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Autor: Prof. Herbert Gonçalves Espuny Colaboradores: Prof. Ricardo Martins Profa. Angélica Carlini Gerenciamento de Crises e Controle de Riscos Professor conteudista: Herbert Gonçalves Espuny Administrador, registrado no Conselho Regional de Administração de São Paulo (CRA-SP). Graduado em Direito. Coordenador do curso de pós-graduação lato sensu em Engenharia de Produção na UNIP. Coordenador do curso de especialização em Atividade de Inteligência, na modalidade EaD na UNIP. Coordenador do Curso de Logística EaD. Professor titular no curso de bacharelado em Administração e professor profissionalizante IV em cursos de graduação tecnológica, na UNIP. Doutor na área de Engenharia de Produção, área de concentração em Gestão de Sistemas de Operação e linha de pesquisa centrada nas Redes de Empresas e Planejamento da Produção, com pesquisa específica na área de Produção de Conhecimento Estratégico (Inteligência) pela UNIP. Mestre no programa interdisciplinar Adolescentes em Conflito com a Lei pela Universidade Bandeirante de São Paulo (Uniban). Especialista nas áreas de Direito Constitucional e Administrativo e Direito Corporativo e Compliance (Escola Paulista de Direito – EPD), Segurança Empresarial (Universidade Anhembi-Morumbi), Segurança Pública (Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo), Inteligência de Segurança Pública (Universidade Sul de Santa Catarina), Educação a Distância (Universidade Federal Fluminense) e História das Culturas Afro-Brasileiras (FTC). Membro da Associação Brasileira de Profissionais de Segurança (ABSEG). © Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta obra pode ser reproduzida ou transmitida por qualquer forma e/ou quaisquer meios (eletrônico, incluindo fotocópia e gravação) ou arquivada em qualquer sistema ou banco de dados sem permissão escrita da Universidade Paulista. Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) E77g Espuny, Herbert Gonçalves. Gerenciamento de Crises e Controle de Riscos / Herbert Gonçalves Espuny. – São Paulo: Editora Sol, 2020. 152 p., il. Nota: este volume está publicado nos Cadernos de Estudos e Pesquisas da UNIP, Série Didática, ISSN 1517-9230. 1. Controle de riscos. 2. Crises. 3. Gerenciamento. I.Título CDU 658 U505.22 – 20 Prof. Dr. João Carlos Di Genio Reitor Prof. Fábio Romeu de Carvalho Vice-Reitor de Planejamento, Administração e Finanças Profa. Melânia Dalla Torre Vice-Reitora de Unidades Universitárias Prof. Dr. Yugo Okida Vice-Reitor de Pós-Graduação e Pesquisa Profa. Dra. Marília Ancona-Lopez Vice-Reitora de Graduação Unip Interativa – EaD Profa. Elisabete Brihy Prof. Marcelo Souza Prof. Dr. Luiz Felipe Scabar Prof. Ivan Daliberto Frugoli Material Didático – EaD Comissão editorial: Dra. Angélica L. Carlini (UNIP) Dra. Divane Alves da Silva (UNIP) Dr. Ivan Dias da Motta (CESUMAR) Dra. Kátia Mosorov Alonso (UFMT) Dra. Valéria de Carvalho (UNIP) Apoio: Profa. Cláudia Regina Baptista – EaD Profa. Betisa Malaman – Comissão de Qualificação e Avaliação de Cursos Projeto gráfico: Prof. Alexandre Ponzetto Revisão: Vera Saad Lucas Ricardi Sumário Gerenciamento de Crises e Controle de Riscos APRESENTAÇÃO ......................................................................................................................................................7 INTRODUÇÃO ...........................................................................................................................................................7 Unidade I 1 CRISES E GERENCIAMENTO DE CRISES .....................................................................................................9 1.1 Definição de crise ....................................................................................................................................9 1.2 Tipos de crise .......................................................................................................................................... 14 1.3 Observações importantes na questão de crises ....................................................................... 20 1.4 Comitê de crises .................................................................................................................................... 22 2 PLANEJAMENTO NA ÁREA DE CRISES .................................................................................................... 25 2.1 Princípios organizacionais para o gerenciamento de crises ............................................... 26 2.1.1 Princípio da prevenção ......................................................................................................................... 26 2.1.2 Princípio da estrita legalidade ........................................................................................................... 32 2.1.3 Princípio da qualidade .......................................................................................................................... 33 2.1.4 Princípio da ética e da moralidade .................................................................................................. 34 2.1.5 Princípio da interdisciplinaridade .................................................................................................... 35 2.2 Iniciativas da organização: vacinas contra crises ................................................................... 36 2.2.1 NRs: prevenção para todo e qualquer tipo de crise ................................................................. 36 2.2.2 Governança corporativa ...................................................................................................................... 39 2.2.3 Compliance ................................................................................................................................................ 40 2.2.4 Inteligência nas organizações ........................................................................................................... 40 Unidade II 3 OPERAÇÕES DURANTE AS CRISES ........................................................................................................... 45 3.1 Equipe de gerenciamento da crise e conceitos iniciais ........................................................ 46 3.2 Contenção de crises nas áreas econômica, financeira e/ou patrimonial ...................... 51 3.3 Contenção de crises decorrentes de desastres naturais ou de falhas em equipamentos ........................................................................................................................................ 53 3.4 Contenção de crises diversas ........................................................................................................... 58 3.4.1 Ações criminosas ..................................................................................................................................... 58 3.4.2 Questões legais ........................................................................................................................................ 63 3.4.3 Boatos sem fundamentos ................................................................................................................... 64 3.4.4 Reputação .................................................................................................................................................. 65 4 COMUNICAÇÃO NAS CRISES ...................................................................................................................... 66 4.1 Problemas de comunicação nas crises ........................................................................................ 67 4.2 Elementos importantes na comunicação de crises ................................................................ 71 Unidade III 5 INTRODUÇÃO À ANÁLISE DE RISCOS ...................................................................................................... 77 5.1 O que é risco e elementos da análise de riscos ........................................................................77 5.2 Elementos complementares da análise de risco ...................................................................... 83 5.3 Fontes para estudos da gestão de riscos .................................................................................... 86 5.3.1 Orange book .............................................................................................................................................. 92 6 TÉCNICAS DE ANÁLISES DE RISCOS ........................................................................................................ 94 6.1 Considerações básicas sobre as análises de riscos .................................................................. 94 6.2 Exemplos práticos de análises de riscos ....................................................................................100 Unidade IV 7 PONTOS COMPLEMENTARES DA ANÁLISE DE RISCOS ...................................................................111 7.1 Gestão de continuidade de negócios .........................................................................................111 7.2 Tratamentos do risco ........................................................................................................................116 8 FERRAMENTAS E PROGRAMAS DE CONTROLE .................................................................................119 8.1 Técnicas e ferramentas auxiliares ................................................................................................119 8.1.1 Análise preliminar de perigo (APP) ................................................................................................ 119 8.1.2 Análise de riscos e operabilidade (Hazop) ..................................................................................121 8.1.3 Análise pela árvore de causas (AAC), análise por árvore de falhas (AAF) e análise por árvore de eventos (AAE) .................................................................................................... 