Buscar

MateusBB-DISSERT

Prévia do material em texto

universidade federal do rio grande do norte
centro de ciências exatas e da terra
departamento de física teórica e experimental
programa de pós-graduação em física
Superparamagnetismo em Jacobsitas
sintéticas
Mateus Bruno Barbosa
Natal-rn
março de 2012
Mateus Bruno Barbosa
Superparamagnetismo em Jacobsitas
sintéticas
Disssertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em
Física, do Departamento de Física Teórica e Experimental da
Universidade Federal do Rio Grande do Norte, como requisito
parcial para a obtenção do título de Mestre em Física.
Orientador: Prof. Dr. José Humberto de Araújo
Natal-RN
março de 2012
Para Pessoas Especiais:
A meus pais, Joaquim Mateus Barbosa
e Mirian da Silva Barbosa.
i
Agradecimentos
A Deus.
À minha família, meus pais, meu irmão e minhas irmãs.
Ao meu orientador, Prof. Dr. José Humberto de Araujo, pela orientação e pelo apoio
logístico e intelectual durante todo o período do mestrado.
A Armando Araújo, Thatyara Freire e Rodolfo Bezerra, pela ajuda na produção de
amostras, técnicas laboratoriais e discussões pertinentes à pesquisa.
Aos colegas das salas César Lattes, Mário Schenberg e Jaime Tionmo, e também aos
da sala dos experimentais.
Ao Prof. Dr. Artur da Silva Carriço, pelas recentes e inspiradoras discussões.
Ao Prof. Dr. Joâo Maria Soares pelas medidas de difração de raios-x e espectroscopia
Mössbauer relizdas no LAMOP-UERN.
À Capes, pelo apoio financeiro.
ii
"Desde toda a eternidade, Deus, pelo muito sábio e santo
conselho da sua própria vontade, ordenou livre e inalte-
rável tudo quanto acontece, porém de modo que nem
Deus é o autor do pecado, nem violentada é a vontade
da criatura, nem é tirada a liberdade ou a contingência
das causas secundárias, antes estabelicidas."
( Capítulo 3 - CONFISSÃO DE FÉ DE
WESTMINSTER)
iii
Resumo
Neste estudo experimental, amostras sintéticas de Jacobsitas (MnFe2O4) foram sin-
tetizadas pelo método Pechini e calcinadas em atmosfera ambiente e em vácuo de 400 até
700oC. Análises de difração de raio-x (DRX) e microscopia eletrônica de varredura (MEV)
revelaram que a amostra calcinada em 400oC é composta por uma fase simples tipo espinélio,
com tamanho médio do cristalito de 8, 8nm para amostra calcinada em atmosfera ambiente,
e 20,1 nm para amostra calcinada em vácuo, indicando que o tamanho médio do cristalito
pode ser manipulado pelo controle da atmosfera. A curva de magnetização para amostra
calcinada a 400oC em atmosfera ambiente revela características de comportamento superpa-
ramagnético, com magnetização de 29.3emu/g num campo máximo de 1.2T . Já a amostra
calcinada em 400oC sob vácuo apresentou magnetização ∼= 67emu/g no campo máximo de
1.5T . A amostra tratada em 500oC, em atmosfera ambiente, acusa além da fase espinélio,
fases secundárias de hematita (Fe2O3) e bixbyita (FeMnO3). A curva de magnetização mos-
tra uma queda abrupta na magnetização comparada com as amostras anteriores. A análise
mostra que, para mais altas temperaturas (600oC and 700oC), observou-se apenas a conti-
nuação das fases hematita e bixbyita. A curva de magnetização dessas amostras são linhas
retas cortando a origem, consistente com o comportamento antiferromagnético dessas fases.
A espectroscopia Mössbauer revelou que para a amostra calcinada em 400oC em atmosfera
ambiente há dois sextetos e um dubleto. Os dois sextetos são atribuídos aos campos hiperfi-
nos referentes ao desdobramento magnético no núcleo dos íons Fe3+, nos sítios tetraédricos
e octaédricos. O dubleto é atribuído ao comportamento superparamagnético das partículas
com diâmetro menor que dc. Já a amostra calcinada em 400oC sob vácuo apresenta apenas
dois sextetos.
PALAVRAS-CHAVE: Superparamagnetismo, Jacobsita, Espinélios, MnFe2O4.
iv
Abstract
In this experimental study sintetic samples of Jacobsites (MnFe2O4) were synthe-
sized by the Pechini method and calcined within ambient atmosphere and afterwards in the
vacuum from 400 to 700oC, the range of calcination temperatures. The X-Ray Diffraction
(XRD) and the Scanning Electronic Microscopy (SEM) analysis have shown that the sam-
ples treated at 400oC temperature are composed by a simple type of spinel phase, with a
crystallite size of 8.8nm for the sample calcined in ambient atmosphere and 20, 1nm for the
sample treated in the vacuum, showing that the cristallite average size can be manipulated
by the atmosphere control. The hysteresis loops for the sample calcined at 400oC in ambient
atmosphere reveal features of superparamagnetic behavior with magnetization 29.3emu/g at
the maximum field of 1.2T . The sample calcined in 400oC under vacuum show magnetiza-
tion ∼= 67emu/g at the maximum field of 1.5T . The sample treated at 500oC, under ambient
atmosphere, has shown besides the spinel phase, secondary phases of hematite (Fe2O3) and
bixbyite (FeMnO3). The hysteresis loops demonstrate a sharp drop of the magnetization
compared to the previous sample. The analysis has revealed that for the samples treated in
higher temperatures (600oC and 700oC) it’s observed the absence of the spinel phase and the
maintenance of the bixbyite and hematite. The hysteresis loops for those samples in accor-
dance to the external magnetic field are straight lines crossing the origin, consistent with the
antiferromagnetic behavior of the phases.The Mössbauer espectroscopy show to the sample
calcined at 400oC within ambiente atmosphere two sextet and one doublet. The two sextets
are assigned to the hyperfine fields related to the magnetic deployment in the nuclei of Fe3+
ions, at the tetraedric and octaedric sites. The doublet is assigned to superparamagnetic
behavior of the particles with smaller diameter than dc . Now the sample calcined at 400oC
under vacuum only show two sextet.
KEYWORDS: Superparamagnetism, Jacobsite, Spinels, MnFe2O4.
v
Lista de Figuras
1.1 Movimento de rotação e translação do elétron . . . . . . . . . . . . . . . . . 3
1.2 Curva de Histerese de um Material Ferromagnético . . . . . . . . . . . . . . 5
1.3 Dependência da temperatura característica com a susceptibilidade recíproca:
(a) para um diamagnético e (b) para um paramagnético [12]. . . . . . . . . . 9
1.4 Efeito do campo no momento orbital [11] . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 10
1.5 Função de Langevin [11] . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 12
1.6 Espaço de Quantização: (a) Teoria Clássica, (b) e (c) Teoria Quântica [11]. . 15
1.7 Processo de Magnetização . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 16
1.8 (a) Magnetização espontânea pelo campo molecular; (b) Efeito da temperatura
no valor da magnetização espontânea. Curva 1 é a função de Langevin [11] . 18
1.9 Arranjo Antiferromagnético composto de duas sub-redes ferromagneticamente
ordenadas [24]. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 20
1.10 Arranjo Ferrimagnético [9]. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 22
1.11 Dependência da temperatura da susceptiblidade magnética recíproca para ma-
teriais ferro, antiferro e ferrimagnéticos. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 25
1.12 Magnetização de uma partícula esférica fazendo um ângulo θ com o eixo de
fácil magnetização . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 27
1.13 Relação do tamanho da nanopartícula e sua histerese magnética, (adaptado
de [11]). . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 28
vi
2.1 Estrutura Espinélio. Célula unitária divida em octantes. Cátions nos sítios
tetraédricos A, cátions nos sítios octaédricos B e átomos O em dois octantes
[12]. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 33
2.2 Definição do parâmetro de deformação u. Meio plano de (110) é mostrado.
Atómos de oxigênio (círculos grandes) estão dispostos na direção 〈111〉 devido
a presença dos cátions tetraédricos. No caso ideal, u = 0.375 [12]. . . . . . . 34
2.3 Geometria espacial dos orbitais d (a) dxy, (b) dx2−y2 , (c) dz2 [12]. . . . . . . . 352.4 Ordenamento de longo alcance em espninélios inversos, resultado de uma ocu-
pação alternada de sítios octaédricos por dois tipos de cátions. Apenas cátions
octaédricos são apresentados.[12][37] . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 37
2.5 Ordamento de longo alcance em espinélios com razão 1:3 de cátions em sítios
octaédricos.[12][37] . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 38
3.1 Esquema de um Magnetômetro de Amostra Vibrante,[23] . . . . . . . . . . . 44
3.2 Absorção ressonante por um núcleo atômico. (Adaptado de [19]) . . . . . . . 45
3.3 Gráfico da emissão γ de um núcleo.(Adaptado de [19]) . . . . . . . . . . . . 46
3.4 Recuo de um núcleo após emissão γ.(Adaptado de [19]) . . . . . . . . . . . . 46
3.5 Esquema simplificado da Espectroscopia Mössbauer (Adaptado de [19]). . . . 47
3.6 Representação esquemática do MEV [41] . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 49
3.7 Esquema da varredura do feixe de elétrons [41] . . . . . . . . . . . . . . . . . 50
4.1 Difratograma de Raio-X da amostra calcinada em 400oC sob atmosfera ambiente 53
4.2 Difratograma de Raio-X da amostra calcinada em 500oC sob atmosfera ambiente 54
4.3 Difratograma de Raio-X da amostra calcinada em 600oC sob atmosfera ambiente 55
4.4 Difratograma de Raio-X da amostra calcinada em 700oC sob atmosfera ambiente 55
4.5 Difratograma de Raio-X da amostra calcinada em 400oC sob vácuo . . . . . 56
4.6 Difratogramas de Raio-X das amostras calcinadas em 500oC sob vácuo . . . 57
4.7 Imagens obtida pelo MEV das amostras calcinadas em 400 e 500oC em atmos-
fera ambiente . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 58
vii
4.8 Imagens obtida pelo MEV das amostras calcinadas em 600 e 700oC em atmos-
fera ambiente . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 58
4.9 Curva Magnetização vs Campo aplicado das amostras calcinadas a 400 e 500
em atmosfera ambiente . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 59
4.10 Curva Magnetização vs Campo aplicado das amostras calcinadas a 600 e 700oC
em atmosfera ambiente . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 60
4.11 Curva MvsH das amostras calcinadas a 400 e 500oC em vácuo . . . . . . . . 61
4.12 Fit da Curva MvsH da amostra calcinada a 400oC em vácuo . . . . . . . . . 62
4.13 Espectro Mössbauer da amostra calcinada em 400oC sob atmosfera ambiente. 63
4.14 Espectro Mössbauer da amostra calcinada a 400oC em vácuo. . . . . . . . . 64
viii
Lista de Tabelas
4.1 Informações das amostras calcinadas sob atmosfera ambiente . . . . . . . . . 54
4.2 Informações das amostras calcinadas sob vácuo . . . . . . . . . . . . . . . . . 56
4.3 Informações dos parâmetros do fit da função de Langevin adaptada. . . . . . 62
4.4 Informações dos parâmetros da espectroscopia Mössbauer da amostra calci-
nada a 400oC em atmosfera ambiente. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 63
4.5 Informações dos parâmetros da espectroscopia Mössbauer da amostra calci-
nada a 400oC em vácuo. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 64
ix
Sumário
Agradecimento ii
Resumo iv
Abstract v
Lista de Figuras viii
Lista de Tabelas ix
1 Conceitos de Magnetismo 2
1.1 Fenômenos Magnéticos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 6
1.1.1 Diamagnetismo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 7
1.1.2 Paramagnetismo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 8
1.1.3 Ferromagnetismo e Antiferromagnetismo . . . . . . . . . . . . . . . . 16
1.1.4 Ferrimagnetismo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 22
1.1.5 Superparamagnetismo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 26
2 Ferritas 31
2.1 Óxidos Magnéticos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 31
2.2 Estrutura Espinélio . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 32
x
3 Procedimento Experimental 39
3.1 Material Utilizado . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 40
3.2 Tratamento Térmico . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 41
3.3 Difratometria de Raios-X . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 41
3.3.1 Refinamento Rietveld . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 42
3.4 Magnetometria de Amostra Vibrante . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 43
3.5 Espectroscopia Mössbauer . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 45
3.6 Microscopia Eletrônica de Varredura (MEV) . . . . . . . . . . . . . . . . . . 49
4 Resultados 52
4.1 Difratometria de Raio-X . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 53
4.2 Microscopia Eletrônica de Varredura (MEV) . . . . . . . . . . . . . . . . . . 58
4.3 Magnetometria de Amostra Vibrante (MAV) . . . . . . . . . . . . . . . . . . 59
4.4 Espectroscopia Mössbauer . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 63
5 Conclusão 65
Referências bibliográficas 67
xi
Introdução
"Porque em esperança fomos salvos.
