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CONFORTO AMBIENTAL: ILUMINAÇÃO NATURAL Gabriel Lima Giambastiani Variáveis do comportamento térmico em ambientes residenciais e de serviços Objetivos de aprendizagem Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados: � Relacionar os efeitos do modelo de construção e da sua localização ao comportamento térmico. � Reconhecer a influência da capacidade térmica das paredes exteriores no verão e no inverno. � Categorizar a influência da capacidade térmica da cobertura no verão e no inverno. Introdução O desconforto ocasionado por situações de frio ou calor extremo in- fluenciam no dia a dia dos usuários de uma edificação, tornando as atividades básicas do cotidiano incômodas e os ambientes na quais elas são executadas pouco confortáveis ao uso. Historicamente, as edificações se adaptam à sua localização, e as técnicas construtivas e materiais de construção são previstos de forma a responder ao clima local, atendendo às necessidades de isolamento e proteção específicos para cada região. Neste capítulo, você vai estudar a influência das coberturas e paredes no conforto térmico das edificações e ler sobre a importância da espe- cificação dos materiais e métodos construtivos mais adequados. Além disso, verá os efeitos que o modelo construtivo e a localização do projeto geram no comportamento térmico da edificação. 1 Efeitos do modelo de construção e da localização ao comportamento térmico Ao vermos uma imagem de um conjunto de construções brancas com telhados azuis e vista para o mar, rapidamente associamos a imagem à paisagem grega, como a mostrada na Figura 1. Em uma conclusão precipitada, poderíamos supor que a escolha de cores e materiais é fruto de um nacionalismo exacerbado, fazendo alusão à bandeira grega, que é azul e branca. A motivação, no entanto, é mais prática do que ufanista. O material mais abundante na região é a pedra, que absorve o calor e mantém o interior das edificações quente. A cor branca, por sua vez, reflete os raios solares, colaborando para manter o interior das edificações mais fresco. O azul dos telhados tem uma motivação econômica. Um produto de limpeza chamado loulaki, usado para lavar roupas, reage com o calcário formando um solução azulada; portanto, era a solução mais fácil e que logo se tornou a padrão. Perceba nesse exemplo as relações entre materiais de construção, localização geográfica e habitabilidade das edificações. Figura 1. Santorini, Grécia. Fonte: PHOTOCREO Michal Bednarek/Shutterstock.com. Variáveis do comportamento térmico em ambientes residenciais e de serviços2 A arquitetura se insere dentro de um contexto mais amplo, no qual inter- ferem condições políticas, sociais, econômicas etc. No entanto, nasce e se concretiza dentro de uma lógica disciplinar própria, de modo que podemos compreender as obras de arquitetura como o resultado de uma somatória de diversas forças internas e externas que ajudam a moldá-la (ZEIN, 2018). Uma dessas forças é a localização da obra. É possível observar que cons- truções de diferentes partes do mundo apresentam características em comum pelo fato de estarem entre os mesmos paralelos no globo terrestre, ou seja, por compartilharem características climáticas. Os materiais podem diferir de região para região, mas as estratégias de conforto térmico tendem a se repetir nos locais de clima semelhante. Observe a Figura 2. Nas regiões em que o Sol atinge a Terra de modo mais vertical — isto é, na linha do Equador —, prevalece um clima quente, o que induz a soluções de proteção da incidência solar direta; já nas parcelas mais frias do globo terrestre, as estratégias devem ser de aproveitamento energético do calor do Sol. Figura 2. Regiões com clima semelhante apresentam soluções semelhantes. Veja no mapa a incidência solar em diferentes partes do mundo e estratégias similares. Fonte: Roaf (2014, p. 143). 