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Suriman Bentes Carreira QUIMERA Uma síntese crítica das religiões mais proeminentes, com maior enfoque no cristianismo. 3ª edição (Outubro/2013) Brasil Brasília – DF, 27 de outubro de 2009. - QUIMERA - 1 ⁞⁞⁞ Sobre o autor: Sou natural de Manaus-AM, casado, resido em Brasília-DF, trabalho com Tecnologia da Informação nas funções de analista de sistemas e desenvolvedor, entretanto, sempre fui fascinado por temas controversos. Desde 1996/97, aproximadamente, a profusão de igrejas e facções cristãs, principalmente nos meios de comunicação, tem me despertado curiosidade e especial interesse, a tal ponto, que me impulsionou a pesquisar e estudar a religiosidade e suas diversas manifes- tações. Sempre me questionei sobre vários pontos inconsistentes e duvidosos na Bíblia e nas religiões abraâmicas em geral e, desde que comecei a aprofundar-me no assunto, me deparei com muitos fatos e aspectos antes totalmente desconhecidos a mim, e isto me encorajou mais na busca do conhecimento. Pesquisei e estudei muito, acumulei uma gama de informações que me instigaram a desenvolver esta obra literária. Obra registrada junto ao Escritório de Direitos Autorais da Fundação Biblioteca Nacional – EDA. Título original: Quimera; Autor: Suriman Bentes Carreira; Data de registro no EDA-FBN: 27/10/2009; Nº do registro no EDA-FBN: 476461. - QUIMERA - 2 Dedicatória: À Socorro, minha amada esposa, pelo apoio e in- centivo, e por ter me ensinado e passado muitos valores que antes ignorava; também ao apoio de meus filhos Evandro, Jonas e Nádia, e de criatu- rinhas muito especiais: Luppy, Richard, Charlita, Rossi, Ozzy, Rachid, Sabrina, Samira, Pis-Pis, Max, Bi-bi, Thor, Lady, Pampinha, Pufi, Faísca, Mel, Samir, os coelhos, etc.☺ In Memoriam: À memória de minha mãe Nelma B. Carreira. - QUIMERA - 3 Agradecimentos: Primeiramente, agradeço ao PAI-MÃE Celestial, manancial que vivifica as nossas almas, e a to- das as fontes de conhecimento que utilizei. - QUIMERA - 4 ÍNDICE Tópico Página APRESENTAÇÃO 6 PRELÚDIO 9 QUIMERA 12 (1) CRISTIANISMO 15 (2) CONTRADIÇÕES BÍBLICAS 16 (3) LADO POSITIVO 87 (4) DEUS SOL 90 (5) INFLUÊNCIAS 110 (6) SINCRETISMO RELIGIOSO ROMANO 111 (7) EVANGELHOS 112 (8) RABI 116 (9) FILHOS DO PAI ETERNO 121 (10) COMPARAÇÃO 125 (11) DOMÍNIO 131 (12) EVOLUÇÃO 142 (13) CRISTIANISMO ATUAL 146 (14) AVATAR 147 (15) EPOPEIA DE GILGAMESH 148 (16) MESOPOTÂMIA 158 (17) ANUNNAKI 172 (18) NIBIRU 174 (19) PLUTÃO 176 (20) LIVRO DE ENOQUE 177 (21) TESTAMENTOS DOS DOZE PATRIARCAS 178 (22) SETH 179 (23) EGUNS 180 (24) UMBRAL 181 (25) FORÇAS CÓSMICAS 187 (26) OSTARA 188 (27) VARUNA 192 (28) MITOLOGIA PERSA 194 (29) CIVILIZAÇÃO VÉDICA 197 (30) AHURA MAZDA 199 (31) DAEVAS 200 - QUIMERA - 5 (32) RELIGIÃO DE MISTÉRIO 201 (33) MANIQUEÍSMO 204 (34) ÍSIS 205 (35) BELANUS 210 (36) CORNUCÓPIA 212 (37) YULE 217 (38) SAMHAIM 218 (39) MITOLOGIA DOS MAGOS 220 (40) ÉDITO DE MILÃO 221 (41) CONCÍLIOS 222 (42) JUDAÍSMO 224 (43) HEBREUS 225 (44) CONSCIENTIZAÇÃO 228 (45) SALVAÇÃO ILUSÓRIA 229 (46) HOLOCAUSTO 231 (47) ESPÍRITO SANTO 233 (48) ANTIGO TESTAMENTO 237 (49) ISLAMISMO 239 (50) ZOROASTRO 243 (51) ZOROASTRISMO 252 (52) GNOSTICISMO 258 (53) GNOSE 263 (54) HERMETISMO 264 (55) VEDAS 267 (56) PERISPÍRITO 269 (57) ZIGURATE 273 (58) CÓDIGO DE HAMURABI 276 (59) WICCA 280 (60) ÉBER 288 (61) AVESTA 289 (62) REENCARNAÇÃO 290 (63) SANTA INQUISIÇÃO 347 Epílogo 367 - QUIMERA - 6 APRESENTAÇÃO Religião é um assunto muito delicado. Um antigo provérbio popular diz que não se discute religião e futebol, pois é que nem gosto: Cada um tem o seu. Porém, a obra literária a seguir trata justamente de religião, tendo como temas centrais o cristianismo e a Bíblia. Quimera é o título desta obra e sintetiza os temas em questão. Quimera é fruto de elucubrações e conclusões baseadas em pesquisas, observações, estudos e leituras. Muitos dos textos que compõem esta obra foram coletados de diversas fontes, citadas nas últimas páginas. É uma coletânea bem esclarecedora. Este trabalho está organizado em um texto principal, situado no início, com notas que fazem referência a outros com teor mais elucida- tivo. Os textos atinentes às notas são aprofundamentos de tópicos presen- tes em texto anterior, que pode ser também outra nota. As notas podem ser também capítulos. Desta forma, o leitor pode ler este trabalho linearmente, de capa a capa, se assim o desejar, sem ir às notas e depois voltar ao texto de origem. Quimera é um compêndio que aborda as origens e discrepân- cias das religiões mais proeminentes, principalmente o cristianismo, a mais destacada de todas, com intensa análise e questionamento dos aspectos mais polêmicos e das sérias consequências na História e no caráter do homem. Quimera dá ao leitor uma visão geral das religiões, suas origens, influências, aspectos negativos e positivos, procurando manter o máximo de imparcialidade, dentro do mais estrito senso lógico possível. Esta obra literária também enfatiza e analisa muitos pontos inconsistentes e contradi- tórios na Bíblia. Trata-se de um trabalho que se aprofunda na origem das sagradas escrituras hebraicas, revelando que as mesmas não são tão únicas e originais como muitos creem, e que seus textos têm origens em mitologias e culturas muito mais remotas no tempo. A obra em questão contempla toda a influência que as crenças e as culturas dos povos do passado na região da antiga Mesopotâmia e áreas adjacentes, berço das três religiões mais importantes, exerceram umas sobre as outras, e o quanto isto foi crucial à formação do povo hebreu e o impacto nas religiões abraâmicas, principalmente no cristianismo e na Bíblia. Quimera analisa e levanta questões delicadas sobre o cristianismo, o judaísmo e o islamismo. - QUIMERA - 7 A obra perscruta o porquê da profusão de religiões e templos, principal- mente cristãos, na atualidade. Quimera é uma obra muito contundente nos temas em questão, na tentativa de induzir o leitor ao questionamento e, consequentemente, à busca do conhecimento. Quimera avalia o quanto as religiões influenciaram e influenciam a cultura e a história dos povos, inclu- sive seus efeitos na Natureza; o poder que uma religião pode ter; o contro- le sobre as massas; a finalidade desse controle e suas consequências. O título Quimera* sintetiza, de modo figurativo, as maiores religiões do mun- do: Cristianismo, Judaísmo e Islamismo. * Quimera é uma figura mítica que, apesar de algumas varia- ções, costuma ser apresentada como um ser de cabeça e corpo de leão, além de duas outras cabeças, uma de dragão e outra de cabra. Outras descrições trazem apenas duas cabeças ou até mesmo uma única cabeça de leão, desta vez com corpo de cabra e cauda de serpente, bem como a capacidade de lançar fogo pelas narinas. Graças ao caráter eminentemen- te fantástico de tal figura mítica, o termo quimerismo e o adjetivo quimérico se referem a algo que não passa de fruto da imaginação, uma ilusão, um sonho. Origens Oriunda da Anatólia e cujo tipo surgiu na Grécia durante o sé- culo VII a.C. Sempre exerceu atração sobre a imaginação popular. De acordo com a versão mais difundida da lenda, a quimera era um monstruoso produto da união entre Equidna - metade mulher, me- tade serpente - e o gigantesco Tífon. Outras lendas a fazem filha da hidra de Lerna e do leão de Neméia, que foram mortos por Hércules. Habitualmente era descrita com cabeça de leão, torso de cabra e parte posterior dedragão ou serpente. Criada pelo rei de Cária, mais tarde assolaria este reino e o de Lícia com o fogo que vomitava incessantemente, até que o herói Belerofonte, montado no cavalo alado Pégaso, conseguiu matá-la. A representação plástica mais frequente da quimera era a de um leão com uma cabeça de cabra em sua espádua. Essa foi também a mais comum na arte cristã medieval, que fez dela um símbolo do mal. Quimera também pode ser considerada como um ser com corpo e cabeça de leão, com duas cabeças anexas, uma de cabra e outra de serpente. - QUIMERA - 8 Com o passar do tempo, chamou-se genericamente quimera a todo monstro fantástico empregado na decoração arquitetônica. Em linguagem popular, o termo quimera alude a qualquer composição fantástica, absurda ou monstruosa, constituída de elementos disparatados ou incongruentes, significando também utopia. Em Alquimia, é um ser artificial (assim como o homúnculo), criado a partir da fusão de um ser humano e animal. A palavra quimera, por derivação de sentido, significa também o produto da imaginação, um sonho ou fantasia (por exemplo: A Quimera de Ouro). (Fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/Quimera - BORGES, Jorge Luis. O livro dos seres imaginários. São Paulo: Editora Globo, 2002. ISBN 8525003050) Suriman Bentes Carreira - QUIMERA - 9 PRELÚDIO Falar do ser humano constitui, por si só, uma tarefa difícil e de- licada. Imagine falar de algo tão polêmico e pessoal que é religião. É como se equilibrar em corda-bamba. As religiões sempre predominaram ou fazi- am-se presentes nos momentos mais pungentes da História do homem. Influenciaram e influenciam a vida humana em vários aspectos. Principal- mente na cultura e na política. Quimera aborda estas questões na tentativa de instigar a mente na busca do conhecimento. Conhecimento é aprendi- zado; respostas às nossas indagações. Quanto mais buscamos, mais aprendemos. E, quanto mais aprendemos, mais questionamos, e os ques- tionamentos impelem a novas pesquisas. Essa busca é salutar. Buscar conhecimento é uma arte e não deve ser limitada ou restringida. Buscar é investigar; pesquisar a fundo; perscrutar. É preciso ouvir, ler, analisar ou- tras versões, outros pontos de vista, outras ideologias e até mesmo pen- sar, se pôr no lugar ou tentar ver através destes outros prismas, no intuito de construir uma base mais sólida de conhecimento. Mesmo que os nos- sos princípios sejam