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3 
 
CAPÍTULO 1 
 
TRILHANDO A HISTÓRIA: APROPRIAÇÃO DE TERRAS NO BRASIL 
 
A história da ocupação do território brasileiro trouxe muitos reflexos para a 
realidade atual, definindo novos rumos da luta pela terra pelos camponeses que 
continuam construindo formas de sobrevivência na terra. Os camponeses do 
Assentamento Timboré vem trilhando formas particulares de sobrevivência dentro do 
atual modelo econômico. Assim como fez noutros tempos os camponeses no Brasil, 
com suas diversas estratégias de sobrevivência e movimentos rebeldes, muitas vezes 
escondidos pela nossa história oficial. Nesse sentido, compreendemos que a história está 
atrelada às necessidades de um determinado desenvolvimento econômico que atua de 
acordo com privilégios e interesses das classes dominantes. Antonio Candido (1964) 
menciona que “... a História se ocupa do que ficou documentado, e a documentação se 
refere geralmente à vida das camadas dominantes.” (CÂNDIDO; 1964: 04). 
Ou ainda podemos concordar que: “A história do Brasil é a história das suas 
classes dominantes, é uma história de senhores e generais, não é uma história de 
trabalhadores e rebeldes.” (MARTINS; 1995: 26) 
Desse modo, muito do que se conhece a respeito da apropriação das terras no 
Brasil está ligado ao pensamento de uma classe dominante que deixou registrado o que 
lhe convinha, procurando garantir a sustentação desses direitos de forma institucional, 
criando leis que os amparasse. 
 No Brasil, a origem da concentração da terra está ligada ao processo de 
colonização deste território. Quando os portugueses começaram a colonizar o Brasil 
com vistas à exploração de seus recursos naturais e posteriormente do estabelecimento 
de uma agricultura de exportação, subordinaram as populações nativas. A partir de então 
várias propostas de exploração do território brasileiro foram postas em prática. José de 
Souza Martins( 1995) reflete sobre a concessão de terras no período colonial e a 
dificuldade encontrada pelo camponês nesse período: 
...a concessão da sesmaria tinha precedência legal sobre direitos de 
posseiros. Não era raro o fazendeiro encontrar, no território de que se tornara 
sesmeiro, posseiros instalados com suas roças e seus ranchos. Dependia do 
fazendeiro aceitar ou não a permanência desses posseiros como agregados 
4 
 
(...) a posse do fazendeiro conduzia a legitimação através do título de 
sesmaria; o mesmo não se dava com a posse do camponês, do mestiço, cujos 
direitos se efetivavam em nome do fazendeiro. Basicamente, tais situações 
configuravam a desigualdade dos direitos entre o fazendeiro e o camponês- 
desigualdade essa que definia os que tinham e os que não tinham direitos, os 
incluídos e os excluídos. (MARTINS; 1995 : 35) 
No mais, a disparidade era abrangente para a maioria da classe pobre do período. 
No período colonial, quem não tivesse sangue limpo, quem fosse 
bastardo, mestiço de branco e índia, estava excluído da herança. A interdição 
da propriedade, desse modo, alcançava não só o índio reduzido à condição 
de peça e escravo, nas fazendas e nos aldeamentos organizados e 
administrados pelos padres e pelas câmaras, como alcançava também o filho 
de branco sem pureza de sangue. (MARTINS;1995 : 31-2) 
A particularidade do camponês se acentuava ainda mais: 
 O camponês era, portanto, duplamente excluído: da condição de 
proprietário de terras e da condição de escravo, já que não podia ser 
convertido em renda capitalizada do tráfico colonial. (MARTINS; 1995 : 38) 
Essa condição facilitava a manipulação das elites agrárias sobre o campesinato, 
que estava na condição meramente de dependência, tendo seus direitos anulados por 
aqueles que condicionavam o poder econômico sob seus interesses. A estrutura de poder 
criada na sociedade impedia a participação das camadas pobres nas esferas de decisão 
política: 
Por serem pobres, esses camponeses estavam excluídos de toda e qualquer 
participação na estrutura de poder de então. A Constituição de 1824, 
confirmando a exclusão política dos pobres, estabelecia, entre outras, uma 
restrição essencial de ordem econômica para que alguém pudesse ser eleitor 
ou elegível. Nas eleições paroquiais, a renda líquida de Rs. 100$000 (cem 
mil réis) era uma das condições, o que equivalia a uns 759 Kg de açúcar ou 
1.500 Kg de farinha de mandioca, ou uns 6 bois, uns 4 cavalos. 
(...)(MARTINS; 1995: 40). 
Os mecanismos de apropriação territorial pela aristocracia rural e pela burguesia 
garantiram durante o processo histórico de formação da Nação, as desigualdades sociais 
e a reprodução das desigualdades. Ariovaldo Umbelino de Oliveira (2001) aponta : 
Historicamente a estrutura fundiária no Brasil, ou seja, a 
forma de distribuição e acesso à terra, verificamos que desde os 
5 
 
