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Organização Victor Calari Autores Carlos Henrique Gomes • Rui Leon • Fabiana Monteiro Aviões de Guerra --São Paulo, SP, Discovery Publicações, -- Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução total ou parcial deste trabalho, seja por meio eletrônico ou impresso, inclusive fotocópias sem prévia autoriazação e consentimento da editora. 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Apresentação 6 ÉÉ tatambmbémém nnasas gguerrrrasaas qqqueueuee aaaapappap reecem m m m gêgêgêg ninininiososos militarareseses, teteóróróriciciccosososos qqqqueueue dodomiminam asa eststraraatétégigigigiasaasa ddde ee cocomomomoo gggguueueerrrrreaeaear rr comm umumumaaaa sasasabebebedododoooririririr aaa ququque não se sabe dee oondndnn e e veveem.m.m.m. AAAAlgglglgggumumuumumasasaa ddddeseseee sasass fififif guguug ras hihistststóróróriciicicasasasa ttttoommararamamam uum vulto de grandeza dededede ttttamamammananananhahahhaaa aaampmpmpmmpplililillitututtudededd qqqqueueue hhojojoo e e sãsãsãsãoo oo cicicitatatadadadaad ss cocomomomo eeexexempm los em áreas que popopopp ucucucu o oooo tetttemm mm aaa vevever r r coccom m m guguguguererrarararass,s,s ttaiaiiissss coc momomm aaa ggesstãtão de negócios e a jornada dodo auauutototocococonhnhnheceece imimimmenenenntotototo... EmEmEmEmprprresesesasasasas dddddde e e popopoporttrte, antenadas com a modernidaadede, adadototam lililivrvrvrv ososs qqqqueueueue ffffalalalalamaamam ddasasss ccccononononququququuisisisistatatass eee dod s métodos e estratégias nonos s cacampmpos de babataatalhlhlha,aa, ddde e gegegegenenenerararaisisiss ssábábábioios s cocomomo oo chinêês Sun Tzu e Allexexanandrdre,e, O Grande,e, papp ra mmmelelelhohohorarar r a a ccapapacicidadadede ddee cocompm etição e proodudutitivividadadede de seus empmpreregagadodoss. Este livro traz z umu apapanhnhadadoo dodos s mam ioioreress esessestrtrata egistas dod s cacampmposos ddee batalha, homens que fizeram hihiststttóróróróriaiaia eeee qqqqueue mmmududararam oo desstitino ddee nan çõçõeses inteiras; grandes conquiuiststadaddororreseseses, doddodotatatttt dododoss dededed ccccapapapapacccciddadada ees ggeneniaiaisis;; fifiguguraras notáveveisi ppela voocac çãçãoo papara a açãç o, pele a hahabibibibillilidadededde pparara a aa momobibililizazaçãção e e ororgaganiniizazaçãçãç o;o; ffororamam eeleles todos exceleentess oobsbsererervavaaadodododoreress e e coconhnhececede ores prprprprrrp ofofununnndodododosss dododo cccomoompopportamento coletivo huhuhuhuhhuhhuumamamammamm nononnoonnoon .. SuSuSuuSuua a aaa leleleleleittitititi urururuu a aa éé indicada paparrrrrararr ppesese sosoasasas iinttereresessasadadass em vencec r r dedededededdessasasasaafifififfiososososos, , , susususuupepepep rararaaaarrrrr obobobobooo stststtstácácáácácululuu ososos eee seseserrrererrr m líderes em tododasas aas s atativi idadddesesess,, pepepepepepeppessssssssss oaoaoaoaaisisis eeeee pppppprororororofifififif sssssssssioioionananan isisisisss.. . Boa leitura! Os EEdiditooreress 7 G RA N D E S E S T RA T E G I S T A S M I L I T A RE S POR CARLOS HENRIQUE GOMES Sun Tzu 8 Nascido no Estado de Qi, no Período das Primave- ras e Outonos da China (722 a.C. a 481 a.C.), e morto no Estado de Wu, em 496 a.C., o general e escritor Sun Tzu é uma das mais importantes personalidades chi- nesas, muito destacada e citada na atualidade pela sua mais importante obra, A Arte da Guerra. Sun Tzu deixou seus pensamentos em 13 capítulos que compõem A Arte da Guerra, cada qual abordando um aspecto da estratégia de guerra formando os mais antigos fundamentos da estratégia militar conhecidos. Com frases simples e objetivas, foi uma obra adotada por militares de vários países, influenciando coman- dantes como Napoleão Bonaparte, Joseph Stalin, Mao Tse-Tung e Douglas MacArthur. A obra de Sun Tzu, apesar de ser um manual de táticas militares, passou a atrair outros tipos de leitores, como empresários, ad- ministradores, políticos e atletas, pois fornece impor- tantes informações sobre como atuar na vida, tendo como objetivo maior o de vencer. Planejamento inicial “O comandante apoia sua autoridade nestas virtu- des: sabedoria, justiça, benevolência, rigor e coragem.” O primeiro capítulo de A Arte da Guerra é dedicado à importância do planejamento e aos cinco fatores que devem ser considerados ao determinar as condições no campo de batalha: Leis Morais, Tempo, Espaço, Co- mandante e Método. As Leis Morais tratam das virtudes que o líder trans- mite aos seus subordinados para conquistar a confian- ça e buscar a vitória. Os que ignoram as condições geográficas - montanhas e florestas - desfiladeiros perigosos, pântanos e lamaçais - não podem conduzir a marcha de um exército. • Sun Tzu • 9 G RA N D E S E S T RA T E G I S T A S M I L I T A RE S O Tempo se refere ao conhecimento prévio da situ- ação climática, a época adequada e a hora, fatores que têm influência direta no resultado da ação e que devem ser executados no momento certo, aproveitando-se das condições favoráveis. O conhecimento do Espaço inclui avaliar a distân- cia, o grau de dificuldade para locomoção, o risco e segurança. O Comandante apoia sua autoridade nestas virtu- des: sabedoria, justiça, benevolência, rigor e coragem. O estadista britânico Winston Churchill atualizou a definição dos atributos do grande comandante: “O ar- cabouço do verdadeiro líder inclui, além da capacidade de argumentação e um apurado senso comum, o poder da criatividade, mas principalmente um toque de presti- digitação, como uma marca original e temível, atributos que fazem os adversários se sentirem aturdidos e fragi- lizados.” Por Método se entende a organização do exército, o transporte de suprimentos e o controle dos gastos mili- tares, ou seja, a logística, que é fundamental no plane- jamento e consecução de um empreendimento. A Arte da Guerra passa a analisar a importânciafundamental da simulação. O elemento surpresa, tão necessário para a vitória com o máximo de eficiência, depende de conhecer os outros sem ser por eles conhe- cido, de modo que o segredo e a informação distorcida são considerados artes essenciais. Administrando a Guerra “Apenas quem está completamente familiarizado com as dificuldades da guerra pode compreender intei- 10 ramente a conveniência de levá-la adiante com rapidez.” O segundo capítulo é sobre a batalha e sobre o cuidado em não prolongar a guerra. Há uma grande preocupação com a economia, seja do exército ou da população. Sun Tzu instrui o exército a levar apenas o material bélico e a saquear os suprimentos do inimigo, incluindo a utilização dos materiais apreendidos con- tra o próprio inimigo. Estratégias de luta “Derrotar o inimigo em cem batalhas não é a exce- lência suprema; a excelência suprema consiste em vencer o inimigo sem ser preciso lutar”. A essência da arte da guerra, para Sun Tzu, está re- sumida nesta frase. O ensinamento do grande estra- tegista diz que o confronto direto deve ser sempre a última opção. Portanto, a melhor estratégia de luta é, sempre que possível, a negociação. Na prática da arte da guerra, a melhor coisa é render o país inimigo, inteiro e intacto, pois não há benefício em danificar e destruir. Da mesma maneira, é melhor capturar um exército inteiro do que destruí-lo. Dessa forma, o líder conseguirá subjugar as tropas inimigas sem luta, capturará suas cidades sem sitiá-las e domi- nará seus reinos sem operações prolongadas. A estratégia de Sun Tzu neste capítulo também de- limita a ação conforme o contingente do exército ini- migo. Para Sun Tzu, é importante o líder saber quan- do deve atacar, cercar, dividir ou recuar. O líder pode arruinar o exército de três maneiras: ignorar o fato de Aquele que se empenha a resolver as dificuldades resolve-as antes que elas surjam. Aquele que se ultrapassa a vencer os inimigos triunfa antes que as suas ameaças se concretizem. • Sun Tzu • 11 G RA N D E S E S T RA T E G I S T A S M I L I T A RE S que não pode ser obedecido, isso significa imobilizar o exército; ignorar as condições do exército, causando inquietação dos soldados; e confiar em oficiais despre- parados, escolhidos de maneira inadequada, abalando a confiança da tropa. Em contrapartida, existem cinco aspectos essen- ciais para a vitória: saber quando lutar e quando evitar a luta; lidar tanto com forças superiores como inferio- res; conseguir um exército integrado como uma uni- dade; surpreender o inimigo quando este se encontra despreparado; e não sofrer interferência do soberano. Em resumo: se você conhecer o inimigo e a si mes- mo, não precisa temer o resultado da batalha. Se não conhecer nem o inimigo nem a si mesmo, você sucum- birá. Disposições táticas “O ápice da excelência não é vislumbrar a vitória quando isso pode ser feito por qualquer homem do povo.” O quarto capítulo deste tratado dá ênfase à forma- ção, porém vai além de mera arrumação física, aproxi- mando-se mais do sentido de configuração tática. Sun Tzu volta a enfatizar que a busca pela vitória se dá pelo conhecimento do momento certo de atacar ou ficar na defensiva. A invencibilidade depende da defesa; a vitó- ria depende do ataque; a sabedoria consiste em elabo- rar uma disposição tática que impossibilite a derrota e viabilize a vitória. Portanto, a vitória está no equilíbrio defesa-ataque, sabendo o momento certo de cada ação. Segundo Sun Tzu, o guerreiro talentoso não é aque- O verdadeiro método, quando se tem homens sob as nossas ordens, consiste em utilizar o avaro e o tolo, o sábio e o corajoso, e em dar a cada um a responsabilidade adequada. 12 le que apenas vence, mas a maneira como atinge a vi- tória é fundamental. A vitória decorre de uma boa tá- tica elaborada pelo estrategista, que criou as condições favoráveis. O verdadeiro líder vence as batalhas não cometendo erros, se coloca em uma disposição tática • Sun Tzu • 13 G RA N D E S E S T RA T E G I S T A S M I L I T A RE S que impossibilita a derrota. Portanto, o estrategista só busca a batalha depois da vitória assegurada. Energia combinada “Uma confusão simulada exige uma disciplina per- feita; medo simulado requer coragem; fraqueza simula- da demanda força.” O quinto capítulo tem como tema a força, a coorde- nação dinâmica e o conjunto de manobras que permi- tem que os soldados possam resistir à força do ataque inimigo e permanecer inabaláveis. Sun Tzu define ape- nas dois métodos de ataque: Zhèng (forças normais) e Qí (forças indiretas, extraordinárias). Não é simples captar o significado completo desses dois ideogramas. Uma maneira de expressar o seu conceito é: as forças normais (Zhèng) contêm o avanço do inimigo; as for- ças extraordinárias (Qí) são introduzidas no combate de um modo imprevisto, tanto no momento quanto no lugar, como no tipo de ação, como uma tática de guer- rilha. Encarar o inimigo é Zhèng, desviar para os lados é Qí. Na batalha, não há mais do que esses dois métodos de ataque, entretanto estes dois combinados dão ori- gem a séries infindáveis de manobras. Detecção de pontos fracos e fortes “É divina a arte da sutileza e do segredo! É através dela que se aprende a ser invisível e inaudível; enigmá- ticos como um deus, assim poderemos ter o destino do inimigo em nossas mãos.” 14 A ideia neste capítulo é ter energia enquanto se esvazia o oponente, reconhecer os lugares indefesos e ocupar posições previamente no campo de batalha. Sun Tzu mostra as qualidades que um exército deve ter para conseguir uma boa vitória. Atingir o ponto fraco, ser rápido, descobrir as disposições do inimigo, frag- mentar o oponente, ou seja, ter a máxima eficiência na hora de atacar. Para isso, é necessário estudar muito bem o inimigo, assegurando a vantagem para si. As- sim, ele pode fazer com que o inimigo se aproxime de acordo com sua vontade, obtendo a vitória usando as próprias táticas do inimigo. Mais ainda, é importante evitar o confronto quando o inimigo é mais forte. Sun Tzu faz uma analogia das táticas que devem ser empregadas com a água. Assim como a água modela seu curso de acordo com a natureza do solo onde cor- re, o soldado forja sua vitória de acordo com o inimi- go que esteja enfrentando. Da mesma maneira que a água não tem uma forma constante, nas batalhas não há condições constantes. Estratagemas “Disciplinados e calmos, esperando o surgir da desor- dem e do tumulto entre as hostes inimigas: esta é a arte estratégica de preservar o autodomínio.” Neste capítulo sobre manobras táticas, Sun Tzu des- taca as dificuldades e os perigos em realizar manobras com grupos indisciplinados. Não obterá êxito em lide- rar um exército em marcha sem o conhecimento pré- vio da região. Sobre saquear um território, Sun Tzu diz que a pi- Se você conhece o inimigo e conhece a si mesmo, não precisa temer o resultado de cem batalhas. Se você se conhece mas não conhece o inimigo, para cada vitória ganha sofrerá também uma derrota. Se você não conhece nem o inimigo nem a si mesmo, perderá todas as batalhas... • Sun Tzu • 15 G RA N D E S E S T RA T E G I S T A S M I L I T A RE S lhagem deve ser dividida entre todos. Quando capturar um novo território, ele deve ser dividido em lotes para o benefício da tropa. Foi o que Napoleão fez ao assumir o comando do exército em solo italiano, e, hoje em dia, empresas bem-sucedidas distribuem um percentual dos lucros entre seus funcionários. A arte de estudar os ânimos do exército também se encontra neste capítulo. O ânimo de um soldado está mais entusiástico pela manhã, ao meio-dia começa a decair e à noite seus pensamentos se inclinam para a volta ao acampamento. Um general inteligente evita um exército quando o ânimo estiver entusiástico. Quando cercarum exército, sempre deixe uma saí- da livre. Muitos exércitos encurralados decidem lutar até o fim e vendem caro a derrota. Sun Tzu, neste capí- tulo, mostra a arte de gerir a guerra. Diversificações estratégicas “A arte da guerra nos ensina a confiar, não na pos- sibilidade de o inimigo não vir, mas sim na nossa pron- tidão para recebê-lo; não na probabilidade de ele não atacar, mas preferivelmente no fato de termos tornado nossa posição inexpugnável.” Este capítulo trata de adaptação, sobre considerar as vantagens e desvantagens e diversificar as táticas. O general deve reconhecer caminhos que não devem ser seguidos, exércitos que não devem ser atacados, cidades que não devem ser sitiadas, posições que não devem ser disputadas e ordens que não devem ser se- guidas. Sun Tzu, neste capítulo, lista cinco fraquezas de ca- Disciplina: a ordem e a obediência decorrem do exemplo de conduta do líder. 16 ráter que um comandante pode ter e que podem ser a causa da derrota de um exército. 