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73- Longa jornada noite adentro

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LONGA JORNADA 
NOITE ADENTRO
EUGENE O’NEILL
Quando Eugene O’Neill terminou Longa Jornada Noite Adentro, em 1941, 
decidiu que a peça não poderia ser lida nem montada senão vinte e cinco anos após a sua 
morte. Indagado sobre as razões dessa exigência, O’Neill respondeu apenas que uma das 
personagens ainda vivia. Raros amigos tiveram o privilégio de ler os originais, antes que 
eles fossem enviados para os cofres da Randon House, a editora que publicava as obras 
de O’Neill, e para a Biblioteca da Universidade de Yale. Mas a vontade do autor não foi 
cumprida.
Em 1956, três anos depois de sua morte, a viúva de O’Neill, Carlotta Monterey, 
liberou a publicação e a montagem da peça. Soube-se então por que o dramaturgo não 
desejava que a Longa Jornada Noite Adentro viesse a público. Com essa autobiografia 
dramática, como tantos a chamariam, ele ressuscitava seus mortos o pai, a mãe, o irmão 
—, traçando um comovente retrato da família O’Neill, no qual o autor se identificava 
com o personagem Edmund. Em 1941, ao concluir a peça, apenas Edmund-Eugene 
estava vivo.
Apesar de seu caráter autobiográfico, Longa Jornada Noite Adentro é muito mais 
do que um retrato do artista quando jovem. Ainda que O’Neill tenha reproduzido na obra 
parte de sua vida, também é certo que determinados aspectos da realidade foram 
omitidos e outros simplesmente inventados.
A aventura desse homem singular chamado Eugene O’Neill, tuberculoso na 
juventude, dominado pelo medo de se tornar um alcoólatra como o irmão, filho de uma 
mulher que se abandonou ao vício das drogas e de um ator famoso que aviltou seu 
talento em peças de sucesso comercial, tem paralelos muito estreitos com a realidade de 
Longa Jornada Noite Adentro. Mas esse destino particular, ao ser recriado por meio do 
teatro, ganhou dimensão maior — graças, precisamente, ao caráter inconfundível das 
experiências pessoais do autor —, transfigurando-se e revestindo-se de um sentido 
comum e universal.
UM LAR PROVISÓRIO
A Barret House era uma pensão familiar situada na Broadway, em Nova York, 
onde se hospedavam artistas de teatro, como James O’Neill, que, ao regressar de suas 
excursões pelo país, fazia daquela casa o seu lar. Ali, no quarto 236 do terceiro andar, 
nasceu Eugene Gladstone O’Neill, na tarde de 16 de outubro de 1888.
James O’Neill, católico de origem irlandesa, foi um grande ator que se perdeu. 
Poderia ter sido maior que o shakespeariano Edwin Booth (1833-1893), pois, na opinião 
deste, que o vira como protagonista em Otelo, James interpretava melhor que ele o 
famoso personagem. Mas James não soube aproveitar seu talento e se tornou apenas um 
bom ator, dedicando a maior parte de sua vida a representar Edmund Dantes em O 
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Conde de Monte Cristo, percorrendo a América de costa a costa e ganhando uma fortuna 
em cada temporada.
Alguns biógrafos relacionam essa mudança de rumo com o seu casamento com 
Ella Quinlan, filha de abastado comerciante, uma jovem frágil, delicada e muito 
religiosa. Para casar-se com o ator, Ella foi obrigada a romper com seu meio social e 
sua família. James tinha adoração pela mulher e, para compensá-la do que havia perdido, 
construiu casas requintadas que ela nunca pôde habitar.
Em 1878, nasceu James O’Neill Jr., o primeiro filho do casal. Foi internado muito 
cedo no Colégio Notre-Dame, uma aristocrática escola católica. Quando Eugene nasceu 
James tinha dez anos e só viu o irmão três meses depois, durante uma visita em que os 
pais levaram o bebê ao internato. 
Entre James Jr. e Eugene, Ella tivera outro filho, Edmund, que morrera ainda 
bebê, na casa dos avós, enquanto a mãe acompanhava o marido numa temporada pelo 
interior. Ella jamais se refez do sentimento de culpa por ter abandonado Edmund. Além 
do mais, era uma mulher sensível e sofria intensamente com a falta de raízes que 
ligassem a família O’Neill a uma casa, a uma vizinhança, a uma paróquia.
Desde o parto de Eugene, Ella descobrira que a morfina, que fora receitada pelo 
médico para lhe aliviar as dores, também diminuía seu nervosismo e sua insatisfação 
permanente. Procurou esconder do marido esse vício e quando James descobriu já era 
muito tarde.
Enviado para um internato católico em Nova York. o Mount Saint-Vincent, em 
1895, Eugene passou a ver seus pais muito raramente. Era um menino triste e quieto, 
mergulhado numa solidão que se acentuava com a falta de calor humano das freiras e 
com o sentimento de rejeição em relação à família.
Em 1900, Eugene saiu do Saint-Vincent e foi para o De La Salle Institute, em 
Nova York. No segundo ano de sua permanência no La Salle, a mãe resolveu interná-lo 
novamente. O menino esforçou-se nos estudos, passou de ano com excelente média, mas 
a mãe sentia que era insuportável viver com o filho, cujos olhos pareciam reprovar 
constantemente seus atos. Ela acabou convencendo o marido, e Eugene voltou a ser 
internado, em 1902, na Academia Betts, em Stanford, um colégio laico.
Nessa fase ocorre sua revolta contra a religião católica e Eugene estreita sua 
ligação com o irmão James, que passa a ser uma espécie de tutor, introduzindo o 
adolescente no “outro lado” do mundo teatral, do qual os pais tinham procurado 
preservá-lo durante a infância.
Ao terminar o curso secundário, no ano de 1906, Eugene entrou na aristocrática 
Universidade de Princeton, no leste. Sentiu imediatamente que estava num ambiente 
tradicional, esnobe e, sobretudo, pouco estimulante intelectualmente. Nove meses mais 
tarde, era expulso, por atirar uma garrafa contra a janela da casa onde vivia Woodrow 
Wilson (1856-1924), presidente da Universidade e, durante a Primeira Guerra Mundial, 
presidente dos Estados Unidos.
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Em Nova York, Eugene encontrou um clima de tensão muito grande na família, 
pois James, também expulso de Notre-Dame, no ano anterior, não conseguia se definir 
profissionalmente, entregando-se a bebedeiras e farras sem fim. Tentara a carreira de 
repórter e depois resolveu ser ator.
Eugene, por sua vez, foi trabalhar como escriturário numa empresa de promoções. 
O emprego era tedioso, mas Eugene passava a maior parte do tempo numa livraria da 6.ª 
Avenida, cujo proprietário, Benjamin Tucker, era um dos mais conhecidos membros do 
movimento anarco-individualista americano. Eugene absorvia suas idéias, seus livros, 
suas palavras de ordem; mas a contribuição mais importante de Tucker foi revelar a 
O’Neill a obra de Friedrich Nietzsche (1844-1900).
Assim Falava Zaratustra, a grande obra profética de Nietzsche, acabou por se 
tornar o “catecismo” de O’Neill, a resposta que ele desejava contrapor ao primeiro dos 
seus catecismos: o católico. Naquela fase de sua vida anárquica, o pensamento de 
Nietzsche não era apenas uma refutação ao nível religioso, mas a confirmação de um 
estado de espírito, uma disposição em relacão à vida que era a sua. “Deves trazer o caos 
dentro de ti para fazer nascer uma estrela bailarina.”
Um dia, em 1909, Eugene comunicou à família que ia se casar. Na verdade, a 
moça, Kathleen Jenkins, já estava grávida. O filho nasceu pouco tempo depois do breve 
e tumultuoso casamento, quando O’Neill não se encontrava mais nos Estados Unidos. 
Havia ido para Honduras, em busca de “novas oportunidades” ou, segundo a opinião 
unânime de seus biógrafos, para fugir dos problemas. O casamento foi um erro e o casal 
divorciou-se oficialmente em 1912.
Vítima da febre amarela, Eugene teve que voltar para Nova York. O pai tentou 
então fazer dele uma espécie de assistente de diretor, em sua companhia de teatro; mas 
em três meses de excursão, Eugene não demonstrou o menor interesse pelo trabalho. Lia 
muito, principalmente relatos de viagem de Jack London (1876-1916), Josef Conrad 
(1857-1924) e Rudyard Kipling (1865-1936). Um dia resolveu partir para Buenos Aires, 
no navio Charles Racine, que saiu do porto de Nova York na primavera de 1910.
EmBuenos Aires, trabalhou algum tempo num frigorífico e numa fábrica de 
máquinas de costura. Durante os períodos de desemprego ia aos bares do cais, 
freqüentados por marinheiros que contavam suas aventuras, falavam de amores 
distantes, bebiam e jogavam muito. Em 1911 voltou para Nova York, engajado como 
marinheiro no Ikalis.
