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O texto que nos foi proposto “Ordem Jurídica e Ordem Econômica, Direito Estatal e Extra-Estatal – por Max Weber”, inicia com o autor deixando bem claro sua intenção, ao afirmar que: “quando se fala de "Direito", "ordem jurídica" e "norma jurídica", deve-se observar muito rigorosamente a diferença entre os pontos de vista jurídico e sociológico. Quanto ao primeiro, cabe perguntar o que idealmente se entende por direito. Isto é, que significado, ou seja, que sentido normativo, deveria corresponder, de modo logicamente correto, a um complexo verbal que se apresenta como norma jurídica. Quanto ao último, ao contrário, cabe perguntar o que de fato ocorre, dado que existe a probabilidade de as pessoas participantes nas ações da comunidade especialmente aquelas em cujas mãos está uma porção socialmente relevante de influência efetiva sobre essas ações, considerarem subjetivamente determinadas ordens como válidas e assim as tratarem, orientando, portanto, por elas suas condutas". Preliminarmente, antes de avançarmos no texto propriamente dito, é importante que se comente que o autor (Max Weber) pregava a ideia de que “a lei não poderia criar efetivamente o Direito, visto que tal tarefa era destinada ao órgão vivo, ao elemento subjetivo do Direito, o juiz (giurisprudenzia). Deste modo, qualquer ciência que fosse válida deveria pautar-se nos acontecimentos da realidade, nos elementos empiricamente constatáveis. Com tais formulações, criticavam severamente a ciência jurídica dos juristas que somente se atinham às leis formalmente criadas pelo legislador. Além do mais, tais pensadores reivindicavam a função judicial como a verdadeira fonte de Direito, visto que se tratava de efetivamente aplicar uma norma abstrata ao mundo fático, função esta materializadora do Direito e que alcançava, portanto, fins práticos. Propunham, assim, a livre criação do Direito por parte do magistrado, além de defenderem a ideia de que a Sociologia do Direito seria a única e verdadeira ciência de estudo do Direito, por ser a única que se voltava a atingir ao escopo do próprio Direito, que é a transformação do mundo fático. (Silveira, 2006). E, não menos importante, dentro do contexto desse estudo, é importante dentro das várias vertentes já desenvolvidas para classificar o capitalismo, tendo como base as teorias de Max Weber, poder-se-ia utilizar a título de complementação, a que diz ser um sistema em que “as relações econômicas e sociais são governadas por contrato, em que os homens são agentes livres na busca de sua subsistência [...]. o capitalismo torna-se assim, virtualmente sinônimo de um regime de laissez-faire e, em alguns usos do termo, de um regime de livre concorrência”. (DOBBE, 1988). Observamos que a investigação sociológica do direito, proposta pelo autor, não se atem ao sentido normativo à que deve corresponder uma norma jurídica, mas àquela ordem que uma comunidade considera subjetivamente como válida e pela qual orienta sua conduta prática. Portanto, o objeto da análise sociológica não serão as normas, mas as ações sociais concretas orientadas por uma ordem jurídica. Desta forma, na teoria weberiana, estabelece-se, sociologicamente, uma relação entre ordem jurídica, direito e comportamento social. Essa relação se faz possível na medida em que os limites que orientam e motivam as ações definem-se, não no âmbito dos valores e crenças, puramente interiores aos indivíduos que compõem uma comunidade, mas por expectativas de comportamentos pretendidos pela comunidade, a partir de valores cultivados socialmente e garantidos por um aparato jurídico que coage os indivíduos. O conceito de Direito em Weber, está assim associado ao poder de coação física e psíquica que este deve exercer de forma exterior ao indivíduo, não podendo assim se confundir ao costume ou a convenção. Estes últimos estariam relacionados à ética e a moral, fugindo ao campo de estudo da sociologia. (ALMEIDA, 2005) Depreende-se da passagem comentada no 1º parágrafo, que o autor (Weber) reduz a tensão entre Dogmática Jurídica e Sociologia do Direito a um cariz estritamente metodológico. Ele considera que quando tratamos da primeira ciência