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Introdução à psicanálise e análise dos sonhos

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Introdução à psicanálise e análise dos sonhos
O contato com a psicanálise gera sempre um choque de alguma natureza. A
disciplina em que se desenvolveu a pesquisa acerca das neuroses e seus métodos de
tratamento nasceu de um campo próprio de estranhamento, o campo dos conflitos
psíquicos e suas manifestações. A temática que ainda não havia sido compreendida de
maneira satisfatória no espaço cultural e no momento histórico em que se dava o
desenvolvimento inicial da psicanálise, lançou médicos a se aventurarem em um novo
campo de investigação. Desta vez eles estavam lidando com fenômenos de natureza mais
sutil que os métodos e as ciências médicas permitiam observar, ainda que estivessem em
expansão. Seria preciso um olhar dinâmico para progredir frente às questões que os
fenômenos de ordem psicológica estavam levantando aos médicos da época. Estava sendo
inaugurado um novo campo de saber, um vasto território tão fascinante quanto
desconhecido. Não bastasse o impacto da passagem do modelo médico fisiológico para
uma proposta de modelo psicológico que introduziu a concepção de um dinamismo
psíquico, a disciplina psicanalítica havia ainda inaugurado uma mudança histórica
significativa: a descoberta do inconsciente e sua influência sobre nosso comportamento
consciente passa a ser vista como tão vasta quanto desconhecida.
Um dos choques que a psicanálise nos apresenta é fazer frente às nossas próprias
resistências. Ao falar de psicanálise e, portanto, tocar no conceito de inconsciente freudiano
de forma sincera, é difícil não reagir com algum grau de espanto. Em psicanálise
sustenta-se que os conflitos psíquicos têm origem na tensão entre os instintos libidinais e as
tendências do restante do Eu, o que nos coloca de frente com questões complexas e
delicadas como repressão, cultura, sexualidade infantil, o caráter fundamental da primeira
infância no desenvolvimento psíquico e suas as implicações. Além disso, a psicanálise tece
uma trama complexa de significados e profundidade acerca de aspectos do cotidiano
aparentemente desprovidos de maiores significados, tais como os atos falhos, o chiste, os
pequenos lapsos do cotidiano, bem como propõe a interpretação do conteúdo inconsciente
por meio dos sonhos a partir da formulação de que os sonhos são realizações disfarçadas
de desejos reprimidos. No texto Princípios Básicos da Psicanálise (1913), Freud comenta
sobre as dificuldades no avanço da psicanálise devido ao medo do observador médio de
encarar-se em seu próprio espelho. Tais questões que acompanharam a psicanálise desde
seus primórdios não deixam de ser atuais. Aparentemente a apresentação de resistências é
um produto natural quando nos deparamos com o corpo de saberes psicanalíticos, e o
confronto com elas, uma decorrência a ser ou não resolvida e a sua dissolução seria, ao
meu ver, um trabalho possivelmente árduo, porém fortemente desejável. Parece-se com
olhar para o que quer ser visto e não se quer ver, e então, expandir. Abrir as portas para o
desconhecido e se deixar tocar.
Tendo sido a Psicanálise um empreendimento de caráter tão revolucionário, seu
desenvolvimento se deu em constante movimento e em bases que estavam sendo
construídas ao passo em que Freud explorou o território psíquico. Dessa maneira, as
formulações muitas vezes são descritas como temporárias ou reservadas a um determinado
momento do desenvolvimento da psicanálise, entre outras justas ressalvas, o que
complexifica ainda mais o estudo do campo. No texto O Inconsciente (1915), Freud
apresenta em seu trabalho a justificação do inconsciente, a pluralidade dos sentidos do
inconsciente, o ponto de vista topológico, sentimentos inconscientes, topologia e dinâmica
da repressão, as características especiais do sistema Ics, a comunicação entre os sistemas
e a identificação do inconsciente. Neste mesmo texto, Freud introduz a visão de que a
essência da repressão não é anular a ideia do instinto, mas impedir que esta se torne
consciente, fazendo a partir dessa constatação o desenvolvimento das suas propostas para
os conceitos relacionados ao funcionamento do inconsciente. Assim, começar a adentrar a
psicanálise é uma tarefa que pede dedicação para compreender pouco a pouco cada
momento dessa jornada.
Dentre os diversos temas abordados, o que mais me chamou a atenção foi a
interpretação de sonhos. No capítulo III - O Discurso do Desejo: A interpretação de sonhos
do livro Freud e o Inconsciente, o autor Luiz Alfredo Garcia-Roza (2009) cita que a
interpretação de sonhos de Freud foi uma obra muito mal recebida pelos psiquiatras da
época, mas que se tornou um dos livros mais importantes do século em que foi publicado.