3Variáveis do comportamento térmico em ambientes residenciais e de serviços As zonas latitudinais (Figura 3) são úteis para referência e comparação; no entanto, não têm limites rígidos e devemos pensar nelas como zonas de transição entre si (CHRISTOPHERSON; BIRKELAND, 2017). Figura 3. Diferentes zonas climáticas em função da latitude. Fonte: Christopherson e Birkeland (2017, p. 18). Além do clima, a localização da obra de arquitetura condiciona a dis- ponibilidade dos materiais de construção, como demonstrou o exemplo das construções gregas, e, consequentemente, da técnica construtiva. Não há concepção, em arquitetura, sem consciência construtiva — e é essa consciência que separa a arquitetura da pura geometria (MAHFUZ, 2007). Essa consci- ência construtiva é evidente na arquitetura vernacular, isto é, aquela que é produzida de maneira espontânea em determinada cultura sem a presença de profissionais projetistas. O termo vernacular, utilizado para tratar dessa arquitetura sem arquitetos, tem origem no latim vernaculum, expressão que era utilizada para tratar os escravos que nasciam na casa do senhor. A adaptação do termo para aspectos culturais foi inicialmente registrada no século XVII, quando James Howell se referiu às línguas nativas da Itália como idiomas vernaculares. Variáveis do comportamento térmico em ambientes residenciais e de serviços4 O aproveitamento dos materiais típicos de cada região, trabalhados com técnicas construtivas locais é testado, copiado e, com o tempo, leva à cristali- zação de uma construção típica daquela região sem a presença de uma mente criadora única. Nesse contexto, o conhecimento sobre o modo de construir é passado de geração em geração mediante cópia e pequenos aperfeiçoamentos. Esse tipo de construção nos interessa pois ilustra os pontos comentados acima: os condicionantes do local, a disponibilidade dos materiais de construção e a preocupação com a habitabilidade das edificações, uma vez que são respostas genuínas a problemas locais bastante específicos. Observe na Figura 4 algumas construções de palha e barro no Norte do continente africano. Perceba que é difícil distinguir a construção da terra que a circunda; as aberturas pequenas reduzem a quantidade de raios solares incidentes no interior das edificações, o que ajuda a manter o clima interno mais fresco. O telhado de palha é uma resposta simples e eficaz para o pro- blema da cobertura. Esta solução vernacular difere muito pouco de algumas construções no interior do Nordeste brasileiro, onde o clima quente e seco se repete. Entretanto, se avançarmos ao Sul, veremos que, em regiões quentes e úmidas, esta solução começa a sofrer algumas alterações, como inclinação dos telhados a fim de escoar a água da chuva e altura da construção em relação ao chão, para prevenir alagamentos. Figura 4. Casas de palha e barro no Norte da África. Fonte: Peter Wollinga/Shutterstock.com. 5Variáveis do comportamento térmico em ambientes residenciais e de serviços Sempre que você observar uma imagem de uma região qualquer, princi- palmente de suas construções primitivas, tente inferir quais eram as restrições que aquela população enfrentava e também quais problemas tentava solucionar com os materiais que tinha à disposição. Em regiões de clima frio, por exemplo, você vai verificar janelas mais amplas, voltadas para o sentido solar, a fim de captar o calor do Sol para o ambiente interno. Para os países de clima frio, existem estratégias de aquecimento passivo. Essas estraté- gias consistem em, de alguma forma, armazenar o calor proveniente do Sol e utilizá-lo de outras maneiras. Por exemplo, pisos e paredes de grande inércia térmica, como pedra natural e madeira, absorvem a luz solar incidente nas vidraças e armazenam o seu calor, liberando-o lentamente, mantendo o conforto ambiental interno. Esse tipo de aproveitamento de calor é considerado um sistema passivo de ganho direto (ROAF, 2014, p. 142). As características climáticas são as principais diretrizes para a escolha de tipologias construtivas e materiais de construção.Agora que você já leu sobre as relações entre os materiais de construção, a localização da edificação e as questões de habitabilidade, está pronto para analisar os aspectos relativos às principais superfícies das construções, isto é, as paredes e coberturas, cujas características influenciam diretamente no conforto dos ambientes internos. 