122 8.1.4 Análise dos modos de falhas e efeitos (Amfe) ......................................................................... 123 8.1.5 E se? What if? ........................................................................................................................................ 124 8.1.6 Lista de verificação .............................................................................................................................. 125 8.1.7 Técnica do incidente crítico (TIC) .................................................................................................. 125 8.1.8 Análise pela matriz das interações ............................................................................................... 126 8.1.9 Inspeção planejada (IP) ..................................................................................................................... 128 8.1.10 Registro e análise de ocorrências (RAO) .................................................................................. 128 8.2 Exemplo de gestão de riscos ..........................................................................................................128 7 APRESENTAÇÃO Os gestores em geral e, especificamente, os gestores de segurança estão voltados para situações que envolvam crises. Tais crises podem se instalar nas mais variadas instâncias da organização e em contextos que gerem seríssimas preocupações: a segurança dos funcionários, dos clientes e das instalações. A área da segurança empresarial pode envolver decisões que identifiquem as melhores formas e os melhores caminhos para lidar com ameaças, como explosões e crimes perpetrados no interior da organização ou durante o transporte de valores. Mas o fundamental é a preparação do gestor para esse tipo de situação. Pretendemos apresentar ao aluno os principais problemas relacionados a situações de crise, bem como fornecer ferramentas para lidar com elas. Além de aprender a lidar com situações de crises, o gestor também aprenderá a lidar com riscos. Mapear determinadas situações antecipadamente, verificar quais as medidas preventivas e corretivas relacionadas e desenvolver atitudes adequadas para o enfrentamento dos riscos permite que uma organização seja mais segura e profícua. O material apresentado traz as bases necessárias para uma gestão de crises e de riscos eficiente, eficaz e efetiva. Traz, ainda, uma série de artigos e trabalhos que o aluno deve consultar, seja para aprofundar-se em determinados temas, seja para desenvolver um pensamento sistêmico na área. INTRODUÇÃO O gestor que se dedica ao gerenciamento de crises e à análise de riscos tem responsabilidades importantes: precisa saber lidar com situações estressantes, dar as orientações corretas em situações muitas vezes inesperadas e saber como responder de forma preventiva e corretiva em uma série de circunstâncias. Não são tarefas fáceis. Dependem de muito estudo e dedicação. Por este livro os estudantes aprenderão os fundamentos e os tipos de crises e como lidar com cada uma delas. Entenderão os fundamentos operacionais, táticos e estratégicos para encaminhar, da melhor maneira, situações que podem gerar danos significativos para a organização. Também estudarão sobre gestão de riscos. A análise e a gestão de riscos ajudam a prevenir situações de crise, de forma que quanto mais efetivas tais atividades, menor a probabilidade de as organizações estarem expostas às situações de crise. A gestão de riscos e de crises são atividades que se completam, na medida em que uma influencia a outra. São atividades que salvam vidas, patrimônio e reputações. São atividades imprescindíveis nas organizações modernas. Atividades diretamente ligadas à gestão de segurança e de continuidade de negócios. Cada capítulo trará links de artigos de interesse que complementam o que é tratado. Artigos selecionados, que representam pesquisas e estudos da área. Leia cada um deles e complemente seu conhecimento no assunto. 9 GERENCIAMENTO DE CRISES E CONTROLE DE RISCOS Unidade I 1 CRISES E GERENCIAMENTO DE CRISES A gestão nas organizações, seja pública ou privada, está condicionada a uma série de princípios que nem sempre estão bem estabelecidos em algumas áreas específicas. E por que isso ocorre? Por algumas razões bastante simples, mas que permeiam o nosso dia a dia. A rotina acaba ocupando boa parte das reflexões. Aquilo que é exigido imediatamente, como parte das atividades diárias, muitas vezes “aprisiona” o gestor, que acaba deixando de pensar em situações hipotéticas. De forma geral, o gestor intui que precisa saber agir em situações inesperadas, críticas, conhecidas como situações de crise. Contudo, tal pensamento acaba se perdendo em possíveis generalizações, perdendo a condição de pensar concretamente nos problemas da organização. Apenas para exemplificar: todo gestor sabe que um mau atendimento aos clientes pode gerar uma crise de imagem para a empresa. Mas pensar nos possíveis detalhes desencadeadores de tal atendimento inadequado, elencar as possíveis motivações para o fato, tais como falta de treinamento do atendente, falta de estudo das diversas possibilidades de problemas a que o consumidor esteja sujeito (especialmente em problemas raros, que não acontecem com frequência etc.), além de outras vertentes, pode não ser uma tarefa fácil. Caldini (2000, p. 116) exemplifica bem o que foi abordado anteriormente: São duas e meia da manhã. Você é acordado pelo chefe de segurança de sua empresa. Uma caldeira explodiu. Cinco mortos e dois feridos. A imprensa já está na porta da fábrica. Você está preparado para enfrentar a opinião pública e os repórteres? Um problema, por mais grave que seja, enquanto é interno à organização é apenas um problema. Quando atravessa os portões e escandaliza, quando chega à imprensa e ao público, torna-se uma crise. Sendo assim, estudar o gerenciamento de crises e a análise de riscos permite ao gestor desenvolver uma visão sistêmica dos problemas relacionados às áreasda organização que possam gerar tais situações. Inicialmente, serão abordados os conceitos e os diversos tipos de crise. 1.1 Definição de crise Segundo o Dicionário Etimológico: A palavra grega krísis era usada pelos médicos antigos com um sentido particular. Quando o doente, depois de medicado, entrava em crise, era sinal de que haveria um desfecho: a cura ou a morte. Crise significa separação, decisão, definição (DICIONÁRIO ETIMOLÓGICO, [s.d.]). 10 Unidade I Curiosamente, a antiga definição médica parece ser apropriada para contextualizar as crises nas organizações; conforme o desfecho, pode ter alta significância para os destinos da organização. O vocábulo crise apresenta definições em várias, conforme o Dicionário Online de Português (DICIO): 1. Mudança brusca produzida no estado de um doente, causada pela luta entre o agente agressor e os mecanismos de defesa. 2. Manifestação violenta, repentina e breve de; acesso: crise epilética. 3. Conjuntura socioeconômica problemática, desequilíbrio entre bens de produção e de consumo, normalmente definida pelo aumento dos preços, pelo excesso de desemprego, de falências: crise econômica. 4. [Figurado] Momento perigoso ou difícil; período de desordem. 5. [Figurado] Expressão de ausência, carência: crise de mão de obra. 6. Em que há decadência; queda: crise de moralidade. Para efeito dos estudos de gerenciamento de crises, algumas das definições expressas parecem ser apropriadas, especialmente nos seguintes contextos: • Conjuntura ou momento perigoso, difícil ou decisivo: situações em que a organização pode vivenciar – de forma passageira ou incidental –, mas que reflete ou pode refletir inclusive na sobrevivência da própria organização. Por exemplo, a empresa ou organização se envolver em corrupção. • Falta de alguma coisa considerada importante: situações em que a organização não dispõe de algo necessário e considerado prioritário. Por exemplo, um plano adequado para contingenciar algum problema. • Embaraço na marcha regular dos negócios: situações que atrapalhem o curso natural de uma empresa ou organização. Por exemplo, a interdição da única rodovia que permite o escoamento da produção de uma fábrica. Portanto, as situações elencadas podem trazer consequências bastante sérias. Os gestores devem mapeá-las e estudá-las antecipadamente, pois assim é mais fácil de lidar com cada uma concretamente, caso ocorra no âmbito da organização. Uma observação importante: muitas vezes o gestor, que conhece o gerenciamento de crises, trabalha numa empresa terceirizada. Essa empresa presta serviços para outras. Note que, em muitos casos, a organização contratante se aconselha com frequência com a empresa de segurança contratada a respeito de possíveis crises que esteja enfrentando. O gestor que sabe como lidar com crises não terá feito todo o estudo prévio necessário e, talvez, não consiga aconselhar de forma mais abrangente. Apenas para prevenir situações incômodas, entre contratante e contratado é importante destacar alguns pontos. 