Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA “JÚLIO DE MESQUITA FILHO” FACULDADE DE CIÊNCIAS HUMANAS E SOCIAIS JULIANA DE CARVALHO PIMENTA A RELAÇÃO FAMÍLIA – ESCOLA: CONCEPÇÕES E PRÁTICAS FRANCA 2014 JULIANA DE CARVALHO PIMENTA A RELAÇÃO FAMÍLIA – ESCOLA: CONCEPÇÕES E PRÁTICAS Tese apresentada à Faculdade de Ciências Humanas e Sociais, da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”, para obtenção do Título de Doutora em Serviço Social. Área de Concentração: Serviço Social: Trabalho e Sociedade. Orientadora: Prof.a Dra. Cirlene Aparecida Hilário da Silva Oliveira FRANCA 2014 Pimenta, Juliana de Carvalho A relação família – escola : concepções e práticas / Juliana de Carvalho Pimenta. – Franca : [s.n.], 2014. 227 f. Tese (Doutorado em Serviço Social). Universidade Estadual Paulista. Faculdade de Ciências Humanas e Sociais. Orientador: Cirlene Aparecida Hilário da Silva Oliveira. 1. Ensino profissional. 2. Família. 3. Serviço social. I. Título. CDD – 370.981 JULIANA DE CARVALHO PIMENTA A RELAÇÃO FAMÍLIA – ESCOLA: CONCEPÇÕES E PRÁTICAS Tese apresentada à Faculdade de Ciências Humanas e Sociais, da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”, para obtenção do Título de Doutora em Serviço Social. Área de Concentração: Serviço Social: Trabalho e Sociedade. BANCA EXAMINADORA Presidente: _________________________________________________________ Prof.a Dra. Cirlene Aparecida Hilário da Silva Oliveira 1º Examinador: ______________________________________________________ Prof. Dr. Ney Luiz Teixeira de Almeida 2º Examinador: ______________________________________________________ Profa. Dra. Lúcia Aparecida Parreira 3º Examinador: ______________________________________________________ Profa. Dra. Eliana Bolorino Canteiro Martins 4º Examinador: ______________________________________________________ Profa. Dra. Nayara Hakime Dutra Oliveira Franca, 16 de junho de 2014. AGRADECIMENTOS Agradeço à Deus e sua imensa misericórdia que me concedeu força e coragem necessárias para enfrentar as adversidades em minha vida. Sua generosidade infinita tem me proporcionado inúmeras graças, dando-me a certeza de que me carrega em seus braços sempre que preciso. Aos meus pais José (in memorian) e Edirle por me darem a oportunidade de construir minha trajetória educacional e profissional apesar de todas as dificuldades. Muitas leituras realizadas para realização deste estudo me fizeram reviver momentos de minha infância, principalmente relacionados a presença e participação constante de minha mãe nas atividades escolares, atitudes que se repetem também em relação aos netos. Muito obrigada! Ao Luis Roberto Pimenta, meu esposo e companheiro há quase duas décadas. Sem você esta tese não teria se concretizado. Obrigado, pois sei que muitas vezes abdicou de suas coisas para que eu pudesse concluir as minhas. Obrigada pela dedicação e compromisso que dedicas à nossa família e por dividir comigo a tarefa de educar e cuidar de nosso bem mais precioso, nosso Davi. Te amo! Ao Davi prova concreta do imenso amor de Deus por mim, criança esperada e sem dúvida alguma muito amada que sabe retribuir diariamente o amor e afeto recebido. Sua paixão pelos livros e sua sede de aprender me encantam, suas histórias contadas ao longo dos dias exaustivos me fizeram muitas vezes esquecer o cansaço. Seu processo de escolarização, iniciado tão cedo, me faz refletir constantemente sobre o objeto de estudo desta tese. Obrigada meu filho! Te amo infinitamente! À minha orientadora Profa. Dra. Cirlene Aparecida Hilário da Silva Oliveira profissional que admiro de longa data pela capacidade de ouvir, falar e principalmente, de compartilhar os conhecimentos adquiridos. Obrigada por respeitar o meu tempo, as minhas limitações e, sobretudo, valorizar o meu trabalho. À toda minha família, a de origem e a que herdei ao me casar, pelo acompanhamento de minha jornada no doutorado. Vocês foram fundamentais nesse processo, cada uma com suas particularidades e necessidades, e formas sutis de manifestação de apoio e atenção. Aos amigos Maria Aparecida de Lourdes Coelho, João Batista Mamédio, Alexandre Marques Mendes e Rita de Cássia Lopes Oliveira Mendes, Luis Roberto Barbosa, Renata Chioca, Manoel Ambrósio e Elaine Alves de Lima amigos de todas as horas, amizade construída ao longo de nossas vidas e que se mantém nos dando a certeza de querermos estar sempre perto, ainda que distantes. Vocês são especiais! Aos colegas de trabalho do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia – Câmpus Barretos em especial à amiga Renata Niscizak Villela que assumiu comigo o desafio de intervir junto ao projeto de parceria. Sua delicadeza e sensibilidade nunca a impediram de realizar os enfretamentos necessários. Obrigada por me receber nesta cidade e pela escuta sensível, pela generosidade e disponibilidade em ajudar. Te admiro muito! Às assistentes sociais da Secretaria Municipal de Educação do município de Franca que corajosamente enfrentam o desafio de atuação em uma área que até pouco tempo era pouco explorada pela categoria. Conheço bem cada uma de vocês e sei o quanto se comprometem em tudo aquilo que fazem. Aprendi muito com todas vocês. Em especial à Rita Mara Gonçalves Querino e Kátia Cristina Guerreiro Comparini com as quais dividi muitas de minhas inquietações. Aos meus companheiros de docência do Centro Universitário da Fundação Educacional de Barretos pela luta comprometida com a formação de qualidade dos estudantes de Serviço Social desta instituição de ensino. Muitas de nossas discussões contribuíram para a realização deste estudo. Aos sujeitos desta pesquisa: pais, docentes e discentes que aceitaram prontamente oferecer sua contribuição para a conclusão deste estudo. PIMENTA, Juliana de Carvalho. A relação família – escola: concepções e práticas. 2014. 227 f. Tese (Doutorado em Serviço Social) – Faculdade de Ciências Humanas e Sociais, Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”, Franca, 2014. RESUMO Esta tese assumiu o desafio de compreender a complexa realidade vivenciada pela escola e pela família no que diz respeito ao estabelecimento de estratégias de fortalecimento da relação entre estas duas instituições responsáveis pelo desenvolvimento dos indivíduos sociais. Tem como objeto de estudo análise dos fatores que interferem na relação entre escola e família diante das convergências e divergências que favorecem ou dificultam o estabelecimento de estratégias de fortalecimento mútuo e enfrentamento dos problemas vivenciados pela escola pública. Para atender aos objetivos do estudo utilizou-se da pesquisa documental, bibliográfica e de campo. A pesquisa de campo teve como lócus de investigação o Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de São Paulo – Câmpus Barretos. A pesquisadora estabeleceu como objetivo geral analisar os diferentes fatores que interferem na relação estabelecida entre escola e família a partir da experiência de implantação dos cursos técnicos integrados ao ensino médio do IFSP – Câmpus Barretos. Os objetivos específicos foram determinados da seguinte maneira: a) compreender as transformações societárias que provocam rebatimento nos deferentes segmentos da sociedade contemporânea entre estes a família ea escola; b) explicar as mudanças ocorridas na política pública de educação; c) compreender os principais fatores que favorecem ou dificultam o relacionamento entre família e escola. Para o cumprimento de tais objetivos foi necessário o aporte da pesquisa qualitativa, utilizando-se a análise de conteúdo para interpretação dos dados obtidos mediante realização da pesquisa de campo que teve como categorias de análise: 1) a participação da família na escola; 2) o acompanhamento dos deveres; 3) a valorização da escola; 4) as transformações da família. A partir do percurso metodológico da pesquisa observou-se a dificuldade em obtenção de referenciais teóricos científicos que abordasse o assunto. Embora a aproximação entre escola e família seja apontada por educadores, pais, estudantes como um fator de extrema importância para o resultado satisfatório do processo de aprendizagem, poucos estudiosos tem se dedicado a compreensão de como essa relação vem sendo construída por todos. Esse talvez seja um dos méritos deste estudo, que problematiza essa questão, sem, no entanto encerrar por definitivo o assunto, visto se tratar de um processo em construção, e em consequência, em transformação, de acordo com a influência dos sujeitos. Espera-se contribuir com as discussões acerca da temática e contribuir para o debate das questões apontadas pelo estudo. Palavras-chave: educação profissional. família. política educacional. PIMENTA, Juliana de Carvalho. La relación familia - escuela: conceptos y prácticas. 2014. 