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Demências Epidemiologia1 ● Em todo o mundo, aproximadamente 47 milhões de pessoas sofrem de demência, e este número deverá aumentar para 131 milhões até 2050, aumentando particularmente em países de baixa e média renda (LMIC), onde cerca de dois terços das pessoas com demência vivem. ● A demência afeta os indivíduos, suas famílias e a economia, com custos globais estimados em cerca de US$ 1 trilhão anualmente. ● Nos Estados Unidos, a prevalência de demência é de 15% em pessoas commais de 68 anos. ● A doença de Alzheimer (DA) afeta 5,8 milhões de pessoas, e 13,8 milhões deverão ter o diagnóstico de DA até o ano de 2050. ● A DA é a sexta causa de morte e a quinta causa principal entre pessoas com mais de 65 anos. ● As reduções na incidência de demência ajustada à idade ocorreu nos Estados Unidos e em outros países desenvolvidos ao longo últimos 20 anos, talvez associado ao aumento do nível educacional formal. ● Os fatores de risco não modificáveis para DA incluem sexo feminino, raça negra, etnia hispânica e fatores genéticos, como o gene da apolipoproteína E (APOE). ● Fatores de risco modificáveis para demência por todas as causas incluem hipertensão e diabetes, dieta e limitações cognitivas, atividades físicas e sociais. ● Patologicamente, “demência mista” é a forma mais comum de demência, encontrada em 46% das pessoas com DA clinicamente diagnosticada e mais comumente consistindo em neurodegeneração da DA e doença cerebrovascular. ● Outras patologias neurodegenerativas, como a doença dos corpos de Lewy (patologicamente confirmada em 17% dos pacientes) e a degeneração lobar frontotemporal (confirmado em <5% dos pacientes) são menos frequentes. Definição e caracterização2,3 ● Demência é diagnosticada quando há sintomas cognitivos ou comportamentais (neuropsiquiátricos) que: Medicina 7º semestre ○ Interferem na capacidade de trabalho ou de desempenhar atividades usuais ○ Representam declínio com relação a níveis prévios de funcionamento e desempenho ○ Não são explicáveis por delirium (estado confusional agudo) ou doença de cunho psiquiátrico importante. ● O comprometimento cognitivo é detectado e diagnosticado mediante combinação de: ○ Anamnese com o paciente e um informante que tenha conhecimento da história. ○ Avaliação cognitiva objetiva, por meio de breve exame do estado mental ou avaliação neuropsicológica. ● Os comprometimentos cognitivos ou comportamentais afetam, no mínimo, dois dos seguintes domínios: Quadro Clínico e abordagem inicial2,3 Anamnese ● As alterações cognitivas observadas em pacientes com demência geralmente são progressivas e de início insidioso, diferentemente do que se observa em outras doenças, como o delirium, que é agudo e flutuante, e a depressão, em que há envolvimento de alteração de humor. ● Na avaliação da cognição devem-se enfatizar os seguintes aspectos: ○ Memória: comprometimento da capacidade de adquirir ou evocar informações recentes, com sintomas que incluem: repetição das mesmas perguntas ou assuntos, esquecimento de eventos, compromissos ou do lugar em que guardou seus pertences. ○ Funções executivas: comprometimento do raciocínio, da realização de tarefas complexas e do julgamento, com sintomas como: baixa compreensão de situações de risco, redução da capacidade de cuidar das finanças, de tomar decisões e de planejar atividades complexas ou sequenciais. ○ Habilidades visuoespaciais: incapacidade de reconhecer faces ou objetos comuns, de encontrar objetos no campo visual, dificuldade para 2 Medicina 7º semestre manusear utensílios, para se vestir, não explicáveis por deficiência visual ou motora. ○ Linguagem (expressão, compreensão, leitura e escrita): dificuldade de encontrar e/ou compreender palavras, erros ao falar e escrever, com trocas de palavras ou fonemas, não explicáveis por déficit sensorial