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1 BOVINOCULTURA DE CORTE E LEITE AULA 1 Prof.ª Amanda Louise Bruzamolin Oliveira 2 CONVERSA INICIAL A bovinocultura é uma atividade econômica de grande importância no mundo inteiro, e no Brasil não é diferente. A produção de carne e leite é um segmento que contribui significativamente para a economia nacional e mundial, além de ser fundamental para a segurança alimentar das populações. Ao longo de nossos estudos, vamos trabalhar todas as faces da bovinocultura, desde sua função socioeconômica até questões de manejo, fisiologia reprodutiva, melhoramento genético, bem-estar, característica zootécnicas, formas de criação, entre outros. Nesta etapa, discutiremos a bovinocultura em suas diversas perspectivas, sua importância socioeconômica, vantagens e desafios enfrentados pelo setor no Brasil, apresentação das principais raças de gado de corte e de leite, incluindo suas características morfológicas e produtivas. TEMA 1 – BOVINOCULTURA A bovinocultura é a criação de bovinos, e quando pensamos nesse tipo de criação, as duas primeiras coisas que vêm a nossa mente são a produção de carne e de leite. No entanto, além desses dois produtos e de seus derivados, por exemplo, iogurte, manteiga e queijo (derivados do leite), temos também outros produtos muito importantes que são obtidos desse animal (Figura 1): • Couro – obtido da pele dos bovinos, utilizado para fabricar diversos tipos de produtos, como sapatos, cintos, bolsas, estofados, entre outros; • lã – obtida do pelo dos bovinos, utilizada para fabricar diversos tipos de tecidos, como casacos, edredons, meias, entre outros; • Fígado – utilizado na produção de medicamentos e suplementos alimentares; • osso – utilizado para fabricar farinha de osso, que é usada na alimentação animal e na produção de fertilizantes; • gordura – usada para produzir sabão, velas, óleos lubrificantes e outros produtos. 3 Figura 1 – Produtos originários da bovinocultura Crédito: Daniela Barreto/Shutterstock. Como podemos observar, a bovinocultura nos fornece inúmeras possibilidades e, para compreendê-la, precisamos nos aprofundar no protagonista dessa criação, os bovinos. Os bovinos são mamíferos ruminantes de grande porte que pertencem à família dos Bovídeos. De acordo com Chaves et al. (2017, p. 295): A família Bovidae (bovídeos), é constituída pelos mamíferos ruminantes, a qual pertencem: animais domésticos como as ovelhas, as cabras e os bois; e selvagens como os antílopes e bisontes. Na subfamília Bovinae estão os bois, os búfalos e os antílopes de chifres espirais. Na tribo Bovineo gênero Bos divide as espécies bovinas mais exploradas pelo ser humano, em: Bostaurus, denominados bovinos taurinos, e Bosindicus, denominados bovinos zebuínos. Existem diversas raças de bovinos, que podem ser diferenciadas entre raças mais adequadas à produção de carne, bem como raças mais adequadas à produção de leite. A seguir, apresentamos uma lista de algumas das principais raças de bovinos. • Holandês: é uma das raças leiteiras mais populares no mundo, conhecida por sua alta produção de leite. • Jersey: é uma das raças leiteiras mais antigas, conhecida por sua produção de leite rico em gordura e proteína. • Guzerá: também é uma das raças leiteiras mais antigas do mundo, famosa por sua alta produção de leite e adaptabilidade a diferentes condições climáticas. • Girolando: raça híbrida, resultado da mistura de raças leiteiras e de corte, conhecida por alta produção de leite e carne de boa qualidade. • Nelore: raça brasileira, é uma das raças de corte mais populares do mundo, famosa pela rusticidade, resistência e adaptabilidade a diferentes condições climáticas (Figura 2). https://www.shutterstock.com/g/Daniela+Barreto 4 Figura 2 – Rebanho de gado Nelore Crédito: Alf Ribeiro/Shutterstock. • Angus: também é uma das raças de corte mais populares no mundo, conhecida por sua carne de boa qualidade e marmoreio. • Charolês: raça de corte, conhecida por sua carne de boa qualidade, marmoreio e tamanho dos animais. • Hereford: raça de corte conhecida por sua rusticidade, adaptabilidade e carne de boa qualidade. Além dessas, existem diversas outras raças espalhadas pelo mundo, cada uma com suas próprias características e utilidades principais. A exploração de bovinos acompanha a humanidade desde a remota Antiguidade, principalmente para a obtenção de alimentos para o ser humano, como o leite e a carne. Como passar dos anos, juntamente com o aumento da população mundial, houve um grande aumento, principalmente na demanda por carne, sendo necessário a intensificação da produtividade dos animais. (Chaves et al., 2017, p. 294) A bovinocultura se divide em: bovinocultura de corte, que é a criação de animais para abate e produção de carne e derivados (couro, ossos, gordura); e bovinocultura de leite, que é a criação de animais para produção de leite. De acordo com Chaves et al. (2017), foi em meados do século XVIII, com a Revolução Industrial, que as raças bovinas começaram a ser selecionadas 5 pelos seres humanos de maneira empírica, na intenção de subdividir os animais para especificar suas finalidades, com vistas a gerar animais com maior eficiência de produção. A escolha da raça e da finalidade da criação dependerá do objetivo do criador, seja para produção de carne, leite ou ambos. Além disso, é importante considerar a adaptação dos animais ao clima e ao solo do local em que a criação será realizada. A bovinocultura é uma das principais atividades agropecuárias do mundo, sendo responsável tanto pela produção de carne quanto pela produção de leite em escala global. Além de ser fonte importante de proteína e de outros nutrientes para a dieta humana, é também responsável pela geração e manutenção de empregos e renda em diversas comunidades rurais. Como atividade econômica, a bovinocultura é de grande importância para muitos países, principalmente para aqueles, como o Brasil, que têm grandes extensões de pastagens. Essa atividade pode ser desenvolvida de diversas formas, desde a criação de animais em pequenas propriedades familiares até grandes fazendas comerciais. A bovinocultura gera empregos em diferentes etapas da cadeia produtiva: da produção até o abate, beneficiamento e comercialização dos produtos (Figura 3). Ela é uma importante fonte de renda para as comunidades rurais, especialmente em países em desenvolvimento, nos quais a agricultura pode ser limitada pela falta de recursos e infraestrutura. 