227 f. Tesis (Doctorado en Trabajo Social) - Facultad de Humanidades y Ciencias Sociales de la Universidad Estadual Paulista "Júlio de Mesquita Filho", Franca, 2014 . RESUMEN En esta tesis se asumió el reto de comprender la compleja realidad que enfrenta la escuela y la familia en relación con el establecimiento de estrategias para fortalecer la relación entre las dos instituciones responsables del desarrollo de los individuos sociales. El objeto de análisis del estudio de los factores que afectan a la relación entre la escuela y la familia antes de que las convergencias y divergencias que favorecen o dificultan el establecimiento de estrategias de refuerzo mutuo y abordar los problemas experimentados por la escuela pública. Para cumplir con los objetivos del estudio se utilizó el documental, bibliográfica y trabajo de campo. La investigación de campo fue investigar el Instituto locus Federal de Educación, Ciencia y Tecnología de São Paulo - Barretos Câmpus. El investigador se fijó como objetivo general analizar los distintos factores que influyen en la relación entre la escuela y la familia a partir de la experiencia del despliegue de la integral de la escuela secundaria los cursos técnicos IFSP - Barretos Câmpus. Los objetivos específicos fueron determinados de la siguiente manera: a) comprender las transformaciones sociales que causan plegable en segmentos deferentes de la sociedad contemporánea entre estas familias y las escuelas; b) explicar los cambios en la política de la educación pública; c) comprender los factores clave que favorecen o dificultan la relación entre familia y escuela. Para cumplir estos objetivos se requieren la contribución de la investigación cualitativa, utilizando el análisis de contenido para interpretar los datos obtenidos mediante la realización de investigaciones sobre el terreno tenían categorías de análisis: 1) la participación de la familia en la escuela; 2) el seguimiento de funciones; 3) la valoración de la escuela; 4) cambio de la familia. Desde el enfoque metodológico de la investigación señaló la dificultad en la obtención de los marcos teóricos científicos que abordan el tema. Aunque el acercamiento entre la escuela y la familia es indicado por los educadores, los padres, los estudiantes como un factor extremadamente importante para el éxito del proceso de aprendizaje, pocos estudios se han dedicado a la comprensión de cómo esta relación se ha construido por todos. Este es quizás uno de los méritos de este estudio, que analiza esta cuestión, pero sin cerrar por la última cuestión, ya que este es un proceso en curso y, en consecuencia, el cambio de acuerdo a la influencia de los sujetos. Se espera contribuir a los debates sobre el tema y contribuir a la discusión de las cuestiones identificadas en el estudio. Palabras clave: educación profesional. familiar. la política educativa. PIMENTA, Juliana de Carvalho. Il rapporto famiglia - scuola: concetti e pratiche. 2014. 227 f. Tesi di Laurea (Dottorato di Ricerca in Servizio Sociale) - Facoltà di Scienze Umane e Sociali, Universidade Estadual Paulista "Júlio de Mesquita Filho", Franca , 2014. ASTRATTO Questa tesi ha accettato la sfida di comprendere la complessa realtà cui versa la scuola e la famiglia per quanto riguarda la definizione di strategie per rafforzare il rapporto tra le due istituzioni responsabili dello sviluppo di individui sociali . L' oggetto di analisi studio dei fattori che influenzano il rapporto tra scuola e famiglia prima che le convergenze e le divergenze che favoriscono o ostacolano la creazione di reciproco rafforzamento delle strategie e affrontare i problemi che la scuola pubblica . Per soddisfare gli obiettivi dello studio abbiamo utilizzato il documentario , bibliografico e di ricerca sul campo . La ricerca sul campo è stato quello di ricercare l'Istituto locus federale dell'Istruzione, della Scienza e della Tecnologia di São Paulo - Câmpus Barretos . Il ricercatore ha come obiettivo generale quello di analizzare i vari fattori che influenzano il rapporto tra scuola e famiglia dall'esperienza della realizzazione del integrato liceo corsi tecnici IFSP - Câmpus Barretos . Gli obiettivi specifici sono stati determinati come segue : a) comprendere le trasformazioni sociali che causano pieghevole in segmenti deferente della società contemporanea tra queste famiglie e le scuole ; b) spiegare i cambiamenti nella politica pubblica istruzione ; c) comprendere i fattori chiave che favoriscono o ostacolano il rapporto tra famiglia e scuola . Per realizzare questi obiettivi richiesti il contributo della ricerca qualitativa , utilizzando l'analisi dei contenuti per interpretare i dati ottenuti effettuando ricerche sul campo avevano categorie di analisi : 1) la partecipazione della famiglia nella scuola ; 2) compiti di monitoraggio; 3) la valutazione della scuola ; 4) il cambiamento della famiglia . L'approccio metodologico della ricerca ha preso atto della difficoltà di ottenere strutture scientifiche teoriche che hanno affrontato il problema . Anche se l'approccio tra scuola e famiglia è indicato da educatori , genitori , studenti come un fattore estremamente importante per il buon esito del processo di apprendimento , pochi studi sono stati dedicati alla comprensione di come questo rapporto è stato costruito da tutti. Questo è forse uno dei meriti di questo studio, che discute il problema, senza però chiudere il numero finale , in quanto questo è un processo continuo , e, di conseguenza , cambiando secondo l'influenza dei soggetti . Dovrebbe contribuire alle discussioni sul tema e contribuire alla discussione di questioni individuate nello studio . Parole chiave: professionale educazione. Famiglia. politica educativa. LISTA DE TABELAS Tabela 01 Sujeitos da pesquisa ................................................................ 26 Tabela 02 Dados de Implantação dos campi do IFSP .............................. 111 Tabela 03 Gestão IFSP ............................................................................ 112 Tabela 04 Cursos Técnicos do IFSP ........................................................ 114 Tabela 05 Relação Cursos Superiores IFSP ............................................ 115 Tabela 06 Relação Cursos Pós-graduação IFSP ..................................... 116 Tabela 07 Sexo dos Ingressantes do cursoIntegrado ............................. 131 Tabela 08 Idade dos Ingressantes do curso Integrado ............................. 132 Tabela 09 Resultado Final ano letivo 2012 ............................................... 133 Tabela 10 Quantidade de Pessoas por família ......................................... 135 LISTA DE QUADROS Quadro 01 Relação entre cursos técnicos e vestibular para ingresso no ensino superior (1953) ................................................................................. 92 Quadro 02 Cursos Oferecidos no Câmpus Barretos em 2012 ........................... 122 Quadro 03 Docentes da área de recursos naturais ............................................ 125 Quadro 04 Docentes da área de informática ...................................................... 126 Quadro 05 Docentes da área de serviços .......................................................... 126 Quadro 06 Dados da renda familiar per capita dos ingressantes ....................... 136 LISTA DE FIGURAS Figura 01 Mapa da Rede Federal .................................................................. 101 Figura 02 Mapa da Expansão da Rede federal até 2010 .............................. 105 Figura 03 Fachada do Câmpus Barretos ....................................................... 120 LISTA DE SIGLAS ABE Associação Brasileira de Educação AEC Associação dos Educadores Católicos ANDE Associação Nacional de Educação ANDES Associação Nacional de Docentes do Ensino Superior ANFOPE Associação Nacional de Formação dos Profissionais da Educação ANPAE Associação Nacional dos profissionais de Administração Educacional ANPED Associação Nacional de Pesquisa e Pós-graduação em Educação BID Banco Interamericano para o Desenvolvimento BIRD Banco Internacional para Reconstrução e Desenvolvimento CAE Coordenadoria de Apoio ao Ensino CBAS Congresso Brasileiro de Assistentes Sociais CBE Conferência Brasileira de Educação CEFET Centro Federal de Educação Tecnológica CEPAL Comissão Econômica para a América Latina e Caribe CFESS Conselho Federal de Serviço Social CNBB Conferência Nacional dos Bispos do Brasil CNTE Confederação Nacional dos Trabalhadores da Educação CONED Congresso Nacional de Educação CONSED Conselho de Secretários de Estado de Educação CRE Coordenadoria de Registros Escolares CRESS Conselho Regional de Serviço Social EJA Educação de Jovens e Adultos FIC Formação Inicial e Continuada FMI Fundo Monetário Internacional FUNDEB Fundo de Manutenção e Desenvolvimento Da Educação Básica e de Valorização do Magistério FUNDEF Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério GAD Gerência Administrativa GED Gerência Educacional HTPC Hora de Trabalho Pedagógico Coletivo IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística IF Instituto Federal 2 IFSP Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de São Paulo INAF Índice de Alfabetismo Funcional INEP Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais IRCARD Instituto de Treinamento em Técnicas Minimamente Invasivas e Cirurgia Robótica LDB Lei de Diretrizes e Bases LDBEN Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional MEC Ministério da Educação NAPNE Núcleo de Atendimento de Necessidades Educacionais Especiais PAE Programa de Assistência Estudantil PCN Parâmetros Curriculares Nacionais PNAES Política Nacional de Assistência Estudantil PNUD Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento SEE Secretaria de Educação do Estado de São Paulo SENAC Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial SENAI Serviço Nacional da Indústria TAE Técnico em Assuntos Educacionais UNDIME União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação UNESCO Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e a Cultura UNICEF Fundo das Nações Unidas para a Infância USP Universidade de São Paulo SUMÁRIO INTRODUÇÃO.................................................................................................. 15 Metodologia da Pesquisa ................................................................................ 20 CAPÍTULO 1 MARCOS DA POLÍTICA EDUCACIONAL BRASILEIRA ......... 