ou motor. ○ Personalidade ou comportamento: alterações de humor (labilidade, flutuações incaracterísticas), agitação, apatia, desinteresse, isolamento social, perda de empatia, desinibição, comportamentos obsessivos, compulsivos ou socialmente inaceitáveis. ● Ainda na anamnese, deve-se indagar se as alterações cognitivas têm influência nas atividades da vida diária (AVD) que o paciente costumava desempenhar, como: trabalhar, dirigir, cozinhar, ler, controlar as finanças, jogar cartas, lavar roupas, tomar banho. ● Note-se que as AVD podem estar alteradas tanto com relação a funções complexas (p. ex., dirigir e trabalhar) como até quanto a funções básicas (p. ex., tomar banho ou vestir-se). ● A história clínica, além de ajudar no diagnóstico de demência, pode auxiliar na identificação de sua possível causa, sendo necessário pesquisar história de acidente vascular encefálico, hipertensão não controlada, diabetes melito, uso abusivo de álcool, traumatismo cranioencefálico, quedas, alteração da marcha, uso de benzodiazepínicos e cirurgias prévias na tireoide. Exame físico 3 Medicina 7º semestre ● O examinador deve buscar sinais de doenças que afetem a cognição ou que o auxiliem no diagnóstico diferencial entre os tipos de demência, lembrando que doenças orgânicas descompensadas podem causar alteração cognitiva, a exemplo de hipotireoidismo e insuficiência hepática, entre outras. ● Deve-se ter atenção também a sinais clínicos de doenças infecciosas e de alcoolismo. ● Ao exame neurológico, devem-se pesquisar déficits neurológicos focais, reflexos tendinosos, tônus muscular. ● O exame motor deve dedicar particular atenção à pesquisa de sinais extrapiramidais ou movimentos involuntários, como discinesia tardia, tremor, asterixe, coreia ou mioclonia. ● A marcha deve ser cuidadosamente observada: os pequenos passos rígidos da apraxia do lobo frontal podem ser distinguidos da marcha cerebelosa de base ampla ou dos pequenos passos da doença extrapiramidal. ● O exame sensitivo pode revelar dados sugestivos de neuropatia periférica ou de doença sistêmica associada (deficiência de vitamina B12). Avaliação cognitiva objetiva ● Instrumentos que avaliam a cognição podem ser utilizados para triagem ou para melhorar a acurácia diagnóstica da demência. ● Valores isolados abaixo do ponto de corte não significam diagnóstico de demência. ● A escolha do melhor teste depende do cenário e dos recursos. Alguns testes podem ser aplicados rapidamente pelo médico no consultório. ● O Mini-exame do Estado Mental (MEEM), o teste de fluência verbal semântica (número de animais citados em 1 minuto), o teste de memória ou de listas de palavras da bateria do Cerad, e o teste do desenho do relógio são exemplos de instrumentos úteis. ● No MEEM, as pontuações variam de 0 a 30, e valores mais altos sugerem melhor desempenho. Os pontos de corte são 18/19 para analfabetos e 23/24 para indivíduos commais de 1 ano de escolaridade. ● Quando a anamnese e o breve exame cognitivo realizado pelo médico não forem suficientes para se estabelecer um diagnóstico confiável, deve-se realizar uma avaliação neuropsicológica. Avaliação objetiva do estado funcional 4 Medicina 7º semestre ● Existem diversos questionários para avaliação funcional, mas os de uso corriqueiro são os que avaliam as atividades básicas da vida diária (Katz) e as atividades instrumentais da vida diária (Lawton). Avaliação laboratorial ● De forma simplificada, é possível classificar as causas de demência em dois grandes grupos: demências sem e com comprometimento estrutural do sistema nervoso central (SNC). ● As demências sem comprometimento estrutural do SNC são decorrentes de transtornos de origem tóxica ou metabólica que ocorrem secundariamente a doenças sistêmicas (p. ex., doenças endócrinas, hepáticas ou renais) ou à ação de fármacos sobre o SNC (p. ex., substâncias