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TRANSCRIÇÃO DE ENTREVISTA Entrevistado: Elmano de Freitas - candidato do Partido dos Trabalhadores à Prefeitura de Fortaleza em 2012 Dia: 26 de fevereiro de 2015 Local: Gabinete na Assembleia Legislativa do Ceará Aline Carneiro: O objetivo da entrevista é coletar dados para trabalhos acadêmicos que estão sendo elaborados por mim, Aline Mendonça Conde Carneiro, estudante do Mestrado em Comunicação Social pela Universidade Federal do Ceará (UFC). Outros objetivos são analisar a imagem do ex-presidente Lula na campanha do candidato Elmano de Freitas (PT) à Prefeitura de Fortaleza; e verificar a relação entre comunicação e política no período eleitoral. Você passou por diversas experiências ao longo de sua carreira política, ocupando cargos importantes e sempre mantendo contato tanto com a “base” eleitoral, quanto com o núcleo político no âmbito do estado. Em vista disso, e considerando que você cresceu nas intenções de voto após o início do Horário Gratuito de Propaganda Eleitoral, que importância você atribui à Comunicação no processo eleitoral? Elmano de Freitas: Eu considero a comunicação no período eleitoral em duas fases. Você tem o primeiro momento de comunicação, que é antes do programa de rádio e de televisão, que se dar fundamentalmente com material gráfico, presença do candidato em atividades muitas vezes de vereadores ou atividades daquelas regiões da cidade ou com caminhadas ou com pequenos comícios, em terminais de ônibus. Então, é uma fase da campanha em que a comunicação é muito direta e, numa cidade grande com Fortaleza, ela, portanto, tem um impacto reduzido, limitado e, pela minha experiência, um candidato que era pouco conhecido, ela tinha grande dificuldade, inclusive, do eleitorado reconhecer o candidato e ter alguma ideia de qual era a referência política ou de proposta da nossa candidatura. Portanto, era um processo ainda muito lento e que você tinha uma comunicação, basicamente, com o público que você, de maneira, já conhecia para puder você ter condições reais de fazer uma discussão com maior fôlego, digamos assim. Eu acho que essa foi a primeira fase da campanha no ponto de vista da comunicação. Eu acho que tem uma segunda fase quando você tem rádio e televisão, que aí você, ao mesmo tempo, dialoga ou comunica – talvez seja melhor o termo - comunica com muita gente da cidade. Não vou dizer que todos porque nem todas as pessoas assistem ao programa eleitoral. Mas como também tem inserções e elas se colocam no meio da programação, no mínimo, passa-se ter um conhecimento da pessoa do candidato. E as pessoas ao te encontrarem, já começam a ter uma referência de que você é aquele candidato do PT. Como Fortaleza tinha e ainda tem uma preferência eleitoral pelo partido, o fato de ser candidato pelo PT já diz a população um determinado perfil dessa candidatura. Então, para mim, foi muito evidente a mudança de recepção da população antes do programa de rádio e depois do programa de rádio. E, evidentemente, isso se alterou mais ainda quando, além de ser um candidato do PT, era um candidato da prefeita Luizianne Lins e era um candidato do presidente Lula. Evidentemente, isso quando foi feito de maneira, em rádio e TV, a campanha virou outra proporção e, na relação com o eleitorado nas mesmas atividades que eu fazia antes, sem o programa de televisão, a relação já era muito diferenciada. Sempre se fala no papel do “marqueteiro” e na influência que ele exerce. Como se deu a relação do candidato com os assessores de comunicação no que se refere à definição das estratégias da campanha? Elmano de Freitas: Deu de maneira dialogada. Eu diria que a gente tem sempre nas campanhas que eu participei com a companheira Luizianne um grupo de companheiros que cuidam da comunicação e tem, evidentemente, uma coordenação política das campanhas. Fizemos antes um debate de programa, que foi realizado no partido, foi realizado na aliança e com pessoas de várias áreas e setores da cidade e, esse conjunto de propostas era apresentado a equipe de comunicação. Então, a meu ver, e eu acho que isso funcionou bem, o desafio da comunicação é “Qual a melhor forma, qual a melhor linguagem para que a população compreenda essas propostas?”