Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
ASPECTOS DIFICULTADORES DO BLOQUEIO DE TELEFONES CELULARES EM PRESÍDIOS BRASILEIROS Luciano Pereira dos Santos1 Eduardo Tagliaferro2 RESUMO Este artigo tem por finalidade trazer o debate sobre o tema controverso e polêmico acerca do uso de aparelhos celulares pelos detentos inseridos no sistema prisional brasileiro. Ainda que não se trate de um tema necessariamente novo, haja vista que a utilização de aparelhos celulares no interior dos presídios é uma prática notoriamente conhecida há pelo menos uma década, trata-se de uma problemática que permanece sem soluções claras e muito menos objetivas. O recorte de pesquisa terá como ponto fulcral, a viabilidade ou não da instalação de aparelhos bloqueadores de sinal de telefonia celular. Para esta pesquisa foi usado o material de literatura livre existente na internet brasileira e as pesquisas bibliográficas, trazendo a doutrina e sua forma de entendimento. No que tange ao aspecto jurídico trataremos da Lei 11.466/07 em vigor atualmente e a sua abrangência. Palavras-chave: Bloqueadores. Detentos. Presídios .Celulares. ABSTRACT This article aims to bring the debate on the controversial and controversial theme about the use of cell phones by inmates inserted in the Brazilian prison system. Although this is not necessarily a new issue, given that the use of cellular devices inside prisons has been a well- known practice for at least a decade, but it is a problem that remains without clear and much less objective solutions. The research section will have as its central point, the feasibility or not of the installation of cell phone signal blocking devices. For this research, the material of free literature existing in the Brazilian Internet and bibliographic research were used, bringing the doctrine and its form of understanding. With regard to the legal aspect we will deal with Law 11.466/07 in force today and its scope. KEYWORDS: Blockers. Prisoners. Prisons. Cell Phones. 1 Luciano Pereira dos Santos é bacharelando do 4º semestre no curso de Direito da Faculdade do Guarujá. 2 Eduardo Tagliaferro é professor universitário, Pós-graduado em Direito Penal e Direito Processual Penal e mestrando em Direito Internacional. 1. INTRODUÇÃO A entrada de celular e outros aparelhos similares nos estabelecimentos penais brasileiros tem sido sem dúvida, um dos mais graves e complexos problemas que desafiam a Administração Penitenciária de todas as unidades da federação. Podendo variar de acordo com o comportamento social ou uma determinada região do País. No tocando as mudança no judiciário não ocorre na velocidade que se imagina pela à legislação em vigor, nessa direção o artigo 2º da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro – LINDB, que diz em seu caput que “Não se destinando à vigência temporária, a lei terá vigor até que outra à modifique ou revogue”. Hoje em dia vive-se um período altamente tecnológico, o qual proporciona facilidades que jamais existiram antes e uma das grandes invenções da humanidade foi a telefonia, que viabilizou a aproximação das pessoas, encurtando cada vez mais tais distâncias. Mesmo atualmente, estes aparelhos continuam a se modernizar, em tamanho, em funcionalidade, em formas de utilização e, com o advento da internet, o seu uso passou a ser massivo e permanente. A utilização de tecnologia possui pelo menos duas facetas, se de um lado traz conforto aos que a utilizam de forma tradicional, por outro há sua utilização para fins menos ortodoxos. A cada dia a mídia noticia fatos praticados por detentos, que de posse desses aparelhos, praticam crimes, comandam organizações criminosas inteiras, criam e perpetram diariamente dezenas de golpes contra a sociedade que lá os mantém, acreditando que estes presos passam por um processo de ressocialização. É juridicamente inaceitável que de dentro do confinamento se possa ter acesso a estes aparelhos, agora na forma portátil e a outras espécies de tecnologia como o caso da própria internet. Os detentos inseridos no sistema prisional brasileiro possuem acesso na aquisição desses aparelhos que resta demostrado frequentemente, quando da ocorrência de revistas nas celas das casas de custódias, presídios e delegacias em todo o país. Mas como esses aparelhos adentram os presídios? As respostas para esta pergunta são as mais variáveis possíveis, é notória a criatividade nas situações de transposição desses aparelhos para dentro das instalações prisionais, seja por meio de parentes, cônjuges, dentro de objetos, comidas, ou mesmo arremessados de fora para dentro. Já houve relato até de entrega via aérea realizada por intermédio de drones3. 