Ora a esperança que se vê não é espe-
rança; porque o que alguém vê como o
esperará? Mas, se esperamos o que não
vemos, com paciência o esperamos."
Romanos 8: 24 - 25
Este trabalho tem como objetivo sintetizar, caracterizar e estudar as propriedades
magnéticas da ferrita de manganês (MnFe2O4), com dimensões nanométricas. Esse composto
surge naturalmente na crosta terrestre e recebe o nome de Jacobsita. Tem sido utilizado em
vários setores da pesquisa, desde a indústria até medicina, [1], [2], [3], [4], [5], [6]. Por meio
do método Pechini, preparam-se dois lotes de amostras. No primeiro lote fez-se tratamento
térmico em atmosfera ambiente, calcinando as amostras em 400, 500, 600 e 700oC. No
segundo lote, o tratamento térmico foi feito a vácuo, calcinando as amostras em 400 e 500oC.
Utilizou-se a técnica de difração de raio-x, para determinar as fases presentes nas
amostras calcinadas nas diferentes temperaturas e atmosferas, e a técnica de espectroscopia
Mössbauer para identificar a localização dos sítios de Fe3+, bem como o estado em que
ele se encontra. Também fez-se uso da técnica de microscopia eletrônica de varredura para
vizualizar a formação cristalina da substância e, por fim, pela técnica de magnetometria
de amostra vibrante, obteve-se a curva de magnetização vs campo aplicado, com o intuito
de analisar as propriedades magnéticas: remanência, campo coercitivo e magnetização de
saturação.
1
Capı́tulo 1
Conceitos de Magnetismo
"O que você sabe não tem valor. O
valor está no que você faz com o que
sabe."
Bruce Lee
Quando dividimos um ímã ao meio, observamos a formação de outro ímã; não im-
porta quantas divisões sejam feitas, sempre haverá um novo ímã, ou seja, não conseguiremos
separar os pólos norte e sul, ou seja, obter o que é chamado de monopolo magnético. A
unidade fundamental do magnetismo é chamada de dipolo magnético. Um átomo pode agir
como um dipolo magnético. Para produzir um campo magnético, fazemos uma corrente elé-
trica circular em uma espira condutora. Por analogia, um átomo funciona assim: os elétrons
orbitam ao redor do núcleo.
Pensando ainda em um elétron circulando em volta do núcleo, imagina-se que ele gire
em torno do seu próprio eixo, como ocorre com os planetas do sistema solar, que possuem um
movimento de translação e de rotação. Esses movimentos provocam dois momentos de dipolo
magnético: o orbital ou de translação e o intrínseco ou de rotação (o spin), como mostra a
figura 1.1. Esses dois movimentos são as fontes do magnetismo nos átomos; portanto, notamos
que o comportamento magnético dos átomos provém do movimento dos elétrons. Embora o
núcleo possua magnetismo, esse é desprezível se comparado ao dos elétrons [7].
2
Capítulo 1. Conceitos de Magnetismo 3
Figura 1.1: Movimento de rotação e translação do elétron
O momento magnético total do átomo é a soma dos momentos orbital e de spin. O
momento orbital é normal ao plano da órbita e o de spin é paralelo ao eixo de rotação. O
momentoassociado a esses movimentos é uma grandeza vetorial e pode ser representado da
seguinte maneira:
µtotal = µorbital + µspin = −
e
2m
(L+ 2S) (1.1)
Devido ao caráter vetorial da soma dos momentos magnéticos, há duas possibilidades
de comportamento:
1: Os elétrons estão alinhados de tal maneira que ocorre um cancelamento mútuo
e o átomo como um todo não apresenta um momento magnético. Esse caso se aplica aos
materiais diamagnéticos.
2: O cancelamento dos momentos magnéticos dos elétrons é apenas parcial. Logo
o átomo apresenta um momento magnético líquido diferente de zero. As substâncias que
se comportam dessa maneira podem ser principalmente paramagnéticas, ferrimagnéticas,
ferromagnéticas e antiferromagnéticas.
Quando se estuda magnetismo, nota-se a existência de três grandezas importantes
para a descrição das propriedades magnéticas que encontramos na matéria: o campo mag-
nético ~H, a indução magnética ~B e a magnetização ~M . A magnetização é uma grandeza
vetorial macroscópica [7]. Ao pegarmos um elemento de volume ∆V , isto é, um pedaço pe-
queno do ponto de vista macroscópico, porém de tamanho suficiente para conter uma grande
quantidade de átomos, e fazermos a soma de todos os momentos magnéticos (
∑
~µ) naquele
volume V , poderemos definir a magnetização do meio como o momento magnético resultante
Capítulo 1. Conceitos de Magnetismo 4
por unidade de elemento de volume:
~M = lim
∆V→∞
1
∆V
n∑
i=1
~µi (1.2)
Pode haver, nos materiais, tanto momentos de dipolo magnético intrínseco como
momentos de dipolo magnético induzido. O segundo caso ocorre devido à presença de um
campo magnético externo, que provoca alterações nos dipolos magnéticos elementares, tanto
permanentes quanto induzidos, gerando assim um campo de indução que mudará o campo
inicial. Os campos magnéticos são formados por cargas elétricas em movimento. Quando
consideramos o vácuo como o meio onde acontece o fenômeno , observamos que a indução
magnética é diretamente proporcional ao campo magnético:
~B = µ0 ~H (1.3)
em que, µ0 = 4πx10−7Hm−1 é a permeabilidade magnética no vácuo. No vácuo, essas duas
grandezas estão relacionadas somente à densidade de corrente elétrica da fonte. Quando um
material se submete à presença de um meio magnético, tanto o campo H quanto a indução B
serão influenciados pela magnetização M do meio. A magnetização vista microscopicamente
resulta da soma dos momentos magnéticos e essa soma tem de ser diferente de zero. Para que
haja magnetização, é necessário que a média dos momentos magnéticos aponte para a mesma
direção. Os momentos de dipolo magnético que consideramos como correntes microscópicas
são fontes da indução magnética B. O vetor campo magnético está associado somente às
correntes macroscópicas [8]. Vale ressaltar que M e B têm a mesma dimensão. Podemos
relacionar essas três grandezas da seguinte maneira:
~B = µ0( ~H + ~M) (1.4)
Experimentalmente, observa-se uma relação entre a magnetização e o campo, para
materiais isotrópicos e lineares [7]:
~B = χm ~H (1.5)
A grandeza que surge dessa relação χm é adimensional e foi denominada susceptibili-
dade magnética. Se for positiva, a indução magnética se reforçará pela presença do material,
Capítulo 1. Conceitos de Magnetismo 5
que será chamado paramagnético; caso a susceptibilidade seja negativa, a indução se enfra-
quecerá pela presença do material, que se chamará diamagnético. A susceptibilidade é função
da temperatura, com a qual, às vezes, varia drasticamente. Apesar disso, para materiais pa-
ramagnéticos e diamagnéticos, temos que |χm| < 1; já para materiais ferromagnéticos, temos
χm � 1.
Quando magnetizamos uma substância ferromagnética, que em princípio está des-
magnetizada, colocando-a na presença de um campo magnético, os momentos de dipolo
magnéticos dessa substância se alinham de acordo com o campo aplicado numa relação li-
near, que ocorre até haver a saturação provocada pelo alinhamento magnético total, gerando
assim um ímã permanente, sem a presença de corrente (observe a figura 1.2). A primeira
curva (pontilhada), chamada de curva virgem, é a resposta a um campo externo a partir de
um estado desmagnetizado.
Figura 1.2: Curva de Histerese de um Material Ferromagnético
Reduzindo o campo magnetizante H até zero, após o material estar saturado magne-
ticamente, nota-se que a magnetização M não cai até zero, o material continua magnetizado
com um momento magnético chamado de remanência ou magnetização remanente. Se o ma-
terial em questão não estiver saturado por completo, o momento é chamado magnetização
remanente ou retentividade. Logo, remanência é o maior valor de campo que um material
pode gerar [9].
Capítulo 1. Conceitos de Magnetismo 6
Para reduzir a remanência a zero temos de aplicar ao material um campo contrário
também chamado de desmagnetizante (-H). O campo coercitivo ou desmagnetizante, neces-
sário para reduzir a remanência até zero, é chamado coercividade. Ao aumentarmos o campo
desmagnetizante, criamos uma magnetização com polaridade contrária. Dessa forma, ao se
magnetizar novamente o material com um campo H, temos a repetição do processo origi-
nando uma curva fechada que chamamos de Histerese Magnética (a palavra histerese vem
do grego e significa atraso). A histerese magnética consiste na capacidade que cada material
possui de manter suas propriedades magnéticas [7], [10].