diametralmente opostos a estas outras opiniões, de- ve-se, contudo, assumir uma postura neutra durante a investigação para se alcançar uma visão mais ampla e abarcar um conhecimento imparcial, mais coerente e conciso. Por exemplo: Estudar o candomblé, tão somente através de um livro protestante cujo autor é teólogo, formado em faculdade de igreja protestante ou mantida por uma, é o mesmo que estudar o juda- ísmo por um livro nazista. Assim, a investigação torna-se parcial, por con- seguinte, tendenciosa, e, tomando ainda este mesmo exemplo, o viés de parcialidade será ainda maior se o investigador for protestante ou simpati- zante. A propósito, além de parcial, é muito mais cômodo e seguro, pois o investigador não terá de enveredar-se por uma seara um tanto – ou até mesmo totalmente – desconhecida (que poderá incitá-lo a outras questões e levantar possíveis dúvidas sobre suas velhas concepções e valores, intimando-o a perquirir mais) e, em muitos casos, veementemente conde- nada pelos seus congêneres. Consequentemente, a visão da pessoa que busca o conhecimento continuará estreita e o progresso será ínfimo; é como andar em círculos. Isto tem, em maior parte, origem no medo e, em alguns casos, tão somente na apatia intelectual, na ignorância ou na he- rança cultural, que, de certa forma, podem facilmente encobrir o medo - QUIMERA - 10 ancestral. Não podemos ter medo de buscar conhecimento, raciocinar, questionar e aprender. Mesmo que isso nos leve a rever nossos conceitos e valores ou até mudar de ponto de vista; de convicção. O medo tem sido o maior entrave ao avanço da humanidade. O medo existe, é real e intrín- seco à nossa natureza física e, por isso, tem sido muito útil à nossa pre- servação. Até certo ponto, o medo tem suas vantagens. Por exemplo: Normalmente, não vemos pessoas atravessando ruas sem olhar para os lados. É evidente que, graças a ele, garantimos a nossa integridade física. Quando se conhece o perigo – algo potencialmente letal –, o medo ativa o instinto de preservação. O medo é algo natural, inerente à sobrevivência, mas deve ser suplantado em determinadas circunstâncias ou, no mínimo, mantido sob controle. Eliminá-lo por completo seria muito arriscado e é algo, praticamente, impossível. Não existe apenas um tipo de medo: Te- mos medo de perder; medo do desconhecido; medo de errar; medo de ver que estamos errados; medo de nós mesmos... Temos que extirpar cada um de nossos temores. Um por um. Até não existir nada mais do que nós mesmos em nós. Neste nível, até o instinto de preservação deve ser oblite- rado em circunstâncias especiais. Ninguém disse que era fácil vencer o medo, mas é para isso que estamos aqui. O medo é como uma semente que, ao cair em solo fértil, cria raiz e se desenvolve. O medo gerou todos os males da sociedade. O medo prende, entorpece, sufoca e mata. O co- nhecimento liberta, desperta, desobstrui e salva. Ouvidos para ouvir, olhos para ver. ―Quem tem ouvidos para ouvir, ouça‖ (Mateus 11:15). A Verdade está à vista; está ao derredor; está em nós. No entanto, não está ao alcance de todos. Uma coisa é ouvir, outra é compreender. O conhecimento está disponível para todos, mas apenas alguns conseguem entender. Existem os que tentam entender, mas não têm êxito. Outros, simplesmente, repudiam logo de princípio. Todo conhecimento depende de conhecimento anterior. Na matemática, por exemplo, é impossível alguém aprender a tabuada de multiplicação sem saber a de adição. Cada um assimila aquilo que pode entender. Ninguém, nesse mundo, sabe toda a Verdade. Vamos apren- dendo pouco-a-pouco. Depende do esforço de cada um. O entendimento é diretamente proporcional à capacidade assimilativa e esta é diretamente proporcional à bagagem de conhecimento, experiência e evolução espiri- tual. A vida também ensina muito. Através dela, obtemos experiên- cia que pode nos ajudar a ampliar a visão, facilitando o entendimento. Na estrada da vida, muito do que era incompreensível, agora nos parece tão - QUIMERA - 11 claro e o que ainda permanece obscuro, talvez amanhã não o seja, e as- sim acontece com cada um de nós. É perfeitamente normal refutar algo que não entendemos, principalmente, se vai contra aquilo que nos foi ensinado e cremos como verdade absoluta. Mas isso faz parte do momento evolutivo da pessoa. Muitos oferecem maior ou menor resistência a outros conceitos ou pontos de vista. Portanto: ―Quem tem ouvidos para ouvir, ouça‖. Suriman B. Carreira - QUIMERA - 12 QUIMERA O cristianismo(*), assim como a Bíblia, é um embuste. O impe- rador Constantino (272 a 337) e um grupo de pessoas extremamente am- biciosas apossaram-se e distorceram a mensagem crística, passada a nós através de uma filosofia de vida ensinada por Yeshua, e criaram o cristia- nismo(1), atualmente difundido no mundo inteiro, e a ―Palavra de Deus‖ dentro dos moldes da fé romana, adulterando textos, documentos históri- cos, removendo, acrescentando ou mantendo o que lhes era conveniente, e etc. Toda farsa tem contradições(2) e a Bíblia é cheia delas. Os defensores da Bíblia usam argumentos inconsistentes e evasivos para encobrir as discrepâncias bíblicas. Muitos desses defensores são pessoas de boa índole que, graças à sua própria fé, conseguiram muitas coisas. Mas foi a fé delas mesmas e não a Bíblia. Pessoas de fé (fé cega) que vivem e creem em uma ilusão, iludidas, defendem aquilo que acham que é verdade. Porém, existem os que sabem ou percebem que a Bíblia não tem nada de ―palavrade Deus‖ e, mesmo assim, continuam a defendê-la por conveniência (interesses escusos, alheios à fé)(3). A Igreja criou a Bíblia para servir de base ao aprisionamento religioso e, atualmente, é usada por várias vertentes do cristianismo com a mesma intenção. O aprisionamento é consciencial e tem por finalidade precípua controlar seres humanos. O controle é necessário para que as pessoas tenham medo de pensar ou questionar a religião. Pessoas controladas desta forma são levadas a acreditar no que os controladores quiserem. Neste contexto, controlar é dominar; aprisionar. Depois de se conseguir este tipo domínio sobre o povo, tudo vem fácil: Dinheiro, poder, sucesso, etc. O Jesus bíblico também é uma farsa. Um personagem inven- tado conforme os interesses do Império Romano e dos chefes da Igreja. O verdadeiro Jesus fora substituído por um personagem que pudesse ocupar o lugar do deus Sol(4) e de outras deidades solares como Osíris, Mitra, Ísis, Átis, Hórus, Apolo e Rá, idolatradas pelo povo romano, que sempre cultivou um grande apreço pelas crenças egípcias e gregas(5) (exceto Mitra, que veio da Pérsia, mas de origem védica). É notória a total influên- cia das referidas culturas no panteão de divindades romanas. As satur- nais(6) eram exemplos dessa influência. - QUIMERA - 13 Nos primórdios do cristianismo, eram 315 evangelhos, mas a Igreja admitiu apenas 4 (os já conhecidos, que formam o Novo Testamen- to). Isto ocorreu no concílio de Nicéia, aos 325 d.C., primeiro concílio ecu- mênico da Igreja, convocado pelo imperador Constantino. Trezentos bis- pos, homens comuns, mas sedentos de poder, reuniram-se como se fos- sem detentores da Verdade e decidiram que apenas os evangelhos de Mateus, Marcos, Lucas e João eram verdadeiros. Alteraram alguns tre- chos, acrescentaram outros e removeram alguns nas traduções, para en- quadrá-los bem aos seus intentos. São os evangelhos canônicos ou ―inspi- rados‖. O resto é execrado pela Igreja como espúrio e são denominados apócrifos. Entre esses, encontram-se os evangelhos dos naziazenos, dos judeus, dos ebionistas, de Barnabé e dentre os manuscritos do Egito, co- nhecidos como os da biblioteca de Nag Hammadi, encontram-se os evan- gelhos de Tomé, o de Filipe, o de Pedro, o de Judas Iscariotes e o de Ma- ria Madalena e por aí vai(7). Ressaltando-se que todo evangelho que se inicia pelo termo ―segundo‖, que em grego é ―cata‖, não se originam diretamente de seus referenciados evangelistas. Isto quer dizer que os evangelhos inspirados vêm de fontes desconhecidas e, portanto, duvidosas. Poderiam ser apócri- fos também. Isto indica que podem conter trechos verdadeiros e outros não e, para piorar, a Igreja ainda os manipulou. Basta ler atentamente o Novo Testamento para constatar contradições, que comprovam a manipu- lação. Contudo, os evangelhos canônicos deixam transparecer um pouco do Messias real. Mesmo com toda a adulteração, a Igreja deixou passar despercebidamente este ínfimo detalhe. Nota-se que eles traçam um perfil diferente para o Libertador, mas que é totalmente refutado pela Igreja e a grande maioria das instituições cristãs. As passagens existentes nos evangelhos indicam que o Jesus real talvez tenha sido um rabino(8), mas um rabino diferente; Um rabino que pregava com outras palavras; Um rabino que abria a mente das pessoas; Um rabino contra o sistema e isto tivera uma péssima repercussão entre os líderes do judaísmo de então. O que Ele pregara abalara os alicerces que mantinham os sacerdotes no poder. Sacerdotes que, assim como muitos em nosso tempo, não passa- vam de vampiros parasitas, aprisionadores e hipócritas. O Mestre Jesus não veio fundamentar religião alguma. Ele veio revelar-nos a Verdade(9). Ele era e é totalmente contra quaisquer tipos de aprisionamentos. Religião aprisiona. Jesus veio libertar; salvar; tirar-nos da ―Matrix‖(10). O judaísmo é outra farsa. Jesus foi completamen- - QUIMERA - 14 te contra o judaísmo de Sua época (que, diga-se de passagem, de lá para cá, evoluiu pouquíssimo). Ele bateu de frente com os ―cabeças‖ do judaís- mo da época. As escrituras (tanach, talmud, etc.), os rituais, os dogmas e os preceitos judaicos aprisionavam (e ainda aprisionam) a mente das pes- soas para manter o poder nas mãos de um seleto grupo, os sacerdotes. Décadas depois da morte de Jesus, um novo grupo de oportunistas, oriun- dos do judaísmo e do