3 Drones são veículo aéreo não tripulado, ou seja, é um tipo de aeronave que controlado remotamente. Vale lembrar também que algumas vezes os próprios agentes que desempenham funções públicas na carceragem dessas unidades são os responsáveis pela introdução dos aparelhos telefônicos moveis nas unidades prisionais, seja em razão de obtenção de vantagem financeira indevida ou graves ameaças a familiares mais próximos. Diante deste quadro, esta pesquisa bibliográfica, busca evidenciar as alternativas que o poder público vem buscando para combater a entrada de celulares nos presídios brasileiros. Assim, a discussão discorre sobre projetos e entendimentos por parte dos órgãos judiciários e legislativos deste País, acerca de ações que dificultam ou até inviabilizam este tipo de transgressão. 2. A EVOLUÇÃO TECNOLÓGICA E SEUS EFEITOS DENTRO DOS PRESÍDIOS O avanço tecnológico tem sido cada vez mais amplo e contínuo, e isso vem se tornando a cada nova etapa, um desafio para todos os desenvolvedores, principalmente porque surgem pressões políticas e econômicas para que o Estado também possa se beneficiar dessas ou de tecnologia similares para empregar no uso do controle social, vigilância e punição, incorporando-as as tarefas cotidianas. No contexto em que o tema é inserido na maior parte das vezes, o bloqueio de sinal de telefonia celular dentro das velhas ou das novas unidades prisionais, refletem praticamente uma obrigação estatal no que tange a incorporação dessa tecnologia nos territórios onde ficam localizadas as prisões brasileiras. O Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu em 2016, que os Estados não podem obrigar as mantenedoras a instalar bloqueadores de aparelhos de sinal de telefonia celular nas penitenciárias. A ausência de uma regulamentação sobre o assunto provocou a deliberação por parte do Supremo Tribunal Federal (STF), o qual decidiu que as leis estaduais que determinaram a instalação de equipamentos para bloquear sinal de celular em presídios são inconstitucionais. Através da Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 3.835 movida pela ACEL (Associação Nacional das Operadores de Celular), na qual a entidade defendia que a regulamentação sobre telecomunicações é de competência da União e, portanto, não caberia aos Estados decidir sobre bloqueio de aparelhos celulares. A ação foi proposta contra quatro Estados: Mato Grosso do Sul, Paraná, Santa Catarina e Bahia. É uma unanimidade por parte das autoridades de segurança, que é preciso encontrar uma solução para o bloqueio de celulares nas penitenciárias, isso, na prática, não será uma tarefa fácil, tendo em vista que o sinal de um aparelho móvel de telefonia celular é o mesmo que os cidadãos têm acesso no seu dia a dia para o seu conforto e tarefas diárias. Dessa forma, o referido bloqueio acabaria afetando qualquer tipo de comunicação via rádio, ou seja, como não é possível delimitar exatamente a parte da área de cobertura que será atingida, se torna muito complexo realizar o bloqueio sem interferir nas ligações de pessoas ou residências próximas dos presídios.Na prática para que isso ocorra seria necessário desligar o sinal da estação rádio base da operadora de telefonia próxima ao presídio (TADEU, 2017). No que tange ao aspecto econômico, o custo para bloqueio de aparelho móvel em uma penitenciaria é elevado, tendo em vista a necessidade de realizar o bloqueio de nove faixas de frequência para que a interrupção de sinal seja efetiva, sem falar das estações bases das operadoras de telefonia. Assim, o bloqueador