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Colonialismo na África - a escravidão e o tráfico de escravos

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HISTÓRIA E 
CULTURA AFRICANA, 
AFRO-BRASILEIRA E 
INDÍGENA
Celiane Ferreira da Costa
Colonialismo na África:
a escravidão e o
tráfico de escravos
Objetivos de aprendizagem
Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados:
 Relacionar os diferentes tipos de escravidão que ocorreram na 
África.
 Analisar as relações entre a expansão marítima portuguesa e os 
con-tatos estabelecidos com o Reino do Congo.
 Discutir o papel do catolicismo no processo de colonização das 
di-ferentes regiões africanas.
Introdução
O ponto de partida da presença portuguesa na África foi a tomada de 
Ceuta, em 1415. A conquista desse importante entreposto comercial 
no norte do continente inaugurou uma série de viagens em busca do 
ouro africano e, mais tarde, das especiarias asiáticas. Nessas expedições 
marítimas, os portugueses descobriram o potencial do comércio de 
escravos africanos e deram início a outro longo e lucrativo negócio: o 
tráfico de escravos.
O escravo, por definição, é aquele que perdeu a liberdade ou que 
já nasceu sem ela. O escravo não é livre para escolher o seu trabalho, 
deslocar-se livremente e decidir sobre a sua vida. Logicamente, a condi-
ção do escravo variou de uma sociedade para outra e mesmo em uma 
mesma sociedade, dependendo deste ou daquele senhor. Mas, a rigor, 
a escravidão é o extremo da violência contra um indivíduo, pois retira 
dele a soberania sobre a sua própria vida.
A escravidão produziu sofrimento, mortes e um legado de preconceito 
difícil de superar. Porém, ela também promoveu encontros e trocas entre 
diversas sociedades e culturas, ocorridos tanto nos navios negreiros como 
nos espaços que os sujeitos escravizados encontraram fora da África.
Neste capítulo, você vai estudar dois tipos de escravidão que existiram 
na África antes da chegada dos portugueses: a escravidão doméstica e a 
escravidão islâmica. Você vai verificar também de que forma se deram os 
contatos entre os portugueses e o reino do Congo. A partir dessa relação, 
você vai analisar a influência do catolicismo no processo de colonização 
portuguesa no Congo.
A escravidão na África
A historiografi a ainda não chegou a um consenso sobre o surgimento da 
escravidão. Estudos referentes à Antiguidade Clássica revelam que gregos e 
romanos escravizavam os prisioneiros de guerra. Por sua vez, mesopotâmicos 
e egípcios contavam com escravos na base de suas pirâmides sociais.
Silva (2002) aponta que uma campanha militar do faraó Esneferu, realizada 
por volta de 2.680 a.C., retornou da Núbia com 7 mil prisioneiros, no que pode 
ser considerada uma bem-sucedida operação de captura de escravos. Portanto, 
as expedições militares egípcias à Núbia tinham entre os seus objetivos a 
captura de escravos. Silva (2002) avalia que durante 4 mil anos, cerca de 500 
escravos por ano eram traficados da Núbia para o Egito.
Veja o que afirma Souza (2003, p. 13):
Existe uma íntima conexão entre o fenômeno da escravidão e o continente 
africano, não apenas como um cenário das mais antigas regiões onde a es-
cravidão era habitual, mas como a principal fonte de escravos para o mundo 
islâmico, para a Índia e para as Américas.
Com a expansão marítima europeia, capitaneada por Portugal, a África 
passou a ser vista como o centro fornecedor de escravos para suprir a demanda 
de mão de obra na América. A partir dos séculos XV e XVI, o tráfico de es-
cravos realizado por meio do Oceano Atlântico foi responsável pela diáspora 
africana, o movimento de migração forçada mais intenso e volumoso de que 
se tem notícia. Durante quatro séculos, o tráfico de escravos foi responsável 
pelo deslocamento forçado de cerca de 11 milhões de africanos para a América, 
dos quais aproximadamente 4 milhões desembarcaram no Brasil.
Considerando a vasta extensão territorial da África, é correto afirmar que 
os escravos não eram tratados da mesma forma em todas as regiões. Da mesma 
forma, a escravidão desempenhou papéis diversos ao longo do continente. 
Ki-Zerbo (2010) defende que a escravidão possuía um papel marginal nas 
Colonialismo na África: a escravidão e o tráfico de escravos2
sociedades africanas, em que o escravo não era visto como uma propriedade 
do seu senhor. Já Silva (2002, p. 87) aponta que em determinadas regiões o 
escravo era tratado com rigor, sofria injúrias e castigos cruéis e era desprezado 
por ser “[...] preguiçoso, desasseado, curto de ideias, inepto e tonto [...]”.
O processo de escravização na África variava de acordo com a região, a 
cultura e o povo dominante. É preciso considerar o contexto histórico e as 
características de cada grupo ou povo. Para compreender melhor as formas 
de escravidão que se desenvolveram na África, aqui você vai estudar a escra-
vidão doméstica e a escravidão islâmica. A escravidão cristã, por sua vez, se 
relaciona à presença dos portugueses na África e será analisada na próxima 
seção. Na Figura 1, você pode ver o mapa político da África. Ele vai ajudar 
você a compreender melhor o conteúdo a seguir.
Figura 1. Mapa político da África.
Fonte: Guia Geográfico (2019, documento on-line).
