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1 Quem fomos nós no século XX: As grandes interpretações do Brasil Alberto da Costa e Silva Na manhã do primeiro dia de 1901, um brasileiro, sentado ao lado da estante, abria as páginas do último livro recebido de Paris, sem ter grandes esperanças, ao meditar sobre o Brasil. Ali estava, nos trópicos malsãos, cercado de gente que a ciência já situara nos patamares inferiores da humanidade - negros, índios, mulatos, caboclos, cafuzos - e ele próprio sem muita coragem de olhar-se ao espelho. Se fosse mulato escuro ou negro, como aquele catarinense que alguns consideravam um grande poeta, é provável que o dilacerasse o conflito entre o que sabia pela vida, pela inteligência e pelo coração e o que lhe afiançavam os sábios da Europa, e talvez se sentisse a reescrever mentalmente "O emparedado", de Cruz e Sousa, juntando à palavra "África" as duas sílabas de "Brasil". Ainda que os vizinhos lhe sorrissem e os alunos se levantassem, quando entrava na classe, sabia que o olhavam como alguém diferente. A cor da pele, a carapinha, as forma nariz e dos lábios, tudo nele afirmava que descendia de escravos. E o escravo está sempre fora da sociedade para a qual foi arrastado. A ela só se incorpora, e muito lentamente, depois de liberto ou, na maior parte das vezes, nas pessoas de seus netos ou bisnetos. E mal se tinham passado 12 anos da abolição da escravatura no Brasil. Branco ou tido por branco, ele olharia para o vizinho escuro como um problema. Este era um ex-escravo ou o filho de um ex-escravo e, portanto. um ex- estrangeiro, e um ex-estrangeiro dele fisicamente distinto, que tinha de ser 2 absorvido e, em algum caso, europeizado. Pois o Brasil era um país europeu na América. Europeu e branco, ainda que quem pensasse assim fosse um mestiço. A este brasileiro que lia livros não o tranqüilizariam as notícias de que continuavam a chega imigrantes europeus ao país. Se esse sangue novo podia contribuir para apurar a qualidade das populações, nem sempre era ele do melhor, pois predominavam nos recém-vindos os portugueses, italianos e espanhóis, muitos deles da parte meridional de seus respectivos países e, por isso, por atarracados, morenos e com jeito de mouros, distantes dos tipos que a eugenia desejava peIos parâmetros do que se tinha por ciência, a geografia e a mistura de raças condenavam o Brasil, mais do que ao atraso, à barbárie. É possível, porém, que o nosso brasileiro tivesse sobre a mesa um exemplar de Por que me ufano de meu país (1900), publicado havia poucos meses. E que, ao reagir, como o conde Afonso Celso, ao que lhe impunham como cientificamente inexorável, passasse a repetir aqueles versos de Olavo Bilac: "Ama com fé e orgulho a terra em que nasceste, / criança, não verás país nenhum como este". Se mulato, ele se diria mameluco. E, mesmo se branco, com avós chegados do Minho, da Beira ou de Trás-os-Montes, procuraria uma antepassada tupi que se tivesse enlaçado ao seu João Ramalho, ao seu Caramuru ou ao seu Jerônimo de Albuquerque. Pois a Antigüidade na terra e a ligação de sangue com os que dela tinham sido os primeiros senhores vestiam de nobreza quem podia alegá-Ia. Esse nacionalismo em busca não apenas de origens que o justificassem e aristocratizassem, mas também do autenticamente brasileiro, sofreria, em Triste fim de Policarpo Quaresma (1915), de Lima Barreto, um ataque impiedoso, amargo e sofrido de um escritor com profundo senso de realidade ou, na visão ufanista, de um mulato magoado, invejoso e ressentido. Não é de excluir-se tampouco que o nosso brasileiro, sentado ao lado da estante, procurasse, entre o ufanismo e o desalento, um espaço mental de 3 observação, de investigação e de reflexão com um mínimo de peias. Este e aquele logravam observar o país sem os óculos europeus do fim do Oitocentos e investigar com a inteligência aberta. No entanto, ao organizar o material reunido e ao analisá-Io, era-Ihes quase impossível pôr-se de fora das estruturas intelectuais prevalecentes ou chocar-se com a verdade dos livros de prestígio. Assim se passou com Nina Rodrigues. São exemplares a empatia, a objetividade e o rigor com que reuniu, nas ruas e nas casas de Salvador, o material que seria publicado, depois de sua morte, em Os africanos no Brasil (1932). Quando descreve o que viu, ouviu e pressentiu, molda um negro rico de sua história e de sua cultura, criativo, plástico, inteiro. Mas, então, se recorda de que era um homem de ciência e repete os estereótipos racistas de seu tempo, reduz o negro e castiga de degenerado o mestiço que ele próprio era. Um outro mestiço, Euclides da Cunha, não escaparia disto em Os sertões (1902). Não deixou ele de compreender, como, meio século antes, João Francisco Lisboa, no Jornal de Timon, que eram os negros, os caboclos, os mulatos, os cafuzos, os pardos indefinidos e os brancos pobres os construtores do país e as grandes vítimas de sua história. Para Lisboa, nossos males não provinham deles, mas dos desmandos, da usura, da ignorância e da desordem do poder. Como Euclides da Cunha testemunhou em Canudos. Este, porém, ainda que reconhecesse no sertanejo "um forte" e nessa "rocha viva" visse o bisneto abandonado dos que haviam feito o mapa do Brasil, não deixou de contagiar de racismo a sua análise. Cedeu ao que se tinha por ciência e anatematizou, nas duas primeiras partes de seu livro, a terra e a gente brasileiras. Mais do que ninguém, pela recepção estrondosa que teve sua obra, difundiu ele a teoria de que, na mistura de raças, "ainda quando haja sobre o produto o influxo de uma raça superior, despontam vivíssimos estigmas da inferior" e, por isso, "o mestiço [...] é, quase sempre, um desequilibrado". Se faz o elogio do sertanejo, não deixa de tê-lo como um "retardatário", antes de o confrontar com "o raquitismo exaustivo dos mestiços neurastênicos do litoral". Ou seja, do mulato. 