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v . 4 - a g o . 2 0 1 5 ISSN 2316-9664 Sumário Um estudo sobre espaços vetoriais simpléticos Fabiano Borges da Silva, Lívia T. Minami Borges 2 Uma curiosa propriedade com inteiros positivos Fernando Neres de Oliveira 10 Um novo sistema de axiomas para a lógica paraconsistente J3 Hércules de Araujo Feitosa, Gabriel Alexandre da Cruz, Ana Cláudia de Jesus Golzio 16 Parábolas e hipérboles envolventes Calixto Garcia 30 Transformação da equação de Euler em uma equação diferencial com coeficientes constantes Gustavo Jorge Pereira, Lívia Teresa Minami Borges 43 O problema da pirâmide de base quadrada Jaime E. A. Rodriguez, Felipe D. C. Fidalgo 47 Um Estudo Sobre Espaços Vetoriais Simpléticos Fabiano Borges da Silva ∗ Ĺıvia T. Minami Borges † Resumo O presente artigo estuda de maneira detalhada espaços vetoriais que possuem uma estrutura especial dada por uma forma bilinear simplética. A principal fi- nalidade é descrever em detalhes a relação que existe entre as formas bilinea- res simpléticas e as matrizes anti-simétricas invert́ıveis, fornecendo um material acesśıvel para estudantes de graduação. Palavras Chave: formas bilineares, espaços vetoriais simpléticos, matrizes anti- simétricas. Introdução O objetivo deste artigo é divulgar espaços vetoriais simpléticos aos estudantes de Álgebra Linear, afim de despertar o interesse pela área e propiciar um material que poderá ser usado de apoio em estudos avançados de Geometria Simplética. Espaços vetoriais simpléticos fazem parte de um contexto introdutório no estudo da geometria das variedades simpléticas, as quais são caracterizadas pela existência de uma 2-forma fechada e não-degenerada definida no espaço vetorial tangente da variedade. Inicialmente, esta geometria era apenas uma ferramenta de suporte para estudos de campos hamiltonianos em variedades. Porém, atualmente, é uma área de pesquisa com diversas aplicações, como pode ser visto em [1] e [4]. Neste trabalho, procuramos demonstrar em detalhes os teoremas 2 ,8 e 9, que são afirmações encontradas nos caṕıtulos iniciais de [1] e [4]. Quanto ao Teorema 2, encontramos, em [2], apenas uma versão para matrizes simétricas e, por este motivo, fizemos sua demonstração. 1 Formas bilineares e matrizes Nesta seção, veremos que cada forma bilinear está associada a uma matriz e, em particular, cada bilinear anti-simétrica está associada a uma matriz anti-simétrica. Esta relação será importante para compreender a relação entre formas simpléticas e matrizes anti-simétricas invert́ıveis. Definição 1 Seja V um espaço vetorial real. Uma forma bilinear sobre V é uma função f : V × V → R que satisfaz: ∗Email: fabiano@fc.unesp.br, Departamento de Matemática-UNESP-Bauru/SP †Email: liviaminami@ifsp.edu.br, Departamento de Matemática-IFSP-Birigui/SP SILVA, F. B.; BORGES, L. T. M. Um estudo sobre espaços vetoriais simpléticos. DOI: 10.21167/cqdvol4201523169664fbsltmb0209 - Disponível em: http://www2.fc.unesp.br/revistacqd/index.jsp ________________________________________________________________________ 2 C.Q.D. - Revista Eletrônica Paulista de Matemática, Bauru, v. 4, p. 2-9, ago. 2015. 1. f(λu1 + u2, v) = λf(u1, v) + f(u2, v), ∀λ ∈ R, ∀u1, u2, v ∈ V ; 2. f(u, λv1 + v2) = λf(u, v1) + f(u, v2), ∀λ ∈ R, ∀u, v1, v2 ∈ V. Ou seja, ela deve ser linear em cada uma das variáveis, quando a outra é deixada fixa. A matriz associada a uma forma bilinear f, com relação à base β = {v1, ..., vn} de V , é a matriz [f ]β = [aij ], onde aij = f(vi, vj). Para u, v ∈ V temos que u = a1v1 + · · · + anvn e v = b1v1 + · · · + bnvn, com ai, bj ∈ R. E assim, pela bilinearidade da f , temos que f(u, v) = n∑ i=1 n∑ j=1 aibjf(vi, vj) = n∑ i=1 n∑ j=1 aif(vi, vj)bj . Logo podemos escrever f(u, v) = [u]tβ[f ]β[v]β, onde [v]β denota a matriz coluna formada pelas coordenadas do vetor v com relação à base β e [u]tβ denota a transposta da matriz coluna [u]β. Se dim V = n, o conjunto B(V,R) das formas bilineares sobre V formam um espaço vetorial de dimensão n2, o qual é isomorfo ao espaço vetorial das matrizes n× n com entradas reais. De fato, se considerarmos a transformação linear T : B(V,R) −→ Mn(R) f 7−→ [f ]β temos que: (i) T é injetora. De fato, se [f ]β = [g]β para f, g ∈ B(V,R), nos vetores da base β, temos que f(vi, vj) = g(vi, vj) e, para (u, v) ∈ V × V , segue que f(u, v) = n∑ i=1 n∑ j=1 aibjf(vi, vj) = n∑ i=1 n∑ j=1 aibjg(vi, vj) = g(u, v). (ii) T é sobrejetora. De fato, qualquer que seja A ∈ Mn(R), podemos definir fA(u, v) = [u] t βA[v]β e, desta maneira, temos que fA é bilinear e T (fA) = [fA]β = A. Uma forma bilinear f , tal que f(u, v) = −f(v, u), ∀ u, v ∈ V , é chamada de anti- simétrica. Uma matriz A é anti-simétrica se At = −A. O próximo resultado mostra que a bijeção mencionada acima associa formas bilineares anti-simétricas às matrizes anti-simétricas. Mais precisamente, que o subespaço vetorial das formas bineares anti-simétricas é isomorfo ao subespaço vetorial das matrizes anti-simétricas. Teorema 2 Seja V um espaço vetorial real de dimensão finita e f : V × V → R uma forma bilinear. As seguintes afirmações são equivalentes: (a) f é anti-simétrica; (b) [f ]β é uma matriz anti-simétrica para alguma base ordenada β de V ; (c) [f ]γ é uma matriz anti-simétrica para toda base ordenada γ de V . SILVA, F. B.; BORGES, L. T. M. Um estudo sobre espaços vetoriais simpléticos. DOI: 10.21167/cqdvol4201523169664fbsltmb0209 - Disponível em: http://www2.fc.unesp.br/revistacqd/index.jsp ________________________________________________________________________ 3 C.Q.D. - Revista Eletrônica Paulista de Matemática, Bauru, v. 4, p. 2-9, ago. 2015. Demonstração. (a)⇒ (b) Seja β uma base de V . Então, para todo u, v ∈ V , temos [u]tβ[f ]β[v]β = f(u, v) = −f(v, u) = −[v]tβ[f ]β[u]β = −([v]tβ[f ]β[u]β)t = [u]tβ(−[f ]tβ)[v]β. Portanto, [f ]tβ = −[f ]β. (b)⇒ (c) Seja β uma base de V , tal que [f ]β é anti-simétrica. Para cada base γ de V , existe uma matriz M invert́ıvel tal que [f ]β = M t[f ]γM. E assim, ([f ]β) t = (M t[f ]γM) t = M t[f ]tγM. Como [f ]tβ = −[f ]β, segue que −[f ]β = M t[f ]tγM. Portanto, −M t[f ]γM = M t[f ]tγM. Logo, −[f ]γ = ([f ]γ)t. (c) ⇒ (a) Seja β uma base de V . Então, para cada u, v ∈ V , temos que f(u, v) = [u]tβ[f ]β[v]β. Como [u] t β[f ]β[v]β é uma matriz 1× 1, segue que f(u, v) = ([u]tβ[f ]β[v]β) t = [v]tβ([f ]β) t[u]β = −[v]tβ[f ]β[u]β = −f(v, u). 2 Em [2, p.227], existe uma versão análoga à proposição acima para formas biline- ares simétricas (f(u, v) = f(v, u) ∀u, v ∈ V ) e matrizes simétricas (At = A). Além disso, como toda matriz A pode ser escrita como A = 1 2 (A+At) + 1 2 (A−At), temos que os subespaços das matrizes podem ser decompostos em soma direta entre os subespaços das matrizes simétricas e anti-simétricas. A mesma decomposição ocorre com os subespaços vetoriais das fomas bilineares, com relação às formas simétricas e anti-simétricas. SILVA, F. B.; BORGES, L. T. M. Um estudo sobre espaços vetoriais simpléticos. DOI: 10.21167/cqdvol4201523169664fbsltmb0209 - Disponível em: http://www2.fc.unesp.br/revistacqd/index.jsp ________________________________________________________________________ 4 C.Q.D. - Revista Eletrônica Paulista de Matemática, Bauru, v. 4, p. 2-9, ago. 2015. 2 Espaços vetoriais simpléticos Nesta seção, daremos uma breve introdução aos espaços vetoriais simpléticos. Definição 3 Sejam V um espaço vetorial real e Ω : V ×V → R uma forma bilinear anti-simétrica. Dizemos que Ω é não-degenerada ou simplética se: Ω(u, v) = 0, ∀v ∈ V ⇒ u = 0. Um espaço vetorial simplético (V,Ω) é um espaço vetorial V , com uma forma (ou estrutura) simplética Ω. Para ilustrar a definição acima, daremos agora um exemplo de espaço vetorial simplético com uma forma bilinear definida em R2 × R2. Exemplo 1 Seja V = R2e considere a forma bilinear dada por Ω0((u1, u2), (v1, v2)) = u1v2 − u2v1. Mostraremos primeiramente que Ω0 é bilinear. (i) Ω0(λ(u1, u2) + (w1, w2), (v1, v2)) = Ω0((λu1 + w1, λu2 + w2), (v1, v2)) = (λu1 + w1)v2 − (λu2 + w2)v1 = λ(u1v2 − u2v1) + (w1v2 − w2v1) = λΩ0((u1, u2), (v1, v2)) + Ω0((w1, w2), (v1, v2)). (ii) Ω0((u1, u2), λ(v1, v2) + (w1, w2)) = Ω0((u1, u2), (λv1 + w1, λv2 + w2)) = u1(λv2 + w2)− u2(λv1 + w1) = λ(u1v2 − u2v1) + (u1w2 − u2w1) = λΩ0((u1, u2), (v1, v2)) + Ω0((u1, u2), (w1, w2)). Agora, vamos verificar que Ω0 é anti-simétrica. Ω0((u1, u2), (v1, v2)) = u1v2 − u2v1 = −(v1u2 − v2u1) = −Ω0((v1, v2), (u1, u2)). Por fim, Ω0 é simplética pois, se Ω0((u1, u2), (v1, v2)) = 0, ∀(v1, v2) ∈ R2, então u1v2 − u2v1 = 0, para todo v1, v2 ∈ R e, portanto, u1 = u2 = 0. De forma geral, podemos estender este exemplo tomando V = R2n e Ω0(u, v) = [u] t α · J0 · [v]α, onde J0 = ( 0 I −I 0 ) e I é a matriz identidade n× n. O espaço vetorial R2n, com a estrutura dada pela forma bilinear Ω0 é chamado de espaço vetorial simplético canônico. O conceito de isomorfismo para espaços vetoriais simpléticos é dado pela de- finição abaixo e será útil na compreensão do Teorema 9. SILVA, F. B.; BORGES, L. T. M. Um estudo sobre espaços vetoriais simpléticos. DOI: 10.21167/cqdvol4201523169664fbsltmb0209 - Disponível em: http://www2.fc.unesp.br/revistacqd/index.jsp ________________________________________________________________________ 5 C.Q.D. - Revista Eletrônica Paulista de Matemática, Bauru, v. 4, p. 2-9, ago. 2015. Definição 4 Um simplectomorfismo S entre dois espaços vetoriais simpléticos (V1,Ω1) e (V2,Ω2) é um isomorfismmo linear S : V1 → V2 tal que S∗Ω2 = Ω1, ou seja, Ω2(S(u), S(v)) = Ω1(u, v), para todo u, v ∈ V1. Afim de ilustrar a definição acima, seja Ω0 como no Exemplo 1 e Ω1 dada por Ω1((u1, u2), (v1, v2)) = 2u2v1 − 2u1v2. Podemos verificar, como foi feito no Exemplo 1, que Ω1 é uma forma simplética e que S(x, y) = (−1 2 x, y) é um isomorfismo que torna (R2,Ω0) e (R2,Ω1) espaços simplectomorfos. 