paganismo, criou o Novo Testamento (evangelhos). Novo Testamento, mas com a velha fórmula de aprisionamento nos pa- drões romanos. Aprisionamento através do medo(11): ―Fora do(a) cristia- nismo/Igreja não há salvação‖; ―Quem não aceitar Jesus Cristo queimará no fogo eterno‖; ―Peça perdão a Deus e converta-se antes de morrer para ser salvo no dia do Julgamento‖; ―A partir da morte de Jesus na cruz, todo aquele que aceitar o Cristo como salvador tornar-se-á filho de Deus e será salvo no dia do Juízo‖. O Novo Testamento está repleto de coisas assim. Vê-se claramente uma forma de aprisionamento psicológico através do medo. Sedentos por poder e dinheiro fácil, os sacerdotes da atualidade, assim como os do passado, engendram, com maestria, tais pensamentos na mentalidade de seus prosélitos. Controle é poder; quem controla detém o poder; o domínio. Controlar a consciência das pessoas é controlar as pessoas. Esta é a forma mais eficaz de controle. Um caminho curto para se alcançar esse tipo de controle é através do medo. Explorando-se, nas pessoas, o medo inconsciente do sobrenatural. O medo é imposto e o controle torna-se simples. Assim faziam os sacerdotes contemporâneos de Jesus e o mesmo caminho seguem os atuais ministros de Deus, com mais requinte e técnicas bem mais aprimoradas. Jesus veio libertar a consciên- cia desse cárcere. Mas o medo gera medo. O medo de fracassar na esca- lada ao poder, que tanto almejavam os líderes cristãos, fez com que se corrompesse a mensagem crística nos primórdios da Igreja, lançando mão do medo como meio de domínio consciencial, assim como foi feito às anti- gas escrituras hebraicas (que os sacerdotes contemporâneos de Jesus usavam para manterem-se no poder). O medo é a origem da raiz de todos os males: A religião. Com o decorrer do tempo, todas as mentiras religiosas serão desmentidas, ao passo que a Verdade será revelada(12). (*) Trata-se do ―cristianismo‖ propalado pelas inúmeras facções que se fundamentam e se- guem exclusivamente a Bíblia: Catolicismo e protestantismo (pentecostais e neopentecostais, vulgos evangélicos). A Bíblia é um embuste como Palavra de Deus, ou seja, a Bíblia é um livro rico em histórias, fábulas e trechos que a invalidam como Palavra de Deus. As demais religiões abraâmicas e suas escrituras também se enquadram neste contexto. - QUIMERA - 15 - NOTAS - (1) CRISTIANISMO O cristianismo original(13) era uma filosofia de vida, não uma religião. Uma filosofia de vida que, seguida à risca, rompe os grilhões com o plano físico, liberta a consciência para a iluminação, à verdadeira vida eterna, ao encontro com o PAI (o ABSOLUTO, o verdadeiro Deus, a Cau- sa Central Primeira de tudo). Uma filosofia que não tinha mistérios, basea- da nos ensinamentos e no exemplo de vida do maior avatar(14) de todos os tempos. Amor universal: O legado de Jesus (Yeshua). O cristianismo original foi transmutado em uma quimera, que relegou a importância do amor universal à mediocridade de qualquer irre- levante ato humano. Assim sendo, o cristianismo tornou-se um monstro de ilusões aprisionadoras para controlar consciências, convertendo pessoas em fantoches. A Bíblia é utilizada como ferramenta ao tal aprisionamento. Um aprisionamento oriundo da deformação intencional da mensagem crística em um grande embuste. Nesta grande farsa, incautos são levados a crer em povo escolhido, em uma salvação utópica, em um retorno físico de Jesus como juiz, em ressurreição carnal, arrebatamentos de cristãos e até em prosperidade financeira ilimitada concedidapor Deus, dentre outras balelas. Engodos perpetrados por inúmeras facções ditas cristãs e seus finórios de Deus. Portanto, o cristianismo, assim como a Bíblia, é um em- buste constituído por esse pacote de enganação, essa quimera. - QUIMERA - 16 (2) CONTRADIÇÕES BÍBLICAS As contradições bíblicas são muitas. Estima-se em mais de duas mil contradições explícitas e implícitas. Vejamos algumas: Gênesis, capítulo 1, versos 3 e 5: ―[3] E disse Deus: Haja luz; e houve luz; [5] E Deus chamou à luz Dia; e às trevas chamou Noite‖. Comentário(s): Segundo o Gn 1:3,5, Deus criou o dia e a noite no primeiro dia do processo de criação do mundo, fazendo o advento da luz. Assim está escrito. Gênesis, capítulo 1, verso 16: ―E fez Deus os dois grandes lu- minares: o luminar maior para governar o dia, e o luminar menor para go- vernar a noite; e fez as estrelas‖. Comentário(s): Gênesis 1:16 refere-se, obviamente, à criação do Sol e da Lua, onde o Sol é o luminar que governa o dia e a Lua o que governa a noite. Em Gn 1:3,5, Deus fez a luz no primeiro dia, assim geran- do a noite e o dia, entretanto, está escrito, em Gn 1:16, que Deus fez dois grandes luminares no quarto dia, para governarem o dia e a noite, ou seja, segundo o livro de Gênesis, o Sol, a Lua e as estrelas foram criados de- pois da criação do dia e da noite através da criação da luz. Isto é ilógico, porque a luz do Sol faz o dia existir, isto é, a luz do dia provém do Sol, portanto, não faz o menor sentido a luz do dia ter sido criada antes da cria- ção do próprio Sol. A discrepância está na incoerência da sequência dos acontecimentos: No 1º dia, a luz do dia (Gn 1:3,5); No 4º, o Sol e as estre- las (Gn 1:16)! Tais trechos são exemplos de alguns dos evidentes anacro- nismos bíblicos, que formam contradições, que invalidam a Bíblia como Palavra de Deus. A cultura hebraica herdou muita mitologia mesopotâmica de origem suméria-acadiana. Os hebreus tinham ancestrais sumérios. A anti- ga cidade-estado da Babilônia absorveu a cultura suméria-acadiana. Além da mitologia sumeriana, o zoroastrismo (masdeísmo) da Pérsia exerceu fundamental influência na formação da religiosidade hebraica de então. Historicamente, o zoroastrismo (aproximadamente entre 1.500 a 1.200 a.C., conforme algumas pesquisas documentais) é considerado a primeira religião monoteísta, diga-se de passagem, não obstante a controvérsia existente em torno da verdadeira origem do monoteísmo, pois existem estudos que asseveram que o faraó Aquenáton (aproximadamente entre - QUIMERA - 17 1.380 a 1.334 a.C.) foi o primeiro a impor um culto a um único deus, o deus Aton, representado pelo círculo solar, todavia, teria sido Abraão (aproximadamente entre 1.800 a 1.625 a.C.), o primeiro a conceituar o monoteísmo, segundo outros estudos. Contudo, Melquisedeque, rei e su- mo sacerdote de Salém, muito mais velho do que Abraão, era monoteísta quando conheceu pessoalmente o jovem e futuro patriarca do povo he- breu. O rei monoteísta Melquisedeque foi o mentor religioso de Abraão, ou seja, conduziu-lhe ao monoteísmo. Abraão era discípulo de Melquisede- que. Melquisedeque abençoava Abraão, que, por sua vez, dava-lhe dízi- mos, pois assim ordenava a norma religiosa ao fiel seguidor, ou seja, Abraão era um prosélito do monoteísmo de Melquisedeque. Portanto, tudo indica que Melquisedeque antecedeu Abraão no monoteísmo e que, ou- trossim, o povo de Salém já conhecia o monoteísmo antes de Abraão, pois Melquisedeque era rei e sumo sacerdote desta cidade-estado. Apesar de ter conhecido o monoteísmo através de Melquisedeque, alguns estudos indicam que Abraão era henoteísta, ou seja, cultuava um Deus, mas acei- tava a existência de outros. Outrossim, não há certeza absoluta que Melquisedeque era monoteísta (considera-se que era monoteísta) – talvez tenha sido henoteísta. Porém, ainda nesta polêmica, algumas pesquisas indicam que alguns povos e clãs, situados entre as idades da pedra e dos metais, já ensaiavam um protomonoteísmo, que era uma evolução do he- noteísmo, muito antes de Abraão, Melquisedeque, Aquenáton ou Zaratus- tra. Possivelmente, a origem real do monoteísmo perde-se no tempo. A princípio, os hebreus respaldaram-se apenas na mitologia sumeriana, para construir a sua própria, que posteriormente sincretizaram com o zoroastrismo persa, absorvendo principalmente o dualismo e a es- catologia zoroástrica, durante o cativeiro da Babilônia. Ao se fazer um es- tudo comparativo, constata-se a intensa influência das mitologias mesopo- tâmicas e do zoroastrismo nas escrituras hebraicas e, por conseguinte, na Bíblia, pois o Velho Testamento contém a maior parte dessas escrituras. As passagens bíblicas existentes no Gênesis, inerentes à cria- ção do mundo, refletem claramente a intensa influência do épico da cria- ção Enuma Elish. O Gênesis contém uma sucinta síntese do Enuma Elish, dentre outros épicos sumérios da criação, também assimilados pelos babi- lônios. Enuma Elish é o mito babilônico da Criação, descoberto por Austen Henry Layard, em 1.849 (de forma fragmentada em tábuas de argila), nas ruínas da Biblioteca de Assurbanipal, em Nínive (Mossul, Iraque), e publi- cado por George Smith, em 1.876. O supracitado poema é muito extenso (e algumas partes estão ilegíveis), entretanto, vale citar alguns pequenos - QUIMERA - 18 trechos, para ter-se alguma noção da referida similaridade com passagens do Gênesis: ―Ele (Marduk) fez as estações para os grandes deuses. As estrelas, as suas imagens, tal como as estrelas do Zodíaco, ele fixou. Or- denou o ano em seções, ele o dividiu; Para os doze meses, ele fixou três estrelas... Fez com que brilhasse o deus-Lua, a ele lhe confiou a noite... Enquanto que o deus-Sol na fundação do céu... Quando Marduk ouviu a palavra dos deuses, o seu coração despertou-o e ele estabeleceu um pla- no desenvolto. Abriu a sua boca e falou para Ea aquilo que ele tinha con- cebido no seu coração, que lhe concedeu: ―O meu sangue eu tomarei e osso eu formarei. Farei o homem, para que o homem possa... Criarei o homem que habitará a terra‖. O livro mais antigo da Bíblia é o de Jó, da- tando entre 500 a 400 a.C. O épico da Criação Enuma Elish, encontrado na biblioteca do rei Assurbanipal, data entre 1.800 a 1.600 a.C., ou seja, é bem mais antigo que o livro de Jó, que é mais antigo que o Gênesis. Por- tanto, na falta de