3Colonialismo na África: a escravidão e o tráfico de escravos
Características e definições da escravidão em 
território Africano
De acordo com Albuquerque (2006), a organização social e econômica dos 
africanos girava em torno de vínculos de parentesco em famílias extensas, 
de espaços que eram coabitados por diferentes povos e da exploração de um 
povo por outro. A identidade de alguém se definia a partir da vinculação de 
parentesco com um grupo. “Isto quer dizer que o lugar social das pessoas 
era dado pelo seu grau de parentesco em relação ao patriarca ou à matriarca 
da linhagem familiar [...]” (ALBUQUERQUE, 2006, p. 13). Dessa relação 
de parentesco, surge a escravidão de linhagem ou linhageira, também 
conhecida como “escravidão doméstica”.
De acordo com Marzano (2013a), as sociedades linhageiras eram organizadas em 
torno da noção de linhagem. Um grupo de pessoas possuía uma única linha de 
descendência (patrilinear ou matrilinear), traçada a partir de um antepassado comum. 
Em uma mesma sociedade, podiam conviver diferentes linhagens, sendo as diferenças 
entre elas elementos essenciais para a definição do “lugar social” de cada um. Essas 
sociedades podiam ser organizadas em “reinos”, “impérios” ou simples aldeias sem 
poder político centralizado, onde os conflitos eram resolvidos por conselhos de anciãos.
Havia diversas formas de alguém se tornar escravo. A mais comum era 
sendo prisioneiro de guerra. Contudo, em muitas sociedades, a escravização 
era uma forma de punição por um crime cometido (roubo, assassinato e até 
adultério). Pessoas acusadas de feitiçaria também podiam ser escravizadas. 
Albuquerque (2006, p. 15) indica outras formas de se tornar escravo:
A penhora, o rapto individual, a troca e a compra eram outras maneiras de 
se tornar escravo. As pessoas podiam ser penhoradas como garantia para 
o pagamento de dívidas. Nesta situação, caso seus parentes saldassem o
débito, extinguia-se o cativeiro. Tais formas de aquisição de cativos foram
mais ou menos comuns em diferentes períodos e lugares da África. O rapto
e o ataque a vilas se tornaram mais frequentes quando o tráfico de escravos 
tomou grandes proporções.
Colonialismo na África: a escravidão e o tráfico de escravos4
A escravidão era vista também como uma estratégia de sobrevivência 
quando a fome e a seca assolavam um povo. Dessa forma, uma pessoa do grupo 
podia ser vendida ou trocada para garantir a sobrevivência dos demais. Essa 
forma de escravização era, no entanto, um recurso extremo, pois se tornar 
escravo numa sociedade estruturada por laços de parentesco era visto como 
uma desonra (ALBUQUERQUE, 2006).
Em comunidades pequenas, os escravos domésticos eram pouco numerosos 
e havia a preferência por mulheres e crianças. A posse desses escravos assegu-
rava prestígio a seus senhores. Considerando isso, a procriação das escravas 
era estimulada pelos senhores, que chegavam atomá-las como concubinas: 
“[...] assim o grupo podia crescer com o nascimento de escravos, fortalecendo 
as relações de parentesco e aumentando o número de subordinados ao senhor 
[...]” (ALBUQUERQUE, 2006, p. 14). A escravidão doméstica não era uti-
lizada apenas por pequenos grupos. Grandes reinos e impérios africanos se 
consolidaram explorando esse tipo de mão de obra para formar exércitos que 
poderiam garantir a dominação de povos vizinhos e a expansão do território.
A mão de obra dos escravos domésticos era normalmente usada na agri-
cultura familiar, para garantir o sustento de uma família ou de um grupo. Mas 
o uso do escravo doméstico podia variar de acordo com o interesse do senhor
em aumentar o seu poder político:
Nas sociedades linhageiras, a escravidão era fundamentada na relação ex-
tremamente pessoal entre senhor e escravo, da qual derivava toda a inserção 
social deste último. O escravo seria, basicamente, um dependente do senhor; 
até podia servir como mercadoria, podendo ser trocado ou vendido; até podia 
exercer atividades produtivas, como agricultor, mineiro, carregador, artesão, 
mas, em essência, era uma fonte de prestígio social e poder político para o 
seu senhor (MARZANO, 2013a, p. 143).
Vista como uma forma mais branda entre as modalidades de escravização 
africanas, a escravidão doméstica implica, contudo, as marcas de sofrimento 
que qualquer escravidão causa. Apesar de ter sido mais benévola do que a 
escravidão praticada no sul dos Estados Unidos e no Brasil, a escravidão 
doméstica não deve ser romantizada. Conforme alerta Silva (2002, p. 85), 
“[...] não devemos nos iludir com os eufemismos (o dono, por exemplo, ser 
chamado de ‘pai’, e o escravo, de ‘filho’) que dissimulavam, em várias 
regiões do continente, a dureza da realidade [...] Com a expansão do 
islamismo, a partir do século VII, os árabes ocupa-ram o Egito e o norte da 
África. A partir de então, a escravidão doméstica, 
5Colonialismo na África: a escravidão e o tráfico de escravos
praticada em pequena escala, passou a conviver com o intenso comércio de 
escravos. Segundo Albuquerque (2006), a ofensiva muçulmana transformou 
significativamente a escravidão na África, que passou a ser organizada e 
praticada como empreendimento comercial em grande escala. Os escravos 
africanos eram comercializados por toda a África, no mundo árabe e, a partir 
dos séculos XV e XVI, na América, como você vai ver adiante.
A escravidão islâmica
Nos anos que se seguiram à morte do profeta Maomé, em 632, o islamismo 
expandiu os seus domínios por quase todo o Oriente Médio e pela Ásia Menor; 
na África, dominou o Egito e os litorais do norte, até a Tunísia. Ainda no século 
VII, os muçulmanos “[...] acrescentariam o Afeganistão a seus domínios, ca-
minhariam para a Índia e se fariam senhores de quase todo o norte da África 
[...]” (SILVA, 2002, p. 31). Para os muçulmanos, a jihad (guerra santa) tinha 
como objetivo ampliar os territórios sob a lei divina, e a conversão dos povos 
infi éis fazia parte dessa expansão. Durante esse processo, os povos que não 
aceitavam a conversão podiam ser escravizados.