anticolinérgicas, antipsicóticas, antiepilépticas ou hipnóticas). ● Dessa forma, o diagnóstico etiológico nesse grupo de demências depende essencialmente de exames laboratoriais (identificação das demências metabólicas, muitas potencialmente reversíveis) e de história clínica detalhada, buscando relacionar o uso dedeterminados medicamentos com o aparecimento da síndrome demencial. ● Sífilis e AIDS, embora façam parte das chamadas demências secundárias, decorrentes de comprometimento estrutural do SNC, devem também ser investigadas por meio de exames laboratoriais pertinentes e pelo exame do LCR. 5 Medicina 7º semestre ● O LCR também pode auxiliar no diagnóstico da doença de Creutzfeldt-Jakob por meio da detecção da chamada proteína 14-3-3. ○ Esse é um método diagnóstico importante na investigação etiológica de algumas formas específicas de demência rapidamente progressiva, as encefalopatias imunomediadas, por meio da detecção de anticorpos específicos. ○ O exame do LCR tem se revelado um método bastante sensível e específico para o diagnóstico precoce da DA (mesmo no estágio de comprometimento cognitivo leve) quando se utiliza a dosagem das proteínas tau total, tau fosforilada e β-amiloide. ● Outro exame complementar que está indicado em situações especiais é o eletroencefalograma, que pode ser útil no diagnóstico diferencial entre demência e estado confusional agudo (delirium), no diagnóstico de algumas encefalopatias metabólicas (particularmente na encefalopatia hepática), bem como na identificação de atividade epileptogênica subclínica e na doença de Creutzfeldt-Jakob. ● As demências secundárias decorrem de um conjunto variado de condições clínicas, como doença cerebrovascular, hidrocefalia, infecções e tumores. ● Nesses casos, o diagnóstico específico depende fundamentalmente de exames de neuroimagem estrutural (tomografia computadorizada ou ressonância magnética de crânio). ○ Um dos principais objetivos da solicitação desses exames é descartar lesões intracerebrais que causem demência e possam ser potencialmente tratáveis, como hematoma subdural e hidrocefalia de pressão normal. ○ Permitem o diagnóstico de infartos corticais, subcorticais e alterações da substância branca que possam justificar uma etiologia vascular. ○ Podem evidenciar padrões de atrofia característicos: por exemplo, a atrofia hipocampal e temporomedial são marcadores sensíveis e precoces 6 Medicina 7º semestre da doença de Alzheimer, e a atrofia do lobo temporal anterior ou frontal pode ser vista nas demências frontotemporais. ○ A tomografia tem como vantagens o custo mais baixo e a maior rapidez na sua realização. ○ A ressonância magnética, por sua vez, permite avaliação mais detalhada da substância branca, importante para o diagnóstico de demência vascular secundária à doença de pequenos vasos, além de possibilitar a identificação de padrões focais de atrofia (p. ex., atrofia hipocampal), o que pode ser útil para o diagnóstico de condições neurodegenerativas como a DA, a demência frontotemporal e a afasia progressiva primária. ● O último grupo etiológico corresponde às demências primárias ou degenerativas. Dele fazem parte doenças que, embora possam cursar com síndrome demencial como manifestação clínica principal, em geral têm como característica clínica predominante a presença de sinais motores, alterações de equilíbrio e de marcha, entre outros. ○ Nesses casos, portanto, o exame neurológico constitui a principal ferramenta diagnóstica, podendo revelar bradicinesia, rigidez, tremor, instabilidade postural ou alterações de marcha características nos indivíduos com doença de Parkinson, alteração da motricidade ocular extrínseca na paralisia supranuclear progressiva, movimentos coreicos na doença de Huntington ou síndrome cerebelar nas ataxias espinocerebelares. ○ Finalmente, existe a forma de demência primária ou degenerativa, em que a síndrome demencial constitui a manifestação clínica principal. Aqui se encontra a causa mais frequente de demência em idosos, que é a DA. ○ Outras causas incluídas neste grupo são a demência frontotemporal e a demência com corpos de Lewy. Ob�.: em resumo, na suspeita de demência, sempre solicitar, ao menos: hemograma, VDRL, anti-HIV, vitamina B12 e ácido fólico, glicemia de jejum, Hb1Ac, TSH, sódio, potássio e cálcio, ureia e creatinina, AST e ALT, colesterol total e frações (HDL, LDL, TGL), neuroimagem (TC ou RNM de crânio). 