4 Força é não esquecer que esse livro, Os sertões, causou sobre a inteligência brasileira um impacto sem precedentes e que talvez só se tenha repetido, trinta anos mais tarde, com Casa-grande & senzala. Na desgraça de Canudos reproduzia-se, localizada, a desdita do pais: com esse inventário de gente inferior instalada nos trópicos não era possível colocar o Brasil a par com a Europa. Não podíamos ter um futuro melhor do que o presente, pois a ciência marcava os nossos tristes limites. A menos - e esta foi a saída de Sílvio Romero, inconformado com o destino que nos estava previsto - que a miscigenação se fosse processando com um contínuo aumento do sangue branco. Havia que clarear o brasileiro. E difundiu-se popularmente a aspiração de "melhorar a raça". A apologia do branqueamento impregnaria, mais tarde, a importante obra de análise social de Oliveira Viana. Tiveram leitores apaixonados os seus livros Populações meridionais do Brasil (1920) e Evolução do povo brasileiro (1923). Neles, destacava-se que o Brasil se fizera apesar dos índios, dos negros e dos mestiços, tudo devendo aos brancos. E se prognosticava uma nação embranquecida. Contava ele, para isso, com o aumento da imigração européia, com a fecundidade dos brancos, maior do que a das raças inferiores - a população negra, escrevia, estacionara -, e com a preponderância de cruzamentos felizes, nos quais os filhos de casais mistos acompanhassem as características superiores do pai ou da mãe branca. Embora posteriormente Oliveira Viana viesse a corrigir sua posição, persistiu na mente da maioria essa leitura de seus livros. A visão de que as raças formadoras do país e a sua mistura condicionavam negativamente o nosso destino permeia boa parte do que se escreveu na primeira metade do século. Está, por exemplo, nas três raças tristes do Retrato do Brasil (1920), de Paulo Prado. Mas nunca foi sequer considerada por Capistrano de Abreu, que não acreditavaem raças superiores nem inferiores. Para Capistrano, o Brasil autêntico tinha sido formado pelos mamelucos, ao conquistar o sertão. Haviam sido eles os primeiros brasileiros, numa história que teve os negros por atores secundários e não menos estrangeiros do que os portugueses. Era ao 5 caboclo que devíamos a unidade nacional, construída do interior para a costa, uma costa dominada pelos reinóis e os seus mulatos. Todo o enredo violento e heróico de ocupação da terra devia-se "ao sertanejo, ao bandeirante, ao vaqueiro, ao desbravador. E estes se haviam oposto de forma consistente às cidades litorâneas e mineiras, que não se autogovernavam como as fazendas do interior e não tinham outra vontade que não a da metrópole. Quem lesse os Capítulos de história colonial (1907), antes ou depois de Os sertões, talvez não escapasse da impressão de que a campanha de Canudos fora o episódio final, e trágico, de um processo de reversão que se reforçara com a transferência da família real para o Rio de Janeiro, quando a metrópole, sem deixar de ser metrópole, se instalou entre nós, conforme historiara Oliveira Lima em D. João VI no Brasil (1908). Seria nesse corte da evolução natural para a independência, causado pela vinda da casa de Bragança, que Alberto Torres e Manuel Bonfim veriam o início dos desacertos brasileiros. Para o primeiro, cujos livros A organização nacional (1914) e O problema nacional brasileiro (1914) tiveram grande audiência entre as elites, não precisávamos mudar de antepassados nem nos tornar num povo distinto do que éramos, para ocupar espaço entre as grandes nações. Um espaço, por sinal, que já tínhamos por nosso, apesar do curtíssimo período de ação livre, das péssimas condições de competência com outros países e dos defeitos de nossas estruturas sociais e de nosso sistema político. Alberto Torres não acreditava numa hierarquia de raças, tendo no cume o dolicocéfalo louro, nem na degenerescência do mestiço. Do mesmo modo que alguns de seus mais atentos leitores, como Plínio Salgado e os integralistas, de cuja agenda constavam a valorização do mestiço e a dignificação do negro. Na sua prosa exaltada, Manuel Bonfim rasgava fundo: o racismo e as teorias científicas que o amparavam compunham o processo de dominação do resto do mundo pela Europa e seu prolongamento norte-americano. Serviam para justificar o imperialismo: os europeus, por superiores, estavam fadados a conduzir os inferiores ou a substituí-los nas terras que ocupavam. Os povos, porém, não se 6 diferençavam pelas raças; diferençavam-se pelas culturas. Entre eles, o que havia eram dessemelhanças de tradições, direção, perspectivas e, em última análise, momentos históricos. O branco não era, assim, em nada superior ao ameríndio ou ao negro. Os defeitos que no último se apontavam, se os tinha, não eram dele, mas do regime de escravidão a que fora submetido. Quanto aos mestiços, não os considerava desfibrados, mas enérgicos, e o provava a gesta heróica da ocupação do território brasileiro. O autor de O Brasil na América (1929) mais do que acompanhava Capistrano de Abreu: escrevia com entusiasmo sobre o século XVII, quando se formou o brasileiro. Os problemas com que, depois, se defrontaria o país seriam devidos não ao seu povo, mas à ganância da metrópole e aos desacertos das elites que a substituíram no mando. Também para Alberto Torres os problemas do Brasil eram de natureza política e econômica. Derivavam da organização desastrada do Estado e da produção. Um país só é rico quando gera riqueza. Nós não só não a produzíamos na quantidade necessária, como, dadas as nossas estruturas sociais defeituosas, tomávamos a terra "pobre para a sua gente". Fora das cidades, essa gente que tinha a pobreza dentro de si e ao derredor confluiu para um personagem de um artigo, incluído num livro de contos, Urupês (1918), e que, de uma hora para outra, se voltaria em símbolo e tornaria famoso o seu autor. Refiro-me a Jeca Tatu. Monteiro Lobato não permite dúvida de que pretendia satirizar a ufanização do caboclo e devolvê-Io à realidade, de cócoras, a deixar passar, apático, a vida. Não falta no texto o seu toque de preconceito racial, como dele não estará isento o convívio de tia Nastácia com Emília e d Benta. O resto da obra de Lobato nos explica, no entanto, que Jeca Tatu não chega a camponês, ficando em caipira, porque sem terra, sem saúde, sem socorro e sem ter o que fazer com o que colhe, quando toma coragem e planta. Não era assim, no entanto, por determinismo de sangue ou clima. Tanto que Lobato passou a vida a ensinar-nos que Jeca Tatu podia ser resgatado e que era não só possível, mas provável que o Brasil se pudesse tornar uma grande 7 nação - rica, justa, harmoniosa e criadora. Essa imagem de um Brasil que seria conforme o esforço que nele puséssemos, individual e coletivamente, Lobato passou para a maior audiência que um escritor jamais teve no país - uma audiência que se acrescentava a cada ano. Ninguém exerceu influência mais profunda e mais duradoura sobre as crianças e os jovens e, portanto, sobre os adultos, no Brasil do século XX. Ainda quando nos apartamos de muitas de suas concepções, fica-nos a valorização de todo tipo de trabalho, o respeito pelo fazer bem, o aguçamento do olhar crítico, a dúvida diante das idéias feitas, a recusa do conformismo, a confiança na fecundidade da ação, o desgosto com o cerceamento das opiniões e da liberdade, o sentimento de que a imaginação encharca cotidianamente a vida. O mundo é feérico, imprevisível e admirável - ele insistia em seus livros infantis, ao trazer o Sítio do Pica-pau Amarelo para dentro da rotina das casas brasileiras. E não cansava de dizer-nos que o país poderia ser mudado, se cada criança, ao crescer, desse a sua contribuição para lhe modernizar a agricultura, racionalizar