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O ESPAÇO FUNERÁRIO NO EGITO ANTIGO: 
A TUMBA DE NAKHT (REINO NOVO, c. 1401 – 1353 A.E.C.). 
 
VOLUME I - TEXTO 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
PEDRO HUGO CANTO NÚÑEZ 
 
 
UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE 
PRÓ-REITORIA DE PÓS-GRADUAÇÃO 
CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES 
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM HISTÓRIA – MESTRADO 
ÁREA DE CONCENTRAÇÃO: HISTÓRIA E ESPAÇOS 
LINHA DE PESQUISA III: LINGUAGENS, IDENTIDADES E ESPACIALIDADES 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
O ESPAÇO FUNERÁRIO NO EGITO ANTIGO: 
A TUMBA DE NAKHT (REINO NOVO, c. 1401 – 1353 A.E.C.). 
 
VOLUME I - TEXTO 
 
 
 
 
 
 
PEDRO HUGO CANTO NÚÑEZ 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
NATAL, MAIO DE 2021 
 
 
 
 
PEDRO HUGO CANTO NÚÑEZ 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
O ESPAÇO FUNERÁRIO NO EGITO ANTIGO: 
A TUMBA DE NAKHT (REINO NOVO, c. 1401 – 1353 A.E.C.). 
 
VOLUME I - TEXTO 
 
 
 
 
 
 
Dissertação apresentada como requisito para obtenção do grau 
de Mestre no Curso de Pós-Graduação em História, Área de 
Concentração em História e Espaços, Linha de Pesquisa III: 
Linguagens, Identidades e espacialidades, da Universidade 
Federal do Rio Grande do Norte, sob a orientação da Profa. Dra. 
Marcia Severina Vasques e coorientação da Profa. Dra. M. 
Violeta Pereyra. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
NATAL, MAIO DE 2021 
 
Canto Núñez, Pedro Hugo.
 O espaço funerário no Egito Antigo: a tumba de Nakht (Reino
Novo, c. 1401-1353 A.E.C.) - Volume I / Pedro Hugo Canto Núñez.
- 2021.
 373f.: il.
 Dissertação (mestrado) - Centro de Ciências Humanas, Letras e
Artes, Programa de Pós-Graduação em História, Universidade
Federal do Rio Grande do Norte, Natal, RN, 2021.
 Orientadora: Prof.ª Dr.ª Marcia Severina Vasques.
 Coorientadora: Prof.ª Dr.ª Maria Violeta Pereyra.
 1. Egito Antigo - Dissertação. 2. XVIII Dinastia -
Dissertação. 3. Costumes Funerários - Dissertação. 4. Tumbas de
Particulares - Dissertação. 5. Tumba de Nakht - Dissertação. I.
Vasques, Marcia Severina. II. Pereyra, Maria Violeta. III.
Título.
RN/UF/BS-CCHLA CDU 94:393
Universidade Federal do Rio Grande do Norte - UFRN
Sistema de Bibliotecas - SISBI
Catalogação de Publicação na Fonte. UFRN - Biblioteca Setorial do Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes -
CCHLA
Elaborado por Ana Luísa Lincka de Sousa - CRB-15/748
 
 
PEDRO HUGO CANTO NÚÑEZ 
 
 
 
O ESPAÇO FUNERÁRIO NO EGITO ANTIGO: 
A TUMBA DE NAKHT (REINO NOVO, c. 1401 – 1353 A.E.C.). 
 
 
 
 
Dissertação aprovada como requisito para obtenção do grau de Mestre no Curso de Pós-Graduação 
em História da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, pela comissão formada pelos 
professores: 
 
 
 
_________________________________________ 
Nome da Orientadora 
 
 
 
 
_________________________________________ 
Nome da Coorientadora 
 
 
 
 
__________________________________________ 
Nome do Avaliador Externo 
 
 
 
 
________________________________________ 
Nome do Avaliador Interno 
 
 
 
 
 
____________________________________________ 
Nome do Suplente 
 
 
 
Natal, _________de__________________de____________ 
 
 
AGRADECIMENTOS 
 
 Em um período de pandemia, que se iniciou no primeiro semestre de 2020 e perdura até a 
escrita desses agradecimentos, todas as pessoas que me ajudaram direta ou indiretamente merecem 
todos os agradecimentos possíveis e impossíveis. Para essas, os meus mais sinceros “obrigado”! 
 Gostaria de agradecer imensamente a minha orientadora e mãe acadêmica, Marcia Vasques, 
que, ao longo de todos os anos de orientação, tornou-se uma grande amiga, a qual eu sei que posso 
contar em todos os momentos que ela sempre estará lá, seja para falar sobre videogames, para 
corrigir uma crase, ou para falar da vida. Muito obrigado por tudo! 
 Agradeço bastante a minha mãe, Carla Silvia, por todos esses anos de confiança e 
encorajamento em tudo que eu desejo fazer. Você é uma grande inspiração para eu ser quem sou e 
sem ela nada disso seria possível. Obrigado, mãe! Castanha com Baunilha sempre! 
 Aos meus familiares: meu primo, Danilo, um pingo de perfeição nesse mundo; minha avó, 
Ana, que sempre esteve ao meu lado; minha dinda, Alessandra, minha segunda mãe; meu dindo, 
Bruno, quem eu tenho como ídolo desde que me entendo por gente; meu pai, Edwin, que sempre 
me encoraja; meu irmão, que eu amo; meu tio Bezerra, Celly, Diógeno, Nelci, Neli, meu avô... 
Agradeço demais todos vocês! 
 À minha namorada, Rebeca Nadine. Embora não consiga achar palavras suficientes para 
agradecer você, gostaria de dizer “obrigado” por toda sua paciência em me ouvir falar sem parar 
sobre o Egito, por me ajudar nos tempos difíceis e ter regozijado comigo nos bons... Muito obrigado 
por estar sempre ao me lado e me mostrando o melhor da vida! 
 Aos meus amigos, Leonardo, Danny, Esther, Laís, Alaíde, Talita, Arthur, Liliane, Hannah, 
Erick, Alba... Obrigado por todos os momentos tranquilos (ou não)! 
 À minha coorientadora, Maria Violeta Pereyra, por ter visto potencial nessa pesquisa e me 
auxiliado de tantas formas que não consigo achar palavras! 
 
 
 Gostaria de agradecer imensamente a todos professores e funcionários que me auxiliaram 
em minha trajetória acadêmica, direta ou indiretamente! 
 Por fim, agradeço à Capes pela bolsa e ao PPGH-UFRN por ter possibilitado o 
desenvolvimento dessa pesquisa. Que novos dias venham e que as instituições de ensino voltem a 
ser valorizadas pelo governo para, assim, fornecerem esperanças ao povo brasileiro! 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Life is very long… 
(T. S. Eliot – The Hollow Men) 
 
 
 
RESUMO 
 
Nakht, um escriba e astrônomo do deus Âmon, teve sua tumba construída em uma colina, chamada 
atualmente de Sheik el-Qurna, na cidade de Tebas, atual Luxor, entre os anos de 1401 e 1350 
A.E.C., que a faz pertencer ao Reino Novo (c. 1550-1070 A.E.C.), mais especificamente à XVIII 
Dinastia (c. 1550-1307 A.E.C.), entre os reinados de Tutmés IV e Amenhotep III. Nossa intenção 
nessa dissertação é analisar a tumba de Nakht (TT 52), compreendendo o discurso funerário 
produzido pela elite tebana na XVIII Dinastia, assim como o período histórico ao qual ela está 
inserida. Para tanto, este trabalho está dividido em quatro partes, cada uma buscando interpretar 
esse espaço funerário do macro para o micro, a saber: construir a Paisagem tebana da XVIII 
Dinastia, na qual a tumba será analisada em conjunto com outras do mesmo tipo e temporalidade; 
examinar a estrutura da tumba e os objetos encontrados, elucidando os rituais efetuados em seu 
interior; inserir as imagens dispostas nela em um contexto espacial e analisá-las; e, por fim, 
compreender os textos em conjunto com as imagens. Para este fim, utilizaremos teorias tanto da 
própria Egiptologia como da Arqueologia e Antropologia, disciplinas que se relacionam com a 
História, como a Arqueologia Cognitiva, de Colin Renfrew, e o Ambiente Construído, de Amos 
Rapoport, com suporte da Teoria do Engajamento Material, de Lambros Malafouris, e da proposta 
metodológica de Valérie Angenot para análise de imagem e texto, propondo, então, um Sistema de 
Atividades Ritualísticas para a tumba de Nakht (TT 52). 
Palavras-chave: Egito Antigo; XVIII Dinastia; Costumes Funerários; Tumbas de Particulares; 
Tumba de Nakht (TT 52). 
 
 
 
ABSTRACT 
 
Nakht, a scribe and astronomer of the god Amon, had his tomb built on a hill, now called Sheik el-
Qurna, in the city of Thebes, current Luxor, between 1401 and 1350 BCE, which makes it belong 
to the New Kingdom (c. 1550-1070 BCE), specifically the Eighteenth Dynasty (c. 1550-1307 
BCE), between the reigns of Thutmose IV and Amenhotep III. Our intention in this dissertation is 
to analyze the tomb of Nakht (TT 52), understanding the funerary discourse produced by the 
Theban elite in the Eighteenth Dynasty, as well as the historical period to which he lived. Therefore,this work is divided into four parts, each seeking to interpret this funerary space from makros to 
mikros: build the Theban Landscape of the Eighteenth Dynasty, in which the tomb will be analyzed 
together with others of the same type and temporality; inspect the structure of the tomb and the 
objects found, explaining the rituals performed inside; insert the images in a spatial context and 
analyze them; and finally comprehend the texts together with the images. To this proposition, we 
will use theories of Egyptology itself in addition with Archaeology and Anthropology (disciplines 
that relate to History), such as Colin Renfrew's Cognitive Archaeology and Amos Rapoport's Built 
Environment, assisted by Lambros Malafouris’ Material Engagement Theory, and Valérie 
Angenot's methodological proposal for image and text analysis, thus proposing a System of 
Ritualistic Activities for Nakht's tomb (TT 52). 
Keywords: Ancient Egypt; Eighteenth Dynasty; Burial Costumes; Private Tombs; Tomb of Nakht 
(TT 52). 
 
 
 
LISTA DE ILUSTRAÇÕES 
 
Figura 1.1: Mapa simplificado de Tebas. ..................................................................................... 22 
Figura 1.2: Vista longitudinal da margem ocidental de Tebas (Nilo-área agrícola-montanhas). 23 
Figura 1.3: Mapa da Necrópole tebana – Vale dos Nobres. ......................................................... 24 
Figura 1.4: Mapa da cidade de Tebas. .......................................................................................... 28 
Figura 1.5: Templo de Karnak. .................................................................................................... 32 
Figura 1.6: Nebamun vistoriando as produções das terras. .......................................................... 34 
Figura 1.7: Categorias de pessoas que utilizam as terras dos templos na XX Dinastia (a partir do 
Papiro Wilbour). ............................................................................................................................ 36 
Figura 1.8: Distribuição espacial dos templos funerários em Tebas. ........................................... 39 
Figura 1.9: Plano de templo tripartido (Khonsu), Karnak............................................................ 42 
Figura 1.10: Tebas durante o reinado de Amenhotep III. ............................................................ 45 
Figura 1.11: Vias Processionais na margem ocidental de Tebas. ................................................ 50 
Figura 1.12: Principais festivais e seus itinerários em Tebas. ...................................................... 55 
Figura 1.13: Mapa da Paisagem da margem ocidental tebana da XVIII Dinastia. ...................... 66 
Figura 1.14: Planta da TT 192. ..................................................................................................... 69 
Figura 2.1: Capítulo 89 do Livro dos Mortos de Ani. .................................................................. 82 
Figura 2.2: Planta da tumba de Nakht (TT 52). ........................................................................... 86 
Figura 2.3: Plano longitudinal da tumba de Nakht (TT 52). ........................................................ 87 
 
 
Figura 2.4: Fotografia retirada na frente da TT 52. ...................................................................... 88 
Figura 2.5: Localização da TT 52 pelo Google Maps. ................................................................. 89 
Figura 2.6: Vista da TT 52 pelo Google Maps. ............................................................................ 90 
Figura 2.7: Divisão esquemática de uma tumba tebana de particular em três níveis horizontais. 93 
Figura 2.8: Tumbas tebanas e suas tipologias de acordo com Kampp-Seyfried (2003). ............. 95 
Figura 2.9: Aparência de uma tumba da XVIII Dinastia. ............................................................ 96 
Figura 2.10: Reconstrução da fachada da TT 52. ......................................................................... 97 
Figura 2.11: Caixão de Tamyt. ................................................................................................... 114 
Figura 2.12: Descanso de cabeça octogonal............................................................................... 118 
Figura 2.13: Jogo senet encontrado na tumba de Merymaat, em Ábidos. ................................. 121 
Figura 2.14: Esboço do item 8 da listagem de Davies. .............................................................. 123 
Figura 2.15: Esboço do item 9 (pernas da cadeira) da listagem de Davies. ............................... 123 
Figura 2.16: Esboço do item 9 (partes laterais da cadeira) da listagem de Davies. ................... 124 
Figura 2.17: Esboço do item 10 da listagem de Davies. ............................................................ 124 
Figura 2.18: Esboço do item 11 da listagem de Davies. ............................................................ 125 
Figura 2.19: Esboço do item 13 da listagem de Davies. ............................................................ 126 
Figura 2.20: Esboço do item 14 da listagem de Davies. ............................................................ 127 
Figura 2.21: Caixa de shabtis de Henetmehyt. .......................................................................... 128 
Figura 2.22: Vaso de cerâmica amarela da tumba de Nakht. ..................................................... 130 
Figura 2.23: Esboço do item 16 da listagem de Davies. ............................................................ 131 
 
 
Figura 2.24: Esboço do item 17 da listagem de Davies. ............................................................ 132 
Figura 2.25: Esboço do item 647 do catálogo de Petrie, Qurneh............................................... 134 
Figura 2.26: Esboço do item 657 do catálogo de Petrie, Qurneh............................................... 134 
Figura 2.27: Cone funerário de Nakht e de sua esposa Tawi. .................................................... 136 
Figura 2.28: grampo de cabelo de madeira, datado do Reino Novo. ......................................... 139 
Figura 2.29: Estojo de maquiagem e varas de madeira. ............................................................. 139 
Figura 2.30: As três fotografias da estatueta de Nakht. ............................................................. 141 
Figura 3.1: Planificação do plano decorativo da TT 52. ............................................................ 165 
Figura 3.2: Visão da parede leste (saída da tumba) na projeção tridimensional da TT 52. ....... 168 
Figura 3.3: Recorte da cena das oferendas em desenho (parede leste). ..................................... 168 
Figura 3.4: Motivos iconográficos na parede leste (cena das oferendas funerárias) da TT 52. . 170 
Figura 3.5: Destaque nas representações de Nakht e Tawi da cena de oferendas da TT 52. ..... 170 
Figura 3.6: Destaque nas representações das mesas de oferendas da parede leste da TT 52. .... 172 
Figura 3.7: Detalhe da tumba de Pedamenopet, TT 33. ............................................................. 174 
Figura 3.8: Vetorialidade da cena de oferendas funerárias da TT 52. ....................................... 177 
Figura 3.9: Desenho da cena agrícola na TT 52. ........................................................................ 179 
Figura 3.10: Visão esquemática da paisagem do vale do Nilo................................................... 180 
Figura 3.11: As estações egípcias comparadas com o calendário ocidental moderno. .............. 181 
Figura 3.12: Detalhe dos homens trabalhado com enxadas na TT 52, cena agrícola. ............... 183 
Figura 3.13: Detalhe dos homens semeando na TT 52, cena agrícola. ...................................... 185 
 
 
Figura 3.14: Detalhe dos homens incorporando sementes ao solo por pisoteamento na TT 52. 186 
Figura 3.15: Detalhe do uso de animaispara incorporar sementes ao solo arando na TT 52. ... 187 
Figura 3.16: Detalhe do segundo registro da cena agrícola da TT 52. ....................................... 188 
Figura 3.17: Destaque do terceiro registro da cena agrícola da TT 52. ..................................... 188 
Figura 3.18: Instrumento utilizado para debulhar o grão no Egito Antigo, de madeira. ............ 190 
Figura 3.19: Detalhe da cena agrícola da tumba de Nebamun (TT E2). .................................... 192 
Figura 3.20: Vetorialidade da cena agrícola da TT 52. .............................................................. 193 
Figura 3.21: Vinhetas do Capítulo 110 do LDM nos papiros de Nakht, Nebseny e Userhat. ... 195 
Figura 3.22: Comparação dos motivos iconográficos do Capítulo 110 do LDM com as paredes 
sudeste e noroeste da TT 52. ....................................................................................................... 196 
Figura 3.23: Parede noroeste da TT 52. ..................................................................................... 198 
Figura 3.24: Participantes humanos da cena de caça e pesca da TT 52. .................................... 200 
Figura 3.25: Cena de caça e pesca no pântano da tumba de Menna (TT 69). ............................ 201 
Figura 3.26: Detalhe dos peixes entre os barcos representados na parede noroeste da TT 52. . 202 
Figura 3.27: Detalhamento do corte dos Alopochen aegyptiaca na TT 52 e comparação com o 
fragmento da tumba-capela de Nebamun. ................................................................................... 204 
Figura 3.28: Vinicultura e caça de pássaros da TT 52. .............................................................. 205 
Figura 3.29: Vetorialidade da parede noroeste da TT 52. .......................................................... 207 
Figura 3.30: Desenho da parede sudoeste da TT 52. ................................................................. 209 
Figura 3.31: Reconstrução da parede sudoeste da TT 52 com base nas tumbas de Menna (TT 69) 
e Nebamun (TT E2). .................................................................................................................... 210 
 
 
Figura 3.32: Detalhe do gato na parede sudoeste da TT 52. ...................................................... 217 
Figura 3.33: Capítulo 17 do LDM de Hunefer. .......................................................................... 218 
Figura 3.34: Projeção tridimensional da parede oeste da TT 52. ............................................... 219 
Figura 3.35: Vetorialidade da parede oeste da TT 52. ............................................................... 219 
Figura 3.36: Desenho da parede sul da TT 52. .......................................................................... 221 
Figura 3.37: Vetorialidade da parede sul da TT 52. ................................................................... 225 
Figura 3.38: Parede norte da TT 52............................................................................................ 227 
Figura 3.39: Desenho da parede norte da TT 52. ....................................................................... 228 
Figura 3.40: Vetorialidade da parede norte da TT 52. ............................................................... 230 
Figura 3.41: Teto da TT 52. ....................................................................................................... 231 
Figura 3.42: Visão de saída na projeção tridimensional da TT 52. ............................................ 233 
Figura 4.1: Demarcação das inscrições da parede noroeste da TT 52. ....................................... 244 
Figura 4.2: Ordem das inscrições analisadas. ............................................................................. 252 
Figura 4.3: Nomenclatura dos nichos da porta-falsa. ................................................................. 259 
 
 
 
 
 
 
 
LISTA DE TABELAS 
 
Tabela 1: Tipos de solos das Vias Processionais ......................................................................... 48 
Tabela 2: Tumbas de particulares de Tebas entre os reinados de Tutmés IV e Amenhotep III. .. 58 
Tabela 3: Divisão esquemática de uma tumba tebana de particular em três níveis horizontais. .. 93 
Tabela 4: Status social do membro da elite de acordo com os objetos encontrados na tumba. . 150 
Tabela 5: Composições possíveis da TT 52 para wnw.tj “astrônomo”. ...................................... 272 
 
 
 
 
LISTA DE GRÁFICOS 
 
Gráfico 1: Quantidade de tumbas construídas durante os reinados de Tutmés IV e Amenhotep III
 ....................................................................................................................................................... 64 
Gráfico 2: Porcentagem de tumbas construídas durante os reinados de Tutmés IV e Amenhotep III
 ....................................................................................................................................................... 65 
Gráfico 3: Tumbas tebanas construídas entre os reinados de Tutmés III e Amenhotep IV. ........ 67 
Gráfico 4: Porcentagem do Grupo A (indivíduos com mais de um cargo) e do Grupo B (indivíduos 
com apenas um cargo). .................................................................................................................. 72 
Gráfico 5: Cargos dos indivíduos proprietários das tumbas referentes à temporalidade de Tutmés 
IV e Amenhotep III........................................................................................................................ 73 
Gráfico 6: Tipos de tumbas de particulares entre os reinados de Tutmés IV e Amenhotep III. .. 98 
Gráfico 7: Categorias de personagens da cena agrícola e da parede noroeste da TT 52. ........... 208 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS 
 
AJA: American Journal of Archaeology, Nova Iorque. 
ASAE: Annales du Service de Antiquités de l’Égypte, Institut Français d’Archéologie Orientale 
du Caire, Cairo. 
BCLE: Bulletin du Cercle lyonnais d’Égyptologie Victor Loret, Lyon. 
BFA: Bulletin of the Faculty of Arts. University of Cairo, Cairo. 
BIE: Bulletin de l’Institute égyptien, depois Bulletin de l’Institute d’Égypte, Cairo. 
BIFAO: Bulletin de l’Institut Français d’Archéologie Orientale, Cairo. 
BSEG: Bulletin de la Société d’Égyptologie, Société d’Egyptologie, Genève. 
BSFE: Bulletin de la Société Française d’Égyptologie, Société Française d’Égyptologie, Paris. 
CahKarn: Cahiers de Karnak. Centre franco-égyptien d’étude des temples de Karnak. 
CdE: Chronique d’Égypte. Fondation Égyptologique Reine Élisabeth, Bruxelas. 
CIREF: Centre d’information, de recherches et d’études francophones, Paris. 
DE: Discussions in Egyptology, A. Mibbi, Oxford. 
GM: Göttinger Miszellen. Universität Göttingen, Göttingen. 
IOS: Israel Oriental Studies. Faculty of Humanities, University of Tel-Aviv, Tel-Aviv. 
JAOS: Journal of the American Oriental Society, New Haven (Conn.). 
JARCE: Journal of the American Research Center in Egypt, American Research Center in Egypt, 
Nova Iorque. 
JEA: Journal of Egyptian Archaeology, Egyptian Exploration Society, Londres. 
 
 
JNES: Journal of Near Eastern Studies, University of Chicago, Chicago. 
JSSEA: Journal of the Society for the Study of Egyptian Antiquities, Toronto. 
JSTOR: Journal of the American Oriental Society, University of Michigan, Ann Arbor. 
Kêmi: Kêmi. Revue de philologie et d’archéologie égyptiennes et coptes, Paris. 
LÄ: Lexikon der Ägyptologie, Otto Harrassowitz, Wiesbaden. 
LDM: Livro dos Mortos. 
LingAeg: Lingua aegyptia. Journal of Egyptian Studies Semin. für Ägyptologische und 
Koptologische, Göttingen. 
MÄS: Münchner ägyptologische Studien, Münchner Universitätsschriften, Berlim, Munique. 
MDIK: Mitteilungen des Deutschen Archäologischen Instituts, Cairo. 
NSSEA: Newsletter of the Society for the Study of Egyptian Antiquities, The Society for the Studyof Egyptian Antiquities, Toronto. 
OLA: Orientalia lovaniensia analecta. Departamento de Orientalismo, Lovaina. 
OrAnt: Oriens antiquus. Rivista internazionalle del Centro per le Antichitá e la storia dell'ante del 
Vicino Oriente, Roma. 
RdE: Revue d’Égyptologie, Société Française d’Égyptologie, Paris, Lovaina. 
REgA: Revue de l’Égypte ancienne, Paris. Continuação da RevEg. Continuada pela RdE. 
RevEg: Revue égyptologique, Paris. Continuada pela REgA. 
RHR: Revue de l’Histoire des Religions, Paris 
RT: Recueil de travaux relatifs à la philologie et à l’archéologie égyptiennes et assyriennes, Paris. 
SAK: Studien zur Altägyptischen Kultur, Hamburgo. 
 
 
SAOC: Studies in Ancient Oriental Civilization, The Oriental Institute of the University of 
Chicago, Chicago. 
Serapis: American Journal of Egyptology, Chicago (Illinois). 
TC: Textos dos Caixões. 
TP: Textos das Pirâmides. 
Wb: Wörterbuch der Aegyptischen Sprache. 
ZÄS: Zeitschhrift für Ägyptische Sprache und Altertumskunde, Hinrichs’sche Buchhandlung 
/Akademie-Verlag, Leipzig, Berlim. 
 
 
SUMÁRIO 
 
INTRODUÇÃO ..................................................................................................................... 1 
CAPÍTULO 1: A NECRÓPOLE TEBANA ..................................................................... 11 
1. CONSTRUÇÃO DA PAISAGEM FUNERÁRIA TEBANA ....................................... 12 
2. VIAS PROCESSIONAIS E GRANDES MONUMENTOS ......................................... 27 
3. TUMBAS DE PARTICULARES ................................................................................. 56 
CAPÍTULO 2: RITUAIS NA TUMBA DE NAKHT ...................................................... 78 
1. A MORTE E A VIDA ................................................................................................... 78 
2. A ESTRUTURA DA TUMBA ..................................................................................... 85 
3. OS OBJETOS .............................................................................................................. 108 
CAPÍTULO 3: O PLANO DECORATIVO DA TUMBA DE NAKHT ...................... 153 
1. CONCEITUANDO A ARTE EGÍPCIA ..................................................................... 153 
2. OFERENDAS PARA RÊ ............................................................................................ 167 
3. CENAS AGRÍCOLAS ................................................................................................ 178 
4. CAÇA E PESCA NO PÂNTANO, VINICULTURA E CAÇA DE PÁSSAROS ...... 197 
5. BANQUETE FUNERÁRIO ........................................................................................ 209 
6. MANTIMENTO PARA NAKHT ............................................................................... 220 
7. RITOS FUNERÁRIOS ............................................................................................... 226 
8. TETO DA TUMBA ..................................................................................................... 230 
9. IMAGENS COMO GUIAS ......................................................................................... 232 
CAPÍTULO 4: INSCRIÇÕES DA TUMBA DE NAKHT ............................................ 236 
1. OFERENDAS PARA RÊ ............................................................................................ 238 
2. CENAS AGRÍCOLAS ................................................................................................ 241 
3. CAÇA E PESCA NO PÂNTANO, VINICULTURA E CAÇA DE PÁSSAROS ...... 243 
 
 
4. BANQUETE FUNERÁRIO ........................................................................................ 249 
5. MANTIMENTO PARA NAKHT ............................................................................... 251 
6. RITOS FUNERÁRIOS ............................................................................................... 265 
7. NAKHT E TAWI NAS INSCRIÇÕES ....................................................................... 271 
CONSIDERAÇÕES FINAIS ........................................................................................... 283 
REFERÊNCIAS ................................................................................................................ 288 
GLOSSÁRIO ..................................................................................................................... 332 
APÊNDICE A: MAPA DA NECRÓPOLE TEBANA .................................................. 341 
ANEXO A: MAPA DO EGITO ANTIGO ..................................................................... 343 
ANEXO B: MAPA DE TEBAS ....................................................................................... 344 
ANEXO C: TEMPLO DE KARNAK ............................................................................. 345 
ANEXO D: TEBAS NA XVIII DINASTIA (REINADO DE AMENHOTEP III) ...... 346 
ANEXO E: CRONOLOGIA EGÍPCIA ANTIGA ......................................................... 347 
ANEXO F: LISTA ORIGINAL DOS OBJETOS ENCONTRADOS NA TT 52........ 349 
 
 
 
 
1 
 
INTRODUÇÃO 
 
Em seguida, o sumo sacerdote de Âmon, rei dos deuses, Khonsuemhab, disse-lhe 
[ao akh Niutbusemekh]: “Faça-me um pedido concreto para que eu possa cumpri-
lo por você, e eu vou fazê-lo para você. Além disso, terei cinco servidores e cinco 
servidores, no total dez, oferecendo libações de água e receberão um saco de trigo 
diariamente. Além disso, o superintendente de oferendas fará libações de água 
para você”. 
Então o espírito Niutbusemekh lhe disse: “De que adiantariam as ações que você 
pensou em fazer comigo? Uma árvore abandonada cresce ao sol? Não é um acaso 
estar abandonado ao ponto de você não conseguir penetrar na entrada? A pedra ao 
longo dos anos entra em colapso”. 
Assim, o rei Mentuhotep, v.p.s.1, sumo sacerdote de Âmon-Rê, rei dos deuses, três 
homens, cada um [...]. Ele de barco subiu ao templo sagrado do rei Mentuhotep, 
v.p.s. 
Eles entraram nela [a tumba] e limparam vinte e cinco côvados na passagem em 
Deir el-Bahari. Então eles desceram à margem do rio e chegaram ao sumo 
sacerdote de Âmon-Rê, rei dos deuses, Khonsuemhab, e o encontraram 
oficializando os ritos no templo de Âmon-Rê. Então ele lhes disse: “Então vocês 
encontraram um belo lugar para marcar o nome daquele espírito chamado 
Niutbusemekh para a eternidade por toda a eternidade?” Os três homens 
responderam de forma unânime: “Encontramos o belo lugar para fazer o nome do 
espírito durar lá”. Então eles se sentaram diante dele e passaram um dia feliz. O 
coração de Khonsuemhab se alegrou quando disseram: “Quando o sol apareceu 
no horizonte”. 
Então ele contatou Menkau, o superintendente do templo de Âmon e o informou 
sobre sua tarefa. Ele voltou ao anoitecer para dormir na cidade de Tebas. [...] 
 
 O trecho acima pertence ao conto intitulado Khonsuemhab y el espíritu, traduzido na íntegra 
por Valeria Mayocchi e Andrea Zingarelli (2017, p. 273-275) para o espanhol (e, aqui, por nós, 
para o português) a partir de alguns óstracos que datam, provavelmente, do Reino Novo (c. 1550-
1070 A.E.C.), entre a XVIII (c. 1550-1307 A.E.C.) e XIX Dinastias (c. 1307-1196 A.E.C.). A 
 
1 A abreviatura “v.p.s.” significa “vida, prosperidade e saúde” (“ankh, udja, seneb”, em egípcio antigo), 
encontrada nos textos geralmente como sinal de respeito, acompanhando as palavras “rei”, “senhor”, “Sua 
Majestade”, “palácio (do rei)”, entre outros (ARAÚJO, 2000, p. 426). 
2 
 
história em questão nos conta sobre um akh2 de nome Niutbusemekh. Este apareceu para o sumo 
sacerdote do templo de Âmon-Rê, Khonsuemhab, para reclamar sobre o estado de descuido que 
sua tumba se encontrava. O que se sucede é uma ampla discussão do que o sumo sacerdote promete, 
promessas que o espírito se queixa de que não seriam cumpridas. O desfecho do conto se dá quando 
o rei, Mentuhotep, conversa com o sumo sacerdote e os servos que iriam deixar oferendas para 
Niutbusemekh e todos confirmamque a tumba deste seria rememorada, fazendo com que tanto o 
espírito quanto Khonsuemhab restaurem a ordem cósmica egípcia. 
 No Egito Antigo, encontramos uma grande quantidade de vestígios funerários, pois estão 
em áreas que foram melhor preservadas ou não ocupadas posteriormente, fazendo desse escopo 
documental algo frutífero para ser estudado, com, cada vez mais, novas descobertas e análises sobre 
essa antiga sociedade. Dessa forma, se entendermos que um mundo póstumo fazia parte das crenças 
egípcias e que o indivíduo deveria ter sua memória preservada na sociedade para que continuasse 
a existir nesse Além, compreenderemos que o local de sepultamento do egípcio fora um espaço 
sagrado de suma importância, que deveria ser preservado para a eternidade. Mesmo que curta, a 
história de Khonsuemhab e o espírito Niutbusemekh nos faz refletir sobre uma série de 
questionamentos: por que o espírito se revolta e se encontra com o sumo sacerdote de Âmon-Rê? 
Qual a função do sumo sacerdote nessa história? O que essa história representa e qual a sua 
importância para se entender essa Dissertação? 
 A tumba possui, basicamente, a função de guardar o corpo do morto. No entanto, essa 
simples função, na cultura egípcia, é dotada de inúmeros simbolismos que podemos perceber desde 
a escolha do local de enterramento até os ritos funerários que eram ali efetuados. As necrópoles 
egípcias eram geralmente construídas na margem oeste do rio Nilo, associando a morte com o pôr 
do sol. No caso da cidade de Tebas, a margem ocidental era constituída em grande parte por 
sepultamentos, como os enterramentos reais no Vale dos Reis e os de particulares, membros da 
elite como funcionários do palácio, escribas, sacerdotes e artesãos em outras áreas, como Deir el-
Medina, Sheik el-Qurna, el-Asasif e el-Khokha. 
 
2 Nesta versão fora traduzido por “espírito”, mas que também pode aparecer em textos acadêmicos como 
“fantasma” ou “espectro”. No entanto, essas traduções são imprecisas, uma vez que o termo apresenta uma 
complexa crença egípcia que não é semelhante à ocidental. 
3 
 
 A morte, por sua vez, é uma questão evidenciada em todas as culturas em todas as épocas. 
Contudo, o tratamento desse assunto por cada sociedade é o que pode especificar as variadas formas 
de conceber esse estado de “morte”, natural ao humano. A sociedade egípcia acreditava na ideia 
de que, ao morrer, o indivíduo passava por um processo de isolamento e, para viver no Além 
deveria ser reintegrado à sociedade por meio de rituais (ASSMANN, 2003a, p. 141). Tudo isso 
estava relacionado com as crenças egípcias sobre o corpo, que era dividido em partes (Ka, Ba, 
cadáver, sombra, coração, o Akh e o nome) no momento da morte e deveria ser recomposto para 
ser reintegrado à sociedade e assegurar a sua manutenção no Além, algo que deveria ocorrer na 
tumba por rituais apropriados (ASSMANN, 2003a, p. 141). 
 O conto acima reflete toda uma época de grandes mudanças sociais, políticas e religiosas 
que fora o Reino Novo (c. 1550-1070 A.E.C.) do Egito Antigo, mais precisamente a XVIII 
Dinastia. Este fora um momento em que o soberano egípcio precisava se firmar como poderoso, 
uma vez que tinha passado por um estado de conflitos internos com povos estrangeiros (hicsos) 
pelo controle do Egito. Concomitantemente à expulsão dos hicsos, à tomada de poder por uma 
família egípcia e, também, grandes construções de monumentos por todo país comemorando isso, 
podemos perceber uma elite cada vez mais poderosa. Os textos funerários que outrora foram 
destinados apenas aos faraós (no Reino Antigo) nos Textos das Pirâmides e, no Reino Médio eram 
postos em caixões (Textos dos Caixões) destinados aos membros de uma elite restrita, no Reino 
Novo tornam-se cada vez mais “democráticos”. Naquele momento, uma grande parte da elite tem 
acesso aos ritos funerários e, mesmo que não sejam os mesmos que os TP ou TC3, o chamado Livro 
dos Mortos é composto por fórmulas que auxiliam o morto no Além e providenciam o suprimento 
necessário para o seu mantimento. 
 Os dois personagens centrais do conto, como propõe Maria Martha Sarmiento (2017, p. 
285) podem nos encaminhar para uma discussão mais profunda. Como fora dito, o sistema 
cognitivo egípcio é complexo e repleto de simbolismos. “Khonsuemhab” poderia parecer um nome 
comum que aparece entre os egípcios a partir do Reino Novo. Contudo, se analisarmos por uma 
perspectiva etimológica, o nome do sacerdote pode nos indicar uma relação com o deus Khonsu, o 
filho de Âmon, que, em alguns textos funerários aparece como aquele que auxilia o morto a chegar 
 
3 A partir de agora, iremos utilizar as abreviações para esses textos. A lista de abreviações se encontra no 
início dessa dissertação. 
4 
 
no Além. Se pensarmos em “Niutbusemekh” podemos entender que se trata de um nome raro, 
composto por uma espécie de trocadilho. “Niut” (njwt) significa “cidade”, indicando, nesse caso, 
Tebas. Se invertermos e colocarmos “busemekhNiut” (bw-smx-njwt), formamos “Tebas não me 
esqueças”, o que indicaria uma forma de marcar uma necessidade de manter a memória do morto 
viva naquela sociedade (SARMIENTO, 2017, p. 288). 
 Dessa forma, retornando aos questionamentos propostos para o conto de Khonsuemhab e o 
espírito, Niutbusemekh se revoltou com o estado de sua tumba pois, de acordo com a crença 
egípcia, ele estaria passando por um processo de esquecimento e precisava de um membro da elite 
que detivesse poder e conseguisse mudar sua situação e, no contexto do Reino Novo, o sumo 
sacerdote de Âmon-Rê tinha um status social de destaque e seria atendido (aqui também entra o 
fato de que o sumo sacerdote iria proferir rituais e oferendas para o morto, assegurando sua 
manutenção no Além). Sendo assim, essa história representa um medo egípcio antigo que sua 
identidade caísse no esquecimento e, portanto, sofresse as consequências disso no Além, assim 
como um final positivo, no qual o espírito consegue ser atendido e o sacerdote cumpre sua função. 
Se pensarmos nessa problemática, poderemos compreender melhor nosso objeto de pesquisa nesse 
trabalho: a tumba de Nakht (TT4 52). 
 
... 
 
Com o objetivo principal de entender cada vez mais o conceito de morte egípcio, nossa 
dissertação está voltada para o estudo do espaço funerário de uma tumba egípcia de particular5 que 
data da XVIII Dinastia, Reino Novo. A tumba escolhida para nosso trabalho pertenceu ao escriba 
e astrônomo do deus Âmon, Nakht, que viveu entre os reinados de Tutmés IV e o seu sucessor, 
 
4 “TT” é a abreviação dada para o termo Theban Tomb, nomenclatura comum para as tumbas tebanas. 
5 São chamadas de “tumba de particular” aquelas estruturas funerárias feitas para membros da elite. 
Podemos perceber que, no Reino Novo, as tumbas de particulares formam uma categoria de sepultamento 
cada vez mais presente, algo que justifica o processo de “ampliação” de ritos funerários. 
5 
 
Amenhotep III (c. 1401-1353 A.E.C.), faraós que estabelecem uma ponte temporal entre os 
referidos anteriormente. 
Embora seja uma tumba muito famosa, cujos recortes das imagens da capela funerária 
aparecem em quase todo livro de divulgação sobre a arte egípcia, esse complexo funerário não fora 
amplamente explorado e analisado, de modo que podemos numerar os grandes trabalhos sobre essa 
tumba em poucas obras: um catálogo de 1917 do Metropolitan Museum de Nova Iorque, sob 
curadoria de Norman de Garis Davies; um livro, publicado em 1991 por Abdel Ghaffar Shedid e 
Matthias Seidel, que reitera o que Davies apresentou, com o adicional de imagens coloridas da 
tumba; um capítulo no livro de Sigrid Hodel-Hoenes, lançado em 1991, com explicações sobre o 
que algumas cenas da tumba representam; um artigo resultado de uma palestra e publicado em 
1997, escrito por Dimitri Laboury; e um livro de divulgação escrito por Dietrich Wildung, 
publicado em 1998, que seleciona alguns recortes das imagens da tumbae os descreve. Além desses 
trabalhos específicos sobre a tumba, podemos destacar aqui um artigo da Valerie Angenot, de 2012, 
que demonstra como realizar um trabalho hermenêutico da arte egípcia, comparando a tumba de 
Nakht (TT 52) com outras mais antigas, apresentando as influências que os artesãos tiveram ao 
pintar essa tumba. 
 Dos trabalhos citados anteriormente, são explorados pontos que consideramos chave para 
um entendimento aprofundado do sistema cognitivo egípcio, como a análise plurilateral que utilize 
tanto a localização geográfica da tumba em comparação com outras de sua temporalidade quanto 
a sua estrutura, as imagens e os textos presentes e os objetos encontrados. Além disso, a última 
atualização na tradução dos hieróglifos completos da tumba foi feita em 1917, na publicação de 
Davies. Nesse sentido, nossa intenção nessa dissertação é atualizar as análises da tumba de Nakht 
com as discussões atuais da Egiptologia, compreendendo o discurso funerário produzido pela elite 
tebana na XVIII Dinastia, assim como o período histórico ao qual ela está inserida. Para tanto, este 
trabalho está dividido em quatro partes, cada uma buscando interpretar esse espaço funerário do 
macro para o micro, iniciando na construção da Paisagem tebana da XVIII Dinastia, na qual a 
tumba será analisada em conjunto com outras do mesmo tipo e temporalidade, depois, 
examinaremos a estrutura, as imagens e, por fim, os textos da mesma. Para esse fim, utilizaremos 
teorias tanto da própria Egiptologia como da Arqueologia e Antropologia, disciplinas que se 
relacionam com a História. 
6 
 
 O espaço funerário aqui proposto foi analisado usanco como teoria a Arqueologia 
Processual, mais necessariamente a Arqueologia Cognitiva de Colin Renfrew. Este autor defende 
que, como um primeiro passo concreto, é útil assumir que existe em cada mente humana uma 
perspectiva do mundo, uma estrutura interpretativa, um mapa cognitivo (RENFREW, 1994), algo 
que não seja restrito às relações espaciais. Se pensarmos nas possibilidades dessa perspectiva, 
entendemos que seres humanos não agem apenas em relação às impressões sensoriais, mas ao 
conhecimento existente do mundo, através do qual essas impressões são interpretadas e recebem 
significado (RENFREW; BAHN, 2016, p. 392). Dessa forma, podemos apresentar uma certa 
estrutura na qual um humano, acompanhado de seu próprio mapa cognitivo, depara-se com um 
determinado problema. Nesse momento, o indivíduo responde tanto às impressões sensoriais 
percebidas imediatamente quanto a esse mapa internalizado, que inclui uma memória do mundo 
no passado e previsões do mundo no futuro, gerando sua visão de mundo e a resposta para a 
problemática encontrada. 
Nesse sentido, perceberemos que comunidades de pessoas que vivem juntas e compartilham 
do mesmo cotidiano, falando o mesmo idioma, geralmente, compartilham a mesma visão de mundo 
(RENFREW; BAHN, 2016, p. 392). Portanto, podemos falar de um mapa cognitivo comum sem 
negar a individualidade de cada humano (ou grupo) existente nessa sociedade. No caso egípcio, 
mais necessariamente nas tumbas tebanas do Reino Novo, podemos analisar os diferentes tipos de 
fontes que possuímos na tumba de Nakht (localização geográfica, arquitetura, objetos, imagem e 
texto) a partir dessa perspectiva de Renfrew, respeitando as aplicações teóricas permitidas entre os 
autores. Sendo assim, ao organizarmos esse trabalho partindo de uma perspectiva geral (macro) 
para o mínimo (micro), podemos explorar esse sistema cognitivo egípcio, corroborando para o 
desenvolvimento desse mapa cognitivo e resposta de nossa problemática central: qual o discurso 
funerário desenvolvido e mantido pela elite tebana na XVIII Dinastia? 
A partir do conjunto de fontes disponíveis do nosso objeto de pesquisa, compreenderemos 
elas a partir de um Ambiente Construído. Para Amos Rapoport (1982), o ambiente não pode 
determinar completamente o comportamento humano, uma vez que uma atividade presente em um 
espaço pode variar. Entretanto, o conjunto dessas atividades, organizado pelo tempo e espaço em 
um sistema de atividades, pode nos informar sobre a sociedade que vivencia(va) aquele ambiente. 
Rapoport (1982) acredita que o ambiente se comunica com os participantes por meio de um 
7 
 
conjunto de pistas, que são destinadas a provocar emoções, interpretações, comportamentos e 
transações apropriadas, estabelecendo as situações e os contextos apropriados. Pode-se dizer, 
então, que o ambiente age como um agente mnemônico, lembrando às pessoas de um 
comportamento esperado delas. Os ambientes são, portanto, ligações e separações no espaço e no 
tempo que guiam as ações do participante (RAPOPORT, 1982, p. 81). 
Esse estudo da então chamada “Comunicação Não Verbal” do Ambiente Construído pode 
ser contextualizado, analisado e interpretado por três características do ambiente: os elementos 
fixos, os semifixos e os não fixos. Para identificar tais elementos, devemos entender como 
determinada sociedade age em um ambiente (RAPOPORT, 1982, p. 87); se pensarmos na antiga 
sociedade egípcia, podemos identificar a partir da tumba de Nakht. Os elementos fixos são aqueles 
que não mudam ou se modificam raramente ou de maneira lenta. Estes são organizados no espaço 
(geralmente com outros elementos) para comunicar um significado para o humano que o utiliza. 
Os semifixos são aqueles que podem mudar de lugar, como uma cadeira ou mesa. Eles podem e 
mudam facilmente (de forma rápida), o que torna a análise deles mais difícil, uma vez que pode 
haver mudanças de significados com a mudança de contexto. Por fim, os elementos não fixos, 
humanos, que formam o sujeito dos estudos de comunicação não verbal. 
Os três tipos de elementos podem ser evidenciados na TT 52, mesmo que de maneira 
implícita. As imagens e as inscrições (assim como a própria arquitetura da tumba) representam os 
elementos fixos, que estão no espaço para indicar aos visitantes (os elementos não fixos) as suas 
atividades. Ao realizar essas atividades (rituais), os elementos não fixos, de certa forma, produzem 
materiais (os elementos semifixos) que identificam o que fora realizado no interior da tumba. Tais 
elementos semifixos, encontrados na tumba de Nakht, são vasilhames de oferendas e fragmentos 
de mobília (DAVIES, 1917, Pr. XXIX), que nos auxiliam na compreensão dos componentes das 
atividades realizadas do interior da tumba. É possível, então, vincular as duas teorias de modo que 
obtenhamos um Sistema de Atividades Ritualísticas, de modo que entendamos o sistema cognitivo 
egípcio a partir desse espaço funerário, desse Ambiente Construído. 
Nosso objetivo principal do Capítulo 1: a necrópole tebana é de construir uma Paisagem 
funerária de Tebas da XVIII Dinastia. No entanto, devemos em um primeiro momento entender o 
contexto histórico em que o Egito estava inserido no período de Nakht. A partir disso poderemos 
refletir sobre as estruturas consideradas principais, os templos de Karnak e Luxor e os templos 
8 
 
funerários, assim como as diferentes tumbas de particulares (demonstrando suas particularidades e 
analisando os locais das construções), e, também, o que torna possível essas conexões, as Vias 
Processionais e os festivais nelas desempenhados. Temos, portanto, um tríplice foco: compreender 
que a Paisagem natural é pensada de maneira simbólica (BRADLEY, 1999) pelos próprios 
habitantes da região de Tebas da XVIII Dinastia; elencar os critérios utilizados para dotar 
culturalmente a Paisagem, entendo que isso resulta em um espaço adequado para o 
desenvolvimento de práticas rituais de devoção e aprovação de deuses e personagens divinizados 
e de culto à memória dos mortos membros da elite (PEREYRA et al, 2018); e, por fim, reconhecer 
a natureza discursiva que instrui os participantes do culto e outros observadores sobre a maneira 
esperada de usar a Paisagem, a partir do reconhecimento das funçõesdesempenhadas por cada obra 
arquitetônica e das trajetórias seguidas durante a circulação ritual pelos participantes nas 
procissões. 
 No Capítulo 2: rituais na tumba de Nakht, focaremos em tratar sobre as crenças egípcias, 
voltando o olhar para a estrutura da tumba e os objetos nela encontrados. Dessa forma, tentaremos 
entender a religião egípcia no contexto da XVIII Dinastia, interpretando como a elite tebana 
construíra um discurso funerário, que designava uma função (ou funções) para suas tumbas. 
Compreenderemos como analisar esses dados a partir da Arqueologia da Religião, proposta por 
Renfrew (1994), e da Comunicação não-verbal em um Ambiente Construído, proposta por 
Rapoport (1982), iniciando o desenvolvimento do Sistema de Atividades Ritualísticas respaldadas 
tanto na estrutura da tumba quanto nos objetos encontrados nela. 
 Com o Capítulo 3: o plano decorativo da tumba de Nakht, iremos continuar o 
desenvolvimento do que estamos chamando de sistema de atividades ritualísticas da tumba de 
Nakht. Explanaremos sobre a Cultura Visual egípcia, entrando em assuntos como a concepção de 
arte para os egípcios, a teoria imagética para essa sociedade e em como analisá-la em uma tumba 
como a de Nakht. A partir disso poderemos inferir problemáticas na complexidade desse espaço 
funerário, compreendido então pela intersecção da arquitetura, objetos e imagem. Um complexo 
funerário deveria possuir um espaço considerado público, de modo que os antigos egípcios 
(geralmente familiares) pudessem visitar a tumba e realizassem oferendas para manter o morto no 
Além (conforme vimos no conto de abertura dessa introdução). Dessa forma, o ideal era que 
existissem imagens que guiassem as atividades ritualísticas para manutenção da crença egípcia ali 
9 
 
presente, o que nos permite interpretar como Nakht e sua esposa Tawi são dispostos e vistos por 
esses visitantes. 
 Sabemos que existia no Egito Antigo um sistema de escrita complexo que não deveria ser 
dissociado da imagem, uma vez que ambos são complementares. Sendo assim, no Capítulo 4: 
inscrições da tumba de Nakht exploraremos a Cultura Escrita egípcia, comparando imagem e texto 
nas tumbas de particulares. O texto compõe a última parte dessa dissertação, tanto por ser complexo 
quanto por necessitar de todas as outras partes para o entendimento pleno, uma vez que iremos 
analisar essas inscrições em uma tradução atualizada por nós (disponível no Corpus em hieróglifos, 
transcrita e traduzida para o português e espanhol). Pela prática da leitura não ter sido algo 
democrático para o período analisado, então já temos um indicativo de que os visitantes que fossem 
ler essas inscrições seriam uma parcela restrita da própria elite egípcia, fazendo-nos refletir sobre 
a utilidade dessas inscrições: seriam para o próprio morto? Ao compararmos essas inscrições com 
o LDM6, poderemos entender melhor esse discurso funerário egípcio e, enfim, construir o sistema 
de atividades ritualísticas para a tumba de Nakht. 
 Intermediando todos esses quatro capítulos está o Corpus, nosso Volume II da dissertação. 
Podemos justificar a confecção de um Corpus documental como uma base do trabalho 
arqueológico (VASQUES, 2005, p. 35), uma vez que indica uma forma de organização 
metodológica do material da pesquisa. O Corpus apresenta um Título para a parte trabalhada, 
Material e Técnica, Dimensões, Localização atual, Período, Data, Dinastia, Referências 
bibliográficas, Inscrições (essa parte está subdividida em Hieróglifos, Transcrição e Tradução 
para o português -PT- e o espanhol -ES-), e, por fim, a Descrição do que fora trabalhado. Somente 
a partir dessa explanação é que podemos analisar os pormenores que a antiga sociedade egípcia 
entendia. Sendo assim, utilizaremos a semiótica e a hermenêutica para auxiliar a interpretar essa 
sociedade a partir da Arqueologia Cognitiva, uma vez que identificamos seus símbolos e os 
analisamos a partir de uma série de pressupostos e simbologias propriamente egípcios. 
 Sendo assim, a ideia de construção de um Sistema de Atividades Ritualísticas da TT 52 irá 
nos auxiliar na compreensão do que fora o discurso funerário do período de Nakht. Com base nas 
 
6 A partir de agora, iremos utilizar essa abreviação para Livro dos Mortos. A lista de abreviações se encontra 
no início dessa dissertação. 
10 
 
conjunturas arquitetônicas, dos objetos encontrados, imagéticas e textuais, interpretaremos o que 
fora esse espaço funerário. Dessa forma, como podemos analisar Nakht? Quem ele fora? Qual seu 
papel social na sociedade tebana da XVIII Dinastia? Conseguimos saber disso? E quanto à sua 
visão do Além? Seria sua própria visão de morte que encontramos em sua tumba? Como esse 
sistema cognitivo tebano é engendrado? E sobre sua esposa, Tawi? O que podemos encontrar dela 
na TT 52? Qual o papel feminino representado na tumba? O que podemos interpretar da sociedade 
egípcia a partir do material que possuímos na tumba de Nakht? Como o Sistema de Atividades 
Ritualísticas pode ser construído para essa tumba e o que isso auxilia em nossa pesquisa? 
 