outro documento mais antigo, que sirva de fonte ao poe- ma em questão, o Enuma Elish, dentre outros épicos sumerianos, man- tém-se como fonte ao Gênesis, e isto, evidentemente, ocorreu durante o cativeiro da Babilônia. A Epopeia de Gilgamesh, outro épico sumério, tam- bém narra a criação do homem similarmente ao Gênesis bíblico. Segundo a Epopeia de Gilgamesh, o deus Anu pediu à deusa Aruru para criar Enki- du. Então, a deusa mergulhou a mão na água e pegou um pedaço de bar- ro e criou Enkidu, cuja essência era a mesma de Anu, o deus do firmamen- to. Alguns estudiosos e teólogos argumentam que o comando ―Haja luz‖, em Gn 1:3, corresponde à teoria do ―Big-Bang‖, que aborda a origem do Universo a partir de uma explosão primordial, entretanto, o quar- to versículo do capítulo 1 de Gênesis afirma o seguinte, referente à luz que Deus criara: ―E viu Deus que era boa a luz; e fez Deus separação entre a luz e as trevas‖, ou seja, depois de criar a luz, Deus fez o dia e a noite, separando a luz e as trevas. No verso seguinte, Deus denomina a luz, de dia, e as trevas, de noite. Portanto, dentro do contexto bíblico do livro de Gênesis, o argumento do ―Big-Bang‖, para explicar a criação da luz (dia) antes da criação do Sol, perde consistência. A ordem ―Haja luz‖, tomada isoladamente, alinha-se à teoria do ―Big-Bang‖, mas não à criação do dia e da noite (como consta em Gênesis), pois o ―Big-Bang‖ gerou o Universo, mas não o dia e a noite, ou seja, segundo o Gênesis bíblico, ―Haja luz‖ formou apenas o dia e a noite (não o Universo), contrariando assim o ar- gumento em questão, que equiparao comando ―Haja luz‖ com o ―Big- Bang‖. Talvez os hebreus ou seus ancestrais tenham distorcido a mitologia - QUIMERA - 19 sumeriana no decorrer do tempo, de geração a geração, na tradição oral. Em suma: O fato é que, o que está escrito, está incoerente. Gênesis, capítulo 1, verso 26: ―E disse Deus: Façamos o ho- mem à nossa imagem, conforme a nossa semelhança‖. Comentário(s): Por que o plural (―nossa imagem‖... ―nossa se- melhança‖), se Deus é um? Mesmo que se considere a Trindade, afirma- se que a Trindade é Deus e vice-versa, isto é, não há lógica em Deus refe- rir-se a Ele mesmo no plural para dizer que criará o homem à Sua imagem e semelhança. Tendo Deus nos criado à Sua imagem e semelhança, Ele não poderia falar no plural, a não ser que houvesse mais de um Deus. Vale dizer que o Gênesis bíblico mostra Deus agindo solitariamente, mas subitamente aparece Deus falando como se estivesse acompanhado (de outro(s)/outra(s) deus(es)/deusa(s)): ―nossa imagem‖... ―nossa semelhan- ça‖. Isto é, no mínimo, incompatível com o monoteísmo. Vê-se, claramen- te, a influência de mitologia politeísta da Suméria. Existem muitas proposições para explicar esse plural na fala de Deus. Uma dessas teorias diz respeito a uma intervenção alienígena para composição do homem atual, via manipulação genética, ou seja, esse ―Deus‖ seria um extraterrestre, dizendo aos seus geneticistas como terá de ser o novo espécime humanoide. Trata-se de uma explicação lógica, mas ainda não cabalmente comprovada. Gênesis, capítulo 1, verso 27: ―E criou Deus o homem à sua imagem: à imagem de Deus o criou; homem e mulher os criou‖. Comentário(s): Diferentemente de Gn 1:27, em Gn 1:26, é Deus mesmo quem fala no plural: ―NOSSA imagem‖... ―NOSSA semelhan- ça‖. A questão agora é que, em Gn 1:26, Deus cria o homem à imagem e semelhança Dele e de outro(s), mas, em Gn 1:27, afirma-se que Deus fez o homem à Sua imagem apenas. É óbvio que Gn 1:27 tenta contornar a situação delicada em que Gn 1:26 pôs o monoteísmo, entretanto, formou- se uma contradição. Gn 1:27 também afirma taxativamente que Deus criou o ho- mem e a mulher, ou seja, Adão e uma mulher. Uma mulher criada tal qual Adão, ao mesmo tempo, de igual modo, seguindo o mesmo processo e da mesma matéria-prima, ou seja, do barro. Esta mulher não veio da costela de Adão. Contudo, segundo o Zohar (comentário rabínico das escrituras), Eva não foi a primeira mulher de Adão e sua primeira mulher também não teria sido feita do barro, separadamente e simultaneamente à criação de Adão, pois este primeiro ser humano, um proto-Adão feito do barro, teria sido hermafrodita, ou seja, tinha ambos os sexos, que depois foram sepa- - QUIMERA - 20 rados, individualizados, formando duas pessoas diferentes, cada uma com um sexo oposto ao outro, id est, um homem e uma mulher. Gênesis, capítulo 2, verso 22: ―E da costela que o SENHOR Deus tomou do homem, formou uma mulher, e trouxe-a a Adão‖. Comentário(s): Primeiramente, vale lembrar que Gn 2:22 vem depois de Gn 1:27, que narra a criação da primeira mulher, juntamente com Adão, ou seja, Gn 2:22 fala da criação de outra mulher (a segunda, portanto; ou seja, uma mulher em Gn 1:27 e outra em Gn 2:22). Notada- mente, Gn 2:22 narra a criação da Eva, considerada a mulher oficial de Adão e consagrada publicamente como a primeira. Assim sendo, então, quem teria sido a mulher que Deus criou antes de Eva em Gn 1:27? Seria Lilith? Não era Eva, porque ela foi criada em Gn 2:22. A história (mitologia) está mal contada na Bíblia, mas Gn 1:27 deixa claro que houve uma ante- cessora à Eva, ou seja, Eva foi a segunda mulher de Adão. Em Gn 1:27, Deus cria, simultaneamente, um homem e uma mulher, ou seja, uma mu- lher foi criada antes de Eva, pois a criação da Eva ocorre em Gn 2:22, depois da criação de Adão. É óbvio que a mitologia (sumeriana) está trun- cada na Bíblia. Existe uma passagem do prólogo de Gilgamesh, que faz parte do épico babilônico ―Gilgamesh‖, de aproximadamente 2.000 a.C., traduzida por Samuel Kramer, que, segundo ele, contém a mais antiga referência conhecida de Lilith já escrita, que sinteticamente conta o seguin- te: ―Depois do céu e da terra terem sido criados e separados; depois que Enki havia deslizado para o submundo; uma árvore huluppu, que havia sido plantada sobre as margens do Eufrates, foi arrancada pelo vento do sul e levada para longe do Eufrates. Uma deusa levou-a para o jardim de Inanna em Uruk. Inanna esperava ter um trono e uma cama feito para ela de sua madeira. Depois de dez anos, a árvore havia crescido. Mas neste meio tempo, ela descobriu, para seu desânimo e assombro, que suas es- peranças não poderiam ser realizadas. Um dragão havia construído seu abrigo nos pés da árvore, o pássaro Zu havia posto sua cria no cume, e uma demônia Lilith havia construído sua casa no centro. Mas Gilgamesh veio em seu socorro. Ele matou o dragão com seu machado, o pássaro Zu voou para as montanhas com seus filhotes, enquanto Lilith, petrificada de medo, fugiu de sua casa e voou para o deserto‖. É possível notar até as semelhanças da bíblica queda de Luzbel (Lúcifer) com a de Enki, do dra- gão com a serpente, do jardim de Inanna com o Éden, da árvore... Em Gn 2:23, Adão diz: ―Esta é agora osso dos meus ossos...‖. Se Eva fosse a sua primeira mulher, Adão expressaria surpresa, no entan- to, Adão esboça uma naturalidade e normalidade próprias do experiente, - QUIMERA - 21 ou seja, é a voz da experiência. A expressão ―Esta é agora...‖ indica que Adão teve outra companheira (independente dele) antecedente à Eva. Tudo indica que Eva foi a segunda mulher de Adão e a primei- ra foi Lilith (ou Lilit, ou Lilite). Lilith surge nas mitologias de culturas pré- cristãs. Lilith aparece no Tanach, a Bíblia judaica, equivalente ao Antigo Testamento da Bíblia cristã, em Isaías 34:14: ―Ali descansará Lilith, e achará um pouso para si‖. Em Isaías, Lilith passa a habitar no deserto, junto com serpentes, hienas, corujas, sátiros (Samael e os outros demô- nios), etc. (coitados desses animais, associados ao mal, passaram a figu- rar com uma conotação pejorativa na mentalidade popular de então). É a vingança de Deus, transformando a terra de Edom num deserto (Edom significa vermelho, segundo nome de Esaú, irmão gêmeo de Jacó, consi- derado o pai dos edomitas; a terra dos edomitas). Na maioria das tradu- ções de Isaías nas Bíblias cristãs aparece bruxa, fantasma, animais notur- nos, etc., em vez de Lilith. As traduções onde aparecem ―criaturas da noi- te‖, ―animais noturnos‖, etc. é uma especulação interpretativa, oriunda da similaridade do nome ―Lilith‖ com a palavra hebraica ―laylah‖ (noite). O nome Lilith aparece no original hebraico do Tanach (hebraico transliterado: Liyliyth) e, também, em algumas poucas versões de Bíblias cristãs, como, por exemplo, em Isaías 34:14 da Bíblia Sagrada (católica): ―Ali viverão o gato selvagem e a hiena, o cabrito montês chamará os seus companhei- ros; aí Lilit vai descansar e encontrar um lugar de repouso‖. A exclusão de Lilith do texto bíblico ocorreu de maneira gradual, e bem anteriormente à tradução da versão Vulgata (primeira Bíblia (Velho e Novo Testamentos), feita por São Jerônimo, em latim, usada pela Igreja Católica durante muitos séculos e fonte de diversas traduções das quais derivam as Bíblias atuais). Roberto Sicuteri, autor do livro ―Lilith, a Lua Negra‖, confirma que é na época da transposição da versão jeovística da Bíblia (século X a.C.) para a versão sacerdotal (587-538 a.C.) que a lenda de Lilith teria sido eliminada, entretanto, ainda restam pequenos resquícios desta tradição em fragmen- tos deste texto, à exemplo do Livro de Isaías. A partir desse período, a lenda de Lilith passa a ser vista pelos eruditos hebraicos como uma su- perstição sem sentido. Entretanto, a lenda ainda aparece em comentários talmúdicos, na Midrash e na Cabala. A exclusão total do mito no texto bí- blico se dá a partir do período da traduçãoda Septuaginta (Septuaginta, ou Versão dos Setenta, é o nome da versão da Bíblia hebraica – equivalente ao Velho Testamento – para o grego koiné, em 300 a.C.). Um grego de Alexandria, de nome Símaco (185 a 200 d.C.), realizou uma tradução do texto para o grego, valendo-se tanto do texto original em hebraico clássico - QUIMERA - 22 quanto da Septuaginta (Versão dos Setenta, de 300 a.C.). Ele preocupou- se com o sentido da tradução, e não com a exatidão textual. Esse autor exerceu grande influência sobre a Bíblia latina, pois São Jerônimo fez am- plo uso desse texto para compor a Vulgata. Lilith também é um demônio feminino da mitologia babilônica (vale lembrar o cativeiro da Babilônia, período de grande impacto na cultu- ra hebraica), que habitava lugares desertos. A Cabala faz referência à Lilith como a primeira mulher de Adão, mas, em outro trecho, também é tida como a serpente que induziu Eva a comer o fruto proibido (Patai 81: 455f). O folclore hebreu medieval, conhecido como Alfabeto de Ben-Sira (século VI ou VII), menciona Lilith como a primeira mulher criada por Deus, simultaneamente a Adão, mas que o abandonou por causa de uma disputa por igualdade entre sexos. Fato que a converteu em um demônio. Lilith não aceitava ficar por baixo nas relações sexuais e Adão recusava-se em inverter as posições. Isto foi o estopim para desencadear uma grande al- tercação entre o casal primordial, à qual gerou uma imensa indisposição, que culminou na separação. Lilith abandona Adão ao cair da noite (fator que a associa com o período noturno, as trevas, a escuridão, horário em que Deus expulsou os anjos rebeldes, convertendo-os em demônios, horá- rio onde têm mais atuação), voando, devido aos seus conhecimentos má- gicos, ao encontro com os demônios no Mar Vermelho, onde se tornou a noiva de Samael, o senhor das forças do mal do sitra achra (―outro lado‖ em aramaico), anjo caído, transformado no demônio de nome Asmodeus (também chamado de Leviatã), um dos príncipes de Lúcifer, que é o anjo rebelde Luzbel, o líder dos anjos caídos. Diante de tamanha desolação, Adão, que era apaixonado por Lilith, lastima e clama a Deus, que manda três anjos, Sanvi, Sansavi e Samangelaf, convencerem-na (em vão) a re- tornar. Os anjos chegam até a ameaçá-la com a morte, mas ela sabia que era um logro, e continuou irredutível (algumas versões dizem que tais an- jos a condenaram a vagar eternamente pela Terra). Em sua cólera, Lilith se volta contra os homens, crianças e recém-casados. Fator este que faz os anjos entrarem em um acordo com Lilith: Não se aproximar de bebês que tenham um amuleto contendo os nomes dos três anjos (outra versão afirma que os anjos ceifaram a vida de seus filhos com Adão, revoltando-a a ponto de querer aniquilar toda a posteridade de Adão e Eva). Lilith aca- sala-se com os demônios, parindo cem demônios diariamente, cujos ma- chos são denominados Lilim, ou Liliotes, ou Linilins, e as fêmeas Liliths (o termo Lilim aparece no Targum Jerushalami, a bênção sacerdotal dos Nú- meros, VI, 26, que contém esta versão: ―O Senhor te abençoe em todo ato - QUIMERA - 23 teu e te proteja dos Lilim!‖). Estas narrativas são apenas uma pequena parte contida no Talmude (compêndio rabínico das normas, cultura e histó- ria judaica) e no Alfabeto de Ben-Sira. Lilith é também citada em um frag- mento dos Manuscritos do Mar Morto (4QCânticos do Instrutor/ 4QShir — 4Q510 frag. 11.4-6a // frag. 10.1f), da antiga comunidade de Qumran. Tra- ta-se de uma passagem baseada em Isaias 34:14, a saber: ―E Eu, o Instru- tor, proclamo a majestade de seu esplendor a fim de assustar e aterrorizar todos os espíritos dos anjos da destruição e os espíritos bastardos, demô- nios, Liliths, corujas...‖. Existe uma escultura babilônica muito conhecida: Trata-se de uma placa de terracota, denominada Relevo Burney, datada entre 1.500 a 2.000 a.C., na qual Lilith, de cabelos longos, com pés de coruja (indicativos de vida noctívaga) e dotada de asas, é retratada sobre duas hienas e ladeada por duas corujas, como uma representação icono- gráfica que faz lembrar Isaias 34:14, ou seja, é mais uma evidência da influência mitológica sumeriana na cultura hebraica. A referida escultura babilônica também lembra uma antiga lenda suméria na qual uma linda jovem fugiu voando de casa, perto do Rio Eufrates, e se estabeleceu no deserto. Existe também outra escultura babilônica, semelhante à anterior- mente citada, na qual Lilith é vista em pé sobre dois cabritos monteses machos. Nestes baixos-relevos em terracota, Lilith segura pares do ―círcu- lo mágico‖ e da ―santa arma‖, ambos empregados em cerimônias religio- sas. Segundo a iconografia babilônica, os deuses podiam presentear reis e sacerdotes com esses dois objetos, que são representados em afrescos coloridos. Entretanto, tudo indica que Lilith estaria lançando mão de sua magia para subjugar os animais retratados nas referidas esculturas. Lilith ostenta um tipo de gorro ou chapéu escalonado, adornado com enfeites laterais e um disco solar no topo, caracterizando-a como uma deusa (e não como um demônio), segundo a crença. Salta aos olhos que Lilith é representada com atributos, caracteres e postura de uma deusa nos su- pracitados baixos-relevos, ou seja, é evidente que Lilith era considerada uma deusa, e não um demônio, na época em que tais obras foram manu- faturadas. Porém, Lilith foi demonizada com o decorrer do tempo, sob a influência de outras culturas. Na época que o Talmud foi completado, pes- soas que viviam na colônia judaica de Nipur, Babilônia, conheciam Lilith, pois sua imagem foi encontrada em numerosos pratos de cerâmica, que foram desenterrados, datados de 600 d.C., conhecidos como vasos de encantamentos pelas inscrições de feitiços escritos em aramaico. Em um desses vasos, em exposição no Museu Semítico da Universidade de Har- vard, está escrito o seguinte: ―Tu Lilith… Amedrontador e Salteador, adju- - QUIMERA - 24 ro-o pelo Forte de Abraão, pela Rocha de Isaac, pelo Shaddai da volta de Jacob… para longe deste Rashnoi… e de Geyonai o divórcio de seu mari- do... Seu escrito e carta de separação… enviado por santos anjos… Amém, Amém, Aleluia!‖. O nome Lilith tem raízes semíticas e indo-europeias, ligadas às palavras ―lil‖, que significa vento e ar em sumeriano, e ainda às palavras sumérias ―lulti‖, que significa lascívia, ―lulu‖, que significa libertinagem e a palavra hebraica ―laylah‖ ou ―layl‖, cujo significado é noite. Os sumérios a conheciam sob os nomes de Lilitu, Lilu, Ardat Lili e Lamaschtu, que eram termos sumerianos para demônios noturnos ou espíritos de vento. Muitos estudiosos atribuem a origem do nome fonético Lilith por volta de 700 a.C. Lilith é retratada como a serpente em pintura de Rafael Sanzio em 1.508. Ela aparece também como a serpente na fachada da Catedral de Notre-Dame de Paris em 1.163. Também é retratada em famosa gravu- ra de John Collier em 1.892. Lilith aparece como a serpente em pintura de Michelangelo em 1.510. A imagem de Lilith, com o nome Lilitu, é parte integrante da mitologia sumeriana por volta de 3.000 a.C., inicialmente, representando uma categoria de demônios de ventos e tormentas. Lilith aparece também no Épico Babilônico de Gilgamesh (o lendário rei sumé- rio), em aproximadamente 2.000 a.C., como uma prostituta vampira que era incapaz de procriar e cujos seios estavam secos. Tanto na Suméria quanto na Babilônia, Lilith era, ao mesmo tempo, cultuada e identificada com os demônios e espíritos malignos. Seu símbolo era a Lua, pois assim como a Lua, ela seria uma deusa de fases boas e ruins. Alguns estudiosos comparam-na a várias deusas da fertilidade, assim como deusas cruéis, devido ao sincretismo com outras culturas. Muitos acreditam também que há uma relação entre Lilith e Inanna, deusa suméria da guerra, da fertilida- de e do prazer sexual. Inscrições descobertas nas ruínas da Babilônia, precisamente na biblioteca de Assurbanipal, esclarecema origem de Lilith: Cortesã sagrada de Inanna, a ―Grande Deusa Mãe‖, também conhecida como a ―Rainha dos Céus‖, enviada por esta para seduzir os homens na rua e levá-los ao templo da deusa, onde se realizavam os ritos sagrados de fecundidade. Os costumes sexuais sagrados eram a dádiva de Inanna para a humanidade. Em seus templos se praticava a prostituição sagrada e suas sacerdotisas eram conhecidas como Nu-gig. Os homens da comu- nidade buscavam a deusa nessas sacerdotisas e o ato sexual era sagrado, proporcionando a cura física e espiritual. Esses ritos também se davam com o propósito de render boas colheitas. O ato sexual estava relacionado também com a fecundidade da terra. Confundiu-se Lilith, denominada ―A - QUIMERA - 25 Mão de Inanna‖, com a deusa que ela representava, pois a Deusa também recebia, às vezes, o título de ―Prostituta Sagrada‖. Também não é inco- mum que se confunda Lilith com Ishtar ou até mesmo com Ísis, pela liga- ção destas com a morte. Vale dizer que as deusas Inanna dos sumérios, Asterote dos filisteus, Isis dos egípcios, Ishtar dos acádios e posteriormen- te dos babilônios, Astarte dos fenícios e Ostara (Easter), a deusa da fertili- dade e da primavera na mitologia nórdica, são cognatas. Alguns estudos relacionam Lilith a um aspecto dessa ―Grande Deusa‖ (Ishtar/Inanna) cul- tuada na Babilônia, que era nada menos que mais uma herança suméria- acadiana dos mitos da criação, havendo estreita relação entre os cultos dos antigos que honravam a ―Grande Mãe‖ (Mãe Terra) chamada também ―Grande Serpente‖ e ―Dragão‖. Segundo a tradição, o culto à Lilith também possuiria relações com o período menstrual, por isso as mulheres a cultu- avam durante a Lua Nova, pois, em muitas culturas, era comum associar as fases da lua com a mulher. Quando a Lua Nova chegava, costumava-se dizer que a deusa estava com as regras. Assim, o período normalmente dedicado a Lilith, naquela época, era exatamente o período menstrual. O momento em que as mulheres poderiam ter relações sexuais livres da possibilidade de gravidez e, por isso, tais relações estariam exclusivamen- te ligadas ao prazer (e não à procriação, como era a perspectiva patriar- cal). Assim, muitas vezes, se referiu a essa deusa como o ―Espírito