Acesse o link a seguir para verificar conceitos-chave para a compreensão do mundo 
muçulmano.
https://qrgo.page.link/T4iWr
A primeira área de expansão do islã fora da Ásia foi a região do Magreb, 
na África, que corresponde aos atuais Marrocos, Argélia, Tunísia e Líbia. Os 
berberes, do norte da África, foram um dos primeiros povos africanos a se 
converterem ao islamismo. As grandes caravanas que percorriam o deserto 
do Saara eram compostas por berberes islamizados. Seguindo essas rotas, 
o islamismo foi ganhando adeptos na região sudanesa e na região do Sahel
(extensa faixa de terra situada imediatamente ao sul do deserto do Saara).
Utilizando os camelos como meio de transporte, os berberes percorriam lon-
gas distâncias, cruzando o deserto. As rotas percorridas ligavam a região do
Magreb e o Egito às margens dos rios Senegal e Níger, ao sul da Mauritânia
Colonialismo na África: a escravidão e o tráfico de escravos6
e ao lago Chade. No século IX, cerca de 300 mil pessoas eram transportadas 
por essas rotas na condição de escravos (ALBUQUERQUE, 2006).
As caravanas que partiam do norte da África em direção ao Sahel leva-
vam artefatos de metal, como utensílios de cobre, bronze e estanho, além 
de ferramentas, tecidos, adornos e pedras preciosas que vinham do Egito, 
do Oriente Médio e da Europa. Também transportavam: burros e cavalos; 
produtos alimentícios, como tâmaras, passas e raízes, bastante apreciadas 
pelas comunidades islâmicas do Sahel; e sal, produto essencial para a conser-
vação dos alimentos nas áreas tropicais e que também servia de moeda nas 
trocas comerciais. Da região do Sahel, essas caravanas traziam ouro, peles, 
marfim, noz-de-cola (fruto utilizado pelas sociedades africanas tradicionais 
em cerimônias e rituais e para controlar o cansaço e a fome) e principalmente 
escravos, que eram enviados para trabalhar nas salinas do Saara, nas sociedades 
islâmicas do norte da África e nos países europeus, sobretudo na Península 
Ibérica muçulmana. Segundo Albuquerque (2006, p. 16), entre os anos 650 e 
1800, calcula-se que o tráfico transaariano tenha vitimado “[...] 7 milhões de 
pessoas, sendo que 20 por cento delas morreram no deserto [...]”.
A conversão ao Islã não se deu de forma homogênea na África. Algumas 
regiões foram receptivas à nova crença, mas outras seguiam fiéis às crenças 
tradicionais e eram mais resistentes. Em alguns lugares, o islamismo e as 
crenças tradicionais coexistiram; em outras regiões, “[...] a conversão ficou 
restrita ao soberano e à aristocracia, enquanto as pessoas comuns continuavam 
a professar as crenças herdadas dos antepassados”. Houve também regiões em 
que toda a população se converteu “para escapar do risco do cativeiro”, uma 
vez que “apenas os infiéis podiam ser escravizados [...]” (ALBUQUERQUE, 
2006, p. 18). Mas como o islamismo encarava a escravização?
O Alcorão não justifica nem condena a escravidão. Tem-na como natural. Se 
dela fala em algumas passagens, é para recomendar, como obra pia, reparadora 
ou expiatória, a manumissão [alforria] dos escravos, preceituar que devem 
ser tratados com bondade e estabelecer regras de comportamento entre os 
escravos e entre eles e seus senhores. Em outros textos [...] preceitua-se que 
o senhor abrigue, vista e alimente de forma correta o escravo e o poupe de
trabalhos excessivos. [...] Para o islã, a condição normal do homem é a liber-
dade. Foi a partir desse princípio que as várias escolas jurídicas muçulmanas 
[...] compuseram doutrinas, leis e jurisprudência sobre a escravidão. Nenhuma 
pessoa livre podia ser escravizada por crime, dívida ou indigência. Não era
lícito, como na Grécia ou em Roma, fazer escrava, por exemplo, a criança
abandonada. Escravo era quem nascia nessa condição ou era a ela reduzido 
em guerra santa. Ou, ainda, quem era importado de terras de infiéis (SILVA,
2002, p. 32).
7Colonialismo na África: a escravidão e o tráfico de escravos
Para o Islã, havia apenas dois grupos de pessoas: os fiéis, que seguiam as 
leis divinas, e os infiéis. Quem não se convertera ao islamismo no primeiro 
chamado poderia ser salvo por meio da escravidão. Dessa forma, o jihad 
contribuía para a purificação do mundo, “[...] eliminando fisicamente o infiel, 
ou lhe arrancando, pela escravização, a existência legal e moral. A essência 
humana do escravizado não lhe seria devolvida senão com a alforria, para o que 
era indispensável que antes se houvesse convertido [...]” (SILVA, 2002, p. 33). 
A conversão, no entanto, não garantia necessariamente a liberdade do escravo:
Havia razões bem mais comerciais e bem menos altruístas a justificar o cres-
cimento do número de escravos no mundo muçulmano. Primeiro, porque uma 
vez escravizado o indivíduo nem sempre dispunha de tempo e condições para 
ser educado de acordo com as leis islâmicas, e segundo, porque o trabalhador 
escravo era fundamental para a viabilidadedo comércio dos mercadores 
muçulmanos (ALBUQUERQUE, 2006, p. 18).