6 Figura 3 – Bovinocultura responsável pela geração de empregos Crédito: BearFotos/Shutterstock. Além de ser fonte de alimento e renda, a bovinocultura contribui com a conservação dos recursos naturais, como pastagens e florestas, e é também importante para a economia local, por conta da criação de empregos e da geração de renda para as comunidades rurais. TEMA 2 – IMPORTÂNCIA SOCIOECONÔMICA DA BOVINOCULTURA NO BRASIL E NO MUNDO A bovinocultura é uma atividade econômica de grande importância tanto no Brasil quanto no mundo. Ela é responsável por fornecer carne e leite de boa qualidade, além de ser importante fonte de renda para muitas famílias rurais. No Brasil, a bovinocultura é uma das principais atividades agropecuárias, contribuindo significativamente para a economia do país e para a segurança alimentar da população. No mundo, a bovinocultura também é importante, sendo uma das principais fontes de proteína e outros nutrientes na dieta humana, além de ser responsável por empregos e renda em muitas comunidades rurais. A importância socioeconômica da bovinocultura está relacionada à sua capacidade de gerar empregos, renda e alimentos de qualidade para a população. https://www.shutterstock.com/g/jackf 7 A bovinocultura brasileira nos posiciona entreos mais importantes produtores de bovinos mundiais, resultado de muitos anos de investimentos em tecnologia e pesquisas que ano a ano vêm gerando tanto crescimento quantitativo quanto qualitativo do rebanho nacional. Para compreender a complexidade e dimensão da bovinocultura no Brasil, vamos começar analisando alguns dados relacionados ao agronegócio da pecuária de corte. Segundo a Associação Brasileira das Indústrias Exportadoras de Carne (Abiec, 2022), o rebanho bovino brasileiro apresenta uma tendência de crescimento ano a ano. Em 2001, o rebanho brasileiro era de 167,534 milhões de cabeças; em 2011, era de 181,507 milhões de cabeças e, já em 2021: […] o rebanho brasileiro ficou estimado em 196,47 milhões de cabeças, com um abate de 39,14 milhões de cabeças. O volume de carne produzida foi de 9,71 milhões de toneladas carcaça equivalente (TEC). Desse total, 25,51% ou 2,48 milhões TEC foram exportadas, enquanto 7,24 milhões TEC, o equivalente a 74,49%, ficaram no mercado interno (Abiec, 2022, p. 19) Dos 2,48 milhões de toneladas carcaça equivalente (TEC) que foram exportados, 81,7% foram in natura para 124 países, 11,2% foram exportado industrializado para 115 países, e os outros 6,5% foram exportados em miúdos/outros para 106 países. Com relação ao consumo de mercado interno, o consumo brasileiro de carne per capita em 2021 foi de 34,3 kg/ano (Abiec, 2022). Com relação à participação do rebanho por estado no total do Brasil o estado com maior participação no rebanho é o Mato Grosso, que representa 14,15%, seguido de Minas Gerais, com 11,33%, e Mato Grosso do Sul, com 11,21% (Abiec, 2022). Sobre o movimento financeiro relativo ao agronegócio da pecuária de corte, o relatório da Abiec (2022) aponta que: O movimento do agronegócio da pecuária de corte em 2021 foi de R$ 913,14 bilhões. Esse volume inclui todos os negócios e movimentações relacionados à cadeia, incluindo desde valores dos insumos utilizados na pecuária, passando por investimentos em genética, sanidade animal, nutrição, exportações e vendas no mercado interno (Abiec, 2022, p. 1) Dos R$ 913,14 bilhões que movimentaram o agronegócio da pecuária de corte em 2021, R$ 127,08 bilhões foram apenas em insumos e serviços para produção pecuária, que inclui desde nutrição, sanidade animal, protocolos reprodutivos até os combustíveis, lubrificantes e energia elétrica, entre diversos 8 outros setores. Ainda sobre os R$ 913,14 bilhões, destes, R$ 243,18 bilhões foi o faturamento total na pecuária; R$ 57,51 bilhões foram em insumos e serviços da indústria (por exemplo, embalagens, energia elétrica, fretes, funcionários); R$ 220,12 bilhões foi o faturamento dos frigoríficos; R$ 21,7 bilhões em insumos e serviços do varejo; e R$ 241,73 bilhões em receitas do varejo total. Analisando esse cenário, é possível compreender o enorme movimento financeiro gerado pelo agronegócio da pecuária de corte em nosso país. Com isso, podemos compreender também quantos empregos são gerados e mantidos apenas na cadeia produtiva da carne bovina. Para compreender melhor, vamos analisar a Figura 4 a seguir, que apresenta em detalhes as principais etapas dessa cadeia produtiva na propriedade rural e na agroindústria até chegar ao consumidor. Figura 4 – Principais etapas da cadeia produtiva da carne bovina Fonte: Embrapa, 2023. Com relação à participação da cadeia produtiva da carne bovina no Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro, a Embrapa gado de corte destaca que “em 2020 o PIB do Brasil foi de R$ 7,4 trilhões, uma queda de 4,1% em relação ao ano anterior. Apesar dessa queda, o PIB da Pecuária no mesmo período aumentou sua representatividade no PIB total, passando de 8,4% para 10%, evidenciando a força do setor na economia brasileira” (Malafaia et al., 2021, p. 7). 