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1694 DISCUTINDO QUESTÕES DE CIÊNCIA, TECNOLOGIA, SOCIEDADE E AMBIENTE NO ENSINO MÉDIO: A ELABORAÇÃO DE UMA PROPOSTA DIDÁTICA A PARTIR DO FILME INTERESTELAR Mylena Guedes Passeri (Centro Federal de Educação Tecnológica Celso Suckow da Fonseca - CEFET/RJ) Marcelo Borges Rocha (Centro Federal de Educação Tecnológica Celso Suckow da Fonseca - CEFET/RJ) RESUMO Tendo em vista que a escola se apresenta como importante instituição para discussões de questões que relacionam a ciência, tecnologia e sociedade (CTS) de forma imbricada e interdisciplinar e que o uso de filmes é considerado uma estratégia didática atrativa para os alunos e com potencialidades para serem exploradas pelo educador, pretende-se neste trabalho refletir sobre a importância do tratamento de questões socioambientais, científicas e éticas no Ensino de Ciências. Foi elaborado um guia para o educador a partir do filme “Interestelar”. Espera-se que este trabalho sirva de inspiração e estímulo para a utilização de filmes em sala de aula, oferecendo subsídios teórico-práticos para professores e contribuindo para a formação de estudantes mais reflexivos e esclarecidos sobre questões CTS. Palavras-chave: Ciência, Tecnologia e Sociedade; Ensino de Ciências; Estratégias didáticas; Filmes; Interestelar. INTRODUÇÃO O que é a atividade científica? Quais interesses podem influenciar nas decisões científicas e tecnológicas? Como os aspectos éticos influenciam nas decisões cotidianas dos cidadãos e como podem repercutir na sociedade? Tecnologias são as soluções para os atuais problemas ambientais enfrentados? Essas são algumas das questões que relacionam ciência, tecnologia e sociedade (CTS), um campo de investigações interdisciplinar, que merece tratamento planejado e orientado no Ensino de Ciências através de discussões que incluam aspectos sociais, ambientais, éticos e morais de forma inter-relacionada, podendo propiciar e estimular uma participação mais democrática e informada dos indivíduos na sociedade. A formação educacional básica dos indivíduos passa pela instituição escolar, que participa deste processo a partir de variadas dimensões (pedagógica, social, científica e ética). Revista da SBEnBio - Número 9 - 2016 VI Enebio e VIII Erebio Regional 3 SBEnBio - Associação Brasileira de Ensino de Biologia 1695 Nesse contexto, o uso de diferentes metodologias no processo de ensino-aprendizagem torna- se fundamental para contemplar o máximo possível tais dimensões e alcançar o variado público que podemos encontrar nessas instituições. Apesar disso, a abordagem de temas relacionados a CTS no ensino costuma ser controversa e evitada por alguns professores que sentem carência de instrumentos e formação adequada. Neste contexto, o uso de filmes se apresenta como uma estratégia didática atrativa para os alunos e com potencialidades a serem exploradas pelo educador, podendo tornar as discussões, reflexões e as atividades de modo geral mais agradáveis e contextualizadas. Pretende-se com este trabalho, além de apresentar a importância da discussão de temas científicos, tecnológicos, ambientais e éticos em sala de aula, propor um material no formato de um guia para que o educador possa trabalhar o filme “Interestelar” abordando esses eixos de forma integrada e dialógica, a partir de uma visão CTS. A ABORDAGEM CTS NO ENSINO DE CIÊNCIAS O campo de estudos da Natureza da Ciência (NdC) é bastante amplo, incluindo vários aspectos da atividade científica como sua função social, sua definição, a atuação dos pesquisadores, os aspectos axiológicos da pesquisa científica, entre outros. Além disso, diversas áreas de conhecimentos como história, sociologia, filosofia e epistemologia da ciência se inter-relacionam, caracterizando tal área como interdisciplinar (Vázquez-Alonso et al, 2008). Apesar da complexidade do tratamento da NdC, em especial dos estudos CTS, vários estudiosos corroboram para a importância da formação de indivíduos mais críticos com a realidade e atuantes na sociedade (Praia et al, 2007; Vilas Boas et al., 2013). Krasilchik (2000) defende que a “admissão das conexões entre a ciência e a sociedade implica que o ensino não se limite aos aspectos internos à investigação científica, mas à correlação destes com aspectos políticos, econômicos e culturais” (p. 89). Corroborando com essa visão, Praia et al. (2007) apontam em seu trabalho que a visão distorcida da atividade científica e tecnológica (incluindo aspectos sobre o papel e a atuação da ciência e do cientista na sociedade, a visão de ciência como uma atividade neutra e a perspectiva salvacionista atribuída à ciência e a tecnologia) é fundamental de ser abordada no ensino de forma que seja superada, contribuindo para uma educação mais contextualizada, Revista da SBEnBio - Número 9 - 2016 VI Enebio e VIII Erebio Regional 3 SBEnBio - Associação Brasileira de Ensino de Biologia 1696 inter-relacionando as atividades científicas e tecnológicas com questões ambientais, sociais, econômicas e políticas. Relacionando o desenvolvimento científico-tecnológico com o ensino das Ciências, Krasilchik (2000) nos informa que “na medida em que a Ciência e a Tecnologia foram reconhecidas como essenciais no desenvolvimento econômico, cultural e social, o ensino das Ciências em todos os níveis foi também crescendo de importância” (p. 85). Ao longo deste processo, em especial na década de 1960, os Estados Unidos da América fizeram altos investimentos em cursos de Física, Química, Biologia e Matemática na expectativa de identificar e formar cidadãos capacitados para atuar na atividade científica. Esse panorama, além de ilustrar as relações CTS, nos enfatiza a importância reconhecida internacionalmente de uma aprendizagem científica bem estruturada para o desenvolvimento de um país. (KRASILCHIK, 2000). Assim, acredita-se que a abordagem CTS no Ensino de Ciências possa contribuir para uma inserção mais democrática dos estudantes na sociedade, pois os mesmos estariam mais informados e contextualizados com questões cotidianas, em especial, aos aspectos inter- relacionados da ciência e da tecnologia na sociedade. Além disso, espera-se que esse processo educativo possa favorecer uma tomada de decisões mais esclarecidas e seguras, considerando aspectos sociais, ambientais, econômicos e éticos. O USO DE FILMES NO ENSINO DE CIÊNCIAS Escolas são instituições que “refletem as maiores mudanças na sociedade – política, econômica, social e culturalmente” e participam de forma direta da ampliação de saberes e conhecimentos dos indivíduos (KRASILCHIK, 2000, p. 85). No entanto, o dia a dia de uma sala de aula pode ser cansativo e pouco atrativo para professores e alunos ao longo do ano letivo; um dos desafios relatados por professores é a “dificuldade de fazer com que os alunos se interessem pelos estudos e prestem atenção” (NOVA ESCOLA, 2014, p. 24). Entraves logísticos como infraestrutura local e falta de recursos para trabalhar são queixas frequentes dos professores e estão relacionados com as escolhas didáticas e o planejamento do professor (NOVA ESCOLA, 2014). Krasilchik, 2000, (p. 90) ressalta a importância da “existência de bons materiais incluindo livros, manuais de laboratórios e guias de professores, docentes que sejam capazes de usá-los, bem como condições na escola para o seu pleno desenvolvimento” para que um currículo escolar alcance seu êxito. Revista da SBEnBio - Número 9 - 2016 VI Enebio e VIII Erebio Regional 3 SBEnBio - Associação Brasileira de Ensino de Biologia 1697 Já em 1995, José Morán atentava em seu artigo para as potencialidades de uma estratégia pedagógica muito utilizada atualmente: o uso de vídeos, incluindo os filmes, na sala de aula (REICHMANN e SCHIMIN, 2008): O vídeo ajuda a um professor, atrai os alunos, mas não modifica substancialmente a relação pedagógica.Aproxima a sala de aula do cotidiano, das linguagens de aprendizagem e comunicação da sociedade urbana, e também introduz novas questões no processo educacional (Moran, 1995, p. 27) O autor ressalta a capacidade do vídeo de atingir as emoções antes mesmo da razão, de entreter e atrair a atenção através das cores, dos movimentos e das