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Revista Querubim – revista eletrônica de trabalhos científicos nas áreas de Letras, Ciências Humanas e Ciências Sociais – Ano 11 Nº26 vol. esp. – 2015 ISSN 1809-3264 Página 1 de 125 UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE FACULDADE DE EDUCAÇÃO 2015 2015 2015 2015 REVISTA QUERUBIM Letras – Ciências Humanas – Ciências Sociais Ano 11 Número 26 Volume Especial ISSN – 1809-3264 REVISTA QUERUBIM NITERÓI – RIO DE JANEIRO 2015 N I T E R Ó I R J Revista Querubim – revista eletrônica de trabalhos científicos nas áreas de Letras, Ciências Humanas e Ciências Sociais – Ano 11 Nº26 vol. esp. – 2015 ISSN 1809-3264 Página 2 de 125 Revista Querubim 2015 – Ano 11 nº 26 – vol. especial – 125p. (junho – 2015) Rio de Janeiro: Querubim, 2015 – 1. Linguagem 2. Ciências Humanas 3. Ciências Sociais Periódicos. I - Titulo: Revista Querubim Digital Conselho Científico Alessio Surian (Universidade de Padova - Italia) Carlos Walter Porto-Goncalves (UFF - Brasil) Darcilia Simoes (UERJ – Brasil) Evarina Deulofeu (Universidade de Havana – Cuba) Madalena Mendes (Universidade de Lisboa - Portugal) Vicente Manzano (Universidade de Sevilla – Espanha) Virginia Fontes (UFF – Brasil) Conselho Editorial Presidente e Editor Aroldo Magno de Oliveira Consultores Alice Akemi Yamasaki Andre Silva Martins Elanir França Carvalho Enéas Farias Tavares Guilherme Wyllie Janete Silva dos Santos João Carlos de Carvalho José Carlos de Freitas Jussara Bittencourt de Sá Luiza Helena Oliveira da Silva Marcos Pinheiro Barreto Paolo Vittoria Ruth Luz dos Santos Silva Shirley Gomes de Souza Carreira Vanderlei Mendes de Oliveira Venício da Cunha Fernandes Revista Querubim – revista eletrônica de trabalhos científicos nas áreas de Letras, Ciências Humanas e Ciências Sociais – Ano 11 Nº26 vol. esp. – 2015 ISSN 1809-3264 Página 3 de 125 Sumário 01 Elementos sobre o destinatário de emergência em situação de autoconfrontação – Alana Destri, Anselmo Lima e Dalvane Althaus 04 02 "Uma banana para o racismo": análise de um processo de construção de sentido em uma capa da revista "Carta na Escola" – Ana Paula Veiga, Danielle Franco Brunismann, Gessica Aparecida Cappoani, Renan Cesar Venazzi Foschiera e Anselmo Lima 11 03 “Parece milagre!”, mas como seria realidade? análise da construção de sentido em uma capa da Revista Veja – Carla Helena Lange, Joana Bertani de Campos, Nathalia Ferrarini Vargas, Thaís Alessandra Aureluk e Anselmo Lima 17 04 A prática da leitura e a formação do leitor no ensino médio: abordagem crítica em escolas estaduais de ensino regular – Hérica Romena do Carmo, Mayara Ferreira de Farias e Fernanda Ferreira do Carmo 24 04 O ensino da cartografia a partir do estudo em trilhas de orientação – Josuel da Silva Honório, Mayara Ferreira de Farias e Pedro Costa Guedes Vianna 34 05 Conhecimento turístico em escolas: um estudo realizado na Escola Estadual Capitão Mor Galvão em Currais Novos (RN) - Jussara Cirne de Medeiros, Noêmia Assunção de Souza e Mayara Ferreira de Farias 54 06 A criança e o brincar na educação infantil: um estudo de caso na Escola Municipal Estudante Luiz Antônio (João Câmara, RN) – Marlene Vitorino de Farias, Mayara Ferreira de Farias, Janaina Luciana de Medeiros e Mayane Ferreira de Farias 69 07 Em busca de um lugar diferente: usos e possibilidades da do turismo étnico na comunidade Negros do Riacho em Currais Novos (RN) – Ricaelly Lúcia Alves da Silva Sousa, Jeferson Cândido Alves e Mayara Ferreira de Farias 86 08 Do planejamento ao replanejamento do trabalho docente no ensino superior: o que fazer quando os alunos não leem os textos indicados pelo professor? – Solange Ariati, Dalvane Althaus e Anselmo Lima 103 09 Roteiro turístico no interior do Rio Grande do Norte: uma alternativa de desenvolvimento da atividade turística no Município de Tenente Laurentino Cruz/RN – Vanderlucia Vila da Costa, Janaina Luciana de Medeiros e Mayara Ferreira de Farias 110 10 RESENHA Resenha do livro de: NEIMAN, Zysman; MENDONÇA, Rita. (Orgs.). Ecoturismo no Brasil. Barueri, SP: Manole, 2005 - Juciê Santana de Moura e Mayara Ferreira de Farias 119 11 RESENHA Resenha de: OESTERREICH, Frankiele; MONTOLI, Fabiane da Silva. Potencialidades e fragilidades das ferramentas tecnológicas em ambientes virtuais de aprendizagem. Revista Tecnologias na Educação – ano 2- Número 2- Dezembro 2010 – Mayane Ferreira de Farias e João Quincas de Farias Junior 124 Revista Querubim – revista eletrônica de trabalhos científicos nas áreas de Letras, Ciências Humanas e Ciências Sociais – Ano 11 Nº26 vol. esp. – 2015 ISSN 1809-3264 Página 4 de 125 ELEMENTOS SOBRE O DESTINATÁRIO DE EMERGÊNCIA EM SITUAÇÃO DE AUTOCONFRONTAÇÃO1 Alana Destri Acadêmica do Curso de Licenciatura em Letras Português-Inglês Universidade Tecnológica Federal do Paraná (UTFPR), Câmpus Pato Branco Bolsista PIBIC Anselmo Lima Doutor e Mestre em Linguística Aplicada e Estudos da Linguagem pela PUC-SP, com estágio de doutorado no Conservatório Nacional de Artes e Ofícios (CNAM) de Paris, França, e pós- doutorado na Faculdade de Educação e Desenvolvimento Humano da Universidade de Delaware (UDel), Estados Unidos. Professor do Curso de Licenciatura em Letras Português-Inglês, do Programa de Pós-Graduação em Letras (PPGL) e do Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento Regional (PPGDR) da UTFPR, Câmpus Pato Branco. Dalvane Althaus Mestre em Desenvolvimento Regional pela UTFPR. Doutoranda do Programa de Pós-Graduação em Educação da UNICAMP. Pedagoga do Núcleo de Ensino (NUENS) do Departamento de Educação (DEPED) da UTFPR, Câmpus Pato Branco. Resumo Este texto apresenta uma análise linguística, discursiva e psicológica de modos de manifestação do fenômeno do destinatário de emergência em situação de emprego do método de autoconfrontação em uma ação de formação docente continuada no ensino superior. O referido fenômeno consiste em o sujeito buscar justificar e validar suas ações individuais de trabalho por meio de práticas que supostamente seriam comuns em seu coletivo profissional. O método da autoconfrontação consiste em o sujeito se observar em um vídeo em que aparece trabalhando, com o objetivo de descrever e explicar sua atividade a um pesquisador, que atua como mediador de seu desenvolvimento subjetivo. Palavras-chave: destinatário de emergência; autoconfrontação; formação docente continuada. Abstract This text presents a linguistic, discursive and psychological analysis of modes of manifestation of the phenomenon of emergency addressee in a situation of use of the self-confrontation method in an action of university teacher continuing education. The aforementioned phenomenon consists in the subject seeking to justify and validate his professional individual actions by means of practices which would supposedly be common in his work collective. The self-confrontation method consists in the subject observing himself in a video in which he appears working, with the objective of describing and explaining his activity to a researcher, who acts as a mediator of his subjective development. Keywords: emergency addressee; self-confrontation; continuing teacher education. Introdução A autoconfrontação é um método de pesquisa e intervenção desenvolvido pelo linguista Daniel Faïta (cf. 1997; 2007) com base em seus estudos teórico-metodológicos, sendo amplamente empregado pelo psicólogo francês Yves Clot em sua Clínica da Atividade (cf. Clot, 2010; 2005; Clot, et al., 2001). Consiste em gerar um evento específico em que trabalhadores possam ser os 1 Agradecemos ao CNPq e à Universidade Tecnológica Federal do Paraná (UTFPR) por investimentos que têm tornado possível a realização deste trabalho. Revista Querubim – revista eletrônica de trabalhos científicos nas áreas deLetras, Ciências Humanas e Ciências Sociais – Ano 11 Nº26 vol. esp. – 2015 ISSN 1809-3264 Página 5 de 125 observadores e analistas de sua própria atividade, contando para isso com a ajuda do pesquisador, aqui entendido como “mediador”. No emprego desse método, uma dupla de profissionais pertencentes a um coletivo se voluntaria para ter sua atividade de trabalho observada e gravada em vídeo. Um pequeno trecho da gravação é selecionado para que seja assistido e discutido com os profissionais. Nesse contexto, o voluntário explica o que realiza no excerto extraído e, com a direção do mediador, ambos travam um diálogo sobre questões relevantes para o desenvolvimento subjetivo da experiência vivida. Essa etapa também é gravada e precede outras que não são de interesse específico do presente artigo. No emprego do método de autoconfrontação, há um empenho para que o sujeito conheça- se melhor e para que redescubra sua atividade. É importante também que ele transporte as experiências do vivido para aquilo que poderia ter sido feito. Clot (2010 p. 253) ressalta que, durante esse processo, o profissional observado e observador se descobre vivo e percebe que aquilo que não aconteceu ou que não se fez em sua atividade poderia eventualmente ter sido feito. Com esse novo modo de observar sua própria atividade, o que era uma operação automática passa a ser novamente questão. No anseio de apoiar sua explicação de como se dá o exercer do ofício, o profissional tende a não “ficar sozinho”. Ou seja, em busca de respaldo, convoca uma voz exterior ao diálogo na autoconfrontação. Dessa forma, o discurso do “eu” passa a ser o do “a gente” ou do “nós”, o qual, de forma geral, representa a voz da tarefa prescrita de um coletivo, configurando assim, o fenômeno do “destinatário de emergência” (Clot, 1999 p. 254). Metodologia Apenas a situação de autoconfrontação simples de um docente do Curso de Ciências Contábeis é aqui tomada como objeto de análise. O professor, que aqui chamaremos Fábio, voluntariou-se – na segunda