Os materiais que possuem uma alta coercividade são denominados magneticamente
duros e dão origem aos ímãs permanentes. O nome advém do fato de que os primeiros ímãs
conhecidos foram os aços, que também são mecanicamente duros. Sendo assim, para ímãs
permanentes, uma melhoria em suas propriedades significa aumento da remanência e, tam-
bém, da coercividade; os materiais moles como o ferro possuem características opostas. Essas
duas classes de materiais possuem grande aplicação na indústria. Os transformadores, gera-
dores e motores de corrente alternada necessitam da menor coercividade possível, enquanto
os de corrente contínua necessitam de ímãs com altos valores de remanência e coercividade.
1.1 Fenômenos Magnéticos
Os fenômenos magnéticos resultam do comportamento magnético ou da natureza magnética
das substâncias. Basicamente, os fenômenos que ocorrem nos materiais são: Diamagnetismo,
Paramagnetismo, Ferromagnetismo, Antiferromagnetismo e Ferrimagnetismo. Ademais, ou-
tro fenômeno de grande relevância (devido ao crescimento quantitativo de pesquisas e de no-
vos esquipamentos para pesquisa em nanociência), que vem sendo estudado, inclusive neste
trabalho, é o Superparamagnetismo, observado em partículas na escala nanométrica.
Capítulo 1. Conceitos de Magnetismo 7
1.1.1 Diamagnetismo
O diamagnetismo é resultado do movimento orbital dos elétrons, que produz um campo
magnético. Não se gera campo magnético externo porque, para cada órbita, há dois elétrons
circulando em direções opostas. A teoria clássica desse fenômeno foi elaborada pelo físico
francês Paul Lagenvin [1872-1946] e publicada em 1905, em um trabalho notável [11]. O
diamagnetismo está presente em todos os tipos de materiais, não obstante, esse fenômeno é
em geral mascarado por um comportamento paramagnético ou ferromagnético mais intenso,
que costuma ocorrer simultaneamente ao diamagnetismo.
Na presença de um campo magnético, podemos ver o diamagnetismo como con-
sequência da Lei de Lenz atuando em escala atômica; haverá uma alteração na velocidade
orbital dos elétrons no sentido de evitar qualquer mudança no campo magnético produzido
pelo átomo. Dessa forma, as correntes eletrônicas em cada átomo são modificadas de tal
maneira que tendem a enfraquecer o campo; para isso, opõem-se a ele. As substâncias dia-
magnéticas não apresentam um momento magnético externo, ou seja, polos magnéticos como
um ímã permanente. Todavia, quando submetidas a um campo externo, tendem a se afastar
da região em que esse campo é mais forte, diz-se, então, que possui magnetismo negativo.
O resultado coletivo de todos os átomos do material é uma reação contrária ao
campo;logo, a tendência observada macroscopicamente é o afastamento com relação ao
campo aplicado. Materiais que possuem esse tipo de comportamento magnético, apresentam
a susceptibilidade negativa e crescente com o número de elétrons por átomo. Nada nesse
modelo sugere uma forte dependência térmica da susceptibilidade, e isso também está de
acordo com os experimentos realizados [11]. Em geral, compostos orgânicos são diamagnéti-
cos. Valores típicos da susceptibilidade de materiais diamagnéticos estão entre −1 × 10−7 e
−2× 10−6. Os supercondutores são diamagnéticos perfeitos com χ = −1, [12].
Em uma abordagem quântica, tem-se de forma simplificada o pressuposto de que as
camadas eletrônicas estão preenchidas. Sendo assim, não há momento angular orbital e de
spin:
L = S = 0 (1.6)
Capítulo 1. Conceitos de Magnetismo 8
Consequentemente, têm-se:
µB(L + gS) ·H = 0 (1.7)
Assumindo que o campo H é paralelo ao eixo z,
H = (0, 0, H) (1.8)
devido a
H× ri = H ·

−yi
xi
0
 (1.9)
obtemos:
(H× r2i )2 = H2(x2i + y2i ) (1.10)
Consequentemente, uma mudança de energia do estado fundamental ocorre ao termo
diamagnético que equivale a
∆E0 =
e2H2
8m
∑
i
〈0|x2i + y2i |0〉 (1.11)
em que |0〉 é a função de onda no estado fundamental
1.1.2 Paramagnetismo
As substâncias paramagnéticas possuem susceptibilidade magnética de intensidade compa-
rável à dos materiais diamagnéticos, todavia é positiva e depende do inverso da temperatura
absoluta. Conforme a Lei de Curie, temos:
χm =
C
T
(1.12)
em que C é a constante de Curie (definiremos mais tarde essa constante). Essas
Capítulo 1. Conceitos de Magnetismo 9
constatações de Pierre Curie foram todas experimentais.
A teoria clássica do paramagnetismo foi postulada anos mais tarde por Langevin
e qualitativamente é simples. Supõe-se que, em um paramagneto, os átomos possuem um
momento magnético ~µ devido ao não cancelamento dos momentos orbitais e de spin, uma
vez que as subcamadas eletrônicas desses átomos estão parcialmente preenchidas. Na ausên-
cia de um campo magnético, a magnetização do material é zero. Ao colocar um material
paramagnético perante um campo magnético externo aplicado ~H, os momentos de dipolo
magnético orientaram-se paralelamente ao campo externo. Se o campo ~H for não uniforme,
o material paramagnético é atraído da região onde o campo magnético é menos intenso para
a região onde o campo magnético é mais intenso.
Figura 1.3: Dependência da temperatura característica com a susceptibilidade recíproca: (a)
para um diamagnético e (b) para um paramagnético [12].
A energia é menor quando o campo se orienta paralelamente ao campo aplicado; por
isso, essa orientação é escolhida em detrimento da antiparalela. Isso provoca um campo de
indução que se soma ao campo aplicado, fazendo com que o material obtenha um momento
magnético alto. No entanto, agitação térmica tende a desalinhar os momentos magnéticos
do paramagneto, resultando assim num alinhamento parcial dos momentos magnéticos e
numa susceptibilidade positiva e bem reduzida, conforme o esquema da figura 1.3. Um
possível aumento da temperatura provoca o desalinhamento dos momentos e a diminuição
Capítulo 1. Conceitos de Magnetismo 10
da susceptibilidade.
Figura 1.4: Efeito do campo no momento orbital [11]
Considere uma unidade de volume de um determinado material com n átomos, em
que cada um possui momento magnético µ. Esse momento é representado por um vetor que
atravessa o centro de uma esfera de raio unitário. Calculemos o número dn de momentos
inclinados em um ângulo entre θ e θ+dθ em relação ao campo H. Na ausência de um campo
H, o número de vetores µ atravessando uma unidade de área na superfície da esfera será o
mesmo em qualquer ponto dessa superfície, e dn é simplesmente proporcional a dA, que é
2π sin θdθ para uma esfera de raio unitário [11], como podemos observar na figura 1.4. Mas,
quando o campo é aplicado, os momentos se alinham na sua direção e cada momento passa
a ter uma energia potencial
Ep = −µH cos θ (1.13)
Num estado de equilíbrio térmico com temperatura T , a probabilidade de um átomo
ter a energia Ep será eEp/kT , em que k é a constante de Boltzmann. O número de momentos
entre θ e θ + dθ é proporcional a dA multiplicado pelo fator de Boltzmann, isto é,
dn = KdAe−Ep/kT = 2πKeµH cos θ/kT sin θdθ (1.14)
Capítulo 1. Conceitos de Magnetismo 11
Em que K é o fator de proporcionalidade e é encontrado fazendo
∫ n
0
dn = n
Por comodidade, vamos chamar α = µH/kT
2πK
∫ π
0
eα cos θ sin θdθ = n (1.15)
O momento magnético total na direção do campo aplicado por unidade de volume é
conhecido como magnetização M , que é dada por:
M =
∫ n
0
µ cos θdn
em que µ cos θ é a contribuição de cada momento magnético. Substituindo a equação
1.14 na expressão acima, temos:
M = 2πKµ
∫ π
0
eα cos θ sin θ cos θdθ (1.16)
=
nµ
∫ π
0
eα cos θ sin θ cos θdθ∫ π
0
eα cos θ sin θdθ
Fazendo x = cos θ e dx = − sin θdθ, temos:
M =
nµ
∫ −1
1
xeαx∫ −1
1
eαx
= nµ
(
eα + e−α
eα − e−α
− 1
α
)
M = nµ
(
cothα− 1
α
)
(1.17)
nµ é o momento máximo possível a um material. Quando ocorre o perfeito alinha-
mento de todos os momentos magnéticos paralelamente com o campo aplicado, tem-se a
saturação do material. Denotamos nµ = M0. Assim
M
M0
= cothα− 1
α
(1.18)
Capítulo 1. Conceitos de Magnetismo 12
que é mais conhecida como função de Langevin e pode ser expressa por meio de uma
série
L(α) =
α
3
− α
3
45
+
2α5
945
− ... (1.19)
que é válida somente para α ≤ 1. Se α for grande, L(α) tende a 1; se α < 0, 5, é uma linha
reta com inclinação 1/3, como podemos observar na figura 1.5.
Figura 1.5: Função de Langevin [11]
Da Função de Langevin, temos dois resultados:
1. A saturação ocorrerá se α(= µH/KBT ) for suficientemente grande. Isso faz sentido
físico, uma vez que a relação H/T for também suficientemente grande a ponto de
superar a desordem provocada pela agitação térmica.
Capítulo 1. Conceitos de Magnetismo 13
2. Para α pequeno, M varia linearmente com H; é o que observamos sob condições nor-
mais.
A teoria de Langevin leva à Lei de Curie. Para α pequeno, L(α) = α/3, na equação
1.19, temos:
M =
nµα
3
=
nµ2H
3kT
(1.20)
Portanto,
χν =
M
H
=
nµ2
3kT
,
χm =
χν
ρ
=
nµ2
3ρkT
em que ρ é a densidade. Todavia n = Nρ/A, em que N é o número de Avogrado; e
A, a massa atômica. Assim
χν =
Nµ2
3AkT
=
C
T
Am2
m3Am−1
[adimensional](SI)
e
χm =
Nµ2
3ρAkT
=
C
ρT
Am2
KgAm−1
=
m3
Kg
(SI) (1.21)
que é a Lei de Curie, com a constante de Curie dada por
C =
Nµ2
3Ak
(1.22)
A teoria de Langevin para paramagnetismo, que leva à lei Curie, baseia-se na su-
posição de que os portadores individuais de momento magnético (átomos ou moléculas) não
interagem uns com os outros, mas são ativados apenas pelo campo aplicado e pela agitação
térmica.