No mundo islâmico, os escravos tinham várias funções. Mulheres e crianças 
eram destinadas ao serviço doméstico. As mulheres consideradas bonitas 
eram as mais caras e podiam ser incorporadas aos haréns. Os homens adultos 
eram utilizados como carregadores nas longas viagens percorridas pelas 
rotas transaarianas, mas podiam ocupar funções administrativas. Os meninos 
eram destinados ao treinamento militar ou a trabalhos domésticos. “Alguns 
deles, transformados em eunucos, eram incorporados aos exércitos (havia 
exércitos específicos de eunucos) ou alocados nos haréns, como vigilantes. 
Muitos eunucos ocupavam, também, cargos administrativos e funções de 
governo [...]” (MARZANO, 2013a, p. 138). O comércio de escravos na África 
foi intensificado pela presença muçulmana, como pontua Silva (2002, p. 35):
Com a ocupação do Egito e do norte da África, multiplicaram-se os escravos 
pretos. Em pouco tempo, os árabes e seus correligionários organizaram e 
desenvolveram o comércio a distância de negros, dando-lhe uma dimensão 
que jamais tivera. Partiram para isso dos pequenos mercados já existentes no 
Egito e no Magrebe, de rotas milenárias, como as da Núbia, ou de itinerários 
que datavam dos primeiros séculos de nossa era, de quando a adoção do camelo 
permitiu aos berberes que atravessassem regularmente o Saara e fossem pilhar 
as estepes e as savanas ao sul do deserto e ali prear negros, para pô-los nos 
oásis, a cultivar cereais e tâmaras, e talvez para vendê-los na África do Norte.
Os muçulmanos exploravam a mão de obra escrava não só da África, mas 
também da China, da Índia, do sudeste da Ásia e da Europa Oriental. Mas a 
África acabou se tornando uma das principais fornecedoras de escravos. De 
Colonialismo na África: a escravidão e o tráfico de escravos8
acordo com Albuquerque (2006), ainda no século IX, em Bagdá, existiam cerca 
de 45 mil escravos negros. Já no século seguinte, os escravos africanos eram 
numericamente superiores aos escravos turcos e eslavos. “Esse tráfico voraz 
de gente de cor preta explica a presença de negros nas populações árabes [...]” 
(ALBUQUERQUE, 2006, p. 19). Com a presença muçulmana, a escravidão 
na África foi se transformando de escravidão doméstica em escravização em 
larga escala.
Os portugueses na África
Com a presença europeia no continente africano, a partir do século XV, a 
escravização adotou características intercontinentais e a África passou a ser 
o principal fornecedor de escravos do mundo moderno. As grandes nações 
europeias do período se envolveram no tráfi co de escravos, principalmente 
o Império Português.
A expansão marítima portuguesa começa em 1415, com a conquista de 
Ceuta, um importante entreposto comercial no norte da África. Nessa região, 
os portugueses ouviram falar que no interior do continente havia regiões muito 
ricas, abundantes em ouro e pedras preciosas. Após conquistar Ceuta e tomar 
a ilha da Madeira, em 1419, e o arquipélago dos Açores, em 1431, no Oceano 
Atlântico, os portugueses foram margeando o litoral africano, seguindo para 
o sul. Os primeiros contatos entre portugueses e africanos se deram na região 
do rio Senegal, em terras que faziam parte do Império Jalofo (ALBUQUER-
QUE, 2006). Logo, os portugueses começaram a comercializar escravos entre 
os portos africanos. O comércio de escravos não foi, no entanto, o primeiro 
interesse dos portugueses na África, como indica Marzano (2013b, p. 159):
Segundo vários autores, a intenção dos portugueses era contornar a costa da 
África Ocidental para atingir as minas de ouro localizadas no Gana atual. 
Apenas após perceberem a presença da escravidão e o dinamismo do comércio 
de escravos no continente africano é que os europeus teriam se dedicado a 
vender cativos, primeiro de um porto africano para outro, em troca de ouro. O 
transporte de escravos africanos para as ilhas atlânticas — Madeira, Açores e 
Cabo Verde ainda no século XV e São Tomé no século XVI — só teria início 
algum tempo depois.
A intenção dos portugueses não era apenas ter acesso ao mercado do ouro, 
mas chegar ao centro produtor do metal precioso e eliminar os intermediários. 
Assim, em 1445, os portugueses iniciaram a construção da fortaleza e da 
9Colonialismo na África: a escravidão e o tráfico de escravos
feitoria de Arguim (ilha situada na costa da Mauritânia atual), “[...] para onde 
pretendiam desviar o comércio transaariano [...]” (ALBUQUERQUE, 2006, 
p. 22). Aos poucos, os portugueses foram se apropriando, com suas caravelas,
de parte do transporte que até então era feito com camelos; assim, os negócios
com os africanos da região do rio Gâmbia, perto do poderoso Império do Mali,
foram crescendo. Por volta de 1460, os portugueses mantinham boas relações
comerciais com os malineses. Contudo, o principal objetivo, atingir as ricas
minas de ouro, ainda não havia sido atingido.
Embora o comércio de escravos não fosse o seu principal objetivo, os 
portugueses passaram a lucrar com ele. Esse lucro representou a desgraça de 
alguns povos, pois a captura de escravos estimulava as guerras entre os afri-
canos. “A presença portuguesa redimensionou a vida de populações litorâneas 
que, até então, não tinham poder econômico e político significativo e que 
passaram a ter na captura de cativos uma atividade corriqueira, sistemática 
[...]” (ALBUQUERQUE, 2006, p. 24).