2 Influência da capacidade térmica das paredes exteriores As construções humanas surgem, em primeira instância, como uma camada de separação entre o mundo externo e o corpo humano. Em todas as sociedades ao redor do mundo é possível observar dispositivos que protejam os habitantes das intempéries, sejam elas o calor excessivo e o Sol, sejam a chuva, a neve e o frio. Variáveis do comportamento térmico em ambientes residenciais e de serviços6 Historicamente, os povos desenvolveram um tipo de construção adaptada ao lugar onde habitavam, a chamada arquitetura vernacular. Essa arquitetura anônima, sem autores específicos, evoluiu ao longo dos séculos em proces- sos de tentativa e erro, para que os edifícios respondessem às demandas ambientais da melhor forma possível. O desenvolvimento das arquiteturas vernaculares geralmente se relaciona a situações de escassez econômica, quando a necessidade de sobreviver, sobretudo sem desperdiçar os recursos disponíveis, exerce tanta influência que impacta nas decisões arquitetônicas (MASCARÓ, 2004, p. 11). Lucio Costa, um dos primeiros arquitetos brasileiros a reconhecer e divulgar o valor da arquitetura tradicional brasileira, escreveu, em 1929, um texto no qual exalta os exemplares desse tipo de arquitetura no Brasil, principalmente aquela produzida em Minas Gerais, descrita por ele como robusta, forte, maciça, com linhas calmas e tranquilas. Ele costumava escrever sobre as boas recordações e a felicidade que esse tipo de arquitetura trazia ao seu inconsciente (COSTA, 1962). Essa arquitetura, que se encontra dentro do inconsciente dos povos, não pode, no entanto, ser multiplicada na velocidade necessária para o crescimento exponencial pelo qual as cidades ao redor do mundo passaram. A profissionali- zação dos arquitetos e subsequente corporativização das empresas construtoras ao redor do mundo levou a certa homogeneização das técnicas e materiais de forma independente da localização das construções. No Brasil, por exemplo, como você pode ver no mapa da Figura 5, o clima varia desde o equatorial, nas regiões amazônicas próximas ao Equador, até o subtropical, nas regiões abaixo do Trópico de Capricórnio, como os estados da região Sul do país. Somam-se ainda o semiárido, com clima bastante seco, e seu oposto, o tropical úmido, com chuvas fortes e umidade alta (ALVARES et al., 2013). Mesmo com essas diferenças, tanto os materiais de construção quanto o formato e as estratégias de arquitetura são consideravelmente simi- lares de Norte a Sul. 7Variáveis do comportamento térmico em ambientes residenciais e de serviços Figura 5. Mapa das regiões climáticas do Brasil. Fonte: Adaptado de Alvares et al. (2013). Desde o final do século XX, a preocupação com o impacto ambiental das construções levou a uma reconsideração das técnicas de construção utilizadas em regiões com climas díspares. Desta vez, em vez do processo de tentativa e erro, que na arquitetura vernacular levava gerações para ser aperfeiçoado, a indústria da construção civil tem a seu dispor ensaios laboratoriais que atestam a eficiência dos materiais empregados nas obras. Quando falamos da eficiência de materiais na construção civil, geralmente nos referimos à capacidade de um elemento de isolar termicamente um espaço fechado. O exemplo mais comum para entender esse atributo é uma caixa tér- mica, que você enche de gelo para conservá-lo por algum tempo, a despeito das condições climáticas. Nas edificações, a envoltória e, em especial, as paredes são as responsáveis por manter o interior dos prédios em uma temperatura agradável. Para isso, utilizam-se materiais com baixa condutividade térmica, Variáveis do comportamento térmico em ambientes residenciais e de serviços8 ou seja, materiais que não transmitem calor ou frio do interior para o exterior. Quanto mais frio o clima, mais potente e necessário deve ser o isolamento térmico (ROAF, 2014). O termo condutividade térmica é definido pela