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Curso: Relatividade 01/2018 Aula 1: 14 de maio Profa. Raissa F. P. Mendes 1.1 Geometria no exterior de uma estrela esférica 1.1.1 Forma geral da métrica A aplicação mais óbvia de uma teoria de gravitação é a um campo gravitacional estático e es- fericamente simétrico—como o campo criado, em boa aproximação, pela Terra ou pelo Sol, em resposta ao qual outros astros se movem. Para começar, vamos considerar a geometria externa a esses objetos. Fora da estrela, Tµν = 0 e as equações de Einstein se reduzem a Rµν = 0, e essas equações podem ser resolvidas para a métrica. Em geral, a métrica tem 10 componentes independentes, mas 4 delas podem ser fixadas (em particular, zeradas) pela escolha do sistema de coordenadas. Veremos que os requerimentos de estaticidade e simetria esférica reduzem o número de componentes em mais 4, de forma que, num espaço-tempo com essas simetrias, a métrica pode ser determinada por apenas duas funções. Simetria esférica: Em coordenadas esféricas, o elemento de linha de Minkowski é dado por ds2 = −dt2 + dr2 + r2(dθ2 + sin2 θdφ2). Cada superf́ıcie com t e r constantes é uma 2-esfera. Distâncias nessa 2-esfera são obtidas a partir do elemento de linha dl2 = r2(dθ2 + sin2 θdφ2) := r2dΩ2 onde dΩ é o elemento de ângulo sólido. Um espaço-tempo esfericamente simétrico é aquele que tem todas as simetrias de uma esfera, sendo invariante por rotações arbitrárias. Nele, todo ponto está numa superf́ıcie que tem a métrica de uma 2-esfera, ou seja, cujo elemento de linha é proporcional a dΩ2. Ou seja, se θ e φ são coordenadas sobre a esfera e a e b são coordenadas que rotulam o conjunto de todas as esferas, então devemos ter: ds2(a0, b0, θ, φ) = f(a0, b0)dΩ 2. A função f precisa ser independente de θ e φ, caso contrário a superf́ıcie seria irregular (e não esférica). Além disso, a métrica, restrita a valores fixos de θ0 e φ0, assume a forma: ds2(a, b, θ0, φ0) = dτ 2(a, b). 1-1 Aula 1: 14 de maio 1-2 Novamente, uma dependência em θ e φ destruiria a simetria esférica, já que a geometria transversal às esferas dependeria de onde você está na esfera. O próximo passo é ajustar as coordenadas de forma que ~ea e ~eb sejam ortogonais a ~eθ e ~eφ 1. Isso significa que alguns termos cruzados serão nulos: gaθ = gbθ = gaφ = gbφ = 0. Ficamos com: ds2 = gaa(a, b)da 2 + 2gabdadb+ gbbdb 2 + r2(a, b)dΩ2. Aqui, r(a, b) é uma função de a e b (cujo significado f́ısico ficará claro depois), mas nada nos impede de mudar as coordenadas de (a, b) para (a, r) (ou (b, r)). Ficamos com ds2 = gtt(t, r)dt 2 + 2gtr(t, r)dtdr + grr(t, r)dr 2 + r2dΩ2. Qual é o significado da coordenada r? Se fixamos t e r em valores constantes, a superf́ıcie resultante é uma esfera com circunferência 2πr e área 4πr2 2. Note, porém, que r não está relacionado, a prinćıpio, com a distância medida por algum observador da esfera até o “centro”. O centro não faz parte da esfera e a exigência de simetria esférica nem requer que o espaço-tempo tenha um centro, como mostra o gráfico abaixo. Figura 1.1: “Buraco de minhoca”: exemplo de espaço com simetria esférica mas sem um “centro”. De fato, a distância própria entre um raio r1 e outro r2 é l12 = ∫ r2 r1 √ grrdr. Estaticidade: Um espaço-tempo estático é aquele em que é posśıvel encontrar uma coordenada temporal t tal que (i) as componentes da métrica não dependam de t (condição para que seja estacionário); (ii) a geometria seja invariante por reflexão temporal: t→ −t. Sob a transformação de coordenadas (t, r, θ, φ) → (−t, r, θ, φ), apenas a componente gtr da métrica muda, trocando de sinal. Logo, temos que: O elemento de linha de um espaço-tempo esfericamente simétrico e estático pode ser escrito como: ds2 = −e2Φ(r)dt2 + e2Λ(r)dr2 + r2dΩ2. (1.1) 1Essa é uma restrição sobre as coordenadas permitida pela simetria esférica. Consiste em alinhar as coordenadas θ e φ de esferas próximas de modo que se nos afastamos de uma esfera perpendicularmente à sua superf́ıcie, interceptamos a esfera seguinte nos mesmos valores de θ e φ. Ver pgs. 199 e 200 do Sean Carroll. 2A coordenada r é muitas vezes chamada de “coordenada de área” Aula 1: 14 de maio 1-3 Note que a forma como escrevemos a métrica assume que gtt < 0 e grr > 0 em todo lugar. Isso vale para estrelas, mas não para buracos negros. Nesse último caso, precisaremos repensar a nossa escolha de coordenadas! 