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1. DEFINIR A CAQUEXIA E A SARCOPENIA. SARCOPENIA Sarcopenia é uma síndrome caracterizada por progressiva e generalizada perda de massa e função muscular com risco de eventos adversos como incapacidade física, perda da qualidade de vida e morte. O conceito atual define sarcopenia como não apenas o processo de perda de massa muscular relacionada com o envelhecimento, mas também inclui a perda da força e da função muscular. Na maioria dos casos é difícil identificar uma causa única como responsável pelo processo de sarcopenia. Contudo, classificá-la como primária ou secundária pode ser útil na prática clínica. A sarcopenia pode ser considerada primária quando não se encontra nenhuma causa identificável, além do próprio envelhecimento. É considerada secundária quando uma ou mais causas são evidentes. Em muitos idosos a causa é multifatorial, tornando muito difícil a classificação da sarcopenia em primária ou secundária. O estadiamento dessa enfermidade reflete a gravidade da condição. Essa informação pode ser útil na prática clínica, pois pode auxiliar na identificação precoce e no manejo preventivo e terapêutico da sarcopenia. O EWGSOP (European Working Group on Sarcopenia in Older People) sugere três estágios para essa condição: Pré-sarcopenia, Sarcopenia Sarcopenia grave. A pré-sarcopenia é caracterizada por diminuição da massa muscular, sem impacto na força muscular ou no desempenho físico. Esse estágio pode ser identificado somente por técnicas de medidas precisas da massa muscular em comparação a uma população padrão. O estágio de sarcopenia é caracterizado por diminuição da massa muscular além de diminuição na força muscular ou no desempenho físico. A sarcopenia grave é identificada quando os três critérios estão presentes. CAQUEXIA É uma condição clínica em que o idoso com doenças sistêmicas graves, como câncer, insuficiência cardíaca, doença pulmonar obstrutiva e doença renal em estágio terminal, apresenta intensa perda de peso. Tem sido definida como uma síndrome metabólica complexa associada a uma doença subjacente e caracterizada por perda muscular, com ou sem perda de gordura. A caquexia é frequentemente associada a inflamação, resistência à insulina, anorexia e quebra das proteínas musculares. Portanto, muitos indivíduos caquéticos são também sarcopênicos. Todavia, muitos indivíduos sarcopênicos não são considerados caquéticos. Dessa maneira, a sarcopenia é um dos elementos da definição proposta para a caquexia. A síndrome da caquexia em câncer pode ser dividida em três fases que se desenvolvem progressivamente: Pré-caquexia: é definida com base na presença de todos os seguintes critérios: doença crônica subjacente, como o câncer; perda de peso involuntária ≤ 5% do peso corporal durante os últimos seis meses; resposta inflamatória sistêmica crônica ou recorrente; anorexia ou sintomas relacionados com anorexia. Na pré- caquexia, o risco de progressão é variável e depende de fatores como, o tipo de câncer e de seu estágio, a presença de inflamação sistêmica, baixa ingestão alimentar e falta de resposta à terapia anticâncer. Caquexia: é considerada quando há perda de peso corporal ≥ 5%, ou de 2%, com índice de massa corporal (IMC) inferior a 20 kg/m2, ou sarcopenia acompanhada de perda de peso corporal equivalente ou superior a 2%. Além disso, apresentam redução frequente da ingestão alimentar e inflamação sistêmica. Caquexia refratária: ocorre como resultado de um câncer muito avançado (pré-terminal) ou a presença de câncer que progrediu rapidamente e que não responde a terapia anticâncer. Esta fase está associada com catabolismo ativo e presença de fatores que tornam difícil a manutenção do peso corporal. A caquexia refratária é caracterizada também pela expectativa de vida inferior a três meses. Nestes casos, as intervenções terapêuticas são focadas na atenuação das consequências e complicações da caquexia, por meio do aumento de estímulo do apetite, controle das náuseas e para amenizar os sofrimentos dos pacientes e familiares. DIFERENÇAS A caquexia é desencadeada por balanço energético negativo e metabolismo anormal; já a sarcopenia pode ocorrer com o avanço da idade, no entanto ambas têm um ponto de