a exploração dos recursos minerais e crivá-lo de indústrias. Essa idéia do Brasil como um constante projeto, como uma tarefa a ser cumprida, estava no cerne da vontade de alguns jovens seus coetâneos, que com ele, contudo, jamais se entenderam. Foram esses jovens responsáveis pelo que quiseram que fosse um escarcéu publicitário e que, tendo sido, no momento em que se deu, um escândalo de província, se tomou um prolongado escândalo nacional, pela lembrança ampliada que dele os seus participantes não cessaram de reproduzir: a Semana de Arte Moderna. Foi ela um golpe de mestre de rapazes persuadidos de que estavam descobrindo o Brasil ou, quando menos, o procurando. E que convenceram todo o mundo de que com eles se fizera a grande ruptura entre o Brasil que se ignorava e o Brasil que começava a ser, O país estava à nossa espera, cheio de juventude. O que se concebera como uma diretriz estética, a Antropofagia, na realidade definia o Brasil. Como 8 provava o abrasileiramento, logo na primeira geração, dos filhos dos quase quatro milhões de imigrantes desembarcados em nossos portos entre 1860 e 1922. Éramos uma nação antropófaga, devoradora de tudo que vinha de fora, capaz de assimilar e reproduzir, modificados e enriquecidos, os valores que nos interessavam, eliminando o resto. A teoria do Brasil canibal ficou em linguagem de manifesto - quem a formulou, Oswald de Andrade, era um mestre das poucas palavras carregadas de certeza -, porém foi de uma fecundidade enorme. Ajudou, por algum tempo, a varrer para longe os determinismos pessimistas. O Brasil, contudo, não era só futuro. Tinha um passado de invenção e beleza, que necessitava ser revelado ou revalorizado - como o Barroco Mineiro. E tinha um presente riquíssimo, o seu povo. O caipira não era incapaz de arte. O mestiço do litoral não era um desfibrado. Nem o sertanejo, um seco fanático. Ali estavam as cavalhadas, os fandangos, os maracatus, as máscaras dos ticunas, os santos de nó de pau, os exus de ferro, osex-votos, o romance de d. Barão e o da Nau Catarineta, os desafios de violeiros. Ali estava todo um extraordinário material ao aguardo dos artistas urbanos e dos estudiosos. E Mário de Andrade, sem perder um só momento a sua intuição de poeta e sem abandonar, enquanto artista, o rigor do erudito, não só saiu atrás de tudo isso, mas, graças a uma liderança epistolar sem igual, pôs toda a sua geração, e a geração seguinte, a redescobrir o Brasil pelas criações de seu povo. No seu entusiasmo, os modernistas pareciam não aceitar que não se tivesse esperado por eles para proceder ao mapeamento do Brasil, um mapeamento que já começara a ser feito desde havia muito - e com dedicação e competência. Não punham o menor esforço em lembrar-nos, por exemplo, de que Barbosa Rodrigues publicara na Poranduba amazonense (1890) os contos indígenas que recolhera nas suas viagens pelo interior do Brasil, escrevera a importantíssima Sertum Palmarum Brasiliensium e deixara de herança uma monumental Iconographie des Orchidées du Brésil. Era como se Celso de Magalhães nunca tivesse escrito A poesia popular brasileira, nem Sílvio Romero, 9 os seus Cantos populares do Brasil (1883), Contos populares do Brasil (1885) e Estudos sobre a poesia popular do Brasil (1888). De relações praticamente cortadas com os mais velhos ou "passadistas", não queriam dar-se conta de que um amigo desses, Rodolfo von Ihering, já havia publicado o Atlas da fauna do Brasil (1916), assim como a primeira versão do que viria a ser o seu Dicionário dos animais do Brasil (1914), e simulavam ignorar o Folclore pernambucano (1908), de Pereira da Costa, O tupi na geografia nacional (1901), de Teodoro Sampaio, ou Cantadores (1921), de Leonardo Mota. Mais: deixavam-nos na ignorância de que das páginas de Rã-txa-hu-ni-ku-i ou a língua dos caxinauás (1914), de Capistrano de Abreu, e das Lendas em nheengatu e português (1926), de Antônio Brandão de Amorim, vários heróis sem nenhum caráter acenavam para o Macunaíma que Mário de Andrade encontrou como um arecuná, em Koch- Grünberg, e transformou em arquétipo e metáfora. O que era novo nos modernistas era a maneira de olhar. E o meditar apaixonado sobre o que se olhava. E o escrever sem colete. A imagem que o brasileiro fazia de si próprio e de seu país começava a mudar. E mudaria de modo ainda mais radical e num ritmo ainda mais rápido, a partir de 1933, graças a Casa- grande & senzala. Neste livro, Gilberto Freire declarava em voz alta que o Brasil não era uma nação branca que tinha negros. O negro estava em todos nós e sem o negro não teria havido nem havia o Brasil. Bernardo Pereira de Vasconcelos já dissera, em 1843, que a África civilizava o país. Gilberto Freire apresentava as provas disso e punha o negro no centro do cenário, retirando-o da posição ancilar em que o tinham Capistrano de Abreu e Manuel Bonfim. Éramos todos mestiços na cultura. E era a cultura o que importava, a cultura que movimenta a nossa mente e o nosso corpo e, não, a cor da pele ou a textura dos cabelos. Tão intensa fora a nossa mestiçagem cultural, que era quase impossível medir-se, sobretudo no cotidiano doméstico, o que se devia ao ameríndio, ao africano e ao europeu. Algumas décadas mais tarde, talvez fosse difícil perceber a revolução que representou Casa-grande & senzala. Isto porque muitas de suas idéias e do 10 vocabulário em que eram expressas se incorporaram ao dia-a-dia brasileiro. Repetiam o que vinha no livro até os que nunca o tinham lido. Citava-se Gilberto Freire como se ia "embora p'ra Pasárgada", ou se reclamava: "um urubu pousou na minha sorte". Isto é, sem consciência de que se declamavam versos de Manuel Bandeira e Augusto dos Anjos. E também porque, na esteira de Casa-grande & senzala, veio toda uma seqüência de criações tendo por sujeito o negro - o que já havia sido antecipado pelo poema emblemático de Jorge de Lima, "Essa negra Fulô". O próprio impacto do livro de Gilberto Freire e as discussões que provocou mostravam que o Brasil não era uma democracia racial, como ele propugnava. Não era, mas, a partir de então, passou a querer ser. Ser uma democracia racial tornou-se uma das grandes aspirações nacionais. Passáramos a não ter medo de nossa mestiçagem e a esgrimi-Ia como uma vantagem. O mulato patológico de Aluísio Azevedo, Adolfo Caminha e Euclides da Cunha tornava-se um dos erros mais grotescos de todos os que importáramos. Em Casa-grande & senzala reaprendíamos que o grande útero da nação tinha sido a cunhã, a mulher ameríndia. E que tinha sido com o índio que o português aprendera a viver no que viria a ser o Brasil. Não havia escapado à intuição de alguns que o negro não fora apenas os braços e as pernas do branco, mas mudara neste a maneira de comportar-se, de pensar e de sentir. Rui Barbosa já reconhecera no escravo o nosso primeiro