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Técnicas de Atendimento em Psicanálise Título original Técnicas de Atendimento em Psicanálise Primeira publicação em Guaçuí, Espirito Santo, Brasil 2022 1a Edição Todos os direitos da obra Técnicas de Atendimento em Psicanálise Reservados ao Autor Copyright do texto © Ademir Barbosa da Silva,2022 Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) Índices para catálogo sistematico Psicologia B150 Sumário CAPÍTULO I .............................................................................. 9 Primeiro tempo .................................................................... 10 Porque os estímulos externos são entendidos de forma distintas: .......................................................................... 10 O método de escuta do analista ...................................... 13 Sentido lógico das indagações ........................................ 14 Os três tempos de uma análise ....................................... 16 As duas formas de transferência ..................................... 17 Criando demanda de análise ........................................... 19 Diagnóstico estrutural .......................................................... 21 Neurose: .......................................................................... 23 Psicose: ........................................................................... 23 Segundo Momento .............................................................. 25 Manejo da transferência consolidada e a livre associação ........................................................................................ 25 Como são escolhidos os pontos a serem colocados para o paciente? ......................................................................... 27 Ato falho: ......................................................................... 29 Chiste: ............................................................................. 30 Lapsos de memória: ........................................................ 30 Incoerências discursivas: ................................................. 31 Entendendo os mecanismos de defesa ............................... 32 Introjeção: ................................................................. 32 Identificação: ............................................................ 32 Projeção: .................................................................. 32 Negação: .................................................................. 33 Fantasia: ................................................................... 33 Racionalização: ........................................................ 33 Expiação: .................................................................. 33 Formação reativa: ..................................................... 34 Regressão: ............................................................... 34 Terceiro Momento ............................................................... 34 Proposta de intervenção...................................................... 34 Questões importantes a se considerar ............................. 37 O que não devo fazer: ..................................................... 37 O que devo fazer: ............................................................ 37 Atividade: estudo prático de caso .................................... 39 CAPÍTULO II ........................................................................... 47 O inconsciente estruturado como linguagem e a sua análise prática. ................................................................................ 47 Análise prática do discurso .............................................. 51 A amarração significante e o no borromeano ................... 52 Os quatro discursos no manejo clínico ............................ 55 Análise dos discursos: ..................................................... 59 O tempo lógico e as suas atribuições na prática .............. 61 Análise derivatória da demanda provenientes do desejo. 64 Análise da demanda e desejo .......................................... 65 Compilando o método. ..................................................... 66 O método ......................................................................... 68 Análise de caso ............................................................... 70 O emprego da técnica:..................................................... 70 CAPÍTULO III- FUNDAMENTOS DA TÉCNICA ...................... 79 A divisão da técnica psicanalítica ........................................ 79 As críticas em ambos os lados: ........................................... 80 A transferência no processo clínico ..................................... 81 Atuação no processo clinico ................................................ 90 Elaborando perguntas ......................................................... 93 Perguntas como proposta de intervenção. .......................... 96 Marcando pontos................................................................. 97 Tipos de resistência ............................................................ 99 O enquadre no processo de análise .................................. 102 Recomendações sobre a técnica Freud, Bion e Meltzer. ... 104 Recomendações de Meltzer sobre a técnica. .................... 107 Critérios de analisabilidade ............................................... 108 Comunicação não verbal no setting................................... 109 Silencio nas sessões ......................................................... 111 Os quatro tempos de uma análise ..................................... 116 Estrutura dos sintomas ...................................................... 117 Os desafios da neurose no processo clinico ...................... 120 As dificuldades apresentadas pela psicose no processo clínico ................................................................................ 121 As quatro tentações do analista ........................................ 123 Sobre o divã ...................................................................... 126 A técnica ativa e mutua de Sándor Ferenczi ..................... 128 Análise mutua ................................................................... 129 CAPÍTULO IV ....................................................................... 131 A interpretação dos Sonhos .............................................. 131 Teoria topográfica ............................................................. 133 Características do inconsciente: ........................................ 136 O Sonho na Teoria Psicanalítica de Freud ........................ 137 A relação dos desejos as imagens abstratas dos sonhos .. 140 Memória e suas relações com os sonhos .......................... 142 Estrutura dos sonhos ........................................................ 145 impressões sensoriais, ideias e os impulsos do ID ............ 146 O Conteúdo Manifesto e latente do Sonho ........................ 148 Condensação e deslocamento .......................................... 150 O registro do real no umbigo dos sonhos .......................... 152 Método de interpretação.................................................... 155 Análise práticas de sonhos ................................................ 161Introdução O livro Técnicas de Atendimento em Psicanálise reúne técnicas de diversas vertentes psicanalíticas, e aborda desde as análises preliminares até a finalização do processo. Dentro desta proposta, o leitor encontrará uma organização baseada na divisão estrutural do processo clínico, com modelos da utilização da base conceitual psicanalítica de forma prática, tudo em uma linguagem acessível para favorecer uma experiência clara e objetiva ao leitor. 9 CAPÍTULO I O método psicanalítico A psicanálise se baseia na lei da causalidade onde tudo tem uma causa, um porquê. Partindo desse princípio, vamos introduzir os sintomas nessa mesma lógica. O sintoma é um sistema e tem uma lógica e, portanto, a psicanálise entende que o sintoma é o fator resultante de uma organização que se fundamenta a partir das relações. Quando se introduz o termo “relação” entende-se que: • existe mais de um agente; • a relação é uma ação; Logo pode-se vincular a ideia “tempo logico”, sendo assim, cada caso será tratado de forma única, levando-se em consideração a subjetividade. Vamos ao exemplo: imaginemos um grupo de cinco pessoas passeando por um lugar e de repente são atacadas por um animal selvagem, mas ninguém se fere. Das cinco pessoas, duas desenvolve trauma, enquanto 10 que as outras três não desenvolveram nenhum tipo de psicopatologia. Isso acontece pela forma que a psique dessas pessoas é estruturada, ou seja, cada um será diferente do outro na forma de responder aos estímulos externos. Um ponto a se atentar é que, mesmo que as duas pessoas desenvolveram o trauma, esse transtorno não será o mesmo nessas duas pessoas, mesmo que o nome da psicopatologia seja o mesmo. Primeiro tempo Porque os estímulos externos são entendidos de forma distintas: Essa distinção na estruturação entre as pessoas se dá por conta da organização significante de cada um. Essa organização será diferente por conta de diversos fatores, como por exemplo: • dois irmãos gêmeos estão no mesmo ambiente, criados na mesma casa. Um está no quarto vendo televisão e o outro está no quintal brincando, quando 11 de repente, o que está vendo televisão sente uma dor no estômago e nesse momento passa alguma imagem na televisão, então ele pode associar a dor a imagem que viu, enquanto o outro que está no outro local faz outras associações. Vimos então que por mais que o ambiente seja muito próximo, sempre haverá diferença na forma em que os significantes se associam. Por essa razão cada caso será tratado de uma forma distinta do outro pela vertente psicanalítica. Quando falamos de significantes, refere-se aquilo que constituem os significados. Pense em uma cadeira: se eu te pedisse para descrever uma cadeira você iria me falar sobre as suas características, suponhamos que você diga que cadeira é um lugar de sentar que tenha quatro pernas, um encosto. Quatro, pernas, um, encosto, são significantes que formam os significados. Mas note que os significantes que formam os significados também são significados e os significados também são significantes. “Pernas” por exemplo, é um significado que pode ser significante de 12 outro significado. Exemplo: cachorro é um significado que pode ter como significante “pernas”. A psique é formada por significantes, e o que varia é a forma em que eles se organizam na hora de criar uma verdade, então o que a psicanálise propõe é a compreensão da forma em que esses significantes se organizam, ou seja, entender o sistema psicológico de cada um. Nossa estrutura psicológica é baseada em cadeia e significantes, veja o exemplo: 13 O método de escuta do analista A escuta psicanalítica está diretamente relacionada com o posicionamento do analista numa espécie de comprometimento com a dúvida, alienando-se apenas ao não saber, onde seu narcisismo se satisfaz com a experiência de não se localizar no lugar de mestre. É uma conduta ética ao qual Lacan chamou de não ceder do seu desejo. No seminário 1 (os escritos técnicos de Freud), Lacan direciona uma crítica ao modelo interpretativo freudiano onde ele o chama de interpretação de ego para ego que também podemos considerar a vertente winnicottiana nesse mesmo contexto, pois ele afirma que o analista deve se posicionar como um ego auxiliar. Lacan se referia a um modelo de análise que se baseava no ego do próprio analista, o que por sua vez tenderia a direcionar o paciente a uma verdade infundada que não se sustentaria ao passar do tempo, em consequência disso, a psicanálise se moderniza e o analista passa a não mais responder do lugar ao qual é colocado pela questão transferencial do paciente e vai se posicionar como uma ferramenta que vai possibilitar ao paciente em relação a sua própria escuta. 14 Essa escuta essencialista psicanalítica será um grande desafio no início da prática clínica, pois a nossa tendência a nos relacionar partindo no nosso ponto de vista é um fator comum e a derrocada dessa postura vai ocorrer quando o analista abrir mão de sua “onipotência” e o que vai possibilitar esse processo é a análise que todo candidato a analista tem que passar antes de se tornar um psicanalista. Ouvir o outro tem mais a ver com ouvir a si mesmo e por isso a escuta do analista é uma escuta condicionada a aceitação do não saber, é a escuta do não ceder do seu desejo, é a escuta da satisfação do não ser. Escutar o outro é abrir mão da posição que seu narcisismo o coloca. “Sei o que disse, mas nunca o que o outro escutou.” Lacan Sentido lógico das indagações Vamos já iniciar com uma dica do uso prática dos questionamentos. Não é uma regra geral, pois pode alterar 15 em função da direção que a análise toma, mas é de grande valia para o processo. O discurso segue uma sequência, então é plausível pensar que as indagações do analista também devem se enquadrar no sistema do discurso, então a gente vai se basear em três questionamentos importados da filosofia que são: • O que é? • Como é? • Por que é? Essa sequência tem um porquê. Não se pode saber por que é sem antes saber como é, nem saber como é sem saber o que é, logo utilizamos essa sequência lógica para organizar o discurso. Em muitos casos o paciente pode começar o discurso já falando sobre o objeto tornando a primeira pergunta dispensável e pode também detalhar tornando a segunda pergunta dispensável, mas mesmo não as fazendo o sentido do discurso vai girar nessa sequência. 16 Os três tempos de uma análise No primeiro momento o paciente o paciente entrará em contato com o analista e esse contato pode ocorrer de diversas formas, seja por telefone, indo no ambiente de análise ou até mesmo ao encontrar o analista em algum lugar. Nesse momento já existe transferência, pois o paciente está te colocando numa posição onde possivelmente você pode ajudá-lo. A função do analista nesse primeiro contato é de responder desse lugar, de legitimar esse sentimento de confiança que lhe é depositado, para que o paciente mantenha seu empenho em buscar ajuda para seu sofrimento. O manejo da transferência está no cerne da análise e podemos ver isso na ênfase que Freud atribui a transferência em seus dois textos: “A transferência” e “Dinâmica da transferência”. A transferência funciona como uma forma de repetição, em que os conflitos internos são depositados no outro, em nosso caso, na figura do analista. O analista, como lugar 17 de investimento, terá que responder visando o prosseguimento do processo de análise. No primeiro módulo vimosque as verdades dependem da forma em que os significantes se organizam para criar a significação. A transferência é a repetição de uma organização significante que é direcionada para o analista, e a sua função será de manejar esse investimento com o intuito de conseguir resultado terapêutico. As duas formas de transferência • Transferência positiva: é o modelo de transferência em que o analista é colocado como alguém que pode gerar melhora no quadro do paciente. É visto com um ponto seguro de investimento emocional. Esse tipo de transferência funciona como o motor da análise e é indispensável para o seu sucesso. • Transferência negativa: é todo tipo de sentimento voltado para o analista que não ajuda no processo. 18 Pode aparecer de diversas formas, entre elas estão: dificuldade para falar, descrença na efetividade do processo, desconfiança na figura do analista. Esses fatores serão empecilhos que dificultarão esse processo. Mas quando isso acontece, o que o psicanalista deve fazer? O analista vai se portar de forma a modificar essa transferência para um investimento positivo e isso será feito através do lugar a qual ele responde. Esse lugar é: 1. Tratar com empatia as questões do paciente; 2. Não pressionar em nenhum sentido o paciente; 3. Ganhar a confiança do paciente; 4. Lidar com as questões com naturalidade para que o paciente sinta o analista como um porto seguro; 5. Não apresentar extravagâncias na expressão ao tratar de qualquer assunto. Muitos pacientes vão a terapia opondo-se aos seus sentimentos, principalmente pacientes com depressão. Existe também aqueles que vão por que um parente disse que seria bom, nesse caso o paciente não vai confiar no analista no primeiro momento, será necessário o ganho da 19 confiança para mudar de transferência negativa para transferência positiva. Criando demanda de análise Um dos principais desafios que um psicanalista encontra no processo é de manter o paciente engajado no tratamento, isso acontece na maioria das vezes por conta da pulsão de morte ou repetição que visa manter o ciclo o qual o paciente está. Dessa forma, o analista vai criar uma demanda no paciente de querer dar continuidade a esse processo, com o manejo da transferência. Alguns pontos devem ser levados em consideração nesse primeiro momento: • Não falar sobre questões complexas; • Não tratar de questões sexuais polêmicas a menos que o próprio paciente entre nesse ponto; • Não falar sobre quaisquer questões polarizadas na sociedade; • Não confrontar o paciente nesse primeiro momento; 20 • Não falar sobre questões que envolvam qualquer tipo de posicionamento religioso; • Não fazer menções que envolvam a psicanálise a outras práticas. Esses seis pontos são possíveis fatores que podem distanciar alguém que já está descrente e desanimado do processo, a desistir da análise. Mas como deve ser essa criação de demanda? Para criar a demanda é necessário fazer com que o paciente sinta interesse em saber mais e também criar nele a esperança de que sim, o quadro dele pode ser alterado. Isso pode ser feito através da explicação de como a mente funciona e de como o sintoma pode ser modificado, além de exemplos onde um paciente conseguir ter bons resultados com a psicanálise. A psicanálise tem dois tipos de conceitos: aqueles mais polêmicos que envolvem questões sexuais e aqueles que são mais tranquilos de serem aceitos por pessoas do senso comum. A ideia é nesse primeiro momento não usar esses conceitos com alto teor sexual e sim aqueles que dialogam 21 mais com o cotidiano, como por exemplo os mecanismos de defesa. A projeção, por exemplo, é um mecanismo que desperta muito interesse nas pessoas. Tudo isso que foi mencionado até aqui, é sobre o primeiro tempo da análise, que chamamos de análises preliminares. No módulo 4 veremos sobre o diagnóstico estrutural, assunto muito importante, pois é a partir da estrutura clínica que vamos ter a condição de escolher os caminhos que as sessões irão seguir. É importante ressaltar que cada estrutura terá um caminho diferente no processo terapêutico. Diagnóstico estrutural Levando em consideração que cada estrutura psi- cológica tenha as suas características, é razoável que o mesmo modelo de atendimento não caiba em todos os casos, por essa razão é prudente fazer um diagnóstico estrutural para delimitar os caminhos do processo de análise. 