concordância. A perda de massa muscular está presente nestas duas condições. A maioria dos pacientes com caquexia apresenta sarcopenia, ao passo que a maioria dos pacientes sarcopênicos não tem caquexia. Na prática clínica, sarcopenia também pode preexistir à caquexia. A perda rápida e aguda do músculo esquelético é normalmente observada na presença de caquexia, enquanto a caquexia relacionada a sarcopenia está associada com uma perda gradual e progressiva de massa muscular. A sarcopenia pode não depender do estado de nutrição, mas de outros fatores, principalmente o envelhecimento. A perda também é progressiva e ocorre lentamente, mas é acompanhada de ganho (e não perda, como na desnutrição) de massa gorda. Na caquexia há perda de massa magra e gorda ao mesmo tempo, ambas de forma bastante rápida (meses). Finalmente, a caquexia, ao contrário da sarcopenia, está associada à presença de doenças que a induzem, como câncer, doença pulmonar obstrutiva crônica (DPOC), entre outras. 2. ELUCIDAR A SÍNDROME CONSUMPTIVA, ETIOLOGIA, EPIDEMIOLOGIA, FATORES DE RISCO, QUADRO CLÍNICO, DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO A Síndrome Consumptiva pode também ser encontrada como “emagrecimento involuntário” em diversas literaturas. Ambos podem ser definidos como o estado patológico resultante de absoluta ou relativa deficiência de proteína e energia Para definição da síndrome consumptiva, devemos ter em mente que tanto o grau de emagrecimento, bem como o tempo em que ele ocorreu, devem ser avaliados sempre de acordo com o seu peso basal anterior ao quadro de emagrecimento involuntário. Considera-se emagrecimento involuntário se houve perda de 2% do peso basal em 1 semana >5% em 1 mês >7,5% em 3 meses > 10% em 6 a 12 meses Algumas situações devem ser avaliadas de forma específicas, como em idosos, nos quais considera-se síndrome consumptiva em perdas maiores que 5% em 6 a 12 meses e em pacientes portadores de anorexia nervosa, nos quais considera-se emagrecimento involuntário em perdas maiores que 15% em 6 meses. Para não precisar gravar todos esses números, a definição mais utilizada de emagrecimento involuntário é a perda de >10% do peso basal em 6 a 12 meses. EPIDEMIOLOGIA A síndrome consumptiva possui incidência semelhante entre homens e mulheres. Seus principais fatores de risco são o tabagismo, a idade avançada e um autorrelato de “mal estado de saúde”, ou seja, uma saúde prejudicada basalmente. Esses fatores supracitados também são associados a um pior prognóstico no emagrecimento, assim como o fator idade (pacientes idosos), deficientes físicos e pacientes com doença sistêmica crônica. Se estima que 15 a 20% de todos adultos com mais de 65 anos terão emagrecimento involuntário se acompanhados e observados por um período de 5 a 10 anos. No tocante à epidemiologia devemos nos atentar para as neoplasias malignas, a causa mais comum entre elas, ocorrendo em cerca de 15 a 37% dos pacientes com emagrecimento involuntário. Em seguida, existem as causas gastrointestinais não malignas e as causas psiquiátricas, ambas representando cerca de 10 a 20% do total. Mais de 25% dos casos de emagrecimento involuntário não apresentam uma causa definida. FISIOPATOLOGIA E CLASSIFICAÇÃO DA PERDA DE PESO Divide-se a base fisiopatológica da perda de peso em três categorias: Diminuição da ingestão de alimentos; Metabolismo acelerado; ou Aumento da perda de energia; A perda de peso pode ser traduzida como um sintoma de desordemmultifatorial que inclui alteração da ingesta calórica, da absorção intestinal, da motilidade intestinal, do uso de medicamentos e abuso de drogas ou da produção aumentada de substâncias endógenas como fator de necrose tumoral, a interleucina 6, substâncias bombesina-like e fatores liberadores de corticotropina. Outros fatores como náusea e vômito causados pela quimioterapia também são importantes processos associados à perda de peso, bem como dor oncológica e compressões tumorais do trato gastrintestinal, quando provocam disfagia e distensão abdominal. A regulação do apetite sofre alterações com o envelhecimento (“anorexia fisiológica da idade”), há aumento da circulação de colecistocinina, por exemplo, que associada à diminuição do metabolismo basal pode levar