operário, o criador primeiro da riqueza nacional. Mas é com Gilberto Freire que ele perde as feições de selvagem que lhe colaram ao rosto, pois nos mostra que os africanos, ao chegar ao Brasil, sabiam manejar o gado, trabalhar o ferro, abrir galerias para minas, batear o ouro, irrigar o solo, adubá-lo e cuidá-lo como mandava o trópico, fazer fortificações e organizar as tropas para o combate. Todos vinham de povos com história e traziam consigo formas próprias de estar no mundo. Não faltava sequer quem lesse o Alcorão ou escrevesse em arábico, ao passo que o seu dono mal conseguia desenhar o nome. Quanto ao senhor, 11 ainda que um proscrito, não era necessariamente um criminoso nem a escória da metrópole. O degredo aplicava-se aos cristão-novos, aos ciganos, aos dissidentes políticos, aos homossexuais, aos adúlteros, aos bígamos e aos que cometiam delitos que não conseguimos, hoje, colocar entre os malfeitos. O Brasil e os brasileiros não éramos a simples junção das três raças tristes do soneto de Olavo Bilac e do livro de Paulo Prado. Resultávamos de um encontro muito mais complexo - ou mais rico - de culturas. Aqui, minhotos vindos de diferentes vilarejos somavam semelhanças e trocavam diferenças, e o mesmo se passava entre eles e transmontanos de encostas e vales distintos, e com beirões, alentejanos, algarvios, estremenhos, ribatejanos, açorianos e madeirenses. O que era difícil de dar-se no próprio Portugal, aqui se passava corriqueira e facilmente. E o mesmo se repetia com as mulheres e os homens trazidos da África, que não se viam como africanos, mas como gente de sua aldeia, a quem os outros chamavam jalofos, bamuns, mandingas, papéis, bijagós, fantes, achantis, gãs, fons, guns, baribas, gurúnsis, quetos, ondos, ijexás, ijebus, oiós, ibadãs, benins, hauçás, nupês, ibos, ijós, calabaris, teques, iacas, anzicos, congos, andongos, songos, pendes, lenjes, ovimbundos, ovambos, macuas, mangajas, cheuas - cada qual com seus valores e costumes próprios, muitas vezes tão distantes uns dos outros quanto um russo de um siciliano ou um escocês de um andaluz. Não era diferente a situação dos ameríndios nem dos demais europeus e dos asiáticos que emigraram para o Brasil - e de toda essa profusão de gentes e culturas Artur Ramos faria o inventário na sua Introdução à antropologia brasileira (1942-1947). Parafraseando Mário de Andrade, cada um de nós era trezentos, era trezentos e cinqüenta. Deixávamos de nos ver como um povo cabisbaixo, votado inexoravelmente à tristeza. Pessoalmente, podíamos, de vez em quando, ser tomados pela saudade e o banzo. Este seria ensimesmado, mas aquele tinha no rosto o desenho do riso. O que não se poderia mais dizer é que não amávamos o zé- pereira, a festa, os animais com arreios floridos, as casas pintadas de cores vivas, 12 as procissões barulhentas, os tetos forrados de bandeirinhas, as mesas cheias de doces, os estampados vistosos, o frevo, as lapinhas mecânicas, as rendas e as estórias maravilhosas. Tínhamosde sobra tudo isso e mais isto, como passaria a mostrar, incansavelmente Luís da Câmara Cascudo. No seu ciclorama, projetou-se a vida brasileira em toda a sua copiosa variedade, de Roraima ao Rio Grande do Sul e do Acre a Natal, onde morava. Do pelo - sinal na testa do recém-nascido às "excelências" dos velórios. Da praça ao claustro. Do botequim à sacristia. Da sala de visitas à cozinha. E do alpendre ao fundo do quintal. Sem a preocupação de teorizar sobre o Brasil, filmou-o com palavras no espaço e no tempo. Contou-nos o que viu, ouviu e tocou. Repetiu-nos em miúdos o que leu - e leu praticamente tudo sobre o povo brasileiro -, depois de confrontar os textos entre si e com sua experiência pessoal. Comparou nossas festas com as dos outros povos, e nossas comidas, e nossas crenças, e nossas canções, e nossas danças, e nossos brinquedos infantis, e nossas casas, e nossos objetos, e nossos ritmos de viagem, e nossos hábitos de trabalho, e nossos jeitos de conviver, e nossos medos. Ao sistematizar o que se sabia sobre nossa gente e ao ampliar com sua própria pesquisa esse conhecimento, Câmara Cascudo alargou, aprofundou e modificou a idéia que se tinha do Brasil. A sua ambição era a de que os brasileiros gostassem de verdade de sua pátria, e até de seus defeitos, e a quisessem como era e não como uma repetição ou, pior, um simulacro dos Estados Unidos ou da Alemanha. Outros desciam o olhar dos chapéus deslumbrantes e dos rostos floridos dos guerreiros das Alagoas para os seus pés descalços. O Brasil estava errado e havia que descobrir as razões de seu atraso e de suas injustiças Que provinham de suas próprias raízes. E assim se chamou, Raízes do Brasil (1936), o livro em que Sérgio Buarque de Holanda nos propôs uma nova interpretação do país. Como Manoel Bonfim e Gilberto Freire, Sérgio Buarque de Holanda ressaltava a indecisão da lbéria entre a Europa e a África muçulmana. Mas, 13 enquanto o primeiro via o Portugal dos descobrimentos à frente da Europa, graças à sua intimidade com a grande civilização do Islã - não havia nada no resto do continente que pudesse sequer ombrear com Córdoba e Granada, em riqueza, requinte de vida, avanços técnicos, filosofia, ciência e arte-, Buarque de Holanda considerava que os ibéricos se desenvolviam à margem da Europa e das mudanças que se processavam em suas formas de vida social. Não negava que os portugueses tivessem, no fim do século XV, se adiantado aos europeus, ao criar Estados de expressão política e econômica moderna. Mas, em compensação, não se haviam organizado de forma coesa e solidária. A aspiração de cada pessoa era a de bastar-se a si própria. A esse individualismo exacerbado, aliava-se, numa península onde todos queriam ser barões, o desprezo pelo esforço manual, pelo trabalho. Daí que a expansão portuguesa tenha sido só aventura, sem constância no esforço, sem método e sem rumo. Todo o contrário pensava Manuel Bonfim. Para ele, a conquista do Atlântico e do Índico não se explicava apenas pelos grandes avanços técnicos conseguidos pelos portugueses, mas pela obstinação em cumprir um projeto, o do primeiro império moderno, que teria de ser ultramarino e assentado no comércio. Se Bonfim julgava que o enriquecimento das navegações, ao degenerar em cobiça e parasitismo, esgotara o impulso criador português, não tinha dúvidas de que este se encarnara em quem se ia tomando o brasileiro. Para Sérgio Buarque de Holanda, o português era aventureiro e criativo. Aceitava riscos e ignorava obstáculos. Plástico, adaptava-se sem dificuldade à geografia e aos modos de vida locais e se entendia e misturava com os nativos, porém era incapaz do trabalho sistemático, lento e seguro. Queria enricar depressa e voltar o mais rápido possível para a sua terra. A sua moral era a da aventura e não a do trabalho. Por isso e porque