11 GERENCIAMENTO DE CRISES E CONTROLE DE RISCOS Há dúvidas sobre se a empresa de segurança contratada deve auxiliar e/ou assessorar em situações de gerenciamento de crises que não estejam diretamente voltadas para a atividade para as quais estão contratadas. Por exemplo, uma empresa é contratada para a segurança patrimonial e, de repente, um assaltante faz alguém na empresa de refém. Essa é uma situação que envolve o inesperado e a crise e está diretamente relacionada com a segurança patrimonial. Nesse caso, o treinamento do gestor de segurança privada tentará fazer com que o desfecho seja o menos traumático possível. Já na hipótese de a empresa estar envolvida num escândalo de corrupção, se ninguém da empresa estiver capacitado para gerir situações de crise de imagem, o gestor de segurança privada poderá auxiliá-los. Evidentemente, esse tipo de serviço deverá ter previsão contratual. Situações de crise precisam ser conduzidas com o conhecimento de preceitos administrativos e legais. Observe um ponto importante: o bem mais valorizado pela Constituição Federal de 1988 é a vida. Mesmo que a segurança patrimonial tenha a missão de defender o patrimônio da organização, nota-se que atitudes sem o devido reparo legal podem gerar consequências seríssimas. O ideal é que a prevenção seja sempre a orientação principal, para que fatos isolados não se constituam em problemas maiores. Essa questão será novamente abordada, com mais profundidade. Tais pontos devem ser sempre considerados, sob pena da ação que deveria evitar ou corrigir crises e se transformar ela própria numa crise para a organização. Por fim, é necessário considerar que a situação de crise tenha uma característica bem definida: que ela se instale dentro de um contexto absolutamente novo e independente da rotina da organização. Se a organização já sabe como lidar com um determinado problema, se já possui uma rotina de enfrentamento deste, se o evento se repete com frequência, não se trata exatamente de uma situação de crise. Por exemplo, se numa determinada empresa há vazamentos constantes em suas máquinas e isso é considerado rotina, não há como classificá-los de crise. Mas, se não é ocorrência frequente e se tal vazamento se instala repentinamente, capaz de atrasar a entrega de um cliente especial, por exemplo, daí sim é uma crise. Dinkin (2007, p. 49, tradução nossa) define bem esse contexto: A situação de crise não deve apenas ser repentina e exigir uma resposta em tempo oportuno; ela também deve requerer estratégias que sejam diferentes dos procedimentos normais de funcionamento da instituição. A crise é um evento raro que não faz parte do negócio orientado para a missão de uma organização. Se a situação pode ser controlada pelos procedimentos e serviços normalmente prestados pela organização, não pode ser considerada crise para efeito deste estudo. Dentro do contexto da ciência da administração é importante lembrar que a gestão de crises é o exercício de decisões não programadas, pois o evento crítico se instala de repente e está no conjunto de ocorrências não rotineiras. A esse respeito, Maximiano (2009, p. 108) enfatiza que “as decisões não programadas são preparadas uma a uma, para atacar problemas que as soluções padronizadas não conseguem resolver”. 12 Unidade I Essa especificidade, ou seja, essa natureza das situações de crise exige um preparo adicional do gestor: é preciso ter em mente que justamente por envolver situações inesperadas e não previstas é que o treinamento do pessoal de segurança do trabalho, do pessoal de segurança patrimonial e do corpo de funcionários em geral deve ser orientado para o atendimento a situações de crise. Toda a organização precisa vivenciar essa consciência. Por exemplo: um acidente na empresa que tenha como resultado um funcionário com queimaduras de segundo e terceiro graus. Para onde levá-lo? A informação de um hospital especializado nesse tipo de ocorrência facilita o trâmite e pode salvar a vida do acidentado. Outras situações podem influenciar de forma negativa numa ocorrência de crise: um segurança mal treinado pode causar problemas maiores que aquele que pretende resolver. Isso ocorre porque as características de um evento crítico concorrem para tais resultados. A surpresa é um dos fatores que permeiam os eventos críticos: a situação se instala de forma a surpreender a todos os envolvidos. O treinamento constante é um antídoto para esse problema. Contudo, muitas vezes, o aspecto emocional pode acabar anulando ou minimizando um bom treinamento. A ameaça oriunda de toda a situação de crise pode gerar estresse capaz de fazer com que os envolvidos tomem atitudes ilógicas ou não exatamente apropriadas para a situação. Além disso, há a questão do tempo: os envolvidos sabem que situações de crise exigem decisões que não raro estão condicionadas à questão do tempo. A figura a seguir contextualiza uma situação de crise: Atributos da criseTarefas na tomada de decisão Comportamento gerencial + + + + + - - - - - - - - - - - - - - - -- - - - + + + + + Surpresa Ameaça Stress Inflexibilidade na atitude Abrangência da atenção Perspectiva do tempo Resistência para aderir a mudanças Escolha entre as alternativas Análise e avaliação das alternativas e suas consequências Busca de informações sobre a situação e opções Importância de valores de curto prazo Sensibilidade à experiência dos outros Dependência de estereótipos Tolerância à ambiguidade Percepção estereotipada Apego a experiências passadas Sensibilidade aos sinais de perigo Filtragem seletiva das ações Pouco tempo de decisão Figura 1 – Contexto de situações de crises 13 GERENCIAMENTO DE CRISES E CONTROLE DE RISCOS Na figura anterior podemos observar que a surpresa, a ameaça e o pouco tempo de decisão, que são atributos da crise, geram o estresse que pode afetar no comportamento gerencial, tais como: • Abrangência da atenção: o gestor deve se concentrar nos detalhes do caso, não permitindo, por exemplo, que ideias pré-concebidas afetem seu julgamento. Experiências passadas podem ser positivas, desde que não prejudiquem o julgamento do evento corrente. • Inflexibilidade na atitude: a crise é um evento diferente dos eventos corriqueiros. O gestor deve estar atento às soluções próprias para o caso. Cuidado com atitudes inflexíveis que podem agravar a situação. • Perspectiva do tempo: as ações durante um evento crítico devem ser tempestivas, ou seja, devem atender à perspectiva do tempo. Se uma ação for demorada demais, pode não gerar o efeito necessário para conter ou minimizar a crise. Enfim, todo o processo consiste em: • Busca de informações: sobre a situação em todos os detalhes possíveis e as opções disponíveis. • Análises das opções e consequências: o gestor deve refletir sobre as possibilidades de ações que se apresentam e as possíveis consequências de cada uma, para estudar a melhor estratégia. • Escolha das alternativas: após as reflexões, o gestor deve decidir o melhor caminho. Evidentemente que o gestor deve fazer o papel de coordenador no trânsito de todo o processo. As crises são situações complexas que exigem análises não raro de vários setores e departamentos envolvidos. O grande objetivo é evitar que as atitudes relacionadas a um evento crítico acabem por gerar danos maiores. Saiba mais Leia a reportagem a seguir e reflita sobre essa questão: PIMENTEL, G.; OKADA, W. Vigilante que atirou em idoso em banco disse que “mirou na perna”, mas acertou a barriga. G1, São Paulo, 14 maio 2019. Disponível em: https://g1.globo.com/sp/sao-paulo/noticia/2019/05/14/ vigilante-que-atirou-em-idoso-em-banco-disse-que-mirou-na-perna- mas-acertou-a-barriga.ghtml. Acesso em: 30 out. 2019. 14 Unidade I 1.2 Tipos de crise Vários são os tipos de crises. Algumas apresentam características bastante próximas, como crises na área econômica e na área financeira. Por exemplo, a incapacidade de honrar credores em função da falta de dinheiro (crise financeira) provocada pela queda de faturamento nas vendas (crise econômica). Se a impossibilidade se estender a vários compromissos, pode se caracterizar uma crise patrimonial (obrigações superiores aos bens e direitos da organização). Nesses casos, o gestor de crises precisa de orientação bastante efetiva dos setores financeiro, contábil e de recursos patrimoniais e materiais da organização. É necessário saber exatamente se esse fluxo negativo de recursos para cumprir obrigações é devido a fatores sazonais (portanto, passageiros e superáveis) ou se a uma conjuntura mais consistente. As providências para retomar o equilíbrio – desde cortar custos, fechar filiais e cortar funcionários a mudar processos e racionalizar compras – serão baseadas nesse diagnóstico. Tais providências precisam ser tomadas com o apoio e a orientação do nível estratégico (direção) da organização e de certos departamentos (como os já citados contábil, financeiro, de recursos, de auditoria etc.). Outras crises podem ser geradas por acidentes ou incidentes. A seguir, as definições destes dois termos. Segundo o Dicionário on-line Houaiss-UOL, as definições de acidente: substantivo masculino 1 acontecimento casual, inesperado, fortuito ‹a descoberta da América foi um feliz a.› 1.1 qualquer acontecimento, desagradável ou infeliz, que envolva dano, perda, lesão, sofrimento ou morte ‹o a. matou a família inteira› 2 fato acessório; qualidade particular, pormenor ‹a pontualidade é um a. na sua rotina› [...] (HOUAISS-UOL). Já a definição para incidente: “Evento, fato que sobrevém no transcurso de um acontecimento principal” (HOUAISS-UOL). Pelas definições se depreende que o incidente tem uma relevância menor. Contudo, um incidente pode gerar um acidente. Por exemplo, um pneu furado pode representar um incidente no percurso. Mas, se o veículo que tiver o pneu furado perder a direção e bater em outros veículos, aí está representado o acidente. Stefan Santi (2009, p. 3) pontua que “os incidentes são os eventos que costumam ocorrer quando falhas menores são executadas”. Contudo, tais falhas menores podem gerar um acidente. Um exemplo é a chamada Teoria dos Dominós desenvolvida por Heinrich, ao analisar acidentes de segurança do trabalho. 