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1 GESTÃO DA PRODUÇÃO SUMÁRIO GESTÃO DA PRODUÇÃO SUMÁRIO2 GESTÃO DA PRODUÇÃO LISTA DE FIGURAS > FIGURA 1 - Linha de produção de uma indústria automotiva 10 > FIGURA 2 - Estudo de P&D na indústria automotiva 12 > FIGURA 3 - Modelo input-output para o exemplo do RH 18 > FIGURA 4 - Operação de atendimento on-line 26 > FIGURA 5 - Frutos do mar congelados 27 > FIGURA 6 - Inspeção de qualidade 28 > FIGURA 7 - Análise de custos 30 > FIGURA 8 - Relações entre plano estratégico de produção e PMP 39 > FIGURA 9 - Diferenças entre sistemas de produção 52 > FIGURA 10 - Operário realizando setup em uma máquina CNC 58 > FIGURA 11 - Diagrama de Ishikawa 66 > FIGURA 12 - Limpeza e organização do local de trabalho 67 > FIGURA 14 - Qualidade em função da expectativa e percepção dos clientes 79 > FIGURA 15 - Modelo de lacunas para diagnóstico de problemas de qualidade 80 > FIGURA 16 - Exemplo de diagrama de processo 82 > FIGURA 17 - Resultado da análise de Pareto para erros de fornecedores 84 > FIGURA 18 - Resultado da análise de Pareto 85 > FIGURA 20 - Abordagens para as questões ambientais 95 > FIGURA 22 - Fluxograma de Produção mais limpa 100 3 GESTÃO DA PRODUÇÃO SUMÁRIO LISTA DE QUADROS > QUADRO 1 - Diferentes atividades para as funções centrais das empresas 13 > QUADRO 2 - Critérios de desempenho e subobjetivos 30 > QUADRO 3 - Exemplo de planejamento agregado 41 > QUADRO 4 - Evolução da qualidade 75 > QUADRO 5 - Modelo de gestão da qualidade no processo produtivo 77 > QUADRO 6 - Análise de Pareto para erros de fornecedores 83 > QUADRO 7 - Análise de Pareto 85 SUMÁRIO4 GESTÃO DA PRODUÇÃO SUMÁRIO UNIDADE 1 UNIDADE 2 UNIDADE 3 1 GESTÃO DA PRODUÇÃO E OPERAÇÕES 9 1.1 A FUNÇÃO PRODUÇÃO 9 1.1.1 A PRODUÇÃO NAS EMPRESAS 11 1.2 A GESTÃO DE OPERAÇÕES E OS PROCESSOS NAS EMPRESAS 14 1.2.1 O PROCESSO DE TRANSFORMAÇÃO (OU MODELO INPUT-OUTPUT) 16 CONCLUSÃO 19 2 ESTRATÉGIA DE OPERAÇÕES 21 2.1 DEFININDO A ESTRATÉGIA DE PRODUÇÃO 21 2.1.1 GESTÃO DE OPERAÇÕES VS. ESTRATÉGIA DE OPERAÇÕES 23 2.1.2 RELAÇÕES ENTRE A ESTRATÉGIA DE OPERAÇÕES E A ESTRATÉGIA GLO- BAL DA EMPRESA 25 2.2 OBJETIVOS DE DESEMPENHO 28 CONCLUSÃO 31 3 PLANEJAMENTO INTEGRADO DA PRODUÇÃO 33 3.1 O PLANEJAMENTO DA PRODUÇÃO 33 3.1.1 PLANEJAMENTO, CONTROLE E FUNÇÕES DO PCP 34 3.1.2 INTERFACES COM A FUNÇÃO PCP 36 3.2 PLANEJAMENTO INTEGRADO DA PRODUÇÃO 37 3.2.1 CONCEITO DE PMP 38 3.2.2 PLANEJAMENTO DE VENDAS E OPERAÇÕES 41 3.2.3 MATERIAL REQUIREMENT PLANNING (MRP) E MANUFACTURING RE- SOURCES PLANNING (MRP II) 42 CONCLUSÃO 44 5 GESTÃO DA PRODUÇÃO SUMÁRIO SUMÁRIO UNIDADE 4 UNIDADE 5 4 SISTEMAS JUST IN TIME 46 4.1 DEFINIÇÃO DE JUST IN TIME (JIT) 46 4.1.1 O JIT E O STP 47 4.1.2 AS RAÍZES DO JIT E DO STP 49 4.2 DIFERENÇAS ENTRE OS SISTEMAS TRADICIONAIS DE PRODUÇÃO (EM- PURRADOS) E O JIT (PUXADO) 51 4.3 CARACTERÍSTICAS DA MANUFATURA JUST IN TIME 56 4.3.1 LOTES PEQUENOS 56 4.3.2 SETUPS RÁPIDOS 57 4.3.3 PRODUÇÃO NIVELADA 59 4.3.4 NOVO PAPEL DO TRABALHADOR 60 4.3.5 QUALIDADE NA FONTE 61 4.3.6 TECNOLOGIA DE GRUPO 62 4.3.7 MANUTENÇÃO PREVENTIVA 63 4.3.8 PARCERIAS COM FORNECEDORES 64 4.3.9 MELHORIA CONTÍNUA (KAIZEN) 64 4.3.10 RESPEITO PELAS PESSOAS 65 4.3.11 PARADAS DE PRODUÇÃO 65 4.3.12 PADRONIZAÇÃO E SIMPLIFICAÇÃO 67 4.3.13 AMBIENTE DE TRABALHO 67 CONCLUSÃO 68 5 GESTÃO DA QUALIDADE 70 5.1 DEFININDO A QUALIDADE 70 5.1.1 EVOLUÇÃO HISTÓRICA DA QUALIDADE 71 5.1.2 GESTÃO DA QUALIDADE NO PROCESSO PRODUTIVO 76 5.1.2.1 DIAGNÓSTICO DOS PROBLEMAS DE QUALIDADE 78 CONCLUSÃO 87 SUMÁRIO6 GESTÃO DA PRODUÇÃO ICONOGRAFIA 6 PRODUÇÃO MAIS LIMPA 89 6.1 OS SISTEMAS PRODUTIVOS E A UTILIZAÇÃO DE RECURSOS NATURAIS 89 6.1.1 SUSTENTABILIDADE 91 6.2 PRODUÇÃO MAIS LIMPA 94 6.2.1 AS BASES PARA A SUA ORIGEM 94 6.2.2 DEFINIÇÃO 96 6.2.3 A DINÂMICA DA PRODUÇÃO MAIS LIMPA E SEUS BENEFÍCIOS 97 CONCLUSÃO 104 REFERÊNCIAS 105 SUMÁRIO UNIDADE 6 7 GESTÃO DA PRODUÇÃO SUMÁRIO ICONOGRAFIA ATENÇÃO PARA SABER SAIBA MAIS ONDE PESQUISAR DICAS LEITURA COMPLEMENTAR GLOSSÁRIO ATIVIDADES DE APRENDIZAGEM CURIOSIDADES QUESTÕES ÁUDIOSMÍDIAS INTEGRADAS ANOTAÇÕES EXEMPLOS CITAÇÕES DOWNLOADS SUMÁRIO8 GESTÃO DA PRODUÇÃO OBJETIVO Ao final desta unidade, esperamos que possa: > Descrever o sistema input-processamento-output. > Distinguir a função produção das demais funções da empresa. > Demonstrar um sistema produtivo com base em suas entradas e saídas. UNIDADE 1 9 GESTÃO DA PRODUÇÃO SUMÁRIO 1 GESTÃO DA PRODUÇÃO E OPERAÇÕES A gestão da produção, também chamada de administração da produção ou gestão de operações e serviços, é um tema comumente abordado em cursos de gestão, com especial ênfase nos cursos de administração e engenharia de produção. A área empenha-se em estudar diferentes formas e configurações pelas quais as empresas produzem seus produtos de valor agregado. Por produtos, entenda-se tanto de bens físicos (como um refrigerador, uma TV ou um smartphone) quanto de serviços (como a venda de um curso de inglês, uma experiência gastronômica ou uma hospedagem em uma pousada no Nordeste). Assim, nesta primeira unidade, serão apresentadas algumas das principais caracterís- ticas da função ou sistema de produção. Entre essas características, será dado desta- que ao modelo conceitual que norteia a gestão da produção (o processo de transfor- mação, também chamado modelo input-output), bem como aos elementos que o compõem. 1.1 A FUNÇÃO PRODUÇÃO Quando se pensa no termo “produção”, vem à cabeça a imagem de uma instalação fabril, com uma luz indireta, cheia de máquinas e muitas vezes suja e barulhenta. Costuma-se associar a ideia de produção às fábricas e ao trabalho pesado de homens e máquinas. Pois bem, aqui será atualizada essa linha de raciocínio. Para fins desta disciplina, a produção será tratada como uma área ou função dentro de uma empresa. A área de produção ou de operações (também pode ser chamada de manufatura em alguns casos) é a parte da empresa responsável não só pela efetiva manufatura (daí o termo) de um item, mas também pela sua gestão e de uma série de atividades no seu entorno. É por este cenário que se interessa esta disciplina: a gestão da produção. SUMÁRIO10 GESTÃO DA PRODUÇÃO FIGURA 1 - LINHA DE PRODUÇÃO DE UMA INDÚSTRIA AUTOMOTIVA Fonte: SHUTTERSTOCK, 2019. A produção pode ser entendida como o conjunto de atividades necessá- rias para a transformação de matérias-primas e insumos em outros itens de maior valor agregado. No entorno da função produção, encontram-se uma série de outras atividades que atuam como suporte aos seus objetivos. Algumas dessas atividades são a gestão da manutenção, o controle da qualidade e a logística de suprimentos. Conforme comentado, é possível encontrar a utilização dos termos “produção” e “operações” em discursões sobre o tema. Cabe aqui uma pequena distinção. De acor- do com Corrêa e Corrêa (2017) e Slack et al. (2018), o termo “produção” está mais próximo às atividades industriais, enquanto o termo “operações” refere-se comumen- te às atividades realizadas pelos prestadores de serviços, como bancos, agências de viagens, restaurantes, faculdades, etc. 11 GESTÃO DA PRODUÇÃO SUMÁRIO É preciso destacar que a função produção exerce um papel muito importante nas empresas, sejam de manufaturas (como uma montadora de automóveis), sejam de serviços (como um banco). Apesar da proximidade dos termos “operações” e “opera- cional”, essa importância não está limitada ao chão de fábrica ou ao balcão de aten- dimento de uma casa lotérica. O papel que a função produção exerce nas empresas está ligado a todos os três níveis hierárquicos, a saber: estratégico, tácito e operacio- nal. Esta disciplina objetiva abordar em certa medida cada um desses níveis por meio de diferentes tópicos. A próxima unidade dará destaque ao papel estratégico da função produção nas organizações. Para tanto, será apresentada uma discussão sobre as estratégias da área de produção e os principaiscritérios utilizados para a sua confi- guração. Contudo, no presente momento é preciso conhecer um pouco melhor as bases dessa relação. Para isso, cabe o questionamento: como efetivamente a estratégia de uma empresa se correlaciona com a sua função produção? Pense, por exemplo, no objeti- vo principal de uma empresa: produzir bens e serviços de valor agregado, de modo a gerar lucros para os seus stakeholders, em particular, seus acionistas. Stakeholder é um termo em inglês para identificar o público estratégico ou grupo de pessoas interessadas em uma empresa, negócio ou indústria. Os principais stakehol- ders considerados no campo da gestão são os acionistas, clientes, fornecedores, governo, sociedade, fornecedores e concorrentes. Dessa forma, as empresas devem configurar seus processos e recursos produtivos de acordo com as características dos produtos e do mercado consumidor, levando em consideração também aspectos socioeconômicos e avanços tecnológicos. Logo, é prio- ritário que as empresas dominem as possíveis combinações de recursos e processos para uma configuração adequada dos processos produtivos e, com isso, o atendimento às demandas do mercado. E é exatamente a função produção que tem a responsabi- lidade de organizar tais recursos produtivos, de modo a garantir a transformação dos recursos em produtos ou serviços de qualidade e valor agregado para as empresas. 1.1.1 A PRODUÇÃO NAS EMPRESAS Slack et al. (2018) e Tubino (2017) destacam que, apesar da sua importância e rele- vância para os resultados das empresas, a função produção não é a única a atuar dentro das organizações. Na verdade, a função produção, juntamente com outras SUMÁRIO12 GESTÃO DA PRODUÇÃO duas funções, compõem o conjunto de funções centrais da organização. São elas: • A função marketing (que inclui vendas): responsável pela comunicação com seus consumidores. • A função desenvolvimento de produto/serviço: também chamada de Pesqui- sa e Desenvolvimento (ou P&D), responsável pela criação ou adaptação dos novos produtos ou serviços. FIGURA 2 - ESTUDO DE P&D NA INDÚSTRIA AUTOMOTIVA Fonte: SHUTTERSTOCK, 2019. • A função produção: responsável por gerar a satisfação às solicitações dos consumidores, por meio da produção e entrega dos produtos e serviços. É possível identificar com certa facilidade a inter-relação entre as três funções princi- pais de uma organização. É preciso ressaltar que nenhuma dessas atividades atuará isoladamente na empresa, da mesma forma em que será a única responsável pelo desempenho da organização. Cada vez mais, as empresas precisam se comunicar de forma eficiente com seus consumidores, entendendo suas principais demandas. Contudo, essas demandas estão em constante mudança. Assim, é preciso criar produ- tos e/ou adaptar aqueles já existentes. Finalmente, não adiantará a empresa entender as demandas e criar produtos sem a efetiva produção destes e posterior entrega aos clientes. 13 GESTÃO DA PRODUÇÃO SUMÁRIO Slack et al. (2018) apresentam a inter-relação das três funções principais da empresa considerando quatro diferentes sistemas produtivos, a saber: provedor de serviços de Internet, cadeia de fast-food, caridade e fabricante de móveis. Perceba como as atividades de cada função diferenciam-se para cada um dos sistemas. Enquanto nos serviços de caridade a produção está orientada à prestação de serviços aos beneficiários (como a organização de um passeio no jardim zoológico), na fábrica de móveis a atividade está orien- tada à confecção de componentes e posterior montagem dos móveis. No primeiro cenário, há, por exemplo, um grande componente de imprevisibi- lidade. Não se sabe como as crianças vão se comportar no parque, o clima pode não estar bom e começar a chover, etc. Já na fabricação de móveis, há roteiros a seguir para a confecção das peças, tem uma capacidade limitada de peças a serem produzidas por hora, além de nenhuma interação com o consumidor final do produto. QUADRO 1 - DIFERENTES ATIVIDADES PARA AS FUNÇÕES CENTRAIS DAS EMPRESAS ATIVIDADES FUNCIONAIS CENTRAIS PROVEDOR DE SERVIÇOS DE INTERNET CADEIA DE FAST-FOOD CARIDADE FABRICANTE DE MÓVEIS Marketing e vendas Promover serviços a usuários e obter assinaturas. Vender espaço de propaganda. Fazer propaganda em televisão. Inventar material promocional. Desenvolver contratos de fundos. Enviar mala direta com pedidos de doação. Fazer propaganda em revistas. Determinar a polí- tica de preços. Vender para lojas. Desenvolvimen- to de produto ou serviço Criar novos serviços e comissionar novo conteúdo de infor- mação. Inventar hambúr- gueres, pizzas etc. Projetar a deco- ração dos restau- rantes. Desenvol- ver novas campanhas de apelo. Proje- tar novos programas de assistên- cia. Projetar novos móveis. Harmo- nizar as cores da moda. SUMÁRIO14 GESTÃO DA PRODUÇÃO Produção Manter equipamen- tos, programas e informação. Implantar novos links e serviços. Fazer hambúrgue- res, pizzas etc. Servir os clientes. Fazer a limpeza. Manter equipa- mento. Prover servi- ços para os benefi- ciários da caridade. Fazer peças. Montar os móveis. Fonte: Slack et al., 2018. Os autores ainda destacam o papel de outras duas funções de apoio que objetivam dar suporte às atividades da função produção. São elas: • A função contábil-financeira: administra os recursos financeiros e fornece infor- mações que auxiliam nos processos decisórios econômicos da organização. • A função recursos humanos: cuida não só do bem-estar dos funcionários, mas também conduz as contratações e realiza treinamentos para a capacitação dos profissionais 1.2 A GESTÃO DE OPERAÇÕES E OS PROCESSOS NAS EMPRESAS Slack et al. (2018) associam à gestão de operações o projeto, direção e controle dos processos que transformam insumos em serviços ou produtos, tanto para clientes internos quanto para os externos. Logo, o autor atribui à gestão da produção o geren- ciamento dos processos de transformação que ocorrem dentro dos vários departa- mentos de uma empresa, uma vez que esses setores executam uma série de proces- sos específicos. 15 GESTÃO DA PRODUÇÃO SUMÁRIO Aqui se está tratando da abordagem da gestão de operações, e não especifi- camente da função produção de uma empresa. A abordagem é uma forma de enxergar o gerenciamento dos diversos componentes de um sistema, de modo a se obter um produto final que venha a atender um cliente interno ou externo. O foco aqui está na gestão dos processos que levarão à produção de um produto ou serviço. Esse produto ou serviço pode estar localizado em um outro setor completa- mente diferente da produção; contudo, faz uso da mesma lógica (ou modelo) para realizar a gestão dos seus processos. Um setor de recursos humanos de uma empresa química possui uma série de processos internos para entregar os seus produtos aos seus clientes internos, a saber: os demais setores da empresa. Um destes “produtos” é a contratação de estagiários para os diferentes setores da empresa (que aqui configuram-se como seus clientes internos). Para que se parta da demanda apresentada pelos setores até a efetiva contratação dos estagiários, o setor de RH precisa realizar uma série de atividades que comporão o seu processo de contratação (por exemplo, comunicação das vagas para as universidades, recebimento e triagem dos currículos, definição dos horários de entrevista, comunicação aos candidatos selecionados, realização das entrevistas, etc.). Perceba por meio deste exemplo que, independentemente da área, é possível ilustrar o seu funcionamento por meio da modelagem em termos de processos. A base para essa ilustração é o que se chama de modelo de transformação. SUMÁRIO16 GESTÃO DA PRODUÇÃO 1.2.1 O PROCESSO DE TRANSFORMAÇÃO (OU MODELO INPUT-OUTPUT) A principal forma de ilustração dos processos a serem gerenciados pelas empresas recebe o nome de processo de transformaçãoou modelo input-output. Uma vez que a produção de um bem ou serviço envolve um conjunto de recursos de entrada (do inglês input), que vêm a ser processados de modo a se transformarem em produtos ou saídas (do inglês, output), o modelo apresenta simplicidade em termos de enten- dimento e grande aderência às diversas situações empresariais. Tome o exemplo da indústria química previamente apresentado. Seja o cenário da contratação de estagiários, seja a fabricação de um óleo lubrificante (respectivamen- te, um serviço prestado a clientes internos e um bem físico que será eventualmente ao consumidor final), pode-se ilustrar os processos com a mesma lógica do modelo input-processamento-output (outra denominação bastante comum). Será traçado um pequeno comparativo de cada um dos processos apresentados. Para tanto, será iniciada a análise a partir dos produtos ou outputs. No primeiro caso, o setor de RH apresentará como produto final aos seus clientes internos um serviço: a contratação de um grupo de estagiários conforme deman- das dos setores da empresa. Para o segundo caso, tem-se a produção de lotes de óleo lubrificante a serem entregues ao departamento de distribuição (que pode ser entendido como um cliente interno), transportados para diferentes varejos automo- tivos e posteriormente vendidos ao consumidor final. Para que ocorra a contratação dos estagiários, o setor de RH vai precisar de uma série de informações, como o perfil de candidato desejado por cada setor, o orça- mento alocado para o processo de contratação, o valor da remuneração dos esta- giários, as atividades que serão desenvolvidas, etc. Também precisará de informa- ções que são externas à sua empresa, como uma lista de faculdades com cursos de graduação que atendam às demandas dos seus clientes internos em termos de formação dos candidatos. Precisará, ainda, de pessoas capacitadas nos processos de captação e seleção de recursos humanos, computadores, Internet, bem como dos procedimentos internos da empresa para realizar tais contratações. Todos os itens listados configuram algumas das entradas (inputs) necessárias para a realização do 17 GESTÃO DA PRODUÇÃO SUMÁRIO processo de contratação. Analogamente, a produção do óleo lubrificante também demandará inputs. Contu- do, por se tratar de itens físicos que sofrerão modificações ao longo do processo, itens, como os sais, bases, ácidos e demais químicos presentes na produção do óleo, são tratados como matérias-primas. Juntamente com as embalagens, as máquinas necessárias à realização do processo, as informações relativas ao procedimento de produção e os funcionários que operarão as máquinas, tem-se o conjunto de inputs do processo de produção do óleo. As atividades que efetivamente transformam as entradas em saídas compõem o processamento do modelo. Para o caso dos estagiários, um funcionário do RH reali- za o cruzamento das informações sobre as universidades disponíveis na região com as informações sobre o perfil desejado de candidato e valor da bolsa de estágio e elabora um comunicado a ser difundido nas universidades tratando das vagas na empresa. Essa atividade intermediária será a base para as demais atividades que virão em sequência (como a captação de currículos, análise, organização dos horários de entrevista, etc.) até que se complete o processo e, com isso, chegue-se ao produto final. Da mesma forma, os componentes químicos do óleo lubrificante (matérias-pri- mas) serão processados segundo um procedimento predeterminado (outro exemplo de input de informação) e embalados a partir da atuação de máquinas e homens, até que se obtenha o produto desejado. Analogamente, a realização das atividades previstas no procedimento (ex. verificação do pH e viscosidade, aquecimento final, etc.) comporá o processamento em si das entradas e saídas. A figura a seguir ilustra graficamente o processo de contratação de estagiários descri- to previamente. SUMÁRIO18 GESTÃO DA PRODUÇÃO FIGURA 3 - MODELO INPUT-OUTPUT PARA O EXEMPLO DO RH ENTRADAS (INPUTS) • Pessoas - Funcionários da empresa - Candidatos • Procedimentos - Norma de contratação da empresa • Informações - Perfil desejado - Lista de universidades e cursos - Atividades previstas - Valor da bolsa • Capital ($$$) - Orçamento do processo • Equipamentos e instalações - Computadores - Internet PROCESSAMENTO • Comunicação do processo • Captação de currículos • Análise de currículos • Organização dos horários de entrevistas • Realização de entrevistas • Análise das entrevistas • Comunicação do resultado • Processo de contratação SAÍDAS (OUTPUTS) • Novos estagiários alocados em diferentes setores da empresa. Fonte: Elaborado pelo autor, 2019. Apesar de ser bastante recorrente a apresentação dos tópicos iniciais sobre gestão de operações subdivididos entre a produção de bens e serviços, alguns sistemas produtivos apresentam uma sobreposição de característi- cas dessas duas naturezas. Ao ir a um restaurante por exemplo, você vai se deparar com elementos de produção de um bem físico (o seu prato prin- cipal), bem como aspectos inerentes à produção de serviços (como a sua percepção sobre a higiene do local, ambientação, volume da música, etc.). Oliveira (2014) destaca ainda a situação em que as empresas passam a migrar de produtos para serviços como forma de atender a seus clientes de maneira cada vez mais eficiente. 