primórdios da colonização essa distribuição foi desigual. Primeiro 
foram as capitanias hereditárias e seus donatários, depois foram as 
sesmarias. Estas, estão na origem da grande maioria dos latifúndios do 
país, fruto da herança colonial. 
Com a independência e com o fim da escravidão, trataram os 
governantes do país de abrir a possibilidade de, através da “posse”, 
legalizar grandes extensões de terra. Com a Lei de Terras de 1850, 
entretanto, o acesso a terra só passou a ser possível através da 
compra/venda com pagamento em dinheiro, o que limitava, ou mesmo 
praticamente impedia, o acesso à terra para os escravos que foram 
sendo libertos.( OLIVEIRA; 2001: 28)) 
O autor deixa sinalado que essas estratégias governamentais garantiam os 
privilégios das elites e sua sustentabilidade. Os órgãos governamentais criavam leis no 
intuito de impedir o acesso a terra pelas populações pobres, prevenindo-se também das 
variadas formas de contestação social. A Lei de Terras - Lei nº601 do ano de 1850 - 
entre outras, cumpriu este papel reafirmando concretamente os anseios das elites. A Lei 
de Terras assegurava que a aquisição das terras só se faria através da compra e venda. 
Isso excluía a grande parcela de posseiros, parceiros, negros libertos, etc.; estabelecia 
que a terra passou à condição de propriedade privada: 
...as classes dominantes tomaram providências de ordem legal para 
encaminhar o processo de substituição do escravo sem prejuízo para a 
economia da grande lavoura, principalmente café e cana. Tais medidas 
se concretizaram na Lei de Terras, não por coincidência promulgada 
no mesmo ano de 1850. Tal lei instituía um novo regime fundiário 
para substituir o regime de sesmarias suspenso em julho de 1822 e não 
mais restaurado. Nesse meio tempo, ter- se- ia multiplicado o número 
de posseiros em todo o país. a Lei de Terras proibia a abertura de 
novas posses, estabelecendo que ficavam proibidas as aquisições de 
terras devolutas por outro título que não fosse o de compra.(...) a Lei 
de Terras transformava as terras devolutas em monopólio de Estado e 
Estado controlado por uma forte classe e fazendeiros. 
(MARTINS;1995 : 41-2) 
 
 Dessa forma, a Lei de Terras permitiu que todas as terras anteriormente dadas 
em sesmarias, se tornassem de domínio particular. As demais áreas, como as faixas de 
fronteira, faixas de marinha e terras não discriminadas, passaram ao domínio público, 
responsabilidade da Secretaria de Patrimônio da União (SPU) – algumas cabendo à 
alçada estadual. 
 Pierre Mombeig (1984 ), em seus estudos sobre o campo em São Paulo, afirma: 
 
6 
 
O fundamento da propriedade territorial no Brasil era o sistema de 
sesmarias, isto é, da terra outorgada pelo governo português, depois 
pelo governo imperial. Toda terra, não doada em sesmaria, era 
teoricamente do domínio público, ou terra devoluta. (MOMBEIG; 
1984: 144) 
Em função da apropriação desigual da propriedade rural pelas elites agrárias é 
possível compreender que os camponeses marcaram lugar na história, pontuando 
grandes manifestações camponesas que ocorreram em vários momentos, registrando a 
intervenção de um Estado autoritário que semanifestou contra as rebeliões camponesas 
no Império como Canudos-BA, por exemplo, e no início da República como a Guerra 
do Contestado-SC: 
A maior guerra popular da história contemporânea do Brasil foi a 
Guerra do Contestado, uma guerra camponesa no sul do país, nas regiões do 
Paraná e Santa Catarina, de 1912 a 1916. Abrangeu 20 mil rebeldes, 
envolveu metade dos efetivos do Exército brasileiro em 1914... 
(MOMBEIG; 1984: 26) 
 Para Martins essas lutas eram as respostas de uma ofensiva contra os 
camponeses, que vinha sendo feita em vários locais do país, expropriando grandes 
contingentes de famílias camponesas. Porém, a estratégia não parou com a 
intensificação de lutas, deu mais motivos para as instituições se prevenirem contra o 
descontentamento dos camponeses. Para ele estas lutas deram- se: “As primeiras 
grandes lutas camponesas no Brasil coincidiram com o fim do Império e o começo da 
República.” (MARTINS; 1995 : 41) 
O começo da Lei de Terras trouxe à público a grande concentração da terra 
através da grilagem, e ainda é um elemento real na atualidade. Para Pierre Monbeig ( 
1984: 143) “(...) o grileiro ou grilo é um fabricante, no mínimo, um falsificador de 
títulos de propriedade.”, assim, com a “maracutaia”, vem garantindo a permanência dos 
falsificadores nestas propriedades.” 
 (...) os falsários deram provas de imaginação e habilidade diabólicas: buscaram 
folhas de papel timbrado com as armas imperiais, imitaram escritas fora de uso, 
decolaram velhos selos, amareleceram propositalmente seus documentos, 
arrancaram páginas dos registros dos tabeliões.(...) (MOMBEIG; 1984: 144) 
7 
 
Ariovaldo Oliveira(1996) também denuncia o processo de grilagem da terra 
afirmando que esse é o processo comum de expropriação no Brasil: 
O processo de grilagem é clássico. Junta- se a documentação para 
aquisição de terra “devolutas” dos estados, duas certidões sempre 
“negativas” da existência, naquela terra a ser titulada, de índios e/ ou 
posseiros. Essa falsificação tem em vista contornar dispositivos das 
constituições brasileiras que garantem o direito o direito dos índios 
sobre suas terras e dos posseiros sobre suas posses. Depois dos 
documentos, na grande maioria falsos, o órgão competente dos 
estados ( Institutos de Terras) expede os títulos de propriedade da terra 
requisitada, sem que ninguém, nem mesmo os técnicos (agrimensores, 
engenheiro, etc.) que assinaram as plantas de localização e de 
amarração tenham estado lá. São conhecidos como “títulos voadores”, 
títulos de prancheta”. 
 A partir daí acontece o absurdo jurídico: o posseiro e o índio 
são transformados em “invasores” da propriedade privada titulada. 
(OLIVEIRA; 1996: 64) 
Esses fatos demonstram que a terra no Brasil passou por longo processo de 
apropriação no sentido de aumentar o patrimônio das elites agrárias, comerciais e 
urbanas, como mercadoria; a terra não cumpre a sua função social. Nesse sentido, a 
expansão do capitalismo aumentou a formação de grandes latifúndios, onde os 
latifundiários passaram a ocupar grandes extensões de terra no período atual, como 
OLIVEIRA( 2001) afirma: 
Como é de práxis de A história da ocupação das terras no Brasil está 
marcada pelo saque das terras das nações indígenas desde os seus 
primórdios. Está marcada também pelo genocídio a que foram 
submetidas essas nações. (OLIVEIRA; 2001: 21) 
 