Mens- trual‖. É em virtude disso que posteriormente se criou, na sociedade judai- ca, uma série de tabus em relação à menstruação, inclusive proibições sexuais. Entre 3.000 e 2.500 a.C., quando os sumerianos passaram a ter contatos com culturas patriarcais, ocorre a passagem da concepção religi- osa matriarcal para a patriarcal, então, os templos dedicados à deusa fo- ram postos abaixo e as práticas sexuais foram reprimidas e se tornaram parte da sombra, o poder da mulher foi identificado com o mal e o demônio (mas o politeísmo foi mantido, diga-se de passagem). A deusa passa a ser o símbolo do mal supremo. Entretanto, é importante destacar que os he- breus não eram, a princípio, monoteístas, e sim politeístas e henoteístas. Somente após a invasão de Israel pelas forças babilônicas, no século VI a.C., é que começa a surgir o judaísmo, mais ou menos, como é conheci- do atualmente: Integralmente monoteísta e patriarcal. A deusa passou a ser denominada como a ―Grande Abominação‖, entretanto, o livro de Reis demonstra que seu culto e negação passaram por uma sucessão de idas e vindas, pois diversos reis são condenados, no Antigo Testamento, por terem cometido o pecado da idolatria no topo das montanhas, e estas eram um símbolo da Grande Deusa. A deusa de Israel chamava-se Ashe- - QUIMERA - 26 rah (ou Aserá), esposa de Yahweh (Jeová, Deus, Javé, YHWH, etc.). Para a maioria das pessoas que leem a Bíblia, a ideia de um único Deus de Israel, Yahweh, parece ser clara. No entanto, descobertas arqueológicas das últimas décadas vêm demonstrando que nem sempre foi assim. Nem sempre Yahweh esteve solitário. Antes da ascensão do monoteísmo em Israel, o Deus Yahweh fazia parte de um contexto politeísta onde havia um panteão de deuses e deusas, sendo que provavelmente foi adorado ao lado de sua consorte, Asherah. O culto à Deusa era exercido tanto por homens quanto por mulheres, mas veio, sobretudo, ao encontro das ne- cessidades das mulheres, pois lhes oferecia mais espaço no âmbito religi- oso. Pesquisas destacam a época do profeta Elias como o período históri- co em que se começa a falar da exclusividade do Deus de Israel, princi- palmente no embate com o deus Baal e no processo de sincretismo, onde Yahweh incorpora as características de Baal. O pesquisador Haroldo Rei- mer aponta, sobretudo, o século V a.C. (pós-exílio babilônico) como o momento histórico marcante, em que Yahweh vai se constituindo como Deus único de Israel, desencadeando um ―processo de diabolização de outras divindades‖. Num primeiro momento, a divindade Yahweh teria sido um elemento religioso que veio de fora do contexto cananeu. Nesta época, possivelmente era o Deus El que ocupava o topo do panteão divino. Yahweh passa a integrar o contexto israelita sem, contudo, negar a exis- tência e diversidade de outras divindades. Todavia, conflitos religiosos entre os séculos IX e VII a.C. desencadearam a transferência dos atributos da fertilidade de Baal para Yahweh. Neste período, a afirmação da exclusi- vidade de Yahweh acarreta um processo de ―diabolização‖ da própria Deusa Asherah. Frente a essa exclusividade de Yahweh, será impossível a sobrevivência de qualquer outra divindade, além de que a ênfase em Yahweh será critério de afirmação do sacerdócio masculino, perpetuando uma sociedade patriarcal. Neste contexto, a existência de outras divinda- des masculinas e femininas foi sempre uma ameaça ao monoteísmo esta- belecido, sendo que as reformas religiosas em Judá, de Josafá (870-848 a.C.), de Ezequias (716-687 a.C.), de Josias (640-609 a.C.) e as legisla- ções do Código da Aliança (Ex 20:22-23 e 19) e do Código Deuteronômico (Dt 12 e 26) agiram como instrumentos que visavam assegurar a fé mono- teísta. Haroldo Reimer aponta cinco fases do desenvolvimento do monote- ísmo no Antigo Israel, a saber: A primeira fase seria marcada pelo sincre- tismo entre El e Yahweh, no qual El é uma divindade cananeia cujas ca- racterísticas são de Criador da terra e pai dos deuses (analogamente, o sumeriano deus Apsu também era o progenitor dos deuses, diga-se de - QUIMERA - 27 passagem); A segunda fase, por volta do século IX a.C., seria marcada pelos conflitos com o Deus Baal. Baal era filho de El, cuja característica principal era a fertilidade; A terceira fase estaria na ênfase da adoração exclusiva a Yahweh. O profeta Oséias, no século VIII a.C., equipara a ido- latria à adoração de outras divindades. Neste período, acontece a reforma de Ezequias (2Rs 18:4), que mostra a remoção dos lugares altos e a des- truição da serpente de bronze, Neustã. Reforma legitimada legalmente através do Código da Aliança (Ex 20:22-23 e 29); A quarta fase remete à época de dominação assíria, com a reforma de Josias (2Rs 22 e 23), justi- ficada legalmente pelo Código Deuteronômico, englobando uma série de medidas visando a exclusividade de Yahweh e sua centralidade em Jeru- salém. Cada vez mais, as reformas religiosas vêm carregadas de intole- rância religiosa, proibindo qualquer tipo de imagens de divindades, mesmo que de Yahweh. Esta fase teria repercutido imensamente no culto à Deusa Asherah, consorte de Yahweh; A quinta fase seria marcada pelo monote- ísmo absoluto e estaria relacionada com o período do exílio. Gn 1 afirma o poder criacional de Yahweh diante do domínio babilônico ancorado na fidelidade à divindade Marduk (a influência da mitologia babilônica). No entanto, o pós-exílio, época do domínio Persa (influência do zorastrismo) e do retorno das elites sacerdotais exiladas na Babilônia, seria o momento de maior afirmação do monoteísmo absoluto em Yahweh, bem como da supressão de qualquer referência a outras divindades, sobretudo femini- nas. Toda a literatura bíblicaproduzida e finalizada neste período terá essa tendência exclusivista em Yahweh. Enfim, o monoteísmo em Israel traz em si um longo processo sincrético de elaboração e afirmação, que se torna absoluto, sobretudo, em torno dos séculos VI e V a.C. (época do Cativeiro da Babilônia e posterior). Conforme a pesquisadora Monika Ottermann, que traça o pa- norama da presença da Deusa em Israel, da Idade do Bronze à Idade do Ferro, no Oriente Médio, datando a Idade do Bronze Médio entre 1.800 a 1.500 a.C., a representação da Deusa é caracterizada como ―Deusa-Nua‖, destacando o triângulo púbico, emergindo também representações em forma de ramos ou pequenas árvores estilizadas, combinação que vem a ser denominada ―Deusa-Árvore‖. Os ramos, árvore ou pequenas árvores, brotando com suas raízes no triângulo púbico, simboliza a busca pela vida, a fertilidade, a manutenção da vida, pois o triângulo púbico é gerador de vida (vale dizer que o hexagrama judaico, conhecido como estrela de Davi, símbolo do Estado de Israel, é formado por dois triângulos opostos e so- brepostos, onde o triângulo voltado para cima representa o fogo, o mascu- - QUIMERA - 28 lino, e o voltado para baixo, a água, o feminino). Na Idade do Ferro I (1.250/1.150-1000 a.C.), a forma corporal da Deusa-Árvore vai desapare- cendo enquanto que formas de animais que amamentam filhotes, às vezes com a presença de uma árvore estilizada, ganham cada vez mais espaços na glíptica, significando a prosperidade e a fertilidade. A presença da Deu- sa fica relegada aos espaços de religiosidade das mulheres. Na Idade do Ferro II (1.000-900 a.C.), início da formação do javismo, as deusas pas- sam a ser simbolizadas por seus atributos. A forma vegetal da Deusa con- funde-se com seu símbolo, a árvore estilizada, sendo que, muitas vezes, é substituída por ele. São imagens que representam a Deusa Asherah. Na Idade do Ferro III (925-720/700 a.C.), Israel e Judá apresentam diferenças no âmbito simbólico. Os documentos epigráficos de Kuntillet Adjrud e de Khirbet el-Qom destacam um vínculo estreito entre Asherah e Yahweh, o que, acima de tudo, demonstra um contexto politeísta, onde se adoravam várias divindades femininas e masculinas. Na Idade do Ferro IV (720/700- 600 a.C.), a Babilônia derruba a Assíria e passa a dominar Israel e Judá. Neste período, encontramos o símbolo tradicional da Deusa, a árvore e o ramo. Vários selos ou impressões de selos que associam símbolos astrais com árvores estilizadas foram encontrados na Palestina e na Transjordâ- nia, o que reforça interpretações sobre a existência de um culto à Deusa Asherah ao lado do Deus Yahweh. É principalmente na forma de árvore estilizada que, ao longo de séculos, Asherah esteve presente em Israel. Mas é, sobretudo, na época pós-exílica que as vertentes políticas e religio- sas dominantes vão excluir e proibir a presença de uma divindade feminina dentro do javismo. As primeiras evidências de Asherah aparecem em textos cu- neiformes babilônicos (1.830-1.531 a.C.) e nas cartas de El Armana (sécu- lo XIV a.C.). Para o pesquisador Ruth Hestrin, informações importantes sobre Asherah vêm dos textos ugaríticos (idioma da cidade perdida de Ugarit, na Síria) de Ras Shamra (costa mediterrânea da Síria). Nestes textos, Asherah é chamada de Atirat, consorte de El, principal Deus do panteão cananeu no segundo milênio a.C., sendo mencionada também como ‗Elat, forma feminina de El. Nos textos ugaríticos, Asherah (ou seja, Atirat ou ‗Elat) é a mãe dos Deuses, simbolizando a Deusa do amor, do sexo e da fertilidade (nota-se o sincretismo com as deusas suméricas- babilônicas Tiamat, Ishtar Inanna, entre outras). O jarro é decorado e con- tém inscrições raras do antigo alfabeto semítico. Na decoração, há o de- senho de uma árvore flanqueada por duas cabras com longos chifres para trás, que, segundo Ruth Hestrin, representa Asherah. Uma inscrição que - QUIMERA - 29 segue pela borda do jarro tem sido reconstruída e traduzida por Frank M. Cross, como: ―Mattan. Um oferecimento para minha senhora ‗Elat‖. Não se sabe quem é Mattan, mas está claro que a pessoa faz uma oferenda para ‗Elat, que é o feminino para El, chefe do panteão cananeu no segundo milênio a.C., equivalente à pré-bíblica Asherah. Nota-se um dado impor- tante, o nome ‗Elat está escrito logo acima da árvore, representação de ‗Elat/Asherah. Provavelmente, o jarro e seu conteúdo foram utilizados co- mo uma oferenda à Deusa. Não obstante, foi no templo de Arad, no Ne- guev, ao sul de Jerusalém, que se encontraram fortes evidências de Ashe- rah. No santuário interno, foram encontrados dois altares diante de um par de pedras verticais, possivelmente lugar de culto a Yahweh e Asherah. Outro altar foi encontrado no pátio externo do templo com as tigelas dos sacerdotes e cinzas de ossos de animais queimados, no canto uma irman- dade local e altares com pedras duplas. Segundo a teóloga Elaine Neuen- feldt, o templo é datado, aproximadamente, da época do Bronze Recente, entre os séculos X e VIII a.C., quando possivelmente a reforma de Eze- quias o extinguiu. Em Khirbet el-Qom, a oeste de Hebron, em 1.967, outro arqueólogo encontrou um túmulo judaico da segunda metade do século VIII, com uma inscrição na parede interior, que Severino Croatto traduziu como: ―1) Urijahu (...) sua inscrição; 2) Abençoado seja Urijahu por Javé (lyhwh); 3) Sua luz por Asherah, a que mantém sua mão sobre ele; 4) por sua rpy, que...