acostumado a estruturas sociais frouxas, com a prevalência das relações pessoais e familiares sobre os interesses da grei, o português não foi capaz de formar no Brasil uma sociedade marcada pela organização, pela associação e pelo planejamento. Cada colono, se tinha força para isso, instalava-se na sua casa-grande, sem cuidar dos vizinhos e sem 14 saber da coroa. Foi-se montando assim um país às avessas, no qual as cidades dependiam do campo. Ao refazer o enredo, Buarque de Holanda discordava fundamentalmente de Capistrano de Abreu: tinha sido um mal que o país tivesse sido construído do interior para a costa, contra as cidades que representavam a metrópole. Entre outras razões, porque a família patriarcal dos sertões tornara-se mais forte do que o Estado. Por isso mesmo, acentuou-se no Brasil a propensão lusitana para confundir os domínios do privado e do público, este constantemente invadido por aquele. Os valores afetivos impuseram-se sobre os da razão coletiva. E o compadrismo tornou-se norma. Bem como a total ausência de solidariedade e responsabilidade fora dos laços de família. Aí estavam as raízes do atraso brasileiro. Tínhamos de conhecê-Ias, para recusá-Ias e cortá-Ias, ou, ao menos, esquecê-Ias, a fim de impedir que o passado continuasse a atuar sobre o inconsciente brasileiro. A modernização passava, assim, pelo abandono das nossas características ibéricas e pela adoção de um novo estilo de vida coletiva, o americano, no qual o público se impusesse sobre o privado e o racional sobre o afetivo. Tínhamos, em última análise, de deixar de ser portugueses transplantados nos trópicos. Porque isto éramos, e não mestiços culturais, uma vez que os ameríndios e os africanos não chegaram a constituir um contrapeso em nossa formação e se ajustaram ao molde lusitano. Na realidade, estávamos, havia muito, a processar essas mudanças. Desde 1850, ou talvez antes, desde a chegada de d. João VI ao Rio de Janeiro, as cidades haviam começado a se impor sobre o isolamento e a auto-suficiência dos casarões rurais. E desde então, continuara, ainda que sem grandes abalos aparentes, a revolução brasileira, que consistia nesse cortar de raízes impróprias, que explicavam o nosso atraso e as injustiças a que condenávamos a maior parte de nossa população, todos aqueles que, nas senzalas, nos mocambos, nas palhoças e casas de sopapo, não receberam a menor parcela da herança e dos cuidados da casa-grande. 15 A guerra de 1939 a 1945 acentuou a percepção de nossas carências. Mas tornou claro também que a maneira de viver dos brasileiros se alterara substancialmente e continuava a modificar-se com grande rapidez. Outros eram os parâmetros de conduta de um país que se industrializava e que estava deixando de ser um arquipélago. À vontade de progresso e à euforia das mudanças aliava-se, entretanto, o sentimento de que algo se fora para sempre - um tipo de vida sem pressa, sem regras, sem desprezo pelo ócio, e no qual os contatos humanos eram cordiais, quando não afetuosos. A nostalgia desse passado alimentará os poemas itabiranos de,Carlos Drummond de Andrade, os romances sobre engenhos, bangüês e usinas de açúcar de José Lins do Rego, os contos de Marques Rebelo sobre os subúrbios cariocas e tantas páginas de outros poetas, ficcionistas, memorialistas e ensaístas, nas quais se perguntava se valia a pena trocar pela eficiência do modelo norte-americano o compasso lento e dengoso de nossa vida de esquina. A pergunta era não só irrelevante, mas também anacrônica. Não havia volta atrás. Quando muito, poder-se-ia procurar, como preconizava o Tristão de Ataíde dos Estudos, preservar os valores da grande família as aspirações à pequena empresa contra a ética protestante norte-americana, que favorecia a grande empresa, a pequena família e a impessoalidade nas relações sociais. Exatamente o contrário do que muitos desejavam - pensaria o nosso brasileiro, ou o seu filho, sentado ao lado da estante, no começo da segunda metade do século,a abrir o último livro publicado no Brasil, antes dos recebidos de Nova York ou de Paris. Estávamos, havia décadas, a tocar o fundo de nós mesmos - e disso dava sinal um livro como A cultura brasileira (1943), de Fernando de Azevedo. Nossa criação artística tornara-se ainda mais o desenho de nossa realidade, e estavam no auge de suas forças, entre tantos outros, Villa-Lobos, Francisco Mignone, Brecheret, Portinari, Goeldi, J. Carlos, Nássara, Cecília Meireles, Nélson Rodrigues, Jorge Amado e Graciliano Ramos. Poucos tinham dúvidas do que éramos, mas mediam de modo diferente as nossas forças e fraquezas. E de modo 16 diferente lhes identificavam e interpretavam as origens. Pois de suas convicções políticas, ou seja, do projeto adotado para o futuro do país e do mundo, dependia a maneira de explicar o Brasil. Se fosse marxista, é provável que visse o nosso passado como feudal e adotasse como primeiro remédio para os males a eliminação dos restos do feudalismo, simbolizados no latifúndio. Ou que definisse como sistema escravista de produção o prevalecente na colônia e no império. Mas é possível também que tivesse do país a imagem que lhe ficara de Evolução política do Brasil (1933) e Formação do Brasil contemporâneo (1942), de Caio Prado Júnior. Nesses livros, não só se fazia uma leitura materialista dialética da história brasileira, uma história que nos era contada a partir da produção, da distribuição e do consumo da riqueza, como se ampliavam as suas dimensões. O Brasil surgira como parte da expansão mercantil do nascente capitalismo europeu. O país fundara-se, de fora para dentro, para fornecer açúcar e bens tropicais. E a sua história não era mais do que um capítulo da história maior do comércio europeu e fora dela não se explicaria. O seu enredo, no entanto, não foi tecido apenas por esses interesses, mas pelas classes sociais em luta. Nele entram, sofridas, machucadas, resignadas ou insubmissas, as massas de escravos e semi-escravos, de pobres, explorados e empobrecidos. E passam a ocupar o espaço que dantes só cabia às elites dirigentes. No retábulo de nossa história, abrem-se painéis para as rebeliões da gentalha, dos cabanos e dos balaios, e tornam-se mais nítidos os traços e as cores dos praieiros e dos farroupilhas. Não éramos portugueses desterrados, mas um povo que fora adquirindo, ao longo da história, fisionomia própria. Desde a colônia, havíamos-nos organizado de forma original, diferente da indígena e da portuguesa e, conseqüentemente, começáramos a desenvolver uma mentalidade coletiva singular. 