teria que atingir os serviços de rádio, de telefonia móvel por satélite e as redes sem fio de comunicação de dados, o que encarece ainda mais a sua implantação (TADEU, 2017). Vale ainda ressaltar que atualmente as unidades prisionais representam muito mais do que um instrumento correcional da justiça criminal quando erigidas, neste sentido, tais estabelecimentos carcerários representam um instrumento com o fito de potencializar o crescimento do território econômico nos pequenos municípios e regiões do interior do País, ou seja, quando ocorre a construção de novas unidades carcerárias nestes municípios, todo um circuito de pequenos negócios tira proveito dessa ocorrência, essas modificações econômicas na estrutura demográfica do local têm aumentado o fluxo de pessoas também, que são componentes primordiais dessa situação alimentada pela economia prisional. Um exemplo do supracitado fenômeno pode ser verificado por meio do surgimento da Penitenciária I "Dr. Geraldo de Andrade Vieira", localizada no Município de São Vicente, inaugurada às margens da Rodovia Padre Manoel da Nóbrega (Km 66) em 29/04/1977, com capacidade para 1.048 presos (Secretaria de Adm. Penitenciária – SAP/SP). Às margens da mesma Rodovia, nasceu, poucos anos depois, o bairro do Humaitá, localizado nas proximidades do presídio, o qual, de acordo com o censo realizado no ano de 2010 contava com 13.586 habitantes, número esse provavelmente defasado ante o decurso dos últimos dez anos (IBGE). O referido fenômeno demonstra que, seja em razão dos familiares de presos, ou criação de comércios voltados ao abastecimento de tais unidades ou até mesmo funcionários dessas unidades prisionais, os quais optam por estabelecer suas residências em locais próximos do respectivo local de trabalho, é certo que a criação de um estabelecimento prisional gera impactos demográficos não somente dentro, mas também no entorno da unidade. 3. A LEI 11.466/07 E SEUS IMPACTOS NOS PRESÍDIOS BRASILEIROS Em maio de 2006 a cidade de São Paulo e outras cidades de grande porte do Estado de São Paulo, interior e litoral, foram cenário da maior onda de rebelião já orquestrada de dentro do sistema penitenciário brasileiro, dentre os resultados ocorridos, podemos citar a sensação de medo que dominou toda a sociedade, trazendo para o cotidiano o pavor vivido por essas pessoas nessas grandes cidades. Em contrapartida os governantes se viram na obrigação de dar uma resposta à altura a esses fatos até então inéditos. Dentro do processo investigatório se percebeu que os aparelhos de telefonia móvel foram de suma importância para o sincronismo da cadeia de comando hierárquico daquela facção a qual se intitulava como dominadora dos presídios paulistas. De posse dessas informações cruciais para a investigação o poder público então definiu suas linhas de atuação pela via legislativa: [...] começando por introduzir no Código Penal o art. 319A, que trouxe a previsão do delito de omissão do dever de vedar ao preso o acesso a aparelhos de comunicação. Por conta, principalmente, de sua localização no Código Penal, logo em seguida ao crime de prevaricação (art. 319), o delito em pauta ficou conhecido como prevaricação imprópria. (GOMES, 2008) Dentre outras tratativas para coibir a entrada desses aparelhos móveis e qualquer outro meio de comunicação nos estabelecimentos prisionais, a Lei 11.466/07 instituiu o delito e criou uma nova hipótese dentro da Lei de Execuções Penal – LEP, que traz na tipificação do artigo 50 a previsão de que comete falta grave o condenado à pena privativa de liberdade que, tiver em sua posse, utilizar ou fornecer aparelho telefônico, de rádio ou similar, que permita a comunicação com outros presos ou com o ambiente externo, definidos aqui claramente por meio do seu inciso VII. Apesar da facilidade de incriminar o agente público facilitador do acesso a estes aparelhos por parte dos presos, faltava ainda criar uma forma de intimidar ou até mesmo incriminar as condutas de agentes que não fazem parte dos quadros da Administração Pública, mas que também facilitam ou favorecem a entrada dos aparelhos no