7 Medicina 7º semestre Classificação3 ● As demências podem ser classificadas de acordo com o seu potencial de reversibilidade (reversíveis ou irreversíveis), a fim de que o tratamento para o primeiro grupo seja instituído prontamente. ● Podem ser classificadas também em degenerativas e não degenerativas. ○ As primeiras estão associadas a processos patológicos que causam dano cerebral progressivo, como a doença de Alzheimer, a doença de Creutzfeldt-Jakob e a demência na doença de Parkinson. ○ As demências não neurodegenerativas são aquelas decorrentes de lesão cerebral, como acidente vascular encefálico (AVE) e traumatismo cranioencefálico. 8 Medicina 7º semestre Principais tipos de demência1 - Demências potencialmente reversíveis - ● Aproximadamente 10% das demências podem ser reversíveis. ● Divididas em três grandes subcategorias: ○ Demências com comprometimento estrutural do sistema nervoso central (SNC): hidrocefalia de pressão normal (HPN), lesões expansivas (neoplasias, hematoma subdural) e doenças infecciosas do SNC. ○ Condições médicas gerais: medicamentos, carências nutricionais, distúrbios hidreletrolíticos, transtornos endócrinos, doenças sistêmicas, intoxicação por metais pesados. ○ Transtornos psiquiátricos: principalmente a depressão maior. - Demências rapidamente progressivas - ● As demências rapidamente progressivas são caracterizadas por um intervalo menor do que 2 anos entre a instalação dos sintomas e o diagnóstico de demência ou a morte. ● É frequente o acometimento de indivíduos com idade inferior a 65 anos. - Doença de Alzheimer - 9 Medicina 7º semestre ● A doença de Alzheimer (DA) é uma doença neurodegenerativa de causa e patogênese incertas, que afeta principalmente idosos e corresponde a aproximadamente 60% de todas as demências, sendo, portanto, a principal e mais prevalente dentre todas as causas. ● Apresenta curso clínico tipicamente de início insidioso e deterioração progressiva. ● A sobrevida após o diagnóstico varia entre 3 e 20 anos, com uma expectativa de vida média de 8 a 10 anos. Apresentação clínica ● A manifestação clínica mais precoce e essencial da DA é o comprometimento da memória episódica, inicialmente para eventos recentes, embora existam exceções em formas atípicas da doença. ● Déficits em outros domínios cognitivos podem aparecer de forma concomitante ou subsequente ao déficit de memória. ● A disfunção executiva e o comprometimento visuoespacial geralmente estão presentes em fases iniciais, enquanto as alterações da linguagem (afasia), apraxia e distúrbios comportamentais se manifestam mais tardiamente no curso da doença. ● Ocasionalmente, a apresentação inicial da doença pode incluir distúrbios comportamentais; porém, a proeminência dessas alterações em relação às alterações cognitivas no início do curso da doença é incomum. ● As características adicionais que diminuem a probabilidade de doença de Alzheimer incluem um início súbito, a presença de sinais neurológicos focais (hemiparesia, perda sensorial, déficits de campo visual, perda de coordenação) e a presença de alterações da marcha ou convulsões de início precoce. ● Nas fases iniciais da DA, o exame neurológico é normal. ● Quando sinais motores piramidais, extrapiramidais, mioclonias e convulsões estão presentes, estes tipicamente ocorrem nas fases avançadas da doença. ● Variantes clínicas da DA: ○ Atrofia cortical posterior: cursa com problemas visuoespaciais. Pode ainda estar associada a uma síndrome logopênica caracterizada por anomia e fluência verbal prejudicada. ○ Variante frontal ou disexecutiva: o paciente apresenta uma disfunção executiva proeminente em relação ao déficit de memória. ○ Síndrome corticobasal. 