15 GERENCIAMENTO DE CRISES E CONTROLE DE RISCOS Bruin (2019) esclarece que: Herbert William Heinrich foi considerado como um dos pioneiros da segurança industrial nos Estados Unidos. Nascido em 1886, faleceu em 22 de junho de 1962. Ele era o Superintendente Adjunto da Engenharia e Divisão de Inspeção de Travelers Insurance Company, quando publicou, em 1931, o seu livro Industrial accident prevention. No compêndio, Heinrich deixava muito claro o seu ponto de vista de que todo acidente teria uma causa ou várias delas e, em nenhuma hipótese, ele simplesmente acontecia. Combatia fortemente a tese da fatalidade. Heinrich imaginou demonstrar a ocorrência dos infortúnios com o auxílio de cinco pedras de dominós que representavam: a personalidade, as falhas humanas, as causas dos acidentes, o acidente em si e as lesões. Portanto, a ideia de que falhas menores podem gerar acidentes é a base da Teoria de Heinrich. Saint (2009, p. 14) ilustrou tal situação: Ambientes Fábricas ruins Descuido Falta de cuidado Atos impensados Acidente Danos Erros pessoais Figura 2 – Modelo Heinrich – Teoria dos Dominós A ilustração representa a ideia de que alguns incidentes (ambientes ruins, falta de cuidado em algumas operações e atos impensados) podem causar acidentes e, consequentemente, danos. Além dos tipos de crises já abordados, há ainda as crises provocadas por atos criminosos, por questões relacionadas aos aspectos legais, crises decorrentes de boatos e crises relacionadas à reputação da organização. Cada uma dessas crises tem especificidades e devem ser enfrentadas de forma diferente. Algumas precauções servem para evitar quase todas, como as medidas baseadas nos processos corretos das atividades da organização, garantindo que todos os aspectos técnicos e legais sejam cumpridos. Contudo, há crises dificilmente evitáveis, como as motivadas por condições da natureza inesperadas (tempestades severas, tufões etc.) ou motivadas por um acidente causado por terceiros. 16 Unidade I Há crises por questões de caráter legal, como as concernentes a processos judiciais (por exemplo, uma indenização alta a ser paga) ou as chamadas crises de reputação, em que fatos da organização se tornam públicos e venham a depor contra sua imagem. O quadro a seguir faz uma síntese dos possíveis tipos de crises a que as organizações estão sujeitas. Quadro 1 – Tipos de crise 1. Crise econômica Redução significativa dos negócios de uma empresa; diminuição do faturamento da organização. 2. Crise financeira Ocorre quando o fluxo de caixa da empresa é inferior aos seus compromissos. 3. Crise patrimonial Caracterizada pela existência de um passivo(obrigações e/ou compromissos) superior ao ativo (bens e direitos). 4. Crise decorrente de desastres industriais Enquadram-se nesse tipo de crise as contaminações de produtos, incêndios, vazamentos e explosões. Essas situações podem prejudicar a produtividade e a imagem da empresa. 5. Crise provocada por desastres naturais São as crises causadas por tempestades, enchentes, terremotos, furacões e outras eventualidades. 6. Crise originada por falhas nos equipamentos Refere-se à crise resultante de falhas nos equipamentos e maquinário. 7. Crise decorrente de ações criminosas Crises empresariais provenientes de sabotagens, fraudes, hackers, vandalismos e outros. 8. Crise motivada por boatos São aquelas ligadas a acusações da concorrência, boatos, entre outros fatores. 9. Crise resultante de questões legais Referente a processos judiciais e indenizações. 10. Crise de reputação Quando ocorrem vazamentos de informações confidenciais, documentos e conduta corrupta. Fonte: Marques (2018). Cada um dos tipos de crises descritos pode ter desdobramentos. É importante compreender que a crise é um evento único, pois tem características e especificidades próprias em cada caso concreto. Isso quer dizer o seguinte: mesmo que duas ocorrências se assemelhem, os aspectos próprios de cada uma precisam ser detalhadamente analisados, pois esses aspectos ajudam o gestor de crises a entender cada situação e estabelecer procedimentos que a evitem, no futuro. As crises econômicas podem ter sido originadas em vários setores: • falta de atualização tecnológica da organização; • manutenção prolongada de equipamentos de produção; • falta de pessoal especializado na gerência de problemas financeiros da empresa; • falta de qualificação adequada no pessoal de produção; • falta de investimento em pesquisa e desenvolvimento, entre outros itens. 17 GERENCIAMENTO DE CRISES E CONTROLE DE RISCOS Observe que tais itens podem comprometer seriamente os aspectos econômicos de uma organização. E, apesar de a crise ser econômica, esta pode ser motivada por inúmeros fatores. Estudar e identificar tais fatores faz parte da atividade de gerenciamento de crises. Por exemplo, uma crise econômica é deflagrada pelo fato de não ter havido investimentos na renovação tecnológica da empresa. Clientes deixam de fazer pedidos por esse motivo. O faturamento cai e a crise se instala. A origem da crise é identificada e o gestor principal da empresa se preocupa em não deixar mais aquela área sem os investimentos necessários. Portanto, tal crise foi devidamente superada. Contudo, outras na área financeira podem ocorrer. A dinâmica exemplificada anteriormente traz uma mensagem clara: as inúmeras áreas passíveis de crise numa organização devem e precisam ser constantemente monitoradas. E toda crise deve e precisa ser estudada de forma individualizada, para que possa trazer o benefício da prevenção. A mesma dinâmica deve ser aplicada em outras áreas. Desastres industriais são exemplos pertinentes. A indústria com seus variados setores pode ter problemas de origens diferentes. Muitas vezes conhecer genericamente o problema não afasta as graves consequências. É necessário estudar detalhadamente cada vertente do assunto e cada uma delas, no caso concreto em que se apresentar. Um exemplo disso são os acidentes com barragens. Tais problemas são relativamente frequentes no mundo inteiro e devidamente conhecidos pela engenharia. No entanto, “de 67 acidentes graves com barragens entre 1940 e 2010, 33 ocorreram da década de 1990 em diante” (VAIANO, 2019). Ou seja, apesar dos riscos conhecidos, os acidentes graves estão mais frequentes e em maior número. Aqui no Brasil houve dois casos bastante graves recentemente: Na cidade de Mariana, no Estado de Minas Gerais, em 2015: A contaminação da bacia hidrográfica do rio Doce pelos rejeitos elevou consideravelmente os níveis de turbidez da água, tornando-a imprópria tanto para o consumo humano como para a agropecuária. O mesmo motivo fez com que a população de peixes fosse praticamente aniquilada de todos os cursos d’água que foram atingidos pela lama. Com os danos à ictiofauna, os pescadores perderam seu principal meio de subsistência. Diversas localidades que dependiam do turismo também contabilizaram amargos prejuízos (LOPES, 2016, p. 13). Três anos depois, outro episódio lamentável também em Minas Gerais: A barragem de fundão, da mineradora Samarco, em Mariana (MG), se rompeu no dia 5 de novembro de 2015 e lançou cerca de 45 milhões de metros cúbicos de rejeitos no meio ambiente, contaminando um dos principais rios do país, localizado na região sudeste, o rio Doce. Os rejeitos percorreram os 663,2 km junto com o rio até o litoral do Espírito Santo. Além disso, essa lama, composta principalmente por óxido de ferro e sílica, soterrou o subdistrito de Bento Rodrigues. Foram 1.469 hectares destruídos, incluindo Áreas de Preservação 18 Unidade I Permanente (APPs). Dezenove pessoas morreram no desastre (Ibama, 2018). Pouco mais de três anos após, no dia 25 de janeiro de 2019, a barragem do Córrego do Feijão, em Brumadinho, também ruiu, destruindo em torno de 269,84 hectares, sendo destes 133,27 hectares de vegetação nativa de Mata Atlântica e 70,65 hectares de Áreas de Preservação Permanente (APP) na extensão dos cursos d’águas contaminados pelos rejeitos de minério (Ibama, 2019). Até agora não se sabe ao certo o número de pessoas mortas, a defesa civil confirmou até o momento 232 mortes e 40 pessoas desaparecidas (DEFESA CIVIL DE MINAS GERAIS apud SANTOS, 2019, p. 10). Portanto, a identificação do problema precisa voltar-se para a concretude de cada ocorrência, pois a semelhança de um caso com outro pode gerar alguns protocolos a serem seguidos, mas a experiência (e o aprendizado) de cada caso é única. Outro ponto também importante: as crises são consequências de ocorrências que envolvem múltiplas causas, na maioria das vezes. No caso das barragens há quem critique o descaso com os aspectos sociais (poluição, vidas humanas) para priorizar o lucro. O gestor de crises deve ponderar essas questões e buscar caminhos que possam solidificar uma política da organização frente a episódios que podem ocasionar, inclusive, a extinção da própria organização. Saiba mais Para se aprofundar no tema, recomendamos a leitura de: VAIANO, B. Acidentes com barragens são um problema mundial e recorrente – que está piorando. Superinteressante, 5 fev. 2019. Disponível em: https://super.abril.com.br/ciencia/acidentes-com-barragens-sao- um-problema-mundial-e-recorrente-que-esta-piorando/. Acesso em: 18 ago. 2019. BECHLE, R. G.; BECHLE, R. R. (Des) Caminhos da Mineração em Brumadinho: presente, passados e futuros. Tempo & Argumento, v. 11, n. 26, p. 548-559, jan./abr. 2019. Disponível em: http://www.periodicos. udesc.br/index.php/tempo/article/viewFile/2175180311262019548/9993. Acesso em: 31 out. 2019. SANTOS, L. B. D. A lama de Mariana e Brumadinho não vale o progresso. Escenarios: empresa y territorio, v. 8, n. 11, p. 9-13, jan./jun. 2019. Disponível em: http://revistas.esumer.edu.co/index.php/escenarios/article/ view/158/178. Acesso em: 18 ago. 2019. 19 GERENCIAMENTO DE CRISES E CONTROLE DE RISCOS A figura a seguir mostra parte da região de Brumadinho, em Minas Gerais, após o rompimento da represa que causou centenas de mortes. O evento crítico causou, além das mortes (lamentáveis, sob qualquer ponto de vista), problemas ambientais gravíssimos e repercussão em todo o mundo. Figura 3 – Lama no meio ambiente Ainda dentro desse contexto, é considerada a importância de todo o gestor de crises possuir no ambiente organizacional os seguintes recursos: • Comunicação imediata com todos os setores da organização. • Meios de mobilizar setores críticos da empresa, como os de informática, produção, recursos humanos, entre outros. • Estabelecer rotinas que visem a atualização de dados administrativos, que possam ser utilizados em situações de crise.