músicas, de aproximar as pessoas a uma situação que pode ser vista como distante em sua realidade, entre outras. Bruzzo (1999) concorda com essas capacidades dos recursos audiovisuais e afirma ainda que as pessoas passam mais tempo nesse mundo imagético do que lendo ou estudando. De acordo com a autora, “o modo como as coisas geralmente são apresentadas no cinema e televisão: intensas, rápidas, excitantes, vertiginosa” (Bruzzo, 1999, p. 3). Essas, dentre outras características dos vídeos os tornam uma ferramenta com potencial para sensibilização dos seus telespectadores, em especial, se houver um processo de mediação (REICHMANN e SCHIMIN, 2008). Na sala de aula essa mediação pode ser feita pelo professor, que deve realizar um planejamento prévio que contemple seus objetivos. O vídeo é sensorial, visual, linguagem falada, linguagem musical e escrita. Linguagens que interagem superpostas, interligadas, somadas, não-separadas. Daí a sua força. Somos atingidos por todos os sentidos e de todas as maneiras. O vídeo nos seduz, informa, entretém, projeta em outras realidades (no imaginário), em outros tempos e espaços (p. 28). REICHMANN e SCHIMIN (2008) apontam em suas pesquisas que filmes e seriados estão entre as programações televisivas preferidas por estudantes do Ensino Médio. Além disso, em pesquisa feita com 61 alunos de quatro escolas da rede pública, as autoras identificaram que 90% destes afirmam que aprendem melhor com o uso de vídeos/DVD em sala de aula. Entre seus achados, as mesmas autoras informam que assuntos relacionados a bioética atraíram bastante o interesse dos alunos, estimulando reflexões e debates acalorados. Apesar de não ser possível generalizar este interesse, tal resultado é um bom indicador de que a bioética merece atenção e uma abordagem planejada e organizada em sala de aula pode atrair interesse e participação de alunos em um tema tão atual e controverso. Revista da SBEnBio - Número 9 - 2016 VI Enebio e VIII Erebio Regional 3 SBEnBio - Associação Brasileira de Ensino de Biologia 1698 O FILME “INTERESTELAR” O filme de ficção científica “Interestelar” foi lançado em novembro de 2014 e recebeu diversos prêmios em 2015, incluindo o Oscar de Melhores Efeitos Especiais1 (foi indicado para cinco categorias da 87º edição da premiação), o Critics' Choice Award2 de Melhor Filme de Ficção Científica/Terror e o Empire Award3 de Melhor Diretor para Christopher Nolan. A história narra uma situação de caos na Terra, com escassez de recursos básicos à sobrevivência da população, que se tornou essencialmente agrária. Cooper é um ex-piloto da NASA (Administração Nacional da Aeronáutica e Espaço dos Estados Unidos da América), viúvo, que vive em sua fazenda com a família, incluindo sua filha mais nova Murphy, de dez anos de idade. Ao descobrirem a origem de misteriosos acontecimentos no quarto de Murphy, Cooper e a filha descobrem uma unidade secreta da NASA, liderada pelo professor John Brandt. Professor Brandt revela a Cooper novas descobertas no Espaço que trariam chance de sucesso a uma viagem de exploração de planetas fora do Sistema Solar, possivelmente habitáveis. Três planetas (Miller, Edmunds e Mann) já haviam sido reconhecidos em missões anteriores, mas sem conclusões definitivas por falta de dados e/ou pela morte ou desaparecimento dos astronautas (que foram homenageados através da nomeação dos planetas investigados com seus próprios nomes). Uma equipe de astronautas é formada para realizar a missão, tendo Cooper como piloto da nave Endurance, além da bióloga Amelia, filha de Brandt, o cientista Romilly, o físico planetário Doyle e os robôs TARS e CASE. Um dos grandes temas físicos tratados no filme é a relatividade do tempo e do espaço. Uma grande problemática que se apresenta logo no início da viagem é a diferença de intervalo temporal sentida entre os astronautas (em diferentes lugares no Espaço) e os seres humanos (na Terra). Tal questão interfere de forma considerável na decisão de Cooper em fazer parte da equipe ou não, já que isso poderia representar não encontrar mais parentes e amigos ainda vivos em seu (possível) retorno à Terra, o que deixa Murphy extremamente abalada e inconformada com a partida do pai. Ao longo da missão várias reviravoltas ocorrem e decisões drásticas precisam ser tomadas. Cooper e Amelia percebem que, enquanto estavam no planeta Myller, 23 anos se 1 Um dos prêmios cinematográficos entregue anualmente pela Academia de Artes e Ciências Cinematográficas dos Estados Unidos da América para a melhor realização em efeitos visuais em um filme. 