Na teoria quântica do paramagnetismo, as principais conclusões da teoria clássica
são modificadas, mas não drasticamente. Em substâncias paragméticas, a energia de cada
momento magnético µ em um campo H é −µHcosθ, em que θ pode assumir apenas deter-
minados valores θ1, θ2, ... e valores intermediários não são permitidos, o que não acontece na
teoria clássica. Essa restrição é chamada de espaço de quantização, como nos revela a figura
Capítulo 1. Conceitos de Magnetismo 14
1.6. As regras do espaço de quantização em geral são expressas em termos do momento
angular em vez do momento magnético; devemos, pois, considerar a relação entre momento
angular orbital e momento angular de spin.
µorbital =
eh
4πm
(1.23)
Sabendo que p = h/2π, temos, então:
µorbital =
e
2m
porbital (1.24)
O momento angular decorrente do spin é sh/2π, em que s = 1/2. Temos, assim:
µspin =
eh
4πm
=
e
m
pspin (1.25)
Combinando as duas últimas equações, obteremos uma forma geral para o momento
angular, que é
µ = g(e/2m)(p) (1.26)
em que o fator g é 1 para momento orbital e 2 para momento de spin.
O momento angular total de um átomo é a combinação das contribuições do momento
orbital e do momento de spin, que é representado por J . Com isso,o momento magnético
efetivo de um átomo µef será:
µef = g
(
eh
4πm
)√
J(J + 1) Am2(SI) (1.27)
Sabendo que o magneton de Bohr é µB = eh/4πm, temos
µef = g
√
J(J + 1)µB (1.28)
Outrossim, pode-se considerar que o momento consiste em um número efetivo nef
Capítulo 1. Conceitos de Magnetismo 15
de magnetons de Bohr:
nef = g
√
J(J + 1) (1.29)
Devido à quantização espacial, o momento efetivo pode ter valores discretos θ1, θ2, ...
para o campo. Em vez de especificar esses ângulos, especificaremos os valores de µH , que é
o componente de µef na direção de H:
µH = gMJµB (1.30)
Em que MJ é um número quântico associado a J [11]. Há 2J + 1 valores de MJ e o
maior valor de µH é gJµB.
Figura 1.6: Espaço de Quantização: (a) Teoria Clássica, (b) e (c) Teoria Quântica [11].
Os valores de J podem ser um número inteiro ou semi-inteiro e vão de J = 1/2 até
J =∞. Isso significa:
• J = 1/2 corresponde à contribuição somente do spin, ou seja, L = 0→ J = S = 1/2, de
modo que o fator de Landé g = 2. Assim, os valores de MJ diminuem de +J para −J
em valores unitários. Nesse caso, temos +1/2 e −1/2, em que os momentos magnéticos
µH são µB e −µB, paralelo e antiparalelo ao campo aplicado, como mostrado na figura
1.6b.
Capítulo 1. Conceitos de Magnetismo 16
• J = ∞ corresponde a um número infinito de orientações. Isso é equivalente à distri-
buição clássica, como mostra a figura 1.6a.
1.1.3 Ferromagnetismo e Antiferromagnetismo
Pierre Weiss formulou a hipótese de que haveria um campo molecular que agiria nas subs-
tâncias ferromagnéticas, tanto abaixo quanto acima da temperatura de Curie, e, complemen-
tando, um ferromagneto desmagnetizado estaria divido em regiões microscópicas chamadas
de domínios. Cada domínio está magnetizado espontaneamente até o valor de saturação MS
direcionado aleatoriamente, culminando numa magnetização total nula. Sendo assim, o pro-
cesso de magnetização consiste em tornar esses multidomínios um único monodomínio com
magnetização resultante direcionada no sentido do campo aplicado, conforme percebemos na
figura 1.7.
Figura 1.7: Processo de Magnetização
No ferromagnetismo, os átomos do material possuem uma forte interação que tende
a manter seus momentos magnéticos alinhados em uma única e exclusiva direção, mesmo
na ausência de campo externo aplicado. Esse efeito é geralmente causado pela interação
de troca. Para um ferromagneto submetido a um campo externo H, o hamiltoniano que
soluciona esse problema é
H = −
∑
ij
JijSi · Sj + gJµB
∑
j
Sj ·H (1.31)
Capítulo 1. Conceitos de Magnetismo 17
Para vizinhos próximos, Jij > 0.
Para a hipótese de Weiss de campo molecular, usa-se um hamiltoniano dessa forma:
H = gJµB
∑
i
Si · (H + Hm) (1.32)
Assumindo que o único campo a agir em um material é o campo molecular Hm
(proporcional à magnetização), temos
Hm = γM (1.33)
em que γ é a constante de campo molecular. Para ferromagnetos, γ >> 1, devido à
influência da interação na interação de troca. Definimos a magnetização relativa como1:
M
Ms
= BJ(y) (1.34)
com BJ(y) sendo a função de Brillouin e
y =
gJµBJ(H + γM)
kT
. (1.35)
A magnetização espontânea em materiais ferromagnéticos varia conforme a tempe-
ratura, cujo limite é a temperatura de Curie (Tc). Acima de Tc, os materiais ferromagnéticos
tornam-se paramagnéticos.
Na figura 1.8 (a), percebe-se que a magnetização produzida pelo campo molecular é
a intersecção entre as curvas. Na origem, temos um ponto de instabilidade, e a magnetização
pode ir tomando os valores 0, A,B,E, ... até chegar no ponto estável P . Esse ponto é estável,
pois a partir dele, mesmo na ausência de campo, a magnetização não mudará.
Agora, veremos o comportamento desses materiais mediante a variação da tempera-
tura, isto é, como a magnetização de saturação MS varia com a temperatura, e observaremos
em qual temperatura esses materiais tornam-se paramagnéticos. Do paramagnetismo, temos
1Ver seção 2.3 [24]
Capítulo 1. Conceitos de Magnetismo 18
Figura 1.8: (a) Magnetização espontânea pelo campo molecular; (b) Efeito da temperatura
no valor da magnetização espontânea. Curva 1 é a função de Langevin [11]
α = µH/kT e consideramos que a magnetização relativa é dada pela função de Langevin
M
M0
= L(α) = coth(α)− 1
α
. (1.36)
Caso não haja campo aplicado, temos:
α =
µHm
kT
=
µγM
kT
=
µγM
kT
M
M0
, (1.37)
M
M0
=
(
kT
µγM0
)
α (1.38)
Nota-se que a magnetização relativa é uma função linear de α e sua inclinação é
proporcional à temperatura absoluta. Observa-se, no gráfico da figura 1.8 (b), uma plotagem
da equação 1.36 para T2, que, com o aumento da temperatura, rotaciona no sentido anti-
horário até a linha 2 e, com mais um aumento de temperatura, rotaciona para a linha 3.
Não há magnetização espontânea quando a temperatura é T3. A curva 3 tangencia a função
de Langevin na origem; portanto, T3 = Tc, que é a temperatura de Curie. Em qualquer
temperatura mais alta que T3, não haverá magnetização espontânea, pois o material será
paramagnético. Pode-se calcular a temperatura de Curie analisando a inclinação da curva
Capítulo 1. Conceitos de Magnetismo 19
T3, que é a mesma da função de Langevin, 1/3. Temos, assim:
kTc
µγM0
=
1
3
Tc =
µγM0
3k
(1.39)
A inclinação da reta, que representa o campo molecular, é em qualquer temperatura:
kT
µγM0
=
T
3Tc
(1.40)
Entretanto, a inclinação da curva determina a intersecção P com a curva de Langevin
e, portanto, o valor de M/M0. Isso significa que todo material ferromagnético que apresenta
diferentes valores deM0 e Tc tem os mesmos valores deMs/M0 para qualquer valor particular
de T/Tc. Isso é geralmente chamado de lei de estados correspondentes.
Ao aplicar um pequeno campo H em T ≥ Tc, acontecerá uma pequena magnetização,
de modo que a aproximação para a função de Brillouin y << 1 pode ser empregada. Assim,
M
Ms
≈ gJµB(J + 1)
3k
(
H + γM
T
)
(1.41)
Isso nos leva a
M
Ms
≈ Tc
λMs
(
H + γM
T
)
(1.42)
Rearranjando os termos, temos:
M
Ms
(
1− Tc
T
)
≈ TcH
µMs
(1.43)
Portanto,
χ = lim
H→0
µ0M
H
∝ 1
T − Tc
(1.44)
que é a lei de Curie.
Capítulo 1. Conceitos de Magnetismo 20
Suscintamente, pode-se explicitar a teoria quântica do ferromagnetismo desta ma-
neira: a magnetização ocorre devido a spins paralelos e não a momentos de dipolo magnético
orbitais. Portanto, os elétrons das subcamadas mais externas de átomos de ferromagnetos
se orientam de maneira que seus spins sejam paralelos, reduzindo assim a energia do átomo.
Isso implica dizer que dois elétrons 3d se encontram mais afastados, em média de seus spins
se forem paralelos em vez de antiparalelos (devido ao princípio de exclusão de Pauli), e, uma
vez mais afastados a energia de repulsão coulombiana mútua é menor. Logo, o momento
dipolar magnético de spin permanente ocorre devido à interação entre as coordenadas de
spin e de espaço impostas pela exigência quântica referente à troca de coordenadas de partí-
culas indistinguíveis. Por isso, o acoplamento de spin é às vezes considerado consequente de
uma forte interação de troca que tem lugar no átomo. Há interação de troca entre átomos
adjacentes em uma rede cristalina de átomos de ferro; essa interação pode levar o sistema a
um estado de menor energia; o mesmo pode acontecer, também, quando os spins de pares
adjacentes de átomos forem paralelos.
De forma análoga, pode-se explicar o comportamento antiferromagnético: momentos
magnéticos vizinhos estão alinhados antiparalelamente. Com isso, há duas possibilidades de
descrição a partir do modelo de Weiss.
1. Uma interação de troca negativa entre vizinhos próximos é considerada;
2. A rede é dividida em duas sub-redes (ver figura 1.9):
- cada sub-rede exibe um arranjo ferromagnético e
- há uma orientação antiparalela da magnetização entre as sub-redes.
Figura 1.9: Arranjo Antiferromagnético composto de duas sub-redes ferromagneticamente
ordenadas [24].
Capítulo 1. Conceitos de Magnetismo 21
Mediante o modelo de Weiss, pressupondo-se que não haja campo magnético externo
e que o campo molecular da sub-rede ↑ H(+)mé proporcional à magnetização da sub-rede ↓
M− e vice-versa, temos:
H(+)m = −|λ|M−
H(−)m = −|λ|M+
A magnetização das sub-redes podem ser escritas, portanto, como
M± = MsHJ
(
− gµBJ |λ|M∓
kT
)
(1.45)
As duas sub-redes têm orientação antiparalela em relação uma a outra, mas a mag-
nitude das suas magnetizações são iguais:
|M+| = |M−| = M
e, portanto,
M = MsHJ
(
− gµBJ |λ|M
kT
)
. (1.46)
O campo molecular segue esse modelo em cada sub-rede e desaparece em tempe-
raturas acima da temperatura de Néel (TN), que é a temperatura de transição, definida 2
por:
TN =
gµB(J + 1)|λ|Ms
3k
=
n|λ|µ2ef
3k
(1.47)
A magnetização das sub-redes estarão em direções opostas; com isso, a magnetização
líquida M+ +M− será nula. Será, contuto, não nula para temperaturas abaixo de TN .