22 No caso do neurótico é possível conduzir a sessão de forma mais aberta, pois é uma estrutura que lida melhor com a realidade e faz associações melhores. Já o psicótico tem características mais instáveis e por conta disso está mais propenso a desenvolver comportamentos mais nocivos a si mesmo, em relação ao estímulo externo. Nesse caso o processo é feito de forma mais indireta e menos incisiva. Desconsideraremos a perversão como estrutura por dois fatores: • Existe um amplo debate se a perversão é de fato uma estrutura; • Pessoas com estrutura perversa, não procuram tratamento. Como é feito o diagnóstico estrutural? Para isso vamos fazer uma análise das características que o paciente apresenta e comparar com a compatibilidade das características das estruturas. Vamos as características de cada estrutura: 23 Neurose: • comportamento estável; • lida bem com a realidade; • emocionalmente estável; • faz associações bem elaboradas; • mantém um padrão de comportamento relativamente padronizado; • gerencia bem suas emoções dividindo sua energia libidinal em diversas atividades; • o senso de realidade é melhor fundamentado por se tratar de um ego mais estruturado. Psicose: • apresenta comportamento impulsivo; • instabilidade emocional; • comportamento pouco padronizado; • não cria boas articulações linguísticas; • não gerencia bem as suas emoções, colocando quase tudo de si em um só lugar; • o senso de realidade fica comprometido porque o ego é mais fraco e o id exerce uma força maior, 24 então há de se esperar um paciente que viva mais pelo princípio do prazer. Outro ponto importante que levamos em consideração é a natureza dos sintomas, pois cada estrutura tem suas subestruturas. Vamos a elas: Neurose: • Neurose fobia • Neurose histérica • Neurose obsessiva Psicose: • Melancolia • Esquizofrenia • Paranoia E o último ponto que levamos em consideração é o mecanismo de defesa que é mais evidente em cada uma das estruturas. Neurose: tem o “recalque” como seu principal mecanismo de defesa. 25 Psicose: tem a “foraclusão” como seu principal mecanismo de defesa. Seguindo essas características, será elaborado o diagnóstico estrutural. Vale ressaltar que tudo que foi mencionado até aqui é parte do primeiro momento da análise que chamamos de análises preliminares. Não tem um tempo cronometrado ou uma quantidade de sessões preestabelecidas para o fim desse estágio preliminar, isso vai depender de cada paciente. Obs: As estruturas clínicas não devem ser entendidas como algo imutável, mas sim como um parâmetro inicial. Após a conclusão dessa etapa, entraremos no segundo momento do processo, no início da associação livre. Segundo Momento Manejo da transferência consolidada e a livre associação Após todas as etapas mencionadas no módulo anterior, a transferência está estabelecida de forma favorável ao 26 processo, então iniciaremos com a “livre associação”. A associação livre como todos sabem, é o processo pelo qual o paciente fala livremente sem um direcionamento do analista. É muito importante que o analista deixe que o paciente fale livremente pois é na fala livre que se produz conteúdo para ser trabalhado, e também é quando o pacientecomete atos falhos, chistes, lapsos de memória e incoerências. Nesse estágio, o manuseio da transferência será diferente, não vamos mais legitimar o lugar de mestre, o qual se é colocado pelo paciente, isso será feito através de uma conduta um pouco mais neutra em relação ao que o paciente leva para a sessão. Segundo Freud, o inconsciente se manifesta de forma indireta, já para o Lacan, o inconsciente funciona de uma forma articulada entre os significantes. Então não devemos esperar que o paciente saiba sobre seu inconsciente ou que nós vamos encontrar o ponto inicial do transtorno psíquico. Em Freud, a proposta é encontrar um ponto onde tudo iniciou, mas em Lacan trata-se de entender como os significantes se articulam para formar significados e 27 introduzir uma nova lógica a essa estrutura. Para atingir esse objetivo vamos pontuar questões importantes para o paciente que ele não percebe na sua fala, para que ele possa refletir sobre esse elemento que tem muita relevância em sua constituição psíquica, mas que ainda ele não consegue trabalhar, porque nem mesmo sabe de sua existência. Como são escolhidos os pontos a serem colocados para o paciente? Freud deixou uma grande contribuição nesse aspecto que foi modernizado por Lacan. Isso inclui atos falhos, lapso de memória, incoerência linguística, entre muitos outros, e são exatamente esses pontos fundamentais que devem ser colocados para serem trabalhados pelo paciente. Quando o paciente começa a falar livremente, o analista usa a “atenção flutuante” (sempre é usado uma metáfora para explicar essa técnica). Imagine uma corrente passando na sua frente, todos os elos são iguais, então você os percebe, mas não dá muita importância, mas, de 28 repente passa um elo trincado e ali está o ponto que o analista busca num discurso. Nesse caso o elo rachado está sendo representado por chistes, atos falhos, lapsos de memória e incoerências linguísticas. Em Freud ele analisa isso dentro de um contexto e cria uma interpretação do que aquilo significa, mas numa visão mais moderna do Lacan, ele vai pontuar isso para o paciente para que ele fique ciente desses elementos, fazendo-o refletir o porquê do uso de tal termo. Vamos a um exemplo prático: em minha experiência clínica, uma de minhas pacientes sempre cometia o ato falho de matar sua mãe verbalmente, ao referir-se sobre sua mãe ela diz: “quando minha mãe estava em vida”. Detalhe: a mãe dela está viva. No primeiro momento eu não a falei sobre esse ato falho, pois é recomendado analisar a frequência e o contexto para que você consiga formular o caminho, mas com o passar do tempo e das sessões, eu fiz a demarcação desse ponto e gerou a seguinte reflexão na paciente: “eu usei esse termo porque após o adoecimento dela, ela me tomou o lugar de filha e aquilo que está ali não é mais a minha mãe, eu as vezes me sito 29 culpada porque lá no fundo acredito que só terei alívio quando ela se for”. Como podemos ver, a forma que a linguagem se articula diz muito sobre a condição emocional do paciente. Vamos agora nos debruçar sobre cada ponto mencionado acima. Ato falho: É por uma troca de objeto no momento da fala. Exemplo: paciente está falando de sua namorada e de repente ocorre uma troca e ele se refere a namorada como mãe. Podemos usar o exemplo de Freud quando ele menciona um juiz que ao iniciar a sessão do julgamento, ao invés de dizer essa sessão está aberta, ele diz: essa sessão está encerrada. Para Freud pode existir ali um sentimento de não fazer a sessão e por isso ocorre a troca de palavras. Assim como todos os outros pontos, vamos analisar os “atos falhos” dentro de um contexto e, somente após formular bem uma explicação em nossa mente que vamos transmitir para o paciente e apontar para ele seus “atos falhos”, as frequências e o contexto, pois ao colocar fora de contexto, o paciente possivelmente não conseguirá gerar reflexão sobre isso. 30 Chiste: principalmente relacionado ao “falar brincando” algo que tem um fundo de verdade. Freud diz: “brincando pode-se dizer tudo, até mesmo a verdade”. Vamos ao exemplo prático: um paciente sempre usava um termo pejorativo para referir-se a si mesmo de uma forma bem humorada, não direi para preservar a identidade dele, mas ao longo do tempo fica evidente um sentimento de hostilidade direcionada a sua própria imagem e isso, Freud nos relata que é uma característica da melancolia, e o paciente apresentava um quadro depressivo devidamente diagnosticado por seu psiquiatra. Analisar os “chistes” é o outro ponto a se considerar dentro de um contexto. Lapsos de memória: os esquecimentos, de acordo com Freud, estão relacionados a repressão, mecanismo de defesa que visa manter o paciente em seu estado emocional. Como se trata de esquecimento e não tem uma articulação discursiva, vamos analisar contexto anterior ao esquecimento e associar o contexto, e considerar que naquele ponto existe algo importante na articulação significante do paciente na hora de construir significações. 31 Incoerências discursivas: diferentemente dos atos falhos que são muito específicos dentro do discurso, a incoerência discursiva é mais abrangente. Essa incoerência será percebida como uma mudança na construção do discurso e assim como os outros pontos mencionados, será analisado dentro do contexto. Como pudera perceber, o contexto onde cada elemento se insere é muito importante e faz toda a diferença na hora de projetar qualquer ato analítico. Obs: Pode ocorrer nesse segundo momento uma insistência do paciente para que você responda do lugar do mestre, isso porque ao longo do processo ele se cansa de falar e receber como respostas apenas pontuações. Nesse caso, o analista vai direcionar a análise para o primeiro momento e manejar essa transferência, ou o analista pode contextualizar essa postura no segundo momento e fazer o manejo sem retornar ao estágio anterior da análise. 32 Entendendo os mecanismos de defesa Os mecanismos de defesa são formas que o ego utiliza para lidar com o mundo externo. Os mecanismos de defesa foram amplamente explorados pela psicanálise devido ao seu grande potencial. Entre todos os psicanalistas que se debruçaram sobre esse tema está Ana Freud, filha do doutor Sigmund Freud. Ana Freud escreveu um livro dedicado aos mecanismos de defesa: “O ego e seus mecanismos de defesa”. Listarei os mecanismos e as suas atribuições. • Introjeção: é o mecanismo pelo qual o sujeito trás para dentro de si coisas do mundo externo. • Identificação: é quando a nossa constituição psicológica se associa a algo externo e ocorre uma junção lógica. • Projeção: geralmente só nos posicionamos baseados naquilo que somos, e projeção é exatamente isso, nossas ações e pensamentos são baseados naquilo que já existe em nós. 33 • Negação: é caracterizado pela negação de fatos ou pensamentos. • Sublimação: é uma forma que o ego usa para lidar com os desejos do id sem ser reprimido pelo superego. Exemplo: uma pessoa sente desejo de se relacionar com uma pessoa comprometida e seu superego reprime esse desejo então, o ego sublima esse desejo e o sujeito fica com uma pessoa solteira, mas, que tenha algumas características da outra saciando o desejo do id sem ferir os princípios do superego. • Fantasia: quando alguém deseja algo e não pode realizar, então surge a fantasia para satisfazer parte do desejo. • Racionalização: é a busca por respostas racionais às ações. Exemplo: faço algo errado e crio uma resposta que “justifique” a minha ação. • Expiação: a pessoa quer ser rapidamente punida por algo que ela considera como tendo feito errado. 34 • Formação reativa: o sujeito tem um desejo e faz exatamenteo oposto aquele seu desejo, é uma espécie de substituição maniqueísta. • Regressão: é o retorno a um dos estágios do desenvolvimento. Exemplo: uma pessoa passa por uma situação desagradável e começa a se alimentar de forma compulsiva, teoricamente seria o retorno a fase oral. Conseguir perceber esses mecanismos de defesa será uma grande ferramenta na hora de conduzir um processo de análise, pois entender a forma que alguém se defende cria uma série de possibilidades de intervenções do analista. Logo, o analista vai analisar a forma que o paciente se defende levando em consideração o contexto e vai formular boas intervenções bem fundamentadas. Terceiro Momento Proposta de intervenção O terceiro momento é o tempo onde as verdades já não se sustentam mais, ou seja, onde a verdade se torna um 35 enigma em que o analista não é mais visto como o detentor desse saber e o paciente começa a perceber que tudo está em volta de si mesmo. É nesse momento que as intervenções do analista se tornam mais cirúrgicas. A intervenção do analista é chamada de ato do analista que corresponde as ações que visam gerar reflexões sobre algum ponto. O ato não é necessariamente uma interpretação como em Freud, mas pode ser um corte, enquanto o paciente está falando o analista interrompe a sessão naquele momento e isso gera efeito terapêutico no paciente. Essa é uma característica da vertente lacaniana: fazer interrupções que funcionam como um convite ao paciente para trabalhar aquele ponto. Vamos a um exemplo prático: Lacan está atendendo uma paciente, e num determinado momento ele a toca delicadamente o rosto. Dias depois ela se lembra desse ato e começa a chorar. Isso ocorreu porque ela fez uma vinculação da ação do Lacan com a sua vivência o que provocou reações nessa paciente. Nesse exemplo Lacan utiliza o toque no rosto, mas não é recomendável 36 atualmente tendo em vista que pode ser interpretado de outra forma. É importante ter cuidado com o excesso de interpretação. No primeiro momento o paciente pode achar muito interessante, mas com o passar do tempo isso vai perdendo o sentido para ele, até o ponto de começar a se tornar desinteressante. Lacan tinha uma grande crítica à interpretação da vertente freudiana, isso porque ele acreditava que a interpretação era mais sobre o analista do que sobre o paciente, pois “as formulações que faço são projeções tiradas do lugar de mestre” e por essa razão, Lacan acreditava que era mais efetivo atuações que gerassem trabalho no próprio paciente. Nesse caso o analista seria uma espécie de ferramenta e não mais aquele que sabe. Lacan chama o modelo freudiano de “interpretação de ego para ego”, o que poderia gerar algum efeito terapêutico, mas não com a expressão e segurança que seu método de “pontuar” causava. Lacan formula essa crítica inicialmente no seu seminário 01, “Escritos técnicos de Freud”. 37 Questões importantes a se considerar Nesse último módulo será listado alguns pontos relevantes que devemos considerar, resumindo tudo o que foi mencionado nos módulos anteriores. O que não devo fazer: 1. Não dar conselhos ao paciente; 2. Não falar sobre sua vida; 3. Não fazer nenhum tipo de julgamento; 4. Não criar vínculos fora do ambiente terapêutico; 5. Não infectar o paciente com questões pessoais; 6. Não deixar a análise se tornar um bate papo comum; 7. Não anotar durante as análises, porque isso limita a percepção do analista. O que devo fazer: 1. Repetir o que o paciente falou para que ele possa se escutar; 38 2. Despertar curiosidade no paciente; 3. Ter neutralidade; 4. Marcar pontos; 5. Mostrar incoerências no discurso do paciente. Todos esses pontos devem ser considerados em sua respectiva ordem mencionada acima. Uma das partes mais importantes que não pode ser ensinada é a análise do futuro psicanalista, e isso é condição fundamental para uma boa conduta do psicanalista. Lacan falava sobre não infectar os pacientes com as nossas questões emocionais e, portanto, é necessário que o analista “calce suas luvas emocionais”, que são as análises, a supervisão e o conhecimento teórico. Então, primeiramente é importante que o analista tenha passado por um bom processo de formação, bem estruturado e fundamentado. 39 Atividade: estudo prático de caso Faremos uma análise prática de um caso onde usarei tudo o que foi mencionado nos três tempos da análise. Obviamente eu peguei alguns pontos mais importantes por não existir a possibilidade de colocar aqui todo o processo e, a ordem que se segue não ocorreu de forma tão simétrica quanto a organização. A numeração das sessões foi colocada apenas por questão de organização. • Primeira sessão: Dados do paciente: Mariza. 39 anos de idade. Mãe de dois filhos. Casada. Tristeza contínua, impulsiva, dificuldade em conviver em sociedade, sensação de pânico, medo do relacionamento acabar, desequilíbrio emocional. 40 Diagnosticada com depressão, e anorexia. Mariza chega à sala do analista e diz: _ “Estou sem motivos para viver. Não vejo mais graça no que antes me era de muito apreço, é como se eu estivesse vivendo por viver.” • Segunda sessão: _Sem nenhum motivo aparente, sinto uma angustia muito forte ao pensar no fim do meu casamento. É como se eu não pudesse viver sem ele, e sempre foi assim: “eeeuuuuu, eeeeuuuuuuu”, (expressão de medo, tremura), não consigo pensar uma vida sozinha, de alguma forma é como se ela desse o sentido à minha vida. • Terceira sessão: _É uma sensação engraçada, pois ao mesmo tempo que sinto muito medo de perdê-lo, me sinto mal na presença dele, é como se ele me completasse de algo que não me falta, mas eu sinto falta dela quando ele não está por perto. 