2 Premiação anual organizada por associações de críticos de cinema e TV dos Estados Unidos da América. 3 Premiação anual organizada pela revista britânica Empire, cujos leitores elegem os vencedores. Revista da SBEnBio - Número 9 - 2016 VI Enebio e VIII Erebio Regional 3 SBEnBio - Associação Brasileira de Ensino de Biologia 1699 passaram na Terra. Murphy já está adulta e trabalhando com Brandt para resolver uma equação capaz de lançar no Espaço uma estação espacial gigantesca da NASA capaz de evacuar a Terra. No entanto, Brandt confessa em seu leito de morte que não há solução para a equação e que tudo sempre foi planejado para realizar um “plano B”, que consiste no desenvolvimento de uma nova população humana a partir de óvulos fertilizados em um outro planeta habitável e que a população da Terra não faria parte de nenhum plano de evacuação. No espaço, a tripulação decide visitar o planeta Mann, que ainda estava transmitindo dados otimistas enviados pelo astronauta Mann. Ao chegar, a tripulação da Endurance é surpreendida ao encontrar o astronauta vivo. Em pouco tempo, descobriram que os dados transmitidos eram falsos. Mann matou Romilly e tentou assassinar Cooper, que foi salvo por Amelia. Mann morreu em sua tentativa de fuga. Os dois sobreviventes decidem tentar uma última rota a bordo da Endurance para o planeta Edmunds sabendo que não teriam combustível para retorno à Terra. Cooper e TARS se sacrificam se lançando para dentro do buraco negro para diminuir a massa da nave espacial e coletar dados. Cooper acaba sendo transportado para uma estrutura desconhecida que reflete o tempo de alguma forma espacial. O piloto percebe que pode enviar mensagens contento os dados coletados por TARS através de oscilações gravitacionais para o quarto da filha através de portais temporais. Murphy entende os dados recebidos e soluciona a equação, lançando a nave da NASA e salvando a população humana da Terra. Cooper foi resgatado, mas quando acorda percebe que ele envelheceu somente alguns anos enquanto sua filha já é uma idosa. Após se despedir, Cooper foge da estação da NASA rumo a Edmunds junto com TARS, planeta onde Amelia está iniciando o processo de preparação para o desenvolvimento dos óvulos fertilizados. Pode-se dizer que “Interestelar” aborda um possível futuro para a real crise socioambiental do planeta Terra, sendo um filme pertinente para discussões e reflexões sobre problemas reais vivenciados pela população humana. Ressalta-se que, apesar de o filme também tratar de diversos assuntos relacionados ao Ensino de Física, este guia não focará em tais aspectos e sim nas relações múltiplas entre ciência, tecnologia, ambiente, ética e sociedade. Bruzzo (1999) evidencia que é importante a abordagem do filme a partir de aspectos selecionados e não em sua totalidade, pois, dessa forma, torna-se mais viável o aprofundamento dequestões relevantes ao enfoque escolhido. Revista da SBEnBio - Número 9 - 2016 VI Enebio e VIII Erebio Regional 3 SBEnBio - Associação Brasileira de Ensino de Biologia 1700 PROPOSTA DE UM GUIA PARA O EDUCADOR Propõe-se, a seguir, um guia didático com algumas opções de atividades para serem realizadas com alunos do Ensino Médio a partir do filme “Interestelar”. Ressalta-se que não há uma sequência rigorosa para sua realização, o professor tem total liberdade para decidir utilizar uma, algumas ou todas as atividades sugeridas, dependendo de seu perfil, seus objetivos, tempo disponível, perfil da turma, e outros aspectos que devem ser levados em consideração ao planejar uma atividade didática. Além disso, a avaliação de cada atividade também deverá ser