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2012 Biogeografia Prof.a Ângela da Veiga Beltrame Prof. Ricardo Wagner Ad-Víncula Veado Copyright © UNIASSELVI 2012 Elaboração: Prof.ª Ângela da Veiga Beltrame Prof. Ricardo Wagner Ad-Víncula Veado Revisão, Diagramação e Produção: Centro Universitário Leonardo da Vinci – UNIASSELVI Ficha catalográfica elaborada na fonte pela Biblioteca Dante Alighieri UNIASSELVI – Indaial. 910 B546p Beltrame , Ângela da Veiga. Biogeografia/ Ângela da Veiga Beltrame [e] Ricardo Wagner Ad-Víncula Veado. Centro Universitário Leonardo da Vinci –: Indaial, Grupo UNIASSELVI, 2012.x ; 308.p.: il Inclui bibliografia. ISBN 978-85-7830-334-1 1. Geografia 2. Geografia Política 3. Biogeografia I. Centro Universitário Leonardo da Vinci II. Núcleo de Ensino a Distância III. Título III apresentação Prezado(a) acadêmico(a)! A ideia da elaboração deste caderno por nós, autores, derivou da necessidade de uma melhor organização e sistematização de sínteses elaboradas sobre os temas das três grandes unidades que compõem o estudo desta disciplina: - a primeira compreende a introdução à Biogeografia, seus conceitos, objeto de estudo e objetivo, a biosfera, a atmosfera e o solo, onde há condições para o desenvolvimento da vida; - a segunda aborda a história evolutiva da vida sobre a Terra, denominada aqui de Paleobiogeografia, e também as razões da distribuição e adaptação dos organismos na biosfera; - a terceira e última unidade abrange os territórios biogeográficos, os grandes biomas e a ação do homem sobre eles, de forma a se poder “viajar” através dos textos. Há o cuidado, na orientação deste estudo, no sentido de sempre se considerar a integração dos diferentes aspectos biogeográficos. Com isso, queremos enfatizar que a vida pode se desenvolver ou se adaptar ou se extinguir por um conjunto de fatores bióticos e abióticos, que agem sobre uma população ou comunidade de forma correlacionada, nunca isoladamente. Não temos intenção de esgotarmos os assuntos aqui colocados. Pretendemos que o conteúdo deste caderno seja uma boa introdução aos seus estudos em Biogeografia e que, a partir dele, possa desenvolver outras leituras sobre esta fascinante disciplina. Este caderno é dedicado a todos os estudiosos iniciantes em Biogeografia e a todos os interessados pela temática. Desejamos uma boa leitura. Prof.ª Ângela da Veiga Beltrame Prof. Ricardo Wagner Ad-Víncula Veado IV Você já me conhece das outras disciplinas? Não? É calouro? Enfim, tanto para você que está chegando agora à UNIASSELVI quanto para você que já é veterano, há novidades em nosso material. Na Educação a Distância, o livro impresso, entregue a todos os acadêmicos desde 2005, é o material base da disciplina. A partir de 2017, nossos livros estão de visual novo, com um formato mais prático, que cabe na bolsa e facilita a leitura. O conteúdo continua na íntegra, mas a estrutura interna foi aperfeiçoada com nova diagramação no texto, aproveitando ao máximo o espaço da página, o que também contribui para diminuir a extração de árvores para produção de folhas de papel, por exemplo. Assim, a UNIASSELVI, preocupando-se com o impacto de nossas ações sobre o ambiente, apresenta também este livro no formato digital. Assim, você, acadêmico, tem a possibilidade de estudá-lo com versatilidade nas telas do celular, tablet ou computador. Eu mesmo, UNI, ganhei um novo layout, você me verá frequentemente e surgirei para apresentar dicas de vídeos e outras fontes de conhecimento que complementam o assunto em questão. Todos esses ajustes foram pensados a partir de relatos que recebemos nas pesquisas institucionais sobre os materiais impressos, para que você, nossa maior prioridade, possa continuar seus estudos com um material de qualidade. Aproveito o momento para convidá-lo para um bate-papo sobre o Exame Nacional de Desempenho de Estudantes – ENADE. Bons estudos! NOTA V VI VII UNIDADE 1 – A BIOGEOGRAFIA, A BIOSFERA, O CLIMA, O SOLO E OS SERES VIVOS ..................................................................................................... 1 TÓPICO 1 – OBJETO, OBJETIVOS E CONCEITO DA BIOGEOGRAFIA ................................. 3 1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 3 2 OBJETO E OBJETIVOS ....................................................................................................................... 3 RESUMO DO TÓPICO 1 ....................................................................................................................... 11 AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 13 TÓPICO 2 – A POSIÇÃO DA BIOGEOGRAFIA NA CIÊNCIA GEOGRÁFICA ....................... 15 1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 15 2 ECOSSISTEMA E GEOSSISTEMA .................................................................................................. 15 3 O ENFOQUE SISTÊMICO .................................................................................................................. 16 3.1 O GEOSSISTEMA: A ORGANIZAÇÃO ESPACIAL ................................................................. 18 RESUMO DO TÓPICO 2 ....................................................................................................................... 20 AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 21 TÓPICO 3 – A BIOSFERA ...................................................................................................................... 23 1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 23 2 CONCEITO E LIMITES DA BIOSFERA .......................................................................................... 23 3 AS FONTES DE ENERGIA DA BIOSFERA .................................................................................... 24 4 OS FLUXOS DE ENERGIA E NUTRIENTES NA BIOSFERA: OS CICLOS BIOGEOQUÍMICOS .................................................................................................... 25 RESUMO DO TÓPICO 3 ....................................................................................................................... 31 AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 33 TÓPICO 4 – A ATMOSFERA ................................................................................................................. 35 1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 35 2 O SIGNIFICADO DO CLIMA ........................................................................................................... 35 3 OS PADRÕES CLIMÁTICOS E AS PLANTAS .............................................................................. 36 4 OS EFEITOS DO CLIMA SOBRE OS SERES VIVOS .................................................................. 38 RESUMO DO TÓPICO 4 ....................................................................................................................... 40 AUTOATIVIDADE .................................................................................................................................41 TÓPICO 5 – O SOLO E OS SERES VIVOS ........................................................................................ 43 1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 43 2 FATORES DE FORMAÇÃO DO SOLO ........................................................................................... 44 3 MECANISMOS E PROCESSOS PEDOGENÉTICOS ................................................................... 45 4 O PERFIL DE SOLO ............................................................................................................................. 47 5 DESCRIÇÕES DO PERFIL EM CAMPO ......................................................................................... 49 5.1 DESCRIÇÕES GERAIS .................................................................................................................... 49 5.2 DESCRIÇÕES ESPECÍFICAS DO PERFIL ................................................................................... 50 5.3 OUTROS ATRIBUTOS DOS HORIZONTES, ANALISADOS EM LABORATÓRIO ............. 53 6 CLASSIFICAÇÃO DOS TIPOS DE SOLOS ................................................................................... 54 sumário VIII 6.1 CLASSIFICAÇÃO DOS SOLOS DO MUNDO ............................................................................ 54 6.2 CLASSIFICAÇÃO DOS SOLOS DO BRASIL ............................................................................. 56 6.2.1 Horizontes diagnósticos ........................................................................................................ 57 6.2.2 Tipos de Solos do Brasil ........................................................................................................ 59 LEITURA COMPLEMENTAR ............................................................................................................... 62 RESUMO DO TÓPICO 5 ....................................................................................................................... 64 AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 66 UNIDADE 2 – A PALEOBIOGEOGRAFIA, EVOLUÇÃO E DISTRIBUIÇÃO DOS SERES VIVOS ..................................................................................................... 67 TÓPICO 1 – A PALEOBIOGEOGRAFIA ............................................................................................ 69 1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 69 2 O ESTUDO DAS MUDANÇAS CLIMÁTICAS E A SUA IMPLICAÇÃO NA BIOGEOGRAFIA .......................................................................................................................... 69 3 ELEMENTOS DE APOIO PARA A RECONSTITUIÇÃO DE ÉPOCAS PASSADAS ............. 