10 Medicina 7º semestre Diagnóstico ● O diagnóstico definitivo da doença de Alzheimer requer o exame histopatológico, o que raramente é realizado em vida. ● Portanto, o diagnóstico na práticaé realizado a partir de critérios clínicos (DSM-5, NINCDS-ADRDA), que permitem um diagnóstico preciso em mais de 90% dos casos. ● A DA deve ser suspeitada em qualquer idoso que se apresente com um declínio insidioso e progressivo da memória e de pelo menos alguma outra função cognitiva. ● O papel dos exames laboratoriais e da neuroimagem é principalmente o de excluir outros diagnósticos. ● Existe uma série de biomarcadores para apoiar o diagnóstico de DA, mas que em sua maioria ainda não tem aplicabilidade à prática clínica. ● No entanto, são recursos disponíveis que podem acrescentar confiabilidade adicional ao diagnóstico clínico e podem ser úteis em certas circunstâncias, como na investigação de pacientes com apresentações atípicas ou na doença de início precoce. ● Os testes genéticos não são recomendados como avaliação de rotina. ● A testagem pode estar indicada na suspeita de doença de Huntington, arteriopatia cerebral autossômica dominante com infartos subcorticais e leucoencefalopatia (CADASIL), doença de Alzheimer e demência frontotemporal. - Degeneração lobar frontotemporal - ● Consiste em um termo amplo para descrição de um grupo heterogêneo de distúrbios, caracterizados patologicamente pela atrofia progressiva dos lobos frontal e/ou temporal, que se manifestam por meio de três síndromes 11 Medicina 7º semestre clínicas distintas: demência frontotemporal variante comportamental (DFTv), demência semântica (DS) e afasia não fluente progressiva (ANFP). ● Geralmente é reconhecida como uma causa de demência pré-senil (< 65 anos), mas pode ser tão precoce quanto na terceira década ou tão tardia quanto na nona década. ● A DLFT apresenta um componente genético substancial, com um padrão de herança autossômica dominante e/ou mutações causadoras de doenças identificadas em cerca de 10 a 20% dos casos e história familiar positiva em proporção maior. ● A DFTv é caracterizada por um amplo espectro de manifestações fenotípicas que podem incluir declínio progressivo nas relações interpessoais, disfunção executiva, indiferença afetiva, e uma ampla variedade de comportamentos anormais, como desinibição, adinamia, obsessões, rituais, estereotipias e alterações do padrão alimentar. ● A DS é caracterizada pela perda progressiva da memória semântica, geralmente afetando o conhecimento das palavras. Os pacientes comumente apresentam uma fala fluente, embora vazia de significado, com perda de vocabulário e disgrafia. ○ Um comprometimento semântico mais generalizado, com prejuízo das informações visuais (prosopagnosia, agnosia visual) e de outros domínios não verbais, geralmente sobrevém mais tarde no curso da doença. ○ A DS é associada à atrofia anteroinferior seletiva e assimétrica do lobo temporal, predominantemente do lado esquerdo, na maioria dos casos. ● A ANFP é caracterizada por uma perda progressiva da fluência, afetando inicialmente a fala e, posteriormente, as habilidades de aprendizagem. Geralmente, o discurso é não fluente, contendo erros articulatórios (discurso apráxico) e agramatismo. Ob�.: As alterações precoces no comportamento e na personalidade e a disfunção executiva distinguem a DFTv da doença de Alzheimer. - Demência com corpos de Lewy - ● A demência com corpos de Lewy (DCL) é o segundo tipo mais comum de demência degenerativa, respondendo