11 
 
CAPÍTULO 1: A NECRÓPOLE TEBANA 
 
 A tumba de Nakht, catalogada como Tumba Tebana de número 52, pertenceu ao 
funcionário do Templo de Âmon que ocupava o cargo de escriba e astrônomo desse deus. Embora 
esta tumba esteja em quase todo livro de divulgação da história do Egito Antigo, ela não fora 
amplamente analisada e revisada de acordo com as mais recentes descobertas dos egiptólogos. Este 
complexo funerário existe há mais de 3400 anos e podemos retirar diversas informações da 
sociedade que a construiu se pararmos e refletirmos sobre suas possibilidades. Ao todo, a tumba é 
considerada pequena se compararmos com as demais deste mesmo período. Apresenta um pequeno 
pátio de tamanho irregular, uma capela funerária de 4,8m por 1,5m, uma câmara interna de 2,2m 
por 2,5m e, por fim, uma câmara funerária de dimensões não regulares. Está localizada na região 
sul do atual sítio arqueológico de Sheik el-Qurna, na margem ocidental da atual Luxor, cidade ao 
sul do Egito. 
 Uma tumba egípcia apresenta uma complexa visão de mundo, que devemos explanar o mais 
detalhadamente possível para que possamos analisá-la. Dessa forma, devemos entender suas 
questões culturais, sociais, econômicas e políticas. Ao escrever sobre os problemas atuais da 
Egiptologia, o egiptólogo Rune Nyord (2018) defende que necessitamos de atualizações em nossos 
campos de pesquisa sobre a religião. Dessa forma, precisamos entender que cooperações teóricas 
e metodológicas entre a Egiptologia e demais áreas do conhecimento, como a Antropologia (e, em 
nosso caso, também, a Arqueologia) devem ser encorajadas em nossas pesquisas, uma vez que o 
avanço das discussões nestas duas áreas podem ajudar a quebrar paradigmas tradicionais sobre o 
Além egípcio (NYORD, 2018), como o entendimento de que uma imagem em uma tumba pode 
representar tanto algo que estava sendo vivenciado naquela sociedade como um complexo sistema 
de crenças, que também estavam respaldadas na realidade deles. 
O trabalho que iremos desenvolver nessa dissertação será o de analisar esta tumba do 
escriba e astrônomo do deus Âmon, Nakht. Para tanto, devemos inserir tal complexo funerário em 
seu contexto histórico e espacial. Devemos, então, partir do macro para o micro, de modo que 
entendamos uma complexidade na formação de tal tumba, uma vez que, assim, podemos perceber 
melhor o contexto e, para este capítulo em específico, construir a Paisagem funerária tebana. Sendo 
assim, ao separarmos esta dissertação em quatro capítulos, analisaremos a tumba de Nakht e a 
12 
 
Necrópole tebana, a sua arquitetura e os rituais efetuados na mesma, os costumes funerários e a 
religião egípcia, assim como as conexões entre as cenas da tumba com os textos funerários, que 
permite identificarmos melhor o sistema cognitivo religioso-funerário egípcio. Dessa forma, nesteprimeiro capítulo, iremos tratar das questões relacionadas ao contexto temporal e espacial em que 
a TT 52 está inserida, demarcando sua Paisagem. 
 Sendo assim, neste capítulo iremos atualizar as discussões dos egiptólogos sobre as tumbas 
tebanas de particulares da XVIII Dinastia, tomando como foco a tumba de Nakht (TT 52) e a 
temporalidade entre os reinados de Tutmés IV e Amenhotep III, uma vez que é a datação 
aproximada da construção da tumba. Neste capítulo em específico, como mencionado 
anteriormente, iremos tratar das questões relacionadas ao contexto espacial em que a TT 52 está 
inserida, demarcando sua Paisagem. Portanto, separamos este capítulo em outras três partes, a 
saber: as questões teóricas que iremos empregar nesta análise (Arqueologia Processual - Cognitiva 
e Paisagem); as Vias Processionais como uma tentativa de entender o porquê da tumba de Nakht 
ter sido construída naquele local (questionando, assim, se existiria um sistema cognitivo para tal 
feito); e o que havia ao redor da TT 52 (entendendo quais tumbas existiam na época, de modo que 
possamos indicar ou subentender o status social de Nakht). 
 
1. CONSTRUÇÃO DA PAISAGEM FUNERÁRIA TEBANA 
 
 Tebas, foi uma das cidades mais importantes do Egito ao longo de toda sua história. Na 
Antiguidade, fora um local sagrado, cujo culto central ao deus Âmon concentrara grandes festivais 
e, portanto, uma significativa importância na religião egípcia. Como explicado anteriormente, 
nosso objetivo neste capítulo é analisar a tumba de Nakht (TT 52), localizada na cidade de Tebas 
e construída entre os reinados de Tutmés IV e Amenhotep III (1401-1353 A.E.C.), em comparação 
com as demais construções desta cidade, de modo que entendamos o seu significado na Paisagem 
funerária tebana. Para tanto, basear-nos-emos, primordialmente, nas possibilidades teóricas e 
metodológicas da Arqueologia Cognitiva, pertencente à vertente da Arqueologia Processual, e das 
teorias de Paisagem, que, para alguns autores, pode unir o melhor da Arqueologia Processual com 
a Pós-processual. Dessa forma, caberá a nós explicarmos tais teorias para que possamos 
compreender melhor a TT 52. 
13 
 
 De acordo com o egiptólogo Kent Weeks (2008, p. 14), a inserção dos estudos 
arqueológicos na Egiptologia se deu ao longo do século XX, trazendo consigo a possibilidade de 
analisar melhor essa sociedade, baseando-se principalmente na Cultura Material deixada pelos 
egípcios, o que nos fornece uma base mais confiável para interpretarmos o seu cotidiano. O “mais 
confiável” que aqui expomos se refere ao fato de que algo produzido com intuito de ser utilizado 
no cotidiano, como uma cerâmica ou um objeto de culto, feito para ser útil naquele momento e, 
posteriormente, descartado. Em contrapartida, um objeto produzido com um propósito específico, 
como imagens do faraó em templos funerários massacrando seus inimigos, incide de uma 
subjetividade específica. Atualmente, sabemos que ambos os exemplos são passíveis de análise, se 
interpretados corretamente, baseados em uma teoria e metodologia própria. Entretanto, é 
interessante perceber que, com as novas possibilidades da Arqueologia, os egiptólogos 
conseguiram perceber melhor alguns pontos específicos dos egípcios antigos. 
 Weeks defende que a egiptologia não é mais uma disciplina feita apenas de teólogos, 
filólogos e historiadores, que, até as décadas de 1960 e 19807, eram generalistas quando refletiam 
para a história do Egito Antigo (WEEKS, 2008, p. 14). Ao empregarem as análises arqueológicas, 
como, por exemplo, em ossos de animais, resquícios de plantas, amostras de pólen, argilas, 
ferramentas líticas, e, também, fragmentos de cestos, os egiptólogos podem extrair o máximo 
possível de informação sobre esta sociedade (WEEKS, 2008, p. 14-15). Sendo assim, se pensarmos 
em questões próprias da Arqueologia, podemos tornar complexas nossas análises para a tumba de 
Nakht e, também, atualizar as discussões acerca desta. 
 Colin Renfrew afirma que a arte antiga e a escrita antiga, ambas ricas fontes de informação 
cognitiva, são estudadas há muito tempo por estudiosos, mas que, com muita frequência, as 
pesquisas sobre arte têm sido entendidas como um domínio do historiador da arte e os textos são 
parte da pesquisa do historiador (RENFREW; BAHN, 2016, p. 391). Desse modo, o problema que 
cerne o seu desenvolvimento é que a perspectiva arqueológica nesses trabalhos está ausente, o que 
impossibilita as análises mais completas sobre o sistema cognitivo da época. 
 Renfrew argumenta ao longo de seu manual sobre as teorias, métodos e práticas 
arqueológicas sobre os alcances de sua linha teórica, chamada de Arqueologia Cognitiva 
 
7 Essas décadas são marcadas, para a Arqueologia, com um forte início das linhas teóricas da Arqueologia 
Processual e Pós-processual, respectivamente. 
14 
 
(RENFREW; BAHN, 2016). O autor defende que o ceticismo dos primeiros arqueólogos da 
Arqueologia Processual e a empatia não estruturada dos primeiros da Pós-processual podem ser 
respondidos pelo desenvolvimento de procedimentos explícitos para analisar os conceitos das 
sociedades antigas e a maneira como elas pensavam (RENFREW; BAHN, 2016, p. 391). Portanto, 
se seguirmos essa linha proposta, podemos analisar como as pessoas descreveram e mediram seu 
mundo; como as pessoas planejavam monumentos e cidades, uma vez que o próprio layout das 
ruas revela aspectos do planejamento; quais bens materiais as pessoas mais valorizavam e talvez 
viam como símbolos de autoridade ou poder; podemos, também, investigar a maneira pela qual as 
pessoas conceberam o sobrenatural e como elas responderam a essas concepções em sua prática de 
culto (RENFREW; BAHN, 2016, p. 391). 
 Nos dias atuais, geralmente são aceitas as ideias que entendem a distinção da espécie 
humana com outras formas de vida se dá pela nossa capacidade de usar símbolos. Toda forma de 
cognição, assim como todo discurso coerente são baseados em símbolos, pois as próprias palavras 
são símbolos, onde o som ou as letras escritas representam e, portanto, representam (ou 
simbolizam) um aspecto do mundo real. Geralmente, no entanto, o significado é atribuído a um 
símbolo em particular de maneira arbitrária: geralmente não há nada que indique que uma palavra 
específica ou um sinal específico deve representar um determinado objeto no mundo e não outro 
(RENFREW; BAHN, 2016, p. 391). 
 Além disso, o significado atribuído a um símbolo é específico para uma tradição cultural 
específica. Ao nos depararmos com um relevo egípcio, situado em um templo, com a representação 
de um homem, maior do que os outros na imagem, com diversas pessoas, menores que ele, presas 
pelos cabelos em sua mão direita, apenas com pesquisas podemos inferir que essa imagem 
representa o faraó massacrando seus inimigos. Entretanto, as pessoas que viveram a época em que 
essa imagem estava sendo construída e, portanto, vivenciada diariamente, não precisavam fazer 
relações com outras imagens e estudá-las a fundo. O que Renfrew defende é que essas pessoas 
faziam parte de um sistema cognitivo e, ao olharem para a imagem, reconheciam quem era e como 
se portar diante desta. É interessante um exemplo que o autor utiliza sobre pessoas que falam 
idiomas diferentes: estes usam palavras diferentes para descrever a mesma coisa. Pensando nisso, 
um objeto ou ideia pode ser expresso simbolicamente de várias maneiras diferentes (RENFREW; 
BAHN, 2016, p. 391). 
15 
 
 Renfrew aponta que, geralmente é impossível inferir o significado de um símbolo dentro de 
uma determinada cultura a partir da forma simbólica da imagem ou do objeto. Sendo assim, temos 
que ver como essa forma é usada e vê-la no contexto de outros símbolos. A Arqueologia Cognitiva 
deve, portanto, ter muito cuidado com contextos específicos de descoberta: é o conjunto que 
importa, não o objeto individual isoladamente. Conforme vamos adentramos em discussõesmais 
profundas sobre a tumba de Nakht, entendemos que este é um dos pontos cruciais para todos os 
capítulos aqui propostos: a tumba de Nakht existe em um espaço construído para abrigar os corpos 
de diversos membros da elite egípcia da XVIII Dinastia, a Necrópole Tebana; dentro dela, a sua 
arquitetura desempenha determinadas funções que podem ser entendidas a partir de ritos funerários 
(tema do segundo capítulo); nas paredes desta tumba, existem imagens e textos que devem ser 
analisados em conjunto com os objetos ali encontrados e, também, com a própria arquitetura e 
localização geográfica deste complexo funerário (temas do segundo, terceiro e quarto capítulos). 
 Dessa forma, é importante aceitar que representações e objetos materiais (artefatos) não 
revelam diretamente seus significados para nós - certamente não na ausência de evidências escritas. 
É fundamental do método científico que seja o observador, o pesquisador, quem deve oferecer a 
interpretação, entendendo que pode haver várias interpretações alternativas e que elas devem ser 
avaliadas, se necessário umas contra as outras, por procedimentos explícitos de avaliação ou teste 
com novos dados (RENFREW; BAHN, 2016, p. 392). Esse é um dos princípios da Arqueologia 
Processual, conforme discutido acima. 
 Alguns Arqueólogos Processuais, principalmente Binford, argumentaram que não é útil 
considerar o que as pessoas pensavam no passado, defendendo que são as ações e não os sistemas 
cognitivos das pessoas que encontram seu caminho, principalmente no registro material 
(RENFREW; BAHN, 2016, p. 392). E é nesse momento que Renfrew quebra com uma perspectiva 
que considera ultrapassada e inicia a Arqueologia Cognitiva. Dessa forma, se considerarmos que o 
que encontramos de antigas sociedades (ou até mesmo das contemporâneas) são, em parte, 
produtos de suas crenças e intenções humanas (que críticos, como Ian Hodder, não negariam), e 
que isso oferece potencialidades e problemas em seu estudo, podemos entender a sociedade egípcia 
a partir desse pressuposto, auxiliando para o desenvolvimento da própria Egiptologia ao fazê-lo e, 
portanto, das análises sobre a tumba de Nakht. Mas, como faremos isso? Qual metodologia para 
alcançarmos esse objetivo? 
16 
 
 Renfrew (1994) assume que, como um primeiro passo concreto, é útil assumir que existe 
em cada mente humana uma perspectiva do mundo, uma estrutura interpretativa, um mapa 
cognitivo, uma ideia semelhante ao mapa mental que os geógrafos discutem, mas que não se 
restringe à representação de apenas relações espaciais. Isso é interessante se pensarmos em suas 
possibilidades. Os seres humanos não agem apenas em relação às impressões sensoriais, mas ao 
conhecimento existente do mundo, através do qual essas impressões são interpretadas e recebem 
significado (RENFREW; BAHN, 2016, p. 392). 
 
Esquema 1: Mapa cognitivo a partir da Arqueologia Cognitiva. 
Fonte: Adaptado de Renfrew e Bahn (2016, p. 392, fig. 10.2). 
 
 No esquema acima, proposto por Renfrew, vemos um indivíduo humano acompanhado (em 
sua mente) por um mapa cognitivo pessoal. Sendo assim, esse humano, acompanhado de seu 
próprio mapa cognitivo (representado pelo quadrado), tem acesso a um determinado problema 
(apresentado diante seus olhos). O indivíduo responde tanto a impressões sensoriais percebidas 
imediatamente quanto a esse mapa internalizado, que inclui uma memória do mundo no passado 
(t-1) e previsões do mundo no futuro (t+1), gerando sua visão de mundo e a resposta. Se pensarmos 
17 
 
em uma comunidade de pessoas habitando juntas, podermos perceber que se elas compartilharem 
da mesma cultura e falarem o mesmo idioma, geralmente elas compartilham a mesma visão de 
mundo (RENFREW; BAHN, 2016, p. 392). Dessa forma, podemos falar de um mapa cognitivo 
comum sem negar a individualidade de cada humano (ou grupo) englobado por este mapa. 
 Essa ideia oferece uma ampla capacidade de análise. Uma vez que temos disponíveis para 
tratar sobre a tumba de Nakht diversos tipos de fontes8, que devem ser exploradas em conjunto, 
devemos confrontá-las com outras fontes disponíveis. Por exemplo, neste capítulo em específico 
iremos comparar os diferentes tipos de tumbas de particulares, de modo que entendamos esse mapa 
cognitivo comum entre os membros da elite enterrados na Necrópole tebana da XVIII Dinastia. 
Entretanto, não devemos olhar apenas as tumbas e seus tipos de modo aleatório. Devemos entender 
que este espaço, quando analisado como um todo, fornece-nos dados importantes sobre essa 
sociedade. Dessa forma, precisamos buscar respostas para nossas inquietações nos estudos sobre 
Paisagem. 
 A discussão sobre Paisagem é infinita para diversas áreas do conhecimento. Por exemplo, 
uma filósofa francesa, como Anne Cauquelin, pode se remeter à Paisagem como algo que está 
inteiramente submetida às convenções pictóricas e literárias, entendendo-a como algo que evoca 
uma natureza e, portanto, subjetiva (CAUQUELIN, 2007). Para nossa perspectiva, arqueológica, 
Kurt F. Anschuetz, Richard H. Wilshusen e Cherie L. Scheick escreveram, talvez, um dos artigos 
mais completos sobre as perspectivas que a Paisagem pode tomar na Arqueologia, tanto na linha 
Processual quanto na Pós-processual. Devemos, portanto, entender a partir deles os paradigmas da 
Paisagem e suas utilidades para a Arqueologia, uma vez que eles elencam quatro premissas que 
providenciam os fundamentos principais para este modelo (ANSCHUETZ; WILSHUSEN; 
SCHEICK, 2001, p. 160-161): 
 
 
8 Em cada um dos capítulos, nossas fontes irão ser analisadas conforme o que nos proporciona a Arqueologia 
Cognitiva. A Paisagem funerária de Tebas no primeiro capítulo, tomando como fontes os tipos das tumbas 
construídas à época. A arquitetura da tumba de Nakht e os rituais nela desempenhados como fonte do 
segundo capítulo. Os textos, as imagens e os objetos funerários dispostos na tumba para analisar o conjunto 
proposto nos capítulos três e quatro. Em cada um deles, será retomada e complexificada essa discussão. 
18 
 
1. Paisagens não são sinônimos de ambientes naturais. As paisagens são sintéticas, com 
sistemas culturais estruturando e organizando as interações das pessoas com seus 
ambientes naturais; 
2. Paisagens são mundos de produtos culturais. Através de suas atividades diárias, crenças e 
valores, as comunidades transformam espaços físicos em lugares significativos. Sendo 
assim, uma paisagem é uma construção do mundo que vemos e vivemos, identificado e 
modificado por cada pessoa pertencente a ele; 
3. As paisagens são a arena para todas as atividades de uma comunidade. Assim, as paisagens 
não são apenas construções das populações humanas, mas também o meio em que essas 
populações sobrevivem e se sustentam; 
4. Paisagens são construções dinâmicas, com cada comunidade e cada geração impondo seu 
próprio mapa cognitivo em um mundo antropogênico de morfologia, arranjo e significado 
coerente. 
 
 Entendemos em cada um desses tópicos que as Paisagens podem e devem ser incorporadas 
(quando possível) ao trabalho do arqueólogo que pretende analisar algum espaço construído por 
aquela sociedade. Uma vez que as paisagens incorporam princípios organizadores fundamentais 
para a forma e estrutura das atividades das pessoas, elas servem como uma construção material que 
comunica informações (HUGILL; FOOTE, 1995, p. 20). Além disso, a paisagem, como um sistema 
para manipular símbolos significativos nas ações humanas e seus subprodutos materiais, ajuda a 
definir relacionamentos padronizados habituais entre informações variadas (ANSCHUETZ; 
WILSHUSEN; SCHEICK, 2001, p. 161). Nesse sentido, Emma Blake (2006, p. 235) afirma que o 
estudo da paisagem forneceu aos arqueólogos e geógrafos seu ponto de contato recente mais 
significativo. Blake (2006, p. 235) interpreta ainda que, com isso, os arqueólogos exploravam 
novas maneiras de conceituar a paisagem e problematizaro determinismo ambiental e as 
explicações funcionalistas procuravam os escritos geográficos como forma de construir um melhor 
embasamento teórico e analítico. 
 Os arqueólogos que propuseram estes fundamentos ainda nos informam que os processos 
de mudança comportamental no espaço e ao longo do tempo necessariamente resultam em um 
cenário de constantes mudanças, permitindo-nos a análise da TT 52 a partir desse contexto espacial 
19 
 
e temporal. Nossa utilização da Paisagem é, portanto, usufruirmos do que esta proporciona sobre 
as redes culturais e históricas, fazendo-nos interpretar diversas variáveis espaciais e temporais na 
estrutura e na organização dos traços materiais (ANSCHUETZ; WILSHUSEN; SCHEICK, 2001, 
p. 162). Desse modo, aplicar uma perspectiva de Paisagem auxilia na construção de um 
entendimento mais completo acerca das relações sociais e econômicas, além do contexto histórico, 
ecológico e cognitivo nos quais os humanos interagiam com o ambiente de Tebas da XVIII 
Dinastia. 
 Neste capítulo, utilizaremos diversas estruturas (como os templos funerários, as tumbas de 
particulares e as vias processionais que ligam essas construções) para construirmos a Paisagem de 
Tebas do período. Para tanto, precisamos entender que essas diferentes estruturas, quando 
analisadas em conjunto, existem e foram construídas dentro do que Amos Rapoport considera como 
Ambiente Construído. Este arquiteto e antropólogo passou por diversas formulações e 
reformulações em sua teoria, tendo como a mais utilizada (e, também, madura) por diversas áreas 
do conhecimento, como Arqueologia, História e Geografia, a que consta no livro O Significado do 
Ambiente Construído (RAPOPORT, 1982). Mesmo assim, não devemos descartar totalmente suas 
ideias iniciais, que auxiliaram na formação de sua teoria. 
 Em um artigo publicado em 1974, Rapoport discute sobre o simbolismo no design do 
ambiente, o qual consiste na argumentação de que os símbolos, em uma determinada cultura, 
estavam fixados nesta e eram conhecidos e compartilhados tanto pelos seus desenvolvedores, 
quanto pelo público (RAPOPORT, 1974, p. 61). Dessa forma, as estruturas construídas em uma 
determinada sociedade, estão relacionadas com os valores desta cultura e, portanto, com seus 
símbolos, indicando que essas construções existem de modo que são percebidos pela população 
que as vivenciam e que exercem um certo simbolismo na paisagem dessa sociedade (RAPOPORT, 
1974, p. 60). 
 Se analisarmos em publicações posteriores sobre o assunto, essa ideia de Rapoport 
prevalece, mas não é largamente explicada como neste artigo. Entendemos, assim, que arquitetos 
e designers ambientais (como Rapoport designa aqueles que planejam o ambiente para construí-
lo) não são apenas artistas do espaço, mas também do tempo. Então, Rapoport defende a 
centralidade do significado na cultura material e a relevância de estudos que abordem padrões 
específicos de cultura nos restos que as comunidades humanas deixam em terra. Sendo assim, 
concordamos que, embora gerações de pessoas possam habitar e modificar vários lugares dentro 
20 
 
de sua Paisagem comunitária de maneira diferente, os traços materiais residuais compartilham 
elementos de um padrão organizacional subjacente comum, desde que as tradições culturais 
fundamentais sejam perceptíveis ao analisarmos esses lugares (RAPOPORT, 1982, p. 17). Essa 
ideia de Rapoport pode ser desenvolvida a partir do Sistema de Informação Geográfica (SIG)9, mas 
também podemos utilizá-la para identificar certas particularidades de cada terreno analisado que 
devem ser expostas e analisadas, algo para levarmos além do que um simples padrão organizacional 
subjacente comum. 
 Uma possibilidade de análise que utilizaremos aqui é a de Paisagem Ritual, que se baseia 
nos estudos da distribuição espacial das características ritualísticas, como prédios públicos, 
monumentos e praças (ANSCHUETZ; WILSHUSEN; SCHEICK, 2001, p. 178), por exemplo. Os 
estudos da Paisagem Ritual utilizam, assim, modelos espaciais cognitivos idealizados derivados de 
materiais etnográficos para procurar padrões de similaridade e dissimilaridade no passado. Esses 
padrões possivelmente se relacionam a mudanças no padrão profundo de diretrizes informadas por 
ideias que ajudam a condicionar a estrutura subjacente, mas não o conteúdo específico, do 
comportamento (ANSCHUETZ; WILSHUSEN; SCHEICK, 2001, p. 179). Sendo assim, a 
utilização da Paisagem Ritual é melhor se pensarmos no contexto do Egito Antigo e, também, das 
escolhas teóricas desta dissertação10. 
 Sendo assim, uma vez que a cultura material codifica as informações de maneira 
padronizada, o uso de métodos indutivos pode decodificar observações arqueológicas para nos 
auxiliar a realizar inferências sobre os significados passados subjacentes às regularidades e desvios 
observados (RAPOPORT, 1982, p. 86). Ao combinar uma abordagem de Paisagem com a 
sistemática espacial e temporal desenvolvida pela Arqueologia Processual, é possível incorporar a 
escala dinâmica da análise de Paisagem com a análise espacial e temporal de escala atribuída de 
 
9 A sigla em inglês, mais encontrada nos textos específicos de estudos em Paisagem Arqueológica, é GIS, 
que significa Geographical Information Systems. 
10 Conforme trabalharemos melhor no segundo capítulo, Colin Renfrew possui sua própria ideia para Ritual, 
a qual exploraremos em mais detalhes doravante. Entretanto, de antemão já podemos entender que a 
diferença (ou atualização) consiste na inserção da Arqueologia Cognitiva, compreendendo que o Ritual é 
praticado por algum grupo de pessoas que interpretam de maneira semelhante por estarem inseridas em um 
mesmo contexto cultural. 
21 
 
padrões característicos da prática arqueológica, interpretada por Anschuetz, Wilshusen e Scheick 
(2001), como tradicional11. 
 Tebas (em egípcio, Waset - wAst - ) fora uma cidade destaque no Egito Antigo tanto pela 
sua importância religiosa e administrativa quanto (e atrelado a isso) pela quantidade de achados 
arqueológicos. Essa cidade não era, de fato, a capital do Egito, mas representava, ao longo do 
Médio e do Reino Novo, um padrão de cidade que era seguido nas demais da antiga sociedade 
egípcia. Se pensarmos na cidade atual, Luxor, imaginamos que Tebas tinha toda uma estrutura 
voltada para os seus dois grandes templos (o de Luxor, ao sul, e o de Karnak, ao norte). Temos, 
portanto, na Figura 1.1 o mapa de Tebas, com esquemas determinando a circulação e as influências 
derivadas da localização desses dois templos com o resto da cidade. De fato, essa afirmação não 
está incorreta, mas devemos tentar reconstruir a cidade da época a partir dos vestígios 
arqueológicos para que possamos compreender todos os símbolos por trás dessas construções. 
 
 
11 A utilização da palavra “tradicional”, nesse caso, é em decorrência da pouca (ou precária) incorporação 
da Arqueologia da Paisagem pelos arqueólogos até o momento da publicação do artigo de Anschuetz, 
Wilshusen e Scheick, algo que eles discutem no texto. Após 2001, podemos perceber que essa área da 
Arqueologia fora amplamente trabalhada, tornando-se, cada vez mais, presente nos trabalhos arqueológicos. 
22 
 
Figura 1.1: Mapa simplificado de Tebas. 
Fonte: Adaptado de Pereyra et al (2018, p. 46). 
 
 
 Richard Bradley (1999, p. 33-34) argumenta que, embora os então chamados lugares 
naturais, como a montanha da margem ocidental de Tebas, não possam ser intitulados de 
“monumentos” porque não foram construídos pelo trabalho humano, eles ainda podem ter 
importância comparável na mente das pessoas. Para Bradley, a paisagem natural pode manter, ao 
longo do tempo, sua aparência, apesar de sua percepção e importância serem diferentes 
(BRADLEY, 1999). Isso entra em consonância com o que propõe Rapoport e Renfrew, 
identificando que a Paisagem resultante de toda interpretação e construção humana, que não se 
referem apenasà distribuição de artefatos e estruturas no espaço, ou ao uso de ambientes naturais, 
23 
 
mas também aludem a um processo de construção e reconstrução de significados, implica uma ação 
e reação do ambiente “natural”. Se observarmos na Figura 1.2, vemos uma fotografia recente que 
demonstra o contraste Nilo-margem ocidental-montanha na cidade de Tebas. Dessa forma, 
podemos nos questionar sobre a aplicação desses ideais para a margem ocidental de Tebas da XVIII 
Dinastia. 
 
Figura 1.2: Vista longitudinal da margem ocidental de Tebas (Nilo – área agrícola – montanhas). 
 
Fonte: Disponível em: https://www.researchgate.net/profile/David-
Ward/publication/50405292/figure/fig1/AS:277409002737664@1443150868259/The-Theban-
Mountain-seen-from-the-East-Bank-near-Luxor-The-pyramidal-shape-of-the-El.png. Acesso em: 
20 abr. 2021. 
 
 Liliana Manzi é uma das pesquisadoras que mais possui textos que abrangem essa 
perspectiva teórica da Paisagem na necrópole tebana e, por isso, basearemos o nosso trabalho no 
dela, especificando-o para a tumba de Nakht (TT 52). Uma das propostas aqui é que, a partir da 
Paisagem, podemos entender as expressões de poder tanto do Estado, com os Festivais, por 
exemplo, quanto da elite tebana, por reclamar o direito de uma vida póstuma (principalmente a 
24 
 
partir da XVIII Dinastia). Dessa forma, aproximamo-nos das ideias que defendem a existência de 
redes simbólicas entre as tumbas e os templos de Tebas. Conforme será melhor exposto adiante, 
nesses ideais, os nodos principais seriam templos reais, os secundários, as tumbas de particulares, 
e as vias processionais conectando-os. 
 A Necrópole tebana está dividida, comumente, em três partes: Vale das Rainhas, Vale dos 
Reis e Vale dos Nobres. Conforme vemos na Figura 1.3, este último possui oito sítios (Deir el-
Bahari, Deir el-Medina, Dra Abu el-Naga, el-Assasif, el-Khokha, Qurnet Mura’i, el-Qurna e el-
Tarif), os quais possuem diversas tumbas de particulares, que foram construídas em diferentes 
períodos históricos. No mapa a seguir podemos identificar esses setores da Necrópole tebana. 
 
Figura 1.3: Mapa da Necrópole tebana – Vale dos Nobres. 
Fonte: adaptado de Porter e Moss (1970, Pr. 1). 
 
25 
 
 De acordo com Manzi (2010), um espaço é composto em uma paisagem quando esta possui 
uma atividade contínua entre a geomorfologia e a cultura que vivenciam este espaço; essas 
atividades geram sedimentos, que destroem ou realizam câmbios contextuais. Dessa maneira, a 
soma dessas transformações define uma Paisagem Arqueológica, na qual a distribuição de itens 
não é uma reflexão fiel e precisa de tudo o que aconteceu, mas somente através de sua análise é 
que podemos conceder inteligibilidade temporal e espacial para que as mudanças possam ser 
observadas e explicadas, assim como a resistência de certas manifestações do comportamento 
humano (MANZI, 2010). 
 Desse modo, ao analisarmos a Necrópole tebana vemos que o conjunto de práticas 
mortuárias encontradas foram consideradas de natureza ritual (PEREYRA et al, 2017, p. 7). Todo 
o conjunto de achados arqueológicos nesse espaço favorecem a análise sobre a Paisagem funerária 
tebana. Esses rituais expressavam os usos sociais destinados à manutenção dos dispositivos que 
definiam as inclusões e exclusões hierárquicas, individuais ou parentais, dos membros da elite no 
acesso a diferentes segmentos do espaço, o que, no caso de Tebas, era da natureza. marcadamente 
cerimonial (PEREYRA et al, 2017, p. 8). Dessa forma, podemos entender que o ambiente 
(geomorfologia) e a sociedade (cultura) que vivenciava esse espaço fornecem sentido a este, 
gerando, assim, uma relação simbólica entre ambos, uma vez que todas as ações sociais consistem 
em práticas e representações, constituindo uma dimensão de sua materialidade que explica a 
formalização da primeira. 
 Uma paisagem cultural ou antrópica é definida através da estruturação dos vários elementos 
que os indivíduos manipulam e depositam ao longo do tempo em determinados setores. Isso inclui 
o substrato geológico e os recursos naturais que seus habitantes selecionam dentro de uma gama 
de elementos representados e com os quais estabelecem interações cujo status social, características 
e o poder sobre determinado recurso são mediadas pelas prerrogativas desses status e pelos papéis 
que indivíduos se exercitam dentro de uma população ou sociedade específica (PEREYRA et al, 
2017). Essa maneira de entender a Paisagem pode, por sua vez, adquirir outras denominações, 
dependendo de qual aspecto do comportamento humano é enfatizado. Assim, por exemplo, no caso 
da necrópole de Tebas, é possível falar de uma Paisagem ritual, sagrada, funerária ou mortuária. 
 Podemos separar em três momentos como iremos reconhecer a Paisagem funerária tebana 
a partir do que fora proposto por Pereyra (et al 2017, p. 29-30). Em um primeiro momento, devemos 
reconhecer que a Paisagem natural é pensada de maneira simbólica pelos próprios habitantes da 
26 
 
região de Tebas da XVIII Dinastia. Em um segundo momento, devemos elencar os critérios usados 
para dotar culturalmente a Paisagem, resultando em um espaço adequado para o desenvolvimento 
de práticas rituais de devoção e aprovação de deuses e personagens divinizados e de culto à 
memória dos mortos membros da elite, que serviram como âncoras evocativas das representações 
mentais na ausência de celebrações rituais e onde o papel dos atores sociais variaria, dependendo 
dos cargos dos indivíduos envolvidos. E, finalmente, em um terceiro momento, passaremos a 
reconhecer a natureza discursiva que instrui os participantes e outros observadores sobre a maneira 
esperada de usar a paisagem, através do reconhecimento das funções desempenhadas por cada obra 
arquitetônica e das trajetórias seguidas durante a circulação ritual pelos participantes nas 
procissões. 
 Como pode ser percebido ao longo da história do Egito Antigo, as intervenções realizadas 
pelos faraós, devido à modificação e/ou destruição intencional de certas características naturais ou 
arquitetônicas ou às novas associações que procuravam estabelecer entre elas, foram induzidas pelo 
uso contínuo da necrópole Tebana12. Podemos, portanto, entender o porquê de o comportamento 
humano ser considerado um importante papel como modelador de Paisagens, uma vez que alguns 
indivíduos, através da tomada de decisões e outros através da execução dessas diretrizes, atuam 
como agentes produtores, transformadores ou destruidores das características naturais da paisagem 
(PEREYRA et al, 2017). Nesta linha, é possível analisar a conformação da Paisagem funerária de 
Tebas a partir de uma perspectiva ocupacional, onde essa arquitetura funerária é responsável pela 
construção, remodelação ou usurpação e desmontagem de monumentos. Sendo assim, a partir de 
uma perspectiva mental, poderemos entender como as relações sociais concedem um significado 
simbólico a essa concessão, manutenção e reocupação das estruturas na margem ocidental tebana. 
 No entanto, Pereyra (et al, 2017) nos previne que não devemos aceitar que as escolhas feitas 
são sempre racionais e que foram avaliadas (ou pelo menos fornecidas) pelos atores sociais, que 
agem individualmente, quando se sabe que, como no caso de Tebas, as decisões foram gerenciadas 
a partir de um poder político altamente centralizado, para o qual eles representam basicamente os 
 
12 Essa questão é interessante, pois, se refletirmos que o ambiente e o humano estão em constante interação, 
podemos induzir que, as montanhas de Tebas, por exemplo, são locais que serviram como inspiração mística 
para dar origem à Senhora do Ocidente, um nome para Háthor, protetora dos mortos enterrados em Tebas. 
Esta, na iconografia das tumbas de particulares e do LDM (Capítulo 186), geralmente aparece como uma 
vaca saindo de uma montanha, em direção à tumba do morto, de modo a protegê-la (FAULKNER, 2015, 
Pr. 37-B). 
27níveis mais altos da sociedade. Desse modo, vale a pena ressaltar o que Renfrew nos informa sobre 
a questão da cognição humana e como trabalhá-la (RENFREW, 2012). Devemos, portanto, 
entender que esses indivíduos, que construíram esses monumentos na margem ocidental de Tebas, 
fazem parte de uma sociedade, a egípcia, que tem um padrão tanto comportamental quanto 
cognitivo, expressado pelos seus resquícios arqueológicos. 
 Se pensarmos na Paisagem funerária tebana, é possível enfatizar que, no contexto de um 
relevo com escassos contrastes, as características mais proeminentes na geomorfologia da área 
tebana são as colinas, que poderiam ter sido dotadas de associações ao mítico e, ao mesmo tempo, 
de modo a facilitar o contato visual com os templos funerários13 dos faraós, localizados na margem 
ocidental do Nilo, e os templos de Karnak e Luxor, na margem oriental, no âmbito da celebração 
de diferentes festividades e rituais. A distribuição de tumbas, por outro lado, poderia estar 
relacionada a estruturas consideradas “centrais” (os templos), a partir dos quais o processo de 
ocupação do espaço teria sido impulsionado, e, desse modo, estabeleceriam laços estreitos com e 
entre lugares que emanavam poder real (PEREYRA et al, 2017). Sendo assim, são considerados 
os eixos de circulação - estradas e vias processuais da necrópole - que teriam atuado como 
organizadores do espaço, canalizando e orientando a atenção dos participantes nas práticas rituais 
(PEREYRA et al, 2017, p. 30). Dessa forma, podemos entender tanto que a morte é uma das 
crenças centrais da antiga sociedade egípcia quanto que todos esses pontos são necessários para 
analisarmos a tumba de Nakht em um contexto mais amplo que ela por si só. 
 
2. VIAS PROCESSIONAIS E GRANDES MONUMENTOS 
 
 Conforme vimos até aqui, para construirmos a Paisagem funerária tebana precisamos 
entender suas características simbólicas, como foram desempenhadas (e facilitadas) as práticas 
rituais, e, então, reconhecer as funções das estruturas e como essas se comunicam. No mapa abaixo 
vemos Tebas com todas as suas estruturas. Entretanto, ao construir a Paisagem funerária tebana 
 
13 Em egípcio, Templo de Milhões de Anos, era o lugar onde os rituais eram realizados em favor dos antigos 
faraós e para assegurar a manutenção do governante contemporâneo durante a sua vida e depois da morte. 
Algumas vezes é referido como “templos funerários” entre os egiptólogos. 
28 
 
devemos ter em mente que vamos situar temporalmente na XVIII Dinastia, entre os reinados de 
Tutmés IV e Amenhotep III, os faraós contemporâneos a Nakht. 
 
Figura 1.4: Mapa da cidade de Tebas14. 
Fonte: Adaptado de Brancaglion Jr., 1999. 
 
14 Mapa disponível em tamanho maior no Anexo B (Cf. p. 344 desse volume). 
29 
 
 Os hicsos tomaram o Egito dos faraós tebanos, encerrando o período que chamamos de 
Reino Médio e iniciando o Segundo Período Intermediário. O poder do Egito só foi retomado pelos 
próprios egípcios a partir da XVII Dinastia, que fora composta por membros da elite tebana que se 
identificava com os reis do Reino Médio. Dessa forma, a cidade de Tebas possui uma história que 
nos remete a tempos anteriores ao Reino Novo. Entretanto, construções, como as tumbas de 
particulares, podem ser observadas em quantidade significativa a partir do Reino Novo, quando 
existe um processo chamado por alguns egiptólogos de ampliação dos rituais funerários. 
 Conforme Renfrew (2012), um humano interpreta determinado problema a partir de seu 
conhecimento de mundo e de sua projeção daquele evento, isso a partir do seu sistema cognitivo, 
que é construído pela sociedade em que está inserido. Sabemos, portanto, que uma sociedade 
complexa, como a do antigo Egito, possui diferentes tipos de status social e, assim, uma forma de 
conduta e moral oriunda dos mais altos níveis desse esquema. Essa relação, no Egito Antigo da 
XVIII Dinastia, pode ser observada a partir do poder que exercem os templos de Karnak e Luxor, 
guiados pelos seus sacerdotes. Para tanto, precisamos entender, mesmo que brevemente, como se 
organizava a sociedade egípcia a partir dessas estruturas de poder, os templos (priorizando o maior 
templo, o de Karnak)15. 
 Remetendo-nos a Berry Kemp (2018), que entende a sociedade egípcia a partir da 
Arqueologia Processual, teremos uma análise mais social e interpretaremos que os diferentes níveis 
de status social gera uma ideologia. Por sua vez, essa ideologia precisa de arquitetura para sua 
expressão mais completa (KEMP, 2018, p. 248). Sendo assim, este autor defende a ideia de que a 
arquitetura egípcia serviu para dominar as multidões16 e, portanto, manter e regular o sistema social 
do Egito Antigo. 
 Ao longo do Antigo e Médio Reino, de acordo com a documentação material que temos até 
os dias atuais, a arquitetura monumental na forma das pirâmides e seus templos foi mantida na 
periferia do mundo visível: à margem do deserto ocidental entre a entrada do Fayum e Abu Rawash, 
 
15 Veremos isso nas páginas seguintes e retomaremos mais adiante, para tentarmos construir uma identidade 
para Nakht, observando e comparando com as posições sociais dos demais membros da elite tebana de sua 
temporalidade. 
16 O autor entende que a sociedade egípcia não é estática e, portanto, ao fazer afirmativas como esta, ele 
situa o contexto histórico até o Reino Novo, uma vez que períodos posteriores realizam cada vez mais trocas 
culturais e estas modificam a estrutura dos templos, por exemplo (KEMP, 2018, p. 248). 
30 
 
ao norte de Gizé (KEMP, 2018, p. 248). Os templos locais ou santuários17, construídos em grande 
parte com tijolos de barro, foram dimensionados para se ajustarem às densas muralhas, construídas 
também com tijolos, das cidades e podiam ser quase invisíveis, como no caso do santuário Hekaib 
em Elefantina. Como instituição, o templo local era um complemento do cargo de chefe da 
comunidade local, de modo que o título de sacerdote principal (Primeiro Profeta de determinada 
divindade) era frequentemente mantido pelo “prefeito” local (KEMP, 2018, p. 248). No Reino 
Novo, a escala monumental e a preferência pela construção de pedra foram levadas para as cidades, 
o que modifica toda uma estrutura citadina, na qual o templo se torna o edifício central da cidade 
(ao menos em nosso caso, na cidade de Tebas). 
 Para um entendimento mais completo de como, ao longo do Reino Novo, a sociedade 
egípcia desenvolveu, a partir dos templos, um forte sistema religioso, dois fatores particulares 
precisam ser apontados de acordo com o que Kemp defende (2018, p. 248-256). O primeiro surgiu 
do dualismo estrutural da adoração no templo, acomodando um aspecto oculto e um revelado. No 
Reino Novo podemos perceber uma grande atenção voltada para este último, a “imagem religiosa 
portátil”, da qual os mais familiares eram os santuários alojados em barcas. Entretanto, esse tipo 
de santuário não fora desenvolvido neste período, tendo, portanto, desde cedo, um importante papel 
simbólico e ritual. Uma vez que, nesse período, identificamos uma ampliação dos ritos, é plausível 
que tais práticas que tornam públicas e, portanto, dignas de adoração, imagens dos deuses, são cada 
vez mais incentivadas, como a barca do deus Âmon de Karnak, chamada Userhat-Amun, “Poderoso 
da proa é Âmon” (KEMP, 2018, p. 248), a qual temos uma versão portátil menor feita nesse 
período. 
 Os locais de descanso para santuários em barcas, ou estações de passagem, têm um plano 
distinto: uma câmara oblonga com uma porta em cada extremidade e um pedestal quadrado central 
de pedra sobre o qual o santuário repousava (KEMP, 2018, p. 249), no quadrante oeste da Figura 
1.5. De acordo com Kemp, a maioria dos templos do Reino Novo foi construída em torno do 
santuário da barca sagrada, e os planos de seu interior e os layouts de seus arredores sagrados 
exteriores começaram com a intenção de levar a barca para demais localidades, fazendocom que 
 
17 Nesse caso, ainda não possuímos grandes estruturas das quais os egiptólogos costumam chamar de 
“templos monumentais”, e é possível que, no início, nem o templo de Karnak tenha sido um templo 
monumental, uma vez que fora aumentado (em construção) por diversos faraós ao longo do Reino Médio e 
Reino Novo. 
31 
 
os templos continuassem a conter imagens fixas de deuses (KEMP, 2018, p. 249). Sendo assim, a 
escala e o chamado “profissionalismo da religião” no templo do Reino Novo agora mantinham a 
população cada vez mais inserida e imersa nos rituais, substituindo parte do controle burocrático 
mais antigo por uma manipulação psicológica maior e mais evidente. Então, como as pessoas 
adoravam os festivais realizadas pelo Estado, seria correto utilizar a teoria de Renfrew sobre o 
sistema cognitivo ser moldado a partir de algo conhecido em conjunto. 
 Para o segundo fator de desenvolvimento desse forte sistema religioso, devemos 
compreender que não era toda a sociedade egípcia que tinha acesso aos templos. Quanto mais 
interna a estrutura, mais restrito era o espaço e, portanto, mais elitista. Sendo assim, ao pensarmos 
na arquitetura externa dos templos, de modo a entender como as elites olhavam para o mundo 
exterior, um mundo que, na maioria das vezes, fora impedido de passar pelas portas do templo, 
estamos trabalhando com uma dicotomia na sociedade egípcia: os que tentam formar um 
conhecimento e os que o interpreta e modifica de acordo com sua realidade. As paredes de pedra 
com cenas pintadas com cores fortes e brilhantes em fundos brancos deslumbrantes não se 
elevavam diretamente das ruas ou espaços públicos (KEMP, 2018, p. 250). De acordo com Kemp, 
existia, entre o templo e o mundo exterior, um recinto cheio de prédios de serviço de tijolos e, 
talvez, santuários menores, todos cercados por uma parede maciça de tijolos de barro18. Se nos 
remetermos à arquitetura do templo e às cenas que ali estão dispostas (pensando, principalmente, 
no templo de Karnak), vemos que o portal dianteiro do templo exibia em toda a parede cenas 
gigantes do rei derrotando seus inimigos na presença dos deuses, o que nos faz analisar que isso 
seria proposital de cada rei que a fez. Assim, o templo apresentou à sua comunidade duas faces 
contrastantes: uma de poder temporal, a outra, nos dias dos Festivais, de libertação através da 
celebração comunitária (KEMP, 2018, p. 252). 
 Na Figura 1.519, vemos a planta do templo de Karnak feita por Cabrol (2001, Pr. 2). O 
templo está dividido em quatro quadrantes, nomeados a partir de sua localização geográfica. O 
templo sofreu diversas mudanças ao longo da história do Egito, entretanto, a partir dos estudos 
arqueológicos, Cabrol (2001, Pr. 2) conseguiu planificar o templo de Karnak da XVIII Dinastia da 
 
18 É interessante pensar que as escavações ao redor dos templos detectaram que esses, em períodos 
posteriores ao Reino Novo, serviram como pequenas cidades, abrigando tanto a população local como, 
também, bens preciosos dos governantes, o que fazia desse espaço propício para invasões de exércitos em 
períodos de guerra (KEMP, 2018, p. 252). 
19 No Anexo C (Cf. p. 345 desse volume) nós conseguimos ver a imagem ampliada. 
32 
 
forma da imagem. Vemos, portanto, no eixo leste-oeste a maior edificação, o templo de Âmon, 
com um muro envolvendo-a e, também, aos templos e construções menores que o cerca (como o 
templo de Khonsu e o de Opet, mais ao sul, e o recinto da barca de Âmon, mais a oeste). No eixo 
norte-sul, temos, de certa forma, dois anexos, um com uma estrutura mais antiga (sul) que, na 
XVIII Dinastia, possuía uma função simbólica em festivais, e outro com uma capela central de 
Karnak (norte). Além dessas estruturas, podemos ver estradas conectando tanto os dois eixos 
quanto indicando o caminho ao Nilo (partindo do quadrante sul em direção a oeste) e ao templo de 
Luxor (ao sul). 
 
Figura 1.5: Templo de Karnak20. 
Fonte: Adaptado de Cabrol (2001, Pr. 2). 
 
 Pensando nesses dois fatores, mesmo que explorados aqui de maneira superficial, podemos 
seguir os ideais de Kemp de que o Egito era um estado sacerdotal, com uma estrutura social que 
podemos determinar. Dessa forma, devemos considerar que a religião não pode ser desvinculada 
 
20 Essa planta está disponível em tamanho maior no Anexo C (Cf. p. 345 desse volume). 
33 
 
das questões sociais, estando atrelada à política, economia e, portanto, à cultura egípcia. Entretanto, 
não iremos abordar com detalhes sobre a religião egípcia neste capítulo21. Nosso objetivo até então 
é entendermos como a ocupação do espaço tebano fora conduzido a partir desse laço construído 
entre os sacerdotes do deus Âmon e os governantes do Egito, indicando como a sociedade de Tebas 
vivenciava este espaço. 
 Os templos (principalmente o de Karnak na XVIII Dinastia) exerciam um controle em 
diversas áreas por possuir, justamente, riquezas. Já citamos esse controle desempenhado a partir 
das cerimônias e rituais religiosos, que envolviam grande parte da população local. Entretanto, 
podemos destacar outras áreas, como a agrícola, uma vez que esses templos possuíam grande parte 
das terras cultiváveis da época, que poderiam ou não ser próximas do templo. Como exemplo, 
podemos destacar a tumba de Nebamun (TT E2), que está, atualmente, em fragmentos no Museu 
Britânico, mas que pertencia a este Escriba e Contador de Grãos do deus Âmon, que viveu entre os 
períodos de Amenhotep III e Akhenaton (um pouco posterior a Nakht) e localizava-se, 
provavelmente, em Dra Abu el-Naga, Tebas (USICK; PARKINSON, 2008). 
 A partir de alguns fragmentos desta tumba, podemos perceber este servidor do templo de 
Âmon, que, supostamente, supervisionava as terras do deus, diante de uma riqueza exemplar 
(PARKINSON, 2009). A Figura 1.6, na qual Nebamun supervisiona as produções, apresenta tal 
fragmento. Nele, bois e gansos são contatos em abundância, indicando que, ou este servidor possuía 
grande poder, ou que o próprio templo possuía essa riqueza (ou as duas informações podem ser 
complementares). Seja como for, isso demonstra um poderio já bem estabelecido e concentrado 
nas mãos de sacerdotes do deus Âmon e, portanto, indicando claramente essas diferenças de status 
social e na forma de ocupação do espaço tebano próximo do final da XVIII Dinastia. 
 
 
 
 
 
21 Tal discussão será explicitada no Capítulo 2 desta dissertação, ao adentrarmos nos rituais desempenhados 
na tumba de Nakht, de modo a entendermos como podemos analisá-los a partir da arquitetura dessa tumba. 
34 
 
Figura 1.6: Nebamun vistoriando as produções das terras. 
Fonte: Museu Britânico (EA 37976, EA 37978, EA 37979) 
 
35 
 
 Entretanto, devemos ressaltar aqui que os estudos desta imagem não apresentam apenas 
essa interpretação. O fato de que ela estava disposta em uma tumba nos indica um vasto campo 
para pesquisa. Podemos, por exemplo, aplicar, mesmo que de uma maneira breve e sem detalhes, 
o que iremos discutir ao longo dos capítulos 3 e 4 desta dissertação. Uma vez inserido o contexto 
temporal do final do Reino Novo, e, portanto, pré-amarniano, analisamos, a partir dessa imagem, 
diferentes status sociais, o que representaria o que Nebamun (assim como a sociedade egípcia) 
pensava quando ela fora pintada. Como uma sociedade, de certa forma, reproduz algo que está 
difundido em sua visão de mundo, caso compararmos essa vistoria das produções com outras 
imagens e textos da época, encontraremos um padrão, o que reforça esse poderio dos sacerdotes 
do deus Âmon, ou daqueles que trabalharam em seu templo, nesse período. No entanto, essa 
imagem está inserida em um âmbito funerário, o que indica algo mais complexo que uma “simples” 
representação e questão de poder. Indica, portanto, que essa sociedade acreditava que sua função 
em vida teria uma continuidade no Além, algo que comprovaríamos a partir de estudos mais 
profundos das crenças egípciasacerca da vida póstuma. Sendo assim, essa imagem de Nebamun 
pode, sim, ser interpretada como uma demonstração do que os sacerdotes tinham e faziam em vida, 
mas, também, em como esse status poderia continuar no Além22. 
 Podemos perceber que a sociedade egípcia possui uma estrutura social que pode ser 
determinada a partir, também, dessa imagem. Nebamun viveu em um período próximo de 
Akhenaton23, e, ao menos nessa imagem, indica um certo poderio do templo ao qual serve, que ele 
próprio vistoria, o que nos auxilia na defesa do que Kemp propõe: os sacerdotes do deus Âmon 
possuem grande poder no Reino Novo. Tomando como base outros documentos da época (ou em 
períodos anteriores e posteriores, também) podemos pensar em uma certa estrutura social padrão 
para o Egito Antigo do Reino Novo24, na qual o faraó ocupa a mais alta posição, os sacerdotes logo 
abaixo, seguidos de artesãos, escribas e, por último, os camponeses. Essa estrutura, mesmo que 
incompleta, aponta-nos a complexidade que expomos anteriormente enquanto falávamos do 
 
22 Essas afirmações podem parecer um tanto imprecisas e preliminares. Porém, nos próximos capítulos, 
iremos abordar de maneira mais completa tais pontos de vistas, tendo como foco de análise a própria tumba 
de Nakht. 
23 Patricia Usick e Richard Parkinson (2008, p. 5) ainda supõem que ele teria vivido no período amarniano. 
24 A partir da tabela elaborada com as tumbas contemporâneas a de Nakht, essa estrutura é um tanto mais 
complexa, uma vez que cada cargo possui seus próprios subalternos e assim por diante, assim como 
diferentes tipos de sacerdotes e escribas. Além disso, existe, na sociedade egípcia, uma possibilidade de 
mudança de status social, o que complexifica ainda mais a análise. 
36 
 
simbolismo dos rituais desempenhados pelos templos. Tal complexidade pode ser evidenciada 
nessa ocupação do espaço tebano que aqui defendemos. 
 Quando analisamos, por exemplo, o Papiro Wilbour, da XX Dinastia, e percebemos a 
quantidade de funcionários dos templos nessa época, podemos interpretar que a elite está bem 
consolidada e possui suas crenças definidas25. Podemos ver, na Figura 1.7, as distribuições de terras 
do templo cedidas para determinados grupos de pessoas: os donos de estábulos são os que mais as 
utilizam, com 198 pessoas. soldados, com 153; senhoras, 131; sacerdotes, 112; pequenos 
agricultores, 109; e pastores, com 102. Por fim, os mercenários estrangeiros (68) e os escribas (30), 
são os que menos utilizam as terras dos templos, de acordo com esse Papiro. Isso nos auxilia a 
moldar esse poderio dos templos. Mas por que isso seria importante? 
 