ambiente prisional, haja vista que até então as medidas tímidas tomadas pelos governantes não foram suficientes, visto que ainda a entrada dos aparelhos continuava elevada nas instituições prisionais. Somente em agosto de 2009, cerca de dois anos após a ação orquestrada pela maior facção criminosa do Estado de São Paulo, entrou em vigor a Lei 12.012 introduzindo a conduta tipificada no Código Penal através do art. 349A, que prescreve em seu texto “Ingressar, promover, intermediar, auxiliar ou facilitar a entrada de aparelho telefônico de comunicação móvel, de rádio ou similar, sem autorização legal, em estabelecimento prisional”. Caso o aparelho móvel inserido no sistema prisional esteja quebrado e considerado inapto para o fim a que se destina, o fato será atípico, já que o tipo penal exige que o aparelho “permita a comunicação com outros presos ou com o ambiente externo”4 (GRECO, 2010). Da mesma forma se o estabelecimento possuir equipamento que impossibilite o seu funcionamento por completo, também será a conduta atípica, por não ser possível por meio dele, nas circunstâncias fáticas, a comunicação apontada no art. 319A, destacamos que a impossibilidade de uso do aparelho deverá ser completa, do contrário permanecerá configurado o delito. (SANCHEZ, ALEXANDRE ALBERTO GONÇALVES DA SILVA, 2008) A apuração de competência para consolidar a prevaricação é do Juizado Especial Criminal, já que a pena é inferior a dois anos de prisão, tendo o fato ocorrido em presídios estaduais, então a apuração dar-se-á a Justiça Estadual, somente será de competência da Justiça Federal se for praticado em presídios federais. Apesar de não estar expressamente prevista na norma é necessário que os aparelhos estejam aptos a comunicação com outros presos e com o ambiente exterior conforme citado anteriormente para a tipicidade do crime no caso concreto, somente assim se configurando apenas a lesão ao bem jurídico tutelado (NUCCI, 2007). 4. PROJETOS DE LEI PARA BLOQUEIO DE SINAL DE TELECOMUNICAÇÕES A cada ano o legislativo brasileiro se debruça a analisar projetos de lei de iniciativa do Senado e da Câmara dos Deputados, sempre com a intenção de alterar ou criar novas normas para que as operadoras de telefonia celular, possam ter o amparo legal e a obrigação de 4 Em sentido similar (GRECO, 2010) implantação e custeio de bloqueadores em presídios brasileiros, como o texto redigido pelo Senador Wilder Morais (PP/GO) que pretende alterar a Lei nº 10.792, de 1º de dezembro de 2003, a qual modifica a Lei nº 7.210, de 11 de junho de 1984 - Lei de Execução Penal, o Decreto-Lei nº 3.689, de 3 de outubro de 1941 - Código de Processo Penal e dá outras providências, e o Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 – Código Penal, tendo como objetivo a determinação para que as operadoras de serviços de comunicações, possam adotar medidas para restringir o total acesso as suas redes nos estabelecimentos penitenciários, ou em qualquer local onde tenha o acesso restrito por leis. (Senado Federal - Atividade Legisltiva, 2017) A motivação do Senador para justificar a emenda se volta a restrição de acesso às redes em estabelecimentos penitenciários, a qual poderá ser efetuada por meiode bloqueadores de sinais de radiocomunicações ou de outras soluções tecnológicas equivalentes. O projeto de lei prevê ainda a detenção de 3 meses a 1 ano para o preso que receber, possuir ou fazer uso de aparelho telefônico, de rádio ou similar, que permita a comunicação com outros presos ou com o ambiente externo fora das hipóteses já admitidas em lei. O projeto foi enviado à CCJ - Comissão de Constituição e Justiça5 em agosto de 2019 e está aguardando o parecer da relatoria do Senador Alessandro Vieira (Senado Federal - Atividade Legisltiva, 2017). No ano de 2018 também foi submetido ao exame do Plenário do Senado Federal, em substituição à CCT - Comissão de Ciência, Tecnologia, Inovação, Comunicação e Informática6 e à CCJ - Comissão de Constituição e Justiça sobre o Projeto de Lei do Senado (PLS) nº 32, de 2018 do Senador Eunício Oliveira, que institui a obrigatoriedade da instalação, em 180 dias, de bloqueadores de sinais de telecomunicação para telefones celulares e estabelece a aplicação dos recursos do FUNPEN7 na instalação, custeio e manutenção do bloqueio de sinais de telecomunicação para telefones celulares, radiotransmissores e outros meios, em estabelecimentos penitenciários e análogos. 