. Porque, às vezes, você tem uma proposta, mas a forma como você apresenta talvez mais confunda do que esclarece. Então, eu acho que é muito importante na campanha que o marketing respeite as decisões políticas da coordenação política. Porque muitas vezes há um debate se aquela proposta era uma proposta simpática ou não naquele momento político eleitoral e a coordenação política entende que aquela proposta é uma proposta que deve ser apresentada e, ao mesmo tempo, a coordenação política tem que respeitar que a forma em que a parte de comunicação da campanha quer apresentar. Também tem ser dada a devida autonomia para esses companheiros e companheiras que cuidam. Evidentemente, que tem determinados momentos que essas coisas tem uma interseção muito forte. Então, a forma de apresentar, no caso o PT, a gente quer que tenha respeito a política de gênero, a gente quer que tenha respeito a política de combate ao racismo, que tenha uma preocupação expressa também na forma de apresentar com as pessoas com deficiência. Então, isso é algo que se faz de maneira dialogada e assim foi feito, com muito diálogo. Eu não lembro de nenhum grande debate na campanha de divergência de forma de comunicação. Tinham diferenças, é claro, como numa campanha normal. Qual o tom? Qual a prioridade da proposta A e proposta B? Qual é aquela que a gente considera que é mais importante para aquele momento ser apresentada? Mas jamais desfazer uma proposta, jamais fazer uma proposta que você discorda porque você acha que vai ter mais votos. Aí a posição minha sempre foi de trabalhar só política e isso a gente não pode ceder, porque, quem faz política como nós fazemos no PT, [sabe que] a eleição é um momento da nossa vida política e da nossa construção histórica. Então, eu prefiro que o povo vote em mim ou vote nas nossas candidaturas sabendo o que nós defendemos, do que votar numa coisa que não é o que a gente está pensando. Aí nesse papel eu não me colocaria. Quando entrevistei a Ana Javes e o Demétrio, eles comentaram que, eventualmente, existiram divergências entre a equipe de marketing e o núcleo político da campanha. Você pode detalhar quais os principais embates na época? Elmano de Freitas: Eu lembro que tinha um debate muito forte... Como é que nós tratávamos continuidade do governo do PT e as mudanças. Nós tínhamos que encontrar um equilíbrio, porque evidente que o governo da prefeita Luizianne havia realizado muitas obras e ampliados muitos serviços da cidade. E, portanto, o governo da Luizianne tinha melhorado muito a cidade diante do que ela recebeu, mas diante do que é o sonho que as pessoas têm na sua vida, ainda estava muito longe. Porque é evidente que um governo tem limitação... Vou dar um exemplo. A prefeita Luizianne fez um programa de moradia que nenhum outro governo fez na história de Fortaleza, absolutamente nenhum outro governo, mas continuava a ter 90 mil pessoas ainda sem casas. Então, ainda que ela tinha entregue 10 mil casas para 10 mil famílias, evidentemente que eu ainda tenho 90 mil que não receberam casas. Então, no meio do eleitorado e da população, aqueles que receberam as 10 mil [casas] perceberam a mudança que foi o governo da prefeita Luizianne, mas os 90 mil que não receberam tinham uma chateação porque eles não tinham sido contemplados e eles continuaram, portanto, sem casas como antes do governo dela. Então, isso gera um debate na campanha: Até que ponto você faz a campanha, não só de comunicação, de linha política... Como é que você conjuga continuar um governo que está mudando a vida das pessoas? Quando são pesquisadas, elas dizem: “Você quer que continue ou que mude?”. Ela pode estar respondendo que ela quer que mude a vida dela, não necessariamenteo governo. Esta zona cinzenta, que se expressa em pesquisa, tem que ser lido com muita cautela e, evidentemente, que nessa hora nós tínhamos impressões diferentes até dos dados das pesquisas. Quando você tinha uma pesquisa: “Quer continuidade ou você quer mudança?”