servimo-nos do método lógico-normativo, ao passo que na segunda utiliza-se o método empírico-causal, este típico da Sociologia. Segundo ele, o método lógico-normativo possui a finalidade de verificar no interior de um "cosmos de regras abstratas" suas regras de validade, realizando uma verificação de compatibilidade lógica das normas em um ordenamento. Esta operação, portanto, situa-se no plano ideal, ou seja, no pensamento racional, no plano das ideias. Já o método empírico-causal investiga o comportamento dos indivíduos frente a um sistema de regras, avaliando a potencialidade de suas condutas subsumirem aquelas disposições, ou ainda, orientarem-se segundo o conteúdo da norma, ainda que não cumprindo o disposto nela. O fato é que a Dogmático-jurídica para Weber possui uma peculiaridade especial: ela situa-se na esfera do dever-ser (Sollen), porquanto lida com a forma de melhor regular (prescrever) condutas e organizá-las sistemática e logicamente, de modo a criar um sistema isento de contradições e exigível perante seus destinatários. Vejamos o que ele mesmo (Weber) nos ensina a respeito da “Dogmático-jurídica” "[...] propõe-se a tarefa de investigar o sentido correto de normas cujo conteúdo apresenta-se como uma ordem que pretende ser determinante para o comportamento de um círculo de pessoas de alguma forma definido, isto é, de investigar as situações efetivas sujeitas a essa ordem e o modo como isso ocorre". Também através da obra Weberiana, por outro lado, podemos entender por Sociologia Jurídica “o estudo do comportamento dos indivíduos frente às normas vigentes e à determinação do grau em que se verifica a orientação dos homens por esse conjunto de leis (ordem legítima)”. A tarefa sociológica na seara do Direito atém-se a investigar, no plano da realidade, do acontecer fático, o que sucede no comportamento das pessoas que se submetem a um ordenamento e de que maneira verifica-se sua orientação segundo esta ordem legítima. "A Sociologia Jurídica tem por objeto compreender o comportamento significativo dos membros de um grupamento quanto às leis em vigor e determinar o sentido da crença em sua validade ou na ordem que elas estabeleceram. Procura, pois, apreender até que ponto as regras de direito são observadas, e como os indivíduos orientam de acordo com elas a sua conduta". (Freund, 2000, p. 178) Podemos observar uma perene preocupação de Weber em situar esses limites específicos, destina-se a não permitir a confusão entre aqueles assuntos referentes aos aspectos normativos e aqueles situados no acontecer social (empíricos). Tal tarefa decorre da diferenciação quanto às regras do "ser" (Sein) e do "dever-ser" (Sollen), de tradição kantiana, na qual o comportamento humano orientado conforme a norma atuar este que se situa no plano do "ser", da realidade fática é de incumbência de estudo da Sociologia Jurídica; ao passo que as regras jurídicas, a forma de sua criação, seu conteúdo a ser prescrito, sua organização em um sistema lógico interno, isento de contradições, seriam da alçada da Dogmática Jurídica, visto que se situam na esfera do "dever-ser". Nesse sentido, fica evidente tal consideração quando nos reportamos ao próprio autor, quando ele assevera com propriedade: "[...] a ordem jurídica ideal da teoria do direito [leia-se aqui Dogmática Jurídica] não tem diretamente nada a ver com o cosmos das ações [...] efetivas [objeto da Sociologia Jurídica], uma vez que ambos se encontram em planos diferentes: a primeira, no plano ideal de vigência pretendida; o segundo, no dos acontecimentos reais" (DULCE, 1989, p. 66) Há no presente estudo um ponto bem peculiar, todavia, queé necessário não se deixar obscurecer: a Sociologia Jurídica é responsável por investigar o comportamento dos indivíduos conforme um ordenamento jurídico posto (vigente), orientando-se por ele, para o cumprir ou o burlar. Um estelionatário, a fim de livrar-se do peso da lei, orienta-se segundo a norma com o fito de escapar- lhe. Ele visa aplicar a máxima diligência em não ser descoberto, porque ao orientar-se conforme a norma percebe que aquele comportamento é reprovável e sujeito à sanção. Atente-se, assim, para o fato de que a observância ou não observância