à perda de peso importante. A maioria dos homens atinge o máximo de peso corporal ao redor dos 40 anos e as mulheres aos 50 anos. Logo após, ocorre progressiva perda de massa magra corporal, principalmente nas extremidades e estoque de gordura central. Atrofia gordurosa também pode ocorrer gerando aparência caquética. Alguns estudos mostram que há declínio natural da sensibilidade ao paladar e olfato com o aumento da idade, o que pode contribuir para a diminuição de peso. Distúrbios de visão e cognição no idoso também podem contribuir para a diminuição de ingesta calórica. Classifica-se perda de peso em dois grandes grupos: 1) Perda de peso involuntária com aumento ou diminuição do apetite 2) Perda de peso voluntária PERDA DE PESO INVOLUNTÁRIA COM AUMENTO DO APETITE: Esta condição está associada com aumento do gasto energético ou perda de calorias pelas fezes ou urina. Neste caso, a quantidade de calorias ingeridas é insuficiente para suprir o déficit energético. São causas deste tipo de condição: hipertireoidismo, diabetes mellitus (DM) descompensado, síndrome de má absorção, feocromocitoma, aumento importante de atividade física. No hipertireoidismo, a perda de peso está associada com aumento do gasto energético basal e com o déficit na absorção intestinal devido ao aumento da motilidade gastrointestinal. Em idosos com hipertireoidismo, também pode ocorrer a associação desta doença com anorexia. No diabetes mellitus descompensado, principalmente no DM tipo 1, a causa da perda de peso está associada à deficiência de insulina (hormônio anabólico) e à hiperglicemia com glicosúria (diurese osmótica), causando depleção de líquido extra e intracelular (desidratação). No feocromocitoma a atividade adrenérgica exacerbada aumenta a taxa de metabolismo basal. Outra causa não orgânica deste tipo de perda de peso é a baixa condição econômica, que pode resultar em dificuldades para comprar alimentos adequados para a manutenção do equilíbrio calórico. PERDA DE PESO INVOLUNTÁRIA COM DIMINUIÇÃO DO APETITE: Neste grupo de doenças incluíam-se as doenças psiquiátricas como depressão, fase maníaca do distúrbio bipolar, distúrbio de personalidade e paranoia, uso crônico de drogas, doenças como câncer, endocrinopatias, doenças crônicas, doença pulmonar obstrutiva crônica e doenças gastrointestinais. A perda de peso devido ao câncer (síndrome anorexia- caquexia) é comum e ocasionalmente pode ser a única manifestação de tumores ocultos. Qualquer câncer pode evoluir com perda de peso, tanto como primeira manifestação ou manifestação tardia do tumor As malignidades acometem aproximadamente um terço dos pacientes que apresentam síndrome consumptiva. Afecções gastrointestinais benignas, tais como úlcera e colecistite, também têm sido causas de perda de peso em 11,0 a 17,0% dos pacientes investigados. Nos pacientes com vírus da imunodeficiência humana (HIV) positivos ou soro-reagentes a perda de peso é sintoma relativamente comum, mas ao contrário dos cânceres, esta redução de peso está associada primariamente à diminuição da ingestão calórica, já que o gasto energético é igual ao paciente sem a doença. Perda de peso súbita no paciente com HIV geralmente está relacionada à infecção secundária, enquanto que perda gradual geralmente está relacionada à redução de ingesta calórica. Dentre as endocrinopatias, a insuficiência adrenal pode cursar com anorexia, náusea e perda de peso, assim como a hipercalcemia e alguns pacientes com hipertireoidismo, geralmente idoso. Nos pacientes com diabetes mellitus, pode ocorrer a perda de apetite como sintoma da gastroparesia, má absorção intestinal por neuropatia intestinal e insuficiência renal. Diabético tipo um pode também apresentar doença de Addison associada. Pacientes com doenças psiquiátricas frequentemente apresentam perda de peso como critério de diagnóstico, como por exemplo, na depressão maior (perda de mais de 5,0% em um mês). A caquexia pode ser induzida por uso crônico de neuroléptico e deve ser descontinuada neste caso. O uso crônico do álcool, nicotina, opiáceos e estimulantes do sistema nervoso central diminuem o apetite e causam perda de peso. Outro distúrbio psiquiátrico, a anorexia nervosa é classificada como perda de peso voluntária. Nas