. Havia pessoas que liam: “não, se a mudança está 60% é porque o nosso governo não está bem” e outros “não, eles querem mudança porque querem mudanças na vida deles e o nosso governo ainda não chegou na vida concreta deles”. Este foi um tema bastante permanente na campanha de como é que nós conjugaríamos esse dilema complementar de continuar um governo que nós apostávamos que era um governo tinha um rumo correto para a cidade e esclarecerem quais eram as mudanças que nós queríamos fazer, porque também tinham questões... Com o acúmulo de tempo que nós estávamos no governo, nós acumulamos uma experiência que justamente íamos pensar outros saltos, portanto, também fazer mudanças no próprio governo. Eu acho que foi o tema mais forte do ponto de vista interno da campanha, como fazer esse equilíbrio. Teve outro embate que você lembra? Elmano de Freitas: Tinha um embate, mas não chega a ser um embate. Tinham os pontos de como, por exemplo, a gente, nos debates, se portar em relação a vários candidatos que faziam muito ataque ao governo e como a gente deveria se comportar no debate e havia uma linha do tipo responde todo mundo e ataca todo mundo e havia uma linha de dizer o que nós gostaríamos de fazer e deixasse o povo julgar. Eles iam continuar falando o que faltava fazer na cidade e algumas coisas realmente faltavam, faltam e vão demorar um bom tempo, vão continuar faltando porque são demandas sociais para uma geração, não para um governo e nós apostamos que o caminho mais adequado era “Vamos apresentar o que nós fizemos e vamos apresentar o que que nós queremos fazer”. Essa foi a linha dominante da campanha. Portanto, não ficar muito preocupado em responder e atacar e ficar mais preocupado em dizer o que que fizemos e o que queremos fazer. Quando entrevistei Luizianne, a ex-prefeita disse que se incomodou com o rumo de algumas estratégias da comunicação da campanha. Como vocês lidavam com isso? Elmano de Freitas: Isso era feito a cada momento, na discussão de cada, praticamente de vários programas de debate que aconteciam e ele estava vinculado aquela discussão de continuidade e mudança. Porque quando a Luizianne tinha uma presença extremamente forte, havia companheiros que achavam que ficava muito a marca só de continuidade e, quando ela estava muito ausente, dava uma ideia de que a gente estava desconsiderando tudo que tinha sido feito. Então, a presença da Luizianne estava ligada a qual o tamanho que a gente queria dar à continuidade e à mudança. E isso não tem fórmula, não tem jeito. Então, nós tivemos esse debate em vários momentos da campanha no primeiro turno e no segundo turno. Mas a Luizianne participou do primeiro programa de campanha ela estava. Eu nunca fiz esse estudo, nunca olhei... Mas eu imagino que ela deve ter participado da maioria dos programas. Então, uma coisa é certa, nunca teve nenhuma linha de posição de dizer que eu não era o candidato da prefeita ou que eu não era o candidato do governo. Ao contrário, era o candidato do governo que estava defendendo o governo que acreditava, como eu continuo achando que foi um grande governo da prefeita Luizianne e que queria avançar ainda mais, fazer coisas melhores porque nós tínhamos mais experiências do que nós tínhamos há 8 anos atrás. Mas, evidentemente, tem momentos tensos de achar que estava aparecendo mais ou menos e não era uma questão da Luizianne do ponto de vista pessoal. A Luizianne nunca teve uma política de personalismo. “Eu quero aparecer, porque eu quero aparecer”. Não, era realmente uma questão de estratégia porque quanto mais ela aparecesse explicando que tinha feito, evidentemente, que isso também havia na cidade, tanto que nós fomos crescendo na campanha do primeiro para o segundo turno, apresentando o que nós tínhamos feito e apresentando que isso era feito pelo governo da prefeita Luizianne. Ela acha que houve pouca continuidade e você? Elmano de Freitas: Não, eu acho que teve uma posição equilibrada. Eu acho que o programa apresentava as principais conquistas do governo e eu acho que, na verdade na verdade, eu não acho que nós perdemos a campanha pela batalha da comunicação. Eu acho que nós perdemos a campanha por outras questões. Eu acho que nós perdemos a campanha por um grau de mobilização do adversário no segundo turno, no que diz respeito a compra de voto e acho que nós perdemos a eleição porque nós tivemos um conjunto de forças, praticamente todos os candidatos do primeiro turno, juntos, contra a nossa candidatura. Eu acho que isso foi mais significativo do que qualquer questão que possa ter havido na comunicação, porque eu acho normal que na comunicação tem programa que você tem um resultado eleitoral melhor, tem programas que tem o resultado eleitoral menor, tem debate que eu fui que eu me saí melhor, tem debate que eu não me saí tão