• Estudos sempre atualizados de providências pertinentes a situações de crise, como hospitais próximos (e especialidades de cada um), empresas de manutenção (máquinas e equipamentos, com possíveis telefones para horários não comerciais), entre outros dados que poderão ser úteis, conforme a situação. Saiba mais Acostume-se com a terminologia “gerenciamento de crises”, que se fundamenta numa série de conceitos importantes, e com tais conceitos com o texto de Moretti, de Administradores: MORETTI, C. Gerenciamento de crises de acordo com o negócio. Administradores, 7 fev. 2017. Disponível em: https://administradores.com.br/artigos/gerenciamento- de-crises-de-acordo-com-o-negocio. Acesso em: 26 nov. 2019. 20 Unidade I 1.3 Observações importantes na questão de crises O gestor que se dedica ao tratamento do evento crítico precisa encarar o problema sem quaisquer preconceitos ou juízos antecipados. O objetivo é superar o problema de imediato para depois avaliar o que o causou e, se possível, corrigir vertentes de modo que o erro não se repita. Muito cuidado com: • Julgamentos e interpretações precipitadas: o foco deve ser a superação do episódio crítico. Após essa superação haverá tempo suficiente para a devida apuração dos fatos. • Atribuição prematura de responsabilidades: novamente a ênfase deve ser na superação da crise. Identificar culpados deve ficar para a etapa seguinte, a não ser que se trate de um flagrante delito em que os responsáveis possam ser detidos e encaminhados para uma delegacia de polícia, por exemplo. • Disposição para entender e superar o episódio crítico: o gestor responsável pela crise deve procurar entender os fatores que levaram àquela situação e, proporcionalmente, o que pode ser feito para superá-la. Essa relação de causa-efeito deve estar presente sempre no raciocínio do gestor. Apenas para exemplificar, observe a figura a seguir: trata-se de um incêndio. Em primeiro lugar, o gestor precisa e deve saber quais são os tipos de materiais capazes de causar ocorrência desse tipo no âmbito da organização. Quais os tipos de equipamentos e materiais que podem gerar explosões, por exemplo. Ou seja, no momento da ocorrência é necessário dar atenção ao que ocorre e às formas de minimizar o evento. Figura 4 – Incêndio é um exemplo de situação de crise Considerando que a vida é o bem mais valioso, a retirada de pessoas do local e o combate efetivo do incêndio dentro das normas de segurança adequadas constituem as providências razoáveis que o gestor deve tomar. 21 GERENCIAMENTO DE CRISES E CONTROLE DE RISCOS Após a superação do fato, a apuração deve ser rigorosa: • O incêndio foi provocado por que razão? • Houve falha operacional? • Houve provocação criminosa? • Onde iniciou o incêndio? • Quem era(m) o(s) responsável(is) pela área? • Havia pessoal preparado para lidar com a ocorrência? • Os equipamentos de combate ao incêndio funcionaram corretamente? Enfim, lidar com crises exige: • Preparação prévia: estudar o ambiente e os processos para garantir efetividade numa possível situação de crise. • Ação durante o evento crítico: capacidade de lidar com o problema instalado. • Apurar o ocorrido: verificar detalhadamente a ocorrência para apurar responsabilidades e evitar novas situações de crises. Outro fator muito importante durante a ocorrência de um evento crítico é a comunicação. Dependendo da organização, determinados fatos chegam muito rapidamente à imprensa. Outro fenômeno recente é a alta exposição dos fatos nas redes sociais. Há organizações estruturadas com um setor específico de comunicação social. Nesse caso é mais fácil lidar com esses tipos de fenômeno, pois os profissionais ali estabelecidos têm conhecimento para transmitir as informações de forma apropriada. Observação O gestor de crises tem a responsabilidade de conduzir da forma mais adequada as comunicações referentes aos episódios de administração da crise. A sociedade tem o direito de receber informações fidedignas. Também é importante: • Disponibilizar pessoal para passar informações seja para a imprensa, seja para as redes sociais, seja para pessoas que entrem em contato. Por exemplo, um avião que não chegou ao seu destino e há indícios de acidente aéreo. É importante manter canais de comunicação que possam suprir o interesse da sociedade. 22 Unidade I • A equipe responsável pela comunicação deve ser continuamente informada pelo gestor da crise a respeito do andamento da situação. • A equipe responsável deve conhecer (quando possível) dados para informar familiares, por exemplo, de pessoas envolvidas no contexto da crise. • A equipe de comunicação deve ser transparente e responsável. Evidentemente que não deve revelar dados ou informações que possam comprometer o desfecho da situação. Mas deve fazer um esforço no sentido de se manter fidedigna ao lidar com a imprensa, com as redes sociais e com familiares do pessoal envolvido na crise. • É importante notar que, independentemente do desfecho da crise em curso, a reputação da empresa pode ser mais ou menos afetada. Mesmo sob fatos de extrema gravidade, a entidade pode demonstrar organização e capacidade para lidar com a situação. Isso certamente refletirá na situação futura da empresa quando esta for analisada seja pela sociedade em geral, seja pela imprensa, seja por seus acionistas, diretores e/ou funcionários. Evidentemente que tal perspectiva depende de um bom treinamento para situações de crises e de uma boa condução no desenrolar destas. Mas as comunicações corretas também auxiliam de forma que a situação não seja desproporcionalmente amplificada e que a imagem da empresa fique mais arranhada do que efetivamente deveria. Por exemplo, um incêndio em uma das instalações. Se o combate foi efetivo, as providências tomadas foram pertinentes e tempestivas e todo o pessoal agiu corretamente, é importante passar tais fatos. Demonstra a maturidade e preparo para lidar com ocorrências de crise. Saiba mais Para refletir, leia o artigo: HARGREAVES, L. O paradoxo do “Castelo de Areia” e o gerenciamento de crises. Administradores, 2014. Disponível em: https://administradores. com.br/artigos/o-paradoxo-do-castelo-de-areia-e-o-gerenciamento-de- crises. Acesso em: 1° nov. 2019. 1.4 Comitê de crises A administração de crises exige um acompanhamento estrito e competente. A criação de um comitê de crises pode ser interessante na medida em que permite decisões mais dinâmicas e rápidas. A composição dos comitês de crises está condicionada naturalmente ao tamanho da organização. De qualquer forma, uma boa sugestão é “reunir pessoas com experiência nas mais diversas áreas [...]” (ESPUNY et al., 2008, p. 33). 23 GERENCIAMENTO DE CRISES E CONTROLE DE RISCOS Gestores da área de produção, da área financeira, de segurança, entre outros, constituem uma sólida formação para um comitê desse tipo. É importante que um representante da alta direção também faça parte do comitê de crises para decisões estratégicas que eventualmente necessitem ser tomadas no curso da crise, como liberação extra de valores. Empresas maiores podem ter também subcomitês (NEVES, 2002, p. 176). Um comitê de crises constituído para enfrentamentos de caráter geral e subcomitês pautados em assuntos específicos, como em questões de segurança. Uma das principais atividades do Comitê de Crises é a identificação dos riscos a que a empresa está sujeita. Estudaremos mais adiante a gestão de riscos, de forma mais abrangente. Por enquanto, serão identificados os grandes grupos de riscos, que são: • Negócio: problemas relacionados ao negócio em si. Incluem greves (com várias motivações), sabotagens (fraudes internas), problemas administrativos de vários matizes, entre outros. • Imagem: problemas relacionados à opinião pública (sociedade, imprensa, redes sociais). • Produto: problemas relacionados à produção, como acidentes industriais, quebras de equipamentos, falhas na entrega de pedidos, entre outros. • Pessoas:problemas relacionados a óbitos, acidentes de vários tipos, ergonômicos etc. Um detalhe importante: quando há situações de crise que envolva a presença de criminosos com explosivos e/ou com reféns, os cuidados devem ser ainda mais extremados. O criminoso ou os criminosos ameaçam com explosivos e/ou com a retenção de um ou mais reféns com o objetivo de conseguir fugir da situação. Normalmente tais situações ocorrem quando a fuga é impedida por: • não conseguirem fugir a tempo; • serem surpreendidos por alguém, no meio da ação criminosa; • ter havido atrasos por razões não previstas. É muito importante que o gestor de segurança ou o responsável pelo Comitê de Crises peça apoio policial especializado. A polícia deve ser avisada da situação para enviar uma unidade especializada nesses casos. Além de essas unidades especiais possuírem policiais preparados para lidar com ações especiais, normalmente há um ou mais policiais especializados em negociação com criminosos. No Estado de São Paulo, por exemplo, tanto a Polícia Civil quanto a Militar possuem grupos especializados em situações críticas. A Polícia Civil possui o Grupo Especial de Reação (GER) e a Polícia Militar possui o Grupo de Ações Táticas Especiais (Gate). Ambos são especializados em situações de 24 Unidade I crise que envolvam explosivos e reféns. Ao contatar tais unidades é importante já seguir as orientações exaradas para que a ocorrência tenha o desfecho mais adequado. Por exemplo, a Polícia Civil do Estado da Bahia, numa apostila para formação de investigadores e escrivães de 2008, apresentou o grau de risco de ocorrências em tabela originária do Federal Bureau of Investigation (FBI), a polícia federal norte-americana. O quadro a seguir expressa esses graus de risco: Quadro 2 – Graus de risco de ocorrências críticas Classificação Tipos Exemplos (FBI) 1º Grau Alto risco Assalto a banco promovido por uma ou duas pessoas armadas de pistola ou revólver, sem reféns. 