doenças cardiopulmonares, a perda de peso relaciona-se à insuficiência cardíaca (caquexia cardíaca) ou à doença pulmonar obstrutiva crônica. No entanto, esta perda de peso pode ser ocultada pelo edema concomitante. Doenças neurológicas como o acidente vascular cerebral, demências, esclerose múltipla, Parkinson, podem estar associadas com alteração de motilidade gastrintestinal bem como disfagia, alteração do olfato, paladar (disgeusia), constipação, disfunção esfincteriana e falta de apetite. A doença de Parkinson relaciona-se com anorexia e aumento do gasto energético. Uremia induz anorexia, náusea e vômito, assim como perda de proteína pela urina, por exemplo, na síndrome nefrótica, contribuindo para o balanço negativo calórico. Pacientes em situações de isolamento social tendem a apresentar diminuição do apetite. Nos idosos, o isolamento se refere não apenas ao ato de comer, mas também à dificuldade em comprar e preparar os alimentos. A tabela 2 resume as principais causas de perda de peso involuntária DIAGNÓSTICO CLÍNICO E DIFERENCIAL Anamnese: Durante investigação etiológica de síndrome consumptiva, é necessário perguntar ao paciente sobre seu apetite, atividade física, como é o padrão da perda de peso (flutuante ou estável), por quanto tempo vem perdendo peso e se a perda é voluntária ou involuntária. Outra regra mneumônica para lembrar-se dos diagnósticos diferenciais para perda de peso é MEALS ON WHEELS: Medication: medicamentos Emotional problems: problemas emocionais, principalmente depressão Anorexia nervosa, alcoolismo Late Life paranóia Swallowing: deglutição Oral factors: fatores orais No Money: problemas financeiros Wandering ou comportamentos alterados H: hiper/hipotireoidismo, hiperparatireoidismo, hipoadrenalismo Enteric problems: problemas entéricos Eating: problemas para se alimentar sozinho Low salt, low cholesterol: dieta sem gordura e sal Stones, social problems: problemas sociais Ainda como roteiro da anamnese, deve-se quantificar a Medida de Independência Funcional (MIF) dos pacientes no intuito de avaliar o grau de dependência nas atividades de vida diária. O instrumento avalia 18 categorias pontuadas de um a sete e classificadas quanto ao grau de dependência para a realização da tarefa. As categorias são agrupadas em seis dimensões: autocuidados, controle de esfíncteres, transferências, locomoção, comunicação e cognição social. Cada dimensão é analisada pela soma de suas categorias referentes; quanto menor a pontuação, maior é o grau de dependência. Somando-se os pontos das dimensões da MIF obtém- se escore total mínimo de 18 e máximo de 126 pontos. Existem diversos instrumentosvalidados que poderão auxiliar na avaliação da perda de peso do paciente, tal como Mini Nutritional Assessment (MNA), que avalia o risco de desnutrição em idosos, e inclui a medida de circunferência do braço (valores menores que 22 cm para mulher e 23 cm para homens são sugestivos de deficiência crônica de energia). Os pacientes frequentemente têm aspecto emagrecido, com perda de tecido gorduroso. Podem queixar-se de dispneia, cansaço e falta de disposição. Na maioria das vezes, a grande preocupação de médicos e pacientes é a presença de uma neoplasia como causa desta síndrome. Embora esta seja uma possibilidade real, há outras causas que podem levar a esta condição e que devem ser investigadas Apesar da grande preocupação com a presença de uma neoplasia, é importante que o médico procure retirar o máximo de informações do paciente de modo a dirigir sua investigação diagnóstica. A presença de outros sinais e sintomas é fundamental. Sintomas dispépticos, queixas de dor abdominal, diarreia, obstipação, febre, sintomas pulmonares podem sugerir ao médico o caminho investigativo mais adequado. Pode-se observar que algumas das doenças listadas fazem parte de outras síndromes (inclusive acima descritas). Assim, a presença de outras síndromes pode facilitar a identificação do diagnóstico etiológico. O médico deve procurar as causas não neoplásicas de síndrome consumptiva. Às vezes, a causa não neoplásica é mais grave e pode imprimir maior risco que uma neoplasia, como é o caso de diabetes mellitus (DM). A história de exposição a riscos e uma avaliação do estado emocional do