41 • Quarta sessão: _Estive pensando sobre a vida e concluí que a vida não faz o menor sentido. Comer para que, se um dia vou morrer? Tomar banho para que, se um dia vou morrer? Trabalhar e estudar para que, se um dia vou morrer? A vida só faz sentido no momento em que a vivemos. • Quinta sessão: _Por que “eeeeeuuuuu” quero não esperar viver sem ele? Eu estou me sentindo angustiada, eu não quero perder ela, mas tem algo que me afasta dela como uma barreira que se põe entre nós. Eu pensei muito sobre ele e percebi uma mágoa com relação a ele. Ele me impede de realizar meus sonhos, isso me deixa magoada e por isso me sinto angustiada quando ele está perto. • Sexta sessão: _Após refletir sobre algumas questões que o senhor questionou, comecei a sentir um pavor em ter que voltar aqui. Comecei a sentir medo de homens de cabelos castanhos, estou sentindo que a análise 42 está me fazendo mal, pensar sobre os fatos está me deixando pior, acho que vou parar a análise. • Sétima sessão: _Essa semana passei bem, só me senti agitada quando estava perto do marido e deprimida instantes depois. Analista pergunta: você ama seu marido? _ “Eeeeeuuuuu” te odeio, como o senhor pode fazer uma pergunta dessas? Claro que o amo, você é um idiota, estou cansada de você, só venho aqui ainda por que de alguma forma sua voz me acalma, calma, calma, mas me deixa muito irritada. • Oitava sessão: _Hoje acordei sentindo saudades da minha mãe, mas nem sei o porquê sinto falta dela, ela era uma pessoa muito impulsiva, fazia as pessoas se sentirem mal com as coisas que ela falava, era uma pessoa obsessiva, achava que era dona das pessoas, aquele excesso de zelo me causa nojo, nunca me dei bem com ela, “eeeeuuuuu” e ele sempre fomos rivais em tudo. 43 Já na primeira sessão existe transferência positiva, nesse caso não há necessidade de fazer todo aquele processo de alteração de transferência, então o próximo passoserá de debruçar sobre o diagnóstico estrutural. Primeiramente, devemos colher informações pessoais. Ela sofre de depressão e é impulsiva, desequilíbrio emocional e dependência emocional. Essas informações nos direcionam para uma psicose, mas vamos a segunda sessão para ver se essa formulação inicial se sustenta. Na segunda sessão, ela refere-se a si mesmo com muita intensidade, aí está um ponto relevante, e ainda na segunda sessão ela comete um ato falho onde ao mencionar seu marido, ela faz uma troca de pronome onde se refere a ele como ela. Ainda não fiz nenhuma pontuação para não criar especulação infundada. Na terceira sessão ela mantém o ato falho e traz uma questão importante que é uma ambivalência, ao mesmo tempo que gosta, ela o odeia e isso tem a ver com uma repetição. O mesmo que cuida é o mesmo que te repreende. Aqui já começa a clarear. O marido é uma representação de quem exerce a função materna. Notem como a linguagem dela se articula. Na quarta sessão houve muita hostilidade direcionada a ela 44 mesmo vindo com essas palavras de descrença nas questões do cotidiano, um sentimento depreciativo. Na quinta sessão essa primeira frase não faz muito sentido, então eu a perguntei o que ela quis dizer e ela negou que falou dessa forma. Ela continua a trocar os pronomes e a partir daqui eu começo a dizer para ela que está trocando os pronomes a algum tempo. Ela afirma que perto dele ela sente uma angustia e ele a faz ficar reprimida em relação aos seus sonhos. Essa relação está nos aproximando cada vez mais de uma repetição. Na sexta sessão, ela começa demonstrar resistência e começa a reprimir, e isso é o mecanismo de defesa do ego, a repressão que tende a não querer trabalhar esses pontos dolorosos. Ela apresentou essa reação após, na sessão passada, eu ter perguntado qual relação tinha o marido com a sua mãe e quais as semelhanças. Notem que foi uma pergunta formulada baseada no contexto a qual a análise caminha. Na sétima sessão ela demonstra uma grande agressividade que não é direcionada a mim, eu sou apenas o representante da culpa que ela sente por odiar a mãe que ela tanto ama. Lacan chama isso de amodio. Na última sessão ela começa elaborar e a partir desse ponto ela mantém esse 45 ritmo elaborando, pois toma consciência de que por trás dessa relação existe algo a mais, então ela começa a buscar respostas e eu passo a pontuar ainda menos até o momento em que ela modifica sua relação com o marido e passa a ter uma relação mais equilibrada consigo mesmo. Conclusão: se tratava de uma paciente psicótica, pois além de todas as características, ela não lida bem com a realidade, ela responde de forma agressiva e também tem uma relação muito fechada com sua mãe. Além disso, ela demonstra grande dificuldade de pensar uma vida sem ele, sinal de dependência emocional que nos leva a uma construção fraca do ego(castração). Apesar de ocorrer a repressão, que é um mecanismo de defesa da neurose, é apenas um ponto considerado a vasta características da psicose. Ela tinha mágoas de sua mãe e transferia esse sentimento para o marido, para que não se sentisse mal por culpa de odiar alguém que se ama, mas, como bem sabemos, a transferência/repetição não ocorre de forma simétrica e deixa alguns extravios, como esse sentimento ruim voltado a ela mesmo, por odiar a mãe e sublimar isso numa mágoa voltada ao marido. 46 47 CAPÍTULO II O inconsciente estruturado como linguagem e a sua análise prática. Sendo o inconsciente a base da conceituação psicanalítica e todo método psicanalítico ser baseado no discurso, é prudente entendemos quais as relações do inconsciente com a linguagem, pois a partir dessa compreensão vai se dar a possibilidade de relacionar o discurso ao sintoma do analisando. Esse conceito se inicia entre 1953 a 1960, período conhecido como retorno a Freud. Ramon Jakobson pioneiro na análise estrutural do discurso usava duas figuras de linguagem, a metáfora e a metonímia. *metáfora: se usa os termos que são distintos numa relação de semelhança. Exemplo: Pedro foi muito cavalo com João. Nesse exemplo o termo cavalo é usado para substituir a palavra ignorante. Notem que a metáfora tem 48 uma característica mais subjetiva, pois o mesmo termo poderia ser interpretado de outras formas. *metonímia: é o emprego de um termo no lugar do outro. Exemplo: eu preciso ler Freud. Observem que eu removo alguns termos, mas ainda assim todos entendem que eu gosto de ler os livros de Freud, ou seja, a metonímia é objetiva diferentemente da metáfora. Lacan diz no seminário três que o que Freud chama de metáfora é a condensação e a metonímia é o deslocamento. Esses dois conceitos de deslocamento e condensação é mencionado por Freud e seu livro a interpretação dos sonhos. Lacan vai se apropriar da conceituação criada por Saussure para criar sua compreensão de inconsciente estruturado como linguagem. Para Saussure o signo é a junção de significado e significante onde significante é o conceito de caneta e o significado é o para que serve, essa junção vai formar o signo. Lacan em discordância vai afirmar que o significado é na verdade uma cadeia de significantes que se relacionam entre si. Para Saussure o 49 significado se sobrepõe aos significantes e para Lacan é o contrário. Significante: são elementos que se articulam entre si para formar significados. Um significante não é capaz de produzir significação por si mesmo, ele está sempre dependente de outros para produzir sentido. Exemplo: arvore é formada por folhas, raízes, galhos, etc. é necessário um conjunto de elementos para formar a representação de uma arvore. Significado: é o resultante da cadeia significante ou melhor dizendo, da articulação entre os significantes, mas um detalhe muito importante é que o significado também é significante de outros significados. Exemplo: arvore é significado, mas também é significante de floresta. Mas como os significantes se articulam? O que causa essa amarração para formar os significados? O amarrador conceitual é descrito por Lacan como uma espécie de suposição do indizível ou o objeto “A”, que é o representante do desejo da função materna. É através dessa suposição que vai se dar a articulação entre os 50 significantes. Essa suposição surge da escassez do desejo da função materna em relação ao bebe. No início dessa relação, toda a atenção é voltada para a criança, mas como nossa demanda derivativa do desejo está em constante mudança, a função materna retoma seus interesses para atividades, coisas e pessoas que tem representatividade forte para ela e o bebe começa a perder a hegemonia do desejo da função materna e com isso ele sente essa perda e começa a supor o que está sendo posto entre eles e essa suposição é o que vai juntar todos os significantes soltos e vai formar a significação, o sentido. Toda relação social ou objetal está relacionada ao desejo do outro. Exemplo: o que faz com que um pedaço de papel tenha valor de troca? (Dinheiro) é o desejo do outro, o outro deseja aquele pedaço de papel e te fornece algo, então tudo isso vem dessa relação primaria. Lacan chamava de: desejo do desejo do outro. As relações estão baseadas no desejo do outro e disso Lacan afirma que existe um outro em mim, que eu sou constituído a partir do desejo do outro e esse é o outro do inconsciente. 51 O representante dessa desse algo que junta tudo é o significante mestres que Lacan representa como S1 e a junção dos significantes que é a cadeia de significantes Lacan representa pelo S2. Sem o significante mestre o S2 não existiria e todos os significantes seriam elementos insetos de significação Análiseprática do discurso Análise sincrônica: é a análise das relações entre os significantes no mesmo período de tempo, ou seja, uma análise vertical. O analisando está falando sobre algo e o analista analisa como se estabelece a junção dos elementos que constituem o discurso. Análise diacrônica: é a análise da variação do discurso no tempo ou análise horizontal do discurso. Exemplo: ao longo dos anos a linguagem foi se alterando como podemos ver no exemplo, vossa mercê, voz mercê, você. O mesmo ocorre num espaço de tempo menor, nossa linguagem no decorrer do tempo vai se modificando e o 52 analista vai analisar essa mudança no discurso com o passar do tempo entre as sessões. A amarração significante e o no borromeano O nó borromeano é uma ligação estabelecida entre três funções que constituem nossa psique. Real, simbólico e imaginário. Real: é o indizível o inalcançável. O real não é atravessado pela linguagem então não se pode nomeado. Simbólico: refere-se a linguagem, a nomeação e representação linguística, é a junção dos significantes. Ele surge com o advento do terceiro termo que desperta o desejo da função materna que amarra os significantes formando a significação. Imaginário: é a relação que estabelecemos com a imagem, surge com o processo de castração onde eu passo não mais ver o outro como sendo eu, mas passo a me reconhecer como ser autônomo. Essa teoria é explicada no estádio do espelho onde a partir de um 53 momento a criança passa a se reconhecer no espelho e isso significa o surgimento do ego. O nó borromeano é um entrelaçamento que depende dos três elementos para se manter. Em uma situação hipotética onde o objeto “a” fosse arrancado do seu centro todo os três perderiam seu sentido e caso um desses fosse arrancados todo o nó se soltaria. 54 Vamos agora entender a funcionalidade desse conceito na dinâmica clínica. Uma vez atendi uma paciente que não era capaz de se reconhecer em fotos e nem mesmo sua imagem no espelho, sua relação com sua imagem não era plena. Como todo analista, comecei a criar suposições de que a castração não foi bem sucedida e que o imaginário dela não se consolidou e seu simbólico não conseguia criar significação acerca de si e que ela estaria sofrendo com as investidas do real. Em diversos momentos ela se colocava na posição de sua mãe através de atos falhos. Sua cadeia significante sempre estava direcionada para a relação dual entre as duas. Ela era incapaz de descrever a si mesmo, seus objetivos da vida e seus ideais, após um período de atos analíticos a sua vida foi se voltando para si e ela até fez um ensaio fotográfico algo que no início era inimaginável para ela. Como pudemos observar, toda a estruturação psicológica é regida por esses três termos. Observar a relação que se estabelece com a autoimagem, a análise sincrônica e diacrônica do discurso (simbólico) e entender 55 ambos como aquilo que tenta alcançar o inalcançável é um fator importante no processo de análise. Os quatro discursos no manejo clínico Os quatro discursos é uma organização teórica feita pelo Lacan citada no seminário 17. Esse conceito surge a partir da teoria do Freud sobre os ofícios impossíveis como, governar, educar e psicanalisa, e Lacan introduz fazer desejar. Essas impossibilidades estão relacionadas com o sentido que só tem Lógica partindo da própria subjetividade, vamos ao exemplo: quando você ensina algo para uma criança, ela entende aquilo partindo de suas referências, por essa razão que pessoas tem formas diferentes de aprender e é dessa impossibilidade que se trata. Essa teoria tem o intuito de sistematizar as posições do discurso, as relações sociais. São eles: discurso do mestre, discurso da histérica, discurso do universitário e discurso do analista. Cada discurso tem uma orientação, posição e lugares fixos. Esses lugares são: 56 Agente: são as verdades que criamos para dar conta da realidade externa, mas são tomadas como sofisma, pois são verdades sublimadas que escondem o verdadeiro caráter daquilo que se quer expressar. Outro: é a quem o discurso se dirige. Verdade: é o lugar do mais de gozar, da repetição e pela impossibilidade. Saber: diferentemente daquilo que se aprende, é sobre aquilo que se produz. 57 Essas posições serão preenchidas por matemas que representam conceitos da vertente lacaniana. S1, S2, $, a. S1: representa o significante mestre que amarra todos os significantes e forma a significação. S2: representa a cadeia significante. a: representa o objeto que causa o desejo $: sujeito dividido ou sujeito castrado. Agora que entendemos a estrutura dos discursos, vamos compreende-los em sua totalidade. As posições onde são colocados os matemas tem a ver com o sentido do discurso. Exemplo: no discurso do analista no lugar do agente está o “a” que é o significante 58 da falta, ou seja, toda expressão do psicanalista está voltada para uma falta. Mestre: é o lugar daquele que tudo sabe, é a posição das verdades imutáveis, é um discurso que não reconhece suas faltas e falhas. Histérico: é o discurso do reconhecimento de suas falhas, esse discurso é sustentado pela falta e coloca o analista na posição de mestre. Analista: esse discurso se caracteriza pela aceitação da falta como um agente produtor. O outro é visto como sujeito. Universitário: é a posição que se forma a partir do reconhecimento do outro como um objeto a ser moldado, formatado. É o discurso que tem no lugar do agente a cadeia significante que vai tentar racionalizar tudo que tem no mundo, o discurso da ciência. 59 Análise dos discursos: Sendo os discursos laços sociais, a psicanálise se propõe a analisá-los e tentar entende-los para a sua utilização no processo de análise. Discurso do mestre: a tomada das sublimações como orientação é uma característica de uma construção psíquica que não está baseada numa boa relação com a frustação, herança deixada pela castração, uma não aceitação dessa condição. Essa conduta está intimamente ligada a não aceitação do diferente onde todos devem estar alinhados com a mesma posição. Esse discurso pode aparecer no processo de análise como aqueles analisando que não estabelecem transferência positiva e o analista vai precisar fazer todo aquele manejo para conseguir alterar essa transferência. Discurso do histérico: imaginemos que todo o trabalho de análises preliminares tenha sido bem sucedido e gora o discurso de mestre passa a ser um discurso histérico, nesse sentido o histérico vai colocar o analista no lugar de mestre, aquele que tudo sabe. De uma posição de não 60 aceitação, agora aparece uma posição de reverencia em relação ao analista. E o analista? Ele como se posicionar nessa circunstância? Veremos no próximo discurso. Discurso do analista: posiciona o outro no lugar de sujeito, aquele que sede do seu desejo, aquele que se orienta a partir do seu desejo. O analista ao compreender sua própria falta vai ter a possibilidade de não intervenção na conduta de seus analisandos, deixando-os em uma posição de responsabilização por suas ações e essa condição vai promover o discurso do histérico para o discurso do universitário onde a racionalização será o norte. Discurso do universitário: esse discurso terá a razão como direção, o que vai aos poucos colocando o analista no lugar de suposto saber e o sujeito vai entrando na posição de aceitação de suas faltas e vai se dirigindo para o discurso do analista. Essa é a lógica pelo qual todo analista antes de o sê-lo é analisando. Esse é o sentido pela qual o processo de análise se orienta. Reconhecer os discursos vai proporcionar ao 61 analista a condição do manuseiodo processo no que desrespeito aos atos analíticos. O tempo lógico e as suas atribuições na prática A ideia do tempo surge de uma análise crítica que Lacan faz sobre a questão da temporalidade em Freud. Freud levava a sessão por volta de cinquenta minutos. Lacan percebe que ao analisando deixavam o que elas consideravam mais importante para o final da sessão, então Lacan começa a deixar as sessões muito curtas obrigando os analisando a falar logo no início aquilo que lhe eram de mais importante. Com isso Lacan foi desenvolvendo o conceito de temporalidade que colocava a subjetividade de cada um em pauta no processo de análise. Lacan pensava a extensão das sessões com uma particularidade que tem que ver com o tempo não cronometrado, mas um tempo que se articula numa lógica particular associada ao desejo. A inscrição temporal do desejo é algo compartilhado, mas que se formaliza na 62 subjetividade, o que em filosofia se chama de intersubjetividade. A lógica temporal na prática clínica tem a finalidade de produzir efeitos associativos na relação do paciente com seu inconsciente por meio da relação transferencial que coloca o encerramento das sessões como algo valoroso que acaba por demarcar algo que tenha algum valor para aquele analisando. Essa valorização se dar por uma transferência que coloca o analista no lugar de suposto saber e por essa via vai se falicisar aquilo que se encontra no fim da sessão. Esse conceito parte de uma situação citada no livro escritos no texto o tempo logico e a asserção da certeza antecipada. Um novo sofisma. Nesse texto Lacan está discutindo a lógica da segregação e fazendo uma reflexão que a liberdade tem que ver com o outro o que nos leva a entender o tempo como algo que está presente nas nossas relações. Três prisioneiros que podem ser libertos se declararem para o carcereiro a cor do disco que tem nas costas, se é branco ou preto. No jogo tem três discos brancos e dois discos pretos. Lacan propõe três soluções possíveis. Na primeira, se eu vejo dois discos negro, eu de 63 forma imediata concluo que sou um branco. Nesse caso é um sujeito da imediaticidade. Vejo e concluo sem mediação. A segunda situação é; eu vejo um disco preto e um disco branco. Nesse caso surge uma dúvida, se ele que é um branco está vendo um preto como eu e não saiu, é porque eu não sou um preto. Se ele vesse dois pretos ele teria saído. Isso significa que eu sou um branco. Esse é o sujeito do tempo para compreender. Na próxima situação os três prisioneiros têm discos brancos. Nesse caso se cria uma certeza e se perde essa certeza. As conclusões é o que dá a lógica para o termino das sessões. É um momento de reorganização significante. A conclusão é o produto de uma produção que surge da pontuação falicisada do instante. É o que dá a forma lógica dos sintomas. A certeza antecipada pode ser associada a ansiedade por se tratar de uma certeza que se dá numa lógica ilusória isenta de razão. Essa formação sintomática diz muito da relação do sujeito com seu inconsciente. O tempo de ver, a forma de entender e o momento de concluir vão organizar a sua constituição de sujeito. 