1- Temeridade: ou- sadia sem inteligência; 2- Pusilanimidade: indecisão e falta de segurança; 3- Irascibilidade: perda do autocon- trole; 4-Suscetibilidade: ser afetado com facilidade, o que desestimula a crítica construtiva e 5- Leniência: tornar-se muito condescendente. Essas cinco deficiências devem ser neutralizadas com cinco virtudes: 1- Coerência: inspira confiança aos subordinados; 2- Firmeza: não hesitar em momen- tos cruciais; 3- Equilíbrio: o líder comedido não se abala com problemas nem perante desafios; 4- Sensa- tez: conquista lealdade de sua equipe e se mostra aber- to a sugestões e 5- Disciplina: a ordem e a obediência decorrem do exemplo de conduta do líder. O exército em movimento “Aquele que não sabe fazer previsões e faz pouco caso de seus oponentes, subestimando sua capacidade, certa- mente será derrotado por eles.” O capítulo nono relata sobre exércitos em manobras estratégicas. O estudo da região de acampamento e de ataque é importante para Sun Tzu. Existem quatro ti- pos de cenários de batalha: montanhas, rios, pântanos e terrenos planos. Mestre Sun aconselha a acampar em lugares mais elevados e voltados para o Sol. “Quando uma força inimiga atravessa um rio em sua marcha, não avance de encontro a ela no meio do rio e ancore sua embarcação mais acima”, afirma o estrategista. Não demore ao atravessar pântanos e, em terrenos planos, tome uma posição de fácil acesso, enquanto que com • Sun Tzu • 17 G RA N D E S E S T RA T E G I S T A S M I L I T A RE S terrenos em aclive, na retaguarda. Sun Tzu dá dicas importantes para não ser surpre- endido em ataques repentinos. Quando o inimigo se mantém a distância e tenta provocar uma batalha, isso pode significar que ele está ansioso para que o outro lado avance. Palavras humildes e aumento de prepara- tivos são sinais de que o inimigo está prestes a atacar. Linguagem agressiva e avanço, como se fosse atacar, são sinais de uma batida em retirada. A observação da natureza é muito importante para 18 o mestre Sun, o movimento dos pássaros, o abate dos animais utilizados, animais assustados, a poeira espa- lhada na região, todos são fatores que dizem sobre o movimento da tropa inimiga. Topografia do terreno “Veja seus homens como seus discípulos e eles o se- guirão aos vales mais profundos; zele por eles como se fossem seus filhos queridos e eles ficarão ao seu lado até mesmo na morte.” Neste capítulo, Sun Tzu analisa a questão do terreno e volta às ideias de manobras e adaptação. Existem seis tipos de terrenos: acessível, perigoso, impreciso, desfiladeiros estreitos, cumes escarpados e posições muito distantes do inimigo. Em um terreno acessível, é possível obter vantagem antecipando o ini- migo e ocupando lugares mais elevados e ensolarados. No terreno perigoso, a chance de vitória é atacar de surpresa enquanto o adversário não está preparado. No terreno impreciso, o melhor a fazer é atrair o adversá- rio, já que a região não confere vantagem. Em desfila- deiros estreitos, proteja muito bem as posições e espere a vinda do inimigo. Em relação aos cumes escarpados, ocupe os lugares mais elevados. Se o inimigo ocupou os cumes antes de você, retire-se e tente instigá-lo a sair. A longa distância, não é prudente provocar uma batalha, pois lutar, nesse caso, não demonstra vanta- gem. Mestre Sun prevê seis calamidades do exército que são de responsabilidade do general: fuga, insubordi- nação, colapso, ruína, desorganização e fracasso. Em Não é preciso ter olhos abertos para ver o Sol, nem é preciso ter ouvidos afiados para ouvir o trovão. Para ser vitorioso você precisa ver o que não está visível. • Sun Tzu • 19 G RA N D E S E S T RA T E G I S T A S M I L I T A RE S condições equivalentes, se uma força for arremessada contra outra mais numerosa, o resultado é a fuga da primeira. Insubordinação ocorre quando os soldados são mais fortes do que seus oficiais, o que é o contrário de colapso, que acontece quando os soldados são fra- cos demais e os oficiais, fortes demais. O exército será levado à ruína se os oficiais superiores lutarem por conta própria sem a ordem do comandante, baseados em ressentimento. A desorganização é fruto de ordens imprecisas, pouco claras, e deveres não estabelecidos designados aos oficiais. Finalmente, o fracasso acon- tece quando o general subestima o exército inimigo e envia um destacamento fraco contra um forte. A capacidade de avaliar o adversário, de controlar forças da vitória e de calcular as dificuldades, riscos e distâncias, constitui as características de um grande comandante. Manobras em nove situações “O general habilidoso conduz seu exército como se estivesse trazendo pela mão um único homem indeciso.” Neste capítulo, Sun Tzu apresenta um tratamento mais detalhado do relevo, especialmente em termos do relacionamento de um exército com o terreno. Pode- -se inferir que esses detalhamentos das regiões não se tratam apenas do território físico, mas também no sen- tido mais abstrato. A arte da guerra reconhece nove variedades de re- giões: dispersa, acessível, disputada, aberta, intersec- ção, perigosa, difícil, cercada e renhida. Quando um comandante luta em seu próprio território, essa é uma E como a felicidade pode se transformar na insatisfação, assim o desespero pode sumir no despertar de uma nova primavera. Com cada dia,pode nascer um outro entendimento de nosso estado,nossos laços e objetivos. 20 região dispersa. A região acessível acontece quando o exército está penetrado em um território hostil. A re- gião disputada traz grande vantagem para ambos os lados. A região aberta confere grande mobilidade de movimentos. Uma região que seja um ponto-chave, de tal forma que aquele que ocupá-la primeiro terá a maior parte do Império sob seu comando, é uma região de intersecção. A região perigosa deixa a re- taguarda do exército vulnerável a ataques. A região difícil traz um relevo acidentado para o movimento da tropa. Uma região cercada é um local que só é al- cançado através de desfiladeiros e apenas um grupo pequeno de inimigos é suficiente para esmagar um grande número de soldados. A região renhida, ou também região de morte, acontece quando o exército só pode ser salvo se lutar desesperadamente. Ações pirotécnicas “Infeliz é a condição daquele que tenta vencer ba- talhas e ser bem-sucedido na guerra sem cultivar um espírito empreendedor.” O décimo segundo capítulo trata das formas de ataque utilizando fogo. São cinco formas: incendiar os soldados em seu acampamento, incendiar arma- zéns de suprimentos, incendiar os comboios de abas- tecimento, incendiar arsenais e lançar fogo em meio ao inimigo. Sun Tzu analisa as condições favoráveis para atacar com fogo, no caso, quando o clima estiver seco. Neste capítulo, Sun Tzu volta a reafirmarque a guerra deve ser travada apenas como último recurso: “Não se mova, a não ser que seja uma vantagem; não • Sun Tzu • 21 G RA N D E S E S T RA T E G I S T A S M I L I T A RE S use suas tropas a não ser que haja algum proveito; não lute, a não ser que sua posição seja crítica.”. Uso de agentes infiltrados “Só o soberano iluminado e o general capaz é que usarão a mais elevada inteligência do exér- cito com o objetivo de espionar e, por esta razão, conseguirão os melhores resultados.” O último capítulo do livro cuida da espiona- gem. Buscar informações sobre o inimigo é im- portante para a economia do Estado e previne perda de tempo e perda de pessoas e isso é obti- do com a utilização de agentes infiltrados. Exis- tem cinco classes de espiões: locais, internos, duplos, condenados e sobreviventes. Os espiões locais são habitantes contratados do país inimi- go; os internos são oficiais do inimigo; agentes duplos são os espiões inimigos trabalhando a nosso favor; os espiões condenados relatam in- formações erradas para nossos inimigos. Só o soberano iluminado e o comandante capaz é que usarão a mais elevada inteligência do exército com o objetivo de espionar e, por esta razão, conseguirão os melhores resultados. Os espiões são elementos muito importantes na guerra, pois deles dependerá a habilidade do exército para avançar. Dessa forma, Sun Tzu conclui o primeiro e ainda significativo manual de estratégias escri- to, sendo até hoje lido e interpretado mesmo fora do ambiente militar. Um chefe que é capaz deve fingir ser incapaz; se está pronto, deve fingir-se despreparado; se estiver perto do inimigo deve parecer estar longe. 22 • Sun Tzu • 23 G RA N D E S E S T RA T E G I S T A S M I L I T A RE S POR CARLOS HENRIQUE GOMES Musashi 24 Shinmen Musashi No Kami Fujiwara no Genshin foi um famoso samurai japonês, criador do estilo de luta com duas espadas chamado Niten Ichi Ryu, mais conhecido como Miyamoto Musashi, nome da cidade em que o sa- murai nasceu, a aldeia de Miyamoto, no ano de 1584. A obra e os ensinamentos do samurai extrapolaram o mun- do oriental, sendo incorporados nas estratégias militares do Ocidente e ainda nos livros de estratégia voltados para o mercado de trabalho. Prenunciando o que seria sua vida futura, aos 13 anos de idade Musashi matou o samurai Arima Kihei, da esco- la xintoísta Ryu, conhecido por sua habilidade na lança e espada. Aos 16 anos enfrentou e venceu Tadashima Akiyama e tornou-se um samurai sem senhor, um ronin. Para suprir as despesas, sempre contou com a habilidade para escul- pir e desenhar. Participou da batalha de Sekigahara, um conflito importante que acarretou em uma mudança radi- cal na distribuição dos feudos no Japão. Aos 21 anos, lutou contra a família Yoshioka, o famo- so clã de instrutores da casa Ashikaga. Seijiro, o primeiro da família Yoshioka a enfrentar Musashi, empunhava uma espada considerada de boa qualidade, enquanto que Mu- sashi utilizava uma espada de madeira. Com um violento ataque, Musashi derrubou Seijiro e atacou sem parar. Nesse episódio, percebemos o porquê do livro de Mu- sashi ser lido por empresários do mundo inteiro. Nem sempre o mais bem aparelhado para as exigências do mer- cado conseguirá colocar com maior eficácia seus produ- tos, uma boa ofensiva deve ser seguida por uma continui- dade a fim de que o adversário não possa se recompor. Nunca deixe o adversário impor regras apenas porque Qualquer que seja o modo, o mestre estrategista não parece ser rápido... Claro, lentidão é ruim. Pessoas realmente hábeis nunca ficam sem tempo, são sempre deliberadas e nunca parecem estar ocupadas. • Musashi • 25 G RA N D E S E S T RA T E G I S T A S M I L I T A RE S está mais bem equipado e jamais, jamais pare de atacar. Musashi permaneceu em Kioto após essa vitória e lutou com o segundo samurai mais importante do clã Yoshioka, Densichiro. Para esse combate, Musashi chegou atrasa- do e poucos segundos depois do início da luta quebrou o crânio de seu oponente. O ensinamento desse episódio é: conheça suas armas e a técnica de seus oponentes. Não reduza o potencial de seus ataques e numa luta mortal, as- sim como no mercado ou nas práticas militares, não tenha misericórdia. A terceira luta foi contra Hansichiro. Dessa vez, Mu- sashi chegou cedo ao local e escondeu-se. No horário marcado, acreditando que Musashi não apareceria, Hansi- chiro foi surpreendido com a velocidade de Musashi, que o matou, abriu caminho entre o grupo armado e fugiu. Assim como os outros episódios, esse também guardaria uma importante lição para o samurai, sendo aqui a de agir de maneira inesperada. Surpreenda o adversário, cause danos no front mais importante e se não puder aniquilát - -lo, fuja. O duelo mais famoso de Musashi aconteceu em 1612 contra Sasaki Kojiro. O duelo teria acontecido em uma ilha. Durante a viagem, Musashi esculpiu uma espada a partir do remo do barco e chegando ao local, se posicio- nou contra o Sol, atrapalhando a visão de Kojiro. Musashi golpeou Kojiro na cabeça, que caiu morto. O golpe desfe- rido por Kojiro cortou parte da roupa de Musashi. Uma boa estratégia diversiva, seguida de manutenção do firme propósito de executá-la efetivamente, tem resul- tados favoráveis, ainda que não extinga os riscos de con- fronto com um adversário bem preparado. Seja na lógica militar de combate moderno, envolvendo grandes exér- A percepção é forte e a visão é fraca. Em estratégia, é importante ver o que está distante como se estivesse próximo e ter uma visão distanciada do que está próximo. 26 citos ou no mercado de trabalho ou mesmo de ações, se empregam táticas dessa natureza, sendo preciso agir firme para a execução de um projeto, criando táticas e estraté- gias que retirem o foco de seus adversários e concorrentes de sua estratégia principal, conduzindo seus adversários a se ocuparem única e exclusivamente com detalhes su- pérfluos. Após uma sucessão de batalhas vitoriosas, Musashi se aposentou e viveu como recluso em uma caverna chamada Reigendo. Lá, escreveu o Livro dos Cinco Anéis, pouco antes da sua morte, em 1645. Entre os japoneses, Musashi é conhecido como “Ken- sei”, Santo da Espada, e o Livro dos Cinco Anéis é uma obra considerada fundamental entre os livros de arte marcial, uma vez que trata tanto de estratégia quanto de combate corpo a corpo. Segundo as palavras do próprio • Musashi • 27 G RA N D E S E S T RA T E G I S T A S M I L I T A RE S Musashi, trata-se de “um guia para homens que queiram aprender estratégia”. O Livro dos Cinco Anéis é dividido em cinco partes, cada parte representada por um elemento: Terra, Água, Fogo, Vento e Vazio. O livro da Terra trata sobre o Caminho da Estratégia através da escola Niten Ichi Ryu. Neste capítulo, Musashi diz que considerava difícil enxergar o Verdadeiro Cami- nho por meio apenas do treino com a espada, advertindo que devemos observar e conhecer as menores e as maiores coisas. Estratégia é a arte do guerreiro. Os comandantes devem ensinar a arte e os soldados precisam conhecer esse caminho. Segundo Musashi, existem vários cami- nhos para atingir a iluminação: Caminho da Salvação pela Lei de Buda, o Caminho do Aprendizado Governado por Confúcio e o Caminho do Arco e Flecha. Cada um pratica de acordo com a sua inclinação. O Caminho do Guerreiro é o caminho da espada, é a aceitação resoluta da morte. O Caminho da Estratégia se baseia em superar os homens. Musashi lista nove itens para quem quer aprender o Caminho da estratégia: não pensar desonestamente; o Ca- minho está no treinamento; familiarizar-se com todas as artes; conhecer os Caminhos de todas as profissões; dis- tinguir entre ganho e perda nas questões mundanas; de- senvolver julgamento intuitivo e a compreensão de todas as coisas;notar aquelas coisas que não podem ser vistas; prestar atenção a tudo, mesmo aparentes baboseiras; e não fazer nada que não tenha utilidade. O Livro da Água explica a relevância espiritual na es- tratégia. Tanto em luta quanto na vida cotidiana, perma- neça calmo. Mesmo que o espírito esteja calmo, não deixe o corpo relaxar, mas quando o corpo estiver relaxado, não 28 amoleça o espírito. Controle os ânimos, evite os extremos, não deixe o