Figura 1.7: Categorias de pessoas que utilizam as terras dos templos na XX Dinastia (a partir do 
Papiro Wilbour). 
Fonte: Adaptado de Kemp (2018, fig. 93). 
 
 
25 Embora seja um documento datado da XX Dinastia e, portanto, distante temporalmente de Nakht, 
defendemos a utilização desse papiro para este estudo pelo fato de ser um dos maiores exemplares que 
dispomos na Egiptologia para compreendermos a estrutura da sociedade egípcia. 
37 
 
 Uma das formas que podemos desenvolver essa estrutura social é a partir do entendimento 
egípcio sobre a morte, que indicava um rito de passagem para uma vida póstuma, no Além 
(ASSMANN, 2003a). Entretanto, essa vida no Além existia, no Reino Novo, para membros da elite 
que construíram suas tumbas e tiveram acesso aos rituais funerários. Sabemos que tais ideais 
podem ser expandidos, por exemplo, para os familiares deste morto e, provavelmente, para seus 
trabalhadores (por meio dos shabtis, por exemplo). É comum que uma tumba contenha imagens 
tanto do proprietário quanto de sua esposa no Além, mas existem tumbas que possuem subdivisões 
arquitetônicas que possibilitaram o enterramento não só do casal dono da tumba e de seus filhos 
como, também, a família (podendo se estender até para os pais do morto). 
 É, justamente, esse ponto que iremos desenvolver a partir de agora: a ocupação do espaço 
tebano por essa perspectiva funerária. Tumbas são necessárias e reivindicadas pelos membros da 
elite da XVIII Dinastia. Isso compõe e constrói a Paisagem funerária de Tebas. Se pensarmos 
apenas nas grandes construções, vemos na margem oriental os templos de Karnak e Luxor, 
enquanto na margem ocidental, os Templos de Milhões de Anos, as tumbas de particulares e as 
tumbas de reis e rainhas. 
 As construções dessas tumbas são feitas por decisões oficiais do Estado, representado pelo 
próprio faraó. Tais decisões são divididas pelos egiptólogos entre duas categorias, a saber: político-
administrativas e político-religiosas. Enquanto na primeira existe um processo de construção e 
reocupação dessas tumbas26, na segunda, isso está atrelado à arquitetura das tumbas (MANZI, 
2010). Essas práticas constroem a Paisagem funerária tebana, reforçando a ideia de que existe uma 
rede simbólica visual a partir disso. As celebrações na margem ocidental de Tebas, desempenhadas 
principalmente pelo templo de Karnak, servem para reforçar o controle da população e, também, 
do desenvolvimento do espaço, assim como exercer e manter o seu poder social, político e 
religioso. 
 
26 O processo de reocupação de monumentos no Egito Antigo é um tanto quanto complexo. Não está restrito 
às tumbas, o que significa que templos funerários de faraós também podem passar por esse processo. 
Entretanto, como nosso foco são as tumbas de particulares, deixaremos as demais discussões e daremos 
continuidade para a nossa. As tumbas são estruturas feitas para a eternidade; caso os rituais realizados em 
prol daquele morto que está na tumba deixem de ser feitos pelos seus familiares, que deveriam desempenhar 
essa função, o Estado pode conceder esta tumba para que outro morto (um secundário) possa usufruir dessa 
estrutura (MEKHITARIAN, 1985). 
38 
 
 Sendo assim, ao entendermos de forma breve alguns pontos centrais desse processo de 
ocupação, manutenção e vivência do espaço tebano, podemos resgatar as questões já lançadas ao 
longo da primeira parte deste capítulo e, finalmente, começar a desenvolvê-las nas próximas 
páginas. Como as estruturas na margem ocidental de Tebas, como os templos funerários, podem 
influenciar nas construções das tumbas de particulares? As tumbas estão organizadas de forma tão 
aleatória? Mas será que estão organizadas? Em que momento essas tumbas mantêm comunicação 
com essas outras estruturas? Para quê? O que a tumba de Nakht representa em toda essa conjuntura? 
Ela pode nos auxiliar a entender tudo isso? Como? 
 Os templos funerários reais possuem diversas funções e, portanto, uma complexidade 
própria que não nos cabe examinar os pormenores nesta dissertação. Entretanto, devemos 
compreender que estes eram feitos pelo e para o faraó, em prol de manter viva a memória de sua 
pessoa, de modo que esta mantenha uma vida no Além. Arthur Rodrigues Fabrício defende que 
este tipo de complexo de culto real era construído para que o faraó pudesse lutar contra o 
esquecimento, promover a manutenção da ordem e garanti-la por toda a eternidade (FABRÍCIO, 
2016, p. 279). Uma vez que nossa preocupação é demonstrar como a tumba de Nakht se insere na 
Paisagem tebana da XVIII Dinastia, e que estes tipos de templos são interpretados como pontos 
nodais de Tebas, devemos explanar sobre como eles estão configurados e organizados, de modo 
que, posteriormente, demonstremos suas conexões com as tumbas de particulares a partir das Vias 
Processionais. Podemos analisar na Figura 1.8, na página seguinte, os diferentes templos desse tipo 
construídos na margem ocidental de Tebas. Nessa imagem aparecem todos os templos que temos 
acesso atualmente, identificados pelo nome daquele faraó representado. Se olharmos com atenção, 
vemos que eles estão, de certa forma, alinhados. Esse alinhamento pode ser fruto da área agrícola 
do Reino Novo. Na imagem atual, vemos (a parte mais escura, à direita) que a área agrícola atualrespeita a suposta linha, uma vez que, com a construção da Barragem de Assuã, essa área ao longo 
do Nilo pode ser controlada artificialmente, o que percebemos na imagem, pois à esquerda dessa 
parte agrícola, temos uma parte mais clara, que seria o início do deserto, bem determinada. Quando 
formos analisar as tumbas tebanas que foram construídas no período de Nakht, apresentaremos um 
mapa com os templos que tinham sido construídos até esse período, de modo a elaborarmos a 
Paisagem funerária tebana (Figura 1.12). 
 
39 
 
Figura 1.8: Distribuição espacial dos templos funerários em Tebas. 
Fonte: Manzi, 2015, p. 198. 
40 
 
 Sabemos que o processo de ocupação e diferenciação da Paisagem tebana foi ativado a 
partir da seleção de locais para a colocação de monumentos reais, constituídos em residências de 
deuses e locais de celebração mítica e religiosa, atuando como centros organizadores do 
planejamento territorial e circulação humana e de mercadorias (MANZI, 2015). Sendo assim, e 
associando com o que sabemos das crenças egípcias, podemos defender que os túmulos eram locais 
de descanso dos mortos, locais onde as suas memórias eram honradas. 
 A construção de Templos de Milhões de Anos em Tebas começou com o de Nebhepetre 
Mentuhotep II, em Deir el-Bahari, datada do Reino Médio, com a XI Dinastia, em uma área nunca 
usada para a realização de cultos funerários (MANZI; PEREYRA, 2010). Na XII Dinastia, Senusret 
III colocou várias estátuas naquele templo funerário, o que poderia ser explicado no respeito que 
professava ao seu antecessor, cujo nome era composto pelo do deus Montu, uma divindade também 
venerada por ele e protetor da própria Tebas (STRUDWICK; STRUDWICK, 1999, p. 77). 
 Entretanto, conforme afirmamos anteriormente, a sociedade egípcia não era estática 
(KEMP, 2018). Dessa forma, os templos do Reino Novo estão relacionados à perpetuação do poder 
e da natureza do faraó como governante divino, atendendo a suas necessidades físicas e míticas 
(MANZI; PEREYRA, 2010), e podemos incorporar nessa interpretação a que Arthur R. Fabrício 
(2016) defende, de que esse poder seria perpetuado a partir da Memória Cultural egípcia. Sendo 
assim, entendemos que funções religiosas e econômicas foram desenvolvidas a partir deles 
(MANZI; PEREYRA, 2010). Mesmo que a renda que cada templo recebeu para sua construção 
tenha variado, podemos defender esse ponto de vista a partir das ofertas de alimentos para a 
divindade e ao faraó. 
 A partir da XVIII Dinastia os faraós começaram a separar o local de perpetuação de sua 
memória com o que seu corpo repousava. Enquanto temos tumbas de particulares nas quais são 
separadas em três estruturas (pátio, câmaras internas e câmara funerária), na qual cada parte possuía 
uma função específica27, os reis da XVIII Dinastia separaram o túmulo (recipientes de suas múmias 
e de outros elementos do rito fúnebre) dos templos mortuários. A. J. Spencer (1982) interpreta essa 
separação como uma forma de proteger e esconder seu corpo dos saques às tumbas que aconteciam 
na Antiguidade. Podemos compreender que poderia ter sido, também, por causa dos saques. 
 
27 Entraremos em mais detalhes no segundo capítulo, no qual analisaremos a tumba de Nakht a partir dessas 
diferentes estruturas. 
41 
 
Entretanto, uma ideia que entra em acordo com nossa abordagem teórica é a de que essa mudança 
pode ter sido ocasionada a partir das crenças egípcias e do simbolismo que as montanhas tebanas 
recebem (HARTWIG, 2004). Sendo assim, os faraós dividiram essas estruturas e deixaram seus 
complexos de cultos na margem ocidental tebana, para que fossem facilmente cultuados, e 
esconderam suas tumbas por trás (ou entre) das montanhas de Tebas, para que tivessem uma 
proteção natural e simbólica. 
 Barry Kemp entende que esses templos funerários reais eram, na realidade, templos 
dedicados a uma forma específica do deus Âmon, com quem o rei se fundiu tanto na morte, por 
meio da presença de suas imagens em seus próprios santuários, e em vida durante suas visitas ao 
templo (KEMP, 2018). Dessa forma, cada um desses templos era, na verdade, um templo de Âmon, 
no qual a forma de um rei em particular havia se estabelecido. Isso é muito aparente na arquitetura 
dos templos melhor preservados da XIX Dinastia, como os de Seth I e Ramessés II, e o de Ramessés 
III, da XX Dinastia. Esses templos reservavam as câmaras centrais traseiras, a parte mais sagrada 
do templo, para o culto a Âmon, não apenas em uma imagem permanente, mas, o mais importante, 
em um santuário de barco portátil mantido dentro de uma sala com pilares com pedestal central 
(KEMP, 2018, p. 252). 
 Para a XVIII Dinastia, apenas o templo de Hatshepsut preserva o suficiente de sua alvenaria 
e podemos reparar que, atrás do centro do terraço superior, um santuário talhado em rocha abrigava 
a imagem de Âmon. Um faraó que encomenda um determinado templo, naturalmente, tinha uma 
parte proeminente no culto do templo, na medida em que, a julgar pelos textos preservados em 
Medinet Habu, pensava-se que seu espírito se fundisse com o da forma local de Âmon (DODSON, 
2010, p. 822). Os templos funerários também atendiam a outros aspectos das crenças egípcias. O 
antigo culto solar recebeu cada vez mais espaço, conforme podemos constatar na arquitetura desses 
templos (e, também, em tumbas de particulares - a partir do pátio, como dissemos anteriormente). 
No templo de Deir el-Bahari, por exemplo, existia uma plataforma de pedra alcançada por degraus, 
na qual hinos solares eram declamados (KEMP, 2018, p. 273). 
 Vemos na Figura 1.9, na página seguinte, uma imagem longitudinal e planificada do templo 
de Khonsu (Karnak), para nos demonstrar como o plano básico dos templos era formado (seguindo 
uma ordem da esquerda para a direita da figura): a primeira estrutura era composta pelos portões, 
que representavam o nascer e o pôr do sol no horizonte montanhoso, em referência ao culto solar; 
em seguida, as salas com colunas, aludindo à vegetação que crescia quando as águas da enchente 
42 
 
recuavam; e, por fim, os santuários, que significavam a montanha original, em evocação do próprio 
ato da criação, e as paredes externas separavam a ordem alcançada nas águas do caos (JACOB; 
MANZI, 2013, p. 8). Sendo assim, sua arquitetura representava a conexão com a vida concedida 
por Rê, razão pela qual muitos templos estavam alinhados na direção Leste-Oeste, representando 
o caminho do sol ao longo do dia (STRUDWICK; STRUDWICK, 1999, p. 7). 
 
Figura 1.9: Plano de templo tripartido (Khonsu), Karnak. 
Fonte: Adaptado de Jacob e Manzi (2013). 
 
43 
 
 Podemos afirmar então que as estruturas de circulação e os templos eram elementos 
dinâmicos da Paisagem, permitindo a circulação e expressando o compromisso simbólico entre 
hierarquias dentro da elite tebana (PEREYRA; MANZI, 2014). Desse modo, podemos entender 
esses monumentos como um processo perceptivo, cognitivo e discursivo, uma vez que tais 
construções tinham o objetivo de durar para a eternidade (MANZI, 2010, p. 653-654). Sendo assim, 
é interessante a interpretação de que a visualização alcançada por esses templos na Paisagem de 
Tebas, dependendo do tamanho e dos personagens aos quais foram dedicados, levou-os a continuar 
ocupados (mesmo após a necrópole ter sido abandonada como local de sepultamento e culto), de 
modo que suas construções continuassem em uso, mas com funções e finalidades diferentes 
(NICORA; MANZI; YOMAHA, 2015, p. 1195). 
 Dessa forma, os complexos de cultos reais desempenhavam uma significativa função na 
margem ocidental de Tebas. Toda essa complexa simbologia refletia na escolha das construções 
das tumbas de particulares e, portanto, na construção da Paisagem funerária tebana da XVIII 
Dinastia, uma vez que ao longo deste capítulo estamos considerando todos os três tipos de 
estruturas: as tumbas de particulares, as Vias Processionais e os templos funerários.Se resgatarmos 
o que refletimos sobre Rapoport no início deste capítulo, entenderemos os monumentos egípcios 
como instrumentos simbólicos que representam a estrutura social egípcia nessa organização 
espacial (RAPOPORT, 1974). A partir disso, entenderemos que esses símbolos ditavam às pessoas 
seus comportamentos e o que se esperar da visão de mundo daquela cultura, assim como as suas 
hierarquias. Se analisarmos toda essa complexidade, extrairemos o que Renfrew chama de sistema 
cognitivo da sociedade egípcia, indicado por essa visão de mundo construída a partir dessa estrutura 
social, perceptível a partir dos monumentos. 
 Já temos uma ampla ideia desses monumentos tidos como nodais, de como estão 
organizados na Paisagem funerária tebana e de como eles, de certa forma, interagem 
simbolicamente com os templos de Karnak e Luxor. Entretanto, algo que geralmente é deixado de 
lado nas análises é do como a população local pode se locomover entre esses. As experiências 
desenvolvidas por um indivíduo, se pensarmos em teóricos como Yi-Fu Tuan, devem ser 
elucidadas ao se analisar determinado objeto de pesquisa. Para este autor, uma experiência é 
categorizada como um termo que abrange as diferentes maneiras por intermédio das quais um 
indivíduo conhece e constrói a realidade (TUAN, 2013, p. 17). Tal experiência é, portanto, 
constituída de sentimento e pensamento, relacionados à memória e à intuição deste indivíduo 
44 
 
(TUAN, 2013, p. 19). Não chegaremos ao indivíduo egípcio propriamente dito nesta dissertação; 
contudo, podemos adaptar essa ideia e trabalhar mais com o social, em consonância aos teóricos 
aqui utilizados. Sendo assim, os caminhos percorridos pelos indivíduos devem ser problematizados 
ao analisar as conexões simbólicas entre os templos funerários, os templos de Luxor e Karnak e as 
tumbas de particulares, dando ênfase para esta última categoria. 
 Um dos maiores trabalhos feitos entre os egiptólogos que trabalham com as Vias 
Processionais de Tebas é, certamente, o de Agnès Cabrol (2001). Em sua tese, ela divide os 
momentos de pesquisa em três a partir dos vestígios arqueológicos, a saber: os elementos que 
marcam o curso dos barcos de Procissão28, como o piso, as estátuas (incluindo as esfinges), a 
vegetação e as paredes adjacentes dos templos; as estruturas imobiliárias que pontuam as paradas 
do barco, como as “estações de descanso” e, também, outros edifícios com um destino mais 
específico; outros aspectos do funcionamento dos caminhos, entendendo como esses estão 
interligados a partir de um contexto (CABROL, 2001, p. 3). O estudo desses acontecimentos é 
seguido por um comentário geral, no qual são evocados os eventos cuja Via Processional é o 
contexto de atividades que se enquadram em três dimensões da sociedade egípcia: vida litúrgica, 
expressão do poder político e da realidade econômica e social (CABROL, 2001). Ao resgatarmos 
o que desenvolvemos sobre a Arqueologia da Paisagem, vemos que o trabalho Arqueológico de 
Cabrol nos indica a importância que essas Vias desempenhavam nesse período. Destacar esses três 
aspectos (litúrgico, político e econômico e social) nos demonstra a pluralidade de questões que 
podemos desenvolver aqui. 
 Pensando na temporalidade de Nakht, os reinados de Tutmés IV e Amenhotep III, esses 
dois faraós realizaram grandes construções. Devemos, portanto, entender como era Tebas durante 
esse período. Quais monumentos estavam erguidos? Como era a distribuição espacial deles? A 
partir do trabalho minucioso de Cabrol, podemos responder tais questionamentos. Na Figura 1.10, 
podemos perceber que muitos dos templos funerários apresentados na Figura 1.4 não estavam 
construídos ainda nesse período. O mapa de Cabrol obedece a uma orientação norte-sul, de modo 
que a margem oriental de Tebas está à direita e a ocidental à esquerda. Na direita vemos o templo 
de Karnak (o maior e mais ao norte) e o templo de Luxor (menor e ao sul), conectados por uma 
estrada (chamada Via Processional Karnak-Luxor). Na margem ocidental, vemos em destaque os 
 
28 As barcas sagradas que tratamos enquanto falávamos do templo de Karnak e de um de seus papeis na 
sociedade egípcia. 
45 
 
Templos de Milhões de Anos e a Via Processional de Deir el-Bahari (linha contínua em direção ao 
quarto templo se contarmos de da direita para a esquerda da margem ocidental), seguido da 
montanha de Tebas (depois dos templos). Essa imagem nos dá uma ideia de quais estruturas 
existiam no período de construção da TT 52 e quais as conexões simbólicas que seriam 
estabelecidas entre essas edificações. 
 
Figura 1.10: Tebas durante o reinado de Amenhotep III29. 
Fonte: Adaptado de Cabrol (2001, Pr. 5). 
 
 Sendo assim, como podemos interpretar essas edificações e conectá-las ao período de 
Nakht? Se pensarmos na estrutura social e em como uma memória passa por um processo de 
esquecimento, seguindo teóricos como Paul Ricœur (2018) e Michael Pollak (1989), entendemos 
 
29 Esse mapa está disponível no Anexo D (Cf. p. 346 desse volume), para melhor visualização. 
46 
 
que isso é lento e gradual. De acordo com Betsy Brian (2004), entre os faraós da XVIII Dinastia 
antes de Amenhotep III, podemos marcar como o início de uma estrutura social desse período o 
reinado de Hatshepsut (1473-1458 A.E.C.), de modo que possamos propor que, no período de 
Nakht, a memória de Hatshepsut ainda estava passando por um processo de esquecimento. Dessa 
forma, podemos construir uma rede simbólica de conexões entre os templos no período de 
Amenhotep III, utilizando os templos funerários de maior destaque para a época: Deir el-Bahari 
(Hatshepsut), Tutmés III, Amenhotep II e Tutmés IV. Uma vez que Amenhotep III ainda estaria 
vivo no período em que Nakht morrera, não inserimos o seu complexo de culto real, apenas o dos 
anteriores, mesmo que ele estivesse em construção e, provavelmente, fosse habitado. 
 Podemos ver em algumas tumbas, como a de Nebamun (c. 1350 A.E.C.), o nome 
“Hatshepsut” ser utilizado pelas pessoas da elite (nesse caso, a esposa de Nebamun possuía esse 
nome). Diante disso, podemos tirar duas possíveis considerações: a primeira é de que esse nome 
podia ser comum para o período; e a segunda é de que a rainha ainda possuía uma certa memória 
viva entre os membros da elite nesse período do final da XVIII Dinastia. Tais considerações podem 
não se anular, permitindo com que as duas sejam verdadeiras. Sendo assim, necessitamos entender 
como esses templos se conectavam. A partir da Figura 1.11, com as Vias Processionais escaneadas 
por Manzi e Pereyra, e do trabalho de Cabrol em identificar os tipos de solo das Vias (Tabela 1), o 
que possibilita interpretar a circulação e importância dessa Via, podemos desenvolver essa ideia 
aqui proposta. Se nos remetermos às Figuras 1.5 e 1.8, podemos encontrar cada um dos pontos 
destacados nas subdivisões da Tabela 1. 
 As Vias Processionais iniciam, geralmente, no templo de Âmon, em Karnak (na parte 
norte), dada a sua importância nesse período, que é dividido em partes, por causa de sua dimensão: 
Karnak-Norte, Karnak-Sul, Karnak-Leste e Karnak-Oeste As procissões geralmente saiam de 
algum ponto de Karnak (por exemplo, a Bela Festa do Vale, um festival que consistia na procissão 
da imagem de Âmon que saia do templo do deus Âmon, situado no eixo Leste-Oeste, e ia para o 
templo de Deir el-Bahari, onde encontrava a imagem da deusa Háthor) para a margem ocidental 
do Nilo (conforme a Figura 1.12 nos indicará), onde tomava outros rumos. Conforme podemos 
perceber na Figura 1.11, os dados obtidos por Manzi e Pereyra (2014) indicam uma pluralidade de 
rotas existentes na margem oeste de Tebas. Ao confrontarmos esse mapeamento com os dados dos 
solos de Cabrol (2001), entendemos que a questão do solo é importante para determinarmos o nível 
de utilização e, portanto, importância tal Via possuía. 
47 
 
 Sendo assim, as dez Vias analisadas porCabrol e dispostas aqui na Tabela 1 nos 
demonstram as importâncias que cada uma possuía. Karnak, conforme esboçamos acima, tratava 
de um templo onde diversos faraós desempenhavam construções ao longo de seus reinados e, 
portanto, sempre acrescentavam algo em sua estrutura. Amenhotep III fora um dos faraós que mais 
construiu em Tebas e apresenta um certo destaque na tabela de Cabrol. Das dez Vias, seis estão 
localizadas na margem oriental de Tebas, a saber: Karnak-Norte, Karnak-Oeste, Karnak-Luxor, 
Estrada de Carros, Estrada do X Portão e Estrada De Mut ao Nilo. As outras quatro Vias estão na 
margem ocidental, cada uma referente ao um templo: Via Qurna-Seth I – cuja estrutura do templo 
data da temporalidade de Seth I, na XIX Dinastia, mas com uma estrada anterior; Via Deir el-
Bahari, que passou por algumas mudanças de solo ao longo dos reinados desde a pavimentação de 
Hatshepsut; Via Ramesseum, cuja construção do templo data da XIX Dinastia, período dos 
Ramessidas; e, por fim, Via Medinet Habu, com a construção do templo datada no reinado de 
Ramessés III. Cada uma dessas Vias apresenta uma subdivisão, organizada de forma cronológica 
ou situacional. Por exemplo, na Via Processional de Karnak-Norte, podemos perceber, ao longo 
do reinado de Amenhotep III, que este iniciou processos de pavimentação em diversas etapas, que 
foram concluídos na XIX e XX Dinastia e mantidos nos períodos posteriores. Na Tabela 1 temos, 
então, as dez Vias Processuais mencionadas acima, com suas subdivisões (cronológica e 
situacional) e o tipo de solo que compõe a via (pavimentação, tijolos, de terra batida ou outro tipo, 
seguindo uma ordem do mais importante para o menos importante). Se a via fora pavimentada, 
indicaria que ela seria muito utilizada ou que possuía um alto valor simbólico. A via também podia 
apresentar dois ou mais tipos de solo (um sobre o outro ou em diferentes pontos da via), o que nos 
indica uma certa transição e consequente elevação da importância dela. 
 Uma observação que Cabrol nos atenta é que um templo funerário não é pressuposto para 
construção de uma Via Processional, mas que, na análise, quando confrontamos essas duas 
documentações, podemos entender melhor como essa Via era vivenciada (CABROL, 2001, p. 773). 
Sendo assim, ao atentarmos para a Figura 1.11, os caminhos percorridos por essa sociedade nos 
indicam uma crença e uma organização social da cidade de Tebas. Na Figura 1.11 vemos a margem 
ocidental de Tebas no sentido norte-sul (vertical). As linhas contínuas representam as vias 
identificadas por Pereyra e Manzi (2014, p. 251) e a parte mais escura representa a montanha (a 
mudança de relevo no mapa). Essa imagem pode ser comparada com a Figura 1.4, Figura 1.8 e 
Figura 1.10 para melhor interpretação das vias com as estruturas. As vias identificadas por Cabrol 
48 
 
(2001) como importantes e representadas por Pereyra e Manzi (2014) foram desenhadas por nós 
no mapa do Apêndice A, mostrando as estruturas da XVIII Dinastia na margem ocidental de Tebas. 
 
Tabela 1: Tipos de solos das Vias Processionais30. 
Via Processional 
Subdivisões 
(cronológica - 
situação) 
Pavimentação 
Solo de 
tijolos 
Solo de terra 
batida Outro 
Karnak-Norte 
Amenhotep III 
Primeiro estágio 
da rampa 
 
Amenhotep III 
Primeiro estágio 
do solo norte 
 
Amenhotep III 
Segundo estágio 
da rampa 
 
Amenhotep III 
Terceiro estágio 
da rampa 
 
Amenhotep III 
Terceiro estágio 
do solo norte 
 
Ramessida 
Taharqa 
Ptolomaico (?) 
Pátio da sbh.t 
Estrada não datada 
da esfinge 
Karnak-Oeste 
Solo e (Reino 
Novo?) 
Solo d’ (Reino 
Novo) 
Solo d'' (Reino 
Novo /Terceiro 
Período 
Intermediário) 
 
Solo d 
 
30 Todos os mapas das vias que aparecem em cada uma das subdivisões foram adaptados das Pranchas de 
Cabrol, cuja prancha referente ao período de Nakht está disponível no Anexo D (Cf. p. 346 desse volume). 
49 
 
Solo c 
(Ptolomaico) 
Solo b (Romano) 
Estrada de carros 
Estação do VII 
Portão 
Estação do VIII 
Portão 
Estação do X 
Portão 
Estrada do X 
Portão 
Entre o repositório 
da XVIII Dinastia 
e o X Portão 
 
Pátio da porta do 
santuário de Mut 
De Mut ao Nilo 
Karnak-Luxor 
Karnak-Luxor 
(Sul) 
Pátio do templo de 
Luxor 
Qurna-Seth I 
Deir el-Bahari 
Hatshepsut 
Tutmés III 
Montuhotep II 
Reino Médio 
Ramesseum 
Medinet Habu 
Do grande templo 
ao púlpito 
Fonte: Adaptado de Cabrol (2001, p. 157-158). 
50 
 
Figura 1.11: Vias Processionais na margem ocidental de Tebas. 
Fonte: Adaptado de Pereyra e Manzi (2014, p. 251). 
 
 Mesmo com todos esses dados, os fatores que poderiam ser levados em conta para 
estabelecer essa análise são bastante distorcidos de acordo com Cabrol (2001, p. 161), uma vez que 
a maioria dos pavimentos de Karnak constitui o último estado de um solo que foi refeito 
repetidamente e são desconhecidas as camadas subjacentes, exceto no caso de Karnak-Norte e 
Karnak-Oeste, cujas trilhas foram escavadas em profundidade (CABROL, 2001, p. 161). Os únicos 
fatos, no entanto, menos dedutíveis é que a maioria dos revestimentos de superfície branca remonta 
ao reinado de Amenhotep III - e ao Reino Novo - e que os pavimentos de arenito parecem constituir 
um revestimento de predileção no Período Tardio (525-332 A.E.C.) (CABROL, 2001, p. 161). 
 No entanto, Cabrol (2001, p. 161-162) analisa que, na Via Processional do templo de 
Montuhotep Nebhepetrê, a aparência pontual de tijolos estampados é única no contexto das estradas 
de Tebas, mas é uma peculiaridade das técnicas de construção, embora conhecidas no Reino Médio, 
ilustradas por vários paralelos, incluindo a pirâmide de Amenemhat III em Hawara ou a de Senusret 
III em Dashur. A autora, portanto, reconhece uma distinção de natureza técnica, assinaturas das 
51 
 
divisões dos espaços ou marcas de instalação dos tijolos em um determinado local, embora o 
reagrupamento das marcas não pareça obedecer a nenhuma regra lógica (CABROL, 2001, p. 162). 
 Em outro ponto, a Figura 1.11 nos demonstra diversas estradas que foram detectadas pelo 
Sistema de Informação Geográfica (SIG), examinado por Manzi e Pereyra. Tais estradas, 
aparentemente, estão concentradas, praticamente, entre o Ramesseum e Deir el-Bahari. Isso pode 
indicar, mesmo de forma não conclusiva, que as tumbas construídas entre esses dois grandes 
templos estão, de certo modo, mais visíveis do que outras construídas, por exemplo, em Dra Abu 
el-Naga e Qurnet-Murai (Figura 1.3). Entretanto, conforme já mencionamos, isso depende de uma 
variante muito complexa, como os rituais que são efetuados em cada período e os faraós da 
temporalidade estudada. Em nosso caso, Nakht, enterrado no sítio de Sheik el-Qurna, está inserido 
nesse contexto de tumbas entre o Ramesseum e Deir el-Bahari. Podemos, portanto, visualizar no 
mapa da Figura 1.10 e comparar os dados obtidos pelo SIG, de Manzi e Pereyra, com os 
arqueológicos, de Cabrol, para entendermos melhor esse contexto. 
 Diante isso, temos outro assunto ainda a tratar nesse tópico: os Festivais. Temos três tipos 
muito importantes, mas não únicos (lembrando que Tebas era uma cidade com um calendário 
festivo bem intenso), que acontecem no período de Nakht, a saber: o Festival Sed de Amenhotep 
III, o Festival Opet e a Bela Festa do Vale. Os sacerdotes do templo de Karnak influenciavam a 
sociedade egípcia de modo que as expressões religiosas podiam ser percebidas, também, nos 
resquícios materiais do Egito Antigo (ao menos entre os membros da elite). Dessa forma, o que se 
propõe aqui é que esses três festivais por serem desempenhados em Vias Processionais em Tebas, 
podem ter influenciado na escolha do local de construção da tumba dos membros da elite31. 
 O Festival Sed, é, na verdade, uma cerimônia, um rito de passagem, no qual o faraó celebra 
o seu trigésimo anocomo governante do Egito. Os Festivais Sed aparecem como rituais elaborados 
no templo e incluíam procissões, oferendas e atos religiosos, como o levantamento cerimonial de 
um pilar djed, um símbolo fálico que representa a força “potência e duração do governo do faraó” 
(BERMAN, 2004), mas que também simboliza a coluna vertebral do deus Osíris. Mesmo que não 
passem pela margem ocidental de Tebas nesse cerimonial, seus templos funerários podiam 
apresentar inscrições comemorando tal feito, além de ser algo que, supostamente, era recordado 
 
31 Observaremos ao longo da dissertação que uma crença egípcia é que, ao ter sua tumba visitada e os textos 
e imagens lidos, o morto recebe oferendas no Além. Sendo assim, a ideia de ter uma procissão passando em 
frente, com pessoas e o poder simbólico da divindade ali presente, à sua tumba é valorizada nessa sociedade. 
52 
 
entre os próprios egípcios, uma vez que trinta anos de reinado na antiguidade é um longuíssimo 
tempo, sendo improvável sua não divulgação. 
 No caso de Amenhotep III, este teve três Festivais Sed (aos trinta, trinta e quatro e trinta e 
sete anos de reinado). Todos foram celebrados no Palácio de Malqata, na margem ocidental de 
Tebas32, chamado de Per-Hay em seu período, ou “A casa do júbilo”, que incluía um templo de 
Âmon e um corredor especialmente construído para esse festival (BERMAN, 2004, p. 15-16). 
Dessa forma, é interessante o que Berman analisa sobre o impacto desse festival nesse período, 
afirmando que a produção artística disso fora estupenda (BERMAN, 2004, p. 18), o que nos auxilia 
na defesa de que, mesmo que Nakht não tenha sua tumba construída após tal festividade (e é capaz 
que não), outras tumbas foram, e o local de suas construções, se próximas do templo funerário de 
Amenhotep III, podem nos indicar uma proximidade da elite local com esse faraó e, portanto, com 
o Festival. 
 A procissão do Festival Opet, segundo festival da nossa lista, “levou o rei ao templo”, de 
acordo com Kemp (2018, p. 270-273), o que indica a necessidade de aproximação do rei com os 
sacerdotes de Âmon, por questões políticas, econômicas e religiosas. Sendo assim, o festival tinha 
início quando o faraó entrava no templo de Karnak e deixava a multidão do lado de fora. Ao entrar, 
os sacerdotes acompanhavam o governante até as câmaras internas do templo e, portanto, onde 
repousava a estátua do deus Âmon. Nesse recinto, rituais eram desempenhados e o rei e o deus 
eram associados, transformando-os em um só. Após esse momento, o faraó reaparece para a 
população e se mostra associado a Âmon. Kemp (2018, p. 270-273) afirma que seu reaparecimento 
em público ao ser transfigurado era o verdadeiro clímax, o momento de aplausos que implicava 
que o ritual funcionara e fora aceito de maneira positiva. 
 Após esse primeiro momento, havia uma procissão até o templo de Luxor para outra 
aparição e, em seguida, continuavam o festival na margem ocidental de Tebas, em Medinet Habu. 
O templo de Luxor era, nas palavras de seu construtor original (Amenhotep III), seu local de 
justificação, no qual ele é rejuvenescido; o palácio do qual ele parte com alegria no momento de 
sua aparição, suas transformações visíveis a todos (KEMP, 2018, p. 272). O templo de Luxor 
proporcionou ao rei o cenário essencial para a interação entre os aspectos ocultos e revelados (ou 
 
32 Este palácio pode ser observado na Figura 1.1 e 1.4, próximo a Medinet Habu, sendo a construção mais 
ao sul da margem ocidental no mapa. 
53 
 
privados e públicos, respectivamente) de uma divindade que outros templos faziam pelas imagens 
dos deuses (KEMP, 2018, p. 272). Dessa forma, esse festival anual centrava-se na presença do rei 
em pessoa. 
 É interessante pensar que, em meados da XVIII Dinastia, os reis não estavam mais residindo 
em Tebas. Eles viveram a maior parte do tempo no norte do Egito, principalmente nos palácios de 
Mênfis. A participação real todos os anos no Festival Opet, portanto, passou a envolver um 
progresso estatal rio acima, que espalhou ainda mais a aclamação pública e se tornou uma 
instituição em si (KEMP, 2018, p. 272). Podemos, portanto, supor que, com a mudança de Tutmés 
IV para Tebas durante o seu reinado, conferiu mais importância a este festival. Isso é importante 
para nós pois nos auxilia, justamente, a entender que o período vivenciado por Nakht é palco para 
diversas mudanças no Egito, que culminam no período amarniano. 
 Por fim, temos A Bela Festa do Vale. Em sua tese de doutorado, Antonio Brancaglion Jr. 
(1999), ao analisar certos elementos em cenas de banquetes presentes em tumbas de particulares 
do Reino Novo, descreve como seria o terceiro tipo de festival aqui referido. A Bela Festa do Vale 
era celebrada uma vez por ano, na primeira lua nova do segundo mês da estação Shemu (Smw), 
referente ao período em que o plantio já fora feito. A festa tinha início com uma oferenda ao deus 
Âmon no templo de Karnak. Em seguida, iniciava-se uma procissão que conduzia a imagem desse 
deus para as demais localidades de Tebas, transportando-a em sua barca, acompanhada pelo faraó 
e o sumo-sacerdote. A barca possuía um relicário para a estátua e, por sua vez, era posta em um 
barco cerimonial, que era guiado através do Nilo por um outro barco, este pertencente à família 
real. 
 Ao chegar à margem ocidental da cidade de Tebas, a imagem era carregada em procissão 
pelo sacerdote, seguidos pelo faraó, as cantoras de Âmon e as sacerdotisas de Háthor. A procissão 
seguia em direção à necrópole tebana, atravessando os campos agrícolas e parando em pequenos 
santuários, feitos de pedra, dispostos ao longo do caminho, além de visitar os templos de milhões 
de anos dos faraós e as capelas funerárias de particulares. Em cada uma dessas paradas, grupos de 
dançarinos e cantores apresentavam-se diante do deus. Quando a procissão chegava ao templo de 
Deir el-Bahari, ponto culminante da Bela Festa do Vale, a estátua do deus Âmon se encontrava 
com a da deusa Háthor. O festival só continuava no dia seguinte, quando a imagem do deus fazia 
o caminho inverso: de Deir el-Bahari para o templo de Karnak. 
54 
 
 Durante toda procissão em direção ao templo, os que acompanhavam o festival carregavam 
grandes buquês e alimentos, de forma a ofertar aos dois deuses e, também, aos mortos. Todo esse 
caminho possuía diversos pontos-chaves que, quando comparamos com o que conhecemos da 
cultura egípcia, entendemos o todo. A imagem do deus, ao atravessar, o rio Nilo da margem 
oriental, associada com a vida, para a ocidental, representando a morte, revitalizava esses espaços 
funerários. O encontro de Âmon com Háthor também não era aleatório. Háthor33 era uma divindade 
importante para a necrópole tebana. O encontro desses dois deuses reverberava em uma união dos 
vivos com os mortos. Sendo assim, A Bela Festa do Vale também indica a presença dos vivos 
perpetuando a memória dos mortos ao visitarem os seus templos funerários e capelas funerárias e 
ofertarem aos mortos. Os músicos e dançarinos nesse festival são cruciais para a procissão. Em 
todos esses momentos citados, eles cantavam e realizavam performances em prol dos deuses. 
Associada à deusa Háthor, a música servia, também, como revitalização. 
Na Figura 1.12 podemos observar essas procissões dos dois festivais aqui citados que 
envolviam alguma mudança de local; portanto, não estará presente o Festival Sed. Nesse mapa 
podemos notar o que falávamos sobre as Vias Processionais. Vale ressaltar que o Festival Opet 
modificou sua “forma de fazer” ao longo do Reino Novo. Em um primeiro momento, o percurso 
que levava ao templo de Luxor era feito por terra; posteriormente, o mesmo trajeto passou a ser 
feito pelo rio; e, em um terceiro período, a procissão era levada até o templo de Medinet Habu. 
Ramessés III, por exemplo, fez o festival durar setenta dias. Na imagem, vemos as linhas tracejadas 
com setas no final indicando os sentidosda A Bela Festa do Vale e do Festival Opet, ambos saindo 
de Karnak e culminando no templo de Deir el-Bahari e Medinet Habu, respectivamente. 
 
33 Háthor é, talvez, uma das deusas de maior abrangência de características no Egito Antigo. Na XVIII 
Dinastia, a deusa estava associada com o mito de criação, tendo o título de “mão de Âmon”, como aquela 
que estimulava este deus para o orgasmo, criando, assim, o mundo (MESKELL, 2005, p. 62). Háthor tornou-
se central para todos os aspectos das vidas das mulheres, personificando a sexualidade feminina e a 
maternidade, mesmo que estivesse associada também à sexualidade masculina (ROBINS, 1993). Contudo, 
não é apenas essa característica assumida por ela. A deusa aparece também como mãe ou esposa de Hórus 
(e, por isso, é associada como mãe ou esposa do rei), deusa do céu (nos Textos das Pirâmides - Fórmula 
546), esposa ou filha e “olho” de Rê, vaca celeste, deusa das terras estrangeiras, deusa do Ocidente (também 
chamada de Senhora do sicômoro na região de Mênfis) e, o motivo aqui explanado, a deusa da música, 
prazer e felicidade (Htp) (WILKINSON, 2017, p. 143). 
55 
 
Figura 1.12: Principais festivais e seus itinerários em Tebas. 
Fonte: Adaptado de Kemp (2018, Fig. 97). 
 
56 
 
 Podemos, portanto, concluir que as Vias Processionais e os Festivais auxiliam na 
construção da Paisagem tebana e nos possibilita melhor analisar as tumbas de particulares que a 
compõem, assim como os templos funerários e até os templos de Luxor e Karnak (como vimos 
agora como pontos centrais dos festivais). Dessa forma, o que nos resta nesse capítulo é 
entendermos como as tumbas do período de Nakht estão dispostas no espaço, algo que nos fará 
analisar a visibilidade de seu complexo funerário, assim como propor como a identidade de Nakht 
pode ser construída ao compararmos com as dos demais donos de tumbas. 
 
3. TUMBAS DE PARTICULARES 
 
 Até aqui, entendemos como a Arqueologia Cognitiva e a ideia de Paisagem podem nos 
ajudar, assim como discorremos sobre como os templos de Karnak e de Luxor, os templos 
funerários e as Vias Processionais funcionam e estruturam a sociedade egípcia. Agora, 
pretendemos analisar como a elite tebana concebia todo esse processo de poder. Sendo assim, a 
partir desse ponto, examinaremos com mais detalhes as tumbas do período de Nakht e, com isso, 
poderemos defender algumas considerações importantes, como, por exemplo, a identidade do dono 
da TT 52. Seria um escriba e astrônomo algo comum no Egito? Teria ele algum tipo de destaque 
social pelo seu status? O que pode indicar todo esse conjunto de dados que levantaremos ao longo 
desta terceira parte do capítulo? 
 De início, já podemos explicar o levantamento de dados que fizemos e organizamos em 
forma de tabela. A Tabela 2, nas páginas seguintes, apresenta as tumbas que, de acordo com o 
catálogo de Porter e Moss (1970), foram construídas durante ou entre os reinados de Tutmés IV e 
Amenhotep III. Sendo assim, possuímos algumas tumbas que estão situadas temporalmente em 
períodos posteriores, como a TT 383, de Merymosi (Amenhotep III - Amenhotep IV), ou de 
períodos anteriores, como a TT 176, de [Amen]userhet (Amenhotep II - Tutmés IV), ou até mesmo 
o caso da TT 78, de Horemheb, que atravessa um longo período de tempo (Tutmés III - Amenhotep 
III). 
57 
 
 Pensando em nosso foco neste capítulo, de indicar uma identidade para Nakht, baseando na 
comparação com as outras tumbas de sua temporalidade, a Tabela 2 foi organizada em sete 
categorias, a saber: 
 
1. Nome do dono; 
2. Cargo; 
3. Outras informações; 
4. Temporalidade; 
5. Sítio arqueológico no qual fora construída; 
6. Se a tumba fora reocupada; 
7. Em caso de tumba reocupadas, quem fizera e qual seu cargo. 
 
 Tais dados foram retirados dos catálogos de Porter e Moss (1970) e de Kento Zenihiro 
(2009) e da obra de Friederick Kampp (1996). Excluímos, propositalmente, tumbas que estão em 
fragmentos fora do Egito, como a de Nebamun, no Museu Britânico, e deixamos apenas as que 
estão no local de construção. Isso nos permite analisarmos dados mais precisos e interpretarmos 
melhor a sociedade egípcia, uma vez que, por exemplo, não há certeza nos dados da tumba de 
Nebamun, já que não houve uma grande preocupação em anotá-los e, se teve, foram perdidos nos 
diversos desvios das peças no percurso entre Tebas e o Museu Britânico (PARKINSON, 2009). As 
categorias sobre os cargos e outras informações são complementares e, para separarmos, 
levantamos o critério de importância do cargo, de quantas vezes ele aparece nos cones funerários 
ou nas tumbas34. 
 
 
34 Zenihiro (2009) cataloga uma série de cones funerários (objetos encontrados nas tumbas nos quais são 
dispostas frases para o morto – geralmente o cargo dele, mas também podem aparecer fórmulas de oferendas 
para o morto no Além), a partir dessa série podemos contabilizar quantas vezes apareceram os nomes dos 
cargos dos donos das tumbas aqui analisadas. Além disso, o catálogo de Porter e Moss (1970), mesmo que 
um tanto antigo, apresenta um cargo principal e, quando aparecem, os demais cargos, que estão dispostos 
nas cenas das tumbas ou em estatuárias encontradas. Em alguns casos (como o da TT 295), um cargo (o de 
escriba nesse caso) estava no cone funerário e não na parede da tumba. 
58 
 
Tabela 2: Tumbas de particulares de Tebas entre os reinados de Tutmés IV e Amenhotep III. 
Número da 
tumba 
Nome do 
dono 
Cargo 
Outras 
informa-
ções 
Tempo-
ralidade 
Sítio 
arqueo-
lógico 
Tumba 
reocupada 
Novo dono 
e cargo 
TT 8 Kha 
Chefe no 
Grande 
Palácio 
- 
Amenhotep 
II - 
Amenhotep 
III 
Deir el-
Medina 
Não - 
TT 38 
Djeserka-
reseneb 
Escriba 
Contador de 
grãos das 
terras das 
divinas 
oferendas de 
Âmon 
Tutmés IV 
Sheik el-
Qurna 
Não - 
TT 46 Raamosi Mordomo 
Supervisor 
dos celeiros 
do Alto e 
Baixo Egito 
Amenhotep 
III 
Sheik el-
Qurna 
Não - 
TT 47 Userhet 
Supervisor 
do Harém 
Real 
- 
Amenhotep 
III 
El-Khôkha Não - 
TT 48 
Amenem-
het, Surero 
Mordomo 
Chefe / 
Escriba real 
À frente do 
rei / 
Supervisor 
do gado de 
Âmon 
Amenhotep 
III 
El-Khôkha Não - 
TT 52 Nakht Escriba 
Astrônomo 
de Âmon 
Tutmés IV - 
Amenhotep 
III 
Sheik el-
Qurna 
Não - 
TT 54 Huy 
Escultor de 
Âmon 
- 
Tutmés IV - 
Amenhotep 
III 
Sheik el-
Qurna 
Não - 
TT 55 Raamosi Vizir 
Nobre 
hereditário / 
Compa-
nheiro único 
/ Prefeito / 
Principal 
dos grandes 
/ 
Governante 
da cidade 
Amenhotep 
IV 
Sheik el-
Qurna 
Não - 
TT 57 
Khaaemhet 
Mahu 
Escriba real 
Supervisor 
dos celeiros 
do Alto e 
Baixo Egito 
Amenhotep 
III 
Sheik el-
Qurna 
Não - 
59 
 
TT 58 ? ? - 
Amenhotep 
III 
Sheik el-
Qurna 
Sim 
Amenhotp: 
Superinten-
dente dos 
profetas de 
Âmon / 
Amene-
monet: 
escriba do 
templo de 
Ramsés - 
Amado 
como Âmon 
(XX 
Dinastia) 
TT 63 Sebkhotp 
Prefeito do 
Lago 
Meridional 
e do Lago 
Sobek 
- Tutmés IV 
Sheik el-
Qurna 
Não - 
TT 64 Hekerneheh Tutor real35 Filho do kap Tutmés IV 
Sheik el-
Qurna 
Não - 
TT 66 Hepu Vizir 
Governante 
da cidade 
Tutmés IV 
Sheik el-
Qurna 
Não - 
TT 69 Menna Escriba 
Escriba dos 
campos do 
Senhor das 
duas terras 
do Alto e 
Baixo Egito 
Tutmés IV 
Sheik el-
Qurna 
Não - 
TT 74 Thanuny 
Escriba do 
rei 
Escriba dos 
recrutas / 
Escriba da 
armada 
Tutmés IV 
Sheik el-
Qurna 
Não - 
TT 75 
Amenhotp-
si-se 
Segundo 
profeta de 
Âmon 
- Tutmés IV 
Sheik el-
Qurna 
Não - 
TT 76 Thenuna 
Portador de 
leques à 
direita do 
rei 
- Tutmés IV 
Sheik el-
Qurna 
Não - 
TT 77 Ptahemhet 
Chefe do 
berçário 
Supervisor 
de obras no 
Templo de 
Âmon / 
Supervisor 
dos campos 
de Âmon / 
Supervisor 
dos duplos 
celeiros no 
Tutmés IV 
Sheik el-
Qurna 
Sim 
Roy: 
superinten-
dente de 
escultores 
do Senhor 
das duas 
terras 
 
35 No catálogo de Porter e Moss (1970), esse cargo é traduzido para o inglês como “nurse”, que é traduzido 
para o português como “ama” entreos egiptólogos, um cargo importante na elite egípcia. No entanto, 
Zenihiro (2009) encontra um cone funerário que pertencia a essa tumba e traduziu como “tutor real”. 
Portanto, deixamos a tradução de Zenihiro, pelo fato da palavra “ama” ter o significado de “mulher que 
amamenta o filho de outra pessoa” e não possuir um substituto masculino que seja plausível para a 
temporalidade do Egito Antigo. 
60 
 
templo de 
Âmon / 
Supervisor 
dos 
agricultores 
arrendatá-
rios de 
Âmon 
TT 78 Haremhab 
Escriba do 
Rei 
Escriba 
professor 
Tutmés IV 
Sheik el-
Qurna 
Não - 
TT 89 Amenmosi 
Mordomo 
na cidade do 
sul 
- 
Amenhotep 
III 
Sheik el-
Qurna 
Não - 
TT 90 Nebamun 
Porta-
estandarte 
de (a barca 
sagrada 
chamada) 
‘Amado de 
Âmon’ 
Supervisor 
das terras do 
deserto ao 
oeste de 
Tebas 
Tutmés IV - 
Amenhotep 
III 
Sheik el-
Qurna 
Não - 
TT 91 ? 
Capitão das 
tropas […] 
Supervisor 
dos cavalos 
Tutmés IV - 
Amenhotep 
III 
Sheik el-
Qurna 
Não - 
TT 102 Imhotep Escriba real 
Chefe do 
berçário 
Amenhotep 
III 
Sheik el-
Qurna 
Não - 
TT 107 
Nefersekher
u 
Escriba real 
Mordomo 
dos bens de 
Amenhotep 
III ‘Rê é 
brilhante’ 
Amenhotep 
III 
Sheik el-
Qurna 
Não - 
TT 108 Nebseny 
Primeiro 
profeta de 
Onúris 
- Tutmés IV 
Sheik el-
Qurna 
Não - 
TT 116 ? 
Príncipe 
hereditário 
- 
Tutmés IV - 
Amenhotep 
III 
Sheik el-
Qurna 
Não - 
TT 118 Amenmosi 
Portador de 
leques à 
direita do 
rei 
- 
Amenhotep 
III 
Sheik el-
Qurna 
Não - 
TT 120 Anen, Mahu 
Segundo 
profeta de 
Âmon 
- 
Amenhotep 
III 
Sheik el-
Qurna 
Não - 
TT 139 Pairi 
Sacerdote 
Waab 
Primeiro 
Filho Real 
na frente de 
Amon / 
Supervisor 
de 
camponeses 
de Amon 
Amenhotep 
III 
Sheik el-
Qurna 
Não - 
TT 147 ? 
Chefe dos 
mestres de 
cerimônias 
(?) de Âmon 
- Tutmés IV 
Dra’ Abu 
el-Naga 
Não - 
61 
 
TT 151 Hety Escriba 
Contador de 
gado da 
esposa do 
deus de 
Âmon / 
Mordomo 
da esposa 
do deus 
Tutmés IV 
Dra’ Abu 
el-Naga 
Não - 
TT 161 Nakht 
Portador das 
ofertas 
florais de 
Âmon 
- 
Amenhotep 
III 
Dra’ Abu 
el-Naga 
Não - 
TT 165 
Nehe-
maaway 
Ourives 
Escultor de 
retratos 
Tutmés IV 
Dra’ Abu 
el-Naga 
Não - 
TT 175 ? ? - Tutmés IV El-Khôkha Não - 
TT 176 
[Amen]user
het 
Empregado 
limpo de 
mãos 
- 
Amenhotep 
II - Tutmés 
IV 
El-Khôkha Não - 
TT 181 
Nebamun / 
Ipuky 
Escultor 
principal do 
Senhor das 
Duas Terras 
/ Escultor 
do Senhor 
das Duas 
Terras 
- 
Amenhotep 
III - 
Amenhotep 
IV 
El-Khôkha Não - 
TT 192 
Kharuef, 
Senaaa 
Mordomo 
da Grande 
Esposa Real 
Tiye 
- 
Amenhotep 
III - 
Amenhotep 
IV 
‘Asâsif Não - 
TT 201 Rēa Primeiro 
arauto real 
- 
Tutmés IV - 
Amenhotep 
III 
El-Khôkha Não - 
TT 226 ? Escriba real 
Supervisor 
das amas 
reais 
Amenhotep 
III 
Sheik el-
Qurna 
Não - 
TT 239 Penhet 
Governador 
de todas as 
Terras do 
Norte 
- Tutmés IV 
Dra’ Abu 
el-Naga 
Não - 
TT 249 Neferronpet 
Fornecedor 
(?) de vinho 
de tâmara 
- Tutmés IV 
Sheik el-
Qurna 
Não - 
TT 253 Khnemmosi Escriba 
Contador de 
grãos (a) 
das terras de 
Âmon, (b) 
nas terras 
das divinas 
oferendas 
Amenhotep 
III 
El-Khôkha Não - 
62 
 
TT 257 Neferhotep Escriba 
Contador de 
grãos de 
Âmon 
Tutmés IV - 
Amenhotep 
III 
El-Khôkha Sim 
Mahu: 
Deputado na 
mansão de 
Usimare-
setempenre 
(Ramesseu
m) 
TT 258 Menkheper 
Chefe do 
berçário 
Escriba real 
da casa das 
crianças 
reais 
Tutmés IV El-Khôkha Não - 
TT 276 
Amenemop
et 
Supervisor 
do tesouro 
de ouro e 
prata 
Juiz / 
Superinten-
dente do 
gabinete 
Tutmés IV 
Qurnet 
Mura’i Não - 
TT 294 Amenhotep 
Supervisor 
do celeiro 
de Âmon 
- 
Amenhotep 
III 
El-Khôkha Sim 
Roma: 
Sacerdote 
waab de 
Âmon 
(início do 
Ramessida) 
TT 295 
Dhutmosi, 
Paroy 
Sacerdote 
sem na Boa 
Casa 
Embalsa-
mador / 
Cabeça dos 
segredos no 
peito de 
Anubis / 
Escriba 
Tutmés IV - 
Amenhotep 
III 
El-Khôkha Não - 
TT 333 ? ? - 
Amenhotep 
III 
Dra’ Abu 
el-Naga 
Não - 
TT 334 ? 
Chefe de 
lavradores 
- 
Amenhotep 
III 
Dra’ Abu 
el-Naga 
Não - 
TT 383 Merymosi 
Vice-rei de 
Kush 
Filho de 
Amenhotep 
III 
Amenhotep 
III - 
Amenhotep 
IV 
Qurnet 
Mura’i Não - 
TT 402 ? ? - Tutmés IV 
Dra’ Abu 
el-Naga 
Não - 
A. 24 Simut 
Segundo 
profeta de 
Âmon 
Supervisor 
do tesouro 
de ouro e 
prata/Sela-
dor de todos 
os contratos 
em Karnak 
Amenhotep 
III 
Dra’ Abu 
el-Naga 
Não - 
C. 1 Amenhotep 
Supervisor 
de 
carpinteiros 
de Âmon 
Camareiro 
Amenhotep 
III 
Sheik el-
Qurna 
Não - 
C. 6 Ipy 
Supervisor 
de barcos de 
Âmon no 
Templo de 
Tutmés IV 
- Tutmés IV 
Sheik el-
Qurna 
Não - 
63 
 
Fonte: dados obtidos a partir dos catálogos de Porter e Moss (1970), Kampp (1996) e Zenihiro 
(2009). 
 