64 Análise derivatória da demanda provenientes do desejo. As nossas posições são derivações de percursos que nossa mente segue sempre orientada por um a mais e não é diferente da necessidade e demanda. A demanda é a desnaturalização do instinto que nos leva a satisfação ou a insatisfação (frustração). Exemplo: a fome é um instinto, porém a forma que lidamos com ela modifica em nossa consciência a percepção dessa necessidade. A fome é para nos manter nutridos, porém, a satisfação causada por essa ação pode ser exagerada causando problemas de saúde. Freud teorizava sobre o prazer na boca como uma forma de manter o bebe nutrido. Já o desejo como sinônimo de pulsão não tem um objeto, é algo que nos move sem uma direção. O desejo ele é produzido a partir do desejo do outro e essa é uma condição que dá a possibilidade não só da análise individual partindo do outro, mas também de uma análise da sociedade como um todo. A demanda é entendida como uma derivação do desejo, ou seja, uma forma que o ego encontra para satisfazer as necessidades do id na consciência, enquanto que o desejo é da ordem 65 do inconsciente, é aquilo que não tem forma, mas que se orienta a partir daqui que foi introjetado no outro. Análise da demanda e desejo Sendo a demanda uma derivação do desejo e o desejo sendo uma impossibilidade, deduz-se que não seja possível compreende-lo a partir de si mesmo, é necessário indagar a demanda, vontade, querer para modificar a orientação do ego em relação ao desejo. O analista precisa se posicionar para lançar de volta as particularidades do discurso para que na elaboração do paciente seja possível uma alteração em relação as ações guiadas pelo desejo. Sempre estamos relacionando as análises ao discurso e isso é algo muito positivo, mas agora vamos nos direcionar para a análise da demanda. A forma que o sujeito se satisfaz é um caminho muito rico pois nossa forma de satisfação é o caminho que tem o desejo como início de rota. O desejo por ser orientado pelo desejo do outro é dotado de um dinamismo que nos conduz de uma 66 forma ao qual a consciência fica impossibilitada de associar e apenas sente, mas esse movimento desorientado na percepção consciente também aparece como vetor diretivo do analista, então, mais do que conhecer toda a técnica, se apegar ao não saber como horizonte é a garantia de bons resultados nesse processo. O analista deve se munir do senso crítico consigo mesmo na intensão de não sede do seu desejo. Compilando o método. O método psicanalítico de orientação lacaniana parte de uma direção essencialista, ou seja, coloca o outro em lugar de destaque como principal agente da ação. Isso é justificado por uma interdição. Para entendermos melhor será necessário fazemos uma breve passagem sobre a memória. Na visão de Lacan a nossa psique é constituída por cadeia de significantes, ou seja, os significantes se relacionam entre si para formar a significação, com o tempo a cadeia significante vai se alterando e isso podemos contemplar com alguns exemplos, quando você era 67 adolescente seus posicionamentos eram diferentes das posições que toma hoje, exemplo: o processo de apaixonamento era mais intenso aos quinze anos do que aos 40. Outro exemplo: muitas de suas convicções foram alteradas com o passar do tempo. Quero com esses exemplos mostras que a memória não é como um HD de computador que você coloca um arquivo e ele fica lá, a memória se altera com o passar do tempo e isso ocorre por conta da alteração na nossa cadeia significante que se modifica em função das experiências vividas. Aposto que você já teve a experiência de ir a um lugar que você não ia a tempos e teve a impressão de que as coisas eram diferentes, pois é, isso ocorre porque nossa percepção se altera baseado em nossas referencias que se modificam. A mutabilidade da nossa cadeia significante é um fator essencial para gerar alteração na estrutura dos sintomas, porem também pode ser usado para legitima-lo, o uso dessa variação deve ser dado pelo próprio paciente, se houver interferência por parte do analista, essa lógica pode se articular de uma forma pouco favorável. A modificação sintomática vai se dar através do próprio desejo no 68 paciente. O desejo não pode ser alterado, mas a lógica que ele coordena sim e isso é a condição necessária para a melhora. O método O que vamos considerar inicialmente é a forma em que os significantes se articulam, mas para chegar a esse ponto será necessário algumas medicas. • analisaras formas de satisfação do paciente Sabemos que os pontos de amarração são dados pelo desejo e entender a demanda e seus objetos vai nos permitir trilhar um caminho na lógica do paciente. • análise sincrônica e diacrônica do discurso, Sendo o discurso uma ferramenta de expressão e a cadeia significante mutável, vamos análise o movimento das articulações no sentido vertical e horizontal e avaliar essas alterações contextualizadas. • analisando as metáforas e metonímias. 69 São dois conceitos relacionados a uma sublimação do desejo, vamos avaliar e analisar como a linguagem figurativa se relaciona com os diferentes elementos da psique. • análise do real, simbólico e imaginário. Analisar a forma que o simbólico (palavra) se relaciona com o imaginário para dar conta do indizível (real). • análise dos discursos Analisar em qual discurso o paciente se encontra. Entender cada discurso e suas posições vai nos auxiliar na hora de contextualizar toda compreensão teórica vista até aqui. • análise do tempo logico de forma única em cada paciente. A lógica pelo qual o paciente age está diretamente relacionado com o tempo de suas ações, ou seja, o sujeito da imediaticidade por exemplo é tem uma” certeza” antecipada onde a conclusão é uma vinculação com suas verdades preestabelecidas. Entender a temporalidade de cada um será um importante guia das ações do analista. 70 Análise de caso Nessa análise vou partir de um momento mais avançado do processo dessa paciente. exemplo: manejo da transferência, análises preliminares, diagnostico estrutural, geração de demanda de análise, etc. nesse estudo de caso vou partir de um período ao qual toda dinâmica inicial já estava concretizada e é importante ressaltar que a ordem das sessões que irei apresentar é com o intuito de apenas organizar, pois não dá para descrever detalhadamente cada ponto da análise por ter tido a duração de um ano e nove meses. Aqui irei relatar apenas as partes mais relevantes. O emprego da técnica: A paciente tinha uma enorme dificuldade de se relacionar e sempre relatava um sentimento de angustia que ocorria após ver montanhas no período onde o sol começa a se, porém, também a mesma angustia ocorria quando ela ouvia determinados tipos de músicas. Ela o 71 relatava como uma tristeza profunda que a impossibilitava de estabelecer relacionamento. Sessão 1 _Paciente: eu vivo uma vida vazia, vivo sozinha sem poder contar com ninguém. Todos os meus relacionamentos fracassaram é como se eu atraísse apenas pessoas que não prestam. Analista: como eram essas pessoas ao qual você se refere ter atraído? Qual a semelhança entre eles? Obs: nesse momento eu comecei a criar uma suposição de uma possível repetição. _Paciente: não sei se vou conseguir me expressar bem, mas são pessoas sem perspectiva de vida. _Analista: como eram o comportamento dessas pessoas? _Paciente: todos eles tinham problemas com bebida e eram agressivos quando não verbalmente, fisicamente e alguns eram as duas, mas eu sempre via na semelhança algo de muito especial. 72 _Analista: a sessão está encerrada, até a próxima. Tenha uma ótima noite. Obs: esse encerramento foi feito cerca de 23 minutos de sessão. A sessão não tem um horário estipulado, esse termino repentino foi pensado como um ato analítico, uma espécie de convite a paciente elaborar sobre a sua frase final. Sessão 2 _Paciente: meu filho essa semana me fez muita raiva, ele passa o tempo me perturbando. Ele tem o habito de não seguir regras, ele não é um menino que respeita a gente. Está mal na escola, mal em casa e nada está bom para ele. _Analista: me fale mais sobre ele? _Paciente: ele de modo geral é muito parecido comigo. Ele não gosta muito de se relacionar e é muito independente, mas é muito arrogante, mal educado e é muito irritante e não aceita ser contrariado. Temos isso em comum. Ele é uma xerox minha. O patinho feio da família. (Risos) Obs: discurso do mestre. 73 _Analista: o que é uma pessoa irritante para você? _Paciente: pessoas que vivem para contrariar as outras, que são sempre do contra em tudo. Obs: na frase “o patinho feio da família” ela usa um personagem para descrever seu filho e isso é uma metáfora que vamos analisar dentro do contexto geral. Sessão 3 _Paciente: estou de saco cheio de ter que fazer o que não quero, odeio ter que agradar, estou cansada de me sentir um nada. Parece que todo mundo resolveu me encher a paciência. Minha mãe está igualzinha meu ex, aliás ele é o tipo de cara que eu não suporto. Obs: observe que a frase “eu não suporta” não faz sentido, mas se alterar o eu por ela, a frase ganha sentido. Ela não suporta. Vamos tomar esse ponto como ato falho. _Analista: por que ela não suporta? _Paciente: como assim? _Analista: você disse eu não suporta, acredito que você se referia a ela. Vou finalizar a sessão e a gente continua na próxima 74 Sessão 4 _Paciente: essa semana estava me olhando no espelho e pensando no que me tornei. _Analista: em que você se tornou? _Paciente: eu não concordo com quase nada, mas não é uma discordar por um motivo, eu descordo só para ser do contra. Obs: discurso histérico. Reconhecimento de suas falhas. _Analista; como são essas discordâncias? _Paciente: eu não sei explicar, mas eu sinto uma raiva quando as pessoas tem ideias parecidas com as minhas. _Analista: e porque você sente raiva? _Paciente: não sei, só sei que odeio ser parecida com alguém, aliás dizem que eu sou muito parecida com a vaca da minha mãe. _Analista: como assim vaca? _Paciente: minha mãe não presta, ela se masturbava perto de mim, transava perto de mim quando eu era criança. Tenho novo. Meu sonho é prender ela em um caixão e colocar uma câmera dentro para mim a ver morrendo aos poucos. 75 Sessão 5 _Paciente: Minha mãe está babando no moleque nojento. Palhaçada. _Analista: quem é essa pessoa? _Paciente: o filho da minha irmã. (Expressão de raiva) _Analista: por que isso te incomoda se você afirma não gostar dela? _Paciente: na verdade não sei. _Analista: vou deixar você pensar sobre esse assunto. Sessão 6 _Paciente: analisando minha vida percebi que não estou dando o melhor de mim. Ando buscando desculpas para tudo e estou meio cansada disso, não vejo resultados em nada que faço. Obs: observe que o discurso da paciente começou a está mais voltado para ela mesmo do que para outras pessoas como no início. (Análise diacrônica do discurso) _Analista: por que você faz dessa forma? 76 _Paciente: éééééééé, boooom, eu demorei um tempo para perceber isso, mas eu acho que estou vivendo me baseando na vontade dos outros. _Analista: pode me explicar mais sobre isso? _Paciente: nas relações por exemplo, eu não sinto prazer na pessoa em si, meu prazer está nas pessoas que tem coisas que minha mãe desaprova. _Analista: sabe me dizer por que faz isso? _Paciente: acho que estou vivendo por magoa não só dela, mas de mim também, então acabo me isolando para não arrumar ninguém que seja um completo idiota. _Analista: mas também se isola de outras relações. _Paciente: é que todos representam o pior para mim. Conclusão: após essa sessão descrita as analisas continuam por algum tempo e aproximadamente seis meses eu a vi de mãos dadas a um rapaz. 77 O caminho lógico que a sessão seguiu foi a dissolução das verdades e a construção de questionamentos que geraram reflexões na mente da paciente a ponto de toda aquela postura imutável não se sustentar mais e abrir espaço para novas ideias e posicionamentos. 78 79 CAPÍTULO III- FUNDAMENTOS DA TÉCNICA A divisão da técnica psicanalítica Apsicanálise se divide em duas modalidades, na primeira temos uma psicanálise influenciada pela prática médica, uma corrente britânica e por outro lado temos uma psicanálise mais social fortemente influenciada pelos movimentos artísticos que surge na França. Cada uma dessas modalidades apresenta suas particularidades acerca da prática clínica. Do lado britânico temos uma psicanálise mais metódica que se preocupa mais com uma organização do processo de análise que se apropria de métodos e técnicas muito bem elaboradas que ao meu ver é o que mais se aproxima da metodologia cientifica, já do lado francês, temos uma psicanálise que não atribui tanta ênfase aos métodos, mas atribuem grande valor a relação estabelecida no setting analítico. O lado britânico busca compreender padrões de repetição no discurso do analisando, a estruturação dos sintomas, as formas de 80 defesa e as intervenções que geram elaboração são baseadas em amplos estudos sobre as características do analisando. do lado Frances traz uma modalidade clinica relacional onde o inconsciente do analista é a principal ferramenta na análise, as interpretações seriam quase que inconscientes, como uma surpresa e o resultado da identificação do analisando com aquilo que o analista disse é o que iria gerar a elaboração que é o que vai alterar a estrutura dos sintomas. Por mais que exista essa enorme discrepância, as duas estão condicionadas a processos de identificação que vão gerar algum tipo de contratransferência, no lado britânico temos a tendencia de manter uma contratransferência secundaria que é filtrada pelo eu, no lado francês não existe esse filtro. As críticas em ambos os lados: Do lado britânico temos uma tendencia a parecer meio que controlador e isso gera uma semelhança com o 81 discurso do mestre que é uma posição que o analista não ocupa. Do lado francês encontramos um problema que está diretamente relacionado a uma tendencia a projeção, a possibilidade dessas interpretações estarem bem próximas de serem parte do desejo dos próprios analistas são grandes. A segunda crítica é que sem uma técnica fica difícil manter a segurança do processo. Exemplo: sem o diagnóstico estrutural fica inviável trabalhar, pois os psicóticos apresentam uma grande instabilidade psíquica e o analista precisa ter a capacidade de identificar, pois a interpretação sem um manejo correto pode gerar reações indesejadas no analisando. A transferência no processo clínico Para entender a transferência no processo de análise, precisaremos entender a sua dinâmica. A transferência compreendida de forma primaria como um processo de repetição torna coerente um modelo de inconsciente que 82 está diretamente relacionado a ideia de lugar, de memória estáticas, mas quando compreendemos a transferência como um processo de repetição relacional, não precisamos mais pensar em um inconsciente como lugar e sim como um inconsciente associativo. Vamos pensar a transferência com crianças: pela lógica a criança que ainda não passou pela castração não deveria realizar transferência, pois ela é análoga a sua função materna, ela não existiria como sujeito, partindo dessa premissa a criança não exerceria transferência e por conta disso seria visto como em Anna Freud como um objeto a ser adaptado ao meio social, entretanto o que acontece é que a transferência não está condicionada a referencias ou memorias guardadas, aqui estamos falando de uma modalidade de transferência das relações, da padronização comportamental e essa modalidade de transferência exercerá influência até mesmo na compreensão de inconsciente. Nós somos seres que funcionamos através de padrões e de acordo que vamos desenvolvendo, nossa capacidade associativa vai aumentando e gerando padrões mais complexo e a forma que esses elementos vão se organizar 83 é o que em termos psicológicos que vai gerar a subjetividade. A sociedade é comparável a uma bolha e aquilo que não se enquadra dentro desses limites relacionais não se desenvolve no mesmo sentido que aqueles que estão orientados pelos padrões sociais. Isso é a base para teorizar sobre um inconsciente que não existe como lugar e sim como relações. Dessa perspectiva podemos considerar como transferência não só apenas aquele processo que ocorre em clínica, mas toda e qualquer relação objetal, ambiental. Esse inconsciente, essa padronização só existem porque existimos no ambiente favorável a essas organizações significantes, ou seja, seres humanos que não foram criados no meio social, não se desenvolvem como tal. O ambiente, as pessoas e as relações mantem essa organização psicológica. Ao decentralizar a ideia de inconsciente como lugar, abrimos margem para encaixar uma nova visão acerca do manejo clinico da transferência, logo a transferência aparecerá no processo de análise como qualquer posição 84 que o analisando tome em relação ao analista e quais são as possíveis posições? 1-desconfiança: nessa transferência o analisando irá colocar o analista como representante do método. Exemplo: será que apenas falando alguma coisa pode mudar em minha vida? Será que o analista realmente poderá me ajudar? Nesse caso podemos considerar uma modalidade de transferência negativa que pode ser caracterizada como um fator que pode acarretar no fim precoce do processo. 2-repulsa: podemos pensar a repulsa como todo sentimento desfavorável ao processo como hostilidade, medo, vergonha. Nesse caso o analisando coloca o analista em uma posição não adequada ao processo e mesmo que essa transferência negativa seja analisável, ela pode significar a interrupção ou mesmo o não início do processo de análise. 3-confiança total: o analisando coloca o analista na posição de mestre segundo o conceito dos quatro discursos do Lacan. Na visão do paciente o analista é 85 aquele que tudo sabe, um exemplo a ser seguido. Lembrando que nessa posição, o analista precisa ter muita cautela no que vai dizer, pois tudo que ele fala tem muita relevância para o analisando e nesse caso trata-se de um sujeito muito sugestionável. 