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Paula Perin Vicentini Rita de Cássia Gallego Vivian Batista da Silva 4SOBRE TEMPOS E ESPAÇOS DOS MODOS DE ENSINAR E APRENDER Licenciatura em ciências · USP/ Univesp 4.1 Introdução e objetivos 4.2 A força da tradição na escola 4.3 O Método Individual 4.4 O Método Mútuo 4.5 O Método Simultâneo 4.6 Conclusão Referências Bibliográficas Di dá tic a 37Licenciatura em Ciências · USP/Univesp · Módulo 5 Didática 4.1 Introdução e objetivos Na aula Sobre tempos e espaços dos modos de ensinar e aprender você conhecerá as múltiplas possibilidades de ensinar e aprender através dos métodos individual, mútuo e simultâneo. Compreenderá assim, as diferentes formas de organização do trabalho dos alunos e professores. Enraizadas em nós mesmos pelo esquecimento de nossa própria história inte- lectual, substituídas socialmente pela ilusão da distribuição igualitária dos saberes na escola republicana, as representações dominantes da aprendizagem são particu- larmente sólidas, porque permitem também legitimar práticas de ensino ou, mais exatamente, limitar as últimas às práticas da informação. Em sua perspectiva, a sala de aula pode, na verdade, ser concebida como o meio onde conhecimentos são dispensados... Basta ouvi-los, revê-los, aplicá-los com atenção, coragem e ardor, incansavelmente, até a apropriação... (Meirieu, 1998, p. 53). Antes de iniciarmos esta aula, gostaríamos de convidá-los a se lembrarem de seus tempos de alunos: O que você aprendeu nas séries iniciais da escola? E nas séries seguintes? Como eram seus professores e professoras? Que materiais eles mais usavam? Como eram as escolas que você frequentou? Você nota diferenças na organização das escolas de hoje? Imaginamos que algumas dessas questões sejam poucas vezes alvo de reflexão. 4.2 A força da tradição na escola Ensinamos e aprendemos corriqueiramente, não só na escola como também em diversas situações do nosso dia a dia. Essas atividades podem parecer óbvias demais, até mesmo naturais e espontâneas. Entretanto, quando consideramos o ensino e a aprendizagem, estamos nos referindo a atividades históricas e culturalmente construídas, e que a escola produz formas de trabalho específicas, cujas lógicas nos permitem compreender seus modos de ensinar e aprender. Figura 4.1: Momento de reflexão. 38 4 Sobre Tempos e Espaços dos Modos de Ensinar e Aprender Licenciatura em Ciências · USP/Univesp · Módulo 5 Ao nos lembrarmos das experiências que tivemos na escola, é comum termos a sensação de que as coisas não mudaram. Apesar de sabermos da existência de inúmeras tentativas de transformar o sistema educacional com base em diferentes teorias, quando refletimos sobre as questões levantadas anteriormente, é possível constatar que há aspectos organizacionais que persistem ao longo dos anos. No que diz respeito ao espaço, as nossas memórias escolares podem remeter para um prédio com várias salas de aula, o pátio, a diretoria, a sala de professores, por exemplo; e, no que concerne ao tempo, talvez tenham revivido o calendário (com as datas de matrícula, férias, feriados, festas, das reuniões e avaliações), a idade permitida para entrar na escola e dos anos ao longo dos quais se estudam determinados saberes previstos no currículo. Essas práticas vêm sendo instauradas pela escola desde o século XIX, com o desenvolvimento da escola que é organizada pelo Estado e destinada a todos, pobres ou ricos, homens ou mulheres, crentes ou ateus, aqueles que querem e aqueles que ainda não pensaram em estudar. Essa insti- tuição tem funcionado como uma espécie de engrenagem, composta por diferentes elementos que devem ser combinados de forma racional e articulada. Como observa David Hamilton (1999), a escola é uma máquina de ensinar e aprender (teaching and learning machine), pois põe em funcionamento uma lógica que nenhum outro lugar conhece. Quantas coisas aprendemos em casa, por exemplo, com nossos pais e irmãos, mas em situações informais, sem haver um tempo previamente determinado para a sua realização nem um espaço preparado para isso, tal como ocorre numa sala de aula. Aprendemos muito pelo exemplo e em meio às exigências da vida cotidiana. Isso é bem diferente do que acontece na escola, onde se criam os espaços, onde os horários e os materiais são previamente escolhidos. Os alunos sabem quais matérias estudarão na