metade do ano de dois mil e doze – para participar de uma ação de formação docente continuada que emprega o método da autoconfrontação. Uma vez realizada e gravada a etapa de autoconfrontação simples, o áudio dessa gravação foi transcrito e sua transcrição foi utilizada como principal material para a análise do fenômeno do destinatário de emergência. A transcrição do áudio foi feita de acordo com normas para transcrição presentes no livro “Análise de textos orais” organizado por Dino Preti (1999), como seguem: Ocorrências Sinais Truncamento / Entonação enfática MAIÚSCULAS Prolongamento de vogal e consoante ::podendo aumentar para:::: dois ou mais Interrogação ? Qualquer pausa ... Comentários descritivos do transcritor ((minúsculas)) Superposição, simultaneidade de vozes Ligando [ as linhas Citações literais ou leituras de textos, durante a gravação. “ ” Quadro 1 – Normas para transcrição de textos orais Fonte: adaptado de Preti (1999, p. 11) Uma hora e trinta e três minutos de áudio de autoconfrontação simples renderam mil seiscentas e trinta e nove linhas transcritas. Em todo o corpus, após uma leitura atenta, foi possível Revista Querubim – revista eletrônica de trabalhos científicos nas áreas de Letras, Ciências Humanas e Ciências Sociais – Ano 11 Nº26 vol. esp. – 2015 ISSN 1809-3264 Página 6 de 125 observar o uso de setenta ocorrências de “a gente”, quatorze ocorrências de “nós” e trinta e uma ocorrências de verbos conjugados na primeira pessoa do plural, podendo estar ou não com o sujeito da oração expresso. Nesse universo, três verbos conjugados e quarenta e seis ocorrências de “a gente” foram identificados como convocação de destinatário de emergência, conforme teorização de Clot (1999). A seleção dos excertos analisados abaixo foi feita de forma que esta investigação pudesse abranger e aprofundar os estudos sobre como e em quais situações distintas se dá o refúgio no coletivo por meio do destinatário de emergência. Fundamentação O método de autoconfrontação simples promove uma situação em que o indivíduo participante passa a conhecer-se melhor – algo que advém unicamente do descobrir-se vivo, analisando o que fez e o que deixou de fazer, ao mesmo tempo em que percebe que pode transformar sua atividade tomando consciência do que poderia ter sido feito de modo diferente. Em outras palavras, é a passagem do vivido na atividade para a experiência do que se é capaz de fazer (Clot, 2010, p. 255). Nesse contexto, ao explicar para o mediador o que se sucede no vídeo, é comum o profissional deparar-se com o “difícil de dizer”. Diante do desconforto de falar de sua própria atividade, o sujeito, consciente ou inconscientemente, busca proteger-se através de um apoio exterior, deslocado para o diálogo, isto é, o sujeito convoca ao diálogo um terceiro participante vivo, que se mistura à sua voz: o “destinatário de emergência”. Segundo Clot (2010): Essa voz que se ouve então nas variações discursivas do ‘eu’ e nas modulações diferenciadas do ‘a gente’ mistura-se ao diálogo com o destinatário direto que é o pesquisador. Essa voz que diz ‘a gente’ no discurso do ‘eu’ fala pelas maneiras de fazer comuns no coletivo e com elas (Clot, 2010 p.254). Sobre essa situação de “pessoa subvertida” é importante ressaltar que quando há a alternância do pronome pessoal de primeira pessoa do singular para a primeira pessoa do plural, o “eu” dilui-se no anonimato do “nós” ou é ampliado. Sendo assim, muitas vezes o enunciador usa “nós” para não falar em seu próprio nome, mas colocar atrás de si uma comunidade, um coletivo respaldando-o (Fiorin, 2010, p. 96). Outro fato a ser observado é que, quando o “eu” designa-se locutor, ele se enuncia como “sujeito” em meio a um discurso. A mais objetiva evidência que se pode ter sobre a identidade de um sujeito é a que ele dá sobre si mesmo. Dessa forma, o fundamento da subjetividade está no exercício da língua e “os pronomes pessoais são o primeiro ponto de apoio para essa revelação da subjetividade na linguagem” (Benveniste, 2005, p. 288). De fato, a linguagem é tão profundamente marcada pela expressão da subjetividade que possivelmente não haveria como funcionar se ela fosse construída de outra forma (Benveniste, 2005 p. 287). Atesta-se assim o poder da linguagem de representar e ser as próprias construções de pensamento do indivíduo e, por meio desse poder, é reforçada a funcionalidade do método de autoconfrotação simples de desenvolver novos meios de pensar. Análise É notável a frequência de manifestação do fenômeno do destinatário de emergência na etapa de autoconfrontação simples. No caso específico que esse artigo aborda, de todas as ocorrências de “a gente” e afins, em quase metade delas configura-se o referido fenômeno. Os Revista Querubim – revista eletrônica de trabalhos científicos nas áreas de Letras, Ciências Humanas e Ciências Sociais – Ano 11 Nº26 vol. esp. – 2015 ISSN 1809-3264 Página 7 de 125 excertos retirados do corpus da transcrição do texto oral demonstram algumas das diversas situações em que se dá essa busca de refúgio no coletivo. No exemplo que segue abaixo, o professor Fábio procura algo que sustente e reforce sua opinião. Como espontaneamente ocorre no fenômeno estudado, Fábio vincula sua opinião a algum coletivo. Leia-se “M” como Mediador e “PF” como Professor Fábio: M: enfim... você falou que também não tem participado nas questões de coordenação... isso pra pro exercício da docência não faz falta?... você ter essa esse esses MOMENTOS de CONTATO com os outros professores para saber como que tá... como que TEU ALUNO está... como que ele está ACONTECENDO na aula com outro:: PF: eu acho que... isso é uma f/ não é::/ eu acho que os DE ((dedicação exclusiva)) iam te responder da mesma forma M: Uhum PF: porque não é uma PRÁTICAdo curso fazer isso... discutir aluno por aluno da dificuldade Sobre o trecho apresentado, o mediador pergunta ao professor se não faz falta para o exercício da docência o contato com outros professores em reuniões para saber como os alunos se comportam nas demais matérias. Percebe-se pelos truncamentos que Fábio ensaiou uma resposta individual, mas acabou por convocar a voz do coletivo dos professores que trabalham quarenta horas e em regime de dedicação exclusiva (DE). Porém, o coletivo no qual o professor se situa é o dos professores que atuam pelo regime de vinte horas, sem DE. Dessa forma, seu refúgio no coletivo se deu para justificar algo que não faz em virtude de todo um coletivo que supostamente também não faz. Ao utilizar-se de um coletivo que não é o seu, ele elimina a oposição entre os dois grupos – o seu e o dos outros. Todavia, o fenômeno do destinatário de emergência comumente se dá de maneira velada. Observe-se o seguinte trecho: M: aham... e durante essa utilização do quadro como que fica a:: a relação com os alunos? a interação entre professor e aluno? porque você está virado pro quadro... PF: sim M: e aí como é que você faz pra COMPENSAR esse esse esse momento que você precisa ficar virado pro qua::dro... o que você faz pra compensar pra não perder a interação com os alunos? PF: eu... é:: algum enquanto está pelo menos montando os exemplos ali... é:: a gente perde mesmo interação... mas na hora que você tá colocando... fazendo cálculos e tal eu uso a participação deles né? Nesse caso, o mediador aponta para um problema da sala de aula: a perda da interação entre professor e aluno. Ele questiona Fábio sobre como se dá a compensação da perda de interação ao voltar-se para o quadro. Deparado com o “difícil de explicar”, Fábio, por meio das palavras, une-se ao coletivo dos “professores em geral” ao subverter o pronome “eu” por “a gente” na oração “a gente perde mesmo interação”. Os pronomes pessoais em primeira pessoa podem ser dois: eu (singular) e nós (plural). No uso coloquial, o “a gente” pode substituir o “nós” (Cunha e Cintra, 2008, p. 310). No entanto, é importante atentar ao fato de que o pronome pessoal “nós” “não é a multiplicação de objetos idênticos, mas a junção de um eu com um não-eu” (Fiorin, 2010 p. 60). Esse “não-eu”, nesse caso, é o destinatário de emergência aplicado ao coletivo “professores em geral”. Essa forma de tratamento pode ser vista de certa forma como o “ofício que fala”, o qual representa um entimema social construído em uma história coletiva: a parte subentendida da atividade que os trabalhadores de determinado meio conhecem e observam, esperam e reconhecem, apreciam ou temem; o que lhes é comum e Revista Querubim – revista eletrônica de trabalhos científicos nas áreas de Letras, Ciências Humanas e Ciências Sociais – Ano 11 Nº26 vol. esp. – 2015 ISSN 1809-3264 Página 8 de 125 os reúne sob condições reais de vida; o que eles sabem que é seu dever fazer, graças a uma comunidade de avaliações pressupostas, sem que seja necessário reespecificar a tarefa sempre que ela se apresenta (CLOT, 2010 p. 26). No caso que estamos analisando, o ofício – ao falar – apresenta-se como o porta-voz do coletivo dos “professores em geral” para afirmar, no discurso de Fábio, que professores normalmente perdem a interação com os alunos ao voltarem-se para o quadro. Outro exemplo semelhante pode ser observado a seguir: M: no caso de quando o:: o o:: o computador... multimídia não deu CERTO... você:: um mudou a forma... partiu para o livro... se tivesse dado certo o multimídia você utilizaria o livro igual? PF: alguma parte... alguns detalhes a mais... que na transparência a gente coloca um resumo né?... um resumo... às vezes algum detalhe a mais e tal para explica::r enfim Da mesma forma que antes, se analisado com base no conceito de “ofício que fala”, esse trecho informa que, segundo a visão do professor Fábio, professores em geral colocam em suas transparências um resumo do conteúdo a ser explicado. Vê-se que até agora, nos