Para T > TN , o efeito de um pequeno campo aplicado será semelhante ao de um
2Para mais detalhes, ver capítulo 5 de [24] e [25]
Capítulo 1. Conceitos de Magnetismo 22
ferromagneto, e a susceptibilidade será dada por:
χ = lim
H→0
µ0M
H
∝ 1
T + TN
, (1.48)
que é a lei de Curie com uma modificação: troca-se o termo −Tc por +TN .
Pode-se ter uma forma geral para expressar a susceptibilidade
χ ∝ 1
T − θ
(1.49)
em que θ é a temperatura de Curie Weiss. Se θ = 0, o material é paramagnético; se
θ > 0, o material é ferromagnético e espera-se θ = Tc; e se θ < 0, o material é antiferromag-
nético e espera-se θ = −TN [25].
1.1.4 Ferrimagnetismo
Os materiais ferrimagnéticos possuem dois tipos diferentes de íons magnéticos que também se
orientam antiparalelamente, mas, como existem dois tipos de íons com momentos magnéticos
diferentes, a magnetização resultante não é nula. Há, então, uma magnetização espontânea
à temperatura ambiente. A estrutura do material contém componentes do tipo "spin para
cima"e "spin para baixo", o que promove um momento magnético resultante não nulo em
um dos sentidos, como mostra a Figura 1.10.
Figura 1.10: Arranjo Ferrimagnético [9].
Capítulo 1. Conceitos de Magnetismo 23
Os efeitos magnéticos externos das ferrites são intermediários entre o ferromagne-
tismo e o antiferromagnetismo. Os ferrimagnéticos apresentam condutividade elétrica muito
baixa, o que é vantajoso para determinadas aplicações, como na detecção de frequências ele-
tromagnéticas altas, devido à ausência de correntes de Foucault apreciáveis, e sem as perdas
de energia resultantes. Há uma temperatura a partir da qual materiais ferrimagnéticos se
tornam paramagnéticos; tal temperatura é conhecida com Temperatura de Curie.
O campo molecular é descrito de forma análoga ao caso antiferromagnético3. Em
decorrência de questões de simetria, temos:
v2 = w1 < 0 (1.50)
devido ao acoplamento antiferromagnético. Mas v1 6= w2. Vamos definir
v2 = w1 = −v, com v > 0 (1.51)
e
v1 = κv
w2 = �w
Sendo assim, pode-se estudar um sistema ferromagnético como uma função da razão
das constantes de campo molecular, em vez dos seus valores absolutos. Portanto, tem-se
H(+)m = κvM+ − vM− (1.52)
H(−)m = −vM− + �vM+ (1.53)
Dessa forma, a magnetização das sub-redes será
3Ver equações 5.63 e 5.64 [24]
Capítulo 1. Conceitos de Magnetismo 24
M+ = ngJµBJ ·HJ
(
gJµBJµ0
kT
· (H + κvM+ − vM−)
)
(1.54)
M− = ngJµBJ ·HJ
(
gJµBJµ0
kT
· (H − vM+ + �vM−)
)
(1.55)
Acima da temperatura de transição, recaímos na função de Brillouin
BJ(y) =
J + 1
3J
y (1.56)
que resulta em:
M+ =
ng2Jµ
2
BJ(J + 1)µ0
3kT
· (H + κvM+ − vM−)
M+ =
c+
T
(H + κvM+ − vM−) (1.57)
com c+ sendo
c+ =
ng2Jµ
2
BJ(J + 1)µ0
3k
(1.58)
e, para outra sub-rede, temos, de forma análoga
M− =
c−
T
(H − vM+ + �vM−) (1.59)
A solução dessas equações é dada por
M+ =
c+T − c+c−�v − c+c−v
T 2 − v(κc+ + �c−)T + c+c−v2(κ�− 1)
·H (1.60)
M− =
c−T − c+c−σv − c+c−v
T 2 − v(κc+ + �c−)T + c+c−v2(κ�− 1)
·H (1.61)
Capítulo 1. Conceitos de Magnetismo 25
Portanto, a magnetização total M = M+ +M− será:
M =
(c+ + c−)T − c+c−v(2 + κ+ �)
T 2 − v(κc+ + �c−)T + c+c−v2(κ�− 1)
(1.62)
Agora, calculamos a susceptibilidade inversa
µ0
1
χ
=
H
M
= H · T
2 − v(κc+ + �c−)T + c+c−v2(κ�− 1)
(c+ + c−)T − c+c−v(2 + κ+ �)
(1.63)
Introduzindo os parâmetros adequados, θ, χ0 e σ, chegamos a:
µ0
1
χ
=
T
c+ + c−
+
1
χ0
+
σ
T − θ
(1.64)
Pode-se observar na figura 1.11 que o comportamento de sistemas ferromagnéticos
e antiferromagnéticos para a susceptibilidade inversa é linear; todavia, para sistemas ferri-
magnéticos, tem-se um caráter hiperbólico. Tomando limite T →∞ para a equação anterior
temos
1
χ
∝ T
c+ + c−
+
1
χ0
(1.65)
bem como a intersecção com o eixo T , que determina a temperatura crítica Tc:
1
χ
(Tc) = 0 (1.66)
Figura 1.11: Dependência da temperatura da susceptiblidade magnética recíproca para ma-
teriais ferro, antiferro e ferrimagnéticos.
Capítulo 1. Conceitos de Magnetismo 26
Devido a diferentes magnitudes das magnetizações das sub-redes, frequentemente a
magnetização total tem um comportamento consideravelmente complexo4, mas não entrare-
mos em detalhes neste trabalho.
1.1.5 Superparamagnetismo
O termo superparamagnetismo foi introduzido por Bean e Livingston em 1959 [13], com vistas
a descrever o comportamento magnético de partículas magnéticas de dimensões de escala
nanométrica. Nessa escala, existem efeitos de tamanho, de confinamento e de superfície que
influenciam as propriedades magnéticas das nanopartículas. Na suposição inicial, considerou-
se que os momentos magnéticos no interior de uma partícula se movimentam coerentemente,
apontando na mesma direção mediante a aplicação de um campo magnético externo, ou
seja, o momento magnético total pode ser representado por meio de um único vetor clássico
de magnitude µ [14]. A redução de tamanho da nanopartícula considerada monodomínio é
suficiente para que o seu momento magnético não fique estável no eixo magnético preferencial
durante um tempo típico de medida.
De acordo com o artigo de Bean e Livingston, no superparamagnetismo, há dois
fenômenos: alinhamento tipo Langevin de macrospins em um campo externo e bloqueio
superparamagnético ou congelamento da magnetização reversa. Na ausência de um campo
externo, a característica de Langevin em ter magnetização em temperatura ambiente torna-se
importante em partículas por volta de 2nm. Em contrapartida, o bloqueio superparamag-
nético ocorre entre 3nm (materiais magnéticos duros) e 30nm (materiais magnéticos moles),
[15].
A direção do momento magnético de cada partícula está determinada pela minimi-
zação da energia de anisotropia do sistema (amostra) que, no caso de ser uniaxial, pode ser
expressa da seguinte maneira:
E = KaV sin
2 θ (1.67)
em que Ka é a constante de anisotropia, V é o volume da partícula e θ é o ângulo
entre o momento magnético da partícula e o eixo de fácil magnetização, como indica a figura
1.12. Sendo assim, percebemos que o momento magnético da partícula possui dois estados
de mínima energia, um para θ = 0 e outro para θ = π. Os estados de mínima energia estão
4Ver seção 5.3 [24]
Capítulo 1. Conceitos de Magnetismo 27
Figura 1.12: Magnetização de uma partícula esférica fazendo um ângulo θ com o eixo de fácil
magnetização
separados por uma barreira de energia igual a KaV .
Se a temperatura do sistema aumenta, aumenta também a energia térmica kT . Para
uma determinada temperatura, o valor da energia térmica pode vir a ser comparável ou
mesmo maior que a barreira de energia KaV . Nesse caso, a magnetização da partícula (em
equilíbrio térmico) não estará mais bloqueada em uma direção, mas apresentará flutuações
entre os dois estados de mínima energia de forma muito rápida. Nesse caso, dizemos que o
sistema de nanopartículas está em um estado superparamagnético, pois poderá ser descrito
por um modelo paramagnético efetivo, em que os momentos magnéticos são os de cada
partícula como um todo, o momento magnético resultante.
Em um sistema no estado superparamagnético, as partículas possuem um tempo de
relaxação que caracteriza asflutuações do momento magnético, que é essencialmente o tempo
médio para reverter o momento magnético de um estadode equilíbrio para outro. Esse
tempo, primeiramente introduzido por Néel, pode ser descrito pela lei de Arrhenius [16]:
τ = τ0e
(
KaV
kBT
)
(1.68)
O tempo de relaxação τ é determinado por uma frequência de tentativas de saltos
τ0 da ordem de 1010Hz, em que kB é a constante de Boltzmann, T a temperatura, V o
volume da partícula e Ka a constante de anisotropia. Podemos observar então que o volume
Capítulo 1. Conceitos de Magnetismo 28
crítico para o superparamagnetismo é diretamente proporcional à temperatura; portanto, ao
obtermos uma distribuição de partículas com diferentes tamanhos e elevando sua temperatura
elas vão se tornando cada vez mais superparamagnéticas. Por exemplo, Um aglomerado de
partículas esféricas de Cobalto, com 68Å de diâmetro e tempo de relaxação τ = 0.1s, chegaria
rapidamente ao equilíbrio térmico. Todavia, se aumentarmos o diâmetro da partícula para
90Å, o valor de τ chega a 3, 2× 109s , aproximadamente 100 anos. Podemos concluir, então,
que o momento magnético torna-se tão instável que acaba demorando muito mais para sofrer
uma reversão [17], mesmo com uma alteração tão pequena no diâmetro da partícula.
Com base nisso, pode-se afirmar que o efeito superparamagnético é observado em
uma determinada partícula quando esta, em dada temperatura, tem seu tempo de relaxação
inferior o tempo necessário para se realizar a medida. Caso contrário, diz-se comumente que a
partícula encontra-se no estado bloqueado. Podemos chegar a esse estado bloqueado de duas
diferentes maneiras: primeiro reduzindo a temperatura da nanopartícula gradualmente até
atingirmos o alinhamento do momento magnético da partícula, conforme a nossa necessidade;
a outra forma possível é aumentando o tamanho da nanopartícula de tal forma que a barreira
potencial de energia magnética será da ordem de tamanho da partícula, não criando assim um
obstáculo. Observamos a relação do alinhamento magnético da nanopartícula e sua histerese
na figura 1.13.