28 1.1 A política pública de educação: análise entre a década de 1960 e a atualidade ................................................................................................ 28 1.2 A Influência do Neoliberalismo na Educação ....................................... 66 1.2.1 Revolução tecnológica, precarização do trabalho: desafios à classe trabalhadora ............................................................................................ 73 1.2.2 Neoliberalismo e educação...................................................................... 74 CAPÍTULO 2 A EDUCAÇÃO PROFISSIONAL NO BRASIL .......................... 86 2.1 A trajetória da educação profissional brasileira: avanços e limites ... 86 2.2 Os Institutos Federais de Educação, Ciência e Tecnologia e o compromisso com a formação profissionalizante do país ................. 107 2.3 O IFSP Câmpus Barretos ........................................................................ 117 2.3.1 O IFSP Câmpus Barretos e o ensino profissional integrado ao ensino médio....................................................................................................... 128 CAPÍTULO 3 A FAMÍLIA BRASILEIRA EM QUESTÃO – ORIGEM, TRANSFORMAÇÃO E A INTERFACE COM A ESCOLA ....... 139 3.1 A família brasileira e sua constituição histórica, cultural e social ..... 142 3.2 Configurações Familiares Contemporâneas: apontamentos e problematizações ............................................................................... 158 3.3 Família e Escola: construções ou desconstruções ............................. 181 CONSIDERAÇÕES ........................................................................................... 227 REFERÊNCIAS .............................................................................................. ... 231 15 INTRODUÇÃO O presente estudo assumiu o desafio de compreender a complexa realidade vivenciada pela escola e pela família no que diz respeito ao estabelecimento de estratégias de fortalecimento da relação entre estas duas instituições diretamente envolvidas no desenvolvimento dos indivíduos sociais. O interesse pelo tema acompanha a autora há algum tempo visto que a mesma exerce suas atividades profissionais enquanto assistente social na área da educação desde 1996. Entre maio do referido ano e junho de 2011 atuou na Prefeitura Municipal de Franca com vínculo junto à Secretaria de Educação onde desenvolveu vários projetos direcionados à educação básica, entre outras ações. Em 2008 assumiu a coordenação da equipe técnica de Serviço Social função exercida até junho de 2011 quando se desligou da empresa para assumir o cargo de assistente social junto ao Instituto Federal de Educação Ciência e Tecnologia de São Paulo1 (IFSP) - câmpus de Barretos. No IFSP a pesquisadora encontra-se vinculada ao Serviço Sociopedagógico que prevê em sua constituição a atuação de profissionais das áreas de Pedagogia, Psicologia, Serviço Social e de Técnicos em Assuntos Educacionais (TAEs), profissionais que necessitam de formação em qualquer licenciatura para exercer suas funções. Embora pressuponha a presença destes profissionais, cada câmpus foi colocando em funcionamento seu Serviço Sociopedagógico de acordo com suas necessidades e também considerando a visão do diretor geral responsável pelas definições das contratações. O Câmpus Barretos, por exemplo, até o final do segundo semestre de 2012 era formado apenas por um assistente social e uma TAE queacumulava a função de Coordenadora de Apoio ao Ensino (CAE). 1 Em 2010 já estavam em pleno funcionamento 38 institutos com 314 campi espalhados em todo país com previsão de expansão da rede. Oferecendo cursos técnicos preferencialmente integrados ao ensino médio e graduações tecnológicas e licenciaturas os Institutos Federais visam oferecer educação de qualidade acessível a jovens e adultos das camadas populares da sociedade brasileira. 16 Ao assumir suas atividades no IFSP – Barretos a pesquisadora teve como demanda inicial a elaboração do plano de trabalho para implantação do Programa de Assistência Estudantil (PAE). O PAE foi instituído nos Institutos Federais de Educação Ciência e Tecnologia a partir do Decreto de nº 7.234 de 19 de julho de 2010 (BRASIL, 2010), que dispõe sobre o Plano Nacional de Assistência Estudantil (PNAES). Esse plano tem como objetivo viabilizar a igualdade de oportunidades entre todos os estudantes contribuindo ainda para melhoria do desempenho acadêmico a partir de estratégias que busquem o combate às situações de repetência e evasão. Prevê a assistência ao estudante mediante a oferta de recursos financeiros para moradia estudantil, alimentação, transporte, inclusão digital, apoio didático pedagógico; oferece ainda ações voltadas à cultura, esporte, saúde biopsicossocial e atendimento em creches. O PNAES pressupõe atendimento aos estudantes de baixa vulnerabilidade social, prioritariamente àqueles com renda familiar entre um salário mínimo e meio. E cada instituição deve elaborar seu plano de trabalho evidenciando as ações e estratégias além dos critérios de seleção. Segundo dados do Ministério da Educação (MEC)2 em 2008, ano da criação do PNAES o PAE recebeu R$ 125,3 milhões, em 2009 foram R$ 203,8 milhões e 2010 R$ 304 milhões. Cada instituição federal conta com seu orçamento e baseado neste propõe suas ações. A partir de 2012 o Serviço Sociopedagógico assumiu a demanda apresentada a partir da implantação dos cursos técnicos integrados ao ensino médio mediante acordo de cooperação entre IFSP e a Secretaria de Educação do Estado (SEE) o que demandou investimentos em ações voltadas para o atendimento de estudantes, pais e professores que serão melhor detalhadas no decorrer deste estudo. Em relação à pesquisa propriamente dita a experiência profissional acumulada ao longo da trajetória profissional da pesquisadora trouxe algumas inquietações entre as quais as relacionadas à responsabilização da família pelo “chamado” fracasso escolar dos estudantes. 2 (BRASIL, 2010a). 17 Em diferentes momentos de sua intervenção profissional, a pesquisadora deparou-se com discursos acerca da falta de interesse e compromisso dos pais, quando não das mães, em relação ao desempenho dos estudantes. Na opinião de vários educadores o grande problema das escolas na atualidade está no desinteresse e desmotivação dos discentes não dispostos a aprender e que não tem incentivo familiar para os estudos. Partindo dos conhecimentos adquiridos pela formação profissional em Serviço Social, no que se refere à sociedade capitalista e suas estratégias de massificação e opressão da classe trabalhadora, que produzem seus reflexos no cotidiano familiar, as acusações feitas em relação à família sempre trouxeram muitos incômodos. O acúmulo teórico adquirido durante a realização do Curso de Mestrado em Serviço Social possibilitou a compreensão de que a educação pública na sociedade brasileira, apesar dos parâmetros estabelecidos, se constituiu numa política contrária ao atendimento qualificado da classe trabalhadora. Neste sentido esta pesquisa se justifica pela necessidade de compreensão acerca das questões relacionadas à família e à escola. A presença da família na escola é importante para que? Ou melhor, para quem? A participação da família na escola vai além da presença em festas comemorativas ou reuniões de pais com pautas pré-estabelecidas pela direção escolar, geralmente com caráter eminentemente administrativo. Pressupõe o compromisso com a aprendizagem de seus filhos, mas não a responsabilidade exclusiva pelo seu chamado fracasso escolar. Afinal, quem obtém todos os instrumentos teóricos e práticos sobre alfabetização, por exemplo? Como os pais podem ajudar neste processo? E quando o professor tem grande responsabilidade no fracasso de seus discentes, pela sua incapacidade profissional ou descumprimento de suas obrigações, como a escola se posiciona? O que a família pode fazer? Que tipo de família a escola deseja que participe de sua rotina? A escola, pela intervenção de seus educadores, está preparada para lidar com as questões apresentadas pelos pais a partir deste processo de aproximação? O Serviço Social mediante as ações propostas pelo Serviço Sociopedagógico contribui efetivamente para a alteração de alguns conceitos já cristalizados acerca da instituição família? 