excertos selecionados, o professor insere no diálogo dois tipos de coletivos de professor: o dos “professores de dedicação exclusiva”, do qual não faz parte, e o dos “professores em geral”, do qual faz parte. No entanto, nada o impede de ligar-se a um coletivo exterior à Universidade para poder justificar algo que faz ou deixa de fazer na sua carreira docente: PF: não quero mais... sábado eu até:: preparo aula e corrijo prova mas no domingo não faço mais ((riso)) M: você fazia? PF: fazi::a... é que é o tempo que eu tenho... durante a semana eu trabalho a semana toda no escritório é... quarta-feira não tenho aula mas a gente avança horário em reuniões ou viaja em algum cliente é::/ aí não tem jeito mesmo... né? essa semana tem prova pra corrigir... quando que vai dar pra eu corrigir? normalmente é no sábado Nesse caso, o professor Fábio não se uniu discursivamente a seus companheiros de profissão, os professores, mas sim aos companheiros de sua outra profissão, a de contador. Fábio pertence perfeitamente a ambos os coletivos e fez uso do segundo para justificar o que talvez não poderia justificar com apenas o primeiro: o tempo limitado para dedicação docente extraclasse. Essa questão classifica-se como “difícil de explicar” e, dessa vez, contrastou dois coletivos a fim de encontrar respaldo para sua atitude. Na sequência, respondendo a uma pergunta do mediador, Fábio demonstra iniciar uma reflexão sobre outros aspectos de sua prática de ensino em sala de aula: M: fazer a leitura no livro não seria:: talvez:: é:: usando tua palavra então... didaticamente agradá::vel... a melhor fo::rma?... PF: não... eu acho que não:: não é que não seria... mas a gente poderia M: o que é que te faz levar/ buscar um outro método? No excerto acima, já que o pensamento não se exprime em palavra, mas nela se realiza (Vygotsky, 2009), é possível perceber através das ocorrências presentes na fala de Fábio que ele está em plena construção de pensamento. Isso ocorre ao responder ao mediador sobre outra questão difícil de tratar: se utilizar o livro didático como material proporciona um melhor método de ensino. Revista Querubim – revista eletrônica de trabalhos científicos nas áreas de Letras, Ciências Humanas e Ciências Sociais – Ano 11 Nº26 vol. esp. – 2015 ISSN 1809-3264 Página 9 de 125 Primeiramente, Fábio nega que o livro didático seria o melhor método: “não... eu acho que não”; e, após um prolongamento do “não”, refaz sua resposta, sugerindo que o livro didático poderia ser o melhor método se fosse feito algo que acabou por não comentar: “não é que não seria... mas a gente poderia”. Ao utilizar o verbo no futuro do pretérito – “poderia” – nota-se que Fábio identificou algo que teria tido a possibilidade de ter acontecido no passado, mas não aconteceu. Segundo Fiorin (2010), o emprego do pretérito imperfeito denota probabilidade em fatos passados ou, ainda, denota acontecimento que precisa de uma confirmação ou de uma hipótese. Dado esse fato, a utilização do pretérito imperfeito nesse caso é indicativo de que provavelmente foi aberta uma discussão interna sobre o que pode ser feito no presente para que aquilo que deveria ter acontecido efetivamente aconteça. Por outro lado, o emprego do “a gente” logo antes do “poderia” dilui a subjetividade do falante em “nós” (Fiorin, 2010 p. 96). Sendo assim, linguisticamente, o professor Fábio não toma unicamente para si a responsabilidade de buscar soluções, mas sim responsabiliza o coletivo inteiro no qual está inserido. Algo semelhante acontece no trecho a seguir: M: e:: assim: é:: os alunos... o que que ele eles não sugerem na::da de de possibilidades de modificação em relação a essa questã::o de como utilizar o computador em sala de a::ula por exemplo? PF: ah eu acho que a gente teria que fazer:: uma discussã::o sobre isso né? M: nos momentos em quevocê conversa com eles sobre isso... alguém dá alguma abertu::ra? PF: ah eu acho que é a gente que tem que provocar... e eu acho que eu não provoquei isso... até seria uma sugestão Professor Fábio, nesse excerto, ao utilizar-se do “a gente teria que fazer uma discussão sobre isso”, demonstra que reconheceu uma tarefa prescrita do seu ofício não realizada por todo seu coletivo. Já em sua próxima fala, ao ser questionado sobre conversar com os alunos a respeito do uso de computadores em sala de aula, o professor aponta para outra atividade prescrita: “a gente que tem que provocar...”. Por fim, dessa vez ele reconhece e assume que, individualmente, não coloca em prática a atividade prescrita sobre a qual comentou ao dizer: “e eu acho que eu não provoquei isso...”. A partir desse momento, de forma geral, o profissional nota que há uma oportunidade de aperfeiçoar sua atividade e consegue enxergar meios para esse fim. Parece dar-se aqui uma tomada de consciência. Conclusão Ao participar da sessão de autoconfrontação simples, o profissional, por meio da busca de refúgio no coletivo, sem disso se dar conta, passa a delinear aspectos do exercício de seu ofício. A partir desse momento, podem-se extrair de seu discurso informações valiosas sobre como um determinado coletivo talvez age ou deveria agir. Além disso, o fenômeno do destinatário de emergência não só foi aqui exposto e analisado, mas evidenciaram-se indicativos de que a afetividade também se manifesta durante grande parte da etapa da autoconfrontação simples. É justamente o afetar que garante o início do processo de reflexão do profissional acerca de sua atividade na relação com seu coletivo. Clot (2010; 2005) ressalta que, para o trabalhador, manter esse observador exterior que cresceu em si é o ideal para que o profissional possa evoluir com os olhos do ofício. Portanto, com esse observador exterior em si, o indivíduo torna-se capaz de ter tomadas de consciência e, reciprocamente, manter o observador desenvolvido nele como forma de buscar cotidianamente o aperfeiçoamento de sua atividade. Revista Querubim – revista eletrônica de trabalhos científicos nas áreas de Letras, Ciências Humanas e Ciências Sociais – Ano 11 Nº26 vol. esp. – 2015 ISSN 1809-3264 Página 10 de 125 Referências BENVENIESTE, Émile. Problemas de Linguística Geral I. Trad. Maria da Glória Novak e Maria Luisa Neri. Campinas: Pontes, 2005. CLOT, Yves. Trabalho e poder de agir. Trad. Guilherme Teixeira e Marlene Vianna. Belo Horizonte: Fabrefactum, 2010. CLOT, Yves. L´autoconfrontation croisée en analyse du travail: l´apport de la théorie bakhtinienne du dialogue. In: FILLIETTAZ, L.; BRONCKART, J. P. (eds.). L´analyse des actions et des discours en situation de travail. Concepts, méthodes et applications. Peeters: Louvain-laneuve, 2005. CLOT, Yves; FAÏTA, Daniel; FERNANDES, Gabriel; SCHELLER, Livia. Entretiens em autoconfrontation croisée: une méthode en clinique de l’activité. Education Permanente. n. 146, p.17- 25, 2001. CUNHA, Celso; CINTRA, Luís F. Lindley. Nova Gramática do Português Contemporâneo. 5.ed. Rio de Janeiro: Lexikon, 2008. FAÏTA, Daniel. L´image animée comme artefact dans le cadre méthodologique d´une analyse clinique de l´activité. @ctivités, n. 2, v. 4. p.3-15, 2007. Disponível em: <http://www.activites.org/sommaires/v4n2.html>. Acesso em: 18/05/2013. FAÏTA, Daniel. La conduite du TGV: exercices de styles. Champs Visuels, n. 6. p.123-129, 1997. FIORIN, José Luiz. As astúcias da enunciação: as categorias de pessoa, espaço e tempo. São Paulo: Editora Ática, 2010. PETRI, Dino. (org). Análise de textos orais. 4 ed. São Paulo: Humanitas, 1999. VYGOTSKY, Lev Semenovich. A construção do pensamento e da linguagem. 2.ed. Trad. Paulo Bezerra. São Paulo: Martins Fontes, 2009. Enviado em 30/04/2015 Avaliado em 15/06/2015 Revista Querubim – revista eletrônica de trabalhos científicos nas áreas de Letras, Ciências Humanas e Ciências Sociais – Ano 11 Nº26 vol. esp. – 2015 ISSN 1809-3264 Página 11 de 125 "UMA BANANA PARA O RACISMO": ANÁLISE DE UM PROCESSO DE CONSTRUÇÃO DE SENTIDO EM UMA CAPA DA REVISTA "CARTA NA ESCOLA" Ana Paula Veiga Danielle Franco Brunismann Gessica Aparecida Cappoani Renan Cesar Venazzi Foschiera2 Anselmo Lima3 Resumo A partir de uma reflexão teórico-metodológica sobre relações entre significação e tema, este artigo tem por objetivo analisar um processo peculiar de construção de sentido em uma capa da revista "Carta na Escola", na qual aparece o enunciado-manchete "Uma BANANA para o RACISMO" acompanhado da imagem de uma mão que segura uma banana descascada até a metade. Trata-se de uma análise verbo-visual que evidencia a ambiguidade da associação do signo à imagem da fruta. Conclui-se que a "mesma" banana que é usada para promover o racismo quando atirada em campo de futebol pelos torcedores é empregada pela revista para combatê-lo. Palavras-chave: significação; tema; racismo. Abstract Based on a theoretical/methodological reflection on relationships between meaning and theme, this article aims at analysing a peculiar meaning-making process on the cover of the magazine "Carta na Escola", in which the utterance "Uma BANANA para o RACISMO" appears accompanied by the image of a hand which holds a half-peeled banana. This is a verbal-visual analysis which examines the ambiguity of the association of the sign to the image of the fruit. The study concludes that the "same" banana that is used to promote racism when thrown in the soccer field by supporters is employed by the magazine in order to combat it. Keys-words: meaning; theme; racism. Introdução Em maio de 2014, a revista "Carta na Escola" escreve uma matéria afirmando que “o preconceito em campo espelha a nossa sociedade e é só mais um capítulo da complexa história do negro no futebol”. Como manchete, na capa, apresenta o sugestivo enunciado: “Uma BANANA para o RACISMO”. Ao lê-lo, atenta-se para o fato de que a revista destaca, em letras maiúsculas, duas palavras: “BANANA” e “RACISMO”. Ambos os signos, quando postos nessa relação enunciativa, criam um enunciado complexo em seus sentidos, para além de seus significados como signos isolados encontrados em qualquer dicionário: por meio de uma construção sintática específica, dentre outros recursos, apresentam um sentido ideológico e histórico. Levando em conta que uma revista constitui-se como um produto e, sendo assim, que ela precisa atrair compradores, o item "capa" tem relevância significativa, visto que os elementos que a compõem precisam prender a atenção dos possíveis leitores-compradores. Para esse fim, nota-se que o enunciado em questão é apresentado em estreita relação com a imagem estampada na capa: uma mão oferecendo/segurando uma banana descascada, o que constitui uma ferramenta primordial na estética da capa. 2 Acadêmicos do quinto período do Curso de Licenciatura em Letras Português-Inglês da UTFPR-PB. 3 Doutor em Linguística Aplicada e Estudos da Linguagem pela PUC-SP; Professor da UTFPR-PB. Revista Querubim – revista eletrônica de trabalhos científicos nas áreas de Letras, Ciências Humanas e Ciências Sociais – Ano 11 Nº26 vol. esp. – 2015 ISSN 1809-3264 Página 12 de 125 Ao considerarem-se a complexidade do enunciado em relação com a imagem, observa-se uma construção articulada de sentidos, na qual os recursos de linguagem verbal e visual dialogam e se reafirmam mutuamente. A proposta deste artigo é, portanto, analisar essa capa, com foco nesses elementos em separado para, em seguida, colocá-los em diálogo, num esforço de melhor entender e fazer compreender mais profundamente sentidos construídos por meio das palavras “BANANA” e “RACISMO”, as quais se encontram intimamente relacionadas com as imagens da capa. Metodologia Para a realização deste estudo, cada um dos autores - trabalhandoem grupo - ficou responsável por selecionar e apresentar uma revista, no intuito de que em sua capa se encontrassem, ocultos ou semiocultos, elementos conflituosos, ou seja, geradores de polêmicas que merecessem análises e discussões aprofundadas. Ao se proceder inicialmente dessa forma, dentre algumas revistas, foi escolhida a "Carta na Escola", em seu número 86. Determinantes para essa escolha foram seus elementos verbais e visuais que aparecem na capa, tendo em vista que o enunciado da manchete é, além de polêmico, bastante expressivo e que as palavras destacadas são potencialmente intrigantes, apresentando um diálogo fluente com os recursos visuais. O enunciado “Uma BANANA para o RACISMO” destaca-se em amarelo na capa e remete à matéria “Uma paixão de todas as cores”. Selecionaram-se desse enunciado as palavras “BANANA” e “RACISMO” para construção de uma análise inicial. Primeiramente, partiu-se para a busca de definições presentes no Novo Dicionário da Língua Portuguesa e no Dicionário Larousse. Nesses dicionários, foi realizada a primeira verificação de significação dos termos. Realizada essa primeira busca, prosseguiu-se com a pesquisa em outras fontes do mesmo gênero, na tentativa de aprofundar os conhecimentos sobre as definições: consultou-se também o Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa. Ao encontrarem-se as definições das palavras, conduziu-se o estudo buscando-se aspectos históricos e ideológicos a elas ligados. A fonte de pesquisa utilizada dessa vez foi um Dicionário Etimológico da Língua Portuguesa. No que diz respeito à palavra “RACISMO”, fez-se necessária a pesquisa sobre o sufixo –ismo. Para o estudo desse sufixo, encontraram-se alguns estudos no artigo de Gianastacio (2010). As palavras, consideradas inicial e isoladamente em suas definições dicionarizadas, já direcionam possíveis análises da capa. Entretanto, uma análise mais aprofundada é apenas possível quando direcionamos o estudo para o enunciado completo: “Uma BANANA para o RACISMO”, contrastando-o com a imagem presente na capa e ressaltando o contexto real do enunciado. Fundamentação teórica Em um enunciado tomado para análise, nota-se a presença de um “sentido da enunciação completa”. É dessa forma que Bakhtin/Volochinov define o conceito de “tema”, acrescentando que “o tema da enunciação é na verdade, assim como a própria enunciação, individual e não reiterável" e que "ele se apresenta como a expressão de uma situação histórica concreta que deu origem à enunciação” (BAKHTIN/VOLOCHINOV, 2012, p.129-136). Com base nisso, o autor ressalta a importância do tema da enunciação, dado ser ele “concreto, tão concreto como o instante histórico ao qual ele pertence. Somente a enunciação tomada em toda a sua amplitude concreta, como fenômeno histórico, possui um tema” (BAKHTIN, 2012, p.134). Bakhtin apresenta a enunciação tendo em vista que “além do tema, ou, mais exatamente, no interior dele, a enunciação é igualmente dotada de significação”, sendo referente aos "elementos da enunciação reiteráveis e idênticos cada vez que são repetidos”, os quais Revista Querubim – revista eletrônica de trabalhos científicos nas áreas de Letras, Ciências Humanas e Ciências Sociais – Ano 11 Nº26 vol. esp. – 2015 ISSN 1809-3264 Página 13 de 125 são tomados como abstratos: "fundados sobre uma convenção, eles não têm existência concreta independente” (BAKHTIN, 2012, p.134). Tendo em vista o enunciado de capa que se pretende analisar adiante, seria cabível, então, analisar a significação da enunciação, ou seja, realizar um estudo sobre os elementos linguísticos que estão operando no mesmo, considerando-se que essa significação é “idêntica em todas as instâncias históricas em que é pronunciada; ela se compõe da significação de todas as palavras que fazem parte dela, das formas de suas relações morfológicas e sintáticas, etc.” (BAKHTIN/VOLOCHINOV, 2012, p.129-136). Em oposição à definição de significação, Bakhtin/Volochinov define tema (ou sentido) como “um sistema de signos dinâmico e complexo, que procura adaptar-se adequadamente às condições de dado momento da evolução” (2012, p.129-136). Entretanto, quando o mesmo autor apresenta a “significação como um aparato técnico para a realização do tema”, estabelece-os como indissociáveis, acrescentando que “não há tema sem significação, e vice-versa” (BAKHTIN/VOLOCHINOV, 2012, p.129-136). Comentando os conceitos de tema e significação em Bakhtin/Volochinov, Cereja esclarece a relação entre significação e signo, de um lado, em comparação com tema e signo ideológico, de outro: “se a significação está para o signo - ambas virtualidades de construção de sentidos da língua -, o tema está para o signo ideológico, resultado da enunciação concreta e da compreensão ativa, o que traz para o primeiro plano as relações concretas entre sujeitos” (CEREJA, 2010, p.202). Vale ressaltar também a inter-relação entre tema e significação, tal qual apresentada por Bakhtin/Volochinov: O tema constitui o estágio superior real da capacidade de significar. De fato, apenas o texto significa de maneira determinada. A significação é o estágio inferior da capacidade de significar. A significação não quer dizer nada em si mesma, ela é apenas um potencial, uma possibilidade de significar no interior de um tema concreto (BAKHTIN/VOLOCHINOV, 2012, p.129-136). Finalmente, ainda segundo Bakhtin/Volochinov, “a distinção entre tema e significação adquire particular clareza em conexão com o problema de compreensão” (2012, p.129-136): para se compreender um enunciado deve-se tomá-lo para análise em sua relação constitutiva com outros enunciados. Análise Primeiramente, apresenta-se a seguir a capa da revista "Carta na Escola", cuja manchete será aqui analisada do ponto de vista teórico apresentado anteriormente: Capa da revista analisada (Fonte: Revista Carta na Escola, n. 86, maio 2014. Arquivo Pessoal.) Revista Querubim – revista eletrônica de trabalhos científicos nas áreas de Letras, Ciências Humanas e Ciências Sociais – Ano 11 Nº26 vol. esp. – 2015 ISSN 1809-3264 Página 14 de 125 Inicialmente buscaram-se em dicionários definições para os signos “BANANA” e “RACISMO” a fim de entenderem-se suas escolhas e suas relações no interior do enunciado. Como significação para “BANANA”, encontra-se no Dicionário Larousse: “s.f (talvez do ár. Banãna ‘dedo’) 1. Fruto da bananeira, oblongo e de polpa carnosa, ger. comestível que se agrupa em cacho [...]. 2. Infrm. Gesto obsceno e ofensivo que consiste ger. em apoiar a mão na dobra do outro braço, que fica erguido e de punho fechado. [...]. 4. Pessoa frouxa, sem energia; palerma.” (2017, p.148). Em seguida, foi consultado o signo “RACISMO”, tal como aparece no Dicionário Aurélio: “[do ingl racism < Fr. racisme] sm 1. Doutrina que sustenta a superioridade de certas raças 2. Qualidade, sentimento ou ato de indivíduo racista. Cf. segregacionismo” (FERREIRA, 1986, p.1443). Buscando expandir o entendimento a respeito da significação da palavra em estudo, procurou-se a definição de "segregacionismo". Assim, no mesmo dicionário, consta o seguinte: “sm Política ou atitude política de segregação racial” (FERREIRA, 1986, p.1562). Avançando-se um pouco mais, para o sintagma "segregação racial", encontrou-se: “política que objetiva separar e/ou isolar no seio de uma sociedade as minorias raciais.” (FERREIRA, 1986, p.1562). Já segundo o Dicionário Contemporâneo da Língua Portuguesa, racismo é: “s.m. teoria filosófica e política da pureza da raça, que admite a superioridade de certas raças, sobretudo a raça ariana, e impede que se lhe misture estranhos” (p.3048). Essa definição restringe-se ao acontecimento do nazismo na Alemanha, mas se relaciona com o sentido geral do termo. Buscando ainda outras fontes que tratassem do conceito e apresentassem uma definição mais abrangente, foi que se encontrou então a definição contida noDicionário Houaiss da Língua Portuguesa, em que se define racismo como: 1. Conjunto de teorias e crenças que estabelecem uma hierarquia entre as raças, entre as etnias. 