Ao chegar, não procurou imediatamente a família nem demonstrou curiosidade 
em conhecer o filho, Eugene Gladstone O’Neill Jr. Sua primeira providência foi alugar 
um quarto numa pensão que ficava em cima do Jimmy-the-Priest, conhecido bar de 
marinheiros. O bar e a pensão eram freqüentados por estivadores, prostitutas, 
contrabandistas, desempregados e anarquistas. De vez em quando Eugene aceitava um 
emprego em algum barco-correio ou navio de longo curso. O mar havia se tornado para 
O’Neill um símbolo de liberdade e conhecimento.
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Mas afinal, cansado e sem dinheiro, foi ao encontro da família, em Nova Orleans. 
O pai achou que estava na hora de arranjar um emprego para o filho e convidou-o para 
fazer uma ponta em O Conde de Monte Cristo. Não havia alternativa e Eugene seguiu a 
companhia até o extremo oeste dos Estados Unidos. Na volta, ficaram algum tempo na 
casa de New London, em Connecticut.
 Foi ali, no mês de agosto, que O’Neill começou a trabalhar como repórter no 
Telegraph. O proprietário do jornal, Frederick Latimer, interessou-se pelos escritos de 
Eugene e percebeu que ele não tinha apenas talento literário, mas gênio. Naquela época 
Eugene escrevia muito, apesar do precário estado de saúde que acabou por levá-lo para 
um sanatório de tuberculosos. No sanatório, durante o inverno e a primavera de 1912-13, 
O’Neill sentiu que escrever para teatro era a melhor forma de expressar o que sentia em 
relação à vida.
A decisão de se tornar um dramaturgo não surgiu subitamente. Na verdade, 
O’Neill não sabia de teatro apenas o que o velho James lhe ensinara. Lera toda a obra de 
William Shakespeare (1564-1616), assistira a numerosas montagens dos autores gregos 
e elisabetanos, conhecia alguma coisa do teatro europeu do século XIX. Desde 1911, seu 
interesse crescera muitíssimo e ele se convertera num espectador assíduo dos teatros de 
Nova York. Era um grande admirador de Ibsen (1828-1906) e, sobretudo, de Strindberg 
(1849-1912).
Em 1914, quando entrou para a Oficina Dramática do professor George Peirce 
Baker, em Harvard, O’Neill já havia escrito várias peças de teatro, como Uma Esposa 
para Sempre (A Wife for Life) e A teia de Aranha (The Web). Essas e outras obras, 
algumas das quais incluídas no volume Sede e Outras Peças em Um Ato (Thirst and 
Other One-Act-Plays), seriam renegadas mais tarde pelo autor, que as considerava de má 
qualidade. Dessa fase, apenas Sede, Rumo a Este para Cardiff (Bound East for Cardiff) e 
Névoa (Fog) chegaram a ser montadas.
O’Neill permaneceu no curso do professor Baker apenas oito meses. Em junho de 
1915 abandonou Harvard. Três meses depois estava morando em Greenwich Village, 
Nova York, onde encontrou um bar irlandês, o Hell Hole, sucedâneo do velho Jimmy-
thePriest. O Hell Hole também era freqüentado por marginais, só que de uma espécie 
diferente a dos intelectuais outsiders: jornalistas, atores, anarquistas, políticos de 
esquerda.
No Village, O’Neill conheceu Terry Carlin, cuja prosa brilhante conquistara 
algumas amizades, como a de Jack London e Theodore Dreiser (1871-1945), o jornalista 
John Reed (1887-1920) e sua mulher Louise Bryant. Durante o verão de 1916, O’Neill, 
Carlin, John e Louise foram para Provincetown, uma cidade praiana de Cape Cod, 
Massachusetts, que se tornou decisiva na vida de O’Neill.
Desde o ano anterior, um grupo de teatro do Village, os Players, fazia ali suas 
montagens de verão. O’Neill e seus companheiros ligaram-se ao grupo, que ficou logo 
interessado na encenação de Rumo a Leste para Cardiff. Duas semanas mais tarde, a 
peça era montada com sucesso. A experiência de Provincetown animou o grupo a se 
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estabelecer, de maneira regular, num teatro em Nova York, o Playwrights Theatre, cujo 
nome foi sugerido por O’Neill. O objetivo do grupo era a montagem de peças novas de 
autores americanos.
Entre 1917 e 1918, O’Neill escreveu várias peças em um ato, das quais as mais 
significativas foram reunidas depois no volume S. S. Glencairn: A Longa Viagem de 
Volta (The Long Voyage Home), Na Zona (In the Zone), A Lua das Caraibas (The Moon 
of the Caribees). E foi no outono de 1917 que Eugene começou a se projetar como 
dramaturgo. Algumas de suas peças foram publicadas a partir desse ano, na revista 
Smart Set. Os Washington Square Players interessaram-se por Na Zona e montaram-na 
em outubro daquele mesmo ano, enquanto A Longa Viagem de Volta era encenada pelos 
comediantes de Provincetown.
Em 1918, O’Neill casou-se com Agnes Boulton, jovem escritora que ele 
conhecera no Hell Hole, em fins de 1917. Mas o casamento fracassou. Eugene precisava 
de uma esposa que também fosse mãe e secretária, e Agnes estava muito empenhada em 
seu próprio trabalho. Haviam feito um acordo de não ter filhos, mas Agnes acabou 
dando à luz dois: Shane, que nasceu em 1919, e Oona, em 1925. Separaram-se em 1926.
Apesar de suas grandes desavenças com Agnes, O’Neill criou nesse período a 
maior parte de suas obras-primas, tendo mesmo dedicado a ela sua primeira peça em três 
atos Além do Horizonte (Beyond the Horizon). A peça foi apresentada no Morosco 
Theatre, na Broadway, em 1920, e lhe valeu o Prêmio Pulitzer, em junho desse mesmo 
ano.
Eugene O’Neill estava definitivamente lançado. Além do Horizonte fazia sucesso 
na Broadway; Chris Christopherson era aplaudida em Atlantic City; Exorcismo 
(Exorcism), uma peça experimental, estreava no Village; O’Neill escrevia Ouro (Gold) e 
se preparava para retomar o tema de Chris Christopherson e criar Anna Christie, a 
história da regeneração de uma prostituta pelo amor. Anna Christie estreou em 1921 e 
O’Neill recebeu seu segundo prêmio Pulitzer.
Grande parte dos dramas escritos por O’Neill abordava a condição de alguns 
homens que ele conhecia bem, especialmente aqueles ligados ao mar. O 
desenvolvimento dramático de suas peças baseava-se no naturalismo cênico, mas a 
grande novidade de sua obra não estava na forma e sim nos temas, na rudeza de seus 
personagens, na devassa que ele fazia de seus pensamentos e sentimentos mais íntimos. 
Desde o início, O’Neill permeou suas obras de uma ironia trágica. Quase sempre, os 
homens alimentavam-se de sonhos que não conseguiam realizar, pois os caminhos 
escolhidos conduziam ao fracasso.
Se, por um lado, os personagens de O’Neill não podem viver sem ilusões, também 
é certo que sofrem com a impressão de que jamais alcançarão seus objetivos. As ilusões 
constituem a perdição e a redenção dos personagens, pois O’Neill afirma que sonhar é 
uma das condições para viver. Devemos alimentar nossos sonhos, mesmo sabendo que 
será difícil concretizá-los. Para O’Neill, “o único sucesso está no fracasso” e qualquer 
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homem que se surpreenda um dia pensando não haver mais o que perseguir está 
acabado.
O Imperador Jones (The Emperor Jones), escrita em 1920 e levada à cena no 
mesmo ano pelos Provincetown Players, tinha pouca relação com as outras peças de 
O’Neill. Na verdade, O Imperador Jones foi um marco, não só na história de O’Neill 
como na do próprio teatro americano. A peça abandona os moldes naturalistas, para 
introduzir o expressionismo na obra de O’Neill e no teatro americano. O protagonista é 
um negro, Brutus Jones, carregador de malas numa estação ferroviária, que comete um 
assassinato e foge de navio para uma ilha das Índias Ocidentais, onde acaba se tornando 
imperador de uma tribo. Jones explora o povo, faz fortuna, até que a tribo se revolta e 
ele se vê obrigado a fugir, refugiando-se na floresta, onde finalmente émorto.
Em 1921, O’Neill parecia interessado unicamente no seu trabalho. O Primeiro 
Homem (The First Man), A Fonte (The Fountain) e O Macaco Peludo (The Hairy Ape) 
foram escritas nesse ano. O Macaco Peludo era a mais brilhante e ofuscou as duas 
primeiras. A Fonte, na qual O’Neill dramatiza o idealismo de Ponce de Léon ao buscar a 
fonte da juventude, só chegou à cena em 1925. O Primeiro Homem estreou em março de 
1921 e foi uma das produções menos felizes do autor. Durante os ensaios, em fevereiro, 
O’Neill recebeu um telegrama de James, que se encontrava na Califórnia com a mãe, 
comunicando que ela estava muito doente. Poucos dias depois ela morreria.