‖. O arqueólogo israelita Ze‘ev Meshel, em Kuntillet Adjrud, 50 km ao sul de Qadesh-Barnea, na antiga estrada de Gaza a Elat, esca- vou uma pousada no deserto que continha várias inscrições. Controlado por Israel, este posto estatal encontrava-se em território de Judá, funcio- nando aproximadamente entre 800 a 775 a.C.. No prédio principal, em sua entrada, duas jarras de armazenagem com desenhos e inscrições foram encontradas e identificadas como pithos A e pithos B. Na inscrição do pithos A se lê: ―Diz... Diga a Jehallel... Josafa e...: Abençoo-vos em YHWH de Samaria e sua Asherah‖. No pithos B se lê: ―Diz Amarjahu: Diga ao meu Senhor: Estás bem? Abençoo-te em YHWH de Teman e sua Asherah. Ele te abençoa e te guarde e com meu senhor‖. Neste pithos aparecem três figuras, duas masculinas, retratos do deus egípcio Bes, e uma claramente feminina (seios em destaque), tocando uma lira (evidente sincretismo com divindades egípcias). Além desses, existem muitos outros artefatos arque- ológicos que ratificam o politeísmo precursor do monoteísmo hebreu. O politeísmo, assim como o culto à Deusa Asherah, foi gradualmente per- dendo espaço ao monoteísmo na sociedade israelita de então. Houve re- sistência, mas o monoteísmo foi imposto, assim como a cultura patriarcal, - QUIMERA - 30 em virtude da intensa influência das nações dominantes no transcurso do tempo. Asherah foi demonizada durante o pós-exílio. Assim como Lilith foi demonizada, Asherah foi também, em função da forte influência do domí- nio babilônico. Lilith foi absorvida da mitologia babilônica à mitologia he- braica quando já se encontrava demonizada na Babilônia. Todas essas mudanças ocorreram nos séculos VI e V a.C., ou seja, durante e após o cativeiro babilônico. Os hebreus seguiram os passos dos babilônios. Lilith aparece em relatos da Torah assírio-babilônica e hebrai- ca, entre outros textos apócrifos. No âmbito da mitologia grega, Lilith é associada à deusa Hécate – analogamente, ―a mulher escarlate‖ do Apo- calipse –, uma deusa que guarda as portas do inferno montada em um enorme cão de três cabeças, o Cérbero. Hécate, assim como Lilith, repre- senta a vida noturna e a rebeldia da mulher sobre o homem, segundo a mitologia grega. É mais uma evidência da influência de uma cultura sobre a outra, gerando sincretismos. A figura de Lilith foi incorporada ao folclore hebraico provavelmente durante o cativeiro na Babilônia. Por exemplo, o Talmud evoca inequivocamente a mítica imagem da Lilith babilônica, des- crevendo-acom asas e cabelos longos: ―Lilith é uma demônia com apa- rência humana, exceto que ela possui asas‖ (b. Nidda 24b); ―Lilith desen- volveu longos cabelos‖ (b. Erubin 100b). É notória a influência da cultura suméria-acadiana sobre a hebraica, durante o período de servidão na Ba- bilônia. A cultura babilônica fundamentou-se na cultura suméria e acadia- na, e depois sofreu influência da cultura persa. Abraão era sumeriano de Ur e sincretizou a mitologia suméria ao monoteísmo de Melquisedeque. Durante o cativeiro da Babilônia, os hebreus tiveram um intenso contato com a cultura sumeriana e com o zoroastrismo persa, que faziam parte da cultura babilônica de então. Este fato influenciou a cultura hebraica a ponto de gerar um grande sincretismo entre o supracitado sincretismo feito por Abraão e as crenças babilônicas, que transitavam entre a herança politeís- ta mitológica suméria-acadiana e a influência do monoteísmo zoroástrico persa, que introduziu precipuamente o dualismo Deus e o Diabo na cultura hebraica, diga-se de passagem. O cativeiro da Babilônia ocorreu em um período de transição entre o politeísmo sumeriano e o monoteísmo zoroás- trico, vivido na Babilônia (época que proporcionou grandes impactos na cultura hebraica, e posteridade). Nesse período, constata-se a absorção e a metamorfose da babilônica entidade mítica Lilitu no igualmente mítico demônio hebreu Lilith, após ser a primeira esposa de Adão. A partir daí, desenvolveram-se as lendas vampíricas, onde Lilith tinha cem filhos por dia, súcubos, quando mulheres, e íncubos, quando homens, ou simples- - QUIMERA - 31 mente lilims. Segundo as lendas, tais seres nutrem-se da energia des- prendida no ato sexual e de sangue humano. Interferem nos sonhos hu- manos, causando as poluções noturnas. Reza a lenda que um homem possuído por um súcubo raramente sobrevive. Outras lendas dizem que Lilith também ataca com um aperto esmagador sobre o tórax, como vin- gança por ter sido obrigada a ficar por baixo de Adão e, segundo alguns relatos católicos medievais, ela podia decepar o pênis com sua vagina. Portanto, Lilith representa a liberdade sexual feminina através da castra- ção masculina. Gênesis, capítulo 3, versos 8 e 9: ―[8] E ouviram a voz do Se- nhor Deus, que passeava no jardim pela viração do dia; e esconderam-se Adão e sua mulher da presença do Senhor Deus, entre as árvores do jar- dim. [9] E chamou o Senhor Deus a Adão, e disse-lhe: Onde estás?‖. Comentário(s): O trecho acima é a narrativa bíblica que conta o que ocorreu após Adão e Eva terem comido o fruto proibido. A discre- pância, em Gn 3:8-9, salta aos olhos quando Deus pergunta a Adão onde ele está! Sendo Deus Onipresente e Onisciente, ou melhor, Todo- Poderoso, Ele não perguntaria a localização de qualquer criatura, pois Ele já saberia. Deus deveria estar a par de tudo, até do fruto que tinham inge- rido. Todavia, segundo a Bíblia, Deus não sabia onde Adão e Eva estavam dentro do jardim que Ele mesmo havia criado! Que Deus Todo-Poderoso é este? Como o Deus bíblico pode ser Onipresente e Onisciente desse jeito? O supracitado trecho diz que o casal ouviu a voz de Deus (em algumas traduções consta que ouviram os passos, ou seja, Deus andava como pessoa física), isto é, então Deus falava com alguém ou falava só. Se Deus falava com alguém, quem era essa pessoa ou ser? Ou seria ou- tro(s) deus(es) ou deusa(s) ou anjo(s)? Se Deus falava só, então Ele pen- sava alto, ou seja, conjecturava sobre algo, tal qual qualquer um de nós outros, meros mortais corpóreos, envoltos em dúvidas, sob o peso de nos- sas imperfeições. De qualquer forma, é demasiado estranho – para não dizer incompatível ou bizarro – um ser Todo-Poderoso, Criador de tudo e de todos, falar e passear no mundo físico assim como um ser humano de carne e ossos, e ainda não estar a par do que se passa em sua criação e nem saber onde se localizam suas próprias criaturas. Outro ponto conflitante é Deus ter plantado uma árvore com um fruto proibido no meio do jardim, que era um paraíso, que Ele mesmo fez para o casal primordial viver para sempre em eterna inocência e pure- za. Por que Deus faria isso? Queria testá-los? Mas por que testá-los, se Deus sabia o futuro? Ou Deus não conhecia o futuro? Não saberia Deus - QUIMERA - 32 que eles comeriam o fruto? O Diabo na forma de serpente, atentando Adão e Eva, é outro ponto discrepante e controverso, porquanto põe em xeque o poder ilimitado do Deus bíblico. Será que Deus e o Diabo tinham algum acordo? Será que o Diabo estava lá sob as ordens de Deus? Ou Deus era algum tipo de sádico? Estes questionamentos são pertinentes e todos deveriam fazê-los, para perceber influências de mitologias preceden- tes nas ditas sagradas escrituras. Gênesis, capítulo 6, versos de 1 a 7: ―[1] E aconteceu que, como os homens começaram a multiplicar-se sobre a face da terra, e lhes nasceram filhas, [2] Viram os filhos de Deus que as filhas dos homens eram formosas; e tomaram para si mulheres de todas as que escolheram. [3] Então disse o SENHOR: Não contenderá o meu Espírito para sempre com o homem; porque ele também é carne; porém os seus dias serão cento e vinte anos. [4] Havia naqueles dias gigantes na terra; e também depois, quando os filhos de Deus entraram às filhas dos homens e delas geraram filhos; estes eram os valentes que houve na antiguidade, os ho- mens de fama. [5] E viu o SENHOR que a maldade do homem se multipli- cara sobre a terra e que toda a imaginação dos pensamentos de seu cora- ção era só má continuamente. [6] Então arrependeu-se o SENHOR de haver feito o homem sobre a terra e pesou-lhe em seu coração. [7] E disse o SENHOR: Destruirei o homem que criei de sobre a face da terra, desde o homem até ao animal, até ao réptil, e até à ave dos céus; porque me arrependo de os haver feito‖. Comentário(s): Analisando, sem proselitismos, o trecho em questão, vê-se claramente que os filhos de Deus foram lascivos e, no en- tanto, Deus não os repreendeu e, pior, castigou o homem. Ainda neste trecho, Deus revelou-se totalmente humano ao se arrepender. Como