71 3.1 PALEOSSOLOS E SEDIMENTOS ................................................................................................. 72 3.2 ANÁLISE POLÍNICA OU PALINOLOGIA ................................................................................. 72 3.3 DATAÇÃO RADIOMÉTRICA ...................................................................................................... 73 3.4 PALEONTOLOGIA ......................................................................................................................... 73 3.5 DENDROCRONOLOGIA .............................................................................................................. 74 3.6 VARVES EM VARVITOS ................................................................................................................ 74 3.7 REFÚGIOS FLORESTAIS ................................................................................................................ 74 3.8 PALEOMAGNETISMO .................................................................................................................. 74 3.9 FÓSSEIS VIVOS ............................................................................................................................... 74 4 A DERIVA CONTINENTAL E O SEU SIGNIFICADO BIOGEOGRÁFICO ........................... 75 5 BREVE DESCRIÇÃO DA EVOLUÇÃOBIOGEOGRÁFICA NAS ERAS GEOLÓGICAS .... 76 5.1 O ARQUENO ................................................................................................................................... 76 5.2 PROTEROZOICO OU PRÉ-CAMBRIANO ................................................................................ 77 5.3 A ERA PALEOZOICA ..................................................................................................................... 79 5.3.1 Cambriano ............................................................................................................................... 79 5.3.2 Ordoviciano ............................................................................................................................ 80 5.3.3 Siluriano .................................................................................................................................. 81 5.3.4 Devoniano ............................................................................................................................... 82 5.3.5 Carbonífero ............................................................................................................................. 85 5.3.6 Permiano ................................................................................................................................. 87 5.4 A ERA MESOZOICA ....................................................................................................................... 89 5.4.1 Triássico ................................................................................................................................... 90 5.4.2 Jurássico ................................................................................................................................... 92 5.4.3 Cretáceo ................................................................................................................................... 94 5.5 A ERA CENOZOICA ...................................................................................................................... 98 5.5.1 Terciário ................................................................................................................................... 98 5.5.2 Paleoceno ................................................................................................................................ 98 5.5.3 Eoceno ..................................................................................................................................... 98 5.5.4 Oligoceno ................................................................................................................................ 99 5.5.5 Mioceno .................................................................................................................................100 5.5.6 Plioceno .................................................................................................................................100 5.5.7 Pleistoceno ............................................................................................................................101 5.5.8 Holoceno ..............................................................................................................................103 RESUMO DO TÓPICO 1 .....................................................................................................................104 AUTOATIVIDADE ...............................................................................................................................107 IX TÓPICO 2 – ORIGEM E EVOLUÇÃO DOS SERES VIVOS .......................................................1091 INTRODUÇÃO ...................................................................................................................................109 2 AS PRIMEIRAS IDEIAS SOBRE O APARECIMENTO DA VIDA .........................................109 3 A QUIMIOSSÍNTESE: UMA TEORIA MODERNA SOBRE A ORIGEM DA VIDA ...........114 3.1 A ATMOSFERA PRIMITIVA ........................................................................................................114 3.2 O AMBIENTE NA TERRA PRIMITIVA .....................................................................................115 3.3 SURGE A FOTOSSÍNTESE ...........................................................................................................116 3.4 A TEORIA DA EVOLUÇÃO: O DARWINISMO E O NEODARWINISMO - A SELEÇÃO NATURAL E A ORIGEM DAS ESPÉCIES ..........................................................117 3.5 O DARWINISMO, O NEODARWINISMO E AS IDEIAS MODERNAS DA EVOLUÇÃO ............................................................................................................................118 3.6 A ADAPTAÇÃO ............................................................................................................................120 3.7 O ISOLAMENTO GENÉTICO E GEOGRÁFICO .....................................................................123 RESUMO DO TÓPICO 2 .....................................................................................................................126 AUTOATIVIDADE ...............................................................................................................................129 TÓPICO 3 – A DISTRIBUIÇÃO DOS SERES VIVOS ...................................................................131 1 INTRODUÇÃO ...................................................................................................................................131 2 PADRÕES DE DISTRIBUIÇÃO DAS ESPÉCIES ........................................................................131 3 AS FORMAS DE DISPERSÃO DAS ESPÉCIES ...........................................................................134 4 ESPÉCIES EXÓTICAS OU ESTRANGEIRAS .............................................................................138 5 OS MOVIMENTOS DOS SERES VIVOS .....................................................................................140 6 AS INTERAÇÕES ENTRE OS SERES VIVOS .............................................................................141 7 O RELEVO COMO BARREIRA OU PONTE BIOGEOGRÁFICA ...........................................145 8 POPULAÇÕES ISOLADAS: A TEORIA DA BIOGEOGRAFIA DE ILHAS ..........................146 9 A TEORIA DOS REFÚGIOS ...........................................................................................................148 10 CICLOS CLIMÁTICOS, PALEOCLIMAS E OS REFÚGIOS ...................................................151 11 A TEORIA DOS REFÚGIOS E A ESPECIAÇÃO. OS CENTROS DE ORIGEM, DE DISPERSÃO E DE DIVERSIFICAÇÃO ................................................................................153 12 REFÚGIOS BRASILEIROS ATUAIS ............................................................................................155 13 IMPORTÂNCIA DA PRESERVAÇÃO DOS REFÚGIOS ATUAIS ........................................157 RESUMO DO TÓPICO 3 .....................................................................................................................160 AUTOATIVIDADE ...............................................................................................................................162 UNIDADE 3 – TERRITÓRIOS BIOGEOGRÁFICOS, BIOMAS E A AÇÃO DO HOMEM ...163 TÓPICO 1 – OS REINOS BIOGEOGRÁFICOS E OS BIOMAS ..................................................165 1 INTRODUÇÃO ...................................................................................................................................165 2 TERRITÓRIOS BIOGEOGRÁFICOS ............................................................................................165 2.1 REINO HOLÁRTICO ....................................................................................................................170 2.2 REINO PALEOTROPICAL ...........................................................................................................170 2.3 REINO AUSTRALIANO ...............................................................................................................171 2.4 REINO ARQUINÓTICO ..............................................................................................................176 2.5 REINO NEOTROPICAL ...............................................................................................................182 3 OS BIOMAS .........................................................................................................................................185 3.1 BIOMA DE TUNDRA ..................................................................................................................185 3.2 BIOMA DE TAIGA - FLORESTA BOREAL DE CONÍFERAS ...............................................189 3.3 FLORESTA TEMPERADA SEMIDECÍDUA OU MISTA .........................................................195 3.4 BIOMA DE ESTEPES, PRADARIAS OU CAMPOS .................................................................198 3.5 BIOMA DE DESERTOS E SEMIDESERTOS .............................................................................201 3.6 VEGETAÇÃO MEDITERRÂNEA .............................................................................................208 3.7 BIOMA DE SAVANAS ..................................................................................................................211 X 3.8 BIOMA DE FLORESTAS PLUVIAIS EQUATORIAIS .............................................................215 RESUMO DO TÓPICO 1 .....................................................................................................................221 AUTOATIVIDADE ...............................................................................................................................224 TÓPICO 2 – AS PAISAGENS FITOGEOGRÁFICAS DO REINO NEOTROPICAL ...............227 1 INTRODUÇÃO ...................................................................................................................................227 2 DOMÍNIOS MORFOCLIMÁTICOS BRASILEIROS .................................................................227 2.1 DOMÍNIO DOS CHAPADÕES TROPICAIS COM DUAS ESTAÇÕES, RECOBERTOS POR CERRADOS E COM FLORESTAS-GALERIA .......................................228 2.2 DOMÍNIO DAS REGIÕES SERRANAS TROPICAIS ÚMIDAS OU DOS "MARES DE MORROS", RECOBERTOS POR FLORESTAS PLUVIAIS ................................231 2.3 DOMÍNIO DAS DEPRESSÕES INTERMONTANAS SEMIÁRIDAS, COM INSELBERGS E DRENAGEM INTERMITENTE E RECOBERTAS POR CAATINGAS ...............................235 2.4 DOMÍNIO DAS TERRAS BAIXAS EQUATORIAIS, EXTENSIVAMENTE FLORESTADAS DA AMAZÔNIA ..............................................................................................237 2.5 DOMÍNIO DOS PLANALTOS DAS ARAUCÁRIAS ..............................................................240 2.6 DOMÍNIO DAS PRADARIAS MISTAS DO SUDESTE DO RIO GRANDE DO SUL .........243 RESUMO DO TÓPICO 2 .....................................................................................................................247 AUTOATIVIDADE ...............................................................................................................................250 TÓPICO 3 – DINÂMICA DA VEGETAÇÃO: SUCESSÃO E CLÍMAX ......................................253 1 INTRODUÇÃO ...................................................................................................................................253 2 A COMUNIDADE VEGETAL E COMUNIDADES VEGETAIS .............................................254 3 ESTRUTURA DAS COMUNIDADES ...........................................................................................2584 O DESENVOLVIMENTO DA COMUNIDADE. SUCESSÃO, CLÍMAX E HIERARQUIA DAS COMUNIDADES .....................................................................................261 RESUMO DO TÓPICO 3 .....................................................................................................................270 AUTOATIVIDADE ...............................................................................................................................272 TÓPICO 4 – A SOCIEDADE HUMANA...........................................................................................275 1 INTRODUÇÃO ...................................................................................................................................275 2 O IMPACTO DA SOCIEDADE NOS SISTEMAS NATURAIS ................................................276 3 MODIFICAÇÕES NOS ECOSSISTEMAS E NOS GEOSSISTEMAS .....................................280 4 A GEOGRAFIA MÉDICA .................................................................................................................286 LEITURA COMPLEMENTAR .............................................................................................................290 RESUMO DO TÓPICO 4 .....................................................................................................................292 AUTOATIVIDADE ...............................................................................................................................294 REFERÊNCIAS ......................................................................................................................................295 1 UNIDADE 1 A BIOGEOGRAFIA, A BIOSFERA, O CLIMA, O SOLO E OS SERES VIVOS OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM PLANO DE ESTUDOS Ao final desta unidade você será capaz de: • compreender os fundamentos históricos, conceituais e metodológicos da Biogeografia; • identificar a posição da Biogeografia na ciência geográfica, bem como o funcionamento dos ecossistemas e geossistemas; • entender o funcionamento da biosfera e sua dinâmica de sustentação da vida; • compreender os padrões climáticos e sua relação com as plantas, bem como os efeitos do clima sobre os seres vivos; • conhecer os diferentes tipos de solos, os processos que o originaram e sua importância na sustentação da vida. Esta Unidade está organizada em cinco tópicos, sendo que em cada um deles você encontrará atividades para uma maior compreensão das informações apresentadas. TÓPICO 1 – OBJETO, OBJETIVOS E CONCEITO DA BIOGEOGRAFIA TÓPICO 2 – A POSIÇÃO DA BIOGEOGRAFIA NA CIÊNCIA GEOGRÁFICA TÓPICO 3 – A BIOSFERA TÓPICO 4 – A ATMOSFERA TÓPICO 5 – O SOLO E OS SERES VIVOS 2 3 TÓPICO 1 UNIDADE 1 OBJETO, OBJETIVOS E CONCEITO DA BIOGEOGRAFIA 1 INTRODUÇÃO A Biogeografia ocupou, durante certo tempo, um lugar secundário na Geografia. As primeiras abordagens biogeográficas, desde o século XIX até meados do século XX, apoiavam-se na Biologia e na Ecologia. No entanto, em meados do século XX a Biogeografia firmou-se como uma ciência geográfica, porque, ao contrário da Ecologia, que não considera o espaço, mas apenas o hábitat, desenvolveu-se uma visão espacial, que a integrava definitivamente no seio da Geografia. Com o uso do modelo sistêmico, os estudos biogeográficos foram ampliados e pôde-se determinar com maior exatidão o campo de estudo biogeográfico dentro de uma perspectiva espacial integrada. A Biogeografia explica a distribuição dos seres vivos no espaço organizado. O dinamismo da expansão e distribuição das espécies na biosfera é muito complexo e envolve conceitos da Geografia, da Ecologia, da Biologia, da Climatologia, da Hidrologia e muitas outras disciplinas, inclusive as ligadas à Geografia Humana. 2 OBJETO E OBJETIVOS O termo Biogeografia causa alguma confusão ainda hoje – é muito comum confundir-se Biogeografia com Ecologia – e vice-versa. Camargo (1988, p.98) aponta que “[...] muitos trabalhos, apesar de se referirem ou terem por tema “Biogeografia”, apresentam uma abordagem completamente diferente da dos geógrafos, em função da formação profissional destes cientistas e, principalmente, por causa dos objetivos diferentes”. UNIDADE 1 | A BIOGEOGRAFIA, A BIOSFERA, O CLIMA, O SOLO E OS SERES VIVOS 4 Dansereau (1957, p. 323 e 1999, p.128) definiu a Ecologia como “o estudo das reações das plantas e animais ao seu ambiente imediato, o seu hábitat (e não à sua localização geográfica)”. Em 1966, com base nesta mesma definição, argumentou que, “de acordo com este enunciado, a ecologia não chega a abranger o estudo do ambiente como um todo, assumindo em suas dimensões últimas o que constituiria o domínio da Biogeografia. Esta última integra neste sentido a geografia das plantas e animais históricos + bioclimatologia + autoecologia + sinecologia + uso do solo [...]. Mas valorizo a distinção entre Ecologia e Biogeografia, e mantenho pelo menos que necessitamos desta sólida estrutura conceitual para fazer avançar a ciência ambiental. Vejo-me também compelido a enfatizar que a ecologia forma o seu pivô [...]”. A Biogeografia considera o espaço geográfico organizado para explicar as causas e as consequências da distribuição das espécies. Para isso, tem que considerar o passado e, com ele, explicar o presente. O homem é um elemento primordial na distribuição das espécies, papel que é, muitas vezes, ignorado por muitos biogeógrafos, que se preocupam apenas com os fatores naturais. Não podemos esquecer que o homem sempre exerceu participação fundamental na repartição das espécies. Causas naturais e antropogênicas se misturam no decorrer do tempo. Os processos evolutivos são importantes: “[...] o geógrafo precisa saber como apareceram e porque se extinguiram as espécies. A distribuição geográfica das espécies, assim como a respectiva fisionomia, dependem das condições das épocas passadas [...]”. O número de indivíduos por espécie também era preocupação de De Martone, que afirmava que “[...] Os processos de multiplicação e de dispersão [...] são fatores primordiais da distribuição geográfica [...]”