No dia anterior à morte de Ella, O Macaco Peludo tinha estreado no Playwrights 
Theatre, com um sucesso fantástico. Um mês depois, iniciava sua carreira na Broadway. 
O papel de Milkdred era interpretado então por uma bela atriz, Carlotta Monterey, que 
substituíra Mary Blair. O primeiro contato de Carlotta com O’Neill nada teve de 
excepcional e ele mal se deu conta de sua presença. Quando voltaram a se ver, cinco 
anos mais tarde, o reencontro foi decisivo na vida de ambos.
Em 1923, O’Neill escreveu Acorrentados (Welded), na qual abordou o tema do 
casamento, analisando um casal em sua relação de amor e ódio. Nesse mesmo ano 
escreveu outra peça, Todos os Filhos de Deus Têm Asas (All God ‘s Children Got 
Wings), que tratava de um tema até então inédito nos palcos americanos: o problema 
conjugal entre uma branca e um negro. Em novembro desse ano, O’Neill perdeu o irmão 
James, que passara vários meses numa clínica tentando se recuperar do alcoolismo.
Desejo sob os Olmos (Desire Under the Elms) foi o grande êxito de 1924. Nessa 
obra evidenciava-se nitidamente a influência da tragédia grega, mais precisamente de 
Hipólito e Medéia, de Eurípides (484-406 a.C.). A madrasta se apaixona pelo enteado, 
trai o marido e engravida, acabando por matar o filho para provar ao esposo o seu amor.
A peça criou problemas com a censura e chegou a ser proibida em algumas 
cidades, como Boston e Los Angeles. Em janeiro de 1925, O’Neill, cansado e 
preocupado com o vício de beber, temeroso de ter o mesmo fim do irmão, resolveu 
submeter-se à psicanálise. Por sugestão do psicanalista comprou uma casa nas Bermudas 
e se mudou com a família para lá, onde trabalhou em duas novas peças O Grande Deus 
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Brown (The Great God Brown) e Marco Milhões (Marco Millions), esta última iniciada 
em 1923.
No fim de 1925, o Greenwich Village Theatre, do qual O’Neill fazia parte como 
sócio, encenou A Fonte, e em janeiro de 1926, O Grande Deus Brown. O’Neill estava 
empenhado também na cara produção de Marco Milhões, na qual um produtor da 
Broadway, David Belasco, parecia interessado. Mas depois de um ano de indecisões, 
Belasco desistiu e Marco Milhões teve que esperar mais dois anos para ser encenada, no 
Guild Theatre.
Tanto O Grande Deus Brown como Marco Milhões, apesar de sua diferente 
ambientação (a primeira se passava na época contemporânea, nos Estados Unidos, e a 
segunda tratava da viagem de Marco Polo à China no século XIII), eram uma crítica ao 
mito do sucesso e do dinheiro.
Ainda em 1926, O’Neill escreveu Lázaro Riu (Lazarus Laughed), na qual 
dramatizava a vida de Lázaro, após a sua ressurreição por Cristo. O’Neill procurava 
situar um novo idealismo religioso, mesclado de elementos cristãos, nietzscheanos e 
orientais. No verão desse mesmo ano, O’Neill e a família foram para o Maine, nos 
Estados Unidos. Perto da casa dos O’Neill morava uma amiga do autor, Elizabeth 
Marbury, que na época estava hospedando Carlotta Monterey. O reencontro de O’Neill e 
Carlotta foi decisivo. Apaixonaram-se, voltaram a se encontrar em Nova York e, no ano 
seguinte, Eugene abandonou Agnes. O divórcio seria muito mais difícil de conseguir do 
que O’Neill imaginava. Agnes não chegava a um acordo sobre a pensão e desejava 
sempre mais do que O’Neill estava disposto a conceder.
Em janeiro de 1928 estreou Estranho Interlúdio (Strange Interlude), no John 
Golden Theatre. A peça, de nove atos, não era nem uma tragédia, nem um drama 
realista, nem um drama simbólico, mas uma mistura de todas essas formas num drama 
sobre uma mulher, Nina Leeds, em toda uma gama de papéis: mãe, esposa, amante, 
filha. Estranho Interlúdio foi a peça de O’Neill que alcançou maior êxito comercial: 
rendeu-lhe duzentos mil dólares. Ficou anos em cartaz e graças a ela O’Neill recebeu 
mais um prêmio Pulitzer.
Eugene e Carlotta resolveram então fazer uma viagem à Europa e embarcaram, 
incógnitos, em fevereiro de 1928. Foi uma longa viagem, que se estendeu até o Oriente. 
O’Neill não conseguia trabalhar: bebia demais para aliviar a tensão provocada pelas 
exigências de Agnes sobre o divórcio. A última bebedeira, em Xangai, culminou com 
seu internamento num hospital. Em julho de 1929, Agnes finalmente concedeu-lhe o 
divórcio. O’Neill e Carlotta casaram-se em Paris.
Quando terminou de escrever Electra e os Fantasmas (Mourning Becomes 
Electra), O’Neill dedicou-a a Carlotta. Era mais uma obra-prima. O’Neill lançara-se ao 
projeto ambicioso e feliz de basear sua peça num mito da Antiguidade clássica. Foi uma 
prova difícil, mas ele arrebatou mais elogios da crítica por essa peça do que em qualquer 
das anteriores. Electra e os Fantasmas passou à história como a maior tragédia 
americana.
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O’Neill e Carlotta retornaram aos Estados Unidos em maio de 1931. Em outubro, 
Electra foi levada à cena e, para não fugir à regra, o autor não compareceu à estréia. 
Estava em sua casa, recém-adquirida, a Genotta, em Sea Island, na Geórgia, e começava 
a escrever Dias sem Fim (Days Without End). A peça abordava a aridez espiritual da 
época e só ficou pronta em 1933. No ano anterior, O’Neill concluiu A Juventude não É 
Tudo (Ah, Wilderness!), uma comédia. Em 1934, Dias sem Fim foi encenada pelo Guild 
Theatre — um grande fracasso. O’Neill resolveu afastar-se temporariamente das lides 
teatrais para se dedicar a um ciclo de peças que trataria da ascensão e queda de uma 
família americana. Trabalhou no projeto de 1935 a 1939, mas, insatisfeito com os 
resultados, rasgou a maior parte dos manuscritos. Sobraram apenas duas peças: Um 
Toque de Poeta (A Touch of Poet) e A mais Sólida Mansão (More Stately Mansion).
Depois de dois anos de silêncio foi surpreendido, em 1936, com a concessão do 
prêmio Nobel de Literatura. Mudou-se da Geórgia para a Califórnia, onde, em sua Tao 
House, uma imponente mansão, escrevia e recebia poucos amigos. Viveu na Tao House 
por mais de seis anos, sua maior permanência numa casa até então, e só a abandonou por 
motivos de saúde, em 1944.
Foi na Tao House que O’Neill voltou a ver os filhos, Shane, Oona e Eugene Jr. 
Quando Oona se casou com Charles Chaplin, em 1943, O’Neill a deserdou e nunca mais 
quis vê-la. Shane tornou-se um segundo James O’Neill, e Eugene Jr. parecia, em seu 
cargo de professor assistente em Yale, o único de seus filhos a lhe trazer satisfações.
Desde seu retiro voluntário, Eugene O’Neill começou a sofrer os primeiros 
sintomas da doença que acabaria por impedi-lo de escrever, pois atacava o sistema 
motor. A partir de 1939, com a guerra, a mudança para a Califórnia e a doença, O’Neill 
começou a se voltar para o seu passado. Naquele mesmo ano escreveu O Geleiro 
Chegou (The Iceman Cometh). Havia na peça um bar chamado Harry Hope, uma 
mistura do Hell Hole e do Jimmy-the-Priest. Foi nessa volta ao passado, revendo seus 
fantasmas, que escreveu Longa Jornada Noite Adentro (Long Day‘s Journey into Night, 
1919-41), a última e a mais dolorosa das suas peças de caráter autobiográfico, e Uma 
Lua para o Bastardo (A Moon for the Misbegotten), onde dramatizava a vida de James, 
seu irmão.
Os últimos anos da vida de O’Neill foram extremamente difíceise solitários. Sua 
ligação com o mundo exterior era Carlotta. Os médicos não conseguiam deter o curso da 
doença. Em 1951, O’Neill mudou-se para um hotel, em Boston, o Shelton, próximo ao 
hospital onde trabalhava a equipe médica que o assistia. Em novembro de 1953 seu 
estado se agravou. No dia 24 deixou de comer; na madrugada do dia 27, morreu. Nesses 
dias de agonia, num momento de lucidez, balbuciou: “Nascido num quarto de hotel e, 
maldito seja, morto num quarto de hotel!”