Naquela obra, o trabalho de Freud foi marcado pela passagem do exame dos problemas
neurológicos e metapsicológicos para o exame dos problemas clínicos, fator esse que
contribuiu para o despertar do meu interesse.
Segundo os autores, a partir da interpretação dos sonhos é possível acessar o
mundo próprio das atividades inconscientes. Como os sonhos não diferem entre a
normalidade e a patologia, eles são uma via privilegiada de acesso ao inconsciente e
constituem uma articulação entre o normal e o patológico. Assim, a interpretação dos
sonhos é tida como o melhor caminho para o estudo da neurose. Para Freud, os sonhos
possuem um sentido e representam a realização de desejos inconscientes. É importante
ressaltar que aquilo que se analisa são as comunicações da pessoa que sonha e que
através do seu relato é que podemos tomar algum conhecimento dos sonhos, que não
podem ser acessados em si. Freud tinha por pressuposto que a pessoa que sonha sabe o
significado do seu sonho, mas a censura impede que ela saiba que sabe. Assim, a
interpretação dos sonhos é justamente uma ferramenta de transposição dos sentidos
inconscientes do sonho para sentidos conscientes. Como demarca Garcia-Roza (2009),
neste ponto do seu desenvolvimento a psicanálise se articula com a linguagem e rompe
definitivamente com o referencial neurológico.
A princípio o sentido do sonho não é acessível nem ao sonhador e nem ao
intérprete. O sonho é sempre uma realização disfarçada de desejos inconscientes e
portanto passam por um processo de censura chamado deformação onírica. A censura
intrapsíquica está a serviço de proteger o sujeito do caráter ameaçador dos próprios
desejos. Desta forma, o sonho recordado é um substituto de um conteúdo inconsciente ao
qual se pretende alcançar por meio da análise e interpretação. A essas diferenças cabem
as classificações freudianas de conteúdo manifesto do sonho, que corresponde ao sonho
lembrado e contado e a de pensamentos oníricos latentes, que corresponde ao que se
refere à porção inconsciente e oculta dos sonhos. A partir dessas classificações faz-se
importante ressaltar que a interpretação é feita sempre à nível da linguagem, então a
análise é feita por meio de enunciados que são substituídos pelo analista por outros
enunciados cada vez mais primitivos e ocultos, relacionados à expressão do desejo do
paciente.
Um detalhe muito interessante sobre o método psicanalítico de interpretação dos
sonhos é que ele difere de métodos anteriormente existentes para tal objetivo. Para Freud,
a questão do sentido do sonho está relacionada aos elementos oníricos com função de
significante. Estes, por sua vez estruturados, fornecerão o sentido do sonho. Assim, o
significado dos sonhos não é acessível imediatamente, se não a partir de um trabalho de
estruturação da sua própria linguagem, que é uma linguagem inconsciente. É importante
ressaltar que o que é chamado aqui de inconsciente não se trata de uma profundeza
psíquica ou um ambiente interno onde pensamentos latentes são distorcidos e
transformados, mas sim “algo que fala em seus próprios termos”. Os significantes estão
sujeitos a uma sintaxe que não pertence aos sistemas Pré-consciente/Consciente e as
distorções dos pensamentos oníricos latentes servem como meio para chegar à sintaxe
própria do Inconsciente. Tais elaborações teóricas levam à famosa frase de Lacan que diz
que “oInconsciente é estruturado como uma linguagem”.
Para Freud, a linguagem é lugar de ocultamento. Buscando a verdade do desejo, a
psicanálise tem como função fazer aparecer o desejo que o discurso esconde. E com todas
as interdições que o desejo sofre a única forma de se fazer aparecer, transpondo a censura,
é através das distorções. Garcia-Roza (2009) explica que tanto os sintomas neuróticos
como o sonho manifesto são efeitos da distorção causada pela censura. A essa distorção
Freud chama de elaboração onírica ou trabalho do sonho, enquanto o trabalho inverso que
visa decifrar a elaboração onírica é chamado de interpretação. Freud aponta quatro
mecanismos de elaboração onírica, sendo eles a condensação, o deslocamento, a
figuração e a elaboração secundária. A condensação é o mecanismo que faz o conteúdo
manifesto aparecer como uma “tradução abreviada” do conteúdo latente, de forma que
diversas características sejam apresentadas reunidas e ou sintetizadas em uma mesma
representação. O deslocamento é o mecanismo da elaboração onírica que decorre da
censura, ele opera substituindo um elemento latente por outro mais distante da sua
representação original e também deslocando os acentos dos elementos mais importantes
para outros de menor importância. Garcia-Roza (2009) cita como esses dois mecanismos
foram reconhecidos por Lacan como correlatos da metonímia e da metáfora, figuras
fundamentais da linguística. Ainda, há o mecanismo da figuração, que consiste na seleção e
transformação de ideias em imagens e a elaboração secundária, mecanismo responsável
pela composição do sonho enquanto uma história coerente e compreensível, mais próxima
de uma lógica diurna, enquanto introduz fantasias diurnas no conteúdo do sono.