 Temos, ao todo, cinquenta e quatro tumbas construídas entre os reinados de Tutmés IV e 
Amenhotep III. Como já havíamos comentado, Renfrew (2012, p. 139-141) entende que uma 
sociedade apresenta um modo de pensar semelhante, que pode ser rastreado a partir dos vestígios 
materiais dessa sociedade. No caso da egípcia, esta possuía uma estreita relação com a religião. A 
religião egípcia, por sua vez, apresenta uma série de crenças funerárias analisadas pelos egiptólogos 
atuais a partir das visões de mundos encontradas nos textos, imagens, arquiteturas, próprias para 
este meio e que desempenham um importante papel na manutenção desta religião. Como uma das 
ideias centrais dessas crenças era, justamente, construir um local para que o seu corpo pudesse 
repousar para toda a eternidade, fazendo com que a pessoa continuasse a viver em um mundo 
póstumo, os egípcios, ao longo de seus anos, aperfeiçoaram essa crença, construindo tumbas, 
embalsamando seus mortos com técnicas que favorecessem a conservação do corpo, e, também, 
visitando as tumbas de seus familiares, de modo que esses permanecessem vivos no Além. 
 Dessa forma, separamos essa terceira parte em três momentos. O primeiro irá explorar os 
dados das categorias da tabela, enquanto o segundo interpretará tais resultados e tentará construir 
as hierarquias desses membros da elite que foram enterrados nesse período. Por fim, o terceiro 
momento irá fechar o capítulo com as considerações construídas sobre as tumbas de particulares 
na Paisagem tebana da XVIII Dinastia e indicará nosso caminho para o resto da dissertação. 
A relação da sociedade egípcia com a religião pode ser percebida a partir dos dados que 
levantamos. Nossa preocupação com as tumbas reocupadas e, caso tenham sido, quem as reocupou, 
indica o que Mekhitarian (1985, p. 240-241) defende ao interpretar que essas tumbas podem passar 
por esse processo caso os rituais realizados em prol daquele morto que está na tumba deixem de 
ser feitos pelos seus familiares (por casos como, por exemplo, desaparecimento da linhagem, 
mudanças de local ou perda de nível do status social - algo mais complexo), que deveriam 
desempenhar essa função36. Sendo assim, descobrimos apenas quatro tumbas reocupadas do total 
 
36 Caso retornássemos ao conto que abrimos nossa Introdução, podemos interpretar que esse processo 
poderia ser algo negativo para o morto e, conforme testemunhamos em nosso levantamento de dados, era 
algo que podia ser considerado “raro” (7,4% da nossa amostragem), mas possível. 
64 
 
de cinquenta e quatro tumbas. Dessas quatro, três datam do período ramessida e apenas uma data 
de Tutmés IV. Esta última, a TT 77, entra nesse levantamento de dados justamente por esse 
processo de reocupação. 
 Quanto à escolha do local de sepultamento, algo que desenvolvemos desde o início deste 
capítulo, temos múltiplos focos, mas que se concentram no sítio arqueológico de Sheik el-Qurna, 
onde se encontra a tumba de Nakht. No Gráfico 1 podemos entender melhor como essas tumbas 
estavam distribuídas na necrópole tebana e, no Gráfico 2, a porcentagem desses valores obtidos no 
primeiro. Isso nos indica uma preferência pelo sítio arqueológicode Sheik el-Qurna nessa época. 
 
Gráfico 1: Quantidade de tumbas construídas durante os reinados de Tutmés IV e Amenhotep III 
em cada um dos sítios arqueológicos da necrópole tebana. 
Fonte: dados obtidos a partir da Tabela 2. 
 
1 1 
8 
11 
2 
29 
0
54
‘A
sâ
sif
D
ei
r 
el
-M
ed
in
a
D
ra
’ A
bu
 e
l-
N
ag
a
E
l-
K
hô
kh
a
Q
ur
ne
t M
ur
a’
i
Sh
ei
k 
el
-Q
ur
naQ
ua
nt
id
ad
e 
de
 tu
m
ba
s 
co
ns
tr
uí
da
s
65 
 
Gráfico 2: Porcentagem de tumbas construídas durante os reinados de Tutmés IV e Amenhotep III 
em cada um dos sítios arqueológicos da necrópole tebana. 
Fonte: dados obtidos a partir da Tabela 2. 
 
 Mas será que essa preferência pelo sítio arqueológico de Sheik el-Qurna nos indica, de fato, 
algum dado importante? Se analisarmos novamente todos os mapas trabalhados ao longo desse 
capítulo, sobrepuséssemos, refinarmos e excluirmos as construções que são posteriores ao período 
que estudamos, encontraremos algo como o mapa da Figura 1.13. Em tal mapa constam as tumbas 
de particulares, posicionadas de acordo com os mapas do catálogo de Porter e Moss (1970). O que 
podemos interpretar disso tudo é que a escolha do sítio arqueológico de Sheik el-Qurna não é 
aleatória. Podemos destacar dois fatores para isso. Na XVIII Dinastia, A Bela Festa do Vale 
passava por uma Via Processional próxima desse sítio, o que indicaria que o morto e sua tumba 
estariam sendo visitados e rememorados (a de Nakht está destacada em azul). O segundo é que dois 
dos templos mais importantes, Deir el-Bahari (marcado em vermelho) e o de Tutmés IV (circulado 
em verde), estão ligados por uma Via Processional que passa dentro desse sítio. 
 
2%
2%
15%
21%
4%
56%
‘Asâsif Deir el-Medina Dra’ Abu el-Naga El-Khôkha Qurnet Mura’i Sheik el-Qurna
66 
 
Figura 1.13: Mapa da Paisagem da margem ocidental tebana da XVIII Dinastia37. 
Fonte: Mapa construído por Pedro Hugo Canto Núñez (2020) a partir dos dados de Porter e Moss 
(1970), Pereyra e Manzi (2014, p. 251), Manzi (2015), Strudwick e Strudwick (1999), Pereyra et 
al (2017) e Kampp (1996). 
 
 Quanto à temporalidade, temos oito categorias diferentes para quantificar em um gráfico 
(Gráfico 3), baseadas em períodos que as tumbas foram construídas, com a intercalação do reinado 
de Tutmés IV e Amenhotep III. Existe, entretanto, uma exceção que é a tumba de Raamosi (TT 
55), datada do início do reinado de Amenhotep IV. Fizemos essa escolha pois, se analisarmos essa 
tumba, veremos que este vizir de Tebas possui uma tumba de grandes dimensões, com catorze 
paredes pintadas e trinta e dois pilares, além de possuir a TT 331 anexada em sua estrutura, uma 
tumba pertencente ao período ramessida. Tudo isso indica que Raamosi possuía um destaque social 
(tanto pelo cargo quanto pela estrutura da tumba). O interessante é que este indivíduo passara 
grande parte da sua vida durante o Egito do reinado de Amenhotep III, sendo assim, apresenta a 
 
37 Esse mapa está disponível nos Apêndice A, para melhor visualização. 
67 
 
visão de mundo construída em comum desta temporalidade. O local que sua tumba está situada é, 
justamente, Sheik el-Qurna. Pode parecer um pouco inconclusivo neste momento da dissertação, 
entretanto, podemos notar um certo destaque social nesta tumba e deste sítio nesse período de 
Tutmés IV e Amenhotep III. 
 
Gráfico 3: Tumbas tebanas construídas entre os reinados de Tutmés III e Amenhotep IV. 
Fonte: dados obtidos a partir da Tabela 2. 
 
 Se filtrarmos nossos dados para apenas as tumbas construídas no sítio de Sheik el-Qurna, 
veremos que dessas, doze foram construídas no período de Tutmés IV, dez no período de 
Amenhotep III e a de Raamosi no de Amenhotep IV. Isso corrobora com nossas ideias de que as 
tumbas construídas nesse sítio ao longo dessa temporalidade possuíam um certo destaque social. 
Conforme veremos no próximo subtópico deste capítulo, os diferentes status sociais dos donos das 
tumbas, quando comparados com o tamanho de suas tumbas e as cenas destas, podem nos ajudar a 
defender essa ideia. 
 Por enquanto, atentando-nos aos gráficos produzidos até agora, podemos definir que Deir 
el-Medina e Qurnet Mura’i, assim como ‘Asâsîf, não são locais destacados por suas construções, 
se pensarmos em números de tumbas. A maioria delas possui um tipo de construção padrão desse 
1
1
1
21
7
17
3
1
0 54
Tutmés III - Amenhotep III
Amenhotep II - Tutmés IV
Amenhotep II - Amenhotep III
Tutmés IV
Tutmés IV - Amenhotep III
Amenhotep III
Amenhotep III - Amenhotep IV
Amenhotep IV
Quantidade de tumbas construídas
68 
 
período38, contudo, estas possuem, também, imagens que poderíamos utilizar para extrair o sistema 
cognitivo dessa sociedade, algo que trataremos nos capítulos 3 e 4. 
 Algo que destacaríamos aqui é a tumba de ‘Asâsîf. A TT 192 não parece ser algo comum 
para esse período. Se analisarmos a Figura 1.14, veremos a planta da tumba (desenhada por 
Kampp), que pertence a um complexo funerário que abriga outras tumbas. De baixo para cima na 
imagem, a tumba apresenta um vestíbulo, um pórtico, um pátio, duas salas com colunas (o primeiro 
com colunas circulares e o segundo com colunas quadradas), na primeira sala há a entrada da 
câmara funerária e, no fim da segunda sala, uma capela funerária; quase todos os recintos são 
decorados. Kharuef (também chamado de Sena’a), proprietário deste complexo funerário, era 
mordomo da esposa real, Tiye, um cargo que não parece comum e que o liga diretamente com a 
família real. Não podemos assumir isso com base nessa pouca documentação que dispomos, mas 
podemos supor que ‘Asâsîf não seria um local para indivíduos com baixo status social. 
 
 
 
 
 
 
 
 
38 Os tipos arquitetônicos das tumbas dessa temporalidade será trabalhado com mais detalhes no segundo 
capítulo. 
69 
 
Figura 1.14: Planta da TT 192. 
Fonte: Adaptado de Kampp (1996, p. 481). 
70 
 
 As tumbas de Qurnet Mura’i merecem outro destaque aqui. Uma delas, a TT 276, pertence 
ao supervisor do tesouro de ouro e prata, juiz e supervisor do gabinete (?), Amenemopet, o qual, 
baseado em seus cargos, indicam um status elevado, mais próximos da família real. E a outra, TT 
383, pertence a Merymosi, filho de Amenhotep III e vice-rei de Kush. Portanto, podemos supor 
que esse sítio, assim como ‘Asâsîf, não possui destaque quanto às construções de tumbas por se 
tratar de locais mais exclusivos, por assim dizer. A TT 8, de Kha, a única de Deir el-Medina nessa 
temporalidade, é uma tumba de pequenas proporções, com apenas três paredes decoradas. Seu 
cargo, no entanto, fora de chefe no grande palácio. Não sabemos o porquê de sua tumba ter 
pequenas proporções ou de ter sido enterrada neste sítio em especial, uma vez que não está próximo 
de nenhuma Via Processional ou templo importante. Não podemos, portanto, concluir nada no 
momento por falta de documentação. 
 Por último, comentaremos sobre os sítios de Dra Abu el-Naga, el-Khokha e Sheik el-Qurna. 
As oito tumbas de Dra Abu el-Naga não parecem ter destaque, a não ser pela quantidade de 
construções desse tipo nesse local. Não há, nesse período, algum templo construído que possa 
indicar algo. A Via Processional principal é a que está por trás desse sítio, que leva a procissão de 
enterramento do faraó ao Vale dos Reis. Talvez essa seja a suposta justificativa, mesmo que esse 
caminho esteja em outro nível. Também poderíamos supor algum destaque a partir da proximidade 
do rio Nilo, mas nada conclusivo no momento. 
 Os sítios de el-Khokha e Sheik el-Qurna parecem ser os mais fáceis de analisar. Ambos 
estão próximos e no meio de templos funerários importantes, como os de Amenhotep III, Tutmés 
IV e Deir el-Bahari. Ambos possuem diversas tumbas construídas nesse período. Ambos estão 
cortados por Vias Processionais importantes. Portanto, defendemos aqui que, devido a estes dados, 
ambos os sítios indicam, sim, um destaque do statussocial dos proprietários das tumbas ali 
construídas. Nakht possui sua tumba em Sheik el-Qurna e, assim, estaria dentro dessa elite. No 
entanto, podemos adentrar ainda mais nessas informações e tentar estabelecer algum padrão nisso, 
tendo em vista nossa coluna ainda não explorada (propositalmente) da Tabela 2: os cargos e 
“subcargos” de cada proprietário das tumbas dessa temporalidade. 
 Ao analisarmos a organização dessas tumbas de particulares no espaço, levantamos diversas 
hipóteses sobre as intenções desta escolha. Seja por proximidade com os templos funerários, seja 
por status social mais elevado que os demais, esses membros da elite demonstram que o sistema 
cognitivo egípcio desse período é complexo. Podemos, portanto, iniciar nossa trajetória para 
71 
 
entender essa complexidade a partir desse entendimento dos diferentes status sociais e, também, 
propor uma organização para a elite tebana dessa temporalidade da XVIII Dinastia. 
 No momento em que comentamos neste capítulo sobre as terras que os templos sedem para 
parte da população e, portanto, exerce poder sobre estes, expusemos uma pequena hierarquia que 
existia no Egito Antigo no período do Papiro Wilbour (XX Dinastia)39, na qual os sacerdotes dos 
templos, teoricamente, estavam no topo e os demais (donos de estábulos, senhoras, soldados, 
pequenos agricultores, pastores, mercenários estrangeiros, escribas) abaixo. Pode ser que essa 
cadeia hierárquica não seja bem definida no sentido de que escribas tenham menos poder que, por 
exemplo, donos de estábulos, por utilizarem menos terras que estes. Pelo contrário: o fato de os 
escribas possuírem menos necessidade de utilizar a terra que os donos de estábulos, uma vez que 
estes possuem, teoricamente, animais para pastarem, mas, mesmo assim, utilizam terras, pode 
indicar um certo destaque social. 
 A egiptóloga Elizabeth Frood (2010, p. 476) explica que as sociedades complexas, como a 
egípcia, são articuladas por relações de poder e é crucial estudar como essas relações são criadas, 
mantidas, projetadas, legitimidades e reforçadas. No momento, tratamos do poder que os templos 
e seus funcionários exercem perante a população e, agora, tentaremos examinar como a hierarquia 
e destaque social determinam o acesso ao Além, tendo como base os cargos de cada morto nas 
tumbas de particulares, elencado na Tabela 2. 
 John Baines (1990) defende que, para a sociedade egípcia, o poder não é apenas um 
significado de bem-estar, mas, sim, um estado privilegiado que concede acesso a conhecimentos 
restritos, como o literário, e controle de símbolos e formas estéticas. Dessa forma, podemos, a partir 
desses cargos, entender que a tumba de um escriba do templo é diferente de um escriba real, e que 
um profeta do deus Âmon poderia ter um poder diferenciado de um simples sacerdote. Ou, para o 
nosso propósito, o que Nakht, um escriba e astrônomo do deus Âmon, representava no meio disso 
tudo. Só o fato de possuir uma tumba na necrópole tebana já nos indica um alto nível de status 
social, mas será que podemos entender ainda mais essa complexa hierarquia? 
 Entre as cinquenta e quatro tumbas que elencamos na Tabela 2, referentes ao reinado de 
Tutmés IV e Amenhotep III, quatro não possuem títulos visíveis (duas de Dra’ Abu el-Naga, uma 
de Sheik el-Qurna e outra de El-Khôkha), de modo que não podemos indicar uma hierarquia 
 
39 Cf. p. 36 deste volume da dissertação. 
72 
 
baseada no cargo desses mortos. As cinquenta outras tumbas podem ser transpostas em números, 
indicando dois grupos: um daqueles que possuem um segundo (ou mais) cargo e outro com aqueles 
que possuem apenas um. O que isso nos possibilita é tentar entender melhor essa sociedade da 
XVIII Dinastia e construir essa hierarquia, de modo que possamos compreender melhor a 
identidade de Nakht. 
 
Gráfico 4: Porcentagem do Grupo A (indivíduos com mais de um cargo) e do Grupo B (indivíduos 
com apenas um cargo). 
Fonte: dados obtidos a partir da Tabela 2. 
 
 Se analisarmos este gráfico, veremos que existe uma diferença de seis tumbas (8%) cujos 
proprietários não possuíam um segundo cargo ou terceiro cargo. Sendo assim, seria mais 
interessante expormos aqui todos os cargos, de modo que entendamos como estava subdividida 
essa sociedade. Dessa forma, o Gráfico 5, abaixo, apresenta-nos esses cargos, organizados em 
ordem alfabética. 
 
 
56%
44%
Grupo A Grupo B
73 
 
Gráfico 5: Cargos dos indivíduos proprietários das tumbas referentes à temporalidade de Tutmés 
IV e Amenhotep III. 
Fonte: dados obtidos a partir da Tabela 2. 
0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10
Capitão das tropas […]
Chefe de lavradores
Chefe do berçário
Chefe dos mestres de cerimônias (?) de Âmon
Chefe no Grande Palácio
Contador de grãos (a) das terras de Âmon, (b)…
Empregado limpo de mãos
Escriba [...]
Escriba Real
Escultor de Âmon
Escultor principal do Senhor das Duas Terras /…
Fornecedor (?) de vinho de tâmara
Governador de todas as Terras do Norte
Mordomo
Mordomo Chefe
Mordomo da Grande Esposa Real Tiye
Mordomo na cidade do sul
Ourives
Portador das ofertas florais de Âmon
Portador de leques à direita do rei
Porta-estandarte de (a barca sagrada chamada…
Prefeito do Lago Meridional e do Lago Sobek
Primeiro arauto real
Primeiro profeta de Onuris
Príncipe hereditário
Sacerdote Wab
Segundo profeta de Âmon
Supervisor de barcos de Âmon no Templo de…
Supervisor de carpinteiros de Âmon
Supervisor do celeiro de Âmon
Supervisor do harém real
Supervisor do tesouro de ouro e prata
Supervisor dos celeiros do Alto e Baixo Egito
Tutor real
Vice-rei de Kush
Vizir
Cargo Principal Cargo Secundário/Terciário
74 
 
 Tendo em vista que alguns proprietários das tumbas possuem dois ou até três cargos 
secundários, conforme podemos observar na Tabela 2, priorizamos os cargos principais e 
excluímos aqueles cargos que assistem apenas um proprietário (como, por exemplo, o caso 
Raamosi, que possui “filho de Amenhotep III” como título secundário). Este gráfico nos auxilia a 
entender a complexidade da sociedade egípcia. Podemos ainda utilizar as abreviações como 
“sacerdote” ou “soldado”, mas devemos entender que tais denominações podem representar uma 
vasta subdivisão, como soldado das cidades ao sul, ou segundo profeta de Âmon. Além disso, 
temos o caso da TT 74, cujo proprietário apresenta três cargos diferentes para a função de escriba. 
Vemos como interessante a inserção desses títulos secundários em nossa tabela, uma vez que 
demonstra a vasta aplicabilidade da função de um escriba e que existia uma preocupação em dispor 
tanto nas paredes das tumbas quanto nos cones funerários esses títulos. 
 Dessa forma, o que tais números nos indicam? Acima de tudo e o mais óbvio, indica que 
existe, de fato, uma preocupação em fazer esse status ser rememorado por aqueles que visitam as 
tumbas desses indivíduos, de modo que possa perpetuar no Além seu cargo em vida. Em segundo 
lugar, indica-nos uma complexa sociedade que possui diversos cargos para as mais diversas 
necessidades, e o estudo mais aprofundado desse quadro, como aponta Frood (2010), auxilia-nos 
a compreender a hierarquia egípcia, de modo a desenvolvermos uma escala para esta. Uma terceira 
consideração, mais preocupados com o caso de Nakht, é que este indivíduo possui uma função 
diferente (a de astrônomo) que não aparece outra vez entre essas tumbas. 
 Entretanto, Nakht possui uma função comum entre os membros dessa elite: a de escriba. 
Sem fazer distinção entre os tipos (ou subtipos) de escribas, temos, ao todo, quinze dos cinquenta 
proprietários de tumbas que exerciam esse cargo (30%): seis durante o reinado de Tutmés IV, seis 
no de Amenhotep III e três no período entre estes dois reinados. Portanto, podemos deduzir que, 
por possuírem o maior número de tumbas construídas (se interpretarmos esses cargos como 
grupos), o grupo de escribas possuíam, de fato, um maior status social na hierarquia egípcia dessa 
temporalidade.Dessa forma, Nakht, inserido nesse grupo, se destaca por apresentar um cargo 
secundário intrigante e sem conclusões acerca. Poderia ser que a função não fosse valorizada e só 
Nakht conseguiu construir sua tumba ou que a função de astrônomo era tão complicada que só ele 
conseguiu destaque? Conforme veremos no final dessa dissertação, o astrônomo tinha uma 
importante função social, a de organizar o calendário, o que implica, por exemplo, na agricultura e 
na esfera religiosa. Seja como for, sua tumba fora construída, está localizada próxima a uma Via 
75 
 
Processional (conforme podemos reparar na Figura 1.13), é destacada por estar no topo de uma 
colina e possui muito mais assuntos para discutirmos ao longo dessa dissertação nos próximos 
capítulos. 
 
... 
 
 Ao longo desse capítulo exploramos uma das camadas que pretendemos analisar da tumba 
de Nakht: a mais externa. Partimos, portanto, do macro e estamos nos encaminhando para o micro. 
Ao tratarmos, a partir da Arqueologia, sobre o posicionamento que essa tumba se insere tanto 
geográfico quanto histórico, entendemos que esse complexo funerário apresenta características 
extremamente significativas para entendermos melhor sobre a sociedade egípcia. Nossa escolha da 
Arqueologia Processual para nos guiar teoricamente ao longo de toda a dissertação não poderia se 
justificar apenas por suas funcionalidades, mas, também, pela sua aplicabilidade e utilidade em 
conjunto com as demais teorias que utilizaremos doravante, como, por exemplo, a semiótica e a 
aplicabilidade da hermenêutica para esse trabalho. 
 Para utilizarmos metodologicamente a Arqueologia Cognitiva, de Renfrew, deveríamos 
estabelecer e compreender um complexo sistema que encontramos nos resquícios dessa 
determinada sociedade. Se pudermos usufruir de diversos tipos de fontes (e, com a tumba de Nakht, 
podemos), será melhor para a análise dessa sociedade. Portanto, ao analisarmos o contexto histórico 
em que a tumba de Nakht está inserida, de acordo com a construção da Paisagem, entendemos uma 
parte desse processo que escolhemos seguir com a Arqueologia Cognitiva. Nesse sentido, vimos a 
morfologia de Tebas (o rio cortando a cidade em duas margens: as montanhas ao oeste e uma 
margem mais baixa à leste), as possíveis conexões simbólicas que os antigos egípcios fizeram com 
esses relevos, suas interseções e, por fim, tentamos configurar essa Paisagem. De modo 
complementar a este, reconhecemos a Paisagem funerária tebana a partir do que fora proposto por 
Pereyra (et al 2017, p. 29-30). 
 Em um primeiro momento, compreendemos que a Paisagem natural é pensada de maneira 
simbólica pelos próprios habitantes da região de Tebas da XVIII Dinastia. Em um segundo 
momento, elencamos os critérios utilizados para dotar culturalmente a Paisagem, resultando em 
um espaço adequado para o desenvolvimento de práticas rituais de devoção e aprovação de deuses 
76 
 
e personagens divinizados e de culto à memória dos mortos membros da elite, que serviram como 
âncoras evocativas das representações mentais na ausência de celebrações rituais e onde o papel 
dos atores sociais variaria, dependendo dos cargos dos indivíduos envolvidos. E, em um terceiro 
momento, passamos a reconhecer a natureza discursiva que instrui os participantes e outros 
observadores sobre a maneira esperada de usar a paisagem, através do reconhecimento das funções 
desempenhadas por cada obra arquitetônica e das trajetórias seguidas durante a circulação ritual 
pelos participantes nas procissões. 
 Relembramos constantemente que o trabalho em desenvolvimento ao longo de toda 
dissertação é o de analisar a tumba do escriba e astrônomo do deus Âmon, Nakht. Portanto, ao 
construirmos a Paisagem funerária de Tebas da XVIII Dinastia, refletimos sobre as estruturas 
consideradas principais, os templos de Karnak e Luxor e os templos funerários, assim como as 
diferentes tumbas de particulares (demonstrando suas particularidades e analisando os locais das 
construções), e, também, o que torna possível essas conexões, as Vias Processionais e os festivais 
nelas desempenhados. 
 Propomos, ainda, possíveis interpretações sobre os dados levantados na Tabela 2, sobre as 
tumbas de particulares da temporalidade dos reinados de Tutmés IV e Amenhotep III. O fato de 
ter mais escribas construindo tumbas do que outros membros da elite nos indica o provável poder 
que esses membros possuíam, ou, também, as diferentes iniciativas para a escolha do local onde 
será construída a tumba daquele proprietário. Conforme vimos, as tumbas de Qurnet Mura’i, a TT 
276 e a TT 383, ambas pertencentes ao supervisor do tesouro de ouro e prata, juiz e supervisor do 
gabinete (?), Amenemopet, e a Merymosi, filho de Amenhotep III e vice-rei de Kush, 
respectivamente, se encaixam no exemplo de que apenas estudando os pormenores conseguimos 
compor a Paisagem. Poderíamos nos aprofundar nessas cinquenta e quatro tumbas elencadas na 
Tabela 2 e determinarmos mais precisamente essa Paisagem. Entretanto, não é esse o nosso 
objetivo nesta dissertação. Desse modo, mesmo que não sejam conclusivos, podemos utilizar as 
interpretações dadas nesse capítulo para estudos posteriores. 
 Sendo assim, iniciamos nosso entendimento sobre as estruturas sociais, econômicas e 
culturais próprias ao Egito do final da XVIII Dinastia. Refletimos sobre Arqueologia Cognitiva, 
Paisagem, Templos na margem ocidental e oriental de Tebas, as Vias Processionais e os Festivais 
da cidade e, por fim, as tumbas de particulares de Tebas. Todos estes pontos serão complementados 
conforme adentramos na TT 52. Para o próximo capítulo, exploraremos melhor essa tumba, 
77 
 
compreendendo sua função e qual interpretação os antigos egípcios deveriam ter do mesmo, 
analisando os rituais e as atividades desempenhadas neste espaço a partir da arquitetura e dos 
objetos encontrados na tumba de Nakht.
78 
 
CAPÍTULO 2: RITUAIS NA TUMBA DE NAKHT 
 
Trataremos neste capítulo da estrutura da TT 52, comparando-a com outras de sua 
temporalidade, de modo que possamos compreender como se configurava uma tumba no período 
de Nakht e o porquê de ela obter a sua estrutura. Além disso, analisaremos os objetos encontrados 
na escavação de Norman de Garis Davies, conforme catálogo publicado em 1917. Dessa forma, 
argumentamos aqui que a compreensão desse espaço, a partir de sua estrutura e objetos, fornece-
nos subsídio para elaborarmos um sistema de atividades ritualísticas, a fim de construirmos um 
sistema cognitivo egípcio nos moldes da Arqueologia Cognitiva de Colin Renfrew em conjunto 
com o Ambiente Construído de Amos Rapoport. Sendo assim, temos um tríplice foco nesse 
capítulo. Primeiro, analisaremos os conceitos funerários egípcios para melhor compreendermos do 
que vamos falar da arquitetura (segundo ponto) e dos objetos (terceiro), que estão separados em 
seis categorias: fragmentos de caixões, vasos, caixas, cones funerários, cosméticos/cabelo e 
estatueta de Nakht. 
 
1. A MORTE E A VIDA 
 
Para os antigos egípcios, a morte não significa o fim, mas o início de uma jornada que 
aquele indivíduo iria percorrer para a vida eterna. De acordo com a literatura funerária, essa jornada 
difere em muitos aspectos, pode ser a partir do status da pessoa, como também da cidade em que 
ele viveu e da época. A visão de morte varia tanto entre os status sociais quanto entre os períodos, 
mas podemos utilizar essas diferenças para elucidarmos melhor a nossa interpretação daquela 
determinada visão analisada. Por exemplo, existe uma significante diferença entre o discurso 
funerário produzido para um faraó da XVIII Dinastia, com sua tumba construída em Tebas, para a 
tumba de um funcionário do templo de Âmon do mesmo período e da mesma cidade. Dessa forma, 
trataremos aqui sobre a visão funerária egípcia da XVIII Dinastia entre os membros da elite. 
79 
 
Para Assmann (2003a, p. 17), a morte significauma experiência, uma consciência da 
finitude da vida, que apresenta cenários para rituais funerários, em espaços como tumbas, 
permitindo uma comunicação dos vivos com os mortos. De acordo com Assmann, a visão egípcia 
de morte é muito diferente da nossa, uma vez que existe uma quantificação intrínseca à 
compreensão de vivo e morto (ASSMANN, 2003a, p. 32). Por exemplo, pode-se estar em um 
estado “meio morto”. Para tanto, os egípcios utilizavam de um artificio para que essa ligação do 
Egito terreno com o Além pudesse ser revitalizada: uma tumba (maHat ou mjHat 
 em egípcio). Esta era um local de descanso do corpo do morto e da regeneração deste 
no Além. No entanto, como isso funcionava? 
Em textos como o Conto do Náufrago (para as traduções em português, CANHÃO, 2010, 
p. 69-88; ARAÚJO, 2000, p. 73-79) e a História de Sinuhe (CANHÃO, 2010, p. 89-98; ARAÚJO, 
2000, p. 101-119)40 a necessidade de voltar para o Egito é presente e digna de menção, uma vez 
que um discurso é feito em prol desse retorno, poderíamos inferir que existia um vínculo com o 
medo de morrer no estrangeiro, uma vez que lá o indivíduo não teria uma tumba para que sua 
memória fosse perpetuada. Assmann comenta que, nesses textos, pensar na tumba significa pensar 
em sua terra natal e sua divindade local, fazendo com que a imagem da morte como retorno 
correspondesse ao sentimento de apego local, de enraizamento no campo, cujos centros são o 
templo e a necrópole (ASSMANN, 2003a, p. 273-276). Assmann, de certa forma, atualiza a 
interpretação de K. J. Seyfried (1995), que analisa a tumba como um símbolo de conectividade que 
percorre e integra diversas gerações, algo que iremos associar a uma estrutura cognitiva que pode 
ser estudada em Tebas desse período. Nesse sentido, palavras como Ka (kA ) ou Ba (bA ou 
) serão extremamente utilizadas a partir desse ponto nessa dissertação e necessitam explicação, 
assim como demais conceitos funerários. 
Assmann (2003a, p. 74-75) defende que existia uma imagem de morte como um isolamento 
que procede da ideia de conectividade social, atrelada à vida. Algo que parece bem interessante 
para muitas sociedades que acreditam em um pós-vida é, justamente, a compreensão de que um 
indivíduo morto só tem acesso a esse Além a partir de ritos feitos no Egito terreno, alguns 
 
40 Recomendamos, também, a tradução para o inglês da Miriam Lichtheim (1973, p. 211-214) para o Conto 
do Náufrago e, também da Lichtheim (1973, p. 222-236) para Sinuhe. 
80 
 
imediatamente após a morte e outros continuamente, para que aquele indivíduo permaneça 
existindo no mundo idealizado. Se repararmos e trouxermos a história que introduz essa 
dissertação, perceberemos as nuances dessa noção, uma vez que o morto precisava de rituais para 
que pudesse viver em harmonia no Além. Dessa maneira, Assmann (2003a, p. 141-145) divide em 
duas partes todo o processo do defunto em sua morte e vida no Além, uma esfera física, que deixara 
no Egito terreno, e outra social, que seria lembrada entre os seus descendentes e, portanto, garantiria 
sua vida no Além. 
O princípio da conectividade social revigorava e animava o humano ao vinculá-lo à 
comunidade dos homens, enquanto o princípio da conectividade física, que era ativado pelo sangue 
de seu corpo e pela magia - com seus textos e amuletos - como parte da mumificação, conectava 
os membros uns aos outros e animava o corpo (ASSMANN, 2003a, p. 80). De acordo com 
Assmann (2003a, p. 80), um humano é, intrinsecamente, uma pluralidade de componentes que 
devem ser combinados em uma unidade orgânica, e, extrinsecamente, parte de processos de 
socialização e integração nas constelações da vida social, tudo isso faz com que os humanos se 
tornem plenamente vivos como elemento da comunidade. No entanto, qual ou quais são esses 
elementos que compõem o humano? 
O Ka e o Ba fazem parte das duas esferas dicotômicas que iremos trazer aqui. Na primeira 
esfera (a social), temos o Ka, o nome (rn) e a múmia (saH) enquanto na outra (uma física) temos, 
junto ao Ba, o corpo (Dt), o cadáver (XAt), e a sombra (Swt). Na intersecção das duas esferas, temos 
o coração (ib) e, em uma categoria própria, o Akh (Ax) (ASSMANN, 2003a). Dessa forma, como 
podemos compreender que o morto pode possuir um ou vários elementos e, mesmo assim, todos 
existem em prol desse indivíduo de modo a assegurar sua existência no Além? 
Por serem parte da composição humana, não conseguimos discriminar cada elemento de 
forma singular pois eles funcionam em forma plural para garantir o Além do morto. Portanto, 
conforme Assmann defende, um caminho interessante para a explicação das esferas é comparar o 
Ba e o Ka. Enquanto o primeiro elemento (Ba) é aquele que se movimenta e viaja para fora da 
tumba, de modo que o morto visite o Egito terreno, o segundo (Ka) consiste naquele que indica o 
status do morto (perpetuando sua memória entre o Egito terreno) e recebe as oferendas feitas na 
tumba, assim como também recebe tudo que o Ba provém. Desse modo, dois pontos são 
81 
 
importantes de ressaltar: o tema da liberdade de movimento, presente no Ba, não é desempenhado 
no Ka, de modo que o Ka faz parte da esfera social do morto (ASSMANN, 2003a, p. 157). Um 
aspecto em comum aos dois é que ambos se reúnem para receber as oferendas junto ao morto, como 
demonstrado no Capítulo 89 do LDM: 
 
Ó tu que chegas, ó andarilho que habitas o teu pavilhão (divino), grande deus, faz 
que a minha alma venha para junto de mim, seja qual for o lugar em que ela esteja! 
Se tardam a trazer-me a minha alma, seja qual for o lugar em que ela esteja, então 
tu encontrarás o olho de Hórus dirigido contra ti, assim. 
Ó deuses que tirais a barca do senhor dos milhões de anos, que conduzis o céu à 
Duat, que afastais o céu inferior, que fazeis que as almas se aproximem das múmias, 
que as vossas mãos segurem os vossos cordames, que os vossos punhos prendam 
os vossos chuços e o inimigo, para que a barca jubile e o grande deus voe em paz, 
mas fazei que esta alma de N (que eu sou) suba para junto dos deuses sob as vossas 
nádegas, do horizonte oriental do céu, para ir até ao lugar onde ela (?) estivera 
ontem, em paz, em paz, no Ocidente! Que ela veja o seu corpo, que ela repouse 
sobre a sua múmia! (Assim), ela não perecerá, ela não será destruída, nunca 
(LOPES, 1991, p. 119-120). 
 
 A partir disso, vemos a preocupação para que esses dois elementos (no caso, Lopes traduz 
Ba por “alma”) se unam. Sendo assim, o Ba circula livremente entre o Egito Terreno e o Além, 
enquanto o Ka parece estar associado com a instância da justificação, que restitui ao homem seu 
status social no Além. A vinheta que acompanha esse texto pode ser vista na Figura 2.1. Nela, o 
Ba está representado como um pássaro sobrevoando o caixão do morto, indicando-nos o momento 
em que o Ba encontra outros elementos do morto. Portanto, o Capítulo 89 demonstra que o Ba se 
separa e retorna ao seu corpo constantemente, sendo necessário isso para a perpetuação da vida; o 
Ba se separa e desfruta sua vida para retornar e compartilhar com o imóvel (Ka), enquanto o imóvel 
recebe as oferendas e nutre o móvel (Ba). 
 
 
 
 
 
 
82 
 
 
 
Figura 2.1: Capítulo 89 do Livro dos Mortos de Ani. 
 
Fonte: Museu Britânico (BM EA 10470,17). 
 
Além dessa, em outras fórmulas do LDM podemos encontrar outras uniões, como, por 
exemplo, a do cadáver e o seu Ba no Capítulo 169, quando é dito “o teu Ba no céu, o teu cadáver 
na terra” (Adaptado de LOPES, 1991, p. 236). De acordo com Assmann (2003a, p. 147), o culto 
funerário, de certa forma, aumenta um vínculo que o Ba possui com o seu cadáver a partir de uma 
terceira forma, a representação de culto do morto, de modo que ele esteja ao mesmo tempo presente 
no céu, na terra e no submundo. Esses rituais se aplicam, também, para o Ka e a múmia, da esfera 
social, uma vez que este rito é realizado durante o ritual de abertura da boca em frente à múmiaerguida no pátio do túmulo. Sendo assim, seguindo o exemplo do deus sol, por ser representado na 
83 
 
barca solar e englobar o trajeto solar, o morto consegue a reintegração de sua pessoa na forma da 
união do Ba e do cadáver (ASSMANN, 2003a, p. 149). 
A dissociação do Ba do cadáver e sua viagem ao céu e à terra é destinada a trazer os mortos 
para compartilhar a forma de existência do deus sol, que viaja para o céu, visível para todos na 
forma de disco solar e se põe à noite nos mundos exteriores onde, invisível, escondido, se une com 
os mortos (ASSMANN, 2003a, p. 149). O Ba deriva dessa união com o cadáver, gerando uma força 
de renovação que lhe permite voltar para o céu para um novo ciclo. Essa regeneração cíclica do Ba 
e do cadáver trabalham juntos e dependentes uns dos outros, eles são subordinados uns aos outros, 
inseparáveis. 
 O nome (rn), pertencente à esfera social, consiste naquele elemento que mantém a memória 
do morto viva no Egito terreno, para, assim, assegurar o seu Além, por isso aparece diversas vezes 
na tumba e, para as tebanas, já são presentes no pátio por meio dos cones funerários, que são 
pequenos objetos com inscrições do dono da tumba e, em alguns casos, de sua esposa. Para o 
coração (ib), Assmann (2003a, p. 165) argumenta que é uma categoria de complexa compreensão, 
uma vez que é algo material e que não pode ser separado do corpo. De acordo com os egípcios 
antigos, compreende-se que a morte é a dissociação do coração com o morto e sua cura é 
apresentada como a união (ASSMANN, 2003a, p. 168). De acordo com Assmann (2003a, p. 168), 
o Ba faz com o coração algo semelhante ao que faz com o Ka, ele o encontra e se une, mesmo que 
a sua reconstituição dependesse de divindades como Nut e Anúbis, referentes ao trabalho de 
restituir essas partes do corpo. Sendo assim, o coração é o ponto de intersecção entre as duas 
esferas, com uma função definida a partir da integração do físico com o social, com fim de 
determinar a unidade do morto (ASSMANN, 2003a, p. 144). 
 Por fim, temos o Akh (Ax), uma parte do morto transfigurada, existente para poder fazer 
referência ao Ka e ao Ba, recebendo as oferendas e passando-as ao morto. De acordo com Assmann 
(2000, p. 81-92), o Akh pode ser enquadrado em nenhuma das duas esferas, sendo algo que aparece 
quando invocado pela fórmula jn.t Ax, que significa “Trazer (fazer vir) o Ax”, mas que também 
existe em uma relação parental, uma vez que o elemento pode significar algo que beneficia alguém, 
como um pai ao seu filho e vice-versa (ASSMANN, 2000, p. 87). No Esquema 2, podemos 
compreender melhor essas esferas e como elas são interpretadas por Assmann (2003a). 
84 
 
Esquema 2: Elementos que compõem o morto e suas respectivas esferas. 
 
Fonte: adaptado de Assmann (2003a, p. 181). 
 
Sendo assim, como compreender esses elementos no espaço funerário da TT 52. Temos três 
estágios que eles podem aparecer: arquitetura, pintura e escrita. A imagem da morte é algo muito 
bem preservado e cognitivamente difundido nessa sociedade, algo que Assmann (2003a, p. 171) 
defende como uma necessidade de marcar a presença da ausência. Dessa forma, existe uma 
associação muito forte entre a imagem e o corpo do morto, uma vez que as palavras egípcias que 
designam o corpo do morto (Dt, XAt, saH) são as mesmas que imagem (estátua, imagem, forma...), 
alterando o determinativo da palavra de horizontal para vertical, respectivamente (ASSMANN, 
2003a, p. 171). Dessa forma, podemos compreender um sentido cognitivo a partir dessa linguagem: 
se uma imagem pode ser associada a uma forma do morto, ela simboliza o próprio morto. Fazer, 
kA 
Nome (rn) 
Múmia (saH) 
bA 
Sombra (Swt) 
Corpo (Dt) 
Cadáver (HAt) 
ib 
Esfera social Esfera física 
AH Se relaciona com Se relaciona com 
85 
 
portanto, uma oferenda à estátua do morto (por vezes chamada de estátua Ka), significa fazer 
oferendas ao próprio morto; ou, em outro exemplo, os ritos utilizados em um shabti41 significam 
que esse objeto, essa imagem, será transformada em uma pessoa para realizar o que estiver escrito. 
 
2. A ESTRUTURA DA TUMBA 
 
Aos 25°43’54.4”N e 32°36’36.0”E a tumba de Nakht (TT 52) pode ser encontrada. Ela está 
situada no atual sítio arqueológico de Sheik el-Qurna, a oeste do rio Nilo na cidade de Luxor, antiga 
Tebas, Egito. Esse espaço possui, como podemos observar na Figura 2.2, um pátio (A) (irregular), 
uma capela funerária (B) (aprox. 4,8m x 1,5m), um pequeno corredor posterior (aprox. 0,5m x 
0,6m) que leva a uma câmara interna (C) (aprox. 2,2m x 2,5m), que contém um pequeno nicho (D) 
para uma estátua Ka (aprox. 0,5m x 0,4m). Abaixo desse recinto, há um fosso para a descida para 
a câmara funerária, que possui um plano irregular. Na Figura 2.3 temos essa tumba exposta em 
uma perspectiva longitudinal, na qual podemos ver os pontos supracitados e compreender melhor 
o tamanho desse espaço. 
 
 
41 Os Shabtis, conforme iremos ver ainda nesse capítulo, são estatuetas que contêm uma fórmula para 
trabalhar para e no lugar do morto no Além. 
86 
 
Figura 2.2: Planta da tumba de Nakht (TT 52). 
 
Legenda: A (pátio); B (capela funerária – com seis paredes decoradas, numeradas do 1 ao 6); C (câmara 
interna); D (nicho para a estátua Ka). 
Fonte: adaptado de Laboury (1997, p. 50). 
 
 
 
 
 
 
87 
 
Figura 2.3: Plano longitudinal da tumba de Nakht (TT 52). 
 
Legenda: A (pátio); B (capela funerária); C (câmara interna); D (nicho para a estátua Ka); E (câmara 
funerária). 
Fonte: adaptado de Kampp (1996, p. 257) 
 
 No ano de 1889, o Serviço de Antiguidades egípcio tomou conhecimento da tumba de 
Nakht a partir de relatos das descobertas dos habitantes da aldeia de Qurna e, no mesmo ano, a 
tumba passou por um processo de limpeza, com uma equipe chefiada por M. Grébaut (DAVIES, 
1917, p. 36). Em 1894, foi publicado o quinto volume da Mission archéologique francaise au 
Caire, que conta, no terceiro fascículo, com um texto de G. Maspero, intitulado Le tombeau de 
Nakhti, a tumba 125 do plano de M. Eisenlohr (MASPERO, 1894, p. 469-485). Nesse texto, o autor 
faz um levantamento dos desenhos e dos hieróglifos da tumba, e, no final, diz que seria interessante 
se ela fosse estudada de forma aprofundada (MASPERO, 1894, p. 485). Entre 1907 e 1910, 
Norman de Garis Davies, enviado pelo Museu Metropolitano de Nova Iorque (Metropolitan 
Museum – MET), coordena o que fora o início da escavação da tumba de Nakht, intitulada a partir 
88 
 
de então como Theban Tomb 52, e que culmina em um catálogo lançado pelo próprio museu em 
1917. 
 
Figura 2.4: Fotografia retirada na frente da TT 52. 
 
Fonte: Disponível em: 
https://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/3/36/Tomb_of_Nakht_%28TT52%29_-
_Entrance.jpg. Acesso em: 20 set. 2020. 
89 
 
 Nos dias atuais, podemos encontrar fotografias retiradas da frente da TT 52, como na Figura 
2.4, acima. Podemos ainda achar sua localização pelo Google Maps, como na Figura 2.5, sendo 
possível, então, saber qual seria a visão ao sair dela, conforme a Figura 2.6. Nas duas primeiras 
imagens vemos que sua fachada original não existe mais, sendo ela uma reconstrução reforçada 
para a visita turística. Quanto à Figura 2.6, percebemos que podemos visualizar a área agrícola de 
Luxor, às margens do Nilo, e, ao fundo, a Luxor moderna contrastada pelo templo de Karnak, 
conforme indicado pela seta vermelha na imagem. Isso nos possibilita compreender que o visitante 
da tumba de Nakht teria uma visão ampla de Tebas ao sair da tumba. 
 
Figura 2.5: Localização da TT 52 pelo Google Maps. 
 
Fonte: Google Maps. Acesso em: 20 set. 2020. 
 
 
 
90 
 
Figura 2.6: Vista da TT 52 pelo Google Maps. 
 
Fonte: Google Maps. Acesso em: 20 set. 2020. 
 