por 10 a 15% dos casos. ● Clinicamente, a DCL é caracterizada por declínio cognitivo progressivo, acompanhado de sintomas característicos, como alucinações visuais 12 Medicina 7º semestre complexas, atenção e cognição flutuantes e parkinsonismo de início precoce no curso da doença. ● Características que apoiam a doença incluem a hipersensibilidade aos neurolépticos e distúrbios comportamentais do sono REM. ● Atenção, habilidades visuoespaciais e funções executivas encontram-se mais afetadas nos indivíduos com DCL em comparação aos portadores de DA. - Síndromes parkinsonianas - ● As síndromes parkinsonianas são doenças neurodegenerativas com características proeminentes extrapiramidais (bradicinesia, rigidez, instabilidade da marcha). ● Com frequência essas síndromes estão também associadas a comprometimento cognitivo significativo. ● Dentre as síndromes parkinsonianas estão a doença de Parkinson (DP), a paralisia supranuclear progressiva (PSP), a demência com corpos de Lewy (DCL), a atrofia de múltiplos sistemas (AMS) e a degeneração corticobasal (DCB). ● Na DP, o comprometimento cognitivo tende a surgir pelo menos 1 ano após o início dos sintomas motores. ● Essa regra temporal tem sido utilizada para auxílio no diagnóstico diferencial entre DP e DCL. ● A PSP é inicialmente caracterizada por oftalmoplegia supranuclear, instabilidade postural complicada por quedas e rigidez axial. ● A AMS é caracterizada pela associação de parkinsonismo com disautonomia, disfunção cerebelar ou corticoespinal. ● A DCB é uma síndrome clínica heterogênea que causa parkinsonismo assimétrico, distonia e sinais como apraxia, perda sensorial cortical ou membro alienígena. - Demência vascular - ● A doença cerebrovascular é a segunda causa mais comum de demência no idoso. ● O aparecimento de demência no prazo de 3 meses após um acidente vascular cerebral e a deterioração da cognição em degraus são altamente sugestivos de demência vascular (DV). ● A apresentação clínica da DV dependerá da localização e da causa das lesões cerebrovasculares. 13 Medicina 7º semestre ● Uma doença de grandes vasos leva comumente a infartos corticais (síndrome demencial cortical), enquanto uma doença de pequenos vasos causa isquemia da substância branca periventricular e infartos lacunares, levando à demência vascular isquêmica subcortical (DVIS), que consiste no subtipo mais comum e responsável por mais de 50% dos casos de DV. ● Dependendo da localização das lesões, o padrão do déficit cognitivo poderá ser subcortical, cortical ou misto. ● As demências de padrão subcortical, em geral, resultam em uma síndrome caracterizada por alterações frontais, disfunção executiva, comprometimento leve da memória, prejuízo da atenção, depressão, alentecimento motor, sintomas parkinsonianos, distúrbios urinários e paralisia pseudobulbar. ● Nas demências de padrão cortical, as características cognitivas dependerão das áreas cerebrais afetadas. ● O diagnóstico é altamente sugestivo quando há predominância de disfunção executiva, sintomas neurológicos focais, síndrome pseudobulbar e início precoce do transtorno de marcha ou urgência urinária . ● Os sinais neurológicos focais que podem ser encontrados na demência vascular incluem resposta extensora plantar, paralisia pseudobulbar, anormalidades da marcha, hiper-reflexia e paresia de uma das extremidades. ● A presença de doença extensa e confluente na substância branca e a localização de lesões isquêmicas em “áreas estratégicas” para a cognição, como giro do cíngulo, lobo temporal medial, tálamo ou caudado, aumentam a probabilidade da etiologia vascular para o comprometimento cognitivo. - Demência mista - ● O termo demência mista é mais comumente aplicado à coexistência de doença de Alzheimer e demência vascular. ● Porém, outras patologias concomitantes também podem ocorrer em demência. A doença de Parkinson