medida de fluência do calor de uma unidade de espessura de um material através da condução. É a capacidade que um material tem de conduzir energia térmica, dada pelo fluxo térmico W por unidade de espessura de determinada área de um material e por grau de diferença de temperatura (BROWN; DEKAY, 2007). Na construção civil, os materiais são classificados quanto ao seu isolamento térmico em três categorias — isolamento resistivo, isolamento refletivo e isolamento capacitivo —, de acordo com a maneira pela qual objetos produ- zidos ou revestidos com esses materiais, como tijolos e blocos estruturais, comportam-se e resistem à variações de temperatura. Isolamento resistivo O isolamento resistivo é conhecido como aquele tipo de material que a maioria das pessoas imagina quando pensa em um isolante térmico. Trata-se das lãs mineral, de vidro e vegetal, dos fardos de palha e dos inúmeros tipos de poliestireno e poliuretano, conhecidos popularmente como “isopor” no Brasil. Esses materiais atuam no sentido de evitar a convecção. Isso depende da condutividade do material ou do vazio contidos dentro dos materiais, assim como suas dimensões e a diferença de temperatura (ROAF, (2014). Este tipo de isolamento também é utilizado em esquadrias de alto de- sempenho, tanto em sua instalação (com poliestireno expandido), quando do contato com as paredes, evitando frestas, quanto nos sistemas de folhas de vidros duplos com câmara de ar interna. Em suma, o isolamento resistivo é aquele que ocorre por meio da resistência do material à condução de calor. O ar é um elemento que oferece grande resistência quando confinado em pe- quenas células no interior de um material ou encapsulado entre dois materiais totalmente inertes, como o vidro. 9Variáveis do comportamento térmico em ambientes residenciais e de serviços Isolamento refletivo Este tipo de isolamento consiste na utilização de materiais que tenham a capacidade de refletir os raios do Sol, reduzindo ou impedindo que sejam absorvidos pela superfície. Isso evita que o material aqueça e transfira carga térmica para o ambiente interno. Neste tipo de material, o isolamento se dá, por exemplo, pelo uso de lâminas com espessuras mínimas e materiais com elevadíssimos níveis de refletância. Embora seja mais visível em coberturas, como mantas térmicas revestidas com uma fina camada de alumínio, este tipo de isolamento em manta pode também ser utilizado na parte interna de paredes duplas. O alumínio apresenta emissividade baixa, reduzindo a transferência de calor entre as paredes das paredes duplas. Entretanto, a parcela reflexiva não deve estar em contato com a camada interna da parede dupla. Sendo o metal um bom condutor térmico, se ele tocar o material da camada interna da parede, pode ser responsável por conduzir calor para ele, aquecendo, por consequência, o ambiente. O Instituto de Pesquisas Tecnológicas de São Paulo (INSTITUTO DE PES- QUISAS TECNOLÓGICAS, 2020) coloca que ainda podem ser considerados isolantes refletivos as tintas utilizadas na face externa das paredes de vedação. A refletância é medida por suas propriedades de absorver ou refletir a luz do sol, considerando tonalidades cromáticas e materiais de fabricação. Outros revestimentos de fachadas, como cerâmicas, painéis compostos de alumínio ou placas de poliestireno também podem atuar como isolantes refletivos. Embora mais usada em coberturas, a chamada “tinta térmica” também pode ser utilizada em paredes. Com a adição de microesferas cerâmicas, este tipo de tinta aumenta o potencial de reflexão da superfície onde ela é aplicada. Variáveis do comportamento térmico em ambientes residenciaise de serviços10 Isolamento capacitivo O terceiro tipo de material isolante foi o mais utilizado no passado, sendo a solução menos tecnológica dos três. Estes materiais garantem a inércia térmica a partir da massa térmica, observada em construções com paredes pesadas. Nesses casos, a espessura e a massa dos elementos construtivos é tão grande que retarda a transmitância de calor. A condutividade térmica aqui é reduzida, de acordo com o