. A competição e a adaptação ao meio também eram objeto de preocupação de De Martone, porque contribuem para a fisionomia das regiões geográficas. De Martone escreveu também um capítulo sobre as modificações que o homem impunha à natureza. As definições modernas da Biogeografia são semelhantes e seguem, em geral, a linha de De Martone. Dansereau (1959) define a Biogeografia como “a ciência que estuda a distribuição, a adaptação, a expansão e a associação das plantas e dos animais”. Lemée (1967, apud KUHLMANN, 1977) a define como “a ciência da repartição dos seres vivos, de suas causas e de suas modificações”. (FURON apud KUHLMANN) afirma que a Biogeografia “é a ciência que estuda a repartição dos seres vivos na superfície dos continentes e no seio dos oceanos e as causas dessa repartição no espaço e no tempo”. Elhai (1968, apud QUINTANILLA, 1981) destaca a inter-relação da natureza com o homem e sintetiza o objeto e o objetivo da Biogeografia: “A Biogeografia estuda os organismos vivos, as plantas e os animais na superfície do globo, na sua repartição, em seu agrupamento e em suas relações com outros elementos do mundo físico e humano.” TÓPICO 1 | OBJETO, OBJETIVOS E CONCEITO DA BIOGEOGRAFIA 5 Para Mielke (1988, p.1), a Biogeografia “é o estudo científico dos padrões globais dos animais e das plantas”. Margalef (1989, p. 238) compara a Biogeografia com a Ecologia e sua definição mostra que ele se preocupa com o espaço geográfico, um conceito importante na Geografia, mas que a Ecologia não leva em conta: a Biogeografia é “[...] o estudo dos fenômenos biológicos em sua manifestação espacial [...]”. Troppmair (1989, p.1) defende a Biogeografia como parte integrante da Geografia e, pois, “estuda as interações,a organização e os processos espaciais” nos quais os seres vivos, inclusive o homem, têm participação fundamental. Por isso, ele diz (2006, p.1) que a Biogeografia estuda “as interações, a organização e os processos espaciais do presente e do passado, dando ênfase aos seres vivos – biocenoses – que habitam determinado local: o biótopo”. Cox & Moore (1994, p.1) definem a Biogeografia como “o estudo das coisas vivas num contexto espacial e temporal”. A ocupação de um biótopo é gradual, segundo a capacidade de adaptação e de dispersão das espécies. O tempo é importante, porque muitos fatos e fatores mudarão e evoluirão, enquanto as espécies organizam o espaço em que vão viver. Margalef (1989, p.235) reconhece que o tempo tem influência nas distribuições dos seres vivos do passado, com reflexos nos ecossistemas atuais. Müeller (1976, apud TROPPMAIR, 2006, p.1) delimita os objetivos e o campo de atuação da Biogeografia e dá importância ao espaço ocupado pelas espécies: Biogeografia pesquisa as razões da distribuição dos organismos, das comunidades vivas (biocenoses) e dos ecossistemas nas paisagens, países e continentes do mundo. A estrutura, a função, a história e os fatos indicadores sobre espaços são o objetivo dos estudos biogeográficos. Cox & Moore (1994, p.1) enumeram várias questões básicas que os biogeógrafos procuram responder: por que há tantos seres vivos? Por que eles se encontram distribuídos segundo os padrões atuais? Ocuparam eles, no passado, os mesmos padrões de distribuição de hoje? As atividades humanas alteram esses padrões e, se os alteram, o que acontecerá no futuro? A tarefa do biogeógrafo é buscar respostas para essas indagações e procurar regras gerais que as expliquem e, dessa forma, construir uma rede de conhecimentos que possa ser usada em predições para o futuro das espécies, incluindo a humana. A Geografia é antropocêntrica. O homem pode desequilibrar algumas variáveis do meio físico e acelerar e desequilibrar esses mecanismos e, pois, transformar a organização espacial. Por esta razão, Cox & Moore (1994, p. 1) afirmam que “[...] seria irreal fazer uma síntese da Biogeografia sem considerar o impacto causado pela espécie humana”. E Quintanilla (1981) confere fundamental importância à atuação do homem como modificador do meio natural. UNIDADE 1 | A BIOGEOGRAFIA, A BIOSFERA, O CLIMA, O SOLO E OS SERES VIVOS 6 Dansereau (1999, p. 37), comentou seu livro de 1957 (ver bibliografia) e disse que “Na verdade, meu esforço só chegaria a ser superado muito tempo depois, na medida em que ‘Biogeography’ permaneceu como sendo o único tratado geral de ecologia onde a dimensão humana era colocada em destaque” (p. 37). Ele foi um dos primeiros ecólogos a tentar construir uma ponte entre Ecologia e Biogeografia, ao enfocar a participação humana no meio natural. Dansereau mostrou que a Biogeografia busca auxílio em muitas outras ciências, tal qual faz a própria Geografia. Ele chamou essas disciplinas auxiliares de níveis de integração: “Os planos da Biogeografia representam, então, as várias limitações que o meio impõe sucessivamente aos seres vivos no tempo e no espaço”. (1999, p. 70). Contudo, o pilar principal da Biogeografia é a Geografia, onde se tem a base do estudo representada pela noção de espaço, de organização espacial. A distribuição dos seres vivos se faz no espaço geográfico e altera, com a dinâmica, a organização espacial. As disciplinas auxiliares da Biogeografia – Climatologia, Geologia, Pedologia, Fisiologia, Etologia, Sociologia, Antropologia, Filosofia, Ecologia, Biologia, Química, Física, Botânica, Zoologia, Paleontologia, Matemática, Estatística, Bioquímica e tantas outras – são integradas sob um único ponto de vista – o geossistema, que, de acordo com Monteiro (1994), é o “elemento de integração da síntese geográfica”. Os estudos geográficos e biogeográficos integram-se nos pontos de vista do geossistema e do ecossistema, embora sejam conceitos diferentes, que não devem ser confundidos. Orellana (1985, p.130) explica: “[...] no ecossistema a ênfase é toda para o componente vivo (biocenose) e o físico é acessório e muito variável [...]. No geossistema o elemento básico para a classificação é o espaço e tudo o que nele está contido em integração funcional”. O geossistema é a integração do meio físico, que constitui a sua base, com o meio biótico, que vive nele. O tempo é importante na Biogeografia. Ele tem duas escalas diferentes – a escala do homem e a escala dos tempos geológicos. Gould (1991) chama esta última de tempo profundo, para definir um tempo difícil de ser assimilado na escala cronológica. Conhecer a distribuição atual das espécies implica no estudo da sua evolução. Não apenas situar as espécies em uma determinada época geológica, mas, sobretudo, compreender o papel delas nos biótopos pretéritos. Da mesma forma, entender como as espécies atuais derivaram das suas ancestrais e que participações elas têm, hoje, nos biótopos. Então, a noção de tempo volta-se para outro ponto de vista – quanto tempo ainda viverão as espécies atuais que se encontram em estado de extinção? Quanto tempo levará para que essas espécies, ao invés de se extinguirem, se adaptem às transformações dos biótopos? São perguntas feitas por Cox & Moore (1994, p. 2) para as quais os biogeógrafos precisam encontrar a resposta. TÓPICO 1 | OBJETO, OBJETIVOS E CONCEITO DA BIOGEOGRAFIA 7 As populações e comunidades são outro rico campo de estudo da Biogeografia. A complexa rede de inter-relacionamento dos seres vivos nas comunidades pode permitir a coexistência de espécies diferentes no mesmo biótopo, selecionando as bem adaptadas, mas também pode eliminar populações pouco adaptadas. A espécie humana tem muita flexibilidade de se adaptar às mudanças ambientais, tanto por sua própria capacidade fisiológica, quanto por dispor de técnicas. O meio abiótico exerce enorme influência nas espécies, inclusive a humana. Os fatores físicos possuem uma dinâmica complexa, mas previsível, que se dá em ciclos – os ciclos biogeoquímicos. A noção de ecossistema é capital para a Geografia. Entretanto, o ecossistema não tem escala. Mas isto não impede que possa ser abordado convenientemente pelos estudos geográficos. No entanto, deve-se tomar o devido cuidado, exatamente pela falta da escala. As diferenças entre o ecossistema e o geossistema começam aqui – a escala. O ecossistema não é um lugar físico na natureza, mas, sim, um conjunto de relações ecológicas, que não pode ser mapeado, porque não tem dimensão espacial, muito embora essas relações de deem no espaço geográfico. O geossistema tem dimensão e pode ser representado cartograficamente. As relações dos organismos com o meio em que vivem e com os outros seres vivos se dão no campo sociológico e biológico, daí, a dificuldade de mapeá-las. Consideremos, por exemplo, a polinização das flores por pássaros, insetos ou pelo vento. O mecanismo da polinização é biológico, mas também implica num aspecto geográfico – graças a ele, a planta pode se expandir e ocupar o espaço geográfico. A polinização não pode ser mapeada, mas seus resultados podem ser colocados em tabelas e gráficos. A expansão da vegetação, por seu lado, pode ser mapeada. Este fato evidencia a interligação da Ecologia com a Biogeografia e com a Geografia, o que mostra que as noções de ecossistema e de geossistema se completam. A Biogeografia não estuda apenas a distribuição das espécies, mas, também, as interações dos seres vivos entre si e com o meio em que vivem, tal como se faz na Ecologia. Contudo, com a diferença de que o espaço organizado tem que ser levado em conta, o que representa o estudo da organização do espaço, em que interagem elementos bióticos e abióticos, incluindo o homem. Quando uma população se estabelece num biótopo provocaráalterações, que alterarão a organização espacial do geossistema. É o caso dos cupins (insetos da ordem Isoptera), que mudam a paisagem natural do cerrado brasileiro quando erigem seus ninhos. O número elevado de cupinzeiros dificulta o uso para pastagem e para a