A prosperidade dos negócios portugueses fez surgir a necessidade de esta-
belecer mais feitorias no litoral africano. Dessa forma, em 1482, os portugueses 
construíram a feitoria de São Jorge da Mina (Figura 2), na Costa do Ouro (atual 
Gana). A construção imponente demonstrava que os portugueses pretendiam 
ficar por muito tempo na região, pois, de acordo com Silva (2002, p. 212), “[...] 
não se tratava de um simples entreposto, mas, sim, de uma fortaleza, que se 
erguia a quase quatro mil quilômetros da pátria dos que a levantavam [...]”. A 
partir de São Jorge da Mina, os portugueses conseguiram interceptar quase 
todo o metal transportado pelo Saara. De posse do ouro, puderam negociar 
com vantagens nos mercados africanos e, com os lucros, obter mercadorias 
sofisticadas que não eram fabricadas em Portugal.
Figura 2. Castelo de São Jorge da Mina.
Fonte: Wikimedia (2006, documento on-line). 
Colonialismo na África: a escravidão e o tráfico de escravos10
Na feitoria de São Jorge da Mina, concentrou-se o embarque de escravos 
para a América — Brasil, Caribe e América Inglesa — até 1637, quando o local 
foi tomado pelos holandeses. São Jorge da Mina foi a principal feitoria na costa 
africana e a mais importante fonte de lucros para a economia portuguesa até o 
início do ciclo de comércio com a Índia. Concomitantemente à construção da 
feitoria de São Jorge da Mina, outro importante fato aconteceu: o navegador 
português Diogo Cão chegou ao reino do Congo.
Relações entre Portugal e Congo
Por volta do século XIV, comunidades que viviam na África centro-ocidental 
foram unifi cadas, formando o reino do Congo, que abrangeu territórios que 
hoje correspondem a Angola, República do Congo, República Democrática 
do Congo e Gabão. Nesse reino, o poder era exercido pelo manicongo, que 
governava com o auxílio de um conselho real, cujos membros eram represen-
tantes destacados de cada comunidade, formando uma espécie de nobreza.
Manicongo era o rei, ou seja, quem governava o reino do Congo. Já os mani eram os 
governantes das províncias, enquanto as mbanza eram as cidades que pertenciam 
ao reino do Congo.
O reino do Congo era próspero. O seu solo era fértil e havia bons supri-
mentos de água, que favoreciam a agricultura e a criação de animais. Os 
rios forneciam peixes e, nas savanas, a caça era abundante. Para garantir a 
continuidade das atividades agrícolas, o manicongo procurava ampliar as 
suas terras produtivas, o que fazia por meio de guerras com povos vizinhos 
ou associando-se a eles por meio de casamentos. A escravidão praticada no 
reino era do tipodoméstica, “[...] embora nas cidades fosse comum que um 
número significativo de prisioneiros de guerra estivesse a serviço da nobreza 
[...]” (ALBUQUERQUE, 2006, p. 32).
O navegador português Diogo Cão aportou na foz do rio Zaire em 1483. 
Logo se espalhou pela região a notícia de que grandes barcos, que se asseme-
lhavam a pássaros gigantes, haviam chegado ao litoral. Os habitantes locais 
ficaram espantados com os homens que saíam das embarcações: “[...] pensava-
11Colonialismo na África: a escravidão e o tráfico de escravos
-se que os europeus vinham de outro mundo, que eram seres sobrenaturais
[...]” (ALBUQUERQUE, 2006, p. 29).
Os portugueses foram recebidos pelo mani de Sônio, província do noroeste 
do reino. Alguns mensageiros portugueses foram enviados à Mbanza Congo, 
cidade real onde vivia o manicongo. Curioso com a presença dos homens 
brancos que diziam ter cruzado o oceano, o manicongo resolveu manter os 
mensageiros em seu palácio. Como os mensageiros tardavam a retornar, “Diogo 
Cão tomou por reféns quatro congueses que visitavam, atentos para todas as 
novidades, um de seus navios e os levou consigo para Portugal [...]”, com a 
promessa de trazê-los de volta depois de 15 luas (SILVA, 2002, p. 361). Os 
mensageiros portugueses puderam conhecer um pouco da organização admi-
nistrativa complexa e centralizada do reino do Congo. Já os quatro africanos 
levados por Diogo Cão retornaram “[...] vestidos como europeus e falando 
português [...]” (ALBUQUERQUE, 2006, p. 30). Tanto os mensageiros tinham 
muito para contar a Diogo Cão como os africanos tinham muito a narrar para 
o manicongo:
O manicongo Nzinga a Nkuwa ouviu cuidadosamente o que lhe narraram os 
quatro súditos que tinham passado vários meses em Portugal. Não só de seus 
relatos, das entrevistas concedidas a Diogo Cão e dos mimos que recebeu, mas 
também do que vieram os seus dizer-lhe sobre as bombardas, os arcabuzes, 
os machados, as bestas e o tamanho dos barcos portugueses, é provável que 
tenha concluído que aqueles estrangeiros dispunham de recursos técnicos 
muito maiores e mais eficazes do que os conhecidos pela sua gente. E que 
contavam com um deus poderosíssimo. Se os congos pudessem captar tudo 
aquilo, tornar-se-iam muito mais fortes do que os demais reinos vizinhos e 
teriam condições de fazer face aos novos desafios que certamente surgiriam 
da presença dos que haviam chegado do oceano (SILVA, 2002, p. 361).
Ainda na década de 1480, os monarcas de ambos os reinos estreitaram as 
suas relações trocando presentes e emissários. Em 1489, o manicongo Nzinga a 
Nkuwa enviou para Portugal uma comitiva, da qual faziam parte um dos afri-
canos “sequestrados” por Diogo Cão e o mani Cabunda, sacerdote de Mbanza 
Congo. A comitiva levou presentes para serem entregues ao rei português D. 