Figura 1.13: Relação do tamanho da nanopartícula e sua histerese magnética, (adaptado de
[11]).
Quando a nanopartícula encontra-se num estado superparamagnético, ou seja, está
Capítulo 1. Conceitos de Magnetismo 29
com o seu momento magnético instável, observamos que sua histerese é fechada, as duas
curvas estão superpostas (curva vermelha na figura 1.13). Com isso, podemos observar que
a coercividade ou Campo Coercitivo é zero, isto é, não é necessário aplicar campo magnético
externo para desalinhar o momento magnético da partícula.
Já para as partículas com pseudomonodomínio ou multidomínio (curva azul na figura
1.13) observamos que o Campo Coercitivo é muito alto, ou seja, exige-se um campo magnético
alto para se desmagnetizar a amostra. Materiais desse tipo são muito necessários na produção,
por exemplo, de discos rígidos de computadores, uma vez que as informações gravadas nesses
materiais, não devem se perder em caso de contato com campo magnético externo.
Outro fator importante para a confirmação de superparamagnetismo nessas amostras
é a comparação do tamanho médio do cristalito com o diâmetro crítico dc superparamagnético
para tais amostras. O tempo de relaxação é essencialmente o tempo necessário para reverter
o momento magnético de um estado de equilíbrio para outro. Esse tempo característico
depende da energia da barreira KV e da temperatura. Da equação 1.67 temos:
τ = τ0
KaV
kBT
(1.69)
Em nanopartículas, comportamento magnético depende também do tempo de me-
dida τm, que varia desde valores altos (tipicamente 102s), até baixos valores (10−8s), no caso
da espectrocopia Mössbauer.
Para altas temperaturas ou pequenos volumes, kBT � KaV , tem-se τm � τ →Regime
Superparamagnético. kBT � KaV , tem-se τm � τ →Regime Bloqueado.
Definindo o volume crítico a uma temperatura constante To ao requerer τm = τ
ln τ = ln τ0 +
KaVcrit
kBT0
=

ln 102
...
ln 10−8 .
(1.70)
Assumindo que τm = 100s [42], tem-se:
Vcrit ≈
25kT
Ka
(1.71)
De posse dessa relação, pode-se calcular o volume crítico para a amostra deMnFe2O4.
Capítulo 1. Conceitos de Magnetismo 30
Sabe-se que Ka para ferrita de manganês é 0, 056J/cm3 [43], tendo-se, assim,
Vcrit ≈
25 · 1, 38 · 10−23m2Kgs−2K−13̇00K
0, 056Kgm2s−2cm−3
Vcrit ≈
10350 · 10−23
0, 0561̇0−21nm−3
Vcrit ≈ 1850nm3
Considerando que a nanopartícula possui forma esférica, pode-se calcular o raio e
consequentemente o diâmetro crítico dcrit para MnFe2O4.
dcrit = 2rcrit = 2 ·
3
√
3Vcrit
4π
dcrit ∼= 15.2nm
Capı́tulo 2
Ferritas
"The grass was greener. The light was
brighter. The taste was sweeter. The
nights of wonder. With friends sur-
rounded. The dawn mist glowing. The
water flowing. The endless river. Fore-
ver and ever. "
High Hopes - PINK FLOYD
2.1 Óxidos Magnéticos
Os óxidos magnéticos geralmente são compostos por elementos dos grupos de transição, nos
quais estão os elementos que possuem as camadas eletrônicas mais internas não preenchidas.
Os elétrons das camadas mais externas contribuem na ligação química, e os elétrons das
camadas internas não preenchidas são responsáveis pela variedade de propriedades magnéti-
cas, em decorrência do desemparelhamento dos spins. Tais estados eletrônicos que produzem
magnetismo são pouco afetados pelo ambiente, uma vez que sua valência é bem definida.
A força do acoplamento spin-órbita é determinante para estabelecer até que ponto
o momento orbital contribui para as propriedades magnéticas. Os spins também interagem
com a rede; nessa interação, o elétron sofre influência de dois campos separadamente: o
campo elétrico cristalino captura ou extingue o momento orbital, mediante o Efeito Stark, e
a interação de troca ordena os spins [22].
Os elementos que produzem efeitos magnéticos mais significantes, quando combina-
31
Capítulo 2. Ferritas 32
dos com oxigênio, são os que possuem camadas internas dn e fn incompletas. Neste trabalho,
nosso foco de interesse são os elementos pertencentes ao grupo 3dn, mais conhecido como
série do ferro, que se inicia no Escândio Sc21 e termina no Cobre Cu29.
2.2 Estrutura Espinélio
Ferritas Espinélio constitui um grande grupo de óxidos que possuem estrutura semelhante ao
espinélio natural MgAl2O4. Existem muitos espinélios sintéticos comercializados, mas sem
dúvida o espinélio mais conhecido e também um dos mais utilizados é a magnetita Fe3O4,
que é um óxido natural.
Espinélios possuem estrutura estável e predominantemente iônica; todavia, sítios
ocupados por cátions são influenciados por vários fatores, dentre eles: efeitos de ligações
covalentes e energias de estabilização de campo do cristal de cátions de metais de transição.
A primeira estrutura espinélio foi determinada a princípio por Bragg (1915) e Nishikawa
(1915). A estrutura ideal é cúbica de face centrada (cfc), composta por um conjunto de
átomos de oxigênio; nela, 1/8 dos sítios tetraédricos e 1/2 dos sítios octaédricos intersticiais
são ocupados por cátions. Adotaremos A, para representar os sítios tetraédricos, e B, para
os sítios octaédricos.
A célula unitária contém 8 unidades de fórmula AB2O4, é formada por 8 sítios A, 16
sítios B e 32 oxigênios. Pode-se descrever a célula unitária tomando os sítios A como origem
da célula unitária. Por conveniência, divide-se a célula unitária em oito cubos de aresta a/2
para mostrar a disposição dos sítios A e B, como podemos observar na figura 2.1.
Os átomos de oxigênio geralmente não estão localizados em posições exatas das sub-
redes cfc. As posições detalhadas são determinadas pelo parâmetro u, que reflete o ajuste da
estrutura a fim de acomodar diferenças nas razões de raios dos cátions nos sítios tetraédricos
e octaédricos.
O parâmetro u é definido na figura 2.2 e tem valor de 0.375 para um arranjo ideal de
face centrada de átomos de O, tomando como célula unitária a da figura 2.1. Pode-se usar,
outrossim, o centro de simetria para definir o parâmetro, localizado em (0.125, 0.125, 0.125),
como origem da célula unitária. Nesse caso, o valor ideal de u é 0.25.
A situação ideal é dificilmente realizada, eos reais valores de u, para maioria dos
espinélios, variam de 0.375 a 0.385. O parâmetro u aumenta porque os ânions nos sítios
Capítulo 2. Ferritas 33
Figura 2.1: Estrutura Espinélio. Célula unitária divida em octantes. Cátions nos sítios
tetraédricos A, cátions nos sítios octaédricos B e átomos O em dois octantes [12].
tetraédricos são forçados a moverem-se na direção [111] para ceder espaço aos cátions A, que
em geral são maiores que o espaço ideal permitido pelo arranjo de face centrada do oxigênio,
mas sem alterar a simetria total 43m. O octaedro torna-se menor e assume a simetria 3m.
A média radial dos cátions afeta primeiramente o parâmetro a, enquanto a razão radial de
cátions tetraédricos e octaédricos determina principalmente o valor de u. Se o parâmetro
da rede é tomado como a média ponderada das projeções dos comprimentos das ligações
tetraédricas e octaédricas na célula unitária, o parâmetro pode ser descrito por [12]:
a =
8(lig. tet.)
3
√
3
+
8(lig. oct.)
3
(2.1)
Essa expressão é responsável por aproximadamente 96.7% das variações do parâmetro
de rede de 149 óxidos espinélio [26].
No espinélio MgAl2O4, os cátions Al e Mg ocupam respectivamente os sítios octaé-
drico e tetraédrico. A distribuição de cátion usual é:
(Mg)[Al2]O4 (2.2)
Capítulo 2. Ferritas 34
Figura 2.2: Definição do parâmetro de deformação u. Meio plano de (110) é mostrado.
Atómos de oxigênio (círculos grandes) estão dispostos na direção 〈111〉 devido a presença dos
cátions tetraédricos. No caso ideal, u = 0.375 [12].
em que os colchetes indicam a ocupação dos sítios octaédricos e os parênteses a dos
sítios tetraédricos. Essa distribuição é chamada normal. SeD representa um cátion divalente,
e T um trivalente, tem-se outra distribuição
(T )[DT ]O4 (2.3)
que é chamada espinélio inverso. Em vários casos, encontra-se uma distribuição
intermediária
(D1−δTδ)[DδT2−δ]O4 (2.4)
na qual δ é o grau de inversão, com valor zero para distribuição normal e 1 para
distribuição inversa. Em muitos casos, o grau de inversão depende da técnica de preparo, em
especial a taxa de resfriamento após a sinterização.
As propriedades físicas dos espinélios não dependem apenas dos tipos de cátions
presentes na rede, mas também da sua distribuição sobre todos os sítios disponíveis do
cristal. De fato, entender e prever a distribuição dos cátions nos espinélios estão entre os
Capítulo 2. Ferritas 35
mais interessantes e persistentes problemas da química de cristais.
Os fatores que contribuem para a energia total da rede em espinélios são:
1. Energia elástica;
2. Energia eletrostática (Madelung);
3. Energia de estabilização do campo cristal;
4. Efeitos de polarização.
As duas primeiras energias, em geral, são suficientes para determinar a energia total
da rede em óxidos de metais que não são de transição. A energia elástica está relacionada
ao grau de distorção da estrutura do cristal, que, por sua vez, está relacionado às diferenças
de raio iônico, assumindo que os íons adotam uma forma esférica. Cátions menores, com
raio entre 0.225 e 0.4, ocupam sítios tetraédricos, já cátions de raio entre 0.4 e 0.73 ocupam
sítios octraédricos. Essa distribuição leva a um mínimo de tensão na rede, uma vez que
cátions trivalentes são geralmente menores que os divalentes. As contribuições eletrostática e
elástica estão embasadas no pressuposto da simetria esférica dos íons com apenas interações
coulombianas, o que está longe de ser o caso para cátions de metais de transição em espinélios
ferrimagnéticos.
Figura 2.3: Geometria espacial dos orbitais d (a) dxy, (b) dx2−y2 , (c) dz2 [12].