agricultura. Na África, os elefantes devastam as florestas de acácias, das quais usam apenas a casca para se alimentar. UNIDADE 1 | A BIOGEOGRAFIA, A BIOSFERA, O CLIMA, O SOLO E OS SERES VIVOS 8 O homem é o principal transformador das paisagens. Além das modificações que ele introduz nos biótopos e nos ecossistemas, um fato que não desperta muita atenção, a proliferação de doenças, é um dos mais importantes efeitos do mau planejamento regional. Muitas epidemias, que se julgavam controladas ou até erradicadas, voltaram com muita força desde o final do século passado. A dengue e a febre amarela transmitidas pelo mosquito Aedes aegypti, a malária protagonizada pelo mosquito Anopheles darlingi, que introduz o protozoário do gênero Plasmodium, o cólera, trazido pelo bacilo Vibrio comma, que vive em águas contaminadas por esgotos, são exemplos mais recentes de endemias típicas do século XIX e anteriores. A geografia médica presta ao homem um inestimável serviço no conhecimento e localização de focos de epidemias. O estudo das enfermidades tem um vasto campo de pesquisa na Biogeografia. Conhecer os hábitos de vetores transmissores de moléstias, saber quais são os seus predadores, por exemplo, é um decisivo passo para combatê-los. A organização do espaço não se refere apenas à estrutura visível da paisagem do geossistema. As microformas, quase invisíveis e pouco observadas, são um importante componente da organização do espaço. Restos de comida, simples farelos de pão, por exemplo, esquecidos no canto da sala e que nos passam despercebidos, são excelentes fontes de alimentos para uma população inteira de baratas. As simpáticas lagartixas, que habitam os cantos invisíveis das casas, são um grande e útil predador de baratas e mosquitos. A organização do espaço doméstico é fortemente influenciada pelos insetos e outros animais, como os ratos. A organização do espaço tem uma vertente natural – não é só o homem que cria a paisagem. Há fatores físicos que interferem na distribuição das espécies e na organização do espaço. Por exemplo, nas altas montanhas, a distribuição das plantas está diretamente ligada às faixas de temperatura. Podemos observar isso nas serras de Santa Catarina, que não são tão altas, mas que mostram essa distribuição claramente. Outro exemplo é a distribuição das temperaturas segundo as latitudes. Em Santa Catarina, podemos ver uma clara distribuição natural da vegetação – a floresta ombrófila densa no litoral e nos morros e serras litorâneas, a floresta de araucária e os campos no planalto, com as suas respectivas particularidades. O homem não intervém nessa repartição. Há incontáveis maneiras de estudar a Biogeografia, tanto em excursões programadas nos cursos de Geografia e Ecologia, como um simples passeio num jardim e em um quintal. Os jardins e os quintais apresentam uma organização social e espacial muitíssimo variada e, por isto, são excelentes locais para se observar pequenos animais e insetos nas relações que travam entre si e com o ambiente. As comunidades dos jardins e quintais dependem integralmente do arranjo dos elementos componentes. TÓPICO 1 | OBJETO, OBJETIVOS E CONCEITO DA BIOGEOGRAFIA 9 A sombra de um arbusto, por exemplo, abriga seres vivos que preferem locais frescos e com alguma umidade, desde pequenos insetos, como aranhas, e animais, como minhocas, lesmas e centopeias, e plantas, como os musgos. Durrel (1989, p. 31) explora o ambiente doméstico numa observação criteriosa e assinala: “um quintal é um bom lugar para se estudar a história das plantas, uma vez que estamos, por assim dizer, ‘in situ’ e podemos observar as suas condições de crescimento, a forma como florescem e dão sementes e quais os animais que as ajudam ou prejudicam”. Quanto menos perturbação sofreu esse quintal ou jardim, maior será a diversidade de seres vivos nele abrigada. As populações em um quintal mudam com as horas do dia, porque cada ser vivo tem o seu próprio relógio biológico, que interfere no seu comportamento. Há espécies que preferem as horas mais frescas da manhã e da tarde, outras aparecem no final da tarde e outras, ainda, só vêm à noite. Nas horas mais quentes, os indivíduos, normalmente, permanecem em repouso a fim de resguardar a energia. Nisso inclui-se o homem, com a sua tradicional sesta após o almoço. No interior das residências também podemos encontrar padrões biogeográficos bem distintos. A busca do conhecimento em Biogeografia passa indubitavelmente pela observação in situ das inter-relações entre os seres vivos e destes com o ambiente: “a observação do ambiente natural faz parte do cotidiano do ser humano, de forma mais ou menos consciente. Todavia, no contexto acadêmico, esta operação deve ser cada vez melhor registrada, organizada e sistematizada” (BELTRAME, 1999, p. 519). A Biogeografia é dividida em dois ramos: a Fitogeografia, que estuda a distribuição espacial e as formas de dispersão das plantas na biosfera; e a Zoogeografia, que analisa as formas de distribuição e dispersão dos animais. Esse estudo deveria ser integrado, mas a complexidade dos dois campos e a preferência do biogeógrafo por um ou outro direcionam as pesquisas, o que não invalida o outro campo. No Brasil, de um modo geral, tem-se dispensado mais atenção à Fitogeografia. Camargo (1993) aponta várias dificuldades por que a Zoogeografia é menos estudada: a mobilidade constante dos animais à procura de comida e de abrigo, a competição entre as populações e dentro delas, os hábitos específicos de cada espécie, como a vida noturna, o pequeno porte dos animais brasileiros – com a única exceção da onça. Também podemos juntar aí o pequeno número de indivíduos por espécie, o que torna uma floresta, por exemplo, quase vazia, sobretudo de mamíferos. UNIDADE 1 | A BIOGEOGRAFIA, A BIOSFERA, O CLIMA, O SOLO E OS SERES VIVOS 10 Não é constante a aproximação do homem de um animal – ou ele foge ou está bem escondido. O pesquisador tem que acompanhar durante vários dias as pegadas, as fezes e todos os traços deixados pelo animal no hábitat até encontrá- lo. Há lugares específicos frequentados pelos animais, como locais em que vão dessedentar-se em rios. E eles têm períodos próprios para ir a esses lugares, geralmente, ao cair da noite. Por esta razão é importante conhecer pessoas que vivam nas proximidades desses biótopos. Elas, de modo geral, têm algum conhecimento dos hábitos dos animais. Os lugares mais indicados para se encontrar um animal ou ave são os ecótonos, uma faixa de transição entre ecossistemas diferentes – que não deve ser confundido com zonas de conflito ou de tensão ecológica, quando uma ou mais espécies tentam se impor sobre outras, em clara competição pelo espaço. O estudo da vegetação é facilitado, porque as plantas são fixas e permitem melhor observação, que consiste, principalmente, nas suas relações com o clima, o relevo e o solo. (CAMARGO, 1993). A Fitogeografia estuda as relações das plantas com os fatores físicos e bióticos dos biótopos. A flora é um tema da Botânica, mas não pode ser esquecido pela Fitogeografia. O enfoque biogeográfico não é biológico, mas procura relacionar as espécies de plantas – e de animais – com o meio em que se encontram. Finalmente, o objetivo da Biogeografia é estudar a repartição dos seres vivos na face da Terra e criar as bases conceituais para que a sua compreensão possa conduzir ao conhecimento dos hábitos e do comportamento das espécies, permitindo que as pesquisas se estendam até o âmbito da qualidade de vida para as outras espéciese, por extensão, para o próprio homem. 11 Neste tópico você estudou que: • A Biogeografia explica a distribuição dos seres vivos no espaço organizado. O dinamismo da expansão e distribuição das espécies na biosfera é muito complexo e envolve conceitos da Geografia, da Ecologia, da Biologia, da Climatologia, da Hidrologia e muitas outras disciplinas, inclusive as ligadas à Geografia Humana. • A Biogeografia considera o espaço geográfico organizado para explicar as causas e as consequências da distribuição das espécies. Para isso, tem que considerar o passado e, com ele, explicar o presente. • Para Mielke (1988, p. 1), a Biogeografia “é o estudo científico dos padrões globais dos animais e das plantas”. • A Biogeografia estuda “as interações, a organização e os processos espaciais do presente e do passado, dando ênfase aos seres vivos – biocenoses – que habitam determinado local: o biótopo”. • A Biogeografia pesquisa as razões da distribuição dos organismos, das comunidades vivas (biocenoses) e dos ecossistemas nas paisagens, países e continentes do mundo. A estrutura, a função, a história e os fatos indicadores sobre espaços são o objetivo dos estudos biogeográficos. • A tarefa do biogeógrafo é buscar respostas para essas indagações e procurar regras gerais que as expliquem e, dessa forma, construir uma rede de conhecimentos que possa ser usada em predições para o futuro das espécies, incluindo a humana. • O tempo é importante na Biogeografia. Ele tem duas escalas diferentes – a escala do homem e a escala dos tempos geológicos • Conhecer a distribuição atual das espécies implica no estudo da sua evolução. Não apenas situar as espécies em uma determinada época geológica, mas, sobretudo, compreender o papel delas nos biótopos pretéritos. • As diferenças entre o ecossistema e o geossistema começam aqui – a escala. O ecossistema não é um lugar físico na natureza, mas, sim, um conjunto de relações ecológicas, que não pode ser mapeada, porque não tem dimensão espacial, muito embora essas relações se deem no espaço geográfico. O geossistema tem dimensão e pode ser representado cartograficamente. RESUMO DO TÓPICO 1 12 • A Biogeografia é dividida em dois ramos: a Fitogeografia, que estuda a distribuição espacial e as formas de dispersão das plantas na biosfera; e a Zoogeografia, que analisa as formas de distribuição e dispersão dos animais. • O enfoque biogeográfico não é biológico, mas procura relacionar as espécies de plantas – e de animais – com o meio em que se encontram. 