4-confiança parcial: essa confiança parcial trata-se de um sujeito que coloca o analista na posição de suposto saber, aquele pode sim ajuda-lo, mas isso só será possível através do empenho do próprio analisando. Esse é o discurso do analista, aquele que pode vir a me ajudar. Essa é a modalidade de transferência mais favorável para o processo de análise onde o analisando é o centro e não o analista como na transferência de número 3. As modalidades de transferência 1,2 e 3 são mais comuns na psicose por apresentar um comportamento mais instável, já a transferência 4 é mais voltada a neurose por se tratar daquele que é sem que precise de um outro para ser. A proposta a manejar a transferência para alcançar o modelo 4 e para isso vamos considerar as particularidades 86 de cada modelo. No primeiro modelo, o analista precisara manejar de forma a reduzir a desconfiança e isso pode ser realizado através do embasamento teórico. O analista pode mostrar ao analisando a lógica por trás dos sintomas, apresentar as teorias de forma acessível ao analisando e com isso a probabilidade de o analisando começar a reconhecer a legitimidade do método aumenta. No segundo modelo o analista precisará gerar identificação com questões que gerem sentimento de prazer no analisando. Essa é a principal importância de uma ficha de anamnese, pois através de uma ficha completa o analista terá informações do que o paciente gosta e não gosta. Se existe essa transferência de desconfiança, existe uma identificação desfavorável ao método, então quando o analista perceber, ele pode identificar algo que seu analisando gostee começar a estudar sobre aquilo para mostra interesse e assim começar gerar identificação positiva. O modelo 3 não deve ser mantido, o analista precisa sair dessa posição sem regredir para a posição 1 e 2, a proposta é atingir a posição de número 4. Vamos começar 87 a mostrar ao analisando sua legitimidade não respondendo as suas demandas. Exemplo: analisando pergunta “o que devo fazer no meu casamento?” analista devolve a pergunta “o que você acha que deve fazer no seu casamento?” ou quando o analisando começar a levar a análise para descobrir coisas sobre o analista então o analista diz, vamos voltar para você, você é o foco aqui. Dessa forma o paciente com a suposta psicose começará a passar por uma espécie de frustração que pode ser considerado como uma espécie de castração atingindo assim o modelo de número 4. O modelo 4 deve ser mantido e de forma natural o paciente através das intervenções do analista começará a gerar elaboração até o fim do processo de análise. Contratransferência direta e indireta A contratransferência são as repetições do analista na relação de análise. Quando falo sobre relação é que mesmo que de uma forma indireta o analista vai se 88 relacionar com o analisando, isso ocorre porque diferentemente da astronomia que o astrônomo estuda um objeto distante, na psicanálise o analista faz parte do meio social e com isso acaba por aparecer as identificações no processo de análise, essas identificações são chamadas de contratransferência. A contratransferência é inevitável, porem pode ser controlada e isso é feito através de um senso crítico que o analista cria quando passa pelo processo de análise e passa a duvidar de suas próprias convicções. Anteriormente falamos sobre 4 modelos de transferência e o último é o modelo ideal. Nas análises o candidato a psicanalista passa por todo aquele processo para alcançar esse modelo 4, logo ele compreende que aqueles posicionamentos que passam em sua mente sobre como o outro deve agir são dele e não do outro. Quando surge esse senso crítico no analista, ele começa a dirigir o processo de análise baseado não em convicções, mas com a certeza de são saber sobre o outro, então ele cria hipóteses, suposições sobre as possíveis causas dos sintomas, mas como ele pode estar errado, ele não fala isso para seu paciente como no modelo de 89 interpretação de Freud, ele usa essa hipótese apenas como caminho e ai surge o que chamamos de jogo do inconsciente, ou uma relação de transferência e contra transferência indireta por parte do analista. Existe uma suposição no centro e de um lado o analista pensa que pode está correta e então o analista formula suas perguntas, suas intervenções baseadas nessa hipótese, mas por outro lado, o analisando recebe essas intervenções, perguntas de uma forma diferente daquela que foi colocada pelo analista, isso ocorre por causa da impossibilidade que existe entre as pessoas. Eu digo algo de um jeito, mas você interpreta baseado em sua realidade, referencias. Esse processo é o que chamamos de contratransferência indireta. No caso da contratransferência direta, o analista estaria na posição de metre e ele projetaria suas convicções no analisando, de início o analisando poderia até se identificar, mas com a alteração do desejo a identificação diminuiria e faria com que o analisando ficasse meio descrente. A lei do desejo é: eu em relação com o objeto “A” crio a demanda, mas essa demanda não corresponde ao objeto perdido de forma 90 plena e por isso ele irá se alterar fazendo do processo inviável. Como vimos anteriormente, o inconsciente não é um lugar e sim relações e no modelo de contratransferência indireta, adotaremos a postura de não tentar encontrar os elementos desse “lugar” e sim buscar entender a lógica discursiva, os padrões de repetição. Atuação no processo clinico Atuação também pode ser entendida como uma modalidade de resistência e transferência, mas porque resistência e transferência usados como sinônimo? Quando alguém resiste a algo, ele está transferindo ou posicionando aquilo do qual resiste baseado em referencias, em padrões e isso é uma modalidade de repetição, de transferência. Vamos pensar a atuação de forma separada para felicitar a compreensão: a atuação é o processo onde o analisando cria algo falso com o intuito de não lidar com questões que ele julga ser complicado. 91 Exemplo: um analisando pode apresentar uma rápida melhora para agradar o analista, ou mesmo ver sentido em tudo que o analista fala ou até mesmo se comportar de uma determinada forma apenas para se adequar ao que o analista fala. Outro exemplo: o analista fala gera uma interpretação no modelo freudiano e diz para o analisando que seus sintomas são como são porque quando criança ele desejava está perto de sua mãe, mas seu pai não deixava. O analisando começa a se comportar como se quisesse manter essa relação com a mãe e passa a se comportar como se o analista fosse sua mãe e acata a tudo que o analista diz. A atuação é uma forma de resistência e essa resistência é inconsciente, porém o analisando percebe que está atuando, obvio que se tratando de neurose, mas no caso da psicose ele viveria aquilo como se realmente fosse uma verdade. Aqui falamos de forma separada, mas de modo geral a atuação é uma forma de resistência e de transferência, pois é usada para não lidar com processos inconscientes, mas como o analista vai lidar com isso no processo de análise? 92 Como lidar com a atuação: a atuação segue dois caminhos. No primeiro ela vai tentar gerar efeito terapêutico rápido para agradar o analista e o segundo, ela vai concordar e verá sentido em tudo que o analista fale. Para contornar isso, primeiro o analista precisa não se posicionar no lugar de mestre e não realizar interpretações diretas, pois assim ficaria muito mais provável o surgimento das atuações. Caso a atuação já esteja no processo, o analista precisará ter um olhar crítico em relação a essa suposta melhora e manter esse mesmo olhar sobre a lógica impregnada em tudo, dessa forma a resposta do analista a atuação não será recíproca e o analisando ira sentir essa ausência de resposta e a atuação tenderá a diminuir e então começara a análise de fato, pois esse processo transferencial de atuação é desfavorável, com ele o analista não consegue dar sequência por se tratar de uma modalidade de resistência. É bem comum nesses casos onde a atuação é dissipada o analisando experimentar uma frustração, pois as questões que a atuação visava sublimar agora estarão expostas para serem trabalhadas. 93 Elaborando perguntas As perguntas exercem diferentes funções dentro do processo clinico como função de intervenção e função de direção. Basicamente essas são as duas propostas da prática clínica psicanalítica. Intervenção para gerar elaboração e direção para o manejo da transferência no processo, então é de suma importância ter a capacidade de elaborar boas perguntas para que o processo de análise flua da maneira almejada. Para elaborar boas perguntas aquele que pergunta deverá assumir a posição de analista e para isso ele deverá usar a contratransferência indireta, mas para isso ele deverá compreender que ele também se trata de um sujeito castrado que não ocupa a posição de mestre. (Quando falo sobre posição de mestre e de analista, estou me referindo aos 4 discursos do Lacan. Quando o analista assume a posição de analista, ele adota uma postura crítica com aquilo que ele acha que sabe sempre acreditando está errado sobre suas suposições e então ao invés de interpretar de forma direta, ele elabora perguntas. Anteriormente, quando o analista acha que 94 sabe as respostas sobre o outro,na verdade ele está apenas projetando aquilo que existe nele mesmo em um outro. Vamos usar as perguntas para manejo e para intervir, então vamos a algumas situações comuns que ocorrem no processo de análise que vão demandar manejo. Analisando que tem dificuldade de falar: o analisando com essa dificuldade está resistindo ao processo e o analista pode manejar isso gerando identificação. O analista olha nas informações coletadas o que o analisando gosta e não gosta, então o analista pergunta sobre isso que ele gosta. É recomendável que o analista pergunte sobre o que ele gosta para gerar estimulo nele. Paciente que só responde de forma direta: Alguns analisandos respondem apenas sim, não, bem, mal, não sei. Nessa situação o analista pode adotar uma postura mais antecipada. Exemplo: como foi sua semana? Bem! E o que é estar bem? Qual a diferença entre estar bem e está mal? O analisando responde que foi normal. O que é normal e anormal? Como você reage a situações normais? 95 Dessa forma será menos provável que o analisando manterá essa postura tão direta. Pacientes com instabilidade emocional: Esses pacientes podem apresentar algumas alterações de humor de forma brusca e isso pode ser muito desagradável tanto para o analista quanto para o analisando, por isso vamos adotar um método onde geramos perguntas que ele identifique de forma positiva e perguntas mais longas e detalhadas. Exemplo: a pergunta comum seria: por que você tem medo de perder sua esposa? A proposta aqui será: quando uma pessoa termina seu relacionamento e fica triste, antes desse relacionamento ela era feliz e agora não será mais. Com o que você acredita que esse relacionamento esteja ligado para gerar esse efeito na pessoa? Observem que aqui a pergunta foi direcionada a um terceiro e o fato de não ser uma pergunta direta para o analisando, já reduz e muito a probabilidade de um surto. Outro fato de a pergunta não ser curta e direta é que abre margem para o analisando gerar sua própria interpretação e com isso o analista poderá avaliar o comportamento do analisando. O analisando ficara um pouco confuso com a 96 pergunta e dirá: “você está querendo dizer isso?” se o analisando disser de uma forma calma, o analista pode confirma, mas se ele estiver alterado o analista tem a possibilidade de dizer, não foi isso que eu quis perguntar e então o analista reformula sua pergunta. Pacientes que tende a fazer da análise uma conversa informal: Alguns analisandos tendem a levar a análise para uma conversa formal e com isso a análise começa a perder seu sentido, isso ocorre por causa da resistência e também por transferência de querer se sentir mais próximo do analista. Quando isso acontece o analista precisa reestabelecer o foco e gerar perguntas relacionadas aos sintomas do analisando, isso seria uma forma de não responder ao analisando do lugar que ele o coloca e isso gera a frustração necessária. Perguntas como proposta de intervenção. Esse modelo de perguntas está relacionado a geração de elaboração. Para isso será necessária essa pergunta está associada e contextualizada em um amplo processo. 97 Como observamos, a contratransferência indireta possibilita ao analista criar hipóteses sobre a possível causa do sintoma, logo as perguntas serão geradas baseadas nessa hipótese. Não é possível que o analista não crie nenhuma hipótese, pois ele é um sujeito social e com isso fica inevitável, mas a diferença é que ele terá a certeza que essa hipótese não representa a verdade do paciente e sim e a sua então ao invés de falar, ele irá contextualizar tudo que o analisando falar e vai criar uma proposta de intervenção que nesse caso será uma pergunta. A pergunta como intervenção será mais pontuada e quando digo pontuada, refiro-me a uma pergunta baseada em todas as evidencias de repetição coletada no processo de análise. Marcando pontos Marcar pontos no processo de análise terá duas vertentes diferentes. A primeira estamos falando de acentuar um comportamento que baseado com o contexto o analista vai julgar importante como por exemplo, quando 98 o analista cria uma suposição sobre a origem dos sintomas e um determinado comportamento do analisando desperta essa identificação no analisa e então o analista apresenta esse comportamento ao analisando fazendo com que ele fique ciente disso. Temos a segunda forma de marcação de pontos que é quando o paciente apresenta aqueles elementos analisáveis no processo de análise como: chistes, lapsos de memória, incoerências, repetições. Quantos mais o analista mostra essas características no discurso do analisando, mais o analisando vai associar. O analista terá essas duas formas para julgar se um conteúdo é relevante para ser marcado. O primeiro é baseado na contextualização de outras análises feita com o mesmo analisando e a segundo é quando se deparar com chistes, lapsos de memoras, incoerências e atos falhos. Essas questões que poderão ser maracas acontecem porque é uma forma sublimada do inconsciente se manifestar, logo teremos a possibilidade de bater direto em pontos de alienação na estrutura dos sintomas. Bruce Fink aponta alguns comportamentos que podem ser marcados. 99 • começa a falar e para e depois inicia de novo • palavras iniciadas pelo lugar errado. Exemplo: comigo inicia migo • parar no meio da frase e iniciar outra. • interromper e reconstruir a sentença Esses comportamentos podem ser marcados e apresentados aos analisandos com o intuito de gerar elaboração. Tipos de resistência Saber identificar as resistências é um fator essencial no processo clínico psicanalítico, dessa forma o analista conseguirá visualizar quando ocorrerem processos que estejam diretamente relacionados a processos de alienação. No texto teoria das neuroses de Fenichel, ele descreve alguns tipos de resistência, são elas: • Esquecimentos • Críticas aos comentários do analista 100 • Pode sentir-se antagônico ou não se sentir à vontade • Forcar no presente • Na forma inversa só fala das lembranças da infância. Além dessas, Freud descreve outras como, atos falhos lapsos de memória, lapsos de fala, chistes. Conceitualmente, a resistência é um mecanismo psíquico que atua para que o sujeito não sofra com conteúdo danosos e por mais que sua origem seja inconsciente, essas resistências se manifestam de forma consciente dificultando o processo de análise. Para dar sequência ao processo de análise, o analista terá que identificar, “compreender” e quebrar essas resistências. Alguns psicanalistas classificam o processo de análise como uma interpretação da resistência, pois teoricamente o que gera o sintoma é a resistência que mantem conteúdos recalcados no inconsciente, mas já outros psicanalistas consideram a resistência não como algo na ordem “intencional”, mas como a inexistência daqueles 101 processos que levaram a geração dos sintomas. Para entendermos essa teórica, a loca estaria na organização inconsciente de uma vertente mais lacaniana. O inconsciente associativo, não considera as experiências passadas como algo intacto na psique, elas são associadas as experiencias do agora e não existem mais no sentido de estarem guardadas como um hd de computador, nesse sentido, a resistência não seria mais um mecanismo e sim o fluxo normal do processo de desenvolvimento. Nesse sentido a análise não visaria encontrar após a resistência o lugar originário dos sintomas, porque o sintoma estaria na própria consciência, nas ações, nos comportamentos, a consciência seria o lugar do inconsciente. Nessa perspectiva o analista entenderia as resistências citadas apenas como conceitos e usaria para relacionar, contextualizar suas propostas de intervenção.102 O enquadre no processo de análise O enquadre é um contrato combinado entre o psicanalista e o analisando que visa estabelecer limites e o funcionamento do processo de análise como por exemplo: duração, frequência, honorários, esclarecimento de papeis. Por mais que o enquadre tenha um uma função objetiva e bem delimitada, é importante se atentar para questões subjetivas que vão permear essa relação terapêutica e aqui estou falando da transferência. Os analisandos chegam com diferentes demandas e com diferentes posicionamentos, logo a posição que o analista exerce vai depender da forma em que o analisando se coloca. O analista vai se moldar para mante ou levar o processo de análise a diante. Existem pacientes que se não sentirem empatia em relação ao analista desistem do processo de análise, casos onde o analisando não fala e só responde aquilo que lhe é perguntado. Sempre ouvimos dizer que a posição de analista é uma posição fixa, mas algo que sempre acontece é analisando desistindo do processo por não verem o processo ir a diante, nesses casos é melhor deixar o analisando desistir ou o analista se tornar uma 103 posição mais flexível e manter o processo? O analista terá que está ciente dos riscos que isso pode gerar como a sua contratransferência sair de indireta para direta e com isso o processo de análise se tornar mais uma projeção do próprio analista e desfocar do próprio paciente. O analista só consegue manter essa posição se ele se mantiver na contratransferência indireta que equivale ao desejo do analista. Isso será condicionado as análises que o analista fez quando ainda não era analista e ao amplo estudo realizado em psicanálise, mas existem alguns pontos que o analista deve manter e também podem ser usados como limite dessa relação de análise. • não falar da sua vida pessoal • não comparar a situação do analisando com a do analista • não estabelecer vínculos fora do processo de análise • não dar conselhos e nem direcionamentos • não aceitar presentes dos analisandos Esses são pontos principais que o analista precisa manter para estabelecer os limites do processo de análise e 104 também o analista deve manter um policiamento se ele está cumprindo esses pontos. Alguns pontos o analista precisará manejar de forma mais atenta. Vimos sobre manejo da transferência que alguns analisandos não falam e nesses casos o analista usa a ficha para identificar alguns interesses do analisando para gerar transferência positiva, mas isso o colocara em uma posição de familiaridade com o analisando e fara com que ele o veja com algum grau de proximidade, mas o analista só responde desse lugar até que a transferência se estabeleça por completo e faça com que o processo de análise se inicie, assim que houver transferência, o analista vai se retirar dessa posição e adotara uma postura mais neutra, mas ainda assim o analista não irá fazer aquilo que foi listado anteriormente. Recomendações sobre a técnica Freud, Bion e Meltzer. Freud fez algumas recomendações sobre de suma 105 importância e até hoje é usado como norte no processo de análise. • Não dirigir o foco para nenhum ponto: Quando damos uma direção, a associação livre deixa de ser livre e o analisando passa a realizar uma seleção daquilo que irá falar e desse modo as repressões exercidas pelo ego vão se organizar para que esses conteúdos não cheguem à consciência. • Atenção flutuante a atenção flutuante consiste em não focar no assunto em si, mas nos chistes, atos falhos, lapsos de memória e incoerências, isso porque nossa psique é limitada e se for prestar atenção em tudo com o passar do tempo nossa mente começara a selecionar pontos a serem focados e isso faz com que o processo de análise não tenha sua máxima eficácia. 