3 Formas simpléticas e suas matrizes associa- das. Nesta seção, mostraremos que cada forma simplética, uma vez fixada uma base do espaço vetorial, está associada a uma única matriz anti-simétrica e invert́ıvel. Para isso, necessitaremos dos seguintes resultados de Álgebra Linear. Proposição 5 Sejam U e V espaços vetoriais reais de mesma dimensão e T : U → V uma transformação linear. São equivalentes: 1. T é um isomorfismo; 2. T é injetora; 3. T é sobrejetora. Proposição 6 Sejam U e V espaços vetoriais reais, α base de U e β base de V . Uma transformação linear T : U → V é um isomorfismo se, e somente se, [T ]αβ for invert́ıvel, onde [T ]αβ é a matriz associada à transformação linear T. As duas proposições acima podem ser encontradas, entre outros, em [2] e [3]. Lema 7 Sejam Ω uma forma simplética e Ω] : V → V ∗ a transformação linear dada por Ω](u)(v) := Ω(u, v). Então, Ω é simplética se, e somente se, Ω] é um isomorfismo. Demonstração. Se Ω é simplética, então o núcleo da transformação linear Ω(u, ·) é {0} e portanto, Ω] é injetora. Pela Proposição 5, temos que Ω] é um isomorfismo. Reciprocamente, se Ω] é um isomorfismo, como dim V = dim V ∗, segue que Ω] é injetora e o núcleo da transformação linear Ω(u, ·) é {0}. Portanto, Ω é simplética. 2 Quando tomamos a base canônica α = {e1, e2, ..., en} de V, podemos representar, conforme visto na Seção 1, uma forma bilinear anti-simétrica Ω por uma matriz anti-simétrica A = [Aij ], onde Aij = Ω(ei, ej). Nestas condições, temos o seguinte resultado. Teorema 8 Seja Ω uma forma bilinear anti-simétrica. Então, Ω é simplética se, e somente se, A é invert́ıvel. SILVA, F. B.; BORGES, L. T. M. Um estudo sobre espaços vetoriais simpléticos. DOI: 10.21167/cqdvol4201523169664fbsltmb0209 - Disponível em: http://www2.fc.unesp.br/revistacqd/index.jsp ________________________________________________________________________ 6 C.Q.D. - Revista Eletrônica Paulista de Matemática, Bauru, v. 4, p. 2-9, ago. 2015. Demonstração. Pela Proposição 6 e pelo Lema 7, temos que Ω é simplética se, e somente se, [Ω]]αβ é invert́ıvel, onde α é a base canônica e β é sua base dual. Falta então verificar que a matriz [Ω]]αβ coincide com a matriz A t. Para isto, notemos que Ω](e1) = Ω(e1, ·) = Ω(e1, e1).e∗1 + ...+ Ω(e1, en).e∗n , ... Ω](en) = Ω(en, ·) = Ω(en, e1).e∗1 + ...+ Ω(en, en).e∗n . E portanto, [Ω]]αβ = Ω(e1, e1) · · · Ω(en, e1)... . . . ... Ω(e1, en) · · · Ω(en, en) = At. 2 O teorema acima permite, entre outras coisas, obter vários exemplos de formas simpléticas a partir de matrizes anti-simétricas invert́ıveis. Exemplo 2 Considere a matriz A = 0 0 2 −1 0 0 0 1 −2 0 0 0 1 −1 0 0 . Como A é uma matriz invert́ıvel e At = −A, segue que a forma bilinear Ω : R4 × R4 → R associada a esta matriz é uma forma simplética. Assim, para u = (a1, a2, a3, a4) e v = (b1, b2, b3, b4), Ω(u, v) = 4∑ i=1 4∑ j=1 aiΩ(ei, ej)bj . Ou seja, na base canônica β temos que: Ω((a1, a2, a3, a4), (b1, b2, b3, b4)) = [u] t βA[v]β = a1(2b3 − b4) + a2b4 − 2a3b1 + a4(b1 − b2). Segue abaixo um resultado que nos fornece uma maneira de construir um espaço vetorial simplético a partir de qualquer espaço vetorial W, de dimensão finita, e seu espaço vetorial dual W ∗. Além disso, dado qualquer isomorfismo linear T : W →W, constrói-se um simplectomorfismo a partir de T e seu adjunto T ∗. Teorema 9 Sejam W um espaço vetorial de dimenção n e W ∗ seu dual. Então o espaço vetorial V = W×W ∗ possui uma estrutura simplética natural Ω : V ×V → R definida por Ω((u, f), (v, g)) := g(u)− f(v). Além disso, todo isomorfismo T : W →W determina um simplectomorfismo T ⊕ (T−1)∗ : V → V. SILVA, F. B.; BORGES, L. T. M. Um estudo sobre espaços vetoriais simpléticos. DOI: 10.21167/cqdvol4201523169664fbsltmb0209 - Disponível em: http://www2.fc.unesp.br/revistacqd/index.jsp ________________________________________________________________________ 7 C.Q.D. - Revista Eletrônica Paulista de Matemática, Bauru, v. 4, p. 2-9, ago. 2015. Demonstração. Se {e1, e2, ..., en} é a base canônica de W, temos que a base canônica de V é dada por α = {(e1, 0), (e2, 0), ..., (en, 0), (0, e∗1), (0, e∗2), ..., (0, e∗n)}. Então, para todo 1 ≤ i, j ≤ n temos que: Ω((ei, 0), (ej , 0)) = 0; Ω((0, e∗i ), (0, e ∗ j )) = 0; Ω((ei, 0), (0, e ∗ j )) = δij ; Ω((0, e∗j ), (ei, 0)) = −δij . Desta forma, como na demonstração do Teorema 8, temos que a matriz [Ω]α é dada por: [Ω]α = ( 0 −I I 0 ) . Podemos ver que [Ω]α é anti-simétrica e invert́ıvel, uma vez que seu determinante é diferente de zero. Portanto, Ω é simplética. E ainda, T ⊕ (T−1)∗ é um simplectomorfismo pois: (T ⊕ (T−1)∗)∗Ω((u, f), (v, g)) = Ω((Tu, (T−1)∗f), (Tv, (T−1)∗g)) = (T−1)∗g(Tu)− (T−1)∗f(Tv) = g((T−1)Tu)− f((T−1)Tv) = gu− fv = Ω((u, f), (v, g)). 2 Este teorema pode ser adaptado para variedades diferenciáveis, sendo W o espaço vetorial tangente. O leitor interessado em mais detalhes pode ver, entre outros, [1] e [4]. SILVA, F. B.; BORGES, L. T. M. Um estudo sobre espaços vetoriais simpléticos. DOI: 10.21167/cqdvol4201523169664fbsltmb0209 - Disponível em: http://www2.fc.unesp.br/revistacqd/index.jsp ________________________________________________________________________ 8 C.Q.D. - Revista Eletrônica Paulista de Matemática, Bauru, v. 4, p. 2-9, ago. 2015. Referências [1] Bursztyn, H e Macarini, L. – Introdução à geometria simplética, XIV Escola de Geometria Diferencial. Instituto de Matemática Pura e Aplicada (IMPA), Rio de Janeiro, 2006. [2] Coelho, F. U. e Lorenço, M. L.–Um Curso de Álgebra Linear, Editora da Universidade de São Paulo, São Paulo, 2001. [3] Lima, E. L.–Algebra Linear, Coleção Matemática Universitária, Instituto de Matemática Pura e Aplicada (IMPA), Rio de Janeiro, 2011. [4] Silva, A. C. – Introduction to symplecticand Hamiltonian geometry, Pu- blicações Matemáticas do IMPA. [IMPA Mathematical Publications] Instituto de Matemática Pura e Aplicada (IMPA), Rio de Janeiro, 2003. SILVA, F. B.; BORGES, L. T. M. Um estudo sobre espaços vetoriais simpléticos. DOI: 10.21167/cqdvol4201523169664fbsltmb0209 - Disponível em: http://www2.fc.unesp.br/revistacqd/index.jsp ________________________________________________________________________ 9 C.Q.D. - Revista Eletrônica Paulista de Matemática, Bauru, v. 4, p. 2-9, ago. 2015. Uma curiosa propriedade com inteiros positivos Fernando Neres de Oliveira ∗ Resumo Neste trabalho iremos provar uma curiosa propriedade para listas de inteiros positivos da forma (1, 2, . . . , n) e também provaremos um teorema devido a Liouville que generaliza tal propriedade para outras listas de inteiros positivos. Palavras Chave: Inteiros positivos, Soma de cubos, Generalização de Liouville Introdução Pretendemos demonstrar a validade de uma curiosa propriedade para listas de in- teiros positivos da forma (1, 2, . . . , n), a saber, 13 + 23 + 33 + · · ·+ n3 = (1 + 2 + 3 + · · ·+ n)2, ∀n ∈ N. Para essa demonstração, faremos uso do prinćıpio da indução. Uma natural per- gunta que nos vem à cabeça, é a seguinte: Há listas de inteiros positivos diferentes do modelo (1, 2, . . . , n) e que satisfazem também a mesma curiosa propriedade? Bem, o teorema do matemático francês Joseph Liouville (1809-1882) que generaliza essa propriedade, mostrará que a resposta à essa pergunta é afirmativa. Para a prova desse teorema, além do prinćıpio da indução, usaremos a validade da propriedade para listas do tipo (1, 2, . . . , n) e, alguns resultados sobre MDC e fatoração prima. 1 A curiosa propriedade Vejamos inicialmente que a propriedade mencionada acima é verdadeira para n = 2, n = 3, n = 4, n = 5 e n = 6. 13 + 23 = 1 + 8 = 9 = 32 = (1 + 2)2 13 + 23 + 33 = 1 + 8 + 27 = 36 = 62 = (1 + 2 + 3)2 13 + 23 + 33 + 43 = 1 + 8 + 27 + 64 = 100 = 102 = (1 + 2 + 3 + 4)2 13 + 23 + 33 + 43 + 53 = 1 + 8 + 27 + 64 + 125 = 225 = 152 = (1 + 2 + 3 + 4 + 5)2 13+23+33+43+53+63 = 1+8+27+64+125+216 = 441 = 212 = (1+2+3+4+5+6)2 E ela continuará verdadeira se considerarmos qualquer lista de inteiros positivos da forma (1, 2, . . . , n) onde n ∈ N. Essa afirmação é provada na ∗Email: fernandoneres@ufersa.edu.br. Universidade Federal Rural do Semi- Árido, UFERSA. Caraúbas, RN OLIVEIRA, F. N. Uma curiosa propriedade com inteiros positivos. DOI: 10.21167/cqdvol4201523169664fno1015 - Disponível em: http://www2.fc.unesp.br/revistacqd/index.jsp ________________________________________________________________________ 10 C.Q.D. - Revista Eletrônica Paulista de Matemática, p. 10-15, ago. 2015. Bauru, v. 4, Proposição 1 13 + 23 + 33 + · · ·+ n3 = (1 + 2 + 3 + · · ·+ n)2, ∀n ∈ N. Prova: Usaremos o prinćıpio da indução sobre n. Para n = 1 a propriedade se escreve da seguinte forma 13 = 12, o que é uma verdade. Suponha agora que a propriedade é verdadeira para um inteiro positivo n = k, isto é, 13 + 23 + 33 + · · ·+ k3 = (1 + 2 + 3 + · · ·+ k)2. Para n = k + 1, o primeiro membro da propriedade se escreve da seguinte forma 13 + 23 + 33 + · · ·+ k3 + (k + 1)3, (1) enquanto que o segundo membro é escrito na forma (1 + 2 + 3 + · · ·+ k + k + 1)2. (2) Mostraremos que os inteiros dados pelas expressões (1) e (2) são iguais. Vejamos, (1 + 2 + 3 + · · ·+ k + k + 1)2 = (1 + 2 + 3 + · · ·+ k)2 +2 · (1 + 2 + 3 + · · ·+ k) · (k + 1) + (k + 1)2 = (1 + 2 + 3 + · · ·+ k)2 +2 · k(k + 1) 2 · (k + 1) + (k + 1)2 = (1 + 2 + 3 + · · ·+ k)2 + k(k + 1)2 + (k + 1)2 = (1 + 2 + 3 + · · ·+ k)2 + (k + 1)2(k + 1) = (1 + 2 + 3 + · · ·+ k)2 + (k + 1)3. Usando agora a nossa hipótese de