Em uma tumba egípcia podemos perceber a morte como um sentido de passagem, uma 
imagem que está impressa na arquitetura da mesma (ASSMANN, 2003a, p. 185), algo que os 
egípcios compreendiamcomo uma forma de reintegrar o morto na sociedade, fazendo da tumba 
um local de integração de gerações, conforme fora defendido no artigo de Seyfried (1995). 
Assmann (2003a, p. 282-320) defende que, na tumba egípcia, existiam duas funções que eram 
opostas e mutuamente exclusivas: “mistério”42 e “memória”. Por um lado, a tumba serviu como 
um sinal visível destinado a manter viva a lembrança do morto em memória da posteridade. Esta 
função da tumba exigia visibilidade e abertura. Por outro lado, a tumba deveria abrigar a múmia e, 
na medida do possível, mantê-la a salvo de qualquer interferência externa, um lugar escondido e 
 
42 Acreditamos que seja importante destacar que, em outro livro, Assmann (1995) utiliza da palavra 
“mistério” e separa o seu significado aplicado ao Egito antigo com a aplicação da palavra entre os gregos 
antigos. Para a sociedade aqui estudada, a utilização da palavra “mistério” evidencia algo “secreto” no 
sentido de ser um conhecimento limitado entre os sacerdotes que realizam determinado ritual, algo que 
exige uma fala e um ato próprio desses sábios (ASSMANN, 1995, p. 17). 
91 
 
inacessível onde o falecido era protegido para sempre. Nesta tentativa arquitetônica de criar um 
espaço protetor para a múmia, Assmann (2003a, p. 283) argumenta que podemos perceber a 
expressão tangível da imagem da morte como mistério. Arquitetonicamente, a realização dessa 
separação existe em prol de dois aspectos, a saber: o aspecto solar, que simboliza renovação, e o 
aspecto associado ao deus Osíris, proteção, indicando uma ocultação absoluta (ASSMANN, 2003a, 
p. 283). Seguindo essa ideia, Assmann (2003b) compreende que podemos separar em cinco as 
funções de uma tumba: 
 
1. Abrigar e ocultar o sarcófago com a múmia: esta função está relacionada com a noção de 
sagrado, uma vez que o que está inacessível está guardado e intocável; 
2. Indicar o lugar de enterramento e mostrar o nome do defunto: associa-se com o 
conhecimento do eu e poder simbólico que esse possibilita; 
3. Mnemônica ou de representação biográfica: a tumba era construída para ser visitada para a 
posteridade, já que a crença egípcia entende que o dono da tumba, para continuar sua vida 
no Além, deve ser relembrado no Egito terreno; 
4. Prover uma interface: ou uma passagem (ponte), para que o morto possa transitar entre este 
e o outro mundo; 
5. Prevenir o regresso do defunto ao mundo dos vivos: com o intuito de que este não perturbe 
os vivos, separando, assim, de seu mundo por meio do isolamento da câmara funerária. 
 
Se pensarmos que uma parte da tumba necessita de visibilidade (capela funerária) enquanto 
a outra é totalmente o oposto (câmara funerária), podemos supor que ambas as funções 
apresentadas são divergentes em certos pontos. A quarta e a quinta função estão associadas com o 
viés de simbolismo no projeto arquitetônico da tumba e das esferas físicas e social do morto. Sendo 
assim, tumba não é interpretada como um bloqueio entre os mundos dos vivos e dos mortos, mas, 
sim, como uma “interface”, que é o símbolo principal desse aspecto (ASSMANN, 2003b, p. 47). 
Existem diferenças nas concepções de tumbas dependendo do período. Para o Reino Novo, temos 
três tipos de nomenclaturas, demarcadas a partir do reinado de Akhenaton. Esse período, chamado 
de amarniano, intencionou uma reforma nas crenças religiosas e, portanto, artística (um dos pontos 
92 
 
mais perceptíveis). Essa tentativa, no entanto, não fora frutífera, de modo que temos documentos 
de Tebas que nos demonstram uma continuidade das práticas religiosas, mesmo que em baixa 
frequência. Ao fim do reinado de Akhenaton, percebemos que alguns ideais desse período 
perduraram entre os membros da elite. Ao compararmos as tumbas pré-amarnianas (como a TT 52) 
com as amarnianas (dentro da cidade de Amarna) e as pós-amarnianas (se restringirmos às tebanas), 
vemos uma grande diferença entre o primeiro tipo e o segundo (como, por exemplo, o faraó se 
torna um ponto central nas imagens das tumbas) e, para o terceiro, não há um resgate completo do 
primeiro tipo, sendo recorrente um motivo iconográfico do segundo tipo perdurar no terceiro (como 
citado, o rei aparece em algumas imagens da tumba pós-amarniana). 
A estrutura de uma tumba foi amplamente estudada por Friederike Kampp-Seyfried em sua 
Tese (1996)43. De acordo com a autora, podemos separar em três as partes de uma tumba, cada uma 
com uma função específica e uma forma arquitetônica (KAMPP-SEYFRIED, 2003). Se 
repararmos na Tabela 3 e utilizarmos da Figura 2.7, podemos identificar os diferentes níveis e suas 
funções. Na Tabela 3, possuíamos a nomenclatura da divisão feita pela autora, com sua função e a 
descrição de sua forma arquitetônica. Na Figura 2.7, vemos exemplos dessa divisão esquemática 
da tumba em desenhos, com o primeiro nível sendo o superior, categorizado como uma 
superestrutura em forma de capela, estatuetas ou formas piramidais (da esquerda para a direita na 
imagem); o segundo nível (médio) é composto por um pátio e uma câmara interna (respectivamente 
da esquerda para a direita), uma estrutura semelhante ao templo, conforme vimos no primeiro 
capítulo (Figura 1.9); por fim, o nível inferior, que é subterrâneo e pode ser direto de um poço (no 
desenho da direita) ou com corredores e antessalas (desenho da esquerda). 
 
 
 
 
 
43 Na edição que temos dessa Tese, o nome utilizado pela autora é “Friederike Kampp”, justificando, assim, 
a aparição desse nome nas referências desta dissertação para essa obra. 
93 
 
Tabela 3: Divisão esquemática de uma tumba tebana de particular em três níveis horizontais. 
Divisão Função Forma arquitetônica 
Nível 
superior 
(A) 
Aspecto de culto solar, adoração solar 
Superestrutura em forma de uma capela, pirâmide, ou a 
fachada recuada com uma estátua do tipo stelophor 
Nível 
médio 
(B) 
Local de adoração e cultos 
cerimoniais (rituais), monumentos 
sociais para o proprietário da tumba 
Pátio e câmara interna, como vestíbulo, corredor e 
nichos 
Nível 
inferior 
(C) 
Aspecto do culto a Osíris, realização 
de paisagens para o Além, e local de 
descanso do corpo 
Complexo funerário subterrâneo com nichos e 
corredores, antessalas e câmaras marginais, além de 
uma câmara contendo o caixão 
Fonte: Kampp-Seyfried (2003, p. 8). 
 
Figura 2.7: Divisão esquemática de uma tumba tebana de particular em três níveis horizontais. 
 
Fonte: Kampp-Seyfried (2003, p. 8). 
94 
 
Para o nível médio, a autora divide as tipologias das tumbas de Tebas em dez categorias, 
conforme vemos na Figura 2.8. Nessa imagem percebemos a tipologia de cada tumba. O primeiro 
tipo é o mais simples, com apenas uma capela de culto. O tipo II possui um acréscimo de algum 
nicho para uma estátua, subdividido em duas categorias, a primeira (IIa) com a capela na horizontal 
e a segunda (IIb) na vertical. No terceiro tipo, um corredor faz a ligação do pátio com a capela, e, 
enquanto o IIIa não possui colunas na fachada da tumba, o IIIb as possui. O tipo IV é semelhante 
ao tipo III, com a diferença que o corredor é mais largo e categorizado como uma parte da capela 
funerária (ou um vestíbulo). Quanto ao tipo V, o qual a TT 52 se enquadra, existe uma capela 
funerária anterior a uma câmara interna, que pode ser separado em cinco categorias. A Va é 
composta apenas pela câmara horizontal antes de uma vertical, enquanto o Vb possui um nicho no 
final da tumba, o Vc possui duas câmaras anteriores, o Vd com duas câmaras horizontais 
intercaladas por uma vertical, e, por fim, a Ve possui duas câmaras com acesso pela primeira 
câmara anterior (com casos de compartilhamento da tumba nesse tipo). Os tipos VI, VII, VIII, IX 
e X são versões de colunas dos tipos anteriores. 
 
95 
 
Figura 2.8: Tumbas tebanas e suas tipologias de acordo com Kampp-Seyfried (2003). 
Fonte: adaptado de Kampp-Seyfried (2003, p. 4). 
 
 Sobre os pátios, a autora sugere que essas tumbas escavadasem rochas teriam uma estrutura 
comum, com algumas poucas alterações. Na Figura 2.9, vemos o modelo base que Kampp-Seyfried 
(2003, p. 9) sugere. Vemos que o muro do pátio seria baixo na entrada e elevado de forma gradual 
até a parede da fachada, que teria frisos para os cones funerários e um recuo para estatuetas. As 
96 
 
mudanças são vistas nos elementos extras que compõem esse pátio, que, conforme vemos no 
desenho, podem possuir uma base e um poço. A partir disso, fizemos em conjunto com o professor 
Bruno Leonardo Canto Martins (DFTE/UFRN) uma reconstrução para a TT 52, cujo pátio não fora 
reconstruído na escavação e atualmente possui uma estrutura moderna (como vimos nas Figuras 
2.4 e 2.5). Vemos essa reconstrução na Figura 2.10. 
 
Figura 2.9: Aparência de uma tumba da XVIII Dinastia. 
 
Fonte: Adaptado de Kampp-Seyfried (2003, p. 9). 
 
 
 
Frisos para os 
cones funerários 
Parede da 
fachada 
Recuo para 
estatuetas 
Muro 
do pátio Poço 
Base 
Rocha 
97 
 
Figura 2.10: Reconstrução da fachada da TT 52. 
 
Fonte: projeção feita em conjunto com o Prof. Dr. Bruno Leonardo Canto Martins (UFRN/DFTE) 
no programa SketchUp. 
 
Quanto à câmara interna. para o período de Nakht, Kampp-Seyfried mostra que nove das 
dez categorias de tumbas são presentes. No Gráfico 6, podemos ver quantas tumbas existem em 
cada categoria e, na Figura 2.8, o plano de cada uma dessas categorias e suas subdivisões. Vemos 
que a maioria das tumbas do período são do tipo V (21), justamente o qual a TT 52 se enquadra. 
Enquanto os tipos Va e Vb, conhecidos como a forma básica tebana tradicional, são relativamente 
equilibrados cronológica e regionalmente e podem ser documentados desde o início da XVIII 
Dinastia até o final do período Ramessida, o tipo Vc se limitou à XVIII dinastia, com um foco no 
reinado de Tutmés IV (KAMPP, 1996, p. 27). Isso é interessante a partir do momento que criamos 
um mapa cognitivo para essa região. O tipo Va e Vb, por serem mais comuns, poderiam apresentar 
um espaço mais prático para realizações de rituais. Conforme mencionamos anteriormente, o tipo 
Vb, o mesmo da tumba de Nakht (Figura 2.2) e de outras 14 tumbas dessa nossa seleção, difere da 
forma básica simples porque a parede frontal no corredor longitudinal é estendida para criar um 
alvo de culto na forma de um nicho ou uma capela com um nicho. 
98 
 
Gráfico 6: Tipos de tumbas de particulares entre os reinados de Tutmés IV e Amenhotep III. 
 
 
 
Fonte: Dados obtidos a partir de Kampp (1996). 
 
Se pensarmos, no momento, apenas nessa superestrutura, podemos compreender alguns 
ideais egípcios que Kampp-Seyfried reflete em sua Tese. A função desse nível é realçá-lo como 
um espaço de culto solar. Podemos perceber essa interação a partir da simbologia básica de ser um 
local que recebe a maior área de luz solar na tumba. Se prestarmos atenção na Figura 2.10, podemos 
ver que o pátio da tumba de Nakht não parece ser algo suntuoso. No entanto, Kampp-Seyfried 
explica três pontos nesses tipos de pátios da TT 52, um com paredes laterais e pátios abertos, com 
incidência de luz solar. 
A primeira questão é que a grande maioria das sepulturas rochosas de Tebas estão mais ou 
menos nas encostas das colinas das necrópoles. Devido apenas a esta localização na encosta, foram 
criados pátios que são abertos na encosta, ladeados por rocha. Essas paredes laterais perdem altura 
devido à formação do declive para o leste e, portanto, marcam naturalmente o limite frontal do 
pátio. Na maioria das sepulturas registradas, esta forma de pátio - modificada por algumas medidas 
de engenharia estrutural - pode ser considerada um caso normal (KAMPP, 1996, p. 59). A segunda 
explicação é que, em muitos pátios abertos (ou fechados) em uma encosta, as faces laterais das 
rochas ou partes delas foram parcialmente fechadas com tijolos e alongadas (KAMPP, 1996, p. 
2
9
1
1
21
4
8
5
1
I
II
III
IV
V
VI
VII
VIII
X
99 
 
62). Isso pode ser explicado a partir do terceiro ponto, que é referente às fachadas (com ou sem 
pórtico). Elas eram geralmente coroadas com uma parede acima das bordas da rocha, que 
inicialmente deveria ser avaliada como uma medida estrutural para proteger a fachada e o pátio da 
queda de detritos. Além dessa função protetora primária, a parede da fachada assumiu um carácter 
especial. O design - sobretudo na XVIII Dinastia - era um fato muito importante: servia para realçar 
todo o conjunto de tumbas e, ao mesmo tempo, podia assumir funções de superestrutura (KAMPP, 
1996, p. 64). 
Concordamos com Maria Violeta Pereyra (et al, 2019, p. 25) ao considerar que uma tumba 
de particular deve ser analisada como um todo orgânico e dinâmico, compreendendo-o como um 
espaço de convergência entre a arquitetura, a imagem e o texto. Em nosso caso, basear-nos-emos 
na ideia de ritual para a Arqueologia Cognitiva. Roy Rappaport (1999) entende que uma 
experiência religiosa suporta uma doutrina religiosa e crenças, que direcionam a um ritual; este, 
por sua vez, induz a experiência religiosa e gera um ciclo (Esquema 2). Esse ciclo elaborado por 
Rappaport (1999), afirma Renfrew (RENFREW; BAHN, 2016, p. 413), pode originar imposições 
santificadas para uma ação, que gera um processo ecológico e social e culmina no ritual, uma parte 
que completa o ciclo. Ao inserirmos o Esquema 1 (Cf. p. 16 do Volume I) nessa equação, 
compreendemos que todo esse ciclo deriva de uma rede cognitiva mais ampla. Renfrew (1994), ao 
explicar sobre os aspectos do ritual sagrado, categoriza a crença religiosa como aquela que afirma 
a existência de alguma força ou poder transcendental, sobrenatural, ou de várias delas. Dessa forma, 
o objetivo do culto é, basicamente, trazer os humanos participantes, assim como aqueles a quem 
eles representam, a uma relação mais direta com essas realidades transcendentais (RENFREW, 
1994, p. 47-48). 
 
100 
 
Esquema 3: Religião interpretada por Roy Rappaport. 
Fonte: adaptado de Renfrew e Bahn (2016, p. 413). 
 
Renfrew (1994, p. 51) argumenta que o ritual sagrado enquanto experiência religiosa pode 
ocorrer em um local especial (específico) - seja por sua posição natural, como uma caverna ou um 
bosque de árvores, ou especialmente construída para esse fim. Além disso, uma adoração requer 
um foco de atenção. No nosso caso, a tumba pode ser identificada por um local de culto em prol 
do morto. Por esse motivo, a maioria dos rituais sagrados é direcionada para um local sagrado 
específico, às vezes um altar, sejam feitas oferendas ou não nesse local. Muitos utilizam algum 
foco simbólico para atrair essa atenção, que pode tomar forma como um objeto natural ao qual se 
atribui significado ou uma imagem que representa a divindade, podendo também haver objetos 
específicos do culto, como o instrumento do Ritual de Abertura de Boca, no Egito Antigo. De 
modo que esses rituais fossem identificados pelos arqueólogos, Renfrew e Bahn (2016, p. 416-417) 
propuseram uma lista genérica com dezesseis critérios, separados em quatro partes44: 
 
 
44 Traduzida por Pedro Hugo Canto Núñez (2020) para o português. 
Ritual
Imposições 
santificadas 
para uma ação
Processo 
ecológico e 
social
Experiência 
religiosa
Doutrina 
religiosa e 
crenças
Ritual
101 
 
A. Foco de atenção 
1. O ritual pode acontecer em um local com associações naturais (uma caverna, 
árvores, o topo de uma montanha...); 
2. De forma alternativa, o ritual pode tomar lugar em uma construção especial para 
funções sagradas (um templo ou uma igreja); 
3. A estrutura e o equipamento usado para o ritual podem empregar um foco de 
atenção, refletido na arquitetura, utensílios especiais (altares, bancos...) e 
equipamentos móveis (lâmpadas, gongos e sinos, vasos ritualísticos, incensos, 
roupas...); 
4. A área sagrada é provável ser rica em repertório simbólico. 
 
B. Zona periférica entre esse mundo e o Outro: 
5. O ritual pode envolver tantoa exposição pública visível (e gastos) quanto os 
mistérios exclusivos escondidos, cuja prática será refletida na arquitetura; 
6. Conceitos de limpeza e purificação podem ser refletidos em suas instalações 
(piscinas ou tanques de água) e manutenção da área sagrada. 
C. Presença da divindade 
7. A associação com a(s) divindade(s) pode ser refletida no uso de uma imagem de 
culto, ou a representação da divindade em sua forma abstrata; 
8. Os símbolos ritualísticos geralmente estarão relacionados, iconograficamente, com 
as divindades adoradas e suas associações míticas. O simbolismo animal (de 
animais reais ou míticos) pode estar presente com animais particulares relacionados 
às divindades ou aos poderes específicos; 
9. Os símbolos ritualísticos podem estar relacionados com aqueles utilizados também 
em rituais funerários e em outros ritos de passagem. 
 
D. Participação e oferenda 
10. Adoração envolverá oração e movimentos especiais (gestos de adoração), podendo 
estar refletidos na arte ou iconografia das decorações ou imagens; 
11. O ritual pode empregar vários dispositivos para induzir a experiência religiosa 
(dança, música, drogas e a imposição da dor); 
102 
 
12. O sacrifício de animais ou humanos podem ser praticados; 
13. Comida e bebida podem ser levadas e, possivelmente, consumidas como oferendas 
ou queimadas; 
14. Outros materiais podem ser levados e ofertados (oferendas votivas). O ato de 
oferecer pode implicar a quebra e ocultação ou descarte; 
15. Grande investimento de riqueza pode ser refletido tanto no equipamento utilizado 
quanto na oferenda feita; 
16. Grande investimento de riqueza e recursos pode ser refletido na estrutura do lugar 
e em suas instalações. 
 
Sendo assim, um ritual enquanto experiência religiosa pode ocorrer em um local especial 
(específico) - seja por sua posição natural, como uma caverna ou um bosque de árvores ou em um 
lugar construído para esse fim. Por uma adoração requerer um foco especial, a maioria dos rituais 
é direcionada para um local específico. Podemos pensar no conjunto das paredes da tumba de 
Nakht, na qual os motivos iconográficos, de certa forma, são animados a partir da experiência 
religiosa, ativando o ciclo do Esquema 3. Como, então, podemos organizar esse espaço e o sistema 
cognitivo da TT 52? Para um monumento egípcio, especificamente uma tumba, podemos nos guiar 
a partir dos níveis que delimitam o discurso figurativo, proposto por Valérie Angenot (2010). 
A proposta de Valérie Angenot (2010), é que são oito as etapas de interpretação de uma 
construção egípcia, a saber: monumento, sala/câmara, parede, compartimento, registro, cena, figura 
e a subfigura. A autora defende que essas etapas de leitura, no entanto, constituem unidades dos 
sentidos isolados, cada uma assumindo uma função precisa dentro do microcosmo recriado pelo 
monumento e cada uma definida por sua própria estrutura (ANGENOT, 2010, p. 21). 
Reproduzimos abaixo essas etapas e a sua respectiva área interpretativa. 
 
1. Monumento 
• Espaço, limite, texto (quadro psicológico) 
2. Sala/câmara 
103 
 
• Parede, porta 
3. Parede 
• Externa: elementos arquitetônicos (colunas e cornijas) 
• Interna: frisos 
4. Compartimento 
• Linha fechada, coluna de texto, figura grande 
5. Registro 
• Linha aberta 
6. Cena 
• Um relatório cronológico, espacial ou paradigmático 
7. Figura 
• Contorno da imagem (exceto o vegetal), quadriculado (invisível) 
8. Subfigura 
• Contorno da imagem 
 
De acordo com Angenot (2010, p. 49), a capela do hipogeu egípcio do Reino Novo é 
orientada de leste (entrada) a oeste (fundo), de acordo com o curso do sol, do deus Rê em seu barco, 
que se levanta pela manhã no horizonte oriental e desaparece a oeste à noite para se regenerar. 
Dessa forma, este arranjo topográfico resulta no fato de que a cada manhã, a estrela do dia sobe na 
moldura da porta e vem batendo e seus raios incidem sobre duas paredes das tumbas, deixando o 
resto das câmaras na escuridão total. Estas seriam as primeiras paredes que um potencial visitante 
veria ao entrar na capela. Enquanto a decoração da tumba egípcia pode funcionar no vácuo e sem 
um espectador externo, algumas paredes são, no entanto, destinadas a ser vistas e entregar uma 
mensagem ao mundo exterior (ANGENOT, 2010, p. 49). Assim, a autora argumenta que essas duas 
partes das paredes acessíveis aos raios do sol forneciam ao visitante informações sobre o status 
social do dono do túmulo e suas relações com a instituição real (ANGENOT, 2010, p. 50). 
Poderíamos inserir a essa ideia a teoria de Amos Rapoport sobre o Ambiente Construído. 
Para Rapoport (1982, p. 13), as pessoas reagem ao ambiente em termos do significado que ele afeta 
na pessoa. Existe, portanto, uma forte conexão entre o ambiente e o seu significado, sua função, 
104 
 
para com o seu visitante, de modo que, conforme argumenta Rapoport (1994), aspectos do 
ambiente podem ser tão importantes para aqueles que efetuam atividades nele, que eles são 
condicionados a se comportarem de determinada maneira. Dessa forma, Rapoport (1976, p. 23) vê 
que, se um ambiente construído faz um sistema cognitivo visível, faz-se com que o humano entenda 
o mundo como significante a partir de suas distinções, classificações e definições de lugares, que, 
para o autor, são constituídos a partir da “noção de estar aqui ao invés de lá”. A partir disso, ao 
retomarmos às anotações de Renfrew (2014), podemos definir um ponto de encontro das duas 
teorias: um espaço determina uma ação para o humano a partir de uma rede cognitiva. 
Essa rede pode ser interpretada a partir das atividades ocorridas no ambiente, algo que 
Rapoport (1982, p. 18) defende que pode não estar sempre presente de forma explícita e, por isso, 
o faz refletir sobre a Comunicação Não-verbal, que pode ser contextualizada, analisada e 
interpretada por três características do ambiente: os elementos fixos (fixed-feature), os semifixos 
(semifixed-featured) e os não-fixos (nonfixed-feature). Para identificar tais elementos, a sociedade 
deve ser identificada e analisada em como o comportamento humano é feito no ambiente 
(Rapoport, 1982, p. 87). Os elementos fixos são aqueles que não mudam ou se modificam 
raramente ou de maneira lenta. Estes são organizados no espaço (geralmente com outros elementos) 
para comunicar um significado ao humano que o vivencia. Os semifixos são aqueles 
(objetos/coisas) que podem mudar de lugar, como uma cadeira ou mesa. Eles podem e mudam fácil 
e rapidamente, o que torna a análise deles mais difícil, uma vez que pode haver mudanças de 
significados com a mudança de contexto. Por fim, os elementos não fixos, humanos, que formam 
o sujeito dos estudos de Comunicação Não-verbal. 
No entanto, como podemos extrair um sentido cognitivo na tumba de Nakht? A partir da 
Teoria de Engajamento Material (TEM) de Lambros Malafouris (2013) podemos desenvolver 
melhor o problema, uma vez que ela nos proporciona uma forma de articular e trazer ao foco uma 
interação entre pessoas e as coisas por ser baseada em três fatores: a mente (ou a extensão mental, 
trabalho psicanalista), o signo ativo (a partir de uma perspectiva semiótica), e a agência material. 
Malafouris (2013, p. 17) argumenta que a tese central que une todos os diferentes níveis é que a 
relação entre cognição e cultura material não é de representação abstrata, ou alguma outra forma 
de ação à distância, mas, sim, de inseparabilidade ontológica (interna do ser). Isso significa que a 
compreensão da cognição humana está essencialmente interligada com o estudo das mediações 
105 
 
técnicas que constituem os nós centrais de uma mente humana materialmente estendida e 
distribuída, como podemos ver no esquema a seguir. 
 
Esquema 4: A visão de mundo representada. 
 
Fonte: adaptado de Malafouris (2013, p. 27). 
 
Utilizando o esquema de Malafouris e examinando-o em referência aos esquemas 1 e 4,podemos, agora, compreender um processo maior, o de como o discurso funerário foi circunscrito 
na tumba de Nakht. De acordo com Malafouris, podemos reconhecer a intenção cognitiva por trás 
de um material, interpretando a sociedade que o modelou a partir de uma esquematização um tanto 
simples de compreensão do processo. É interessante pensar nessa perspectiva de Malafouris e nos 
novos horizontes que a Arqueologia Cognitiva pode alcançar, pois, como defende o autor, somos 
habituados a estudar a Cultura Material como inerte e passiva (MALAFOURIS, 2018, p. 12). 
Seguindo a Teoria do Engajamento Material, podemos analisar essa Cultura Material como meios 
dinâmicos, perturbadores e mediacionais, cuja presença tem o potencial de alterar as relações entre 
os humanos e seus ambientes (MALAFOURIS, 2018, p. 12). Novos artefatos criam relações e 
106 
 
entendimentos do mundo. Utilizando o próprio exemplo do autor (MALAFOURIS, 2013, p. 175), 
ao lascar uma pedra, o humano o fizera refletindo através (through) da mesma, sobre a mesma e 
com a mesma, o que gerara o que Malafouris chama de “meta-cognição”, um pensamento sobre o 
pensamento. Isso gera uma marca no objeto, uma marca que será identificada como intenção. 
Atentando-nos ao Esquema 4, compreendemos que, no mundo, existem eventos X e Y, que serão 
interpretados e processados na mente do humano como X’ e Y’. Esse processo ocasionará um 
produto (E), realizado pelo seu corpo. 
 Exportando esse modo de compreensão para a TT 52, podemos inferir uma série de 
questões relevantes para essa pesquisa. O Modelo 1 é resultado de uma pesquisa que foi 
desenvolvida em conjunto com o professor Bruno Leonardo Canto Martins do Departamento de 
Física Teórica e Experimental da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, na qual 
projetamos a TT 52 tridimensionalmente no programa SketchUp para melhor visualizarmos todas 
problemáticas com base em Renfrew, Rapoport, Malafouris e Angenot. 
 
Modelo 1: Modelo da TT 52 feito no SketchUp. 
Fonte: construído em conjunto com o Prof. Dr. Bruno Leonardo Canto Martins (UFRN/DFTE) no 
programa SketchUp, com medidas baseadas em Kampp (1996), Laboury (1997), Davies (1917) e 
Porter e Moss (1980). 
107 
 
Para tornarmos possível a nossa projeção tridimensional da tumba de Nakht (TT 52), 
resolvemos utilizar o programa SketchUp, um dos mais comuns entre arquitetos e designers por 
ser um aplicativo não muito pesado e que contém diversos recursos criativos. O programa permite 
criar paredes, moldá-las para mostrar suas imperfeições, adicionar a informação do material 
utilizado nessa parede, criar objetos específicos e, também, tornar público o produto. Para tanto, 
utilizamos todos os desenhos, medições e fotografias feitos da tumba e que estavam disponíveis 
para serem utilizadas. Seguimos, portanto, um processo metódico. 
Em um primeiro momento, utilizamos as medições do catálogo feito por Norman de Garis 
Davies (1917) e da tese de Friederik Kampp-Seyfried (1996, p. 257-258) para projetarmos as 
paredes no espaço do aplicativo, iniciando com a camada superior (pátio, capela funerária, câmara 
interna e nicho da estátua Ka) para fazermos a camada inferior. Encontramos um problema ao 
projetarmos a câmara funerária: o terreno é irregular e as medidas computadas pelos dois 
egiptólogos acima não são exatas e correspondentes. Diante disso, resolvemos manter as medições 
correspondentes e ignorar as irregularidades, deixando a camada inferior com as paredes retas 
quanto ao eixo horizontal e respeitando as imperfeições do eixo vertical. 
Erguidas as paredes, tentamos resgatar os materiais que as compõem. Retiramos essas 
informações da tese de Fiederik Kampp (1996, p. 257-258) e do artigo de Dimitri Laboury (1997). 
Cada uma das colorações na projeção representa um material: os pedregulhos na parede sul do 
pátio, o arenito nas pilastras da entrada da tumba (provavelmente essas pilastras são construções 
do período moderno, para manterem uma porta e poderem fechar/guardar a tumba) e a rocha 
talhada em toda extensão da tumba (em cinza). As camadas desses diferentes materiais foram 
importadas de arquivos públicos de arquitetura depois de pesquisarmos quais são aquelas que mais 
se assemelham às egípcias. 
Feito isso, modelamos um bloco com 40 cm de altura, 20,7 cm de largura e 25,6 cm de 
profundidade. Nele inserimos as imagens da estátua Ka disponíveis no catálogo de Davies (1917) 
e no livro de Seidel e Shedid (1991). Esse bloco fora posicionado no nicho da estátua Ka. Para 
completar, utilizamos as imagens disponíveis pelo Metropolitan Museum of Art de Nova Iorque 
para inserirmos nas seis paredes da capela funerária, calculando suas posições a partir da 
planificação feita por Laboury (1997, p. 76-77). 
108 
 
 Compreendemos, assim, que a TT 52 possui um pátio aberto, que possibilita a incidência 
solar, com paredes laterais, as quais compõem a fachada da tumba, com um espaço disponível para 
os cones funerários. Em nosso modelo não pusemos um nicho para uma estatueta, uma vez que a 
estrutura da TT 52 pode ser enquadrada no tipo Vb e esse nicho aparece no nível médio da tumba, 
de modo a convergir para ela o olhar do visitante que entrasse no recinto. Sendo assim, 
interpretamos que existia um foco visual na estrutura da tumba que guiaria o visitante e o faria 
revitalizar o morto no Além. Embora não possamos reconstituir a câmara funerária da tumba, por 
ela possuir uma significativa falta de dados concretos quanto à medição, e por sabermos que nesse 
recinto não existem paredes decoradas, a nossa projeção serve para visualizar melhor, mesmo que 
remotamente, a TT 52 e, portanto, sugerir uma esquematização dos rituais efetuados no espaço. 
Contudo, ainda possuímos mais um ponto que podemos incorporar à nossa análise: os objetos 
encontrados na tumba e elencados por Davies (1917). 
 
3. OS OBJETOS 
 
Conforme mencionamos anteriormente, entre 1907 e 1910, Norman de Garis Davies 
coordena a escavação da TT 52. Durante esse período, Davies descreve que o Serviço de 
Antiguidades não havia limpado o poço (e, portanto, nem a câmara funerária), cabendo a ele a 
descoberta dos objetos que acompanharam Nakht em seu enterro. De acordo com Davies (1917, p. 
39-43), eles são45: 
 
1. Fragmento da parte superior do caixão de um homem em madeira vermelha, com um rosto 
pintado. A peruca pintada de preto com listras amarelas. As sobrancelhas e os olhos foram 
embutidos com vidro colorido, provavelmente; 
2. Fragmento da parte superior do caixão de uma mulher de um tipo semelhante ao anterior, 
em madeira comum. Os olhos foram pintados com tinta preta e sobrancelhas em azul; 
 
45 A listagem a seguir fora traduzida e adaptada por nós, mas as páginas do catálogo referentes a ela estão 
disponibilizadas no Anexo F (Cf. p. 349-352 desse volume). Os apontamentos feitos nas próximas duas 
notas de rodapé são com base nos escritos de Davies para o objeto. 
109 
 
3. Fragmento semelhante aos anteriores, com o rosto pintado de amarelo e olhos e 
sobrancelhas como o item 2; 
4. Pedaços de um caixão de tom preto com decoração em amarelo claro. Existe uma figura 
semelhante a uma deusa nele. Uma legenda percorreu uma coluna longitudinal na tampa é 
dedicada aos deuses funerários. O nome é ilegível; 
5. Parte da haste de um descanso de cabeça octogonal, bem detalhado. O encaixe foi 
habilmente feito pelo uso de pinos bifurcados retirados de galhos; 
6. Dois pedaços de um cetro (provavelmente colocado originalmente no caixão com o corpo); 
7. Duas das quatro pernas e a barra de conexão de uma mesa pequena ou suporte de madeira. 
As pernas eram quadradas de 25 mm no encaixe e curvadas ligeiramente para fora. A mesa 
devia ter 48 cm de comprimento e tinha pouco menos de 30 cm de altura; 
8. Três das quatro pernas, em formato de pata de leão, e um pedaço do assento de uma cadeira 
de madeira baixa, pintada de preto, 24 cm de altura na frente46;9. Um conjunto similar ao anterior, pintado de branco. Dois lados da moldura são perfurados 
com dezoito orifícios para tirar a corda ou tangas do assento, que era de cerca de 60 cm e 
levantado 26 cm do chão na frente; 
10. Três pernas de uma cadeira mais rústica e um pouco mais alta, pintada de preto; 
11. O trilho superior de uma cadeira, com cinco buracos, um largo no centro e dois menores de 
cada lado. Tem 37,5 cm de comprimento, e, sendo preto, talvez pertença ao item 8. 
12. Um suporte de madeira para fortalecer uma junta de uma mesa ou da cadeira do item 11; 
13. As laterais quebradas e a tampa de uma caixa de madeira de 40 cm de comprimento, pintada 
em preto e branco; 
14. Partes das laterais, extremidades e tampa de uma ou duas caixas cerca de 35 cm por 19 cm, 
pintadas com faixas brancas no preto e um painel central em vermelho, sendo a tampa 
ligeiramente arqueada; 
15. Um vaso fino (quebrado) de cerâmica amarela pintada com quatro fileiras de pétalas azuis 
entre linhas vermelhas compostas. Ele teria cerca de 30 cm de altura, sendo o fragmento 
real de 28 cm de comprimento e 8,25 cm de largura na boca; 
16. Dois potes vermelhos grossos, de 12 e 19 cm de altura, com pescoço em forma de costela 
e faixas vermelhas escuras pintadas nas orelhas e no ombro; 
 
46 As pernas traseiras são menores, de modo a dar uma inclinação confortável para o assento. 
110 
 
17. Um jarro de cerâmica vermelho com alça, decorado com uma linha preta dupla na junção 
do pescoço e ombro. Linhas duplas similares vão deste para o pé, com manchas pretas entre 
as linhas; 
18. Três cones funerários inscritos com o nome e títulos de Nakht e sua esposa47; 
19. Uma pequena vara de madeira para aplicar maquiagem nos olhos; 
20. Um grampo de cabelo de madeira. 
 
O maior problema dessa lista de vinte itens é que, na época, foi feita foto apenas de uma 
pequena parte. Como podemos ler em alguns boletins do MET, parece que o interesse maior dessa 
escavação foi com as paredes da tumba: 
 
Pode ser verdade que a popularidade da tumba se deva tanto à sua acessibilidade 
e boa preservação quanto ao seu mérito intrínseco. Mas, por apresentar a arte 
mural e as cenas típicas do período sem qualquer deterioração séria de cor ou 
linha, ela merece publicação e estudo muito cuidadosos (THE METROPOLITAN 
MUSEUM OF ART, 1917, p. 131)48 
 
e com a estátua Ka de Nakht. 
 
Em contraste com esse trabalho infrutífero [sobre as tumbas de Userhêt, TT 51, e 
Thothemhab TT 45], algumas pequenas escavações realizadas com o mesmo 
propósito na tumba de Nakht tiveram uma recompensa descoberta, uma 
encantadora estatueta pintada do proprietário sendo encontrada deitada no 
enchimento do poço do cemitério, onde foi lançada de seu nicho na parede da 
câmara acima por aqueles que saquearam o túmulo nos tempos antigos. [...] Seu 
acabamento é excelente e se assemelha à decoração mural deste túmulo por ser 
inteiramente típico de um bom trabalho da época, ambas as lajes nas quais um 
 
47 Dois deles estariam em posse de Davies, outro no Museu do Cairo, juntamente com um tijolo em forma 
de cunha de argila queimada estampado em três lados com a mesma impressão, que Davies acredita ser 
derivado da limpeza de M. Grébaut da tumba. 
48 No original: It may be true that the popularity of the tomb has been due as much to its accessibility and 
good preservation as to its intrinsic merit. But by presenting the average mural art and the typical scenes 
of the period without any serious deterioration either in color or line, it deserves very careful publication 
and study (THE METROPOLITAN MUSEUM OF ART, 1917, p. 131). 
111 
 
endereçamento ao deus-sol é recortado em hieróglifos incisos amarelos (DAVIES, 
1915, p. 234-235)49 
 
Sobre a estátua, Davies (1917, p. 36) comenta que ela foi destinada ao MET como objetos 
encontrados no inverno de 1914-15, no entanto, ela foi perdida por ocasião do envio para Nova 
Iorque, quando o navio foi afundado por um submarino no verão de 191550. O que nos resta dela 
são apenas as três fotografias retiradas na escavação, em diferentes perspectivas (Figura 40). 
Sobre os outros objetos, fora as imagens e informações que temos disponíveis no Corpus 
dessa dissertação, baseadas na listagem acima, não temos muitos dados sobre esses achados. No 
site do MET temos disponível o vaso número 15 na lista acima51 e um dos cones funerários do 
número 18, justamente um dos que estava em posse de Davies52. Não conseguimos rastrear os 
demais objetos. Poderíamos supor que estavam no mesmo navio da estátua? Ou eles foram para o 
Museu do Cairo53? Ou estão na reserva técnica do MET? Infelizmente, não temos (ou não 
encontramos até o momento de fechamento da escrita dessa dissertação) um boletim para responder 
essa dúvida. Portanto, precisaremos trabalhar com os dados da lista acima. 
 A TEM54 de Malafouris e os elementos fixos e semi-fixos de Rapoport podem nos guiar na 
classificação de cada um dos elementos encontrados na tumba. Conforme afirmamos, não 
possuímos as fotografias ou uma certeza da localização atual de todos os elementos encontrados 
por Davies. Por isso, trabalharemos em cima da listagem feita dos vinte achados, utilizando, sempre 
 
49 No original: In contrast with this unfruitful labor some slight excavations entered on with the same 
purpose in the tomb of Nakht had an unlocked-for reward, a charming painted statuette of the owner being 
found lying in the filling of the burial shaft, where it had been thrown from its niche in the wall of the 
chamber above by those who plundered the tomb in ancient times. [...] Its workmanship is excellent and 
resembles the mural decoration of this tomb in being thoroughly typical of good work of the period both 
slab on which an address to the sun-god is cut in yellow incised hieroglyphs (DAVIES, 1915, p. 234-235). 
50 Seidel e Shedid (1991, p. 19) comentam que esse submarino era alemão, vinculando o caso com o contexto 
da Primeira Guerra Mundial. 
51 De acordo com o site do museu, o objeto foi comprado em Luxor em 1915. 
52 Esse objeto teria sido doado em 1930 ao MET pelo próprio Davies. 
53 Assim como o cone funerário do número 18, que o Davies afirma ter encaminhado ao Museu do Cairo, 
poderíamos supor que os demais objetos também foram. 
54 A sigla em inglês da Teoria do Engajamento Material (Material Engagement Theory) é “MET”, mesmo 
conjunto que utilizamos para o Museu Metropolitano de Nova Iorque. Portanto, optamos pela sigla de nossa 
tradução em português e a utilizaremos a partir desse ponto da dissertação. 
112 
 
que pudermos, das imagens disponíveis deles e, quando não for possível, basear-nos-emos na 
descrição de Davies (1917, p. 39-43). 
 
Fragmentos de caixões 
 
 Os itens 1 ao 4 (Cf. p. 109-110) nos indicam que Davies encontrou, pelo menos, três caixões 
distintos. O primeiro documentado seria um fragmento da parte superior do caixão de um homem, 
muito provável que seja o de Nakht, em madeira vermelha e uma pintura de um rosto, com peruca 
pintada de preto com listras amarelas. Davies supõe que as sobrancelhas e os olhos seriam de vidro 
colorido, embutido na madeira. Caso isso fosse considerado, teríamos um tipo de caixão de 
particular que seria destacado justamente pela inserção do trabalho com vidro, uma vez que Paul 
Nicholson, ao explicar sobre esse tipo de trabalho, defende que tanto o vidro quanto a faiança eram 
tratadas como pedras preciosas artificiais (NICHOLSON, 2000, p. 195). O segundo ponto indica 
que fora encontrado outro fragmento da parte superior do caixão de uma mulher, provavelmente 
Tawi, do mesmo tipo do de Nakht; porém, com os olhos pintados em preto e as sobrancelhas em 
azul. O terceiro fragmento também pertence à parte superior do caixão, como os dois anteriores; 
no entanto, sem muitas informações a não ser que o rosto é amarelo e a pintura dos olhos e 
sobrancelhas como o segundo. Por fim, o quarto ponto é do corpo de um caixão de fundo amareloclaro e decoração preta, provavelmente para remeter aos papiros. Nesse fragmento, Davies (1917, 
p. 39) alega que existe uma figura semelhante a uma deusa e uma legenda em coluna longitudinal 
na tampa, e dedicatórias aos deuses associados à questão funerária nas bordas laterais. O nome do 
morto é ilegível de acordo com Davies. 
John Taylor (1989, p. 30-34) afirma que a maioria dos achados da XVIII Dinastia indicam 
que o morto possuía um caixão, que podia ser de dois tipos (um decorado com listras e outro com 
inscrições que remetiam aos costumes funerários do Reino Médio) e uma máscara funerária, de 
modo que não havia muita distinção entre os gêneros dos donos ou de que um proprietário possuía 
diversos caixões ou máscaras funerárias. Dessa forma, a título de comparação, poderíamos trazer 
a tampa do caixão de Tamyt (Figura 2.11), encontrada em Tebas e produzida na mesma 
113 
 
temporalidade que a tumba de Nakht (c. 1400 A.E.C.). Trata-se de um caixão antropomórfico de 
madeira pintada, no rosto, os olhos e sobrancelhas são pintados com betume, de acordo com 
Margaret Serpico (2010, p. 460); a peruca é semelhante à descrição de Davies sobre o caixão de 
Nakht, pintada de preto com listras amarelas, além de um colar representado no peito e, abaixo 
dele, um abutre pintado com as asas abertas, simbolizando Nut, com inscrições indicando o papel 
da deusa em proteger o morto. Além disso, existem representações de Anúbis e os Quatro Filhos 
de Hórus, assim como inscrições funerárias. O curador dessa peça afirma que a família de Tamyt, 
provavelmente, não estaria entre as mais ricas de Tebas, tanto pelo material quanto pelo fato de 
que seu nome foi alocado posteriormente à construção do caixão, o que indica que este não foi feito 
especificamente para ela55. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
55 As informações do caixão de Tamyt estão disponíveis em: 
https://www.britishmuseum.org/collection/object/Y_EA6661. Acesso em: 16 jan. 2021. 
114 
 
Figura 2.11: Caixão de Tamyt. 
 
Fonte: Museu Britânico (EA 6661). 
 
A partir do caixão de Tamyt podemos inferir algumas comparações com os encontrados na 
TT 52. A primeira que levantaremos aqui é a peruca. A associação do morto com a divindade solar 
é algo que podemos perceber na literatura funerária desde os Textos das Pirâmides. No Livro da 
115 
 
Vaca do Céu, que narra um mito de destruição da humanidade e a ascensão de Rê aos céus (limitado 
às costas de Nut), podemos ver na abertura do conto a descrição de que à medida que Rê iria 
envelhecendo, seus ossos se tornariam prata, sua carne, ouro, e seu cabelo, lápis-lazúli 
(LICHTHEIM, 1976, p. 198). A associação do morto com Rê em relação a essa questão de ossos 
serem prata, a carne ser ouro e o cabelo ser lápis-lazúli na cultura material é bem nítida na máscara 
do Tutankhamon, com o rosto em ouro e a peruca em ouro e lápis-lazúli. No caixão de Tamyt 
percebemos que esse discurso funerário não é algo apenas pertencente à realeza, podendo ser real 
a possibilidade de associação do rosto da morta ser pintada em amarelo, representando ouro. 
Sabemos, a partir da descrição de Davies, que o rosto do terceiro fragmento é amarelo, talvez a 
mesma associação, e que as sobrancelhas do rosto do segundo e terceiro fragmentos são azuis, 
referência aos cabelos de lápis-lazúli. De acordo com Nicholson (2012, p. 22), a técnica de pintura 
de vidro já era conhecida no Reino Novo, um período em que era muito comum o uso do vidro de 
azul cobalto escuro, cor que se assemelha ao lápis-lazúli. Dessa forma, poderíamos supor que o 
vidro que estaria na sobrancelha do primeiro fragmento documentado por Davies seria, de fato, um 
vidro de coloração azul cobalto escuro. 
Uma segunda comparação que podemos fazer é sobre o quarto fragmento documentado por 
Davies. O autor indica que estaria representada uma figura semelhante a uma deusa. É comum ver 
representações de Isis e Néftis protegendo o morto. No entanto, como Davies (1917, p. 40) utiliza 
a expressão no singular (A goddess stands), devemos pensar em uma divindade que proteja o morto 
“sozinha”. De acordo com Nils Billing (2002, p. 17), um dos papéis da deusa Nut, uma divindade 
comum nessa literatura funerária, é o de proteger o morto como uma mãe. Billing (2002, p. 17) 
argumenta que, desde os TP, Nut aparece protegendo o morto como um abutre a partir do trocadilho 
da palavra nri, que significa “proteger”, com nrt, “abutre”, e mwt, “mãe”56. O discurso funerário 
presente no caixão de Tamyt é que Nut aparece como abutre protegendo a morta. Dessa forma, não 
seria totalmente errado supor que seria essa a representação que comenta Davies para o quarto 
fragmento. 
A terceira comparação plausível seria a especulação sobre quem seriam os deuses funerários 
presentes no quarto fragmento. Davies descreve-os como gods of burial (DAVIES, 1917, p. 40). 
 
56 Como iremos ver ao tratarmos da inscrição da estatueta de Nakht, a deusa Mut (mwt) aparece efetuando 
esse papel materno para Rê no hino solar. 
116 
 
Em um primeiro momento, acreditamos que não tenha muita diferença com o nosso conhecimento 
atual sobre quem podem ser esses deuses que Davies faz referência, uma vez que podemos 
visualizar em um livro do período, como o de E.A. Wallis Budge, intitulado Egyptian ideas of the 
future life, lançado em 1900, o título de gods of burial utilizado para deuses como Osíris, Anúbis, 
Isis e Néftis, por exemplo, algo que atualmente pode ser utilizado, mas que exige uma maior 
complexidade. Não acreditamos que ele tenha se referenciado pelos Quatro Filhos de Hórus nesse 
momento, como são as inscrições do caixão de Tamyt, uma vez que ele os chama de the four genii 
of burial (DAVIES, 1917, p. 49). Portanto, provavelmente as divindades presentes no fragmento 
seriam como as descritas por Budge (1900), embora não possamos descartar totalmente a opção de 
serem, de fato, os Quatro Filhos de Hórus nos fragmentos encontrados. 
Por fim, é interessante pensar sobre quem seria o outro fragmento de caixão feminino, uma 
vez que o mais lógico de indagar é que o primeiro (masculino) seria de Nakht e algum dos outros 
dois seria de Tawi. O outro feminino seria o da filha do casal? Seria uma das filhas representadas 
na cena de caça e pesca no pântano (Parede Noroeste da Capela da TT 52), mas o nome dela não 
aparece nas inscrições. Não temos conclusão para esse dilema, mas, se considerarmos o que 
Kathlyn M. Cooney afirma, compreendemos que, na XXI Dinastia, é comum encontrar vestígios 
de caixão com cenas e inscrições que servem de suprimento para o morto caso não haja decoração, 
estatuária ou estrutura apropriada na tumba do/para o morto, de modo que o papel de prover o Além 
e mantê-lo nesse espaço deriva da decoração dos caixões (COONEY, 2011, p. 20). De acordo com 
a autora, essa prática tem início no Reino Médio com os TC e que vai se estabelecendo no Reino 
Novo, mas que, com o processo de abertura do acesso ao espaço funerário, se consolida no final 
desse período (com a XXI Dinastia). Se a prática não pode ser descartada por completo no início 
do Reino Novo, poderíamos então supor que esse terceiro caixão seria, de fato, pertencente a 
alguém próximo a Nakht e Tawi, com o mais provável ser um vínculo de uma geração de diferença 
(mãe ou filha) e que essa pessoa estaria assegurando sua vida no Além a partir das inscrições 
contidas no caixão. 
Devemos inserir uma consideração aqui ao item 6 da lista de Davies: dois pedaços de um 
cetro. Davies (1917, p. 40) indaga sobre o cetro, dizendo que ele, provavelmente estaria junto à 
múmia e, portanto, dentro do caixão. De forma geral, esses objetos possuem um significado 
atrelado ao de poder para essa sociedade (WILKINSON, 1992, p. 181-183). O tipo de cetro na 
117 
 
tumba de Nakht, de acordo com Davies, seria um simples, para auxiliar a andar, algo que também 
fora encontrado em outras tumbas (SMITH, 1992, p. 209). 
É claro quedevemos considerar o fato de que, se Davies encontrou apenas fragmentos 
desses documentos, é muito provável que a tumba fora vítima de ladrões de tumbas. Não temos 
comprovações disso, mas, como podemos atestar nos papiros elencados por T. Eric Peet (1930), o 
roubo de tumbas e templos era comum na Antiguidade, tornando algo um tanto impossível de se 
rastrear. Dessa maneira, acreditamos que devemos considerar as decisões tomadas na análise desses 
primeiros quatro fragmentos são apenas sugestões e que não podem ser conclusivas. 
 
Mobília 
 
 Abordaremos os itens 5, 7, 8, 9, 10, 11 e 12 da listagem de Davies (Cf. p. 109-110). O item 
5 seria uma parte da haste de um descanso de cabeça octogonal, que Davies adjetiva como bem 
detalhado, descrevendo que fora habilmente feito pelo uso de pinos bifurcados retirado de galhos. 
Infelizmente, não temos a foto do objeto, mas, na Figura 2.12, podemos ver um exemplo de 
descanso de cabeça do mesmo tipo do encontrado na TT 52, um que possui oito superfícies planas 
(por isso, o nome octogonal). 
De acordo com Jan Summers Duffy (2016, p. 230), esses objetos fazem parte de uma 
conjuntura de mobílias interessantes de serem analisadas pois indicam que eles eram considerados 
essenciais para a vida cotidiana e, por isso, seriam considerados necessários no Além. De acordo 
com D’Auria, Lacovara e Roehrig, esse objeto, em um primeiro momento, tinha um significado 
prático: servir de apoio para a cabeça do morto. Depois (e aqui os autores não indicam o período), 
eles serviam como amuletos (D’AURIA; LACOVARA; ROEHRIG, 1988, p. 225). 
 
 
 
 
118 
 
Figura 2.12: Descanso de cabeça octogonal. 
 
Fonte: Museu do Brooklin (14650). 
 
 Acreditamos que o objeto tenha um sentido mais complexo quando inserimos o discurso 
funerário do período. No Capítulo 166 do LDM, intitulado como a fórmula para o descanso de 
cabeça, temos uma sequência um tanto interessante: 
 
Os menut acordam-te, tu que estavas adormecido, N.: eles acordam-te no 
horizonte. Levanta-te! [...] Tu és Hórus, o filho de Hathor [sic], o 
Incandescente (filho do) Incandescente, aquele a quem foi restituída (a sua) 
cabeça depois de ter sido cortada; a cabeça não te será roubada, a tua cabeça 
não te será roubada, nunca mais (LOPES, 1991, p. 247). 
119 
 
Existe, portanto, uma preocupação com a cabeça e, principalmente, de que ela não seja roubada ou 
cortada, também presente no Capítulo 43 do LDM: 
 
Que ele diga: Eu sou o grande, filho do grande, o incandescente, filho do 
incandescente, a quem foi restituída a cabeça depois de ter sido cortada. 
Não retirarão a cabeça a Osíris, não me retirarão a minha cabeça. Eu estou 
reconstituído, eu estou rejuvenescido, eu estou revigorado, eu sou Osíris, 
senhor da eternidade (LOPES, 1991, p. 247). 
 