2. Doutrina ou sistema político fundado sobre o direito de uma raça (considerada pura e superior) de dominar outras. 3. Preconceito extremado contra indivíduos pertencentes a uma raça ou etnia diferente geralmente considerada inferior. 4. Atitude de hostilidade em relação a determinada categoria de pessoas. ETIM raça+ ismo; ver rat. Diante da indicação etimológica que a definição do Houaiss nos fornece, partiu-se ao Dicionário Etimológico da Língua, investigando-se a etimologia do signo "raça": “conjunto de indivíduos cujos caracteres somáticos são semelhantes e se transmitem por hereditariedade. XV. Do it. Razza derivado do lat. ratiõ – õnis| RACIAL XX| RACISMO” (CUNHA, 2010, p. 544). Partindo dessas significações, para se estabelecer uma relação entre o signo “raça” com o signo “banana”, investigou-se o significado de “banana” no Dicionário Etimológico: “sf. fruto da bananeira, planta da fam. das musáceas. ext. Pessoa frouxa, palerma, sem energia. De origem africana”. (CUNHA, 2010, p. 78). Parece, entretanto, que merece destaque uma definição já vista anteriormente: "gesto obsceno e ofensivo que consiste ger. em apoiar a mão na dobra do outro braço, que fica erguido e de punho fechado". Apresentada a primeira parte de nosso estudo, a qual consistiu em um levantamento de informações em dicionários, sobre as palavras "BANANA" e “RACISMO”, cabe agora analisar o sufixo – ismo. Encontramos o estudo feito por Gianastacio, que faz a seguinte consideração sobre a Revista Querubim – revista eletrônica de trabalhos científicos nas áreas de Letras, Ciências Humanas e Ciências Sociais – Ano 11 Nº26 vol. esp. – 2015 ISSN 1809-3264 Página 15 de 125 historicidade do sufixo - ismo: “o sufixo – ismus no latim passou para a língua portuguesa em – ismo” (GIANASTACIO, 2009, p. 29). O mesmo autor esclarece que: O sufixo – ismus, lembra Mauerer Jr. (1951, p. 09), foi introduzido no latim cristão, como cristianismus e Judaismus [...] dessa forma, tanto o sufixo –ismo como – ista foram bem utilizados no latim medieval, para designar sistemas doutrinários e seus seguidores (GIANASTACIO, 2009, p. 31). Ginastacio, analisando o sufixo na língua portuguesa, destaca então que: “o sufixo – ismo tem como base, na maioria de suas formações, um substantivo. Há formações também de bases adjetivas. [...] Os significados, segundo Sandmann, são dos mais diversos: ‘doutrinas e teorias filosóficas e religiosas, políticas, orientações políticas, sociais e artísticas, maneiras de comportamento etc. (SANDMANN, 1989, p. 42)” (GIANASTACIO, 2009, p. 33). Entendidas as significações, cabe voltar-se ao enunciado completo: “Uma BANANA para o RACISMO”. Deve-se colocar o mesmo no contexto real do discurso. Especialmente na época da publicação da revista cuja capa está sendo analisada, ocorreu algumas vezes que, em estádios de futebol, torcedores jogaram bananas em campo como forma de ofensa, de xingar e agredir jogadores negros: “você(s) é(são) macacos!”. O conhecimento desse fato possibilita estabelecer uma análise mais rica do enunciado, inclusive da imagem que o acompanha. Ao relacionar a capa com a matéria publicada na revista, é possível perceber que essa construção do enunciado foi intencional. Trata-se especialmente da utilização do signo "banana", o qual permite diversas significações. No contexto do estádio de futebol, no momento em que foi atirada em campo, o uso da banana funcionou como agressão, mas, no contexto da capa, a "mesma" banana é agora utilizada pela revista para expressar um gesto enfático de discordância com o comportamento dos torcedores. Assim a expressão utilizada na capa representa um “basta” quando se diz “uma banana para o racismo”. Ao utilizar-se desses recursos, a revista pretende expressar a construção da capa como: “um BASTA para o racismo” (aqui há relações com o "gesto obsceno" da banana, com a significação de um "não!", de um "nem vem que não tem!"). Dessa forma, torna-se necessário observar como o momento do discurso constroi o tema (ou o sentido) a partir da significação, pois a mesma “BANANA” usada para promover o racismo em campo de futebol tornou-se também uma forma de expressão usada para combatê-lo. Cabe ainda destacar que a imagem da banana, juntamente com a imagem da mão que a segura ao lado do enunciado "uma banana para o racismo", parece inclusive funcionar como ponto de exclamação (!). Conclui-se que a capa da revista não parece apenas expressar a ideia de um mero "basta" a esse tipo de atitude da torcida, mas a ideia de um "basta" com ênfase, num parentesco com o "gesto obsceno" da banana. Considerações finais Ao término da execução de todos os procedimentos descritos no item de metodologia, a saber, escolha da capa de revista a analisar, estudo dos textos teóricos, pesquisa realizada nos mais diversos tipos de dicionários, buscou-se relacionar e sintetizar as informações obtidas a fim de contribuir para o esclarecimento do enunciado, isto é, para um acesso a seu tema (ou sentido). A matéria da revista "Carta na Escola", cuja capa foi analisada anteriormente, aborda a história do futebol, suas formações, o motivo de sua criação e os objetivos pelos quais era praticado, bem como as justificativas do público que praticava esse esporte para o fato de o terem escolhido. Revista Querubim – revista eletrônica de trabalhos científicos nas áreas de Letras, Ciências Humanas e Ciências Sociais – Ano 11 Nº26 vol. esp. – 2015 ISSN 1809-3264 Página 16 de 125 De um lado, houve aqueles que jogavam futebol, mas recebiam críticas e eram hostilizados por terem supostamente passado a praticar o esporte não como forma de agregação de aspectos à sua identidade, mas como forma de transformação da mesma, negando sua classe social e sua cor. De outro lado, antes desses, houve aqueles que praticavam o esporte como forma de afirmação de uma origem considerada pura e superior. Assim, disseminavam-se valores preconceituosos dos considerados brancos em relação aos outros grupos étnicos que jogavam o futebol. À luz desses fatos históricos, compreende-se de maneira mais clara o motivo pelo qual se construiu o enunciado de capa como forma inicial de apresentação do assunto a ser abordado na matéria da revista. Diante do exposto, com base na teoria de Bakhtin/Volochinov, compreende-se algo a mais a respeito da evolução da utilização das palavras “banana” e “racismo”, o que auxilia no estudo da interpretação ambígua da palavra “banana” relacionada com a palavra “racismo” no enunciado de capa. De um lado, nesse contexto, pode-se entender a evocação e a resposta a um enunciado anterior, que manifesta e reafirma o preconceito (o ato de torcedores, ao atirarem bananas ao campo), ao mesmo tempo em que, de outro lado, por meio do emprego criativo da palavra e da imagem de uma banana na capa de uma revista, manifesta-se no enunciado-resposta da capa uma ruptura com o preconceito: “uma banana!”, no sentido de expressar um não ao racismo e de não mais aceitar atitudes preconceituosas. Reconhecem-se, portanto, duas vozes discursivas em luta no mesmo enunciado. Com base nos conceitos de significação e tema, ao se estudar o processo histórico de transformação das palavras "banana" e "racismo" em contraposição a informações sobre a história do desenvolvimento do próprio esporte (futebol), interpreta-se com maior profundidade e amplitude a proposta da matéria publicada pela revista. É isso. Referências AULETE, Caudas. Dicionário Contemporâneo da Língua Portuguesa. Volume IV. 5ª ed. Rio de Janeiro: Delta, 1970. BAKHTIN, Mikhail (Volochinov). Marxismo e Filosofia da Linguagem: problemas fundamentais do método sociológico da linguagem. Tradução Michel Lahud e Yara Frateschi Vieira. 13. ed. São Paulo: Hucitec,2012. CEREJA, William. Significação e tema. In: BRAIT, Beth. (org.). Bakhtin: conceitos-chave. 4. ed. São Paulo: Contexto, 2010. CUNHA, Antônio Geraldo da. Dicionário Etimológico da Língua Portuguesa. 4. ed. Rio de Janeiro: Lexikon, 2010. FERREIRA, Aurélio Buarque de Olanda. Novo Dicionário da Língua portuguesa. 2. ed. Revista e aumentada. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1986. GIANASTACIO, Vanderlei. O sufixo -ismo na história das gramáticas da Língua Portuguesa. In: Anais 12º Congresso Brasileiro de Língua Portuguesa do IP/PUC-SP 3º Congresso Internacional de Lusofonia. (Evento realizado de 1 a 3 de maio de 2008, PUC-SP). São Paulo: IP/PUC-SP, 2010, CD-ROM. HOUAISS, Antônio. Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa. Elaborado no Instituto Antônio Houaiss de Lexicografia e Banco de Dados da Língua Portuguesa S/C Ltda. Rio de Janeiro: Objetiva, 2001. MAURER JR., Theodoro Henrique. O problema do Latim Vulgar. Rio de Janeiro: Livraria Acadêmica, 1962. SANDMANN, Antônio José. Formação de palavras no português brasileiro contemporâneo. Curitiba: Editora da UFPR / Editora Ícone, 1989. Enviado em 30/04/2015 Avaliado em 15/06/2015 http://www.usp.br/gmhp/publ/GiaA2.pdf Revista Querubim – revista eletrônica de trabalhos científicos nas áreas de Letras, Ciências Humanas e Ciências Sociais – Ano 11 Nº26 vol. esp. – 2015 ISSN 1809-3264 Página 17 de 125 “PARECE MILAGRE!”, MAS COMO SERIA REALIDADE? ANÁLISE DA CONSTRUÇÃO DE SENTIDO EM UMA CAPA DA REVISTA VEJA Carla Helena Lange4 Joana Bertani de Campos5 Nathalia Ferrarini Vargas6 Thaís Alessandra Aureluk7 Anselmo Lima8 Resumo O presente artigo busca e analisa a etimologia e a origem latina da palavra “milagre" em relação com o enunciado verbo-visual “Parece Milagre!” presente em uma capa da revista Veja. A análise do enunciado se dá a partir dos conceitos teóricos de significação e tema propostos por Bakhtin/Volochinov e, posteriormente, comentados por William Cereja. Com base no tema enunciativo identificado, as considerações finais denunciam a revista Veja por, dentre outras coisas, promover em sua capa um medicamento para emagrecimento não recomendado pela ANVISA para esse fim. Palavras-Chave: Milagre. Significação. Tema. Abstract The present article seeks and analyzes the etymology and the Latin origin of the word “milagre” in connection with the verbal-visual utterance “Parece Milagre!” encountered on a cover of Veja magazine. The analysis of the utterance is carried out based on the theoretical concepts of theme and meaning developed by Bakhtin/Volochinov and, afterwards, commented on by William Cereja. Based on the identified utterance theme, the final considerations denounce Veja magazine for having, among other things, promoted on one of its covers a medicine for slimming which is not recommended by ANVISA for this purpose. Keywords: Miracle. Meaning. Theme. Introdução Neste texto, realizamos um estudo da significação da palavra “milagre” e do tema ou sentido construído a partir dela no interior do enunciado em que ocorre: “Parece Milagre!”, o qual foi estampado na capa da revista Veja de 7 de setembro de 2011. Nosso objetivo é propor uma leitura e interpretação dessa capa de modo que, levando-se na devida conta a historicidade da palavra e de seus contextos, seja possível uma compreensão crítica do texto midiático. Baseando-nos em estudos de Bakhtin/Volochinov e de seu comentador, William Cereja, buscamos - portanto - a história da palavra, sua etimologia, a qual é extremamente importante para a compreensão do que se lê, uma vez que, por meio do conhecimento da origem das palavras, 4 Graduanda do curso de Licenciatura em Letras Português-Inglês da Universidade Tecnológica Federal do Paraná – Câmpus Pato Branco, carllahelena@hotmail.com. 5 Graduanda do curso de Licenciatura em Letras Português-Inglês da Universidade Tecnológica Federal do Paraná – Câmpus Pato Branco, jo.bertani@hotmail.com. 6 Graduanda do curso de Licenciatura em Letras Português-Inglês da Universidade Tecnológica Federal do Paraná – Câmpus Pato Branco, natyhfmv@hotmail.com. 7 Graduanda do curso de Licenciatura em Letras Português-Inglês da Universidade Tecnológica Federal do Paraná – Câmpus Pato Branco, thais.aureluk@hotmail.com. 8 Doutor em Linguística Aplicada e Estudos da Linguagem pela PUC-SP; Professor da Universidade Tecnológica Federal do Paraná – Câmpus Pato Branco, selmolima@hotmail.com. mailto:carllahelena@hotmail.com mailto:jo.bertani@hotmail.com mailto:natyhfmv@hotmail.com mailto:thais.aureluk@hotmail.com Revista Querubim – revista eletrônica de trabalhos científicos nas áreas de Letras, Ciências Humanas e Ciências Sociais – Ano 11 Nº26 vol. esp. – 2015 ISSN 1809-3264 Página 18 de 125 novos caminhos de percepção se abrem no ato de leitura e interpretação de textos contemporâneos, reduzindo-se as chances de conclusões errôneas. Dessa forma, surgem novas propostas e novos pensamentos que orientam o modo como a palavra deve ser abordada na relação, por exemplo, com seu contexto enunciativo anterior, presente e também futuro. Sendo a revista Veja um veículo midiático sem dúvidas bastante polêmico em nosso país pelo fato de ser considerada por muitos bastante manipuladora do público leitor, nosso objetivo é também mostrar se e como isso ficaria evidenciado por meio da análise de uma de suas capas cuidadosamente selecionada para essa finalidade. Fundamentação teórica Bakhtin/Volochinov problematiza o par tema-significação. Ao falar sobre o primeiro item do par, o autor explica: “vamos chamar o sentido da enunciação completa o seu tema. O tema deve ser único. Caso contrário, não teríamos nenhuma base para definir a enunciação. O tema da enunciação é (…) individual e não reiterável” (BAKHTIN/VOLOCHINOV, 2009, p. 133). Entende-se que esse tema (ou sentido) é determinado pelas formas linguísticas bem como pelos elementos extraverbais da situação, que fazem parte da produção, da recepção e da circulação do discurso. Quando tomamos a enunciação como um fenômeno histórico, concreto, então certamente esta terá um tema, o tema da enunciação. A partir disso, de acordo com Cereja, compreende-se - na esteira de Bakhtin/Volochinov - que o tema é de fato único e irrepetível (CEREJA, 2010, p. 202). Dentro das condições de um dado momento da evolução, o tema é aquele "sistema de signos dinâmico e complexo" que vai atentar a se adaptar de maneira adequada, enquanto que a significação “é um aparato técnico para a realização do tema.” (BAKHTIN/VOLOCHINOV, 2009, p. 134). Ou seja, de acordo com Cereja (2010, p. 202) o instável e o inusitado de cada enunciação se somam à significação e dão origem ao tema, o resultado final e global do processo de construção de sentido. Já a significação é vista como “além do tema, ou, mais exatamente, no interior dele", sendo que "a enunciação é igualmente dotada de uma significação". Assim, por significação, "entendemos os elementos da enunciação que são reiteráveis e idênticos cada vez que são repetidos” (BAKHTIN/VOLOCHINOV, 2009, p. 134). Esses elementos são abstratos e não têm existência concreta independente, são fundados sobre uma convenção. Além disso, a significação, segundo Cereja (2010, p. 202), se dá por sua capacidade de construir sentido, sendo assim um estágio mais estável dos enunciados e dos signos. Como nosso interesse se encontra especialmente na palavra "milagre" e em outras palavras que a acompanham publicadas em uma capa da revista Veja, é importante considerar que o cerne da palavra é justamente a multiplicidade de suas significações. E se há uma palavra que tenha apenas uma significação, então esta é o que se chama de tema, pois a sua significação se encerra na situação concreta em que se realiza (BAKHTIN/VOLOCHINOV, 2009, p.135). Para Cereja, “a significação é por natureza abstrata” e tende à estabilidade,enquanto que o tema é concreto e histórico e tende à recriação: se aquela está para o signo linguístico, este está para o signo ideológico, resultado da enunciação concreta (CEREJA, 2010, p. 202). Para exemplificar essas ideias, Cereja empregou a enunciação “Que horas são?”, analisando-a do ponto de vista dos conceitos de significação e tema (sentido). É possível perceber a diferença entre o tema da enunciação de um(a) professor(a) que pergunta “Que horas são?” ao final de uma aula e a de uma criança que pergunta “Que horas são?” a algum(a) responsável que está fazendo o almoço. Nessas duas enunciações, a significação é a mesma. Entretanto, no nível do tema, há diferenças: provavelmente o docente deseja saber quanto ainda pode desenvolver determinado assunto durante a aula, enquanto a criança talvez deseje saber se o almoço já está Revista Querubim – revista eletrônica de trabalhos científicos nas áreas de Letras, Ciências Humanas e Ciências Sociais – Ano 11 Nº26 vol. esp. – 2015 ISSN 1809-3264 Página 19 de 125 pronto (CEREJA, 2010, p. 202). Cabe ainda esclarecer que, para Bakhtin/Volochinov (2009, p. 136), o tema é entendido como um “estágio superior real da capacidade linguística de significar” e a significação seria um “estágio inferior da capacidade de significar”. Esta é um potencial e sua investigação pode se dar em duas direções: a primeira seria para um estágio superior, ou seja, o tema. A segunda seria para um estágio inferior, da própria significação; ou seja, a da palavra dicionarizada. Neste texto, nossa análise atua nas duas direções. Metodologia Primeiramente, nossa equipe de pesquisa selecionou para análise uma dentre quatro palavras presentes em capas de revista, as quais foram examinadas e discutidas em nossas reuniões de trabalho. Trata-se de “milagre”, “ressurreição”, “garimpeiros” e “povo”, sendo as três primeiras palavras provenientes de capas da revista Veja e a última, de uma capa da revista Época (ver referências). A palavra escolhida para estudo foi "milagre", pois de imediato soou como uma tentativa de manipulação do público leitor pela mídia, que - nesse caso (ver capa adiante) - aposta na ideia de que as leitoras não se sentem confortáveis com o peso de seus corpos revelado nas balanças. Essa palavra foi escolhida para análise também porque nos pareceu evidente o quanto o universo midiático coage o brasileiro a usar os produtos dos quais fazem propaganda, sendo que, nesse caso, muitos desses produtos podem ser medicamentos proibidos, que prejudicam o organismo. Os procedimentos para análise da capa consistiram em discussões sobre a significação e o tema do material verbal, com ênfase no visual da capa, em que há duas versões da "mesma" mulher encostada em uma seringa, sendo que a mulher do lado direito é a versão mais “cheinha”, mais triste e tímida da mulher que, do lado esquerdo, aparece confiante e com um sorriso estampado no rosto por estar com o peso ideal, “padronizado” pela sociedade (ver capa adiante). Para maior compreensão do significado e do tema da palavra "milagre", foram consultados os seguintes dicionários: 1) contemporâneo, para acessarmos a significação atual da palavra em Língua Portuguesa; 2) etimológico, para acessarmos a origem da palavra na Língua Latina; e 3) Latim- Português, para encontrarmos a significação latina da palavra. Análise Na época atual, segmentos sociais opressores exigem padrões de beleza absurdos e muitas pessoas que não se encaixam nesses padrões são levadas a procurar um método fácil e rápido para emagrecer: o uso de medicamentos. Muitos deles, entretanto, sendo oferecidos e usados para o emagrecimento, não têm a venda recomendada no Brasil para essa finalidade pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) por causarem sérios riscos à saúde (ver referências). A capa da edição de 7 de setembro de 2011 da revista Veja traz como destaque uma matéria sobre o uso de medicamentos para emagrecer, mais especificamente sobre um novo medicamento que chegou ao Brasil e que supostamente está agradando a muitos médicos e pacientes por causa de seus resultados: Revista Querubim – revista eletrônica de trabalhos científicos nas áreas de Letras, Ciências Humanas e Ciências Sociais – Ano 11 Nº26 vol. esp. – 2015 ISSN 1809-3264 Página 20 de 125 (Fonte: Foto da capa da revista VEJA, de setembro de 2011, arquivo pessoal.) “Parece Milagre!”