indução, obtemos que (1+2+3+· · ·+k+k+1)2 = (1+2+3+· · ·+k)2+(k+1)3 = 13+23+33+· · ·+k3+(k+1)3, o que garante a validade da propriedade para n = k+1. Portanto, segue do prinćıpio da indução que 13 + 23 + 33 + · · ·+ n3 = (1 + 2 + 3 + · · ·+ n)2, ∀n ∈ N. 2 O teorema de Liouville Na sequência apresentaremos um resultado estabelecido pelo matemático Liouville, que generaliza a Proposição 1 para outras listas de inteiros positivos. Com o ob- jetivo de compreendermos o enunciado do teorema e de nos convencermos da sua veracidade em casos particulares, vejamos os seguintes exemplos: Exemplo 1 Seja N = 6. Os divisores positivos de N são d1 = 1, d2 = 2, d3 = 3, d4 = 6. Seja cj o número de divisores positivos de dj. Logo, c1 = 1, c2 = 2, c3 = 2, c4 = 4. Dáı, temos que c31 + c 3 2 + c 3 3 + c 3 4 = 1 3 + 23 + 23 + 43 = 1 + 8 + 8 + 64 = 81 = 92 = (1 + 2 + 2 + 4)2 = (c1 + c2 + c3 + c4) 2. cqdvol4201523169664fno1015 OLIVEIRA, F. N. Uma curiosa propriedade com inteiros positivos. DOI: 10.21167/cqdvol4201523169664fno1015 - Disponível em: http://www2.fc.unesp.br/revistacqd/index.jsp ________________________________________________________________________ 11 C.Q.D. - Revista Eletrônica Paulista de Matemática, p. 10-15, ago. 2015. Bauru, v. 4, Exemplo 2 Seja N = 36. Os divisores positivos de N são d1 = 1, d2 = 2, d3 = 3, d4 = 4, d5 = 6, d6 = 9, d7 = 12, d8 = 18, d9 = 36. Seja cj o número de divisores positivos de dj. Logo, c1 = 1, c2 = 2, c3 = 2, c4 = 3, c5 = 4, c6 = 3, c7 = 6, c8 = 6, c9 = 9. Dáı, temos que c31 + c 3 2 + c 3 3 + c 3 4 + c 3 5 + c 3 6 + c 3 7 + c 3 8 + c 3 9 = 1 3 + 23 + 23 + 33 + 43 + 33 + 63 + 63 +93 = 1 + 8 + 8 + 27 + 64 + 27 + 216 + 216 +729 = 1296 = 362 = (1 + 2 + 2 + 3 + 4 + 3 + 6 + 6 + 9)2 = (c1 + c2 + c3 + c4 + c5 + c6 + c7 + c8 +c9) 2. Exemplo 3 Seja N = 54. Os divisores positivos de N são d1 = 1, d2 = 2, d3 = 3, d4 = 6, d5 = 9, d6 = 18, d7 = 27, d8 = 54. Seja cj o número de divisores positivos de dj. Logo, c1 = 1, c2 = 2, c3 = 2, c4 = 4, c5 = 3, c6 = 6, c7 = 4, c8 = 8. Dáı, temos que c31 + c 3 2 + c 3 3 + c 3 4 + c 3 5 + c 3 6 + c 3 7 + c 3 8 = 1 3 + 23 + 23 + 43 + 33 + 63 + 43 + 83 = 1 + 8 + 8 + 64 + 27 + 216 + 64 + 512 = 900 = 302 = (1 + 2 + 2 + 4 + 3 + 6 + 4 + 8)2 = (c1 + c2 + c3 + c4 + c5 + c6 + c7 + c8) 2. Definição 1 τ(N) é o número de divisores positivos do inteiro positivo N . A propriedade comum aos números 6, 36 e 54, vista nos exemplos acima, é generalizada no Teorema 1 (Liouville) Seja N um inteiro positivo qualquer e ( d1, d2, . . . , dτ(N) ) a lista de todos os divisores positivos de N(incluindo 1 e N). Seja cj o número de divisores positivos de dj. Então, a lista ( c1, c2, . . . , cτ(N) ) satisfaz a seguinte propriedade c31 + c 3 2 + · · ·+ c3τ(N) = ( c1 + c2 + · · ·+ cτ(N) )2 . Prova: Para N = 1 o teorema é obviamente verdadeiro. Resta então prová-lo para inteiros N > 1. Mostraremos inicialmente que o resultado é verdadeiro para potências de primos. Seja então, N = pn onde p é primo e n ≥ 1. Os divisores positivos de N são d1 = 1, d2 = p, d3 = p 2, . . . , dτ(N) = p n. OLIVEIRA, F. N. Uma curiosa propriedade com inteiros positivos. DOI: 10.21167/cqdvol4201523169664fno1015 - Disponível em: http://www2.fc.unesp.br/revistacqd/index.jsp ________________________________________________________________________ 12 C.Q.D. - Revista Eletrônica Paulista de Matemática, p. 10-15, ago. 2015. Bauru, v. 4, Logo, c1 = 1, c2 = 2, c3 = 3, . . . , cτ(N) = n+ 1. Dáı, segue que c31 + c 3 2 + · · ·+ c3τ(N) = 1 3 + 23 + 33 + · · ·+ (n+ 1)3 = Prop 1 [1 + 2 + 3 + · · ·+ (n+ 1)]2 = ( c1 + c2 + c3 + · · ·+ cτ(N) )2 , o que mostra a validade do resultado para potências de primos. No que segue, mostraremos que: Se o resultado é válido para um inteiro positivo K então ele também é (3) válido para inteiros Kpn, onde, p é um primo tal que mdc(K, p) = 1. Obviamente, que o resultado vale para K = 1 e também será válido para Kpn, pois nesse caso, Kpn (= pn) é potência de primo. Suponha agora que o resultado é válido para um inteiro K > 1, isto é, a31 + a 3 2 + · · ·+ a3τ(K) = (a1 + a2 + · · ·+ aτ(K)) 2, (4) onde, (1 = b1, b2, . . . , bτ(K) = K) é a lista de todos osdivisores positivos de K e aj é o número de divisores positivos de bj , j = 1, 2, . . . , τ(K). É fácil ver que, qualquer divisor positivo de K multiplicado por qualquer divisor positivo de pn, é um divisor positivo de Kpn. A lista completa desses produtos, é a seguinte: b1, b2, . . . , bτ(K); b1p, b2p, . . . , bτ(K)p; . . . ; b1p n, b2p n, . . . , bτ(K)p n. (5) Reciprocamente, todo divisor positivo de Kpn é um dos inteiros dados em (5). Com efeito, seja D um divisor positivo de Kpn. Se D é o menor deles então D = b1 = 1. Assuma que D > 1, então segue da fatoração (única) em primos de D, que: D = dpm, onde mdc(d, p) = 1 e d,m são inteiros tais que d > 1 e m ≥ 0. Segue então dáı que m ≤ n, caso contrário1, teremos que p | K (CONTRADIÇÃO, pois mdc(K, p) = 1). Para m = n temos Kpn = q̃ ·D = q̃ · dpn (q̃ ∈ Z), isto é, K = q̃ · d (q̃ ∈ Z). Ou seja, d | K. E para m < n temos que n = m+s com s ≥ 1 e Kpn = q̂ ·D = q̂ ·dpm (q̂ ∈ Z). Dáı, seguem as implicações, q̂ · dpm = Kpn = Kpm+s = Kpmps ⇒ q̂ · d = Kps (s ≥ 1) ⇒ d | Kps (s ≥ 1) ⇒ d | K, onde a última implicação deve-se ao fato de que mdc2(d, ps) = 1. Podemos então concluir que D ∈ { b1, b2, . . . , bτ(K), b1p, b2p, . . . , bτ(K)p, . . . , b1p n, b2p n, . . . , bτ(K)p n } . 1Se m > n então m = n+ r com r ≥ 1. Como D divide Kpn então existe q ∈ Z tal que Kpn = q ·D. Logo, Kpn = q ·D = q · dpm = q · dpn+r = q · dpnpr, isto é, K = qd · pr (r ≥ 1). Portanto, p | K. 2Suponha que mdc(d, ps) ̸= 1. Nesse caso, mdc(d, ps) = pe onde 1 ≤ e ≤ s. Dáı, teremos que, p | pe e pe | d, ou seja, p | d. Portanto, mdc(d, p) = p ̸= 1. (CONTRADIÇÃO) OLIVEIRA, F. N. Uma curiosa propriedade com inteiros positivos. DOI: 10.21167/cqdvol4201523169664fno1015 - Disponível em: http://www2.fc.unesp.br/revistacqd/index.jsp ________________________________________________________________________ 13 C.Q.D. - Revista Eletrônica Paulista de Matemática, p. 10-15, ago. 2015. Bauru, v. 4, Portanto, em (5) temos a lista completa de todos os divisores positivos de Kpn. Por outro lado, temos também que mdc(bj , p) = 1 para cada j = 1, 2, . . . , τ(K), caso contrário, teŕıamos que p | K (CONTRADIÇÃO). Logo, nenhum bj contém o fator primo p. Dáı, segue então que, quaisquer dois bjp i (i = 1, 2, . . . , n) são distintos, e além disso, o número de divisores positivos dos inteiros listados em (5), são: a1, a2, . . . , aτ(K); 2a1, 2a2, . . . , 2aτ(K); . . . ; (n+ 1)a1, (n+ 1)a2, . . . , (n+ 1)aτ(K). (6) Seja S a soma de todos os números listados em (6), isto é, S = a1 + a2 + · · ·+ aτ(K) + 2a1 + 2a2 + · · ·+ 2aτ(K) + · · ·+ (n+ 1)a1 + (n+ 1)a2 + · · ·+ (n+ 1)aτ(K) = ( a1 + a2 + · · ·+ aτ(K) ) + 2 ( a1 + a2 + · · ·+ aτ(K) ) + · · ·+ (n+ 1) ( a1 + a2 + · · ·+ aτ(K) ) = ( a1 + a2 + · · ·+ aτ(K) ) [1 + 2 + · · ·+ (n+ 1)] . Dáı, teremos que, S2 = ( a1 + a2 + · · ·+ aτ(K) )2 [1 + 2 + · · ·+ (n+ 1)]2 = (4) e Prop 1 ( a31 + a 3 2 + · · ·+ a3τ(K) ) [ 13 + 23 + · · ·+ (n+ 1)3 ] = ( a31 + a 3 2 + · · ·+ a3τ(K) ) + ( 23a31 + 2 3a32 + · · ·+ 23a3τ(K) ) + · · ·+ [ (n+ 1)3a31 + (n+ 1) 3a32 + · · ·+ (n+ 1)3a3τ(K) ] = a31 + a 3 2 + · · ·+ a3τ(K) + (2a1) 3 + (2a2) 3 + · · ·+ ( 2aτ(K) )3 + · · ·+ [(n+ 1)a1]3 + [(n+ 1)a2]3 + · · ·+ [ (n+ 1)aτ(K) ]3 , o que mostra a validade do resultado para Kpn. Podemos agora mostrar que o resultado é válido para qualquer inteiro N > 1, nesse caso, o Teorema Fundamental da Aritmética nos garante que N tem uma fatoração (única) em primos, a saber, N = pe11 · p e2 2 · p e3 3 · . . . · p ek k , onde, ei ≥ 1 é inteiro, pi é primo e pi ̸= pj sempre que i ̸= j. Já vimos que o resultado é válido para potências de primos, então, para N1 = p e1 1 ele será verda- deiro. Suponha que para algum 1 ≤ i ≤ k − 1, o resultado seja verdadeiro para Ni = p e1 1 · p e2 2 · p e3 3 · . . . · p ei i . Como mdc 3(Ni, pi+1) = 1 então segue de (3) que o resultado é válido para Ni+1 = Ni · pei+1i+1 = p e1 1 · p e2 2 · p e3 3 · . . . · p ei i · p ei+1 i+1 . Dáı, o prinćıpio da indução nos garante que para cada i ∈ {1, 2, 3, . . . , k}, o resultado será válido para Ni, em particular, será válido para Nk = N . 