Duffy (2016, p. 230) argumenta existe uma certa preocupação entre os egípcios sobre o ato 
de dormir, uma vez que são comuns textos dizendo “durma bem” e que simbolizam uma proteção 
contra superstições e perigos durante o sono, tanto é que, de acordo com o autor, podemos encontrar 
a divindade Bés57 representada em alguns exemplares. Além disso, é interessante o trocadilho na 
língua egípcia na palavra para descanso de cabeça (wrs) com a palavra rs, o que significa “sonho” 
(DUFFY, 2016, p. 230). Para Duffy (2016), o significado religioso e a necessidade de “levantar a 
cabeça mais alto” tornaram-se importantes enquanto dormiam e até mesmo após a morte, já que, 
para uma cerimônia funerária, a cabeça do morto era levantada ou apoiada em um descanso de 
cabeça no caixão ou sarcófago. 
Stuart Tyson Smith (1992), ao expor a pesquisa que realizou em tumbas que foram 
encontradas intactas e datadas da XVII e XVIII Dinastia, em Tebas, indicou que a maioria dessas 
tumbas (incluindo as menos ricas), apresentavam ao menos um descanso de cabeça (SMITH, 1992, 
p. 205). É interessante esse dado ser levantado por Smith, uma vez que percebemos que, em 
cemitérios que não fazem parte das grandes cidades do Egito no Reino Novo, como o de Sidmant, 
na área do Fayum, estudado por Koichiro Wada (2007), não apresentam um número muito grande 
de descansos de cabeça e, como afirma Wada (2007, p. 372), não parecem ser comuns à essa parte 
da sociedade, mesmo que haja muitas mobílias encontradas nessa região para o período. 
 
57 Uma divindade de baixa estatura, com traços leoninos (juba, rabo, patas), que era utilizado como amuleto 
para proteger crianças e mulheres no parto. 
120 
 
Talvez seja importante ressaltar que, os descansos de cabeça eram utilizados tanto por 
homens quanto por mulheres, explicável a partir da variação de tamanho e design. A altura do 
objeto em si pode não ter sido importante, mas dependia do comprimento do pescoço que segurava, 
seja homem, mulher ou criança. De acordo com Duffy (2016, p. 231), o descanso de pescoço tinha, 
em média, 15 cm de altura. Dessa forma, não podemos concluir que o item 5 da listagem de Davies 
seja, de fato, de Nakht ou de Tawi, mas compreendemos que era algo comum nessa região de Tebas 
e que poderia simbolizar tanto uma necessidade cotidiana que seria transposta no Além (o morto 
precisa dormir no Além), quanto uma forma de proteger a cabeça de roubos ou cortes. 
O sétimo item da lista seria uma mesa. Davies alega que encontrou duas das quatro pernas 
da mesa e a barra de conexão entre elas. As pernas eram quadradas, com 25 mm no encaixe da 
barra, além de serem ligeiramente curvadas para fora. De acordo com Davies, essa mesa deveria 
ter 48 cm de comprimento e pouco menos de 30 cm de altura. As mesas, nesse contexto funerário, 
podem representar dois papéis bem interessantes. O primeiro é o de mesa de oferendas. No Além, 
o morto necessita receber certas oferendas no Egito terreno para que permaneça vivo nesse espaço. 
O seu Ba viaja pelo Egito terreno de dia para retornar à tumba e se reencontrar com suas outras 
partes, assim como o seu Ka recebe oferendas derivadas de visitantes da tumba. Ambas as esferas 
efetuam atos em prol do morto para que essas oferendas cheguem ao seu destino. O segundo papel 
está atrelado com o jogo, por ter sido o local que apoiava o tabuleiro. O jogo mais famoso para o 
período de Nakht é o Senet58, que, inclusive, aparece no Capítulo 17 do LDM: 
 
Fórmulas para elevação e transfiguração, para sair da necrópole, por estar 
próximo de Osíris, e estar contente com a comida de Wennefer, saindo de 
dia, tomando qualquer forma desejada para ser tomada, jogando o senet, 
estando no pavilhão, uma alma viva, o Osiris N entre os reverenciados 
diante da grande Enéada59, que está no Oeste, depois que ele atracar. Isso é 
bom para quem faz isso na Terra. As palavras se passam, em conclusão 
(BOOK OF THE DEAD, 2002). 
 
58 Este era um jogo de tabuleiro que, como podemos ver na Figura 2.13, consistia em três fileiras de casas 
com dez espaços. O jogo possuía o objetivo de atravessar o peão para o outro lado do tabuleiro, 
provavelmente um simbolismo para o Além. 
59 Grupo de nove deuses egípcios, psDt ( ) em egípcio antigo. 
121 
 
 
Existem exemplares do jogo em diversos períodos do Egito antigo. Na Figura 2.13, 
podemos ver um modelo encontrado em uma tumba em Ábidos, feito de faiança, na mesma 
temporalidade de Nakht. É interessante constatar que o contexto de achado desses tabuleiros é, 
geralmente, funerário; além disso, snit, a palavra em egípcio para o jogo, pode ser compreendida 
também por “passagem” ou “sobrepassar”, sni, (GARDINER, 1993, p. 180). Isso nos permite 
indagar que cada uma das trinta casas deveria representar uma questão do Além, uma dificuldade 
que será perpassada pelo morto e, com respaldo no Capítulo 17, é algo interessante para o morto. 
 
Figura 2.13: Jogo senet encontrado na tumba de Merymaat, em Ábidos. 
 
Fonte: Metropolitan Museum (01.4.1a). 
 
122 
 
Os pontos do 8 ao 12 são fragmentos de cadeira e possuímos alguns desses fotografados 
por Davies. No Corpus dessadissertação podemos encontrar os detalhes desses objetos, bem como 
a fotografia (Cf. p. 48-49 do Volume II). Uma cadeira, em contextos de banquetes funerários, por 
exemplo, indica o status social daquela pessoa. As cadeiras com pernas representando patas de 
animais são as mais comuns entre os exemplares encontrados em tumbas tebanas da XVIII Dinastia 
e, de acordo com os dados levantados por Smith (1992, p. 205), nas tumbas intactas podemos 
identificar que essas cadeiras aparecem em quase todas as tumbas, tornando-se um elemento 
essencial para essas tumbas do Reino Novo. 
 Entre os achados na TT 52 temos a probabilidade de que os fragmentos descritos por Davies 
pertencessem a três cadeiras distintas. No item 8 é descrito três das quatro pernas de uma cadeira, 
com um pedaço do assento. Essa cadeira seria baixa e pintada de preto. A Figura 2.14 nos traz o 
esboço do objeto60. O item 9 é composto por pernas de uma cadeira baixa de madeira pintada de 
branco (Figura 2.15)61 e as partes laterais de uma cadeira baixa de madeira pintada de branco 
(Figura 2.16)62. No item 10, Davies comenta que encontrou três pernas de uma cadeira mais rústica 
que as demais e um pouco mais alta também, pintada de preto. No entanto, na fotografia temos 
apenas duas dessas três pernas, esboçadas na Figura 2.1763. O item 11 documenta o trilho superior 
de um encosto da cadeira, com três furos, que serviam para sustentar as colunas verticais, uma larga 
no centro e dois menores de cada lado (Figura 2.18)64. Por fim, o item 12 (não fotografado) indica 
a existência de um suporte de madeira para fortalecer uma junta de mesa ou da cadeira do item 11. 
 
 
60 No Corpus ela pode ser encontrada como o item 12 da fotografia (Cf. p. 49 do Volume II). 
61 No Corpus elas podem ser encontradas como os itens 10 e 11 da fotografia (Cf. p. 49 do Volume II). 
62 No Corpus elas podem ser encontradas como os itens 5 e 7 da fotografia (Cf. p. 49 do Volume II). 
63 No Corpus elas podem ser encontradas como os itens 8 e 9 da fotografia (Cf. p. 49 do Volume II). 
64 No Corpus ela pode ser encontrada como o item 6 da fotografia (Cf. p. 49 do Volume II). 
123 
 
Figura 2.14: Esboço do item 8 da listagem de Davies. 
Fonte: Desenho feito por Pedro Hugo Canto Núñez (2020) com base na fotografia de Davies (1917, 
Pr. XXIX). 
 
Figura 2.15: Esboço do item 9 (pernas da cadeira) da listagem de Davies. 
Fonte: Desenho feito por Pedro Hugo Canto Núñez (2020) com base na fotografia de Davies (1917, 
Pr. XXIX). 
124 
 
Figura 2.16: Esboço do item 9 (partes laterais da cadeira) da listagem de Davies. 
Fonte: Desenho feito por Pedro Hugo Canto Núñez (2020) com base na fotografia de Davies (1917, 
Pr. XXIX). 
 
Figura 2.17: Esboço do item 10 da listagem de Davies. 
Fonte: Desenho feito por Pedro Hugo Canto Núñez (2020) com base na fotografia de Davies (1917, 
Pr. XXIX). 
125 
 
Figura 2.18: Esboço do item 11 da listagem de Davies. 
Fonte: Desenho feito por Pedro Hugo Canto Núñez (2020) com base na fotografia de Davies (1917, 
Pr. XXIX). 
 
 É muito provável que a existência dessas três cadeiras tenha como referência os três caixões 
da tumba. Isso pode nos indicar que, de fato, os três caixões eram da TT 52, assim como essas três 
cadeiras parecem pertencer a cada um dos mortos. Talvez possamos determinar, com base nas 
descrições de Davies, a cadeira de cada membro. Uma vez que temos três cadeiras com patas de 
leão representadas, sendo duas pintadas de preto e outra de branco, podemos supor que a branca 
seja de Nakht e as duas outras de Tawi e da outra mulher enterrada com eles. Além disso, as partes 
laterais, também brancas, fariam parte da cadeira de Nakht. Não podemos concluir nada sobre o 
item 11, uma vez que nos faltam informações para isso. No entanto, isso já basta para 
compreendermos que, ao menos uma das três cadeiras, possuía um encosto, o que é possível se 
estender para as outras duas esse padrão, já que é comum que bancos encontrados em outras tumbas 
não tenham tantos detalhes em suas pernas. Podemos inferir ainda que a cadeira considerada mais 
rústica por Davies pertenceria à outra mulher, seguindo a lógica de que Tawi efetua um papel 
fundamental em acompanhar Nakht ao Além nas imagens disponíveis na tumba e, portanto, seria 
mais importante que essa terceira pessoa. Por fim, não podemos determinar muito a respeito do 
item 12, a não ser que, se enterraram esses equipamentos funerários (seja a mesa ou as próprias 
cadeiras), é provável que houvesse a preocupação de criar um objeto que pudesse suportar algo 
pesado. Se inferirmos que este item pertencesse a uma das cadeiras, suporíamos que um desses 
mortos seria gordo, determinando-o como alguém com condições financeiras de ser bem 
alimentado, possuindo um status mais elevado nessa sociedade, talvez Nakht? 
126 
 
Caixas 
 
 Davies elenca, nos itens 13 e 14 (Cf. p. 109-110), o que provavelmente são duas caixas 
distintas65. A primeira é descrita como as laterais quebradas e a tampa de uma caixa de madeira de 
40 cm (total pressuposto por Davies) de comprimento, pintada de preto e branco (Figura 2.19), 
enquanto a segunda é descrita como as partes das laterais (Figura 2.20), extremidades e tampa de 
uma ou duas caixas com 35 cm por 19 cm, pintadas com faixas brancas no preto e um painel central 
em vermelho, sendo a tampa ligeiramente arqueada. Não temos essa tampa ligeiramente arqueada 
ou mais fotos sobre a primeira caixa. Davies (1917, p. 41), entretanto, comenta que caixas 
semelhantes foram encontradas em outras tumbas e que estas eram, provavelmente, destinadas a 
guardar os shabtis. 
 
Figura 2.19: Esboço do item 13 da listagem de Davies. 
Fonte: Desenho feito por Pedro Hugo Canto Núñez (2020) com base na fotografia de Davies (1917, 
Pr. XXIX). 
 
65 No Corpus elas podem ser encontradas como os itens 1, 2, 3 e 4 da fotografia (Cf. p. 49 do Volume II). 
127 
 
Figura 2.20: Esboço do item 14 da listagem de Davies. 
Fonte: Desenho feito por Pedro Hugo Canto Núñez (2020) com base na fotografia de Davies (1917, 
Pr. XXIX). 
 
 Os shabtis são pequenas estatuetas de trabalhadores feitas de materiais diversos, que tinham 
como função substituir o morto no Além. De acordo com Henk Milde (2012, p. 2), durante o Reino 
Novo, a palavra Sbty é encontrada para designar essas pequenas estatuetas, provavelmente é uma 
derivação do verbo Sbj, que significa “substituir”. Jean-Luc Bovot (2003, p. 53-55) defende que 
essas estatuetas podem realizar trabalhos braçais para o morto no Além. Temos alguns Capítulos 
do LDM que indicam que o morto precisa efetuar esse tipo de trabalho, como o Capítulo 110, 
analisado por nós outrora (VASQUES; CANTO NÚÑEZ, 2018), mas que demonstra um espaço 
específico do Além66. 
Se compararmos com uma caixa de shabtis (Figura 2.21) encontrada em Tebas na XIX 
Dinastia, vemos que a tampa da caixa é, de fato, arqueada, e que as laterais são retas. Na imagem, 
vemos uma caixa com uma cena de oferendas de uma mulher (Henutmehyt) para Anúbis e Osíris, 
vemos ainda oito shabtis, dos quais quatro estão dentro da caixa e os outros fora, uma disposição 
do museu. Embora não tenhamos, na Figura 2.19 e Figura 2.20, alguma representação como no 
exemplo, acreditamos que as partes da caixa encontradas por Davies seja parte de um exemplar 
semelhante, uma vez que, de acordo com Smith (1992, p. 199-200), essas caixas fazem parte do 
cortejo funerário, mas o achado delas não é constante. Sendo assim, não podemos concluir se essa 
 
66 Entraremos em mais detalhes sobre esse espaço no Capítulo 3, quando trataremos sobre a representação 
do Capítulo 110 do LDM nas cenas da TT 52. 
128 
 
caixa seria de Nakht ou de Tawi, por ser um objeto que pode ser encontrado para ambos os gêneros 
e não haver nenhuma inscrição indicando o proprietário. 
 
Figura 2.21: Caixa de shabtis de Henetmehyt. 
Fonte: Museu Britânico (EA 41549). 
129 
 
Vasos 
 
 Os itens 15, 16 e17 (Cf. p. 109-110) são destinados à descrição de vasos. Sendo um dos 
únicos itens que encontramos nos museus, o vaso do item 15, disponível no acervo do MET, pode 
ser visto na Figura 2.22 Ele é um vaso de cerâmica amarela pintada, fino, que foi encontrado 
quebrado por Davies e foi restaurado recentemente pelo museu. Em sua pintura, podemos ver 
quatro fileiras de pétalas azuis entre linhas vermelhas compostas. Os vasos que compõem o item 
16, de acordo com a descrição de Davies, são vermelhos, grossos, com 12 e 19 cm de altura, com 
pescoço em forma de costela e faixas vermelhas escuras pintadas nos ombros. Temos, na Figura 
2.23, o esboço da versão desse vaso de 19 cm de altura, conforme presente na fotografia presente 
no catálogo de Davies (1917, Pr. XXIX). Por fim, o item 17 descreve um jarro de cerâmica 
vermelha com alça, decorado com uma linha preta dupla na junção do pescoço com o ombro 
(esboçado na Figura 2.24). Linhas duplas pretas semelhantes aos da alça continuam do ombro até 
o pé do jarro, com manchas pretas entre as linhas. 
 
130 
 
Figura 2.22: Vaso de cerâmica amarela da tumba de Nakht. 
Fonte: Metropolitan Museum (15.10.171). 
131 
 
Figura 2.23: Esboço do item 16 da listagem de Davies. 
Fonte: Desenho feito por Pedro Hugo Canto Núñez (2020) com base na fotografia de Davies (1917, 
Pr. XXIX). 
 
 
132 
 
Figura 2.24: Esboço do item 17 da listagem de Davies. 
Fonte: Desenho feito por Pedro Hugo Canto Núñez (2020) com base na fotografia de Davies (1917, 
Pr. XXIX). 
 
 Mencionamos as etapas de escavação da tumba e que Davies não sabe ao certo se os objetos 
encontrados na TT 52 foram relocados no poço desde o século XVIII ou se fora algo mais antigo, 
assim como nós não podemos alegar que Davies tinha a preocupação de arqueólogos atuais em 
escavar. Sendo assim, Pamela Rose (2003), ao estudar as cerâmicas encontradas em tumbas do 
Reino Novo, informa-nos que, dada uma certa falta de interesse em vasos e objetos do tipo nos 
séculos XVIII e XIX, a limpeza de tumbas pelo roubo ou escavação em prol do “museu 
133 
 
beneficiado”, apenas teriam realocado esses materiais e não descartados. Desse modo, podemos 
demarcar que a cerâmica encontrada em uma tumba geralmente fora parte dos objetos funerários 
daquele morto (ROSE, 2003, p. 202). 
 De acordo com a catalogação de Rose (2003, p. 206), o primeiro vaso, da Figura 2.3, 
pertence ao tipo siltware jar. Esse tipo de vaso pode ser encontrado na XVIII Dinastia, em grupos 
da alta elite (principalmente a tebana), incluindo enterros reais nesse grupo. Em tumbas reais, nas 
quais temos a melhor preservação desses objetos, Rose (2003, p. 207) alega rastrear que, no Vale 
dos Reis, esse tipo de vaso pode ser encontrado com materiais para embalsamento, enquanto em 
outras áreas pode assumir o papel de conter líquidos para oferendas, como é o caso atestado por 
Yvan Koenig (1988, p. 126), com um exemplar na QV 32 que estava lacrado e continha cerveja. É 
provável que esse exemplar estivesse com algum líquido de oferendas. 
 Em Qurneh, catálogo de vasos de Flinders Petrie (1909, Pr. XL), podemos encontrar que 
os tipos dos itens 16 e 17 são, respectivamente, o 647 (Figura 2.25) e 657 (Figura 2.26). O que 
Davies comenta (1917, p. 41) sobre o item 16 é que esse tipo de jarro é encontrado no período pré-
dinástico e comum no Reino Médio, retornando a aparecer na segunda metade da XVIII Dinastia, 
servindo como depósito de água. Quanto ao item 17, Davies, em uma publicação de uma escavação 
anterior à de Nakht, encontra um jarro semelhante a esse, datando esse tipo, em conjunto com 
Petrie, do período de Tutmés III (DAVIES, 1913, p. 6-7). Provavelmente, a sua aplicação seria em 
contextos de oferendas. 
134 
 
Figura 2.25: Esboço do item 647 do catálogo de Petrie, Qurneh. 
Fonte: Desenho feito por Rebeca Nadine de Araújo Paiva e Pedro Hugo Canto Núñez (2020) com 
base no modelo de Petrie (1909, Pr. XL, 647). 
 
Figura 2.26: Esboço do item 657 do catálogo de Petrie, Qurneh. 
Fonte: Desenho feito por Rebeca Nadine de Araújo Paiva e Pedro Hugo Canto Núñez (2020) com 
base no modelo de Petrie (1909, Pr. XL, 657). 
135 
 
Cones funerários 
 
 Como item 18 (Cf. p. 109-110), Davies faz o levantamento de três cones funerários 
pertencentes a Nakht e a sua esposa, Tawi. A única foto que temos de algum deles é o da Figura 
2.27, que fora doado ao museu por Davies. Os demais, não sabemos. O que podemos verificar é 
que os cones funerários são objetos encontrados em grande maioria na margem ocidental de Tebas, 
nos quais estão escritos os títulos dos donos das tumbas. Como vimos no modelo de Kampp-
Seyfried, Figura 2.9, esses objetos estariam dispostos nos frisos da entrada da tumba, de modo que 
o visitante pudesse lê-los. Lise Manniche (1987, p. 16) interpreta o formato da base em círculo para 
fazer associação com o disco solar. Com isso, é possível que compreendamos sua localização ser, 
originalmente, no pátio da tumba, para que pudesse fazer parte do culto solar. É interessante o que 
Manniche (1987) observa: mesmo que existam cones com menções a pessoas que desempenharam 
funções fora de Tebas, todos esses foram enterrados em Tebas, com os seus respectivos cones 
funerários. Isso nos indica, além da necessidade de ser enterrado no Egito (como mencionado 
anteriormente sobre o Conto do Náufrago, por exemplo), existe algo especial sobre os cones 
funerários e as suas funções para a região de Tebas. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
136 
 
Figura 2.27: Cone funerário de Nakht e de sua esposa Tawi. 
 
Fonte: Metropolitan Museum (30.6.85). 
 
Kento Zenihiro (2009), ao catalogar o que parecem ser todos os cones funerários existentes 
em museus, traz informações pertinentes sobre esses objetos. De acordo com Zenihiro (2009, p. 
137 
 
21), parece que os cones funerários têm origem no reinado de Tutmés II e expandem o número de 
exemplares na segunda metade da XVIII Dinastia, sendo identificados até o período ramessida. A 
seguir, vemos a nossa transcrição com base no desenho que Davies fez de um dos cones funerários 
que estava em sua posse (DAVIES, 1917, p. 42). 
 
 
 Podemos traduzir isso da seguinte maneira: 
 
imAXy xr wsir Os venerados ante Osiris, 
wnwt n imn sS nxt o astrônomo de Âmon (e) escriba Nakht (e) 
snt.f Smayt n imn tAwi sua esposa, a cantora de Âmon, Tawi. 
 
 Como veremos no Capítulo 4, esse cone funerário e a sua leitura nos auxiliam tanto na 
restauração de algumas colunas dos hieróglifos da TT 52 quanto a compreender um pouco mais 
138 
 
sobre Nakht e Tawi. No momento, podemos entender três questões: os dois trabalhavam para o 
templo de Âmon, ele como astrônomo e ela como cantora; ambos frequentavam, teoricamente, o 
mesmo espaço; e, por fim, Nakht possuía um título secundário que fora transcrito no cone, o de 
escriba, enquanto os títulos secundários de Tawi aparecem apenas nos hieróglifos da tumba. Por 
que Nakht possuía um segundo título que seria considerado importante para colocar no cone 
funerário? A função de astrônomo está atrelada à de escriba? O que significava ser um astrônomo? 
E quanto à cantora? Qual o papel de Tawi? Voltaremos a esses questionamentos no Capítulo 4, 
quando teremos um leque mais amplo de aparições dos títulos dos dois, mas, quanto à Tawi, a 
omissão de seu segundo título senhora da casa (nb.t-pr), provavelmente foi por falta de espaço para 
o escriba, uma vez que até o título de cantora (Smayt) está em sua forma diminuta. 
 
Cosméticos e cabelo 
 
Como últimos pontos da lista, temos, no item 19, uma pequena vara de madeira para aplicar 
maquiagem nos olhos, e, no 20, um grampo de madeira para prender o cabelo (Cf. p. 109-110). 
Não possuímos fotografia de ambos os objetos, mas podemos fazer certas inferências e 
interpretações diante dessas informações. A título de adicionar informação, o Museu Britânico 
possui um grampo de madeira para prender cabelo datado do ReinoNovo (Figura 2.28). O MET 
possui um dos mais bem preservados estojos de maquiagem e varas de madeira (Figura 38), 
encontrados em Tebas e datado da primeira metade da XVIII Dinastia. 
 
 
 
 
 
139 
 
Figura 2.28: grampo de cabelo de madeira, datado do Reino Novo. 
 
Fonte: Museu Britânico (EA 2694). 
 
Figura 2.29: Estojo de maquiagem e varas de madeira. 
Fonte: Metropolitan Museum (26.7.1447). 
140 
 
Falaremos primeiro sobre o primeiro item da listagem (comparando-o com o da Figura 
2.29). De acordo com Carolyn Graves-Brown (2010, p. 112), tanto homens quanto mulheres 
usavam maquiagem no Egito Antigo, mas, no caso da iconografia, podemos rastrear muitos casos 
de mulheres aplicando a maquiagem umas nas outras. Para a autora, com base no Papiro Erótico 
de Turim, isso simboliza que a aplicação da maquiagem, ou o próprio uso do cosmético, pode ser 
associado a questões sexuais (GRAVES-BROWN, 2010, p. 112), algo que, conforme iremos 
trabalhar no terceiro capítulo, pode aparecer em cenas de banquetes. Não sabemos, portanto, para 
quem estaria destinado esse objeto. Seria para Nakht? Tawi? Ou os dois poderiam usufruir de 
maquiagem no Além? 
Quanto ao segundo objeto, Amy Joann Fletcher, em sua tese (1995), escreve sobre o cabelo 
no Egito antigo. Para a autora, o cabelo possui uma ampla simbologia para essa sociedade, que 
pode ser tanto um adorno que a pessoa possui afeto, quanto a algo bem prático, como a 
aplicabilidade em rituais, por exemplo (FLETCHER, 1995, p. 35-99). Sabemos a partir do vestígio 
material que diversas perucas foram encontradas ao longo de toda a história do Egito. Fletcher 
indica que elas seriam tão comuns para os antigos egípcios que fica difícil para analisarmos na 
iconografia quando e onde eles utilizavam perucas ou os cabelos verdadeiros (FLETCHER, 1995, 
p. 13). A autora então sugere que, comumente, as pessoas que participam de festivais ou estão em 
cerimônias mais práticas fariam uso da peruca, caso pudessem pagar para a confecção da mesma 
(FLETCHER, 1995, p. 13-14). Além disso, o uso de materiais como o grampo de madeira presente 
na tumba de Nakht, precede a existência de uma peruca ou de trabalhos e cuidados com o cabelo 
natural, sendo comumente visto na iconografia associado às mulheres (FLETCHER, 2002). Como 
não temos indicação de uma peruca entre os achados de Davies na TT 52, podemos apenas supor 
que existia, mas não sabemos como esse grampo seria usado por Tawi. 
 
 
 
 
 
141 
 
Estatueta de Nakht 
 
 Ao abrirmos esse capítulo, falamos sobre a estatueta que fora encontrada na TT 52. Na 
Figura 2.30, temos as três fotografias disponíveis do objeto, a primeira visualizada de frente, a 
segunda em um ângulo de 45º e a terceira de perfil. De acordo com Assmann (1983, p. XVI), os 
tipos dessa estatueta, classificados como stelophor, baseados em uma conjuntura religiosa que une 
as concepções de estátua, estela e porta falsa. A estátua possui uma função de ser o Ka do morto e 
receber as oferendas destinadas a ele. A estela possui uma função de apresentação identitária do 
morto, de modo que o leitor pronuncie seu nome e mantenha-o vivo no Além. Seria interessante 
mencionarmos algo que Heinrich Schafer associa a essas estelas, indicando que elas podem 
simbolizar a abóboda do céu (SCHÄFER, 2002, p. 235). Se considerarmos essa perspectiva, 
podemos incorporar nessa leitura essa associação com Nut e, portanto, um simbolismo protecional 
para a estela. Por fim, a porta-falsa efetua um simbolismo atrelado à transmissão do mundo terreno 
(das oferendas ou dos dizeres da estela) para o morto no Além. 
 
Figura 2.30: As três fotografias da estatueta de Nakht. 
Fonte: Seidel e Shedid (1991, p. 18) e Davies (1917, Pr. XXVIII). 
142 
 
De acordo com Kampp-Seyfried (1996), o tipo de tumba Vb, que é a da TT 52, serve para 
guiar o visitante em direção ao nicho no final da tumba, nicho este que seria onde estava essa 
estatueta. Se observarmos o texto da estela, vemos uma construção baseada no que Assmann (1983, 
p. XII) categoriza como os três níveis intrínsecos ao fenômeno histórico dos hinos solares: um 
pragmático, um redacional (baseado no local de produção) e um discursivo. Vamos, portanto, 
explorar o texto da estela. Abaixo, veremos a transcrição dos hieróglifos e, em seguida, 
separaremos nossa leitura em três momentos: a leitura da luneta, a introdução ao hino e o hino 
propriamente dito. 
 
143 
 
Para a luneta67, temos dois olhos wdjat (em egípcio, wDAt) que englobam um Sn e um vaso 
iab, formando a fórmula wDAt Snw iab. Não temos um consenso entre as traduções dessas fórmulas 
nas lunetas, mas defendemos aqui que elas devem ser lidas e interpretadas de acordo com os 
hieróglifos que aparecem. E não encontramos uma fórmula específica que traduza essas três 
palavras juntas, de modo que deveremos traduzir palavra por palavra, analisando suas simbologias. 
De acordo com Richard Wilkinson (1992, p. 43), para os olhos nesse tipo (que indicam o hieróglifo 
D10 - - da lista de Gardiner68), o olho direito representa o olho de Rê e, o esquerdo, o de Hórus, 
ambos simbolizando amuletos protetores. O shen (Sn), como podemos ver no Worterbuch der 
Aegyptischen Sprache (IV, 488-493), pode assumir significado de eternidade, de algo que irá durar 
eternamente, enquanto, para o vaso, temos ele aparecendo como determinativo da palavra iab (WB, 
I, 40), significando um recipiente para água ou incenso, com ideia de serem libações. Isso nos 
auxilia a reduzir a nossa procura pelo Sn nessa fórmula. No Wb (IV, 493) encontramos a 
possibilidade do shen (Sn) ser reunido com qbHw, que significa “libação”. Ao juntarmos as três 
palavras, poderíamos traduzir algo como “Proteção à libação eterna”. 
A introdução ao hino é composta pelas linhas 1 e 2: 
 
dwA ra xft wbn.f r xprt Htp.f m Adoração a Rê quando ele se eleva, para que chegue a 
ocultar-se 
anx in wnwt(j) n [imn] sS nxt mAa-Hrw vivendo, pelo astrônomo de [Âmon], o escriba Nakht, 
justificado. 
 
 As expressões wbn, “elevar”, e xprt Htp.f, “chegar a ocultar-se”, nessa introdução ao hino 
nos indicam diferentes tempos, momentos, na vida do sol. A primeira está se referindo ao nascer 
do sol, e a segunda, ao pôr do sol. Se virmos os hinos solares traduzidos por Assmann em 
Sonnenhymnen in Thebanischen Grabern (1983), percebemos que essas introduções comumente 
 
67 Derivado da palavra em francês “lunette” é a decoração no topo da estela que, nesse caso, é um texto com 
quatro signos. 
68 O egiptólogo Alan Gardiner publica, em 1927, uma lista que normatiza os hieróglifos, de modo que seja 
mais fácil e universal a conversão do signo, algo utilizado até hoje. 
144 
 
fazem referência a esses dois estágios do sol. É importante ressaltar que podemos compreender 
uma crença egípcia nessa ordem. O sol nasce a leste e se põe a oeste, isso é entendido a partir da 
simples observação. Mas, o fato de existir o m anx, “vivendo”, logo após a segunda expressão 
destacada, poderia simbolizar que a crença egípcia explicita que Rê não morre ao se pôr e que vai 
reaparecer no horizonte quando terminar sua trajetória no Além. 
A aparição da expressão in, “pelo”, antes dos títulos e nome de Nakht indica a necessidade 
em demarcar que quem faz a adoração ali expressa é o morto, dono da estatueta. Dessa forma, o 
leitor está mantendo o seu nome vivo e, portanto, a divindade solar irá receber a oferta (nesse caso 
a adoração) do morto, assim como o morto receberá a leitura de seu nome do leitor do texto, um 
sistema de trocas complexo, mas prático. Precisamos reconstituir o nome de Âmon após a palavra 
“astrônomo”. Fizemos isso com base no cone funerário de Nakht, que demonstra o seu título 
completo, que dava certo no espaço disponível para isso. Nesse momento, não entraremos no 
porquê o nome de Âmon sofrera esse corte, por ser um tanto complexo que devemos considerar 
todos os hieróglifos da tumba e compará-los com osde outra do mesmo período para concluirmos 
isso. No entanto, o que alguns egiptólogos (WILKINSON, 2003, p. 174-175; MALEK, 2009) 
argumentam é que, no período de Akhenaton, houve uma certa iconoclastia para com o nome do 
deus Âmon. Para encerrarmos a parte do nome de Nakht, existe a expressão, mAa-Hrw, “justificado”, 
que identifica o morto como aceito pelo tribunal de Osíris e vive no Além. 
O hino está nas linhas 3 a 8: 
inD Hr.k ra m wbn.k itm m Saúdo a ti, Rê, quando te levantas, e Atum-Rê em 
xtp.k nfr Haj.k psD.k Hr-psD mwt.k xaj.ti teu descanso. Tu apareceres (em glória), e tu brilhas sobre o 
brilho de tua mãe, aparecida (em glória), 
m nsw [psDt] ky nwt nyny n Hr.k Hpt como outro rei [da Enéada divina]. Nut te saúda (e) abraça 
mAat r tr.wi nmi.k Hrt ib.k Maat nos dois tempos. Percorreu tu o firmamento, e te 
Awi mr nxA.wi xpr m Htp.w sbi xr regozijas, o lago das Duas Facas está em paz (porque) a 
serpente rebelde está caída, 
awi.f qAsw Hsq n dm.t Tzw.f as suas mãos estão atadas e uma faca cortou suas vértebras. 
 
145 
 
 Assmann (1995, p. 42) afirma que os hinos solares, que apresentam as três fases do sol 
(manhã, tarde e noite), sob a forma de “transfiguração” ou “interpretação sacramental”, referem-se 
a um evento, enquanto o elogio na forma de um “nome” refere-se a uma essência ou identidade. 
Por “interpretação sacramental” Assmann (1995, p. 42) compreende que deveríamos correlacionar 
os níveis semânticos: o nível de “atos de culto” (do mundo humano) e o nível de “significado 
mítico” (associado ao mundo divino). Dessa forma, os diferentes níveis semânticos correlacionados 
por hinos solares, em sua função original como “transfiguração” da jornada solar seriam, com base 
em Assmann (1995, p. 42-45): (1) o nível cósmico dos eventos resumidos no conceito “jornada 
solar”, (2) o nível real e (3) o nível de crença funerária. Podemos, portanto, separar as três fases do 
sol no esquema a seguir: 
 
Esquema 5: Fases do sol em hinos solares. 
 
Fonte: esquema baseado em Assmann (1995, p. 44). 
 
Primeiras horas do dia
•Aparição
•Recepção 
Meio do dia
•Ato do deus: passagem e vitória
•Resposta ao ato
Noite
•Ato do deus: se pôr, jornada noturna
•Recepção 
146 
 
 Em nosso hino, temos cinco partes que aparecem marcações temporais do sol. O primeiro 
é demarcado pelo verbo wbn.k, “te levantas”, logo na primeira linha do hino (linha 3 da estela). O 
ato de indicar o sol se levantando como Rê simboliza, justamente, a divindade aparecer no 
horizonte para o início da manhã. A expressão xtp.k nfr, “teu descanso”, marca o segundo momento 
temporal do sol nesse hino, indicando quando o sol se põe. Se pusermos as duas expressões em um 
mesmo marco cognitivo, poderíamos supor que, nesse texto, o escriba estivera reproduzindo a 
crença cíclica de que o sol dorme e acorda. A palavra xtp, nesse contexto, sozinha pode ser 
traduzida por “poente” ou “ocultar”, conforme traduzimos quando ela apareceu na introdução da 
estela. No entanto, wbn possui um significado claro de “levantar”, necessitando do complemento 
pronominal. Como ambas as palavras pertencem à mesma frase, optamos por traduzi-las de tal 
maneira. 
 O terceiro marco temporal pode ser encontrado na expressão Haj.k psD.k Hr-psD, “Tu 
apareceres (em glória), e tu brilhas sobre o brilho”. O verbo Haj, “aparecer”, indica o seu 
aparecimento no horizonte (o nascer do sol), enquanto a sua continuação pode indicar a passagem 
do sol pelo Egito terreno, uma vez que o ato de brilhar (psD) seria inerente ao sol da manhã (nesse 
caso, respeitando a demarcação temporal normatizada por Assmann, o meio do dia). Algo que 
poderíamos compreender melhor aqui é o fato do sol “brilhar sobre o brilho de sua mãe, aparecida 
em glória” (psD.k Hr-psD mwt.k xaj.ti), na quarta linha da estela. Esse ato de brilhar sobre algo, em 
contextos funerários, faz referência com o aparecer para os mortos, revitalizando-os e, assim, 
mantendo-os vivos no Além. Além disso, comentamos anteriormente o papel de Nut, como abutre, 
associado à proteção, à maternidade. A palavra mwt, aqui traduzida por “mãe”, quando 
acompanhada do determinativo divino apropriado, pode ser compreendida como a deusa Mut, que, 
no Reino Novo, faz parte da tríade de Tebas (em conjunto com Âmon e Khonsu), efetuando um 
papel materno. Portanto, é interessante que, caso isso seja um trocadilho, indica que a deusa Mut, 
esposa de Âmon, possui um brilho que protege Tebas. 
O que podemos chamar de quarto marco temporal é dado pela frase nwt nyny n Hr.k Hpt mAat 
r tr.wi, “Nut te saúda (e) abraça Maat nos dois tempos”. Na primeira parte, a intenção dos hieróglifos 
pode simbolizar Nut recebendo Rê como abóboda do céu, indicando o momento do surgimento do 
sol no horizonte. A segunda parte dessa frase, na qual Maat aparece abraçada por Rê nos dois 
tempos, pode nos sugerir uma questão interessante. De acordo com Assmann (2016, p. 8), os 
147 
 
egípcios antigos tinham duas formas de compreender o tempo. O primeiro, chamado de neheh, 
categoriza-se como um tempo sagrado cíclico, considerado um eterno retorno ao igual, reproduzido 
a partir dos movimentos dos astros, determinado pelo sol. Em egípcio, esse tempo se associa com 
o conceito de “transformação”, simbolizado pelo escaravelho, que também representa saúde e 
salvação. Por isso, o neheh possui características de tempo cíclico, por significar uma existência 
contínua. Em nosso caso, o nascer e pôr do sol representa esse tempo, uma vez que é algo contínuo 
e se acredita na eternidade do movimento. 
O segundo tempo, de acordo com Assmann (2016, p. 7-8), o djet simboliza o contrário do 
tempo cíclico, porém, não como uma linha e, sim, como o espaço. Dessa forma, djet não instaura 
uma linha diacrônica, também não consta em uma sucessão sequencial de pontos no tempo, além 
de não se articular no futuro e no passado, não sendo um lugar de história (ASSMANN, 2016, p. 
8). Sendo assim, esse tipo temporal se associa com os conceitos de “permanência” e “duração”, 
tendo como símbolos uma múmia, assim como Osíris. Assmann (2016, p. 8) defende que o djet é 
o espaço sagrado de duração, o que ascendeu a existência e é o sentido perfeito, preservado de 
forma definitiva, sem alteração alguma. Se compreendermos que “os dois tempos” no texto da 
estela estão associados ao neheh e ao djet, podemos interpretar a expressão como se o deus sol 
(assim como Maat, presente nesses dois espaços para receber a divindade) pudesse fazer parte dos 
dois momentos, um de transformação (como percebemos na estela) e outro de permanência 
(simbolizando sua eterna duração). 
Por fim, o último momento é representado pelo ato do deus. Nas frases nmi.k Hrt ib.k Awi mr 
nxA.wi xpr m Htp.w sbi xr awi.f qAsw Hsq n dm.t Tzw.f, traduzida por “percorreste tu o firmamento, e te 
regozijas, o lago das Duas Facas está em paz (porque) a serpente rebelde está caída, as tuas mãos 
foram atadas e uma faca cortou suas vértebras”, podemos identificar o tempo e o espaço em que 
Rê se encontra no texto. Na primeira parte, Rê aparece como se tivesse percorrido o firmamento, 
indicando uma ação passada, na qual Rê já realizou sua jornada no Egito terreno e está adentrando 
a Duat, portanto, noite no Egito terreno e na marcação temporal. Esse ato, quando complementado 
pela expressão subsequente, indica que seu coração se encanta com isso (ib.k Awi, traduzido por “te 
regozijas” possui o sentido semântico de que o coração daquela pessoa se encanta com determinado 
ato que fora mencionado antes no texto). O lago das Duas Facas (mr nxA.wi), representa um espaço 
na Duat que, de acordo com Winfried Barta (1981, p. 88), aparece nos TP como “Canal Necha”, 
148 
 
com um curso d’água sinuoso. Barta (1981, p. 88) indica que nas fórmulas 340c-d, 343a-b, 1084a-
b e 1704a, dos TP, esse lago das duas facas está localizado nos Campos de Junco, e, na fórmula 
1162b-c, dos TP, o mesmo lago está associado à Ascensãodo Céu para o leste. 
Como essa marcação espacial foi feita por Barta no TP, devemos compreender as alterações 
feitas no discurso religioso dessa sociedade até a temporalidade de Nakht. Abas Bayoummi (1940), 
que, ao analisar os Campos de Juncos e os Campos de Oferendas, assim como suas diferenças, 
interpreta que, nos TP, o Campo de Juncos era um lugar de purificação do faraó (a camada social 
que teria acesso às fórmulas funerárias), enquanto no Reino Novo, o mesmo Campo tornou-se um 
lugar cultivável e de labor no LDM. Essa mudança também ocorreu na localização dele. De acordo 
com Bayoummi (1940), o Campo nos TP era situado no céu, na orientação Sudeste, e, com o LDM, 
passou a ser na Duat, também no Sudeste. Sendo assim, o lago das duas facas estaria situado no 
Campo de Juncos, que, por sua vez, seria um espaço no Sudeste da Duat. 
Por fim, o ato efetuado pelo deus: a morte da serpente rebelde. A recepção desse ato pode 
ser entendida pela paz que se instaurou no lago das duas facas, indicada pela expressão xpr m Htp.w, 
“estar em paz”, um momento que, por ser indicado como uma ação no presente, significa algo que, 
no momento da leitura do texto, acontece e é positivo, em contraste com a serpente que caiu. É 
interessante a construção da narrativa na frase seguinte, uma vez que é necessário dizer que as 
mãos da serpente (algo simbólico, pois serpente não possui mãos na natureza) estão atadas e que a 
faca cortou as suas vértebras (também simbólico). De acordo com John Baines (2007), as palavras 
possuem poder e, nesse caso, ao ler o texto da estela na estatueta de Nakht, a supremacia de Rê 
vence o seu desafio e, assim, instaura a ordem perante a possibilidade do caos (representado pela 
serpente). 
 
... 
 
 Vimos os objetos encontrados por Davies na TT 52. Alguns tivemos a oportunidade de 
comprovar o achado a partir das fotografias, enquanto os outros foram baseados na descrição do 
149 
 
objeto fornecida por Davies (1917, p. 39-42). Porém, como podemos compreender todos esses 
objetos no espaço funerário de Nakht? Sugerimos a separação desses objetos nas duas estruturas: 
 
• Superior 
o Estatueta 
o Cones funerários (18) 
o Potes vermelhos (16) 
 
• Inferior 
o Fragmentos de caixões (1 a 4) 
o Cetro (6) 
o Fragmento da mesa (7) 
o Partes das cadeiras (5, 8 a 12) 
o Fragmentos das caixas (13 e 14) 
o Vaso de cerâmica do MET (15) 
o Jarro de cerâmica vermelho (17) 
o Pincel de maquiagem (19) 
o Grampo de cabelo (20) 
 
 Como atesta Kampp (1996), os cones funerários são alocados nos lintéis da porta da tumba 
ou na fachada e, portanto, no pátio. O tipo Vb, de acordo com Kampp (1996), da TT 52, possui 
uma estrutura em T, com as paredes decoradas no primeiro recinto e o nicho para a estatueta no 
segundo. Quanto aos vasos vermelhos, acreditamos que eles não foram enterrados junto aos 
equipamentos funerários de Nakht. Isso se dá pelo fato de não possuírem (ao menos no modelo 
fotografado por Davies) um padrão estético do nível, presente nos outros, que são bem modelados 
e finalizados com pinturas. Dessa forma, sugerimos que tratassem de vasos para oferendas feitas 
na tumba por visitantes (familiares ou não), que depositariam água (como é o uso comum para 
esses vasos, conforme mencionamos), um dos elementos essenciais para a vida, em prol do morto. 
150 
 
Os demais materiais encontrados seriam, de fato, equipamentos funerários e acompanhariam o 
morto (no caso Nakht, Tawi e a terceira pessoa) no Além. 
Smith (1992), após analisar os objetos das tumbas intactas, elabora uma tabela para designar 
o nível da camada social que um membro da elite pertencera, com base em seu equipamento 
funerário. Traduzimo-la Tabela 4. Se fizermos uma espécie de conferência de dados, e tomássemos 
como verdadeiras as informações que Davies nos dá sobre os achados, compreenderíamos que 
Nakht teria um papel de destaque, pertencendo à alta elite. Isso porque, no primeiro fragmento de 
caixão encontrado, Davies alega que os olhos e as sobrancelhas seriam de vidro, pois existia o 
espaço para isso e não fora pintado, apenas inserido o vidro, o que já enquadra Nakht nessa alta 
elite por possuir condições econômicas de pagar por um trabalho em vidro. Além disso, foram 
encontrados múltiplos caixões na TT 52, justificando seu status como alto. Por enquanto, não 
fecharemos esse assunto do status social de Nakht, ou de seus títulos como astrônomo e escriba, 
isso é algo que veremos quando analisarmos as imagens (Capítulo 3) e textos (Capítulo 4) da TT 
52. 
 
Tabela 4: Status social do membro da elite de acordo com os objetos encontrados na tumba. 
Nível Objetos para a tumba Objetos para o cotidiano 
Todos os grupos 
Caixão 
Joias 
Caixas e cestos 
Conjunto de toalete 
Objetos adicionais para 
o status médio 
Shabtis 
Estátua 
Buquês e guirlandas 
Amuletos/Escaravelho 
Vasos Canopos 
Equipamento profissional 
Servos 
Sandálias 
Roupas 
Cadeira / assento 
Cama 
Oferendas de comidas 
Objetos adicionais para 
o status médio-alto 
Papiros 
Jogos 
Máscara funerária 
Vasos de rocha e metais 
Linho 
Outros móveis 
Objetos adicionais para 
o status alto 
Vários caixões 
Comida mumificada (realeza apenas) 
Estatuária especial (?) 
Cama de Osíris (?) 
Trabalhos em vidro (diversos) 
Fonte: Tabela traduzida por Pedro Hugo Canto Núñez (2020) de Smith (1992, p. 219). 
151 
 
Esquema 6: Os dois segmentos para a tumba de Nakht (TT 52). 
Fonte: elaborado por Pedro Hugo Canto Núñez (2020) com base na teoria de Staal (1979) e as 
adaptações feitas por Payne (2004) e Hays (2013). 
Primeiro Segmento: Aproximando-se da tumba Visualização do pátio
Entrada da tumba Visualização dos cones funerários
Passagem para a capela 
funerária
Visualização da estátua 
(stelophor) de Nakht ao 
fundo
Passagem para a câmara 
interna
Contemplação da estátua 
(stelophor) de Nakht e 
leitura da mesma
Realização de oferendas Segundo Segmento: Saindo da tumba
Passagem para a capela 
funerária
Visualização da saída ao 
fundo Saída da tumba
Visualização do pátio 
Vista para o Nilo e a 
margem oriental de Tebas 
(vista do templo de Luxor 
e Karnak?)
152 
 
No momento, podemos fechar nossas ideias sobre a arquitetura da tumba em conjunto com 
os objetos encontrados, e, como expomos, trabalharemos nisso a partir de um sistema ritualístico. 
Para Harold M. Hays (2013), é necessário analisar a estrutura do ritual, compreendendo e lendo as 
ações humanas no espaço a partir de um modelo de ritual de passagem e utilizando a perspectiva 
da sintaxe ritualística69. Por fim, propomos, no Esquema 6 (acima), algo que iremos dar 
continuidade no final de cada capítulo subsequente, incrementando nossa proposta de sistema 
ritualístico para a TT 52. 
Nesse esquema, apresentamos dois segmentos da sintaxe ritualística, a primeira realizar-se-
ia ao adentrar a tumba, na qual o pátio é a primeira parte da estrutura da tumba, local de incipiência 
solar e, portanto, adoração às divindades solares. Ao visualizar e ler os cones funerários, o visitante 
revitalizava o morto no Além, a partir da complexa crença na esfera social do morto, com o 
pronunciamento de seu nome. Na passagem para a capela funerária, as decorações são lidas e 
interpretadas; porém, isso será nosso trabalho para o terceiro capítulo. O foco da leitura do ambiente 
é ao fundo da tumba, conforme vimos na tipologia da tumba (tipo Vb), guiando a visão do visitante 
para a estatueta de Nakht. Portanto, a passagem para a câmara interna marca o início da 
contemplação da estatueta e a leitura dela, assim como a realização de oferendas, cumprindo o 
papel ritualístico de revitalizar o morto no Além. 
Para o segundo segmento, a saída da tumba, por ser uma tumba pequena, o visitante fazia 
o caminho inverso do primeiro segmento, sem muita diferença de interpretação. Conforme veremos 
no terceiro capítulo, devido a variação de angulação da capela funerária em relação aos corredoresque a conectam ao pátio e à câmara interna, a visão do visitante pode ser guiada. Ao sair da tumba, 
podia ser visto o Nilo e a margem oriental de Tebas, com os templos de Luxor e Karnak ao fundo. 
 Assim, no próximo capítulo analisaremos o plano decorativo da TT 52, compreendendo a 
crença egípcia do caráter mágico nessas imagens. Dessa forma, o Capítulo 3 nos auxiliará no 
desenvolvimento do sistema cognitivo ritualístico da tumba de Nakht, com base no discurso 
funerário da XVIII Dinastia. 
 
69 É interessante mencionar aqui o trabalho feito por Richard Payne (2004) sobre a aplicabilidade e constante 
atualização da teoria de F. Staal (1989) para a questão cognitiva, algo que podemos utilizar para justificar 
nossa escolha. 
153 
 
CAPÍTULO 3: O PLANO DECORATIVO DA TUMBA DE NAKHT 
 
 Partiremos, nesse capítulo, para a análise do plano decorativo da TT 52. Conforme Angenot 
(2011), leremos os compartimentos, os registros, as cenas, as figuras e as subfiguras nesse e no 
próximo capítulo, enfatizando as imagens. Ao analisarmos essas figuras presentes nas tumbas 
tebanas, devemos levar em consideração os cânones da arte egípcia, as convenções que regem o 
seu estilo e o seu padrão de representação. Os egípcios acreditavam no sentido mágico das imagens, 
sendo representado, por vezes, aquilo que seria um objeto de desejo, como é o caso, por exemplo, 
das mesas com oferendas de comidas e bebidas, dedicadas aos mortos. 
 