bem, tem debate que eu fui mal né? Mas eu não acho que reside aí as principais explicações da nossa derrota. Acho que a nossa derrota se dá mais por outros motivos. Mas, enquanto tinham todos esses candidatos apoiando o Roberto Cláudio, por outro lado tinha o Lula te apoiando e vocês trouxeram várias inserções de ministros da Dilma, além da Marina Silva... Você acha que deu uma equilibrada ou que o Lula teria mais peso do que esses candidatos? Elmano de Freitas: Ele tinha também o governador Cid, que também tinha uma avaliação positiva na cidade. Eu acho que isso emparelhou a eleição. Exatamente esse motivo que você está apresentando, junto com as políticas corretas do governo da Luizianne, junto com a liderança da Luizianne, junto com a presença do Lula é que fez emparelhar a eleição. E é por isso que eu acho que, ao emparelhar, a força de articulação de tantos candidatos contra nós - e candidatos não são só os candidatos, é o candidato, os vereadores que se elegeram e os que não se elegeram, as lideranças comunitárias entorno desses vereadores que se elegeram e que não se elegeram. É uma força política viva dentro da cidade, com muita estrutura financeira para comprar voto. Então, esta força foi utilizada como nunca a cidade viu. Então, numa eleição muito parelha isto faz a diferença no resultado final. Analisando os programas eleitorais elaborados para a televisão, eu percebi que existia uma ênfase na questão da continuidade, quando o Lula sempre falava que você seria aquele que daria a continuidade ao projeto de governo do PT. Por outro lado, a campanha mostrava você como “um cara novo, um cara diferente”. Você acha que existiu uma tensão entre novidade e continuidade? Elmano de Freitas: Não, isso eu acho que não. Eu tenho a impressão de que, o fato de ser novo como figura pública, é efetivamente... foi uma coisa positiva para a nossa campanha, porque 2013 mostrou que há um cansaço com quem está na política há muito tempo. Porque como há avaliação do eleitorado e da população muito negativa da política e, especialmente, dos políticos quem está nela há muito tempo recai sobre si todos os desgastes, ainda que alguns casos sejam injustos né? E o fato de ser novo como figura pública, evidentemente, que você não tem o mesmo desgaste de quem está há mais tempo na luta política. Isso foi apresentado como alguém novo, mas que iria dar continuidade ao Governo da Luizianne, mas o fato de ser novo, provavelmente, deu credibilidade de que aquela mudança que se falava que eu iria fazer, se ele era novo ele realmente poderia fazer. Se fosse alguém com mais tempo, não. Só que, ao mesmo tempo, o fato de ser novo também dava a ideia, talvez, de que o Elmano não fosse realmente comandar o Governo, fosse ser alguém que a Luizianne pudesse manobrar ou manipular no Governo. Eu acho também que essa ideiafoi construída pelo nosso adversário e eu acho que um eleitor ou outro pode ter sido convencido por essa ideia. Como se deu a participação do presidente Lula na campanha? Como você avalia os efeitos da presença de Lula na sua campanha em 2012? Elmano de Freitas: Eu considero que a presença do presidente Lula foi decisiva primeiro para a vitória do primeiro turno. Eu andei na rua, antes do presidente Lula, e eu andei depois do presidente Lula. Antes do presidente Lula, nós já vínhamos crescendo na campanha com a força do nosso governo e da prefeita Luizianne e com a presença do presidente Lula nos permitiu um crescimento maior, porque, efetivamente, há na cidade uma leitura de confiança de admiração com o presidente Lula que nenhuma outra liderança política, de nenhum partido político, tem. Então, isso é muito mais amplo, inclusive, do que o PT, é como uma liderança política da sociedade. Então, a prefeita Luizianne nos permitiu, com o governo e a sua liderança, um crescimento e o presidente Lula nos permitiu, ao meu ver, ir ao ponto de ganhar no primeiro turno. Então, eu considero a presença do presidente Lula aquela marca que, inclusive, alguns desgastes que nós tínhamos, efetivamente, em virtude de ter 8 anos de governo e é normal que tenha desgaste; o presidente Lula meio que contrabalançou esses desgastes que teria, porque se há um candidato apresentado e apoiado pelo presidente Lula, esse jovem que é desconhecido da população e é jovem e é novo e o Lula está indicando, então é porque