João II, entre os quais destacam-se “[...] dentes de elefante, objetos de marfim 
e panos de ráfia congueses, que eram como brocado, damasco, seda acetinada 
ou tecido de Ormuz [...]” (SILVA, 2002, p. 361). A comitiva levava também 
algumas solicitações: “[...] autorização para que rapazes do reino africano 
Colonialismo na África: a escravidão e o tráfico de escravos12
pudessem ser educados na Europa, conseguir que padres católicos fossem 
enviados ao Kongo, assim como mestres no ofício da carpintaria, pedraria 
e agricultura [...]” (ALBUQUERQUE, 2006, p. 30). O rei português acatou 
as solicitações, pois era de interesse de Portugal estabelecer uma aliança 
sólida com um soberano de um reino próspero que se mostrava disposto a se 
converter ao cristianismo.
Em 1491, o manicongo Nzinga a Nkuwa se converteu ao cristianismo e 
promoveu algumas mudanças na estrutura política de seu reino, inspirando-se 
no modelo europeu. A capital Mbanza Congo teve o nome mudado para São 
Salvador, e foi iniciada no reino uma linhagem de reis católicos. No entanto, 
como destaca Albuquerque (2006), nem todos os congoleses aceitavam a 
conversão; um filho do manicongo, Mpanzu a Kitima, se negou a aderir ao 
catolicismo e foi vencido por Afonso, que herdou o trono. Afonso I governou 
o Congo entre 1506 e 1543. Ao longo desse período, o comércio do próspero
reino com os portugueses expandiu-se e a venda de escravos tornou-se mo-
nopólio real.
Aos poucos, porém, esse monopólio foi sendo quebrado. Desrespeitando 
as regras estabelecidas pelo rei, os mercadores promoviam capturas ilegais 
(no Congo, só era permitida a escravização de prisioneiros de guerra e 
de pessoas endividadas) e transportavam escravos por rotas alternativas 
para fugir da fiscalização e não recolher os impostos devidos aos cofres 
reais, o que causou grande prejuízo ao governo do Congo. Afonso I tam-
bém enfrentou disputas pela sucessão do trono e revoltas de chefes das 
províncias do reino que discordavam do controle excessivo do governo 
sobre seus territórios.
Em paralelo a isso, os portugueses intensificaram o comércio de escravos 
com povos vizinhos subordinados ao Congo, como Angola, sem contar com 
o intermédio de Afonso I. Ao estreitar relações com esses povos vizinhos,
os portugueses almejavam encontrar minas de prata na região. Quando as
pretensões colonialistas dos portugueses tornaram-se evidentes, os africanos
resistiram. Além de confrontar os africanos, os portugueses tinham de enfrentar 
outros inimigos: “[...] as febres, a escassez de comida, os insetos, a estiagem
e a frustração diante da inexistência de prata e ouro nas proximidades. Os
portugueses concluiriam, então, que a empreitada conquistadora não valia
a pena e resolveram concentrar suas forças no comércio de escravos [...]”,
atividade mais lucrativa e que demandava menos trabalho (ALBUQUERQUE,
2006, p. 33).
13Colonialismo na África: a escravidão e o tráfico de escravos
Um exemplo de resistência ao avanço português foi protagonizado pela rainha Nzinga 
Mbandi, que durante 13 anos combateu o avanço dos portugueses em Angola. Veja:
Em 1621, a rainha Jinga de Mutamba, seguida por uma vistosa comitiva, 
propôs uma aliança aos portugueses. Em troca da paz aceitou certas 
condições, inclusive a conversão ao catolicismo. Ela foi batizada com 
o nome de Dona Ana de Souza, na igreja matriz de Luanda, em 1622,
mas não aceitou pagar tributos como exigiam os lusitanos. No ano
seguinte, empreendeu outra guerra contra os portugueses e mandou
uma embaixada ao Papa Alexandre VII pedindo o reconhecimento do
seu reino. Esquecendo o padroado, o papa enviou-lhe uma carta com
orientações para que seu reino fosse cristão, junto com vários missioná-
rios capuchinhos italianos. Mas a rainha foi derrotada à frente de suas
tropas, e suas duas irmãs, as princesas Cambe e Funge, foram levadas 
para Luanda e batizadas com os nomes de Bárbara e Engrácia. Quando, 
em 1641, os holandeses saíram do norte do Brasil e ocuparam Luanda,
Jinga aliou-se a eles contra os portugueses. Mas em 1648, Salvador
Correa de Sá retomou Luanda dos holandeses, com uma armada saída 
do Rio de Janeiro. A rainha Jinga morreu em 17 de dezembro de 1663,
quando teria cerca de 80 anos. A memória dos cortejos e lutas das suas 
tropas continua presente nos congados brasileiros (ALBUQUERQUE, 
2006, p. 33).
No início do século XVII, o contato entre os reinos de Portugal e do Congo 
diminuiu. O Congo se mantinha como um reino autônomo e estabelecia rela-
ções políticas e comerciais com a Holanda. O catolicismo permaneceu como 
religião oficial da monarquia congolesa e padres italianos e espanhóis foram 
enviados diretamente pelo papado para prosseguir o trabalho missionário no 
reino, como você vai ver a seguir. O reino do Congo manteve-se unificado 
e autônomo até 1665, quando o rei Antônio I morreu numa batalha travada 
contra os portugueses, agora estabelecidos em Angola. A derrota nos campos 
de batalha e a morte do rei abriram caminho para a fragmentação do reino 
do Congo.
Colonialismo na África: a escravidão e o tráfico de escravos14
A dominação pela cruz: o papel do catolicismo 
na colonização da África
O sucesso de Portugal e da Espanha nas viagensmarítimas e na exploração 
dos territórios coloniais motivou o papa a colocar nas mãos dos reis ibéricos e 
das autoridades eclesiásticas dos dois países a responsabilidade pela expansão 
do catolicismo nos novos territórios. Para isso, os reis deveriam construir 
igrejas e mosteiros e enviar sacerdotes para evangelizar os habitantes das 
novas possessões.