17 Éramos um só povo, ou cada vez mais um só povo - pensava o nosso brasileiro que lia livros -, mas nos vestíamos conforme o lugar. Tendíamos a olhar o país da janela de nossa província ou região. O nortista que reconhecia o Brasil no Raimundo Morais de Na planície amazônica (1925) e O país das pedras verdes (1930), acercava-se da paisagem e da humanidade de Vida e morte do bandeirante (1929), de Alcântara Machado, com a sensação de distância. E a um gaúcho poderia escapar o que um pernambucano ou um alagoano encontravam em Nordeste (1937), de Gilberto Freire. Pois lemos com os olhos que o menino e o moço que fomos derramaram ao derredor, com as experiências que tivemos nos lugares onde nos foi dado viver e com as memórias de nossos pais e avós. Os brasileiros éramos nós, os daqui, e os outros. Os vários outros. Talvez tivéssemos, por isso, de renunciar a uma interpretação que abrangesse o Brasil inteiro. Talvez fosse mais realista analisar o país a partir de seus vários núcleos culturais, como propôs Viana Moog, em Uma interpretação da literatura brasileira (1943). Para Moog, seriam sete esses núcleos - Amazônia, Nordeste, Bahia, Minas Gerais, São Paulo, Rio Grande do Sul e Rio de Janeiro -, embora ele reconhecesse as peculiaridades do Maranhão e o fato de muito da terra fluminense pertencer culturalmente à área açucareira do Nordeste. Uma dúzia de anos depois, Viana Moog, sem abandonar a sua tese do Brasil como arquipélago cultural se renderia à sereia das explicações globais, com Bandeirantes e pioneiros (1955), um livro em que procurou mostrar por que o Brasil, embora saindo um século na frente, não logrou o êxito, o bem-estar e a posição central no mundo conseguidos pelos Estados Unidos da América. Já então, os Estados Unidos se apresentavam como modelo e meta das classes médias brasileiras, que iam adquirindo intimidade com os modos de vida norte- americanos e a eles se afeiçoando, não só por causa do cinema, mas também graças a outros fatores, entre os quais não seriam de desprezar-se um programa de rádio de enorme audiência, "A família Borges", e os testemunhos de Érico 18 Veríssimo em Gato preto em campo de neve (1941) e A volta do gato preto (1946). O leitor abria Bandeirantes e pioneiros e deparava dois grandes murais, um defronte ao outro. No primeiro, viam-se os recém-chegados diante de amplas planícies, que, após a breve interrupção de uma cadeia de montanhas, voltavam a estender-se para o interior. Entravam eles por rios que conduziam, quase sem cortes de corredeiras, ao coração do continente. Por toda a parte encontravam solos profundos, semelhantes aos mais férteis da Europa, e nos quais o clima permitia que cultivassem o trigo, o centeio e a cevada a que estavam acostumados. E deparavam jazidas de carvão de alta qualidade logo ao lado das minas de ferro. Tinham eles saído de suas terras, porque não suportavam as suas abominações, e traziam como objetivo e sonho construir uma nova pátria. Nenhum pensava em regressar à Europa e todos se faziam prontamente senhores da terra, com uma determinação que se coadunava com a ética do trabalho que neles estava entranhada, assim como a convicção calvinista de que a riqueza era um sinal da graça divina. Tiveram a América como tarefa. E se empenharam em cumpri-Ia, enriquecendo pela agricultura, o pastoreio, a navegação e o comércio. Foram, assim, ocupando o continente, como colonos, cultivadores, pioneiros e, desde o início, americanos. No outro mural, os recém-vindos tinham de escalar, logo após uma faixa litorânea em geral estreita, as escarpas que conduziam ao planalto. Se subiam os rios, logo adiante assustavam-se com a força dos cachões, quedas- d'água e corredeiras que lhes cortavam caminho. Rasos eram, em sua maioria, os solos e não se prestavam em geral ao arado. E o clima era tão distinto do europeu, que naquelas terras se viam obrigados a mudar de cultivos. Quase tudo nelas exigia novas técnicas, que tinham de ser aprendidas dos nativos - como o plantio da mandioca e o fabrico do beiju ou da farinha - ou transplantadas das ilhas atlânticas - como o engenho de açúcar. Quando necessitaram de carvão e ferro, as jazidas de um e outro estavam a longa distância, e as daquele eram de má qualidade. 19 Trabalhavam o solo, ou, melhor, punham os seus escravos a trabalhar o solo, porque necessitavam de alimentos ou, no caso da cana, porque esta substituíra, nas regiões de solos mais gordos, a ambição da prata e do ouro. Pois não tinham atravessado o oceano, para continuar labregos, mas, sim, para enriquecer o mais depressa possível. Para eles, o trabalho era um castigo, o comércio, uma atividade ignóbil, e o lucro e o juro matéria do pecado. Adentraram o continente em busca dos metais preciosos e, enquanto não o encontravam, do índio para escravo. Como soldados, conquistadores, bandeirantes. Não pretendiam instalar- se produtivamente nas terras que desbravavam, mas delas recolher o butim e voltar ao ponto de partida. Se tivessem êxito, tudo a que aspiravam era retornar, prósperos, a Portugal, a que continuaram - e, por muito tempo, também os seus filhos mazombos-ligados. O contraste entre os dois murais explicaria o descompasso histórico entre os Estados Unidos e o Brasil. Ao contráriodeste, que não se sentia convocado a inventar nada, aqueles, com seu amor pelas mãos, ideavam constantemente novos utensílios, novas máquinas e novas técnicas. A geografia, o modo de ocupar a terra e a cultura explicavam muito, mas não tudo - talvez pensasse o nosso brasileiro, sentado junto à estante. Pois o Brasil não era uma ilha; e fora ligado, desde o início, por numerosíssímos istmos não só à Europa e à África, mas também à Índia e ao resto do Oriente, qual se mostrava em Sobrados e mucambos (1936), de Gilberto Freire. A sua fundação podia até ser vista - conforme reclamara Caio Prado Júnior - como um episódio do expansionismo comercial europeu do Quatrocentos e do Quinhentos. Não só o era, confirmava Celso Furtado em Formação econômica do Brasil (1959), como as prosperidades, as estagnações e os declínios do país dependeram, durante mais de trezentos anos, de decisões sobre os seus produtos de exportação, tomadas nos mercados europeus. Desde o início, por exemplo, a produção de açúcar no Brasil foi financiada, refinada e comercializada pelos 20 flamengos. O negócio do açúcar era mais deles do que dos portugueses, por isso que o quanto de mascavo embarcado para a Europa se definia em Antuérpia e, depois, em Amsterdã, e não em Lisboa ou, muito menos, em Salvador ou Olinda. A unidade produtora (engenho, casa-grande e senzala) era altamente especializada e quase auto-suficiente. Não criava mercado para os produtos do país, pois nela praticamente não se adquiriam mais do que lenha para as caldeiras e animais de carga e corte. Só após a descoberta do ouro, com a urbanização propiciada pelas atividades mineiras, é que o Brasil conheceria o surgimento de um incipiente mercado interno. Para as vilas e cidades próximas aos garimpos passaram a afluir produtos de outras regiões, criando-se a base do que viria a ser uma economia