pensada pelo professor a partir de seus objetivos com a realização das atividades. Ressaltamos cuidados importantes antes da reprodução de um vídeo que foram levantados por Morán (1995) e que podem ser seguidos para melhor aproveitamento deste guia: 1) não expressar qualquer interpretação sobre o vídeo ou aspectos relacionados a ele para minimizar a influência sobre as leituras individuais dos alunos, 2) conhecer o vídeo e a qualidade do material a ser exibido e 3) preparar o local e as características básicas para a reprodução do vídeo (volume, posicionar o início do vídeo, ajustar a tela, etc.). Uma das características que precisam ser consideradas é a duração total do filme (169 min). Portanto, o ideal para a exibição e desenvolvimento das atividades a partir do filme é que possam ser feitos em colaboração com outros professores, em um projeto interdisciplinar, especialmente com as disciplinas de Física e Geografia. Assim, além de ganhar tempo de outras disciplinas para o trabalho, há grande enriquecimento de trocas de ideias entre as mesmas, aproveitando melhor o conteúdo que pode ser trabalhado. Caso isso não seja possível, indica-se que o filme seja exibido em partes até que se conclua a reprodução. O professor deverá escolher os pontos de parada na reprodução previamente, tentando não interromper o enredo em momentos que desconcentrem os alunos. Ao longo da exibição, o autor destaca ainda a possibilidade de pequenas pausas na reprodução para breves esclarecimentos. Ao final do vídeo e durante qualquer atividade, indica-se ainda que as cenas podem ser exibidas novamente para relembrar e atentar para detalhes que possam ficar despercebidos em um primeiro momento. Atividade 1: “Tempestade de areia” Conteúdos focais: Técnicas agrícolas, fenômeno climático de seca e tempestades de areia. Revista da SBEnBio - Número 9 - 2016 VI Enebio e VIII Erebio Regional 3 SBEnBio - Associação Brasileira de Ensino de Biologia 1701 Inicialmente, os alunos podem ser motivados a pesquisarem sobre o fenômeno das tempestades de areia relatado no filme. É uma boa oportunidade para uma atividade no laboratório de informática ou em computadores/celulares compartilhados. Essa pesquisa também pode ser solicitada em uma aula prévia para que os materiais pesquisados e levados pelos alunos possam ser utilizados na atividade. Nessa atividade, podemos abordar com os estudantes assuntos como as técnicas de plantio e o manejo do solo, realizados pela população humana ao longo da evolução. O desenvolvimento da policultura, da rotação de culturas no solo, a prática de monoculturas e as consequências de cada técnica para o ambiente, para a economia e o desenvolvimento social são questões pertinentes que podem ser levantadas. Sugere-se que seja construída uma linha do tempo com os estudantes a fim de ilustrar cronologicamente a evolução das técnicas agrícolas. Pode ser interessante ao longo da atividade discutir e criar fóruns com os alunos sobre defensivos agrícolas, saúde, alimentação orgânica e conflitos por posse de terra. O trabalho pode ser feito de forma interdisciplinar, envolvendo professores de biologia, física, geografia, artes, história, entre outros. Atividade 2: “Na mesa: o milho e o quiabo”. Conteúdos focais: saúde coletiva, produção de alimentos, epidemiologia e genética (resistência a pragas). Retomando a praga que se alastra nos cultivos de alimentos no filme e reduz a produção de alimentos basicamente a quiabo e milho, mais resistentes, podemos estimular discussões sobre temas de epidemiologia. Casos reais podem ser exemplificados como o fungo vassoura de bruxa que ataca as plantações de cacau na Bahia, a bactéria causadora da tuberculose que pode ter sua importância considerada como negligenciada em diversos lugares do mundo e os vírus causadores de doenças como a gripe aviária e a gripe suína. Sugere-se que seja planejada e realizada uma campanha de diagnóstico sobre a saúde e a alimentação da população do entorno da escola com objetivo de identificar problemas e potencialidade do local e sensibilizar os alunos e os moradores sobre a