. Este é o título da matéria que aborda os resultados de um medicamento chamado Liraglutida. Mesmo só tendo aprovação da ANVISA para o tratamento de diabetes do tipo 2, tem sido receitado para emagrecer (ver ANVISA nas referências). O título da matéria ganha destaque pela fonte e tamanho das letras e pelo uso do ponto de exclamação. Também chamam a atenção as duas imagens de uma mulher mostrando o seu "antes" e o seu "depois". Entre as imagens, há uma seringa que representa o uso do medicamento para fins de emagrecimento. A ilustração do lado esquerdo mostra uma mulher que está acima do peso, com os braços cruzados para disfarçar a barriga e com uma expressão facial que demonstra não estar feliz. Já a figura do lado direito tem a intenção de mostrar uma "nova" mulher, que está exibindo seu "novo" corpo magro e que está feliz depois de usar o medicamento. A seringa com o Liraglutida entre as ilustrações marca o "antes" e o "depois" da mulher. No que diz respeito ao material verbal que acompanha essas imagens, faremos a seguir uma análise da significação e do tema da enunciação da capa da revista: "Parece Milagre!". Comecemos pelo ponto de exclamação: "!". De acordo com Azeredo (2011, p. 527), o ponto de exclamação “marca entonação variável para um variado espectro de sentimentos”. No caso que estamos analisando, esse sinal de pontuação sugere um sentimento de admiração, de surpresa ou espanto, que pode estar ligado ao fato de o medicamento ser diferente dos demais, pois, segundo a matéria da revista, é altamente eficaz no emagrecimento e causa poucos efeitos colaterais. Resta agora buscar as significações das palavras “parece” e “milagre”, partindo de seus significados contemporâneos e chegando a suas origens latinas. De acordo com o Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa, a palavra “parece” tem o seguinte significado: Parecer Verbo, predicativo e pronome 1 (prep. com) ter o aspecto, a aparência de; assemelhar-se 2 dar a impressão de; aparentar <p. mais magra do que é> 3 (prep. a) apresentar-se (de certa forma) ao entendimento de; afigurar-se 4 ser provável 5 aparência, aspecto <ladrões de mau p.> 6 forma de pensar, opinião, julgamento <não é este meu p.> 7 opinião de um especialista em resposta a consulta As acepções acima correspondem à significação da palavra “parecer” que têm sido praticadas nas últimas décadas. Por conseguinte, verifica-se que a palavra analisada não sofreu grandes mudanças desde sua origem, conforme mostra o seu significado etimológico “Parecer: Revista Querubim – revista eletrônica de trabalhos científicos nas áreas de Letras, Ciências Humanas e Ciências Sociais – Ano 11 Nº26 vol. esp. – 2015 ISSN 1809-3264 Página 21 de 125 Verbo. ‘ant. aparecer XIII; ‘semelhar’ XIII. Do lat. parēscěre || parecENÇA | pareceença XV || parecENTE | parescēte XIV, pareçente XV”. Já a palavra “milagre” contextualiza-se na matéria como um fato único, algo inédito. Isso pelo fato de o Liraglutida, popularmente conhecido como Victoza, além de ajudar na perda de peso em poucos meses, se diferenciar dos demais medicamentos por supostamente possuir poucos e curtos efeitos colaterais. O "milagre" estaria ligado a isso: ao ato de emagrecer sem fazer esforço e sem sofrer as consequências, por meio do uso de determinado medicamento. Mas a palavra “milagre” também pode estar ligada a um evento de significância religiosa, não se referindo - assim - a um feito acidental, mas conectado a uma intenção divina. Segundo o DicionárioHouaiss da Língua Portuguesa, tem-se o seguinte: Milagre Substantivo masculino 1 acontecimento inexplicável pelas leis da natureza 2 acontecimento admirável, estupendo Ex.: <milagre da medicina> <é um milagre que tenha passado de ano> As acepções 1 e 2 correspondem à significação da palavra “milagre” que tem sido praticadas nas últimas décadas, ou seja, um acontecimento que não poderia realizar-se sem uma intervenção divina, algo que o homem e a natureza não conseguem fazer nem explicar. Já do ponto de vista etimológico, a palavra “milagre” origina-se do verbo “mirar”. Segundo Antônio Geraldo da Cunha, etimologicamente, “mirar” significa: Mirar Verbo. ‘Fitar, encarar, cravar a vista em’ ‘apontar para, tomar como alvo’ ‘observar cuidadosamente’ XIII. Do latim mirāre, por mirāri ‘admirar-se, contemplar, olhar’, de mirus ‘digno de admiração, estranho maravilhoso’ || milagre sm. ‘feito extraordinário que vai contra as leis da natureza, maravilha’ | XIV, miragre XIII, myragre XIV etc. | Do latim miraculum ‘coisa admirável’, de mirāri. De acordo com o Dicionário Escolar Latino-Português, miraculum vem do verbo mirari (contemplar com admiração, com espanto, ou com surpresa) e do sufixo -culum. O verbo mirari deu origem a “mirar/admirar” e está associado com a raiz indo-europeia “(s)mei”, que estaria presente em maravilla (maravilha). Ainda sobre a origem da palavra “milagre”, Deonísio da Silva (2014) destaca que: Milagre do latim miraculum, coisa digna de mirare, admirar. No século XIII ainda eram pronunciadas miraclo e a variante miraglo. Comparações com o francês miracle, o italiano miracolo e o espanhol milagro podem esclarecer o percurso da modificação da pronúncia. Encontramos ainda no português medieval as formas miragre e milagro. Nos dias de hoje, quando se ouve a palavra “milagre”, a maioria das pessoas faz uma ligação com alguma entidade divina ou religiosa, mas, do ponto de vista etimológico, “milagre” não tem necessariamente um elo com alguma religião ou entidade divina. Entretanto, está relacionado com algo maravilhoso e isso faz com que muitas pessoas liguem o maravilhoso a Deus. Portando, pode-se dizer que as palavras do enunciado estão intimamente ligadas entre si. “Parece” vem de "semelhar", "aparecer". “Milagre”, por sua vez, vem de "mirar" e está relacionado com "admirar". O tema ou sentido que se constroi a partir dessas palavras em uma enunciação na capa da revista Veja é enfatizado com o ponto de exclamação, que - da mesma forma - está ligado a um sentimento de surpresa, de admiração. Revista Querubim – revista eletrônica de trabalhos científicos nas áreas de Letras, Ciências Humanas e Ciências Sociais – Ano 11 Nº26 vol. esp. – 2015 ISSN 1809-3264 Página 22 de 125 Cabe, entretanto, observar que o enunciado “Parece Milagre!” tem a pretensão de querer dizer que não se trata de milagre, embora possa "parecer". Em outras palavras, emagrecer sem esforço ou dor tornou-se supostamente realidade por meio do uso de um medicamento que não causaria nem mesmo efeitos colaterais relevantes. É o que se pode ler logo abaixo da manchete "Parece milagre": “Um novo remédio faz emagrecer entre 7 e 12 quilos em apenas cinco meses. E sem grandes efeitos colaterais. Saiba tudo sobre ele”. Assim, o que a capa da revista pretende dizer, no nível do tema, é que o remédio faz efetivamente emagrecer e que o público leitor interessado não precisa (mais) esperar por um milagre, pois se trataria de uma realidade disponível para qualquer pessoa. Mas seria de fato realidade? Como poderia ser?! Considerações finais Com base em nossas análises, é possível concluir que as palavras "parece" e "milagre", como material verbal aliado a um material visual específico, foram usadas em uma enunciação na capa da revista Veja de modo a remeter a um contexto de ação divina ao mesmo tempo em que essa mesma ação se tornou supostamente possível aos seres humanos: qualquer cidadão poderia a princípio ter acesso ao remédio "milagroso" e usá-lo para perder peso com rapidez e facilidade. As pessoas, então, especialmente as mulheres, por meio do medicamento, teriam se tornado "deusas" do emagrecimento. A partir das signifições estudadas, este parece ser o tema (ou o sentido) da enunciação analisada. A revista Veja demonstra, portanto, na realidade, usar em sua matéria uma estratégia que a mídia em geral tem demonstrado usar há muito tempo: criar e/ou reforçar estereótipos negativos para, a serviço da indústria e do mercado, vender produtos que supostamente resgatariam as pessoas de uma condição social ideologicamente construída como indesejável. Referências ANVISA. Anvisa reforça esclarecimentos sobre medicamento Victoza. Disponível em:<http://portal.anvisa.gov.br/wps/portal/anvisa/anvisa/posuso/farmacovigilancia/!ut/p/c4/0 4_SB8K8xLLM9MSSzPy8xBz9CP0os3hnd0cPE3MfAwN_Dz8DA09_c19vrwAXAwMfc_2CbEd FAHYfhIs!/?1dmy&urile=wcm%3Apath%3A/anvisa+portal/anvisa/sala+de+imprensa/assunto+ de+interesse/noticias/anvisa+reforca+esclarecimentos+sobre+medicamento+victoza>. Acesso em 01 nov 2014. AZEREDO, José Carlos. Gramática Houaiss da Língua Portuguesa. São Paulo: Publifolha, 2011. BAKHTIN, Mikhail. (VOLOCHINOV). Marxismo e filosofia da linguagem. 11. ed. São Paulo: Hucitec, 2009. CEREJA, William. Significação e tema. In: BRAIT, Beth. (org.). Bakhtin: conceitos-chave. 4. ed. São Paulo: Contexto, 2010. CUNHA, Antônio Geraldo da. Dicionário Etimológico Nova Fronteira da Língua Portuguesa. Rio de Janeiro: Lexikon, 2007. CUNHA, Antônio Geraldo da. Dicionário etimológico Nova Fronteira da língua portuguesa. São Paulo: Nova Fronteira, 1982. ÉPOCA. O povo de Marinou. Revista Época, São Paulo, v. 848, set 2014. FARIA, Ernesto. (org.). Dicionário escolar latino-português. Disponível em <http://www.dominiopublico.gov.br/pesquisa/DetalheObraForm.do?select_action=&co_obra=2 4675>. Acesso em 31 out 2014. FERREIRA, António Gomes. Dicionário de português-latim. Porto: Porto Editora, 1991. HOUAISS, Antônio; VILLAR, Mauro de Salles. Minidicionário da língua portuguesa. 