paciente são muito importantes. Embora os quadros psiquiátricos associados à síndrome consumptiva sejam considerados de exclusão, eles são muito prevalentes. Não se espera a exclusão de todas as possíveis doenças associadas à perda de peso para se iniciar o tratamento de um quadro depressivo. Deve-se, no entanto, procurar as causas que são mais compatíveis com o quadro clínico e com a epidemiologia local. Exame físico: O exame físico do paciente com perda de peso deve ser detalhado e incluir exame da pele (observar sinais de desnutrição, deficiência vitamina e oligo-elementos), cavidade oral, avaliação da tireoide, propedêutica cardiovascular, pulmonar e abdominal, toque retal, palpação de linfonodos, exame neurológico, incluindo o Mini Exame do Estado Mental, medidas antropométricas para cálculo do IMC (kg/m2), além dos sinais vitais. Pode-se definir esta síndrome com a perda de mais de 10% do peso em 6 meses sem que se tenha tentado fazê-lo. Alguns autores, no entanto, definem esta condição com perda acima de 5% do peso em 6 meses. Exames Complementares Iniciais: Para uma avaliação inicial da etiologia em casos em que a história e o exame físico não forem indicativos da causa, os seguintes exames complementares são sugeridos: Hemograma Eletrólitos Glicemia Função renal e hepática TSH Sorologia para HIV Proteína C reativa Parasitológico de fezes Raio X de tórax Urina 1 PPD Embora concentrações de albumina sérica, pré albumina, transferrina, colesterol e contagem de leucócitos possam ajudar a estabelecer o diagnóstico de desnutrição, suas determinações não contribuem para determinar a causa do problema. Na ausência de alteração no exame físico e nos exames iniciais complementares, deve-se seguir a investigação com exames de rastreamento para câncer, conforme sexo e idade. Se houver alguma outra suspeita a partir da história, como uma queixa dispéptica, solicita-se também endoscopia digestiva alta (EDA), sempre dirigindo-se pela queixa. Seguindo esta lógica, outras queixas devem estimular a realização de outros exames laboratoriais. TRATAMENTO O tratamento da síndrome consumptiva é sempre multidisciplinar! O primeiro passo é tratar a causa base, sendo a etapa mais importante do tratamento, porque é o que garante ao paciente o retorno do ganho de peso. Entretanto, deve-se também realizar uma avaliação psicossocioeconômica, em busca de patologias psiquiátrica e causas de cunho psicossociais para o emagrecimento, que possam ser trabalhadas pela Psicologia, bem como pela Assistência Social. O restante do tratamento envolve a avaliação bucal e da deglutição, que engloba tanto a Odontologia como a Fonoaudiologia e Fisioterapia. Uma avaliação física e nutricional elaborada é demandada, para que haja um apoio pelo Nutricionista no processo de reganho do peso. A intervenção medicamentosa, por fim, se faz necessária em alguns casos. A síndrome consumptiva é um quadro que gera muita ansiedade nos médicos e pacientes. Os indivíduos com esta condição apresentam perda de peso não intencional e, da mesma maneira que para os quadros anteriores, podem referir uma série de sintomas adicionais. Uma vez realizada a investigação inicial e excluídas etiologias não neoplásicas pertinentes para o quadro clínico, procura-se os tumores que são prevalentes para aquela faixa etária e sexo. Assim, deve-se considerar avaliar mama, próstata, pulmão e trato digestivo, muitas vezes mesmo na ausência de sintomas compatíveis. No entanto, se após uma boa avaliação clínica, acompanhada de uma análise laboratorial adequada, não se encontrar a causa da síndrome consumptiva, pode ser mais razoável acompanhar o paciente. Mesmo que o diagnóstico seja um tumor ainda não manifesto, detectá-lo nesta fase pode ser muito dispendioso e invasivo e provavelmente trará mais malefícios ao doente do que benefícios. Esta decisão é sem dúvida difícil, mas pode ser tão ou mais importante para o paciente do que outras decisões investigatórias ou terapêuticas. 