9 Sabemos que o agronegócio compõe importante parcela do PIB brasileiro, e que a pecuária bovina representa em torno de 33% do PIB gerado pelo agronegócio (Abiec, 2018), o que reflete as articulações entre os vários elos da cadeia produtiva, que, como vimos, não geram renda apenas por meio da empregabilidade no setor, mas também por meio do desenvolvimento e consumo de insumos e da comercialização dos produtos finais (Abiec, 2018). Os números registrados nos últimos anos não deixam dúvidas e demonstram a importância que o setor proporciona para o Brasil, um dos principais atores na produção e comercialização mundial de carne. O país possui o maior rebanho comercial do mundo, com mais de 244 milhões de cabeças. Produz 16,57% das 60.572 milhões de toneladas equivalente carcaça produzidas no mundo, o que o faz o segundo maior produtor de carne, superado apenas pelos Estados Unidos. É detentor de 30,3% do comércio mundial, gerando receita anual que ultrapassa US$ 7,4 bilhões em vendas e ainda destina aproximadamente 74% de sua produção para abastecer o mercado interno. (Abiec, 2020 citado por Malafaia, 2021, p. 7) Leitura complementar Sobre a produção da carne bovina, sugerimos a leitura do Boletim CiCarne: Projeções para o mercado mundial de carne bovina 2020-2029, elaborado pelos pesquisadores da Embrapa. Disponível em: <https://www. cicarne.com.br/wp-content/uploads/2020/07/Boletim-CiCarne-15.pdf>. Acesso em: 23 fev. 2023. Com relação à cadeia produtiva do leite, de acordo com Rocha, Carvalho e Resende (2020), é uma das principais atividades econômicas brasileiras, tendo forte efeito tanto na geração de emprego quanto de renda. A produção de leite está presente em quase todos os municípios brasileiros, o que envolve mais de um milhão de produtores no campo e gera outros milhões de empregos nos demais segmentos da cadeia. Conforme Rocha, Carvalho e Resende (2020, p. 2): Em 2019, o valor bruto da produção primária de leite atingiu quase R$ 35 bilhões, o sétimo maior dentre os produtos agropecuários nacionais (Brasil, 2020). Já na indústria de alimentos, esse valor mais do que duplica, com o faturamento líquido dos laticínios atingindo R$ 70,9 bilhões, atrás apenas dos setores de derivados de carne e beneficiados de café, chá e cereais. (Abia, 20201) 1 ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DAS INDÚSTRIAS DE ALIMENTAÇÃO – ABIA. Faturamento 2019. Disponível em: <https://www.abia.org.br/vsn/anexos/faturamento2019.pdf>. Acesso em: 15 jun. 2020. 10 Figura 5 – Produtor rural ordenham vaca no campo Crédito: Kitreel/Shutterstock. Segundo dados anuais do Censo Agropecuário do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE, 2023), o Brasil tem uma produção de leite em grande escala, com mais de 11 milhões de vacas ordenhadas e produção anual superior a 25 bilhões de litros. Isso gera ativos significativos na economia, o que inclui a compra de insumos, investimentos em genética, saúde animal, nutrição e pesquisas, bem como vendas de leite no mercado interno e produção de derivados lácteos. Esses números, bastante expressivos, nos confirmam a relevância de um setor que ao longo das duas últimas décadas vem passando por grandes transformações. “Nesse período, a produção de leite aumentou quase 80% utilizando praticamente o mesmo número de vacas ordenhadas, graças à elevação da produtividade do rebanho” (Rocha; Carvalho; Resende, 2020, p. 2). Nos últimos vinte anos, o setor de bovinocultura leiteira passou por significativas transformações na sua estrutura de produção, o que inclui uma redução no número de produtores e uma intensificação dos sistemas de produção. A adoção de novas tecnologias possibilitou um aumento considerável da produtividade dos animais, da terra e da mão de obra, o que resultou em uma maior escala de produção nas fazendas. Como resultado, o Brasil tornou-se o terceiro maior produtor de leite do mundo, porém, ainda existe um grande potencial a ser explorado, principalmente no que diz respeito a ganhos de https://www.shutterstock.com/g/Futurframes 11 produtividade,com o objetivo de se tornar um dos principais players no mercado global de leite e derivados (Rocha; Carvalho; Resende, 2020). Figura 6 – Sistema de ordenha automática/robótica para laticínios Crédito: Mark Brandon/Shutterstock. Ao analisarmos tais dados, podemos concluir que tanto a pecuária de corte quanto a de leite estão em constante evolução, assim como a coesão entre elas é a maior responsável pelo fortalecimento da cadeia produtiva e pela geração de renda de nosso país. TEMA 3 – BOVINOCULTURA NO BRASIL: INÍCIO, EVOLUÇÃO E CADEIA PRODUTIVA De acordo com estudos, os bovinos domésticos foram introduzidos no Brasil pelos colonizadores portugueses no século XVI, o que iniciou, assim, a criação de bovinos no Nordeste, principalmente nas regiões mais interioranas da Bahia e Pernambuco. Os animais eram utilizados principalmente para a tração nas culturas de cana-de-açúcar, além de fornecer carne, leite e couro (Lemos, 2013). Com o tempo, houve uma redução da produção de cana e um aumento da extração de minerais, o que diminuiu a necessidade de bovinos para tração no Nordeste. Como resultado, no final do século XVII e início do século XVIII, o estado de Minas Gerais se tornou um importante centro de criação de bovinos em vista de suas condições climáticas e de solo favoráveis. Com o passar do 12 tempo, a criação de bovinos expandiu-se para outras regiões do país, como Goiás e Mato Grosso, em que a pecuária ainda é forte e consolidada até hoje. Apesar disso, de acordo com Schlesinger (2010), a pecuária de corte no Nordeste ascendeu significativamente até o fim do século XVIII. Já nos estados do sul do país, segundo Lemos (2013), a criação de bovinos foi introduzida apenas no século XVII, pelas missões jesuíticas. Na época, a produção bovina não contava com muita tecnologia, mas foi favorecida pelas condições climáticas, do solo e vegetação da região. Até o século XX, conforme Schlesinger (2010) e Lemos (2013), a criação de bovinos no Brasil não contava com investimentos em tecnologia e infraestrutura. Isso mudou a partir da década de 1930, com o avanço tecnológico em áreas como forragicultura, nutrição e genética. A conjunção do crescimento do café impulsionou o desenvolvimento da pecuária no país. A partir da década de 1960, a indústria de abate e processamento de carne no Brasil se consolidou e as exportações de carne de bovino também