está presente em 20% dos pacientes com DA, e aproximadamente 50% dos casos de demência com corpos de Lewy estão associados à doença de Alzheimer. ● Estudos de necropsia têm evidenciado que a patologia vascular coexistente ocorre em 24 a 28% dos pacientes com DA. ● Porém, o diagnóstico e o tratamento desses pacientes com patologia mista são complexos graças à ausência de critérios diagnósticos específicos. ● A apresentação mais comum de demência mista é a de um paciente com sintomas e características clínicas típicas de DA que sofre piora abrupta, acompanhada pela presença de sinais clínicos de AVE. 14 Medicina 7º semestre - Doença de Creutzfeldt-Jakob - ● A doença de Creutzfeldt-Jakob (DCJ) é o protótipo das demências rapidamente progressivas. ● Consiste em uma doença causada por príons, que podeser herdada geneticamente, adquirida como uma infecção, ou esporádica. ● A DCJ esporádica corresponde à forma mais comum da doença (85% dos casos) e tem uma prevalência estimada em 0,5 a 1,5 caso por milhão; a idade média de início é 65 anos, e a duração média da doença é de 8 meses. Somente 4% dos pacientes sobrevivem por mais de 2 anos. ● Embora rara, a DCJ deve ser reconhecida prontamente devido à possibilidade de transmissão através de instrumentos cirúrgicos contaminados ou transplante de órgãos. ● Os critérios diagnósticos para a DCJ esporádica são baseados em sinais clínicos, presença de ondas periódicas trifásicas e assimétricas no eletroencefalograma, presença no líquor da proteína 14-3-3 e aumento de sinal nas sequências de difusão da ressonância magnética nas regiões do córtex, gânglios da base e pulvinar. ● O padrão de progressão acelerada associado a mioclonia, ataxia de marcha e anormalidades visuais (defeitos de campo visual e alucinações visuais) no início do curso da doença deve sugerir DCJ. ● O diagnóstico de certeza requer confirmação histopatológica. - Resumindo - 15 Medicina 7º semestre Tratamento2 ● Os objetivos básicos sãomelhorar a qualidade de vida e otimizar a capacidade funcional através de melhora da cognição, do humor e do comportamento. Uma conversa franca com o paciente, familiares e cuidadores pode prevenir complicações futuras. - Tratamento geral - ● Identificar e tratar comorbidades ● Promover saúde cerebral por meio de exercício, dieta balanceada e redução do estresse 16 Medicina 7º semestre ● Evitar uso de medicação anticolinérgica (codeína, hidroxizina, oxibutinina, antidepressivo tricíclico) ● Limitar o uso de psicotrópicos, quando necessário ● Esclarecer a evolução da doença ● Otimizar e preservar a capacidade funcional ● Estabelecer vínculo entre paciente e família ● Diagnosticar e tratar sintomas psiquiátricos ● Evitar perambulações na rua ● Alertar família e paciente sobre os perigos de dirigir automóvel ● Alertar a família sobre questão de cuidados e assuntos financeiros e legais. - Tratamento não farmacológico - ● Para manter a capacidade funcional ● Diário miccional, levando o paciente ao toalete nos horários certos, para incontinência urinária ● Assistência moderada (a menor ajuda possível nas AVD), com prática e motivação para que aumente a independência. ● Para transtornos de comportamento: ○ Música durante refeições ou banho ○ Caminhada ou exercício leve ○ Simular presença da família com imagens de vídeo e áudio ○ Terapia com animais de estimação ○ Falar no nível de compreensão do paciente, com pausas, evitando frases longas e palavras complexas ○ Evitar discussões e tom de voz muito alto ○ Luz clara e pouco barulho - Tratamento farmacológico - ● O uso de inibidores da acetilcolinesterase é eficaz para DA leve, moderada e grave em nível importante de evidência. ● O uso de memantina isoladamente ou associada ao inibidor da acetilcolinesterase é eficaz em pessoas com DA moderada a grave. ● No Brasil, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) aprovou o uso de donepezila e galantamina para as formas leves e moderadas de DA e de rivastigmina para as formas leves, moderas e graves. A galantamina foi aprovada também para DA associada a doença vascular cerebral. 