3Suponha que mdc(Ni, pi+1) = pi+1. Então, teŕıamos que pi+1 | Ni e pi+1 é primo, logo, pi+1 | pj para algum 1 ≤ j ≤ i. Mas, como pj é primo, então teŕıamos que pi+1 = pj , isto é, i+ 1 = j ≤ i (absurdo!) OLIVEIRA, F. N. Uma curiosa propriedade com inteiros positivos. DOI: 10.21167/cqdvol4201523169664fno1015 - Disponível em: http://www2.fc.unesp.br/revistacqd/index.jsp ________________________________________________________________________ 14 C.Q.D. - Revista Eletrônica Paulista de Matemática, p. 10-15, ago. 2015. Bauru, v. 4, 3 Conclusão Pelo o que foi apresentado acima, conclúımos então que é posśıvel obter infinitas listas de inteiros positivos, tais que, a soma de seus cubos é igual ao quadrado de sua soma. (7) Vimos na Proposição 1 que toda lista do tipo (1, 2, . . . , n) satisfaz a propriedade (7). Um outro modelo, explicitado por Liouville, que nos permite obter tais listas é apresentado no Teorema 1, o qual garante que toda lista do tipo ( c1, c2, . . . , cτ(N) ) (onde, cj é o número de divisores positivos do divisor positivo dj de N) também satisfaz a propriedade (7). Referências [1] Ross Honsberger. Ingenuity in Mathematics. Mathematical Association of Ame- rica, Washington, 1970. OLIVEIRA, F. N. Uma curiosa propriedade com inteiros positivos. DOI: 10.21167/cqdvol4201523169664fno1015 - Disponível em: http://www2.fc.unesp.br/revistacqd/index.jsp ________________________________________________________________________ 15 C.Q.D. - Revista Eletrônica Paulista de Matemática, p. 10-15, ago. 2015. Bauru, v. 4, Um novo sistema de axiomas para a lógica paraconsistente J3 Hércules de Araujo Feitosa ∗ Gabriel Alexandre da Cruz † Ana Cláudia de Jesus Golzio ‡ Resumo We investigate the paraconsistent logic J3. As original result we propose a new sistem of axioms for J3 and present results of soundness and completeness (adequacy) evolving the original three valued matrix semantic for J3. Palavras Chave: Lógica paraconsistente, Lógica trivalente, Modelo matricial, Sis- tema de axiomas. Introdução A Lógica J3 foi introduzida por D’Ottaviano e da Costa [7], em 1970, a partir de uma semântica matricial trivalente. Trata-se de uma lógica paraconsistente e foi idealizada como uma posśıvel solução a um problema de Jáskowski, que envolveria aspectos das teorias paraconsistentes ainda em fase inicial. Nesse trabalho [7] foram apresentados vários esquemas válidos de fórmulas para as matrizes de J3, porém não foi introduzido um conjunto de axiomas correto e completo para o referido modelo matricial. D’Ottaviano apresentou um sistema de axiomas para J3, em [5], com cinco axi- omas proposicionais e duas regras de dedução. Este sistema de axiomas conta com um operador delta ∆, que será apresentado segundo sua interpretação matricial na próxima seção. Os sistemas axiomáticos, de um modo geral, são pouco elucidativos quanto às noções formalizadas pela referida lógica. Imaginamos que isto tenha ocorrido com este sistema de [5]. Num caṕıtulo destinado a discutir lógicas paraconsistentes, do livro [9], Epstein e D’Ottaviano apresentam um outro sistema de axiomas para J3. Mais recentemente, no contexto das lógicas da inconsistência formal (LFI) [2], Carnielli, Marcos e Amo [3] reconhecem que a lógica J3 tem importância distinguida para as LFI’s, denotam a lógica J3 por LFI1 e apresentam um novo sistema de axiomas um pouco mais compreensivo e com alguns axiomas finais motivados por axiomas do sistema anterior. ∗Email: haf@fc.unesp.br. Departamento de Matemática, UNESP - FC - Bauru †Email: gabriel−210495@hotmail.com. Licenciatura em Matemática, UNESP - FC - Bauru ‡Email: anaclaudiagolzio@yahoo.com.br. Pós em Filosofia, UNICAMP - IFCH - Campinas FEITOSA, H. A.; CRUZ, G. A.; GOLZIO,A. C. J. Um novo sistema de axiomas para a lógica paraconsistente J . DOI: 10.21167/cqdvol4201523169664hafgacacjg1629 - Disponível em: http://www2.fc.unesp.br/revistacqd/index.jsp ________________________________________________________________________ 16 Eletrônica Paulista de Matemática, Bauru, v. 4, p. 16-29, ago. 2015. 3 C.Q.D. - Revista Os sistemas mencionados serão apresentados com mais detalhes na Seção 2 deste trabalho. A meta deste ensaio é apresentar um sistema distinto destes, um pouco mais simples com relação a estes últimos axiomas, e dar uma demonstração de correção e completude do sistema hilbertiano por nós introduzido relativamente à semântica trivalente de J3, conforme as matrizes originais. 1 A lógica J3 De acordo com [7], a lógica J3 foi introduzida a partir das seguintes matrizes trivalentes na linguagem proposicional L = (¬,∨,∇), em que os operadores propo- sicionais ¬ e ∨ formalizam, respectivamente, as noções de negação e disjunção e o operador ∇ separa os elementos distinguidos dos não distinguidos. Os significados destes operadores são dados pelas seguintes tabelas: ¬ 0 1 1 2 1 2 1 0 ∨ 0 12 1 0 0 12 1 1 2 1 2 1 2 1 1 1 1 1 ∇ 0 0 1 2 1 1 1 Além desses operadores básicos, são definidos os seguintes operadores de J3: Conjunção: φ ∧ ψ =def ¬(¬φ ∨ ¬ψ) Negação forte: ∼ φ =def ¬∇φ Delta: ∆φ =def ¬∇¬φ Condicional: φ→ ψ =def ¬∇φ ∨ ψ Bicondicional: φ↔ ψ =def (φ→ ψ) ∧ (ψ → φ) Consistência: ◦φ =def ∼ (φ ∧ ¬φ). Os significados destes novos entes são dados pelas seguintes tabelas: ∧ 0 12 1 0 0 0 0 1 2 0 1 2 1 2 1 0 12 1 ∼ 0 1 1 2 0 1 0 ∆ 0 0 1 2 0 1 1 → 0 12 1 0 1 1 1 1 2 0 1 2 1 1 0 12 1 ↔ 0 12 1 0 1 0 0 1 2 0 1 2 1 2 1 0 12 1 ◦ 0 1 1 2 0 1 1 Da definição da conjunção a partir da disjunção, observamos que devem valer em J3 as leis de De Morgan. A semântica matricial de J3 é dada pela matriz: MJ3 = ({0, 12 , 1}, { 1 2 , 1},¬,∨,∇), FEITOSA, H. A.; CRUZ, G. A.; GOLZIO, A. C. J. Um novo sistema de axiomas para a lógica paraconsistente J . DOI: 10.21167/cqdvol4201523169664hafgacacjg1629 - Disponível em: http://www2.fc.unesp.br/revistacqd/index.jsp ________________________________________________________________________ 17 Eletrônica Paulista de Matemática, Bauru, v. 4, p. 16-29, ago. 2015. 3 C.Q.D. - Revista com o conjunto de valores designados D = {12 , 1} e, dessa maneira, a relação de consequência semântica é dada como segue. A seguir, indicamos por V ar(J3) = {p1, p2, p3, ...} o conjunto das variáveis pro- posicionais de J3 e por For(J3) o conjunto das fórmulas de J3. Uma valoração para J3 é qualquer função: v : V ar(J3) → {0, 12 , 1}, a qual é estendida de modo único para o conjunto For(J3) segundo os operadores introduzidos acima. Se Γ ⊆ For(J3), então v(Γ) = {v(γ) : γ ∈ Γ}. A relação de implicação lógica ou consequência semântica para J3 é dada do seguinte modo. Se Γ ∪ {φ} ⊆ For(J3), então Γ implica φ quando para toda J3-valoração v, se v(Γ) ⊆ D, então v(φ) ∈ D, isto é: Γ � φ ⇐⇒ v(Γ) ⊆ D ⇒ v(φ) ∈ D. Decorre da definição de valoração que toda fórmula de J3 válida segundo uma valoração v : V ar(J3) → {0, 12 , 1} é também válida segundo a restrição booleana de v, isto é, segundo v : V ar(J3) → {0, 1} com os significados booleanos dos operadores ¬, ∨, ∧ e →, em que é apagado o valor 12 . Assim, toda fórmula J3-válida é uma tautologia. Podemos construir tabelas de verdade para fórmulas de J3, que por ser uma lógica trivalente, tem como número de linhas algum múltiplo de 3. Vejamos alguns exemplos: (a) φ→ (ψ → φ): φ → (ψ → φ) 0 1 0 1 0 0 1 12 0 0 0 1 1 0 0 1 2 1 0 1 1 2 1 2 1 2 1 2 1 2 1 2 1 2 1 2 1 1 2 1 2 1 1 0 1 1 1 1 12 1 1 1 1 1 1 1 (b) φ→ (φ ∨ ψ): FEITOSA, H. A.; CRUZ, G. A.; GOLZIO, A. C. J. Um novo sistema de axiomas para a lógica paraconsistente J . DOI: 10.21167/cqdvol4201523169664hafgacacjg1629 - Disponível em: http://www2.fc.unesp.br/revistacqd/index.jsp ________________________________________________________________________ 18 Eletrônica Paulista de Matemática, Bauru, v. 4, p. 16-29, ago. 2015. 3 C.Q.D. - Revista φ → (φ ∨ ψ) 0 1 0 0 0 0 1 0 12 1 2 0 1 0 1 1 1 2 1 2 1 2 1 2 0 1 2 1 2 1 2 1 2 1 2 1 2 1 1 2 1 1 1 1 1 1 0 1 1 1 1 12 1 1 1 1 1 (c) φ↔ ¬¬φ: φ ↔ ¬¬φ 0 1 0 1 2 1 2 1 2 1 1 1 (d) φ→ (φ ∨ ψ): φ ∨ (φ → ψ) 0 1 0 1 0 0 1 0 1 12 0 1 0 1 1 1 2 1 2 1 2 0 0 1 2 1 2 1 2 1 2 1 2 1 2 1 1 2 1 1 1 1 1 0 0 1 1 1 12 1 2 1 1 1 1 1 Como cada última coluna das tabelas anteriores encerra apenas os valores 1 e 12 , então todas estas fórmulas são válidas segundo MJ3 . (e) Cada fórmula σ do tipo φ ∧ ¬φ ∧ ◦φ é contraditória: φ ¬φ ◦φ σ 0 1 1 0 1 2 1 2 0 0 1 0 1 0 Uma fórmula, como esta, que assume todos os valores iguais a 0 será denota por ⊥ e, por outro lado, uma fórmula como a sua negação ¬σ, que assume sempre o valor 1 será denotada por ⊤. Contudo, algumas fórmulas tautológicas bem conhecidas não são J3-válidas. Ve- jamos algumas delas: (f) φ→ (¬φ→ ψ). Tomemos uma valoração v tal que v(φ) = 12 e v(ψ) = 0. Dáı, v(φ → (¬φ → ψ)) = (12 → ( 1 2 → 0)) = 1 2 → 0 = 0. FEITOSA, H. A.; CRUZ, G. A.; GOLZIO, A. C. J. Um novo sistema de axiomas para a lógica paraconsistente J . DOI: 10.21167/cqdvol4201523169664hafgacacjg1629 - Disponível em: http://www2.fc.unesp.br/revistacqd/index.jsp ________________________________________________________________________ 19 Eletrônica Paulista de Matemática, Bauru, v. 4, p. 16-29, ago. 2015. 3 C.Q.D. - Revista (g) (φ→ ψ) → (¬ψ → ¬φ). Tomemos uma valoração v tal que v(φ) = 1 e v(ψ) = 12 . Dáı, v((φ → ψ) → (¬ψ → ¬φ)) = (1 → 12) → ( 1 2 → 0) = 1 2 → 0 = 0. Temos também algumas equivalências: (h) ∼ φ⇔ φ→ ⊥. ∼ φ ↔ (φ → ⊥) 1 1 0 1 0 0 1 12 0 0 0 1 1 0 0 (i) ∇φ⇔ (¬φ ∧ ◦φ) → φ. ∇φ ↔ (¬φ ∧ ◦φ) → φ 0 1 1 1 1 0 0 1 1 12 0 0 1 1 2 1 1 0 0 1 1 1 Proposição 1 Se v : For(J3) → {0, 12 , 1} é uma J3-valoração, então: (i) v(φ) ∈ D ⇔ v(φ) = 12 ou v(φ) = 1; (ii) v(¬φ) ∈ D ⇔ v(φ) = 12 ou v(φ) = 0; (iii) v(◦φ) ∈ D ⇔ v(φ) = 0 ou v(φ) = 1. Demonstração: Imediata das tabelas dos operadores de J3. 2 Sistemas de axiomas de J3 Nesta seção apresentamos três diferentes sistemas hilbertianos introduzidos em momentos distintos para a Lógica Paraconsistente J3, todos no ambiente proposici- onal. Encontramos o primeiro sistema no artigo [5], com a seguinte configuração: Esquemas de Axiomas: (A1) ∆(φ→ (ψ → φ)) (A2) ∆((φ→ ψ) → ((ψ → σ) → (φ→ σ))) (A3) ∆((¬φ→ ¬ψ) → (ψ → φ)) (A4) ∆(((φ→ ¬φ) → φ) → φ) (A5) ∆(∆(φ→ ψ) → ∆(∆φ→ ∆ψ)). Regras de Dedução: (R1) φ,∆(φ→ ψ) ⊢ ψ (R2) ∇φ ⊢ φ. O segundo sistema está em [9]: Esquemas de Axiomas: FEITOSA, H. A.; CRUZ, G. A.; GOLZIO, A. C. J. Um novo sistema de axiomas para a lógica paraconsistente J . DOI: 10.21167/cqdvol4201523169664hafgacacjg1629 - Disponível em: http://www2.fc.unesp.br/revistacqd/index.jsp ________________________________________________________________________ 20 Eletrônica Paulista de Matemática, Bauru, v. 4, p. 16-29, ago. 2015. 