No século XX a aceleração de novas demandas para a área rural, trouxe a partir 
da década de sessenta (60) mudanças profundas no campo no campesinato. 
Os mecanismos internos e externos como a chamada Guerra Fria, (onde o 
mundo estava neste período num contexto de disputa ideológica), fortaleceu a tomada 
do governo brasileiro pelo Golpe Militar, em 1° de Abril de 1964 (ou 31 de Março para 
não parecer mentira), que definiu os rumos a serem seguidos do governo brasileiro. Para 
o campo foi instaurada a Reforma de Base com a revisão agrária, que se opusera dos 
princípios das camadas sociais, acenando para uma política que favorecera as terras 
apropriadas pela burguesia agrária. 
Os governos militares procuraram “administrar” esta contradição e, ao 
mesmo tempo, aprofundaram- na. Reprimiram os movimentos 
populares e deram todo apoio aos investimentos incentivados no 
campo. Transformaram nesse processo, os grandes capitalistas 
8 
 
nacionais ou internacionais em grandes latifundiários.... (OLIVEIRA; 
2001: 144) 
As mudanças nesse período podem ser analisadas, tal com afirma Guilherme 
Delgado (1985): 
A transformação na base técnica da agricultura e a constituição do 
complexo agroindustrial nos fins dos anos 60, é considerado como 
marco de constituição do chamado complexo agroindustrial, 
denominado ainda por alguns autores de arrancada do processo de 
industrialização do campo. Esse processo caracteriza- se, 
fundamentalmente, pela a implantação no Brasil de um setor industrial 
produtor de bens para a agricultura. Paralelamente desenvolve- se ou 
moderniza- se em escala nacional, um mercado para produtos 
industrializados de origem agropecuária, dando origem à formação de 
simultânea de agroindustriais, em parte dirigido para o mercado 
interno e em parte voltado para a exportação. (DELGADO;1985:34) 
 
Nesse processo: 
 
Observa- se que o agronegócio na acepção do termo brasileiro, é uma 
associação do grande capital agroindustrial com a grande propriedade 
fundiária. Essa associação realiza uma estratégia econômica ligada ao 
capital financeiro, perseguindo o lucro e a renda da terra sob o 
patrocínio de política do Estado. (DELGADO;1985:45) 
 
 A partir dos anos 60 a concentração da terra e os incentivos do governo 
expropriaram grande massa da população rural. As grandes fazendas deram lugar ao 
novo arranjo territorial rural- urbano baseado na tecnificação da agricultura, com a 
mecanização e o uso intensivos agroquímicos aliados a monocultura. 
Grande que grande número de trabalhadores rurais, que anteriormente eram 
posseiros, meeiros, parceiros, extrativistas,..., sem poder continuar exercer suas 
atividades na terra migraram para os centros urbanos industriais dos estados. Neste 
cenário expropriatório das classes sociais trabalhadoras pelo capitalismo imprimiu uma 
nova forma de produzir na terra teve seu agravamento, tal como se refere Carlos Lorena 
“a estrutura agrária conservadora, viciosa, que desde o tempo das capitanias 
hereditárias, passando pelas ordenações do Reino, pela Lei das Sesmarias, pela Lei de 
Terras de 1850, até hoje, tem sido sempre conservadora e agravada nos últimos 20 anos” 
(LORENA,1998 apud FERNANDES,1999, p. 36). Neste sentido, entendemos que a 
concentração fundiária vem se agravando nos dias atuais permitindo a 
desterritorialização de inúmeros trabalhadores. 
9 
 
Neste primeiro momento, os resultados da Reforma de base serviram para 
reprimir e extinguir o campesinato com a repressão. Tal como se referiu MARTINS: 
... o fim da escravidão redefine as condições de existência do campesinato; o 
golpe de Estado põe fim as alternativas que estavam contidas nas lutas 
camponesas da época e deixa aberto apenas o caminho da sindicalização. 
Ao mesmo tempo, através do Estatuto da Terra, de fins de 1964, abre 
caminho para que o governo federal enquadre e administre 
institucionalmente as reinvindicações e os surtos de inquietação camponesa: 
o Estatuto abre a possibilidade da reforma agrária localizada e restrita nas 
áreas de tensão social grave, ao mesmo tempo que descarta a possibilidade 
de uma reforma agrária de âmbito nacional. O governo militar poderá, assim, 
a partir de então, controlar duas tendências aparentemente contraditórias em 
favor da primeira: de um lado uma política deliberada de concentração 
fundiária e de constituição de grandes empresas no campo; de outro lado, 
uma política de redistribuição de terras nos lugares em que as tensões sociais 
possam ser definidas como um perigo à segurança nacional, isto é,à 
estabilidade do regime militar. (MARTINS; 1995: 31) 
Este autor completa que o Estatuto da Terra neste período teve um papel 
fundamental para os rumos atuais de luta pela terra. 
O Estatuto faz, portanto, da reforma agrária brasileira uma reforma 
tópica, de emergência, destinada a desmobilizar o campesinato sempre e 
onde o problema da terra se tornar tenso, oferecendo riscos políticos. O 
Estatuto procura impedir que a questão agrária se transforme numa questão 
nacional, política de classe. (MARTINS; 1995: 96) 
Para OLIVEIRA: 
O Estatuto da Terra era uma espécie de bandeira militar levada ao campo em 
luta para, através da guerra, impor a “paz na terra”. Mais de 20 anos de 
foram e os militares não permitiram sequer que o Estatuto se tornasse plano. 
(OLIVEIRA; 1996:13) 
E ainda completa 
O acordo da aprovação do Estatuto foi selado entre os latifundiários e o 
governo militar. Só recentemente foi revelado que o então Ministro Roberto 
10 
 