começaram. Toda essa história do início e evolução da bovinocultura no Brasil é relativamente recente, bem como consegue nos mostrar de forma clara como a modernização da pecuária de corte no Brasil tem sido revolucionária, apesar de, ao longo da cadeia de produção, ainda encontrarmos algumas discrepâncias, por exemplo: apesar de existirem pecuaristas de altíssima produtividade, existem também pecuaristas de baixa produtividade espalhados em todo o território brasileiro; com relação aos abatedouros e leiterias, de um lado existem os extremamente tecnológicos, mas, de outro, muitos que não cumprem nem os requisitos mínimos exigidos pela legislação para a produção de carne e leite. A fim de entendermos melhor a sistematização dos setores da cadeia produtiva da pecuária de corte, devemos compreender os cinco subsistemas que a compõem, bem como suas características, que, de acordo com Batalha e Buainain (2007), são: • apoio – encarregado de fornecer os insumos e o transporte necessários à produção, incluindo fabricantes de alimentos e medicamentos para animais, maquinários e equipamentos, combustíveis, lubrificantes e energia elétrica, fertilizantes, inseticidas, entre outros insumos utilizados na produção animal; • produção de matéria-prima – inclui a produção animal propriamente dita, independentemente do tipo de propriedade e do ciclo realizado, como as 13 fases de cria, recria ou engorda, isoladamente ou ciclo completo, quando se realiza cria, recria e engorda dos bovinos; • industrialização – é o processo de abate dos animais para obtenção de carne in natura e também as indústrias de transformação da carne em diferentes tipos de produtos, como produtos cárneos bovinos desossados, com osso ou industrializados; • comercialização – refere-se às empresas e estabelecimentos que realizam a comercialização, seja por meio de atacadistas, exportadores, varejistas e também empresas de alimentação coletiva como hospitais, escolas, restaurantes, hotéis, entre outros; • consumo – inclui o consumidor final, o setor responsável pela demanda e exigências de todos os setores mencionados anteriormente. Figura 7 – Representação esquemática da setorização da cadeia produtiva da carne Crédito: Inspiring/Shutterstock. Já para compreendermos a cadeia produtiva do leite, podemos extrapolar os sistemas da cadeia produtiva da carne, pois, de acordo com Brum, Kelm e Albornoz (2014), existem grandes similaridades, tanto nas estruturas econômicas quanto nas estruturas tecnológicas das fases de produção, https://www.shutterstock.com/g/Inspiring 14 industrialização, comercialização e consumo de leite e de seus produtos derivados (Figura 8). Figura 8 – Representação esquemática da setorização da cadeia produtiva do leite Crédito: Paul Lesser/Shutterstock. Ambos os sistemas, tanto de corte quanto de leite, constantemente estão evoluindo, e a união entre eles é a maior responsável pelo fortalecimento da cadeia produtiva e também pela geração de renda no país. Com relação ao cenário nacional, sabemos que o agronegócio no Brasil está constantemente em expansão, principalmente os setores de produção de carne e soja, que são fortes geradoras de emprego. De acordo com Cabral et al. (2011), entre os fatores que colaboram com a expansão da bovinocultura nacional, destacam-se: boas condições climáticas em diversas regiões do país; disponibilidade de áreas e de alimentos a baixo custo; e produção animal a pasto. https://www.shutterstock.com/g/paulmalyugin 15 Outro fator importante a ser considerado, segundo Cabral et al. (2011), é que o Brasil é um dos países-membros da Organização Internacional de Epizootias (OIE), o que apresenta risco negligenciável para a encefalopatia espongiforme bovina, bem como é reconhecido como país livre de febre aftosa, com vacinação desde 2018. Porém, para que possamos continuar crescendo e fortalecendo a pecuária nacional, precisamos ainda enfrentar alguns desafios, como baixos índices zootécnicos, degradação de pastagens, desmatamento, falta de organização na cadeia produtiva e a qualidade da carne ainda ser dubitável por alguns países (Cabral et al., 2011). Ao avaliar tais características da pecuária no país, é possível refletir sobre ações para melhorar tanto a qualidade quanto a quantidade de nossa produção animal. Isso pode ser alcançado por meio da compreensão das vantagens que são consideradas como pontos fortes da bovinocultura de corte para a economia nacional, bem como das desvantagens, que representam desafios a serem superados pelo sistema produtivo de bovinos no Brasil. Figura 9 – Rebanho de gado Angus em pasto Crédito: Gestalt Imagery/Shutterstock. 16 Figura 10 – Rebanho de gado Angus em confinamento Crédito: Andrea Cirillo Lopes/Shutterstock. Quanto à concentração de bovinos no Brasil, a distribuição média, como já vimos, é maior no Mato Grosso, que representa 14,15%, seguido de Minas Gerais, com 11,33%, e Mato Grosso do Sul, com 11,21%. É importante ressaltar, que, segundo dados da Athenagro/IBGE (citado por Abiec, 2022, p. 42), apenas 17,19% dos animais abatidos no país são oriundos de criação em confinamento; a maior parte desse rebanho é criado a pasto. Em média, os bovinos ocupam 163,1 milhões de hectares de pasto, sendo a taxa de ocupação de 1,2 cabeças/hectare e lotação de 0,9 UA/ha (Abiec, 2022). Com relação a pecuária de leite, também encontramos heterogeneidadenos sistemas produtivos, sendo possível encontrar grandes discrepância entre estabelecimentos de alta tecnificação e outras propriedades as quais exercem basicamente a atividade de extrativismo para subsistência. Uma confirmação de tal heterogeneidade é o fato de que a maior parte da captação de leite atual ocorre nos grandes laticínios brasileiros, os quais são responsáveis por aproximadamente 80% do volume de leite cru captado anualmente (IBGE, 2023). 