3 C.Q.D. - Revista (A1) φ→ (ψ → φ) (A2) (φ→ (ψ → σ)) → ((φ→ ψ) → (φ→ σ)) (A3) (ψ → (φ→ σ) → (φ ∧ ψ) → σ) (A4) φ→ (ψ → (φ ∧ ψ)) (A5) (φ ∧ ¬φ ∧ ◦φ) → ψ (A6) ((¬φ ∧ ◦φ) → φ) → φ (A7) ¬¬φ↔ φ (A8) ◦φ↔ ◦¬φ (A9) ¬∇φ↔ (¬φ ∧ ◦φ) (A10) ◦(∇φ) (A11) (¬(φ ∧ ψ) ∧ ◦(φ ∧ ψ) ∧ ψ) → (¬φ ∧ ◦φ) (A12) (¬φ ∧ ◦φ) → (¬(φ ∧ ψ) ∧ ◦(φ ∧ ψ)) (A13) ((φ ∧ ψ) ∧ ◦(φ ∧ ψ)) ↔ ((φ ∧ ◦φ) ∧ (ψ ∧ ◦ψ)). Regra de Dedução: (MP) φ,φ→ ψ ⊢ ψ. O terceiro e último sistema que apresentamos está em [3]. O operador de incon- sistência • é a negação do operador de consistência, isto é, •ψ =def ¬ ◦ ψ: Esquemas de Axiomas: (A1) φ→ (ψ → φ) (A2) (φ→ ψ) → ((φ→ (ψ → σ)) → (φ→ σ)) (A3) φ→ (ψ → (φ ∧ ψ)) (A4) (φ ∧ ψ) → φ (A5) (φ ∧ ψ) → ψ (A6) φ→ (φ ∨ ψ) (A7) ψ → (φ ∨ ψ) (A8) (φ→ σ) → ((ψ → σ) → ((φ ∨ ψ) → σ)) (A9) φ ∨ ¬φ (A10) ¬¬φ↔ φ (A11) ◦φ→ (φ→ (¬φ→ ψ)) (A12) •φ→ (φ ∧ ¬φ) (A13) •(φ ∧ ψ) ↔ ((•φ ∧ ψ) ∨ (•ψ ∧ φ)) (A14) •(φ ∨ ψ) ↔ ((•φ ∧ ¬ψ) ∨ (•ψ ∧ ¬φ))(A15) •(φ→ ψ) ↔ (φ ∧ •ψ). Regra de Dedução: (MP) φ,φ→ ψ ⊢ ψ. 3 O nosso sistema de axiomas para J3 Motivados pelas lógicas LFI e pelo texto [4], propomos o seguinte sistema de axiomas para J3: Esquemas de Axiomas: FEITOSA, H. A.; CRUZ, G. A.; GOLZIO, A. C. J. Um novo sistema de axiomas para a lógica paraconsistente J . DOI: 10.21167/cqdvol4201523169664hafgacacjg1629 - Disponível em: http://www2.fc.unesp.br/revistacqd/index.jsp ________________________________________________________________________ 21 Eletrônica Paulista de Matemática, Bauru, v. 4, p. 16-29, ago. 2015. 3 C.Q.D. - Revista (A1) φ→ (ψ → φ) (A2) (φ→ (ψ → σ)) → ((φ→ ψ) → (φ→ σ)) (A3) (φ ∧ ψ) → φ (A4) (φ ∧ ψ) → ψ (A5) (σ → φ) → ((σ → ψ) → (σ → (φ ∧ ψ))) (A6) φ→ (φ ∨ ψ) (A7) ψ → (φ ∨ ψ) (A8) (φ→ σ) → ((ψ → σ) → ((φ ∨ ψ) → σ)) (A9) ¬¬φ↔ φ (A10) φ ∨ (φ→ ψ) (A11) ◦φ→ (φ→ (¬φ→ ψ)) (A12) ¬ ◦ φ→ (φ ∧ ¬φ) (A13) ◦φ→ ◦¬φ (A14) (◦φ ∧ ◦ψ) → ◦(φ→ ψ) (A15) (◦φ ∧ ◦ψ) → ◦(φ ∨ ψ). Regra de Dedução: (MP) φ,φ→ ψ ⊢ ψ. Como pode ser visto em [10] ou [12], os axiomas (A1) e (A2) mais a regra MP garantem a validade do Teorema da Dedução para J3 e também do teorema ⊢ φ→ φ e da regra de dedução SH: φ → ψ,ψ → σ ⊢ φ → σ. Isto garante para o sistema uma relação de ordem dada por φ ≼ ψ ⇔ ⊢ φ→ ψ. Os axiomas (A3) e (A4) caracterizam φ ∧ ψ como um limitante inferior para o conjunto {φ,ψ} e, na presença do axioma (A5), então φ ∧ ψ torna-se o ı́nfimo do conjunto {φ,ψ}. De modo semelhante, os axiomas (A6), (A7) e (A8) tornam φ∨ψ no supremo do conjunto {φ,ψ}. Como temos uma relação de ordem em que a operação ∧ determina o mı́nimo para dois elementos quaisquer e ∨ determina o supremo para dois elementos quais- quer, então estas operações geram um reticulado. O correspondente algébrico de uma lógica que porta os axiomas (A1) - (A8) mais a regra MP, é a lógica positiva, cujo modelo algébrico é um reticulado relativamente pseudo-complementado [12], que é um reticulado distributivo. Os axiomas (A9) e (A10) procuram sistematizar aspectos da negação ¬ no con- texto lógico de J3, embora a negação não ocorra de fato em (A10). Como a negação joga um papel importante na caracterização da paraconsistência, precisamos olhar com cuidado para estes axiomas. O axioma (A11) é equivalente à fórmula (φ ∧ ¬φ ∧ ◦φ) → ψ. Dele depreende que se {φ,¬φ, ◦φ} ⊆ Γ, então para toda fórmula ψ, tem-se que Γ ⊢ ψ. Assim, este axioma esclarece sob quais circunstâncias uma fórmula pode tornar um conjunto trivial no sentido de deduzir todas as fórmulas de J3. O axioma (A12) também é essencial e complementar para o caráter paraconsistente de J3, pois indica que uma fórmula e sua negação podem ocorrer em certas situações. Os axiomas (A13), (A14) e (A15) garantem que se φ e ψ são consistentes, então as suas negações, condicionais e disjunções também são consistentes. Decorre que, neste caso, também a conjunção é consistente. FEITOSA, H. A.; CRUZ, G. A.; GOLZIO, A. C. J. Um novo sistema de axiomas para a lógica paraconsistente J . DOI: 10.21167/cqdvol4201523169664hafgacacjg1629 - Disponível em: http://www2.fc.unesp.br/revistacqd/index.jsp ________________________________________________________________________ 22 Eletrônica Paulista de Matemática, Bauru, v. 4, p. 16-29, ago. 2015. 3 C.Q.D. - Revista Proposição 2 ⊢ (◦φ ∧ ◦ψ) → ◦(φ ∧ ψ) Demonstração: Se ◦φ e ◦ψ, pelo axioma (A13), temos ◦¬φ e ◦¬ψ. De (A16), segue que ◦(¬φ ∨ ¬ψ). Mais uma vez, por (A13), temos ◦¬(¬φ ∨ ¬ψ) e, por De Morgan, ◦(φ ∧ ψ). Proposição 3 {φ,ψ} ⊢ φ ∧ ψ Demonstração: Se temos φ e ψ, pelo axioma (A1), temos também φ → ((σ → σ) → φ) e ψ → ((σ → σ) → ψ). Por duas aplicações de MP temos (σ → σ) → φ e (σ → σ) → ψ. Do axioma (A5) segue que ((σ → σ) → φ) → (((σ → σ) → ψ) → ((σ → σ) → (φ ∧ ψ))). Por duas aplicações de MP temos (σ → σ) → (φ ∧ ψ). Como vale σ → σ, então temos φ ∧ ψ. Proposição 4 (i) φ→ (ψ → σ) ⇔ (φ ∧ ψ) → σ (ii) ⊢ φ→ (ψ → (φ ∧ ψ)). Demonstração: (i) Usaremos o Teorema da Dedução. (⇒) Assumimos que valem φ→ (ψ → σ) e φ∧ψ. Dos axiomas (A3) e (A4) na segunda premissa, temos φ e ψ. Por duas aplicações da MP na primeira premissa obtemos σ. (⇐) Assumimos que valem (φ ∧ ψ) → σ, φ e ψ. Da proposição anterior, segue que {φ,ψ} ⊢ φ∧ψ e, então {φ,ψ} ⊢ σ. Por duas aplicações do Teorema da Dedução temos φ→ (ψ → σ). (ii) Como vale (φ ∧ ψ) → (φ ∧ ψ), usando (i) temos φ→ (ψ → (φ ∧ ψ)). Proposição 5 ⊢ ((¬φ ∧ ◦φ) → φ) → φ. Demonstração: Em acordo com o exemplo (i), devemos mostrar que ⊢ ∇φ → φ e, pela definição de condicional em J3, que ⊢ ¬∇φ ∨ φ. Do axioma (A10), temos ⊢ φ ∨ φ→ ⊥. Segue, pelo exemplo (h), que ⊢ φ ∨ ∼ φ e, então, ⊢ ∼ φ ∨ φ. Da definição de negação forte, temos que ⊢ ¬∇φ ∨ φ. 4 Correção Para a correção, precisamos mostrar que todo teorema de J3 é válido segundo o modelo MJ3 . Isto é o que é conhecido como correção fraca. Mostraremos algo um pouco mais forte, que a cada consequência sintática corresponde uma consequência semântica. Teorema 6 (Correção) Γ ⊢ γ ⇒ Γ � γ. Demonstração: Por indução sobre o comprimento da dedução Γ ⊢ γ. Se o comprimento desta dedução é 1, então γ ∈ Γ ou γ é um axioma de J3. Se γ ∈ Γ, então o resultado é imediato. Agora, devemos verificar que cada axioma de J3 é válido segundo MJ3. Faremos apenas mais alguns casos, pois (A1), (A6), (A9) e (A10) já estão mostrados nos exemplos (a), (b), (c) e (d) da Seção 1. A validade dos axiomas (A7) e (A13) é imediata. (A11) ◦φ→ (φ→ (¬φ→ ψ)): FEITOSA, H. A.; CRUZ, G. A.; GOLZIO, A. C. J. Um novo sistema de axiomas para a lógica paraconsistente J . DOI: 10.21167/cqdvol4201523169664hafgacacjg1629 - Disponível em: http://www2.fc.unesp.br/revistacqd/index.jsp ________________________________________________________________________ 23 Eletrônica Paulista de Matemática, Bauru, v. 4, p. 16-29, ago. 2015. 3 C.Q.D. - Revista ◦φ → (φ → (¬φ → ψ)) 1 1 0 1 1 0 0 1 1 0 1 1 12 1 2 1 1 0 1 1 1 1 0 1 12 0 1 2 0 0 0 1 12 1 2 1 2 1 2 1 2 0 1 12 1 1 2 1 1 1 1 1 1 0 1 0 1 1 1 1 0 1 12 1 1 1 1 0 1 1 (A12) ¬ ◦ φ→ (φ ∧ ¬φ): ¬ ◦ φ → (φ ∧ ¬φ) 0 1 0 0 1 1 12 1 2 1 2 1 2 0 1 1 0 0 Agora o passo indutivo. Se a dedução tem n passos, então o enunciado vale para todas as fórmulas que ocorrem até o passo n − 1 e áı a única regra de dedução, a MP, é aplicada. Assim, temos ρ, ρ → δ ⊢ δ. Pela hipótese de indução v(ρ) ∈ D e v(ρ→ δ) ∈ D. Logo, v(δ) ∈ D e, portanto, δ é válida segundo MJ3. Com o Teorema da Correção, temos que todas as fórmulas de J3 que são de- monstradas no sistema de axiomas de J3 são válidas segundo a semântica matricial MJ3 . O passo seguinte é mostrar que o sistema de axiomas usado demonstra todas as fórmulas que são válidas segundo MJ3 . 5 Completude A completude sempre exige mais esforços. Precisamos de algumas definições iniciais. Definição 7 Seja Γ ∪ {φ,ψ} ⊆ For(J3): (i) o conjunto das consequências de Γ é o conjunto C(Γ) = {φ : Γ ⊢ φ}; (ii) o conjunto Γ é uma teoria se C(Γ) ⊆ Γ; (iii) o conjunto Γ é não trivial se existe alguma fórmula ψ tal que Γ 0 ψ, isto é, C(Γ) ̸= For(J3); (iv) o conjunto Γ é completo quando para toda fórmula φ: Γ 0 φ ⇒ Γ ∪ {φ} é trivial; (v) o conjunto Γ é adequadamente completo se é completo e não trivial. A inclusão Γ ⊆ C(Γ) vale sempre. Uma teoria é um conjunto Γ tal que Γ = C(Γ). Cada conjunto completo é uma teoria, pois já conta com todas as suas con- sequências. A definição de conjunto completo do item (iv) não exclui a possibilidade de Γ ser trivial, pois neste caso não ocorre que Γ 0 φ e, desse antecedente falso, temos uma verdade. O conceito essencial é o de conjunto adequadamente completo, que coincide com o de maximal e não trivial. Este é tal que se tiramos uma fórmula, ele deixa de ser maximal e se inclúımos uma nova fórmula ele deixa de ser não trivial. Nos resultados seguintes consideramos sempre Γ ⊆ For(J3). FEITOSA, H. A.; CRUZ, G. A.; GOLZIO, A. C. J. Um novo sistemade axiomas para a lógica paraconsistente J . DOI: 10.21167/cqdvol4201523169664hafgacacjg1629 - Disponível em: http://www2.fc.unesp.br/revistacqd/index.jsp ________________________________________________________________________ 24 Eletrônica Paulista de Matemática, Bauru, v. 4, p. 16-29, ago. 2015. 