Campos garantira aos latifundiários que o Estatuto aprovado não seria 
implantado. Passado vinte anos descobriu- se a realidade do acordo: o Plano 
Nacional de Reforma Agrária não havia sido elaborado. 
Dessa forma, o regime militar durante seus mais de 20 anos de 
vigência, conviveu/ consentiu/ promoveu um verdadeiro leilão das terras 
públicas deste país entre latifundiários e empresários do Centro- Sul 
industrial. Soldou uma aliança entre a burguesia industrial e os latifundiários 
através da transformação daquela burguesia em latifundiários, 
territorilizando, portanto, a burguesia industrial já mundializada. 
(OLIVEIRA; 1996: 88) 
A crítica feita por Ariovaldo Oliveira segue reforçando que uma vez a estrutura 
desigual de apropriação do território levou a grande maioria da população a viver de 
maneira indigna. De fato, percebemos que todos os mecanismos de resolução dos 
problemas, se resumem em cada vez mais, em elaborar mecanismos para dificultar os 
direitos dos camponeses ao acesso a terra. 
 Como se esperava o Estatuto da Terra não deu conta de ampliar o acesso a terra 
democraticamente. Com o fim do período militar em 1985, em função das demandas 
sociais, foi apresentado o Iº Plano Nacional de Reforma Agrária (PNRA), elaborado 
pela equipe de José Gomes da Silva engenheiro agrônomo, presidente do Instituto 
Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA, antigo IBRA na época). Mesmo 
com toda a retomada de luta pela terra não se obteve resultados satisfatórios do PNRA 
para os movimentos sociais do campo, que mantiveram suas expectativas no governo de 
Fernando Henrique Cardoso. Do mesmo modo, sem êxito, foi o II° Plano Nacional de 
Reforma Agrária em 2003, onde foi gestada novamente pela sociedade a esperança de 
construir uma nova fase da conquista de um território, mas isto não ocorreu. Elaborado 
por equipe coordenada por Plínio de Arruda Sampaio, no governo de Luíz Inácio Lula 
da Silva, no entanto, ainda que as ações sociais aumentassem, o PNRA não foi 
implementado na prática no território brasileiro, por a terra ser dotada de valores que 
garante formas de poder conservadoras nas mãos de quem as detém.1 
 
1.1 – O campesinato 
 
1 Ver in OLIVEIRA, Ariovaldo Umbelino de,Geografia das lutas no Campo, 1996, sobre o I° Plano 
Nacional de Reforma Agrária (PNRA). 
11 
 
 
O conceito de camponês tratado em várias abordagens teóricas procura dar conta 
da multiplicidade de modos de vida apresentada por essa classe de trabalhadores. 
Muitas vezes, referindo-se ao modelo clássico do campesinato russo, a conceituação não 
dá conta da diversidade histórico-social dentro da qual ele se apresenta. 
De fato o camponês da Rússia, assim como de outro local, tenderia a ter 
características diferenciadas, de modo que este sujeito é produto das relações social 
dentro do contexto no qual se origina. Para MARTINS (1995: 15) “La o campesinato 
resistia à expansão do capital porque era um campesinato apegado, ligado a terra (…) 
aqui ao contrário, o campesinato é uma classe não um estamento. É um campesinato que 
quer entrar na terra”. 
O autor Teodor Shanin , diz que: 
Camponês é uma mistificação. Para começar, “um camponês”, não existe em 
nenhum sentido imediato e estritamente específico. Em qualquer continente, 
estado ou região, os assim designados diferem em conteúdo de maneira tão 
rica quanto o próprio mundo. (SHANIN; 2005 : 01) 
 
O camponês é um sujeito que tem suas particularidades, por isso não cabe ver o 
camponês sem visualizar neste as diferentes particularidades que carrega nos 
determinados lugares. Desse modo a particularidade é inerente do camponês, 
O termo campesinato não implica a total semelhança dos camponeses 
em todo o mundo, e/ou sua existência fora do contexto de uma 
sociedade mais ampla não-apenas-camponesa e/ou extra-historicidade. 
Essas idéias são como espantalhos, coisas que as crianças se encantam 
m derrubar. Os camponeses diferem necessariamente de uma 
sociedade para outra e, também, dentro de uma mesma sociedade; 
trata-se do problema de suas características gerais e específicas. Os 
camponeses necessariamente refletem, relacionam-se e interagem com 
não camponeses; trata-se da questão da autonomia parcial de seu ser 
social. O campesinato é um processo e necessariamente parte de uma 
história social mais ampla; trata-se da questão da extensão da 
especificidade dos padrões de seu desenvolvimento, das épocas 
significativas e das rupturas estratégicas que dizem respeito aos 
camponeses. O conceito de camponês é seletivo; a questão é o que 
podemos aprender valendo-nos apenas dele. Os camponeses são uma 
mistificação; o problema é quando o são, como e quando não o são. 
(SHANIN; 2005: 18) 
 