17 TEMA 4 – GADO DE CORTE: PRINCIPAIS RAÇAS, MORFOLOGIA E CARACTERÍSTICAS PRODUTIVAS A exploração de bovinos pelo ser humano remonta à Antiguidade, principalmente para obtenção de alimentos como leite e carne. Com o aumento da população mundial, houve também um grande aumento na demanda por carne, o que exigiu uma intensificação da produtividade dos animais. Ao analisar a taxonomia dos bovinos, as espécies Bos taurus e Bos indicus são as principais exploradas para essa finalidade. Em razão das diferenças morfológicas e fisiológicas entre as espécies, é possível observar variações na produção e na qualidade dos produtos (Chaves et al., 2017). Raças específicas para produção de carne são denominadas as raças de corte, e identificá-las é muito essencial em um planejamento, uma vez que, trata-se de um importante fator que pode influenciar na qualidade da carne, sendo possível observar alterações nas suas características, como maciez e suculência, além de diferenças no rendimento de carcaça, no grau e local de deposição de gordura, e na precocidade, que pode ser definida como a velocidade que o animal atinge a puberdade, ou seja, momento em que o crescimento ósseo é cessado, a taxa de crescimento muscular sofre uma queda e há uma intensificação do enchimento dos adipócitos, ocasionando a deposição de gordura na carcaça; entre outras. (Chaves et al., 2017, p. 296) Para melhorarmos nossa compreensão com relação às diferenças entre as espécies taurus e indicus, precisamos entender que a espécie Bos taurus, que comumente chamamos de “espécies taurinas”, compreende as raças europeias, por exemplo, as raças Holandesa, a Pardo-Suíço e a Jersey. Já a espécie Bos taurus indicus compreende as raças zebuínas, por exemplo, o gado Gir, a Guzerá e Sindi. Além dessa divisão, podemos também agrupar as raças por origem, dividindo-as em taurinas continentais, taurinas britânicas, zebuínas e crioulas, além das raças sintéticas que resultam do cruzamento entre taurinos e zebuínos. A seguir, conheceremos as características principais das raças que compõem cada um desses grupos. 4.1 Raças taurinas britânicas Aberdeen Angus, Red Angus, Red Poll, Hereford, Devon e Shorthorn são algumas das principais raças taurinas britânicas, que são raças originárias da Inglaterra e da Escócia. Vamos analisar rapidamente cada uma delas. 18 A raça Aberdeen Angus é originária da Escócia, mais especificamente, do condado de Aberdeen (daí o nome) e está presente em todo o mundo. Os animais são mochos (sem chifre), de porte grande, apresentam pelagem preta e são conhecidos por sua precocidade sexual, habilidade materna, rapidez de engorda e alto rendimento de carcaça, sendo, por isso, uma raça muito utilizada para cruzamentos. As fêmeas podem chegar a pesar entre 600 kg a 700 kg, e os machos entre 800 kg a 900 kg. Os bezerros nascem com peso médio entre 26 kg (fêmea) e 28 kg (macho), sendo considerados pequenos comparados com outras raças britânicas, mas crescem rapidamente e são abatidos com peso entre 420 e 450 kg (Associação Brasileira de Angus, 2023). Além disso, essa raça é famosa pela qualidade marmorizada da carne, o que confere sabor, maciez e suculência. Quanto à morfologia geral, os animais dessa raça (Figura11) apresentam: cabeça de tamanho médio, pouco alongada, com perfil de côncavo a reto; olhos grandes e separados; orelhas médias; pescoço médio musculoso; corpo comprido, de profundidade média, com dorso e lombo amplos e compridos, quartos muito amplos, pernas amplas, grossas e cheias; pele fina à média, com pelos finos, curtos e densos (Tilburg, 2023). Figura 11 – Exemplar da raça Aberdeen Angus Crédito: Dick Kenny/Shutterstock. 19 Os animais da raça Red Angus são a variedade vermelha de Aberdeen Angus, por isso apresentam as mesmas características zootécnicas supracitadas, porém, com o diferencial da pelagem avermelhada (Figura 12). Figura 12– Exemplar da raça Red Angus Crédito: EcoPrint/Shutterstock. A raça Red Poll, por sua vez, é resultado do cruzamento da raça Norfolk, cuja característica é voltada a produção de carne, com a raça Suffolk Dun, que tem aptidão leiteira; ambas são originárias da Inglaterra. Trata-se de animais de boa rusticidade, prolificidade e, por conta do cruzamento, com dupla aptidão (carne/leite). As fêmeas pesam em média 525 kg, e os touros 750 kg. A pelagem deles é vermelha uniforme, sendo que alguns exemplares apresentam extremidades brancas, possíveis no padrão racial. São naturalmente mochos (sem chifres) e se adaptam bem a sistemas de manejo com baixo investimento, pois são eficientes na conversão de forragem, requerendo pouco ou nenhum alimento adicional. Seus exemplares são dóceis e apresentam excelente habilidade materna; os touros e novilhos jovens finalizam bem e produzem carne de qualidade excepcional (Figura 13). Com relação à morfologia, as vacas dessa raça devem ter cabeça e pescoço finos, suas costas devem ser niveladas, com a cauda longa e fina e posicionada em nível com ela, seu lombo deve ser largo, bem como suas ancas https://www.shutterstock.com/g/ecoprint 20 arredondadas e não muito proeminentes, seu corpo deve ser profundo, com as costelas bem arqueadas. Já os touros são muito parecidos com as vacas, exceto pela formação da cabeça e pescoço, que devem ser fortes e bastante masculinos (Red Poll Cattle Society, 2023). Figura 13 – Exemplar da raça Red Poll Crédito: Maximillian cabinet/Shutterstock. A raça Hereford (Figura 14), originária da Inglaterra, é caracterizada por pelos vermelhos, mas com a fronte, a cara, o ventre, a vassoura da cauda e as partes inferiores das patas na cor branca. Suas principais características produtivas são a excelente produção de carne, com boa eficiência alimentar, alto rendimento de carcaça, capacidade de adaptação, docilidade, longevidade e alta fertilidade. As fêmeas pesam em média 540 kg; já os machos atingem 850 kg. Os animais podem ser abatidos aos 450 kg entre 18 e 24 meses de vida (Associação Brasileira de Hereford e Bradford, 2023). Quanto à morfologia, apresentam cabeça com chanfro de comprimento médio, plano a côncavo, com orelhas médias, providas de pelos internos, chifres 21 simétricos curvados para a frente e para baixo, corpo largo, profundo, alongado e cilíndrico (Tilburg, 2023). Figura 14 – Exemplar da raça Hereford Crédito: visuall2/Shutterstock. Os animais da raça Devon (Figura 15), também originários da Inglaterra, são animais de aptidão tripla: carne, leite e trabalho de tração, mas atualmente são essencialmente produtores de carne. É um gado rústico, forte e manso, muito apto à engorda, com um alto rendimento de carcaça (até 70%). Sua carne é excelente, apresentando bastante marmoreio. As fêmeas adultas pesam em média 500 kg e os machos vão de 600 kg a 800 kg. São animais de pelagem avermelhada e chifres cor de cera com pontos escuros (Tilburg, 2023). 