esse rapaz deve ter boas intenções. Eu acho que o Lula trouxe essa credibilidade para a candidatura. Vocês tentaram inserções com a Dilma? Elmano de Freitas: Não. Desde o começo eu sempre achei que a presidenta Dilma deveria ter uma postura de não se envolver na eleição. Eu sempre achei que se o presidente Lula estivesse na campanha, para nós, eu ficaria extremamente satisfeito. Por que? Porque eu achava que era insignificante o número de eleitores que gosta da Dilma, mas não gosta do Lula. A princípio, todo eleitor, toda pessoa que simpatiza com a Dilma, simpatiza com o Lula, ainda mais na cidade de Fortaleza. Aquele eleitor que não gosta do Lula também não gosta da Dilma. Tem alguém que gosta da Dilma e não gosta do Lula? Tem, mas eu pensava sempre que era insignificante diante do problema que seria ela apoiar o candidato, tento apoio e relação com o governador do Estado, que tinha outro candidato. Eu acho que foi razoável o que foi feito da presidente Dilma não se envolver, manter relações com o governador e o presidente Lula fazer a campanha para o candidato do PT. Eu acho que foi uma solução equilibrada. E a equipe de comunicação em algum momento cogitou a possibilidade de gravar com ela? Elmano de Freitas: Cogitar, cogitou. Mas não colocou como uma questão fundamental e decisiva. Alguns autores afirmam que as campanhas hoje em dia são marcadas por uma “personalização”, havendo um declínio das ideologias e dos partidos. Figuras de maior projeção pública, como Lula, seriam determinantes para influenciar o eleitorado (inclusive mais importantes que os partidos). Você acredita nessa concepção? Elmano de Freitas: Não, eu acho que a cultura brasileira não é personalizada nos últimos anos. Ela é personalizada na sua história. Ela foi assim com Getúlio Vargas, com João Gourlat, ela foi assim com os presidentes da Ditadura Militar, ela foi assim nas lideranças dos partidos comunistas, nas décadas de fundação dos partidos comunistas, é só olhar a história de Luiz Carlos Prestes. Então, a cultura brasileira tem uma cultura muito forte de personificação das lideranças políticas, porque nós temos uma pouca cultura de partido político. Isso é um processo que eu creio que será ainda longo, nós não vamos fazer isso em uma mudança de comportamento de cultura de uma maneira rápida. No sistema presidencialista é fortalecido, porque no sistema presidencialista, a campanha majoritária de prefeitos e governadores e presidente da república fortalece essa questão de votar na pessoa, diferente do parlamentarismo, que você escolhe os parlamentares, em alguns locais do mundo, com votação em lista e, no parlamento, se escolhe o dirigente do país. Então eu não acredito que isso é algo que vem mudando no último período, isso vem de uma tradição brasileira de partidos políticos muito frágeis e que nós do PT devemos lutar para ter um regime político com partidos mais fortes e com mais participação popular. Na medida em que a população participe mais, nós temos também uma cultura política de muita delegação. Eu voto no vereador e no prefeito e vou cobrar depois. Eu não me coloco no dever de participar cotidianamente da política para que as políticas públicas aconteçam. Isso tem um certo lado de comodismo do eleitor também. Para mim é cômodo votar em alguém e depois, para saber se ele fez ou não, cobrar. Eu não me coloco no dever de participar para encontrar soluções que a cidade, meu bairro ou país tem. Então, essa cultura vai levar um tempo e ela não foi criada nas últimas décadas. Esses autores falam que a personalização fortalece o indivíduo. No caso, quando eu analisei, eu vi que a figura do Lula acabava enfraquecendo o partido. Você acha que no HGPE houve um enfraquecimento do PT e um tipo de exaltação da personagem Lula? Elmano de Freitas: Grandes lideranças políticas são naturais na política. Mesmo no sistema parlamentarista, é normal que, no partido, se tenham grandes líderes. Na história dos partidos, na história dos políticos, sempre foi assim e creio que vai ser assim na humanidade. O fato de você ter muitas pessoas participando, não impede que você tenha pessoas que se destaquem e não é ruim que isso seja assim e não é da essência que seja ruim. Uma se destaca como liderança na área da educação, outro se destaca como liderança na área da cultura, outro na área da saúde e tem aqueles