inimigo ver seu espírito. Neste capítulo, Musashi também aborda a posição cor- poral e maneiras de empunhar a espada. O Livro do Fogo descreve a luta. Musashi enfatiza que o estilo da escola Ichi é baseado em muitas disputas, luta pela sobrevivência e eterna prática. O aprendizado se dá arriscando a sobrevivência em inúmeros embates de vida ou morte, nos quais a diferença entre viver ou morrer está no conhecimento ou não dos princípios que regem o Ca- minho da Espada. Aprende-se a reconhecer a força e a fraqueza da espada adversária, enquanto se aperfeiçoam a destreza e o domínio no manejo da sua própria espada. O Livro do Vento analisa outras escolas e faz uma compa- ração com a sua. Musashi se preocupa em explicar a essência de seu estilo por meio do conhecimento do estilo das outras escolas e deixa claro que nenhum dos métodos colocados é o verdadeiro Caminho. Musashi deixa claro também que, em- bora esteja apresentando seus métodos pela escrita, o mes- mo não pode ser explicado dessa maneira, somente por meio do treino. Não há sentido oculto nas atitudes da espada. O Livro do Vazio é o último capítulo e o mais abstrato. Segundo Musashi, Vazio é um termo que ele usa para desig- nar aquilo que não tem começo nem fim. Ao entender esse princípio, significa que não estamos atendendo o princípio e, assim como foi dito no capítulo do Fogo, os princípios devem ser entendidos internamente, com o coração, e não seguidos à risca. Sendo assim, a partir do momento em que não entendermos o princípio, mas sim sentirmos e viven- ciarmos, percebendo que todas as coisas estão interligadas e que o Caminho é um só, lá estará o Vazio, “quando a ati- tude se tornar não atitude e a espada se tornar não espada”. Perceba as qualidades positivas e negativas de tudo, distinguindo entre ganho e perda nas questões mundanas. • Musashi • 29 G RA N D E S E S T RA T E G I S T A S M I L I T A RE S POR CARLOS HENRIQUE GOMES Aníbal 30 Aníbal Barca (Cartago, 247 a.C. - Bitínia, 182 a.C.) foi um ge- neral e estrategista cartaginês, considerado um dos maiores estra- tegistas militares da história. Aníbal obteve sua fama devido às suas táticas e manobras durante a Segunda Guerra Púnica, que ocorreu entre 208 a.C. e 201 a.C., envolvendo Cartago e Roma. Aníbal foi filho de Amílcar Barca, um importante estadista car- taginês responsável pela conquista da Península Ibérica durante a Primeira Guerra Púnica. Cartago era uma potência comercial e marítima no Mediterrâneo. Possuía uma inimizade histórica com Siracusa, cidade grega situada ao leste da ilha da Sicília, tendo ambas as cidades pretensões de dominar a ilha. Cartago viu uma oportunidade de conquistar Siracusa quando, em um conflito en- volvendo mercenários italianos, Siracusa pediu ajuda a Roma e a Cartago. Roma, temendo uma expansão do domínio cartaginês, mandou um exército e atacou os sitiantes mercenários. Siracusa, portanto, se aliou a Roma. Tal aliança se contrapôs aos interesses de Cartago. Cartago, perdendo o domínio da Sicília, decidiu lançar uma expedição sobre a Península Ibérica e promover uma retaliação contra os romanos em território europeu, uma vez que sua frota foi perdida após a assinatura da paz e, além disso, precisava buscar recursos para pagar Roma. Foi durante essa guerra que Amílcar alimentou o ódio de seu filho por Roma, levando-o em suas campanhas desde os 9 anos de idade. Após a morte do pai, Aníbal assumiu o comando do exér- cito cartaginês com apenas 26 anos, com o objetivo de conquistar o restante da Península Ibérica para promover um ataque a Roma. A genialidade e ousadia do general Aníbal foi vista logo no co- meço da Segunda Guerra Púnica, na Batalha do Lago Trasimeno, onde Aníbal iniciou o ataque à Península Itálica. No entanto, o ge- neral inverteu a lógica e, em vez de partir por mar, Aníbal seguiu por terra pelo sul da Gália e atravessou os Alpes, visando atacar Roma pelo norte, mesmo porque Cartago havia perdido a hege- Ou nós encontramos um caminho, ou abriremos um. • Aníbal • 31 G RA N D E S E S T RA T E G I S T A S M I L I T A RE S monia marítima na Primeira Guerra, perdendo Sardenha e Cór- sega para Roma. O exército romano, buscando bloquear o avanço de Aníbal no rio Ródano, se surpreendeu mais uma vez. Aníbal tomou outra rota e atravessou o rio mais acima, utilizando balsas para passar os elefantes. Uma rota muito mais complicada, porém muito mais difícil de ser defendida pelos romanos. Com o objetivo de atravessar dois bloqueios romanos colocados ao norte, Aníbal decidiu repetir a estratégia, e os cartagineses buscaram surpre- ender os romanos, optando por avançar através de pântanos. Tal travessia cobrou seu preço, levando os exércitos cartaginenses a so- frerem grandes perdas. Apesar disso, a estratégia deu certo, o que ficou claro ao se depararem com os exércitos romanos surpresos e sem esperar pelo ataque, que agora era iminente. A consagração de Aníbal se deu na Batalha de Canas, que, junto com as ações do general, se tornou uma das batalhas mais estudadas pelos estrategistas militares até os dias de hoje. Aníbal escolheu um terreno que o favorecia, com o Sol às suas costas e o vento contra os romanos. Ele dividiu o exército de modo que a disposição das tropas formasse um “V” invertido apontado para os romanos, sendo que a infantaria mais fraca ficaria no centro e a cavalaria, disposta nos flancos. Os romanos estavam ganhando no centro do campo, forçando a infantaria cartaginesa a recuar, en- quanto que os flancos mantinham as posições. O resultado dessa manobra foi a formação de uma meia-lua. A cavalaria cartaginesa fechou e atacou a retaguarda romana, fechando o cerco e massa- crando os romanos. As batalhas da Segunda Guerra Púnica deixaram importantes ensinamentos. Embora em maior número, Roma não conseguiu a vitória por ter subestimado seus oponentes; os romanos não es- peravam que as tropas de Aníbal pudessem atacar pelos Alpes. Na verdade, Roma subestimou a importância do conhecimento da ge- ografia e do terreno. Analisando os princípios estratégicos de Aníbal, podemos con- Vamos aliviar o povo romano de seus cuidados contínuos, desde que pensem que aguardam a morte de um homem velho. 32 cluir que o general teve grandes prejuízos ao escolher os caminhos para atacar Roma, porém ele soube ser objetivo e os prejuízos fo- ram compensados com o alvo alcançado da maneira planejada. Aníbal dirigiu toda a operação para uma finalidade claramente definida, ele estava muito mais comprometido com suas metas do que os romanos. Ele atacou o inimigo em pontos vulneráveis e onde esses estariam desprevenidos. Soube lidar com forças fracas e fortes, mantendo as tropas principais em espera até o momento certo e utilizando as mais fracas como isca. Na grande maioria das listas atuais de princípios estratégicos, os conceitos fundamentais são: 1. O princípio da massa, ou seja, concentrar o combate no local e no momento certo. Isso é possível desde que o estrategista colo- que as unidades de infantaria e cavalaria no local mais adequado e no momento mais favorável, com manobras rápidas e através de grandes distâncias, a especialidade de Aníbal. 2. O objetivo: toda a operação militar deve visar à realiza- ção de uma meta claramente definida e importante. O intuito • Aníbal • 33 G RA N D E S E S T RA T E G I S T A S M I L I T A RE S final da guerra éo aniquilamento das forças armadas inimigas e da sua vontade de combater. Assim foi Aníbal, pretendeu atacar Roma por terra e assim o fez, não importando a difi- culdade de atravessar os Alpes, ele sabia que teria sucesso. Sua vontade de combater foi vista logo no começo provocando a guerra e nunca recuando, seu ódio por Roma foi um grande combustível para sua ousadia. 3. A ofensiva, que confere ao estrategista liberdade de ação. To- 34 mando a iniciativa é mais fácil impor o seu jogo ao inimigo, tor- nando mais fácil a estratégia de colocar o inimigo em pontos onde se possa atacar. 4. Economia de forças é o que permite o princípio da massa. Guerrear com o mínimo de desgaste de recursos foi fundamental para Aníbal combater os romanos, já que Roma possuía um exér- cito infinitamente maior, além de um maior número de aliados. 5. Manobra. Uma das características mais proeminentes de Aníbal. O general soube colocar suas tropas em locais que o favore- ceram, tanto no desvio para evitar bloqueios quanto em ofensivas para compensar o menor número de soldados. 6. Unidade de comando: é importante não haver dispersão de responsabilidades, um único comando para conduzir uma força militar é a forma mais eficaz de obter unidade de esforços. Cartago tinha plena confiança em seus generais. Na Segunda Guerra Púni- ca, Aníbal tinha pleno comando do exército e mandou Asdrúbal para assumir o controle da Península Ibérica. 7. Segurança: Aníbal nunca permitiu que Roma adquirisse uma vantagem inesperada. Isso foi possível porque Aníbal sempre to- mou a iniciativa e teve liberdade de ação. 8. Surpresa: significa atingir o inimigo no momento exato e no lugar mais inesperado por ele. Aníbal soube realizar isso com ma- estria ao atacar pelos Alpes, até então uma muralha impenetrável para os romanos, além de contornar os bloqueios romanos por pântanos e surpreender o exército romano que estava em acam- pamento e totalmente despreparado para qualquer conflito. É mais um fator que permite exércitos menores vencer tropas maiores. 9. Simplicidade: a simplicidade e a clareza dos planos reduzem o risco de interpretações erradas e as possibilidades de confusão na sua execução. O comando de Aníbal com certeza foi claro e objeti- vo. Foram necessárias manobras sincronizadas na Batalha de Ca- nas para que o cerco funcionasse da maneira correta. Foi um plano simples de ser realizado, porém concebido apenas por um gênio. A paciência na adversidade é sinal de um coração sensível. • Aníbal • 35 G RA N D E S E S T RA T E G I S T A S M I L I T A RE S POR RUI LEON Alexandre, o Grande 36 O mundo no qual Alexandre nasceu e cresceu Alexandre foi um dos mais importantes generais da Antiguidade, conquistou a maior parte do mundo conhecido até então e escreveu seu nome na História. Nasceu no dia 20 de junho de 356 a.C., em Pela, era fi- lho de Olímpia de Épiro, que havia sido desposada por Filipe II da Macedônia, local que ficava nas frontei- ras daquilo que ficou conhecido como Magna Grécia. Embora os macedônios não fossem vistos pelos gregos como portadores da cultura helênica, terminaram por se misturar a eles em função das guerras que travaram. Tanto Filipe quanto Alexandre, assim como to- dos os outros reis macedônios, consideravam-se des- cendentes de Hércules. Por parte de mãe, Alexandre também possuía Aquiles como antepassado, o que fa- zia dele descendente dos dois maiores heróis gregos, segundo Plutarco. Porém, outra herança contribuiria muito mais decisivamente para transformar Alexandre no maior conquistador do mundo antigo e essa era de um guerreiro que nada tinha de mítico: Filipe II, seu pai. Filipe empreendeu uma guerra contra os gregos já consideravelmente desgastados pela Guerra do Pelo- poneso. Propôs às cidades de Atenas, Tebas e Esparta uma paz e uma aliança na qual lideraria as Cidades- -Estados Gregas contra o “inimigo” comum, os Persas. A proposta foi amplamente recusada pelas cidades. Outro legado deixado por Filipe a seu filho Alexan- dre foi que o Rei sempre optou pela diplomacia, mas sabia que para ser atendido não havia nada melhor do que uma enorme capacidade de guerra, que demons- Eu não temeria um grupo de leões conduzido por uma ovelha, mas eu sempre temeria um rebanho de ovelhas conduzido por um leão. • Alexandre, o Grande • 37 G RA N D E S E S T RA T E G I S T A S M I L I T A RE S trou a essas Cidades-Estados já tão desgastadas. Mas para vencer essa guerra, não bastaria esse desgaste, no- vas estratégias de Guerra teriam que ser pensadas, e foi assim que Filipe, junto a seus engenheiros, introduziu inovações técnicas em seu exército que permitiram que saísse vitorioso nas batalhas. A primeira e nada desprezível foi a Sarissa, uma lança de 4 a 7 metros, utilizada pela infantaria de Fili- pe organizada em falanges, uma formação retangular onde os soldados marcham e atacam de maneira sin- cronizada. Seus soldados receberiam treinamento para conseguir usar essas lanças, alternando os flancos na hora do ataque. O tamanho das lanças impedia que as falanges adversárias conseguissem chegar até eles. Fi- lipe aumentou o número de soldados em 10 fileiras, sendo que a segunda fileira também carregava grandes lanças projetadas entre as primeiras – teríamos a im- pressão de estar vendo um porco-espinho ao ver essa falange marchando. Sua retaguarda era defendida pela cavalaria, assim como por uma infantaria pesada que trazia inovações técnicas, como as Torres de Cerco e a impressionante Catapulta de torção, uma espécie de besta ligada a uma engrenagem que disparava um fle- cha com uma potência jamais vista até então. Além dis- so, fez uma reforma no exército, profissionalizando-o e transformando a participação obrigatória aos mace- dônios. Foi assim que o pai de Alexandre sobrepujou Atenas e outras Cidades-Estados gregas. Tragicamente, Filipe da Macedônia não conseguiria derrotar o Rei Persa, pois seria assassinado por um de seus guarda-costas. Os motivos que levaram Pausânias a assassiná-lo ficaram completamente desconhecidos, Pessoas são como cobras! Você pode dar amor, carinho, afeto, até mesmo alimentá-las mas em um determinado momento elas vão acabar lhe picando, pois é da natureza delas 38 na medida em que assim que os guardas de Filipe o alcançaram já lhe deram cabo, sem deixar que o exe- cutor se explicasse, o que deu margem para inúmeras interpretações. Alexandre torna-se o Grande O trono não ficaria vacante nem por alguns segun- dos. Alexandre assumiria aquilo que fora preparado para fazer, se pensarmos que quando seu pai partiu em guerra contra Bizâncio ele havia assumido o trono como príncipe regente aos 16 anos, a mesma idade em que ele havia encerrado seus estudos com Aristóteles, e nesse período ele teria que responder a uma revolta, • Alexandre, o Grande • 39 G RA N D E S E S T RA T E G I S T A S M I L I T A RE S que esmagou com particular eficiência, e pensarmos também que quando seu pai retornou o enviou em campanhas militares. Assim, quando teve que assumir o trono, mesmo havendo boatos que Filipe preferia o seu irmão mais novo de outro casamento, o jovem Alexandre, com 20 anos, não teve dificuldades, pois contava com a apro- vação dos generais, entre eles Antiparto, e os mace- dônios sabiam de seus feitos como guerreiro e o viam com muita simpatia. Mas se a morte de Filipe não trouxe grandes proble- mas internos para Alexandre, o mesmo já não se podia dizer das Cidades-Estados gregas: a morte de Filipe le- vou a uma tentativa de sublevação destas. Alexandre foi pessoalmente resolver as revoltas com cerca de três mil soldados, mostrando desde aí seu gênio militar, emboscando os tessálios pela retaguarda e de surpresa, não lhes deixando outra opção senão se entregarem e aderirem à cavalaria de Alexandre quemarchava rumo ao Peloponeso, disciplinando Cidades-Estados como Corinto. Atenas sequer chegou a se enfrentar com os exércitos de Alexandre, reconhecendo sua superiori- dade através de seus embaixadores, porém se Alexan- dre quisesse manter controle de toda a Grécia, precisa- va continuar o empreendimento de seu pai e se colocar contra o inimigo comum, aquele conhecido como o Grande Rei, o Rei dos Reis, Dario III, o rei da Pérsia. A justificativa que Alexandre deu a Dario para a Guerra foi, primeiramente, libertar as cidades gregas na Ásia Menor (Turquia) e, a segunda, uma represália contra o que Xerxes havia feito à Grécia em 480 a.C. quando seus exércitos queimaram e saquearam Atenas. 