3. CARACTERIZAR O PROTOCOLO DOS NOVE D'S. Segundo Robbins, podem-se resumir as causas de perda de peso em idosos com o mnemônico dos nove "Ds": Dentição: próteses dentárias mal-adaptadas, dor ao mastigar, diminuição do paladar, lesões gengivais, perda parcial ou total dos dentes. Disgeusia (alteração no paladar): Inibidores de ECA, deficiência de zinco, tabagismo, edentulismo, uso de fluorquinolonas, levodopa; diabetes descompensada; dor ao mastigar; lesões gengivais. Disfagia; Diarreia; laxativos, doença celíaca, pancreatite crônica. Doença: Diabetes, câncer, hipertireoidismo, insuficiência adrenal, insuficiência cardíaca, doença renal, DPOC, tuberculose, Aids. Depressão; Demência (perda progressiva dos instintos de sede e fome); Disfunção (incapacidade funcional): perda de ente querido, condições socioeconômicas precárias, dependência (maus-tratos, isolamento social, dificuldade de levar o alimento à boca). Drogas. Estão envolvidos, muitas vezes, um ou mais fatores: álcool, ISRSS, Topiramato, anti- inflamatório. O déficit cognitivo característico das síndromes demenciais e de outras condições neuropsiquiátricas tendem a levar ao esquecimento da necessidade de realizar as refeições, o que explica a redução na ingesta alimentar e consequente perda ponderal. Em outros casos de déficit cognitivo, pode-se ter um quadro de paranoia ou desconfiança em relação aos alimentos ofertados com resistência à ingesta. Ainda há pacientes que podem apresentar agitação e perambulação mais intensa, que leva ao gasto energético aumentado e redução do peso corporal. No que se refere à depressão, sua influência sobre a mudança do peso corporal reside na associação com inapetência e desmotivação para aquisição de alimentos e preparo das refeições. Muitos estudos apontam o risco do aumento de mortalidade entre os idosos portadores de depressão. As doenças do trato gastrintestinal representam a causa de 1/3 dos casos de perda de peso inexplicada em adultos de todas as idades, incluindo idosos. 4. DEFINIR A SÍNDROME DE FRAGILIDADE DO IDOSOA maior parte das definições de fragilidade enfatiza a vulnerabilidade do indivíduo ao declínio e aos eventos adversos. Fazem parte desse tipo de definição: a redução de reservas fisiológicas e de margens de segurança; a vulnerabilidade a desafios ambientais; os indivíduos muito idosos com redução importante de força e grande suscetibilidade a doenças; o acúmulo de perdas nos sistemas fisiológicos, resultando em função reduzida e intolerância a mudanças; as deficiências simultâneas nos domínios físico, nutricional, cognitivo e sensorial; o comprometimento da capacidade de compensação de distúrbios em múltiplos domínios; a incapacidade de recuperação da funcionalidade após doenças agudas; as combinações de deficiências e condições que aparecem com o envelhecimento e contribuem para fazer do idoso um indivíduo vulnerável; o entendimento de que se trata de uma síndrome biológica de reserva funcional reduzida e diminuição de resistência aos estressores, resultante de um declínio cumulativo de múltiplos sistemas fisiológicos e causando vulnerabilidade a desfechos adversos. Embora pensado dentro da lógica do declínio cumulativo de múltiplos sistemas fisiológicos, o modelo proposto por Fried supõe 3 outras hipóteses: a primeira, que tal declínio acontece com velocidades distintas entre diferentes indivíduos; a segunda, que, em um mesmo indivíduo, diferentes sistemas perdem função com velocidades distintas; por último, a fragilidade aparece de maneira acelerada naqueles indivíduos com declínio, principalmente, nos sistemas musculoesquelético, imunitário e neurohumoral. FISIOPATOLOGIA E FATORES PREDISPONENTES O estudo da fisiopatologia da fragilidade é dificultado pela complexidade dos sistemas envolvidos e pela coexistência frequente de doenças agudas, crônicas e incapacidades. Segundo a teoria proposta por Fried, a síndrome seria embasada na redução da atividade de eixos hormonais anabólicos, na instalação da sarcopenia e na presença de um estado inflamatório crônico subliminar (Figura 90.1). Estas três alterações, quando intensas o suficiente, interagiriam de maneira deletéria (p. ex., a inflamação e as alterações hormonais induzindo a sarcopenia; esta, por sua vez, diminuindo a atividade física e promovendo mais inflamação e alterações hormonais), precipitando a ocorrência de um ciclo autossustentado de redução de energia, perda de peso, inatividade, baixa ingestão alimentar e sarcopenia. Diversos fatores, como doenças agudas