material e espessura da parede, assim como a diferença de temperatura entre os dois lados da parede (ROAF, 2014). Este tipo de isolamento segue sendo muito eficiente em regiões de clima frio, pois a inércia térmica é um fator determinante. Isso quer dizer que as paredes pesadas, como pedras ou tijolos largos, apresentam baixo grau de absorção da temperatura externa, isto é, o frio. Normalmente, é associado com sistemas de calefação internos. Essa combinação de estratégias, segundo Roaf (2014), é responsável por manter o ambiente interno, quando constantemente ocupado, ameno e confortável. Entretanto, uma vez que o imóvel fique desocupado por um longo período de tempo, é necessário grande tempo e energia para que ele volte a apresentar temperatura amena no interior. Como você pode ver, se na arquitetura vernacular as soluções se limita- vam aos materiais encontrados no local e à experiência construtiva de uma sociedade, atualmente a engenharia de materiais nos permite utilizar materiais compostos e sintéticos que foram testados à exaustão para garantir o funcio- namento em diversas situações de projeto. É importante analisar o clima do local onde será implantada a edificação para assim aplicar os materiais mais eficientes para o isolamento térmico e conforto interno. Além das paredes, é importante considerar também o material das co- berturas das edificações. Em climas quentes, principalmente, a proteção da insolação direta pode ser crucial para amenizar os efeitos do calor dentro dos ambientes A seguir, veremos como os materiais podem ser utilizados em coberturas para garantir construções com desempenho térmico satisfatório. 3 Influência da capacidade térmica da cobertura Enquanto nas paredes uma das características mais importantes para a conser- vação de energia é a capacidade de isolar termicamente o interior e o exterior da edificação, nas coberturas, é preciso ter um cuidado extra no que tange à incidência solar direta sobre o plano de cobertura. Enquanto as paredes podem 11Variáveis do comportamento térmico em ambientes residenciais e de serviços ou não ser sombreadas, as coberturas raramente o são, criando a necessidade de utilização de materiais que se comportem satisfatoriamente nessas condições. Os raios solares são formados por ondas de radiação eletromagnética de diferentes comprimentos que atingem a Terra constantemente. As ondas são separadas entre as visíveis, o que chamamos de luz, e as do espectro invi- sível, entre elas o infravermelho e o ultravioleta — estas duas responsáveis, respectivamente, pelo aquecimento e pelas queimaduras solares. As ondas responsáveis pela difusão de rádio e televisão ficam em frequências abaixo de 1 bilhão de hertz. Já acima da frequência de um bilhão de hertz estão as chamadas ondas de calor, primeiro as micro-ondas seguidas do infravermelho. Em um pequeno espectro de ondas com frequência acima do infravermelho está a luz visível. Essas ondas constituem menos do que 1 milionésimo de 1% do espectro eletro- magnético medido (HEWITT, 2015). A luz vermelha representa a frequência mais baixa que podemos enxergar, enquanto a luz violeta é a mais alta, apro- ximadamente duas vezes maior. As frequências acima do espectro visível de luz são chamadas de ultravio- leta, raios X e raios gama, cada qual com frequência mais alta que a anterior, inexistindo, no entanto, uma divisão clara entre elas. Observe na Figura 6 um espectro eletromagnético, identificando as diferentes radiações. Figura 6. Espectro de ondas eletromagnéticas. Fonte: Hewitt (2015, p. 489). Variáveis do comportamento térmico em ambientes residenciais e de serviços12 Na arquitetura, três tipos de radiação exercem a maior influência: o infra- vermelho, o espectro visível e o ultravioleta. A radiação infravermelha é a radiação percebida como calor, responsável pelo aquecimento dos espaços internos; a radiação no espectro visível é responsável pela iluminação dos ambientes e a percepção de cores; já a ultravioleta, embora em grande parte seja absorvida pela atmosfera terrestre, é a radiação responsável pelas