UMA ÁRDUA JORNADA
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A tragédia de Longa Jornada Noite Adentro é motivada pelo drama da família Tyrone, 
cujos elementos se baseiam na biografia da família O’Neill. O pai, James Tyrone (como 
James O’Neill), é filho de pobres imigrantes irlandeses. Da mesma forma que James, 
Tyrone investiu sua carreira numa obra de sucesso fácil, sabendo que poderia ter sido 
um grande ator. Há uma característica no personagem, entretanto, que não corresponde 
ao modelo real: o materialismo exacerbado.
Edmund corresponde a Eugene O’Neill. Ao longo da peça o autor alude à sua vida 
de vagabundo na América do Sul, à febre amarela contraída nos trópicos, às noites na 
taverna Jimmy-the-Priest, à infância nefasta de James, o irmão mais velho. Mas o autor 
omite que em 1912, ano dos acontecimentos de Longa Jornada Noite Adentro, Edmund 
já havia se casado, tido um filho e se divorciado. Curiosamente, O’Neill apropriou-se do 
nome do irmão falecido, Edmund, enquanto que, no decorrer da peça, a mãe se refere ao 
filho morto como Eugene.
James é inteiramente James O’Neill, um bêbado irrecuperável, inútil e perdulário, 
sem qualquer esperança de redenção. Traz em si a marca de Caim — o filho e irmão 
maldito. É rejeitado pela mãe e pelo pai, acusado de corromper Edmund, responsável 
(segundo a mãe) pela morte do pequeno Eugene, pois tinha ciúme dele. Aos sete anos, 
quando contraiu sarampo, sabia que devia ficar afastado do bebê mas entrou no quarto 
do irmão, deliberadamente — e o contaminou, levando-o à morte.
Mary Tyrone, a mãe, corresponde a Ella, numa imagem de pureza e inocência, a 
projetar no destino os motivos de sua falência. Mary diz: “Nenhum de nós pode 
remediar as coisas que a vida nos faz! Estão feitas antes mesmo que a gente se 
aperceba... “ Ela aceita a condenação à impotência, como se fosse uma sina, e tenta 
sobreviver dentro do sonho provocado pela droga. Esta, por instantes, preserva-a da dor 
de viver uma vida que não teve nenhuma complacência com sua fragilidade.
A Longa Jornada Noite Adentro, como especifica O’Neill, aconteceu num dia de 
agosto de 1912, quando a família estava reunida em sua casa de veraneio. Edmund 
apresentava sintomas de tuberculose e trabalhava no jornal daquela pequena comunidade 
à beira-mar. O pai estava muito preocupado mas bastante esperançoso, pois Edmund 
começara a escrever.
No cenário em que se ambienta a peça, o tapete é surrado, mas há muitos livros 
em duas estantes distintas. A de Tyrone, com livros históricos, obras de Shakespeare, 
Dumas e Victor Hugo; a de Edmund, com obras de Zola, Ibsen, Strindberg e outros 
autores, que o velho James O’Neill — como James Tyrone — considerava decadentes.
Nesse cenário, inundado de sol no primeiro e segundo atos, obscurecido pelo 
nevoeiro às 18h30 do mesmo dia, no terceiro ato, e rodeado pela noite no quarto ato, é 
que os personagens se atormentam e se descobrem.
Longa Jornada Noite Adentro é uma tragédia porque os personagens são em parte 
responsáveis por sua própria destruição, embora também sejam vítimas de algo que não 
conseguem controlar e que se pode chamar de destino. Não se trata de uma peça de 
enredo mas de ação psicológica, pois o que realmente aconteceu aos Tyrones está no 
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passado; esse passado é revisitado, trazido à cena nos sucessivos embates entre os 
personagens, justificando a ação presente.
O tempo do drama vai das 8h30 da manhã até a meia-noite, mas o tempo 
psicológico é muito maior, porque esse dia corresponde a uma vida inteira.
A ação começa numa manhã ensolarada, com Mary Tyrone entrando em cena, 
“sorrindo afetuosamente”, e termina quando ela, à meia-noite, envolta pelo sonho 
provisório da morfina, remete ao ponto onde tudo começou. Nesse momento, Mary 
sente falta de alguma coisa que se perdeu e durante alguns minutos procura descobrir 
como e quando isso teria ocorrido. Voltando ao passado, ela se reencontra no convento, 
experimentando uma vocação religiosa que não foi levada adiante. Logo a seguir, numa 
primavera, ela conheceria James Tyrone, apaixonar-se-ia por ele e, durante algum 
tempo, seria muito feliz.
Entre a imagem de Mary sorrindo afetuosamente e a cena final, todos os 
personagens percorreram um trajeto idêntico dentro de sua própria noite. Para cada um 
houve momentos de confissão, de revelação, de esclarecimento, através dos vários 
conflitos entre eles. Um dos conflitos mais importantes se dá entre Edmund e seu irmão 
James. Pouco antes, James Tyrone e Edmund haviam tido seu confronto definitivo, 
quando o velho revelara ao filho mais moço as razões que o levaram a prostituir-se 
profissionalmente. O confronto termina com um momento de compreensão entre o pai e 
o filho.
O conflito com James, que aparece camuflado desde o início, revela-se afinal 
mais violento e profundo. James demonstra todo seu rancor por Edmund ter sido sempre 
o “queridinho”, porque Edmund está no caminho de se encontrar e ele se sente perdido. 
James tenta destruir as ilusões do irmão, como deliberadamente procurara destruí-lo no 
passado, quando o introduziu em seu estilo de vida decadente. James não tem ilusões, 
nem sonhos, nem vontade, nem fé. É o mais indefeso, porque ainda lhe restam alguma 
lucidez e consciência sobre seu próprio estado. Sabe que é irrecuperável, como o próprio 
James O’Neill, que morreu aos 45 anos, vitima do álcool e de si mesmo.
A jornada de Edmund é mais positiva. No itinerário do sofrimento, ele chega à 
luz, erguendo o véu das ilusões. Se por um lado isso lhe causa imensa dor, por outro o 
projeta numa dimensão na qual ele consegue superar seu desespero, iluminando-se, 
redimindo-se.
Em Lázaro Riu, O’Neill tem uma frase que poderia resumir a condição dos 
personagens de Longa Jornada Noite Adentro: “A vida é para cada homem uma cela 
solitária cujas paredes são espelhos”. Assim o foi para os quatro Tyrones na viagem de 
um longo dia dentro da noite, quando conseguiram levar até o fim a descoberta 
insuportável de sua fragilidade.
11
PERSONAGENS
JAMES TYRONE
MARY CAVAN TYRONE, sua esposa
JAMIE TYRONE, seu primogênito
EDMUND TYRONE, o filho caçula
CATHLEEN, a empregada
CENÁRIOS
ATO 1 — Sala da casa de veraneio dos Tyrone.
Às 8h30 da manhã de um dia de agosto de 1912.
ATO II — Cena I — O mesmo, por volta das 12h45.
Cena II — O mesmo, mais ou menos uma meia hora após.
ATO III — O mesmo, à tarde, por volta das 6h30.
ATO IV — O mesmo, à meia-noite.
12
ATO I
CENÁRIO
Sala da casa de veraneio de James Tyrone, numa manhã de 
agosto de 1912.
No fundo do cenário, duas portas duplas com portières. A 
da direita leva a uma sala de frente, cujo aspecto solene e bem 
arrumado revela que é raramente usada. A outra dá para uma 
sala dos fundos, escura e sem janelas, que serve apenas de 
passagem do living room para a sala de jantar. Junto à parede, 
entre as portas, há uma pequena biblioteca sobre a qual pende 
um retrato de Shakespeare e que contém romances de Balzac, 
Zola, Stendhal e obras filosóficas e sociológicas de 
Schopenhauer, Nietzsche, Marx, Engels, Kropotkin e Max 
Steiner, peças de Ibsen, Shaw e Strindberg, poemas de 
Swinburne, Rossetti, Wilde, Ernest Dowson, Kipling, etc...
Na parede da direita, no fundo, há uma porta telada que 
conduz ao pátio, o qual rodeia quase que a metade da casa. 
Mais adiante, três janelas dão para o parque e sobre o porto e 
a avenidaque bordeja o cais. Contra a parede há uma 
mesinha de vime e uma escrivaninha de carvalho, dessas de 
tipo comum, encostadas às janelas.
Na parede da esquerda, uma série análoga de janelas dá 
sobre os terrenos do fundo. Sob as mesmas, um divã de vime 
com almofadões, cuja cabeceira se acha voltada para o lado 
de fora. Mais atrás vê-se uma grande biblioteca com porta de 
vidro, com coleções de Dumas, Victor Hugo, Charles Lever, 
três volumes de Shakespeare, a Melhor Literatura do Mundo 
em cinqüenta grandes tomos, a História da Inglaterra, de 
Hume, a História do Consulado e do Império, de Thiers, a 
História da Inglaterra, de Smollett, a História da Decadência do 
Império Romano, de Gibon, e diversos volumes com antigas 
comédias, poemas e histórias da Irlanda. O que chama a 
atenção nessas coleções é que todos os volumes parecem ter 
sido lidos.