3 C.Q.D. - Revista Proposição 8 O conjunto Γ é não trivial se, e somente se, para toda fórmula φ ∈ For(J3), no máximo duas dentre φ,¬φ, ◦φ estão em C(Γ). Demonstração: (⇒) Se para alguma fórmula φ ∈ For(J3), temos que {φ,¬φ, ◦φ} ⊆ C(Γ), então, pelo axioma (A11), o conjunto Γ é trivial. (⇐) Se alguma fórmula não está em C(Γ), então Γ é não trivial. Proposição 9 O conjunto Γ é adequadamente completo se, e somente se, para toda fórmula φ ∈ For(J3), exatamente duas dentre φ,¬φ, ◦φ estão em C(Γ). Demonstração: (⇒) Como Γ é adequadamente completo, então é não trivial. Pela proposição anterior, no máximo duas dentre φ,¬φ, ◦φ estão em C(Γ). Por outro lado, a condição de conjunto completo dá maximalidade dedutiva para Γ e, desse modo, não pode ocorrer menos que duas dentre φ,¬φ, ◦φ em C(Γ). (⇐) Consideremos que para toda fórmula φ ∈ For(J3), exatamente duas dentre φ,¬φ, ◦φ estão em C(Γ). Pela proposição anterior, Γ é não trivial. Agora, se Γ 0 ψ, então ψ é a terceira dentre as três fórmulas do tipo φ,¬φ, ◦φ, para alguma φ e, assim, Γ ∪ {ψ} é trivial. Proposição 10 Para toda fórmula φ ∈ For(J3), há uma J3-valoração v tal que v satisfaz duas dentre φ,¬φ, ◦φ e não satisfaz a outra. Demonstração: Se v0(φ) = 0, então v0(¬φ) = 1 e v0(◦φ) = 1; Se v1(φ) = 1 2 , então v1(¬φ) = 1 2 e v1(◦φ) = 0; Se v2(φ) = 1, então v2(¬φ) = 0 e v2(◦φ) = 1. Este resultado sugere que cada uma dentre φ,¬φ, ◦φ é independente das outras duas. Proposição 11 Γ ⊢ φ⇔ Γ ∪ {¬φ, ◦φ} é trivial. Demonstração: (⇒) Se Γ ⊢ φ, então Γ ∪ {¬φ, ◦φ} ⊢ φ ∧ ¬φ ∧ ◦φ e, portanto, Γ ∪ {¬φ, ◦φ} é trivial. (⇐) Se Γ ∪ {¬φ, ◦φ} é trivial, então para toda fórmula σ, temos que Γ ∪ {¬φ, ◦φ} ⊢ σ. Em particular, Γ ∪ {¬φ, ◦φ} ⊢ φ. Pelo Teorema da Dedução, segue que Γ ⊢ ¬φ → (◦φ → φ) e, pela Proposição 4 (i), Γ ⊢ (¬φ ∧ ◦φ) → φ. Agora, pela Proposição 5, temos que Γ ⊢ φ. Corolário 12 Se Γ é não trivial, então um dentre Γ ∪ {¬φ, ◦φ}, Γ ∪ {φ, ◦φ} e Γ ∪ {¬φ,φ} é não trivial. Lema 13 Se Γ é adequadamente completo, então: (i) ψ /∈ Γ ⇔ ¬ψ ∈ Γ e ◦ψ ∈ Γ; (ii) ⊥ /∈ Γ e ⊤ ∈ Γ. Demonstração: (i) Como Γ é adequadamente completo, então o resultado segue da Proposição 9. (ii) Se ⊥ ∈ Σ, então Σ é trivial. Como Γ é adequadamente completo, então ⊥ /∈ Γ e, depois, de (i), considerando-se ⊤ = ¬⊥, temos que ⊤ ∈ Γ. Agora veremos como os conjuntos adequadamente completos interagem bem com os axiomas da lógica J3. Teorema 14 Se Γ é adequadamente completo, então valem: [1] ψ ∧ σ ∈ Γ ⇔ ψ ∈ Γ e σ ∈ Γ; [2] ψ ∨ σ ∈ Γ ⇔ ψ ∈ Γ ou σ ∈ Γ; [3] ψ ∈ Γ ⇔ ¬¬ψ ∈ Γ; [4] ψ → σ ∈ Γ ⇔ ψ /∈ Γ ou σ ∈ Γ; FEITOSA, H. A.; CRUZ, G. A.; GOLZIO, A. C. J. Um novo sistema de axiomas para a lógica paraconsistente J . DOI: 10.21167/cqdvol4201523169664hafgacacjg1629 - Disponível em: http://www2.fc.unesp.br/revistacqd/index.jsp ________________________________________________________________________ 25 Eletrônica Paulista de Matemática, Bauru, v. 4, p. 16-29, ago. 2015. 3 C.Q.D. - Revista [5] ◦ ψ ∈ Γ ⇒ ψ /∈ Γ ou ¬ψ /∈ Γ; [6] ¬ ◦ ψ ∈ Γ ⇒ ψ ∈ Γ e ¬ψ ∈ Γ; [7] ◦ ψ ∈ Γ ⇔ ◦¬ψ ∈ Γ; [8] ◦ ψ, ◦σ ∈ Γ ⇒ ◦(ψ → σ) ∈ Γ [9] ◦ ψ, ◦σ ∈ Γ ⇒ ◦(ψ ∨ σ) ∈ Γ [10] ◦ ψ, ◦σ ∈ Γ ⇒ ◦(ψ ∧ σ) ∈ Γ. Demonstração: Se Γ é adequadamente completo, então é uma teoria. [1] Se ψ ∧ σ ∈ Γ, então dos axiomas (A3) e (A4), segue que ψ ∈ Γ e σ ∈ Γ. Por outro lado, se ψ ∈ Γ e σ ∈ Γ, a Proposição 4 (ii), que depende de (A5), garante que ψ ∧ σ ∈ Γ. [2] De modo semelhante a [1], segue dos axiomas (A6)-(A8). [3] Segue do axioma (A9). [4] (⇒) Se ψ ∈ Γ, por MP, σ ∈ Γ. Logo, ψ /∈ Γ ou σ ∈ Γ. (⇐) Do axioma (A10), ψ ∨ (ψ → σ) ∈ Γ e dáı, por [2], segue que ψ ∈ Γ ou ψ → σ ∈ Γ. Se ψ /∈ Γ, então ψ → σ ∈ Γ; e se σ ∈ Γ, de (A1), segue que σ → (ψ → σ) ∈ Γ e, por MP, ψ → σ ∈ Γ. [5] Segue da Proposição 9. [6] Segue do axioma (A12) e de [1]. [7] (⇒) Segue do axioma (A13). (⇐) Mais uma vez, pelo axioma (A13), temos ◦¬ψ → ◦¬¬ψ ⇔ ◦¬ψ → ◦ψ ∈ Γ. [8]− [10] Seguem dos axiomas (A14), (A15) e Proposição 2. Proposição 15 Para Γ ∪ {φ} ⊆ For(J3), se existe uma J3-valoração v tal que v(σ) ∈ D ⇔ σ ∈ Γ, então para toda fórmula φ: v(φ) = 0 ⇔ φ /∈ Γ v(φ) = 12 ⇔ ◦φ /∈ Γ v(φ) = 1 ⇔ ¬φ /∈ Γ. Demonstração: v(φ) = 0 ⇔ v(φ) /∈ D H⇔ φ /∈ Γ; v(φ) = 12 ⇔ v(◦φ) = 0 ⇔ v(◦φ) /∈ D H⇔ ◦φ /∈ Γ; v(φ) = 1 ⇔ v(¬φ) = 0 ⇔ v(¬φ) /∈ D H⇔ ¬φ /∈ Γ. Proposição 16 Para Γ ∪ {φ} ⊆ For(J3), se existe uma J3-valoração v tal que v(σ) ∈ D ⇔ σ ∈ Γ, então Γ é adequadamente completo. Demonstração: Na visão das Proposições 9 e 15, basta mostrar que existe uma J3-valoração v tal que para toda fórmula φ: v(φ) = 0 ⇔ ¬φ, ◦φ ∈ Γ v(φ) = 12 ⇔ φ,¬φ ∈ Γ v(φ) = 1 ⇔ φ, ◦φ ∈ Γ. Como para toda fórmula φ cada J3-valoração v atribui exatamente um valor do conjunto {0, 12 , 1}, então exatamente uma dentre φ,¬φ, ◦φ não está em Γ. Portanto, vale a condição acima e Γ é adequadamente completo. Proposição 17 Se Γ é adequadamente completo, então existe uma J3-valoração v tal que v(σ) ∈ D ⇔ σ ∈ Γ. Demonstração: Seja Γ adequadamente completo. Então para toda fórmula φ ∈ For(J3), exatamente duas dentre φ,¬φ, ◦φ estão em Γ. (⇒) Para cada variável p, se p /∈ Γ, então seja v(p) = 0, se ¬p ∈ Γ, então seja v(p) = 12 e se ◦p ∈ Γ, então seja v(p) = 1. Assim, temos uma valoração tal que v(σ) ∈ D ⇒ σ ∈ Γ. (⇐) Mostramos por indução na complexidade das fórmulas que ocorrem em Γ, que se σ ∈ Γ ⇒ v(σ) ∈ D. Usamos as Proposições 9 e 10. FEITOSA, H. A.; CRUZ, G. A.; GOLZIO, A. C. J. Um novo sistema de axiomas para a lógica paraconsistente J . DOI: 10.21167/cqdvol4201523169664hafgacacjg1629 - Disponível em: http://www2.fc.unesp.br/revistacqd/index.jsp ________________________________________________________________________ 26 Eletrônica Paulista de Matemática, Bauru, v. 4, p. 16-29, ago. 2015. 3 C.Q.D. - Revista Se σ é uma variável p, então de acordo com a Proposição 10: se p, ◦p ∈ Γ, então v(p) = 1 se p,¬p ∈ Γ, então v(p) = 12 se ¬p, ◦p ∈ Γ, então v(p) = 0. Se σ é uma negação ¬ψ, então: se ¬ψ, ◦¬ψ ∈ Γ, por [7], ¬ψ, ◦ψ ∈ Γ e então v(ψ) = 0 se ¬ψ,¬¬ψ ∈ Γ, por [3], ¬ψ,ψ ∈ Γ e então v(ψ) = 12 se ¬¬ψ, ◦¬ψ ∈ Γ, por [3] e [7], ψ, ◦ψ ∈ Γ e então v(ψ) = 1. Se σ é do tipo ◦ψ, então não podem ocorrer σ e ¬σ em Γ: se ¬ ◦ ψ ∈ Γ, por [6], ψ,¬ψ ∈ Γ e então v(ψ) = 12 se ◦ψ ∈ Γ, por [5], ψ /∈ Γ ou ¬ψ /∈ Γ e então v(ψ) = 0 ou v(ψ) = 1. Se σ é uma conjunção ψ ∧ η, então: se (ψ ∧ η), ◦(ψ ∧ η) ∈ Γ, por [1], ψ ∈ Γ, η ∈ Γ e ◦(ψ ∧ η) ∈ Γ, então v(ψ) = 1 e v(η) = 1 se (ψ ∧ η),¬(ψ ∧ η) ∈ Γ, então ◦(ψ ∧ η) /∈ Γ. Dáı, por [1] e [10], ψ, η ∈ Γ e ◦ψ /∈ Γ; ou ψ, η ∈ Γ e ◦η /∈ Γ, então v(ψ) = 12 e v(η) ∈ D ou v(ψ) ∈ D e v(η) = 1 2 se ¬(ψ ∧ η), ◦(ψ ∧ η) ∈ Γ, então ¬ψ ∨¬η, ◦(ψ ∧ η) ∈ Γ, por [2], ¬ψ, ◦(ψ ∧ η) ∈ Γ ou ¬η, ◦(ψ ∧ η) ∈ Γ e então v(ψ) = 0 ou v(ψ) = 12 e v(η) = 0; ou v(η) = 0 ou v(η) = 12 e v(ψ) = 0. Se σ é uma disjunção ψ ∨ η, então: se (ψ ∨ η), ◦(ψ ∨ η) ∈ Γ, por [2], ψ ∈ Γ e ◦(ψ ∨ η) ∈ Γ ou η ∈ Γ e ◦(ψ ∨ η) ∈ Γ, então v(ψ) = 1 ou v(η) = 1. se (ψ ∨ η),¬(ψ ∨ η) ∈ Γ, então ◦(ψ ∨ η) /∈ Γ e, por [9], ◦ψ /∈ Γ ou ◦η /∈ Γ. Da primeira afirmação segue que (ψ ∨ η),¬ψ ∧ ¬η ∈ Γ, por [1] e [2], ψ,¬ψ,¬η ∈ Γ ou η,¬ψ,¬η ∈ Γ e então v(ψ) = 12 e v(η) ̸= 1; ou v(η) = 1 2 e v(ψ) ̸= 1 se ¬(ψ ∨ η), ◦(ψ ∨ η) ∈ Γ, então ψ ∨ η /∈ Γ e, por [2], ψ /∈ Γ e η /∈ Γ e, portanto, v(ψ) = 0 = v(η). Se σ é do tipo ψ → η, então: se ψ → η, ◦(ψ → η) ∈ Γ, por [4], ψ /∈ Γ ou η ∈ Γ e ◦(ψ → η) ∈ Γ e, dáı, v(ψ) = 0 ou v(η) = 1. se ψ → η,¬(ψ → η) ∈ Γ, então ◦(φ → ψ) /∈ Γ, por [8], ◦ψ /∈ Γ ou ◦η /∈ Γ e, portanto, v(η) = 12 e v(ψ) ∈ D se ¬(ψ → η), ◦(ψ → η) ∈ Γ, então ψ → η /∈ Γ, por [4], ψ ∈ Γ e η /∈ Γ e, portanto, v(φ) ∈ D e v(ψ) = 0. Corolário 18 O conjunto Γ é adequadamentecompleto se, e somente se, existe uma J3-valoração v tal que v(σ) ∈ D ⇔ σ ∈ Γ. Demonstração: Segue das duas proposições anteriores. Lema 19 Todo conjunto não trivial pode ser estendido a um conjunto adequada- mente completo. FEITOSA, H. A.; CRUZ, G. A.; GOLZIO, A. C. J. Um novo sistema de axiomas para a lógica paraconsistente J . DOI: 10.21167/cqdvol4201523169664hafgacacjg1629 - Disponível em: http://www2.fc.unesp.br/revistacqd/index.jsp ________________________________________________________________________ 27 Eletrônica Paulista de Matemática, Bauru, v. 4, p. 16-29, ago. 2015. 3 C.Q.D. - Revista Demonstração: Se Γ é não trivial, então mostraremos que ele está contido em um conjunto adequadamente completo Σ. Consideremos uma enumeração de todas as fórmulas de J3: ψ0, ψ1, ψ2, ψ3, ... e Σ0 =def Γ. Agora, respeitando a ordenação acima, definimos, indutivamente, a seguinte sequência de conjuntos de fórmulas. Σn+1 =def { (i) Σn ∪ {ψn,¬ψn}, se Σn ∪ {ψn,¬ψn} é não trivial (ii) Σn ∪ {ψn, ◦ψn}, se Σn ∪ {ψn, ◦ψn} é não trivial (iii) Σn ∪ {◦ψn,¬ψn}, se Σn ∪ {◦ψn,¬ψn} é não trivial, . Finalmente, seja Σ =def ∪n∈N Σn. Por construção, para cada n ∈ N, o conjunto Σn é não trivial e, desse modo, também Σ é não trivial. Além disso, Γ = Σ0 ⊆ Σ e o conjunto Σ é adequadamente completo, pois percorre todo o conjunto For(J3). Proposição 20 O conjunto Γ é não trivial se, e somente se, tem um modelo dado por uma J3-valoração. Demonstração: Se Γ é não trivial, então pode ser estendido a um conjunto adequa- damente completo Σ, para o qual há uma J3-valoração tal que v(σ) ∈ D ⇔ σ ∈ Γ. Por outro lado, se há uma J3-valoração tal que v(σ) ∈ D ⇔ σ ∈ Γ, então existe ψ ∈ For(J3) tal que v(ψ) /∈ D e, portanto, ψ /∈ Γ. Teorema 21 (Completude) Γ � γ ⇒ Γ ⊢ γ. Demonstração: Se Γ 0 γ, pela Proposição 11, o conjunto Γ∪{¬γ, ◦γ} é não trivial. Do Lema 19, há uma teoria adequadamente completa Σ tal que Γ ∪ {¬γ, ◦γ} ⊆ Σ. Pelo Corolário 18, existe uma J3-valoração v tal que v(σ) ∈ D se, e somente se, σ ∈ Σ. Assim, v(¬γ), v(◦γ) ∈ D e v(γ) /∈ D. Logo, Γ 2 γ. Os resultados seguintes dão ênfase à dedutibilidade finita de J3. Proposição 22 Se Γ � ψ, então existe um subconjunto finito Γf ⊆ Γ, tal que Γf � ψ. Demonstração: Se Γ � ψ, pelo Teorema da Completude, Γ ⊢ ψ. Dáı, seja Γf um subconjunto finito de Γ, constitúıdo pelas fórmulas que ocorrem numa dedução de ψ a partir de Γ. Assim , Γf ⊢ ψ e, pelo Teorema da Correção, Γf � ψ. Proposição 23 Se todo subconjunto finito de Γ tem modelo, então Γ tem modelo. Demonstração: Se Γ não tem modelo, então é trivial. Portanto, para alguma fórmula ψ, Γ ⊢ ψ ∧ ¬ψ ∧ ◦ψ. Seja Γf o subconjunto finito de Γ determinado pelas fórmulas que ocorrem na dedução de ψ ∧ ¬ψ ∧ ◦ψ a partir de Γf . Desse modo, Γf ⊢ ψ ∧ ¬ψ ∧ ◦ψ e, portanto, Γf é trivial. Logo, Γf não tem modelo. Segue destas proposições o Teorema da Compacidade. Teorema 24 (Compacidade) O conjunto de fórmulas Γ tem modelo se, e somente se, todo subconjunto finito de Γ tem modelo. Considerações finais Introduzimos um conjunto de axiomas levemente distinto das versões anteriores, as quais foram mencionadas no texto. Entendemos que nosso conjunto de axiomas FEITOSA, H. A.; CRUZ, G. A.; GOLZIO, A. C. J. Um novo sistema de axiomas para a lógica paraconsistente J . DOI: 10.21167/cqdvol4201523169664hafgacacjg1629 - Disponível em: http://www2.fc.unesp.br/revistacqd/index.jsp ________________________________________________________________________ 28 Eletrônica Paulista de Matemática, Bauru, v. 4, p. 16-29, ago. 2015. 