2º Grau Altíssimo risco Um assalto a banco por dois elementos armados mantendo três ou quatro pessoas como reféns. 3º Grau Ameaça extraordinária Terroristas armados de metralhadores ou outras armas automáticas, mantendo oitenta reféns a bordo de uma aeronave. 4º Grau Ameaça exótica Um indivíduo de posse de um recipiente, afirmando que seu conteúdo é radioativo e de alto poder destrutivo ou letal, por um motivo qualquer, ameaça uma população. Fonte: Bahia (2008, p. 14). Segundo o diagnóstico de classificação (1º, 2º, 3º ou 4º grau) há a disposição de enfrentamento conforme a organização e planejamento da instituição policial, no caso, a Polícia Civil do Estado da Bahia. Veja o quadro a seguir: Quadro 3 – Respostas conforme o grau de risco Nível Recursos Resposta Um Efetivo ordinário + Cia. Especial As guarnições do Policiamento Ordinário e as guarnições da Cia. Especial de área poderão atender a ocorrência. Dois Efetivo ordinário + Cia. Especial + COE As guarnições do Policiamento Ordinário e as guarnições da Cia. Especial da área com o apoio de Unidades Especializadas poderão atender a ocorrência. Três Todos do nível dois + Reforço As guarnições do Policiamento Ordinário e as guarnições da Cia. Especial da área com o apoio de Unidades Especializadas poderão atender a ocorrência, juntamente com outros efetivos de reforço. Quatro Todos do nível três + Assessora especial As equipes especializadas são empregadas com o auxílio de áreas específicas. Fonte: Bahia (2008, p. 15). 25 GERENCIAMENTO DE CRISES E CONTROLE DE RISCOS Saiba mais O enfrentamento a crises de suicídio é uma das especialidades das crises gerenciadas por policiais especializados e outros trabalhadores que se envolvem em ocorrências desse tipo. Conheça mais a respeito desse tema com os artigos a seguir: COIMBRA, P. A. M. O gerenciamento de crises policiais em ocorrências envolvendo tentativas de suicídio: uma definição de papéis. Revista Preleção, n. 10, p. 57-76, ago. 2011. Disponível em: https://pm.es.gov.br/ Media/PMES/Revista%20Prele%C3%A7%C3%A3o/Revista_Prelecao_ Edicao_10.pdf#page=57. Acesso em: 1º nov. 2019. SARTORI, S. D.; SOUZA, E. M. de. Entre sofrimento e prazer: vivências no trabalho de intervenção em crises suicidas. Revista Eletrônica de Administração (REAd), v. 24, n. 2, p. 106-134, maio/ago. 2018. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/read/v24n2/1413-2311-read-24-2-0106.pdf. Acesso em: 4 nov. 2019. Conheça algumas recomendações da psicologia para a área de gerenciamento de crises com a leitura de: HODECKER, M.; ALVES, R. B. Estratégias da psicologia para o gerenciamento de crises. PSI Unisc, v. 3, n. 2, p. 61-75, 2019. Disponível em: https://online. unisc.br/seer/index.php/psi/article/view/10922. Acesso em: 4 nov. 2019. Observação A organização do comitê de crises também pode ser composta por profissionais especializados em psicologia ou psiquiatria. Evidentemente que o tamanho e os recursos disponíveis na organização são determinantes na composição do comitê para enfrentar situações desse tipo. De qualquer forma, é importante ter em mente que as situações de crise não raro envolvem vidas humanas, que devem ser preservadas a todo custo. 2 PLANEJAMENTO NA ÁREA DE CRISES O planejamento é essencial em qualquer atividade administrativa. Na área de gerenciamento de crises ocupa importância excepcional, pois um bom planejamento pode evitar problemas maiores oriundos de crises instaladas. 26 Unidade I 2.1 Princípios organizacionais para o gerenciamento de crises Um trabalho acadêmico do ano de 2008, fruto de requisito parcial para a certificação de um curso de pós-graduação em Segurança Estratégica das Organizações (ESPUNY et al., 2008) deu origem à formulação de cinco princípios básicos que podem ajudar o ambiente organizacional da empresa. Tais princípios foram estabelecidos com base na observação pessoal dos autores, além da pesquisa bibliográfica. Os princípios são: princípio da prevenção, princípio da estrita legalidade, princípio da qualidade, princípio da ética e da moralidade e o princípio da interdisciplinaridade. A seguir, cada um desses princípios é explicado e são estabelecidas as possíveis relações com o contexto organizacional. 2.1.1 Princípio da prevenção O princípio da prevenção está relacionado com a análise antecipada de situações que podem gerar problemas futuros e envolve o estudo e a observação a respeito de todos os contextos capazes de gerar crises das mais diversas espécies. Mapear tais problemas e tomar providências para preveni-las permite que o gestor tenha uma vida bem mais tranquila. A seguir, as áreas da organização em que medidas preventivas podem ajudar a evitar problemas maiores. 2.1.1.1 Prevenção nas crises econômicas financeiras e/ou patrimoniais Se há veículos em péssimo estado de conservação, capazes de provocar acidentes, o gestor toma as providências possíveis antes que eventuais acidentes ocorram. A prevenção está especialmente ligada ao gerenciamento de crises e ao controle de riscos. Uma das possíveis vertentes da prevenção é a formação de uma comissão permanente que possa estudar as vulnerabilidades da organização e já planejar providências para os pontos vulneráveis. No caso do gestor de segurança, tais providências podem ser adotadas mesmo se a empresa de segurança presta serviços a terceiros: nesse caso, a experiência em prevenção do gestor de segurança pode assessorar a contratante e os estudos podem ser realizados em conjunto com as competências da contratante e da contratada. Para complementar, observe o texto a seguir: Planejamento. Crises não podem não ser evitadas, mas sua minimização deve ser buscada por seu gestor. Mas isto depende de um certo sentido de antecipação, de uma postura prática diante de fatos que possam representar ameaças à organização. Inicialmente, pode-se pensar em tudo o que poderia representar uma ameaça à continuidade do negócio. Um marceneiro, por exemplo, poderia se preocupar em listar possíveis fornecedores,caso o seu deixe de fornecer sua matéria-prima. Ou pensar em fazer uma pequena reserva financeira para a manutenção das suas máquinas. Enfim, cada negócio exigirá providências diferentes, mas o espírito da prevenção é o que se deve enfatizar. A organização que pretenda estabelecer um setor que gerencie crises precisa pensar nelas. Providências como a instalação de um Comitê de Crises e Planos de Contingência são 27 GERENCIAMENTO DE CRISES E CONTROLE DE RISCOS fundamentais para que a atividade possa crescer nos mais diversos setores da organização. Um bom exercício para todos os envolvidos é listar – setor por setor – todos os possíveis problemas e criar planos de contingência para lidar com estes. Alguns tipos de crises não são facilmente listáveis, pois não fazem parte da nossa cultura. Por exemplo, terremotos. Ninguém precisa listar o terremoto como fonte de suas preocupações. Mas poderia listar – por exemplo – a incapacidade de utilização da planta da empresa. Qual a solução? As atividades poderiam ser transferidas para um outro local? Onde seria? A fabricação, se for o caso, de determinado produto poderia ser contratada? Enfim, o gestor de crises pode ter planos de contingência genéricos, que se preocupem com possíveis efeitos danosos que uma ampla gama de crises possa gerar para a organização (ESPUNY, 2008). Isso demonstra a importância da análise antecipada dos fatores que podem levar a crises. Cada organização possui características próprias que precisam e devem ser levadas em conta em respeito às especificidades e perfil de cada uma. Em relação às crises econômicas, financeiras e patrimoniais, o controle está relacionado ao faturamento, às dívidas e ao fluxo de caixa. A prevenção, em tese, pode ser estabelecida através de algumas providências (os itens a seguir não esgotam todas as providências possíveis): estabelecimento de uma reserva financeira adequada para possíveis tempos de baixo faturamento; cuidado absoluto nas transações a fim de se evitarem apostas arriscadas demais; desenvolvimento de programas internos de transparência nas negociações para a prevenção de ocorrências de corrupção, por exemplo. Muitas organizações contam com setores de governança corporativa e/ou compliance. Saiba mais Conheça os importantes princípios da governança corporativa no site do Instituto Brasileiro de Governança Corporativa: https://www.ibgc.org.br/ 2.1.1.2 Prevenção nas crises de desastres industriais e/ou falhas nos equipamentos Em relação a ocorrências relacionadas a desastres como incêndios, explosões, entre outras, é necessário que todos os envolvidos na organização tenham em mente duas vertentes: a primeira está vinculada diretamente à questão da prevenção. Todos os cuidados técnicos devem ser estritamente observados. Algumas questões estão relacionadas: • Utilização adequada de equipamentos: os equipamentos devem ser utilizados de acordo com a capacidade especificada pelos fabricantes e dentro dos padrões técnicos de utilização. Esses parâmetros obedecidos permitem um setor produtivo adequado e sem surpresas. 28 Unidade I • Manutenção periódica de equipamentos: além de obedecer às especificidades para os quais foram projetados os equipamentos, uma rotina de manutenções é importante e adequada. Determinados problemas, a princípio imperceptíveis, podem ser devidamente identificados pelo pessoal técnico. Normalmente os equipamentos já registram a periocidade adequada para essas providências. • Manutenção periódica das instalações: todos os aspectos relacionados às instalações devem estar monitorados e com a manutenção em dia. Instalações elétricas, hidráulicas, hidrossanitárias e prediais em geral (revestimento, piso, cobertura) bem mantidas podem fazer grande diferença em acidentes. • Treinamento adequado de pessoal: o princípio da prevenção também está relacionado ao adequado treinamento de pessoal. Muito cuidado com improvisações, nas quais pessoas não qualificadas acabam operando equipamentos críticos. A segunda vertente relacionada a esse item está relacionada com a capacidade reativa, no caso de ocorrer algum acidente: pessoas com treinamento adequado na intervenção de ocorrências relacionadas a incêndios e explosões podem minimizar o problema. Além disso, informações adequadas e disponíveis para todos os envolvidos é outro fator para tornar o problema menos grave: por exemplo, um indivíduo que sofreu queimaduras deve ser socorrido numa unidade médica capaz de tratar esse tipo de paciente. Informações adequadas disponíveis com o pessoal de segurança do trabalho, segurança patrimonial e até na portaria da empresa facilita um socorro com essa característica. É importante compreender que durante uma ocorrência crítica os envolvidos nem sempre conseguem pensar em todos os fatores importantes. 