40 As Cidades-Estados gregas na Ásia Menor haviam sido conquistadas dos persas por Filipe, mas um mercená- rio grego chamado Memmom de Rodes as havia reto- mado para o controle do Rei dos Reis. A Conquista do litoral Segundo Plutarco, antes de Alexandre desembar- car na Ásia, após ter cruzado Helesponto em 344 a.C., ele atirou uma lança da embarcação onde estava e, ao desembarcar, pegou a lança e disse: “Por essa lança a Ásia inteira será conquistada.” Lenda ou não, a questão é que Alexandre de fato iria conquistar a Ásia inteira através de seu gênio militar e diplomático. O Rei tinha como primeiro objetivo libertar as cidades gregas da Ásia Menor, mas esse não era o único motivo que o impelia a começar a guerra por ali, havia também uma necessidade estratégica de retirar por terra as cidades que permitiam ao Reino Persa lançar suas esquadras ao Mediterrâneo, o que colocava a Grécia sempre na eminência de uma guerra contra os Persas, na medida em que esses controlavam o Mar Egeu por meio de seus postos marítimos. Os macedônios, não sendo uma potência marítima, tinham como única alternativa tomar por terra as cida- des litorâneas primeiro, tanto é que quando olhamos no mapa as incursões de três batalhas, elas se desta- cam, revelando o gênio do estrategista: a primeira é Grânico em 334 a.C., a segunda é Issos, em 333 a.C., o terceiro é o famoso cerco a Tiro, em 332 a.C. e, no mesmo ano, a conquista de Gaza. Segundo o historiador Pierre Briant, Alexandre de- sembarcou na Ásia com cerca de 30 mil soldados de in- Na fé e na esperança o mundo discordará, mas todo o interesse da humanidade está na caridade. • Alexandre, o Grande • 41 G RA N D E S E S T RA T E G I S T A S M I L I T A RE S fantaria e cinco mil cavaleiros, enquanto é sabido que os Persas tinham condições de mobilizar tropas ainda mais numerosas. Havia um número significativo de soldados gregos entre as tropas de Alexandre, o que era uma fórmula muito hábil que ele usava, na medida em que seus soldados eram ao mesmo tempo reféns das Cidades-Estados conquistadas e uma revolta nessas ci- dades poderia fazer com que os soldados pertencentes a elas sofressem assim que se soubesse da revolta. Ao desembarcar na Ásia, Alexandre avançou em três dias sobre a planície de Grânico, parando apenas no Rio com o mesmo nome. Os Sátrapas não ouviram a recomendação do mercenário grego Memmon de Ro- des, que lhes propôs usar a tática de terra devastada, desgastando as tropas Macedônicas e as obrigando a bater em retirada pela fome para depois atacar Alexan- 42 dre em suas próprias terras. Os Sátrapas se recusaram a atacar a própria população e optaram pelo confronto, estabelecendo seus exércitos na outra margem do Rio Grânico. Todavia, muitos dos generais e oficiais mace- dônios ficaram preocupados com a profundidade do rio e, podendo atolar nele, seriam alvos fáceis para os arqueiros persas. Mesmo assim, Alexandre insistiu em um ataque, não se sabe se por coragem ou porque suas condições materiais eram um tanto precárias. Alexandre coordenou um ataque no qual ele, jun- to à sua Cavalaria, atacaria pelo flanco direito, sendo ele facilmente reconhecível com seu capacete de plu- mas e seu escudo, o que moveria as tropas persas para esse lado do combate, dando tempo para sua infantaria atravessar o rio pelo centro, enquanto a hábil cavalaria tessaliana atacaria pela esquerda, como mostra o grá- fico abaixo: • Alexandre, o Grande • 43 G RA N D E S E S T RA T E G I S T A S M I L I T A RE S A infantaria de Alexandre, se valendo da habilidade do uso da Sarissa, conseguiu facilmente debandar a ca- valaria persa e venceu a batalha, porém os números de baixas apresentados por Plutarco são claramente exa- gerados em favor de Alexandre. Segundo Plutarco, os Persas perderam 20 mil soldados de infantaria e 2.500 cavaleiros. Em contrapartida, as tropas macedônias perderam a irrisória soma de 34 mortos, sendo nove da infantaria (Plutarco, p. 37, 2005). Os que ficaram no local foram os mercenários gre- gos, que os sátrapas resolveram não usar. Estavam cer- cados no alto de uma colina, tendo implorado o per- dão de Alexandre, que o concedeu, incorporando-os em suas forças. Fortalecido por essa vitória, Alexandre avançou sobre outras cidades do litoral, apenas Mileto e Hali- carnasso opuseram resistência, mas com tudo ao redor tomado pelas tropas de Alexandre, ele não teve dificul- dades em obter a vitória, o que lhe colocava a seguinte questão: continuar com seu programa de conquistar o litoral ou se bater com Dario logo, ingressando pelo interior da Ásia, para onde havia escapado? Alexandre achou melhor seguir seus planos e avançar via terra, pelo litoral, neutralizando suas esquadras. Contudo, Dario não veria suas cidades caírem uma a uma ante o imperador Alexandre sem fazer nada, ele colocaria um enorme contingente na cidade Issos, importante posto de abastecimento das tropas mace- dônicas. Alguns historiadores falam de 90 mil a 500 mil soldados, mas sabemos o quão arbitrário são esses números. Mesmo assim, essa batalha, junto à de Tiro, 44 acabaram por ser decisivas. Alexandre mostraria seu poder de adaptação na ba- talha de Issos. Dario havia montado uma verdadeira fortaleza com arqueiros, cavaleiros e uma forte reta- guarda, em geral de gregos mercenários, porém Ale- xandre optou por avançar pelas montanhas, podendo ver como estava a disposição do exército persa e pen- sar na melhor forma de incursão, o que permitiu a ele realocar todas as suas tropas que, apesar de numeri- camente inferiores, fizeram o que sabiam fazer de me- lhor: a guerra através de cerco, o que obrigou o exérci- to persa mais uma vez a bater em retirada e Dario ter que fugir, já que ele teria participado da batalha. O Rei Persa havia deixado para trás sua família e, apesar da guerra impiedosa que Alexandre travava contra o Rei dos Reis, segundo Plutarco, o Rei Macedônico tratou a rainha e as duas princesas com todas as honrarias que a família real persa sempre teve. Após essas batalhas, Alexandre sabia que tomar todo o litoral seria questão de tempo. Todavia, preci- sava ainda tomar uma importante cidade fenícia que, diferentemente de Biblos e Sídon, não havia aceitado o domínio de Alexandre. Os embaixadores macedônicos que foram propor a rendição de Tiro não voltaram com vida, e essa cidade era fundamental para consolidar seu domínio no Egeu. Contudo, a cidade de Tiro con- tava com dois inconvenientes: o primeiro: ela era uma ilha, levantando a questão de como levar os soldados até ela para combater, e, além disso, era uma cidade muito fortificada, com muros quase intransponíveis. Na primeira fase do cerco, Alexandre, junto aos seus engenheiros, construiu um impressionante aterro Meu pai me deu este corpo que é efêmero; mas o meu mestre me deu uma vida que é imortal. • Alexandre, o Grande • 45 G RA N D E S E S T RA T E G I S T A S M I L I T A RE S ligando a ilha ao continente, mas quando os mesmos ali chegaram, os arqueiros de Tiro não os deixaram continuar os trabalhos. Era imperativo pensar novas formas de cerco, e, assim, Alexandree seus engenhei- ros construíram torres de cerco com catapultas de tor- ção e iniciaram a primeira fase do cerco. Da cidade de Sidon, enviaram um número significativo de trirremes para impedir que as de Tiro zarpassem de seus portos. Porém, esses navios não conseguiam atingir os muros da cidade, pois Tiro havia lançado enormes pedras ao mar que os impediam de se aproximarem, mesmo sen- do os trirremes navios próprios para cabotagem. A cada tentativa de transpor os muros de Tiro, pa- recia que a profecia do sonho de Alexandre se confir- mava. Ele havia sonhado com Hércules lhe guiando para dentro da cidade e os seus sacerdotes haviam in- terpretado o sonho da seguinte maneira: Alexandre irá vencer em Tiro, mas antes disso seria necessário um esforço hercúleo. Depois de quase sete meses de cerco e após as pe- dras terem sido removidas e as embarcações poderem atracar no litoral, Tiro cai. Alexandre foi implacável com essa cidade e relatos de historiadores antigos, por mais exagerados que pareçam, dão o tom da resistência imposta: segundo eles, Alexandre fez nessa cidade 30 mil escravos. Após a queda de Tiro, a maioria de cidades litorâne- as não impôs resistência ao domínio macedônico, até porque Alexandre havia aprendido com seu pai como tratar os vencidos e, desde que o obedecessem, man- tinha o sistema administrativo local, muitas vezes ca- sando seus generais com filhas da elite local, como ele Eu superaria mais os outros no conhecimento do que é excelente do que no tamanho dos meus poderes e domínios. 46 mesmo havia feito se casando com a filha do Rei Persa. Apenas Gaza, confiando em suas fortificações, lhe im- pôs resistência, mas com a experiência que ele havia adquirido em Tiro, em cerco, Gaza caiu após três ten- tativas de ser tomada. Se Alexandre era clemente com as cidades que se rendiam, era impiedoso com as que lhe impunham forte resistência: em Gaza, os homens sentiram o peso da lâmina dos macedônios e as mu- lheres e crianças seriam vendidas como escravas. Po- rém, Gaza marcou definitivamente a tomada de todo o litoral. O Rei General partiria para um local fundamental • Alexandre, o Grande • 47 G RA N D E S E S T RA T E G I S T A S M I L I T A RE S no Mediterrâneo, conhecido como celeiro do mundo, graças à sua alta produção cerealífera, em especial no seu delta. Era o Egito, região que não opôs resistên- cia alguma a Alexandre, segundo Plutarco devido ao fato de os sacerdotes da casa de Amom o identificarem como filho de Zeus, o que os levavam a vê-lo como alguém por quem Amom tivesse uma predileção ou até mesmo sendo filho dele, uma criatura divina cujos feitos na Ásia Menor reforçam. Era assim chamado de Meryamun Setepenra Alexandros (Alexandre, amado por Amom, escolhido por Rá) e foi coroado imperador e ali, no delta do Nilo, fundou a mais famosa das Ale- xandrias. O embate final com Dario Alexandre ficou alguns meses no Egito, região que exercia nele um grande fascínio, e um tempo na Fení- cia, mas apesar de ele agora ser senhor de toda a Gré- cia, e desde a batalha da Issos havia sido proclamado 48 senhor de toda a Ásia, Dario ainda vivia e governava toda a porção oriental do Império Aquemênida. Ale- xandre mobilizou novamente seus exércitos, que agora contavam com cerca de 40 mil homens na infantaria, enquanto Dário havia se refugiado na maior cidade de seu império, a Babilônia, organizando lá uma for- ça descomunal para arrebatar Alexandre, ou forçá-lo a aceitar um acordo de paz. Dario ofereceu todas as terras da Ásia Menor para Alexandre e mais o Egito e a Grécia, terras já conquistas por Alexandre, mas a resposta foi negativa, pois o Rei Macedônio ansiava pela cabeça do Rei dos Reis e, talvez, estivesse aí sua desgraça. Dario aguardou Alexandre ao norte de Babilônia. Contava com o deserto para deixar famélicas as tropas macedônicas e ainda combateria em um local que co- nhecia bem. Mais uma vez o gênio bélico de Alexandre se revelaria: levou suas tropas para áreas menos quen- tes entre o Rio Tigre e Eufrates e não foi de encontro imediato com as tropas de Dario, fazendo com que o Reis dos Persas deslocasse as suas para ir ao seu en- contro. Era a maior força que Alexandre jamais enfrentara. Alguns falam em 200 mil homens de infantaria e mais 40 mil na cavalaria, além de Dario ter modernizado seu exército e trazido elefantes para o combate, ani- mais que Alexandre nunca havia enfrentado. Alguns colocavam a proporção em cinco persas para cada um macedônio nessa batalha (claro que esse número pode ter sido significativamente aumentado pelos cronistas de Alexandre para aumentar os louros de sua vitória). Alexandre, um dia antes, optou por deixar seu exér- Lembre- se que da conduta de cada um depende o destino de todos. • Alexandre, o Grande • 49 G RA N D E S E S T RA T E G I S T A S M I L I T A RE S cito dormir e comer. Bem alimentados e descansados, o exército de Dario III não conseguia fazer frente à infernal falange macedônia com suas Sarrisas e agilidade do com- bate. Os elefantes em combate faziam enorme estrago, até que Alexandre mandou que seus arqueiros cegassem os paquidermes. Assim, Alexandre obrigou Dario a bater em retirada, perseguindo-o no dia desta batalha até o li- miar de suas forças, mas ele escaparia mais uma vez. Apesar de Dario ter fugido, a batalha teve conse- quências terríveis para ele. Alexandre capturou sua biga, suas armas e todo seu tesouro e, com o exército persa disperso, rapidamente se apoderou da Babilônia, uma cidade cujo esplendor e riqueza eram maiores do que qualquer Cidade-Estado grega. Os objetivos da guerra estavam cumpridos. Alexan- dre havia libertado as cidades gregas da Ásia Menor, porém ele não se deu por satisfeito e marchou cidade após cidade atrás do Rei dos Reis, que agora contava com pouco apoio da própria elite persa. Enquanto Ale- xandre permanecia em Rages, Dario III demonstrou disposição para enfrentar novamente o exército de Alexandre, porém Bessos, um dos Sátrapas mais pode- rosos, tentou traí-lo, com esperança de que Alexandre o proclamasse Sátrapa das cidades persas do Império Persa do Oriente. Todavia, Alexandre perseguiu Bes- sos, que se encontrando com Dario, o matou, coisa que levou Alexandre a lamentar profundamente o regicí- dio, mandando o corpo do rei para ser sepultado com todas as honrarias que o Rei dos Reis merecia. O legado cultural que Alexandre criou, chamado helenismo, perseverou ainda que seu império tenha se esfacelado em disputas entre os seus generais. Que nosso exército sejam as árvores, as rochas e os pássaros do céu. 50 • Alexandre, o Grande • 51 G RA N D E S E S T RA T E G I S T A S M I L I T A RE S POR RUI LEON Júl io César 52 Poucos nomes na História não necessitam de uma apresentação acurada como Caio Júlio César. Porém, como