18 Como a escola pode e deve se organizar na tentativa de aproximação com as famílias? Com quais objetivos e estratégias? O que a família pensa sobre a escola de seu filho? O que a escola pensa sobre a família de seus estudantes? Em que medida tais concepções são problematizadas no cotidiano escolar? Alguns destes questionamentos puderam ser explorados neste estudo, outros, no entanto, poderão servir de guia para a realização de novos estudos tanto pela pesquisadora quanto por aqueles que puderem se interessar pelo assunto. Neste sentido a pesquisa ora proposta tem como objeto de estudo a análise dos fatores que interferem na relação entre escola e família diante das convergências e divergências que favorecem ou dificultam o estabelecimento de estratégias de fortalecimento mútuo e enfrentamento dos problemas vivenciados pela escola pública. Baseada nestes questionamentos estabeleceu-se como objetivo geral analisar os diferentes fatores que interferem na relação estabelecida entre escola e família a partir da experiência de implantação dos cursos técnicos integrados ao ensino médio do IFSP – Câmpus Barretos. A pesquisadora elegeu como objetivos específicos: (1) compreender as transformações societárias que provocam rebatimento nos diferentes segmentos da sociedade contemporânea, entre estes a família e a escola; (2) explicar as mudanças ocorridas na política pública de educação; (3) compreender os principais fatores que interferem no relacionamento entre família e escola. Partindo da definição do objeto de estudo foi preciso delimitá-lo com maior precisão de forma a garantir a realização de um estudo que fosse capaz de apreender a realidade. Neste sentido foi definido que a pesquisa teria como lócus de investigação o IFSP - Câmpus Barretos. Definiu-se ainda que a pesquisa seria realizada junto a uma modalidade específica: os cursos técnicos integrados ao ensino médio de agropecuária e informática. A escolha desta modalidade de ensino se justifica pelo fato de que esses cursos são frequentados por estudantes na faixa etária dos 15 anos de idade, o que faz com que muitas ações da instituição escolar demandem o contato com a família. Em 2012 o IFSP recebeu 80 estudantes para cursar um dos cursos oferecidos mediante um acordo de cooperação entre governo federal e SEE. Diante da faixa etária de seus discentes a escola precisou obrigatoriamente estabelecer 19 uma ação de aproximação com a família destes estudantes. Neste sentido muitas possibilidades e também inúmeros desafios passaram a permear o cotidiano dos profissionais da instituição. A utilização do método dialético fundamentou todo o processo de realização desta pesquisa que contou com pesquisa bibliográfica, documental e de campo. A estrutura expositiva da tese foi organizada de forma a garantir a compreensão do objeto de estudo em questão;organizada em três capítulos, buscou-se problematizar e refletir os desafios da relação família e escola. O Capítulo 1 sob título Marcos da Política Educacional Brasileira apresenta a trajetória da política pública de educação a partir da década de 1960 até os dias atuais. Aponta as principais transformações recorrendo ainda à contextualização política, econômica e social que a influenciou diretamente. A pesquisadora traz à discussão a influência do ideário neoliberal na sociedade brasileira com ênfase no impacto provocado diretamente na política educacional brasileira e alguns de seus efeitos nefastos. O Capítulo 2 denominado A Educação Profissional no Brasil buscou elucidar a trajetória do ensino profissionalizante cujas origens estão marcadas em uma política de atendimento à um segmento social específico – pobres e desvalidos da sorte3. A expansão da rede federal de ensino e a criação dos Institutos Federais de Educação, Ciência e Tecnologia também é contextualizada e discutida. A última seção apresenta o IFSP – Câmpus Barretos, lócus em que foi realizada a pesquisa de campo, com ênfase a uma das modalidades de ensino oferecida: o ensino profissionalizante integrado ao ensino médio. O Capítulo 3 denominado A Família Brasileira em Questão: Origem, Transformação e a Interface com a Escola contextualiza a instituição família partindo da concepção da mesma enquanto construção social e discute alguns conceitos a ela relacionados. Apresenta a família brasileira com suas características particulares e algumas de suas especificidades. Provoca o debate acerca das diversas configurações familiares e dos desafios enfrentados em seu cotidiano. Por fim discute a interface da família com a escola em face de algumas construções e desconstruções. 3 Pobres e desvalidos da sorte: são expressões frequentemente encontradas nas produções que se reportam a origem do ensino profissionalizante referindo-se ao atendimento de jovens órfãos institucionalizados ou em condições financeiras desfavoráveis, filhos da classe trabalhadora. 20 O percurso metodológico seguido pela pesquisadora conduziu a quatro categorias de análise que foram apresentadas utilizando-se os depoimentos dos sujeitos selecionados de maneira intencional oferecendo grande contribuição para a concretização dos objetivos propostos. São elas: 1) a participação da família na escola; 2) o acompanhamento dos deveres de casa; 3) a valorização da escola por parte da família e 4) as transformações da família. Por fim a pesquisadora apresenta suas considerações finais acerca deste estudo que durante toda sua trajetória foi repleto de desafios principalmente pelo vínculo estreito da pesquisadora com seu objeto de estudo. Metodologia da Pesquisa A partir da definição dos objetivos foi possível estabelecer a metodologia que norteou o desenvolvimento da pesquisa. Buscou-se o apoio de um método que possibilitasse a apreensão da realidade considerando o desafio estabelecido desde o início que era a proximidade da pesquisadora com seu objeto de estudo. Desvelar as interlocuções entre família e escola, diante das particularidades de ambas já se apresenta como uma empreitada desafiadora a qualquer pesquisador. A ausência de produções com caráter científico e ao mesmo tempo a existência de obras que abordam o tema de forma idealizada e sem nenhuma fundamentação teórica foi um dos primeiros obstáculos. Estar tão estreitamente relacionada a este universo, enquanto profissional atuante na área da educação, constantemente inserida no cotidiano escolar vivenciando os desafios postos à profissão fez com que a escolha do percurso metodológico a ser percorrido pela pesquisa fosse cuidadosamente definido. A definição deste percurso considerou que [...] o método não é um conjunto de regras formais que se “aplicam” a um objeto que foi recortado para uma investigação determinada nem, menos ainda, um conjunto de regras que o sujeito que pesquisa escolhe, conforme a sua vontade, para “enquadrar” o seu objeto de investigação. (PAULO NETTO, 2009, p. 26). 21 Neste sentido compreender a subjetividade do pesquisador e também a realidade a ele apresentada é o que irá determinar a escolha do método e não o contrário. Para o alcance de seus objetivos é imprescindível o aporte de uma teoria que oriente seu percurso, que na concepção de Marx é a “[...]reprodução ideal do movimento real do objeto pelo sujeito que pesquisa: pela teoria, o sujeito reproduz em seu pensamento a estrutura e a dinâmica do objeto que pesquisa.” (PAULO NETTO, 2009, p. 7, grifo do autor). Vale dizer que a realidade é sempre muito mais do que a pretensão do pesquisador em conhecê-la. O método apresentado na perspectiva crítica evidencia ainda que o pesquisador se debruce sobre todas as facetas de seu objeto buscando identificar o que está por trás da aparência, logo identificar sua essência. É preciso “[...] refletir obstinadamente, insistentemente, para chegar à verdadeira natureza do objeto, ou seja, a sua essência, a sua universalidade, a sua totalidade.” (IANNI, 2011, p. 398). Na perspectiva dialética a aparência é parte constituinte da essência, deste modo é preciso negá-la ao invés de desprezá-la em busca de um processo de superação. A partir destes apontamentos é possível identificar o grande mérito do método de Marx que aponta para a concepção de totalidade que “[...] é uma categoria concreta. É própria da constituição do real. É a essência constitutiva do real; por isso, ontológica.” (PONTES, 2010, p. 70). A totalidade traz consigo as diferenças dentro da unidade, a complexidade de vários complexos. O conhecimento do que é real se dá mediante aproximações sucessivas, interrogando o próprio objeto, questionando, negando o que está na aparência. Esse ingente processo de aproximações sucessivas torna-se um imperativo para o conhecimento dialético, justamente porque, no plano da imediaticidade, os fatos, os objetos, as coisas aparecem como seres acabados, sua gênese, sua constituição, enquanto complexo total, e as próprias mediações, ficam veladas pelo traço de positividade que o plano empírico impõe à representação do sujeito. (PONTES, 2010, p. 82). É esse processo de aproximação e negação que oferece condições de inferir sobre novas possibilidades e descobertas. O que a princípio aparece aos olhos 22 como sendo o real aos poucos vai se transformando, dando origem a novas determinações. Como bom materialista, Marx separa claramente o que é da ordem da realidade, do objeto, do que é da ordem do pensamento (o conhecimento operado pelo sujeito): começa-se “pelo real e pelo concreto”, que aparecem como dados; pela análise, um e outro elementos são abstraídos e, progressivamente, com o avanço da análise, chega-se a conceitos, a abstrações que remetem a determinações as mais simples. (PAULO NETTO, 2009, p. 19, grifo do autor). Esse exercício permanente exige a utilização de outro recurso metodológico que é a abstração. Paulo Netto (2009, p. 21, grifo do autor) faz as seguintes considerações acerca desta questão: A abstração, possibilitando a análise, retira do elemento abstraído as suas determinações mais concretas, até atingir “determinações as mais simples”. Neste nível, o elemento abstraído torna-se “abstrato” – precisamente o que não é na totalidade de que foi extraído: nela, ele se concretiza porquanto está saturado de “muitas determinações”. A realidade é concreta exatamente por isto, por ser “a síntese de muitas determinações”, a “unidade do diverso” que é própria de toda totalidade. Esse processo que se opera no campo da singularidade, da imediaticidade a partir da utilização do recurso da abstração conduz a outro campo que é o da universalidade. Nesta etapa deve-se “[...] ‘buscar a legalidade de cada processosocial’, através da apreensão das determinações onto-genéticas dos processos sociais.” A partir daí é possível identificar o que pode ser considerado como demandas sociais, ou seja, fatores que interferem diretamente no objeto e que a partir de sua identificação e compreensão podem apontar para outras formas de compreensão do real (PONTES, 2010, p. 85, grifo do autor). Em uma perspectiva de totalidade esse