22 Figura 15 – Exemplares da raça Devon Crédito: Dick Kenny/Shutterstock. A raça inglesa Shorthorn (Figura 16), por sua vez, é um gado essencialmente de corte, que apresenta engorda rápida e precocidade excelente. Porém, a qualidade de sua carne é pouco apreciada por conta da má distribuição de gordura. Por apresentar baixa rusticidade, não teve bom aproveitamento no Brasil, por conta do clima tropical e também por não se adaptar a pastos secundários.Sua pelagem pode ser: vermelha, branca e rosilha, mas alguns criadores incluem também o padrão vermelho e branco. Quando gordos, apresentam rendimento elevado. As vacas atingem peso vivo entre 500 kg e 600 kg, já os machos atingem de 800 kg a 900 kg (Tilburg, 2023). https://www.shutterstock.com/g/Dick+Kenny 23 Figura 16 – Exemplar da raça Shorthorn (bezerro) Crédito: Beatrice Foord-St-Laurent/Shutterstock. 4.2 Raças taurinas continentais Charolês, Marchigiana, Blonde d’Aquitane, Piemontês, Limousin, Belgian Blue, Simental e Pardo-Suíço são algumas das raças taurinas continentais, as quais advêm de países da Europa continental, como Bélgica, França, Itália e Suíça. A raça Charolês (Figura 17) tem origem na França, com características de tripla aptidão (carne, leite e trabalho), mas se destaca na produção de carne, sendo utilizado no Brasil para a formação do gado Canchim. Tem boa adaptabilidade aos diferentes climas e é um excelente ganhador de peso em confinamento, com rendimento de carcaça chegando a 65 e 70%. Na idade adulta, as vacas chegam de 600 a 800 kg, e os machos vão de 800 a 1.100 kg. Produzem carne excelente, com pouca gordura superficial e bom marmoreio. Quanto à morfologia, apresentam pelos curtos, brilhantes e de cor branca ou creme. Cabeça ampla, nuca reta, orelhas em forma de palmatória, olhos grandes, focinho largo e destacado, narinas bem separadas, boca ampla. Seu pescoço é longilíneo e musculoso, seus chifres são medianos, curvados para a frente e de cor branca ou marfim, sendo que na variedade mocha pode 24 apresentar rudimentos soltos. Seu corpo é amplo e cilíndrico, com lombo reto, largo e musculoso (Tilburg, 2023). Figura 17 – Exemplar da raça Charolês Crédito: Liga Gabrane/Shutterstock. A raça Blonde d’Aquitaine (Figura 18) é uma jovem raça francesa, que se estabeleceu apenas em 1962. Ela se origina de uma região de terrenos pedregosos e de pastagens muito pobres, o que lhe confere boa rusticidade. Os exemplares dessa raça suportam frio e calor intenso. Além da rusticidade, eles também apresentam habilidade materna, elevada fertilidade, docilidade e boa precocidade. As vacas adultas pesam entre 650 e 900 kg, e os touros pesam entre 1.000 e 1.500 kg. Sua pelagem é cor de trigo, podendo variar de claro a escuro, apresentando auréolas mais claras ao redor dos olhos. Apresentam boa conversão alimentar, com elevado rendimento de carcaça (Tilburg, 2023). https://www.shutterstock.com/g/liga 25 Figura 18 – Exemplar da raça Blonde d’Aquitaine Crédito: g.ozenne/Shutterstock. A raça Piemontês (Figura 19) é originária da Itália (região de Piemonte), sendo de dupla aptidão (carne e leite). Porém, ela se destaca na produção de carne, pois tem o melhor rendimento de carcaça e melhor porcentagem de cortes de todas as raças. Sua carne é muito magra, não apresentando marmoreio, mas a diferente composição das fibras garante uma grande maciez. A principal característica da raça é o seu rendimento de carcaça e de desossa, uma vez que é o melhor exemplo da característica de dupla musculatura, com ossos e pele fina. Em média, seus exemplares pesam de 550 a 600 kg. Seus destaques, além da dupla musculatura, são: precocidade, habilidade materna, boa conversão alimentar. São de porte médio, com excelente comprimento e largura de garupa, pernas curtas, e com o corpo todo coberto por uma abundante massa muscular, com finíssima capa de gordura. Seus pelos são brancos e apresentam marcante presença de pigmentação em torno de olhos, orelhas e focinho (Tilburg, 2023). https://www.shutterstock.com/g/g-ozenne 26 Figura 19 – Exemplar da raça Piemontês Crédito: marineke thissen/Shutterstock. A raça Limousin advém da França, mas já é bastante difundida no mundo. Suas qualidades são: resistência, adaptação a climas rudes e a condições extremas, facilidade de marcha em busca de alimentos e habilidades maternas, além de seu potencial produtivo, com fina qualidade de carne e rendimento de carcaça. Apresenta pelagem cor amarelo-clara e há a presença de regiões mais claras ao redor de olhos, focinho, abdome, períneo e extremidade dos membros. As fêmeas atingem entre 550 e 750kg e os machos entre 950 e 1.200 kg, seu corpo é ligeiramente maior que o dos demais bovinos franceses, pois foi selecionado para dupla aptidão (carne e trabalho) (Associação Brasileira de Criadores – ABC, 2023). 27 Figura 20 – Exemplar da raça Limousin Crédito: hans engbers/Shutterstock. A raça Belgian Blue é um cruzamento desenvolvido na Bélgica com origem no gado Shorthorn e no Charolês. É uma raça rústica que se adapta à diversidade do solo, do relevo, e do clima. Sua aparência reúne uma musculatura fortemente desenvolvida, uma estrutura óssea sólida e linhas harmoniosas. Não são animais grandes. Apresentam linhas arredondadas e músculos proeminentes, principalmente o ombro, o quarto traseiro, o lombo e a anca. Sua pelagem é de coloração branca, azul e às vezes negra. Suas principais características são: desenvolvimento extraordinário de musculatura, dupla musculatura do traseiro, precocidade, excelente índice de conversão alimentar, excelente habilidade materna e docilidade. Uma desvantagem da raça é que as fêmeas tendem a apresentar dificuldade no parto, sendo a cesariana frequentemente necessária (ABC, 2023). 