19 GESTÃO DA PRODUÇÃO SUMÁRIO CONCLUSÃO Nesta unidade, inicial você conheceu as bases da gestão da produção, sua impor- tância para as empresas – independentemente se estas produzem bens ou serviços – e a sua relação com as demais funções da empresa, a saber: centrais e de apoio. Você foi apresentado ao modelo input-output, amplamente utilizado na literatu- ra de gestão para ilustrar o funcionamento de processos diversos e, efetivamente, auxiliar na sua gestão. Por meio de exemplos práticos, você conheceu os elementos constituintes do mode- lo input-output e já pode inclusive, passar a ilustrar processos empresariais que você venha a se deparar. Uma sugestão é a de procurar conhecer e ilustrar processos dife- rentes daqueles que você já está acostumado ou tenha conhecimento. Pense em diferentes processos de serviços que estão ao seu redor (uma matrícula na faculdade, a compra emissão de uma passagem aérea, etc.). Da mesma forma, procure conhecer processos de produção de bens que você não esteja familiarizado. Busque conhecer suas matérias-primas e processos de fabrica- ção. Bons estudos e até a próxima. SUMÁRIO20 GESTÃO DA PRODUÇÃO OBJETIVO Ao final desta unidade, esperamos que possa: > Ilustrar o conceito de estratégia no contexto de produção. > Selecionar possíveis estratégias de produção para um cenário de negócios. > Diferenciar os objetivos de desempenho que compõem a estratégia de operações. UNIDADE 2 21 GESTÃO DA PRODUÇÃO SUMÁRIO 2 ESTRATÉGIA DE OPERAÇÕES Após ilustrarmos a importância da gestão da produção e operações no dia a dia das empresas e como esta função figura como uma das mais centrais para o desempe- nho das organizações, passamos a discutir como a função produção se relaciona com a estratégia global da empresa. Mais que isso, a partir desta unidade, você vai enten- der como a função produção de uma empresa elabora estratégias para dar suporte e alinhar-se aos objetivos gerais da empresa. Para tanto, serão destacados os cinco critérios de desempenho utilizados pela produ- ção para elaborar suas estratégias e acompanhar a eficiência e eficácia de seus proces- sos frente aos objetivos traçados previamente. 2.1 DEFININDO A ESTRATÉGIA DE PRODUÇÃO Antes de tentar definir o que venha a ser a estratégia da produção, é preciso inicial- mente entender o que significa estratégia. Pode-se entender a estratégia como a forma por meio da qual a empresa define seu caminho para atingir seus objetivos. Esta escolha por caminhos é particulara cada empresa, tendo como base elementos como o ambiente em que está inserida, suas condições econômicas, suas ideias para novos produtos etc. Para Slack et al. (2018, p. 80), a estratégia abrangeria os seguintes itens: • Estabelecer objetivos amplos que direcionam uma empresa à sua meta global. • Planejar o caminho (em termos gerais, não específicos) para se chegar a essas metas. • Enfatizar os objetivos de longo e não de curto prazo. • Lidar com o quadro amplo, em vez de enfatizar atividades isoladas. • Manter-se afastado e acima da confusão e distrações das atividades do dia a dia. SUMÁRIO22 GESTÃO DA PRODUÇÃO Ainda segundo os autores, a estratégia de produção trata do padrão de ações e deci- sões estratégicas que definem o papel, os objetivos e as atividades da área de opera- ções. É comum pensar que os termos “estratégia” e “operações” não apresentem rela- ção alguma; contudo, é preciso destacar a diferença entre os termos “operações” e “operacional”. “Operacional” está associado a algo que acontece de forma rotineira e repetitiva. Já o termo “operações”, como você já sabe, refere-se a uma complexa área da empresa, contemplando tanto aspectos operacionais quanto estratégicos. Em linhas gerais, o objetivo da função produção é o de gerar riqueza para sociedade por meio da transformação de insumos (inputs) em produtos (bens e/ ou serviços) de valor agregado. De acordo com Slack et al. (2018, p. 36): [...] a produção da empresa é peça chave e a base para o sucesso do negócio, a administração da produção pode “fazer quebrar” qualquer empresa. Não só porque a função produção é grande e para muitas empresas representa o grosso dos bens e a maior parte dos colaboradores, mas também porque é a função que agrega competitividade à empresa ao fornecer a habilidade de resposta aos consumidores e ao desenvolver as capacitações que a colocarão à frente dos concorrentes no futuro. (SLACK, 2018, p. 36) Chiavenato (2015) destaca ainda que, em um mundo com uma demanda incessante por bens e serviços, as empresas precisam produzir e abastecer um mercado exigen- te em termos de preço e qualidade e com necessidades cada vez mais complexas e sofisticadas. Dado tal cenário, há de se questionar aquilo que é esperado da função produção para a efetiva satisfação do mercado consumidor da empresa associado a um posicionamento diferenciado quando comparado aos seus concorrentes. É sob essa perspectiva que passamos a aproximar a função produção (e, por conse- guinte, a gestão da produção) da estratégia da empresa como um todo. É preciso destacar que, enquanto um elemento da empresa, a área de operações também apre- senta sua própria estratégia. Logo, para efetivamente sabermos o que esperar da área de operações precisamos, antes de tudo, diferenciar a gestão de operações da estra- tégia da área de operações e das relações desta com a estratégia global da empresa. Vamos iniciar esta clarificação diferenciando os conceitos de gestão de operações e estratégia de operações. 23 GESTÃO DA PRODUÇÃO SUMÁRIO 2.1.1 GESTÃO DE OPERAÇÕES VS. ESTRATÉGIA DE OPERAÇÕES Corrêa e Corrêa (2017, p. 33) estabelecem a diferença entre os dois termos da seguin- te maneira. Para os autores, a gestão de operações é tida como a atividade de geren- ciamento dos recursos associados à produção do pacote de serviços entregue ao cliente. Muitas empresas, apesar de possuírem uma área ou departamento voltado às atividades de produção, denominam essas estruturas de outra forma. Como você já sabe, a função produção, ou operações, processa insumos, matérias- -primas e embalagens por meio de recursos de transformação (como máquinas e equipamentos) de modo a obterem as saídas dos seus processos produtivos (bens ou serviços). De acordo com Corrêa e Corrêa (2017, p. 33): [...] a gestão de operações preocupa-se basicamente com essas funções e em como esses processos são gerenciados. Tarefas típicas incluem o projeto dos processos, a escolha, configuração, implantação e manutenção das tecnolo- gias de processo, o projeto do trabalho das pessoas envolvidas na operação, o planejamento e controle das atividades, filas, fluxos e estoques, a garantia de níveis adequados de qualidade das saídas, a garantia de níveis adequados de uso dos recursos, entre outros. De forma relacionada, porém diferente, a estratégia de operações está mais volta- da ao processo global da função produção da empresa e menos orientada aos seus processos individuais e rotineiros. Neste sentido, surge a preocupação com a inter-re- lação com as demais áreas de negócio da empresa, como marketing, finanças e RH, e demais atores do ambiente em que está inserido (governo, concorrentes, fornece- dores, clientes etc.). Ainda segundo os autores, a estratégia de operações preocupa-se também em sempre atualizar a área de operações em relação às eventuais mudanças dos fatores SUMÁRIO24 GESTÃO DA PRODUÇÃO ambientais. Para tanto, empenha-se no desenvolvimento de longo prazo dos proces- sos e recursos e com a criação de competências para que a organização tenha níveis sustentáveis de vantagens competitivas. Assim, a estratégia de operações é vista como um processo para a manutenção do padrão global de decisões que visam aumentar a competitividade sustentada da organização através de organizar seus recursos, criar e manter competências, para que possam prover um composto adequado de carac- terísticas de desempenho ao longo do futuro (CORRÊA; CORRÊA, 2017, p. 33). Dessa forma, as principais diferenças entre a gestão de operações e a estratégia de operações, na visão de Corrêa e Corrêa, (2017) são: • Natureza: a gestão de operações preocupa-se em apoiar a tomada das deci- sões individuais de recursos de operações, enquanto a estratégia de operações preocupa-se com a conformação e manutenção do padrão de tomada dessas decisões. • Escala de tempo: a gestão de operações tipicamente se preocupa com uma escala de até um ano, enquanto a estratégia de operações terá preocupação com uma escala de um a dez anos à frente, dependendo da inércia das deci- sões envolvidas no negócio. • Grau de agregação das decisões: se, por um lado, a gestão de operações está orientada às decisões sobre recursos e processos com um maior nível de deta- lhe, a estratégia de operações volta-se às decisões com maior nível de agrega- ção. Ou seja, decisões sobre o conjunto de unidades produtivas, segmentação de produtos e serviços, agregados de clientes, nível geral de competências. • Ênfase: a gestão de operações preocupa-se com as interfaces entre opera- ções e outras áreas, mas a ênfase é predominantemente interna; a estratégia de operações preocupa-se também com aspectos internos, mas a ênfase é predominantemente em como a operação relaciona-se com seu ambiente interno e externo. • Nível hierárquico decisório: a gestão de operações lida com uma série de deci- sões compartilhada por grande número de pessoas, frequentemente associa- das aos níveis gerencial e operacional. Já a estratégia de operações trata de decisões mais agregadas, com impacto de médio e longo prazos, e relaciona- das a aspectos da alta direção. • Nível de abstração: estratégia de operações lida predominantemente com 25 GESTÃO DA PRODUÇÃO SUMÁRIO conceitos e ideias mais abstratos (e.g., deveríamos enfatizar as parcerias e concentrarmo-nos nas atividades essenciais ou deveríamos manter altos níveis de integração vertical?), enquanto a gestão de operações lida com questões mais concretas do dia a dia (e.g., qual tem sido o desempenho de nosso forne- cedor desse serviço e como podemos fazer para que ele melhore?). • Subordinação: as decisões de estratégia de operações em geral definem por prazos mais longos as capacitações que a operação vai ter no futuro. Essas, portanto, limitarão e definirão os contornos dentro dos quais a flexibilidade e a liberdade dos tomadores de decisões de gestão ocorrerão. De certaforma, portanto, as decisões de gestão de operações subordinam-se aos limites dados anteriormente pela estratégia de operações. Esse ponto, entretanto, é polêmi- co e merece maior aprofundamento no item que se segue. 2.1.2 RELAÇÕES ENTRE A ESTRATÉGIA DE OPERAÇÕES E A ESTRATÉGIA GLOBAL DA EMPRESA Após a caracterização da estratégia de operações, podemos nos voltar para o questio- namento de como esta se relaciona com a estratégia global da empresa. Mais espe- cificamente, podemos nos questionar sobre o que se espera que a função produção (por meio da sua estratégia) desempenhe no âmbito do negócio. Slack et al. (2018, p. 82) apresentam três possíveis relações, a saber: • Implementadora da estratégia empresarial – ser capaz de colocar em prática a estratégia traçada pela empresa. Imagine uma companhia de seguros que definiu como estratégia global a migração do seu atendimento para um serviço on-line inteiramente novo. SUMÁRIO26 GESTÃO DA PRODUÇÃO Assim, sua “operação” de marketing necessitará organizar atividades promo- cionais adequadas, sua “operação” de tecnologia da informação necessitará suprir sistemas apropriados. De forma mais significativa, sua função produ- ção terá que supervisionar o projeto de todos os processos que permitam aos consumidores acesso à informação on-line, elaboração de cotações, pedidos de informações adicionais, detalhes de checagem de crédito, envio de docu- mentação, e assim por diante. FIGURA 4 - OPERAÇÃO DE ATENDIMENTO ON-LINE Fonte: SHUTTERSTOCK, 2019. • Apoiadora da estratégia empresarial – ser capaz de “comprar a ideia”, ou seja, significa desenvolver suas capacitações de modo a permitir à organização aprimorar e refinar seus objetivos estratégicos. Um fabricante de telefones celulares decidiu ser o primeiro no mercado com produtos inovadores. Sua operação necessita, portanto, ser capaz de enfren- tar a inovação constante. 27 GESTÃO DA PRODUÇÃO SUMÁRIO Deve desenvolver processos que sejam flexíveis o suficiente para fabricar novos componentes, organizar seus funcionários para que eles entendam as novas tecnologias, desenvolver relacionamentos com os fornecedores que ajudem a responder rapidamente no fornecimento de novos componentes, e assim por diante. • Impulsionadora da estratégia empresarial – criar vantagens únicas de longo prazo. Uma empresa especializada em serviços de alimentação fornece peixes congelados e produtos do mar a restaurantes. Essa empresa desenvolveu, ao longo dos anos, relacionamentos próximos com seus consumidores (os chefs), assim como seus fornecedores ao redor do mundo (empresas de pesca e fazendas de criação de peixes). Adicionalmente, possui sua própria fábrica pequena, onde desenvolve e produz um contínuo fluxo de novos e excitan- tes produtos. A empresa possui uma posição única na indústria porque seus relacionamentos excepcionais com consumidores e fornecedores, além do desenvolvimento de novos produtos, são condições extremamente difíceis de serem imitadas por seus concorrentes. FIGURA 5 - FRUTOS DO MAR CONGELADOS Fonte: SHUTTERSTOCK, 2019. SUMÁRIO28 GESTÃO DA PRODUÇÃO 2.2 OBJETIVOS DE DESEMPENHO De modo a garantir que a estratégia de operações está alinhada à estratégia global da empresa, a função produção define um conjunto de parâmetros através dos quais a gerência (bem como os demais níveis hierárquicos) da empresa poderá verificar se as ações tomadas em nível operacional, tácito ou estratégico, estão sendo adequadas aos objetivos da organização. Esses parâmetros são chamados de objetivos de desempenho, a saber (SLACK et al., 2018, p. 50): • Qualidade – significa fazer as coisas da maneira correta. Isto é, sem cometer erros e satisfazendo seus clientes através do fornecimento de serviços sem erro e produtos que estejam conforme seus propósitos. FIGURA 6 - INSPEÇÃO DE QUALIDADE Fonte: SHUTTERSTOCK, 2019. • Velocidade – fazer as coisas com rapidez, minimizando o tempo entre o pedi- do de um cliente por serviços ou produtos e a entrega a ele por completo, aumentando, assim, a disponibilidade de seus serviços e produtos. 29 GESTÃO DA PRODUÇÃO SUMÁRIO • Confiabilidade – fazer as coisas no prazo acordado, mantendo as promessas de entrega feitas. • Flexibilidade – ter condições de mudar o que faz; isto é, ser hábil em variar ou adaptar as atividades de produção para enfrentar circunstâncias inesperadas ou dar tratamento individual aos clientes. Ser capaz de fazer mudanças gran- des e rápidas para atender às exigências dos clientes. O objetivo de desempenho de flexibilidade pode ainda ser desdobrado em quatro diferentes aspectos ou quatro tipos de flexibilidade. São eles: • Flexibilidade de produto/serviço – capacidade de apresentar ao mercado dife- rentes produtos ou serviços ou modificação das suas características básicas quando demandado. Por exemplo, as companhias de refrigerantes passaram a produzir isotônicos e águas saborizadas conforme o mercado consumidor passou a demandar produtos mais “fitness”. • Flexibilidade de composto (mix de produtos/serviços) – capacidade de compor um pacote de produtos ou serviços de acordo com a necessidade do cliente, variando tal composto (ou mix) de cliente para cliente. Por exemplo, as redes de hotéis que passaram a integrar passeios turísticos e comodidades como traslado, massagens e escritórios locais, além da hospedagem. • Flexibilidade de volume – capacidade de produzir diferentes quantidades em função das variações de demanda do mercado. Por exemplo, fábricas que apresentam capacidade instalada para vários níveis de demanda e para diferentes produtos. Produtos com menor volume são produzidos em certas unidades, enquanto produtos de grande demanda são produzidos em fábri- cas de maior capacidade. • Flexibilidade de entrega – capacidade de entregar produtos ou serviços de dife- rentes maneiras ou formatos, conforme a necessidade do cliente. Por exem- plo, clientes que especificam as condições de descarregamento nas docas dos seus armazéns em função da altura do prédio ou estabelecem a forma de paletização da carga. • Custos – fazer as coisas do modo mais barato possível; isto é, criar e entregar serviços e produtos a um custo que possibilite uma boa formação de preço para o mercado, além de permitir bom retorno para a organização; ou, em uma organização sem fins lucrativos, dar bom valor aos pagadores de impos- tos ou a quem mais financie a operação. SUMÁRIO30 GESTÃO DA PRODUÇÃO FIGURA 7 - ANÁLISE DE CUSTOS Fonte: SHUTTERSTOCK, 2019. Corrêa e Corrêa (2017, p. 35) desdobram esses objetivos ou critérios de desempe- nho em subobjetivos e apresentam suas respectivas descrições. O quadro a seguir condensa tais informações: QUADRO 2 - CRITÉRIOS DE DESEMPENHO E SUBOBJETIVOS CRITÉRIOS SUBOBJETIVOS DESCRIÇÃO Preço/custo. Custo de produzir. Custo de servir. Custo de produzir o produto. Custo de entregar e servir o cliente. Velocidade. Acesso. Atendimento. Cotação. Entrega. Tempo e facilidade para ganhar acesso à operação. Tempo para iniciar o atendimento. Tempo para cotar preço, prazo, especificação. Tempo para entregar o produto. Confiabilidade. Pontualidade. Integridade. Segurança. Robustez. Cumprimento de prazos acordados. Cumprimento de promessas feitas. Segurança pessoal ou de bens do cliente, sustentabilidade, baixo risco. Manutenção do atendimento mesmo que algo dê errado. Qualidade. Desempenho. Conformidade. Consistência. Recursos. Durabilidade. Confiabilidade. Limpeza. Conforto Estética. Comunicação. Competência. Simpatia. Atenção. Características primárias do produto. Produto conforme as especificações. Produto sempre conforme as especificações. Características acessórias do produto. Tempo de vida útil do produto. Probabilidade de falha do produto no tempo. Asseio das instalações da operação. Conforto físico do cliente oferecido pelas instalações. Características(das instalações e produtos) que afetam os sentidos. Clareza, riqueza, precisão e frequência da informação. Grau de capacitação técnica da operação. Educação e cortesia no atendimento. Atendimento atento. 