movimento de superação de um nível de compreensão a outro e a identificação dos vários complexos que compõe o real só é possível mediante processo de mediação. Seguindo os apontamentos de Pontes (2010, p. 81): A mediação aparece neste complexo categorial com um alto poder de dinamismo e articulação. É responsável pelas moventes relações que se operam no interior de cada complexo relativamente total e 23 das articulações dinâmicas e contraditórias entre estas várias estruturas sócio-históricas. De acordo com os ensinamentos deste autor a mediação é a categoria que leva a conhecer e a agir, funciona na mente como um movimento. Permite a transposição permanente das concepções do intelecto (responsável pela afirmação) e da razão (responsável pela negação). A mediação conduz a reconstrução do objeto de intervenção que ocorre no campo da particularidade – campo das mediações. A particularidade “[...] é um espaço onde a legalidade universal se singulariza e a imediaticidade do singular se universaliza.” (PONTES, 2010, p.85). O conhecimento concreto só pode ser assim considerado se envolver os princípios da universalidade, singularidade e particularidade. Para tanto é imprescindível contar com a categoria de mediação, pois sem sua compreensão “[...] a categoria do particular se esvazia numa polarização dicotômica entre o universal e o singular.” (PONTES, 2010, p.87). Para a realização deste estudo parte do pressuposto que: 1) os professores de maneira geral responsabilizam a família pelo fracasso dos estudantes e mantém concepções idealizadas a seu respeito; 2) as famílias dos estudantes dos cursos técnicos do Instituto Federal de São Paulo – Câmpus Barretos demonstram satisfação com as ações da escola mesmo cientes do desempenho insatisfatório dos discentes valorizando demasiadamente a estrutura administrativa da escola. Partindo destes pressupostos considerando ainda os objetivos já identificados e à luz do método dialético esta pesquisa recorreu à utilização da pesquisa bibliográfica, documental e de campo. A pesquisa bibliográfica foi utilizada para a construção do referencial teórico que norteou a investigação. Privilegiou publicações que versassem sobre os temas relacionados a este estudo. Neste sentido a pesquisadora num primeiro momento tentou elucidar os desafios postos à política educacional brasileira, desafio imenso dada a complexidade e amplitude desta política pública. Foi preciso compreender as transformações vividas na área educacional brasileira, principalmente em relação à educação profissional em razão desta constituir-se na missão principal da instituição e da modalidade de ensino que foram definidos lócus de investigação. 24 Foi necessário ainda debruçar-se sobre a família, compreender sua origem enquanto instituição socialmente instituída, e que no caso brasileiro traz em sua história traços marcantes do processo de exploração colonizadora que ainda produz seus reflexos na sociedade contemporânea diante da imensa desigualdade social que assola esse país. Olhar para a família neste estudo significou compreender sua origem histórica e refletir sobre as transformações inclusive relacionadas aos modelos familiares presentes na contemporaneidade. Identificar tais configurações, não na perspectiva de enquadrar cada família a este ou àquele modelo, mas na tentativa de problematizar alguns dilemas ou possibilidades possíveis de serem experimentados pelos grupos familiares. Significou também compreender o sentido da participação da família na escola, como esta se instituiu historicamente e como pode ser concebida de forma a não transferir responsabilidades. A pesquisa documental permitiu a obtenção das informações referentes ao Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia especialmente no que disse respeito às ações do Câmpus Barretos voltadas aos estudantes e suas respectivas famílias. Foram imprescindíveis para esta etapa da pesquisa as informações disponíveis no sistema acadêmico e também na documentação elaborada e sistematizada pelo Serviço Sociopedagógico. A pesquisa de campo fundamental para o cumprimento de alguns dos objetivos propostos foi realizada a partir de alguns procedimentos brevemente descritos a seguir. O cenário para a realização da pesquisa foi o Instituto Federal de Educação Ciência e Tecnologia de São Paulo (IFSP) câmpus Barretos. Considerando que todo processo de pesquisa obedeceu aos pressupostos defendidos pela pesquisa qualitativa a definição precisa de critérios para escolha de sujeitos e sua respectiva amostra foi importante e favoreceu a obtenção dos resultados. Segundo Minayo (1994, p. 21-22) este tipo de pesquisa [...] responde a questões muito particulares. Ela se preocupa, nas ciências sociais, com um nível de realidade que não pode ser quantificado. Ora seja, ela trabalha com o universo dos significados, motivos, aspirações, crenças, valores e atitudes, o que corresponde a um espaço mais profundo das relações, dos processos e dos 25 fenômenos que não podem ser reduzidos à operacionalização de variáveis. Diante dos objetivos propostos a este estudo os sujeitos que compuseram o corpus investigativo foram pais, professores e estudantes vinculados aos cursos técnicos integrados ao ensino médio dos cursos de agropecuária e informática ingressantes em 2012. A definição da amostra se preocupou acima de tudo com a contribuição que este grupo pudesse trazer, tendo em vista [...] a concepção de sujeito coletivo, no sentido de que aquela pessoa que está sendo convidada para participar da pesquisa tem uma referência grupal, expressando de forma típica o conjunto de vivências de seu grupo. O importante não é o número de pessoas, mas o significado que estes sujeitos têm em função do que estamos procurando com a pesquisa. (MARTINELLI, 1995, p. 14). A amostra desta pesquisa é formada por 12 sujeitos, sendo estes pais/responsáveis, estudantes e docentes. Os sujeitos das categorias já identificadas foram selecionados da seguinte maneira: Categoria 1 - Professores: Foram convidados 02 professores que ministraram suas aulas nas turmas de informática e/ou de agropecuária no ano de 2012, período em que a pesquisa foi realizada. Categoria 2 - Família: nesta categoria os sujeitos foram selecionados entre os discentes das duas turmas de forma aleatória. Em uma das reuniões de pais/responsáveis realizadas ao término do bimestre a pesquisadora apresentou os objetivos da pesquisa e convidou os presentes a participarem. Ao término da reunião reuniu o nome dos interessados e posteriormente agendou a entrevista selecionando 02 famílias de cada turma representadas por um dos seus componentes. Categoria 3 – estudante: Nesta categoria foram convidados três estudantes de cada turma garantindo a existência de 01 estudante com bom desempenho; 01 estudante com desempenho insatisfatório; 01 estudante com ocorrências disciplinares recorrentes. Para facilitar a visualização a tabela 01 apresenta os dados relativos aos sujeitos da pesquisa. 26 Tabela 01 – Sujeitos da Pesquisa Categoria Quantidade de sujeitos Categoria 1 – Docentes 02 Categoria 02 – Família 04 Categoria 03 - Estudantes 06 Total 12 Fonte: elaborada por Juliana de Carvalho Pimenta O processo de levantamento de dados aconteceu de forma diferente entre as categorias estudantes e família/ professores. Nas categorias professores e família a opçãometodológica utilizada foi a entrevista que contou com o apoio de um questionário semi-estruturado dividido em três blocos de assuntos/temas: 1. Participação da família; 2. Acompanhamento das atividades acadêmicas; 3. Valorização da escola. As entrevistas realizadas no primeiro semestre de 2013 foram gravadas com a autorização dos sujeitos e posteriormente transcritas pela pesquisadora para qualificar a análise dos dados. Junto aos discentes optou-se pela utilização do grupo focal buscando garantir maior riqueza nas informações colhidas junto a estes sujeitos considerando principalmente sua faixa etária e a vivência profissional da pesquisadora junto a este grupo. Realizou-se dois encontros com o estudantes para que fosse possível a obtenção das informações necessárias ao cumprimento dos objetivos deste estudo. A partir da obtenção dos dados realizou-se um minucioso tratamento do material num processo de aproximação e distanciamento, de estranhamento e interpretação dos conteúdos expostos de forma tão singela e contundente, num perfeito movimento dialético que trouxe algumas respostas e ao mesmo tempo inúmeros questionamentos. Para análise e interpretação dos dados foram utilizados os procedimentos defendidos pela Análise de Conteúdo. Este procedimento metodológico de pesquisa que inicialmente teve sua utilização mais voltada para as pesquisas quantitativas, atualmente tem seu valor também reconhecido nas pesquisas de caráter qualitativo. 