Nas pesquisas de MARQUES (2008), ao trabalhar o conceito de campesinato, a 
autora cita Teodor Shanin: 
O campesinato é, ao mesmo tempo, uma classe social e um “mundo 
12 
 
diferente”, que apresenta padrões de relações sociais distintos - ou 
seja, o que também podemos denominar de modo de vida. Para ele, o 
campesinato é uma classe social de baixa “classicidade” que se insere 
na sociedade capitalista de forma subordinada e se levanta em 
momentos de crise. (SHANIN apud MARQUES; 2008: 59) 
 
Desse modo, ao analisar o camponês deve- se considerar vários elementos que 
inclui seu modo de vida, suas relações de trabalho com a terra, enfim, as 
particularidades e transformações dessa classe. SHANIN propõe que : 
O camponês deve ser compreendido, portanto, através da investigação 
das características do estabelecimento rural familiar camponês, tanto 
internas quanto externas, isto é, suas especificidades reações e 
interações com o contexto social mais amplo. (SHANIN; 2005: 05) 
O que realmente se quer dizer é que os camponeses representam uma 
especificidade de características sociais econômicas, que se refletirão 
em qualquer sistema societário em que operem. Que dizer também 
que a história camponesa se relaciona com as histórias societárias 
mais amplas, não como seu simples reflexo, mas com medidas 
importantes de autonomia. Em poucas palavras, significa que uma 
formação social dominada pelo capital, que abarque camponeses, 
difere daquelas em que não existem camponeses. (SHANIN;2005 : 
14) 
 
 Cabe destacar que o camponês não deve ser visualizado apenas como um 
modelo; existem outros elementos que caracteriza o camponês e sua unidade produtiva, 
como aparece em uma fala de José Vicente Tavares dos Santos: 
Na unidade produtiva camponesa, a força de trabalho é utilizada 
segundo seu valor de uso, pois é como atividade orientada de 
transformação de objetos que a capacidade de trabalho de cada 
membro possui significado para a família. Não se realiza a separação 
do trabalho da pessoa do trabalhador nem a consequente conversão da 
força de trabalho em mercadoria. Cada pessoa da família camponesa 
desempenha um trabalho útil e concreto, segundo o momento e anecessidade. Desse modo, estrutura- se no interior da família uma 
divisão técnica do trabalho, articulada pelo processo de cooperação, 
resultando numa jornada de trabalho combinada dos vários membros 
da família. Nesse sentido, a família camponesa transforma- se em um 
trabalhador coletivo. (SANTOS; 1978 :33-4) 
 A unidade camponesa de produção tem como uma de suas características básicas 
a força de trabalho familiar, como aparece no trabalho de SANTOS ( 1978 ) ao estudar 
o bairro rural de São Pedro no Rio Grande do Sul. A realidade imposta pelo capitalismo 
na agricultura brasileira impulsiona os camponeses a procurarem meios de 
permanecerem na terra- resistindo nela ou conquistando-a. 
13 
 
Para compreender o conceito de camponês na atualidade, devemos levar em 
conta um leque de questões caracterizadas pela resistência que o camponês trava 
diariamente contra o capital; essa exploração se manifesta de várias maneiras, como 
assentado, rendeiro, assalariado rural, posseiro, entre outras formas de se organizarem 
no campo. 
 Esses camponeses da atualidade são bem definidos em relação ao camponês do 
passado. Nos Parceiros do Rio Bonito, Antônio Candido cita: 
A sociedade que se formou do século XVI ao XVIII na área paulista 
de expansão só pode ser compreendida à luz de reflexões como estas, que 
dão a chave das acomodações sucessivas por que passou aqui o colonizador, 
nas vicissitudes da sua intensa mobilidade. A vida social do caipira 
assimilou e conservou os elementos condicionados pelas suas origens 
nômades. A combinação dos traços culturais indígenas e portugueses 
obedeceu ao ritmo nômade do bandeirante e do povoador, conservando as 
características de uma economia, largamente permeada pelas práticas de 
presa e coleta, cuja estrutura instável dependia da mobilidade dos indivíduos 
e dos grupos. Por isso, na habitação, na dieta, no caráter do caipira, gravou- 
se para sempre o provisório da aventura. (CANDIDO;1964:20) 
Para ele o “... o paulista se ajustou as técnicas do bugre, que lhe permitiram estreitar os 
laços com a terra,...” (CANDIDO;1964:34) 
 Isto seria uma característica fundamental para que o caipira tivesse uma relação de 
afetividade direta com a terra. Nesse sentido o autor aponta que o caipira fazia parte de: 
... um sistema de economia fechada, ou semifechada, ligada ao povoamento 
disperso, compreenderemos, no plano demográfico e econômico, a auto- 
suficiência que as caracteriza.(CANDIDO1964: 39) 
Antônio Candido comentava de um camponês que “... antigamente, a “gente do 
sítio” fazia tudo e raramente ia ao comércio, comprar sal.” (CANDIDO;1964: 21). Hoje estes 
camponeses tem uma relação direta com muitos produtos industrializados. Então eles deixaram 
de ser camponeses? Bem, notamos na pesquisa que não se trata de analisar o que estas pessoas 
consomem, mas levantar a ideia de que a sociedade se modifica de acordo com o espaço e com 
o tempo: isso altera o que consomem e a forma como consomem. As pessoas que se inserem 
14 
 