O chão de hardwood parece estar totalmente recoberto por 
um tapete de desenho vago e tonalidades apagadas. No centro 
há uma mesa redonda com uma lâmpada de ler, munida de um 
13
abajur verde, cujo cordão está embutido em uma das quatro 
lâmpadas do lustre. Ao redor da mesa, ao alcance da luz, há 
três poltronas de vime e à direita, adiante daquela, uma 
cadeira de balanço, de carvalho envernizado, com assento de 
couro.
São, pouco mais ou menos, oito horas e meia. O sol penetra 
pelas janelas da direita. Ao levantar-se o pano do fundo, a 
família acaba de tomar o café da manhã. Mary Tyrone e seu 
marido saem juntos da sala dos fundos. Vêm da sala de jantar.
Mary tem cinqüenta e quatro anos e é uma mulher de 
estatura mediana. Sua silhueta elegante, ainda juvenil, é um 
tanto roliça, mas nela não se notam a cintura e as cadeiras 
próprias da idade madura, apesar de não usar um colete muito 
ajustado. Seu rosto é tipicamente irlandês. Deve ter sido um 
rosto lindo, e ainda chama a atenção. Não se harmoniza com a 
saúde que sua silhueta denota. É enxuto e pálido, nele 
sobressaindo a estrutura óssea. Tem o nariz longo e reto e a 
boca larga, de lábios carnudos e sensíveis. Não usa ruge nem 
qualquer espécie de maquilagem. O cabelo farto e de um 
branco puro emoldura sua testa. Acentuados por esse cabelo e 
por sua palidez, seus olhos, de um pardo escuro, parecem 
negros. São excepcionalmente grandes e belos, de 
sobrancelhas negras e pestanas frisadas.
O que imediatamente chama a atenção é seu extremo 
nervosismo. Suas mãos nunca estão quietas. Foram lindas 
mãos de longos dedos finos, mas o reumatismo tornou nodosas 
as articulações e deformou os dedos, que agora parecem 
mutilados. Todos evitam fitá-los, sobretudo porque se nota que 
Mary não consegue esquecer o triste aspecto que apresentam, 
e sente-se humilhada por não poder dominar esse nervosismo 
que mais chama a atenção sobre suas mãos.
Veste-se com simplicidade, mas com uma segura intuição do 
que lhe vai bem. Tem o cabelo cuidadosamente penteado. Sua 
voz e suave e atraente. Quando está alegre, sente-se nessa voz 
um leve sotaque irlandês. Sua qualidade mais sedutora — e 
que nunca perdeu — é o simples e espontâneo encanto juvenil 
de uma menina de colégio, uma inata inocência alheia à vida 
mundana.
James Tyrone tem sessenta e cinco anos, porém parece ter 
dez anos menos. De estatura média, largo de ombros e de 
peito, dir-se-ia que sua estatura é mais elevada devido ao 
14
porte, cujas características são próprias de um soldado: leva a 
cabeça erguida, o peito estufado, o ventre contraído e os 
ombros quadrados. Seu rosto já apresenta os primeiros sinais 
da velhice, mas ainda assim é um belo rosto de homem — a 
cabeça é grande, bem modelada —, possui um belo perfil e 
olhos fundos, de uma tonalidade parda e clara. Seu cabelo 
grisalho rareia, e ostenta uma calvície semelhante à tonsura 
de um frade.
Na sua personalidade está inconfundivelmente estampado o 
selo de sua profissão. Não porque tenha por hábito comprazer-
se em alguma das deliberadas atitudes temperamentais 
próprias do ator teatral. Por gosto e natureza, é um homem 
simples, sem pretensões, cujas inclinações não se afastam 
muito do humilde início que teve na vida e dos agricultores 
irlandeses que foram seus antepassados. Mas, 
inconscientemente, é ator, e se trai em todos os vícios e hábitos 
de linguagem, em seu modo de ser, nos gestos próprios de uma 
técnica estudada. Tem uma bela voz sonora e flexível, de que 
muito se orgulha.
Seu modo de vestir não é certamente próprio de um papel 
romântico. Usa um blusão americano cinza, de confecção; e 
uns sapatos negros, sem lustre algum; uma camisa sem 
colarinho, e um grande lenço branco enrolado frouxamente no 
pescoço. Esta indumentária é de uma humildade vulgar em 
que nada revela uma pitoresca negligência.
Tyrone é de opinião que se deve usar a roupa enquanto esta 
dura. Vestiu-separa trabalhar no jardim e não se incomoda em 
absoluto com o próprio aspecto.
Nunca esteve realmente enfermo um dia sequer de sua vida. 
É como se não possuísse nervos. Nele há muito do camponês 
estúpido e rude em que se mesclam veias de melancolia 
sentimental, e irrompem raros fulgores de intuitiva 
sensibilidade.
O braço de Tyrone envolve a cintura de sua mulher quando 
ambos vêm da sala dos fundos.
(Ao entrar, abraça-a com ar travesso.)
TYRONE
É difícil abraçá-la, Mary, agora que você aumentou dez quilos.
15
MARY (sorrindo afetuosamente)
Diga clara e simplesmente que engordei demais, querido. Na verdade, deveria perder 
um pouco deste peso.
TYRONE
Em absoluto, minha senhora! Você está ótima! Não falemos de perder peso. Foi por 
isso que comeu tão pouco no café?
MARY
Tão pouco? Julguei até que tivesse comido muito.
TYRONE
Não. Pelo menos não tanto quanto eu teria desejado.
MARY (em tom de brincadeira)
Oh! Você pretende, por acaso, que todos comam feito você? Ninguém poderia devorar 
um café da manhã igual ao seu, sem morrer de indigestão. (Dá uns passos e se detém 
à direita da mesa.)
TYRONE (seguindo-a)
Não creio que eu seja assim tão glutão. (Com sincera satisfação) Porém, graças a 
Deus, conservo o apetite e a digestão de um jovem de vinte anos, apesar dos meus 
sessenta e cinco.
MARY
Bem o creio, James. Ninguém poderia negá-lo! (Ri e se senta na cadeira de vime que 
se acha à direita, afastada da mesa. Seu marido se aproxima por trás, escolhe um 
charuto de uma caixa que está sobre a mesa, e com uma pequena tesoura corta-lhe a 
ponta. Da sala de jantar chegam as vozes de Edmund e Jamie. Mary volve a cabeça 
nessa direção.) Por que terão os rapazes ficado na sala de jantar? Cathleen deve estar 
esperando que venham embora a fim de poder tirar a mesa.
TYRONE (em tom alegre, mas com um laivo de ressentimento na voz)
Certamente fazem alguma “conspiração”, e não querem que os ouça. Aposto como 
estão urdindo algum plano para extorquir dinheiro do “velho”!
(Mary não responde e permanece com a cabeça voltada em 
direção às vozes dos filhos. Suas mãos se movem inquietas 
sobre a mesa. Tyrone acende seu charuto, senta-se na cadeira 
16
de balanço à direita da mesa, e, com ar satisfeito, lança 
baforadas de fumo.)
TYRONE
Nada como o primeiro charuto que se fuma após o café da manhã, quando é de boa 
qualidade. E esse novo maço de charutos tem o sabor perfeito, ideal. Além do mais, 
foi uma pechincha. Comprei-os muito barato. Foi McGuire quem os conseguiu para 
mim.
MARY (com certo azedume)
Suponho que não lhe terá impingido, ao mesmo tempo, uma nova propriedade. Suas 
pechinchas em matéria de negócios não dão assim tão bom resultado!
TYRONE (na defensiva)
Não sou dessa opinião, Mary. Afinal de contas, foi ele quem me aconselhou a comprar 
aquela casa da rua Chestnut, e a revendi com um belo lucro.
MARY (sorrindo com zombeteiro afeto)
Bem o sei! A “famosa” oportunidadeque nunca se repete na vida... Certamente 
McGuire não sonhou sequer... (Acaricia a mão do marido.) Perdoa-me, James. Quem 
poderia convencê-lo de que não é um especulador astuto em negócios de bens?
TYRONE (com ar aborrecido)
Não se trata disso. Mas terra é sempre terra, e é mais seguro que os títulos e as ações 
dos vigaristas de Wall Street. (Em tom conciliador) É melhor que, tão cedo, não 
falemos de negócios.
(Há uma pausa. Tornam-se a ouvir as vozes dos filhos, e um 
deles tem acesso de tosse. Mary escuta com ar inquieto. Seus 
dedos tamborilam sobre o tampo da mesa, nervosamente.)
MARY
James, deveria passar um pito em Edmund, por não comer o suficiente. Apenas 
beliscou alguma coisa, além do café. Se não come, forçosamente se enfraquecerá. 
Repito-o sem cessar, mas ele me responde simplesmente que não tem fome. Com 
efeito, um forte resfriado de verão torna qualquer um inapetente.