3 C.Q.D. - Revista é mais simples que os anteriores e conta com uma argumentação mı́nima sobre a presença de cada axioma no sistema hilbertiano proposto. Este sistema é correto e completo para as matrizes de J3, denotada por MJ3 . Demos uma demonstração bastante simples e direta, motivada por [9], mas com algumas contribuições nossas. Finalmente, mostramos que o sistema é adequado, mas não temos certeza de que precisamos de todos os axiomas do sistema. Não mostramos a independência dos axiomas, mas apenas que eles dão conta de gerar todas as fórmulas J3-válidas. Fica então a questão de saber se podemos dispensar algum dos axiomas ou parte deles. Agradecimentos Agradecemos apoio do CNPq e da FAPESP. Referências [1] BOLC, L., BOROWIK, P. Many-valued logics: 1 theoretical foundations. Berlin: Springer-Verlag, 1992. [2] CARNIELLI, W.; CONIGLIO, M. E; MARCOS, J. Logics of formal inconsis- tency. In GABBAY, D.; GUENTHNER, F. (Eds.) Handbook of Philosophical Logic, 2nd. ed., v. 14, p. 1-93, 2007. [3] CARNIELLI, W. A.; MARCOS J.; AMO S. Formal inconsistency and evoluti- onary databases. Logic and Logical Philosophy, v. 8, p. 115-152, 2000. [4] CONIGLIO, M. E.; SILVESTRINI, L. H. C. An alternative approach for quasi- truth. Logic Journal of IGPL, v. 22, p. 387-410, 2014. [5] D’OTTAVIANO, I. M. L. The completeness and compactness of a three-valued first-order logic. Revista Colombiana de Matemáticas, v. XIX, n. 19, p. 77-94, 1985. [6] D’OTTAVIANO, I. M. L. Definability and quantifier elimination for J3-theories. Studia Logica, v. XLVI, v. 46, n. 1, p. 37-54, 1987. [7] D’OTTAVIANO, I. M. L.; da COSTA, N. C. A. Sur un problème de Jáskowski. Comptes Rendus de l’Académie de Sciences de Paris (A-B), v. 270, p. 1349-1353, 1970. [8] ENDERTON, H. B. A mathematical introduction to logic. San Diego: Academic Press, 1972. [9] EPSTEIN, R. L. The semantic foundations of logic. Volume 1: propositional logics. Dordrecht: Kluwer Academic Publishers, 1990. [10] FEITOSA, H. A.; PAULOVICH, L. Um prelúdio à lógica. São Paulo: Editora, UNESP, 2005. [11] MALINOWSKI, G. Many-valued logics. Oxford: Clarendon Press, 1993. [12] RASIOWA, H. An algebraic approach to non-classical logics. Amsterdam: North-Holland, 1974. FEITOSA, H. A.; CRUZ, G. A.; GOLZIO, A. C. J. Um novo sistema de axiomas para a lógica paraconsistente J . DOI: 10.21167/cqdvol4201523169664hafgacacjg1629 - Disponível em: http://www2.fc.unesp.br/revistacqd/index.jsp ________________________________________________________________________ 29 Eletrônica Paulista de Matemática, Bauru, v. 4, p. 16-29, ago. 2015. 3 C.Q.D. - Revista ____________________________ * Email: klixg@yahoo.com.br. EEP, Piracicaba, SP; Uniesp, Tietê, SP; Colégio Gradual, Cerquilho, SP; E. E. Pres. Arthur da Silva Bernardes, Cerquilho, SP Parábolas e hipérboles envolventes Calixto Garcia * Resumo Não é raro na escola do ensino básico a confecção de trabalhos artísticos que consistem em unir, com barbantes esticados, pregos fixados em uma base plana, seguindo alguma regularidade. Nesse contexto, curvas podem ser definidas com a propriedade de tangenciar cada linha da coleção de segmentos concebidos por tais barbantes, característica das chamadas curvas envolventes. Pretende-se explorar neste trabalho duas situações que geram curvas com essa propriedade, quais sejam: a parábola e a hipérbole. Palavras-chave: curvas envolventes, parábola, hipérbole. Introdução Dar tratamento matemático a situações do cotidiano é um hábito que usualmente se desenvolve naquele que aprecia as ciências exatas. A situação que expomos no resumo é oportuna a esse tratamento. Ao abordá-la, dispondo-se de uma base plana, inicialmente estabelecemos uma disposição para os pregos e, a depender da interligação destes com os barbantes, determinamos analiticamente a parábola ou a hipérbole como curva envolvente. Em seguida, para cada caso, procedemos a uma generalização (com demonstração de recíproca), estudando o comportamento de cada curva criada na medida em que alteramos o “posicionamento dos pregos”. Nesse estudo, é interessante e instrutivo contar com o auxílio de softwares geradores de gráficos ou dedicados à Geometria, tais como o Winplot, Graphmatica, Cabri e o Geogebra, sobretudo com os que oferecem apresentação dinâmica. GARCIA,C. Parábolas e hipérboles envolventes. DOI: 10.21167/cqdvol4201523169664cg3042 - Disponível em: http://www2.fc.unesp.br/revistacqd/index.jsp ________________________________________________________________________ 30 C.Q.D. - Revista Eletrônica Paulista de Matemática, Bauru, v. 4, p. 30-42, ago. 2015. 1 Parábola envolvente Imaginemos, na figura 1, pregos igualmente espaçados sobre os lados de um ângulo reto. Note que os pedaços de barbante esticados que unem cada dois deles são hipotenusas de triângulos com a soma das medidas dos catetos constante. figura 1 Mostremos que existe uma parábola tangenciando cada linha dessa coleção, ou, em outras palavras, que a curva envolvente criada por essas linhas é uma parábola. Iniciemos com um exemplo, adotando 2 2 para soma das distâncias dos pontos de fixação do barbante ao vértice do referido ângulo reto, considerando-o com lados nas bissetrizes dos dois primeiros quadrantes de um plano cartesiano. Observando a figura 2, devemos ter OP + OQ = 2 2 . Assim, sendo xQ = k, com 0 ≤ k ≤ 2, temos OQ = k 2 e, portanto, OP = 2 2 – k 2 = (2 – k) 2 . Com isso, concluímos que xP = – (2 – k) e, também, conhecemos Q = (k, k) e P = (k – 2, 2 – k). figura 2 GARCIA, C. Parábolas e hipérboles envolventes. DOI: 10.21167/cqdvol4201523169664cg3042 - Disponível em: http://www2.fc.unesp.br/revistacqd/index.jsp ________________________________________________________________________ 31 C.Q.D. - Revista Eletrônica Paulista de Matemática, Bauru, v. 4, p. 30-42, ago. 2015. Então, a reta PQ tem coeficiente angular )2( )2( kk kk = k – 1, e, portanto, sua equação é: y – k = (k – 1)(x – k). Embora tenhamos um número finito de barbantes, para cada k real entre 0 e 2, vamos considerar a família de retas com a equação y – k = (k – 1)(x – k). Essa equação é quadrática na variável k, a saber, k2 – (x + 2)k + x + y = 0, e deve apresentar uma só solução, se procurarmos os pontos (x, y) pelos quais passa uma única reta dessa família. Com isso, seu discriminante Δ = (x + 2)2 – 4(x + y) deve ser nulo, o que conduz à equação y = ¼ x2 + 1, reconhecidamente de uma parábola. E, para cada k, não é difícil verificar que a tal reta intersecta essa parábola no ponto (2(k – 1), (k – 1)2 + 1). Em outras palavras, todos os pontos por onde passa somente uma reta da família pertencem à parábola y = ¼ x2 + 1. Vamos proceder agora a uma generalização compreendendo a inclinação das semirretas OP e OQ e a tal soma OP + OQ. Sem perdê-la, entretanto, podemos “posicionar” na origem O o vértice do ângulo que delimita a curva envolvente, tendo como bissetriz a parte positiva do eixo y, como fizemos acima. Denominemos S a soma das distâncias dos pontos de fixação do barbante ao vértice desse ângulo. Como se pode observar na figura 3, os lados dos ângulos estão contidos nas retas de equações y = (tgα)·x e y = – (tgα)·x. Daí, sendo xQ = k, temos Q = (k, (tgα)·k). Como k = OQ·cosα e OQ + OP = S, então OP = S – cos k , para 0 ≤ k ≤ S·cosα. Disso, |xP| = OP·cosα = S·cosα – k, ou, xP = k – S·cosα e, também, yP = – (tgα)·xP = S·senα – k·tgα. Portanto, P = (k – S·cosα, S·senα – k·tgα). Daí, a reta PQ, de coeficiente angular cos 2 S senStgk , tem equação y – k·tgα = cos 2 S senStgk (x – k). Essa equação pode ser reescrita assim: (2tgα)·k2 – (2S·senα + 2x·tgα)·k + S·x·senα + S·y·cosα = 0. Na variável k, deve apresentar apenas uma solução, se desejarmos encontrar os pontos (x, y) pelos quais passa uma única reta dessa família. Isso significa que é nulo o seu discriminante, o que equivale a y = 2cos2 2 2 senS x S sen , com 0 < α < π/2. GARCIA, C. Parábolas e hipérboles envolventes. DOI: 10.21167/cqdvol4201523169664cg3042 - Disponível em: http://www2.fc.unesp.br/revistacqd/index.jsp ________________________________________________________________________ 32 C.Q.D. - Revista Eletrônica Paulista de Matemática, Bauru, v. 4, p. 30-42, ago. 2015. figura 3 Para ilustrar alguns casos particulares dessas porções de parábolas com prolongamentos, apresentamos a figura 4: na esquerda, temos fixo α = π/3 e, na direita, S = 4. figura 4 GARCIA, C. Parábolas e hipérboles envolventes. DOI: 10.21167/cqdvol4201523169664cg3042 - Disponível em: http://www2.fc.unesp.br/revistacqd/index.jsp ________________________________________________________________________ 33 C.Q.D. - Revista Eletrônica Paulista de Matemática, Bauru, v. 4, p. 30-42, ago. 2015. Vamos formular uma espécie de recíproca do que foi tratado acima. Seja uma parábola e um ângulo com vértice em seu eixo de simetria, de modo que seus lados tangenciam-na. Considere os pontos P e Q, cada qual pertencente a um lado desse ângulo, tal que o segmento PQ seja também tangente à parábola. Mostremos que, quaisquer que sejam os pares de pontos P e Q assim tomados, a soma das distâncias destes pontos ao vértice do referido ângulo é constante. De fato, sem comprometer a ideia geral, podemos tomar uma parábola com vértice na origem do sistema cartesiano, com concavidade voltada para cima. Ela tem, portanto, equação da forma y = ax2, com a > 0. Para dado λ > 