17 Medicina 7º semestre ● Os anticolinesterásicos têm mostrado pequeno benefício também em outras demências, como a associada à doença de Parkinson, a demência vascular e a demência com corpos de Lewy. ● O uso de anticolinesterásico pode manter ou melhorar a capacidade funcional por mais tempo. ● A avaliação de resposta ao tratamento deverá ser feita por meio de: ○ Observação, pelo cuidador, do comportamento e da cognição do paciente ○ Realização de avaliações objetivas de cognição e AVD (p. ex., MEEM, KATZ, Lawton). 18 Medicina 7º semestre Tratamento dos sintomas comportamentais e psicológicos da demência ● O tratamento farmacológico da agitação e da agressividade para pacientes com DA só deve ser instituído quando nenhuma medida não farmacológica responder, e após se ter descartado qualquer outro fator interveniente (dor, retenção urinária, impactação fecal). Antipsicóticos ● Tratamento da agitação e agressividade em pacientes com DA moderada a grave. Trata-se da classe de medicamentos de escolha para essa situação clínica. ● Deve-se iniciar com doses baixas, somente após avaliação do risco e do benefício. O período estimado de tratamento é de 12 semanas, com reavaliação obrigatória. A insistência em doses progressivamente maiores e tempo indeterminado leva mais a efeitos deletérios do que benéficos. ● Neurolépticos atípicos devem ser preferidos porque têm menos efeitos colaterais e não conferem maior risco de acidente vascular encefálico ou mortalidade do que os convencionais. Benzodiazepínicos ● Os poucos estudos específicos sobre os SCPD e dados da literatura demonstram benefício modesto dos benzodiazepínicos, com uma série de efeitos adversos envolvendo risco aumentado de quedas, confusão, piora da memória, complicações respiratórias; em poucos casos, podem levar a desinibição paradoxal. ● Lorazepam e oxazepam, que não têm metabólitos ativos, são preferíveis aos agentes com meia-vida longa, como diazepam ou clonazepam. Anticolinesterásicos ● Em manifestações específicas, como depressão ou disforia, ansiedade e apatia ou indiferença, há evidências de benefício. Memantina ● O uso de memantina em pacientes com DA moderada a grave provavelmente reduz o aparecimento de alguns SCPD. Todavia, vale lembrar a existência de possíveis efeitos adversos (p. ex., constipação intestinal, tontura, cefaleia e anorexia) que podem alterar o transtorno comportamental. 19 Medicina 7º semestre Antidepressivos ● É possível que o uso de antidepressivos seja benéfico no tratamento de alguns SCPD em pacientes com DA. Destacam-se o citalopram e a sertralina, que chegaram a ser comparados a risperidona e haloperidol. Anticonvulsivantes ● Esta classe de medicamentos pode ser uma boa opção para manejo de sintomas comportamentais que exijam tratamento prolongado ou quando existe falha de antipsicóticos. A carbamazepina foi estudada inicialmente, mas estudos recentes ponderam a aplicação de outras substâncias (p. ex., lamotrigina e gabapentina). Referências 1) ARVANITAKIS, Zoe; SHAH, Raj C.; BENNETT, David A. Diagnosis and Management of Dementia: Review. JAMA, [s. l.], v. 322, n. 16, p. 1589-1599, 2019. 2) VIRGÍLIO GARCIA MOREIRA, Roberto Alves Lourenço. O Idoso Frágil. In: FREITAS, Elizabeth Viana et al. Manual Prático de Geriatria. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2018. v. 2, cap. 3, p. 31-40. 3) SPERANZA, Ana Cristina Canedo; MOSCI, Tarso. Diagnóstico Diferencial das Demência. In: FREITAS, Elizabeth Viana. Tratado de geriatria e gerontologia. 4. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2018. cap. 20, p. 221-230. 20
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