31 GESTÃO DA PRODUÇÃO SUMÁRIO CRITÉRIOS SUBOBJETIVOS DESCRIÇÃO Flexibilidade. Produtos. Mix. Entregas. Volume. Horários. Área. Habilidade de introduzir/modificar produtos economica- mente. Habilidade de modificar o mix produzido economica- mente. Habilidade de mudar datas de entrega economicamente. Habilidade de alterar volumes agregados de produção. Amplitude de horários de atendimento. Amplitude de área geográfica na qual o atendimento pode ocorrer. Fonte: CORRÊA; CORRÊA, 2017. É preciso destacar ainda que esses critérios serão representados de diferentes formas e apresentarão diferentes contribuições em função do tipo de sistema produtivo a ser analisado. Por exemplo, para uma empresa de logística, a velocidade está associada a um menor tempo de entrega de produtos; para um laboratório de análises clínicas, está associada à resposta de um diagnóstico. Da mesma forma, diferentes sistemas produtivos terão concepções diferentes sobre a hierarquia dos critérios. A empresa de logística poderia ter o critério de custos como o mais prioritário, enquanto o laboratório clínico poderia ter a confiabilidade como uma referência de desempenho. CONCLUSÃO Nesta unidade, você viu como a função produção desenvolve sua própria estratégia e como esta se relaciona com a estratégia global da empresa. Para tanto, foi apresenta- da uma breve definição dos termos estratégia e estratégia de operações, bem como suas características. De forma complementar, foram apresentadas as três formas de relação entre a estratégia de operações e a estratégia de negócios. Ao final da unida- de, você conheceu os critérios de desempenho utilizados para a elaboração das estra- tégias de operação, seus subobjetivos e respectivas descrições. Agora, você já pode utilizar esses objetivos de desempenho para entender melhor as operações de diferentes sistemas produtivos. Procure observar no seu dia a dia como eles se desdobram nas atividades das empresas. Bons estudos e até a próxima! SUMÁRIO32 GESTÃO DA PRODUÇÃO OBJETIVO Ao final desta unidade, esperamos que possa: > Ilustrar o conceito de estratégia no contexto de produção. > Selecionar possíveis estratégias de produção para um cenário de negócios. > Diferenciar os objetivos de desempenho que compõem a estratégia de operações. UNIDADE 3 33 GESTÃO DA PRODUÇÃO SUMÁRIO 3 PLANEJAMENTO INTEGRADO DA PRODUÇÃO No dia a dia das empresas, é preciso que a área de produção tome decisões em dife- rentes níveis de atuação, a saber: longo prazo, médio prazo e curto prazo. Para cada um desses estágios, a relação com outros setores da empresa – como marketing, suprimentos e finanças – torna-se cada vez mais crítica e, assim, é preciso determinar processos bem estruturados que atendam às demandas da empresa e não limitem os recursos produtivos. Nesse sentido, esta unidade apresenta uma série de processos voltados a esse fim. Será apresentada a abordagem utilizada para o cálculo dos volu- mes de produção (PMP), bem como serão discutidas as estratégias de MRP utilizadas no cálculo do consumo dos recursos produtivos. 3.1 O PLANEJAMENTO DA PRODUÇÃO De acordo com Chiavenato (2015), para que uma empresa possa produzir bem, é preciso que haja planejamento, organização, direção e controle. É necessário que a função produção esteja baseada em um sistema de planejamento e controle confiá- vel para que os seus resultados apresentem tanto eficiência quanto eficácia. Segundo o autor: Há muita atividade a ser planejada, organizada e coordenada para que a pro- dução ocorra da melhor maneira possível. A complexidade do sistema pro- dutivo exige necessariamente um esquema adequado de planejamento e controle. As empresas não produzem ao acaso nem funcionam de maneira improvisada. Para atingir seus objetivos e aplicar adequadamente seus recur- sos, as empresas precisam planejar com antecedência e controlar correta- mente sua produção (CHIAVENATO, 2015, p. 135). É nesse contexto de coordenação e controle dos recursos orientados à produção que surge a figura do profissional e da área de planejamento e controle da produção (PCP). O PCP atua como um elemento central no planejamento e na programação da produção. Você pode imaginá-lo como a “cabeça pensante” da função produção, uma vez que é responsável pela elaboração do plano mestre de produção (PMP) a partir da utilização da abordagem do planejamento de recursos da manufatura ou manufacturing resource planning (MRP). SUMÁRIO34 GESTÃO DA PRODUÇÃO 3.1.1 PLANEJAMENTO, CONTROLE E FUNÇÕES DO PCP De acordo com Chiavenato (2015), o planejamento tem o objetivo de fixar os rumos e focalizar o futuro e a sustentabilidade da empresa a partir da determinação anteci- pada das metas a serem atingidas e daquilo que deve ser feito de modo a realizá-las. Ainda segundo o autor, “sem o planejamento, a empresa fica perdida no caos, sem saber exatamente para onde ir”. Neste sentido, o planejamento determina o que se deve fazer, quando fazer, quem deve fazer e de que maneira. Em contrapartida, o controle é tido como a função administrativa que consiste em acompanhar, medir e ajustar o desempenho da empresa de modo a assegurar que os planos sejam executados da melhor maneira possível. Tem por objetivo verificar se aquilo que fora planejado está sendo realizado da forma idealizada, identificando eventuais desvios e corrigindo-os quando necessário. A partir dessas definições mais abrangentes, Chiavenato (2015, p. 137) contextualiza o trabalho do PCP em termos de planejamento e controle. Segundo o autor: No caso específico da produção, o PCP planeja e controla todas as atividades produtivas da empresa. Se a empresa é produtora de bens ou mercadorias, o PCP cuida das matérias-primas necessárias, da quantidade de mão de obra, das máquinas e dos equipamentos e do estoque de produtos acabados dis- poníveis no tempo e no espaço, para que a área de vendas possa entregar aos clientes. Se a empresa é prestadora de serviços, o PCP planeja e controla a produção dos serviços e operações, cuidando da quantidade de talentos necessária, de instalações, máquinas e equipamentos e dos demais recursos necessários para a oferta dos serviços no tempo e no espaço, de modo a aten- der à demanda dos clientes e usuários. Partindo dos objetivos da empresa, o PCP planeja e programa a produção e as operações da empresa, bem como as controla adequadamente para tirar o melhor proveito possível em termos de eficiência e eficácia (CHIAVENATO, 2015, p. 137). Lobo e Silva (2014), em linha com essa visão, argumentam que o planejamento é parte fundamental da empresa, estando presente desde a sua concepção no plane- jamento estratégico até o planejamento das atividades diárias. Os autores dão desta- que ainda para os horizontes de atuação do planejamento, os níveis hierárquicos e a sinergia necessária entre eles. Dentro da organização, temos o planejamento de longo, médio e curto prazo. Para um planejamento eficiente, todos os níveis hierárquicos da empresa devem estar em perfeito sincronismo, conhecendo, entendendo e compartilhando dos mesmos 35 GESTÃO DA PRODUÇÃO SUMÁRIO objetivos. Daí a necessidade de um sistema de informação eficiente, com fluxo rápido e confiável, transmitindo as informações entre todos os níveis hierárquicos da empre- sa, os quais compreendem três níveis, cada um dos quais com a sua responsabilida- de e tomando as decisões necessárias para o bom andamento da empresa (LOBO; SILVA, 2014, p. 82). Tradicionalmente, a atuação das empresas e dos seus elementos constituintes é divi- dida em três níveis hierárquicos: estratégico, tático e operacional. Lobo e Silva (2014, p. 83) definem-nos da seguinte maneira: • Nível estratégico:responsável por decisões de grande impacto. São decisões empresariais, como a mudança da empresa para outra cidade, estado ou país, bem como a criação de uma filial, de um novo produto ou serviço. Pode resul- tar em lucro ou até mesmo na falência. • Nível tático: responsável por decisões de caráter administrativo e gerencial, como o transporte do maquinário, caso a empresa venha mudar de localiza- ção. Suas decisões são importantes, pois podem gerar lucros ou prejuízos. • Nível operacional: responsável por decisões técnicas, do cotidiano, de baixo impacto para a empresa, como interromper a produção de uma peça por conta de um defeito ou continuar produzindo e depois gerar um retrabalho. Uma vez que as atividades da empresa não devem ser realizadas por acaso, é preci- so que haja planejamento e controle para garantir sua eficiência e eficácia. Logo, as funções do PCP devem estar bem definidas e entendidas pelos diversos setores que fazem interface com a sua atuação. Para Chiavenato (2015), o PCP apresenta dupla finalidade: atuar sobre os meios de produção para aumentar a eficiência e cuidar para que os objetivos de produção sejam plenamente alcançados para aumentar a eficácia. Para que isso ocorra, é preciso que o PCP planeje antecipadamente aquilo que deverá ser produzido e, consequentemente, realize a alocação correta dos recursos produti- vos, como matérias-primas, pessoas, máquinas e equipamentos, bem como de esto- ques de produtos acabados para suprir as vendas. Adicionalmente, temos o caráter de controle do PCP. SUMÁRIO36 GESTÃO DA PRODUÇÃO Chiavenato (2015) destaca que “o PCP serve para monitorar e controlar o desempenho da produção em relação ao que foi planejado, corrigindo even- tuais desvios ou erros que possam surgir no decorrer das operações”. Assim, a atuação do PCP pode ser observada antes, durante e depois do processo produtivo: antes, quando está planejando o processo produtivo e programando recur- sos produtivos, como materiais, máquinas, pessoas e estoques; durante, ao controlar o funcionamento do processo produtivo de modo a garantir sua execução conforme aquilo que foi planejado; depois, ao checar os resultados obtidos, comparando-os com os objetivos definidos previamente. 3.1.2 INTERFACES COM A FUNÇÃO PCP Ao longo do desenvolvimento das suas atividades de planejamento e programação dos recursos produtivos, o PCP apresenta a necessidade de relacionamento com diversas outras áreas da empresa. Para Chiavenato (2015), essas inter-relações ou interfaces ocorrem porque “o PCP procura utilizar racionalmente os recursos empre- sariais, sejam eles materiais, humanos, financeiros, etc.”. O autor apresenta as seguin- tes interpelações entre a função PCP e as demais áreas da empresa (CHIAVENATO, 2015, p. 140): • Área de engenharia industrial: o PCP programa o funcionamento de máqui- nas e equipamentos e se baseia em boletins de operações (BO) fornecidos pela engenharia industrial. • Área de suprimentos e compras: o PCP programa materiais e matérias-pri- mas que devem ser obtidos no mercado fornecedor por meio do órgão de compras e estocados pelo órgão de suprimentos. Assim, a área de suprimen- tos e compras funciona com base no que é planejado pelo PCP. • Área de recursos humanos: o PCP programa a atividade da mão de obra, esta- belecendo a quantidade de pessoas que devem trabalhar no processo de 37 GESTÃO DA PRODUÇÃO SUMÁRIO produção. O recrutamento, a seleção e o treinamento do pessoal são ativida- des estabelecidas em função do PCP. • Área financeira: o PCP se baseia nos cálculos financeiros fornecidos pela área financeira para estabelecer os níveis ótimos de estoques de matérias-primas e produtos acabados, além dos lotes econômicos de produção. • Área de vendas: o PCP se baseia na previsão de vendas fornecida pela área de vendas para elaborar o plano de produção da empresa e planejar a quantida- de de produtos acabados necessária para suprir as entregas aos clientes. • Área de produção: o PCP planeja e controla a atividade da área de produção (CHIAVENATO, 2015). 3.2 PLANEJAMENTO INTEGRADO DA PRODUÇÃO Tomando como base as principais funções do PCP – planejamento e controle dos recursos produtivos –, destacamos agora o aspecto de integração das suas atividades. Você já sabe que, ao realizar tais atividades, o PCP inter-relaciona-se com diversas áreas da empresa, como vendas, suprimentos, finanças, etc. Assim sendo, a partir deste tópico, será dado ainda mais destaque à forma como essa integração acontece e, em especial, às áreas de suprimentos e logística. Para tanto, serão detalhados dois processos de grande importância para o PCP e que efetivamente imprimem o caráter de integração das suas atividades: o planejamento mestre da produção (PMP) e o planejamento dos recursos de manufatura (do inglês, manufacturing resource planning – MRP). O PMP tem a função de direcionar as atividades de produção tendo como base as necessidades de vendas e os níveis de estoque dos produtos acabados em um dado período de tempo. Já o MRP é implementando de modo a colocar em prática aquilo que fora previamen- te planejado através da “puxada” de materiais nas quantidades e momentos certos. Em outras palavras, o MRP atua como um norteador do consumo de matérias-primas e da ocupação de centros de trabalho de forma que as atividades sejam otimizadas ao mesmo tempo em que as demandas internas e externas sejam atendidas. SUMÁRIO38 GESTÃO DA PRODUÇÃO 3.2.1 CONCEITO DE PMP De acordo com Tubino (2017, p. 82), o planejamento mestre da produção (PMP) tem a função de desmembrar os planos produtivos desenvolvidos no nível estratégico (longo prazo) em planos específicos de produtos acabados (bens ou serviços) para o médio prazo, direcionando as etapas de programação e execução das atividades operacionais da empresa (como, por exemplo, montagem, fabricação e compras). É a partir desse planejamento que a empresa pode organizar as atividades inter- nas, como montagem e fabricação, bem como assumir compromissos de compra de componentes, embalagens e matérias-primas obtidos junto a fornecedores externos. O resultado do PMP é um plano que indicará o caminho a ser tomado em termos de decisões sobre a necessidade de produtos acabados para cada período analisado. Ainda segundo Tubino (2017), o PMP faz a conexão entre o planejamento estratégico (plano de produção) e as atividades operacionais da produção. O plano é frequen- temente obtido por um processo de tentativa e erro. Partindo-se de um PMP inicial, a empresa (na figura do PCP) verifica a disponibilidade de recursos para atender o plano estabelecido. Em caso de viabilidade do PMP, o plano é autorizado. Em caso negativo, o plano é refeito, podendo inclusive chegar ao ponto de ter que retornar ao nível do plano de produção e reconsiderar as questões estratégicas (TUBINO, 2017, p. 83). Tubino (2017) ainda destaca duas funções do PMP associadas aos seus prazos de execução: • A análise e validação da capacidade de médio prazo do sistema produtivo em atender à demanda futura, que desmembra a estratégia de produção em táticas de uso para o sistema produtivo montado (um link entre o longo e o médio prazo); • Implementação da tática escolhida para o próximo período, identificando as quantidades de produtos acabados que deverão ser produzidas de forma a iniciar o processo de programação da produção (um link entre o médio e o curto prazo) (TUBINO, 2017). 39 GESTÃO DA PRODUÇÃO SUMÁRIO É preciso destacar as diferenças entre o PMP e o plano de produção. Dois aspectos se sobressaem, e o primeiro deles trata do nível de agregação dos produtos: enquan- to o plano estratégico de produção trata das famílias (segmentos) de produtos, o PMP foca especificamente nos produtos individuais. Analogamente, o plano estra- tégico de produção utiliza o horizonte de meses, trimestres e anos como forma de planejamento,enquanto o PMP utiliza unidades de tempo mais curtas, como dias e semanas. A figura a seguir apresenta o percurso iterativo realizado pela função produção, que vai desde o plano estratégico de produção idealizado – tendo como referência o longo prazo – até a efetiva programação da produção. Perceba o elemento interati- vo observado no médio prazo, quando se checa a viabilidade do PMP e se realizam os respectivos ajustes antes de se passar à programação dos recursos produtivos no curto prazo. FIGURA 8 - RELAÇÕES ENTRE PLANO ESTRATÉGICO DE PRODUÇÃO E PMP Fonte: TUBINO, 2017. SUMÁRIO40 GESTÃO DA PRODUÇÃO Para que o PMP seja elaborado adequadamente, é preciso que haja envolvimento das diversas áreas da empresa. Esse envolvimento está refletido tanto no forneci- mento de subsídios para as tomadas de decisão quanto na utilização dessas infor- mações no PMP. Tubino (2017) destaca ainda que a tática a ser empregada nos ciclos de programação é definida a partir de reuniões periódicas entre as áreas que fazem interface com o PMP. De acordo com o autor: A área de Finanças coordenará os gastos com compras, estoques, horas extras, manutenção das instalações e equipamentos etc.; a área de Marketing passa- rá seu plano de vendas e a previsão da demanda para os períodos analisados; a área de Engenharia fornecerá os padrões atuais de tempos e consumos de materiais para execução das tarefas; a área de Produção colocará suas limi- tações de capacidade e instalações; a área de Compras informará suas ne- cessidades referentes à logística de fornecimento externo; a área de Recursos Humanos apresentará seu plano de contratação e treinamento de pessoal etc. (TUBINO, 2017, p. 83). Ao final do processo de PMP, todas as áreas que apresentam interface apresentarão sua programação específica para as semanas futuras. Nesse sentido, Tubino (2017) destaca que a área de finanças obterá seu plano de necessidades de capital, a área de marketing obterá seu plano de vendas com possíveis datas de entregas, a área de compras terá oportunidade de negociar seus contratos com os fornecedores, a área de recursos humanos obterá seu plano de contratação e treinamento de pessoal, e a área de produção terá seu PMP liberado para programar suas atividades na próxima semana e planejar seus recursos nas semanas seguintes. Na prática, o PMP prevê o atendimento de certo valor de demanda para semana, considerando os tempos médios de produção (lead time) e entrega de matérias-pri- mas para cada produto em questão. Assim, é preciso uma tabela similar à apresenta- da a seguir. Esse preenchimento pode ser realizado via software de gestão de produ- ção ou pelo próprio PCP. 41 GESTÃO DA PRODUÇÃO SUMÁRIO QUADRO 3 - EXEMPLO DE PLANEJAMENTO AGREGADO SEMANA 1 2 3 4 5 DEMANDA 18000 20000 18000 18000 23000 ESTOQUE INICIAL 0 2000 0 2000 4000 PRODUÇÃO 20000 18000 20000 20000 19000 ESTOQUE FINAL 2000 0 2000 4000 0 Fonte: Elaborada pelo autor. Perceba que, para cada semana, é preciso determinar a quantidade a ser produzida de modo a atender a demanda prevista. Contudo, é preciso levar em consideração os volumes dos estoques inicial e final do produto, o tempo necessário para a produ- ção e as capacidades de produção e estoque. Para o exemplo apresentado, temos um tempo de produção de uma semana e uma capacidade de produção de 20.000 unidades por semana. 