normativa não é requisito essencial para determinar o que é e o que não é tarefa da Sociologia Jurídica investigar. Assim, basta a ação do indivíduo conforme a ordem prescrita para que encontremos matéria de análise. Como Weber explica: "O fato de pessoas quaisquer se comportarem de determinada forma porque a consideram prescrita por normas jurídicas é, sem dúvida, um componente essencial da gênese real empírica, e também da perduração, de uma 'ordem jurídica'" E, em outro trecho, ele completa essa sua ideia: "Também é desnecessário dizer que todos os que compartilham a convicção do caráter normativo de determinadas condutas vivam sempre de acordo com isso. Isso também nunca ocorre [...]. O 'Direito' é para nós [segundo a ótica da Sociologia Jurídica] uma 'ordem' com certas garantias específicas da probabilidade de sua vigência empírica" Sobre a Subjetividade do Direito e o Direito garantido, Weber procura entender até que ponto as regras do Direito são observadas e como os indivíduos orientam de acordo com elas a sua conduta. O conceito de subjetividade no Direito é o ponto de partida para uma visão da sociologia jurídica que procura demonstrar um relativismo e rebela-se contra o dogmatismo normativo da sociologia positivista. No direito subjetivo, o centro do sistema é o agente social com atividade suficiente para compreender ou não o texto legal e, principalmente, aceitá-lo ou não, para emitir respostas concretas que podem ou não agradar ao sistema. O direito subjetivo é, portanto, um ícone à liberdade e à igualdade, à democratização do sistema jurídico. Do ponto de vista jurídico, um direito moderno compõe-se de disposições jurídicas, isto é, normas abstratas com o conteúdo de que determinada situação, de fato, deva ter determinadas consequências jurídicas. A divisão mais corrente das "disposições jurídicas", como em todas as ordens, é a em normas "imperativas", "proibitivas" e "permissivas", das quais nascem os direitos subjetivos dos indivíduos de ordenar, proibir ou permitir aos outros determinadas ações. A este poder juridicamente garantido e limitado sobre as ações dos outros correspondem sociologicamente as seguintes expectativas: 1) que outras pessoas façam determinada coisa ou 2) que deixem de fazer determinada coisa - as duas formas de "pretensões" - ou 3) que uma pessoa pode fazer ou, se quiser, deixar de fazer determinada coisa sem intervenção de terceiros: "autorizações". Todo direito subjetivo é uma fonte de poder que, no caso concreto, devido à existência da respectiva disposição jurídica, pode também ser concedida a alguém que sem esta disposição seria totalmente impotente. Já por isso, a disposição jurídica é uma fonte de situações inteiramente novas no interior da ação social. (WEBER, 2004). Desse modo, para Weber, o direito é garantido, pois o cidadão só se submete a um tipo de “Medo controlado” que o sistema lhe inculca, se houver uma contrapartida. É com base nesta projeção, que se legitima uma norma e o conjunto do ordenamento jurídico, como algo que está lá para lhe favorecer de algum modo. A coerção física é transformada em coerção jurídica. O domínio do estado sobre seus cidadãos, de forma controlada em troca de favores e interesses reais e futuros, Weber denominou Dominação Racional Legal. (SHIRAISHI, 2016) Podemos concluir que o mérito maior de Weber, ao que parece, foi o de distinguir o âmbito de atuação de cada um desses ramos do conhecimento, a saber, a Dogmática Jurídica e a Sociologia do Direito. Também se prestou, na mesma medida, a elucidar quais as metodologias a lógico-normativa e a empírico-causal de que ambas as ciências valiam-se para entender seus objetos específicos. DOBB, Maurice. A evolução do capitalismo. Tradução de Manuel do Rêgo Braga. 3. ed. São Paulo: Nova Cultural, 1988. SHERMAN, Howard J. História do pensamento econômico. Tradução de Jaime Larry Benchimol. 13. ed. Rio de Janeiro: Vozes, 1995 SINGER, Paul. O capitalismo. Sua evolução, sua lógica e sua dinâmica. São Paulo: Moderna, 1987. WEBER, Max. A ética protestante e o “espírito” do capitalismo. Tradução de José Marcos Mariani de Macedo. São Paulo: Companhia das Letras, 2004.
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