segunda, terça, quarta, quinta e sexta-feira. É possível lembrar aqui algumas experiências vividas, na maioria das escolas, há mais de um século, como o sinal de entrada, a hora do recreio ou o toque da saída. Já chamamos a atenção para isso anteriormente, quando convidamos vocês a pensar sobre suas experiências de alunos. Essas descrições evidenciam o que caracteriza as instituições modernas de ensino: organizar os horários e os lugares para aprender na escola é definir a progressão no curso seguido, definir o início da vida na escola, o fim de uma etapa, o início de outra, favorecer a orientação dos Figura 4.2: Organizar os horários e os lugares para aprender. 39Licenciatura em Ciências · USP/Univesp · Módulo 5 Didática estudantes para determinados tipos de estudos, atestar a entrada no mercado de trabalho e no mundo. Organizar os horários e os lugares para aprender é também privilegiar um modo de estar em aula e na sociedade, valorizar formas e normas de excelência, definir os padrões que fazem do aluno um estudante ideal: aquele que se esforça para realizar todas as tarefas e aprender na escola. Embora se defenda hoje o respeito pela pluralidade e liberdade para aprender, as crianças da mesma idade continuam obrigadas a seguirem o mesmo programa. Essa espécie de inércia configura-se nas características dos prédios, nos textos usados para ensinar e aprender, nos cadernos, nos dias de prova, nos planejamentos dos professores. Essa tradição pode nos parecer imutável: costumamos avançar os conteúdos, muitas vezes numerosos, num ritmo suficiente para dar conta deles. Essa é a lógica do chamado método simultâneo, pelo qual se ensina a todos ao mesmo tempo as mesmas coisas. Ele foi consagrado com as escolas graduadas (grupos escolares) no fim do século XIX no caso do Brasil. 4.3 O Método Individual Embora ensinar a todos ao mesmo tempo e as mesmas coisas, pareça a única e melhor maneira possível de se ensinar na escola, até meados do século XIX, o chamado método individual era praticamente a única possibilidade de organizar a situação pedagógica ou, no máximo, o professor contava com o auxílio dos alunos que sabiam mais para ensinar os demais. Até a instituição da escola graduada, não havia o estabelecimento de um número de anos para se cursar um dado nível de ensino, tampouco uma relação entre idade-um ano escolar-conheci- mento. Naquela altura, para viabilizar o método simultâneo, muitos aspectos temporais tiveram de Nada se transforma de um dia para outro no mundo escolar. Se perguntarmos a uma pessoa de 100 anos como foi a sua vida de aluno, certamente o seu relato terá muitos pontos em comum com as nossas lembranças e as lembranças de um adolescente de 14 anos. Mesmo com os discursos que pregam a reformulação da pedagogia, a força da tradição na escola é inegável (Nóvoa, 1995). Muitos pedagogos e políticos com suas reformas educacionais tendem a acreditar na possibilidade de ultrapassar os muros das salas de aula, mediante o uso de materiais inovadores, mas os tempos e espaços tradicionais ainda são muito marcantes em inúmeros sistemas escolares. 40 4 Sobre Tempos e Espaços dos Modos de Ensinar e Aprender Licenciatura em Ciências · USP/Univesp · Módulo 5 ser configurados e conquistados junto às famílias: organização do ano letivo, com a matrícula dos alunos realizada no mesmo momento – início do ano letivo –, controle e exigência da frequência e valorização da assiduidade, a chegada e saída dos alunos no mesmo horário, o estabelecimento de um espaço em que fosse possível a divisãodas crianças por nível de conhecimento, de modo a formar as classes/séries. Sem esses elementos, não era possível implementar o método simultâneo, já difundido como o método mais moderno para ensinar em outros países, como a Inglaterra, França, Estados Unidos, Suíça, Alemanha, por exemplo. Por isso, ao contrário do que possa parecer, não foi fácil incorporá-lo ao cotidiano escolar. Aliás, escola, até a construção dos grupos escolares, que consolidam um espaço próprio/uma arquitetura para a atividade de ensinar, com salas de aula para cada idade/série, além de salas para o diretor, quadra para atividade física, pátio e cozinha, era a própria casa dos professores, ou um espaço cedido pelas igrejas, fábricas, assim sem qualquer identidade. Desse modo, podemos dizer que a escola era o professor, pois ele reunia no mesmo espaço crianças, e