3.2.2 PLANEJAMENTO DE VENDAS E OPERAÇÕES Ao longo da unidade, foram abordadas as reuniões existentes entre a função produ- ção e as demais áreas da empresa para a elaboração do PMP. Dentre estas, será dado destaque ao planejamento de vendas e operações (em inglês, sales and operations planning ou S&OP, como é comumente conhecido). Para Corrêa e Corrêa (2019), o processo deve integrar diversas funções, como manufatura, marketing, finanças e engenharia, tanto no nível de políticas como no de decisões. Por se tratar de um processo de planejamento, o S&OP procura identificar como a visão de determinado horizonte de futuro, juntamente com o conhe- cimento da situação atual, pode influenciar as decisões que estão sendo to- madas agora e que visam a determinados objetivos. É um processo de plane- jamento caracterizado por revisões mensais e ajustes contínuos dos planos da empresa à luz das flutuações da demanda do mercado, da disponibilidade de recursos internos e do suprimento de materiais e serviços externos (CORRÊA; CORRÊA, 2019, p. 420). Adicionalmente, o processo de S&OP apresenta, segundo Corrêa e Correa (2019, p. 420), os seguintes objetivos a serem alcançados: SUMÁRIO42 GESTÃO DA PRODUÇÃO • suportar o planejamento estratégico do negócio; • garantir que os planos sejam realísticos; • gerenciar as mudanças de forma eficaz; • gerenciar os estoques de produtos finais e/ou a carteira de pedidos de forma a garantir bom desempenho de entregas (nível de serviço a clientes); • avaliar o desempenho; • desenvolver o trabalho em equipe (CORRÊA; CORREA, 2019). Analogamente, os autores apresentam alguns dos principais resultados esperados pelo processo de S&OP: • estabelecimento das metas mensais de faturamento; • projeção de lucros; • projeção de estoques; • fluxo de caixa projetado; • determinação das quantidades mensais de produção para serem firmadas dentro do período de congelamento; • estabelecimento de orçamentos de compras e despesas de capital; • definição de limites de tolerância para variações no Plano Mestre de Produção (PMP) (CORRÊA; CORREA, 2019). 3.2.3 MATERIAL REQUIREMENT PLANNING (MRP) E MANUFACTURING RESOURCES PLANNING (MRP II) Chiavenato (2015) define o material requirement planning (MRP) como o planeja- mento de necessidades de materiais, e o manufacturing resources planning (MRP II) como o planejamento dos recursos de manufatura. Tanto o MRP como o MRP II ganharam destaque nas empresas a partir do aumento da informatização dos seus processos e da incorporação de sistemas de informatizados de gestão. 43 GESTÃO DA PRODUÇÃO SUMÁRIO A principal diferença observada entre os dois sistemas está na evolução atribuída à gestão dos recursos produtivos. Enquanto o MRP foca no cálculo das necessidades de recursos exclusivamente materiais (embalagens, componentes, matérias-primas, etc.) para o atendimento de demandas previamente colocadas no sistema, o MRP II apresenta as mesmas características somando-se agora informações sobre tempo de produção, necessidade de mão de obra por posto de trabalho e capacidade produ- tiva. Assim, o MRP II incorpora à perspectiva de cálculo de necessidade de materiais do MRP a complexidade relativa à capacidade produtiva dos centros de trabalho da função produção. Para Chiavenato (2015, p. 153): [...] o MRP II é um software que parte do plano mestre que integra estoques de materiais, estoques de componentes, lista de materiais, restrições de mão de obra, disponibilidade de equipamentos, gera as necessidades de compra (ou até mesmo as ordens de compras) para os itens fornecidos por terceiros e ordens de produção para as necessidades de fabricação própria (CHIAVENA- TO, 2015, p. 153). O autor ainda destaca que, tradicionalmente, o MRP II envolve os seguintes parâme- tros: • Estoque de segurança (ES): quantidade mínima do item que se deseja manter em estoque. • Lote: quantidade em que o item é produzido internamente ou fornecido por terceiros. • Tempo de atendimento (TA) ou lead time: é o prazo de entrega, ou seja, o tempo previsto para a produção dos lotes ou para a entrega dos pedidos feitos. • Estoque em mãos: quantidade disponível do item quando se faz o planeja- mento. • Períodos consecutivos de planejamento: geralmente em semanas. • Necessidade de produção projetada (NP): demanda projetada, ou seja, as quantidades que devem estar disponíveis em cada semana. • Recebimentos previstos (RP): quantidades encomendadas e cuja entrega está prevista para o período planejado. • Disponível à mão (DM): estoque queestará disponível no fim de cada semana. • Necessidade líquida de produção (NL): quantidades que devem ser produzidas SUMÁRIO44 GESTÃO DA PRODUÇÃO ou compradas. • Liberação da ordem: quantidade que deve ser pedida e a semana em que deve ser efetuada. Somam-se a esses parâmetros os tempos de entrega (ou recebimento) para os itens comprados, tempos de fabricação para os itens produzidos internamente, estoques de segurança e quantidade requisitada. Destacam-se ainda dados complementares sobre o produto, como preço unitário, fornecedores, processo de fabricação, equipa- mento, roteiros de fabricação e respectivos centros de custos, mão de obra usada por categorias profissionais e ferramentas utilizadas. CONCLUSÃO Nesta unidade, você conheceu um pouco mais sobre os detalhes dos processos reali- zados pelas empresas para determinar seus níveis de produção e dinamizar a rotina da produção. Você pôde perceber a importância das relações com outras áreas da empresa, como marketing, finanças e suprimentos. Mais que isso, você pôde levar a esses setores a visão e as necessidades da área de produção. Profissionalmente, você agora pode ter aberto novas portas em empresas de software no sentido de “traduzir” a realidade da produção para os algoritmos dos sistemas que darão suporte à tomada de decisão da função produção. No mais, você está cada vez mais se apropriando de conhecimentos críticos às empre- sas para dinamizar e otimizar seus processos produtivos ao passo em que conseguem atender as demandas de vendas. A função “cerebral” do PCP está mais próxima das suas possibilidades profissionais depois destas discussões. Cabe a você agora complementar suas competências com outras abordagens ainda mais refinadas e fazer a diferença no dia a dia das empresas. Bons estudos e até a próxima. 45 GESTÃO DA PRODUÇÃO SUMÁRIO OBJETIVO Ao final desta unidade, esperamos que possa: > Diferenciar as características dos sistemas tradicionais e da filosofia JIT de produção. > Discutir a relação da filosofia JIT com o Sistema Toyota de Produção. > Ilustrar a importância do sistema Kanban para o bom desempenho dos processos produtivos. UNIDADE 4 SUMÁRIO46 GESTÃO DA PRODUÇÃO 4 SISTEMAS JUST IN TIME Quando o mundo se deparou com as grandes restrições de recursos produtivos em função da crise do petróleo nos anos 70, as empresas japonesas – que já apresenta- vam restrições de recursos desde o término da Segunda Guerra Mundial – precisa- ram desenvolver novos métodos para se posicionar em um mercado cada vez mais complexo e ansioso por inovações e baixo custo. Assim, empresas como a Toyota passaram a se relacionar de uma maneira diferencia- da com o mercado, atendendo-o de forma rápida e dinâmica, ao mesmo tempo em que minimizavam ao máximo seus custos operacionais e com estoques. Essa faça- nha só foi possível a partir do desenvolvimento da filosofia Just in Time de produção em que as empresas deixaram de empurrar produtos para o mercado e passaram a fazer com que a demanda do mercado ditasse o ritmo de produção. Nesse sentido, esta unidade apresentará as principais características da abordagem revolucionária e possivelmente vai fazer você enxergar os sistemas produtivos por meio de outro prisma. 4.1 DEFINIÇÃO DE JUST IN TIME (JIT) De acordo com Chiavenato (2014), o Just in Time, ou apenas JIT, é um sistema de produção voltado à rápida resposta às demandas dos clientes, tendo como priori- dade evitar os desperdícios e, consequentemente, o aumento da produtividade. Ainda segundo o autor, “o objetivo é produzir exatamente o que é necessário para satisfazer à demanda atual – nem mais, nem menos”. É possível destacar como característica marcante do sistema JIT o fato de primar pela utilização exata dos volumes de materiais necessários para o atendimento das demandas de mercado. Tal característica permite uma redução considerável dos níveis de estoque, altos níveis de qualidade e menores tempos de produção. Para Chiavenato (2014, p. 83): [...] o JIT requer alta coordenação da programação da produção e saídas livres de defeitos em cada estágio do processo para que o sistema tenha pequenos 47 GESTÃO DA PRODUÇÃO SUMÁRIO inventários. Todos são totalmente envolvidos e compromissados com o sis- tema. O objetivo é responder prontamente às demandas e às necessidades do cliente pela redução contínua do tempo de manufatura por meio de me- lhorias incrementais no sistema. Toda atividade que consome recursos e não agrega valor é um desperdício. O combate ao desperdício é a base do sistema. Moreira (2012) apoia-se na visão da APICS (The Association for Operations Manage- ment) para definir o just in time como uma filosofia de manufatura, ou seja, mais do que um simples sistema, o JIT é percebido como uma forma de abordar, entender e conduzir atividades manufatureiras de uma organização. Para o autor, a base dessa filosofia é a eliminação planejada e sistemática do desperdício, levando a um melho- ramento contínuo da produtividade. É possível aproximar a tradução do termo just in time para algo como “apenas a tempo” ou “justamente a tempo”. Contudo, dada a sua ampla utilização, o entendi- mento geral do termo é de “na hora certa”. De fato, a expressão refere-se a uma das tentativas básicas de eliminar o desperdício, produzindo sempre a peça (ou produto, em geral) certa, no lugar certo e “na hora certa” (MOREIRA, 2012, p. 505). É preciso ressaltar ainda que muitos autores se referem apenas ao termo JIT, enquanto muitos outros se referem à manufatura JIT, assumindo assim, uma forte ligação da filosofia JIT com atividades de base industrial. 4.1.1 O JIT E O STP Outra associação bastante tradicional envolvendo a filosofia Just in Time – e que por vezes, pode incorrer em uma compreensão equivocada – é a sua ligação dire- ta com o Sistema Toyota de Produção (ou simplesmente STP). Apesar de bastante próximos, os termos não são sinônimos. De acordo com Moreira (2012), o STP é visto como uma criação do vice-presidente da empresa, Taichi Ohno, e tem suas bases na crise do petróleo do ano de 1973, onde os custos de produção aumentaram drasticamente, principalmente para aquelas empresas japonesas que já compe- tiam no mercado internacional. SUMÁRIO48 GESTÃO DA PRODUÇÃO Além da atuação e concepção por parte do vice-presidente Taichi Ohno, o Sistema Toyota de Produção contou com a contribuição de diversos outros profissionais. Entre eles, podemos destacar o engenheiro Shigeo Shingo, que atuou na própria Toyota e desenvolveu uma tipologia específica para os desperdícios encontrados nos sistemas produtivos. Esta tipologia desenvolvida por Shigeo Shingo, bem como uma série de outras considerações sobre o STP, pode ser encontrada em seu livro O Siste- ma Toyota de Produção do ponto de vista da engenharia de produção, que está disponível no Minha Biblioteca. Ainda segundo o autor, para contrabalancear os crescentes custos, essas empresas tiveram que passar a utilizar seus recursos de forma mais eficiente e produtiva, de forma que os estoques não poderiam mais esconder os efeitos dos problemas exis- tentes. Assim como diversas outras empresas japonesas, a Toyota também figurava como uma das empresas que apresentava escassez de recursos produtivos após a Segunda Guerra Mundial. A saída adotada pelas empresas japonesas foi apurar o processo de tomada de decisão e eliminar a causa raiz de problemas que acarreta- vam em desperdícios de recursos como tempo, material e mão de obra. Dado este cenário de escassez de recursos, necessidade de mudança nos paradigmas de gestão operacional e acirrada competição, muitas empresas japonesas (incluindo a Toyota) passaram a aderir às práticas simples e eficazes do JIT. 49 GESTÃO DA PRODUÇÃO SUMÁRIO 4.1.2 AS RAÍZES DO JIT E DO STP O Sistema Toyota de Produção (STP) não surgiu do nada. Ele tem fortes raízes em dois elementos associadosao mercado norte-americano. São eles: o sistema de produção em massa idealizado, implementado e difundido por Henry Ford, e a estrutura dos grandes supermercados. Mesmo sendo comum e erroneamente associado como uma oposição ao sistema industrial tradicional, é possível visualizar características inerentes ao sistema fordista que foram absorvidas pelos sistemas JIT. Moreira (2012) descreve tais características: • Preocupação com o desperdício – eliminação de atividades que incorrem em custos sem adicionar valor ao produto. Toda ação que não agrega valor ao produto ou processo é considerada um desperdício. • Ênfase no melhoramento contínuo – preocupação com a otimização contínua dos processos. • Redução no setup – necessidade de minimização do número e da duração dos setups, uma vez que seus custos não adicionam valor ao produto. • Ênfase na ordem e no arranjo do local de trabalho – locais de trabalho limpos e bem organizados contribuem positivamente para o desempenho e para a moral do empregado. • Nivelamento da produção – minimização das flutuações nos níveis de progra- mação de produção, uma vez que esses desníveis dificultam a gestão da demanda e ocultam oportunidades de melhoria. • Respeito por pessoas – preocupação em criar um ambiente propício à produ- tividade do trabalhador. Décadas após a disseminação dos preceitos de Ford e do seu formato de produção em massa, Ohno incorporou parte desses conceitos ao seu sistema de manufatura; não obstante, também fez uso da ideia por trás dos supermercados norte-ameri- canos. A ideia que Ohno assimilou foi que um supermercado era um lugar onde o cliente podia obter o que precisasse, na hora certa e na quantidade certa. No modelo do supermercado, a necessidade de produtos é que determina o que se movia nas prateleiras. O sistema funcionava movendo-se continuamente, dos fornecedores para SUMÁRIO50 GESTÃO DA PRODUÇÃO os clientes (MOREIRA, 2012). Em se tratando do ponto focal do JIT, o desperdício é visto como o resultado de qualquer atividade ou ação que incorre em custo ao processo sem adicionar valor ao mesmo. Como exemplo, podemos citar o movimento desnecessário dos operadores ao buscar ferramentas, a formação de estoques intermediários para suprir paradas de máquinas e a necessidade de retrabalho em peças defeituosas. Para Moreira (2012), os gerentes de operação que administram o JIT encaram o desperdício como sintoma de algum problema. O desperdício em si não é o proble- ma, mas sim o seu aspecto visível. Em outras palavras, o desperdício pode ser enca- rado como o resultado de um processo que está sendo executado de forma errada e passível de mudança. Logo, é preciso atacar a causa raiz do desperdício e não olhar simplesmente para o seu aspecto superficial. A análise dos tipos de desperdícios presentes nos processos produtivos (também chamados de perdas) foi tratada por Ohno (culminando na já citada obra de Shingo) e amplamente discutida ao longo dos anos. Slack et al. (2018) apresentam esta tipo- logia: • Superprodução: está relacionado ao ato de produzir mais do que é necessário para a etapa seguinte do processo ou é demandado pelo mercado. De acordo com o STP, esta é a maior das fontes de desperdício. • Tempo de espera: eficiência do equipamento e do trabalho são duas medidas amplamente utilizadas para avaliar o tempo de espera dos equipamentos e do trabalho. • Transporte: movimentar itens através da operação não agrega valor. Modifica- ções no layout, melhorias nos métodos de transporte e organização do local de trabalho podem reduzir esse tipo de desperdício. • Processo: o processo, por si só, pode gerar desperdício. Algumas operações podem ocorrer puramente por questões de baixa qualidade de componentes ou falhas de manutenção e, assim, podem ser eliminadas. • Estoque: todo estoque deveria ser alvo de melhorias. Entretanto, apenas atra- vés do levantamento das causas desses estoques que os mesmos podem ser reduzidos. • Ações indevidas: um operador pode parecer estar ocupado, mas algumas 51 GESTÃO DA PRODUÇÃO SUMÁRIO vezes nenhum valor está sendo agregado ao seu trabalho. A simplificação do trabalho é um grande recurso para a redução de desperdícios em ações inde- vidas. • Defeitos: Os desperdícios associados à qualidade são geralmente bastante significantes nas operações. Os custos totais de qualidade são muito maiores do que aqueles que tradicionalmente consideramos e, dessa forma, extrema- mente importantes. 4.2 DIFERENÇAS ENTRE OS SISTEMAS TRADICIONAIS DE PRODUÇÃO (EMPURRADOS) E O JIT (PUXADO) Um dos principais pontos de debate associados à filosofia JIT está na sua concep- ção de atendimento à demanda do mercado. Enquanto os sistemas tradicionais de produção estão orientados à produção para estoque e, posteriormente, à venda dos produtos, os sistemas de produção que se baseiam no just in time (e aqui logicamen- te inclui-se o Sistema Toyota de Produção) apenas são iniciados quando a demanda é formalizada. Dessa forma, só se produzirá aquilo que foi solicitado, no momento em que foi solicitado e na quantidade solicitada. Logo, evita-se os excessos de produção que culminam em estoques, as paradas para ajustes (setup) de máquina e os esto- ques intermediários. A analogia apresentada na literatura é a de que os sistemas tradicionais “empurram” a produção para o mercado através de seus estoques, e os sistemas JIT “puxam” a produção no momento adequado e na quantidade correta, conforme a demanda se formaliza. A figura a seguir ilustra tais diferenças. SUMÁRIO52 GESTÃO DA PRODUÇÃO FIGURA 9 - DIFERENÇAS ENTRE SISTEMAS DE PRODUÇÃO Sistema tradicional – produção “empurrada” Sistema JIT – produção “puxada” Previsão de demanda Operação A WIP 1 WIP 2 Operação B Operação C DemandaEstoque Operação A Operação B Operação C Demanda Demandana quantidade certa Demanda na quantidade certa Demanda na quantidade certa Fonte: Elaborada pelo autor. Considere uma concessionária de automóveis e sua relação com a empresa montadora. Em um sistema de produção tradicional, a demanda da conces- sionária é atendida pela montadora, tendo como base o histórico de pedi- dos realizados previamente e que alimentaram a programação da produção de um lote de carros que foram manufaturados antes de a demanda ter sido apresentada. Logo, os carros que chegarão à concessionária já foram fabricados antes mesmos desta manifestar o desejo de adquiri-los, ou seja, a montadora fabricou os carros e os colocou em um estoque e, na medida em que os pedidos são feitos pelo cliente, esse estoque é “empurrado” para o mercado para atender às suas demandas. 