e crônicas, alterações próprias do envelhecimento, efeito de medicamentos, quedas e outras condições mórbidas, contribuiriam para que uma pessoa idosa entrasse no ciclo de fragilidade (Figura 90.2). Diversos autores têm proposto o envolvimento de outros fatores na gênese da fragilidade. Como exemplos: Bortz propôs a importância de carga genética, estilo de vida e doenças ou lesões; Morley propôs como fatores etiológicos da síndrome idade, genética e nível educacional prévio, além de prejuízo cognitivo São ainda citados como envolvidos na patogênese da fragilidade carga alostática ao longo da vida, acúmulo de lesões oxidativas do DNA, declínio na capacidade de reparo, anormalidades na transcrição, deleções e mutações no DNA mitocondrial, encurtamento telomérico e alterações proteicas como glicação e oxidação A sarcopenia impacta profundamente as habilidades funcionais dos indivíduos mais idosos, resultando em decréscimo de força muscular e na tolerância ao exercício, além de fraqueza, fadiga e diminuição da habilidade de realizar atividades do dia a dia. A musculatura esquelética é o principal componente do gasto energético, e essa perda resulta também em uma taxa metabólica diminuída, alterando a termorregulação, o eixo da insulina e a regulação de hormônios anabólicos. No sistema imune, observa-se um comprometimento das imunidades celular e humoral, aumentando a vulnerabilidade a infecções e alterando a capacidade do organismo em responder às demandas infecciosas. Um mecanismo de inflamação generalizada é observado no organismo do idoso frágil, denotado principalmente pela elevação de citocinas inflamatórias, como a interleucinas-6 (IL6), a interleucinas-1B (IL1B) e o fator de necrose tumoral alfa (TNFa) O equilíbrio neuroendócrino é fundamental para se manter a homeostasia basal do organismo. O sistema simpático, com a liberação de epinefrina e da norepinefrina, promove uma ação imediata: taquicardia, broncodilatação, estado de alerta e aumento transitório da força muscular (estímulos beta- adrenérgicos). Em curtos intervalos de tempo, esses mecanismos são fundamentais para a homeostase ideal; no entanto, por longo prazo, ou por intermédio de vários e contínuos estímulos, levam a uma superprodução de cortisol, com consequente alteração da função imune, aumento da resistência à insulina e perda de massa óssea. A alteração da produção de alguns hormônios – hormônio do crescimento (GH), estrógeno e progesterona, além dos níveis diminuídos de desidroepiandrosterona (DHEA) – está presente nesses indivíduos 5. DISCUTIR A IMPORTÂNCIA DA EQUIPE MULTIDISCIPLINAR NA APS E COM A FAMÍLIA NO CUIDADO DO PACIENTE COM SÍNDROME CONSUMPTIVA. A abordagem multiprofissional deve ser reforçada nos períodos interconsultas com o médico para fortalecer adesão e avaliar potenciais eventos adversos ou situações clínicas que sugiram retorno em consulta médica antes do período combinado Com o gradativo aumento da população idosa brasileira, torna-se urgente a capacitação dos profissionais da saúde para uma adequada abordagem desse grupo etário na Atenção Básica. Acerca disso, o médico deve buscar a redução da morbimortalidade, a manutenção da independência funcional do idoso e a garantia da qualidade de vida. Nesse contexto, é essencial entender a complexidade do processo de adoecimento dos idosos, que dificilmente apresentam apenas uma condição clínica isolada, e a diferença entre mudanças fisiológicas decorrentes do processo de envelhecimento e alterações patológicas. Diante disso, percebeu-se a necessidade de desenvolver uma ferramenta capaz de direcionar a conduta do profissional da saúde na Atenção Primária durante a abordagem de um paciente idoso, o chamado instrumento de avaliação multidimensional do idoso. Tal ferramenta pode ser utilizada de forma complementar durante a consulta médica e avalia, de modo bastante simples, fatores que estão relacionados a agravos frequentes e incapacitantes, de grande repercussão funcional. Os componentes avaliados são visão, audição, função dos membros superiores e inferiores, estado mental, risco de queda, avaliação funcional, presença de incontinência urinária, estado nutricional e suporte social.
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