5 A Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJ) tem como principal objetivo a discussão dos aspectos constitucionais, legais e jurídicos de Propostas de Emenda à Constituição (PEC) que, posteriormente, passarão pela Câmara dos Deputados. 6 A Comissão de Ciência, Tecnologia, Inovação, Comunicação e Informática é uma comissão permanente da atividade legislativa do Senado Federal do Brasil, formada por 17 senadores e 17 suplentes 7 O Fundo Penitenciário Nacional foi criado pela Lei Complementar nº 79, de 7 de janeiro de 1994, instituído no âmbito do Ministério da Justiça e Segurança Pública, gerido pelo Departamento Penitenciário Nacional - DEPEN, com a finalidade de proporcionar recursos e meios para financiar e apoiar as atividades e os programas de modernização e aprimoramento do sistema penitenciário nacional. O projeto visa incluir o inciso XVIII no artigo 3º da Lei Complementar nº 79, de 7 de janeiro de 1994, para prever expressamente a destinação de recursos do Fundo Penitenciário Nacional para a instalação, custeio e manutenção do bloqueio de sinais de telecomunicação para telefones celulares, radiotransmissores e outros meios, em estabelecimentos penitenciários, unidades de internação e outros análogos do sistema penitenciário nacional. 5. A VISÃO DO STF ACERCA DA CONCESSÃO DOS SERVIÇOS PÚBLICOS DAS TELECOMUNICAÇÕES Em agosto de 2016 o Supremo Tribunal Federal considerou que são inconstitucionais leis estaduais que determinam o bloqueio do sinal de telefones celulares em áreas próximas aos presídios. Por 8 votos a 3, os ministros definiram que apenas a União pode legislar sobre o tema. Em sua maioria o Supremo entendeu que as leis estaduais representam uma invasão de competência privativa da União por legislar sobre a concessão ou autorização de serviços de telecomunicações. Para os ministros, as empresas de telefonia não podem ser obrigadas a gastar mais por causa de leis estaduais, uma vez que são criadas obrigações que não estavam previstas nos contratos de concessão de serviço público firmados pelas operadoras (ADIN nº 3.835). 6. CONSIDERAÇÕES FINAIS Diante de todo o exposto, resta evidenciada a existência de um conflito existente entre o poder público e os interesses econômicos por parte das operadoras de telefonia móvel. Tais conflitos passam a ser desvelados, na medida em que os governos estaduais buscam de alguma forma regulamentar um meio eficaz para a inutilização dos aparelhos celulares inseridos no sistema prisional, porém, encontram resistência por parte das empresas concessionárias de serviços de telefonia móvel no país. Tais interesses econômicos podem ser verificados sob dois aspectos distintos apresentados ao longo da pesquisa realizada. O primeiro diz respeito a ausência de interesse por parte das operadoras de telefonia móvel em realizar o bloqueio de sinal, haja vista que, conforme demonstrado, a tecnologia existente atualmente é insuficiente para limitar a área de atuação da interferência do sinal telemático, o que pode acabar por afetar os usuários que se encontram ou até mesmo residem em áreas próximas aos estabelecimentos prisionais que iriam realizar o bloqueio do referido sinal. Ademais, resta evidente que qualquer movimento no sentido de restringir o sinal telemático representaria um retrocesso a toda e qualquer operadora de serviços dessa natureza, haja vista que o movimento empregado por tais companhias se dá justamente no sentido de ampliação da área de cobertura do serviço, com a finalidade de atrair um número cada vez maior de clientes, aumentando assim, a sua margem de lucros e dividendos. É certo ainda que, de forma geral, a maior parte das populações que residem no entorno de unidades prisionais ocupam áreas periféricas dos seus respectivos municípios e que poderiam ser diretamente afetados