quei- maduras solares. A radiação solar que consegue passar pela atmosfera se movimenta li- vremente até atingir um objeto. Segundo Brown e Dekay (2007), ao atingir uma superfície, como a cobertura de um edifício, parte da energia contida na radiação é absorvida pelo material enquanto o restante é refletido, voltando para a atmosfera. No Quadro 1, você pode ver uma relação entre a absortância e a refletância de um material. Observe que a soma dos dois atributos sempre é igual a 100, ou seja, um material que absorve 50% da radiação obrigatoriamente reflete os outros 50%. Veja como a tinta preta fosca absorve incríveis 95% dos raios, refletindo apenas 5%, enquanto a película aluminizada Mylar, é praticamente o oposto, absorvendo apenas 10% dos raios e refletindo 90% de volta para a atmosfera. Cor/material Absortância Refletância Tinta preta fosca ótica 0,98 0,02 Tinta preta fosca 0,95 0,05 Verniz preto 0,92 0,08 Tinta chumbo 0,91 0,09 Concreto preto 0,91 0,09 Verniz azul-escuro 0,91 0,09 Tinta a óleo preta 0,90 0,10 Tijolos azuis tipo Stafford 0,89 0,11 Tinta fosca oliva-escuro 0,89 0,11 Tinta marrom-escuro 0,88 0,12 Tinta azul-escuro-acinzentado 0,88 0,12 Quadro 1. Absortância e refletância solar dos acabamentos (Continua) 13Variáveis do comportamento térmico em ambientes residenciais e de serviços Fonte: Adaptado de Brown e Dekay (2007). Cor/material Absortância Refletância Azul-celeste/verniz verde-escuro 0,88 0,12 Concreto marrom 0,85 0,15 Tinta marrom 0,84 0,16 Tinta marrom-claro 0,80 0,20 Verniz marrom ou verde 0,79 0,21 Tinta anticorrosiva 0,78 0,22 Tinta a óleo cinza-claro 0,75 0,25 Tinta a óleo vermelha 0,74 0,26 Tijolos cor natural 0,70 0,30 Concreto cor natural 0,65 0,35 Tijolos laranja levemente claro 0,60 0,40 Tinta verde fosca 0,59 0,41 Tinta laranja 0,58 0,42 Tinta amarela 0,57 0,43 Tinta azul 0,51 0,49 Tinta verde-médio 0,51 0,49 Tinta verde-claro 0,47 0,53 Tinta branca semibrilho 0,30 0,70 Tinta branca brilho 0,25 0,75 Tinta prateada 0,25 0,75 Verniz branco 0,21 0,79 Refletor de alumínio polido 0,12 0,88 Película Mylar aluminizada 0,10 0,90 Acabamentos especiais (laboratórios) 0,02 0,98 Quadro 1. Absortância e refletância solar dos acabamentos (Continuação) Variáveis do comportamento térmico em ambientes residenciais e de serviços14 A transmissão do calor de um objeto aquecido por radiação solar não é, no entanto, um fator isolado nas construções. Para que exista o aquecimento de um ambiente, é preciso que o material aquecido tenha uma resistência térmica baixa. A resistência térmica é a medida do valor de isolamento ou da resistência ao fluxo de calor dos materiais ou elementos construtivos, ou seja, é a capacidade de um material de transmitir calor (BROWN; DEKAY, 2007). O Sistema Internacional de Medidas adota a sigla SRI para designar a resistência térmica, que é medida em K/W pela área analisada. No Quadro 2, você pode ver o RSI de alguns materiais utilizados na construção civil. Observe, no Quadro 2, como existe uma diferença considerável entre os três tipos de isolantes. enquanto os isolantes para enchimento variam de 0,10 para os materiais mais simples como a palha prensada até 0,30 para compostos industrializados, a exemplo da lã de vidro de alto desempenho, os isolantes superficiais rígidos partem de 0,20 para as placas de lã mineral e chegam até 0,49 nos materiais complexos, como os painéis de poliisocianuratocom revestimento. Tipo de isolante RSI por centímetro (– R por polegada) Isolantes para enchimento Palha prensada 0,10 (1,5) Algodão prensado ou em fibras soltas 0,21–0,26 (3,0–3,7) Lã de vidro ou fibra de vidro prensada 0,20–0,26 (2,9–3,8) Lã de vidro ou fibra de vidro prensada de alto desempenho 0,26–0,30 (3,7–4,3) Fibras de vidro soltas 0,16–0,19 (2,3–2,7) Fibras soltas de lã de rocha 0,19–0,21 (2,7–3,0) Fibras soltas de celulose 0,24–0,26 (3,4–3,7) Perlita ou vermiculita 0,17–0,26 (2,4–3,7) Quadro 2. Valores de resistência dos materiais isolantes (Continua) 15Variáveis do comportamento térmico em ambientes residenciais e de serviços Fonte: Adaptado de Brown e Dekay (2007). Tipo