4. ed. Rio de Janeiro: Objetiva, 2010. Origen de las palabras. Etimología de Milagro. Disponível em <http://etimologias.dechile.net/?milagro>. Acesso em 29 out 2014. Revista Querubim – revista eletrônica de trabalhos científicos nas áreas de Letras, Ciências Humanas e Ciências Sociais – Ano 11 Nº26 vol. esp. – 2015 ISSN 1809-3264 Página 23 de 125 SILVA, Deonísio da. De onde vêm as palavras: origens e curiosidades da língua portuguesa. 17. ed. Rio de Janeiro: Lexikon, 2014. VEJA. Parece Milagre! Revista Veja, São Paulo, v. 2233, nº36, set. 2011. Disponível em <http://veja.abril.com.br/acervodigital/home.aspx>. Acesso em 13 out 2014. VEJA. A ressurreição de Che Guevara. Disponível em <http://veja.abril.com.br/acervodigital/home.aspx>.Acesso em 13 out 2014. VEJA. Garimpeiros. Disponível em <http://veja.abril.com.br/acervo/home.aspx>. Acesso em 20 out 2014. Enviado em 30/04/2015 Avaliado em 15/06/2015 Revista Querubim – revista eletrônica de trabalhos científicos nas áreas de Letras, Ciências Humanas e Ciências Sociais – Ano 11 Nº26 vol. esp. – 2015 ISSN 1809-3264 Página 24 de 125 A PRÁTICA DA LEITURA E A FORMAÇÃO DO LEITOR NO ENSINO MÉDIO: ABORDAGEM CRÍTICA EM ESCOLAS ESTADUAIS DE ENSINO REGULAR 9Hérica Romena do Carmo 10Mayara Ferreira de Farias 11Fernanda Ferreira do Carmo Resumo Última etapa da educação básica de ensino regular, o Ensino Médio vem sendo o foco de múltiplos olhares, no que concerne tanto aos estudiosos da educação quanto ao Poder Público. O desinteresse, a evasão escolar, a repetência, o não acompanhamento idade-série, o não sucesso do professor ao trabalhar no desenvolvimento de um leitor crítico, preparado para outras etapas de ensino, tornam-se barreiras não só em aulas de Língua Portuguesa, mas também em outras áreas, bem como em processos seletivos referentes à produção de serviçosou ingresso em instituições de ensino superior. A leitura torna o indivíduo capaz de lidar com situações diversas, dando-lhe suporte para desenvolver novas habilidades e competências necessárias ao progresso de sua própria dignidade como cidadão. Entretanto, ainda são muitos os fatores que tornam a prática da leitura em sala de aula desfavorável quando o assunto é a formação de um leitor capaz de compreender a leitura que fez e fazer novas leituras da realidade que o cerca, intervindo de forma positiva na sociedade em que vive. Palavras-chave: Leitura crítica. Formação do leitor. Ensino Médio. Abstract Last stage of the regular teaching basic education, secondary education has been the focus of multiple viewpoints in regard to both scholars of education as to the Government. The disinterest, truancy, repetition, failure monitoring age-grade, the unsuccessful teacher to work on developing a critical reader, prepared for other educational stages, they become barriers not only in Portuguese classes, but also in other areas as well as in selection processes related to production services or admission to higher education institutions. The reading makes the individual able to handle different situations, giving support to develop new skills and competencies needed to progress their own dignity as citizens. However, there are still many factors that make the practice of reading in unfavorable classroom when it comes to the formation of a able to understand the reader reading that made and make new readings of reality that surrounds him, intervening positively in society where he lives. Keywords: Critical reading. Formation reader. High School. Introdução 9 Pós-graduada no Curso de Especialização em Línguas: Portuguesa, Inglesa e Espanhola, pelo Instituto de Educação Athena. Graduada em Letras Português-Literatura e Pedagogia Licenciatura pela Universidade Estadual do Maranhão - UEMA. Atualmente ministra disciplinas no Curso de Letras da Universidade Estadual do Maranhão – UEMA, trabalhando ainda no Ensino Médio da rede estadual de ensino do Maranhão. 10 Mestre em Turismo pela UFRN. Especialista em Gestão Pública Municipal pela UFPB. Especialista em História e Cultura Afro-brasileira e Africana pela UFRN. Licenciada em Filosofia pelo ISEP. Bacharel em Turismo pela UFRN. Técnico em Informática pelo IFRN. Técnico em Guia de Turismo Regional pelo SENAC (Natal). Técnico em Segurança do Trabalho do IFPB. Graduanda Letras em Espanhol do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio Grande do Norte - Polo Currais Novos. Pós-graduanda na Especialização Lato Sensu UNIAFRO: Política de Promoção da Igualdade Racial na Escola/PPGLS na Universidade Federal Rural do Semi-Árido. Professora voluntária no curso de Turismo da UFRN. Professora do curso Técnico em Guia de Turismo da UFRN/EAJ. 11 Graduada em Letras pelo Instituto de Ensino Superior Múltiplo.. Revista Querubim – revista eletrônica de trabalhos científicos nas áreas de Letras, Ciências Humanas e Ciências Sociais – Ano 11 Nº26 vol. esp. – 2015 ISSN 1809-3264 Página 25 de 125 Afinal, o que garante a formação de um leitor crítico? Quais as estratégias de leitura em sala de aula devem ser adotadas visando a essa postura? O que nos dizem os parâmetros curriculares e epistemológicos, norteadores sobre essa prática social? Como a escola lida ao seu respeito? Estar regularmente matriculado no Ensino Médio revela a presença de um leitor que gosta de ler e compreende a leitura que fez? Não é difícil encontrar-se um relativo conjunto de opiniões a respeito da crítica situação da leitura em aulas de Língua Portuguesa, principalmente, pelo leque de informações presentes nos conteúdos curriculares que integram o ano letivo. Compreender os diferentes conteúdos propostos, cumprir a carga horária anual referente ao período total de aulas no Ensino Médio, fez com que o docente ao voltar-se ao trabalho criterioso com a prática da leitura enfrentasse mais desafios do que imaginara, mais especificamente, quando se trata de formar leitores. A organização do trabalho educativo nem sempre reflete acerca das leituras desenvolvidas em sala de aula, observando os recursos expressivos da linguagem do texto, para que o educando experimente isso na escola e saiba lidar com diversas situações no seu dia-a-dia. A leitura deve fazer parte do currículo escolar não só junto à aproximação do discente aos temas propostos na escola, mas também da sua própria realidade, que lhe é inerente e individual. Dada a sua complexidade e diversidade, conceituar leitura, não é tão simples como se possa imaginar, portanto por mais coerente que se possa ser, optou-se como ponto de partida a definição dessa prática como um recurso essencial ao indivíduo a fim de que este seja capaz de lidar com situações diversas, dando-lhe suporte para desenvolver novas habilidades e competências necessárias ao progresso de sua própria dignidade como cidadão. Nessa perspectiva, pode-se entender que as propostas de leitura utilizadas pelo professor são primordiais à formação do gosto pela leitura, isto quando as aulas de Língua Portuguesa abrangem sentidos que vão além da linguagem verbal, oral ou escrita. Entretanto, é necessário que se observem os meios nos quais ela se manifesta, enfatizando também o produto final das relações estabelecidas entre professor mediador e o leitor, intensificando ainda, o tratamento que a escola dá a essa prática para que o hábito da leitura seja frequente no contexto das demais áreas do ciclo de ensino supracitado. O texto selecionado para a leitura em sala de aula deve estar em equidade às outras ações curriculares desenvolvidas nas aulas de LP. Isso torna ainda mais interessante o cotidiano da leitura e a sua prática diversificada mediante as situações em que se manifesta. Ao analisar a problemática educacional no contexto do Ensino Médio em escolas de ensino regular considerando o incentivo ao ato de ler criticamente, sentiu-se a necessidade de desenvolver um trabalho que tem como objetivo levantar questões subjacentes à prática da leitura e a formação do leitor em aulas de LP, tendo em vista a interação dos alunos com as propostas de socialização da leitura em sala de aula, ao utilizá-la nos diversos contextos sociais enriquecendo recursos expressivos próprios do ato da comunicação e daqueles que se estabelecem por meio da sua utilização. Este trabalho tem como objetivo analisar e discutir como são efetivadas as práticas de leitura em sala de aula, visando à formação do leitor crítico. Neste sentido, fundamenta-se teoricamente em autores que abordam ideias sobre a prática da leitura e sua importância na sociedade, assim como também as interações que podem ser estabelecidas através de suas práticas Revista Querubim – revista eletrônica de trabalhos científicos nas áreas de Letras, Ciências Humanas e Ciências Sociais – Ano 11 Nº26 vol. esp. – 2015 ISSN 1809-3264 Página 26 de 125 no contexto escolar, entre os quais podemos citar: Antunes (2003); Bordini (2007); Jurado e Rojo (2006); Naspolini (2009), Saraiva (2001); Villardi (1997); entre outros. A importância da leitura e a formação do leitor O ensino da leitura exerce papel fundamental por toda a vida do indivíduo, podendo facilitar sua progressão e o seu crescimento como pessoa. O contato com os mais variados tipos de textos podem ajudar a despertar nos discentes o gosto pela leitura. O texto quando utilizado e explorado pelo professor de maneira significativa, auxilia no estímulo à criatividade do leitor, assim como também tem grande influência na construção de sua identidade pessoal. Através dele, o leitor recria o mundo por meio da imaginação e faz reflexões a respeito do que leu, atribuindo significados, construindo assim, novas leituras. O universo da leitura é a viagem mais fascinante, no que diz respeito
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