é comum a esses tipos de personagens, o mito acaba abafando o homem. É certo que sua importância foi tama- nha que seu nome passou a virar o título pelo qual todos os imperadores foram chamados, apesar de Júlio César nunca ter sido imperador, sendo o primeiro seu sobrinho Octavio, que viria a ser o Augusto e que adotaria o nome de seu tio em homenagem. César nasceu no dia 10 de julho do ano 100 a.C., filho de patrícios, de uma espécie de segunda nobreza ou no- breza empobrecida, razão pela qual seu pai jamais conse- guiu alcançar grandes cargos dentro da república romana. Seu parentesco mais significativo, que pode ser digno de nota, é aquele que foi proporcionado pelo casamento de sua tia por parte de pai com um proeminente general da República, um homem que, segundo o historiador Pierre Grimal, teria vindo da plebe e subido de cargo através de seus êxitos militares. Seu nome era Mario. César nasceu em um tempo em que as Guerras Púnicas haviam chegado ao fim, trazendo àtona toda uma gama de contradições, pois os soldados que lutaram na guerra haviam sido deixados de lado pelos ambiciosos senadores. O povo se encontrava na miséria absoluta, os saques eram rotineiros e ex-oficiais organizavam soldados fora de ati- vidade para realizá-los. Os homens públicos se dividiam entre aristocratas em geral, compostos por patrícios e o que poderíamos chamar de democratas, em geral tribunos que inflamavam a plebe famélica contra os aristocratas, como era o caso do general Mario. Roma submergia em uma guerra civil. Até que surgiu, por volta de 83 a.C., um homem cha- Palavras, são só palavras. As atitudes, elas sim mostram quem você realmente é; seu caráter, sua personalidade, o que você sente e o que quer. • Júlio César • 53 G RA N D E S E S T RA T E G I S T A S M I L I T A RE S mado Sula, general romano famoso pelas suas vitórias no Oriente, que esmagou nos portões de Roma o parti- do popular, mandando executar mais de 40 senadores e mais de 2.500 cavaleiros, base dos democratas na guerra civil, declarando-se ditador perpétuo, perseguindo to- dos os seus inimigos, em especial Mario e seus aliados. No meio deles, constava o nome de um jovem chamado Caio Júlio César, que nesse momento estava casado com Cornélia, filha de outro de seus inimigos. Sula mandou que César se separasse da mulher. Ele se negou, optando pelo exílio, mesmo tendo sido perdoado por Sula, que profeticamente disse: “Roma encontrará neste jovem vá- rios Marios.” César torna-se um político César voltou a Roma após Sula se retirar da vida pú- blica. Fora de Roma, pôde estudar retórica, filosofia e se dedicar ao exército. Na volta, morreram sua esposa Cornélia e sua tia Júlia, fazendo ele questão de sepultá- -la com a máscara funerária de seu esposo Mario, coisa que não era bem vista pelos antigos seguidores de Sula, e de fazer um belo discurso em sua homenagem, o que não era de praxe para mulheres mais jovens. Tal ato é interpretado hoje como uma jogada política, na medida em que esse funeral o fez cair nas graças do povo no momento em que se candidatava para questor. Em 63 a.C., César foi eleito pretor em um momen- to em que Roma entrava novamente em Guerra Civil e as disputas intestinais no Senado voltavam a ocorrer, somadas ao fantasma da revolta escrava de Espártaco que ainda assombrava o povo romano. Nesse cenário também se projetava o nome de outros dois membros Nem todas as pessoas sabem demonstrar o amor que sentem, porém, isso não significa que as mesmas não amem com toda força que podem. 54 importantes de Roma: o rico Crasso e o experiente Pom- peu. Cícero foi o responsável por impedir que uma nova guerra civil ocorresse. César percebeu que o caminho para chegar ao consu- lado, cujas eleições se avizinhavam, era usar seu prestí- gio adquirido pela sua fantástica oratória, combinando a isso seu prestígio militar e uma aliança com dois no- mes destacados dentro da república, Crasso e Pompeu, que formariam o primeiro Triunvirato. Elevando Júlio César a cônsul, Pompeu buscava gol- pear a aristocracia que sempre o deixara à margem, a despeito de suas enormes vitórias, exclusivamente por não ter origem patrícia, ignorando seus pedidos para que seus soldados obtivessem alguma recompensa pe- las guerras travadas. Por sua vez, Crasso tinha uma ver- dadeira obsessão pelo Oriente, com suas promessas de grandes tesouros, além de buscar a todo custo conven- cer o Senado a fazer guerra contra o Império Arsácida, • Júlio César • 55 G RA N D E S E S T RA T E G I S T A S M I L I T A RE S que sabiamente o Senado sempre negou. A tentativa de incursão nessas terras colocaria fim à vida de Crasso. Com César eleito cônsul, ele governaria arbitraria- mente contra a aristocracia, possuindo um projeto po- lítico para si e para Roma muito mais acabado do que Crasso ou Pompeu, tal qual aponta Grimal: “Isso pode ser visto durante seu consulado. Ele quis de fato realizar reformas necessárias de maneira pacífica; ele quis dar terras aos miseráveis, limitar os excessos dos governan- tes nas províncias; é também a ele que se deve a publi- cação, pela primeira vez na história, de um jornal de Roma, que comunicava ao público notícias importantes e permitia à opinião pública tomar partido com conhe- cimento de causa.” (Grimal, p. 112). O Senado se contorcia de ódio de César e ele tinha clara percepção de que deveria evitar o destino dos Gra- cos, pois o que aconteceria com ele após seu mandato 56 como cônsul? Os senadores não iram querer lhe cobrar todas essas medidas com sangue? Desde a fundação do jornal, César percebeu que o poder de Roma estava em quem controlasse a opinião pública da plebe. Assim, aliou-se a um propagandista brilhante chamado Públio Clódio e seu próximo passo foi eliminar um antigo conhecido e homem tão capaz quanto Públio em conduzir a opinião pública: o ex-côn- sul Cícero. Com o exército, Públio, e mais o enorme ape- lo popular que possuía, conseguiu mandar Cícero para o exílio. Os senadores foram incapazes de perceber que o que estava por trás dessa medida era a enorme sanha de poder inconteste de Júlio César, não movendo uma palha para salvar Cícero. Ao término do mandato como cônsul, conseguiu para si o governo da Gália, que lhe garantia um enor- me exército dividido em várias legiões. Ele sabia que se derrotasse o último foco da resistência gaulesa, voltaria para Roma carregado nos braços de seus soldados e ova- cionado pela plebe. A guerra da Gália A Gália é um território que hoje compreende parte da França, Bélgica e Suíça. Ela não era um estado cen- tralizado como Roma, era dividida em pequenas tribos com um líder, podendo essas tribos variar de tamanho significativamente. Os gauleses foram retratados de ma- neira vívida nos célebres personagens de um quadrinho francês chamado Obelix e Asterix. Foi ali que Júlio César demonstrou toda sua perícia bélica. Apesar de a Guerra da Gália ter sido batizada com esse nome, ela não foi propriamente uma guerra, Às vezes nos esquecemos que somos humanos e sem perceber passamos por cima de nossos próprios sentimentos! • Júlio César • 57 G RA N D E S E S T RA T E G I S T A S M I L I T A RE S mas uma série de batalhas e incursões que César fez du- rante seis anos até ter conquistado toda a Gália. O primeiro elemento que Júlio buscou antes de qual- quer coisa foi conquistar a fidelidade de seus legioná- rios. Vestia-se com um manto vermelho para sempre ser facilmente identificado na batalha e buscou dividir o butim com seus soldados da maneira mais igualitária. Os seus legionários tinham um fidelidade canina a Júlio César. Outro elemento que César explorou foi o fato de os gauleses serem divididos em tribos, aproveitando-se das rivalidades entre eles para conseguir aliados dentro do povo que procurava dominar. Além disso, após mostrar para as tribos germânicas que conseguia atravessar o Reno com a edificação de uma ponte espantosamente construída no espaço de 10 dias para atravessar mais de 40 mil soldados, conquistou o apoio destes bárbaros, que preferiam não ter que enfrentar a legião de César. Porém, os motivos torpes que levaram César a ata- car os gauleses levariam várias tribos a se organizarem sob o comando de um líder chamado Vercingetorix, que conseguiu infringir a primeira derrota às legiões de Ce- sar, capturando-as e migrando com seus 80 mil soldados para Alésia. Ali, em 52 a.C., foi empreendida a mais fan- tástica tática de cerco de toda Antiguidade, um exemplo das estratégias militares e da inteligência e genialidade de Júlio César. César dessa vez estava preparado para as tropas gau- lesas. Mandou seus engenheiros cavarem fossas, prepa- rarem armadilhas e assim cercarem Vercingetorix para que ele não pudesse sair de onde estava com suas tropas, consumindoseus recursos e o levando a um desgaste Por que as estrelas não brilham mais como antigamente! Será que é por que nossos pensamentos malignos estão ofuscando- as! 58 total. Além disso, o general colocou soldados virados para fora das fossas cavadas, evitando que o cerco fosse rompido e o líder gaulês obtivesse ajuda. Em resumo, ninguém entrava ou saia: os gauleses estavam ilhados em um mar de legionários enfurecidos. Após dois meses de cerco, Vercingetorix se entregou. Uma saída digna que evitaria maiores flagelos aos guer- reiros gauleses. Porém, César não os poupou, fez todos os rendidos de escravos e saqueou tudo que podia. Após a vitória, o Senado pediu a César que depusesse as armas e retornasse a Roma para ocupar o lugar que lhe era de direito, mas o general não estava disposto a entregar os louros da vitória aos velhos senadores. Sua intenção era fazer algo ilegal e jamais visto: marchar so- bre Roma com seus legionários exibindo o grande líder gaulês em uma gaiola. Assim, o povo saberia quem era o grande general dos romanos que pôs fim ao povo que mais tempo lhes havia resistido. “Alea jacta est” (A sorte está lançada) foi a frase dita por César ao atravessar o Rubicão, limite do Império que nenhum general podia transpor com suas legiões. César não o respeitou e o Senado convocou Pompeu para resisti-lo, mesmo sem possuir a menor condição para isso. Tanto foi assim que fugiu para o Oriente para tentar agrupar forças para combatê-lo, e Crasso há mui- to havia sido morto em suas desventuras pelo Oriente. Abrir-se-ia novamente uma Guerra Civil entre Pom- peu, que controlava a porção oriental e tinha o apoio do senado, e César, que controlava a península Itálica, a Gália, parte da Germânia e a Espanha. Na batalha de Farsala, ele impôs uma derrota definitiva a Pompeu e aos senadores. • Júlio César • 59 G RA N D E S E S T RA T E G I S T A S M I L I T A RE S César substituiu todos os senadores e empreendeu uma verdadeira reforma em Roma, tanto política como social e urbana, criando templos e fóruns aos moldes gre- gos e, após conquistas no Egito e outras regiões da África, preparava uma incursão na Ásia, que o igualaria a outro grande general, Alexandre, o Grande, porém não houve tempo: a aristocracia amedrontada pelo seu enorme po- der o emboscou e o matou, cabendo a seu sobrinho-neto Octavio transformar Roma em um império. 60 • Júlio César • 61 G RA N D E S E S T RA T E G I S T A S M I L I T A RE S POR VICTOR CALLARI Napoleão Bonaparte 62 Antes de se sagrar imperador dos franceses na Catedral de Notre-Dame em 1804, Napoleão foi conhecido e respeitado como o General Bonaparte. Seus feitos militares inspiraram algumas das mais importantes obras da arte neoclássica pelas mãos de Jacques Louis David e Antoine-Jean Gross, além de uma homenagem de Ludwig Van Beethoven em sua terceira sinfonia, homenagem essa que foi retirada exatamente após sua coroação. Napoleão nasceu na ilha da Córsega, oficialmente no dia 15 de agosto de 1769, apesar de seus diversos biógrafos afirmarem existir ainda dúvidas sobre essa data. A importância dada pelos autores para a real data de nascimento diz respeito à possessão da ilha da Córsega por parte dos franceses, o que teria ocorrido apenas em maio de 1768, fazendo com que Napoleão fosse um estrangeiro caso tivesse nascido no ano anterior. Polêmicas à parte, é inquestionável sua origem caucasiana e relativamente nobre. Seu pai foi Carlo Bonaparte, um advogado e membro da pequena nobreza italiana que chegou mesmo a ser recebido por Luís XVI em 1778. Apesar de sua língua materna ser o italiano e não o francês, sua educação se deu, quase que por completa, na França e mais importante: diante dos valores iluministas em voga no século XVIII. Para ser mais preciso, é possível ainda identificar na história de vida de Napoleão um dos primeiros exemplos do que os valores iluministas pregavam para a sociedade europeia. Bonaparte estudou na Academia Militar de Brienne-Le- -Château e depois na Escola Militar de Paris; formou-se em se- tembro de 1785 com a patente de Segundo Tenente de artilha- ria; em Brienne, Napoleão ainda estava distante de demonstrar o brilhantismo que o conduziria ao posto de imperador, sendo apenas o quadragésimo segundo entre os cinquenta e oito for- mados. O homem superior é impassível por natureza: pouco se lhe dá que o elogiem ou censurem - ele não ouve senão a voz da própria consciência. • Napoleão Bonaparte • 63 G RA N D E S E S T RA T E G I S T A S M I L I T A RE S Em 1789, depois de um longo período de gestação, eclodiu a Revolução Francesa, e os conflitos que se intensificaram de- pois da decapitação do rei Luís XVI e sua família a partir de 1793 foram fundamentais para a carreira de Bonaparte. Na- poleão publicou em 1792 um panfleto a favor da proclamação da República antes mesmo da execução do rei, o que fez com que ele caísse nas graças de Augustin Robespierre, irmão mais novo do líder revolucionário jacobino Maximilien Robespierre. Dessa forma, foi nomeado comandante de artilharia no cerco de Toulon, cidade que havia questionado a recém-proclamada República e havia sido ocupada por tropas inglesas, espanholas e napolitanas. Ao tomar a frente das tropas, Bonaparte ficou surpreso com o amadorismo dos soldados que compunham o exército repu- blicano, assim como de suas principais lideranças. Tal amado- rismo era algo muito comum, uma vez que os principais líderes militares franceses eram de origem nobre e, consequentemente, apoiavam o retorno da monarquia dos Bournon. Logo de cara Bonaparte percebeu que não havia o armamento necessário para a consecução do plano de ataque dos generais Carteaux e La Poype à cidade de Toulon e por esse motivo sugeriu que as tropas republicanas avançassem sobre a Península de Le Caire para a tomada dos fortes L’Eguilette e Tour de Balaguier, do- minando toda a baia e obrigando os navios da Coligação a se retirarem. No dia 21 de setembro de 1793 teve início a operação, que não foi bem-sucedida devido à falta de apoio do general Carte- aux, que não disponibilizou soldados suficientes para a tomada dos fortes. Bonaparte então escreveu para a Convenção Na- cional em Paris e foi promovido a Major. O novo comandante Coquille Dugommier optou por acatar o plano do Major Bona- parte, que consistia em uma maior preparação das tropas – 13 A primeira qualidade de um comandante é cabeça fria para receber uma impressão correta das coisas. Não deve deixar- se confundir quer por boas quer por más notícias. 