de isolante RSI por centímetro (– R por polegada) Isolantes para enchimento (em espuma) Celulose borrifada 0,20–0,24 (2,9–3,5) Fibra de vidro borrifada 0,26–0,27 (3,7–3,9) Espuma de cementite 0,27 (3,9) Espuma de poliuretano borrifada 0,39–0,44 (5,6–6,3) Isolantes superficiais rígidos Placas de lã mineral 0,20 (2,9) Painéis de poliestireno expandido 0,25–0,28 (3,6–4,0) Painéis de fibra de vidro 0,28 (4) Icynene 0,27 (4,3) Painéis de poliestireno extrudado, sem revestimento 0,31–0,35 (4,5–5,0) Painéis de poliisocianurato, com revestimento 0,49 (7,0) Quadro 2. Valores de resistência dos materiais isolantes (Continuação) A perda de calor em casas nos meses mais frios — e consequente ganho térmico nos meses mais quentes — depende tanto da condução quanto da radiação (BAUER; WESTFALL; DIAS, 2013), demandando a combinação entre isolamento térmico e revestimentos com refletância elevada. Atualmente, as novas técnicas construtivas miram na elevação da eficiência do isolamento, utilizando barreiras radiantes. Isso significa utilizar uma camada de um material que reflete eficientemente as ondas eletromagnéticas, especialmente a radiação infravermelha, relacionada com a sensação de calor (BAUER; WESTFALL; DIAS, 2013). Variáveis do comportamento térmico em ambientes residenciais e de serviços16 Na Figura 7, você pode ver um exemplo de como a combinação entre dife- rentes materiais é uma das estratégias mais acertadas para garantir uma inércia térmica satisfatória. Na ilustração, é possível observar que, na cobertura, são utilizadas telhas e isolamento com fator R de R–30, em uma combinação que torna o conjunto mais eficiente do que apenas o uso de telhas. Nas paredes, o mesmo princípio é aplicado, combinando os tijolos externos e isolamento com fator R de R–19 separados pela mesma barreira radiante que separa telhas e estrutura do telhado. A substância refletora normalmente é o alumínio ou algum material revestido com ele, já que esse material reflete 97% da radiação infravermelha. Figura 7. Cobertura e paredes com materiais compostos. Fonte: Bauer, Westfall e Dias (2013, p. 192). 17Variáveis do comportamento térmico em ambientes residenciais e de serviços Bauer, Westfall e Dias (2013) demonstram a importância do uso de barreiras radiantes citando estudos do Laboratório Nacional de Oak Ridge, na Flórida, Estados Unidos, que compararam residências da região construídas com e sem o uso de tais elementos. Segundo os autores, os ganhos de calor no verão “[...] em telhados com isolamento R–19 podem ser reduzidos entre 16 e 42%” (BAUER; WESTFALL; DIAS, 2013, p. ??), levando a uma redução nos gastos com condicionamento de ar na faixa de 17%. Para as coberturas, tanto o isolamento resistivo quanto o refletivo são amplamente utilizados. O exemplo da Figura 7 demonstra o uso de um tipo resistivo, que é a utilização de isolamentos na parcela interna do telhado, nor- malmente compostos por lã de vidro, de rocha ou outros materiais derivados de polímeros. Esse tipo de solução normalmente é dado quando do projeto das coberturas, pois sua instalação é feita acima dos forros, sendo necessário, portanto, que seja feita antes da construção dos forros. Verifique, na Figura 8, a instalação desse tipo de isolamento. Figura 8. Isolamento de cobertura por lã de rocha. Após a fixação da manta, é possível instalar o forro. Fonte: (a) Sanit Ratsameephot/Shutterstock.com; (b) Patryk Kosmider/Shutterstock.com. (a) (b) Embora a instalação de materiais isolantes refletivos, como a manta de alumínio, também seja indicada na parte interna, isto é, abaixo das telhas, o material pode também ser aplicado posteriormente à construção da edificação. É muito comum a aplicação de mantas térmicas com capa de alumínio em coberturas acima das telhas. Conforme visto, as características reflexivas do alumínio são muito eficazes impedindo a penetração do espectro infravermelho das ondas do Sol. Variáveis do comportamento térmico em ambientes residenciais e de serviços18 Outro material que vem ganhando mercado na construção brasileira para a mesma finalidade são