A conversão dos africanos ao catolicismo desempenhou um papel muito 
importante no processo de expansão portuguesa na África. A presença do 
catolicismo na África acompanhava a colonização portuguesa em território 
africano por meio da instalação de dioceses. De acordo com Marcussi (2012), 
as ordens religiosas enviadas à África tinham como objetivo específico a 
transmissão da mensagem religiosa aos povos com os quais os portugueses 
faziam contatos comerciais.
A mesma Igreja Católica que procurava converter os africanos usava argumentos 
teológicos para justificar a escravidão. Para legitimar a prática da escravidão sob o 
ponto de vista moral e jurídico, os europeus procuravam justificativas no pensamento 
de juristas cristãos e pensadores da Igreja, nos textos de Aristóteles e no direito romano. 
Em outras palavras, os europeus criaram um discurso que transformava um ato cruel 
e hediondo em uma prática justa, natural e necessária.
Um dos discursos criados pelos europeus para justificar a escravidão consistia em 
associar os negros aos descendentes de Caim, personagem bíblico que assassinou o 
seu irmão Abel e por isso foi amaldiçoado por Deus.
Os africanos seriam os descendentes de Caim, e, portanto, trazendo 
ainda na carne o sinal da maldição divina imposta ao primeiro homicida, 
segundo a narrativa bíblica. De fato, ao amaldiçoar Caim, Deus lhe 
colocou um signo na carne, para que não fosse morto e vivesse continu-
amente expiando seu crime. Na tradição popular, os negros passaram a 
ser considerados como raça maldita de Caim, sendo a negritude de sua 
pele um sinal imposto pelo próprio Deus (AZZI, 2005, p. 98).
15Colonialismo na África: a escravidão e o tráfico de escravos
O início do contato entre os africanos e o catolicismo se deu nas ilhas da 
costa africana, onde os portugueses mantinham seus entrepostos comerciais. 
Marcussi (2012, p. 39–40) apresenta um panorama da inserção do catolicismo 
na África a partir da presença portuguesa:
Na costa da Senegâmbia, ao norte, a Igreja nunca chegou a ter grande pene-
tração no território continental antes do século XIX, permanecendo restrita 
ao arquipélago de Cabo Verde e a algumas poucas feitorias portuguesas na 
costa, para além das missões esparsas realizadas pelas ordens religiosas, 
sobretudo os jesuítas. Na costa da Mina, sob jurisdição da diocese de São 
Tomé, também houve poucas incursões católicas, limitadas à missionação 
das ordens religiosas, incluindo uma mal sucedida missão ao reino do Benim 
em 1515, um breve período de atuação jesuítica em Serra Leoa entre 1604 e 
1617 [...]. A costa de Moçambique, sob administração eclesiástica da diocese 
de Goa, também recebeu algumas missões, a maior parte das quais jesuíticas 
e dominicanas, mas de penetração igualmente escassa, restringindo-se ao 
batismo de alguns reis locais e à assistência de comunidades portuguesas. 
Porém, no caso da costa centro-africana ocidental (compreendendo as regiões 
do Congo, Angola e Benguela), houve um relativo adensamento e disseminação 
das instituições clericais a partir do arquipélago de São Tomé.
Quando os portugueses chegaram ao litoral do reino do Congo, os nativos 
daquela região pensaram estar diante de seres sobrenaturais. Isso porque, 
segundo Albuquerque (2006), na região do Congo-Angola os africanos acre-
ditavam que existia uma linha divisória chamada Calunga, que separava 
o mundo dos vivos do mundo dos mortos. “Quando alguém morria o seu
espírito atravessava a fronteira entre a vida e a morte navegando numa zona
transitória que seria o oceano. Para eles [os africanos], os homens brancos
que desembarcaram com Diogo Cão podiam ser espíritos de antepassados
voltando para casa [...]” (ALBUQUERQUE, 2006, p. 29).
Devido a essa crença, os portugueses foram recebidos de forma calorosa 
pelo mani de Sônio e pelos habitantes do litoral. Como você viu anteriormente, 
em 1483, Diogo Cão “sequestrou” quatro africanos e levou-os para Portugal, 
onde ficaram até 1485. Ao retornarem, os africanos descreveram para o ma-
nicongo o que viram em Portugal e afirmaram que os portugueses tinham 
um “deus poderosíssimo”. Quem pudesse contar com os recursos técnicos 
dos portugueses e com esse “deus poderosíssimo” seria capaz de enfrentar os 
novos desafios que estavam por vir. Entusiasmado com os relatos, o manicongo 
enviou uma comitiva à Portugal com uma solicitação clara: que os portugueses 
enviassem padres para instruir os congos na religião. Um dos primeiros congos 
a se converter foi o mani de Sônio, batizado “[...] com o nome de Manuel, em 
Colonialismo na África: a escravidão e o tráfico de escravos16
missa cantada, numa igreja de madeira construída para a ocasião. Depois, 
ordenou que se queimassem todos os fetiches e, possivelmente, as imagens 
dos ancestrais [...]” (SILVA, 2002, p. 363).
O manicongo ordenou que fosse construída uma igreja de pedra e cal para 
nela os fiéis receberem o batismo. Devido a uma campanha militar contra 
povos inimigos, o manicongo não pôde esperar a conclusão da igreja e recebeu 
o batismo, em 1491, num altar improvisado. Seguiram o seu exemplo uma de
suas esposas e um filho, que, após serem batizados, receberam nomes latinos.