64 baterias com 63 bocas de fogo – e a tomada do forte de Mul- grave. Apesar da forte chuva que caía, Napoleão insistiu para que o ataque continuasse, pois a chuva serviria de cobertura para as tropas republicanas, e apenas um dia após o início dos ataques, a cidade de Toulon havia sido recuperada. O exército francês perdera dois mil soldados, menos da metade das perdas que infligiu às tropas da Coligação. Três dias depois da vitória, Bonaparte foi promovido a General de Brigada, deixando para trás outros dois importantes postos: tenente-coronel e coronel. Em julho de 1794 o governo Jacobino foi deposto com o chamado Golpe do 9 Termidor, Napoleão foi preso devido à sua proximidade com os líderes jacobinos depos- tos e executados. Apenas com a ameaça monar- quista que buscava depor o vacilante governo do Diretório recém-instau- rado é que Bonaparte voltou a ser protagonista dos eventos na França. Paul Barras, um dos lí- deres do novo governo, convocou o general para liderar as tropas de defesa do governo em Paris, e a atuação de Bonaparte, re- sultando no massacre de quase mil e quinhentos monarquistas subleva- dos, foi o suficiente para demonstrar que ele esta- • Napoleão Bonaparte • 65 G RA N D E SE S T RA T E G I S T A S M I L I T A RE S va acima da proximidade política jacobina que caracterizara seu início de carreira. Napoleão, do dia para a noite, passou de esquecido e traidor para o defensor do Diretório, rico e famoso, além de receber o comando das tropas francesas na Itália. As campanhas seguintes lideradas pelo General Bonaparte foram as campanhas da Itália onde o general subjugou as tro- pas austríacas e alcançou o domínio dos territórios pontifícios, tendo na Batalha da Ponte D’Arcole seu momento áureo consa- grado no famoso retrato-matriz de Antoine-Jean Gross. As vi- tórias na Itália e os saques realizados enriqueceram o corrupto governo do Diretório e fizeram apenas crescer o prestígio de Napoleão, fazendo com que alguns políticos passassem a temer sua figura e influência. A principal consequência disso foi sua designação para conquistar uma vitória sobre a Inglaterra. Sa- bendo ser impossível invadir a ilha, Napoleão ajustou sua es- tratégia para além dos planos militares e se propôs a conquis- tar o Egito e, assim, cortar uma das principais rotas de comércio da Inglaterra, enfraquecendo economi- camente seu principal ad- versário. Tanto na campanha da Itália quanto no Egito, as principais estratégias de guerra, assim como o novo modelo de exército adotado por Napoleão, fo- ram colocados em prática. O exército do general não mais se assentava no privi- légio como os exércitos das 66 potências do Antigo Regime. Pelo contrário, baseado no mo- delo inglês criado por Oliver Cromwell, a carreira agora estava aberta ao talento; o exército era recrutado junto ao povo e seus oficiais podiam aspirar por uma carreira, portanto muito mais democrático do que o antigo modelo, que permitia apenas aos nobres portar espadas e alcançar altas patentes. Esse novo modelo de exército ganhou corpo com a promul- gação de duas leis, a “lei do amálgama”, de 21 de fevereiro de 1793, que unia o antigo e o novo batalhão; e a “lei Jourdan, de 5 de setembro de 1798, que tornava o serviço militar obrigatório aos jovens de 18 e 24 anos. As principais estratégias militares adotadas por Napoleão consistiam na utilização de uma guerra de massas, o que de- monstra por que o General é conhecido como o percussor das guerras modernas, e na velocidade, para a dominação do campo de batalha. Mondani afirma que “Napoleão sempre teve como objetivo fazer com que, por meio do deslocamento rá- pido das suas tropas para uma posição estratégica, o exército inimigo fosse atraído para uma guerra de grandes proporções”. À frente das tropas ficava organizada uma grande barreira de artilharia formada por canhões, utilizados de maneira exemplar e quase sempre de forma a minar a resistência adversária; atrás dos canhões, a cavalaria preparada para atacar em velocidade os pontos mais fracos e precários após o ataque dos canhões e, por último, uma enorme e ágil infantaria que tinha como principal objetivo dominar o campo de batalha. Outras duas estratégias muito bem utilizadas por Napoleão consistiam muito mais na leitura da conjuntura para sua utili- zação do que propriamente em sua inovação teórica. As mano- bras de posição central e a manobra de flanco foram sempre uti- lizadas com sabedoria e astúcia por parte do general, podendo ser exemplificas na Segunda Campanha da Itália, quando Bona- Em tudo quanto se empreende, há que atribuir dois terços à razão e o outro terço ao acaso. Se aumentardes a primeira fracção, sereis pusilânime. Aumentai a segunda, sereis temerário. • Napoleão Bonaparte • 67 G RA N D E S E S T RA T E G I S T A S M I L I T A RE S parte, atualizando os feitos de Aníbal, cruzou os Alpes Suíços, manobra considerada quase impossível, para surpreender pela retaguarda as tropas austríacas da coalizão. Segundo Duggan, “Napoleão repetiu a mesma fórmula de sucesso de sua primei- ra campanha em 55 batalhas por toda a Europa. Suas vitórias o fizeram governante da França em 1799 e depois imperador da Europa em 1804. Seus inimigos se digladiavam para estudar seus métodos, aprender seus segredos e desafiá-lo.” As estratégias de Napoleão eram sustentadas pela criação de escolas militares que preparavam cada vez melhor seus solda- dos, a criação de um corpo militar de elite, por um conheci- mento geográfico capaz de aperfeiçoar a utilização da cavalaria e por uma rede de espionagem espalhada pelos países europeus que permitia ao general tomar conhecimento de tudo o que se passava nos domínios de seus rivais. O apoio de tamanho exér- cito foi fundamental na sagração do general em imperador. Entre 1805 e 1815, Napoleão empreendeu diversas campa- nhas para conquistar a Europa, entre as mais destacadas estão a Batalha Naval contra a Inglaterra, o Bloqueio Continental e as batalhas na Rússia. A estratégia adotada pelo imperador para a conquista da Inglaterra residia em movimentar uma frota fran- cesa e espanhola em direção ao Caribe para ser seguida pelas tropas inglesas, deixando, assim, desguarnecido o Canal da Mancha, por onde Napoleão esperava invadir a ilha. Os planos do imperador caíram por terra quando o principal líder da ma- rinha inglesa, almirante Nelson, não mordeu a isca, retornando ao Canal da Mancha para protegê-lo. A consequência para os franceses foi desastrosa, resultando na derrota da batalha de Trafalgar, ainda que os franceses superassem os ingleses em uma proporção de 33 a 27 navios. A estratégia adotada por Napoleão passaria a ser o famo- so Bloqueio Continental que, em tese, deveria fechar todos os Existem apenas duas espécies de planos de batalha, os bons e os maus. Os bons, falham quase sempre, devido a circunstâncias imprevistas que fazem, muitas vezes, que os maus sejam bem sucedidos. 68 portos da Europa à Inglaterra, impedindo os outros países de realizarem comércio com toda a Grã-Bretanha, resultando em um sufocamento da economia inglesa. Em 1805, Napoleão derrotou as duas mais importantes alia- das inglesas, a Áustria na batalha de Ulm, e a Rússia na batalha de Austerlitz, a maior vitória do imperador até então. As suces- sivas tentativas de romper o embargo imposto pela França aos ingleses por parte de Portugal culminou com a fuga da família real para o Brasil em 1808 e a partir dessa data tinha início o declínio do império francês, que terminaria apenas em 1815. Movimentos internos passaram a minar as bases do Impé- rio Continental construído por Napoleão. Na Espanha, mais de 40 mil espanhóis lutaram contra os 10 mil soldados france- ses presentes e os derrotaram ainda em 1808. Os russos, que haviam sido subjugados em 1805, romperam com o Bloqueio Continental e entraram em rota de colisão com os exércitos • Napoleão Bonaparte • 69 G RA N D E S E S T RA T E G I S T A S M I L I T A RE S napoleônicos a partir de 1811. A invasão da Rússia teve início em 1812, com o maior efetivo já reunido por Napoleão, mais de 500 mil soldados, com o intuito de uma vitória rápida e esmagadora, marchando diretamente de Varsóvia a Moscou. Napoleão esperava encontrar resistência logo na fronteira com a Rússia, mas não foi o que aconteceu. Os russos recua- ram território adentro, obrigando os exércitos napoleônicos a marcharem mais de 800 quilômetros até Moscou e, ainda lá, não imprimiram resistência; deixaram a cidade, mas não sem antes incendiá-la, destruindo todos os suprimentos. A dificuldade de abastecimento e as baixas temperaturas resul- taram na morte de mais da metade dos soldados franceses, que, ao combater na batalha de Borodino, tinham um efetivo de pouco mais de 150 mil soldados. As batalhas para deixar o território russo foram mais violentas do que aquelas para avançar e ao término da retirada, dos quase 600 mil soldados que haviam entrado no território russo, apenas 20 mil regres- saram. A maior das derrotas de Napoleão. Tendoque conviver com as tentativas internas de golpe para tirá-lo do poder, Napoleão foi derrotado mais uma vez na Batalha das Nações, em Leipzig, culminando com sua abdi- cação. Napoleão foi exilado na ilha de Elba, retornando para o Governo dos Cem Dias até ser novamente derrotado e exilado na ilha de Santa Helena, onde permaneceria até sua morte. As estratégias militares de Napoleão não estavam restri- tas apenas ao campo de Batalha. O general e depois impera- dor foi capaz de perceber a importância da economia como estratégia para derrotar seus inimigos, assim como fez uso da arte e da arquitetura como estratégia para consolidação de seu poder e sua imagem. Sendo assim, Napoleão travou não apenas a última das guerras antigas, mas também a pri- meira das guerras modernas. Alexandre, César, Carlos Magno e eu mesmo fundamos impérios, mas à base de que firmamos as criações do nosso gênio? À base da força. Só Jesus Cristo fundou seu reino à base do amor, e até hoje milhões de homens morreriam por ele. 70 • Napoleão Bonaparte • 71 G RA N D E S E S T RA T E G I S T A S M I L I T A RE S POR VICTOR CALLARI Bismarck 72 Otto Eduard Von Bismarck Schönhausen foi um dos mais importantes líderes e estrategistas militares do sé- culo XIX. Muitas vezes reconhecido como o Napoleão da Alemanha, o Chanceler foi o principal responsável pelo processo de unificação dos reinos germânicos em torno da desenvolvida Prússia. Bismarck foi o braço direito do Imperador Guilherme II e articulador do Segundo Reich Alemão. Bismarck nasceu no dia 1 de abril de 1815, no reino da Prússia, um dos mais desenvolvidos reinos ger- mânicos, estudou direito nas universidades de Göttingen e Berlim e trabalhou como advogado e administrador até se tornar embaixador nas cidades de São Petersburgo e Paris. Em 1862 foi escolhido pelo recém-coroado rei da Prússia, Guilherme I, primeiro-ministro, com a missão de articular o fortalecimento militar do reino apesar de toda a oposição do Parlamento, constituído por ricos pro- prietários de terras que acreditavam que a formação de um forte exército centralizado daria poderes absolutos ao monarca prussiano. Um dos mais importantes historiadores do século XX, Eric Hobsbawm atribuiu à atuação de Bismarck o período de relativa paz interna que a Europa foi capaz de desfrutar após as guerras napoleônicas, ainda que pequenos confli- tos tenham sido as armas fundamentais na estratégia de unificação elaborada pelo Chanceler. O historiador Ar- mando Vidigal afirmou “Com relação a Bismarck, pou- cos estadistas contribuíram como ele para mudar o curso da história”, enquanto que Henry Kissinger disse “A nova Alemanha foi desenhada por um gênio que se propôs a comandar as forças que ele havia liberado, tanto estran- geiras como domésticas, pela manipulação de seus anta- gonismos. Uma tarefa na qual ele era mestre, mas que pro- Com leis ruins e funcionários bons ainda é possível governar. Mas com funcionários ruins as melhores leis não servem para nada. • Bismack • 73 G RA N D E S E S T RA T E G I S T A S M I L I T A RE S vou estar acima da capacidade de seus sucessores.” Depois de 1862 tiveram início as estratégias e articu- lações que levariam à unificação dos reinos alemães e ao fortalecimento da Prússia. As guerras de unificação co- meçaram em 1864 em um conflito com o reino da Dina- marca pelo controle dos ducados de Schleswig-Holstein que se encontravam sob administração dinamarquesa, fosse por antigos laços de feudalidade, fosse por tratados de união pessoal. A constituição assinada pelo rei Cristiano IX foi o esto- pim do conflito, uma vez que contrariava antigos acordos firmados. Essa constituição conduziu a uma aliança entre Áustria e Prússia, costurada por Bismarck, para a tomada dos territórios citados. Após a batalha de Dybbol, os dina- marqueses foram obrigados a reconhecer a superioridade econômica e militar de seus adversários, e os ducados fo- ram divididos entre os dois reinos vencedores. Foram necessários apenas dois anos para que Bismarck desse continuidade ao seu plano de unificação. O primei- ro-ministro prussiano provocou conflitos em relação à ad- ministração dos ducados que haviam sido conquistados e divididos com a Áustria, fazendo com que esses pequenos conflitos levassem o Império Austríaco a declarar guerra contra a Prússia, contando ainda com o apoio de diversos outros reinos germânicos, enquanto que Bismarck pas- sou a contar com a recém-unificada Itália para apoiá-lo, uma vez que os italianos desejavam territórios até então dominados pelos austríacos. O ponto fundamental dessa segunda etapa do processo era disseminar um antagonis- mo ao império austríaco, fazendo com que ele parecesse o agressor. O conflito se estendeu durante o ano de 1866 e teve na Os tolos dizem que aprendem com os seus próprios erros; eu prefiro aprender com os erros dos outros. 