até mesmo adultos, e ensinava-os a ler, escrever e contar, sem qualquer sistematização. Era justamente o fim dessa realidade o grande objetivo dos legisladores e educadores brasileiros e estrangeiros do século XIX. Não se alfabetiza um povo com o método individual; era preciso otimizar o tempo de ensinar e aprender! E é nesse contexto que o método simultâneo passa a ser referência para que os professores ensinem. Mas como colocá-lo em prática sem os elementos temporais indicados acima e sem um espaço onde fosse possível dividir os alunos segundo o seu nível de conhecimento? Como e por que o ensino simultâneo foi adotado gradativamente como o ícone da escola moderna a partir do século XIX, quando da constituição dos sistemas estatais de educação? Estudos destinados à cultura e à forma escolar (Frago, 1996, escolaNo, 1992, Julia, 2001, e viNceNt; lahire; thiN, 2001) atribuem uma importância especial às práticas escolares presentes desde o fim do século XVI, quando os jesuítas inauguravam a instrução formal de grupos de jovens, inspirada na vida monástica. A atenção consistia no princípio organizador pelo qual se perseguia a equivalência do tempo de ensino e do tempo de aprendizagem, mediante a hierarquização de textos sagrados, e o agrupamento dos alunos segundo a idade e o nível de conhecimento (chartier; Julia; coMpère, 1976). 41Licenciatura em Ciências · USP/Univesp · Módulo 5 Didática Segundo St.Jarre (2001, p. 21), as contribuições vindas depois, a partir dos protestantes e das próprias experiências católicas, traçaram as grandes linhas da escola construída no século XIX, cujo modelo simultâneo de ensino ainda constitui a forma de ensinar e aprender nas escolas atuais. A mesma autora, assim como Julia (2001), Vincent (2001), Compère (1996), em diferentes estudos, atribui o alargamento da instrução escolar a um número mais abrangente de jovens, nos fins do século XVII a Jean-Baptiste de La Salle (1651-1719), fundador do Instituto dos Irmãos das Escolas Cristãs, na França. Os esforços de La Salle incidiam na uniformização do contexto da aprendizagem mediante a classificação, a fragmentação dos elementos em jogo, a saber: alunos, saberes, classe, ou seja, o espaço disponível para ensinar. Isso significa considerar que Jean Baptiste de La Salle, ao agrupar alunos em mesmo nível de conhecimento, pregava e, ao mesmo tempo, inaugurava a instrução simultânea como maneira de reduzir o tempo de aquisição dos saberes elementares (ler, escrever e contar). Assim teria nascido o método simultâneo em substituição, pelo menos em tese, ao método individual desenvolvido até então. Esse método, porém, somente é generalizado e adotado como “o” método de ensinar e aprender em meados do século XIX, e fortemente no século XX, em vários países do Ocidente, quando da organização de um sistema estatal de educação primária. Tal fato indica que a organização do conhecimento e das crianças em classes antecipava o momento em que o Estado se responsabilizaria pela ordenação e administração da educação primária (Ensino Fundamental I atualmente). A pedagogia elementar, a partir de então, é dotado de um verdadeiro modelo pedagógico, o qual era tomado como referência pelos promotores de instrução pública. Uma análise histórica linear sugeriria que, após a experiência de La Salle, se instalaria imediatamente o método simultâneo, mas seriam necessários muitos anos ainda e ensaios de outros métodos para se eleger esse como o emblema da escola moderna, configurada a partir de características tão presentes nas escolas de La Salle. No fim do século XVII, nas escolas cristãs, a organização racional do tempo escolar já se fazia presente. O professor deveria ordenar o ensino de maneira a fixar anteriormente as matérias de ensino e seu tempo, organizadas de maneira hierárquica, sustentadas por um método que comportava várias etapas, apoiadas em manuais e diversas técnicas associadas à memória. 