2.1.1.3 Prevenção nas crises de desastres naturais Já as crises por desastres naturais também podem ser prevenidas ou minimizadas pelo que foi discutido nas crises industriais. Contudo, é evidente que algumas crises por desastres naturais podem ser absolutamente imprevisíveis, como a ocorrência de chuvas intensas. O que foi citado em relação às manutenções adequadas das instalações, entretanto, certamente fará diferença. Instalações hidráulicas entupidas, revestimento com infiltrações, teto e piso mal cuidados podem maximizar problemas climáticos, como o caso já citado de chuvas intensas. Aplica-se, também, o que já mencionamos em relação ao treinamento de pessoal: sempre importante ter um corpo de funcionários preparado para eventos desse tipo. 2.1.1.4 Prevenção nas crises decorrentes de ações criminosas Esse tipo de crise se origina na ação criminosa que pode instalar crises de diferentes tipos e intensidades na organização. O gestor deve se preocupar com uma série de fatores que estabeleceriam parâmetros preventivos para evitar ocorrências desse tipo. A primeira ação relevante é propiciar um ambiente seguro, tanto na organização quanto, se possível, no seu entorno. Para isso há várias vertentes exploradas pela segurança patrimonial nesse sentido. Vejamos as mais importantes: 29 GERENCIAMENTO DE CRISES E CONTROLE DE RISCOS • Controle de acesso: todos os indivíduos que entram na empresa devem possuir identificação própria, individual, que possa informar de forma exata a hora da entrada e da saída e, se possível, os setores que transitaram na empresa. O controle de acesso pode ser feito por um crachá individual, pela impressão digital, entre outros métodos. O importante é que, além do registro feito na entrada do indivíduo na organização, haja também, conforme o tamanho e complexidade do edifício, um rastreamento que permita identificar os locais por onde passou. Por exemplo, há organizações que possuem câmaras em todas as áreas de fluxo interno. Outras colocam um chip no crachá de identificação do visitante, que permite rastreá-lo. Enfim, tais especificidades dependem do: — grau de complexidade do local – se há segredos industriais ou conhecimento estratégico, por exemplo; — nível de investimento na segurança interna – tais providências demandam investimentos específicos nessa área, que nem sempre é priorizada pela empresa. • Capacidade tecnológica da empresa: é necessário verificar se a segurança é desenvolvida pela própria organização ou se é feita por uma empresa terceirizada. A partir daí é necessário verificar a capacidade tecnológica de implementar tais providências. Há empresas que não dispõem de tecnologia capaz de suprir tal demanda. Nesse caso, se for uma empresa terceirizada, o gestor deve ponderar se demanda da própria empresa essa complementação (que custará investimento na aquisição de equipamentos e qualificação de pessoal) ou se busca outra empresa no mercado mais preparada para esse grau de prestação de serviços. Caso a segurança seja própria, a decisão muda um pouco de foco, mas a problemática é parecida: compensa investir nessa modernização (com todo o investimento decorrenteda iniciativa) ou é melhor contratar uma empresa no mercado capacitada para isso? A resposta depende de estudos internos que levem em conta o que seria mais eficiente e eficaz e o que seria mais viável em termos de investimento. Outros aspectos importantes relacionados à prevenção em relação às ações criminosas podem ser elencados da seguinte forma: • Triagem de novos funcionários: a triagem de funcionários pode ser feita em função de uma série de pré-requisitos. Evidentemente que a formação necessária para o desenvolvimento de determinada função, cursos complementares que venham a auxiliar no desempenho profissional e, conforme o caso, experiências específicas ajudam a escolher o perfil certo. Tal atividade normalmente fica a cargo do pessoal responsável pela área de recursos humanos da organização. Há também a possibilidade de avaliar a situação de possíveis passagens criminais do candidato. Nota-se que a análise baseada nos antecedentes criminais segue regramento específico, de acordo com as diretrizes legais. Não deve ser utilizado como forma de discriminação ao candidato, pois há uma série de circunstâncias que acabaram por tornar a certidão de antecedentes criminal bastante controversa: — há a possibilidade de o candidato alegar dano moral pelo fato de ter sido solicitada tal certidão na admissão; 30 Unidade I — mesmo que o candidato tenha sido condenado por algum crime e cumprido já a totalidade da pena, portanto já esteja reabilitado, nenhum registro constará na certidão; — há entendimento expresso pelo Superior Tribunal do Trabalho “de que a exigência da certidão de antecedentes criminais somente seria legítima e não caracterizaria lesão moral em caso de expressa previsão em lei ou em razão da natureza do ofício ou do grau especial de confiança exigido […]”(TST, s.d.a). E quais seriam estas situações? O Acordão SbDI-1 (TST, s.d.b) deixa claro que: 1. Não é legítima e caracteriza lesão moral a exigência de Certidão de Antecedentes Criminais de candidato a emprego quando traduzir tratamento discriminatório ou não se justificar em razão de previsão em lei, da natureza do ofício ou do grau especial de fidúcia exigido. 2. A exigência de Certidão de Antecedentes Criminais de candidato a emprego é legítima e não caracteriza lesão moral quando amparada em expressa previsão legal ou justifica-se em razão da natureza do ofício ou do grau especial de fidúcia exigido, a exemplo de empregados domésticos, cuidadores de menores, idosos ou deficientes (em creches, asilos ou instituições afins), motoristas rodoviários de carga, empregados que laboram no setor da agroindústria no manejo de ferramentas de trabalho perfurocortantes, bancários e afins, trabalhadores que atuam com substâncias tóxicas, entorpecentes e armas, trabalhadores que atuam com informações sigilosas. 3. A exigência de Certidão de Antecedentes Criminais, quando ausente alguma das justificativas supra, caracteriza dano moral in re ipsa, passível de indenização, independentemente de o candidato ao emprego ter ou não sido admitido. Todo profissional de gestão deve observar uma regra básica: a atualização é uma necessidade. Tudo que estiver consignado neste material didático pode mudar. Principalmente, na área de gestão de crises, que envolve leis e jurisprudência (entendimento dos tribunais). Portanto, nunca é demais relembrar: pesquise sempre. Lembrete É fundamental que o profissional da área se mantenha sempre atualizado. 31 GERENCIAMENTO DE CRISES E CONTROLE DE RISCOS Saiba mais Para se aprofundar no assunto leia: CABRAL, B. F. Aspectos controvertidos da emissão da certidão de antecedentes criminais. jus.com.br, 2017. Disponível em: https://jus.com. br/artigos/56718/aspectos-controvertidos-da-emissao-da-certidao-de- antecedentes-criminais. Acesso em: 5 nov. 2019. 2.1.1.5 Prevenção nas crises decorrentes de boatos A crise gerada por boatos é significativa, muito especialmente em função das redes sociais. Um boato publicado por jornais, revistas, rádios ou televisão é relativamente fácil de ser desmentido, pois tais mídias normalmente são responsáveis e, até por questões legais, disponibilizam espaço para desmentidos. Contudo, muitas vezes é complicada a plena recuperação da imagem. Mas sempre há a possibilidade de ações judiciais para cobrar possíveis danos morais, lucros cessantes, entre outros. Há, contudo, crises de boatos mais sérias. As redes sociais não têm o mesmo controle. As chamadas fake news podem efetivamente ser responsáveis por danos irrecuperáveis. Consequências gravíssimas podem ocorrer em função da divulgação de notícias falsas. As fake news podem servir a interesses escusos, ou seja, nem sempre são divulgadas em função de um erro de interpretação ou de algum equívoco na publicação. Saiba mais O gestor de crises precisa ficar atento às consequências de uma crise gerada por boatos, conforme aponta o artigo a seguir: CAMPOS, L. V. O que são fake news? Brasil Escola, [s.d.]. Disponível em: https://brasilescola.uol.com.br/curiosidades/o-que-sao-fake-news.htm. Acesso em: 5 nov. 2019. A prevenção de boatos é difícil haja vista que muitas destas divulgações podem ser frutos de interpretações equivocadas (ou maldosas) de uma pessoa ou um grupo delas que pode se difundir rapidamente nas redes sociais. Um acompanhamento frequente do que é divulgado na imprensa e nas redes sociais pode ser a maneira de captar a existência de boatos e de enfrentá-los antes que haja repercussão maior. 32 Unidade I 2.1.1.6 Prevenção nas crises desencadeadas por questões legais Uma empresa envolvida em escândalos de corrupção ou em outros tipos de problemas que envolvam o descumprimento do regramento legal é uma empresa que não inspira confiança no mercado. Acionistas e clientes deixam de confiar numa estrutura que não seja transparente e que cumpra rigorosamente com seus compromissos trabalhistas, fiscais e legais, de forma geral. Ainda nessa seção há dois itens que abordam explicitamente esses pontos: a governança corporativa e o compliance. Quanto mais transparente e mais cumpridora de seus deveres, menos sujeita a crises a organização está sujeita. Saiba mais Conheça mais sobre a gestão transparente pelo artigo: PETROBRAS. Os benefícios da gestão transparente. Valor Econômico, 8 dez. 2017. Disponível em: https://www.valor.com.br/patrocinado/ petrobras/gestao-e-negocios/os-beneficios-da-gestao-transparente. Acesso em: 5 nov. 2011. 