74 batalha de Königgrätz o momento de vitória dos prussianos, obrigando Viena à rendição e consolidando a supremacia prussiana nas questões germânicas, culminando na anexação de diversos territórios como Schleswig-Holstein, Hanover, Frankfurt, entre outros. A Prússia de Bismarck consolidava-se cada vez mais não apenas como uma potência econômica a ser considerada, mas uma potência militar. Junto com o general Von Moltke, Bismarck realizou uma reforma nas fileiras do exército prussiano que permitiu sua modernização e tamanha superioridade diante de seus adver- sários. Diversas dessas reformas foram levadas a cabo acom- panhando o rápido desenvolvimento proporcionado pela Re- volução Industrial. Segundo Vidigal, “O exército prussiano adotou o fuzil de carregamento pela culatra a partir de 1843, usando-o com êxito nas campanhas de 1848 e de 1864, esta última contra a Dinamarca. Todavia, foi somente em 1866, diante de um exército de primei- ra classe como o austrí- aco, mas equipado ainda com fuzis de carregamen- to pela boca, que o novo fuzil mostrou toda a sua superioridade: para cada seis tiros prussianos, ape- nas um tiro austríaco foi dado.” A última etapa que antecedeu o processo de unificação foi a Guerra • Bismack • 75 G RA N D E S E S T RA T E G I S T A S M I L I T A RE S Franco-Prussiana. O clima de rivalidade e hostilidade entre França e Prússia vinha crescendo desde as guerras napoleô- nicas e foi habilmente utilizado por Bismarck para consolidar a unificação alemã. A situação se agravou graças ao problema da sucessão do trono espanhol desde a abdicação da rainha Isabel II em 1868, fazendo com que a coroa fosse oferecida ao príncipe Leopoldo de Hohenzollern, da Prússia, primo do rei Guilherme I, o que causou imenso desconforto aos franceses, que poderiam se ver entre dois reinos adversários. Napoleão III enviou seu primeiro ministro para um discurso ameaçador e contrário às intenções prussianas, resultando em um forte sentimento contrário aos franceses nos reinos germânicos do sul. A exigência de uma garantia de que nenhum membro da família jamais voltasse a pleitear a coroa espanhola foi o esto- pim para o conflito. Em 1870 teve início a guerra após Bismarck insultar direta- mente o imperador Napoleão III. Ambos os lados acreditavam 76 possuir uma força militar capaz de alcançar a vitória, porém o poder bélico e econômico maior estava do lado prussiano, que, sob o comando do general Von Moltke, conquistou uma importante vitória na batalha de Sedan. Poucos dias depois Napoleão III foi derrotado e capturado, abdicando ao trono de imperador dos franceses. Um dos elementos de desequilí- brio do conflito foi a força da artilharia prussiana. A artilharia francesa era tida como a melhor entre todas as artilharias da Europa, equipada com canhões de carregamento pela boca, mas com alma raiada, o que proporcionavamaior precisão de tiro, enquanto que a artilharia prussiana precisou ser inteira- mente renovada após o conflito com a Áustria para poder fa- zer frente aos franceses e todos os canhões passaram a ser de aço, permitindo maiores cargas e alcance, com alma raiada e carregamento pela culatra. A resistência francesa prosseguiu ainda em outras frentes, sendo a mais destacada a Comuna de Paris. Ao término do conflito, com o Tratado de Frankfurt, a Alemanha completou sua unificação, o rei Guilherme I foi aclamado imperador no Palácio de Versalhes, além de tomar os territórios da Alsácia e parte da Lorena para si. Esses territórios seriam recuperados pela França após a Primeira Guerra Mundial. Dois meses após a coroação do imperador e da unificação da Alemanha, Bismarck foi nomeado Chanceler Imperial do Reich e, como Chanceler, cumpriu papel fundamental para manter a paz em toda a Europa, uma paz que continuaria até 1914 com a eclosão da Primeira Grande Guerra. Bismarck re- alizou reformas internas como parte de sua política antisso- cialista, como a criação de avançadas leis trabalhistas, previ- dência social, entre outras como parte de sua estratégia de ges- tão e administração política. Nenhum outro nome fez jus ao título de estrategista político como Bismarck no século XIX. Aquilo que é estrangeiro tem sempre uma aparência aristocrática para nós. • Bismack • 77 G RA N D E S E S T RA T E G I S T A S M I L I T A RE S POR FABIANA MONTEIRO Eisenhower 78 Dwight David Eisenhower nasceu em 14 de outubro de 1890 em Denison, Texas, e desde muito cedo nutriu um ins- tigante interesse por história militar. Foi um dos maiores estrategistas militares da história devido à sua importante atuação nas batalhas e campanhas durante a Segunda Guer- ra Mundial que culminaram na vitória dos Aliados e expur- garam do Ocidente a ameaça nazista. Sua história no exército americano começou em 1911 quando entrou para a Academia Militar de West Point, sain- do de lá em 1915 com a patente de 2º Tenente de Infanta- ria. Alguns anos ainda seriam necessários para mostrar ao mundo sua capacidade de lidar com as situações extremas às quais se submetem militares em períodos de guerra, uma vez que não foi convocado para atuar na Primeira Guerra Mundial. Mesmo não tendo participado do primeiro grande con- flito do século XX, seguiu carreira como militar ainda que suas promoções para as mais altas patentes ocorressem de forma lenta e gradual. Em 1917 foi designado Comandante do Corpo de Tanques, grupo recentemente formado e que lhe incorporaria à experiência necessária para o novo tipo de guerra que seria usado a partir de 1939, a “Guerra de Mo- vimento”. Eisenhower foi sempre respeitado e querido pelos solda- dos que o rodeavam em virtude de sua liderança incisiva, seu carisma e simplicidade, características que continuariam predominantes mesmo quando chegasse ao comando das ações na Europa, lidando com centenas ou milhares de sol- dados. Em 1941 os Estados Unidos entraram em guerra contra o Japão após o ataque à base americana em Pearl Harbor, e Eisenhower foi designado como General de Brigadas para Por várias razões, Brasília exerce um fascínio sobre os cidadãos dos Estados Unidos. Brasília é uma epopeia digna das vastas possibilidades e aspirações desta nação. • Eisenhower • 79 G RA N D E S E S T RA T E G I S T A S M I L I T A RE S atuar em Manilla, nas Filipinas, pois a base de Clark também sofrera com o ataque japonês. Ali não obteve muito sucesso e reconhecimento devido, entre outros fatores, à superiori- dade no número de soldados japoneses e a necessidade da abertura de uma frente na Europa para a derrota do exército alemão. Dentre as tantas operações das quais Eisenhower partici- pou desde o início de sua carreira, três se mostraram as mais importantes por possuírem estratégias inovadoras e com- plexas: Operação Tocha, Operação Fortaleza ou Fortitude e Operação Overlord. Operação Tocha A Operação Tocha tinha como objetivo libertar a África do Norte – território francês – do poder das forças italianas e alemãs que ali haviam se estabelecido após a invasão da França pelo exército de Hitler. A operação era complexa por si só e ainda contava com um agravante: ser mista, ou seja, composta por soldados ingleses e americanos, o que exigiu de Eisenhower um cuidado especial para não desmerecer os ingleses a favor dos americanos ou vice-versa. Para isso, Ei- senhower fez uso de uma estratégia de equilíbrio para que os oficiais americanos e ingleses tivessem postos divididos igualmente entre si, evitando desavenças e conflitos internos que pudessem comprometer os objetivos traçados. Além disso, a Operação Tocha cumpriria um papel fun- damental, pois adiaria a possibilidade de abertura de uma frente de batalha na Europa Ocidental para a retomada da França, expulsando os alemães do território ocupado e obri- gando-os à sua rendição incondicional. A ideia de adiar a retomada da Europa pelos Aliados não agradava a opinião O que conta não é necessariamente o tamanho do cão na briga - é o tamanho da luta no cão. 80 pública e muito menos a alguns governos, principalmente a União Soviética Stalinista, que ansiava pela abertura de uma segunda frente de luta contra os alemães com o objetivo de enfraquecê-los e dar aos soviéticos melhores condições de suprir suas tropas, além da segurança de que os Aliados re- almente estavam dispostos a cumprir o acordo de lutarem juntamente com os soviéticos contra a Alemanha. A operação Tocha começou em 1942 com um ataque anfíbio, desembarque através de navios nas costas da Áfri- ca do Norte. Os desembarques foram feitos em três pontos: Casablanca, no Marrocos e Argel e Oran na Argélia, locais geograficamente importantes para a enviada de suprimentos via mar para frente de batalha e para combater os alemães de Rommel localizados na Líbia. Para obtenção do sucesso da operação, era necessário que as tropas francesas do go- verno de Vichy, posicionadas na região, não atacassem os soldados aliados e, se possí- vel, ainda ajudassem lutando ao lado dos Aliados contra os alemães e italianos. Eisenhower se dispôs a fa- zer acordos com os militares franceses na África. A primei- ra tentativa de acordo foi com o General Henri Giraud, mas não deu certo devido a am- bições incompatíveis com as possibilidades do momento. Giraud, entre outras exigên- • Eisenhower • 81 G RA N D E S E S T RA T E G I S T A S M I L I T A RE S cias, queria que as tropas fossem posicionadas para a liberta- ção da França, o que já fora discutido e concluído ser impos- sível nas condições presentes à época. O segundo acordo foi o mais polêmico e foi também o que deu as condições de continuidade aos ataques sem que se tivesse que travar guerra contra os franceses. O acordo foi firmado com o Almirante Jean Darlan, comandante das Forças Armadas do governo de Vichy. Ele propôs o apoio das Forças Armadas, a não entrega da frota francesa aos alemães e o apaziguamento dos árabes para que não entrassem no conflito. Em troca, Eisenhower ofereceu ajuda para rearmar os exércitos franceses na África e alimentos para a população de suas colônias francesas. A polêmica se deu devido ao fato de Darlan ter fama de antissemita e fascista, mas o acordo era mais importante por seu papel estratégico do que a opi- nião pública podia compreender no momento. No decorrer da guerra, os Aliados conseguiram expulsar os alemães da África do Norte. Da Líbia, os alemães e italia- nos voltaram para a Itália, mas antes tentaram tomar a frota francesa que foi afundada pelos seus tripulantes para não passar para as mãos do Eixo. A guerra no deserto foi violenta devido à falta de experiência no combate em terrenos como o da África e foi desafiadora devido à enorme operação an- fíbia necessária paradeslocar todas as tropas, armamentos e suprimentos necessários para a operação. Da África, os Alia- dos seguiriam para a libertação da Itália do comando fascista de Mussolini. Operação Fortaleza A Operação Fortaleza foi uma grande cortina de fumaça para os reais objetivos estratégicos dos Aliados. Tinha como objetivo fazer com que o exército alemão acreditasse que 82 os Aliados estavam organizando um ataque para libertar a França a partir da Inglaterra com o objetivo de desembarcar em Calais, na França, quando na verdade o ataque se daria em praias da Normandia. Foi criado todo um aparato para dar veracidade ao blefe de Eisenhower. Mensagens e códigos eram transmitidos pe- los rádios a fim de dar aos alemães a impressão de estarem interceptando informações sobre o ataque. Houve a implan- tação de agentes secretos no serviço de informação alemão e um acampamento falso foi montado com tanques infláveis que estariam sob o comando do renomado General Patton. Por ser a região mais provável para o desembarque, devi- do ao seu posicionamento geográfico e ao blefe de Eisenho- wer, os alemães acabaram por fortalecer significantemente a região de Calais, deslocando para lá boa parte das forças alemãs que poderiam atrapalhar o real desembarque na Nor- mandia. Operação Overlord (Dia D) A Operação Overlord é uma das mais famosas e destaca- das batalhas da Segunda Guerra Mundial, reproduzida di- versas vezes pelo cinema nos Estados Unidos e cenário ins- pirador dos primeiros minutos do famoso filme “O Resgate do Soldado Ryan”, dirigido por Steven Spielberg em 1998. A operação era a porta de entrada dos Aliados à Europa Con- tinental e ficou conhecida como a maior operação unificada da Segunda Guerra, atacando por mar, ar e terra. Os desembarques de soldados foram feitos em cinco praias: Utah, Omaha, Juno, Sword e Gold, contando com apoio aéreo, bombardeios para destruir pontos de defesa alemães na região das praias, além de lançarem paraquedis- A liderança é a arte de conseguir que um outro faça alguma coisa que você quer feita porque ele quer fazê-la. • Eisenhower • 83 G RA N D E S E S T RA T E G I S T A S M I L I T A RE S tas horas antes do ataque para que estes dessem apoio aos soldados que desembarcariam nas praias, tomando pontes, vilas e localizações importantes. Estima-se que o ataque ini- cial Aliado contou com 156 mil homens, cinco mil navios e 10 mil aviões. Para ocorrer como o planejado, as condições meteoroló- gicas deveriam estar a favor, sem tempestades que agitassem demais o mar, o que dificultaria o desembarque dos soldados e impossibilitaria a visibilidade dos aviões. No dia 4 de junho de 1944 se iniciaram os preparativos para o ataque, que saiu da Inglaterra no dia seguinte, che- gando à Normandia no inicio do dia 6 e pegando os alemães completamente desavisados, em parte devido à certeza que tinham do ataque a partir de Calais e também devido às más condições meteorológicas dos dias anteriores, o que sugeria 84 que tão cedo não haveria nenhum tipo de ataque. Apesar do elemento-surpresa a favor de Eisenhower e dos Aliados, ainda havia a Muralha do Atlântico – como era conhecido o complexo de armamentos instalados nas praias para dificultar o desembarque e a invasão inimiga – para transpor. Esse complexo era composto por minas terrestres, baterias antiaéreas e casamatas, de onde os alemães tinham visão privilegiada de ataque nas praias, além de obstáculos colocados na beira a fim de dificultar o desembarque de tan- ques e caminhões e atrasar o deslocamento de tropas inva- soras. Em 12 de junho, dias depois do ataque inicial, Eisenho- wer já estava em solo francês para comandar os próximos passos da operação que expulsaria os alemães do território francês e em seguida forçaria a rendição alemã. Eisenhower na presidência dos Estados Unidos Eisenhower foi presidente dos Estados Unidos durante dois mandatos, de 1953 a 1961, e enfrentou questões mili- tares importantes durante o seu governo, nas quais utilizou muito do que aprendeu no período de guerra, usando seu carisma para tentar contornar a situação. Entre alguns mo- mentos importantes, podemos citar o episódio da Guerra das Coreias, a Crise do Canal de Suez, o lançamento do fo- guete soviético Sputnik e a Crise de Berlim. Eisenhower morreu em 28 de março de 1969 em um quarto de hospital onde ficou internado após um ataque car- díaco. Seus feitos à frente dos exércitos aliados são reconhe- cidos até hoje. A melhor moral existe quando você nunca ouve falar na palavra. Quando a moral é muito mencionada, anda péssima. • Eisenhower • 85 G RA N D E S E S T RA T E G I S T A S M I L I T A RE S POR FABIANA MONTEIRO Patton 86 Em 11 de novembro de 1885, em San Gabriel, Califór- nia, nascia