num padrão de vida e, ao modificá-lo, são introduzidos novos hábitos, porém o seu sentimento 
em relação a terra não muda. Ainda ficam animados com a chuva, com o sol, agradecem a Deus 
quando as plantas nascem, quando um animal nasce, enfim, são sensações que fazem parte de 
uma cultura camponesa. Esses sentimentos são construídos no contexto da sociabilidade 
camponesa, no cotidiano da produção e reprodução de um modo de vida. 
Entretanto, o camponês não vive um mundo fechado, ele mantém uma ligação 
com seu entorno, os bairros e as cidades, integrando-se de forma diferenciada no 
mercado: feiras, cooperativas, associações, etc. 
No entanto, é a partir da década de 50 do século XX, que de fato as organizações 
camponesas se destacam cada vez mais com caráter político e combatente, e também 
com ampla visão do sistema monopolizador do capital, trazendo novas perspectivas para 
a luta camponesa num sentido amplo. Para OLIVEIRA: 
Foi, pois, nesse processo combativo que os trabalhadores do campo 
foram forjando os movimentos sociais de luta pela terra e pelo 
estabelecimento de relações de trabalho condizentes com a dignidade 
humana. (OLIVEIRA;1996: 18) 
Entre outras organizações destacamos as Ligas Camponesas entre a década de 50 
a 60, OLIVEIRA salienta que 
..o movimento das Ligas Camponesas tem que ser entendido, não 
como um movimento local, mas como manifestação nacional de um 
estado de tensão e injustiças a que estavam submetidos os 
trabalhadores do campo e as profundas desigualdades nas condições 
gerais do desenvolvimento capitalista no país (OLIVEIRA;1996: 26) 
 
Esse processo de organização camponesa antecedeu e germinou mais tarde, logo 
após a ditadura militar em 1984, o nascimento dos Movimento dos Trabalhadores 
Rurais Sem Terra, que hoje representa um dos movimentos mais expressivos e com 
caráter fortemente critico no campo brasileiro. Segundo Fernandes: 
 
Assim, por meio da ocupação de terra, os trabalhadores sem-terra do campo 
e da cidade se ressocializam, resistindo e se subordinando ao capital, porque 
ao ocuparem a terra, se (re) inserem no processo de diferenciação e podem 
15 
 
ser novamente expropriados e outra vez se ressocializarem. Desenvolvem-se 
assim, o intenso e tenso processo de territorialização da luta pela terra. O 
sentido dessa resistência na luta contra o capital é lutar para continuarem 
sendo eles mesmos. Resistem para não se tornarem assalariados, nem 
capitalistas. Portanto, muitos trabalhadores, conscientes do “destino”, lutam 
contra esta desventura. (FERNANDES; 2001:32) 
 
Diante disso coloca-se o campesinato num embate social, econômico e político 
contra o avanço capitalista no campo, enquanto classe camponesa trazendo através da 
Reforma Agrária formas de resistências e também caminho para o socialismo. 
 
 
1.2 - Índios, migrantes, posseiros: a história de Andradina; 
 
 
Este capítulo será parte de um esforço em apresentar a região dentro do estado, 
onde fincou os antecedentes que demarcaram o Assentamento Timboré. Contaremos 
com a contribuição de alguns autores. Pierre Monbeig, com sua riquíssima contribuição 
do processo de expansão dos povoamentos e lavouras no estado de São Paulo. Luziana 
Queiróz Alcântara, argumentando sobre a origem de Andradina. Ariovaldo Umbelino de 
Oliveira, tratando- se das questões do campo e o avanço, para o ocidente paulista. 
SelmaR. A. Micheletto, o Assentamento Timboré como um novo paradigma na 
Reforma Agrária (...) 
Como sabemos a história do Brasil é parte das contradições. As iniciativas de 
“descobrimento” e colonização é resultado de incentivos para apropriar ao máximo das 
riquezas dos espaços: uma espécie cíclica de “desbravamento” (destruimento) dos bens 
naturais. Aí, junta- se a madeira, o ouro (pedras em geral), petróleo, sementes,... enfim, 
tudo que possa possibilitar o lucro de quem domina em uma dada sociedade. 
Desse modo, compreendemos que o estado de São Paulo é parte desse processo 
avassalador do desenvolvimento econômico. Ao que se sabe a história do interior 
paulista teve início a partir da coragem de muitos camponeses que se desafiaram a viver 
neste espaço. Pierre Monbeig traz uma grande contribuição em seu trabalho, 
16 
 
informando dentre outros, o processo de desenvolvimento econômico e populacional no 
interior paulista. 
O que se sabia, segundo Monbeig, naquele período, é que esta região era 
formada por florestas, pouco se sabia até então. 
 Assim, em 1870, os planaltos e florestas do oeste de São Paulo e do norte do 
Paraná constituíam vasto sertão, região mal conhecida, habitada sobretudo 
por índios, na qual se perdiam alguns sertanistas audazes. O sertão ocidental 
escapava completamente à economia da Província . ( MONBEIG;1984:27) 
O autor destaca que nos séculos passados ouve um incentivo em mapear e 
povoar zonas do interior paulista, estrategicamente, mas perceberam que não seriacompensador. Portanto, isso só foi possível no final do século de XIX. 
 Assim, os planaltos ocidentais de São Paulo e do norte o Paraná 
esperaram até o último quartel do século XIX, para se tornarem zonas 
pioneiras. Entretanto como já foi visto, tinham sido atravessados pelos 
portugueses, no curso do período colonial. Provindos do Paraguai, pelo vale 
do Paraná, os jesuítas haviam subido os rios Ivaí e Paranapanema, 
estabelecendo pontos de povoamento. Mas, caçando índios, os paulistas 
tinham destruído as missões, não deixando mais que ruínas. 
 Desde que a experiência revelou ser o índio um escravo de pouco valor, 
desde que se esgotaram as minas do Mato Grosso, foram abandonadas as 
navegações penosas. Caíram no olvido os caminhos antigos, salvo a estrada 
de Goiás, facilmente acessível. Certo se conservava a recordação legendária 
dos antigos itinerários de penetração: os paulistas não cessaram de celebrar o 
Tiete, rio paulista em todo o seu curso e cuja navegação nunca parou 
completamente. Já não eram, porém, suficientes os motivos capazes de 
animar as energias; já não havia riquezas a conquistar, nem homens em 
número bastante para lançar- se a empresas tão perigosas. Foi o que se viu 
claramente, em 1857, quando o Imperador Pedro II tentou uma experiência 
de colonização militar, na margem direita do baixo Tiete, em Itapura: a 
penetração não partia mais de São Paulo, porém do Mato Grosso e do 
Triângulo Mineiro. As distâncias eram por demais longas, o isolamento por 
demais acentuado, e a própria colônia rapidamente caiu em ruínas. 
17 
 