106 • Não anotar durante o processo Anotar durante o processo gera desvio de atenção e reduz o processo transferencial que acontece em análise. caso seja preciso anotar, que seja ao final da sessão quando o analisando se tiver ido embora. Recomendações de Bion sobre a técnica. • Usar sentidos Quando Bion fala em usar os sentidos está se referendo ao uso da percepção. • Abandonar memorias Cada sessão deve ser encarada como sendo a primeira na visão de Bion. • estado de rêverie O analista deve se orientar por um estado onírico em vigília, como se o analista se mantivesse em um 107 estado inconsciente para realizar a relação inconsciente. • Utilizar raciocínio especulativo Bion fala sobre usar a imaginação especulativa no processo onde as deduções não serão baseadas em processos pré-estipulados. Recomendações de Meltzer sobre a técnica. • Atenção uniforme Aqui ele fala sobre suspenção das, memorias e desejos que possam organizar o processo. Essas memorias podem vir a influenciar no percurso que a análise vai seguir. • Compreensão dos vínculos entre as associações Analisar simultaneamente cada associação estabelecida pelo analisando. 108 • coleta da transferência Ele diz que o analista deve analisar e interpretar a transferência positiva e negativa desde o início do processo para que isso gere uma adaptação no analisando. Critérios de analisabilidade Freud estabelece alguns requisitos para que uma pessoa possa realizar as análises e ele os chamam de critérios de analisabilidade. Algumas questões vão impossibilitar o processo de análise como: • pessoas próximas como: amigos, parentes conhecidos, ex-namorados etc. • pacientes com a estrutura perversa • pacientes que não estabelecem transferência positiva. 109 É inviável realizar análise com pessoas próximas por conta de diversos fatores como: aquilo que é dito em análise pode gerar alteração na relação, o analisando não falara tudo que vem à mente de forma livre para que o analista não saiba de coisas que ele considere constrangedoras. Pacientes com a estrutura perversa ou narcísica são incapazes de serem analisados, pois não estabelecem transferência positiva, tudo de erado está no outro, ele é sempre perfeito. Já os pacientes que não são capazes de gerar transferência positiva, mesmo passando por todo aquele processo de manejo transferencial nas análises preliminares, isso se dá por conta de um processo de identificação com o analista que gera nele uma forte transferência negativa que tona o processo inviável. Comunicação não verbal no setting Quando pensamos em livre associação, assimilamos quase que de maneira automática a linguagem verbal, mas a linguagem não verbal não deve ser desconsiderada e se analisada da maneira correta, servira de grande auxilio no 110 processo clinico. A linguagem não verbal deverá ser entendida dentro de um contexto, isso porque são gestos que podem ter diferentes significados e o analista não conseguirá ter exatidão em sua interpretação, por tanto será necessário o auxílio da linguagem verbal para introduzir essa forma indireta ao discurso e avalia-la de maneira relacionada. Uma das principais formas que encontramos de usa-la no processo de análise é compreende-la como um processo de repetição, exemplo: sempre que o analisando fala sobre algo ou alguém, ele utiliza um mesmo gesto, seja um gesto com as mãos, seja uma expressão fácil, ou mesmo um toc. Dessa forma associativa o analista conseguira associar o comportamento a um elemento psíquico e gerar o que chamamos de suposição de análise. A fundamentação da linguagem não verbal dentro da prática psicanalítica nos remete a vertente lacaniana onde aquilo que se repete se organiza como um ganho secundário do sintoma, o gozo e ao que chamamos de psicosomatismo. O psicossomático dentro da psicanálise vem de umprocesso de desenvolvimento que antecede o 111 surgimento do eu, algo que inicialmente está relacionado a não percepção de si mesmo. Em Freud pensamos nas fases do desenvolvimento da libido onde a energia libidinal da sentido a diferentes partes do corpo, já em Lacan pensamos no desenvolvimento que surge através do desejo do outro que nomeia os objetos e da sentido a minha própria existência, desse modo existe uma conexão entre o intrapsíquico e o corpo e essa vinculação nos permite contextualizar o comportamento expresso de forma não verbal as palavras e compreender tudo isso de maneira contextualizada dentro do processo de análise. Silencio nas sessões É algo que ocorre de maneira não tão frequente, mas quando acontece, é algo muito complexo de lidar, estamos falando do silencio nas sessões. Não existe uma única causa para o silencio, mas sim diversas, vamos mapear aqui as possíveis causas. 112 1. adolescentes que são levados pelos pais: nesse caso, é muito comum não haver interesse por parte do adolescente em realizar o processo de análise e isso pode gerar aquelas respostas indesejadas do tipo sim, não e talvez. 2. analisandos introvertidos: analisandos que não estabelecem relação transferencial apresentem grande dificuldade em associar livremente e isso acaba por gerar silencio nas sessões. 3. Analisando descrente que o processo funcione: nesse caso o analisando pode apresentar uma grande falta de interesse pelo processo e isso fara com que ele não fale muito. 4.Analisando com grau elevado de depressão: algumas pessoas com grau elevando de depressão apresentam uma característica de tanto faz. Nada para eles faz sentido e desse modo fazer ou não as sessões é um tanto faz. Isso pode ser relacionado ao ponto 3 que gera um desinteresse por parte do analisando em continuar o processo. 5 falta de identificação com o analista: aqui o analista pode gerar transferência negativa no 113 analisando fazendo com que seja inviável processo de análise com aquele analista. Vimos que existem diferentes formas de silêncio e com isso, vão existe diferentes formas de lidar com cada uma delas. O primeiro passo é realizar uma identificação de qual tipo de silencio seu analisando trans. O silêncio ele diz muito, mas essa frase não deve ser usada para legitimar um comportamento passivo do analista em relação ao silêncio, o analista precisar ter técnica para lidar com essa situação dentro do processo de análise. Vamos analisar caso a caso: 1 primeiro é preciso identificar se o paciente realmente precisa de ajuda ou se são os pais que precisam, isso porque alguns pais consideram um problema filhos que não respondem exatamente do lugar a qual os pais os colocam e aqui não me refiro a comportamento ilícitos e sim de um filho que não quer cursar direto e sim medicina. Quando algo semelhante ocorre, será fundamental que o analista converse sobre isso com os responsáveis. 114 2 O analista consegue estimular o analisando gerando identificação, isso pode ser feito através de compreensão sobre assuntos que o analisando domine ou goste e então o analista demonstrara interesse por aquele assunto, mas vale se atentar para o fato que essa prática muitas vezes precisara ser realizada com mais frequência para gerar resultados. 3 Quando ocorre a descrença, é preciso compreender o que levou o analisando a buscar uma análise, pois se ele não acredita na eficácia do método não faz sentido ter procurado, pelo menos um sentido direto. Compreender o sentido indireto é a chave para o analista conseguir gerar identificação no analisando e gerar o engajamento no processo. 4 como nada faz sentido é inviável pensar que o analisando vá associar livremente. Aqui é onde se torna interessante o analista identificar coisas que o analisando antes gostava e agora não gosta mais, assim será possível que o analisando expresse resquícios de sentimentos relacionado aquilo que antes ele gostava. Teoricamente dentro da 115 psicanálise a depressão seria o mesmo que a incapacidade do ego de direcionar a energia libidinal para algum ponto, logo essa energia libidinal estaria canalizada ou reprimida e com essa técnica pode ser possível que o analista traga resquícios ou melhor gere ligação intrapsíquica no analisando. 5 mesmo realizando todo o processo de manejo transferencial o analisando ainda transfere para o analista um sentimento que torna inviável o processo e dessa forma caberá ao analista se posicionar de forma ética e encaminhar o analisando a outro analista, pois dessa forma o analisando não perde seu dinheiro, seu tempo com algo que não lhe gerara progresso. Como analista sempre levo comigo o sentimento e o pensamento que a melhora do paciente sempre estará acima de qualquer capricho. 116 Os quatro tempos de uma análise As análises se dividem em quatro tempos que é uma organização, uma sistematização do processo clinico. Compreender essa organização é fundamental para um melhor manejo. 1 Primeiro tempo: tempo de ver, de perguntar sobre aquilo que está vendo. Nesse tempo a função do analista será de abrir espaço para o segundo tempo. 2 Segundo tempo: é o ensaio de resposta. Não daremos uma resposta, mas vamos buscar compreender aquilo que vimos no primeiro tempo, é onde se inicia um processo de aprofundamento no enquadre psicanalítico. 3 Terceiro tempo: tempo de concluir aquilo que observou e entendeu, é o tempo da legitimação do segundo tempo e com isso dará a possibilidade da entrada no quarto tempo. 4 Quarto tempo: tempo da elaboração, é o momento onde o analista traves das suas intervenções ajuda o analisando a lidar com suas ausências. A análise 117 não tem por objetivo banir sentimentos ou pensamentos e sim possibilitar que o analisando posso lidar com isso sem fazer disso um sintoma. Essa organização é uma visão mais lacaniana da estruturação de um processo de análise. na perceptiva lacaniana a análise seria um ensaio de resposta continua por não levar em consideração a possibilidade de responder do lugar que o analisando o coloca ou do lugar que o analista pensa ocupar. Essa impossibilidade que permeia o processo é o que justamente da as condições para as análises, análises essas que estão condicionadas essa organização relacional faltante. Estrutura dos sintomas O que são os sintomas e quais as suas organizações? Os sintomas não são obras do acaso, eles têm uma estrutura, um sistema, uma organização lógica. Esse sistema organizacional foi proposto pelo Freud em seu texto a interpretação dos sonhos onde ele fala que os 118 elementos psicológicos funcionam como cadeias associando-se entre si, mas na mesma visão freudiana encontramos cadeias engessadas como se fosse uma definição da personalidade. Nossa mente teria a parte inconsciente que guardaria as informações das experiencias vividas como se fossem um pen drive, entretanto a nossa psique tem um sentido relacional entre os significantes que vão se agrupando as novas experiencias e formando outros modelos de organização, na compreensão sobre memoria usaríamos a cadeia significante proposta por Lacan. Significantes são elementos psíquicos que se relacionam entre si para formar significação. Exemplo: duas pernas, dois braços, dois olhos, um nariz, duas orelhas, esses são significantes que quando juntos formam o significado pessoa, mas todo significado também é significante de outros significados, exemplo: pessoa é significante do significado grupo, instituições, sociedade, etc., ao mesmo tempo que é significado se torna significante. Além disso todos os significantes se relacionam entre si, como exemplo: braço é um significante de pessoa, mas também pode ser significantede sofá. É muito comum a expressão braço do 119 sofá. Essa lógica forma o sistema do sintoma, a psicopatologia é formada pela associação dos significantes que geram a significação. Para compreender a forma lógica que os significantes se organizam, precisaremos compreender que esses significantes se organizam de forma diferente em cada pessoa, isso porque vai depender da internalização ao longo do processo de desenvolvimento, uma relação entre vinculação da energia libidinal e a realidade externa que serão posteriormente o que falamos de referências e após isso, essas referências serão base para identificar aquilo que vejo, ouso com aquilo que existe no mundo interno. Ainda sobre a estruturação dos sintomas, o que gera essa lógica é a busca pelo prazer e a tentativa de evitar o desprazer, logo essa lógica significante será baseada nessa base. Agora sobre a alteração nessa estrutura. O analista precisara identificar padrões de repetições entre a organização significantes no discurso do analisando, identificando esse padrão vai se dá a possibilidade de gerar uma hipótese que mencionamos anteriormente e a partir 120 dessa hipótese elaborar uma proposta de intervenção. A intervenção deverá ser relacionada as referências do analisando para gerar nele a identificação que apenas dessa forma vai gerar a elaboração que é a alteração na lógica dos sintomas. Os desafios da neurose no processo clinico Quando falo de neurose refiro-me a estrutura clínica. A neurose apresenta uma característica que é desfavoráveis as análises, essa característica é a estruturação do ego que organiza os sintomas de uma forma sublimada dificultando a percepção das relações entre os elementos psíquicos que compõem o sintoma, sendo assim o analista encontrara os mecanismos de defesa do ego que vão dificultar o processo, então o analista precisara conhecer e saber identificar quando esses mecanismos surgirem para conseguir compreende- los não como algo do acaso, mas sim como ferramenta para entender a organização lógica dos sintomas. 121 Segundo a teoria do surgimento das estruturas clinicas, a neurose seria uma herança do processo de castração, quando surge o eu, surge na mesma estrutura do ego o superego que visa reprimir de diversas formas os instintos do id, e com essa forte repressão o analista precisara quebrar essa resistência e para isso ele precisara entender como esse analisando se defende. A forma em que o analisando se defende é a forma em que o sintoma se organiza. Vou listar aqui os tipos de mecanismos de defesa e como lidar com cada um deles. As dificuldades apresentadas pela psicose no processo clínico Como psicose como estrutura apresenta uma peculiaridade bem relação a neurose, a psicose apresenta um mecanismo de defesa que dificulta as análises, estamos falando da forclusão que é um mecanismo de defesa que mantem o sujeito se relacionado apenas com aquilo que existe em sua própria psique. Em certa medida, o neurótico considera a possibilidade de não saber algo, 122 então em uma situação como duas pessoas rindo na rua, ele pensa que talvez elas estejam rindo de uma piada, já o psicótico conclui que estão rindo dele e não tem outra possibilidade, ou seja a realidade intrapsíquica do psicótico é uma só, é como se aquilo que existe que chamamos de referências psicológicas não se relacionassem com as percepções do mundo externo. Essa característica fara com que o processo de análise enfrente algumas dificuldades bem severas, como o paciente ter baixa capacidade de elaboração, as intervenções do analista não surtirão o efeito esperado, a transferência será algo voltado para o próprio analisando. Para amenizar essas dificuldades primeiro entender como a psique do analisando se organiza e isso vai exigir análises preliminares mais longos. Uma segunda dificuldade bastante complicada é a variação brusca de humor. Nesse caso o analista não poderá realizar intervenções muito diretas ou muito incisivas, isso porque o analisando vai interpretar aquilo que é dito da exata maneiro como as referências dele se organizam e com essa característica mais instável 123 emocionalmente, é bem provável que ele desenvolva algum tipo de reação indesejada como ficar agressivo, ficar muito triste, muito ansioso entre outras possibilidades. Com pacientes psicóticos as intervenções devem ser sempre realizadas em formato de perguntas, sempre de maneira indireta, pois a relação que ele estabelece com ele é uma relação interna e o que vem de fora não gera elaboração. As quatro tentações do analista Os psicanalistas, apesar de estarem embasados em sua prática por teorias e suas próprias análises, ainda é um ser humano e como todo ser humano não está isento de suas características subjetivas, e com isso é natural principalmente em analistas iniciantes, a tendencia a deixar as suas características pessoas interferirem nas análises, isso está relacionado com a identificação que gera a contratransferência que por sua vez pode ser originaria da ausência de análises ou mesmo análises que podemos 124 dizer não terem sido bem conduzidas ao psicanalista no momento em que era aspirante a psicanalista. Vamos listas aqui as quatro tentações dos analistas. Posição de professor: 1 O analista pode acabar por se deixar seduzir pela transferência do analisando que o coloca na posição de mestre e se sente tentado e ensinar um caminho ao analisando, algo que é completamente fora do processo de análise, isso porque a realidade do analista nunca será igual à do analisando, e com isso a possibilidade de aparecer um resultado negativo é grande. 2 Características dessa posição: *Tendencia a dar conselhos *Dar direcionamentos *Ensinar o que o analisando deve ou não fazer 2-Posiçao de salvador: O analista contagiado pela posição de mestre, não deve responder desse lugar, pois é recomendável 125 que o analisando se posicione como sujeito que produz subjetividade. Desse lugar de salvador o analista o retira dessa posição e impossibilita a produção de elaboração. 3 Posição de aliado: Nessa posição o analista se identifica com alguma coisa trago pelo analisando e gera a contratransferência e então se inicia uma relação isenta de neutralidade por parte do analista o que acarreta na ineficácia da análise a transformando em uma conversa informal que é algo muito improdutivo para o processo. 4 Posição de moralista: Aqui vamos nos deparar com uma posição onde o analista se identifica com algo e essa identificação gera no analista comportamentos que reprimem o analisando e isso faz com que essa repressão dificulte ainda mais o processo de análise que por si só já enfrenta uma série de dificuldades. 