13 1 O que estuda a biogeografia e quais os dois principais ramos em que ela se divide? 2 Acerca do objeto, objetivo e conceito da Biogeografia, coloque V para as afirmativas verdadeiras e F para as falsas e em seguida assinale a alternativa que apresenta a sequência correta. ( ) As primeiras abordagens biogeográficas, desde o século XIX até cerca de meados do século XX, apoiavam-se na Biologia e na Ecologia. ( ) A Biogeografia considera o espaço geográfico organizado para explicar as causas e as consequências da distribuição das espécies. Para isso, tem que considerar o passado e, com ele, explicar o presente. ( ) A Biogeografia pesquisa as razões da distribuição dos organismos, das comunidades vivas (biocenoses) e dos ecossistemas nas paisagens, países e continentes do mundo. A estrutura, a função, a história e os fatos indicadores sobre espaços são o objetivo dos estudos biogeográficos. ( ) A Biogeografia não estuda apenas a distribuição das espécies, mas, também, as interações dos seres vivos entre si e com o meio em que vivem, tal como se faz na Ecologia. ( ) A Biogeografia é dividida em dois ramos: a Fitogeografia, que estuda a distribuição espacial e as formas de dispersão das plantas na biosfera; e a Zoogeografia, que analisa as formas de distribuição e dispersão dos animais. A sequência CORRETA é: a) ( ) V – V – V – V – V. b) ( ) F – V – F – V – V. c) ( ) V – F – V – V – F. d) ( ) V – V – V – F – V. AUTOATIVIDADE 14 15 TÓPICO 2 A POSIÇÃO DA BIOGEOGRAFIA NA CIÊNCIA GEOGRÁFICA UNIDADE 1 1 INTRODUÇÃO Neste tópico estudaremos assuntos relacionados ao ecossistema e ao geossistema. 2 ECOSSISTEMA E GEOSSISTEMA A unidade funcional da biosfera na visão da Ecologia é o ecossistema. Na visão geográfica, o espaço acha-se integrado à biosfera e é constituído por geossistemas (DUVIGNEAUD, 1980, p. 99; TROPPMAIR, 2002, p.100), formados por um mosaico de ecossistemas. O termo geobiocenose foi proposto pelo pedólogo russo Soukatchev em 1947 e é semelhante ao conceito de ecossistema. Subentende uma visão espacial do ecossistema, a partir do conceito de paisagem ecológica, expressão criada por Berg, em 1931, na Rússia. Berg definiu a paisagem ecológica como “[...] uma combinação ou agrupamento de objetos e de fenômenos, em que o relevo, o clima, a água, o solo, a cobertura vegetal, a vida animal e, ainda, a atividade humana, se combinam num todo harmonioso, repetindo-se de forma típica ao longo de uma área territorial”. (DUVIGNEAUD, p. 102). Troppmair (2002) assevera que as geobiocenoses têm uma componente orgânica – os seres vivos – e uma inorgânica – o biótopo, “[...) o elemento espacial, suporte da geobiocenose [...]”. A Ecologia estuda a transferência de matéria e energia no âmbito dos ecossistemas e esse movimento cria uma complexa rede de inter-relações. A Geografia estuda, por sua vez, a distribuição espacial dos ecossistemas no sistema geográfico, ou geossistema. Na verdade, não se pode falar de distribuição espacial dos ecossistemas, unicamente, porque eles não têm escala, dimensão. Um ecossistema não ocupa lugar no espaço, porque é uma rede de inter-relações e não um elemento concreto. UNIDADE 1 | A BIOGEOGRAFIA, A BIOSFERA, O CLIMA, O SOLO E OS SERES VIVOS 16 O homem é um componente da cadeia alimentar do ecossistema. Logo, é visto, pela Ecologia, como um produtor e consumidor de energia. Mas sociedade humana também é a paisagem geográfica organizada e cria paisagens diferentes. A cultura é um elemento do desenvolvimento cultural, transmitida coletivamente e própria da sociedade humana. É ela que diferencia o homem dos demais animais. Para Drew (1994, p.1), “a tradição cultural tem desempenhado o seu papel na determinação do comportamento das pessoas em relação ao ambiente”. Sem dúvida, é um elemento indispensável na análise da dimensão antropocêntrica de um geossistema. É o homem um componente biótico da cadeia alimentar ou é um componente à parte, situado fora do geossistema, mas que o altera? Ou poderá ser os dois, simultaneamente? Essas dúvidas foram levantadas na década de 1950 e, até agora, a Geografia não encontrou uma resposta. Inicialmente, os estudos biogeográficos foram realizados por biólogos – e muitos ainda o são. Mas a Ecologia não estuda a distribuição das espécies, mas, apenas, a sua localização, situando-as nos diversos biomas. A Geografia tem outra concepção – ela considera a constituição do espaço geográfico, uma vez que introduz um componente espacial, que foge aos conceitos ecológicos. (SCHÄFER, 1984 p. 37; CAMARGO, 1993). O ecossistema é a componente biológica do geossistema – que é físico. Troppmair (1984, apud CAMARGO, 1993) justifica o estudo dos ecossistemas na Geografia "[...] estudando a distribuição, a estrutura e a organização espacial dos compoentes bióticos e abióticos. Desse ponto de vista, o ecossistema passa a ser um subsistema do geossistema, pois a distribuição e a organização espacial dos diferentes ecossistemas, seja na forma, função e estrutura, compõem um mosaico que é a própria ‘paisagem’, objeto de pesquisa geográfica”. 3 O ENFOQUE SISTÊMICO O objetivo deste tópico é servir como um ponto de partida e apoio para a compreensão dos processos e mecanismosintegrados, que se verificam na biosfera e que nortearão a linha filosófica do Caderno de Estudos. A organização espacial dos sistemas naturais e humanos depende fundamentalmente da importação e da exportação da energia e da matéria. A organização espacial dos geossistemas é fruto dessa importação e exportação de energia e matéria. Ela compõe a paisagem geográfica organizada, integrada. TÓPICO 2 | A POSIÇÃO DA BIOGEOGRAFIA NA CIÊNCIA GEOGRÁFICA 17 Os estudos da paisagem não são recentes na Geografia. Alexandre von Humboldt (1769-1859) e Karl Ritter (1779-1859) afirmavam que o homem e a natureza se completavam. Vidal de La Blache (1845-1918) mostrou a interdependência dos fatores físicos e do homem na natureza, cujo fundamento está em Humboldt e Ritter (BROECK, 1981 p. 37; CHRISTOFOLETTI, org., 1982, p. 43; Moraes, 1986 p. 61; Müller Filho, 1988). Para De La Blache, a influência mútua homem-natureza constitui “[...] um todo integrado, interagente e interdependente [...], (MÜLLER FILHO, 1988, p. 1-21). Dessa forma, de La Blache criou as bases do possibilismo geográfico. Contudo, na concepção de La Blache, os fatores físicos sobressaíam-se aos humanos e deveriam ser tratados em primeiro lugar. Só depois de analisados fatores físicos, os humanos seriam incluídos, porque entravam para alterar o quadro físico. Por isto, ele separava os aspectos naturais e humanos em dois blocos distintos e fechados, que não se comunicavam. Mas, na sua visão, o papel da geografia não era estático. A ideia de La Blache era uma sobreposição de fatos e não de integração. O final da Segunda Guerra Mundial foi um novo renascimento para a humanidade. As relações da sociedade com a natureza tornaram-se mais complexas e se davam com extrema rapidez. A Geografia Regional de La Blache não conseguia acompanhar as mudanças. As pesquisas integradas na Geografia foram primeiramente elaboradas pelo geógrafo alemão Carl Troll (1899-1975). Firmando-se nos conceitos de troca de energia entre sistemas – a sinergia – que a Ecologia já usava desde a década de 30 – e que a Geografia só descobriu em fins dos anos 40 e início dos 50, graças aos seus trabalhos, ele mostrou como os elementos se interligavam para obter um resultado. Ele observara, perto de Munique, Alemanha, que, em algumas pequenas áreas, havia apenas uma cobertura vegetal de caráter xerófito, que se destacava por completo da vegetação de floresta de clima temperado úmido (Troppmair, 2001). Troll constatou que a vegetação xerófita nascera num solo pedregoso de origem glacial trazido pelo escoamento da água do degelo na primavera. Levados pelo escoamento e rios, os sedimentos foram depositados no sopé dos morros nos arredores de Munique. O solo formado era pobre em nutrientes e em água e a vegetação era um reflexo dessas condições. Levantou ele, então, a hipótese de que quadros semelhantes deveriam ocorrer em outras partes do mundo. Suas viagens pelos Andes, África e Ásia confirmaram a sua hipótese. Em 1939, Troll concluiu de suas pesquisas que: "Toda biocenose está vinculada a condições ambientais e tem características que dão origem a um tipo de paisagem [...]" e que "[...] toda biocenose bem característica e marcante é um sistema ecológico onde clima, solo, água, plantas e animais são funcionalmente interligados, formando um sistema maravilhosamente integrado" (in Troppmair, Id.). UNIDADE 1 | A BIOGEOGRAFIA, A BIOSFERA, O CLIMA, O SOLO E OS SERES VIVOS 18 3.1 O GEOSSISTEMA: A ORGANIZAÇÃO ESPACIAL Os elementos constitutivos da paisagem integrada agrupam-se em unidades homogêneas em si mesmas, contudo, heterogêneas em relação ao conjunto. Essas unidades recebem inúmeras denominações: geossistemas geocomplexos, sistemas geográficos, sistemas naturais territoriais, dentre outras. Viktor Sochava (1905-1978) empregou o método sistêmico, desenvolvido pelo biólogo austríaco Ludwig von Bartalanffy (1901-1972), para desenvolver o conceito de geossistema (Monteiro, 1996). O conceito de geossistema é fundamentalmente físico (SOCHAVA,1977; ORELLANA, 