28 Figura 21 – Exemplar da raça Belgian Blue Crédito: Hans Viveen/Shutterstock. As raças Simental e Pardo Suíço apresentam dupla aptidão, podendo ser utilizadas tanto para produção de carne quanto para produção de leite. A raça Simental é conhecida por seu crescimento rápido e desenvolvimento muscular com gordura intramuscular, enquanto a raça Pardo Suíço é reconhecida por sua rusticidade, adaptabilidade, longevidade e precocidade sexual (Associação Brasileira de Criadores de Simental e Simbrasil, 2023; Associação Brasileira de Criadores de Gado Pardo-Suíço, 2023). 4.3 Raças zebuínas Brahman, Gir, Guzerá, Indubrasil, Nelore e Tabapuã são as raças zebuínas mais utilizadas na pecuária brasileira. De maneira geral, são sexualmente e produtivamente mais tardias do que as raças taurinas, mas se destacam por sua maior adaptabilidade e resistência (Leal, 2012). A raça Brahman, originária da Índia, apresenta uma ótima morfologia para produção de carne, com um tórax profundo, costelas bem espaçadas e uma extensão gastrointestinal que garante bom aproveitamento da ingestão dos alimentos. É um gado precoce, com boa habilidade materna, rusticidade e produz uma carne de qualidade, sendo amplamente utilizada em cruzamentos 29 industriais. Sua pelagem pode ser vermelha ou cinza e apresentam orelhas longas. As fêmeas atingem de 450 a 630 kg, e os touros pesam entre 720 e 990 kg (Associação de Criadores de Brahman do Brasil, 2023). Figura 22 – Exemplar da raça Brahman Crédito: mifotodigital.club/Shutterstock. Os animais da raça Gir, apesar de utilizados majoritariamente para produção de leite, apresentam boa produção de carne quando são favorecidos nutricionalmente (ABC, 2023). A raça brasileira originária de Minas Gerais, Indubrasil, por sua vez, é resultado do cruzamento de Gir, Guzerá e Nelore. Ela é uma raça de excelente rendimento de carcaça e boa cobertura muscular. Suas fêmeas adultas chegam a 700 kg, enquanto os touros podem chegar a 1.000 kg (Associação Brasileira dos Criadores de Indubrasil, 2023). A raça Nelore (Figura 23) tem sua origem na Índia, de onde embarcaram os primeiros exemplares enviados ao Brasil. Em sua origem, são utilizados para produção de leite e para o trabalho, pois na Índia o bovino é um animal sagrado. Porém, ao redor do mundo, o gado nelore é conhecido por sua rusticidade e produção de carne. Atualmente, o Nelore brasileiro é considerado patrimônio legitimamente nacional, o qual produz uma carne saudável e natural,que é exportada para mais de 146 países e cada vez mais demandada por https://www.shutterstock.com/g/mifotodigital 30 consumidores esclarecidos do mundo todo (Associação dos Criadores de Nelore do Brasil, 2023). Os animais apresentam temperamento ativo e dócil, a pelagem é branca ou cinza-clara, sendo que os machos apresentam o pescoço e o cupim geralmente mais escuros. A cara é estreita, com focinho preto e largo, narinas dilatadas e bem afastadas e orelhas curtas. Existem exemplares mochos e também exemplares com chifres, que são curtos, cônicos e de cor escura (Associação dos Criadores de Nelore do Brasil, 2023). Algumas das principais características da raça são: excelente capacidade de aproveitar alimentos grosseiros, resistência natural a parasitas, resistência ao calor, elevada longevidade reprodutiva, rusticidade, baixo custo de manutenção, e as vacas apresentam facilidade de parto e excelente habilidade materna (Associação dos Criadores de Nelore do Brasil, 2023). Figura 23 – Exemplar da raça Nelore Crédito: casa.da.photo/Shutterstock. A raça Tabapuã, por sua vez, apresenta características similares ao Nelore e ao Gir, sendo largamente utilizada em cruzamentos por conta da sua precocidade, fertilidade e habilidade materna (ABC, 2023). 31 4.4 Raças crioulas De acordo com a Embrapa (Leal, 2012; Dichoff, 2014), as raças crioulas são originadas de raças taurinas introduzidas no Brasil que se adaptaram às condições tropicais, com boa resistência, embora a produção possa ser menor do que as raças taurinas. Alguns exemplos dessas raças incluem o gado Caracu (Figura 24), que tem um acabamento tardio e rendimento de carcaça baixo, o gado Curraleiro Pé-Duro, proveniente do semiárido brasileiro e de baixo porte, o Pantaneiro, que se destaca pela sua rusticidade e resistência às doenças, e o gado Crioulo Lajeano, que, embora tenha grande porte, apresenta maturidade sexual tardia. Figura 24 – Exemplar da raça Caracu Crédito: Rafael Goes/Shutterstock. 4.5 Raças sintéticas As raças sintéticas, por exemplo, Santa Gertrudis (Figura 25), Brangus, Simbrasil, Bradford, Canchim e Bonsmara, são resultado do cruzamento entre Bos taurus taurus e Bos taurus indicus, ou seja, entre taurinos e zebuínos (Leal, 2012). O foco dos tipos de cruzamentos e seus efeitos serão aprofundados futuramente. 