A utilização da Teoria do Campo Cristalino para a compreensão do sítio preferencial
do cátion foi sugerida primeiramente por Romeijn (1915). Ja é sabido que a densidade de
Capítulo 2. Ferritas 36
carga dos orbitais d, figura 2.3, interage com a distribuição de carga do ambiente no qual o
íon de transição é inserido. Os cinco orbitais d (dxy, dyz, dzx, dz2 , dx2−y2) já não têm a mesma
energia, mas estão dividos conforme a simetria do campo eletrostático produzido pelos ânions
do sítio particular da rede. As bases físicas para essa divisão são simplesmente a repulsão
eletrostática entre os elétrons d e os elétrons dos orbitais em torno dos ânions.
A polarização pode ser considerada o grau de distorção da densidade de carga ele-
trônica ao redor do íon e pode surgir de várias maneiras. Dois casos extremos seriam: um
efeito insignificante que dá origem a um vínculo puramente covalente e a remoção eficaz de
um elétron de um íon em direção ao seu vizinho dará origem a um vínculo puramente iônico.
Em relação aos íons dos metais de transição em espinélios, espera-se que apenas íons esferica-
mente simétricos (d5 e d10) possam indicar uma tendência para covalência. Nesse caso, sítios
tetraédricos são, pois, preferidos. Cátions que revelam afinidade covalente para ambientes
tetraédricos são Fe3+, Ga3+, In3+ e, mais fortemente, Zn2+ e Cd2+. Espinélios formados
pelos primeiros cátions citados são inversos, enquanto os formados pelos últimos tendem a
ser espinélios normais [12].
O grau de inversão, δ, não é exatamente zero ou um em muitas ferritas e pode ser
modificado por meio da técnica de preparação. Em altas temperaturas (próximas ao ponto de
fusão, por exemplo), seria esperada uma simples distribuição estatística de todos os cátions
nos sítios do cristal (δ = 2/3). Um resfriamento muito rápido pode extinguir estados em alta
temperatura. Se a redistribuição dos cátions é lenta, estados de alta temperatura permane-
cem em temperatura ambiente. Em muitos casos, uma simples distribuição de Boltzmann
tem evidenciado uma boa concordância com os resultados experimentais. A distribuição de
Boltzmann pode ser descrita da seguinte maneira:
(2− δ)(1− δ)
δ2
= e
−E
kT (2.5)
em que E é a energia de ativação para a troca de sítio entre um cátion trivalente
e um divalente, k é a constante de Boltzmann e T é a temperatura. A termodinâmica da
redistribuição de cátion é bem conhecida pela variação da taxa de resfriamento entre 0.01oC/s
e 1000oC/s; uma variação contínua na configuração de cátion é obtida em CoFe2O4 [27]. Um
valor típico de E é 0.8± 0.05eV para uma ferrita inversa, NiFe2O4 [28], e 0.14eV para uma
ferrita mista, MgFe2O4 [29]. A distribuição das seguintes ferritas tem sido investigada por
difração de nêutron: NiFe2O4 e ZnFe2O4 [30], MgFe2O4 [31] e Fe3O4 [32].
Capítulo 2. Ferritas 37
Esses mecanismos de redistribuição de cátions (os cinéticos), entretanto, são comple-
xos e podem ser afetados significativamente pela presença de Fe2+ [33]. Quando uma con-
centração substancial de Fe divalente estava presente num espinélio inverso, a redistribuição
cinética independia da vacância da concentração de cátions, tamanho de grão e estequiome-
tria de O. Ferritas que contêm Fe apenas no estado trivalente, a exemplo de MgFe2O4, que
tem mostrado, em vez disso, uma clara dependência no tamanho do grão e de outros fatores
associados com nucleação e mecanismos de crescimento [34].
No que concerne a ferritas inversas (ou em vários casos em que há mais de um tipo de
cátions ocupando o mesmo conjunto de sítios cristalográficos), fenômenos ordenados podem
ser esperados [35]. Nessas ferritas, a ocupação dos sítios octaédricos por dois tipos de cátions
(divalente e trivalente) pode levar à ordem de longo alcance, na qual sucessivas camadas
(001) de sítios octaédricos são ocupadas alternadamente por cátions divalentes e trivalentes.
Nesse caso, existem duas sub-redes iônicas nos sítios octaédricos [36] (figura 2.4).
Figura 2.4: Ordenamento de longo alcance em espninélios inversos, resultado de uma ocupa-
ção alternada de sítios octaédricos por dois tipos de cátions. Apenas cátions octaédricos são
apresentados.[12][37]
Capítulo 2. Ferritas 38
Há, outrossim, evidências de que quando a razão de dois cátions nos sítios B é
1 : 3, a ordem de longo alcance pode ser estabelecida. Cada linha de cátions octaédricos
nas direções 〈110〉 contém cátions B em forma ordenada (figura2.5). Um exemplo disso é
(Fe)[Li0.5Fe2.5]O4 [38], cuja estrutura é essencialmente cúbica. A transição para a distribui-
ção aleatória de Li+ e Fe3+ nos sítios octaédricos B ocorre entre 1000 e 1028K. Um terceiro
tipo de ordenamento de cátion pode ocorrer quando existe a taxa de cátion 1 : 1 em sítios
tetraédricos, nos quais os cátions alternam-se. Essa superestrutura tem sido observada em
Li0.5Fe0.5[Cr2]O4 [39].
Figura 2.5: Ordenamento de longo alcance em espinélios com razão 1:3 de cátions em sítios
octaédricos. [12][37]
Capı́tulo 3
Procedimento Experimental
"I have finally found a place to live
In the presence of the Lord."
Presence of the Lord - Eric Clapton
A obtenção das amostras de ferrita de manganês foi realizada por meio do método
Pechini, também conhecido como Método dos Precursores Poliméricos, que consiste em um
processo de polimerização através da mistura de nitratos, facilitando a manipulação das
propriedades físicas e estruturais desejadas para o material resultante. Tal processo produz
óxidos mistos cujas estruturas apresentam uma organização tridimensional dos constituintes,
resultando em materiais na forma de pó, o que o torna bastante eficaz devido à possibilidade
do controle do tamanho das partículas, da cristalinidade e da porosidade. Por esse motivo,
os materiais fabricados pelo método possuem alta pureza, homogeneidade e temperaturas de
processamento baixas, quando comparados a outros métodos equivalentes. Tais fatores são
de incontestável relevância, pois influenciam nas propriedades ópticas, magnéticas, catalíticas
e mecânicas do produto resultante.
Inicialmente, o sistema consiste em uma suspensão de partículas coloidais, cujo ta-
manho varia entre 1 e 100nm, dispersas em um solvente. Essas partículas se ligam formando
cadeias ramificadas e tridimensionais chamadas de microgel. Essas regiões crescem até ocu-
parem metade do volume total; nessa situação, a viscosidade aumenta e, assim, o sistema
atinge o ponto de gel e passa a se comportar como um fluido estático. Nesse estágio do
processo, o sistema é formado por uma rede de partículas coloidais ou cadeias poliméricas
e, a partir desse momento, as cadeias estruturais crescem conjuntamente, criando uma rede
contínua por todo o sistema. O gel continua sendo aquecido até chegar à textura de flocos,
39
Capítulo 3. Procedimento Experimental 40
formando o precursor que será utilizado para calcinação [18], [19].
3.1 Material Utilizado
• 1 becker
• 1 balança de precisão
• 1 agitador magnético com variação de temperatura
• 1 pipeta
• Nitrato de Ferro III: Fe(NO3)3 + 9H2O
• Nitrato de Manganês: Mn(NO3)2 + 4H2O
• Ácido Nítrico: H3C6H5O7H2O
• Etileno Glicol: C2H6O2
• Água destilada
O processo de produção da Ferrita de Manganês (MnFe2O4) ocorreu no Laboratório
de Magnetismo e Materiais Magnéticos do DFTE-UFRN, seguindo as etapas discriminadas:
1. Pesagem dos nitratos;
2. Diluição dos nitratos no becker com 300ml de água destilada, já no agitador magnético;
3. Adição de ácido cítrico com a espátula, após a diluição completa dos nitratos;
4. Adição de etileno glicol com a pipeta;
5. Manutenção do medidor de temperatura em 100oC, até obter uma solução uniforme;
6. Aumento da temperatura em 100oC a cada 30 minutos, até obter a temperatura máxima
de 300o do agitador para acelerar o processo de polimerização e exaustão dos nitratos;
7. Espera até que a solução chegue à textura de flocos;
8. Após esfriar, maceração dos flocos.
Capítulo 3. Procedimento Experimental 41
3.2 Tratamento Térmico
O tratamento térmico é efetuado com o intuito de eliminar toda a matéria orgânica restante
na amostra, como também de sabermos em qual temperatura a fase (jacobsita) desejada se
encontra e fazermos o controle do tamanho dos cristalitos.
Antes da calcinação, as amostras são maceradas com vistas a uniformizar o tamanho
dos grãos. Tal maceramento é efetuado em um almofariz de ágata; logo depois, as amostras
são levadas a uma mufla modelo LT0212 e, então, calcinadas à temperatura controlada. As
amostras de Ferrita de Manganês (MnFe2O4) foram calcinadas em 400oC, 500oC, 600oC e
700oC, tanto em atmosfera ambiente quanto em vácuo.
3.3 Difratometria de Raios-X
Com o objetivo de investigar as características estruturais das amostras produzidas, bem
como verificar se a produção das amostras se o tratamento térmico geraram ferritas de man-
ganês, utilizamos uma ferramenta poderosa chamada difração de Raios X (a difratometria
de raios-x, que é a melhor opção para a determinação estrutural de um sólido).
Essa técnica é de fundamental importância para o estudo da matéria condensada,
pois permite a investigação do arranjo ordenado dos sólidos, parâmetros de rede, defeitos
estruturais, simetria cristalina, distância interplanar, etc. Baseia-se no princípio de que os
cristais são formados por átomos ordenados de forma periódica em três dimensões [19], [20].
Quando o comprimento de onda (λ) de uma onda eletromagnética é mensurável com
as dimensões atômicas da rede, pode-se verificar que as relações de fase entre os espalhamentos
tornam-se periódicas e que efeitos de difração dos raios-x podem ser observados em vários
ângulos. Considerando-se dois ou mais planos de uma estrutura cristalina, se a diferença
entre os caminhos ópticos for um número inteiro (n) de comprimento de onda (λ), haverá
uma superposição construtiva (um feixe de raios-x será observado); caso contrário, haverá
superposição destrutiva. Isso pode ser descrito matematicamente segundo a lei de Bragg:
[19], [21]
2d sin θ = λn (3.1)
Em que d é a distância interplanar, θ é o ângulo de incidência do feixe de luz com o
Capítulo 3. Procedimento Experimental 42
plano, n é um numero inteiro e λ é o comprimento de onda. As análises dos nossos materiais
foram realizadas em pós cristalinos sobre porta-amostras de vidro neutro, utilizando-se de
um difratômetro Shimadzu XRD-6000, operando com fonte radioativa com linha de emissão
do cobre CuKa = 1, 5400, obtida por d.d.p de 40KV e corrente de filamento de 30mA.