27 Foi preciso atentar-se às três etapas assinaladas por Bardin (2004) como sendo fundamentais para a realização da análise de conteúdo: a pré-análise que tratou da organização de todos os materiais que foram utilizados para o levantamento dos dados e também outros materiais que puderam auxiliar a entender melhor o foco da investigação e fixar o que foi definido como corpus da investigação, ou seja, o campo específico em que se concentrou a investigação. A etapa posterior compreendida pela descrição analítica que neste momento já contava com o corpus da pesquisa definido possibilitou a realização da busca de sínteses coincidentes e divergentes de ideias podendo organizar as informações em quadros de referências. A última etapa denominada interpretação referencial tratou da análise propriamente dita. Finalizando este estudo a pesquisadora apresenta suas Considerações em que tenta concluir as observações em face da finalização do percurso metodológico. Como já explicitado não houve a pretensão de esgotamento do assunto, embora todo cuidado foi tomado para sua exploração adequada e amparada por instrumentais científicos garantindo a idoneidade dos dados apresentados. A conclusão definitiva do assunto é impossível diante da realidade social que se apresenta em constante movimento. Desta forma a apreensão ora apresentada diz respeito a um determinado contexto social que se modifica pela ação voluntária ou não dos sujeitos nele inseridos. Espera-se, contudo contribuir para o desvelar de propostas que tenham como alvo a valorização da relação entre família e escola em busca de uma educação pública e de qualidade para todos. 28 CAPITULO 1 MARCOS DA POLÍTICA EDUCACIONAL BRASILEIRA Este capítulo pretende discutir a política pública de educação brasileira e suas transformações no cenário contemporâneo. Inicialmente apresenta as mudanças ocorridas em face da implantação do sistema de ensino e a legislação que acompanhou tais transformações. Diante da contextualização dessa política pública foi necessário trazer à tona a implantação do ideário neoliberal em nosso país tendo em vista sua relevância nos processos decisórios dos rumos da referida política pública. 1.1 A política pública de educação: análise entre a década de 1960 e a atualidade Até meados da década de 1960 o Brasil não contava com um sistema nacional de educação. A Constituição Federal de 1946 conferia à União a responsabilidade pelas diretrizes e bases da educação nacional, neste sentido, em 1948 encaminhou-se ao Congresso o anteprojeto de criação da primeira lei de diretrizes e bases da educação. A iniciativa deixou evidente a “[...] demonstração de que a educação não é uma questão que prioritariamente preocupasse a ‘classe política’, o anteprojeto permaneceu por alguns anos esquecido nas gavetas dos parlamentares da época.” (PALMA FILHO, 2005b, p. 81, grifo do autor). Tal esquecimento talvez encontre sentido na resistência de parlamentares entre estes Gustavo Capanema que se opunham a algumas de suas considerações. De 1949 a 1951 o projeto ficou aguardando a tramitação sem nenhuma demonstração de que seria debatido. Nos quatro anos seguintes a discussão girou em torno da questão da centralização x descentralização. O interesse da iniciativa privada em relação à ideia de descentralização foi despertado e o princípio da liberdade do ensino utilizado para barrar a expansão do ensino público. Frente a este movimento encontrava-se a Igreja Católica representada por seus interlocutores. Em 1958 foram apresentados substitutivos organizados pelas lideranças das duas alas, a favor e contra, a expansão do ensino público e a partir de maio de 1959 iniciaram-se suas discussões. 29 Naquele momento histórico o país não contava com uma rede ampliada de ensino superior, ao contrário, o ensino médio havia crescido muito desde 1930 e era considerado patrimônio nacional defendido pela ala democrática do país. O debate contra e a favor da escola pública trouxe à tona a Campanha em Defesa da Escola Pública ocorrida em 1960 liderada por vários intelectuais e membros de prestígio da sociedade. Este grupo já havia organizado o Manifesto de Educadores4 ‘Mais uma Vez Convocados’ em 1959 que foi “[...] favorável à existência das duas redes, pública e particular; mas propunha que as verbas públicas servissem somente à rede pública e que as escolas particulares se submetessem à fiscalização oficial.” (GUIRALDELLI JÚNIOR, 2009, p. 93). A Campanha de 1960 realizou amplos debates em diferentes segmentos da sociedade e teve em Florestan Fernandes um forte aliado que levou a discussão para o interior do país mediante estratégias como encontros e palestras. A partir dos debates com os setores mais pobres da população foram realizadas as Convenções Operárias de Defesa da Escola Pública, nos anos de 1960 e 1961 na cidade de São Paulo. A Campanha em Defesa da Escola Pública conseguiu agregar representantes de diferentes concepções de educação que embora divergissem entre si, se dispuseram a lutar em conjunto por aquilo em que suas opiniões convergiam. Formou-se um grupo com nomes de pessoas já famosas e de jovens que, mais tarde, iriam se tornar bastante conhecidos. Alguns vieram a se tornar autores de clássicos do pensamento brasileiro em diversas áreas, outros, mais tarde, colaboraram com projetos educacionais ligados à Ditadura Militar (1964-1985) e, até, entre os signatários, houve um casal que ocupou os cargos de Presidente da República e de Primeira Dama, como foi o caso de Fernando Henrique Cardoso e Ruth Correia Leite Cardoso. (GUIRALDELLI JÚNIIOR, 2009, p. 96). Havia, contudo um grupo amparado pela Igreja Católica que defendia a ideia do ensino livre, valorizando que a família era a responsável pela educação em razão de ser um grupo natural cuja existência se deu anterior ao surgimento do Estado. 4 O Manifesto dos Educadores “Mais uma Vez Convocados” surgiu reafirmando alguns dos princípios já defendidos pelos educadores em 1932 pelo Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova que entre outras questões defendiam a escola pública, laica, obrigatória e gratuita. 30 O projeto da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LBDEN) já havia sido aprovado pela Câmara e aguardava apenas a aprovação no Senado quando a Campanha iniciadaem 1959 chegou a seu apogeu. Realizou-se em 1961 a II Convenção em Defesa da Escola Pública. “Intelectuais e dirigentes sindicais voltaram a condenar o projeto que, segundo as palavras de Florestan Fernandes à época, pautou-se por fazer ‘concessões à cupidez ou à ânsia de poder dos círculos privatistas’.” (GUIRALDELLI JÚNIOR, 2009, p.97, grifo do autor). A análise feita por Palma Filho (2005b) é que ao término do processo, o posicionamento adotado foi conciliador, aproveitando parte das propostas dos dois segmentos e ainda, A lei que levou treze anos para ser aprovada já nascia velha, pois não dava conta das muitas transformações porque passara o país, principalmente a partir do final da II Guerra Mundial. O Brasil dos anos 60 é urbano e em acelerado processo de industrialização. Os 50 anos em 5 de JK, principalmente com a transferência do centro político do país para o planalto central e a instalação da indústria automobilística no ABC paulista, colocavam novas exigências para o setor educacional, que a nova lei não levava em conta. (PALMA FILHO, 2005b, p. 83). Diante da análise feita por vários autores importantes no cenário educacional entres estes Demerval Saviani podem-se apontar alguns aspectos significativos da Lei 4024\61. Entre estes garantiu “[...] à família o direito de educação que deveria ser ministrado aos seus filhos, e estabeleceu que o ensino era ‘obrigação do poder público e livre à iniciativa privada’.” (GUIRALDELLI JÚNIOR, 2009, p. 99, grifo do autor). Em relação à obrigatoriedade escolar observou-se um retrocesso. O artigo 30, em seu parágrafo único estabeleceu que “[...] constituem casos de isenção (da obrigatoriedade), além de outros previstos em lei: a) comprovado estado de pobreza do pai ou responsável; b) insuficiência de escolas; c) matrículas encerradas; d) doença ou anomalia grave da criança.” (ROMANELLI, 2012, p. 187). Percebe-se com isso o total descompromisso do Estado com uma política educacional que atendesse a toda população brasileira. Não é difícil a partir disso, compreender o alto índice de analfabetismo brasileiro nas décadas seguintes. Romanelli (2012) aponta que em 1964 os dados divulgados pelo censo escolar 31 apontavam que 33,7% da população na faixa etária entre 7 e 14 anos não frequentava a escola, na maioria das vezes por falta de instituições de ensino. Quanto à estrutura geral do ensino foi mantida a organização em: ensino primário (escolas maternais e jardins de infância; ensino primário, com duração de 4 anos; ensino médio organizado em dois ciclos: o ginasial com duração de 4 anos e o colegial de 3 anos. O ensino secundário e técnico estava compreendido neste nível de ensino e, por último o ensino superior. A aprovação da LDBEN mostrou com o tempo o quanto o país desperdiçou a oportunidade de sistematizar um sistema educacional que atendesse aos interesses da população brasileira tanto em seu caráter democrático quanto em relação ao processo de desenvolvimento vivido que exigia mudanças. Em relação à democratização do ensino é importante enfatizar que a luta em sua defesa deveria ser um objetivo dos defensores da educação tendo em vista tratar-se de [...] uma oportunidade colocada ao alcance de todos, ‘não porque o desenvolvimento capitalista moderno se apoia em técnicas que, por mais rudimentares que sejam, dependem em grau crescente do conhecimento da leitura, da escrita e das operações elementares, mas porque só com o domínio destas técnicas cada pessoa consegue colocar-se em posição mais vantajosa no processo de criação de riquezas, beneficiando-se, ao mesmo tempo, de melhor distribuição das rendas que ajudou a constituir’. (CARDOSO apud ROMANELLI, 2012, p. 190, grifo ao autor). No entanto, o acesso das camadas populares às instituições públicas de ensino de forma democrática, com a preocupação de universalização do ensino, só irá efetivar-se duas décadas depois trazendo consigo outros dilemas que serão apontados ainda neste texto. Um aspecto importante deste período em que o país era governado pelo então presidente Jango, que assumiu a presidência após a renúncia de Jânio Quadros, ocorrida em agosto de 1961 foi a tentativa de implantação do Plano Nacional de Educação (PNE) em 1962 que estabeleceu metas tanto qualitativas quanto quantitativas a serem alcançadas em um prazo de oito anos. O PNE propôs ainda o aumento de gastos da União com a política pública de educação em 8%. 