nacional. Mas as minas eram também regidas de fora, o que impediu que delas saíssem impulsos para as atividades manufatureiras, pois o seu controle e de toda a economia da colônia ficava em Lisboa, e Portugal havia renunciado, no início do século XVIII, à industrialização. Após a independência, a demanda externa continuou a condicionar a estrutura e o desempenho de nossa economia. Quem não produzia para exportar, produzia para o seu próprio sustento e para alguns poucos vizinhos. O quadro modificar-se-ia, porém, com o café, cuja comercialização estava, em geral, nas mãos dos que o cultivavam, e com a substituição da escravatura pelo trabalho assalariado. Criou-se então, no leste e sul do Brasil, uma massa de consumidores e uma verdadeira economia de mercado interno. E pela primeira vez, as decisões econômicas passaram a ser tomadas dentro do país, com o governo a controlar a oferta internacional do café e a amparar a industrialização. Ninguém mais pensava com seriedade que o Brasil devesse os seus problemas a defeitos de origem em sua terra ou na conformação de seu povo. Nosso atraso e nossas disparidades de desenvolvimento regional - deixava claro Celso Furtado - encontravam explicação na história de nossa economia. Os remédios, muitos dos quais já vinham sendo aplicados, tinham de ser, por isso mesmo, de natureza econômica. Entre eles, o do fortalecimento e ampliação do 21 mercado interno, o que dependia de se corrigirem as grandes desigualdades entre as regiões mais atrasadas, como o Nordeste, e as mais adiantadas como o Sul. A ligá-Ias pelo interior, os sertões. Que adquiriam uma outra imagem, distinta e até inversa à de Euclides da Cunha. Pois Miguilim, ao pôr os óculos pela primeira vez, descobrira que a paisagem ao derredor era bela, era mais que bela, era belíssima. Agora, não apenas ele, mas todos nós sabíamos. Como aprendêramos, com Soropita e Doralda, que a pobreza não impede os dias e as noites de mel e alegria. O sertão era terrível, mas era o nosso sertão, o de nossas navegações, o de nossa aventura, nossa, pois éramos Diadorim e Riobaldo. Guimarães Rosa, em Corpo de baile (1956) e Grande sertão: veredas (1956), nos convencia de que nada tínhamos a invejar dos antigos gregos, porque os heróis estavam aqui, de olhos abertos para os mistérios e o esplendor do mundo. E não só nos sertões, mas também nos pampas e nas coxilhas, pois recebiam a mesma graça de convívio com o deslumbramento e o trágico os habitantes do primeiro volume de O tempo e o vento (1949-1962), de Érico Veríssimo. Não mereciam o desânimo o país que nos fora dado nem o povo de que éramos parte. E disso nos tornávamos mais conscientes à medida que avançávamos no levantamento e na análise de tudo o que tínhamos feito no correr da história. A partir do século XVIII, havíamos desenvolvido uma literatura com feição e cânones próprios, uma literatura visceralmente nacional - como acentuava Antonio Candido em Formação da literatura brasileira (1959) -, e passáramos a julgar o que líamos pelo metro de nossa tradição e de seus valores. E o mesmo se passava em outros campos da criação artística e da investigação intelectual. O Aleijadinho, contudo, não justificava a escravidão. E do alto de seus cavalos, Medeiro Vaz e Joca Ramiro punham o olhar sobre crianças nuas e mulheres maltrapilhas. Para o leitor urbano de classe média, uma grande parte de nossa gente vivia como as personagens de Morte e vida severina (1965), de João Cabral de MeIo Neto, e mais parecia servir de exemplo para as teses de Geografia 22 da fome (1942) Josué de Castro punha a maior parte do país num círculo vicioso: a pobreza extrema e a subalimentação dela decorrente, por carência de comida ou hábitos de nutrição desenvolvidos na penúria, impediam o crescimento econômico, e a ausência deste perpetuava a fome. Havia que romper em algum ponto o círculo, mas essa não era a prioridade dos que, como estamento dominante e, depois, como classe, se tinham, ao longo da história, apoderado política e patrimonialmente do país. "Donos da vida", chamava-Ihes Mário de Andrade; Donos do poder (1958) seria o título do livro em que Raymundo Faoro lhes estudou a história, as técnicas de mandonismo e as astúcias de perpetuação hegemônica. Essa minoria comportava-se como se a nação começasse e terminasse nela, ignorando ou menoscabando o resto do país. Não podia ser de outra forma - argumentava Florestan Fernandes -, pois o passado escravista, com toda a sua violência, não nos dissera adeus. O negro continuava à margem do corpo social e a ter de render-se aos valores do branco para em seu universo, a duras penas, ingressar (O negro no mundo dos brancos, 1972). Eram também cidadãos de segunda, o índio, os mestiços e o branco encardido, porque pobre. A iniqüidade permeava a vida brasileira. O Brasil - argumentava no ensaio introdutório da segunda edição de Mudanças sociais no Brasil (1974) e em A revolução burguesa no Brasil (1974) – transitara do regime colonial ao capitalismo sem romper a situação e dependência. Eram os interesses externos, das potências dominantes, que e determinavam as decisões nacionais. Instalados no próprio país, esses interesses cooptaram a antiga oligarquia agrária e a nova burguesia urbana, que, por sua vez, já se haviam sucessivamente entendido, aliado e fundido. Estávamos condenados a essa subordinação, e ao atraso e à injustiça social que trazia jungidos, a menos que conseguíssemos o feito de - para usar a imagem de Carlos Drummond de Andrade - "dinamitar a ilha de Manhattan". Pois, sem a quebra do sistema 23 capitalista internacional, a situação de dependência ver-se-ia sempre renovada e revigorada. Enquanto empilhava os novos volumes que iam sendo publicados sobre o Brasil, à lembrança de nosso leitor voltaram os determinismos e os vaticínios do início do século. Também eles vinham investidos de prestígio intelectual. Não seria de afastar-se, por isso, que muitas das análisese conclusões fundadas nas ciências sociais de nosso tempo acabassem por revelar - se igualmente abstratas, eurocêntricas e redutoras da realidade a esquemas mentais preconcebidos. Pelas páginas cheias de categorias analíticas de numerosos desses livros, só de raro em raro passavam seres humanos. Parecia estranho, por exemplo, o não se topar um único escravo ou senhor de escravo, a não ser como idéia ou como número, numa obra sobre a escravidão. Em outras, porém, estavam a espiar, meio escondidos no canto de uma construção teórica, ou a nos olhar de frente, bem no meio da página, os Caxias, os malandros e os renunciadores que Roberto DAMATTA encontrou a servir de parâmetros para o brasileiro. Em carnavais, malandros e heróis (1979), ele convocava a nossa atenção para as paradas militares, os desfiles de escola de samba e as procissões, a fim de melhor ressaltar um dia-a-dia