53 GESTÃO DA PRODUÇÃO SUMÁRIO O risco para a montadora é o de que aquela previsão de demanda inicial não seja efetivada e, assim, o estoque ficaria obsoleto até que sejam efetiva- das novas vendas. Já para a concessionária, o risco é de que a sua deman- da não seja atendida pelo estoque da montadora. Os modelos, as cores, os opcionais produzidos pela montadora podem não ser aqueles desejados pela concessionária. Da mesma forma, os volumes produzidos e demanda- dos podem apresentar diferenças. Por exemplo, a montadora pode produzir acima daquilo que será comprado pela concessionária ou ainda a um custo acima daquilo que se deseja pagar. Para todas essas situações, apenas após a produção, teremos certeza do que pode acontecer. Já no cenário de produção JIT a montadora só inicia seus trabalhos de manu- fatura a partir do momento em que o pedido da concessionária é confirma- do. Assim, a montadora tem certeza de quantos carros devem ser fabricados, quais os modelos, os prazos de entrega e os respectivos custos. Da mesma forma, em função da certeza da demanda, a montadora pode acionar seus fornecedores para o processo de suprimento de peças e componentes nas quantidades, custos e prazos corretos. Perceba que a premissa é a de que só será produzidoaquilo que foi compra- do. Logo, elimina-se (em teoria) os estoques e os desperdícios ao longo do processo produtivo, pois a demanda do cliente “puxa” a produção de X carros. Esta demanda por sua vez, “puxa” a necessidade de se produzir X chassis no respectivo centro de trabalho, ao passo que acionará o fornecedor para o suprimento de 5X pneus (considerando o estepe) e assim por diante. Cada centro de trabalho da montadora, bem como seus fornecedores, será orien- tado a produzir e entregar os seus materiais e componentes no momento certo, na quantidade certa e ao custo correto. SUMÁRIO54 GESTÃO DA PRODUÇÃO Em decorrência dessa abordagem de se produzir apenas aquilo que foi demandado, o sistema vai apresentar níveis de produção mais estáveis, ou seja, com menores flutuações do volume a ser produzido, permitindo um melhor ajuste da capacidade produtiva instalada. Adicionalmente, tem-se a vantagem de que os centros de trabalho (e, por conseguinte, o sistema produtivo como um todo) estarão atuando com estoques mais baixos se comparados à produção em massa, pois, uma vez que temos certeza da demanda a ser atendida e uma produção mais nivelada, em termos de volu- me, podemos programar a produção de forma que cada centro de trabalho seja atendido por meio da quantidade exata de componentes que podem ser processados em um dado período (por exemplo, uma hora, um turno ou um dia) sem produção excessiva o que acarretaria em lotes. Moreira (2012, p. 508) resume o funcionamento do sistema JIT da seguinte maneira: O JIT usa um sistema “puxado” em vez de um sistema “empurrado” para mo- ver os produtos por meio das instalações. A lógica de um sistema puxado é simples: a comunicação no JIT começa ou com a última estação de trabalho na linha de produção ou com o cliente – e depois trabalha para trás por meio do sistema. Cada estação requisita da estação de trabalho prévia a quantida- de precisa de produtos que é necessária. Se os produtos não são requisitados, não são produzidos. Dessa forma, os estoques em excesso não são gerados. Resumindo, o JIT baseia-se em um sistema de coordenação que retira pe- ças de um centro de trabalho prévio e as move até o próximo. Veremos mais adiante que o sistema tipicamente confia em cartões kanban para puxar os produtos necessários por meio do sistema de produção. É por essa razão que o JIT é freqüentemente chamado de sistema puxado. O kanban especifica o que é preciso. Não existe produção em excesso porque os únicos produtos e quantidades produzidos são aqueles especificados pelo kanban. Complementarmente Monden (2015, p. 35) destaca as diferenças entre os dois siste- mas destacando a dinâmica de cada abordagem. Segundo o autor, no sistema de produção tradicional, a sincronização entre produção e o atendimento à demanda são obtidos por meio de várias programações de produção. Contudo, ressalta que esse método “torna difícil uma adaptação rápida a mudanças causadas por problemas 55 GESTÃO DA PRODUÇÃO SUMÁRIO em algum processo ou por flutuações na demanda”. Logo, faz-se necessário manter estoques para absorver problemas e ocasionais flutuações na demanda. Como resultado desta configuração, tem-se que: [...] tal sistema cria muitas vezes um desbalanceamento de estoque entre os processos, o que frequentemente acarreta em estoque desnecessário, em ex- cesso de equipamentos ou em um excedente de trabalhadores quando mu- danças no modelo acabam acontecendo (MONDEN, 2015, p.36). Em contrapartida, no sistema JIT são os processos subsequentes que recolhem as peças juntos aos processos precedentes (daí a conotação de um sistema que “puxa” a produ- ção). Uma vez que a etapa final do processo ilustra precisamente o ritmo e a quanti- dade de peças necessárias para atender à demanda, Monden (2015) destaca que não é preciso fazer programações de produção simultâneas ao longo do mês para todos os processos. Em vez disso, apenas a etapa final do processo precisa ser adaptada em função de uma flutuação de demanda ou eventual problema e, consequentemente, esta realizará a “puxada” da produção no ritmo adequado a atender à demanda. Para realizar o “balanceamento” dos níveis de produção em cada uma das etapas do processo produtivo, o sistema JIT faz uso de um artifício específico e que muitas vezes é confundido com a própria filosofia JIT, a saber: o sistema kanban. Este sistema é de extrema importância para o bom funcionamento dos sistemas produtivos que se baseiam no JIT. É a partir desse (sub)sistema que se dá a comunicação entre as etapas do processo produtivo. Na prática, é por meio dos cartões kanban que cada posto de trabalho sabe quanto e quando deve produzir de modo a atender À demanda implan- tada sem excessos de produção ou desperdícios de materiais. SUMÁRIO56 GESTÃO DA PRODUÇÃO 4.3 CARACTERÍSTICAS DA MANUFATURA JUST IN TIME Com o propósito de atingir o seu objetivo maior (fornecer a quantidade certa de produto, na hora certa, com o nível certo de qualidade, no lugar certo, com maior produtividade e ao menor custo possível), um sistema JIT deve apresentar algumas características fundamentais. Tais características são apresentadas por Moreira (2012). 4.3.1 LOTES PEQUENOS Na produção de pequenos lotes reside uma das principais diferenças entre a manu- fatura JIT e a produção em massa. A adoção de lotes em pequenas quantidades permite a flexibilidade, pois produz diferentes composições ou grande diversidade de produtos rapidamente, sem sacrificar a eficiência em volumes menores de produ- ção. A produção em lotes pequenos, feitos na hora em que são demandados pelos clientes, leva a estoques menores, quer sejam de matérias-primas, de materiais em processo ou de produtos acabados. Da mesma forma que na produção em massa, na manufatura JIT, os estoques são encarados como um desperdício, pois os estoques consomem recursos. De uma maneira direta, ele eleva os custos, pois o processo aloca recursos para a produção de itens que não dão retorno imediato para a empresa (na forma de vendas). De forma indireta, os estoques também elevam os custos à medida que a empresa precisa destinar espaço em armazéns e tempo dos trabalhadores para gerenciar e acompanhar os níveis de estoque. Outro ponto a se ressaltar, é que os estoques escondem os problemas existentes na empresa em termos de má qualidade, tempos de espera muito longos e/ ou proje- tos defeituosos. Adicionalmente, os estoques podem ajudar a suportar os grandes tempos de espera nos pedidos ou os inconvenientes associados às programações de entrega pouco confiáveis. Fato é, que as empresas não podem simplesmente abandonar a ideia de utilizar estoques; da mesma forma, não será possível implantar quaisquer outras medidas 57 GESTÃO DA PRODUÇÃO SUMÁRIO que objetivem reduzir ou eliminar os desperdícios antes de tratar a causa real dos problemas que vêm a esconder (como exemplo, pode-se citar: atrasos nas entregas dos fornecedores, qualidade baixa, paradas de máquinas, absenteísmo, setups longos ou programação deficiente). À medida que os níveis de estoque baixam, tais problemas ficam mais evidentes. Ao invés de aumentar os níveis de estoque, o JIT procura tratar tais problemas e removê- -los da rotina da empresa. Para se produzir em lotes pequenos, é necessário pensar no custo de preparação de máquinas, ou seja, o custo de setup. Esse formato de produção exige que as máquinas estejam frequentemente sendo preparadas e, com isso, incorrendo em custos de setup. Esse custo é, em grande parte, função do tempo necessário para realizar o ajuste das máquinas. Portanto, setups rápidos são outra característica do JIT. 4.3.2 SETUPS RÁPIDOS Nos sistemas tradicionais de produção em massa, fabrica-se uma grande quantidade de um tipo de produto antes de se passar à produção de outro. Isso acontece devido aos grandes custos decorrentes do tempo necessário para a preparação de máqui- nas eequipamentos antes da sua efetiva utilização (setup). Essas ações de ajuste, que podem incluir recalibragem de equipamentos, limpeza, mudança de ferramentas/ componentes/ acessórios, podem ser observadas em momentos de troca de produ- ção (sair do produto A para o produto B), após a realização de atividades de manu- tenção e/ ou paradas programadas das linhas de produção. SUMÁRIO58 GESTÃO DA PRODUÇÃO Em uma fábrica de sucos, a atividade de limpeza dos tanques que realizam a mistura dos componentes e aditivos (corantes, vitaminas, conservantes, etc.) previamente à troca de produção pode ser considerada uma atividade de setup. Imagine que em um primeiro turno de trabalho aquela linha esteja produzindo um suco de uva e, em um segundo turno, temos programada a produção de um suco de laranja. Além da própria sanitização do tanque e da troca dos componentes a serem adicionados no processo produtivo, temos a necessidade de limpeza para evitar a mistura no gosto dos sabores e também nas cores (roxo do suco de uva se misturando ao amarelo do suco de laranja). No sistema tradicional de produção em massa, os elevados custos de setup levam as empresas à produção do maior número possível de unidades de um produto antes de realizarem a troca de ferramentas. O reflexo dessa abordagem na prática são os altos custos de estoque quer seja de matéria-prima, material em processo e/ ou produto acabado. FIGURA 10 - OPERÁRIO REALIZANDO SETUP EM UMA MÁQUINA CNC Fonte: SHUTTERSTOCK, 2019. A manufatura JIT tem obtido reduções em tempos de setup da ordem de horas para segundos com grande sucesso. Tempos menores de setup possibilitam que pequenos 59 GESTÃO DA PRODUÇÃO SUMÁRIO lotes podem ser produzidos, além de outros benefícios como o aumento do giro de capital da empresa, levando a um maior retorno do investimento por meio da maximização do tempo produtivo dos equipamentos. Além disso, menores estoques possibilitam uma melhor utilização do espaço da planta industrial, menos operações que não agregam valor (como manuseio de estoques) e menores perdas de material. Setups menos complicados simplificam a manutenção do local de trabalho e dimi- nuem as despesas operacionais. É o caso dos chamados setups externos, que podem ser realizados mesmo com a máquina em funcionamento. 4.3.3 PRODUÇÃO NIVELADA A demanda para certo produto pode oscilar, e frequentemente isso acontece, poden- do gerar ineficácia e desperdício. Na produção em massa, esse fenômeno é combati- do através do uso de estoques: a partir da previsão de demanda, gera-se a produção e também se gera os estoques. No caso da manufatura JIT, a ideia básica é combater o problema de instabilidade da demanda, fazendo pequenos ajustamentos, adotando um plano de produção e conservando-o por certo período. A isso damos o nome de “carga uniforme da fábri- ca” ou “nivelamento da programação da produção”. De modo a atender à demanda prevista ao mesmo tempo em que se opera com estoques baixos, é preciso idealizar uma programação de produção nivelada em que se observa a produção do mesmo mix de produtos por diversos períodos (turnos, dias, semanas, etc.) com a fabricação de pequenas quantidades de cada produto. Essa perspectiva logicamente contradiz os preceitos da produção em massa que é orientada à produção de grandes quantidades do mesmo produto, precedida de períodos de setup que culminam em grandes estoques. SUMÁRIO60 GESTÃO DA PRODUÇÃO 4.3.4 NOVO PAPEL DO TRABALHADOR Em comparação com as carreiras tradicionais dos sistemas de produção em massa (onde o trabalhador desenvolve níveis mais altos de conhecimento técnico e tende a tornar-se proficiente em áreas mais restritas de especialização), o empregado na manufatura enxuta combina as responsabilidades tradicionais de planejamento com as responsabilidades de execução. O trabalhador deve habituar-se a tomar decisões e a resolver problemas, tanto os do dia a dia da produção, como os decorrentes de situações atípicas, em que é funda- mental a familiaridade do trabalhador com seu ambiente de trabalho e com as técni- cas. Visto que a produção não possui mais os anteparos dos estoques, é necessário que a organização ataque agressivamente quaisquer causas de problemas. A força de trabalho na manufatura JIT deve ser flexível, e os trabalhadores devem ser polifuncionais. Uma força de trabalho flexível consegue se mover de uma área onde a empresa experimenta pouca demanda para áreas mais ativas. Por meio do trei- namento polifuncional, ou seja, pelo treinamento para a realização de mais de uma tarefa, uma empresa pode desenvolver uma força de trabalho flexível. Esse movimento, na direção de uma força de trabalho mais flexível, coloca maior demanda nos trabalhadores, exigindo que eles se movam além do papel de simples solucionadores de problemas para se tornarem recursos multi-habilitados. Dessa forma, o pagamento e a segurança no trabalho (estabilidade) não estão mais ligados apenas à senioridade. Eles devem refletir o número e tipo de habilidades dos empre- gados. Os trabalhadores da produção são constantemente orientados a monitorar a quali- dade do processo de produção. Isso inclui inspecionar seu próprio trabalho, bem como o material recebido de operações prévias. No JIT, é a qualidade na fonte que significa que todos os empregados são responsáveis por chegar até a causa raiz dos problemas de qualidade. Os trabalhadores devem também agir sobre a informação que coletam em sua roti- na diária. Conforme os trabalhadores habituam-se ao novo ambiente de respeito e responsabilidade, eles passam a desenvolver a iniciativa para a resolução de proble- mas. Essa atitude acabará por mostrar-se muito mais eficaz do que simplesmente 61 GESTÃO DA PRODUÇÃO SUMÁRIO passar a solução de problemas para a responsabilidade de alguma outra pessoa. 4.3.5 QUALIDADE NA FONTE A concepção de qualidade na fonte está relacionada ao ato de descobrir a origem dos problemas de qualidade e solucioná-los de modo que estes não emerjam em uma nova oportunidade. Para tanto, é preciso que os trabalhadores possuam responsabilidade quanto à quali- dade das atividades que realizam, bem como a autonomia para parar a produção quando identificarem o surgimento de um problema (no tópico Paradas de produ- ção você entenderá melhor). Para Moreira (2012), a qualidade na fonte é determi- nada no momento em que um produto é feito, pois nenhuma inspeção a posteriori poderá fazer melhor esta captação. Faz parte desse conceito a ideia de que qualquer pessoa envolvida em um processo de transformação deva se ver como um fornecedor de um ou mais clientes internos. A qualidade dos resultados dos estágios posteriores da produção depende do que se recebe, isto é, da qualidade de seus insumos. O custo da qualidade deficiente aumenta quando se incluem problemas, como conserto do projeto, retrabalho e refugo de produtos que não podem ser retrabalha- dos, produtos com defeito que retornam dos clientes etc. Algumas das causas asso- ciadas a retrabalhos e refugos são: • Projeto de produto envolvendo defeitos no conceito: as necessidades do consumidor podem ser mal-entendidas e não serem incorporadas no produ- to ou no projeto do produto. • Projeto do processo: problemas de gerência e de equipamentos podem advir do projeto do processo de produção (na visão da qualidade, os erros dos opera- dores correspondem a apenas 15% dos problemas de qualidade). • Componentes defeituosos que são enviados pelos fornecedores: existe uma preocupação com a qualidade assegurada no fornecedor, para se ter certeza de que os problemas de qualidade não aparecerão. Os problemas de quali- dade causados por fornecedores incluem desde materiais de baixa qualidade até a falta de entendimento entre fabricante e o fornecedor. • Empregados mal treinados (ou mal selecionados): os trabalhadores não têm SUMÁRIO62 GESTÃO DA PRODUÇÃO ashabilidades necessárias para realizar seu trabalho. • Equipamentos em más condições: os equipamentos não conseguem produzir com alta qualidade de maneira consistente. 4.3.6 TECNOLOGIA DE GRUPO A tecnologia de grupo é encarada como um tipo de arranjo que reúne todos os equi- pamentos necessários para a completa produção de uma família de peças similares, ligando assim todas as operações em um processo particular. A base da tecnologia de grupo é o conceito de famílias de peças ou grupos de peças similares. Por trás dessas similaridades, podem existir características comuns dos projetos ou de neces- sidades de manufatura. Após o agrupamento dessas peças em famílias que compartilham algumas caracte- rísticas importantes, é possível organizar uma célula para cada família. Essa célula irá congregar todo o equipamento e as instalações necessárias para fazer exatamente aquele conjunto de peças. O layout final coloca as máquinas na sequência ótima para produzir as peças da família. Comumente, esse layout apresenta a forma de um U (ou C), e o operador, situado em uma posição central, desempenha todas as atividades necessárias para a produção de cada unidade de produto. Ao comparar o layout celular (PAOLESCHI, 2014) com os layouts funcionais clássi- cos, veremos que o primeiro tende a encurtar distâncias entre as operações, fazen- do com que os tempos de espera entre operações sejam reduzidos. Outro ponto é o fato de que o volume de material em processo diminui, à medida que o fluxo de materiais é suavizado. 63 GESTÃO DA PRODUÇÃO SUMÁRIO O layout celular é uma configuração do arranjo físico normalmente disposta em forma de C ou U e que contempla um grupo de máquinas e equipa- mentos necessários para a realização de um conjunto amplo de atividades a serem realizadas pelo trabalhador. Com essa configuração, um número reduzido de trabalhadores com um conjunto de competências similares (por exemplo, o treinamento na utilização daqueles equipamentos) é posi- cionado de modo a formar uma célula de produção multitarefa. Como bene- fício desta estrutura, temos o baixo tempo para transporte de materiais entre uma atividade e outra, dada a proximidade dos trabalhadores e a possibi- lidade de revezamento de atividades, minimizando assim a monotonia ao longo do turno de trabalhado. 