2.1.1.7 Prevenção nas crises decorrentes de crises de reputação As chamadas crises de reputação ou crises de imagem possuem elementos bastante distintivos. A crise de imagem é a crise instalada que ganhou alguma mídia (imprensa escrita ou falada) ou redes sociais, ou seja, que foi divulgada para certo número de pessoas. Há um conflito entre o que se espera de uma organização segura e o que efetivamente se observa, divulga e/ou interpreta numa situação de crise (CARDIA, 2015, p. 3-24). 2.1.2 Princípio da estrita legalidade A estrita legalidade se refere ao cumprimento rigoroso de todos os regramentos, tanto os internos quanto os externos (a organização está sujeita tanto às leis municipais quanto às estaduais e federais). Não deveria ser nem objeto de observação nem de atenção, pois é obrigatória em qualquer organização. Contudo, não é incomum que as organizações tangenciem certos pontos e passem por cima de certos regramentos internos (quando não tentam burlar leis), sob as mais variadas desculpas. Não é uma área apropriada para o famoso “jeitinho brasileiro”. Convém observar que essa área é de importância estratégica e não pode ser de forma alguma descuidada. Conforme pontuam Espuny et al. (2008, p. 37): O complexo de leis num país como o Brasil muitas vezes dificulta o completo enquadramento de todas as atividades da empresa na legislação. Mas esta não é uma atividade que possa ser adiada: cada setor da empresa e seus respectivos encarregados, chefes, gerentes e diretores precisam se comprometer com esteprincípio. 33 GERENCIAMENTO DE CRISES E CONTROLE DE RISCOS O cumprimento integral de todas as leis, normas e regras a que a empresa está submetida evita, e muito, a erupção de diversas crises. Determinados acontecimentos que, apesar de serem extremamente desagradáveis, poderiam ter seu desfecho abreviado, acabam se constituindo em crises de proporções gigantescas. Ou seja, mesmo que a organização seja envolvida em ocorrência de crise inevitável, se esta estiver absolutamente dentro de todos os regramentos, naturalmente tal crise será mais facilmente superável. 2.1.3 Princípio da qualidade Há várias definições de qualidade. A maior parte define qualidade em função de uma motivação subjetiva. Por exemplo, qualidade de produto tem a ver com o que o consumidor deseja ou necessita. Contudo, os desejos e necessidades variam. Claro que todos precisam se alimentar. Mas as opções entre um sanduíche ou uma refeição completa passam por várias instâncias que repousam nas necessidades e desejos de cada consumidor. Da mesma forma, outras vertentes da qualidade também podem ser exploradas dentro dessa margem subjetiva. Por exemplo, o conceito de preço. Uns podem achar determinado preço barato... Outros, caro... E, ainda, o conceito de preço ainda pode estar vinculado a um contexto: um colecionador de carros pode pagar bem mais caro por um modelo de Fusca de 1975, por exemplo, que alguém que busque tão somente um meio de se locomover. Contudo, há um aspecto da qualidade que é objetivo: o processo. Uma empresa que cultua a qualidade, certamente, estabeleceu processos para o desenvolvimento das etapas de fabricação. Inclusive a certificação de qualidade ISO 9000 é baseada exatamente nos processos: Na gestão da qualidade, a ISO 9000 é o conjunto composto pelas normas ISO 9000, 9001, 9004 e 19011. Elas podem ser aplicadas em diversos tipos de organização: indústrias, empresas, instituições e afins, e se referem apenas à qualidade dos processos da organização, e não dos produtos ou serviços. Esse grupo de normas descreve regras relacionadas à implantação, desenvolvimento, avaliação e continuidade do Sistema de Gestão da Qualidade. Elas tornaram-se oficiais a partir do ano de 1987, baseadas em normas britânicas, e, desde então, vêm sofrendo revisões (GESTÃO DA QUALIDADE, s.d.). Empresas que aplicam as normas ISO 9000 têm uma vantagem adicional, pois têm maior credibilidade frente aos seus clientes e concorrentes. Dentro desse contexto, uma empresa que prioriza seus processos e implanta qualidade garante um funcionamento adequado de sua área produtiva e também da área administrativa. Considerando que a adequação dos processos é um instrumento que pode determinar um bom funcionamento da organização, evidentemente que se constitui, também, numa prevenção de possíveis crises. Complementando a ideia: 34 Unidade I O aspecto objetivo, mensurável da Qualidade, é o processo. É através dele que se pode implantar sistemas como o da ISO 9000, por exemplo. Isto pode ser aplicado desde a fabricação de um automóvel até a confecção de um sanduíche. Utilizemo-nos de dois exemplos de Qualidade nas atividades citadas: o veículo Rolls-Royce e os sanduíches McDonald’s. Tanto um quanto o outro têm todas as suas etapas de desenvolvimento bem estabelecidas. É a valorização dos processos. A tinta na coloração exata, as máquinas da linha de produção perfeitamente reguladas, os parafusos nos lugares corretos, o tempo de fabricação perfeitamente controlado, um veículo exatamente igual ao outro. Da mesma forma, os componentes do sanduíche sempre do mesmo fornecedor, a chapa de fritura aquecida na mesma temperatura, a forma do manuseio do sanduíche sempre com higiene resultando num produto final bastante parecido, independente da lanchonete que se utilize. É o chamado padrão de Qualidade (ESPUNY, 2015). Portanto, uma empresa que mantenha programa de qualidade garante que seus aspectos operacionais estejam vinculados a processos capazes de garantir um funcionamento coerente. 2.1.4 Princípio da ética e da moralidade Esse princípio está ligado ao ambiente saudável que deve permear todas as relações no interior de uma organização. Há uma confusão entre a questão da competitividade e da ética ou da boa conduta. Os gestores em geral e a alta direção das organizações precisam estar absolutamente conscientes de que uma empresa não consegue fixar condutas nem ter um desenvolvimento seguro se não estiver lastreada por boas práticas e difundir um ambiente de respeito, honestidade e respeito a valores éticos. Como observa Espuny et al. (2008, p. 42-43): O gestor deve iniciar fazendo uma reflexão sobre os princípios éticos da organização […]. Departamentos e setores que cultuam o “jeitinho” com as mais variadas desculpas, tais como mostrar uma pseudoeficácia, devem – prontamente – ser corrigidos. O princípio da ética e da moralidade precisa permear todos os níveis da organização: estratégico, tático e operacional. Por princípio, a alta administração precisa defender esse princípio e ser sua mais intransigente defensora e praticante, pois só é possível à organização imergir em atitudes éticas e baseadas na moralidade se o exemplo advier do nível mais alto da administração. E, além disso, a alta administração não deve permitir quaisquer eventos que se afastem desse contexto. Todos devem respeitar os regramentos externos e internos. Todos devem ter responsabilidade social. Todos devem se adaptar e cumprir preceitos de compliance. Tal princípio obviamente previne também crises. Situações de envolvimento com corrupção, negociatas e crimes contra o meio ambiente, apenas para exemplificar, podem gerar crises bastante complicadas para as organizações, crises que podem ser evitadas se tal princípio, juntamente com o da estrita legalidade, for rigidamente seguido. 35 GERENCIAMENTO DE CRISES E CONTROLE DE RISCOS 2.1.5 Princípio da interdisciplinaridade O princípio da interdisciplinaridade concerne à integração de conhecimentos. Profissionais qualificados que integram o Comitê de Crise devem ser oriundos dos mais diversos setores da organização: administrativo, operacional, da segurança e saúde do trabalho, da segurança empresarial, representante da alta direção, entre outros possíveis, conforme o tamanho da empresa. Evidentemente que profissionais da área da psicologia e/ou da área médica também agregam significativamente a atividade de gerenciamento de crises. A visão integrada de várias áreas pode privilegiar, pela via da interdisciplinaridade, a visão sistêmica dos fatos a serem enfrentados. E para encerrar o que foi até aqui exposto, considere: A organização moderna que quer dar os primeiros passos no gerenciamento de crises deve, em primeiro lugar, ver estabelecida esta meta como estratégica, da alta direção. Em seguida, revisar todas as suas atividades, externas e internas, sob a ótica da legalidade e, efetivamente, corrigir quaisquer desvios neste sentido. O conjunto de leis às quais o mercado é exposto, no Brasil, com certeza não facilita o desenvolvimento desta tarefa. Mas não é um assunto que deva ser relegado a um segundo plano quando se fala na gestão de crises. Geri-las não é fácil... Se a empresa não estiver absolutamente dentro da estrita legalidade é, praticamente, impossível. Finalmente, os primeiros exercícios da organização devem ser no sentido de mapear as principais crises, ou todas as que podem comprometer a continuidade da atividade-fim da empresa. Com esse primeiro mapeamento em mãos, a confecção dos planos de contingência vão se desenvolvendo, até criar uma cultura organizacional propícia ao pleno gerenciamento de crises, com a possibilidade da implantação de todos os demais princípios (ESPUNY, 2008). Considerando o que já foi abordado, a seguir um resumo com os citados princípios: Quadro 4 – Resumo dos princípios organizacionais para o gerenciamento de crises Princípios organizacionais para o gerenciamento de crises a. Princípio da
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