que vão se destacar porque tem uma visão mais completa de todas as áreas e de todas as dimensões. Grandes lideranças é muito bom para a política, desde que sejam sérias e tenham compromissos com os projetos que elas defendem. Então, isso não é problema. O problema que eu vejo é você ter grandes lideranças com estruturas partidárias muito frágeis, porque aí você tem uma lógica das pessoas que definem os projetos e não o coletivo. Porque, quando você tem um coletivo, significa que essas ideias vão ganhando capilaridade na sociedade. Então, você tem uma sociedade mais politizada. Quando se tem pessoas com projetos políticos, você cria um fosso entre as lideranças e a população e, portanto, a política fica empobrecida porque você tem pouca participação da sociedade. Se a campanha fosse hoje, quais mudanças você sugeriria no tom dos programas eleitorais? Elmano de Freitas: No tom dos programas, eu não faria nenhuma grande alteração. O nosso crescimento e o emparelhamento na campanha no segundo turno... Eu achei que, fundamentalmente, a campanha de comunicação foi correta. Eu não teria grande alteração. Eu diria que nós tínhamos que nos preparar mais e melhor para os últimos dias da campanha, para a disputa do corpo a corpo com o eleitorado e para evitar que o nosso adversário pudesse, de maneira tão tranquila e tão frouxa de fiscalização, comprar tanto voto. Eu tenho a impressão que se nós tivéssemos tido uma campanha mais massiva e organizada, na última semana de campanha, o resultado poderia ter sido outro. Ou se as instituições de fiscalização funcionassem, mas, infelizmente, a Justiça Eleitoral não tem estrutura de fiscalização do processo eleitoral. O que ela consegue fiscalizar é muito pequeno diante do que é o processo eleitoral como um todo. E eu não acho que é porque ela não quer, é porque ela não tem a estrutura suficiente. Na última semana, o Lula veio e teve aquele grande comício na Praça do Ferreira. Vocês colocaram muita parte do Horário Eleitoral. Você não acha que influenciou? Elmano de Freitas: Maseu acho que influenciou positivamente. Eu acho que se nós não tivéssemos o comício e não tivéssemos colocado o comício na televisão, talvez o resultado fosse mais favorável ao adversário. O que eu acho é que aquilo pode ter gerado na nossa campanha uma certa ideia de vitória antecipada e com isso a gente não se preparar, devidamente, para os últimos dias após o comício. O comício teve um aspecto muito importante de animar a militância, de a cidade fazer uma homenagem ao Lula mais do que merecida. Eu acho que o comício foi uma grande homenagem ao presidente Lula. As pessoas iam lá para prestigiá-lo também. Então, eu acho que foi muito bom. Agora, uma campanha tem que ser capaz de fazer um grande comício e, ao mesmo tempo, preparar os últimos dias para a disputa eleitoral voto a voto numa eleição que tem 41% a 41%, 42% a 41%. Então, evidentemente, aí eu acho que nós falhamos. Quando a equipe de marketing terminava um programa eleitoral, antes de ir ao ar, vocês olhavam, vocês avaliavam, diziam o que queriam e o que não queriam? Elmano de Freitas: Tinham pessoas responsáveis para isso. Eu vi vários, mas não pude ver todos, mas tinham companheiros e companheiras que tinham responsabilidade não só de ver o programa antes de ele ser veiculado, como também de acompanhar pesquisas qualitativas de repercussão no eleitorado do programa. Houve mais a opinião da equipe política ou dos consultores de comunicação na elaboração dos HGPE? Como você colocaria? Elmano de Freitas: O que foi da campanha foi o que foi possível de construir de concepção de equilíbrio de continuidade e mudança. Se fosse hoje, poderia ser diferente. Não tem fórmula. Isso é aquele momento, com aquelas impressões, com aquela experiência que aquele conjunto de militantes tem né? Com as suas sensibilidades. Eu acho que nós não tivemos um grande problema de divergência da campanha com a comunicação. Eu acho que existiam problemas pontuais com uma pessoa ou outra. Eu também tinha. Uma hora a Luizianne tinha uma opinião, outro companheiro tinha outra. Teve horas em que eu também tive outra. Mas acho que, no geral, nós tivemos um alinhamento bom, mas evidentemente com a tensão natural entre o tema continuidade e mudança. Transcrição e edição: Aline Carneiro
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