ante ao fato de que tais regiões não possuem serviços telemáticos providos por intermédio de cabeamento, dependendo somente do sinal das operadoras de telefonia móvel. Nesse contexto, caso o bloqueio de sinal interfira nas comunicações das populações periféricas, a sociedade sofreria ainda mais com um aumento cada vez maior na desigualdade social, haja vista que o acesso a rede mundial de computadores tornou-se indispensável, até mesmo no que tange ao acesso à educação, fato esse que restou evidenciado com a pandemia da Covid-19 no presente ano e que colocou todos os alunos de redes públicas e particulares em isolamento social, com atividades escolares realizadas de maneira remota e por meio da internet. Um segundo aspecto importante, percebido ao longo da pesquisa, é a questão relativa ao custo das operações, as quais teriam a incumbência, não somente em adquirir os aparelhos bloqueadores de sinal, mas também em realizar as suas respectivas instalações e ainda, realizar a sua manutenção periodicamente. É certo que os Estados desejam que a supramencionada operação, seja custeada de forma exclusiva por parte das companhias concessionárias do serviço de telefonia móvel, o que representaria não somente uma grande economia aos entes federativos, mas também a desnecessidade acerca da criação de processos voltados à licitações de serviços de compra, instalação e manutenção, processo esse um tanto quanto complexo sob o ponto de vista administrativo e que por sua vez poderão ser descontinuados de acordo com a mudança dos mandatos eletivos, trazendo um prejuízo de grande monta ao erário. Por sua vez, de acordo com o entendimento da Suprema Corte brasileira, as empresas concessionárias de serviços telemáticos não podem ser compelidas, por meio de leis estaduais a realizar gastos não previstos nos contratos de concessão de serviço público firmados entre as operadoras e a União. Dessa forma, percebe-se que não há somente uma questão de boa vontade ou boa-fé por parte da administração pública em relação à instalação dos respectivos aparelhos bloqueadores de sinal, mas sim toda uma gama de interesses que extrapolam até mesmo os interesses dos Estados e das operadoras, atingindo também o direito de acesso à comunicação, seja ela pela via telefônica ou informática, das populações que residem em regiões que são periféricas, porém, próximas aos locais onde esse sinal estaria prejudicado. REFERÊNCIAS ADIN – Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 3.835, proposta pela ACEL - Associação Nacional das Operadores de Celular. Disponível em: https://direitodiario.jusbrasil.com.br/artigos/381673874/por-que-o-stf-declarou- inconstitucional-lei-estadual-que-versava-sobre-bloqueadores-de-sinal-de-celular-em-presidioBRASIL. Lei 11.466 de 28 de março de 2007. Altera a Lei nº 7.210/84 – Lei de Execução Penal e o Decreto-Lei nº 2.848 de 07 de dezembro de 1940 – Código Penal. GOMES, R. S. C. Direito Penal: Parte Especial. São Paulo: Juspodivm, v. 3, 2008. GRECO, R. Direito Penal. In: GRECO, R. Curso de Direito Penal: Parte Especial. Rio de Janeiro: Impectus, v. 4, 2010. p. 424. NASCIMENTO, S. Hoje em dia - Horizontes. Jornal Hoje em dia, 2019. Disponivel em: <https://www.hojeemdia.com.br/horizontes/presos-mineiros-pagam-at%C3%A9-r-12-mil- para-ter-um-celular-dentro-da-penitenci%C3%A1ria-1.722681>. Acesso em: 20 out. 2020. NUCCI, G. D. S. Código Penal Comentado. 7ª. ed. São Paulo: Revista dos tribunais, 2007. SANCHEZ, ALEXANDRE ALBERTO GONÇALVES DA SILVA. BLOQUEIO DE CELULARES EM PENITENCIÁRIAS: UM PARALELO ENTRE BRASIL E EUA. Revista da Faculdade de Direito de São Bernardo do Campo, São Bernado do Campo, n. 14, setembro 2008. SENADO Federal - Atividade Legisltiva. Senado Federal, 2017. Disponivel em: <https://www25.senado.leg.br/web/atividade/materias/-/materia/131369>. Acesso em: 15 out. 2020. TADEU, E. Computerworld | o porta-voz do mercado da tecnologia. Computerworld, 2017. Disponivel em: <https://computerworld.com.br/2017/01/06/entenda-como-e-feito-o-bloqueio- de-celular-e-por-que-os-presidios-estao-vulneraveis/>. Acesso em: 10 setembro 2020.
Compartilhar