importância de uma alimentação adequada, de boas condições de saneamento ambiental e qualidade do ar para a promoção da saúde e boa qualidade de vida. Um questionário pode ser construído coletivamente com a turma, que poderá usá-lo para entrevistar os vizinhos e moradores do entorno da escola. Após o questionário e a entrevista de diagnóstico, ações de sensibilização e mobilização (palestras, oficinas, murais informativos e outros) da comunidade poderão ser desenvolvidas a partir da escola, em eventos comemorativos, por exemplo. Revista da SBEnBio - Número 9 - 2016 VI Enebio e VIII Erebio Regional 3 SBEnBio - Associação Brasileira de Ensino de Biologia 1702 Além disso, professores de biologia podem trabalhar temas de genética e biodiversidade com os estudantes a partir do estudo de casos de espécies vegetais resistentes a pragas e de espécies de insetos e microrganismos resistentes a inseticidas e antibióticos, respectivamente. Pode-se estimular pesquisas e levantar discussões livres sobre a situação das superbactérias, os riscos associados à saúde da população, o uso indiscriminado de antibióticos, o uso de medicamentos sem prescrição médica, tratamentos alternativos, entre outros. A turma pode ser dividida em grupos e apresentar os resultados de suas pesquisas e discussões em seminários abertos ao restante da comunidade escolar e aos moradores do entorno. Atividade 3: “O que você faria?” Conteúdos focais: ciência, tecnologia, problemas ambientais e sociedade. O material apresentado a seguir (Quadro 1) foi produzido para estimular a reflexão sobre aspectos éticos, ambientais e emocionais nos estudantes. Neste, oferecemos sugestões de cenas que tratam do assunto para cada carta e temas chaves para a discussão mediada pelo professor. Espera-se que os alunos sejam instigados a desenvolver sua capacidade de argumentação e discussão respeitosa com os demais colegas. Propomos que a atividade seja realizada em grupos e, assim, os estudantes tenham a oportunidade de trocar ideias sobre os temas. As cartas que orientam a atividade (Cartas problematizadoras) podem ser sorteadas ou escolhidas: uma para cada grupo. Cada uma apresenta uma questão problematizadora. A partir dela, os estudantes devem conversar com os colegas do grupo sobre a situação questionada para, posteriormente, apresentar a ideia à turma permitindo a livre discussão. Ressaltamos que não há respostas estritamente corretas ou erradas para as questões. Não há um gabarito. O importante é a argumentação, a defesa do posicionamento e o respeito aos demais colegas. Por se tratar de temas polêmicos, o professor deve se preparar para tal mediação, considerando possíveis confrontos de ideias entre os estudantes, o que é ótimo quando bem orientado! Revista da SBEnBio - Número 9 - 2016 VI Enebio e VIII Erebio Regional 3 SBEnBio - Associação Brasileira de Ensino de Biologia 1703 Quadro 1: Atividade “O que você faria?” Carta problematizadoraCena(s) Tema(s) Imagem adaptada de: http://4.bp.blogspot.com/- cs7xU5whcYI/VG_F_y1WYQI/AAAAAAAAZxE/HX7jP3gO47k/ s1600/is8.jpg 2min 47s - 3min 29s Ponto de não retorno climático, exploração de recursos naturais e suas legislações, desertificação, cadeia de produção de bens, consumismo e descarte de resíduos. Imagem adaptada de: <http://geracaox2.com.br/wp- content/uploads/2014/11/FILME-INTERSTELLAR-2014-204- size-598.jpg> 9min 58s - 11min 30s Mercado de trabalho, perspectiva de vida, empreendedorismo. Imagem adaptada de: cena do filme (12 min 39 s). 11min 30s - 13min 20s Ética, bipolarização política entre EUA e URSS, popularização da ciência, divulgação científica. Imagem adaptada de: <http://i1.wp.com/www.showmetech.com.br/wp- content/uploads/2015/02/interstellar_voyage-wide.jpg> 11min 30s - 13min 40s Problemas ambientais (desmatamento, aquecimento global, desertificação, poluição e outros), interesses econômicos e políticos por trás do mercado econômico “ecologicamente correto”. Revista da SBEnBio - Número 9 - 2016 VI Enebio e VIII Erebio Regional 3 SBEnBio - Associação Brasileira de Ensino de Biologia 1704 Imagem adaptada de: <http://cinemacao.com/wp- content/uploads/2014/11/02_interstellar.jpeg> 28min 39s - 29min 15s Desmistificação de questões relacionadas ao estereótipo do cientista e da atividade científica, história da ciência. Imagem adaptada de: <http://pipocadepimenta.com/wp- content/uploads/2015/01/coopermurphy.jpg> 30min - 31min 27s Relações interpessoais e trabalho, ética, grandes decisões e consequências. Imagem adaptada de: cena do filme (35 min 14 s). 