4.3.7 MANUTENÇÃO PREVENTIVA Tida como um importante aspecto da contínua busca pela qualidade da função produção, a manutenção preventiva envolve a realização regular e programada de inspeções e ações de manutenção, de modo a manter as máquinas operando com elevado grau de confiabilidade. Apesar da impressão inicial de que a manutenção preventiva é um processo caro, é possível observar que, em geral, ela se torna muito mais viável do que arcar com as paradas repentinas da produção. No sistema JIT, as atividades rotineiras de manutenção, incluindo limpeza, lubrificação, recalibragem e outros ajustes são realizadas pelos próprios operadores. SUMÁRIO64 GESTÃO DA PRODUÇÃO Os funcionários associados à área de produção que acumulam também as funções de manutenção rotineira são comumente denominados de opera- dores-mantenedores. 4.3.8 PARCERIAS COM FORNECEDORES Os fornecedores impactam no processo JIT na medida em que entregam insumos satisfazendo aos requisitos de quantidade certa e qualidade na fonte. Empresas JIT constroem relacionamentos em longo prazo com seus fornecedores, assumindo que os mesmos são parceiros e atuam como uma espécie de fábrica externa. Os sistemas JIT comumente apresentam um número de fornecedores muito menor do que nos sistemas tradicionais. Apresentam ainda a tendência a mudar para fornecedores únicos que entregam uma família inteira de peças e que desenvolvem os seguintes papéis: • Fontes de conhecimento na solução de problemas. • Praticantes do princípio de qualidade na fonte. • Comunicadores no momento certo. • Participantes em programas de redução de custos. 4.3.9 MELHORIA CONTÍNUA (KAIZEN) Elemento fundamental na filosofia Just in Time, o conceito de melhoria contínua implica que a empresa deve continuar e ativamente trabalhar, sem considerar qual- quer melhoria como definitiva (MOREIRA, 2012, p. 513). Esta noção de melhoria contínua pode ser observada na busca incessante pela redução do número de defei- tos, diminuição dos custos operacionais e de setup, bem como nos níveis de estoque. A palavra japonesa kaizen projeta a ideia de melhoria contínua. É a partir desta ideia que todos (da alta gerência até os funcionários da operação) são orientados a esse objetivo único. Moreira (2012, p. 514) destaca: 65 GESTÃO DA PRODUÇÃO SUMÁRIO “Uma conseqüência imediata do conceito de melhoria contínua é que o pro- cesso de implementação da filosofia Just in Time não começará e terminará em períodos definidos de tempo. Reduções no estoque têm de ser precedi- das por melhorias na qualidade, mudanças no layout, reduções nos setups e treinamento do empregado. Na medida em que as melhorias são feitas, o estoque pode ser diminuído. Na medida em que novos problemas se tornam visíveis, devem ser resolvidos antes que novas reduções no estoque possam ser feitas. Este é um processo contínuo e gradual, e a implementação nunca estará completa”. Para Corrêa e Corrêa (2019, p. 175), a palavra japonesa kaizen significa melhoramen- to, melhoramento contínuo e continuado. Para os autores, a melhoria contínua deve ser praticada e é responsabilidade de todos, da alta gerência até os trabalhadores da linha de frente. O aspecto essencial do kaizen é que os melhoramentos sugeri- dos pelas equipes de trabalho e analisados pelos comitês de avaliação são imple- mentados de forma contínua. Esses melhoramentos têm como base aspectos, como processos, fluxos e métodos de trabalho, arranjo físico de equipamentos e instala- ções, entre outros. 4.3.10 RESPEITO PELAS PESSOAS O envolvimento das pessoas é um elemento de grande importância no sistema JIT. As pessoas devem ser atuantes no atingimento das necessidades dos consumido- res, pois, na filosofia JIT, as pessoas são o bem mais valioso de uma empresa. Moreira (2012) ressalta que “para que os trabalhadores deem o seu melhor, é preciso existir respeito verdadeiro”. É preciso que os empregados sintam-se seguros; logo, os siste- mas JIT são caracterizados pela grande autonomia e responsabilidade dos funcioná- rios. 4.3.11 PARADAS DE PRODUÇÃO Na produção em massa, os estoques são usados para mascarar problemas na produ- ção ou qualidade do produto final. No JIT, procura-se a qualidade desde a fonte, o que requer a solução imediata dos problemas. Dessa forma, os trabalhadores são encorajados a identificar e corrigir problemas e pesquisar cada um deles até a sua causa raiz, de forma que os mesmos não ocorram novamente. SUMÁRIO66 GESTÃO DA PRODUÇÃO Para ajudar na identificação das causas raiz e solução dos problemas, são instituídos sistemas de paradas de linha. Nesses sistemas, a mera constatação de que existe um problema a ser corrigido permite que um trabalhador pare o processo para consertá- -lo imediatamente, antes de permitir que ele provoque resultados indesejáveis. Uma das ferramentas utilizadas juntamente ao sistema de paradas de linhas é o Diagrama de Ishikawa (também chamado de Diagrama de Causa e Efei- to ou Espinha de peixe), em que as causas dos problemas são analisadas de acordo com seis categorias (os seis M), a saber: Material, Método, Meio Ambiente, Medida, Mão de Obra e Máquina. FIGURA 11 - DIAGRAMA DE ISHIKAWA Fonte: SHUTTERSTOCK, 2019. 67 GESTÃO DA PRODUÇÃO SUMÁRIO 4.3.12 PADRONIZAÇÃO E SIMPLIFICAÇÃO Nos sistemas JIT, busca-se a eliminação dos passos desnecessários em todos os processos de produção. A isso, damos o nome de simplificação. Já a padronização é caracterizada como o esforço desenvolvido para substituir quaisquer métodos de trabalho inconsistentes por rotinas padrão, de fácil aprendizado e à prova deerros. 4.3.13 AMBIENTE DE TRABALHO A preocupação com o ambiente de trabalho nos sistemas está relacionada tanto ao respeito às pessoas quanto à qualidade. De acordo com Moreira (2012, p. 515), ordem e simplicidade são consideradas altamente importantes, pois “um ambiente organizado cria uma mente calma e clara, enquanto um ambiente desorganizado cria pensamentos desorganizados”. Nos sistemas JIT, cada trabalhador é responsável pela limpeza do seu equipamento e de suas ferramentas depois do uso, bem como guardá-los no local apropriado. FIGURA 12 - LIMPEZA E ORGANIZAÇÃO DO LOCAL DE TRABALHO Fonte: SHUTTERSTOCK, 2019. SUMÁRIO68 GESTÃO DA PRODUÇÃO CONCLUSÃO Ao longo desta unidade, você foi apresentado à filosofia Just in Time de produção. Você pôde entender suas origens e perceber que, apesar da nova forma de pensar a produção, essa abordagem tem suas raízes no sistema fordista tradicional como já conhecemos. Contudo, você agora já pode entender como essa abordagem trata, de maneira diferenciada, a relação entre produção e atendimento à demanda. Agora, você já está mais seguro quanto às formas de balanceamento do ritmo de produção e de minimização dos níveis de estoques intermediários, de matérias-primas e de produtos finais. Esta inclusive pode ser uma potencial área de especialização do seu trabalho. Levar às empresas a visão de diminuição dos estoques, a partir do balanceamento do ritmo de produção, por meio das demandas implantadas. Você pode ser um agente de mudança nas rotinas de trabalho de uma empresa. Basta seguir com os estudos e buscar cada vez mais a sua atualização. Bons estudos e até a próxima! 69 GESTÃO DA PRODUÇÃO SUMÁRIO OBJETIVO Ao final desta unidade, esperamos que possa: > Discutir as diferentes abordagens da qualidade. > Ilustrar a evolução histórica da qualidade. > Aplicar os modelos de diagnóstico de problemas de qualidade. UNIDADE 5 SUMÁRIO70 GESTÃO DA PRODUÇÃO 5 GESTÃO DA QUALIDADE Conforme os mercados vão se tornando mais competitivos e os clientes mais exigen- tes, as organizações precisam desenvolver mecanismos para tratar eventuais proble- mas ou limitações em seus produtos e/ou serviços. Assim, ao longo dos tempos, as empresas passaram a desenvolver o conceito da gestão da qualidade para tratar falhas e também desenvolver características em seus processos produtivos. Assim, nesta unidade, você vai conhecer os principais aspectos das diferentes concepções de qualidade, bem como sua evolução histórica. Por fim, essas concepções serão levadas para o contexto prático do diagnóstico de problemas de qualidade nos processos produtivos. 5.1 DEFININDO A QUALIDADE Para Paladini1 (2012), definir a qualidade não é uma tarefa fácil. Desde os trabalhos iniciais de Joseph M. Juran, considerado por muitos o “pai da qualidade”, a ideia de um conceito único para a qualidade se mostra algo ainda distante de um consenso. Distanciando-se dessa ideia de homogeneização do conceito, muitos autores partem para um conjunto de definições amparadas na premissa de que a qualidade é algo necessário, imprescindível e que leva resultados empresariais sustentáveis (FEO; JURAN, 2015). Mais do que a premissa de algo imprescindível, a qualidade é tradicionalmente defi- nida a partir de algumas dimensões ou abordagens. Na abordagem transcendental, a qualidade é sinônimo de excelência inata, algo que é universalmente reconhecível, como, por exemplo, um carro esportivo de referência, como uma Lamborghini. Na abordagem baseada em produto, a qualidade é uma variável precisa refletida em atributos e passível de mensuração. Nessa abordagem, a ideia principal é a de que a maior qualidade só será obtida com maior custo. Na abordagem baseada na produção, a qualidade também é enxergada como atributos mensuráveis, contudo, o grau de qualidade aumenta conforme se observa a aderência com o projeto do produto. Logo, quanto maior a conformidade com o projeto, maior a qualidade. Um exemplo dessas abordagens seria o acompanhamento de variáveis como o peso e as 71 GESTÃO DA PRODUÇÃO SUMÁRIO dimensões de uma embalagem de biscoitos. Aquelas que se encontram dentro dos parâmetros previstos em projeto serão consideradas dentro do padrão de qualidade. As abordagens baseadas no usuário e no valor são mais difíceis de definir ou mensu- rar. Na primeira delas, a qualidade é uma variável subjetiva e está baseada na expec- tativa do usuário. Logo, os produtos de melhor qualidade são aqueles que atendem melhor aos desejos do consumidor. A abordagem baseada em valor contempla dois conceitos anteriores, a saber: excelência e valor. Assim, destacam-se os trade-offs entre qualidade e preço. Nesta abordagem, são enfatizados os resultados da engenharia de valor no sentido de se dar destaque aos itens que agregam valor aos produtos e/ ou serviços independentes dos seus preços. 5.1.1 EVOLUÇÃO HISTÓRICA DA QUALIDADE Apesar da grande difusão da absorção dos diferentes conceitos de qualidade, é preci- so salientar que a visão do que é qualidade sofreu modificações ao longo do tempo. Assim como as concepções previamente apresentadas, a forma como a qualidade era encarada de maneira prática dentro das empresas mudou ao longo do tempo e sofreu modificações em função dos momentos históricos e dos contextos ambientais do mercado. Para Paladini (2012), a interpretação do conceito de qualidade e sua evolução se dão à luz do ambiente produtivo vigente na época. A interpretação começa tendo como base o trabalho de um artesão. Esse profissional era tido como um especialista responsável pelas várias etapas do processo produti- vo, desde a concepção, passando pela manufatura, até a pós-venda de um produto. Nesse sentido, era possível perceber, mesmo que indiretamente, aspectos da moder- na gestão da qualidade na medida em que o artesão buscava o atendimento direto às necessidades dos clientes. Em contrapartida, o controle de qualidade estava volta- do diretamente ao produto e não ao processo. Com a chegada da Revolução Industrial, a customização foi substituída pela padroni- zação e os altos volumes de produção. O advento da máquina a vapor proporcionou a invenção de máquinas orientadas à produção em larga escala, demandando, assim, uma nova forma de organização do trabalho. Essa nova organização fora obtida a partir da estruturação das linhas de montagem em que as atividades necessárias à produção eram sequenciadas, e os trabalhadores SUMÁRIO72 GESTÃO DA PRODUÇÃO respondiam agora por apenas uma fração do processo produtivo. A noção de quali- dade relacionada a essa configuração era a da inspeção (com isso, surge também a figura do inspetor de qualidade). O objetivo era identificar e retirar da linha de produ- ção os itens que apresentassem não conformidades, configurando uma abordagem puramente corretiva. A partir das linhas de montagem derivadas do modelo fordista, surgiram concei- tos importantes, como a intercambiabilidade e o sistema padronizado de medida de peças. Esses conceitos deram subsídios para o desenvolvimento de uma área de grande importância na qualidade: a metrologia. Além disso, observa-se o desenvol- vimento de aspectos como: sistema de medidas, especificações e tolerância. Esse desenvolvimento e seus efeitos migraram também para outras aplicações industriais fora da indústria automotiva. De acordo com o site do Inmetro (2019), a Metrologia “é a ciência que abrange todos os aspectos teóricos e práticos relativos às medições, qual- quer que seja a incerteza em qualquer campo da ciência ou tecnologia. Nesse sentido a Metrologia Científica e Industrial é uma ferramenta funda- mental no crescimento e inovação tecnológica, promovendo a competiti- vidade e criando um ambiente favorável ao desenvolvimento científico e industrial em todo e qualquer país”. Para conhecer um pouco mais sobre a Metrologia e suas áreas de atuação (como a metrologialegal, industrial e nas ciências da vida), você pode acessar os sites do Inmetro e da Sociedade Brasileira de Metrologia. 73 GESTÃO DA PRODUÇÃO SUMÁRIO A intercambiabilidade pode ser entendida como a propriedade que um material, componente ou peça tem de ser montada, substituída ou encaixa- da com outro item sem a necessidade de ajustes ou adaptações. FIGURA 13 - ALGUNS INSTRUMENTOS UTILIZADOS NA METROLOGIA E NO CONTROLE DA QUALIDADE Fonte: SHUTTERSTOCK, 2019. Na década de 1930, são desenvolvidos os primeiros trabalhos voltados à normali- zação, como a norma britânica British Standard 600 (BS600) e a americana Ameri- can War Standards Z1.1-Z1.3, ambas orientadas ao controle estatístico da qualida- de. Na década seguinte, surgem as primeiras associações de profissionais da área de qualidade nos Estados Unidos: a Society of Quality Engineers, em 1945, e a American Society for Qualiry Control – ASQC, em 1946. O grande nome associado ao desenvolvimento dos gráficos de controle estatístico SUMÁRIO74 GESTÃO DA PRODUÇÃO da qualidade é Walter A. Shewhart. O desenvolvimento dessa abordagem reflete a mudança de paradigma da qualidade, realizando a transição da postura corretiva para uma postura de prevenção, monitoramento e controle. Shewhart também é lembrado pela introdução do conceito de melhoria contínua e a proposta do ciclo PDCA (Plan, Do, Check and Act), posteriormente difundido por W. Edwards Deming. Apesar de já apresentar aspectos de proatividade nessa abordagem, a área de quali- dade nesse período ainda era tida como de responsabilidade de inspetores e espe- cialistas, deixando, assim, pouca ou nenhuma participação por parte dos trabalhado- res nos processos de melhoria da qualidade. A década de 1950 apresenta a terceira fase da evolução da qualidade, que é denomi- nada garantia da qualidade. Sua origem está associada à primeira abordagem sistê- mica da qualidade proposta por Armand Feigenbaum, denominada de controle da qualidade total (do inglês Total Quality Control – TQC). Sua premissa era a de que a qualidade deveria envolver todas as áreas da organização e não apenas o setor produ- tivo. Essa abordagem viria a influenciar fortemente as normas da série ISO 9000, cuja primeira versão é de 1987. A quarta fase é denominada gestão da qualidade e começou a ser desenhada no Japão do pós-guerra, quando especialistas americanos, como E. Edwards Deming e Joseph M. Juran, participaram do seu programa de reconstrução. Nesse período, esses especialistas, juntamente com a Japanese Union of Scientists and Engineers (JUSE), difundiram os conceitos e técnicas da qualidade que foram recebidos com muito entusiasmo pelas empresas japonesas. A referida evolução da noção de qualidade pode ser sintetizada no quadro a seguir, que apresenta para cada uma das fases da qualidade o foco, visão e ênfase dada à qualidade, bem como os métodos empregados, o papel executado pelos profissio- nais e os departamentos responsáveis dentro das empresas. 75 GESTÃO DA PRODUÇÃO SUMÁRIO QUADRO 4 - EVOLUÇÃO DA QUALIDADE FASE DA QUALIDA- DE FOCO VISÃO ÊNFASE MÉTODOS PAPEL DOS PROFISSIO- NAIS RESPON- SÁVEL INSPEÇÃO Verifica- ção Um proble- ma a ser resolvido Um problema a ser resol- vido Um proble- ma a ser resolvido Inspeção, classificação, contagem, avaliação e reparo Departa- mento de Inspeção CONTRO- LE ESTA- TÍSTICO Controle Um proble- ma a ser resolvido Uniformi- dade do produ- to com menos inspeção Ferramen- tas e técni- cas estatís- ticas Solução de problemas e a aplicação de métodos estatísticos Departa- mentos de Fabricação e Engenha- ria (Controle de Qualida- de) GARAN- TIA Coorde- nação Um proble- ma a ser resolvido, mas que é enfrentado proativa- mente. Toda cadeia de fabrica- ção, desde o proje- to até o mercado, e a contri- buição de todos os grupos funcionais para impe- dir falhas de quali- dade Programas e sistemas. Planejamen- to, medição da qualidade e desenvol- vimento de programas. Todos os departa- mentos, com envol- vimento superficial da alta adminis- tração no planeja- mento e execução das dire- trizes da qualidade. Gestão Impacto estraté- gico Uma opor- tunidade de diferen- ciação da concorrência As neces- sidades de mercado e do cliente Planeja- mento estratégico, estabeleci- mento de objetivos e a mobi- lização da organiza- ção Planejamen- to estratégi- co, estabele- cimento de objetivos e a mobilização da organiza- ção Todos na empresa, com a alta administra- ção exer- cendo forte liderança. Fonte: adaptado de PALADINI (2015). SUMÁRIO76 GESTÃO DA PRODUÇÃO 5.1.2 GESTÃO DA QUALIDADE NO PROCESSO PRODUTIVO Para Paladini (2012, p. 20), conforme o conceito de qualidade total foi sendo incor- porado às empresas, componentes operacionais, como a gestão da qualidade no processo produtivo, passaram a sofrer impactos. O autor dá destaque especial à forma como as falhas dos processos de manufatura passaram a ser acompanhadas e eventualmente tratadas pela gestão a partir do prisma da gestão da qualidade. Assim, propõe-se um modelo gerencial que mune a área de processos ou produção com uma abordagem para a obtenção da qualidade no processo produtivo. Segun- do o autor: Nota-se, com efeito, que a maioria das estratégias desenvolvidas para tanto prioriza o processo produtivo. Foi apenas mais recentemente que começou o esforço de criar técnicas que visam analisar [...] ação de concorrentes, [...] Nota-se, de fato, que por muito tempo a qualidade era avaliada em produtos e serviços, centrando-se a atenção em resultados de atividades ou efeitos de ações bem definidas. [...] Há quem considere que o esforço para agregar qua- lidade ao processo produtivo gerou uma nova era no esforço pela qualidade. Criaram-se, a partir daí, novas prioridades e novas posturas gerenciais. A ênfa- se, agora, parece ser a análise das causas e não mais a atenção exclusiva a efei- tos. Nesse novo contexto, surge a Gestão da Qualidade no processo, definida como o direcionamento de todas as ações do processo produtivo para o pleno atendimento do cliente. (PALADINI, 2015, p. 21) Logo, o modelo voltado à análise e ao tratamento das causas de não conformidades é subdividido em três etapas, a saber: a eliminação de perdas; a eliminação das causas das perdas; e a otimização do processo. O quadro a seguir sumariza as características de cada etapa. 