42 4 Sobre Tempos e Espaços dos Modos de Ensinar e Aprender Licenciatura em Ciências · USP/Univesp · Módulo 5 4.4 O Método Mútuo Anos depois, em outro contexto, na Inglaterra, foi criado o “método mútuo”, lancasteriano ou monitorial, cujo representante era Joseph Lancaster (1778-1838). A intenção também era otimizar o tempo de ensino, dadas as necessidades daquele momento histórico. O método mútuo impunha uma organização que evocava rigor, pois devia atender muitos alunos numa mesma sala; a segmentação detalhada da aprendizagem, a sucessão minuciosa das atividades, a recomposição permanente de oito grupos de nível segundo a progressão individual dos alunos não deixariam espaço algum à improvisação, tendo o monitor a função de atender a esses grupos separados por nível de conhecimento. Nesse sentido, o ensino mútuo era baseado em horários minuciosos, nos quais havia um esqua- drinhamento cerrado do tempo. Tentava-se garantir a qualidade do tempo empregado mediante o controle ininterrupto, anulação de tudo o que pudesse perturbar ou distrair os alunos. De um modo ou de outro, é indiscutível que, em diferentes países, se defendia e se ensaiava a substituição do ensino individual de uma maneira mais incisiva a partir dos anos 1800. A supressão do método individual era defendida pelas referências modernas de escola, e essas influenciavam as proposições de como ensinar nas escolas primárias brasileiras e, de modo particular nas paulistas, a partir da década de 1820. O método individual, segundo sublinha Faria Filho, era “o método por excelência da instrução doméstica, aquela que ocorria em casa, onde a mãe ensinava os filhos e às filhas, ou os irmãos que sabiam alguma coisa ensinavam àqueles que nada sabiam” (2000, p. 140). A abolição do método individual significava, simbolicamente, a transição do tradicional ensino doméstico para aquele que seria realizado num espaço específico, que, portanto, devia se diferenciar por vários motivos, a começar pelo número de crianças atendidas. A lei geral da educação, de 1827, definiu o método mútuo como forma de organização das aulas de primeiras Assim, a diferença fundamental entre o método mútuo e o simultâneo está no fato de que o primeiro se faz com o auxílio de uma figura imprescindível: o monitor, este representado por alunos mais adiantados que atendia aos pequenos agrupamentos segundo o nível de conhecimento em leitura, escrita, por exemplo; logo, as lições eram acompanhadas e otimizadas por alunos que ajudavam o professor. 43Licenciatura em Ciências · USP/Univesp · Módulo 5 Didática letras das localidades mais populosas, em perfeita consonância com o que se difundia e se instalava em outros países. No entanto, como já se observou, até o fim do século XIX não havia escolas públicas funcionando em prédios públicos; assim, o método mútuo não ocorria tal como era preconizado por Lancaster (espaços amplos, com muitos alunos e atendendo um número expressivo de alunos). Embora o método mútuo fosse legalmente o modo almejado para ensinar e até tenha sido notado nas práticas dos professores numa tentativa de otimizaro tempo de ensino, era condicionado à presença de alunos adiantados, o que nem sempre ocorria, conforme relatos de professores desse período histórico. 4.5 O Método Simultâneo É no fim da década de 1860 que começa a ser difundido o método simultâneo em São Paulo como o método de organização do ensino a ser adotado, conforme vinha sendo realizado nas escolas modernas em configuração em vários países (como a Inglaterra, França, Portugal, Espanha, Estados Unidos etc.), que servia de modelo para o Brasil. Essa difusão era otimizada pela circulação dos manuais pedagógicos voltados aos professores e eram, geralmente, traduzidos de países como a França. A seguir, seguem as recomendações legais referentes ao método simultâneo, entre 1868 e 1887, conforme consta em Gallego (2008): Tabela 4.1: Recomendações legais referentes ao método simultâneo, entre 1868 e 1887. / Fonte: GalleGo, 2008. Regulamento de 17 de abril de 1868 Art. 63 – A o método de ensino nas escolas será o geral ou simultâneo. Regulamento de 18 de abril de 1869 Art. 109 – A o inspetor geral que faz o regimento interno das escolas, no qual deverá ser observado: § 1º. Os alunos serão organizados segundo seu grau de adiantamento. § 2º. A passagem de uma a outra classe precederá exame sobre esse estado. Lei de 2 de maio de 1885 Art. 75 – A instrução primária nas escolas públicas da província se divide em três graus apropriados à idade e desenvolvimento intelectual dos alunos. Art. 77 – Os alunos em cada escola serão divididos em classes conforme o grau de instrução que receberam. Lei nº 81, de 6 de abril de 1887 Art. 73 – Os alunos em cada escola serão divididos em classes conforme o grau de instrução que receberam. 