TYRONE
É, é natural. Contanto que não se aflija...
MARY (rapidamente)
17
Oh! Não! Sei que Edmund, se tomar cuidado, estará restabelecido dentro de alguns 
dias. (Como se quisesse desviar o assunto, porém sem consegui-lo.) Mas é uma pena 
que tenha ficado doente... logo agora.
TYRONE
Sim, foi pouca sorte! (Olha-a de soslaio, inquieto.) Mas, não se preocupe com isso, 
Mary. Lembre-se de que deve também cuidar-se.
MARY (bruscamente)
Não me preocupo. Não há motivo para tal. Por que haveria de supor...
TYRONE
Por nada. Nestes últimos dias tenho notado que você anda um pouco nervosa.
MARY (com um sorriso forçado)
Verdade? Que absurdo, meu bem. É pura imaginação. (Com um ar bruscamente 
tenso) Não fique assim me observando a toda hora, James. Quero dizer — é isso que 
me irrita e me põe nervosa.
TYRONE (põe a mão sobre uma das de sua esposa, que novamente tamborilam sobre a 
mesa)
Vamos, vamos, Mary. Agora a culpa é da sua imaginação. Se a observo é apenas para 
admirar o quanto está roliça e bonita. (Bruscamente a emoção na sua voz trai um 
profundo sentimento.) Não imagina, querida, o quanto me sinto feliz ao vê-la assim, 
desde que você retomou a vida ao nosso lado. (Inclina-se e impulsivamente a beija. A 
seguir, volvendo o rosto, com um ar constrangido, acrescenta) Insista nesse esforço, 
Mary... por favor.
MARY (que afastou o rosto)
Eu o farei, querido. (Levanta-se com ar impaciente e caminha até as janelinhas da 
direita.) Por sorte, a neblina está se dissipando. (Volta-se) Esta manhã sinto-me mal-
humorada. Perturbou-me o sono essa horrível sirene que esteve apitando a noite 
inteira.
TYRONE
Sim, é como ter uma baleia ferida no pátio dos fundos! A mim, tampouco me deixou 
dormir.
MARY (achando graça e com ar afetuoso)
É mesmo?!! Você tem uma forma estranha de insônia! Roncava tanto, que eu não 
sabia distinguir os seus roncos dos apitos da sirene! (Aproxima-se rindo e lhe dá uma 
pancadinha afetuosa no rosto.) Nem mesmo dez sirenes bastariam para acordá-lo. 
Não tem nervos. Nunca os teve.
18
TYRONE (irritado na sua vaidade, com tom impertinente) 
 Que tolice! Sempre exagera ao falar de meus roncos!
MARY
Se pudesse ouvir a si mesmo... (Da sala de jantar chega um estalar de gargalhadas. 
Mary volta a cabeça, sorridente.) De que estão rindo tanto?
TYRONE (áspero)
De mim. Sou capaz de apostar. Sempre se riem às custas do “velho”.
MARY (com ar brincalhão)
Sim, todos nós o pirraçamos muito... não é assim? (Ri e acrescenta com ar satisfeito, 
de alívio.) Bem. Não sei se riem, mas de qualquer forma me alivia ouvir o riso de 
Edmund. Ele tem estado tão deprimido, ultimamente!
TYRONE (como se não tivesse ouvido essas últimas palavras, prossegue, ressentido.)
Apostaria como é alguma brincadeira de Jamie. Está sempre caçoando de alguém.
MARY
Vamos, não comece já a criticar o pobre do Jamie, meu bem. (Sem convicção alguma) 
Verá como ele acabará por ser um homem de verdade.
TYRONE
Pois que trate então de começar logo a sê-lo... Falta-lhe pouco para completar trinta e 
quatro anos.
MARY (ignorando essas palavras)
Meu Deus! Será que os rapazes pretendem ficar o dia todo na sala de jantar? (Vai até 
a porta da sala dos fundos e chama) Jamie? Edmund! Venham para cá, para que a 
Cathleen possa tirar a mesa. (Edmund responde: “Já vamos, mamãe”. E Mary 
retorna ao seu lugar primitivo.)
TYRONE (mal-humorado)
Sempre lhe achará desculpas, faça o que fizer.
MARY (sentando-se ao seu lado, acaricia-lhe a mão)
Silêncio.
19
(Entram os filhos de ambos, Jamie e Edmund, que vêm da 
sala dos fundos. Ambos sorriem, achando ainda graça no que 
os fez rir. Olham de esguelha para o pai, e seus sorrisos então 
se acentuam. Jamie, o mais velho, tem trinta e três anos. 
Herdou o físico do pai: largo de ombros e o tórax forte, mede 
uma polegada a mais de estatura e pesa menos, porém parece 
mais baixo e atarracado, porque lhe faltam o porte e o garbo 
de Tyrone. Não tem, tampouco, a vitalidade do pai. Notam-se 
nele sintomas de prematuro envelhecimento. Seu rosto ainda é 
belo, apesar dos evidentes vestígios nele deixados por uma 
vida de libertinagem, mas nunca teve a galhardia do pai, se 
bem que se pareça mais com este do que com a mãe. Tem uns 
lindos olhos pardos, cuja tonalidade oscila entre a cor mais 
clara dos olhos paternos e mais escura dos olhos de Mary. 
Seus cabelos começam a rarear e nele já desponta a calvície 
do pai. Tem um nariz acentuadamente aquilino, diverso dos 
demais membros da família. Junto á sua habitual expressão de 
cinismo, tal traço imprime ao seu semblante um caráter 
mefistofélico. Todavia, nas raras ocasiões em que sorri sem 
sarcasmo, pressentem-se em sua personalidade os ressaibos de 
um jovial encanto irlandês, romântico e irresponsável, o do 
tipo folgazão, simpático, dotado de um veio de poesia 
sentimental que atrai as mulheres e o torna popular entre os 
homens. Veste um blusão tipo americano, não tão gasto quanto 
o do pai, e colarinho e gravata. Sua pele, muito clara, está 
bronzeada e adquiriu uma tonalidade avermelhada, salpicada 
de sardas.
Edmund tem dez anos menos que o irmão. Leva-lhe de 
vantagem umas duas polegadas de estatura. É fraco e nervoso. 
Enquanto Jamie saiu ao pai e pouco se parece com a mãe, 
Edmund lembra a ambos, aproximando-se mais do tipo de 
Mary. Os grandes olhos escuros são o traço dominante de seu 
rosto alongado e enxuto. A boca denota a mesma 
hipersensibilidade da de Mary. Sua testa larga é a da mãe, 
ainda mais acentuada e traz o cabelo escuro, que o sol 
descolorou nas pontas, tornando-o avermelhado, bem 
penteado para trás. Mas tem o nariz paterno e seu rosto, de 
perfil, recorda o de Tyrone. As mãos de Edmund evocam, de 
maneira evidente, as da sua mãe — de dedos excepcional-
mente finos. Revelam até, em menor escala, o mesmo 
nervosismo. A semelhança de Edmund com a mãe afirma-se 
20
precisamente na extrema sensibilidade nervosa de ambos. É 
evidente que seu estado de saúde não é bom. Muito mais fraco 
do que deveria ser, tem os olhos febris e fundas as maçãs do 
rosto. Se bem que o sol lhe tenha tostado a pele até torná-la 
escura, sua tez ostenta uma lividez de pergaminho. Veste 
camisa, colarinho e gravata, e umas velhas calças de flanela. 
Não usa paletó. Nos pés calça sapatos com sola de borracha.)
MARY (voltando-se para ele, sorrindo, num tom jovial e um tanto forçado)
Caçoava de seu pai, por causa de seus roncos. (Dirigindo-se a Tyrone) Os filhos que o 
digam, James! Devem tê-lo ouvido. Não — você não, Jamie. Ouvi-o roncar na outra 
extremidade do corredor, quase tão ruidosamente como seu pai. É igual a ele. Mal 
encosta a cabeça no travesseiro e já adormece e nem dez sirenes despertá-lo-iam. 
(Interrompe-se bruscamente ao notar que Jamie a fita com mal-estar e um ar 
inquisitivo. Seu sorriso se esbate. Disfarçando) Por que me olha assim, Jamie? (Leva 
nervosamente as mãos ao cabelo.)Será que o meu cabelo está desarrumado? Custa-
me tanto agora penteá-lo devidamente. Minha vista está cada vez pior e nunca 
encontro meus óculos.
JAMIE (desviando o olhar, com ar de culpa)
Seu penteado está perfeitamente em ordem, mamãe. Eu pensava apenas no quanto 
você está bonita.
TYRONE (alegremente)
É justamente o que eu dizia, Jamie. Está tão atrevidamente gorda que breve não 
haverá meio de abraçá-la.
EDMUND
Sim, é certo que você está esplêndida, mamãe.
(Mary se tranqüiliza e sorri afetuosamente para o filho. Ele 
lhe pisca o olho, com um ar brincalhão.)