77 GESTÃO DA PRODUÇÃO SUMÁRIO QUADRO 5 - MODELO DE GESTÃO DA QUALIDADE NO PROCESSO PRODUTIVO ETAPA ATIVIDADES CARACTERÍSTI- CAS NATUREZA DAS AÇÕES PRIORIDADE OBSERVA- ÇÕES ELIMINAÇÃO DE PERDAS Eliminação de defeitos e esfor- ços inúteis a partir do emprego de programas de redução dos erros da mão de obra e minimização dos custos de produ- ção. Corretivas visando elimi- nar falhas em elementos espe- cíficos do proces- so e com resulta- dos imediatos. Minimizar desvios da produção. Eliminação de desperdícios sem necessaria- mente modifi- car o processo. ELIMINAÇÃO DAS CAUSAS DAS PERDAS Controle estatís- tico do processo e desenvolvimen- to de projetos de experimentos para o estudo das causas de defeitos. Preventivas com ênfase na elimi- nação de causas de falhas, objeti- vando o aumen- to do desem- penho após a correção dessas causas. Os resultados eram obtidos frequentemente no médio prazo. Eliminar elementos que prejudiquem os proces- sos evitando, assim, situa- ções que possam condu- zir a desvios de produção. A perda nessa etapa é consi- derada toda e qualquer ação que impacte na adequação do produto ao seu uso efetivo. OTIMIZAÇÃO DO PROCESSO Qualidade é compreendida como adequação ao uso e não mais como a ausência de defeitos. Dessa forma, objetiva- -se o aumento da produtividade e da capacidade opera- cional da empresa a partir da melhor alocação dos seus recursos (humanos, materiais, financei- ros, etc.). Desenvolvimen-to de atividades que gerem resul- tados benéficos para a empresa de forma durável e sustentável. As ações realizadas são abrangen- tes e focadas no processo como um todo e não apenas em uma etapa deste. Definir aquilo que o proces- so apresenta de melhor no presente e identificar as suas opor- tunidades de melhoria. Única etapa que efetiva- mente agre- ga valor ao processo e, por consequência, ao produto. Fonte: adaptado de PALADINI (2012). SUMÁRIO78 GESTÃO DA PRODUÇÃO Paladini (2012) destaca dois aspectos relativos à última etapa do modelo: a consistência com a noção de melhoria contínua e o direcionamento do processo aos objetivos globais da empresa, reforçando, assim, a harmoniza- ção das metas operacionais, táticas e estratégicas. 5.1.2.1 DIAGNÓSTICO DOS PROBLEMAS DE QUALIDADE Slack et al. (2018, p. 648) destacam a importância de se alinharem as visões de quali- dade do cliente e da operação no processo de diagnóstico dos eventuais problemas de qualidade de um produto ou serviço. Para os autores, “para criar uma visão unifi- cada, a qualidade pode ser definida como o grau de adequação entre as expectativas e as percepções dos clientes sobre o serviço ou produto” (SLACK et al., 2018, p. 648). Dessa maneira, um produto ou serviço apresentará uma baixa qualidade percebida quando se observar uma lacuna muito grande entre as expectativas que os clientes tinham em relação àquele produto ou serviço e a efetiva percepção que os clientes têm ao utilizar ou experimentar o produto ou serviço. Analogamente, o produto ou serviço apresentará alta qualidade percebida quando houver uma lacuna (positiva) entre a percepção dos clientes e aquilo que estes esperavam do produto ou serviço. A figura a seguir ilustra tal concepção. 79 GESTÃO DA PRODUÇÃO SUMÁRIO FIGURA 14 - QUALIDADE EM FUNÇÃO DA EXPECTATIVA E PERCEPÇÃO DOS CLIENTES Fonte: SLACK et al. (2018). Os autores detalham ainda mais o processo de diagnóstico dos problemas de quali- dade ao apresentarem uma tipologia das lacunas entre a percepção e a expectativa dos clientes, a especificação de qualidade definida pela empresa e as reais caracte- rísticas do produto ou serviço. As lacunas são as seguintes (SLACK et al., 2018, p. 649): • Lacuna 1 – a lacuna entre a especificação do cliente e a especificação da opera- ção. A qualidade percebida pode ser ruim porque pode haver incompatibili- dade entre a especificação de qualidade da própria organização e a especifi- cação que é esperada pelo cliente. Por exemplo, um carro pode ser projetado para necessitar de assistência técnica a cada 10 mil quilômetros, mas o cliente pode ter expectativa de intervalos de assistência técnica de 15 mil quilôme- tros. • Lacuna 2 – a lacuna entre o conceito e a especificação. A qualidade percebida pode ser ruim porque há incompatibilidade entre o conceito do produto ou serviço e a forma como a organização especificou internamente a qualidade do produto ou serviço. Por exemplo, o conceito de um carro pode ter sido defi- nido como um meio de transporte barato e eficiente em consumo de combus- tível, mas a inclusão de um sistema de ar-condicionado pode ter aumentado seu custo e o tornado menos eficiente no consumo de combustível. • Lacuna 3 – lacuna entre a especificação da qualidade e a qualidade real. A qualidade percebida pode ser ruim porque há divergência entre a qualidade SUMÁRIO80 GESTÃO DA PRODUÇÃO real e a especificação de qualidade interna (frequentemente denominada “conformidade à especificação”). Por exemplo, a especificação de qualidade interna para um carro pode ser a folga entre suas portas e a lataria, quando fechadas, não exceder 7 milímetros. Todavia, em razão de equipamento inade- quado, a folga, na verdade, é de 9 milímetros. • Lacuna 4 – lacuna entre a qualidade real e a imagem comunicada. A qualida- de percebida pode ser ruim porque há uma lacuna entre as comunicações externas da organização ou imagem de mercado e a qualidade real entregue ao cliente. Isso pode ocorrer porque a função marketing criou expectativas ou operações inatingíveis e não é capaz de atingir o nível de qualidade esperado pelo cliente. Por exemplo, uma campanha de propaganda de uma linha aérea pode mostrar uma comissária oferecendo-se para substituir a camisa de um cliente na qual caiu comida ou bebida, embora esse serviço possa não estar, de fato, disponível se isso ocorrer. Complementarmente, os autores apresentam a seguinte ilustração do modelo: FIGURA 15 - MODELO DE LACUNAS PARA DIAGNÓSTICO DE PROBLEMAS DE QUALIDADE 81 GESTÃO DA PRODUÇÃO SUMÁRIO Fonte: SLACK et al. (2018). Juntamente com os modelos para diagnóstico de problemas de qualidade, alguns autores, como Corrêa e Corrêa (2019), apresentam uma série de ferramentas bastan- te tradicionais na qualidade. A seguir, serão apresentadas três dessas ferramentas com breves ilustrações de como funcionam. 1. Diagramas de processo – representação gráfica de todas as etapas de um processo produtivo a partir da simbologia das suas principais atividades, como ação, transpor- te, inspeção, armazenagem e espera. SUMÁRIO82 GESTÃO DA PRODUÇÃO Corrêa e Corrêa (2019, p. 166) apresentam um exemplo de processo produ- tivo representado via diagrama de processo. A figura a seguir representa o processo de produção de peças por meio de injeção de plástico em um centro produtivo. Perceba que, adicionalmente à ilustração da atividade, a forma de diagrama apresenta o tempo e a distância percorrida acumulados ao longo do processo. FIGURA 16 - EXEMPLO DE DIAGRAMA DE PROCESSO Fonte: CORRÊA; CORRÊA (2019). 2. Análise (ou diagrama) de Pareto – estrutura que classifica em ordem decrescente os problemas que apresentam maior contribuição, de modo que possam ser ataca- dos de forma prioritária. De acordo com Corrêa e Corrêa (2019, p. 167), “dessa forma, a capacidade de solução disponível será direcionada exatamente para onde os resul- tados sejam maximizados de forma mais intensa”. 83 GESTÃO DA PRODUÇÃO SUMÁRIO No exemplo apresentado por Corrêa e Corrêa (2019, p. 168), temos uma análi- se de Pareto realizada com a contribuição de cada fornecedor para o total de defeitos identificados em um dado processo produtivo. Perceba que os forne- cedores O, D e G somados representam 75,16% dos problemas de qualidade encontrados. Logo, os gestores do processo podem focar seus esforços na reso- lução dos problemas relativos a esses três fornecedores e nessa ordem, pois, assim, estarão eliminando quase a totalidade dos problemas de qualidade. Exemplo de aplicação de análise de Pareto para erros de fornecedores: QUADRO 6 - ANÁLISE DE PARETO PARA ERROS DE FORNECEDORES Fonte: CORRÊA; CORRÊA (2019). SUMÁRIO84 GESTÃO DA PRODUÇÃO FIGURA 17 - RESULTADO DA ANÁLISE DE PARETO PARA ERROS DE FORNECEDORES Fonte: CORRÊA; CORRÊA (2019). 3. Diagramas de causa e efeito – também chamados de diagramas de Ishikawa ou “espinha de peixe”, são comumente utilizados em conjunto com diagramas de Pare- to para a identificação das causas raiz dos problemas de qualidade. Neste exemplo, também apresentado por Corrêa e Corrêa (2019, p. 168) tem-se uma situação mais completa. Iniciou-se a análise de Pareto dos prin- cipais defeitos observados em um processo produtivo. Exemplo: 85 GESTÃO DA PRODUÇÃO SUMÁRIO Exemplo de análise de Pareto QUADRO 7 - ANÁLISE DE PARETO Fonte: CORRÊA; CORRÊA (2019). FIGURA 18 - RESULTADO DA ANÁLISE DE PARETO Fonte: CORRÊA; CORRÊA (2019). Perceba que o tipo “pintura danificada” foi considerado o principal problema de qualidade a ser enfrentado. Logo, a nossa abordagem “conjunta” vai se debruçar por meio do diagrama de causa e efeito a investigar a causa raiz desse problema. A figura a seguir ilustra o diagrama de causa e efeito para o problema de pintura danificada (posicionado à direita do diagrama). A construção do diagrama é normal- mente elaborada tomando como base seisdimensões de análise, os chamados 6M, a SUMÁRIO86 GESTÃO DA PRODUÇÃO saber: máquina, mão de obra, medida, material, método e meio ambiente. Cada uma dessas dimensões formará um grande eixo onde as possíveis causas (e as causas das causas) para o problema serão posicionadas. Ou seja, o problema a ser analisado será decomposto em possíveis causas que se enquadram nessas categorias. Para o exemplo apresentado, uma possível causa para o problema de pintura dani- ficada está associada a uma aplicação de tinta que está sendo realizada fora dos parâmetros de pressão (causa), pois o instrumento de leitura – manômetro – pode estar com defeito (causa da causa). Logo, observa-se uma possível e factível relação de causa e efeito para esse problema, que se refere exclusivamente a problemas de medição. Logo, está posicionada na categoria de medida. Da mesma forma, pode- mos ter o problema de pintura danificada em função de uma corrosão após a ativi- dade de decapagem (causa) decorrente de excesso de umidade do ambiente (causa da causa), causas essas associadas à categoria de meio ambiente. FIGURA 19 - EXEMPLO DE DIAGRAMA DE CAUSA E EFEITO PARA O PROBLEMA DE PINTURA DANIFICADA Fonte: CORRÊA; CORRÊA (2019). 87 GESTÃO DA PRODUÇÃO SUMÁRIO Para saber mais sobre outras ferramentas da qualidade, como, por exem- plo, os gráficos de correlação, histogramas, cartas de controle e folhas de verificação, você pode acessar o capítulo 6 do livro Administração de Produção e Operações de Henrique L. Corrêa e Carlos A. Corrêa, disponível no Minha Biblioteca. CONCLUSÃO Nesta unidade, você pôde conhecer um pouco mais sobre as diversas abordagens dadas à qualidade dentro dos processos produtivos. Contudo, foi discutido inicial- mente o fato de que a qualidade não é um conceito simples e de fácil concepção. Para tanto, foi apresentado um conjunto de conceitos associados à qualidade em função da abordagem (do cliente, do produto, transcendental, etc.). Dando conti- nuidade ao delineamento da qualidade, foi apresentado um breve histórico da evolução da qualidade e das abordagens dadas a ela ao longo do tempo. Mais especificamente, para cada era da qualidade, apresentaram-se o foco, ferramentas e responsáveis dentro das organizações. Trazendo a noção de qualidade para os processos produtivos, foram apresentadas as abordagens desenvolvidas por Paladini e Slack et al., respectivamente para a gestão da qualidade e para o diagnóstico de problemas de qualidade em proces- sos produtivos. Esta, inclusive é uma boa oportunidade profissional para o seu início de carreira. Levar tais abordagens como forma de tratamento de não confor- midades dos processos produtivos das empresas pode gerar um grande diferencial profissional para você. Assim sendo, bons estudos e até a próxima! SUMÁRIO88 GESTÃO DA PRODUÇÃO OBJETIVO Ao final desta unidade, esperamos que possa: > Discutir o papel da produção na utilização dos recursos naturais. > Definir o triple bottom line e a pegada ambiental. > Ilustrar as etapas do processo de implantação da produção mais limpa. UNIDADE 6 89 GESTÃO DA PRODUÇÃO SUMÁRIO 6 PRODUÇÃO MAIS LIMPA Conforme a humanidade avança tecnologicamente, as suas demandas passam a ser impostas de forma não linear apesar de muitas vezes não necessárias. Estamos ansio- sos pela chegada de um novo modelo de smartphone mesmo tendo adquirido um aparelho há menos de um ano. Nossos carros são recheados de tecnologias que não podemos utilizar, pois estamos em um mesmo ponto do congestionamento há cerca de 40 minutos. Logo, é preciso repensar a forma pela qual estamos fazendo uso dos recursos naturais para a produção destes bens e serviços, muitas vezes desnecessá- rios ou mal utilizados. Nesta unidade serão discutidos não apenas a forma como a produção se relaciona com a utilização destes recursos naturais, mas também uma nova abordagem para tentar equalizar esta utilização. Serão apresentadas as principais ideias por trás do conceito de produção mais limpa. Uma abordagem que se baseia na ideia da susten- tabilidade para reformular de forma socialmente responsável e economicamente viável os processos de produtos e serviços. 6.1 OS SISTEMAS PRODUTIVOS E A UTILIZAÇÃO DE RECURSOS NATURAIS Para muitos autores como Gonçalves e Martos (2016), o século XX apresentou gran- des desdobramentos científicos e tecnológicos para os seres humanos. Contudo, este desenvolvimento, que se segue nos primeiros anos do século XXI, apresenta um custo a ser cobrado. Se por um lado obtivemos benefícios como o potencial para se produzir todo e qualquer serviço, tivemos uma inversão da origem dos problemas socioeconômicos. Segundo os autores: A população mais do que duplicou e o poder de fornecimento de bens e servi- ços para a humanidade atingiu um grau tal que, ao final do século, os proble- mas econômicos saltaram do lado da produção para o lado da demanda. Não há produto ou serviço que se queira produzir, em qualquer escala imaginada, que não seja possível fazer hoje. É tudo uma questão de preço (GONÇALVES; MARTOS, 2016, p. 296). SUMÁRIO90 GESTÃO DA PRODUÇÃO Conforme as empresas passavam a entender o meio ambiente como uma fonte para os recursos necessários aos seus processos de produção de bens e serviços, instau- rou-se uma lógica para o sucesso econômico de que tanto os depósitos ou fontes de recursos naturais eram infinitos, quanto os espaços orientados à disposição de resí- duos e rejeitos. Assim, conforme argumentam Gonçalves e Martos (2016), trabalha- va-se na expectativa de que o uso indiscriminado dos recursos naturais (e em parti- cular aqueles não renováveis) fosse amenizado segundo uma lógica de racionalidade econômica. Seguindo tal linha, a disposição de rejeitos era considerada como um efei- to colateral inevitável inerente aos processos produtivos e “que deveria somente ser contabilizado como mais um custo a ser amortizado” (GONÇALVES; MARTOS, 2016, p. 296). Mesmo em face a inúmeros desastres ambientais, a exploração indiscriminada dos recursos naturais por parte do homem não cessou. Dada a incorporação da ideia de que os recursos naturais não estariam sempre à disposição dos processos produtivos (tal qual um depósito infinito), os processos produtivos passaram a adotar a utilização de novos recursos em substituição àqueles enxergados como escassos ou custosos às organizações. O exemplo a seguir, ilustrado por Gonçalves e Martos (2016), dá uma dimensão deste processo de substituição. De acordo com Gonçalves e Martos (2016, p. 296), durante mais de um século, a indústria de extração de óleo de baleia empregou mais de 70 mil trabalha- dores. Por volta de 1840, a indústria teve indícios da diminuição das popula- ções das baleias. Mesmo com a constatação da finitude dos recursos naturais, os dirigentes da indústria não modificaram sua forma de pensar, e a explora- ção de recursos naturais transferiu-se do óleo de baleia para o petróleo. Apenas em meados dos anos 1980, após uma série de conferências sobre meio ambiente realizadas na década anterior, passa-se a analisar o desempenho das empresas para além do escopo do resultado econômico. Assim, inicia-se um perío- do de questionamento sobre possíveis maneiras de harmonizar a produção de bens e serviços, e a utilização de recursos naturais. Com isso, temos um cenário em que a 91 GESTÃO DA PRODUÇÃO SUMÁRIO sustentabilidade passa a figurar como um elemento diferencial na rotina das empre- sas. 6.1.1 SUSTENTABILIDADE Corrêa e Corrêa (2019, p. 189) trazem a noção de sustentabilidade junto do concei- to de desenvolvimento (de sistemas produtivos, políticas, tecnologias, entre outros). Para os autores, este desenvolvimento tem por base o atendimento das necessidades atuais sem eventualmente comprometer a capacidade das futuras gerações atende- rem as suas próprias demandas. Neste sentido, os autores postulam ainda os seguin-tes questionamentos para um melhor entendimento deste conceito (CORRÊA; CORRÊA, 2019, p. 189): • De quais recursos as futuras gerações necessitarão? • Em que níveis os poluentes podem ser liberados sem que tenham impacto nas futuras gerações? • Em que medida os recursos renováveis podem ser explorados de forma que continuem renováveis? • Quanto a tecnologia pode resolver o paradoxo da necessidade de uso susten- tável de recursos com a crescente demanda mundial por riqueza material? • Quais políticas são necessárias para atingir a sustentabilidade? Conforme comentado previamente, apenas mais recentemente a sociedade toma consciência sobre o fato de que o lucro não deve ser o único elemento norteador para as empresas. Corrêa e Corrêa (2019) argumentam que a maior importância deva estar no futuro das pessoas e do planeta, neste sentido estas preocupações passam a ser capturadas por abordagens mais amplas como o triple bottom line (3PL) SUMÁRIO92 GESTÃO DA PRODUÇÃO O triple bottom line (3BL) representa a “tripla linha de baixo” dos demonstrati- vos financeiros. Mais especificamente ele aborda as avaliações de desempenho organizacional em torno dos três Ps, a saber: Pessoas, Profit (lucro) e Planeta. Talvez tão importante quanto o surgimento do triple bottom line enquanto um meca- nismo para a avaliação do desempenho organizacional que leva em conta também os aspectos ambientais, está a mudança de postura das empresas em relação aos impactos dos seus processos produtivos e à forma como a sociedade como um todo encara esta relação. Neste sentido, Corrêa e Corrêa (2019, p. 189) ressaltam a noção de pegada ambiental: “o ‘rastro’ ou ‘pegada’ ambiental (environmental footprint) de uma organização é a consequência causada ao meio ambiente por fluxos materiais e energéticos que deixam o sistema definido por ela”. Sobre a mudança na postura das empresas e sua pegada ambiental, os autores apre- sentam o exemplo da tratativa adotada pela Petrobras em função de alguns desas- tres naturais. 