pode Deus ser perfeito, onipotente, onipresente e onisciente e não ter previsto o que iria acontecer e nem conhecer a sua própria criação? Arrependimento não é inerente ao PAI. Na maioria dos casos, se arrepende quem cometeu erro. Porém, a perfeição não tem erros. O mais insignificante traço de erro descaracteriza a perfeição. Portanto, quem é perfeito jamais erra e, por conseguinte, nunca se arrepende, e, segundo o Velho Testamento, Deus sempre foi literalmente perfeito, sendo assim, não poderia se arrepender, mas se arrependeu. Então, esse Deus, retratado no Velho Testamento, não pode ser perfeito, como o próprio testamento afirma. Isto é uma con- tradição implícita. E tem mais: Depois de se arrepender, Deus desconta nas Suas criaturas, ceifando a vida de pessoas e animais. Deus agiu como um tirano, matando indiscriminadamente criaturas inocentes como crian- - QUIMERA - 33 ças a animais, que não tinham nada a ver com o que acontecera e muito menos com a Sua insatisfação. O Velho Testamento converte Deus em um monstro sanguinário que pune a todos, sem restrições, inocentes e culpa- dos, para aplacar seus instintos, sentimentos e caprichos mais mundanos. Trecho totalmente ilógico e fantasioso. Isto também contradiz o Deus amo- roso e justo retratado em outros trechos. A Bíblia possui muitos pontos assim. Coisas assim invalidam a Bíblia como a ―palavra de Deus‖. Pelo visto, atribuíram a Deus, dando-Lhe argumentos, pensamentos e senti- mentos, a causa de um cataclismo natural, que fora o Dilúvio, como puni- ção às transgressões humanas. Mitologia herdada da remota civilização suméria e serviu como mais uma forma de argumento que os antigos pa- triarcas hebreus utilizaram para insuflar o medo nas massas, para conse- guir obediência. Na verdade, a história bíblica do Dilúvio é baseada na epopeia de Gilgamesh(15). Os hebreus foram escravos na Babilôniae a referida epopeia fazia parte das tradições culturais babilônicas. Gênesis, capítulo 7, versos de 21 a 23: ―[21] E expirou toda a carne que se movia sobre a terra, tanto de ave como de gado e de feras, e de todo o réptil que se arrasta sobre a terra, e todo o homem. [22] Tudo o que tinha fôlego de espírito de vida em suas narinas, tudo o que havia em terra seca, morreu. [23] Assim foi destruído todo o ser vivente que havia sobre a face da terra, desde o homem até ao animal, até ao réptil, e até à ave dos céus; e foram extintos da terra; e ficou somente Noé, e os que com ele estavam na arca‖. Comentário(s): Este trecho afirma que todos os seres viventes pereceram no Dilúvio, exceto os que estavam na arca de Noé. Números, capítulo 13, verso 33: ―Também vimos ali gigantes, filhos de Enaque, descendentes dos gigantes; e éramos aos nossos olhos como gafanhotos, e assim também éramos aos seus olhos‖. Comentário(s): Este trecho narra o relatório feito pelos espiões de Moisés na ―terra prometida‖, Canaã. Segundo este trecho, eles viram gigantes. A história de Moisés ocorrera muito tempo depois do Dilúvio, depois da Terra ter sido renovada e repovoada, segundo o Velho Testa- mento. Segundo o livro de gênesis, existiam gigantes antes do Dilúvio, mas eles não foram escolhidos para sobreviverem na arca e Deus matou todos os seres viventes que existiam sobre a face da Terra. Porém, quem estava na arca escapou. Isto quer dizer que apenas os familiares de Noé e os animais da arca sobreviveram e repovoaram a Terra. Mas Noé não era gigante ou descendente de um, nem nenhum de seus familiares. A lógica - QUIMERA - 34 seria a não existência de gigantes após o Dilúvio, mas na época de Moisés existiam gigantes, segundo o livro de números. Isto é uma contradição. Na Bíblia, não existem referências mais detalhadas sobre Enaque, o pai dos gigantes. A Bíblia só diz que Enaque era filho de Arba, o fundador de Hebrom, e pai de Aimã, Sesai e Talmai (os gigantes). Sobre Arba, não mais do que isso. Para se obter mais informação a respeito de Enaque, faz-se necessário buscar em outras fontes. Enaque é um perso- nagem bíblico cujo nome significa ―pescoço comprido‖. É pai dos enaquins, descritos como os gigantes. Os enaquins/anaquins (ou enakins) eram po- derosos guerreiros da Antiguidade que habitavam as regiões montanhosas da Mesopotâmia(16). Eram gigantes descendentes dos nephilin. Nefilím, hebraico, significa ―aqueles que caíram do céu‖. Deriva da forma causativa do verbo na·fál ou nefal (fazer cair; cortar), conforme encontrado, por exemplo, na Bíblia em 2 Reis 3:19; 19:7. Traz uma ideia de dividido, falho, queda, perdido, mentiroso. Literalmente ―os que fazem os outros cair‖. No dicionário de Strong são chamados de ―tiranos‖. Em aramaico nephila de- signa a constelação de Orion, que entre os hebreus era o anjo Shemhazai (Semyaza, Samyaza, Semyaze). Os ―Filhos de Deus‖ eram ―anjos‖ caídos que se relacionaram com mulheres da Terra e tiveram filhos com elas. Os filhos dos ―Filhos de Deus‖ eram gigantes e foram chamados nefilins. A Bíblia afirma que os nefilins eram os valentes; homens de fama da Antigüi- dade; porém, homens perversos. Estes tiveram filhos gigantes, que foram os anaquins. Provavelmente, Enaque era um nefilin e o pai dele, Arba, talvez um ―Filho de Deus‖ (―anjo‖ caído) ou outro nefilin. O nome nefilin foi traduzido para o grego como grigori, vigilante (―aqueles que vigiam‖, ―aque- les que estão despertos‖, ―aqueles que nunca dormem‖), e para o latim como Gigantes. A Bíblia atual (tradução Almeida) utiliza apenas o termo gigante, como tradução do hebraico nefilím. Segundo a tradição judaico- cristã, os genitores dos nefilins teriam se desmaterializado, tornando-se novamente seres espirituais. São identificados ao longo da Bíblia por ―an- jos decaídos‖, ―espíritos impuros‖ ou ―demônios‖. Existem paralelos com outras culturas que evidenciam similaridades. Há claros indícios da in- fluência suméria também nesta passagem bíblica sobre os nefilins. Alguns estudiosos sustentam a teoria da associação dos anunnaki(17) a estes bíblicos nephilin, enquanto que outros, como Zecharia Sitchin, vão mais além, ligando-os a todos os mitos pagãos da Antigüidade. De acordo com Sitchin, os nefilim (gênesis 6, salmo 82) supostamente seriam os habitan- tes de Nibiru/Marduk(18), hipotético 9º(19) planeta do sistema solar. Os sumérios tinham grandes conhecimentos de astronomia para sua época. - QUIMERA - 35 Os teólogos e estudiosos da Bíblia até hoje divergem sobre a natureza dos nephilim e dos ―Filhos de Deus‖, mencionados em Gn 6. Há duas interpre- tações bastante difundidas: G. H. Pember argumenta em favor da teoria que diz que os ―Filhos de Deus‖ de Gn 6 são, na verdade, anjos que vie- ram à Terra para terem intercurso com mulheres, tiveram filhos, sendo por isso punidos e lançados no inferno, segundo a Segunda Epístola de Pedro 2:4 (é interessante notar que no original a palavra não é ―inferno‖, e sim ―tártaro‖ o que pode implicar um lugar diferente), e seus filhos se tornaram pessoas híbridas, metade humano, metade anjo. Essa teoria é defendida por muitos teólogos. Esteve em voga na Idade Média. É também o ponto de vista de Fílon de Alexandria e dos apócrifos de Enoque(20) e do Tes- tamento dos Doze Patriarcas(21). No entanto, esta teoria tem um ponto ilógico: Se tais anjos vieram à Terra para terem relacionamentos com mu- lheres, por que seriam punidos por isso? Este argumento debilita a teoria, deixando-a inconsistente. A outra teoria muito conhecida afirma que não eram anjos, mas sim descendentes de Sete(22), que ainda seguiam a Deus. As ―filhas dos homens‖ eram filhas de Caim, afastadas de Deus, e seus filhos foram heróis posteriormente, mas a Bíblia considera-os caídos, porque se afastaram de Deus. Argumenta-se que os anjos não podem procriar e que ―filhos de Deus‖ se referia aos seguidores de Deus. Essa teoria foi propagada por Agostinho, C. I. Scofield, Gordon Lindsay, entre outros, sendo a mais aceita. Há outras teorias mais estranhas como a de pano de fundo evolucionista que diz que os ―filhos de Deus‖ eram descen- dentes de Adão e as ―filhas dos homens‖ de uma raça inferior, como, por exemplo, a neandertal. Existem também hipóteses que afirmam que os ―filhos de Deus‖ poderiam ser extraterrestres e os nefilins seriam os híbri- dos, resultado do cruzamento genético. Muitas culturas contam histórias mitológicas sobre ―deuses‖ que desceram do céu (ou ascenderam) em suas carruagens de fogo, etc. Arqueólogos já encontraram desenhos e pinturas rupestres que datam da pré-história anterior à escrita e retratam imagens de seres e objetos que não eram nem um pouco comuns ao am- biente e conjuntura de então. Por exemplo: Imagens de seres humanoides com indumentária similar à de astronautas; a representação, em pedra, do deus maia Kukulcan é análoga a um homem pilotando algum tipo de veícu- lo similar a uma nave espacial; no deserto do Iraque foram encontradas baterias de argila com eletrodos, datadas em 2 mil e 500 anos antes de Cristo; em uma pirâmide funerária, havia um modelo de aeroplano perfei- tamente funcional; etc. - QUIMERA - 36 Os verdadeiros anjos são espíritos que atingiram um nível de contínua sintonia com o PAI Celestial, que possibilita a fusão total com Ele. Isto os torna um com o PAI e o Cosmo. Estes seres não vivem mais em corpos físicos, tais quais nós outros. Não têm as necessidades e sentimen- tos carnais inerentes a qualquer pessoa viva. Seria impossível, em suas formas naturais, sentirem atrações físicas, terem relações carnais e engra- vidarem mulheres. A não ser que se revestissem em corpos físicos quais os nossos, exatamente com a mesma fisiologia. Porém, estes espíritos, pelo próprio grau evolutivo atingido por eles, já passaram por experiências físicas pelas quais nos encontramos agora. Eles têm uma capacidade mui- to elevada de domínio sobre a carne. São detentores de elevado
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