34min 34s - 35min 12s Ética, barriga de aluguel, fertilização artificial, diversidade genética, adaptabilidade e sobrevivência. Imagem adaptada de: <http://imguol.com/c/entretenimento/2014/11/10/cena-do-filme- interestelar-1415654824728_615x300.jpg> 1h 50min 59s - 1h 51min 11s; 1h 52min 06s - 1h 52min 16s; 1h 52min 40s - 1h 52min 57s; 1h 53min 58s - 1h 54min 43s. Doenças respiratórias, ressentimentos na família e consequências na personalidade dos personagens, tempestades de poeira reais. Imagem adaptada de: <http://i.imgur.com/pwTGQw5.jpg?1> 1h 52min 57s - 1h 53min 55s Ética, sobrevivência, evolução. Revista da SBEnBio - Número 9 - 2016 VI Enebio e VIII Erebio Regional 3 SBEnBio - Associação Brasileira de Ensino de Biologia 1705 Imagem adaptada de: <http://vignette4.wikia.nocookie.net/interstellarfilm/images/c/c2/A melia_and_CASE's_compound.jpg/revision/latest/scale-to-width- down/1280?cb=20150715095818> 2h 42min 42s – 2h 43min 55s Ética, condições básicas de sobrevivência em um planeta, relações afetivas. Fonte: Elaborado pelos autores. CONSIDERAÇÕES FINAIS Espera-se que este trabalho sirva de inspiração e estímulo para a utilização do filme “Interestelar” em sala de aula, oferecendo subsídios teórico-práticos para professores e contribuindo para a formação de estudantes mais reflexivos e esclarecidos sobre ciência, sociedade, ética e condições ambientais a partir de uma visão CTS. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BRUZZO, C. Filmes e escola: isto combina? Ciência & Ensino, Campinas, n. 6, p. 03-06, 1999. INTERESTELAR. Autores: Jonathan Nolan e Christopher Nolan. Direção: Christopher Nolan. Produção: Emma Thomas, Christopher Nolan e Lynda Obst. Intérpretes: Matthew McConaughey, Anne Hathaway, Jessica Chastain, Bill Irwin, Ellen Burstyn, Michael Caine e outros. Produtores executivos: Jordan Goldberg, Jake Myers, Kip Thorne e Thomas Tull. Diretor de Fotografia: Hoyte Van Hoytema. Desenhista de produção: Nathan Crowley. Editor: Lee Smith. Desenhista de vestuários: Mary Zophres. Música de Hans Zimmer. EUA e Reino Unido: Warner Bros. Pictures e Paramount Pictures em associação com Legendary Pictures e produzido por Syncopy Films e Lynda Obst. Productions, 2014. DVD, 169 min, sonoro, legendas em inglês, espanhol e português, widescreen, colorido. Não recomendado para menores de 10 anos. KRASILCHIK, M. REFORMAS E REALIDADE: o caso do ensino das ciências. São Paulo em Perspectiva, v. 14, n. 1. jan./mar. 2000. MORÁN, J. M. O vídeo na sala de aula. Revista Comunicação & Educação, São Paulo, ECA - Ed Moderna, v. 2, n. 2, jan./abr. 1995. p. 27-35. Revista da SBEnBio - Número 9 - 2016 VI Enebio e VIII Erebio Regional 3 SBEnBio - Associação Brasileira de Ensino de Biologia 1706 NOVA ESCOLA. O dia a dia do professor: como se preparar para os desafios da sala de aula. 1 ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira; São Paulo: Nova Escola, 2014, 192 p. PRAIA, J.; GIL-PÉREZ, D.; VILCHES, A. O papel da Natureza da Ciência na educação para a cidadania. Ciência & Educação, Bauru, São Paulo, Brasil, v. 13, n. 2, p. 141-156, 2007. REICHMANN, D. do R. X. T.; SCHIMIN, E. S. Imagens: contribuição para o ensino- aprendizagem em Biologia. Cadernos PDE, Governo do Estado do Paraná: Secretaria de Educação, v. 1, p. 1-27, 2007. Versão Online, ISBN 978-85-8015-037-7. Disponível em: <http://www.diaadiaeducacao.pr.gov.br/portals/cadernospde/pdebusca/producoes_pde/2007_u nicentro_bio_artigo_deise_do_rocio_xavier_taborda_reichmann.pdf>. Acesso em: 08 jun. 2016. VÁZQUEZ-ALONSO, Á.; MANASSERO-MAS, M. A.; ACEVEDO-DÍAZ, J. A.; ACEVEDO-ROMERO, P. 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