1. CONCEITUANDO A ARTE EGÍPCIA 
 
 Para os antigos egípcios, a arte não pode ser aplicada no sentido moderno do termo. Não 
havia artistas e, sim, artesãos que não assinavam as suas obras e trabalham em conjunto nas 
oficinas70. A arte tinha uma função essencialmente mágica, por isso, existia a preocupação de se 
representar o todo da figura, considerada como sendo melhor visualizada de perfil. A imagem 
poderia, portanto, se tornar “viva” pelo poder da magia. A pintura forneceria, então, uma ideia de 
que ela é agrupada em composições retangulares, constituindo, assim, harmoniosamente, padrões 
que devem ser respeitados. 
 John Baines (2007, p. 3) defende que não podemos distinguir a arte da escrita no Egito 
antigo, algo que compreendemos de forma unificada desde os primórdios do surgimento da escrita 
nesse local. Dessa forma, adotaremos a aplicabilidade e os alcances dos estudos que a “cultura 
escrita” e a “cultura visual” possuem na Egiptologia a partir de John Baines (2007). Para esse autor, 
os tópicos focalizados em torno de textos literários que os egiptólogos abordaram sob o título 
 
70 As pesquisas sobre isso ainda estão em desenvolvimento. Por exemplo, em abril de 2021 foi publicado 
(BLAKEMORE, 2021; FABRICIUS, 2021; WOODWARD, 2021) a descoberta de uma vila do período de 
Amenhotep III na margem ocidental de Tebas que pode nos auxiliar futuramente em informações sobre os 
trabalhadores de Tebas. 
154 
 
“cultura escrita”, referem-se às sociedades que constituem a forma social em que a escrita é 
encontrada de forma principal, enquanto os problemas de representação pictórica, terminológica e 
classificatória daqueles resquícios materiais que são abordados sob o título “cultura visual”, são 
comuns a um leque mais amplo de sociedades (BAINES, 2007, p. 29). Em contraste, a discussão 
sobre o que é “arte”, e como ela se relaciona com seu contexto social e intelectual, tende a ser vista 
no Ocidente de acordo com uma perspectiva eurocêntrica, excessivamente evolucionária, na qual 
se diz que as instituições relevantes foram transformadas por ideias estéticas, que se desenvolveram 
especialmente desde o século XVIII, uma vez que foram características das sociedades modernas 
e pós-modernas (BAINES, 2007, p. 29). 
 Para Baines (2007, p. 29-30), as classificações humanas não são limitadas pela linguagem, 
de modo que a ausência de terminologia em uma sociedade é apenas um guia muito parcial das 
instituições dessa sociedade e, portanto, também argumento contra abordagens logocêntricas 
indevidas. Sendo assim, o autor argumenta que a aplicabilidade do termo “arte” para o Egito antigo, 
no sentido amplo das motivações, atividades e produtos estéticos, é do humano universal e pode 
ser utilizado como termo para pesquisa nessa sociedade, sem descartar todo o avanço acadêmico 
trazido à área egiptológica pela discussão teórica da cultura visual (BAINES, 2007, p. 30). 
 Um exemplo que podemos expor aqui é, justamente, o trabalho de Brian Leigh Molyneaux 
(1997), que analisa um efetivo reforço de poder e ideologia oriundos das imagens. Para este autor, 
as imagens que são construídas por uma determinada sociedade possuem um poder implícito, uma 
vez que as imagens existem em um contexto extratextual, circunscritas no próprio espaço 
(MOLYNEAUX, 1997, p. 4). Sendo assim, as imagens podem ser criadas visando a qualidade 
estética, mas tendem a ser “representações” de ideias, ou “ilustrações” de objetos ou 
“reconstruções” de eventos. Torna-se interessante para o nosso estudo quando Molyneaux (1997, 
p. 5-6) interpreta o artista de uma determinada obra não como um autômato social, que 
simplesmente reproduz uma imagem que já está na mente, mas o primeiro espectador, que trabalha 
baseando-se em algo que podemos chamar de sistema cognitivo, com as mãos e os olhos no 
ambiente de informações que representam uma imagem. No entanto, antes de adentrarmos de 
forma mais profunda sobre toda essa teorização da imagem para a TT 52, devemos ter uma noção 
sobre os cânones da arte egípcia. 
155 
 
 O início da composição de um desenho egípcio se dá a partir de uma orientação de espaço, 
de modo a deixar toda a pintura com um caráter ortogonal. Alinham-se, portanto, os bastões de 
forma vertical e calculam a horizontalidade dos ombros e da parte inferior dos saiotes e das ações 
dos personagens da cena. Dessa forma, o ato de pintar seria dividido em etapas entre os artesãos 
responsáveis por aquele plano decorativo. Em um primeiro momento, a superfície era preparada, 
deixando-a plana e, depois, era traçada uma grade quadriculada71, o próximo era fazer um esquema 
do desenho, sendo seguido pela sua pintura e, depois, uma correção nos desenhos (MALEK, 2011). 
 O objeto nessas pinturas pode ser visto ao mesmo tempo de frente, de perfil e de três quartos, 
tudo seguindo uma lógica bem clara. Ao ser representado, uma pessoa tem seu olho e seu tronco 
figurados segundo uma visão frontal, este último mostrando a força dos movimentos e a sua 
musculatura. A visão lateral do desenho de uma pessoa era feita de modo que a cabeça, as pernas 
(sempre com o pé esquerdo à frente, dando uma ideia de movimento para quem visualiza a imagem 
e impedindo a supressão de uma perna), os pés e os braços aparecessem todos na imagem. E a sua 
face está, geralmente, representada de perfil. Nas imagens masculinas, o umbigo era utilizado como 
uma forma de tornar mais clara a ligação do tronco com as pernas e, nas femininas, um seio era 
representado sobre o tórax, de perfil. 
 A mesma ideia usada para as pessoas era utilizada em paisagens. A cena combina uma vista 
de plano superior com uma visão frontal. Nas cenas de jardins, por exemplo, temos um lago visto 
de cima (plano superior), sua fauna e flora são representadas de perfil (visão frontal), assim como 
as árvores ao seu redor e as construções que possam ser ilustradas (casas ou vinhedos). Sendo assim 
fornecida uma melhor compreensão do espaço. 
Um outro princípio egípcio encontrado em sua arte é a da variação de tamanho de uma 
pessoa, um ponto que indica o destaque social. É indicado, assim, uma ordem de poder, pondo em 
evidência quem fosse mais importante. Por exemplo, nas cenas das tumbas, o casal, sempre está 
representado maior que os seus servos. Um dos padrões de decoro ressaltado por Heinrich Schäfer, 
um dos primeiros egiptólogos a postular os fundamentos da arte egípcia, e que é utilizado até os 
 
71 A grade quadriculada para se basear na escala de tamanhomuda ao longo da história do Egito Antigo. Ela 
fica mais comprimida a partir do Reino Novo, fazendo com que o desenho fique mais detalhado. Um corpo 
humano de um membro da elite, era repartido em 18 quadrados no Reino Médio e passa a ser repartido em 
21 quadrados no fim do Terceiro Período Intermediário (ROBINS, 2015, p. 141-142). 
156 
 
dias atuais é o termo “isocefalia”, que ressalta a ideia de que se as cabeças e troncos das pessoas 
ocupassem a mesma linha horizontal, estas teriam o mesmo nível social, como é o caso de um rei 
que esteja representado diante de alguma divindade (SCHÄFER, 2002, p. 14-18). 
 A escala de tamanho interfere nas relações sociais que as pessoas possuem, sendo provável 
que essa ideia tenha surgido a partir de que o personagem em destaque seria mais forte que os 
outros, convertendo-se até demonstrar que quem estivesse em destaque seria um símbolo de poder 
e importância, devido ao indicativo de força (SCHÄFER, 2002, p. 230-234). Em alguns casos, 
como aponta Richard Wilkinson (2003, p. 45), a razão para a alteração dos tamanhos de certos 
objetos ou figuras pode ser apenas mitológico, pois, de acordo com as crenças egípcias, o mundo 
dos mortos teria dimensões descomunais e estaria repleto de criaturas com tamanhos gigantescos. 
Outra hipótese também relacionada ao tamanho de determinada imagem é o ato de fazer a menor 
parecer insignificante ou indefesa, por exemplo, o caso da representação do deus Seth como um 
pequeno hipopótamo sendo atacado pelo rei e por outros deuses, no templo ptolomaico de Edfu. 
 As figuras estavam organizadas em faixas horizontais, os registros. Para Schäfer (2002), os 
registros seriam uma forma de organizar o espaço, mostrando o todo que os egípcios buscavam, 
fazendo com que a cena estivesse clara e com seu significado completo, de forma para auxiliar a 
magia por trás da pintura. Dessa forma, a utilização do espaço para a pintura de uma imagem não 
buscava apenas ilustrar o local, mas, sim, estaria repleto de significado e crenças sobre o que estava 
representado. 
 Com esse levantamento de alguns cânones da arte egípcia, podemos compreender o que 
Baines (2007, p. 301) sugere sobre a arte egípcia. Para o autor, a arte para essa sociedade precisa 
ser vista como um produto, criado para um determinado propósito, que exibe uma ordem e 
organização estética que vai além do seu valor funcional. Essa definição pode incorporar ritos e 
performances que podem ser analisadas a partir de um sistema social que engloba a sociedade 
egípcia (BAINES, 2007, p. 301). Entretanto, como podemos perceber esse sistema na TT 52? 
 Conforme mencionamos, o Egito, no início do Reino Novo, vivera um período de 
reafirmação do poder dos faraós egípcios. Esse momento concedeu uma grande importância para 
a cidade de Tebas, uma vez que os faraós descendiam daqueles que reinavam no final do Reino 
Médio e, por sua vez, eram tebanos. Sendo assim, conquistas e expedições eram feitas em nome de 
157 
 
Âmon e, no período de Nakht, podemos perceber que os sacerdotes de Tebas possuem uma certa 
relevância, de modo que grandes festivais e cerimônias (que discutimos no Capítulo 1) eram 
realizadas em Tebas. 
Conforme Kemp (1989, p. 188) afirma, nesse período inicial do Reino Novo, percebemos 
que as imagens religiosas, como, por exemplo, as portáteis, tornaram-se mais comuns, sugerindo 
que o culto estava se transformando para se adequar a um público e, portanto, um espetáculo 
político, à medida que o Estado substituía alguns dos antigos controles burocráticos por uma 
manipulação psicológica maior e mais aberta. Dessa forma, David O’Connor (1983, p. 40-42) 
compreende que a crescente visibilidade desses objetos ideológicos sugere que o rei e o estado 
ajustaram ativamente sua produção ideológica em resposta às mudanças no clima político. Isso é 
interessante para nós pois, para compreendermos como o discurso funerário da TT 52 fora criado 
com base no sistema cognitivo do período em que Nakht vivera, devemos analisar como que os 
egiptólogos percebem as nuanças existentes no âmbito oficial da arte egípcia. 
Conforme aponta Baines (2007, p. 207), é possível encontrar evidências de fugas dos 
cânones artísticos egípcios, algo que Schäfer (2002, p. 36-68) já apontava em seus princípios. 
Mesmo assim, não é algo que seja extremamente avesso ao estilo predominantemente egípcio 
(BAINES, 2007, p. 207). De acordo com Gay Robins (2015, p. 12), consiste em um resultado da 
natureza duradoura da arte egípcia que pode ser percebido desde o Reino Antigo até o período 
romano. Essa “natureza duradoura”, que comenta Robins, não indica que seja algo imutável, tanto 
é que, como podemos perceber a partir de Baines (1989; 2007), Kemp (1989) e O’Connor (1983), 
existe uma forte ligação das mudanças políticas com as alterações sofridas na arte, um exemplo 
disso é o período amarniano. Se compararmos as tumbas de particulares pré e pós-amarnianas, 
vemos que, antes de Akhenaton, o centro da tumba era, de fato, o próprio dono da tumba e, por 
vezes, sua esposa. Nas tumbas de Amarna, percebemos que elas possuem como centro da imagem 
a família real, associada ao deus Áton. Nas tumbas tebanas pós-amarnianas, vemos um aumento 
em imagens do faraó desempenhando alguma função (o motivo iconográfico mais comum é de 
festivais). 
Sendo assim, compreendemos que o caráter mágico da arte egípcia pode ser alterado de 
acordo com as influências políticas do período (já que não podemos analisar separadamente cada 
uma das esferas sociais egípcias), e que, conforme visto anteriormente, o culto solar ao deus Âmon 
158 
 
tinha grande poder no período de Nakht. Portanto, como iremos proceder na nossa interpretação 
do plano decorativo da TT 52? 
A semiótica, proposta por Roland Tefnin (1997, p. 7) parece ser um bom caminho a ser 
seguido. Tefnin entende que existe uma interação entre imagem, texto e espaço como vetores de 
relações a partir da seguinte estrutura: 
 
• Relação da imagem e do texto (a escrita como imagem, a imagem como escrita); 
• Relação da imagem e do espaço (quando o espaço funciona plenamente como signo. 
Exemplo: o vazio luminoso da porta "recebendo" a recitação de um hino ao sol); 
• Relação do texto e do espaço (frisos e molduras); 
• Relação da junção de texto, imagem e espaço de uma tumba com o espaço cósmico 
(orientações geograficamente simbólicas, possíveis distorções intencionais). 
 
Assim, a semiologia de Tefnin (1997), seguindo a análise estrutural, trouxe uma nova 
maneira de conceber o significado de um edifício, um modo global de apreensão que transcende as 
divisões tradicionais entre os filólogos, arqueólogos, historiadores da arte, algo que revela o caráter 
mágico egípcio, expresso em termos de redes, ramificações, constelações, tramas diversas. Se 
utilizarmos essa perspectiva metodológica para a nossa análise, precisamos considerar as 
atualizações que ela sofreu. Uma discípula e continuadora de Tefnin, Valérie Angenot em um 
capítulo publicado em 2015, expõe os alcances que a semiótica e a hermenêutica podem ter quando 
utilizadas (em conjunto) para analisar a imagem egípcia. 
Angenot (2014, p. 102) justifica que não podemos tratar, de maneira teórica-metodológica, 
a leitura da arte egípcia com o auxílio de uma gramática, como defendia Philippe Derchain (1962). 
A autora está inclinada mais para utilizar o termo “código” do que “gramática”, uma vez que o 
processo de carregar um significado depende de uma camada de regras que podem ser 
159 
 
compreendidas em uma imagem. Dessa forma, Angenot (2014, p. 102-104) elenca seis princípios 
que podem ser observados nessa escolha teórica: 
 
• Univalência 
o Em sistemas puramente semióticos, um sinal deve ter apenas um significado claro 
e simples e não ser ambivalente. Há algumas raras exceções a esse princípio. Alguns 
sinais podem de fato assumir dois significados, desde que isso seja feito em um 
objetivode “economia de meios” e, na medida em que os dois significados não 
interferem no mesmo nível de comunicação (por exemplo, significado do signo + 
padrão de leitura). 
• Taxonomia 
o A taxonomia (ou classificação) está estritamente ligada ao pensamento semiótico. 
A semiótica se apoia em classes determinadas pela taxonomia, que constituem a 
base do sistema determinativo na estrutura tripla da escrita hieróglifo egípcia 
(ideogramas, fonogramas e determinativos). Os egípcios escolheram o hieróglifo 
que representa o pato para significar a ideia geral de “pássaro”, o que não exclui as 
demais categorias, mas firma uma norma. Isso também pode ser encontrado em 
outros níveis da representação. Por exemplo, em uma série de posições corporais 
destinadas a retratar um ritual ou performance, os egípcios selecionaram um gesto 
que representava todo o ritual (chamado de sinédoque = “parte para o todo”), de 
modo que ficava melhor transmitir o significado, o gesto e/ou atitude tinha que ser 
o mais típico da ação significada. 
• Legibilidade 
o Legibilidade significa adotar o ponto de vista que tornará um sinal o mais legível e 
compreensível possível, excluindo outras interpretações (indevidas). A legibilidade 
funciona junto com a normalidade e a esquematização. Por exemplo, a cabeça foi 
usada no sistema hieróglifo para significar tanto /cabeça/ e /face/. Mas os egípcios 
160 
 
usaram a representação frontal para o rosto e o perfil para a cabeça porque cada 
sinal era mais legível e representativo em seu respectivo significado. Em nome dos 
princípios de tipicidade e legibilidade, os egípcios misturaram diferentes pontos de 
vista em uma e a mesma imagem. Por exemplo, um ser humano é retratado com 
uma cabeça de perfil, mas um olho é frontal por ser mais legível que um olho na 
visão de perfil. 
• Esquematização e densidade 
o Uma das condições de univalência é o uso de um conjunto de sinais recorrentes, que 
são diretamente reconhecíveis e despojados de quaisquer detalhes perturbados, 
estranhos ou não essenciais. O grau de detalhes e precisão usados em uma 
representação é chamado de “densidade”. Em certa medida, enquanto o objeto 
permanecer identificável, a esquematização aumenta o desempenho e a legibilidade 
do objeto. No entanto, o grau de esquema variou com o tempo, como já mencionado. 
Dessa forma, apesar de algumas tendências miméticas, os sinais semióticos 
relativos à imagem egípcia permaneceram identificáveis ao longo do tempo. A falta 
de movimento e variação também diz respeito ao princípio da esquematização. 
• Funcionalidade 
o A funcionalidade supera a semelhança em representações semióticas. Uma imagem 
pode ser representada de uma forma convencional ou não, de modo que sua função 
seja preservada, mesmo que haja divergência semântica na sua esquematização. 
• Durabilidade 
o De acordo com Angenot (2014, p. 104), a autoridade faraônica entendeu bem que a 
sobrevivência de seu sistema semiótico (e, portanto, seu sistema de comunicação e 
propaganda) dependia de sua estabilidade e durabilidade. Para um código funcionar, 
ele tem que durar no tempo, juntamente com razões filosóficas e religiosas. 
 
161 
 
Tudo isso gira em torno de alguns outros pontos da semiótica para o Egito Antigo, como o 
significante (a representação material de alguma coisa ou conceito), o significado (o objeto mental 
ou material que é compreendido a partir de uma descrição material determinada), ícone (uma 
similaridade topológica com o objeto – o significante é semelhante ao significado), símbolo 
(aqueles que possuem uma base convencional com o objeto) e os índices (aqueles signos cuja 
presença implica a ocorrência de algum outro evento ou objeto). Desse modo, temos o que Angenot 
(2014, p. 107-108) compreende por relações sintagmáticas (em uma linha horizontal - arranjos de 
termos) e paradigmáticas (em uma linha vertical - variação de termos). Podemos ver em Tefnin 
(1991, p. 9-12) esse esquema projetado na iconografia de tumbas tebanas de particulares, que 
possui o morto (N) como o sujeito das iconografias (e textos) das tumbas, efetuando uma 
determinada ação, que basicamente são quatro (ver, receber, ofertar e contar), sobre um objeto. No 
Esquema 7 vemos essa projeção em três quadros de níveis sintagmáticos (sujeito-ação-objeto) e os 
seus sentidos paradigmáticos para as tumbas tebanas de particulares, de acordo com Tefnin (1991. 
9-12). 
 
Esquema 7: Eixos sintagmáticos e paradigmáticos em uma tumba tebana de particular. 
 
Fonte: adaptado de Tefnin (1991). 
 
Sujeito
• N
Ação 
• Ver
• Receber
• Ofertar
• Contar
Objeto
• O Campo de 
Junco ...
• As oferendas 
...
• Carne e 
cerveja ...
• 10 côvados de 
...
162 
 
 Além de Tefnin, podemos nos respaldar em certos momentos dessas análises no processo 
cognitivo da língua egípcia apontado por Pascal Vernus (2018). Para este autor, os hieróglifos 
podem apresentar traços de praticidade em sua composição, de modo que o signo de uma corda, 
por exemplo, formará parte de uma palavra para poder fazer o leitor compreender que aquilo escrito 
é referente ao objeto, assim como a palavra “gato” é escrita pelo hieróglifo do gato (VERNUS, 
2018, p. 47-48). Isso entra de acordo com a ideia de Tefnin (1997, p. 7) sobre a relação intrínseca 
que imagem e texto possuem. Dessa forma, podemos utilizar esses trocadilhos da escrita egípcia 
para analisarmos tanto a questão imagética quanto escrita da TT 52. 
 Angenot, ao expor toda essa perspectiva teórica-metodológica que pode e é utilizada para 
o Egito antigo, elenca alguns problemas atuais que não podemos resolver apenas com a semiótica. 
Podemos utilizar como exemplo a análise de algumas cenas agrícolas em tumbas tebanas de 
particulares, que outrora foram interpretadas por “cenas do cotidiano”, e que hoje são analisadas a 
partir de um significado mais profundo, interpretando-as como cenas do Além. Portanto, de acordo 
com Angenot, fica evidente a necessidade de trabalharmos com a hermenêutica para estudarmos o 
Egito antigo. Entre os ideais dessa linha teórica, a autora destaca (ANGENOT, 2014, p. 109-114): 
 
• Kheperu: 
o Uma das características da sociedade egípcia seria a analogia. Todas as instâncias 
divinas, todos os fenômenos transcendentes, são revelados ao conhecimento 
humano por meio de muitos nomes, muitas formas, muitas manifestações (kheperu). 
Todo fenômeno imanente é, portanto, provável que evoque um transcendente e vice-
versa, assim como objetos com características análogas, formas ou até mesmo 
nomes similares dentro do mesmo “reino” também podem se referir uns aos outros. 
• Restrições e tabus: 
o Todas as sociedades emitiram restrições culturais e privilégios que impedem parte 
da sociedade de dizer abertamente ou retratar diferentes tipos de coisas. Os mistérios 
do reino divino só eram conhecidos pelo rei e alguns sacerdotes iniciados. No início 
da história do Egito, apenas a realeza parecia assumir um papel ativo no processo 
163 
 
cósmico, vivendo no Além e associando-se com divindades como Rê. Com o tempo, 
no entanto, as prerrogativas reais foram introduzidas na iconografia da elite em um 
processo de ampliação desse Além. Nessa ideia podemos encontrar alguns motivos 
iconográficos que parecem pertencer a apenas uma esfera social específica. A 
ausência desses podem ser referenciados como restrições ou tabus da sociedade para 
uma esfera social. 
• Economia e edificação: 
o O princípio da economia consiste em transmitir, com uma única e marcante imagem, 
a mais completa matriz de significado, bem como os muitos aspectos e camadas que 
um conceito englobava. Isso correspondia nos formulários de escrita a “um 
agregado de raciocínio discursivo e disposto detalhado”. Por exemplo, havia muitos 
requisitos necessários para a vida no Além, que devem ser invocados a partir dos 
rituais (conforme vimos no Capítulo 2). 
• Überderterminierung (muitos significados):o Überdeterminierung (aqui traduzido pela expressão “muitos significados”) é um 
termo emprestado da psicanálise. Foi usado pela primeira vez por Freud para fazer 
um relato da forma como os sonhos foram elaborados pela mente humana em 
múltiplas camadas determinadas por múltiplos fatores. Nesse sentido, os sonhos 
foram construídos pelo acúmulo de múltiplas causas de diferentes naturezas (como 
traumas antigos, resíduos da época, desejos latentes, entre outros), que combinam 
para entregar um motivo comum. Com a abordagem hermenêutica é possível 
averiguar que os antigos egípcios compreendiam nas imagens questões mais 
profundas, algo que podemos identificar a partir de diversas comparações, 
encontrando o caráter polivalente de cada motivo iconográfico. 
• Polivalência: 
o Como uma consequência da Überdeterminierung, a polivalência seria o fato de 
apresentar pelo menos um significado literal ao valor facial e um significado 
derivado ou oculto. Nos dispositivos semióticos, os signos são usados para 
164 
 
transmitir significados derivados por meio de associações e regras específicas, 
assim como a linguagem (sistema semiótico) é usada para transmitir insinuações 
(mecanismo hermenêutico). 
 
Metodologicamente, Angenot (2014, p. 116) argumenta que, uma vez que a norma, a 
anomalia e o contextos de um motivo iconográfico forem definidos, a interpretação deve ser feita 
considerando todos e quaisquer elementos, produzindo uma variedade de contextos possíveis para 
a análise. Sendo assim, Angenot (2014) propõe que a aplicabilidade da hermenêutica pode produzir 
cada vez mais questões para compreendermos o Egito antigo, e, como um meio para chegarmos à 
essa compreensão, o uso da semiótica e de seus sistemas interpretativos seriam úteis, criando, 
assim, uma extensa rede de níveis interpretativos e contextuais. 
Além da Angenot e de suas demonstrações de aplicabilidade da união da semiótica com a 
hermenêutica (ANGENOT 2012; 2011; 2010; 2007; 2005; 2003; 2002; 1996), podemos basear 
nossas análises das imagens da TT 52 também em Hays (2013; 2010), que, conforme mencionamos 
no Capítulo 2, trabalha sob uma perspectiva da sintaxe ritualística e demonstra a possibilidade de 
interpretarmos o direcionamento da leitura da imagem. Dessa maneira, continuaremos nosso 
capítulo avaliando cada motivo iconográfico presente na TT 52, identificando cada signo, 
compreendendo-o em um contexto e propondo uma forma de leitura que os antigos egípcios fariam. 
A função mágica de uma tumba, em quesito arquitetônico, seria, basicamente, o de prover 
um Além para o morto eternamente. Para a imagem e texto, esse caráter também pode ser 
percebido, porém, podemos inserir aqui o fator de que a tumba possui um local para a interação 
dos visitantes para com o morto, a estrutura superior. Na TT 52, os espaços de interação estão 
dispostos em A, B e C das Figuras 2.2 e 2.3 (Cf. p. 87 e 88). Em B, na chamada capela funerária, 
as paredes estão decoradas, como podemos ver na planificação (Figura 3.1) do plano decorativo 
desse espaço. Podemos, portanto, separar essas seis paredes em sete motivos iconográficos 
diferentes que, de certa forma, se complementam e assumem o papel mágico de manter Nakht e 
165 
 
Tawi no Além72. Para facilitar a compreensão, colocamo-los em diferentes cores na Figura 3.1, a 
saber: oferendas para Rê (em marrom), cenas agrícolas (em verde escuro), mantimentos para Nakht 
(em azul escuro), banquete funerário (em roxo), caça e pesca no pântano, vinicultura e caça de 
pássaros (em rosa) e, por fim, ritos funerários (em verde claro). 
 
Figura 3.1: Planificação do plano decorativo da TT 52. 
Fonte: adaptado de Laboury (1997, p. 76-77). 
 
 Melinda Hartwig (2004, p. 39), ao explorar sobre a função de uma imagem em uma tumba 
tebana privada, explica que, no antigo Egito, o sagrado e o invisível se manifestavam a partir das 
imagens. Para isso, os símbolos representavam e comunicavam as ideias, crenças e atitudes sobre 
 
72 Não sabemos de quem seria o terceiro caixão visto no Capítulo 2, mas, como suponhamos que poderia 
ser de alguma filha do casal, ela poderia aparecer na cena de caça e pesca no pântano e, mesmo que não 
possamos fechar essa ideia no momento, é um questionamento para a sua análise. 
166 
 
a natureza da vida e a realidade que estavam circunscritas na sociedade (HARTWIG, 2004, p. 39). 
Podemos, portanto, trazer aqui a reflexão de Rapoport (1982) sobre o que seriam os elementos de 
um ambiente. Dessa forma, a imagem faria parte dos elementos fixos desse espaço funerário, 
indicando de maneira eterna (como seria o ideal de acordo com a crença egípcia) para o morto os 
seus mantimentos para o Além. Hartwig (2004, p. 40-41) explica que, para ocorrer essa indicação, 
o local que estavam essas imagens precisavam ser comemoradas a partir de um contato com algum 
visitante da tumba. 
 Não nos cabe entrar em detalhes sobre o que seria essa memória comemorativa; no entanto, 
devemos explicá-la, mesmo que de maneira superficial. Para Assmann (1988, p. 51-52), esse tipo 
de memória vem da presença dos mortos em um momento atual, sendo um espaço da comemoração 
que abrange o passado e o presente, mortos e vivos, em um horizonte comum. Dessa forma, 
Assmann (1988, p. 51-52) argumenta que, se os mortos são comemorados, são porque possuem um 
poder presente; se não têm poder atual, são esquecidos e não existem mais, de modo que o passado 
exista apenas como duração atual, enquanto o presente exista apenas como um passado contínuo. 
Sendo assim, essa comemoração é o que mantêm os mortos, por meio da magia circunscrita no 
espaço, regozijando o Além. 
É interessante a reflexão feita recentemente por Betsy M. Bryan (2009, p. 27), que 
compreende essa memória também como expressa pelo próprio morto. A lógica desse 
posicionamento de Bryan é eficaz pois, ao construir sua tumba, o membro da elite expusera sua 
compreensão de mundo. Nesse ato, podemos perceber uma escolha de imagens e textos que vão 
refletir essa compreensão. Se atentarmos para o Esquema 7 e as ações descritas em uma tumba pelo 
morto, compreendemos que os verbos “ver”, “receber”, “ofertar” e “contar” são ações feitas pelo 
morto em um ciclo eterno. De acordo com Bryan (2009, p. 27), essa projeção pode ser uma 
metáfora para a sua própria memória imaginada de sua vida desejada. Se atentarmos ao Ritual de 
Abertura de Boca, por exemplo, compreendemos que, a partir de um ritual, a estátua do morto era 
revitalizada, de modo que palavras pudessem ser pronunciadas. As palavras exprimem um poder 
mágico que, nesse caso, são uma forma de manter o morto. Portanto, ao “ver”, “receber”, “ofertar” 
e “contar”, o morto pronuncia e torna realidade essas ações em sua tumba. Dessa forma, a função 
dessas cenas nas tumbas egípcias tinha como objetivo, além de propagar a identidade social do 
morto, de impactar os visitantes do espaço, a fim de que eles apreciassem as imagens e 
167 
 
rememorassem o morto. Esse ato apresenta a ideia de que, além das propriedades mágicas e 
comemorativas dos textos e das imagens, a iconografia das tumbas tebanas reafirma uma 
preocupação dos egípcios em valorizar sua vida no Egito terreno e em prol de assegurar a do Além, 
demonstrando, assim, as concepções ideológicas e religiosas que permeavam o momento 
vivenciado na região de Tebas. 
 
2. OFERENDAS PARA RÊ 
 
 Os alimentos são necessários para a manutenção da vida de todo ser vivo. Ao se tratar de 
uma sociedade, entendemos que os alimentos possuem um significado cultural que é intrínseco ao 
cotidiano desse determinado povo. Para os antigos egípcios, a alimentação é vista como algo 
necessário e que pode ser escasso, se considerarmos a posição geográfica dessa sociedade e a 
irregularidade do rio Nilo quanto às suas cheias (ZINGARELLI, 2011, p. 85). Portanto, ao vermos 
iconografias ou textos evidenciando um motivo alimentício, tendemos a imaginar que issoera algo 
importante para os que produziram o documento. No LDM existem diversas fórmulas que provém 
água e alimentos para o morto e, portanto, também são presentes essas cenas em paredes de tumbas 
de particulares do Reino Novo. A tumba de Nakht (TT 52) apresenta essa cena de adoração com 
muitos alimentos na entrada do espaço que seria vista ao sair da tumba, como nos mostra as Figuras 
3.2 e 3.3. Como podemos analisar essa cena? As imagens coloridas referentes às paredes aqui 
trabalhadas podem ser encontradas no Corpus (Cf. p. 3; 38 do Volume II). 
 
168 
 
Figura 3.2: Visão da parede leste (saída da tumba) na projeção tridimensional da TT 52. 
Fonte: projeção feita em colaboração com o Prof. Dr. Bruno Leonardo Canto Martins 
(DFTE/UFRN) no SketchUp. 
 
Figura 3.3: Recorte da cena das oferendas em desenho (parede leste). 
Fonte: adaptado de Laboury (1997, p. 52). 
 
169 
 
A cena é espelhada, na qual Nakht e Tawi aparecem diante de uma mesa de oferendas. Na 
parede sudeste, vemos cinco personagens (o casal e três servos), enquanto na parede nordeste são 
treze personagens (o casal e onze servos). As mesas de oferendas estão separadas em três partes, 
com uma esteira verde marcando essa separação: na primeira parte, quatro vasos com lótus acima 
deles; na segunda, alimentos e, na terceira, um boi fora representado com servos o cortando 
(sudeste) e já cortado (nordeste). Em ambas as imagens, Nakht aparece com um vaso em suas mãos, 
despejando algo na mesa de oferendas e Tawi aparece com dois instrumentos, um menit e um sistro. 
Na parede nordeste, os onze servos aparecem à esquerda do casal, em três registros, com oferendas 
em direção à mesa. 
 Dessa forma, podemos separar a parede leste em motivos iconográficos, como podemos ver 
na Figura 3.473. Em uma observação rápida podemos constar que houve, de fato, uma preocupação 
em organizar esses desenhos nas duas paredes de modo que eles possam ser espelhados e da mesma 
altura. Temos, portanto, o casal, as mesas de oferendas, boi(s) em dois estágios (sendo cortado e já 
cortado), lótus e os vasos, e os servos com as oferendas. Essa composição imagética aparece, 
geralmente, com uma divindade após a mesa de oferendas, algo inexistente em nossa parede. Sendo 
assim, existe algo ou alguém, ausente na iconografia, que seria aquele receptor das oferendas. 
Como, então, podemos lidar com essa ausência? De acordo com Angenot (2014), essa ausência 
pode ser encontrada seguindo uma perspectiva hermenêutica. Sendo assim, começaremos por 
compreender cada motivo iconográfico e, depois, interpretá-lo em um contexto. 
 
73 Por enquanto, não trabalharemos com a inserção dos hieróglifos na cena, pois isso exige uma maior 
complexidade, por isso destinamos isso ao Capítulo 4. 
170 
 
Figura 3.4: Motivos iconográficos na parede leste (cena das oferendas funerárias) da TT 52. 
Fonte: esquema elaborado por Pedro Hugo Canto Núñez (2020), baseado no desenho de Laboury 
(1997, p. 52). 
 
Figura 3.5: Destaque nas representações de Nakht e Tawi da cena de oferendas da TT 52. 
Fonte: desenho feito por Pedro Hugo Canto Núñez (2020), com base em Davies (1917, Pr. XII; 
XVIII). 
 
171 
 
 As figuras em destaque nas imagens são Nakht e Tawi. Na Figura 3.5 temos o recorte de 
suas silhuetas para podermos compreender melhor os símbolos presentes neles. Nakht aparece em 
um gesto correspondente ao signo hieroglífico A30 ( ), que, de acordo com Wilkinson (p. 29), 
em pinturas ou estatuetas, esse gesto é comumente visto diante divindades ou reis como um sinal 
de respeito e adoração. Existe uma diferença entre as duas representações de Nakht: a da esquerda 
nos mostra um Nakht com barbicha, que simboliza um certo poder que ele tivera, um maior status 
social. Não existe um problema em sua inexistência na representação da esquerda, uma vez que na 
cena de caça e pesca, onde existe mais um espelhamento de cena, o Nakht da direita aparece com 
barbicha, enquanto o da esquerda não. O colar, do tipo wesekh, e os braceletes são de contas. Os 
colares de acordo com Alan Schulman (1988, p. 1-6) eram concedidos pelo rei aos seus 
funcionários na cerimônia do “Ouro de Honra” durante o Novo Reino. Schulman (1988, p. 1-6) 
interpreta que essa cerimônia, atestada em alguns textos do Reino Novo, seria comum, baseando-
se na quantidade de resquício material e iconográfico que temos desses colares. O saiote de Nakht 
possui uma certa diferenciação dos saiotes dos servos, indicando um status social mais elevado que 
os demais. O vaso em sua mão trata-se, provavelmente do hieróglifo W1 ( ), que aparece como 
determinativo de mDt, unguento. Podemos atestar essa referência a partir do líquido que é 
representado saindo do vaso para a mesa de oferendas. 
 Quanto à Tawi, ela está com uma mão em frente ao peito e outra para baixo. Nas mãos perto 
ao peito, ela porta um colar menit (mnjt), correspondente ao hieróglifo S18 ( ), um colar de cabeça 
pesada com uma peça frontal em crescente e um contrapeso preso na parte traseira. Nas outras 
mãos, é representado um sistro (sSSt), signo hieroglífico Y8 ( ), um objeto com hastes de metal 
colocadas em um aro, que suportavam pequenos discos de metal ou quadrados que produziam um 
som característico de tilintar quando o instrumento era sacudido. Tanto o colar quanto o sistro, 
podem ter funcionado como uma espécie de instrumento de percussão em certos contextos 
religiosos. Ambos estavam associados à deusa Háthor. Wilkinson (1992, p. 173) afirma que o menit 
parece ter funcionado como um meio pelo qual o poder da deusa era transmitido, de modo que 
muitas representações mostram essa divindade oferecendo o menit ao rei. Dessa maneira, 
Wilkinson (1992, p. 173;213) acredita que tanto o menit quanto o sistro eram associados a ideias 
de vida, potência, fertilidade, nascimento e renovação. Além disso, podemos constatar que Tawi 
fora representada portando do colar shebyu, que, de acordo com Peter Brand (2006), eram, assim 
172 
 
como o de Nakht, entregues aos funcionários na cerimônia de “Ouro de Honra”. Em sua cabeça, 
Tawi está representada com uma tiara de lótus, a Nymphaea cerulea, indicada no hieróglifo M9 (
). Essa flor, nesse contexto, pode ser interpretada como adorno, mas é mais provável que haja 
uma associação ao deus Nefertem, referência ao sol, perfume, e renascimento. Por fim, seu vestido 
apresenta uma diferença entre as duas imagens. Enquanto a da direita aparece com um seio para 
fora, a Tawi da esquerda tem seus seios cobertos pelo vestido. Isso pode ser associado ao tipo de 
representação feminina, ambos os tipos são comuns na iconografia egípcia do período; por 
exemplo, a Deusa do Sicômoro que aparece na parede sul da tumba possui um vestido que cobre 
os seios, mas, mesmo assim, o mamilo da deusa aparece no desenho. 
 
Figura 3.6: Destaque nas representações das mesas de oferendas da parede leste da TT 52. 
Fonte: desenho feito por Pedro Hugo Canto Núñez (2020), com base em Davies (1917, Pr. XII; 
XVIII). 
173 
 
 
 Quanto às mesas de oferendas, na Figura 3.6 vemos os seus destaques. Na primeira esteira, 
os vasos com lótus são referentes, respectivamente, aos hieróglifos W1 ( ) e M9 ( ). Nas 
segundas esteiras possuimos uma miscelânia de alimentos. Uvas e figos, conforme comprova Mary 
Anne Murray (2009, p. 612-614), são achados comuns e aparecem em tumbas. Existiam muitos 
tipos diferentes de pães no Egito Antigo; nessas mesas de oferendas podemos ver quatro tipos 
diferentes (redondos, ovais com extremidades pontiagudas, ovais com extremidades arredondadas 
e uma base maior, e retangulares). De acordo com Salima Ikram (2009, p. 669), carne, seja ela 
bovina, avícola ou pisciana, era disponibilizada pelo palácio para uma parte da população egípcia 
uma ou duas vezes na semana. Ikram (2009, p. 669) afirma que as pessoas mais pobres podiam 
obter suas carnes a partir da caça e da pesca, enquanto os membros da elite, alémde poder consumir 
a partir de criações de porcos, cabras e ovelhas, podiam ainda comprar dos templos quando estes 
possuissem um extra74. Sendo assim, a aparição desses alimentos nessa esteira faz parte desse 
sistema alimentar que podemos encontrar nos resquícios arqueológicos. Na terceira esteira temos 
duas representações de bois sendo ofertados. Salima Ikram (2009, p. 657) expõe, com base nos 
relevos da tumba de Ptahhotep, em Saqqara, que o sacerdote wab (wab) costumava examinar o 
animal quanto à pureza e saúde, testando seu sangue e suas entranhas. Depois que a garganta era 
cortada, o sangue era drenado do corpo pela pata dianteira do animal, forçando o sangue a fluir das 
veias e artérias do pescoço cortado. Isso ajuda a explicar o porquê da pata dianteira ser um 
determinativo de força e de ser cortada como uma oferenda aos deuses, sendo um componente 
vital, um artifício usado para esvaziar o sangue do corpo, evitando assim a deterioração da carne. 
Além disso, é interessante que aparecem em cenas do Ritual de Abertura de Boca da XXV e XXVI 
Dinastia o corte do boi e, em seguida, o uso da pata dianteira como utensílio para o ritual pelo 
sacerdote (WILKINSON, 1992, p. 74-75)75, conforme atestamos na Figura 3.7. 
 
 
74 Essa discussão de “sobras de carne em templos” aparece no Papiro Bulaq II e é comentada por T. Eric 
Peet (1934), ao estudar uma unidade de valor nesse papiro. 
75 Na parede norte da TT 52, veremos que partes do boi são ofertadas a Nakht e Tawi, logo abaixo do que 
seria a representação do Ritual de Abertura de Boca. 
174 
 
 
Figura 3.7: Detalhe da tumba de Pedamenopet, TT 33. 
 
Fonte: adaptado de Dümichen (1885, Pr. VII). 
 
 Por fim, temos os servos que estão dispostos na extrema esquerda da cena, divididos nos 
três registros. Os alimentos como uvas, pães e figos levados são referêntes à oferta para a mesa de 
oferendas, um motivo comum, conforme supracitado. Os papiros presentes, que referenciam os 
hieróglifos M15 ( ) e M16 ( ), simbolizam a vida e prosperidade nessas oferendas. O khepesh, 
do hieróglifo F 24 ( ), como explicamos acima, possui um significado associado ao poder 
conferido nessa oferta. É interessante destacar aqui os patos que aparecem no terceiro registro, uma 
vez que eles possuem uma semelhança no código visual com os inimigos do rei sendo massacrados. 
Por isso, Wilkinson (1992, p. 95) compreende que os patos nessas cenas possuem dois significados 
distintos (mas que se complementam): o de supressão do mal (e, portanto, a manutenção da ordem) 
e o da fertilidade e renascimento (por causa, provavelmente, da manutenção da ordem). Os 
antílopes que aparecem nos três registros nos evocam uma série de problemáticas. No primeiro e 
no terceiro, tratam-se de um Oryx dammah ou Oryx beisa, por causa do tipo do rabo e da barriga76, 
que, de acordo com Åsa Strandberg (2009, p. 12) eram chamados no Egito antigo de mA HD (“vendo 
branco”). Esse tipo de órix aparece no Capítulo 112 do LDM, que trata sobre a reconstrução do 
olho de Hórus por Rê: 
 
[...] Aconteceu que Rê disse a Hórus: “Deixe-me ver seu olho já que isso aconteceu 
com ele”. Ele olhou para ele e disse: “Olhe para aquele ponto preto com a mão 
 
76 A pintura da parede não foi finalizada, faltando alguns detalhes perceptíveis. Por este fator, não podemos 
considerar a coloração, mesmo que branca, como um fator argumentativo. 
175 
 
cobrindo o olho que está lá”. Hórus olhou para aquele ponto e disse: “Eis que estou 
vendo completamente branco”. E foi assim que o órix surgiu (FAULKNER, 2015, 
p. 128)77. 
 
Dessa forma, compreendemos um complexo sistema de crenças existentes em apenas um signo. 
No segundo registro temos a Gazella dorcas, que, de acordo com Strandberg (2009, p. 9), é a mais 
comum na arte egípcia. No entanto, Strandberg (2009, p. 101-104) argumenta que existia, nessas 
cenas, uma referência com a caça no deserto e, se presente esse tipo de gazela em uma cena de 
oferendas funerárias, seria um indicativo de alto status social do dono da tumba78. Hermann Junker 
(1938, p. 69) nos mostra que essas gazelas eram, comumente, guiadas pelos chifres, de modo que, 
com esse argumento, Jacques Vandier (1969, p. 187-190) defende que essas gazelas aparecem na 
iconografia como animais domésticos quando jovens para, depois do período de engorda, serem 
sacrificadas nessas cenas de oferendas79. 
A primeira aparição de oferendas funerárias, de acordo com Assmann (2000, p. 81), fora 
de motivos iconográficos, nas tumbas da V Dinastia. Este autor defende que a função de uma 
oferenda é dada já no Texto das Pirâmides, na Fórmula 373. Há uma separação desse texto em 
quatro partes. Em um primeiro momento, o morto se prepara e estabelece um contato, em seguida, 
apresenta as oferendas, que serão interpretadas em sua sacralidade no terceiro momento e, por fim, 
serão postas em favor desse morto (ASSMANN, 2000, p. 82). A fórmula em questão é a seguinte: 
 
Oho, o que está fazendo? Oho, o que está fazendo? Levante-se, Ó Rei; receber sua cabeça, 
coletar seus ossos, reunir seus membros, jogar fora a terra de sua carne, receber seu pão que 
não cresce humorado e sua cerveja que não cresce azedo, e ficar nas portas que mantêm 
fora os plebeus. Hnty-mnwt.f sai até você e agarra sua mão, ele te leva para o céu, para seu 
pai Geb. Ele está alegre em conhecê-lo, ele coloca as mãos em você, ele te beija e te acaricia, 
ele te coloca na cabeça dos espíritos, as Estrelas. Aqueles cujos assentos estão escondidos 
te adoram, os Grandes cuidam de você, os Observadores esperam por você. A cevada é 
 
77 No original: [...] It so happened that Re said to Horus: “Let me see your eye since this has happened to 
it”. He looked at it and said: “Look at that black stroke with your hand covering up the sound eye which is 
there”. Horus looked at that stroke and said: “Behold, I am seeing it as altogether white”. And that is how 
the oryx came into being (FAULKNER, 2015, p. 128). 
78 Temos, como exemplo do período de Nakht, Menna (TT 69) e Nebamun (TT E2), que possuem, em 
cenas de oferendas, a Gazella dorcas. 
79 Essas cenas de sacrifícios possuem semelhanças com o corte da pata dianteira do boi, como vimos nas 
Figuras 46 e 47, mas, de acordo com Vandier (1969, p. 189), são mais raras. 
176 
 
relada para você, o trigo é colhido para você, e isso é feito em seus festivais mensais, 
oferenda disso é feita em seus festivais semestrais, sendo o que foi ordenado a ser feito por 
você por seu pai Geb. Levante-se, Ó Rei, pois você não morreu! (FAULKNER, 2007, p. 
123-124)80. 
 
Assmann (2003b) defende que a adoração do morto (não pertencente à realeza) aos deuses 
é um tema que está totalmente ausente da decoração das tumbas de particulares dos Reinos Antigo 
e do Médio, sendo inédito no Reino Novo. Isso pode ser resultado da aproximação do faraó com 
os sacerdotes de Âmon para a retomada do poder dos egípcios da XVII Dinastia de seu território 
durante o Segundo Período Intermediário. Assmann (2003b) indica que, nas tumbas pré-
amarnianas, a localização da adoração do morto aos deuses está restrita à parte acima das portas 
das tumbas, que pode também incluir alguma porta-falsa, como o objetivo para o qual a procissão 
é dirigida. 
 Ao observarmos apenas a iconografia e compreendendo-a no espaço, vemos que existe um 
esquema pragmático da leitura dessa cena, obedecendo a mesma sequência que Assmann (2000, p. 
82) comenta: um contato estabelecido pelo morto, as oferendas apresentadas, interpretadas no 
nascer do sol, ausente na iconografia e inserida no espaço, e, depois, o morto que as recebe. Para 
construirmos uma ordem de leitura, podemos nos basear no artigo de Tefnin (1993) sobre a leitura 
da imagem a partir da ótica egípcia e da atualização dessa visão, a partir da perspectiva de Angenot 
(1996) sobre a vetorialidade das imagens em tumbas privadas no Reino Novo. Na Figura 3.8, 
vemos a vetorialidade da cena, na qual temos como motivoiconográfico principal o casal, em 
seguida o que está no seu campo de visão, a esteira central e, em seguida, a terceira esteira, por ser 
o segundo maior componente e, depois, a primeira. Na parede da esquerda ainda temos os três 
registros de servos com as oferendas. 
 
80 No original: “Oho! Oho! Raise yourself, O King; receive your head, collect your bones, gather your limbs 
together, throw off the earth from your flesh, receive your bread which does not grow moodily and your 
beer which does not grow sour, and stand at the doors which keep out the plebs. Hnty-mnwt.f comes out to 
you and grasps your hand, he takes you to the sky, to your father Geb. He is joyful at meeting you, he sets 
his hands on you, he kisses you and caresses you, he sets you at the head of the spirits, the Imperishable 
Stars. Those whose seats are hidden worship you, the Great Ones care for you, the Watchers wait upon you. 
Barley is threshed for you, emmer is reaped for you, and offering thereof is made at your monthly festivals, 
offering thereof is made at your half-monthly festivals, being what was commanded to be done for you by 
your father Geb. Rise up, O King, for you have not died!” (FAULKNER, 2007, p. 123-124). 
 
177 
 
Figura 3.8: Vetorialidade da cena de oferendas funerárias da TT 52. 
Fonte: esquema elaborado por Pedro Hugo Canto Núñez (2020). 
 
 Sendo assim, compreendemos que existe um sistema cognitivo exposto nessa cena a partir 
da junção da iconografia com o espaço ao qual ela está circunscrita. Nessa cena, Nakht realiza uma 
cena de adoração com sua esposa apoiando, acompanhando o ritual a partir de seus instrumentos. 
Pelo ato da musicalidade, podemos afirmar que Tawi também possui um papel importante nessa 
imagem. Aquele que recebe a oferenda e adoração está ausente da imagem. No entanto, nessa 
ausência podemos constar que existe um espaço físico que divide as duas paredes. Esse espaço é, 
justamente, a porta de saída/entrada da tumba, para o Leste. Por uma questão natural, o sol, ao 
nascer no leste, ilumina o interior da TT 52. Nesse momento, o ausente se faz presente. Portanto, 
o deus solar existe na cena a partir da organização espacial. 
É interessante pensar no sistema cognitivo induzido para essa produção. Vimos no Esquema 
4 (Cf. p. 105) que, diante de um problema X e Y, o cérebro humano os processa e retorna ao mundo 
um produto E. Em nosso caso, usando dessa lógica de Malafouris (2013), compreendemos melhor 
como os antigos egípcios engendraram essa cena de oferendas da TT 52, na qual os problemas 
seriam a organização espacial em conjunto com as crenças egípcias, deixando-nos a cena estudada 
aqui como o produto dessa fórmula. Se pensarmos na recepção desse quadro e observarmos o 
Esquema 1 (Cf. p. 16 do Volume I), compreendemos que aquele egípcio visitante da tumba iria 
compreender essa imagem a partir da sua visão de mundo, interpretando que por Nakht estar em 
uma posição de adoração e Tawi com o sistro e o menit, ambos estariam, então, em um ritual. Isso, 
178 
 
em uma visão de saída da tumba, indicaria que o sol, pelos seus raios, estaria recebendo essas 
oferendas do ritual. Dessa forma, o ambiente fora construído de modo que aqueles visitantes 
(elemento não-fixo) visualizasse os elementos fixos (as paredes) e os elementos semi-fixos (as 
imagens), interpretando-os dessa forma, baseando-se no complexo sistema de identificação visual 
que exploramos acima. Mesmo que não fosse feita a leitura detalhada e todo esse complexo sistema 
fosse posto em prática pelos descendentes de Nakht e Tawi, a ideia central era lida, a adoração e 
oferendas às divindades solares, de modo que essas fossem retornadas ao casal no Além, conforme 
a crença egípcia. 
 
3. CENAS AGRÍCOLAS 
 
Por muito tempo, as cenas agrícolas que aparecem em tumbas de particulares (que são 
motivos iconográficos um tanto comuns) foram lidas como cenas do cotidiano que eram desejadas 
para o Além, como, por exemplo, nos textos de Davies (1911; 1913; 1915; 1917; 1975) e Cyril 
Aldred (1996). Em textos recentes podemos ver uma interpretação mais complexa que essa. Janice 
Kamrin (1999, p. 72), ao estudar a tumba de Khnumhotep, compreende que essas imagens indicam 
que o morto teria, magicamente, suprimento de grão para a eternidade em suas refeições e 
oferendas. É interessante ainda uma sutil diferença que apresentam Dimitri Laboury (1998, p. 131-
148) e Jan Assmann (2003b, p. 51) quanto ao entendimento dessas cenas; enquanto o primeiro 
argumenta que o significado da ação representada existe como um ponto de contato entre o mundo 
terreno e o Além, no qual o observador existe dentro da composição em prol do morto, o segundo 
interpreta que a decoração da tumba serve como um diálogo entre o morto e o vivo a partir da 
comemoração da identidade do morto e a preservação dos seus títulos e status sociais. A partir 
disso, torna-se atraente a defesa de Melinda Hartwig (2004, p. 50), que argumenta a análise dessas 
cenas por meio de uma compreensão da função da tumba, como um veículo de regeneração do 
morto no Além e um monumento comemorativo, combinando as perspectivas de Laboury (1998) 
e Assmann (2003b). 
 
179 
 
Figura 3.9: Desenho da cena agrícola na TT 52. 
Fonte: desenho feito por Pedro Hugo Canto Núñez (2020), com base em Davies (1917, Pr. XVIII). 
 
Na Figura 3.2 podemos ver, na parede Sudeste, a cena agrícola da TT 52 em nossa projeção 
tridimensional. Na Figura 3.9 temos o desenho dessa cena. São, portanto, três registros com 33 
personagens humanos ao todo. Em uma leitura de cima pra baixo, da esquerda para a direita, temos, 
no primeiro registro, 12 personagens, sendo um Nakht, que está sentado à direita da cena, sob um 
recinto, e os demais estão organizados em dois sub-registros: o primeiro, com 8 personagens 
debulhando grãos e o segundo com 3 separando grãos. O segundo registro apresenta 8 personagens, 
dos quais 2 estão colhendo linho, 3 estão arrumando o trigo em uma cesta, e os outros 3 estão 
colhendo o trigo. No último registro, Nakht aparece sentado de forma semelhante ao primeiro 
registro, também à direita da cena. À esquerda da cena, vemos um personagem bebendo algo de 
um odre sob uma árvore, enquanto os outros 11 personagens estão trabalhando no campo em 
diversas funções: a lavra, a gradagem, a semeadura e o pisoteamento do solo. 
180 
 
Essa cena é, tipicamente, uma cena agrícola. Como defende Kamrin (1999, p. 5), a área 
agrícola no Egito antigo estendia-se até o deserto (conforme a Figura 3.10), e, por isso, essa questão 
alimentícia estava no centro das questões dessa sociedade. Os egípcios dividiam seu ano de 360 
dias em três, que, comparando com o nosso moderno, como vemos na Figura 3.11, apresenta 
semelhanças. Durante o Akhet, as terras ficavam encharcadas de água e do adubo fértil carregado 
pelo Nilo, categorizando-se como um período de trabalho mais intenso e um maior controle do solo 
para o plantio. A estação seguinte é a Peret, que seria o preparo da terra, utilizando arados e enxadas 
para quebrar o solo, um trabalho que, por vezes, podia ser desempenhado com a ajuda de animais 
bovinos. Após esse preparo, as sementes eram enterradas, trabalho que também podia ser feito com 
a ajuda de animais. A última estação é a Shemu, a colheita, quando todos os sinais da água da 
inundação desapareciam. Nesse sentido, temos o Esquema 8, adaptado do estudo de Mary Anne 
Murray (2000), que analisa a produção de cereais em evidências artísticas, textuais, arqueológicas, 
arqueobotânicas, etnográficas e ecológicas. 
 