dividido entre a casa e a rua, um cotidiano no qual permanentemente conflitam e se combinam uma ideologia igualitária e as estruturas hierarquizantes de nossa sociedade, cada um tem e sabe o seu lugar. Mas onde, em compensação, o filho de uma liberta com um marujo pode transformar-se, para os seus descendentes, em um sir inglês, como aquele personagem de João Ubaldo Ribeiro, em Viva o povo brasileiro (1984). Quem nos olhava no meio da página podia ser um brancoso louro. Ou um preto. Ou um nisei. Ou um bugre de gravata. Ou um mulato, um cafuzo, um curiboca, um pardo, um melado. Ou uma dessas mesclas de bisavós libaneses, bávaros, normandos, canelas, galegos, transmontanos, beirões, fons e sefardins, que fazem um brasileiro. Qualquer funcionário de imigração sabe, aliás, disto: não há tipo humano que não caiba num passaporte do Brasil. Pois o brasileiro é, antes de mais nada, um mestiço - e Darci Ribeiro, sobretudo em O povo brasileiro 24 (1995), retomou, com desbordante entusiasmo, essa tese por alguns esquecida. Nascemos do que ele chamou de "ninguendade": o mameluco não era português, como o pai, nem índio, como a mãe, e o mulato não era europeu nem africano, e, por não serem uma coisa nem outra, tornaram-se os primeiros brasileiros. A mestiçagem foi e continua a ser o nosso processo de fazimento: é por meio dela que nos construímos, que vamos, a partir da matriz latina, ibérica e lusitana, formando com as diferenças dos povos uma nação. Nossa aventura histórica é, por isso, singular. Por isso e por realizar-se nos trópicos, ela é inteiramente nova. E "melhor, porque tem mais humanidade incorporada". Se nossas classes dominantes se revelam infecundas, o mesmo não se passa com o povo, no seu processo de autocriação. E é com essa vantagem de sermos mestiços que vamos chegar ao futuro. Foi, aliás, em busca do futuro que passamos todo um século a indagar quem somos, e o que queremos ser, e a projetar imagens de nós mesmos, espelho contra espelho. A cada sístole e diástole desses cem anos corresponderam visões otimistas e pessimistas, barrocas e contidas, esperançosas e desalentadas. Pois cada momento - o da Belle Époque, o da Revolução de 30, o do Estado Novo, o da redemocratização, o do dia seguinte ao suicídio de Getúlio Vargas, o do desenvolvimentismo dos anos 50, o do regime militar e o da segunda redemocratização - refez o retrato do Brasil. Mudou, ao longo do tempo, a linguagem com que nos descrevemos. E mudou também o país sobre o qual se dissertava. Lidos um após outro, os nossos evangelistas soam dissonantes, mas, juntos, se corrigem ou polifonicamente se completam. Assim talvez venha a pensar um certo brasileiro, ao concluir a leitura destas páginas, na primeira manhã de 2001. 25 Bibliografia selecionada ABREU, Capistrano de. Capítulos de história colonial. Rio de Janeiro: M. Orosco, 1907. ____________________Rã-txa-hu-ni-ku-i ou a língua dos caxinauás. Rio de Janeiro: Leuzinger,1914. Amorim, Antônio Brandão de. 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Ufanismo desalento -estereótipos racistas, considerando ao atraso, á barbárie, á pobreza; -contrapondo-se, a visão de que o sertanejo, ao bandeirante, ao vaqueiro, ao desbravador; - a análise de que os problemas brasileiros não são da raça mas da cultura e que, tais problemas decorrem da ganância da metrópole, desacertos das elites, organização desastrada do Estado e da produção. Revolta de Canudos 1920/1940 O Brasil na América. Sítio do pica-pau amarelo, cantadores, lendas em nhengatu e português Macunaíma, Grande & Senzala, Vaqueiros e, Cantadores, Raizes do Brasil, Estudos, Evolução Política do, Brasil, Formação do Brasil Contemporâneo. Manuel Bonfim, Monteiro Lobato Leonardo Mota Antonio Brandão de Amorim Mário de Andrade Gilberto Freire Câmara Cascudo Sérgio Buarque De Holanda Tristão de Ataíde Caio Prado Junior -Aprofundamento da visão de que o Brasil será o resultado do esforço individual e coletivo do seu povo, independendo da sua raça; -revelação e revalorização do passado brasileiro das artes: o barroco mineiro, as cavalhadas, os fandangos, o maracatu, as máscaras dos ticuna, os santos de nó de pau. - busca de uma identidade nacional no campo das artes, com ápice na semana de arte moderna de 22. Semana de Arte Moderna Revolução de 30 Estado Novo 31 PERÍODO OBRAS AUTORES Retratos do Brasil Fato Histórico (importante no Período) 1920/1940 Pág. anterior Pág. anterior -inicio da mudança da imagem que o brasileiro fazia de si mesmo: o brasileiro é um somatório de culturas; 1940/1960 Introdução á Antropologia Brasileira, contos tradicionais do Brasil, Geografia dos mitos Brasileiros, a cultura Brasileira, uma interpretação da literatura Brasileira, Bandeirantes e pioneiros, Formação Econômica do Brasil, Grande Sertão: Veredas, Geografia da fome, Donos do Poder, Gato Preto em campo de neve, A volta do Gato Preto, Formação da Literatura Brasileira. Artur Ramos, Câmara Cascudo Fernando Azevedo Viana Moog Celso Furtado Guimarães Rosa Josué de Castro Raymundo Faoro Érico Veríssimo Antônio Cândido -Continuidade da revisão do que o brasileiro pensa sobre o Brasil (defende-se a idéia de que o brasileiro ame o Brasil como ele é e não como simulacro de outros países); -Predominância dos valores afetivos sobre os da razão coletiva geram o compadrismo, considerado uma das razões do atraso brasileiro; -a guerra acentua a percepção de nossas carências e o inicio da industrialização continua a modificação do modo de viver dos brasileiros, que busca abandonar a vida sem pressa; -Criação artística brasileira se fortalece e se identifica com nossa realidade. Guerra de 1939 a 1945 Inicio da industrialização Desenvolvimento dos anos 50 Suicídio de Getúlio Vargas Juscelino Kubichek 1960/1980 Morte e Vida Severina, O Negro no Mundo dos Brancos, A revolução Burguesa no Brasil, Carnavais, Malandros e Heróis, O tempo e o vento. João Cabral de Melo Neto Florestan Fernandes Roberto Damatta Èrico Veríssimo -Retorna a questão do ciclo vicioso: a pobreza extrema do povo brasileiro impede o crescimento econômico e a ausência deste perpetua a miséria, a fome -Retorna a tese de que somos um povo mestiço e é com esta característica que estamos construindo o Brasil Regime Militar 1980/2000 Viva o povo Brasileiro, O povo Brasileiro. Ubaldo Ribeiro Darcy Ribeiro -Fortalecimento do entusiasmo de sermos um povo mestiço, construtores de uma aventura história singular “se nossas classes dominantes se revelam infecundas, o mesmo não se passa com o povo no seu processo de autocriação. E é com essa vantagem de sermos mestiços que vamos chegar ao futuro.” Segunda Redemocratização Ao longo desses 100 anos tivemos, de nós mesmo, “visões otimista e pessimista, barrocas e contidas, esperançosa e desalentadas”.
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