1985). A análise de sistemas investiga um todo unificado, formado por partes integradas, que se completam. Desta forma, é um excelente método para o estudo da paisagem geográfica. O geossistema é estruturado por processos dinâmicos que lhe conferem um estado momentâneo e característico. Os processos que dinamizam os geossistemas são de ordem biótica e abiótica e sua ação origina arranjos espaciais que “[...] formam um mosaico que é a própria organização do espaço geográfico”. (TROPPMAIR, 1989, p. 125). Troppmair (2002, p. 99) define o geossistema como “[...] um espaço que se caracteriza pela homogeneidade dos seus componentes, suas estruturas, fluxos e relações que, integrados, formam o sistema do ambiente físico e onde há exploração biológica.” Sochava define como “[...] sistemas naturais, de nível local, regional ou global, nos quais o substrato mineral, o solo, as comunidades de seres vivos, a água e as massas de ar, particulares às diversas subdivisões da superfície terrestre, acham-se interconectadas por trocas de matéria e energia, em um só conjunto”. (ROUGERIE; BEROUTCHACHVILI, 1991, p. 59). O trabalho de Troll, em Munique, foi feito com observações de campo e com fotografias aéreas, em 1928/29 – ele foi pioneiro no uso da fotointerpretação (Troppmair). Em 1937 ele apresentou as suas conclusões na Associação de Ciências da Terra, na Alemanha, que tiveram enorme repercussão entre os geógrafos, geólogos e outros pesquisadores das geociências. Um ano mais tarde ele publicou um trabalho intitulado Fotointerpretação e Pesquisa Ecológica, defendendo o uso de fotografias aéreas nos trabalhos ecológicos. Nesse trabalho, Troll utilizou pela primeira vez o termo Landschaftsoekologie, ou ecologia da paisagem ou, ainda, geoecologia (CHRISTOFOLETTI, 1981; KLINK, 1981, TROPPMAIR, 1985). TÓPICO 2 | A POSIÇÃO DA BIOGEOGRAFIA NA CIÊNCIA GEOGRÁFICA 19 Para Monteiro (1994), o geossistema é uma organização espacial geográfica, que forma um conjunto só entre o homem e o meio biótico e abiótico. Por esta razão, Monteiro “[...] evita a consideração das relações entre a natureza e sociedade em termos de antagonismo entre sistemas oponentes [...] (1994), pois, na sua opinião, o geossistema é um “[...] sistema singular, do tipo complexo, evolutivo e cibernético. O homem - parte integrante da natureza – [...] deve ser capaz de ser um elemento catalisador do jogo de relações e capaz de introduzir circuitos positivos de ‘feed- back’ regeneradores e autorreguladores do sistema”. (1994). O conceito de geossistema não está fechado – ainda se discutem as suas implicações na evolução da paisagem e o seu relacionamento com o homem e demais variáveis bióticas. Ao considerá-lo um paradigma da Geografia Física, Monteiro (1994) afirma que “[...] mais de três decênios (35 anos de 1960 a 1995) são passados e a ideia dos ‘geossistemas’ continua em progressão”. A estrutura, a hierarquia e o funcionamento do geossistema dependem da quantidade e da qualidade da energia importada. Os fluxos de energia organizam a distribuição das espécies e, desta forma, a expansão dos seres vivos não se dá ao acaso. Há fatores muito complexos (que estudaremos mais tarde) que a governam. O estudo da organização espacial é um diagnóstico do estado atual do geossistema enfocado. A representação cartográfica é essencial na síntese da análise geossistêmica, ao integrar dados obtidos nas diversas fontes utilizadas na pesquisa. As técnicas de geoprocessamento são essenciais hoje em dia para dar suporte à pesquisa. A aplicação do modelo geossistêmico, embora fundamental nos estudos geográficos e biogeográficos, especialmente, ainda é um grande desafio na sua concepção como na sua aplicação. Monteiro (1994) aponta três grandes dificuldadesnesta abordagem, mas que devemos vê-las como desafios da Geografia atual. São elas: • incorporação das ações antropogênicas, sugerindo o levantamento de medidas de precaução e a apresentação de medidas preventivas das aptidões do geossistema em estudo; • a prática da interdisciplinaridade, “isto é, quando várias disciplinas interagem de modo convergente para um propósito superior a todas elas” (p. 90); ● a comunicação visual dos resultados obtidos, que, em geral, requer mais do que a representação cartográfica. Monteiro (1994) salienta ainda que os componentes naturais podem, muitas vezes, ser superados pela “antropização” do geossistema, especialmente em áreas urbanizadas e industrializadas, o que representa outro desafio para o geógrafo. 20 RESUMO DO TÓPICO 2 Neste tópico você estudou que: • Na visão geográfica, o espaço acha-se integrado à biosfera e é constituído por geossistemas. • Inicialmente, os estudos biogeográficos foram realizados por biólogos – e muitos ainda o são. Mas a Ecologia não estuda a distribuição das espécies, apenas a sua localização, situando-as nos diversos biomas. • A Geografia tem outra concepção – ela considera a constituição do espaço geográfico, uma vez que introduz uma componente espacial, que foge aos conceitos ecológicos. • O ecossistema é a componente biológica do geossistema – que é físico. • O objetivo do enfoque sistêmico é servir como um ponto de partida e apoio para a compreensão dos processos e mecanismos integrados, que se verificam na biosfera e que nortearão a linha filosófica do Caderno de Estudos. • Os elementos constitutivos da paisagem integrada agrupam-se em unidades homogêneas em si mesmas, contudo, heterogêneas em relação ao conjunto. Essas unidades recebem inúmeras denominações: geossistemas geocomplexos, sistemas geográficos, sistemas naturais territoriais, dentre outras. • O geossistema é estrutura por processos dinâmicos que lhe conferem um estado momentâneo e característico. Os processos que dinamizam os geossistemas são de ordem biótica e abiótica e sua ação origina arranjos espaciais que “[...] formam um mosaico que é a própria organização do espaço geográfico” (TROPPMAIR, 1989, p. 125). • O geossistema é uma organização espacial geográfica, que forma um conjunto só entre o homem e o meio biótico e abiótico. 21 1 Caracterize três grandes desafios em estudos geográficos através da abordagem geossistêmica. 2 A unidade funcional da biosfera na visão da Ecologia é o ecossistema. Na visão geográfica, o espaço acha-se integrado à biosfera e é constituído por geossistemas formados por um mosaico de ecossistemas. Diante do exposto e com base no estudo realizado neste tópico, analise as afirmativas a seguir. I. O termo geobiocenose foi proposto pelo pedólogo russo Soukatchev em 1947 e é semelhante ao conceito de ecossistema. II. A Ecologia estuda a transferência de matéria e energia no âmbito dos ecossistemas e esse movimento cria uma complexa rede de inter-relações. III. A Geografia estuda, por sua vez, a distribuição espacial dos ecossistemas no sistema geográfico ou geossistema. IV. Um ecossistema não ocupa lugar no espaço, porque é uma rede de inter- relações e não um elemento concreto. V. O homem é um componente da cadeia alimentar do ecossistema. Logo, é visto, pela Ecologia, como um produtor e consumidor de energia. Agora, assinale a alternativa CORRETA: a) ( ) Estão corretas apenas as afirmativas I, II, III e IV. b) ( ) Estão corretas apenas as afirmativas I, III e V. c) ( ) Estão corretas apenas as afirmativas III e IV. d) ( ) Todas as afirmativas estão corretas. AUTOATIVIDADE 22 23 TÓPICO 3 A BIOSFERA UNIDADE 1 1 INTRODUÇÃO Caro(a) acadêmico(a), neste tópico abordaremos temas referentes à Biosfera, como: conceito, limites, fontes de energia, fluxos de energia e nutrientes (ciclos biogeoquímicos). 2 CONCEITO E LIMITES DA BIOSFERA A biosfera é a camada do planeta capaz de ser habitada por organismos. Divide- se em hidrosfera, troposfera (camada mais inferior da atmosfera) e a parte superior da litosfera, compreendendo uma faixa ou camada do globo terrestre que não ultrapassa os 20 quilômetros de espessura. O termo biosfera foi introduzido na ciência em 1875, pelo geólogo austríaco Eduard Suess. O russo Vladimir Ivanovitch Vernadsky usou o termo numa conferência em 1929 e, desta forma, o conceito de biosfera chegou ao Ocidente (Hutchinson, in Scientific American, 1972, p. 3). É quase impossível demarcar os limites da biosfera – traçar esses limites é desenhar a própria fronteira da vida. É muito difícil demarcar os limites da biosfera. Formas simples de vida, como esporos e bactérias, vivem a 8 ou 9 quilômetros de altura, camada em que o oxigênio é mínimo e a temperatura está por volta de 60º C abaixo de zero. Nos oceanos, a luz alcança cerca de 200 metros de profundidade, o que é o limite para as plantas que fazem a fotossíntese. Nas fossas submarinas, a mais de 10 quilômetros de profundidade, pequenos organismos vivem no limite da sobrevivência. Na superfície dos continentes, os desertos quentes e frios, as crateras de vulcões, as fontes termais, onde a água atinge temperaturas de 80º C, são lugares em que a vida está no seu limite. Dentre estes lugares, estão os picos de montanhas com "neves perpétuas" e lugares muito quentes e áridos. O limite do oxigênio é cerca de 6.000 metros de altitude, o que obriga aos alpinistas o uso de equipamento especial. Hutchinson (in Scientific American, 1972, p. 4) chama essas zonas de parabiosféricas. 