A complexidade da linguagem do inconsciente fica ainda mais evidenciada quando a
sobredeterminação das formações inconscientes é examinada. O sentido do sonho, assim
como o do sintoma, nunca é encerrado em uma única interpretação, pois as formações do
inconsciente são sobredeterminadas. Isso significa que um mesmo elemento manifesto
pode estar ligado a cadeias de pensamentos latentes que não possuem relação entre si.
Assim, a característica de sobredeterminação leva naturalmente ao fenômeno da
superinterpretação. O conceito de superinterpretação diz respeito a interpretações que são
sobrepostas às interpretações originais e que oferecem significados distintos destas. Assim,
interpretações incompatíveis entre si não invalidam uma a outra, pois as interpretações
terão tanta variedade quanto há na natureza sobredeterminada das formações do
inconsciente. “A rigor, não há interpretação completa” (Garcia-Roza, 2009). Ainda, a
superinterpretação pode ocorrer também pela apresentação de novas associações por
parte do sonhador no trabalho de interpretação dos sonhos. No trabalho de interpretação
dos sonhos não há começos e nem fins absolutos uma vez que não se considera a
existência de uma verdade essencial a ser descoberta. Não há um sentido sem uma
interpretação, assim como também não pode haver interpretação sem sentido. Todo sentido
já é uma interpretação, assim como toda interpretação é uma forma de constituição de
sentido, e assim é que se dá o processo de reconhecimento da linguagem do inconsciente.
Quando falamos em sonhos e formações inconscientes é quase automático nos
remetermos ao simbolismo. A palavra “símbolo” vem do grego (symbolon) e designa duas
metades separadas de um objeto que se aproximavam, fazendo menção não a uma
qualidade, mas a uma relação. Um signo é aquilo que representa um objeto e em função da
relação que tiver com o objeto pode ser um índice, um ícone ou um símbolo. O índice tem
relação direta com o objeto que representa, o ícone tem uma relação de semelhança com o
objeto que representa e o símbolo tem uma relação arbitrária ou convencional, não natural,
com o que representa, como é o caso das palavras, assim, o símbolo serve como veículo
para a concepção de objetos.
Entretanto, segundo Garcia-Roza (2009) tal aspecto não recebeu tanta importância
por parte de Freud no início da teoria dos sonhos. A posição foi tomada devido ao método
psicanalítico diferenciar-se do método de interpretação simbólica. De toda forma, a
existência dos símbolos se fez notar no fato de que certos conflitos eram representados
semelhantemente em sonhos independente de seus sonhadores, levando Freud a fazer um
exame posterior sobre o tema dos símbolos e tratar sobre o assunto em diferentes
momentos da teoria. Além de suas aparições nos sonhos, os símbolos aparecem também
na arte, na religião, nos mitos e são caracterizados basicamente pela constância da relação
entre o símbolo e o que é simbolizado. Dada a notória existência de tais símbolos, foi
necessário o emprego de duas formas diferentes entre si de interpretação dos sonhos. Uma
forma de interpretação parte unicamente das associações fornecidas pelo sonhador e outra
se aplica diretamente aos símbolos. A razão disso é que no primeiro caso os motivos são
singulares e pertencem apenas ao sonhador, sendo as associações a única chave para
ultrapassar a censura. Enquanto isso, nos sonhos simbólicos o símbolo é cultural e
transcende o sonhador. Nestes casos, a interpretação depende do conhecimento dos
símbolos, não das associações fornecidas.
Referências
Freud e o inconsciente. Luiz Alfredo Garcia-Roza – 24.ed. – Rio de Janeiro: Jorge Zahar
Ed., 2009.
Princípios Básicos da Psicanálise (1913). em Em Sigmund Freud, Obras Completas volume
10
O inconsciente (1915). Em Sigmund Freud, Obras Completas volume 1

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