1.1.2 Resolvendo as equações de Einstein O tensor de Einstein para a métrica (1.1) tem componentes Gtt = 1 r2 e2Φ d dr [r(1− e−2Λ)], Grr = − 1 r2 e2Λ(1− e−2Λ) + 2 r Φ′, Gθθ = sin −2 θGφφ = r 2e−2Λ[Φ′′ + (Φ′)2 + Φ′/r − Φ′Λ′ − Λ′/r]. As demais componentes são nulas. Nossa tarefa é resolver as equações Gµν = 0 para as funções métricas Φ e Λ. Definindo uma nova função m(r) como m(r) = 1 2 r(1− e−2Λ) → e2Λ = (1− 2M/r)−1, obtemos, de Gtt = 0, que m(r) = M = cte. Da equação Grr = 0, obtemos: dΦ dr = M r[r − 2M ] , que tem solução Φ = (1/2) ln(1− 2M/r). Portanto, nosso elemento de linha fica: Elemento de linha de Schwarzschild: ds2 = −(1− 2M/r)dt2 + (1− 2M/r)−1dr2 + r2dΩ2 (1.2) Chegamos a uma métrica important́ıssima, conhecida como métrica de Schwarzschild ! Einstein imaginava que as equações da RG eram tão complicadas que seria dif́ıcil ou imposśıvel encontrar soluções exatas, mesmo no vácuo, e que deveŕıamos nos contentar com soluções aproximadas. Mas algumas semanas depois do seu trabalho de 25 de novembro de 1915, Karl Schwarzschild, um f́ısico alemão que estava servindo no exército alemão na fronte russa da primeira guerra mundial, encontrou essa solução de vácuo (apresentada em 13 de janeiro de 1916) e, quatro meses depois, uma solução na presença de matéria. (No entanto, em junho de 1916, Schwarzschild faleceu devido a uma doença contráıda no fronte russo.) Algumas observações: • Limite assintótico: Para r grande, a Eq. (1.3) se torna: ds2 ≈ −(1− 2GM/rc2)dt2 + (1 + 2GM/rc2)dr2 + r2dΩ2 (1.3) Aula 1: 14 de maio 1-4 Como vimos anteriormente, o potencial Newtoniano é tal que g00 = −1 + h00 = −1 − 2φ/c2 e lemos φ = −GM/r, o potencial Newtoniano devido a uma massa M . Isso justifica o nome que escolhemos para a constante de integração. Essa massa M é a massa que determina as órbitas de corpos distantes. Como veremos adiante, ela não é a massa de repouso da estrela (obtida somando as massas de repouso de todas as part́ıculas que a compõem), mas contém uma componente de energia de ligação gravitacional. • Raio de Schwarzschild: Note que algo estranho acontece com a métrica (1.3) em r = 0 e r = 2M (ou r = 2GM/c2, recuperando G e c). O último é chamado raio de Schwarzschild, e define a escala de curvatura nessa geometria (note, por exemplo, que RµνρσRµνρσ = 48G 2M2/r6). Mas a superf́ıcie de uma estrela é sempre muito maior que esse raio. Por exemplo, o raio de Schwarzschild para o Sol é 2.95 km, muito menor que o raio do Sol, de cerca de 7 × 105km. Na superf́ıcie, a geometria de Schwarzschild se junta com uma solução diferente dentro da estrela, que vamos discutir adiante. Portanto, não vamos nos preocupar com esses pontos “singulares” por enquanto! No que segue, vamos explorar essa geometria estudando as órbitas de part́ıculas teste e raios de luz. Tomando o limite de campo fraco nos nossos resultados, chegaremos a algumas previsões importantes da Relatividade Geral, propostas por Einstein para testar a teoria. 1.1.3 Redshift gravitacional Como um primeiro exemplo, vamos considerar o efeito de redshift gravitacional, que já discutimos antes no contexto do prinćıpio da equivalência. Aqui, vamos mostrar como ele surge numa solução exata das equações de Einstein. Figura 1.2: Um observador em r = 4M emite um raio de luz ao longo da direção radial, que é observado por um observador em r = 10M . Note que a propagação da luz não é retiĺınea nessas coordenadas, e que os versores de base têm comprimentosdiferentes nos dois pontos! Aula 1: 14 de maio 1-5 Considere um observador estacionário numa certa coordenada r1, que emite um raio de luz. Quando emitida, a luz tem uma frequência ω1 e energia E1 = ~ω1 com relação a esse observador. A luz se propaga para o infinito e é detectada por um observador estacionário numa certa coordenada r2 > r1. Qual é frequência da radiação observada por ele? A situação é ilustrada na figura 1.2. Vamos usar o fato de que, sendo o espaço-tempo estacionário, a componente p0 do quadri-momento da radiação é conservada ao longo da geodésica descrita pelo raio de luz. Como a frequência ω1 se relaciona com p0? Temos que E1 = −gµνpµuν1 . A quadri-velocidade do emissor deve ser proporcional a (1, 0, 0, 0), já que ele é estacionário. A constante de proporcionalidade é obtida exigindo que a quadrivelocidade seja normalizada: gµνu µuν = −1. Com isso, obtemos: uµ1 = (1 − 2M/r1)−1/2(1, 0, 0, 0) e E1 = −p0(1 − 2M/r1)−1/2. Por outro lado, a energia medida pelo observador em r2 é E2 = −p0(1− 2M/r2)−1/2. Temos: ω2 ω1 = E2 E1 = √ 1− 2M/r1 1− 2M/r2 r2→∞→ √ 1− 2M/r1. (1.4) A energia (e a frequência) da radiação diminui a medida que ela se propaga, dizemos que há um desvio para o vermelho na frequência da radiação. Quando GM/Rc2 � 1, podemos expandir a expressão acima e chegamos ao resultado que hav́ıamos deduzido no contexto Newtoniano. O que parece acontecer no limite r → 2M?! Geometria no exterior de uma estrela esférica Forma geral da métrica Resolvendo as equações de Einstein Redshift gravitacional Geodésicas tipo-tempo no espaço-tempo de Schwarzschild A forma das órbitas e a precessão do periélio de Mercúrio
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