32 Estavam entre as metas quantitativas a serem alcançadas: a) Ensino primário: matrícula até a quarta série de 100% da população escolar de 7 a 11 anos de idade; e matrícula nas quinta e sexta séries de 70% da população escolar de 12 a 14 anos; b) Ensino médio: matrícula de 30% da população escolar de 11, 12 e 14 anos nas duas primeiras séries do ciclo ginasial; matrícula de 50% da população escolar de 13 a 15 anos nas duas últimas séries do ciclo ginasial; e matrícula de 30% da população de 15 a 18 anos do ciclo ginasial; c) Ensino superior: expansão da matrícula até a inclusão, pelo menos, de metade dos que terminam o colegial. (GUIRALDELLI JÚNIOR, 2009, p. 104-105). O alcance destas metas exigiu do governo mudanças tanto no interior das escolas quanto na sociedade em geral já acostumada de certa forma com uma política educacional excludente voltada para um grupo específico da sociedade. Neste sentido o PNE traçou também metas qualitativas a serem alcançadas que serão descritas a seguir. a) Além de matricular toda a população em idade escolar primária, deve o sistema escolar contar, até 1970, com professores primários diplomados, sendo 20% em cursos regentes, 60% em cursos normais e 20% em cursos de nível pós-colegial; b) As duas últimas séries, pelo menos, do curso primário (quinta e sexta séries) deverão oferecer dia completo de atividades escolares e incluir no seu programa o ensino, em oficinas adequadas, das artes industriais; c) O ensino médio deverá incluir em seu programa o estudo dirigido e estender o dia letivo a seis horas de atividades escolares, compreendendo estudos e práticas educativas; d) O ensino superior deverá contar com pelo menos 30% de professores e alunos de tempo integral. (GUIRALDELLI JUNIOR, 2009, p. 105) As metas propostas pelo PNE foram suspensas tendo em vista que o mesmo foi extinto em 1964 logo após o golpe militar que instaurou em nosso país um longo período de ditadura que influenciou sobremaneira os rumos da educação brasileira. Foi proposto entre os anos de 1965 e 1966 uma revisão do extinto PNE e as metas a serem alcançadas pelo governo foram mantidas. Entre os anos de 1963 e 1965 o governo implantou o Plano Trienal de Desenvolvimento Econômico e Social que em relação à educação “[...] fixou como prioridades a necessidade de expansão do ensino primário, o desenvolvimento da 33 pesquisa científica e tecnológica e a formação e treinamento do pessoal técnico.” (GUIRALDELLI JÚNIOR, 2009, p. 104). Neste período o investimento do país em educação era de 12% dos recursos dos impostos arrecadados e havia a expectativa de conseguir em oito anos garantir a matrícula de 100% da população escolar entre 7 e 14 anos. No entanto, Romanelli (2012) aponta que a escolaridade ao final da década de 1960 era de 73,61% da população entre 7 e 11 anos; 52,24% na faixa etária entre 12 e 24 anos; 27,9% entre 15 e 18 anos. O referido plano pode ser considerado positivo em relação ao aumento da escolaridade e ampliação da demanda, no entanto, já era possível identificar problemas sérios na estrutura interna do sistema de ensino que não conseguia equacionar o problema da reprovação e evasão escolar. Fica evidente desta forma que a ampliação da oferta de vagas isoladamente não resolve o problema da educação. Com o Golpe de Estado instituído no país, entre os anos de 1964 e 1985 algumas medidas políticas e repressivas foram tomadasna tentativa de manter o controle da situação. Palma Filho (2005b) aponta as principais intervenções no campo da educação durante a presidência do Marechal Castelo Branco (1964 – 1967): 1) Invasão da Universidade de Brasília por tropas militares e destituição do Reitor Anísio Teixeira, grande nome da educação brasileira que foi substituído por um médico, professor Zeferino Vaz; 2) A União Nacional dos Estudantes (UNE) foi colocada na ilegalidade; 3) Criação de Diretórios Acadêmicos em substituição aos Centros Acadêmicos, nas Universidades criou-se o Diretório Central dos Estudantes (DCE); 4) Extinção do Serviço de Assistência ao Menor (SAM) que foi substituído pela Fundação Nacional do Bem Estar do Menor (FUNABEM); 5) Contratação de assessores americanos para aperfeiçoamento do ensino primário mediante acordo MEC/ United States Agency for Development (USAID); 6) Criação do salário educação, com recursos provenientes das empresas; 7) Nova invasão da Universidade de Brasília, desta vez para conter uma greve de docentes e alunos contra atos autoritários da reitoria. 34 8) Invasão da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras, da Universidade de São Paulo por tropas da polícia estadual que resultou na inutilização de equipamentos e prisão de professores e estudantes. Ainda em São Paulo outras Universidades foram invadidas e seus diretores e professores afastados. Entre os anos de 1967 e 1969 assumiu a presidência da república outro militar, o general Costa e Silva, considerado como uma liderança linha dura que reprimiu de forma mais intensa as diversas demonstrações de insatisfação contra o governo. No campo da educação, data deste período histórico algumas ações apontadas por Palma Filho (2005c), as quais se destacam: 1) Assinatura de alguns acordos entre MEC/USAID para modernização da universidade brasileira, para orientação vocacional e treinamento de técnicos rurais e reforma do ensino médio; 2) Assinatura de acordo entre MEC e o Sindicato Nacional dos Editores de Livros para cooperação na publicação de livros técnicos, científicos e educacionais; 3) Criação do Projeto Rondon com a participação de estudantes universitários sob a supervisão de militares; 4) Promulgação da Lei Federal n° 5370 que criou o Movimento Brasileiro de Alfabetização (MOBRAL). 5) Contenção dos conflitos entre estudantes e o regime militar que se acirravam; 6) Criação do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE). Neste período ocorreu a aposentadoria compulsória de vários professores universitários como consequência da edição do Ato Institucional n° 5 (AI 5) que delegou ao presidente da república poderes absolutos e suprimiu vários direitos políticos, este decreto proibiu também manifestações políticas, impôs censura prévia à imprensa e teve como ato emblemático o fechamento do Congresso Nacional por quase um ano. A sucessão presidencial ocorrida em 1969 levou à presidência o militar General Emílio Garrastazu Médici que nomeou o Coronel Jarbas Passarinho para assumir o Ministério da Educação. O governo Médici foi apontado como um dos períodos mais intensos e repressivos da ditadura militar, com inúmeras denúncias de torturas contra presos 35 políticos. É nesse período também que o país viveu uma fase positiva do desenvolvimento industrial e crescimento econômico conhecido como o “Milagre Brasileiro”, que trouxe consigo contraditoriamente o aumento da miséria e da desigualdade social. Nesta década o Brasil esteve em evidência em razão do êxito do país na Copa do Mundo, sendo tricampeão mundial. O fascínio da conquista serviu de certa forma, como máscara para encobrir as façanhas governistas contra a população mais empobrecida. A tortura e prisão de lideranças que se opunham ao regime, a propaganda nacionalista, a repressão policial contra qualquer forma de organização da sociedade civil sufocou a atuação dos movimentos sociais por um determinado período. É neste governo que ocorreu a aprovação da Lei Federal n° 5.692/71 (BRASIL, 1971), que fixou as diretrizes e bases para o funcionamento dos ensinos de 1º e 2º graus (antigo primário e ensino médio). A lei de diretrizes e bases anterior, datada de 1961, como já explicitado, ficou por mais de dez anos tramitando pelo poder legislativo, e quando sancionada pelo presidente teve 23 vetos presidenciais, nove destes mantidos pelo Congresso Nacional. A Lei n° 5.692/71, ao contrário, levou pouco mais de um ano para discussão e aprovação não sofrendo nenhum veto. O Presidente da República instituiu um Grupo de Trabalho (GT) composto por nove membros indicados por ele para apresentação de estudos e projetos para modificação da lei de diretrizes e bases da educação. O GT teve prazo de 60 dias estabelecidos no decreto para realizar seus trabalhos. Organizou-se então uma “Semana de Educação na Universidade de Brasília, na qual todos os seus membros tiveram a oportunidade de ministrar palestras aos alunos da instituição, seguidas de debates.” (VALÉRIO, 2007, p. 5636). A partir daí apresentou-se a proposta de reformulação da lei que se ateve principalmente ao ensino de 1º e 2º graus. A lei foi aprovada em 11 de agosto de 1971 com 88 artigos. Para sua implementação foi necessária a criação de atos complementares como, por exemplo, diversos pareceres do Conselho Federal de Educação. A mudança mais significativa proposta na nova lei foi a profissionalização compulsória do ensino secundário que será analisada em outra seção desta pesquisa. 