O manicongo passou a se chamar D. João I (mesmo nome do rei de Portugal na
época); sua esposa, Leonor; e seu filho, Afonso. “Para a guerra, da qual saiu
vitorioso, o manicongo levou, benta pelo papa Inocêncio VIII, uma bandeira
de cruzado que lhe mandara o rei de Portugal, além de barcos e arcabuzeiros
portugueses [...]” (SILVA, 2002, p. 363).
Sobre a conversão dos congos ao cristianismo, Silva (2002, p. 364) apresenta 
as várias interpretações dadas pela historiografia:
Assim começa a história fascinante e controvertida do cristianismo no reino 
do Congo. Alguns consideram que não houve uma conversão verdadeira, pois 
fundada num “mal-entendido colossal”: os portugueses teriam conquistado os 
ouvidos dos congueses porque eram brancos vindos do mar e, como tais, seres 
sacrossantos. Outros julgam que o cristianismo do rei e das elites teria sido 
superficial ou apenas de fachada, para ganhar audiência nas cortes europeias, 
subsistindo entre os congos a religião tradicional, ainda que incorporasse 
alguns rituais e objetos de culto católico às suas cerimônias e aos seus altares. 
Não falta quem acrescente que a conversão dos manicongos foi um expediente 
de política interna: como o rei não controlava o culto dos antepassados, nem o 
dos espíritos das águas e da terra, [...] percebeu que poderia ter no cristianismo 
uma fonte de legitimidade independente do beneplácito, da sagração ou do 
apoio dos chefes das candas (ou clãs e linhagens matrilineares) [...]. Houve 
também quem julgasse que o cristianismo teria sido, desde o início, apropriado 
pela religião local, que o reinterpretou segundo o seu sistema de crenças e o 
acomodou à sua concepção do universo e do sagrado. Para outros, o chamado 
catolicismo dos congos não seria sequer um culto híbrido, pois tinha por base 
uma visão do mundo que era inteiramente africana.
De acordo com Silva (2002), a conversão dos congos teria se dado para 
alguns pela fé e, para outros, por conveniência. O autor cita como exemplo o 
caso do manicongo, que teria se convertido por impulso, imaginando que 
sem a conversão não haveria aliança com os portugueses. 
17Colonialismo na África: a escravidão e o tráfico de escravos
O governo de D. Afonso foi de suma importância para a consolidação 
do cristianismo no Reino do Congo e serviu para estabelecer as bases da 
organização política que vigoraria pelos séculos subsequentes. O 
cristianismo sustentou politicamente a conquista do poder, a sua 
consolidaçãoe a sua ampliação. Ainda de acordo com Souza (2016, p. 453), 
“[...] a elite conguesa refundiu ideias heterogêneas, locais e estrangeiras, em 
novas partes inter-relacionadas, em uma visão de mundo que constituiu o 
cristianismo congo: um novo sistema de pensamento religioso, expressão 
artística e organização política [...]”.
As ações de D. Afonso foram fundamentais para o fortalecimento do 
cristianismo no Congo, que serviu para os portugueses, sustentarem o 
comércio de escravos e suplantarem a autoridade dos reis congos, que 
controlavam, além do comércio, o cristianismo. Souza (2016) defende que as 
redes comerciais estabelecidas e a adoção do cristianismo deram ao Congo 
uma posição de destaque no mundo atlântico entre os séculos XVII e XVIII.
O cristianismo já era conhecido em algumas regiões da África antes da chegada dos 
portugueses. A Etiópia foi o primeiro e mais antigo reino africano a adotá-lo como 
religião oficial do Estado. Desde o século IV, o reino da Abissínia, depois chamado de 
Etiópia, tornou-se cristão ortodoxo.
No século XII, espalhou-se pela Europa a lenda de um reino cristão no Extremo 
Oriente, governado por um rei conhecido como Preste João. Segundo a lenda, Preste 
João teria mais de 500 anos de idade, pois em seu reino havia uma fonte da eterna 
juventude. No século XV, um reino cristão foi descoberto pelos portugueses na região 
da Etiópia, na África oriental.
Colonialismo na África: a escravidão e o tráfico de escravos18
Ao tomarem contato com esse Reino Cristão, os lusitanos acreditaram ter encontrado 
a mítica terra de Preste João, o soberano que lhes ajudaria a combater os muçulmanos 
que controlavam as rotas comerciais no Oceano Índico; porém, foram os portugueses 
que acabaram enviando tropas para auxiliar o reino africano no combate às investidas 
turcas na região do Mar Vermelho.
Tanto o papa quanto Alfonso de Aragão [nobre espanhol] enviaram 
missões à Etiópia. [...] Não se sabe se todas chegaram ao seu destino. De 
qualquer forma, ao iniciar-se a segunda metade do século XV, algumas 
conexões com a Europa haviam rompido o isolamento dos etíopes, e 
a Abissínia [...] deixara de ser uma terra desconhecida para os euro-
peus. [...] Para os portugueses, que aspiravam ao domínio do Índico, a 
Etiópia desenhava-se como parceiro ideal. Desde muito, Preste João 
e seus exércitos frequentavam a imaginação lusitana. Tanto que [o rei 
português] D. João II, em 1487, mandara [o explorador] Pero da Covi-
lhã em busca das terras do Preste, para alcançar uma aliança. Pero da 
Covilhã só chegou à Etiópia após seis anos de longa e intricada viagem. 
De lá nunca mais sairia, para dizer a seu rei o que fizera e vira. Mas as 
notícias que deu de Portugal à rainha [etíope] Eleni influenciaram-na 
profundamente e a convenceram de que os portugueses eram os aliados 
naturais da Etiópia (SILVA, 1996, p. 601).
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