 A conjuntura só tornou a ser favorável por volta de 1870 e é nessa 
época discernimos as verdadeiras causas do movimento de conquista dos 
planaltos ocidentais. Essas causas não são apenas paulistas, nem somente 
brasileiras. A marcha ininterrupta da frente de povoamento, não passa de um 
aspecto da explotação do pelos brancos. Tanto em suas origens, como em 
sua continuidade, ela se prende, por sobre os oceanos, às condições técnicas, 
econômicas e políticas do mundo. Complexo jogo de circunstâncias locais, 
de ordem natural e social, e de oportunidades muito mais gerais, que é 
preciso deslindar, se se quiser compreender por que os paulistas invadiram 
os planaltos ocidentais, ao findar o século XIX, e por que, desde então, não 
se deteve essa arrancada.( MONBEIG;1984:94) 
De modo geral as iniciativas são produto das necessidades do capital. A nossa 
análise parte da ideia que Andradina é fruto dos interesses de determinados grupos 
econômicos e do Estado, que vieram a procura de benefícios que o interior paulista 
pudesse dar. Esse fato, embora contraditório permitiu, a inquietação dos sujeitos, 
incentivando o nascimento de futuros conflitos e a territorialização de vários 
assentamentos, de modo peculiar, o Timboré. 
A história da ocupação da região iniciou- se através dos índios Kaingang 
(Caigangues) que adentraram pelo continente refugiando do litoral onde o homem já 
havia de apropriado das suas terras e fixaram- se as margens de confluência dos rios 
Tiete e Paraná, atraídos pelos recursos naturais em especial a piracema. Viviam gozando 
dos bens naturais em relação mútua e direta com os animais e plantas. Ariovaldo afirma 
que: “A formação do Brasil foi feita através da destruição de muitas nações indígenas.” 
( OLIVEIRA;1996:55) 
Neste aspecto, durante muito tempo foi se findando as nações indígenas para dar 
espaço ao novo arranjo do capital. 
O território capitalista brasileiro foi produto da conquista e destruição do 
território indígena. Espaço e tempo do universo cultural índio foram sendo 
moldados ao espaço e tempo do capital. (OLIVEIRA;1996:11) 
Esse processo no decorrer da história foi destruidor e muito violento em todo o 
período, deixando um legado humilhante para a sociedade que promoveu e ainda 
promovem o extermínio de nossos irmãos- camponeses, nas palavras de Ariovaldo, a 
18 
 
nível de Brasil: “Esta história, de destruição e dominação, fez com que dos 5 milhões de 
índios restassem hoje pouco mais de 220 mil. (Ibidem, p. 56) 
Da população indígena do interior paulista, sabe- se que durante pouco tempo 
foram dizimados e expulsos da região durante os vários confrontos que tiveram com os 
construtores das estradas de ferro. 
 Com o fim dos índios Kaingang a cartografia da região modificou- se 
novamente. Os índios foram substituídos no intuito de dar lugar as novas necessidades 
politicas econômicas do homem branco como pode ser visto por Micheletto: 
 
A ocupação branca do noroeste paulista até 1908 atendia a dois 
objetivos básicos: um estratégico- Militar, relacionado a busca de um 
caminho alternativo pela região pantanal para se atingir a bacia do 
Paraná em função da guerra do Paraguaí e, outro, econômico, 
relacionado ao processo de ocupação de novas terras para o plantio do 
café. ( MICHELETTO;2003:78) 
 
Para MONBEIG: 
... o governo Federal por motivos políticos e estratégicos, havia 
deliberadamente ativado a construção da estrada de ferro que, partindo de 
Bauru, dirigir- se- ia a Mato Grosso e iria atingir as margens do rio 
Paraguai. No território paulista, essa linha, a “Noroeste”, iria atingir vastas 
reservas florestais, situadas entre os vales do Tiete e do Feio- Aguapeí, com 
suas terras virgens frequentemente propícias 
aocafeeiro.(MONBEIG;1984:182) 
As aglomerações se intensificaram graças a três características marcantes: a 
primeira, a construção da ferrovia que ligava a capital ao noroeste paulista o estado 
onde atualmente compreende a cidade de Andradina. A segunda, foi a construção das 
três usinas hidrelétricas, localizadas em Ilha Solteira, Pereira Barreto e Castilho (divisa 
do estado de São Paulo e Mato Grosso do Sul). E o terceiro: esses fatores estimularam a 
burguesia Agrária, no sentido de se apropriarem da oportunidade para implantar seu 
poder de concentração fundiária, compravam do estado de São Paulo os títulos de posse 
da terra. Antônio Joaquim de Moura Andrade, detentor de 20 mil alqueires de terra, cujo 
19 
 
o sobrenome deu origem ao nome de Andradina, foi o principal investidor. Ao que se 
sabe, nas palavras de ALCANTARA(2001): 
por volta de 1927 o Estado de São Paulo vendia terras devolutas , com 
títulos de origem do próprio governo para estimular a colonização e 
desenvolver a agricultura em terras despovoadas. Moura Andrade 
comprou 20.000 alqueires na margem do rio Tietê com a reta da ilha 
Seca. ( ALCANTARA;2001:18) 
 