O detector foi variado de 10o a 80o e velocidade de 3o por minuto. Tais medidas foram
feitas nas dependências do núcleo de pesquisas de petróleo e gás natural (NUPEG-UFRN),
e no laboratório de magnetismo e materiais magnéticos do DFTE-UFRN e no laboratório de
análises magnéticas e óticas da UERN-Mossoró.
3.3.1 Refinamento Rietveld
Essa técnica permite a determinação de parâmetros muito importantes como: posição dos
átomos, tamanho e volume da célula unitária, as impurezas que tal composto químico apre-
senta, a estrutura cristalina, o grupo espacial e os parâmetros de rede. Recebe esse nome em
homenagem a Hugo Rietveld(1932-)1, que iniciou o trabalho com difração de nêutrons. Pos-
teriormente, a técnica foi adaptada para difratometria de raios-x por Wiles e Young. Consiste
no uso da modelagem dos picos experimentais que apresentam uma ou mais fases. Tal ajuste
é feito a partir da técnica de mínimos quadrados e do background do difratograma; o pa-
drão obtido é ajustado a uma função y(cal), que depende das variáveis do modelo estrutural
adotado. As intensidades correspondentes às reflexões são obtidas por meio da equação:
yi(cal) = s
∑
k
Lk|Fk|2σ(2θi − 2θk)PkA+ yb (3.2)
em que s é o fator de escala de fase, k são os índices de Miller para uma reflexão
de Bragg determinada, Lk são os fatores de Lorentz de polarização e multiplicidade, σ é a
função perfil da reflexão, Pk é a função correspondente às orientações preferenciais, A é o
fator de absorção, yb é a intensidade do background e Fk é o fator da estrutura para k-ésima
reflexão, dado pela equação:
Fk =
∑
j
Njfj exp
{
2π(hxj + kyj + lzj) exp
(
−Bj sin θ
λ2
)}
(3.3)
1O programa utilizado foi MAUD 2.33
Capítulo 3. Procedimento Experimental 43
3.4 Magnetometria de Amostra Vibrante
Essa medida é feita utilizando um Magnetômetro de Amostra Vibrante (instrumento é base-
ado na Lei de Faraday, isto é, uma força eletromotriz (FEM) será gerada pela variação do
fluxo dentro das bobinas).
Sabemos que o fluxomagnético ∆Φ através de um elemento de superfície ∆A é o
produto escalar da densidade de fluxo magnético pelo elemento de área
∆Φ = B ·∆A (3.4)
Da lei de Faraday para um condutor fechado, temos que
E = −ndΦ
dt
(3.5)
em que n é o número de voltas da bobina. Combinando as equações (3.4) e (3.5), temos:
Fem = −nA
dB
dt
(3.6)
Uma vez que a bobina esteja submetida a um campo magnético constante, temos B = µ0H.
Uma amostra dentro da bobina tem magnetização M , obtendo, assim B = µ0(H +M). E a
variação do fluxo correspondente será
∆Φ = µ0M (3.7)
Combinando as equações (3.6) e (3.7), temos
Femdt = −nAµ0M (3.8)
Com isso, observa-se que o sinal de saída da bobina é proporcional à magnetização e inde-
pendente do campo magnético que a gerou.
No magnetômetro, a amostra é submetida a ummovimento senoidal AC de frequência
ν, pelo oscilador. Esse sinal é convertido pelo driver em um movimento senoidal vertical.
Portanto, a substância é submetida a um campo magnético uniforme H0, como na figura 3.1.
As bobinas captam o sinal AC da amostra com frequência ν, que, por sua vez, é
Capítulo 3. Procedimento Experimental 44
Figura 3.1: Esquema de um Magnetômetro de Amostra Vibrante,[23]
proporcional ao momento da amostra. Esse sinal é proporcional à amplitude de vibração e à
frequência. Devido a isso, está sujeito a ruídos, que consistem em variações na amplitude de
vibração e na frequência, provocados por falha no sistema.
Para sanar essas imperfeições, utiliza-se um capacitor de vibração que produz um
sinal de mesmo momento, amplitude de vibração e frequência semelhantes ao sinal da bo-
bina de captação. Quando processado de maneira adequada, esse sinal inibe os ruídos do
sistema, obtendo apenas a leitura referente ao momento da amostra. Essas medidas foram
feitas no laboratório de magnetismo e materiais magnéticos (LMMM) do DFTE-UFRN e no
laboratório de análises magnéticas e óticas da UERN-Mossoró.
Capítulo 3. Procedimento Experimental 45
3.5 Espectroscopia Mössbauer
O efeito Mössbauer foi descoberto após estudos de absorção nuclear ressonante. Esse fenô-
meno ocorre quando núcleos excitados, com energia Ee, podem liberar o excesso de energia
ao decair para o estado fundamental, de energia Ef , emitindo assim radiação gama, (γ), com
energia E(γ) = Ee −Ef . Se a radiação gama emitida atinge outro núcleo idêntico (igual no
número de prótons e nêutrons), no estado fundamental, pode ser absorvida ressonantemente
passando ao estado excitado (figura 3.2).
Figura 3.2: Absorção ressonante por um núcleo atômico. (Adaptado de [19])
Para núcleos fixos, esse decaimento deve envolver todos os valores possíveis de energia
no intervalo de Ef = Γ2 , no qual Γ é a largura da linha espectral. Chamando de I(E) a
probabilidade de que o decaimento ou, mesmo, a excitação do núcleo ocorra com energia E,
a linha espectral apresenta a forma de uma lorentziana (figura 3.3).
I(E) representa a função da energia de transição; Γ, a incerteza na energia do estado
exitado. A existência desse intervalo para possíveis energias para emissão em um decaimento
é baseada no princípio da incerteza de Heisenberg. Um outro fator importante na absorção
nuclear é o possível recuo dos núcleos envolvidos(figura 3.4).
Dessa forma, um átomo livre, ao emitir ou absorver um fóton, recua por uma unidade
ER. Emissor e absorvedor sofrem recuo. Essas linhas são separadas por um fator de 2ER.
Portanto, a ressonância ocorre quando Γ ≥ 2E, sendo pouco provável a ressonância para a
maioria dos elementos, a exemplo de 57Fe. Para observar a absorção nuclear, é necessário
Capítulo 3. Procedimento Experimental 46
Figura 3.3: Gráfico da emissão γ de um núcleo.(Adaptado de [19])
Figura 3.4: Recuo de um núcleo após emissão γ. (Adaptado de [19])
uma área de superposição de espectros. A descoberta da ressonância nuclear por Rudolf
Mössbauer lhe proporcionou o prêmio Nobel de Física em 1961. Mössbauer fez medições
relativas à absorção ressonante e ao espalhamento da radição emitida na transição do estado
excitado de 129 KeV do 191Ir, por meio de um cristal natural do elemento [19].
Com experimento em baixas temperaturas, esperava-se que, com um efeito Doppler
menos intenso devido à diminuição da agitação térmica, a largura das linhas diminuíssem,
acarretando menor superposição entre as linhas de absorção e emissão e, por conseguinte,
menor absorção de fótons. Todavia, Mössbauer notou o comportamento contrário; o aumento
na absorção ressonante em baixas temperaturas. Esse fenômeno é conhecido atualmente como
absorção sem recuo.
Mössbauer considerou o cristal como um conjunto de oscilações que emitem e absor-
vem energias de forma quantizada. Se a energia de recuo da emissão ou absorção de radiação
Capítulo 3. Procedimento Experimental 47
não coincide com nenhuma das possíveis transições entre os níveis vibracionais do cristal,
ela é absorvida pelo cristal como um todo. Mössbauer buscou a máxima superposição das
linhas de absorção e emissão. Essa superposição é obtida imprimindo-se à fonte radioativa
uma velocidade relativa ao absorvedor, o que leva a uma modulação da energia do raio γ por
meio do efeito Doppler.
A figura 3.5 apresenta um arranjo experimental simplificado da espectroscopia möss-
bauer. A fonte radioativa é fixada na ponta de um eixo ligado a um transdutor de velocidade,
que por sua vez executa um movimento oscilatório longitudinal, com a velocidade ajustada.
Uma amostra é alocada no caminho da radiação colimada e, atrás dessa amostra, o detector
dos fótons emitidos.
Figura 3.5: Esquema simplificado da Espectroscopia Mössbauer (Adaptado de [19]).
Variando a velocidade instantânea da fonte, haverá uma superposição das curvas
de absorção e emissão. Nesse momento, a ressonância será máxima e, conseqüentemente, a
transmissão mínima, criando os chamados vales de ressonância.
A espectroscopia Mössbauer apresenta algumas características e propriedades inte-
ressantes, a saber:
• alta sensibilidade, possibilitando executar medidas em intervalos pequenos de energia;
• não destrutividade do sistema em estudo;
A espectroscopia mössbauer nos fornece informações sobre os estados de oxidação,
as propriedades do ambiente local dos isótopos, e a influência da eletronegatividade de ou-
Capítulo 3. Procedimento Experimental 48
tros tipos de átomos coordenados com o ferro podem ser extraídos a partir dos seguintes
parâmetros hiperfinos.
1) deslocamento isomérico δ
Relacionado com o estado de oxidação ou a valência dos átomos que compõem a
amostra. Sua magnitude depende da densidade total de elétrons no núcleo do 57Fe, inversa-
mente proporcional ao δ.
2) desdobramento quadrupolar ∆Q
Parâmetro referente ao potencial eletrostático dos átomos. É a medida da sime-
tria cúbica ou esférica, das cargas externas ao núcleo, resultante da interação do momento
quadrangular nuclear com o gradiente do campo elétrico na região do núcleo.
3) campo hiperfino Hhf
Reporta-se nos momentos magnéticos dos átomos envolvidos na ressonância. Envolve
especificamente a interação entre o momento magnético nuclear e o campo magnético no
núcleo.
Entretanto, os espectros de amostras que contém ferro em sua composição podem
apresentar na presença das interações hiperfinas algumas características peculiares, a saber:
uma única linha de ressonância, denominada (singleto), duas linhas (dupleto) e seis linhas
(sexteto); em casos raros, podem-se ainda encontrar oito linhas (octeto).
Sabe-se que materiais que apresentam o singleto como assinatura dos seus espectros,
são compostos com o desdobramento quadrupolar e campo hiperfino nulos e não apresentam
quebra de degenerescência em seus níveis nucleares. Já os que apresentam um dupleto como
assinatura, possuem campo hiperfino nulo, mas o seu desdobramento quadrupolar é diferente
de zero.
No caso de aparecimento de um sexteto como assinatura da amostra tem-se que seu
campo hiperfino é diferente de zero, mas o desdobramento quadrupolar é reduzido. Assim,
os níveis hiperfinos se desdobram em seis transições permitidas

Continue navegando