as tintas térmicas. Por ter efeito estético mais agradável do que o alumínio, esta tecnologia tem caído no gosto dos consumidores que precisam isolar as suas coberturas após a sua construção. Com o corrente uso de isolantes refletivos, algumas empresas de telha passaram a incluí-lo no processo de fabricação das telhas. Assim como as chamadas telhas sanduíche (que têm material isolante térmico entre duas camas de telhas metálicas, formando um sanduíche), as telhas com camada de alumínio já podem ser compradas prontas, agilizando o processo construtivo. Por ser um material pesado, o isolamento capacitivo é pouco usado em coberturas. Para aplicar os materiais de construção com suas respectivas propriedades térmicas, é necessário que se estude o clima de implantação da edificação e, a partir daí, combinar as melhores soluções, que, além de serem competentes para telhado e paredes, configurem uma solução estética aprazível. Por exemplo, em uma região quente e seca, é indicado que se use um bom isolamento no telhado, para que a radiação infravermelha seja impedida de entrar, preservando o frescor interno. As cores claras auxiliam na reflexão da luz. As paredes podem permitir a passagem de ventos, porém podem apresentar elementos construtivos que filtrem os raios do Sol diretos, como brises. Como você pode ver, as propriedades dos materiais utilizados nas constru- ções têm influência direta na qualidade ambiental e na eficiência energética das edificações. Enquanto, nas paredes, essa escolha pode ser mitigada por dispositivos de projeto como beirais e aberturas generosas, as coberturas geralmente têm apenas a sua própria geometria e o material das quais são formadas para performar de maneira eficiente. Em seus próximos projetos, lembre-se de utilizar materiais que contribuam positivamente para o conforto térmico dos usuários. 19Variáveis do comportamento térmico em ambientes residenciais e de serviços ALVARES, C. A. et al. Köppen's climate classification map for Brazil. Meteorologische Zeitschrift, v. 22, n. 6, p. 711–728, 2013. BAUER, W.; WESTFALL, G. D.; DIAS, H. Física para universitários: relatividade, oscilações, ondas e calor. Porto Alegre: AMGH, 2013. BROWN, G. Z.; DEKAY, G. Sol, vento e luz: estratégias para o projeto de arquitetura. Porto Alegre: Bookman, 2007. CHRISTOPHERSON, R.; BIRKELAND, G. H. Geossistemas: uma introdução à geografia física. 9. ed. Porto Alegre: Bookman, 2017. COSTA, L. Sobre arquitetura. Porto Alegre: CEUA, 1962. HEWITT, P. G. Física conceitual. Porto Alegre: Bookman, 2015 INSTITUTO DE PESQUISAS TECNOLÓGICAS. Caracterização de produtos isolantes térmi- cos para a indústria e construção. São Paulo, 2020. Disponível em: https://www.ipt.br/ solucoes/184-caracterizacao_de_produtos_isolantes_termicos_para_industria_e_ construcao_civil.htm. Acesso em: 9 abr. 2020. MAHFUZ, E. da C. Observações sobre o formalismo de Helio Piñón: parte 1. Vitruvius Arquitextos, ano 08, out. 2007. Disponível em: https://www.vitruvius.com.br/revistas/ read/arquitextos/08.089/196. Acesso em: 9 abr. 2020. MASCARÓ, J. L. (org.). O custo das decisões arquitetônicas. Porto Alegre:Masquatro Editora, 2004. ROAF, S. Ecohouse. 4. ed. Porto Alegre: Bookman, 2014. ZEIN, R. V. Leituras críticas. São Paulo: Romano Guerra Editora, 2018. Leituras recomendadas ANDRADE, V. Andrade Morettin: cadernos de arquitetura. São Paulo: Bei Comunicação, 2016. JOURDA, F.-H. Pequeno manual do projeto sustentável. São Paulo: Gustavo Gili, 2013. Variáveis do comportamento térmico em ambientes residenciais e de serviços20 Os links para sites da web fornecidos neste capítulo foram todos testados, e seu fun- cionamento foi comprovado no momento da publicação do material. No entanto, a rede é extremamente dinâmica; suas páginas estão constantemente mudando de local e conteúdo. Assim, os editores declaram não ter qualquer responsabilidade sobre qualidade, precisão ou integralidade das informações referidas em tais links. 21Variáveis do comportamento térmico em ambientes residenciais e de serviços
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