126 O analista precisa manter uma posição de constante policiamento para não se deixar levar pelo seu desejo primário e conduzir não uma análise, mas sim um diálogo que remova o paciente do centro e o analista ocupe essa posição. Sobre o divã Os motivos para o uso do divã 1 O divã é uma herança deixada no período onde Freud ainda usava a hipnose como método terapêutico. 2 Foi mantido porquê dessa forma o analisando ficava mais relaxado e assim associava com mais facilidade 3 3Sem estar olhando para outra pessoa conseguimos nos relacionar melhor com nossas palavras 4 Reduz a percepção das contratransferências do analista. 127 5 Um outro motivo é pelo desgaste do analista que ao longo dia vai aparecendo o cansaço e o analisando pode identificar isso como falta de interesse do analista. 6 O divã tem uma outra função que faz parte de uma visão mais técnica dentro da psicanálise que é o marco da entrada na análise.reinch propunha que as análises deveriam antes de se iniciarem serem marcadas por análises preliminares e Lacan mantem essa posição e compreende que o divã representa a entrada do sujeito do inconsciente no processo, a perda de compromisso com o falso self, a ruptura com as resistências secundarias. Desse modo as análises preliminares são feitas olho no olho e quando se inicia a análise se utiliza o divã que é onde começa a relação inconsciente do processo. Esse método é algo que particularmente me é de muito apreço. Como pudemos observar o divã é uma importante ferramenta dentro do processo clinico psicanalítica, mas 128 não deve ser entendido como uma regra geral, a sua funcionalidade vai depender do formato subjetivo da estruturação psicológica de cada analisando e com isso podemos imaginar que cada analisando vai se sentir de formas diferentes com relação a posição do divã. É recomendável, mas não é uma imposição o uso do divã. Esse será um tema amplamente debatido dentro da comunidade psicanalítica. A técnica ativa e mutua de Sándor Ferenczi Ferenczi observa que através das interpretações, intervenções do analista se criava um vício n processo de análise e o analisando passava a se comportar de maneira meio que programada para se adaptar as intervenções do analista e com isso, Ferenczi cria a técnica ativa, que consiste em estimular o analisando a algumas posturas diferentes como um enfrentamento ao objeto fóbico, mas também o proibia de executar outros tipo mania, tiques, era uma postura confrontativa muito diferente da postura 129 passiva que encontramos em outras modalidades de psicanálise. Ferencz propõe que a técnica ativa fosse utilizada em último caso quando não houvesse êxito na análise tradicional. Essa técnica foi pensada para gerar movimento da libido, ao estimular o analisando a pensar sobre seus traumas, seus sofrimentos, ao estimular o analisando a se aproximar de objetos que lhe geram terro, gerava-se um movimento da libido que por sua vez gera efeito terapêutico. Análise mutua A análise mutua foi pensada quando Ferencz observa que o caráter é uma forma de se defender, de reprimida, uma forma organizada para lidar com a realidade que de certa forma nos colocava em uma posição passiva em relação ao outro, com a análise mutua que consistia na inversão de lugar, onde o analista falava para seu paciente sobre suas análises, sobre seu conflitos, sobre seus desafios e com isso o paciente ouvia isso de uma outra 130 posição o que fazia o analisando a restaurar sua postura ativa e com isso ele elaborava a partir das próprias intervenção. Essa prática é impensável para muitos psicanalistas, entretanto é uma proposta bem diferente que eu particularmente não vejo com grande entusiasmo. Diferentemente da técnica ativa que é uma prática bem fundamentada dentro da própria base conceitual psicanalítica. 131 CAPÍTULO IV A interpretação dos Sonhos Os sonhos sempre foram vinculados as superstições, questão místicas como mensagem do mundo das mortes, premonições, entre outras, mas foi com Freud em seu texto a interpretação dos sonhos que se alterou a compreensão desse processo onírico que antes foi relacionado a mitos. O texto foi publicado em 1900, porem o texto a interpretação dos sonhos foi escrito em 1899 no século 19, mas Freud queria que seu texto fosse do século 20 e por essa razão o texto foi publicado em 1900, início do século 20. Foi com a teorização sobre os sonhos que a psicanálise ganha uma base conceitual solida, devido ao fato de que a vertente teórica freudiana se baseia em conceitos que foram elaborada baseadas em seu estudo sobre os sonhos e vai ser no texto a interpretação dos sonhos que encontraremos importantes conceitos ou melhor dizendo conceitos bases da psicanálise, como a teoria topográfica, 132 consciente, pré-consciente e inconsciente, primeira tópica ou se preferir primeiro modelo da estrutura da personalidade. Essas teorias foram base para o surgimento de novas compreensões tanto da vertente freudiana quanto de outras correntes teóricas da psicanálise. Quando falo sobre nossas teorias, refiro-me por exemplo a segunda tópica, id, ego e super ego, chistes, atos falhos, complexo de édipo, mal estar entre outros conceitos do próprio feud., já em outras vertentes podemos citar o inconsciente estruturado como linguagem, a teoria das relações objetais, teoria das relações ambientais, entre muitas outras. De fato, a teorização acerca dos sonhos foi um marco no desenvolvimento da base conceitual psicanalítica. Se por um lado o estudo dos sonhos é de suma importância para a psicanálise, por outro lado os sonhos geram um rebote devido a vinculação que mencionamos anteriormente. Os sonhos foram amplamente vinculados a questões místicas e com isso criou-se um grande preconceito a cerca desse conceito. Faz-se necessário um amplo trabalho de desvinculação dos sonhos dos mitos e 133 mostrar ao público seus padrões, seu sistema de funcionamento para que possamos trazer esse conhecimento cada vez mais à tona para fomentar o modelo cientifico em relação a compreensão dos sonhos. Mas de modo geral os estudos sobre os sonhos são de grande importância para a psicanálise, foi através desses estudos que a psicanálise se tornou o que é hoje e com isso surgiram conceitos muito modernos sobre a estrutura psicológica e mais, a aplicabilidade prática da interpretação dos sonhos é uma grande ferramenta no processo clinico psicanalítico. Teoria topográfica a teoria topográfica é um modelo de teórico que visa explicar a o funcionamento da psique numa divisão tríplice onde é atribuído diferentes funções a cada parte estruturante da mente. Consciente: tudo que está no psiquismo de livre acesso. A consciência é formada a partir de associação de elementos psíquicos que se vinculam para formas as 134 ideias. Essa vinculação é uma padronização que juntas formam a lógica das verdades, das ideias e dos sintomas. Esses elementos foram descritos por Lacan como significantes. A cadeira como conceito é formada de pernas, encosto, acento. Esses três pontos são significantes que juntos formam os significados, mas pernas, encosto e acento podem ser significantes de outros significados como por exemplo pernas podem ser significantes de animal. O significado cadeira é significante de outros significados como por exemplo escritório. Então significante também são significados e significados são significantes de outros significados. Esses significantes se associam de uma forma lógica para gerar conteúdos conscientes, mas essa associação é inconsciente e com isso podemos entender a consciência como uma derivação de processos inconscientes. Alguns psicanalistas consideram a consciência como mecanismos de defesa, pois consciência é equivalente ao ego que é gerado a ´partir de uma frustração no processo de castração e para lidar com essa frustração surge o ego. Então o ego seria mecanismos de defesa para lidar com realidades difíceis. Fantasia, projeção, identificação etc. 135 Pré-consciente: algumas ideias inconscientes podem se tornar conscientes quando estão ligados a estrutura de linguagem. Uma pessoa te diz o nome dela na semana passada e você não se lembra, mas daqui uns dias você acaba se lembrando, isso aconteceria porque segundo Freud a repressão sobre essa informação não seria tão forte e acabaria por ocorrer ligações que gerem essa memória. Inconsciente: conteúdos reprimidos da consciência. A maior parte do psiquismo é inconsciente e esses conteúdos só chegam à consciência através de estrutura de linguagem, já as emoções se tornam conscientes semestarem ligadas a essas estruturas e disso podem surgir o sofrimento psíquico. O papel do psicanalista é, através da interpretação, inserir esses sentimentos a linguagem onde o sujeito irá reelaborar uma nova forma de se pensar aquilo que lhe faz mal, que antes era desconhecido. 136 Características do inconsciente: • lugar dos reprimidos (nem tudo no inconsciente é reprimido). • é atemporal, não tem um tempo cronológico e sim lógico. • acessível apenas de forma indireta. Através da compreensão dessa estrutura psíquica que o analista encontrara caminhos para realizar atos analíticos que gerem elaboração e com isso a alteração na estrutura dos sintomas. Alguns psicanalistas associam o ato analítico a interpretação, mas de forma particular vejo como toda e qualquer intervenção realizada pelo analista que gere efeito terapêutico como por exemplo uma pergunta pontual com o objetivo, bem direcionada, ou um silencia no momento oportuno, ou no encerramento da sessão em momentos adequados quando surgem conteúdos que o analista considere fundamental na estrutura dos sintomas. 137 O Sonho na Teoria Psicanalítica de Freud Os sonhos sempre tiveram a atenção de Freud desde criança, Freud mantinha um diário ontem descrevia seus sonhos. Freud entende os sonhos não apenas como um conjunto de elementos desajustados que aparecem com o sono, mas como um processo elaborativo dotado de lógica. Os sonhos para Freud já vinculados a psicanálise, são formados por um sistema de vinculação de elementos que constituem a estrutura psíquica. Segundo Freud os sonhos são conteúdos inconscientes que aparecem por conta de a repressão psíquica estar baixa por conta do sono e com isso os conteúdos inconscientes passeiam com mais facilidade. Os sonhos tem uma característica muito importante para a prática clínica psicanalítica que é: os sonhos não falam sobre os personagens dos sonhos e sim daquele que sonha. Podemos vincular essa ideia a ideia de projeção. “Quando Pedro me fala sobre Paulo, sei mais de Pedro que de Paulo” Freud 138 Nessa frase Freud refere-se as representações psíquicas que temos introjetadas em nossa mente que servem de referência para que eu possa interpretar o mundo. Imaginemos a seguinte situação: alguém chega para você e diz que um lápis foi feito para desenhar e você obviamente concordara com isso, isso ocorre porque foi passado entre as gerações essa informação, do contrário você não saberia a finalidade de um lápis. Para que algo faça sentido precisamos é necessário que tenhamos esses conteúdos introjetados em nossa psique para que seja possível associar com elementos externos. É disso que Freud diz sobre os sonhos, por mais que você sonhe com alguém, esse alguém será a representação daquele que você sonha introjetadas em sua mente, ou seja serão apenas referencias que já existem em sua mente sendo vinculadas. O mesmo se dá quando uma pessoa se apaixona por outra, ela cria uma pessoa que só existe em sua mente, o outro é apenas um gatilho que gerou identificação entre o externo e o interno fazendo com que ocorresse a paixão. Essa é a razão pelo qual as pessoas se frustram nos relacionamentos porque o outro nunca irá responder exatamente do lugar onde é colocado. 139 Freud afirmava que os sonhos são realizações de desejos inconscientes que não podem ser realizados quando acordados por conta da forte repressão exercida pela segunda parte do ego, o superego ou eu ideal que sendo uma parte do ego seria a herança deixada pela castração. Nos sonhos os desejos sexuais, agressivos são realizados e por conta disso, a psicanálise da tanta ênfase aos sonhos. Aqui já temos algumas sinalizações do modelo pratico que será aplicado na interpretação dos sonhos. Na prática da interpretação dos sonhos o que vai importar não são os outros dos sonhos, mas o que esses outros representam para o sonhador. Exemplo: um paciente sonha com seu pai o agredindo, o analista não vai analisar o pai e sim o que esse pai representa para o sonhador. Um detalhe importante que apesar do nome ser a interpretação dos sonhos, o que o analista faz não é exatamente interpretar e sim utilizar os sonhos como ferramenta de elaboração para o paciente. Veremos isso com mais detalhes mais à frente. 140 A relação dos desejos as imagens abstratas dos sonhos Vimos anteriormente que Freud afirma que os sonhos são realizações de desejos inconscientes, mas alguns sonhos como aqueles que chamamos de pesadelos despertam uma questão muito interessantes que é: se eu sonho que estou morrendo queimado, que tipo de desejo seria esse? Eu desejo ser queimado? A resposta para essa questão está na lógica do inconsciente. O inconsciente não funciona da mesma forma em que a consciência funciona, e aqui estamos falando do modelo freudiano. O inconsciente tem uma lógica própria e é essa lógica que tentamos compreender e dar sentido de forma direta, mas dessa forma o desejo nos sonhos não fara sentido, pois no exemplo acima dificilmente uma pessoa sentiria o desejo de ser queimado. Essa forma de explicar não é capaz de encontrar o verdadeiro sentido dos sonhos, para isso teremos que usar um método chamado associação livre. Esse método parte da compreensão que tudo na mente está associado como vimos anteriormente em que falo da cadeia significante. Para compreender o desenho dos 141 sonhos, teremos que compreender a lógica em que a cadeia significante do paciente se comporta. Vimos que o que você fala sobre o sonho não é exatamente a forma em que você sonhou, pois ao acordar os mecanismos de defesa do ego começam a filtrar novamente os conteúdos. Dessa maneira as representações que o sonhador tem dos sonhos são conteúdos manifestos e não latentes, e quando tentamos entender o conteúdo latente de uma forma racional e direta, não conseguimos encontrar sentido no desejo dos sonhos, mas ao começar associar junto ao sonhador, começaremos a encontrar sentidos diferentes em cada conteúdo apresentado nos sonhos. exemplo: um fogo que aparece nos sonhos poderia significar uma pessoa, uma arvore, um casal, etc. vamos a um exemplo para entender melhor. Freud atende uma paciente que tinha dois sobrinhos e um que ela amava como filho morreu. Ela sonhou que estava no velório do outro sobrinho, o que estava vivo, então ela se sente mal por achar que ela desejava que o outro morresse no lugar daquele que ela amava como filho, mas quando Freud começa a associar os elementos dos 142 sonhos junto a essa paciente e ela percebe que o desejo estava vinculado a querer estar junto a um amor do passado e ela vincula o velório a esse homem por ele estar presente na casa da irmã e sempre ao lado dela. Observem como o desejo aparece numa lógica que não pode ser compreendida de forma direta. Faça um teste, tente lembrar de algum sonho que você teve e separe cada elemento que apareceu no sonho e escreva um por um no caderno e depois comece a pensar: o que isso significa para mim? Faça isso com todos os elementos e você começara a perceber algumas coisas que te lembrar de outras coisas, de elementos que você viveu nos dias passados. Memória e suas relações com os sonhos A memória sempre foi associada ao conhecimento e sim ela tem grande relevância em nosso processo produtivo, mas é necessário compreender a memorização fora daquela compreensão de memória como 143 armazenamento de dados. A memória para a psicanálise tem um sentido articulativo, ou seja, a memória dependeria de outros processor para que ela apareça. Como mencionado nos módulos anteriores, o conhecimento é a articulação entre elementos internos e externo, nessa associação se constroem padrões que variam dependendode sujeito para sujeito. Mas o que seria esse sujeito? Sujeito não tem uma definição objetiva em psicanálise, mas podemos pensar no sujeito como algo que Winnicott chamava de rumo a independência. Ele falava sobre três estágios no desenvolvimento, dependência absoluta onde eu dependo de um outro para tudo, dependência relativa, onde eu dependo de um outro parcialmente e rumo a independência que é um estado ao qual o sujeito tenta a independência, mas nunca a consegue, pois nossa psique é construída a partir do outro, o desejo do outro que me mantem vivo, o desejo do outro que me aliena então esse outro sempre vai existir em mim. Lacan referia-se ao outro como o desejo que aliena. Um sujeito que existe em mim, o sujeito do inconsciente. O sujeito lacaniano é um sujeito em construção, um sujeito inacabado e essa indefinição impossibilita a existência de verdades que servem de forma 144 constante, uma ideia valida hoje, amanhã pode não ter mais serventia e isso que é a memória, a memória não é como um fato que será guardado para sempre, a memória é aquilo que vivi se vinculando as minhas experiências do agora formando uma memória que para o sujeito parecem ser exatamente da forma em que estão apresentadas, mas na verdade o fato inicial acaba por ser diferente e o que achamos ser uma descrição fiel dos fatos acaba por ser uma interpretação diferente, pois nossa mente já se modificou. Um fato que ocorre a três anos atrás não é exatamente da forma em que é descrito no agora. Isso ocorre porque nossa mente funciona em um processo de articulação entre os significantes da cadeia psíquica e de acordo que as experiencias vão aparecendo, a organização significante vai se alterando e modificando sua lógica. Nos sonhos não é diferente, um sonho contado hoje será diferente quando for contado em um outro momento, o sonho que sonhamos é um sonho bem diferente daquele contamos. 