George Smith Patton Jr., proveniente de uma família de grandes contatos e influências políticas devido à sua longa linhagem de militares. Aos cinco anos ganhou seu primeiro revólver e desde cedo aprendeu a nadar, ca- çar e montar a cavalo. Só não aprendeu a escrever ou ler porque o pai dava prioridade para ler, ele próprio, histó- rias clássicas, como Ilíada, aos seus filhos. Essas histórias sobre bravura e determinação moldaram de certa forma a personalidade de Patton, que dali por diante estava sempre em busca da glória e do momento em que, à frente de um exército, ele lutaria para alcançá-la. Era conservador, polê- mico, com tendências antissemitas, elitista e acreditava na superioridade da raça branca. Patton sonhava em entrar para a Academia Militar de West Point, objetivo que não alcançou em um primeiro momento por falta de alguém influente que politicamen- te pudesse indicá-lo. Dessa forma, seguiu para o Virginia Military Institute, onde ficou até 1904, quando conseguiu indicação para entrar para West Point, onde formou-se em 1909 como segundo-tenente e se estabeleceu em Fort She- ridan, Illinois. Durante os tempos de paz, se dedicou a estudos mili- tares, se aperfeiçoou em esportes e sempre que possível tentava obter destaque político ou militar. Esteve assentado na Virgínia, no Kansas, participou dos Jogos Olímpicos de 1912, mas o lugar que lhe deu mais chances de alavancar a carreira foi em Fort Bliss, Texas, em 1915. Fort Bliss ficava numa região fronteiriça com o México, país que desde a revolução vivia em constante desequilí- brio. Rebeldes mexicanos invadiam cidades americanas, sendo um desses grupos liderado por Pancho Villa, o qual Eu não meço o sucesso de um homem pelo quão alto ele sobe, mas o quão alto ele salta quando atinge o fundo. • Patton • 87 G RA N D E S E S T RA T E G I S T A S M I L I T A RE S Patton enfrentaria em 1916 após um ataque que resultara na morte de 17 pessoas em Columbus. Nessa empreitada, Patton demonstraria como era sua forma de lutar, sem es- crúpulos e com velocidade para atingir seu objetivo, a vitó- ria. Avançou México adentro no encalço de Pancho Villa. Sem sucesso, não conseguiu prendê-lo, porém conseguiu matar seu braço-direito e demonstrar a seus superiores seu potencial e sua capacidade. Após o combate, recebeu a patente de primeiro-tenente e a partir da experiência ad- quirida se pôs a escrever sobre a importância da cavalaria moderna e sua rápida movimentação. Em 2 de abril de 1917, os Estados Unidos declararam guerra, ao lado da França, Itália, Rússia e Inglaterra, contra as Potências Centrais (Áustria-Hungria, Alemanha, Bulgá- ria e Império Turco-Otomano), mas o exército americano precisava melhorar suas condições de treinamento, aumen- tar o número de soldados e alavancar sua indústria bélica. Patton faria parte desse esforço de guerra já em 1917, suas armas agora seriam os blindados. Sua função seria treinar, na Europa, os soldados a manusearem os blindados e entenderem as estratégias de ataques rápidos possíveis com essa armaainda pouco utilizada pelos militares, que em geral defendiam o uso de tanques apenas como apoio à infantaria, limitando, assim, a velocidade e a profundidade do ataque. Patton seguiu fazendo cursos de especialização e su- gestão de mudanças nos tanques franceses da Renault. Ele queria mudar a estratégia de uso das unidades blindadas, pois pensava que quanto mais rápido e mais profundo fosse o avanço, maiores seriam os estragos causados nas linhas inimigas. Ele defendia o uso de combustível extra e mecâ- nicos para pequenos danos, diminuindo, assim, a perda de 88 tanques. Durante a Primeira Guerra, participou de ataques a Saint-Mihiel e à Linha Hidenburg com sucesso. Com a experiência após as operações, pôde perceber quais eram as mudanças necessárias para um melhor emprego das forças blindadas. Em 11 de novembro de 1918 foi assinado o armistício acabando com a guerra, tendo o lado alemão como perde- dor. Em março de 1919, Patton retornava aos EUA. Passada a Primeira Guerra Mundial, muito se discutiu sobre a modernização dos exércitos. Patton era metade conservador, metade moderno, no sentido de que have- ria espaço para a cavalaria e os tanques serem utilizados juntos. Outros militares achavam que a tendência seria a de forças armadas cada vez mais ágeis e modernas, com a utilização de tanques e aviões, mas a ideia de modificar o exército e sua forma de combater, tornando-a motorizada, era um pouco assustadora e cara para os ingleses, franceses e americanos. Enquanto isso, a União Soviética investia nessa nova maneira de combater, mas carecia de oficiais experientes e competentes devido aos expurgos de Stalin. Quem mais investiu na guerra de movimento e profundidade foram os alemães, como ficou claro na invasão da Polônia, logo no início da Segunda Guerra Mundial. Os alemães atacavam por ar, mar e terra, contando com o elemento-surpresa para seguir atacando sem dar tempo para o inimigo se re- organizar. Durante a Segunda Guerra, Hitler utilizou a Blitzkrieg para contrapor sua escassez de reservas disponíveis, como aviões, carros e soldados contra a ampla frente dos Aliados. O diferencial era a forma empregada, ataques rápidos e de profundidade, demonstrando que os exércitos aliados de- A batalha é a competição mais magnífica em que um ser humano pode entrar. Ela traz à tona tudo o que há de melhor; ele remove tudo o que há de base. Todos os homens têm medo na batalha. O covarde é aquele que permite que seu medo supere seu senso de dever, e o dever é a essência da masculinidade. • Patton • 89 G RA N D E S E S T RA T E G I S T A S M I L I T A RE S veriam se modernizar para enfrentarem o exército alemão. Patton passou a comandar e treinar a 2ª Divisão Blinda- da na Geórgia e seguiu para lutar na Operação Tocha, em 1942, na qual foi incumbido de desembarcar no Marrocos, tomar a região e estabelecer-se em Casablanca, operação na qual obteve sucesso. Foi transferido para o comando do 2º Corpo Americano em março de 1943 depois de este sofrer um derrota impos- ta pelo general Rommel da Alemanha. Com o 2º Corpo, sua função era reorganizar a tropa, aumentar sua moral, arrumar as brechas e falhas ocorridas na derrota a Rommel, tudo isso com uma boa dose de disciplina a ser imposta. Para Patton, um soldado tinha que estar sempre vigilante e pronto para o combate a qualquer hora do dia. Isso incluía vestir o uniforme completo, independentemente de estar ou não na frente de batalha. O motivo principal pelo qual Patton havia se tornado a segunda opção nos ataques era seu comportamento impul- sivo, explosivo e espalhafatoso, que às vezes resultava em decisões que não calculavam muito os riscos e as mortes que poderiam ser causadas a seus homens, pois colocava seus interesses pessoais à frente da vida de seus homens; enquanto Montgomery, que sempre detinha a prioridade no abastecimento, era bem mais racional, optando pelo avanço lento e gradual, sendo visto às vezes como quem atrasava as ofensivas por querer sempre que as condições fossem perfeitas e que nada fosse atrapalhar seus avanços. Patton contava com o apoio de Eisenhower que sempre que possível o defendia e encobria suas ações polêmicas da op- nião pública americana, devido à importância que ele dava ao general dentro do exército aliado. Durante a tomada da Sicília, Patton comandava o 7º É insensato e errado chorar os homens que morreram. Pelo contrário, devemos agradecer a Deus porque esses homens viveram. 90 Exército e continuava dando apoio nos flancos do 8º Exér- cito inglês de Montgomery. Nesse momento, as forças do Eixo se encontravam desabastecidas após a fuga da Tunísia imposta pelos Aliados. Patton conseguiu certa autonomia para atacar Palermo, onde demonstrou mais uma vez que sua agressiva forma de combater podia render sempre gran- des avanços territoriais, esmagando os inimigos. De Paler- mo, Patton chegou em Messina antes de Montgomery, um feito memorável, uma vez que Montgomery contava com uma retaguarda de abastecimento bem mais vasta e organi- zada. As batalhas na Itália renderam aos americanos uma experiência em combate importantíssima, além de forçar a derrubada de Mussolini. Porém, contra os alemães a vitória foi meramente simbólica, tendo em vista que eles já esta- vam em retirada por falta de condições de reabastecimento. Devido ao seu comportamento polêmico, Patton sempre • Patton • 91 G RA N D E S E S T RA T E G I S T A S M I L I T A RE S ganhou visibilidade nos meios de comunicação, tornando- -se famoso mundo afora. Essa fama lhe rendeu papel numa operação que tinha como objetivo iludir os alemães no que dizia respeito ao local do desembarque para a invasão e re- tomada da França, a Operação Fortaleza. Nela, Patton ia comandar cerca de um milhão de homens na região de Do- ver para induzir os alemães a acreditarem que o desembar- que aliado seria na parte mais estreita do Canal da Mancha. Chegando a Pas-de-Calais, na França, Patton organizou a operação com vários detalhes a fim de dar credibilidade à farsa. As evidências obtidas pelos alemães, juntamente com o fato de Patton estar no comando do desembarque, fize- ram com que várias tropas alemãs fossem desviadas para a região de Pas-de-Calais, enfraquecendo, assim, a defesa de onde realmente aconteceria o desembarque, as praias da Normandia. Enquanto os alemães acreditavam que Patton lidera- ria o desembarque na França, ele estava no comando do 92 3º Exército, o qual conseguiu treinar de acordo com suas convicções, com muita disciplina e até a exaustão, para que não houvesse tantas diferenças entre o treinamento e a hora da batalha. Mas seu 3º Exército só entraria em combate na França um mês após a invasão pela Normandia. A intenção era dar ainda mais credibilidade de que o desembarque ma- ciço seria feito em Pas-de-Calais e confundir os alemães. Em julho, Patton e seu 3º Exército desembarcam na França, quando a tomada das praias já havia sido consoli- dada e o momento agora era de ganhar territórios França adentro. Patton seguiu isso firmemente, avançando distân- cias consideráveis, mas também se afastando das bases de abastecimentos. Ao perceber essa lacuna entre Patton e a retaguarda, Hitler decidiu atacar o general americano. Esse, por sua vez, tomou conhecimento da ofensiva e teve tempo para articular um contra-ataque. O plano de Patton era fazer um bolsão em torno dos alemães a fim de fechar o cerco e liquidá-los. Para isso, contou com a ajuda do 1º Exérci- to Canadense e do 2º Exército Britânico. A operação era complexa, pois deixava grandes lacunas entre os exércitos aliados que atacariam os alemães, porém o forte apoio aé- reo e a surpresa do contra-ataque acabaram com a frágil e limitada ofensiva alemã. Após a emboscada, o certo a se fazer seria fechar o cer- co, mas os superioresde Patton não o autorizaram a fazê-lo devido à grande faixa de ação necessária para a manobra. Dos 100 mil alemães cercados, 40 mil conseguiram fugir devido ao não fechamento do bolsão. Patton seguiu ganhando terreno e queria seguir perse- guindo os alemães até Berlim. Nesse mesmo momento, o general ganhava grande visibilidade por seus avanços e a Aqueles que rezam fazem mais pelo mundo do que aqueles que lutam; e se o mundo vai de mal a pior, é porque existem mais batalhas do que orações. • Patton • 93 G RA N D E S E S T RA T E G I S T A S M I L I T A RE S opinião pública americana queria que ele comandasse o ataque final contra os alemães. Por questões políticas, Eisenhower não podia deixar o exército inglês de fora da conquista, então ele optou por não ceder nem a Patton nem a Montgomery, já que cada um que- ria a glória final para si, estabelecendo uma frente ampla com espaço para todos, mas deu a Montgomery, que seguiria pela região costeira, a prioridade de abastacimento. Mesmo com essa desvantagem, Patton seguiu ganhando terreno com mui- ta velocidade, o que se tornaria novamente um problema em relação à distância entre as tropas e as bases de abastecimento. Hitler decidiu atacar em Ardenas com o objetivo de dividir as tropas aliadas, acreditando que o poder de seu ataque faria os Aliados se renderem e, assim, dando à Ale- manha forças para combater o perigo soviético, o que se revelou apenas um delírio suicida. O ataque se deu em 16 de dezembro e Patton foi com seu 3º Exército defender as posições e, como era do seu gosto, ani- quilar seus adversários. Patton atacou por trás e pela esquerda, apoiado por forte cobertura aérea. No final de dezembro os alemães bateram em retirada e em janeiro o 3º Exército voltou à linha original da frente ampla de ataque aliado. A partir desse momento, o 1º e o 3º Exércitos dos EUA se mantiveram em apoio a Montgomery, ainda que com a liberdade de seguirem avançando rapidamente e conscien- tes de que continuariam tendo um abastecimento de ordem secundária. Mesmo assim, seguiram rapidamente, toman- do terrenos e acumulando prisioneiros alemães que se ren- diam aos milhares por dia. Após atravessarem o rio Reno em março de 1944, aden- traram cada vez mais fundo numa Alemanha já em colapso, chegando em abril à Tchecoslováquia, onde deveriam parar Se tomarmos a definição geralmente aceita de bravura como uma qualidade que não conhece o medo, eu nunca vi um homem corajoso. Todos os homens estão assustados. Quanto mais inteligentes eles forem, mais estarão assustados. 94 para não adentrar à parte que cabia à União Soviética. A guerra terminaria no dia 8 de maio com a assinatura de rendição dos alemães. Patton chegara à patente de General de quatro estrelas e logo seria transferido para atuar como Governador Militar na Baviera, sem muito sucesso, uma vez que tentou man- ter na estrutura do governo pessoas ligadas ao Partido Na- zista. De lá, foi transferido para comandar o 15º Exército, que cuidava de documentar os acontecimentos de guerra, um posto interessante para quem adorava escrever sobre a guerra e suas estratégias. Morreu aos 60 anos em Heidelberg, em 21 de dezembro de 1945, devido a complicações após um acidente automo- bilístico ocorrido em 7 de dezembro em Mannheim. Foi enterrado em Hamm, Luxemburgo, ao lado de seus solda- dos, no dia 23 de dezembro. • Patton • 95 Personal idades históricas sobejamente famosas, icônicas até, destacadas por suas ações nos campos de batalhas, como Napo- leão Bonaparte e o General Patton, têm em comum a sabedoria das estratégias guerrei- ras que lhes garantiu conquistas formidáveis. Grandes Estrategistas Mil i tares traz um punhado dos maiores gênios que se empe- nharam na arte da guerra, pelo decorrer dos séculos, contando que suas ideias e at itudes servem como inspiração para o mundo com- petit ivo que hoje as pessoas têm de enfren- tar, na vida pessoal e no campo profissional. Capa Organização/Autores Expediente Índice Apresentação Sun Tzu