32 Figura 25 – Exemplar da raça Santa Gertrudis Crédito: Celso Margraf/Shutterstock. TEMA 5 – GADO DE LEITE: PRINCIPAIS RAÇAS, MORFOLOGIA E CARACTERÍSTICAS As principais raças com aptidão para a produção de leite são as taurinas (raças europeias da espécie Bos taurus taurus), por exemplo, Holandesa, Pardo- Suíço, Jersey, Ayrshire, Guernsey e Simental. A raça Holandesa (Figura 26), também conhecida como Holstein- Friesian, é europeia (Bos taurus taurus) e especializada na produção de leite. Ela é amplamente utilizada em todo o mundo, sendo conhecida por ser a maior produtora de leite em volume. Muito popular internacionalmente e bastante utilizada no Brasil, especialmente na região sul do país, essa raça tem suas origens nas terras planas e pantanosas do Norte da Holanda e Oeste da Província da Frísia, em que seus ancestrais primitivos foram domesticados há mais de 2.000 anos (Isola, 2021). No Brasil, de acordo com a Associação Brasileira de Criadores de Bovinos da Raça Holandesa – ABCBRH (Isola, 2021), existem dados históricos de que o gado holandês foi trazido nos anos de 1530 a 1535. Por ser uma raça com origem no clima frio, sua exigência quanto ao clima é alta e a adaptação a climas mais https://www.shutterstock.com/g/Celso+Margraf 33 quentes, como o do Brasil, é mais difícil, pois apesar de suportem climas tropicais, seu conforto térmico ótimo é entre 10 e 20° C. Existem duas variedades dessa raça: o gado Holandês Preto e Branco, também chamado de Frísia; e o gado Holandês Vermelho e Branco, conhecido como Mosa, Reno ou Yessel. Essa raça apresenta animais de grande porte, dos quais as fêmeas pesam entre 500 e 700 kg e produzem em torno de 4.000 a 7.000 litros de leite por lactação, cujo teor de gordura é de aproximadamente 3,5 a 4%, com lactação durando em média 300 dias e vida útil de cinco lactações. Essa raça é amplamente utilizada como matriz em cruzamentos, na intenção de transmitir o gene expressivo de alta produção para as novas linhagens. Suas principais características são: docilidade e facilidade de manejo. Quanto à morfologia, apresenta pelagem preta e branca ou vermelha e branca, cabeça mediana, larga e de perfil subcôncavo, com mandíbulas fortes, olhos grandes e escuros e órbitas salientes, orelhas médias e finas, chifres apontados para frente e com as pontas escuras, corpo bastante desenvolvido, comprido e largo, com costelas arqueadas e compridas, dorso reto, largo e forte, garupa curta e ancas largas e cauda curta e bem inserida, úbere simétrico, bem desenvolvido, com irrigação sanguínea abundante e coberto por pele macia. Figura 26 – Exemplares da raça Holandesa Crédito: Ingrid Pakats/Shutterstock. 34 Outra raça de aptidão leiteira muito difundida no Brasil é a Jersey, originária da Inglaterra, mais especificamente da Ilha de Jersey. São vacas precoces, com facilidade de parto, que apresentam longa vida produtiva e tem maior capacidade de tolerância ao calor, quando comparada às demais raças leiteiras. A Jersey (Figura 27) é uma vaca econômica, pois apresenta elevado índice de conversibilidade e resistência, além de grande rusticidade. A qualidade de seu leite é superior, sendo o melhor e mais completo leite produzido entre todas as leiteiras, pois contém a maior quantidade de sólidos não gordurosos (proteína, lactose, vitaminas e minerais) e gordura, quando comparado com os produzidos pelas outras raças leiteiras. Sua pelagem vai desde pardo claro até pardo escuro, as fêmeas apresentam peso médio de 350 kg, sendo consideradas de pequeno porte (Associação de Criadores de Gado Jersey do Rio Grande do Sul, 2023). Figura 27 – Exemplares da raça Jersey Crédito: Parilov/Shutterstock. Já Gir, Guzerá e Sindi são algumas das principais raças de zebuínos leiteiros (Bos taurus indicus), que são animais mais resistentes, porém, muitas vezes, menos produtivos. O gado Gir (Figura 28), por exemplo, originário da Índia, apresenta uma produção de leite variável conforme sua linhagem, mas que, em média, produz de 1.600 a 3.600 kg de leite por lactação (4,5% de gordura). É um gado de 35 múltiplas pelagens, que vão de branco a vermelho, apresentam pele escura e são aspados (com chifres). Figura 28 – Exemplar da raça Gir Crédito: Victor A Pascoal/Shutterstock. O gado Guzerá, por sua vez, é de dupla aptidão. Suas fêmeas pesam entre 450 e 650kg, bem como produzem diariamente gera uma média de 2.500 kg de leite por lactação. É uma raça muito utilizada em cruzamentos, como veremos futuramente. Já a raça Sindi, originária do Paquistão, também é reconhecida por sua dupla aptidão e boa adaptabilidade. Os exemplares apresentam pelagem avermelhada-alaranjada e até acastanhada, sendo a pelagem dos machos mais escura do que a das fêmeas. Se adaptam à estiagem e também à restrição alimentar. Podem produzir de 2.400 a 7.000 kg de leite por lactação, cuja duração varia entre 172 e 358 dias. Por fim, é interessante destacar a raça Girolando, obtida do cruzamento do gado Gir com Holandês, que gera uma boa rusticidade e longevidade produtiva, aliada a uma boa produção, em média de 5.264 litros de leite por lactação. A composição média desse leite apresenta 3,8% de gordura, 3,3% de proteína e 4,5% de lactose. 36 FINALIZANDO Nesta etapa, introduzimos a temática da bovinocultura, trazendo as inúmeras possibilidades produtivas dessa criação. Tratamos das diferenças entre a bovinocultura de corte e a bovinocultura de leite, apontando aimportância da escolha das raças com relação à finalidade da criação. Abordamos também a bovinocultura como atividade econômica, que é capaz de fornecer carne e leite de boa qualidade, além de ser importante fonte de renda para muitas famílias rurais. Além disso, discorremos sobre a bovinocultura no Brasil, que está posicionado entre os mais importantes produtores de bovinos mundiais. Compreendemos o agronegócio da pecuária de corte, por meio das etapas da cadeia produtiva da carne bovina e também do mercado da produção leiteira, abordando a cadeia produtiva do leite. Finalizamos esta etapa conhecendo um pouco mais sobre as principais raças de corte e leite, analisando seu histórico, sua morfologia e suas características produtivas. Futuramente, vamos abordar a fisiologia reprodutiva dos bovinos, analisando a influência do melhoramento genético nos rebanhos. 37 REFERÊNCIAS ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DAS INDÚSTRIAS EXPORTADORAS DE CARNE – ABIEC. Beef Report: Perfil da Pecuária no Brasil – 2022. Disponível em: <https://www.abiec.com.br/publicacoes/beef-report-2022/>. Acesso em: 23 fev. 2023. _____. Perfil da Pecuária no Brasil: relatório anual. Brasília, 2018. ASSOCIAÇÃO Brasileira de Angus. Disponível em: <https://angus.org.br/>. 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