93 GESTÃO DA PRODUÇÃO SUMÁRIO Há alguns anos, após derramar 5,3 milhões de litros de óleo na baía de Guanabara e em rios do Paraná, a Petrobras encontrava-se sob críticas ferre- nhas dos ambientalistas. No ano seguinte, a plataforma P-36 afundou – e, com ela, a reputação da empresa. Além de multas e perdas de produção, os acidentes pioraram a percepção de risco da Petrobras e encareceram o seguro das refinarias e plataformas. Nos anos seguintes, o valor subiu cinco vezes, chegando a 36 milhões de dólares, chegando a alcançar 46,4 milhões. Depois disso, a empresa empenhou-se em atingir resultados palpáveis de melhoria na gestão dos riscos ambientais e de segurança. O volume de vaza- mentos, por exemplo, baixou de 2,6 milhões de litros de óleo um ano depois do acidente narrado acima, para 197.000 litros um ano depois – um patamar, segundo especialistas, similar ao de algumas das melhores petrolíferas do mundo. A Petrobras já investiu 3,5 bilhões de reais para sanar pontos críticos e implementar um sistema preventivo a acidentes. Foi criado, por exemplo, o Programa de Excelência em Gestão Ambiental e Segurança Operacional. Com ele, ficou mais fácil e rápido descobrir vazamentos. Mais de três quartos dos 7.000 quilômetros de dutos da companhia estão automatizados com sensores que detectam variações no volume de óleo transportado. Se o volu- me diminui muito em um trecho do duto, alertas de segurança são aciona- dos, as refinarias paralisam a produção e equipes são enviadas ao local para investigar o eventual acidente (CORRÊA; CORRÊA, 2019, p. 185). Dada toda a conjuntura de necessidade de recursos para atendimento de deman- das cada vez mais crescentes em meio a um cenário de finitude e utilização indevida de tais recursos comprometendo a sobrevivência das gerações futuras, cabe a nós que estamos atuando no presente passarmos a modelos de produção mais sustentá- veis. Neste sentido, já algum tempo emerge a noção de uma “produção mais limpa”, no sentindo de diminuir as pegadas ambientais das organizações sem efetivamente comprometer seus resultados. SUMÁRIO94 GESTÃO DA PRODUÇÃO 6.2 PRODUÇÃO MAIS LIMPA 6.2.1 AS BASES PARA A SUA ORIGEM Antes de adentrar ao conceito propriamente dito de produção mais limpa e na sua dinâmica de atuação, é preciso destacar o contexto histórico da sua consolida- ção enquanto abordagem gerencial. Pois bem, conforme comentado previamente, a preocupação das empresas com os seus impactos ambientais começa a ganhar corpo a partir da segunda metade do século XX. Apesar da realização de conferên- cias ambientais de repercussão mundial, Gonçalves e Martos (2016) destacam que as empresas adotaram uma postura de atendimento às recentes normas de monito- ramento, licenciamento e análise do impacto ambiental, sendo o cumprimento das normas o ponto principal desta fase. De acordo com os autores: Nessa etapa, a opção preferida pelas organizações foi a de efetuar o controle da emissão de resíduos ao final dos processos produtivos, a utilização das cha- madas tecnologias de final de tubo (end-of-pipe technologies). Buscavam-se então técnicas e/ou equipamentos que pudessem rapidamente minimizar os efeitos dos lançamentos de rejeitos no ambiente. O pensamento dominante era enquadrarem-se rapidamente nas novas normas de forma a neutralizar as consequências econômicas advindas das linhas de produção, principalmente as multas. A responsabilidade empresarial à época era isolada, com cada em- presa tentando fazer com que o respeito às normas coubesse dentro de seus orçamentos (GONÇALVES; MARTOS, 2016, p. 301). Contudo, com a chegada da filosofia japonesa de produção, os paradigmas de manu- fatura sofreram consideráveis alterações. As empresas passaram a encarar a qualidade como elemento de distinção no mercado. Neste contexto, questões ambientais antes não enxergadas nos modelos tradicionais de produção passaram a ser consideradas. Conforme a qualidade foi sendo cada vez mais incorporada ao padrão de expec- tativas dos clientes, muitas empresas entenderam a atitude voluntária em relação a aspectos ambientais como uma nova forma de diferenciação. Para Gonçalves e Martos (2016, p. 302), as empresas enxergaram nestas atitudes voluntárias a possi- bilidade de conseguir diferenciais competitivos sustentáveis, não somente do ponto de vista clássico, mas também transformando a “causa verde” em forma de dife- renciação mercadológica aos olhos do consumidor, mesmo que algumas vezes as 95 GESTÃO DA PRODUÇÃO SUMÁRIO transformações fossem só de fachada (green washing). Os autores destacam ainda que a atitude proativa observada ao final do século XX fez com que algumas empresas extrapolassem o mero cumprimento das normas e levassem as questões ambientais para a sua esfera estratégica, “promovendo a inte- gração total da responsabilidade na estrutura empresarial” (GONÇALVES; MARTOS, 2016, p. 303). O quadro a seguir ilustra esta evolução das abordagens dadas às ques- tões ambientais. FIGURA 20 - ABORDAGENS PARA AS QUESTÕES AMBIENTAIS Fonte: Gonçalves e Martos, 2016 in Venanzi e Silva, 2016. SUMÁRIO96 GESTÃO DA PRODUÇÃO 6.2.2 DEFINIÇÃO Apresentadas as bases em que foram cunhadas as definições de produção mais limpa, vamos passar à sua definição, ou melhor, definições. Para Gonçalves e Martos (2016, p. 303), a produção mais limpa (ou P+L) consiste em não mais deixar o trata- mento de resíduos, rejeitos e sobras para o final do processo (end-of-pipe technolo- gies). Ou seja, considerar no projeto dos processos o velho preceito de que prevenir é melhor que remediar. Neste sentido, passa-se à substituição da pergunta “o que fazer com os resíduos” para “o que fazer para não gerar resíduos?”. Para Rodrigues et al. (2014), a produção mais limpa (do inglês cleaner production, ou ainda PML) pode ser definida como a aplicação contínua de uma estratégia ambien- tal integradaa processos, produtos e serviços com a finalidade de aumentar a eficiên- cia e reduzir riscos para seres humanos e o meio ambiente. Os autores estendem ainda a abordagem do conceito para todas as fases do ciclo de vida do produto, com a finalidade de prevenção e de minimização dos riscos das atividades de processos a pessoas e ao meio ambiente. Destaca-se ainda a necessidade de se entender esta abordagem como uma estratégia preventiva aplicada continuamente a processos, produtos e serviços (RODRIGUES et al., 2014, p. 117). Para Gonçalves e Martos (2016), a P+L também atua procurando eliminar os mate- riais tóxicos e/ou perigosos por meio de alterações nos processos produtivos e/ou nos produtos propriamente ditos. Da mesma forma, busca a redução na quantidade e na toxicidade de todas as emissões e resíduos tendo como base, mudanças ou ajustes dos processos na fonte. Rodrigues et al. (2014) em linha com o exposto apresentam alguns exemplos desta abordagem, a saber: • eliminação ou redução no uso de materiais tóxicos ou ecologicamente preju- diciais; • purificação do material de entrada do processo; • prevenção da geração de resíduos poluentes; • automação e rearranjos físicos da produção; • mudanças nas condições de processo (temperatura de produção, pressão, umidade). 97 GESTÃO DA PRODUÇÃO SUMÁRIO Rodrigues et al. (2014, p. 117) apresentam ainda as estratégias que norteiam a atua- ção da P+L, subdividindo-as em três grupos: • Eficiência na produção: são as estratégias que buscam a otimização do uso dos recursos naturais (como matéria-prima, energia ou água) em todos os estágios dos processos produtivos. • Gerenciamento ambiental: estratégias que visam à minimização dos impac- tos adversos dos processos produtivos no meio ambiente. • Desenvolvimento social: estratégias que tentam diminuir os impactos adver- sos sobre pessoas e comunidades, além de lhes fornecer suporte ao seu desen- volvimento. 6.2.3 A DINÂMICA DA PRODUÇÃO MAIS LIMPA E SEUS BENEFÍCIOS Apesar da preocupação com aspectos ambientais por si só já figurar como um argu- mento plausível para a adoção de uma produção mais limpa, Gonçalves e Martos (2016) destacam que muitos empresários não aceitarão uma mudança na estrutura dos processos antes de enxergarem a real viabilidade econômica da mudança. Ainda segundo os autores, uma vez que a implantação da P+L altera a estrutura de custos da empresa, sua implantação terá mais sucesso se a abordagem tiver de ressaltar uma relação custo-benefício positiva. Rodrigues et al. (2014) também destacam aspectos econômicos da adoção da P+L ao ressaltarem que a sua implantação otimiza a utili- zação dos recursos disponíveis reduzindo, assim, os custos das atividades da empresa. A abordagem de viabilidade econômica para a implantação da P+L pode ser ilustra- da segundo o gráfico a seguir. Nela, percebe-se que já no estágio inicial (estágio A) as ações como “organização da casa” (do inglês housekeeping) já trazem um impacto positivo na redução dos custos. Aqui tem-se a disposição adequada para elemen- tos que não agregam mais valor ao processo produtivo (como estoques excedentes, produtos e matérias-primas fora da validade, peças sobressalentes já obsoletas, etc.). Contudo, conforme destacam Gonçalves e Martos (2016), as alterações no processo que resultarão em maiores ganhos para a empresa demandam um certo grau de investimento (estágio B). E, neste momento, temos uma considerável alteração da SUMÁRIO98 GESTÃO DA PRODUÇÃO estrutura de custos da empresa quando comparada aos processos sem P+L. Todavia, uma vez que estes investimentos são aplicados, os ganhos passam a ser mais inten- sos e duradouros e logo, justificados. FIGURA 21 - CURVA DE IMPACTO NA ESTRUTURA DE CUSTOS EM FUNÇÃO DA IMPLANTAÇÃO DA P+L Fonte: Gonçalves e Martos (2016). Apresentadas as vantagens de base econômico-financeiras da implantação da P+L, passa-se efetivamente ao processo de conscientização dos envolvidos. De acordo com Gonçalves e Martos (2016), a sensibilização do público-alvo (leia-se as lideranças da empresa) pode se dar de forma mais gradual e se a empresa em questão já tiver um histórico de autuações nos órgãos reguladores ou reclamações devido a problemas ambientais por parte de outros stakeholders como a sociedade civil, clientes ou forne- cedores. Os autores também sugerem a realização de visitas técnicas aos ambientes de produção de modo a sensibilizar as lideranças sobre os reais impactos dos seus processos. Realizada a etapa de conscientização e com a garantia do compromisso das lideran- ças, é preciso identificar as pessoas responsáveis pela implantação dos procedimentos da P+L no âmbito da empresa. Este grupo de pessoas é denominado Ecotime. Este grupo tem como principais responsabilidades (GONÇALVES; MARTOS, 2016, p. 305): 99 GESTÃO DA PRODUÇÃO SUMÁRIO • fazer o diagnóstico do processo; • implantar o programa de P+L em seus diversos níveis; • identificar oportunidades de implantação de medidas de P+L; • monitorar e garantir a continuidade do programa; • cuidar da propagação das ideias da P+L; • atrair e manter o maior número possível de colaboradores apoiando o progra- ma. Definidos os elementos do Ecotime e compreendidas suas atividades, o grupo passa a atuar diretamente no processo de implantação da P+L. Este processo, que aconte- ce em três níveis de atuação e apresenta diferentes níveis de prioridade, foca-se na mitigação da utilização de recursos assim como na eliminação dos elementos causa- dores de danos ambientais. Logo, tem-se a necessidade de focar nas três fases do ciclo de vida do produto, a saber: na manufatura propriamente dita, na utilização do produto e na sua destinação final (RODRIGUES et al., 2014). A figura a seguir apresenta o fluxograma do processo de implantação da P+L em uma empresa. SUMÁRIO100 GESTÃO DA PRODUÇÃO FIGURA 22 - FLUXOGRAMA DE PRODUÇÃO MAIS LIMPA Fonte: Gonçalves e Martos (2016). Os três níveis de atuação, com seus respectivos conteúdos e prioridades, são assim apresentados por Rodrigues et al. (2014): • Nível 1 (Prioridade Máxima): envolve modificações em produtos e processos, objetivando a redução de emissões, de resíduos e de possível toxidade já na sua fonte. • Nível 2 (Prioridade Alta): aproveitamento pela própria empresa dos possíveis resíduos que continuarem sendo gerados (reciclagem interna). 101 GESTÃO DA PRODUÇÃO SUMÁRIO • Nível 3 (Prioridade Secundária): não havendo possibilidade de aproveitamen- to interno do resíduo gerado, deve-se buscar como alternativa a reciclagem externa, a partir de venda ou de doação do material para onde haja possibili- dades de reaproveitamento. No caso da inviabilidade desse reaproveitamento, os resíduos devem possuir destinação em condições e locais adequados. Ao comentar sobre cada etapa do processo de implantação (e a hierarquia das ações envolvida no processo), Gonçalves e Martos (2016) destacam que a P+L em seu primei- ro nível resulta na redução na geração de resíduos a partir da modificação do produ- to. Segundo os autores: Essa modificação pode ser uma simples troca de matéria-prima que altere a vida útil do produto, contribuindo assim para a redução do uso de maté- rias-primas, uma vez que haverá aumento do uso do produto, diminuindo a necessidade de trocas e reposições até que um novo design repense o uso do produto em função de torná-lo mais amigável ao meio ambiente (GONÇAL- VES; MARTOS, 2016, p. 307). Ainda nesta etapa é possível destacar as modificações do tipo housekeeping (vide estágio A do gráfico) obtidas a partir da aplicação de boas práticas operacionais, como eliminação vazamentos ou melhor organização do ambiente de trabalho. Assim como as atividades de housekeeping, esta etapa aborda também a substitui- ção de matérias-primas e materiais auxiliares por matérias de natureza biodegradá- vel. Da mesma forma, busca-se a modificação deembalagens de modo a se obter um maior aproveitamento e eventualmente sua reutilização. De acordo com os autores: Essas modificações no processo aparecem em decorrência do olhar detalha- do obtido nas etapas iniciais da implantação da P+L. Uma revisão detalhada do processo, atualizações do fluxograma de produção e, principalmente, a elaboração de balanços de massa do processo, traz à tona pequenos proble- mas que passam despercebidos no dia a dia fabril e que ajustados promovem melhorias sensíveis nos processos (GONÇALVES; MARTOS, 2016, p. 307). O nível 2 da P+L por sua vez, prioriza os processos de reciclagem interna da empre- sa. Logo, busca-se a recuperação de matérias-primas, materiais auxiliares e insumos dentro do próprio ambiente fabril (GONÇALVES; MARTOS, 2016, P. 307). SUMÁRIO102 GESTÃO DA PRODUÇÃO Como exemplo, podemos citar a recuperação de solventes ou a reutilização do bagaço de cana-de- açúcar utilizado na produção de açúcar ou álcool na alimentação de caldeiras. Muitas empresas reestruturam seus processos produtivos de modo a incorpo- rarem às suas etapas de geração de energia a abordagem da cogeração. Esta abordagem consiste em aproveitar boa parte do calor (cerca de 50 a 60%) gerado na produção de energia para alimentar outros processos. De acor- do com o Instituto Nacional de Eficiência Energética (INEE), um gerador de energia elétrica tem potencial para transformar apenas 30–40% da energia do diesel. Em um sistema convencional, 60–70% da energia é perdida sob a forma de calor. A abordagem da cogeração faz uso desta energia residual e a destina para outras funções, por exemplo, a geração de vapor ou água quen- te. Ambos processos que demandam uma grande quantidade de calor. Por último, temos o nível 3 da P+L. Este nível foca-se na reciclagem externa dos resí- duos. Assim, é preciso mapear como os resíduos oriundos do processo produtivo da empresa podem ser utilizados em outros processos externos à sua planta fabril. São exemplos desta abordagem a segregação de aparas de papel para a reciclagem ou a transformação de materiais duros descartados em pontas de ferramentas de corte industrial (GONÇALVES; MARTOS, 2016, 308). 103 GESTÃO DA PRODUÇÃO SUMÁRIO Alguns exemplos de modificações em produtos e processos de modo a torná-los mais sustentáveis são apresentados por Corrêa e Corrêa (2019, p. 189). O primeiro deles trata das lavadoras de pratos Dishlex cuja modifica- ção no produto fez com que o equipamento passasse a utilizar menos de 18 litros para um ciclo completo de lavagem. Segundo os autores, cada lavadora consumiria menos material para sua produção, uma vez que, com a mesma capacidade de outros produtos, tem quase 7 quilogramas a menos. As modi- ficações consistiram em projetar componentes de forma a facilitar recicla- gem e a sua desmontagem. Adicionalmente, a lavadora permitia operar de forma eficiente com água mais fria, logo, consumindo menos energia. Outro exemplo a ser citado é a adoção de material reciclado pela fabricante de móveis Herman Miller. Uma vez que os produtos são projetados com foco em durabilidade, tem-se uma menor necessidade de substituição. A maio- ria das cadeiras é produzida com até 77% de material reciclado, enquanto elementos feitos de polipropileno, aço e alumínio são 100% recicláveis. Outra característica marcante é a facilidade em desmontar os produtos, resultando em uma maior facilidade de reciclagem. SUMÁRIO104 GESTÃO DA PRODUÇÃO CONCLUSÃO Nesta unidade foram tratadas não apenas questões técnicas que propiciam a modifi- cação de processos produtivos. É fato que as modificações apresentadas aqui podem ser utilizadas para minimizar as perdas de matérias-primas e materiais diversos, assim como passar a reutilizar embalagens ou subprodutos do nosso processo. Contu- do, o que você viu nesta unidade lida bem mais com a responsabilidade da gestão da produção de entregar produtos e serviços que façam bom uso dos insumos, ao mesmo tempo em que procuram minimizar o seu impacto no meio ambiente e no potencial de sobrevivência das gerações futuras. A abordagem da produção mais limpa tratada nesta unidade leva a uma reflexão sobre as escolhas relativas aos processos e à forma como lidamos com o nosso produ- to (bem ou serviço) no ambiente de produção e também fora deste. Essa é uma refle- xão necessária a cada um de nós, seja um gerente de processo, analista de qualidade ou ainda um estudante. É até melhor e mais promissor que você já esteja construindo tal consciência neste momento de formação profissional. Você será um profissional do futuro, então é preciso cuidar para que haja um futuro para você atuar enquanto profissional. Bons estudos! 105 GESTÃO DA PRODUÇÃO SUMÁRIO REFERÊNCIAS BOSSA, Nadia A. Dificuldades de aprendizagem. Porto Alegre: Artmed, 2000. BOSSA, Nadia A. Fracasso escolar. Porto Alegre: Artmed, 2001. FARRELL, Michael. Guia do professor: dislexia e outras dificuldades de aprendizagem espe- cíficas - Estratégias educacionais em necessidades especiais. Porto Alegre: Artmed, 2008. GARCÍA SÁNCHEZ, Jesús-Nicasio. Dificuldades de aprendizagem e intervenção psico- pedagógica. Tradução de Ernani Rosa. Porto Alegre: Artmed, 2004. GOULART, Maria Inês M. Psicologia da aprendizagem I. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2010. 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