0, seja R = (0, – λ) o vértice do ângulo descrito acima. Como se pode observar na figura 5, os lados desse ângulo estão contidos em retas de equações y = mx – λ e y = – mx – λ e, já que são tangentes à parábola, têm discriminante nulo as equações ax2 = mx – λ, o que implica em m = a2 e, daí, os pontos de tangência são U = , a e V = , a . figura 5 Sabemos que, a cada ponto T = (x0, a 2 0x ) da parábola em questão, está associada a equação do feixe de retas y – a 20x = m’(x – x0) que o contém. Se procurarmos pela reta PQ deste feixe que a tangencie neste ponto, devemos impor nulo o discriminante da GARCIA, C. Parábolas e hipérboles envolventes. DOI: 10.21167/cqdvol4201523169664cg3042 - Disponível em: http://www2.fc.unesp.br/revistacqd/index.jsp ________________________________________________________________________ 34 C.Q.D. - Revista Eletrônica Paulista de Matemática, Bauru, v. 4, p. 30-42, ago. 2015. equação ax2 – a 20x = m’(x – x0), na variável x, o que equivale a se ter m’ = 2ax0 (*). Com isso, a equação da reta PQ fica assim: y = 2ax0x – a 2 0x . Resolvendo dois sistemas com essa equação em comum, combinada com cada uma das equações das retas suportes y = a2 x – λ e y = a2 x – λ dos lados do ângulo dado, obtemos as coordenadas de Q e P. Eis suas abscissas: xQ = aax ax 22 0 2 0 e xP = aax ax 22 0 2 0 . Uma vez que y + λ = – 2 a x, então, como PR = 22 )( PP yx e QR = 22 )( QQ yx , temos a soma S = PR + QR = 22 4 PP xax + 22 4 QQ xax = axx QP 41|)||(| . Sendo a x a 0 , S = axx PQ 41)( = a aax ax aax ax 41 2222 0 2 0 0 2 0 . Com algumas manipulações algébricas chegamos a S = λ· a 1 4 , que é constante, como queríamos mostrar. 2 Hipérbole envolvente A figura 6 ilustra a mesma disposição dos pregos que na figura 1. figura 6 _________________________________________ * Para obter o coeficiente m’ mais diretamente, é suficiente calcular a derivada da função f(x) = ax2 no ponto x0. GARCIA, C. Parábolas e hipérboles envolventes. DOI: 10.21167/cqdvol4201523169664cg3042 - Disponível em: http://www2.fc.unesp.br/revistacqd/index.jsp ________________________________________________________________________ 35 C.Q.D. - Revista Eletrônica Paulista de Matemática, Bauru, v. 4, p. 30-42, ago. 2015. Note, agora, que os pedaços de barbante esticados que unem cada dois deles são hipotenusas de triângulos como produto das medidas dos catetos constante. A curva envolvente criada por essas linhas é um ramo de uma hipérbole equilátera. Suas assíntotas são as retas suportes dos lados desse ângulo. De fato, seja M o produto das distâncias dos pontos de fixação do barbante ao vértice do referido ângulo reto, considerando-o com lados nas bissetrizes dos dois primeiros quadrantes de um plano cartesiano, assim como fizemos com o caso anterior. Observando a figura 7, devemos ter OP∙OQ = M. Assim, com xQ = k > 0, temos OQ = k 2 e, portanto, OP = 2k M . Com isso, concluímos que xP = – k M 2 e, também, conhecemos Q = (k, k) e P = (– k M 2 , k M 2 ). Então, a reta PQ tem coeficiente angular Mk Mk k M k k M k 2 2 2 2 2 2 , e, portanto, sua equação é: y – k = Mk Mk 2 2 2 2 (x – k). figura 7 Embora também tenhamos um número finito de barbantes, para cada real k > 0, vamos considerar a família de retas com a equação y – k = Mk Mk 2 2 2 2 (x – k). Essa equação é quadrática na variável k, a saber, 2(y – x)∙k2 – 2M∙k + M(y + x) = 0, e deve apresentar uma só solução, se procurarmos os pontos (x, y) pelos quais passa uma única reta dessa família. Com isso, seu discriminante Δ = 4M[M – 2(y2 – x2)] deve ser nulo, o que conduz à equação y2 – x2 = 2 M , reconhecidamente de uma hipérbole equilátera com as bissetrizes dos quadrantes do plano cartesiano como assíntotas. GARCIA, C. Parábolas e hipérboles envolventes. DOI: 10.21167/cqdvol4201523169664cg3042 - Disponível em: http://www2.fc.unesp.br/revistacqd/index.jsp ________________________________________________________________________ 36 C.Q.D. - Revista Eletrônica Paulista de Matemática, Bauru, v. 4, p. 30-42, ago. 2015. Em outras palavras, todos os pontos por onde passa somente uma reta da família pertencem à hipérbole y2 – x2 = 2 M . Vamos proceder a uma generalização, baseando-nos na figura 3, ainda com 0 < α < π/2 e agora, com OP∙OQ = M. Sendo Q = (k, k∙tgα), k > 0, como k = OQ·cosα, então, OP = k M cos . E, como |xP| = OP·cosα, então, xP = k M 2cos . Daí, yP = – (tgα)·xP = k senM cos . Portanto, P = k senM k M cos , cos2 . A reta PQ, de coeficiente angular m = 22 2 cos cos Mk senMtgk , tem equação y – k·tgα = m(x – k) que, após manipulações algébricas, também pode ter a seguinte forma: (y – x∙tgα)∙k2 – (2M∙senα∙cosα)∙k + M∙y∙cos2α + M∙x∙senα∙cosα. Na variável k, esta equação deve apresentar apenas uma solução, se desejarmos encontrar os pontos (x, y) pelos quais passa uma única reta dessa família. Isso significa que é nulo o seu discriminante, o que, com um pouco de trabalho, nos conduz ao equivalente: M x sen y 2 2 2 2 cos , com y > 0, que, por sua vez, pode ser reescrita na forma explícita y = tgα ∙ 22cos xM . Uma conclusão a mais: para cada k, cada ponto dessa hipérbole é médio do segmento PQ, uma vez que a equação da hipérbole é satisfeita para as coordenadas desse ponto. De fato, se T é ponto médio de PQ, T = k tgksenM k Mk 2 cos , 2 cos 222 . Daí, tgα 22cos TxM = tgα 2 22 2 2 cos cos k Mk M = 222 )cos( 2 Mk k tg = k tgksenM 2 cos 2 = yT. A figura 8 ilustra alguns casos particulares desses ramos de hipérboles com suas assíntotas: na esquerda, temos fixo α = π/3 e, na direita, M = 2. GARCIA, C. Parábolas e hipérboles envolventes. DOI: 10.21167/cqdvol4201523169664cg3042 - Disponível em: http://www2.fc.unesp.br/revistacqd/index.jsp ________________________________________________________________________ 37 C.Q.D. - Revista Eletrônica Paulista de Matemática, Bauru, v. 4, p. 30-42, ago. 2015. figura 8 Formulemos uma recíproca para esse resultado. Consideremos um ramo de uma hipérbole de centro O, o ponto comum de suas assíntotas, e uma reta tangente a essa curva. Sejam P e Q os pontos de intersecção dessa reta com tais assíntotas. Então, o produto OP∙OQ é constante, e mais: o ponto de tangência da reta considerada é médio do segmento PQ. De fato, sem afetar a generalidade, podemos considerar o ramo com ordenadas positivas da hipérbole 1 2 2 2 2 b x a y , com a e b positivos, ou seja, da curva com equação y = 22 bx b a . Trata-se da tal porção de hipérbole centrada na origem O do plano cartesiano, com assíntotas y = b a x e y = – b a x (figura 9). figura 9 GARCIA, C. Parábolas e hipérboles envolventes. DOI: 10.21167/cqdvol4201523169664cg3042 - Disponível em: http://www2.fc.unesp.br/revistacqd/index.jsp ________________________________________________________________________ 38 C.Q.D. - Revista Eletrônica Paulista de Matemática, Bauru, v. 4, p. 30-42, ago. 2015. Sabemos que, a cada ponto T = (x0, 22 0 bx b a ) da hipérbole em questão, está associada a equação do feixe de retas y – 220 bx b a = m(x – x0) que o contém. A reta desse feixe que é tangente a essa hipérbole tem o coeficiente m igual ao valor da derivada da função f(x) = 22 bx b a no ponto x0, a saber, m = 22 0 bx x b a (*). Assim, a equação da reta tangente à hipérbole no ponto T é y – 220 bx b a = 22 0 bx x b a (x – x0). Resolvendo dois sistemas com essa equação em comum, combinada com cada uma das equações y = b a x e y = – b a x das assíntotas, obtemos P = 0 22 00 22 0 2 , xbx ab xbx b e Q = 0 22 00 22 0 2 , xbx ab xbx b . Com algumas manipulações algébricas chegamos ao produto OP∙OQ = a2 + b2, que é constante, como pretendido. Ainda, 2 QP xx = 0 22 0 2 0 22 0 2 2 1 xbx b xbx b = )]([2 2 22 0 2 0 0 2 bxx xb = x0 = xT e 2 QP yy = 2 22 0 0 22 00 22 0 2 2 2 1 b bxab xbx ab xbx ab = 220 bx b a = y0 = yT. Com isso, T é ponto médio de PQ. Isso completa a demonstração da recíproca. 3 Construções geométricas Os gráficos apresentados nas figuras 4 e 8 foram construídos por um software a partir de suas equações cartesianas. Também se contando com recursos da informática, essas curvas podem ser observadas quando da construção geométrica das retas que as delimitam, a partir das propriedades que possuem, evidenciadas nesse estudo. –––––––––––––––––––––––––––––––––––––––– * Embora mais trabalhoso, é possível obter o coeficiente m da maneira que foi realizado para encontrar m’, no caso da parábola, ou seja, sem se valer do Cálculo Diferencial. GARCIA, C. Parábolas e hipérboles envolventes. DOI: 10.21167/cqdvol4201523169664cg3042 - Disponível em: http://www2.fc.unesp.br/revistacqd/index.jsp ________________________________________________________________________ 39 C.Q.D. - Revista Eletrônica Paulista de Matemática, Bauru, v. 4, p. 30-42, ago. 2015. No caso da parábola, devemos construir segmentos com extremidades em cada lado de um ângulo dado, de modo que a soma das distâncias dessas extremidades ao vértice desse ângulo seja fixa. Para tanto, primeiramente construímos o ângulo e um segmento de medida fixa s (figura 10). Marcamos um ponto nesse segmento e transferimos (via compasso) as medidas das distâncias u e v desse ponto às suas extremidades em cada lado do ângulo, a partir de seu vértice. Com isso determinamos nesses lados segmentos com a propriedade descrita acima, isto é, com u + v = s. Ao “deslizarmos” o ponto marcado, ao longo do segmento de medida s, o software de Geometria Dinâmica encarrega-se de traçar os segmentos que delimitam a parábola envolvente. figura 10 No caso da hipérbole, devemos construir segmentos com extremidades em cada lado de um ângulo dado, de modo que o produto ω das distâncias
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