145 O que vai importar é o sonho contado, ou seja, o conteúdo manifesto. Cabe ao analista usar da técnica associativa para vincular conteúdo. Observe como a cadeia significante se articula, é dessa maneira em que os sintomas são formados, essa é a lógica do sujeito. Lacan chama de sujeito o que um significante representa para o outro e dessa compreensão entendemos que cada significante está relacionado com todos os outros significantes, então um significante que constitui o conteúdo latente estará relacionado com o conteúdo manifesto e dessa forma o analista ajudara o paciente a compreender a lógica dos seu sonho. Estrutura dos sonhos Os sonhos são formados de uma estrutura dividida em três partes: 146 impressões sensoriais, ideias e os impulsos do ID. As impressões sensoriais são estímulos externos que são percebidos pelo sonhador como por exemplo quando você senha que machucou a perna e quando acorda você está com a perna doendo, ou quando sonhamos que temos várias formigas em nosso braço e acordamos com os braços formigando. Estímulos que geram vinculação as ideias que acabam se agrupando e fazendo parte do conteúdo dos sonhos. as ideias são conteúdos que vivenciamos no dia a dia e essas experiencias se agrupam e formam o conteúdo dos sonhos. exemplo; você viu um comercial de cobra quanto assistia televisão, logo em seguida você assiste a uma novela e vê uma sena de traição e posteriormente você briga com seu namorado. Ao adormecer você sonha que está sendo traído, isso porque as ideias são vinculadas nos sonhos e formam um histórico e daí surge o mito de que sonhar com cobra significa traição. Um outro ponto que leva a esse mito são fatores sociais. Exemplo: você já ouviu dizer várias vezes que sonhar com cobras significa traição, então um dia você começa a desconfiar de possíveis 147 traições onde seu marido tem comportamentos que indicam possíveis traições, então quando você adormece, essa referência que as pessoas te passaram sobre o significado de cobra vem a sua mente e você sonha e posteriormente você descobre a traição. Não foi o sonho que te mostrou a traição, ele apenas foi vinculado aos estímulos gerados pela sua percepção de alteração de comportamento. As pulsões do ID são as pulsões que Freud descreveu como sendo a energia libidinal ou aqui melhor dizendo, são os desejos que geram os sonhos. desejos que tentam ser realizados através dos sonhos. Esses três elementos formam a estrutura dos sonhos. essas três partes se juntam e formam os sonhos. essa vinculação muitas das vezes vão gerar sonhos distorcidos, sonhos estranhos, sem sentido de um ponto de vista do seno comum, mas para a psicanálise eles tem um sentido sublimado. Na prática clínica de interpretação dos sonhos, vamos realizar uma espécie de estimulo do paciente para buscar elaboração sobre cada parte estruturante dos sonhos. o analista vai direcionar o paciente para associar 148 sobre os conteúdos apresentados nessa estrutura de forma subjetiva e única de cada paciente. O Conteúdo Manifesto e latente do Sonho Além das três partes que constituem a estrutura dos sonhos, ainda dividimos em outras duas partes que chamamos de conteúdos manifestos e conteúdos latentes. Conteúdo latentes: são conteúdos inconscientes que constroem os sonhos. esses conteúdos são experiencias que o sujeito passa em seu processo de desenvolvimento ao qual ele não se recorda por conta da força repressiva, isso pensando na perspectiva freudiana. Podemos usar como exemplo os conflitos que aparecem nos complexos, como complexo de desmame, complexo de édipo, o desafio do toalhete. Esses complexos geram mal estar que são reprimidos e passam a ser inconscientes. (elaboração primaria) Conteúdo manifesto: são conteúdos inconscientes que aparecem de forma alterada pelas funções do ego, ou seja, 149 são conteúdos que aparecem sublimados por algum mecanismo de defesa. Exemplo: quando alguém tem um desejo de agredir alguém, essa pessoa não irá agredir, pois tem consequências e a segunda parte do ego, o superego não permite isso, então o ego sublima, então essa pessoa vai participar de campeonatos de luta onde poderá bater sem sofrer julgamentos morais por isso. Notem que nesse exemplo o ego precisou encontrar uma forma de satisfazer os desejos do id sem afrontar o superego e o mesmo acontece em tudo em nosso dia a dia, a razão, consciência nada mais é do que a uma forma sublimada de lidar com as pulsões do id sem afrontar a moralidade representada pelo superego. O que fazemos é buscar formas aceitáveis de lidar com esses desejos. Vivemos em um constante conflito psíquico que geram nossas ações e pensamentos. Os conteúdos latentes sempre serão conteúdos que estarão associados a algum tipo de mecanismo de defesa, pois o ego é formado por diversos mecanismos de defesa. (elaboração secundaria) O analista ao analisar os conteúdos dos sonhos, não vai buscar as raízes inconscientes, porque esses 150 conteúdos apareceram na clínica como conteúdos latentes e não manifestos isso porque ao acordar o paciente terá seus mecanismos de defesa funcionando em sua totalidade e tudo que ele vier a dizer sobre seus sonhos serão conteúdos latentes ou seja, conteúdos filtrados pelas funções do ego e aqui refiro-me aos mecanismos de defesa do ego, dessa maneira a prática da interpretação dos sonhos mais vai se basear na forma sublimada do que na busca de um elemento psíquico inconsciente que tenha gerado esse sonho. Entraremos na parte prática com mais detalhes, vamos aprender o passo a passo de como se interpreta os sonhos. Condensação e deslocamento Freud descreveu alguns aspectos importantes dos sonhos, esses aspectos são formas organizacionais em que os sonhos são formados. condensação: uma pessoa ou objetodo conteúdo latente corresponde a duas ou mais do conteúdo manifesto. 151 Exemplo: sonho com uma mulher e essa mulher representa a função materna, paterna e irmãos. Uma mesma representação nos sonhos pode indicar vários significados, isso porque a condensação reúne várias representatividades em apenas um só elemento. no “seminário três” que o que Freud chama de metáfora é o “condensação” Metáfora: se usa os termos que são distintos numa relação de semelhança. Exemplo: Pedro foi muito cavalo com João. Nesse exemplo o termo cavalo é usado para substituir a palavra ignorante. Notem que a metáfora tem uma característica mais subjetiva, pois o mesmo termo poderia ser interpretado de outras formas. Deslocamento: quando alguém desloca um sentimento de um objeto para outro. Nos sonhos podemos representar isso no exemplo onde sonho que estava matando o padre, mas o sentimento agressivo que apresento é contra a minha função paterna, mas nos sonhos ocorre esse deslocamento que quando acordados podemos também chamar de transferência. a metonímia é o “deslocamento” 152 Metonímia: é o emprego de um termo no lugar do outro. Exemplo: eu preciso ler Freud. Observem que eu removo alguns termos, mas ainda assim todos entendem que eu gosto de ler os livros de Freud, ou seja, a metonímia é objetiva diferentemente da metáfora. Até o momento pudemos observar que os sonhos sempre aparecem de forma distorcida, seja pela condensação, deslocamentos, ou qualquer outra forma de sublimar, desse modo não devemos esperar que os sonhos indiquem algo claro e objetivo, muitas das vezes os sonhos podem apresentar conteúdos muito longe das suposições do analista e isso está relacionado com o excesso de mecanismos que constituem os sonhos. o analista sempre deve considerar as suas hipóteses como possíveis falseamentos. O registro do real no umbigo dos sonhos Freud afirmava que existe uma parte dos sonhos ao qual não conseguimos acessar e por mais que o analista 153 junto ao paciente associem, jamais encontrara um final. Freud chamou isso de umbigo dos sonhos. “Tive a sensação de que a interpretação desta parte do sonho não foi suficientemente desenvolvida para possibilitar o entendimento de todo seu sentido oculto. Se tivesse prosseguido em minha comparação com as três mulheres, ela me teria levado muito longe. Existe pelo menos um ponto em que todo sonho a qual ele é insondável, um umbigo por assim dizer que é seu ponto de contato com o desconhecido.” “Mesmo no sonho mais minunciosamente interpretado é frequente haver um trecho que ser deixado na obscuridade, é que durante o trabalho de interpretação apercebemo-nos de que há nesse ponto um emaranhado de pensamentos oníricos que não se deixa desenredar e que além disso nada acrescenta no nosso conhecimento do conteúdo do sonho, este é o umbigo do sonho, o ponto onde ele 154 mergulha no desconhecido. Os pensamentos oníricos a que somos levados pela interpretação não podem pela natureza das coisas ter um fim definido, estão fardados a ramificar-se em todas as direções dentro da intrincada rede do nosso mundo do pensamento. É de algum ponto em que esta trama é particularmente fechada que brota o desejo do sonho tal como um cogumelo brota do seu micélio.” Freud fala sobre uma cadeia de ramificações infindáveis que nenhuma associação será capaz de alcançar o ponto inicial. Lacan chama esse ponto de real ou indizível, aquilo que a linguagem não alcança, que a linguagem apenas sublima. Freud afirma que é do umbigo dos sonhos é o lugar originário do desejo dos sonhos e Lacan afirma que o objeto “A” o objeto partido que é inexpressável é o que causa o desejo, então em uma associação entre esses dois pensadores, o umbigo dos sonhos seria o real, objeto A para Lacan e essa cadeia de ramificações infindáveis será a cadeia significante em Lacan. 155 Dessa conceituação podemos começar a perceber que não é viável tentar buscar a origem dos sonhos, criar uma interpretação sobre os sonhos, pois isso seria mais uma projeção do analista do que necessariamente a resposta sobre a origem ou significado daqueles sonhos, tendo em vista que o umbigo dos sonhos ou o real é o inalcançável pela linguagem, o que de fato gera efeito terapêutico é a elaboração que acontece através da associação com o paciente ou sonhador. Método de interpretação É importante ressaltar que o que de fato importa é a forma em que o sonhador fala sobre esses sonhos. A interpretação dos sonhos não será uma interpretação de fato e sim um processo elaborativo. Ao contar seu sonho o analista vai usar esse discurso da mesma forma em que utiliza a associação livre. Os sonhos vão funcionar na mesma lógica da construção psíquica, eles são formados por cadeias significantes, então da mesma forma que fazemos na livre associação também faremos com os 156 sonhos, vamos elaborar junto ao paciente entendendo pontos importantes sobre os sonhos. quando falo partes importantes, refiro-me a significantes que aparecerão nos sonhos. o que vai acontecer é que o paciente não conseguira falar sobre o conteúdo latente, isso porque ao despertar seu ego começara a filtrar esses elementos psíquicos. Ao despertar os mecanismos de defesa voltam a funcionar então agora ao falar sobre seus sonhos, o paciente trará conteúdos manifestos, ou seja, conteúdos latentes vinculados a conteúdos manifestos. ATENÇAO: o objetivo dos sonhos não é criar uma resposta para ele e sim gerar elaboração no paciente. O que não fazer: • Não tentar encontrar conteúdos latentes • Não tentar criar interpretações sobre os sonhos. Freud falou que a interpretação mais correta é a que vem do próprio paciente. • Não vincular os sonhos a conteúdos místicos 157 O que fazer: • Selecionar partes importantes do sonho baseado no histórico de análise do paciente. • Associar cada elemento dos sonhos com o paciente no sentido de compreender a repetição que estrutura os sonhos. • Contextualizar os elementos do sonho com conteúdos a realidade do paciente. • Compreender os mecanismos de defesa que o paciente apresenta ao falar sobre o sonho. Vamos analisar ponto a ponto listados: No primeiro ponto vamos usar a atenção flutuante para selecionar partes importantes dos sonhos. exemplo: o paciente está contando um sonho que teve com uma pessoa o obrigando a comer grama. Vamos separar cada parte dos sonhos e vamos perguntar a ele o que cada elemento dos sonhos representa para ele. • O que comer representa para você? • O que grama significa para você? • Qual o sentimento que você teve nos sonhos? 158 • Você já sentiu esse mesmo sentimento em outra ocasião, se sim qual? O analista ainda pode associar as respostas que o paciente trouxe, isso vai enriquecer ainda mais. O paciente trouxe as suas respostas e agora o analista vai avaliar se apareceu atos falhos, lapsos de memória, incoerências linguísticas, chistes. Se sim o analista vai fazer perguntas pontuais sobre esses pontos específicos para que o paciente elabore ainda mais esses conteúdo. É bem provável que nessa associação o analista consiga compreender padrões de comportamentos então agora nós vamos associar esses elementos em comum com outras partes da suas análises anteriores. Agora estamos no segundo ponto. Vamos ao exemplo: suponhamos que quando o analista pergunta sobre qual o sentimento e ele responde que sentiu desespero, logo o analista pergunta em que outro momento você sentiu uma sensação semelhantes? Paciente responde: quando fui tirar carteira de motorista. Me senti muito tenso. Analista pergunta: e por que? Paciente responde: nervoso de errar. Eu costumava ter esse mesmo medo de errarquando meu pai ia me 159 ensinar a plantar milho porque ele me batia sempre que eu errava. O analista agora vai mostrar para ela toda essa repetição. • personagem repressor do sonho associado ao pai. • grama associado a planta ou ao ato de plantar milho. • medo de errar com o pai e com o instrutor de carteira de motorista. Agora no terceiro ponto vamos associar os conteúdos dos sonhos com as análises realizadas até o momento. Suponhamos que na análise o paciente tenha dito que sentia muita ansiedade sempre que iria ser testado e que isso gerava angustia a ponto de ele desistir e fazer provas. Os analistas não vão afirmar, mas vai perguntar você acha que pode ter relação esse medo de ser testado com o conteúdo do sonho e a sua história de vida om seu pai? Paciente responde sim, acredito que possa ter relação. Nesse momento o paciente começará a pensar sobre isso e passara tempos pensando. Talvez nas próximas sessões ele fale sobre essa associação que ele fez e o analista pode fazer algumas intervenções do tipo: qual a lógica de sentir 160 medo de realizar uma prova? O professor não é seu pai e não irá te bater, o instrutor não é seu pai. Qual o sentido de continuar tendo medo? Após isso, não espere que o sintoma desapareça de uma hora para outro, mas sempre que esse paciente sentir medo, ele começara a elaborar sobre isso e com o tempo essas elaborações ficarão cada vez mais fortes gerando efeito terapêutico. Sobre o quarto ponto, o mecanismo de defesa aqui apresentado é o recalcamento, pois um conteúdo que o gerou mal-estar aparece no sonho de forma livre e aparece de forma filtrada em forma de conteúdo manifesto. Um processo de repetição. Note que em momento algum eu disse para o paciente: seu sonho significa isso ou aquilo. Essa não é o objetivo da interpretação dos sonhos e nem mesmo encontrar o que Freud chamou de umbigo dos sonhos, pois mesmo que você associe por anos um único conteúdo, essa prática tendera ao infinito, pois trata-se do real aquilo que é indizível em essência e só é contemplado em suas derivações falhas da linguagem. 161 Observem que o sonho teve material condensado e deslocado. O home dos sonhos representa o pai, o instrutor e o professor. (condensação). O sentimento de medo em relação ao pai foi deslocado para o instrutor e professor. Análise práticas de sonhos Faremos uma análise prática do sonho de uma de minhas pacientes respeitando sua privacidade sempre baseado na ética. O sonho Sonhei na noite passa com incêndio no antigo bairro onde morava, o incêndio queimava o bairro todo e eu me lembro que eu estava preocupado se minha família estava queimando juntos. O incêndio era causado por fogos de artificio e o sentimento era de desespero. Ela me cedeu essa oportunidade de interpretar junto a ela me dando a autorização de utilizar para fins didáticos em meu livro. 162 1 1-Selecionar partes importantes do sonho baseado no histórico de análise do paciente. *incêndio *bairro *queimar *preocupado *minha *família *fogos de artificio *desespero 2 Associar cada elemento dos sonhos com o paciente no sentido de compreender a repetição que estrutura os sonhos. *incêndio fogo, quente, perigo *bairro lembranças difíceis de um passado difícil, medo, angustia *queimar dor, anseio, desespero *preocupada ansiedade, solidão, controle *minha posse, domínio, controle *família união, orgulho *fogos de artificio diversão perigosa. *Desespero medo, angustia, preocupação 163 3 Contextualizar os elementos do sonho com conteúdos a realidade do paciente. Mostrei ao paciente a lógica sequencial da cadeia significante do seu sonho. Incêndio=perigo Bairro= angustia Queimar=desespero preocupação=controle minha=posse família=orgulho fogos de artificio=perigosa desespero=angustia contextualizando com as outras sessões. • Lembrei o paciente que ele já avia me relatado essa angustia, desespero em outras ocasiões, principalmente aqueles em que ela não tinha nenhum controle. 164 • paciente relatava que a família nunca acreditava nele em relação a sua capacidade. • paciente sempre relata sentimento de posse ou dependência emocional em seus relacionamentos. • O paciente relatou que o pai era exigente e uma coisa ínfima que não estivesse correta era o suficiente para ele bater no filho. • Sempre que a esposa faz algo diferente o paciente sente uma enorme ansiedade como se fosse perde- la. Observe como a cadeia significante se associa: controle (tudo precisa está certo nos mínimos detalhes) orgulho (relacionado a família que era exigente) ansiedade, angustia, medo (se algo der errado terá consequências) Mostrei essa organização a ele e perguntei o que sua esposa representa para você? Ele responde: é tudo em minha vida. E o que é tudo para você? Ele responde: tudo é a perfeição, é não faltar nada. Observem como os significantes se associam: toda aquela angustia causada pelo medo de errar provavelmente está 165 relacionada com sua esposa. O sentimento de posse se dá porque a esposa é um significante que representa o orgulho da família e perde-la pode ser o castigo físico. A esposa é o conteúdo condensado que aparece de forma manifesta que esconde o conteúdo latente, incluindo nessa lógica a função materna que pode também ser representado pela esposa. 4 Compreender os mecanismos de defesa que o paciente apresenta ao falar sobre o sonho. O mecanismo de defesa que aparece é a sublimação, ele sublima os conteúdos latentes com os conteúdos manifestos. Olha como o significante bairro aparece muito condensado na associação. bairro lembranças difíceis de um passado difícil, medo, angustia. São muitos elementos manifestos que representam um único conteúdo latente. 166 Conclusão: paciente conclui que seu sonho é a representação do medo, da ansiedade, da angustia de fracassar na vida assim como ele acreditava fracassar perante seu pai agressivo. Eu disse a ele que seu pai já estava morto e que não podia lhe fazer nenhum mal. Essa minha fala parece algo obvio, evidente, porem ao escutar isso, o paciente ficou calado e eu encerrei a sessão. Algumas sessões a frente ele me diz: por que vou ficar sofrendo por algo que não existe mais? Eu lhe devolvo a pergunta: por que sofrer por algo que não existe mais? Ele ficou em silencio. O sonho dele era uma repetição de momentos difíceis em sua vida. Essa obsessão pela esposa lhe causava muito medo e angustia tendo que conviver sempre com o medo de perde-la. 167 168 169