24 UNIDADE 1 | A BIOGEOGRAFIA, A BIOSFERA, O CLIMA, O SOLO E OS SERES VIVOS 3 AS FONTES DE ENERGIA DA BIOSFERA A principal fonte de energia para a Terra é o Sol. Sua energia calorífica e luminosa espalha-se de forma desigual pela superfície, unicamente devido à forma globular do planeta. As latitudes e as altitudes criam variações diárias de luz e calor e os distribuem de forma irregular na superfície, e isto é uma das condições para a expansão das espécies. As leis da Termodinâmica dirigem o papel da energia na biosfera. A energia não pode ser criada nem destruída, apenas pode ser convertida para outra forma – postula a primeira lei, a Lei da Conservação da Energia. Quando uma dada quantidade de energia muda de forma, ocorre uma perda da quantidade total de energia usada antes, que se dissipa na forma de calor. A segunda lei, a Lei da Dissipação da Energia, explica essa perda. FIGURA 1 – A BIOSFERA E OS SEUS SUBSISTEMAS Atmosfera Hidrosfera AnimaisPlantas Litosfera AnimaisPlantas HidrosferaAtmosfera FONTE: Os autores A luz emitida do Sol compõe-se de vários comprimentos de onda, que originam o espectro eletromagnético da luz. Isaac Newton (1643-1727) foi o primeiro cientista a observar a luz solar decomposta nas suas diversas faixas de luz diferentes. Ele chamou as faixas de espectro. Newton mostrou que a luz não era formada apenas por luz branca, como se supunha até então. Ao atravessar a atmosfera, a radiação solar sofre modificações e perde considerável parte da quantidade total com que chega ao topo da atmosfera. As moléculas e os íons dos gases, as partículas de poeira, o vapor d'água, as nuvens são agentes que modificam a energia incidente. Eis alguns dados sobre a energia solar (TUBELIS & NASCIMENTO, 1984, p. 31; AYOADE, 1994, p. 23): - 56 x 1026 calorias são irradiadas pelo Sol por minuto nas formas seguintes: - radiação ultravioleta (comprimento de onda menor que 0,4 µm) - total de 9% recebido pela Terra; TÓPICO 3 | A BIOSFERA 25 - radiação visível (de 0,4 a 0,7 µm) - total de 41%; - radiação infravermelha (maior que 0,7 µm) - total de 50%; - a Terra intercepta 2,55 x 1018 cal - meio milionésimo do total, mas cerca de 30 mil vezesmais energia do que o total anual que a humanidade produz e consome; - constante solar: total de energia que incide numa superfície de 1 cm2 do topo da atmosfera por minuto. Equivale, aproximadamente, a 2cal/cm2/min. A energia solar gasta 9,5 minutos para percorrer os 150 milhões de quilômetros entre a Terra e o Sol. Cerca de 98% da energia incidente se perdem e a biosfera absorve apenas 2% deste total, conforme explica a Lei da Conservação da Energia. A energia radiante que chega à superfície da Terra é formada, num dia claro, por 45% de luz visível, 45% de infravermelho e 10% de ultravioleta. (ODUM, 1985). 4 OS FLUXOS DE ENERGIA E NUTRIENTES NA BIOSFERA: OS CICLOS BIOGEOQUÍMICOS As formas da matéria na biosfera são pouco variadas – gasosa, sólida ou líquida. A matéria transita na biosfera em círculos, ao contrário da energia, que tem apenas uma direção. O intemperismo é uma das formas de movimento dos materiais. O escoamento superficial transporta grandes quantidades de detritos, provenientes do desgaste do solo e das rochas, que são depositadas nos vales e nos leitos dos rios. É um processo contínuo de exportação e importação de matéria pelos geossistemas. A decomposição orgânica gera uma enorme quantidade de elementos e compostos químicos, como nitratos, fosfatos, sulfatos, ácidos orgânicos e elementos livres, como o enxofre, o carbono etc., que são prontamente absorvidos pelas plantas. Tudo começa com a absorção da energia solar pelas plantas clorofiladas. Esse início determina como a energia solar entra na biosfera e sofre modificações na sua forma, qualidade e quantidade. Esse trajeto é denominado cadeia trófica e tem várias etapas. Na fotossíntese, as plantas verdes produzem carboidratos, que, mais tarde, são usados como fonte de energia para o metabolismo da planta. As plantas verdes são chamadas de produtores primários. São autótrofas, porque produzem sua própria fonte de energia. Os herbívoros alimentam-se das plantas – são os consumidores de primeira ordem. Os carnívoros alimentam-se dos herbívoros e são os consumidores de segunda ordem. Há também os decompositores, micro e macro-organismos, que degradam ou mineralizam os restos orgânicos e compõem um importante papel na reciclagem dos nutrientes. Todos esses são heterótrofos, isto é, a fonte de energia é externa a eles. 26 UNIDADE 1 | A BIOGEOGRAFIA, A BIOSFERA, O CLIMA, O SOLO E OS SERES VIVOS Na fotossíntese, a energia solar ou energia dispersa é transformada em matéria ou energia concentrada. A primeira lei da Termodinâmica explica essa transformação. É chamada de Lei da Conservação da Energia. Esse processo constitui a primeira etapa da fabricação de matéria na biosfera. Por isto é denominada de produção primária. Representa a quantidade de tecidos orgânicos produzida pelas plantas. Apenas 2% da energia solar são absorvidos pela biosfera – 98% se perdem. O total absorvido, nada mais que 0,1%, é usado na fotossíntese. Não obstante esse valor tão baixo, as plantas produzem de 150 bilhões a 200 bilhões de toneladas de matéria orgânica seca por ano. Esse mecanismo complexo representa a única forma de manter a energia nos ecossistemas. A transformação de uma forma de energia – energia solar – para outra – a matéria ou energia concentrada – implica numa perda ou dissipação da energia, que supera 90% do total. Portanto, apenas 10% da matéria produzida num nível trófico são usados no nível trófico seguinte. Os nutrientes minerais têm outro processo. A energia tem um fluxo contínuo numa direção apenas – ele não volta sobre si mesmo. Mas os minerais circulam livremente na biosfera. Esse movimento circular permite que os nutrientes sejam usados várias vezes pelos seres vivos, antes de se dispersarem nos sedimentos, na água ou na atmosfera. Os nutrientes deixam os ecossistemas na forma de biomassa. A dispersão da biomassa é feita por três caminhos: - como matéria orgânica morta, que vai ser degradada pelos decompositores, na forma de restos vegetais, e na forma de outros produtos exportados (pólen, sementes, gases, líquidos etc.); - serapilheira, restos vegetais decompostos, que serão transformados em húmus pelos saprófagos – isto constitui o ciclo curto; - transformação dessa matéria orgânica em nutrientes por fungos e bactérias. As plantas reabsorvem os nutrientes e o ciclo é fechado, para recomeçar em seguida. O ciclo longo inclui todos os consumidores (parasitas, herbívoros, onívoros e carnívoros). Embora este ciclo seja menos representativo em termos de quantidade de matéria orgânica reciclada, os consumidores são considerados os reguladores de todo o sistema: “A sobreposição dos circuitos reguladores forma as cadeias alimentares. O ciclo longo é formado por uma sucessão dessas cadeias, que garantem, apesar das flutuações, o alto grau de estabilidade média do ecossistema”. O fluxo de gás carbônico proveniente dos processos de decomposição da serapilheira e do húmus é conhecido como respiração do solo. TÓPICO 3 | A BIOSFERA 27 Os ciclos são relativamente estáveis, mas estão sujeitos a flutuações, provocadas pela quantidade de matéria que entra no sistema, por pragas, moléstias, queimadas, escoamento superficial, nevascas, vendavais etc. Walter (1986, p. 9) cita, por exemplo, que o pastoreio moderado em pradarias “[...] também estimula o crescimento vegetativo das gramíneas, a ponto de aumentar a produção anual total” de biomassa vegetal (fitomassa), incluindo a quantidade consumida pelos animais. A ciclagem dos elementos é a essência do funcionamento do ecossistema. Nos ecossistemas terrestres, elementos essenciais circulam nos detritos que recobrem o solo. No meio aquático, as fontes de nutrientes são os sedimentos. Odum (1985, p. 27) ilustra bem a importância desta reciclagem, ao afirmar que: “(...) a degradação da matéria orgânica é um processo longo e complexo, controlando várias funções importantes no ecossistema. Por exemplo: (1) recicla os nutrientes através da mineralização da matéria orgânica morta; (2) (ligação entre íons metálicos e moléculas orgânicas) e complexa (ligação metal-carbono) nutrientes minerais; (3) recupera nutrientes e energia por ação microbiana; (4) produz alimento para uma sequência de organismos na cadeia alimentar de detritos; (5) produz metabólitos secundários que podem ser inibidores ou estimuladores e que são, muitas vezes, reguladores; (6) modifica os materiais inertes da superfície terrestre, produzindo, e.g., o complexo característico da terra que é o ‘solo’; e (7) mantém uma atmosfera que permita a vida de aeróbios de grande biomassa, como nós.” A ciclagem dos nutrientes é mais conhecida como ciclos biogeoquímicos, porque deles fazem parte tanto componentes bióticos quanto abióticos. Os ciclos biogeoquímicos são de dois tipos: ciclos gasosos, cujo reservatório é a atmosfera, e ciclos sedimentares, em que a crosta terrestre é o reservatório. Os nutrientes variam em quantidades usadas pelos seres vivos. Por esta razão, foram classificados em duas categorias: os macronutrientes e os micronutrientes. Os macronutrientes existem em maior quantidade, porque as plantas os usam em grande quantidade. Os micronutrientes são elementos de que as plantas têm menor necessidade – embora, igualmente, sejam imprescindíveis – e, por isto, ocorrem em menor quantidade na natureza. Esses elementos são de origem natural. Contudo, o homem tem introduzido nos ciclos elementos artificiais ou não, que não fazem parte da matéria orgânica, que Odum denomina elementos não essenciais (1985, p.132). Esses elementos provêm de indústrias, da mineração, da agricultura e contêm concentrações mais ou menos elevadas de metais e compostos orgânicos tóxicos e, sobretudo, elementos radioativos. 28 UNIDADE 1 | A BIOGEOGRAFIA, A BIOSFERA, O CLIMA,
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