36 A crise do petróleo iniciada na década de 1970 atingiu diversos países, entre estes os Estados Unidos por volta de 1974, que entrou em um período de recessão. O aumento do preço dos combustíveis trouxe inúmeros problemas de ordem econômica. O Brasil conseguiu manter-se de certa forma um pouco melhor estabilizado em razão dos efeitos do Milagre Econômico, mas não por muito tempo. Ao final da década de 1970, a inflação começou prejudicar o povo brasileiro que tinha um país altamente endividado em face de inúmeros empréstimos internacionais, com pouco controle sobre a economia e diminuição de reservas cambiais. O Milagre Econômico começou a entrar em declínio e cedeu lugar à uma década de muita recessão, baixo crescimento e sofrimento da população em geral. Os anos de 1980, conhecidos como a ‘Década Perdida’ são invadidos ainda pela adoção do ideário neoliberal intensificado na década seguinte. As reformas instituídas pelos governos anteriores durante o período da ditadura militar começam a serem criticadas por educadores em razão da situação em que se encontrava a área educacional no país. Neste sentido Saviani (2011, p.41) destaca os educadores se organizaram em dois aspectos distintos, considerado como vetores pelo autor, o primeiro [...] caracterizado pela preocupação com o significado social e político da educação, do qual decorre a busca de uma escola pública de qualidade, aberta a toda a população e voltada precipuamente para as necessidades da maioria, isto é, das camadas não dirigentes; e outro, marcado pela preocupação com o aspecto econômico-corporativo, portanto de caráter reivindicativo, cuja expressão mais saliente é dada pelo fenômeno das greves que eclodiram a partir do final dos anos 70 e se repetem em ritmo, frequência e duração crescentes ao longo da década de 80 e penetram nos anos 90. (SAVIANI, 2011, p.41). A presença de atores importantes dará um significado importante ao movimento de crítica e contestação fortalecendo as iniciativas que ocorreram tempos depois. O primeiro eixo que tratou do significado social e político da educação foi constituídos por lideranças ligadas a entidades de caráter acadêmico- científico entre estas: a Associação Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Educação (ANPEd), o Centro de Estudos Educação & Sociedade (CEDES) e a Associação Nacional deEducação (ANDE). 37 Entre as principais ações deste grupo pode-se citar a organização das Conferências Brasileiras de Educação (CBEs) realizadas entre os anos de 1980 e 1991. Neste período realizaram-se 06 conferências. Em relação ao segundo eixo que preocupou-se com as questões econômicas-corporativas foi constituído por entidades sindicais de vários Estados brasileiros contando com a articulação da Confederação Nacional dos Trabalhadores da Educação (CNTE) e também da Associação Nacional de Docentes do Ensino Superior (ANDES). A partir de sua mobilização esse grupo foi incorporando ás suas preocupações questões econômico-políticas e também político-pedagógicas. As consequencias da estagnação do crescimento e os inúmeros problemas sociais em razão da estratégia política adotada reascendeu o anseio pela democracia dando início ao processo de abertura política e transição democrática consolidada no final dos anos de 1980. O processo de abertura e transição definidos pelo presidente da república como gradual, lento e seguro levou à presidência o também militar João Batista de Figueiredo, que em seu mandato nomeu três ministros da educação. Entre as ações de destaque na área aponta-se [...] a reforma da lei 5692, que com a edição da lei 7044 deixou de obrigar a profissionalização compulsória. Na prática, com a promulgação dessa lei, o governo federal reconhece ter fracassado na tentativa de tornar o ensino médio profissionalizante. (PALMA FILHO, 2005b, p. 90). As mudanças no ensino profissionalizante era apenas um dos problemas a serem enfrentados pelo país no campo da educação. Dados do Censo de 1980 apontavam que um terço da população em idade escolar não frequentava o 1º grau. Neste mesmo período o índice de analfabetismo era calculado em 25%. O Brasil vivia um intenso movimento amparado pela pressão de diversos grupos organizados da sociedade civil, da classe artística e também de lideranças políticas e religiosas em busca de uma reforma política e social que deu origem ao movimento conhecido como “Diretas Já” que entre outras bandeiras, lutava pela eleição direta para presidente da república. Embora de extrema importância para o país, naquele momento histórico não foi possível a eleição por voto direto. O presidente Tancredo Neves, eleito por 38 eleição indireta, não chegou a tomar posse em razão de problemas de saúde que o levaram a óbito. Assumiu o governo o vice-presidente José Sarney. O Ministério da Educação ficou inicialmente a cargo de Marco Maciel que assumiu o ministério fortalecido pelo amplo apoio popular que o governo obtinha inicialmente. Marco Maciel tem o mérito de regulamentar a Emenda Calmon que dispunha sobre o investimento de 13% dos recursos orçamentários na política pública de educação. Neste governo esse Ministério sofreu alta rotatividade sendo ocupado por outros três ministros: Jorge Konder Bornhausen, Hugo Napoleão e Carlos Sant’ Anna. Outro marco político importante desse período foi a promulgação da Constituição Federal de 1988, ainda em vigor, considerada cidadã por entre outras questões garantir a recuperação da participação cívica nos processos eleitorais. “A comunidade educacional organizada se mobilizou fortemente em face do tratamento a ser dado à educação na Constituição Federal que iria resultar dos trabalhos do Congresso Nacional Constituinte instalado em fevereiro de 1987”. (SAVIANI, 2011, p.43). Vários eventos importantes foram organizados na tentativa de contribuir para a construção de um texto constitucional que atendesse aos interesses da sociedade brasileira na área da educação. Na Carta Magna de 1988, a Educação não veio contemplada apenas no seu local próprio, no tópico específico destinada a ela, mas apareceu também espalhada em outros tópicos. Assim, no título sobre direitos e garantias fundamentais, a Educação apareceu como um direito social, junto da saúde, do trabalho, do lazer, da segurança, da previdência social, da proteção à maternidade e à infância, da assistência aos desamparados (artigo 6º). Também no capítulo sobre a família, a criança, o adolescente e o idoso, a Educação foi incluída. A constituição determinou ser dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente o direito à educação como uma prioridade em relação a outros direitos. (GUIRALDELLI JÚNIOR, 2009, p. 169). O novo texto constitucional trouxe outros avanços entre estes pode-se destacar como analisa Palma Filho (2005b): 39 - O acesso ao ensino público obrigatório e gratuito como direito público subjetivo (art. 208, parágrafos 1º. e 2º.). Desta forma o poder público pode ser responsabilizado em caso de não garantia de oferta regular; - obrigatoriedade de investimento nunca inferior a 18% da receita de seus impostos, enquanto Estados e municípios nunca inferior a 25%; - obrigatoriedade de fixação de conteúdos mínimos para o ensino fundamental, em âmbito nacional; - garantia às comunidades indígenas do uso de suas línguas maternas e processos próprios de aprendizagem; - educação como direito de todos, dever do Estado e da família em colaboração com toda a sociedade, assegurado pelo artigo 205; - estabelecimento de prioritariamente de atuação dos municípios à educação infantil e no ensino fundamental, que passa a referir-se ao antigo ensino de 1º grau; - reconhecimento da necessidade de elaboração de um Plano Nacional de Educação. No entanto, os preceitos amplamente definidos na legislação, ainda estavam longe de serem cumpridos. Os dados já apontados sobre analfabetismo e evasão escolar evidenciavam o quanto o governo e a política educacional adotada afastava da escola a parcela mais empobrecida da população. Além disso, é importante considerar que Muito embora, a Constituição Federal de 1988 tenha acolhido boa parte das reivindicações dos setores educacionais comprometidos com uma educação voltada para a formação do cidadão, o fato é que a derrota das forças comprometidas com essa visão nas eleições presidenciais de 1989 praticamente arquivava o texto constitucional. (PALMA FILHO, 2005c, p. 30). A eleição presidencial ocorrida em 1989 levou à presidência Fernando Collor de Mello, primeiro civil eleito desde 1960, já sob a vigência da Constituição Federal de 1988. Derrotou em segundo turno o então líder sindical Luis Inácio Lula da Silva. O governo de Collor é marcado por forte alinhamento aos interesses internacionais configurados entre outras questões pela assinatura do Consenso de Washington que definitivamente inseriu o país aos ditames dos organismos internacionais de cunho neoliberal. 40 A partir deste momento histórico, os Estados Unidos e outros organismos como Fundo Monetário Internacional (FMI) e Banco Mundial passaram a adotar políticas de negociação da dívida externa aos países da América Latina pautados nos princípios neoliberais. Na área da educação, os reflexos das estratégias políticas e econômicas foram sentidos de forma bastante intensa. O país dá seguimento, ainda que de forma pouco comprometida, à adequação da legislação para atender aos interesses em jogo, especialmente em relação à Lei de Diretrizes e Bases da Educação que começara a ser discutida antes mesmo da posse de Fernando Collor de Melo. A década de 1990 foi marcada principalmente pelo fim do confronto político- ideológico entre capitalismo e socialismo. A queda do muro de Berlim ocorrida em 1989 foi o principal marco de consolidação da soberania capitalista. Deste período em diante iniciou-se o aprofundamento do ideário neoliberal tonando-se a principal corrente ideológica defendida pelos países. Diferentemente do ocorrido em décadas anteriores, os anos 90, no campo da educação, caracterizam-se pelo abandono da tese da necessidade de se investir em educação pública em todos os graus de ensino, com a finalidade de propiciar uma
Compartilhar