Muitos acreditam que estas iniciativas foram formas de reforma agrária na 
região, mas, o que está por trás desse processo é a maneira que estes comerciantes de 
terras ou especuladores manipulavam a estrutura local desta sociedade. Se por lado, 
dividiam a terra com pagamento com parcelas, de outro, as famílias acabavam por 
serem reféns do processo, pois estes comerciantes eram donos da terra, do armazém da 
cidade, açougue, farmácia, olarias, serrarias, casa bancária, e outros. MONBEIG(1984) 
relata que algumas famílias do interior paulista conseguiram aumentar sua intervenção 
de modo que, 
(...)Assim, estava a família Prado bem situada nas posições chaves do 
movimento pioneiro- a terra, o comércio, o banco, os meios de transporte, a 
organização da mão- de- obra, o poder político- graças aos postos ocupados 
por seus membros e por suas alianças com famílias similares. (MONBEIG; 
1984:141) 
Essas famílias aumentaram seu poder político e aquisitivo concentrando vários 
ramos econômicos. É importante destacar ainda que a idéia de pioneirismo que aqui se 
aponta como frente pioneira, está relacionada com a própria expansão do capital sob o 
controle das elites agrárias e empresariais. Cabe destacar a análise de José de Souza 
Martins quanto a este aspecto: 
Estamos de fato diante de dois movimentos distintos e combinados de 
ocupação territorial, que ocupam de forma distinta e conflituosas entre 
si territórios via de regrajá ocupados por sociedades tribais. Através 
de deslocamento de posseiros é que a sociedade nacional, isto é, 
branca se expande sobre os territórios tribais. Essas frentes de 
ocupação territorial podem ser chamadas de frente de expansão. Um 
segundo movimento é constituído pela forma empresarial e capitalista 
de ocupação do território- é a grande fazenda, o banco, a casa de 
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comércio, a ferrovia, a estrada, o juiz, o cartório, o Estado. É nessa 
frente que surge o que em nosso país se chama hoje, indevidamente, 
de pioneiro. São na verdade os pioneiros das formas sociais e 
econômicas de expansão e dominação vinculadas as classes 
dominantes e ao Estado. Essa frente pioneira é essencialmente 
expropriatória porque está socialmente organizada com base numa 
relação fundamental embora não exclusiva, que é a de compradores e 
vendedores de força de trabalho. ( MARTINS, J S apud 
MICHELETTO;2003:79) 
 
 A cidade de Andradina foi fundada em 1937, no mesmo ano em que chegou a 
estrada de ferro em Andradina, e funcionava como um imã que atraia grande 
contingente de imigrantes e migrantes em sua maioria nordestinos que fugiam em maior 
parte da expropriação e exploração dos senhores de engenho: devido a concentração 
fundiária que continuou sendo um traço marcante da área nordestina (RAMOS, P , 
2007). Os trabalhos nas fazendas de café e as obras das ferrovias e das usinas 
hidrelétricas favoreceram o aumento de mão de obra na região. Dessa forma, 
reconstruíram o território e certamente mais tarde seriam expropriados novamente, 
convivendo com a fome e a miséria com o fim das construções das usinas e a chegada 
da pecuária na década de 60. 
 Retomando a fala de ALCANTARA, onde menciona que a cidade de Andradina: 
Nasceu Andradina, em 11 de Julho de 1937. Milhares de heróis 
anônimos foram sacrificados em sua edificação; uns pela violência da 
luta e outros pelas edemias. A malária tinha aqui seu reinado, nos 
banhados dos rios, nos córregos e nas lagoas; as onças e as serpentes 
traiçoeiras completavam o ambiente agressivo. ... A leishmaniose ou 
úlcera de Bauru, escreveu hediondo capítulo à parte, na tragédia dos 
desbravadores da Noroeste. ...Nascida dois anos antes da Segunda 
guerra, Andradina cresceu sobre racionamento de tudo, desde o 
quinino para cura da malária naquele tempo, até a deficiência dos 
transportes, por falta de combustível e estradas....elevação a distrito, 
em 10 de novembro de 1937, pertencendo inicialmente ao município 
de Valparaiso, desmembrado do mesmo... passando a constituir o 
município de Andradina...( Enciclopédia dos Municípios Brasileiros 
apud ALCANTARA;2001:62) 
 
Nesse aspecto, percebe- se que o processo de povoação deu- se de maneira 
conflitiva com os índios, além das doenças no interior paulista. Isso nos remete a 
vislumbrar a dificuldade dos sujeitos madeireiros, construtores das estradas de ferro, 
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construtores das usinas hidrelétricas que encontraram nesta região. 
 É necessário entender que este vai e vem da história é essencial para o 
desenvolvimento do capitalismo. Este anseio de transformar, modificar, refazer, é parte 
do movimento contraditório do capital. De muitos territórios só se constroem quando se 
destrói outro, talvez seja o empecilho na luta dos assentados, pois a destruição está 
dentro do capitalismo e as barreiras os determinam a todo o momento. O território do 
índio foi superado pelo “homem branco” (Estado, concessionárias, grileiros, 
fazendeiros...), as estradas de ferro expropriaram terras e famílias, o café foi substituído 
pelo gado, agora a cana recobre a paisagem e seguem-se os ciclos econômicos 
alternando-se as formas de apropriação das terras e de expropriação dos trabalhadores.

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