Figura 3.10: Visão esquemática da paisagem do vale do Nilo. 
 
Fonte: adaptado de Kamrin (1999, p. 5). 
181 
 
Figura 3.11: As estações egípcias comparadas com o calendário ocidental moderno. 
 
Fonte: adaptado de Kamrin (1999, p. 6). 
182 
 
Esquema 8: Fluxograma de produção de cereais pré-armazenamento e estágios de processamento. 
Fonte: adaptado de Murray (2009a,p. 506). 
Lavra 
cria um solo fino 
para semear 
Gradagem 
nivela o solo, quebra 
torrões de sujeira 
Semeadura de 
Transmissão 
dispersa sementes no solo 
Pisoteamento ou Arado 
incorpora sementes no solo 
Capinagem 
remove ervas daninhas 
do grão 
Colheita 
remove as sementes do 
campo 
Corte baixo 
na palha 
Debulhamento 
separa os espinhos da palha 
Pisoteamento 
Peneirar 
remove sementes leves de ervas 
daninhas e palha leve 
Peneiramento grosso a médio 
remove sementes grandes de ervas daninhas, 
cabeças de sementes, nós e bases de colmo de 
palha e espigas não debulhadas 
Estoque de grãos 
Enxada Arado 
Ancinho 
Feixe de 
madeira 
Malho 
Enxada 
Desenraizamento Corte apenas nas 
espigas 
Bater Passar o 
trenó 
183 
 
 A partir desse fluxograma de Murray, podemos compreender melhor a cena da TT 52. 
Seguindo, portanto, uma lógica cronológica necessária para esses processos, interpretamos que, em 
uma rápida leitura, a ordem de compreensão dessa cena seria de baixo para cima. Temos nesse 
primeiro registro (o de baixo), portanto, três homens manuseando enxadas, preparando o solo 
(etapa: lavra). Na Figura 3.12 temos um destaque desses três personagens. Se prestarmos atenção 
no homem da esquerda, vemos ele trabalhando em um espaço que, no desenho colorido, tem uma 
distinção de três cores, uma parte é azul, representando a água, outra é um marrom claro, indicando 
o solo mexido, e outro um marrom mais escuro, indicando tanto a diferença dos registros quanto o 
espaço do solo que ele se encontra. O que se torna interessante nesse caso é que dois desses homens 
(os da esquerda) tem uma aparência jovial, enquanto o outro homem, por ser calvo, parece mais 
velho. Além disso, a enxada utilizada por eles apresenta uma diferença: enquanto os de aparência 
jovial possuem uma enxada simples, que representa o signo hieroglífico U8 ( ), o calvo fora 
representado com um mais complexo, do hieróglifo U6 ( ). Os significados dos hieróglifos são os 
mesmos, “enxada”, “cultivar”, mas essa distinção tecnológica, junto com a nossa interpretação da 
idade, pode nos determinar que o homem da esquerda possuía uma maior experiência por ser mais 
velho. 
 
Figura 3.12: Detalhe dos homens trabalhado com enxadas na TT 52, cena agrícola. 
Fonte: desenho feito por Pedro Hugo Canto Núñez (2020), com base em Davies (1917, Pr. XVIII). 
 
184 
 
 No trabalho de gradagem, vemos o trabalho do homem careca do sub-registro superior, que 
está com um machado (hieróglifo T7a - ) tirando uma árvore e, portanto, limpando o solo para a 
semeadura. Na semeadura, temos três personagens que efetuam esse trabalho, detalhados na Figura 
3.13. Todos os três parecem estar próximos a trabalhadores que efetuam outras tarefas que 
complementam com as suas. O primeiro está no sub-registro superior, próximo àqueles dois 
trabalhadores com enxada simples que comentamos anteriormente. Ele está vestido com um saiote 
e possui cabelo. Ele segura a cesta de sementes com a mão esquerda e as joga no solo com a mão 
direita, depois do trabalho com a enxada dos outros dois trabalhadores. O segundo está com o 
mesmo tipo de saiote que o anterior e na mesma posição, mas é careca. Enquanto o terceiro, além 
de ser careca, não possui vestimenta alguma. Este último joga as sementes ao solo com a mão 
direita mais próxima dele se compararmos com os outros dois. Ele está logo após os trabalhadores 
que utilizam dos animais para arar a terra. Nesse caso, a falta de cabelo no segundo camponês pode 
não ser um fator de distinção social, visto que todos são trabalhadores em uma cena agrícola (se 
fosse em uma cena de banquete, por exemplo, na qual é composta por membros da elite, teríamos 
que distinguí-los). O fator de diferença aqui está no terceiro personagem. Existem muitos trabalhos 
que comentam sobre representações de crianças e seus simbolismos (DODSON, 1990; FISHER, 
2001; ROBINS, 1983; ROBINS, 1987; ROMANO, 1991; XEKALAKI, 2007), no entanto, a 
maioria é voltado para príncipes e princesas e suas relações para com a realeza desde a infância. 
Entretanto, e aqui Schäfer (2002, p. 147) nos é útil, compreendemos que a maioria das 
representações de pessoas nuas são, de fato, crianças. É provável que nosso terceiro personagem 
seja uma criança e que vemos, no conjunto ao qual possivelmente ele pertence, três estágios da 
vida de camponeses, quando criança, adulto e velho (respectivamente), conforme veremos na etapa 
seguinte. 
 
185 
 
Figura 3.13: Detalhe dos homens semeando na TT 52, cena agrícola. 
Fonte: desenho feito por Pedro Hugo Canto Núñez (2020), com base em Davies (1917, Pr. XVIII). 
 
 Possuímos dois tipos do trabalho de incorporar as sementes no solo: o pisoteamento e o 
arado. Para o pisoteamento, Figura 3.14, temos dois homens representados da mesma forma 
(mesmo tipo de cabelo, vestimenta e intrumento de trabalho) e pertencem ao conjunto do homem 
careca da etapa anterior. O que torna interessante aqui é o fato do grupo de artesãos que pintaram 
essa cena fizeram uma distinção do solo, assim como o trabalho com a enxada que comentamos 
anteriormente. Dessa forma, os dois trabalhadores incorporam as sementes jogadas pelo homem 
careca com o auxílio de um instrumento semelhante a um martelo. Murray (2009a, p. 519) afirma, 
com base nos estudos de A. Lloyd (1976, p. 75-76) e na pesquisa de Y. Harpur (1987) sobre a 
iconografia de tumbas do Reino Antigo, que existia uma diferença de aplicabilidade dessas duas 
técnicas baseada no nível do solo. De acordo com Lloyd (1976, p. 77), o solo do Delta, desde o 
Reino Antigo até o Período Tardio (século V A.E.C.), era bastante irrigado e extenso, de modo que 
o uso da técnica do pisoteamento não era eficaz, sendo necessário o uso de animais para arar a 
terra. Isso pode ser confirmado por Harpur (1987, p. 163), quando ele argumenta que as 
representações de camponeses pisoteando os campos agrícolas nas tumbas são escassos no Baixo 
Egito, sendo mais comum em tumbas do Alto Egito. Para Murray (2009a, p. 519), enquanto o 
Baixo Egito utiliza muito trabalho animal para incorporar as sementes no solo, os camponeses do 
Alto Egito utilizam do pisoteamento para esse fim. 
 
186 
 
Figura 3.14: Detalhe dos homens incorporando sementes ao solo por pisoteamento na TT 52. 
Fonte: desenho feito por Pedro Hugo Canto Núñez (2020), com base em Davies (1917, Pr. XVIII). 
 
Apesar dessa distinção, o trabalho com animais também pode ser visto na TT 52. Na Figura 
3.15 podemos ver que os quatro bois aparecem como animais de trabalho, limpando o solo com 
um arado, hieróglifo U13 ( ), próprio para esses animais, e guiados por dois homens, ambos com, 
pelo menos uma mão no instrumento. A criança que mencionamos na etapa anterior aparece na 
extremidade da esquerda. Aqui percebemos algo semelhante ao caso do trabalho com a enxada: 
um homem calvo e, ainda, corcunda. Esse homem, por essas duas características, pode, de fato, ser 
mais velho quando comparado ao outro. No entanto, o homem da esquerda possui um açoite, 
hieróglifo S45 ( ). O interessante sobre esse instrumento é que ele possui dois significados 
divergentes. De acordo com Alan Gardiner (1993, p. 93), esse açoite, chamado de nxAxA, era, 
provavelmente, um instrumento usado por pastores. No entanto, podemos encontrar textos que 
defendem um caráter mais ritualístico desse objeto, como o de Percy Newberry (1929), que 
argumenta uma existência do nxAxA em iconografias divinas e em sacerdotes nos festivais. É bem 
provável que aqui seja pressuposto o seu teor prático, bater no animal, pois o personagem que 
segura esse objeto está representado em uma cena agrícola e não recebe um destaque na imagem. 
 
187 
 
Figura 3.15: Detalhe do uso de animais para incorporar sementes ao solo arando na TT 52. 
Fonte: desenho feito por Pedro Hugo Canto Núñez (2020), com base em Davies (1917, Pr. XVIII). 
 
 No segundo registro da cena, detalhado naFigura 3.16, seguindo a ordem de baixo para 
cima, temos a continuidade dos processos do fluxograma. Nesse registro, temos uma ordem 
cronológica seguindo da direita para a esquerda, para o trabalho da colheita. Primeiro, três homens, 
dois carecas e um com cabelo, fazem o corte no trigo com o auxílio de uma foice. Esse corte fora 
apenas nas espigas, conforme vemos na sequência, quando aparece uma mulher de saiote colhendo 
espigas e colocando em cestas e dois homens com as espigas em uma cesta. O grupo de artesãos 
representou o tipo de corte feito pelos homens com as foices por trás dos dois homens fechando o 
cesto. As duas mulheres na extrema esquerda são, de certa forma, emblemáticas. Laboury (2017), 
ao nos demonstrar como diversas cenas agrícolas que aparecem no Novo Reino se assemelham, 
indica que mulheres nessas cenas são comuns. Por trás delas está representado uma parte de água 
(pode ser que elas estivessem dentro da própria água), talvez o rio Nilo. As duas trabalham na 
colheita do linho, um material de difícil artesanato e, portanto, de alto nível social (HEGEMAN, 
2006, p. 14). Sendo assim, esse material também estaria disponível para Nakht e Tawi no Além. 
 
188 
 
Figura 3.16: Detalhe do segundo registro da cena agrícola da TT 52. 
Fonte desenho feito por Pedro Hugo Canto Núñez (2020), com base em Davies (1917, Pr. XVIII). 
 
Figura 3.17: Destaque do terceiro registro da cena agrícola da TT 52. 
Fonte: desenho feito por Pedro Hugo Canto Núñez (2020), com base em Davies (1917, Pr. XVIII). 
 
189 
 
 No terceiro registro, Figura 3.17, vemos dois homens separando os grãos no primeiro sub-
registro (de baixo para cima) e um supervisionando, enquanto, no segundo sub-registro, vemos oito 
personagens realizando o debulhamento desses grãos com um instrumento que, conforme vemos 
na Figura 3.18, temos um exemplar bem preservado no Museu Britânico. Conforme supracitamos, 
no primeiro sub-registro, o homem que está em posição de ordem, que é assimilado ao hieróglifo 
A26 ( ), possui um destaque de status social dos outros dois. Além disso, o grupo de artesãos 
desenhou os grãos em um determinativo espacial associado ao hieróglifo N26 ( ), que, de acordo 
com Gardiner (1993, p. 68), representa uma montanha coberta de areia além das áreas irrigadas. 
Talvez, esse artifício fosse apenas para indicar a separação dos grãos em duas partes. 
No sub-registro superior, os camponeses possuem uma touca branca. O que torna 
interessante essa cena do debulhamento é a descrição espacial que o grupo de artesãos designou 
nesse conjunto. Existe uma diferença de coloração (amarronzada) entre esse conjunto e o resto da 
parede (branca), o que pode nos indicar que seria um local fechado (talvez o celeiro?). Além disso, 
entre os trabalhadores, vemos dois símbolos que parecem não ser associados à cena, o hieróglifo 
N12 ( ) e o W79 ( ). Provavelmente, o vaso poderia servir como recipiente de alguns grãos. O 
N12, no entanto, é o hieróglifo que representa a lua crescente. Sendo assim, temos uma indicação 
espacial (eles estariam em um recinto fechado) e temporal (seria em uma noite de lua crescente). 
A justificativa para tal escolha iconográfica não é clara, no entanto, é provável que seja uma 
referência à divindade lunar, Khonsu ou Renenutet. Khonsu, uma divindade que faz parte da tríade 
tebana, possui, como coroa, uma representação da lua cheia em cima de uma lua crescente 
(WILKINSON, 2017, p. 114), que, conforme demonstra Helen Jacquet-Gordon (2003, p. 8-9) em 
sua tese, ao analisar os grafites do templo de Khonsu, faz parte de uma iconografia comum entre 
os habitantes de Tebas que tinham acesso ao templo. De acordo com o levantamento de Jacquet-
Gordon (2003, p. 19; 31), o motivo iconográfico de uma lua crescente aparece quatro vezes entre 
os grafites, duas desenhado conforme a iconografia do deus, uma apenas o hieróglifo N12 e outra 
acompanhada de um boi. A autora argumenta que a aparição e a disseminação da imagem do deus 
pode ser devido a algum festival que a sua estátua aparecera (JACQUET-GORDON, 2003, p. 19). 
Quanto a Renenutet, no texto de J. Broekhuis (1971) podemos encontrar algumas respostas. A 
deusa Renenutet é, comumente, associada à plantação e, também, à maternidade, aparecendo nos 
TP como aquela que acompanhava o egípcio desde seu nascimento até a sua morte (WILKINSON, 
190 
 
2017, p. 225-226). Broekhuis (1971) defende que o seu aspecto materno é encontrado mais nos TP, 
enquanto sua conexão com a colheita é presente no Reino Novo. Provavelmente, a deusa estaria 
presente na cena agrícola da TT 52 por seu simbolismo e associação com esse motivo iconográfico. 
Conforme demonstra Broekhuis (1971, p. 25), em uma estela encontrada em Tebas na XIX 
Dinastia, a deusa aparece em conjunto com uma divindade lunar e, de acordo com as listas dos 
festivais que a deusa aparece, entre as temporalidades de Amenhotep I e Amenhotep III, existem 
grandes oferendas de grãos feitas à deusa nesses festivais, que ocorreram em períodos noturnos no 
final da Shemu, celebrando o período fértil e como provisão para o novo ciclo (BROEKHNUIS, 
1971, p. 63). Dessa forma, tanto Khonsu quanto Renenutet podem ser inseridas como justificativas 
para os muitos significados que a aparição do N12 possui nessa cena. Entretanto, por ser presente 
grandes festivais no período de Amenhotep I e Amenhotep III e, portanto, o período em que Nakht 
vivera, podemos inferir que seria, de fato, uma referência à Renenutet, esperando que o ciclo 
agrícola representado na TT 52 seja repetido no Além, de modo que Nakht e Tawi possuam esses 
mantimentos eternamente. 
 
Figura 3.18: Instrumento utilizado para debulhar o grão no Egito Antigo, de madeira. 
Fonte: Museu Britânico (EA 18206). 
191 
 
 
 Além do motivo iconográfico central da cena agrícola, podemos destacar dois personagens 
que não comentamos: Nakht em seu pavilhão (que aparece como destaque em dois registros) e um 
homem bebendo água de um odre no primeiro registro da cena. Nakht aparece da mesma forma em 
ambas as representações, sentado em uma cadeira, como no hieróglifo A50 ( ), mas com a forma 
de A21 ( ), com um bastão e um pano nas mãos. Ambas as formas hieroglíficas indicam que essa 
pessoa é algum membro da elite, honrosa. Além disso, Nakht está sob uma estrutura que é 
assimilada ao O22 ( ), um pavilhão aberto apoiado sobre um poste. O formato da coluna é uma 
junção de um papiro com lótus e a coloração é esverdeada, de modo que podemos supor que seja 
um simbolismo para garantir vida e prosperidade para Nakht no Além. Quanto ao homem bebendo 
água, esta parece ser uma cena do cotidiano comum, na qual um trabalhador está descansando, 
conforme aparece, por exemplo, nas imagens da tumba de Nebamun (TT E2), Figura 3.19. 
Entretanto, se inserirmos uma noção espacial de onde essa imagem está inserida, podemos 
interpretar de uma outra forma. Uma árvore, hieróglifo M1 ( ), assim como a água, N35 ( ), 
possuem uma intrínseca associação com “vida”. Conforme vimos na primeira cena aqui trabalhada, 
a extremidade da esquerda dessa cena finda na porta da tumba, de modo que, ao nascer, o sol 
ilumina esse lado e recebe as oferendas que são feitas para ele. O homem bebendo água sob a 
árvore poderia, portanto, possuir uma simbologia mais complexa que apenas uma cena do 
cotidiano, sendo, assim, uma forma de dizer que a vida sempre será concedida a Nakht. 
 
192 
 
Figura 3.19: Detalhe da cena agrícola da tumba de Nebamun (TT E2). 
Fonte: Museu Britânico (EA 37982) 
 
 Por fim, na Figura 3.20 vemos a vetorialidade da cena agrícola da TT 52. Seguimos a defesa 
de Angenot (1996), por seguir uma ordem cronológica quando possível, pois, teóricamente, seria 
a sequência egípcia para a estrutura da imagem. Na cena aqui trabalhada, vemos uma organização 
de baixo para cima, na qual reconstruimos de acordo com o fluxograma proposto por Murray 
(2009a, p. 506).193 
 
Figura 3.20: Vetorialidade da cena agrícola da TT 52. 
 
Fonte: esquema elaborado por Pedro Hugo Canto Núñez (2020). 
 
Ainda não entramos, entretanto, na problemática central dessa cena. Seria ela apenas uma 
cena cotidiana? Ela teria alguma relação com o Além? A interpretação de Harwig (2004, p. 50) é 
a mais atraente entre as demais elencadas no início da análise dessa cena. Concordamos ainda que 
Kamrin (1999) apresenta argumentos que podem contribuir com a nossa pesquisa. Ao 
compreendermos que, assim como a cena das oferendas, o ato da inserção dessa cena agrícola no 
plano decorativo da TT 52 possui uma dupla característica de ofertar e receber, podemos engendrar 
uma perspectiva mais ampla e vincular, de fato, a ideia de que essa imagem serve tanto para o 
morto quanto para os vivos, uma ideia que concordamos com Molyneaux (1997). Como, então, 
inserir essa imagem em um sistema cognitivo desse período de Nakht? 
194 
 
Sabemos que o LDM pode aparecer tanto em papiro quanto em paredes de tumba, com uma 
significativa diferença que é, justamente, a revitalização das imagens pelos vivos quando no 
segundo suporte. Essa cena agrícola e a da parede noroeste aparecem com os motivos iconográficos 
próprios do que chamamos de Capítulo 110 do LDM. Na Figura 3.21 separamos três exemplares 
desse capítulo em papiros da XVIII Dinastia. Não nos compete analisar esses papiros, mas, sim, 
compará-los com a nossa imagem da TT 52. Conforme percebemos, trata-se de uma vinheta 
dividida em registros, no qual o morto trabalha em um campo e, neste, apresenta um contato com 
o divino. O primeiro pertenceu a um Nakht que, assim como o Nakht da TT 52, vivera na mesma 
temporalidade e fora enterrado em Tebas. O segundo pertenceu a Nebseny, encontrado em uma 
tumba de Mênfis, que fora datado da temporalidade de Tutmés IV (mesma de Nakht). Quanto ao 
terceiro, pertenceu a Userhat, encontrado em Tebas e datado da mesma temporalidade que os outros 
dois. Não podemos concluir com apenas essa perspectiva um tanto superficial, no entanto, a visão 
de mundo quanto à crença no Além parece fazer parte de um mesmo sistema cognitivo que existe 
tanto no Alto (Tebas) quanto no Baixo Egito (Mênfis). Seja como for, nas três vinhetas vemos que 
esse espaço é bem delimitado por uma água que fecha o quadrado e, também, divide os registros. 
Essa água, nos papiros de Nakht e Userhat fora colorida de azul, enquanto no de Nebseny é 
preenchida com o hieróglifo que determina “água”, o N35 ( ). O morto realizando oferendas a 
divindades é comum aos três papiros, assim como uma imagem de um barco de remos com uma 
escada (que representa uma ligação entre o mundo terreno e o Além), o morto sob um barco e 
trabalhando em campos agrícolas. Existem, portanto, nessas vinhetas do Capítulo 110, motivos 
iconográficos em comum com a cena agrícola da TT 52 e, também, da parede noroeste da tumba, 
de modo que, na Figura 3.22, vemos os seus destaques. 
195 
 
Figura 3.21: Vinhetas do Capítulo 110 do LDM nos papiros de Nakht, Nebseny e Userhat. 
 
Fonte: Museu Britânico (Nakht - BM EA 10471,13) (Nebseny BM EA 9900,18) (Userhat BM EA 
10009,3) 
 
196 
 
Figura 3.22: Comparação dos motivos iconográficos do Capítulo 110 do LDM com as paredes 
sudeste e noroeste da TT 52. 
Fonte: esquema elaborado por Pedro Hugo Canto Núñez (2020) com as imagens da TT 52 e dos 
papiros do Museu Britânico (EA 10471,13; EA 9900,18; EA 10009,3). 
 
 Não trabalharemos com o texto desse capítulo, sendo isso algo examinado no Capítulo 4. 
No entanto, alguns apontamentos devem ser feitos aqui para que possamos prosseguir com nossa 
análise. O espaço que está representado é referente ao Campo de Juncos e Campo de Oferendas. 
Os dois campos, de acordo com Abas Bayoumi (1940), existiam na crença egípcia desde os TP, 
algo que já comentamos no Capítulo 2. No LDM, a compreensão espacial desses Campos não é 
tão clara quanto nos TP, talvez pelo próprio espaço disponível para a escrita no papiro ser menor 
que o espaço da parede (BAYOUMI, 1940, p. 70). Bayoumi (1940, p. 96) argumenta que, nos TP, 
o Campo de Juncos tinha um caráter de purificar o faraó, algo que foi ressignificado no LDM, de 
modo que esse espaço seria transformado em um lugar de trabalho no campo. Em contrapartida, o 
Campo de Oferendas seria, no LDM, um local de residência e regozijo, ao mesmo tempo que 
serviria, também, para a agricultura e, no Período Tardio, para purificação (BAYOUMI, 1940, p. 
96-97). Dessa forma, o morto no LDM trabalha e reside tanto no Campo de Juncos quanto no 
197 
 
Campo de Oferendas (BAYOUMI, 1940, p. 96). Sendo assim, veremos a seguir a parede noroeste, 
de modo que possamos compreender melhor esse espaço no Além. 
 
4. CAÇA E PESCA NO PÂNTANO, VINICULTURA E CAÇA DE PÁSSAROS 
 
Como se fosse uma sequência da cena anterior, a parede noroeste conta com três motivos 
iconográficos que possuem referência ao Campo de Oferendas e ao Campo de Juncos. Assim como 
a cena anterior, diferentes perspectivas foram formuladas sobre a cena da caça e pesca no pântano. 
Por exemplo, Phillipe Derchain (1975, p. 67-68), ao dissertar sobre cenas de casais (fazendo uso 
de perucas), afirma que existe uma certa sexualidade expressa na cena de caça e pesca no pântano, 
algo que seria defendido, também, por Lise Manniche (1999, p. 104-106) ao escrever sobre a lótus 
e a sua simbologia no Egito Antigo. Por outro lado, Laboury (1997, p. 73) e Angenot (2012, p. 57) 
interpretam que nessas cenas os pântanos e os peixes são considerados inimigos que o morto deve 
enfrentar no Além. Além deles, Claudio Barocas (1990, p. 9) argumenta, que, nessa cena, o morto 
se provava digno de assegurar a alimentação de sua família e, portanto, digno de adoração daqueles 
que vissem essa imagem. Talvez essa cena apresente, de certa forma, um elemento que justifique 
e confirme cada visão aqui elencada e, mesmo que sejam, aparentemente, três perspectivas 
diferentes, todas podem ser complementares. 
198 
 
Figura 3.23: Parede noroeste da TT 52. 
Fonte: desenho feito por Pedro Hugo Canto Núñez (2020), com base em Davies (1917, Pr. XXII). 
 
Na Figura 3.23 vemos o desenho da cena completa na TT 5281. A cena toda é composta por 
33 personagens, entre homens e mulheres, e é separada em dois grandes registros. No primeiro 
registro estão 14 dos personagens. Em uma leitura da direita para a esquerda temos uma cena 
espelhada, na qual Nakht aparece maior que os demais personagens, com uma criança a sua frente 
(mulher para a representação da direita e homem para a da esquerda), uma mulher abaixo (em 
ambas as representações) e Tawi atrás (também em ambas as imagens). Três servos parecem 
acompanhar a família, um à direita e dois à esquerda. Um outro servo fora representado colocando 
alimentos em uma mesa de oferendas que é destinada para as figuras de Nakht e Tawi, que 
aparecem sentado em um sofá à esquerda da cena. No segundo registro, Nakht e Tawi foram 
 
81 Para a imagem colorida, Cf. p. 24 do Volume II. 
199 
 
representados de forma semelhante ao primeiro registro, e os outros 17 personagens aparecem à 
direita, em dois sub-registros: no primeiro, da direita para a esquerda, temos 2 colhendo uvas, 4 
pisoteando-as enquanto 1 colhe o líquido e o armazena em ânforas, e 2 colocando oferendas na 
mesa diante do casal; no segundo, da direita para a esquerda, temos 4 caçando aves em uma rede, 
1 depenando e outro quebrando o pescoço das aves, e 2 colocando oferendas na mesa diante do 
casal. 
Começaremos pelos observadores dos dois registros, que parecem estar desconectados da 
cena. Esse conjunto está associado ao signo hieroglífico A502 ( ), no qual o casal aparece 
sentado em um sofá com pernas representando uma pata de leão. Se virmos a explicação de 
Gardiner (1993, p. 19) sobre o hieróglifo A50 ( ), que representa um homem sentado (sem a 
esposa) em uma cadeira, vemos que ele determina alguém que é membroda elite. Além disso, 
Gardiner (1993, p. 19-20) afirma que, na XVIII Dinastia, é comum a substituição desse signo pelo 
A51 ( ), que funciona como determinativo de jmyw-HAt, que significa “anciões” ou “aqueles de 
tempos passados”, indicando que já estariam mortos. Além dele, Pierre Grandet e Bernard Mathieu 
(2003, p. 673) comentam que o determinativo A50 pode, de fato, apresentar como variante o A51, 
além de determinar um “morto venerável”. De modo semelhante à cena agrícola, porém com a 
presença de Tawi, eles estão dispostos de modo a observar o que está diante deles e receber, por 
meio das mesas de oferendas diante deles, aquilo que está sendo produzido. Em ambas as 
representações do casal, Nakht dispõe de uma flor de lótus voltada para eles. Conforme vimos, a 
lótus simboliza vida conferida para alguém, geralmente para o morto. Poderíamos, então, supor 
que, tanto nessa cena quanto na anterior, Nakht e Tawi estão presentes como aqueles mortos que 
estão recebendo de forma ativa essas oferendas, explicitando uma ligação do mundo terreno com 
o Além, uma vez que toda a parede são cenas do LDM e, de certo modo, são espaços do Além 
representados no terreno que necessitam desse Egito terreno para continuarem a existir na Duat. 
Dessa forma, eles não estão desconectados das cenas da parede, mas, sim, são os principais 
participantes delas, aqueles que observam e recebem magicamente essas provisões representadas 
no terreno para o Além. 
A cena de caça e pesca no pântano é repleta de signos que possuem muitos significados e 
apontam toda uma profundidade das crenças egípcias, por isso, separamos os personagens humanos 
na Figura 3.24. A começar pelo maior e, portanto, mais importante personagem da cena, Nakht. A 
200 
 
representação de Nakht na esquerda aparece como no hieróglifo A59 ( ), com um braço levantado 
e um bastão na mão, o mesmo signo das cenas do faraó massacrando seus inimigos (portando uma 
maça na mão e os cabelos dos inimigos agrupados na outra). Em sua mão esquerda ele aparece 
segurando um pássaro pelas patas, indicando o seu papel de caçador. O Nakht da direita aparece 
na mesma pose, contudo, se fizermos uma comparação com outras tumbas, como na tumba de 
Menna (TT 69), que é da mesma temporalidade da TT 52, vemos que o Menna da direita está com 
uma vara fincada no peixe entre os barcos, Figura 3.25. Com isso, podemos pressupor que Nakht 
estaria efetuando a mesma ação, pois, teoricamente, a intenção da cena seria a mesma: matar o 
peixe. 
 
Figura 3.24: Participantes humanos da cena de caça e pesca da TT 52. 
Fonte: desenho feito por Pedro Hugo Canto Núñez (2020), com base em Davies (1917, Pr. XXII). 
 
201 
 
Figura 3.25: Cena de caça e pesca no pântano da tumba de Menna (TT 69). 
Fonte: disponível em 
https://www.osirisnet.net/popupImage.php?img=/tombes/nobles/menna69/photo/menna_c2_nort
hwall_marsh_01_bg.jpg&lang=en&sw=1920&sh=1080. Acesso em: 28 fev. 2021. 
 
 De acordo com Douglas J. Brewer e Renée F. Friedman (1989, p. 21-48), existiam dez 
maneiras de pesca de peixes no Egito Antigo, indicadas tanto nos resquícios arqueológicos quanto 
na iconografia. Os autores (1989, p. 22-23) argumentam que os arpões, como o que Menna possui 
em sua representação da direita da Figura 3.24, e que Nakht indicaria e que, talvez, não foi 
desenhado, funcionam mais como um objeto simbólico do que, de fato, uma pescaria voltada para 
alimentação (sendo essa a função de redes de pescas, por exemplo). Esses arpões podem ser vistos 
em cenas de caça a crocodilos e hipopótamos, que, conforme vemos desde a IV Dinastia na tumba 
de Mereruka (BREWER; FRIEDMAN, 1989), por exemplo, até no período romano, com imagens 
de Hórus arpoando o deus Seth como crocodilo (VASQUES, 2020, p. 43), indicando um complexo 
sistema cognitivo que perdura por mais de dois mil anos. Mas então que peixes são esses e porque 
eles fazem parte desse motivo iconográfico? Se observarmos a tipologia dos peixes no 
detalhamento da imagem (Figura 3.26), percebemos que o peixe da esquerda pertence à espécie 
Lates niloticus, um peixe que mede cerca de 40cm (BREWER; FRIEDMAN, 1989, p. 74). O peixe 
da direita, uma Tilapia galilaea, de acordo com as marcas na calda, pode medir cerca de 40 cm. O 
202 
 
primeiro era associado com o renascimento, assim como com a deusa Neith, que se transformou 
em um Lates para navegar nas águas primordiais de Nun, enquanto a Tilapia era associada com 
Háthor e representava a fertilidade e o renascimento por causa da sua característica de incubação 
bocal (HARTWIG, 2004, p. 105), na qual eles usam suas bochechas como abrigo para as ovas 
(BREWER; FRIEDMAN, 1989, p. 76). Por sua coloração avermelhada, a Tilapia era associada 
com divindades solares, como Háthor, e, como os antigos egípcios acreditavam em sua 
autoprodução, ela era comumente associada ao deus Atum (LÄ, p. 232-233). 
 
Figura 3.26: Detalhe dos peixes entre os barcos representados na parede noroeste da TT 52. 
Fonte: adaptado de Seidel e Shedid (1991, p. 58). 
203 
 
Dessa forma, Hartwig (2004, p. 105) argumenta que, ao ser representado arpoando esses 
dois peixes, o morto estaria tomando, de forma mágica, para si o ciclo de criação e renascimento 
implícito no simbolismo desses dois peixes, de modo a reconstituir isso no Além, de modo que os 
filhos do dono da tumba aparecerem em seus pés reafirma esse ciclo. A própria autora ainda 
continua sua análise desses motivos iconográficos utilizando como exemplo essa cena da TT 52, 
afirmando que o fato de o filho de Nakht segurar um bastão em formato de cobra (semelhante ao 
que Nakht porta) na representação da direita e a sua filha mais velha segurar uma flor de lótus em 
ambas as representações, são símbolos de criação e renascimento (HARTWIG, 2004, p. 105). 
Se observarmos na mão direita da Tawi da representação da direita, vemos um pequeno 
pato. Esse pato, aparentemente, significaria um animal doméstico, uma vez que faz parte de uma 
cena familiar e está junto à mulher, um conjunto iconográfico comum em cenas de banquetes, por 
exemplo. E, de fato, pode ser isso. Entretanto, se considerarmos a cena completa e a polivalência 
desse signo, devemos compreendê-lo como o hieróglifo G48A ( ), uma vez que a mão de Tawi 
está no formato de um ninho para o pato. Derivações desse signo aparecem em outras partes da 
parede, três na cena de caça e pesca, acima e entre os papiros, e outras quatro nas mesas de 
oferendas. De acordo com Wilkinson (1992, p. 97), o pato ou o ovo em um ninho simboliza o 
próprio começo dos tempos, a origem do mundo, e, portanto, contribuindo para os simbolismos 
elucidados anteriormente, de regeneração no Além. 
Duas imagens, na proa dos barcos, aparentemente, foram apagadas propositalmente da 
cena. Se acompanharmos o detalhamento desse corte e a comparação com a cena de caça e pesca 
de Nebamun na Figura 3.27, vemos que, provavelmente, tratava-se de um Alopochen aegyptiaca. 
Esse tipo de ganso, conforme Wilkinson (2017, p. 95), é associado ao deus Âmon, provavelmente 
em decorrência dele com a criação primordial do mundo. A iconoclastia de Akhenaton (ROBINS, 
2015; MALEK, 2011) que mencionamos no Capítulo 2, pode nos ser útil para compreender esse 
apagamento. Parkinson (2009), ao examinar o fragmento da tumba de Nebamun, acredita que esse 
signo do deus Âmon tenha passado despercebido quando o nome de Âmon fora apagado da tumba, 
pois, como vemos na TT 52, esse seria um signo comum ao sistema cognitivo da elite egípcia da 
XVIII Dinastia. 
 
204 
 
Figura 3.27: Detalhamento do corte dos Alopochen aegyptiaca na TT 52 e comparação com o 
fragmento da tumba-capela de Nebamun. 
Fonte: esquema elaborado por Pedro Hugo Canto Núñez (2020), utilizando a imagem de Seidel e 
Shedid (1991, p. 58) e do Museu Britânico (EA 37977) 
 
 No segundo registro, temos dois sub-registros, o primeiro com uma produção de vinho e o 
segundo com caça e trato de pássaros.Conforme apresenta Angenot (2012), esse registro da TT 52 
apresenta uma semelhança muito grande com a imagem da tumba de Wah (TT 22), mordomo real 
cuja tumba data de Tutmés III. De acordo com a autora, isso demonstra uma intenção da elite de 
fazer fixar a ideia de que tanto a vinicultura quanto essa caça de aves estão interligadas (2012, p. 
58). Na Figura 3.28 vemos os dois sub-registros do segundo registro da parede noroeste da TT 52, 
de modo que possamos os visualizar melhor. 
 
205 
 
Figura 3.28: Vinicultura e caça de pássaros da TT 52. 
Fonte: desenho feito por Pedro Hugo Canto Núñez (2020), com base em Davies (1917, Pr. XXII). 
 
Murray (2009b) indica que o vinho é uma bebida elitista que está intrínseca no antigo 
cotidiano egípcio, de modo que o processo de fabricação era primordialmente apenas do rei e de 
membros de sua família. Entretanto, no Reino Novo, 42 tumbas de particulares apresentam uma 
sequência da produção de vinho (LERSTRUP apud MURRAY, 2009b, p. 578). Isso é relevante, 
pois o deus que está presente no simbolismo de vinhos é, justamente, Shesmu, que aparece de duas 
formas completamente diferentes nos textos. Conforme frisa Mark Ciccarello (1976, p. 46-48), 
essa divindade pode aparecer, no LDM, tanto como negativo, no Capítulo 153 (ele aparece como 
um pescador de mortos, ao qual N deve escapar), quanto em algo positivo, no Capítulo 170 (quando 
ele provém alimentos – aves – para N). Angenot (2012, p. 57) acredita que o ato de pisotear as uvas 
serve como uma associação ao ato de esmagar os inimigos, com respaldo nessa divindade. Essa 
206 
 
última perspectiva faz sentido se, conforme a autora defende, visualizarmos em conjunto com a 
caça de pássaros, que também seria uma forma de controlar o caos e os inimigos (ANGENOT, 
2012, p. 57), uma vez que os pássaros livres em um pântano podem simbolizar o caos e “espíritos 
malignos”, conforme sugere Wilkinson (1992, p. 95) e a rede os capturando pode, de fato, ser esse 
controle que defende Angenot. Podemos utilizar essa interpretação também no primeiro registro, 
quando Nakht aparece caçando os pássaros. 
Sendo assim, ao interpretarmos essa parede em conjunto com a cena agrícola, 
compreendemos que existe uma certa continuidade das duas. A cena de caça e pesca no pântano 
não representa apenas um local de regozijo, mas, também, um trabalho fundamental que é a 
manutenção da ordem, de Maat, algo que existe em textos funerários reais, como o Livro do 
Amduat, e está presente também no LDM. Portanto, a leitura das vinhetas do Capítulo 110 nos 
demonstra essa dupla função do Campo de Juncos e Campo das Oferendas, algo que será 
aprofundado quando virmos os textos dessa cena. Por fim, temos, na Figura 3.29, a vetorialidade 
da leitura da parede noroeste, na qual determinamos o trabalho e o destino dessa provisão, 
utilizando a metodologia de Angenot (1999), de modo que a família caçando e pescando são 
representados na imagem de modo que o leitor as revitalize e seja perpassado ao casal, morto, na 
esquerda, e, da mesma forma, a vinicultura e a caça de pássaros também seja lida pelo antigo 
egípcio que visitasse a tumba e revitalizadas para o casal, morto, na esquerda. 
 
207 
 
Figura 3.29: Vetorialidade da parede noroeste da TT 52. 
Fonte: esquema feito por Pedro Hugo Canto Núñez (2020). 
 
 Por fim, podemos ver no Gráfico 7 o número de personagens que aparecem tanto na parede 
noroeste quanto na cena agrícola de Nakht. Percebemos, então, que são 53 representações de servos 
que trabalham a favor de Nakht e Tawi. Nas vinhetas do Capítulo 110 que trabalhamos, vimos que 
o morto está representado diversas vezes trabalhando diretamente no campo, enquanto nas pinturas 
de Nakht, ele aparece trabalhando apenas na caça e pesca, mantendo a ordem. Isso nos deixa um 
questionamento: seria possível enviar servos para trabalhar nas terras agrícolas do Além? Se 
pensarmos nos shabtis que vimos no segundo capítulo, a resposta é sim. O Capítulo 6 do LDM 
consiste em uma fórmula para fazer com que o shabti trabalhe em vez do morto na Duat: 
 
208 
 
Ó chauabti de N., se eu for chamado, se eu for designado para fazer todos os 
trabalhos que são feitos habitualmente no reino dos mortos, pois bem! Esse cargo 
te será infligido, lá, no além. Toma tu o meu lugar em todos os momentos, para 
cultivar os campos, para irrigar as margens, para transportar a areia do Oriente para 
o Ocidente. “Eis-me aqui!”, dirás tu (LOPES, 1991, p. 21-22) 
 
As partes “para cultivar os campos” e “para irrigar as margens” da fórmula nos permitem interpretar 
que o morto, ao trabalhar no Campo de Juncos e no Campo das Oferendas, pode invocar o shabti 
e este assumir seu papel como trabalhador. Mesmo que tenhamos discutido sobre a probabilidade 
de Nakht e Tawi terem sido enterrados com shabtis físicos, algo que nos leva inferir é que esses 53 
trabalhadores, por estarem representados nas paredes da tumba, magicamente serviriam como 
shabtis no Além, mesmo que não existam os físicos. 
 
Gráfico 7: Categorias de personagens da cena agrícola e da parede noroeste da TT 52. 
Fonte: gráfico elaborado por Pedro Hugo Canto Núñez (2020). 
 
6; 9%
4; 6%
4; 6%
53; 79%
Personagens
Nakht Tawi Filhos do casal Servos
209 
 
5. BANQUETE FUNERÁRIO 
 
Um outro espaço de conexão do morto com os vivos é a cena da parede sudoeste, o banquete 
funerário. De acordo com Hartwig (2004, p. 98), o imagético multivalente das cenas de banquete 
mistura temas de sexualidade e renascimento com os aspectos da Bela Festa do Vale, o banquete 
funerário, e outras oferendas alimentícias em comemoração ao morto na tumba. Na Figura 3.30 
vemos o desenho da parede sudoeste da TT 5282, que apresenta uma cena de banquete incompleta 
por causa do deterioramento da parede, provavelmente em consequência do tempo, uma vez que, 
no boletim de escavação da primeira limpeza da tumba, por G. Maspero (1894, p. 484), podemos 
ler que ele encontrara a parede dessa forma. 
 
Figura 3.30: Desenho da parede sudoeste da TT 52. 
Fonte: desenho feito por Pedro Hugo Canto Núñez (2020), com base em Davies (1917, Pr. XV). 
 
82 Para a imagem colorida, Cf. p. 20 do Volume II. 
210 
 
Ao todo, são apresentados 26 personagens humanos. A cena é dividida em dois registros, 
com uma possibilidade de subdivisão de registro para o superior, conforme vemos em nossa 
tentativa de reconstrução da parede na Figura 3.31. No registro superior podemos perceber duas 
figuras masculinas em pé fazendo, provavelmente, oferendas para o casal (à direita). Em seguida 
estariam mulheres convidadas. Possivelmente haveria uma mesa de oferendas e, em seguida três 
mulheres sentadas com uma serva, em pé, entre a primeira e a segunda mulher. Na parte que 
podemos ver do registro superior, da direita para a esquerda, apresenta um harpista e 7 mulheres, 
sendo 6 sentadas e a outra em pé. No registro inferior, temos, da direita para a esquerda, o casal 
sentado em um sofá (com um gato abaixo da mulher), um homem colocando oferendas na mesa 
diante do casal, três musicistas e, de forma subdividida, 3 homens e 3 mulheres. 
 
Figura 3.31: Reconstrução da parede sudoeste da TT 52 com base nas tumbas de Menna (TT 69) 
e Nebamun (TT E2). 
Fonte: reconstrução feita por Pedro Hugo Canto Núñez (2020), com base em Davies (1917, Pr. 
XV) e Brancaglion Jr. (1999, Pr. LXXX-LXXXII). 
211 
 
Mesmo que não tenhamos as silhuetas de Nakht e Tawi completas na imagem, podemos 
ver que eles estão na mesma posição de suas representações na parede noroeste (Figura 3.23), com 
o hieróglifo A502 ( ), no qual o casal aparece sentado em um sofá com pernas representando 
uma pata de leão. Podemos trazer para essa análise a discussão que levantamos sobre a origem esse 
hieróglifo e os argumentos que utilizamos para a afirmação de que essa seria a representação do 
casal morto recebendo os alimentos. Se virmos os demais personagens dessa cena, vemos que 
aquelesque estão sentados (nove), percebemos que cinco desses estão com flores de lótus voltadas 
para eles mesmos, enquanto os outros quatro não temos certeza, mas podemos supor que estivessem 
na mesma posição. As explicações aqui nos levariam a supor que esses participantes estariam, 
assim como o casal, mortos e essa cena seria representada no Além. Poderíamos afirmar que o 
simbolismo intrínseco à essa representação da parede sudoeste teria o mesmo caráter mágico da 
outra parede. Dessa maneira, suporíamos que o casal recebe as oferendas feitas no banquete 
enquanto mortos, levando-as para o Além, e que os demais participantes os prestigiassem como 
convidados nesse banquete também no Além. Assim, não descartaríamos a possibilidade dessa 
cena ocorrer tanto no Egito terreno quanto na Duat. 
Entretanto, devemos levar algumas questões em consideração. Lise Manniche (1971; 1976; 
1978; 1999; 2000; 2009) defende que existe um certo erotismo nessas cenas de banquete. Seus 
argumentos são pautados na aparição de figos, mandrágoras, flores de lótus e unguentos (e, 
portanto, perfumes) nessas cenas. Para a autora (MANNICHE, 1987a, p. 39-42), os vestidos muito 
bem decorados e as perucas utilizadas pelas mulheres, com unguentos representados acima de suas 
cabeças, indicavam, além de seu status na elite tebana, um erotismo intrínseco à essas cenas. 
Manniche (1987b, p. 22-27) argumenta que imagens que mostram as mulheres oferecendo figos e 
mandrágoras para outras mulheres (como a que temos na TT 52, no primeiro registro da parede 
sudoeste) seria um indicativo de homossexualidade entre elas. Além disso, Manniche (1999, p. 
100-102) discute os muitos significados da mandrágora (Mandragora officinarum) nessas cenas, 
afirmando que, baseado em poemas de amor, os antigos egípcios assemelhavam os seus formatos 
com os seios femininos, e que, conforme estudos modernos do fruto, são alucinógenos e 
soporíferos. O perfume, de acordo com a autora (MANNICHE, 2009, p. 5), seria algo que auxiliaria 
o erotismo nessas cenas, de modo que os cones acima das cabeças dos participantes das cenas de 
banquetes seriam um instrumento artístico para evidenciar o perfume, algo que seria invisível. 
212 
 
Antônio Brancaglion Jr., ao expor seus estudos sobre as cenas de banquetes do Reino Novo 
em sua tese de doutorado, argumenta que essas cenas em tumbas apresentam dois níveis de 
interpretação: o primeiro seria o estabelecimento do status do dono da tumba e a sua participação 
nas festividades da necrópole, servindo como um meio para comemorar a vida no Egito terreno e 
proclamar sua distinção social no Além; enquanto o segundo seria que os elementos da cena 
estariam associados, principalmente, ao culto a Háthor, com a finalidade de garantir os meios 
necessários para que o morto renasça no Além (BRANCAGLION JR., 1999, p. 255). A inserção 
desse nível de compreensão entre os egípcios de Háthor presente nessas cenas pode nos ser útil e 
nos traz outra perspectiva para a cena de banquete, pois, como Hartwig (2004, p. 98-103) comenta, 
podemos interpretar em conjunto com os festivais ocorridos na margem ocidental de Tebas no 
período de Nakht. Entretanto, como podemos compreender Háthor? 
 Uma das deusas mais importantes do Egito Antigo, é possível que Háthor apareça na crença 
egípcia desde os primórdios dessa sociedade, embora a sua presença seja mais significativa a partir 
do Médio Império e o Texto dos Caixões (ROBERTS, 1997). Háthor é, talvez, uma das deusas de 
maior abrangência de características no Egito Antigo. Na XVIII Dinastia, a deusa estava associada 
com o mito de criação, tendo o título de “mão de Âmon”, como aquela que estimulava este deus 
para o orgasmo, criando, assim, o mundo (MESKELL, 2005, p. 62). Pode ser também associada 
com a destruição da humanidade, no Conto da Vaca Celeste, quando fora mandada ao Egito terreno 
como uma leoa por Rê. Apesar dessas características dicotômicas, a deusa aparece também como 
mãe ou esposa de Hórus (e, por isso, é associada como mãe ou esposa do rei), deusa do céu (no 
Texto das Pirâmides - Fórmula 546), esposa ou filha e “olho” de Rê, vaca celeste, deusa das terras 
estrangeiras, deusa do Ocidente (também chamada de Senhora do Sicômoro na região de Mênfis) 
e, o motivo aqui explanado, a deusa da música, prazer e felicidade (Htp) (WILKINSON, 2017, p. 
143). 
 Embora intimamente relacionada ao aspecto de Háthor como uma deusa da fertilidade, 
sexualidade e amor, seu papel como provedor de prazer e felicidade poderia, também, estar 
associado concomitante ao primeiro. De maneira similar, enquanto a relação de Háthor com a 
música era por forma de rituais, como o uso de seu sistro, ela também estava presente no uso da 
música para fins de festividade popular. Háthor também era associada com bebidas alcoólicas, que 
eram parte de A Bela Festa do Vale. Sendo assim, a imagem da deusa é frequentemente encontrada 
213 
 
em vasos feitos para conter vinho e cerveja. Háthor era assim conhecida como a amante da 
embriaguez, da canção e da mirra. Alguns egiptólogos (WILKINSON, 2017, p. 143) associam que 
seja esse último o motivo de tamanho reconhecimento e popularidade da deusa durante todo o Egito 
Antigo. 
Brancaglion Jr. (1999, p. 260-261) nos apresenta o itinerário de A Bela Festa do Vale, que 
era celebrada uma vez por ano, na primeira lua nova do segundo mês da Shemu, referente ao 
período em que o plantio já fora feito. A festa tinha início com uma oferenda ao deus Âmon no 
templo de Karnak. Em seguida, iniciava-se uma procissão que conduzia a imagem desse deus para 
as demais localidades de Tebas, transportando-a em sua barca, acompanhada pelo faraó e o sumo-
sacerdote. A barca possuía um relicário para a estátua e, por sua vez, era posta em um barco 
cerimonial, que era guiado através do Nilo por um outro barco, este pertencente à família real. 
Ao chegar à margem ocidental da cidade de Tebas, a imagem era carregada em procissão 
pelo sacerdote, seguidos pelo faraó, as cantoras de Âmon e as sacerdotisas de Háthor. A procissão 
seguia em direção à necrópole tebana, atravessando os campos agrícolas e parando em pequenos 
santuários, feitos de pedra, dispostos ao longo do caminho, além de visitar os Templos de Milhões 
de Anos dos faraós e as capelas funerárias de particulares. Em cada uma dessas paradas, grupos de 
dançarinos e cantores apresentavam-se diante do deus. Quando a procissão chegava ao templo de 
Deir el-Bahari, ponto culminante da Bela Festa do Vale, a estátua do deus Âmon se encontrava 
com a da deusa Háthor. O festival só continuava no dia seguinte, quando a imagem do deus fazia 
o caminho inverso: de Deir el-Bahari para o templo de Karnak. Durante toda procissão em direção 
ao templo, os que acompanhavam o festival carregavam grandes buquês e alimentos, de forma a 
ofertar aos dois deuses e, também, aos mortos (BRANCAGLION JR., 1999, p. 260-261). 
Todo esse caminho possui diversos pontos que são cruciais para que, quando comparamos 
com o que conhecemos da cultura egípcia, entendamos o todo. A imagem do deus, ao atravessar o 
rio Nilo da margem oriental, associada com a vida, para a ocidental, representando a morte, 
revitaliza esses espaços funerários. O encontro de Âmon com Háthor também não é aleatório. 
Háthor é uma divindade importante para a Necrópole Tebana. O encontro desses dois deuses 
reverbera em uma união dos vivos com os mortos. Sendo assim, A Bela Festa do Vale também 
indica a presença dos vivos perpetuando a memória dos mortos ao visitarem os seus Templos de 
Milhões de Anos e capelas funerárias e ofertarem aos mortos. Os músicos e dançarinos nesse 
214 
 
festival são cruciais para a procissão. Em todos esses momentos citados, eles cantam e realizam 
performances em prol dos deuses. Associada à deusa Háthor, a música serve, também, como 
revitalização. 
 Ao entendermos o significado da deusa ao associarmos a mesma com a música, o prazer e

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