44 4 Sobre Tempos e Espaços dos Modos de Ensinar e Aprender Licenciatura em Ciências · USP/Univesp · Módulo 5 É importante, porém, chamar a sua atenção para a necessidade de se despir das representações atuais sobre o método simultâneo, a divisão em classes e mesmo a ideia de professor que temos para compreender o que se entendia por professor àquela época. Os professores eram pessoas que tinham o domínio dos conteúdos a serem ensinados (ler, escrever e contar, de modo geral), que passavam por um exame geral (nada semelhante aos concursos de hoje em dia) e não tinham qualquer formação sistemática e pedagógica para ser professor. O método simultâneo, conforme se observa na Tabela 4.1, não significava que o professor ensinava todos os alunos ao mesmo tempo e no mesmo espaço – a classe (onde estavam geralmente alunos da mesma idade). Entre 1868 e 1887, a palavra classe não era sinônimo de uma sala de aula, mas de um grupo de alunos com o mesmo nível de conhecimento dentro do mesmo espaço. É o primeiro esforço de classificação dos alunos conforme o que sabem. É a partir de 1893, em São Paulo, com os grupos escolares, que classe passa a ser sinônimo de uma sala de aula, onde são reunidas crianças segundo os critérios de idade e nível de conhe- cimento - essa forma de organização já esboçada em 1885, como podemos notar na Tabela 4.1. Mediante o que se apresentou na Tabela 4.1, nota-se que é nos fins dos anos de 1860 que se acentuam as tentativas de mudança na organização do tempo de ensinar e aprender. Para tanto, o alcance da obrigatoriedade escolar era a estratégia de se instalar o modo de instrução coletiva, esforços enfatizados na década de 1870. Nesse sentido, sem condições de diferentes ordens, que eram pré-requisitos para o êxito do ensino simultâneo, ensaiavam-se os rituais de ensinar pelo modo simultâneo. Para professores e alunos, impunha-se um problema até então desconhecido ou menos importante no ensino individual: as faltas e/ou atrasos implicavam o distanciamento dos colegas da classe, o que, para os professores, gerava um transtorno no sentido do remanejamento das atividades, conforme assinalavam repetidamente em seus relatos. A frequência era, assim, aliada na concretização das práticas pedagógicas pautadas no ensino simultâneo. No fim da década de 1880, outro aspecto era integrado àqueles que constituiam um empe- cilho para efetivar o método simultâneo: a falta de um espaço próprio para o funcionamento das escolas. Para os professores, pelo que parecia, a falta de um espaço próprio e um lugar educativo (Escolano, Frago, 1998) competia com a quantidade de alunos a que atendiam, além da questão de como viabilizar a divisão das crianças em classes sem espaços nem mobílias? A ênfase dada à articulação entre espaço e outro modo de ensino, assim como outros ritmos e tempos, talvez fosse uma estratégia discursiva no sentido de solicitar uma outra condição de se 45Licenciatura em Ciências · USP/Univesp · Módulo 5 Didática ensinar: um prédio escolar. Enquanto tais aspectos ainda estavam em processo de configuração, os professores faziam um amálgama dos modos de ensinar: individual, mútuo e simultâneo quando havia a presença de alunos adiantados para auxiliá-los. Como se percebe e se tem afirmado várias vezes ao longo da presente disciplina, a organização do tempo e do espaço escolar não é natural nem tampouco consensual. Os exemplos descritos anteriormente evidenciam como essa organização tem assumido diversas configurações e motivou inúmeros debates para efetivar o método simultâneo e os preceitos modernos de ensino tão conhecidos entre nós. 4.6 Conclusão As experiências que descrevemos nesta aula evidenciam as múltiplas possibilidades para se ensinar e aprender; os métodos devem ser pensados no plural. E, se não há uma única forma de organizar o trabalho de alunos e professores, convém sempre perguntar: quais questões estão em jogo quando construímos nossos tempos e espaços na escola? Referências Bibliográficas chartier, r.; Julia, D.; coMpère, M. L’éducation en France du XVIe au XVIIe siècles. Paris: SEDES, 1976. escolaNo, a. Tiempo y educación. Notas para uma genealogía del almanaque escolar. Revista de Educación. Tiempo y espacio, Madrid, n. 298, p. 55-70, May./Ago. 1992. Faria, F.; MeNDes, l. de. Instrução elementar no século XIX. In: Faria, F.; MeNDes, l. De; lopes, e. 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