EDMUND
Quanto aos roncos de papai, dou-lhe toda razão. Senhor, que barulhão!
JAMIE
Também o ouvi. (Declama enfaticamente, como um ator dizendo uma citação)
“O Mouro... conheço o seu clarim!” 
(A mãe e o irmão riem.)
TYRONE (com ironia)
21
Se são necessários os meus roncos para que você se lembre de Shakespeare em vez de 
só pensar em programas de corridas, creio que é preferível que eu continue a roncar...
MARY
Vamos, James! não seja tão suscetível.
(Jamie dá de ombros e se senta à direita de sua mãe.)
EDMUND (com irritação)
Ora, papai. Pelo amor de Deus. Acabamos de tomar o café da manhã. Dê-nos uma 
trégua, sim? (Afunda-se na cadeira à esquerda da mesa junto ao irmão. Seu pai o 
ignora.)
MARY (em tom de reprovação)
Seu pai não o estava censurando. Não é preciso você estar sempre a tomar o partido 
de Jamie. É como se, dos dois, fosse você o mais velho e ele dez anos mais moço...
JAMIE (com enfado)
Para que tanto alvoroço? Esqueçamos isso!
TYRONE (desdenhosamente)
Sim, esqueçamos. Esqueçamos tudo! Não enfrentemos coisa alguma. É uma filosofia 
muito cômoda se não se tem ambição alguma na vida a não ser de...
MARY
James, por favor, cale-se. (Põe-lhe um braço em volta do ombro, persuasiva.) Você se 
deve ter levantado hoje da cama com o pé esquerdo. (Aos rapazes, mudando de 
assunto) De que é que vocês estavam rindo tanto quando entraram? Qual era a piada?
TYRONE (fazendo um visível esforço para se mostrar camarada) 
Sim, contem-nos o que era, rapazes! Disse à sua mãe que estava certo que a piada me 
dizia respeito. Mas, não importa. Já estou habituado.
JAMIE (em tom seco)
Não olhe para mim. Isso é com Edmund.
EDMUND (sorrindo)
Pensava contar-lhe ontem à noite, papai, mas esqueci de fazê-lo. Ontem, quando saí 
para dar uma voltinha, entrei num bar...
22
MARY (inquieta)
Não deveria beber agora, Edmund.
EDMUND (como se não a tivesse ouvido)
Sabem quem encontrei ali numa tremenda bebedeira? Shaughnessy, o arrendatário de 
sua granja...
MARY (sorrindo)
Aquele homenzinho horrível?! Mas é divertido.
TYRONE (de sobrecenho fechado)
Não é tão divertido assim quando acontece que se é o proprietário da fazenda. E é 
muito manhoso e maleável. De que é que ele se queixa agora, Edmund? Porque, sem 
dúvida, deve estar queixando-se de alguma coisa. Certamente quererá que lhe reduza 
o arrendamento. Já lhe alugo a granja por uma ninharia, só para ter alguém ali, e só 
me paga quando o ameaço de despejo.
EDMUND
Não, não se queixou de nada. Estava tão satisfeito da vida que até me pagou uma 
bebida, o que da parte dele é simplesmente inacreditável! Estava encantado de ter 
entrado em luta com o seu amigo Harker, o milionário da Standard Oil, vencendo-o 
gloriosamente!
MARY (com um ar de divertida consternação)
Oh! meu Deus, Jamie, vai ter que fazer alguma coisa.
TYRONE
É pouca sorte para Shaughnessy, de qualquer modo.
JAMIE (maliciosamente)
Aposto que da próxima vez que você encontrar Harker no clube e o cumprimentar 
com a habitual consideração, ele nem o olhará.
EDMUND
É isso mesmo. Não o considerará um cavalheiro, porque hospeda um arrendatário que 
não se humilha em presença de um “monarca yankee”.
TYRONE
Nada de expressões socialistas. Não me interessa ouvir...
MARY (com tato)
Continue contando, Edmund.
23
EDMUND (sorrindo de modo provocante para seu pai) 
Bem... Como você sabe, papai, a reserva de água de Harker fica junto à granja, e 
Shaughnessy cria porcos. Segundo parece, na cerca há uma brecha, e os porcos estão 
se banhando no tanque do milionário; e seu capataz disse a Harker que estava certo de 
que Shaughnessy tinha arrebentado de propósito a cerca para dar aos seus suínos um 
banho gratuito!
MARY (escandalizada, mas achando graça)
Meu Deus!
TYRONE (com uma amargura em que há um laivo de admiração)
E tenho certeza como de fato o velhaco assim o fez. Seria muito próprio dele.
EDMUND
E por causa disso Harker foi pessoalmente tomar satisfações de Shaughnessy. (Rindo) 
Uma idéia muito estúpida! Se ainda nos faltasse uma prova de que os plutocratas que 
nos governam — e sobretudo os que herdaram as suas fortunas — não são 
mentalmente uns gigantes, esta seria categórica.
TYRONE (admitindo-o sem refletir)
Sim, Harker não estaria à altura para vencer um Shaughnessy. (Como que caindo em 
si) Guarde suas malditas idéias anarquistas para si mesmo. Não as consinto em minha 
casa. (Porém a curiosidade transborda e ele indaga) Que aconteceu?
EDMUND
As probabilidades de vitória de Harker eram tantas corno as que eu poderia ter com 
um Jack Johnson. Shaughnessy tinha bebido a mais não poder, e o esperava no gradil 
a fim de lhe dar as boas-vindas. Contou-me que nem deu a Harker a oportunidade de 
abrir a boca. Começou logo por gritar-lhe que não era escravo da Standard Oil, para 
que esta o pisoteasse. Era um rei da Irlanda, já que tinha os seus direitos, e a gentalha 
para ele não passava mesmo de gentalha, por mais dinheiro que tivesse roubado aos 
pobres.
MARY
Oh! meu Deus. (Mas não pode reprimir o riso.)
EDMUND
Foi logo acusando Harker de ter ordenado ao seu capataz que derrubasse a cerca para 
atrair os porcos até o tanque e liquidá-los. Os pobres animais — gritou Shaughnessy 
— morreram de frio. Muitos se acabavam de pneumonia e outros estavam doentes de 
raiva, por ter bebido aquela água contaminada. Declarou a Harker que ia contratar um 
24
advogado para processá-lo por danos e prejuízos. E concluiu que já bastava ter que 
suportar em seu sítio a erva venenosa, os carrapatos, as serpentes e raposas, mas que 
era um homem honrado; que entre as granjas havia traçado uma linha divisória e que 
nem o diabo o levasse, não permitiria que um ladrão da Standard Oil o desrespeitasse. 
Em vista do que, pedia a Harker que tivesse a bondade de retirar aqueles pés imundos 
de suas terras, antes que lhe atiçasse o cachorro em cima. E Harker foi-se embora. 
(Ele e Jamie riem.)
MARY (escandalizada, porém rindo)
Oh! Céus, que língua terrível a desse homem.
TYRONE (num impulso de admiração)
Que malandro! Meu Deus, não há meios de dobrá-lo. (Ri — logo se interrompe 
bruscamente e franze o sobrolho.) Que canalha mais sujo. É capaz de me botar em 
apuros! Na certa lhe terá dito que eu ficaria indignado se...
EDMUND
Disse-lhe que a você entusiasmaria essa vitória irlandesa — e é assim mesmo. Deixe 
de comédias, papai.
TYRONE
Pois eu não estou nada entusiasmado.
MARY (zombeteira)
Está sim, James. Sinto-o completamente louco de alegria.
TYRONE
Não, Mary, uma brincadeira é uma brincadeira, mas...
EDMUND
Disse a Shaughnessy que devia lembrar a Harker que um milionário da Standard Oil 
devia saber muito bem o gosto de porco na sua água salgada, como um tempero 
adequado.
TYRONE
Para o inferno com a sua lembrança. (Franze a testa.) Não envolva nos meus assuntos 
suas nefastas idéias socialistas e anarquistas.
EDMUND
25
Shaughnessy quase se pôs a chorar, porque não lhe havia ocorrido dizer isso a Harker, 
mas prometeu incluí-lo numa carta que lhe está escrevendo, junto com outros insultos 
também esquecidos. (Ele e Jamie riem.)
TYRONE
De que você ri? Isto nada tem de engraçado. Que bom filho é quem ajuda a esse patife 
a me meter em apuros!
MARY
Vamos, James. Não perca a calma.
TYRONE (virando-separa Jamie)
E você é ainda pior do que ele, apoiando-o dessa maneira. Suponho que lamenta não 
ter estado presente para atiçar Shaughnessy, sugerindo-lheinsultos ainda mais 
causticantes! Tem talento para isso. Só para isso!
MARY
James! Não há motivo para censurar Jamie. (Jamie se prepara para dar ao pai uma 
resposta sarcástica, mas dá de ombros e se cala.)
EDMUND (repentinamente exasperado)
Oh! Papai, pelo amor de Deus. Se você vai começar de novo, vou-me embora. 
(Levanta-se de um salto.) De qualquer forma deixei o meu livro lá em cima. 
(Dirigindo-se para a sala da frente em tom aborrecido) Puxa, papai! Julguei que você 
se cansasse de dizer... (Desaparece. Tyrone o segue com o olhar irritado.)
MARY
Você não deve aborrecer-se com Edmund, James. Lembre-se de que ele está doente. 
(Ouve-se Edmund, que tosse enquanto sobe para o primeiro andar. Mary, nervosa, 
acrescenta) Esses resfriados de verão põem qualquer um irritadiço.
JAMIE (sinceramente preocupado)
Não é um simples resfriado. Ed está doente de verdade.
(O pai o fita com uma advertência no olhar, porém Jamie 
nem o nota.)
MARY (voltando-se para o filho, ressentida)
Por que diz isso? Não passa de um resfriado. Isso se pode ver logo. Sempre está 
imaginando coisas!
26
TYRONE (com outro olhar de advertência a Jamie, em tom casual)
Jamie quis apenas dizer que Ed talvez tenha alguma coisa a mais que lhe agrave o 
resfriado.
JAMIE
É claro, mamãe. Foi isto o que eu quis dizer.
TYRONE
O Dr. Hardy acredita que ele possa ter apanhado malária quando esteve nos trópicos. 
Caso seja assim, o quinino o porá bom em dois tempos.
MARY (por cuja fisionomia passa uma sombra de hostilidade e desdém)
O Dr. Hardy! Não creio numa só palavra que ele diga; nem que jure sobre uma pilha 
de Bíblias! Conheço bem os médicos! São todos iguais! Apelam para todos os meios, 
contanto que o doente os visite amiúde. (Cala-se bruscamente, nervosíssima, ao notar 
que os olhos do esposo e do filho estão fitos nela. Ergue as mãos ao cabelo, num 
gesto espasmódico, e sorri um sorriso forçado.) Que há? Que é que vocês estão 
olhando? Meu cabelo se...
TYRONE (abraçando-a com uma cordialidade exagerada e apertando-a de encontro a 
si como que de brincadeira)
Seu cabelo está impecável! Quanto mais saudável e mais gorda, mais vaidosa você 
fica! Breve passará a metade do dia enfeitando-se ao espelho!
MARY (em parte tranqüilizada)
Na verdade eu precisaria de uns óculos novos. Vejo tão mal agora...
TYRONE (com uma galanteria verdadeiramente irlandesa) 
Seus olhos são formosos, e bem o sabe.
(Beija-a. Um constrangimento tímido e encantador ilumina 
o rosto de Mary. De repente — surpreendentemente — assoma 
à sua fisionomia a garota de antigamente; não um espectro, e 
sim um ser cheio de vida.)
MARY
Não seja tolo, James. E logo em presença de Jamie!
TYRONE
27
Oh! Ele também a conhece. Sabe que todas essas preocupações com os seus olhos e 
cabelo são um mero pretexto para provocar elogios. Não é mesmo, Jamie?
JAMIE (cujo rosto também se aclarou e em cujo sorriso afetuoso ressurge a sedução 
infantil de antanho)
É sim. Você não nos pode enganar, mamãe.
MARY (ri, e sua voz trai um leve sotaque irlandês)
Vão passear, vocês dois! (Com uma solenidade de adolescente) Mas, no meu tempo, 
eu tive realmente um cabelo lindo, não é verdade, James?
TYRONE
O mais lindo deste mundo!
MARY
Era de um castanho avermelhado pouco comum, e tão comprido que chegava abaixo 
dos meus joelhos. Deve também se lembrar disso, não, James? Foi só depois do 
nascimento de Edmund que me apareceu o primeiro fio branco. E aí todo o meu 
cabelo começou a ficar branco... (A expressão de adolescente desaparece de seu 
rosto.)
TYRONE (prontamente)
E assim ainda ficou mais lindo do que nunca!
MARY (novamente encabulada e satisfeita)
Escute só o seu pai, Jamie... depois de trinta e cinco anos de casamento! Pra alguma 
coisa lhe serve ser um grande ator, hein? Que se passa com você, James? Elogia-me 
só porque caçoei dos seus roncos? Então retiro tudo o que disse... Vai ver que o que 
ouvi foi mesmo a sirene!!! (Ri e eles a acompanham na sua alegria. Numa transição 
brusca, Mary passa a falar em tom prático.) Não posso, porém, ficar mais tempo 
aqui, nem mesmo para ouvir elogios. Tenho que ir falar com a cozinheira e combinar 
com ela o jantar e as compras necessárias. (Levanta-se e suspira com exagero jovial.) 
Bridget é tão preguiçosa! É tão fingida! Começa logo por falar-me de todos os seus 
parentes para que eu não possa intercalar uma só palavra e repreendê-la! Bom! Mais 
vale que eu não dê importância a isso! (Caminha até a porta da sala de jantar, mas 
volta com um ar inquieto.) Não deve fazer o Edmund trabalhar com você no jardim, 
Jamie. Não o esqueça. (Na sua fisionomia reaparece um estranho ar de obstinação.) 
Não porque Ed não seja bastante robusto. Mas na certa transpiraria, e o seu resfriado 
poderia piorar.
(Sai pela sala dos fundos. Tyrone se vira para o filho com 
um ar reprovador.)
28
TYRONE
Seu estúpido! Não tem nenhum critério? Acima de tudo, o que é preciso evitar é dizer-
lhe algo que possa afligi-la ainda mais a respeito de Edmund!
JAMIE (dando de ombros)
Se você o prefere assim... Acho que seria melhor que mamãe não continuasse 
enganando-se a si própria. Será muito mais duro para ela, quando tiver que enfrentar a 
verdade. Você vê que deliberadamente ela se atordoa, falando num resfriado de verão. 
E, no entanto, sabe a verdade.
TYRONE
A verdade? Ninguém a sabe ainda.
JAMIE
Pois eu sei. Acompanhei Edmund na segunda-feira, quando foi ver o Dr. Hardy. Ouvi-
o aludir à malária. Insistiu que devia ser isso. Porém ele próprio não acredita no que 
diz. Você o sabe tão bem quanto eu, pois falou com o Dr. Hardy quando foi ao 
povoado, ontem... não é verdade?
TYRONE
Ele não me pôde afirmar coisa alguma com certeza. Deve telefonar-me hoje antes que 
Edmund vá vê-lo.
JAMIE (lentamente)
Hardy crê que seja tuberculose... não é assim, papai?
TYRONE (de má vontade)
Disse-me que podia ser isso.
JAMIE (comovido, sentindo aflorar-lhe ao peito o afeto pelo irmão)
Pobre rapaz! Que pouca sorte! (Volta-se para o pai com ar acusador.) Isso não teria 
acontecido se você o tivesse entregue às mãos de um médico de verdade, quando ele 
apareceu doente.
TYRONE
E o que há de errado em Hardy? Foi sempre o nosso médico aqui.
JAMIE
O que tem de errado? Tudo! Até neste miserável povoado o consideram um 
medicastro. É um vulgar charlatão!
TYRONE
29
Aí está... Despreza-o! Despreza todo mundo! Para você todos são uns impostores!
JAMIE (com desprezo)
Hardy cobra apenas um dólar! Por isso é que você o considera um bom médico!
TYRONE (atingido pela frase do filho)
Cale-se! Agora não está bêbedo! Não tem desculpa... (Dominando-se, na defensiva) 
Se insinua que não me posso permitir o luxo de chamar um desses médicos da alta 
sociedade que vivem de explorar os veranistas ricaços...
JAMIE
Que você não se pode permitir esse luxo?! Mas se você é um dos proprietários mais 
importantes da região...
TYRONE
Isso não significa que eu seja rico... Tenho tudo hipotecado.
JAMIE
Porque você continua a comprar novas terras em vez de pagar as hipotecas! Se 
Edmund fosse apenas um desses miseráveis acres de terra que você tanto cobiça, na 
certa estaria disposto a pagar qualquer preço.
TYRONE
Isso é falso! E seus sarcasmos contra o Dr. Hardy também são falsos! Hardy não se 
veste com requintes, nem tem consultório em bairro elegante, nem viaja em carro de 
luxo. Isso é o que custeamos, quando pagamos a um desses médicos figurões cinco 
dólares por uma consulta, e não a sua capacidade!
JAMIE (encolhendo os ombros num gesto de desdém)
Está bem, está bem! Perco meu tempo discutindo com você. Não adianta. “Não se 
pode tirar as manchas do leopardo.”
TYRONE (com crescente cólera)
Não, não se pode tirar... Essa lição eu a aprendi demasiado bem. Quanto a você, já 
perdi toda a esperança de que mude de pele! Você se atreve a me dizer, a mim, o que 
posso gastar? Não sabe o que vale um dólar, nem poderia saber. Jamais economizou 
um só! Nofim de cada temporada está sempre sem um centavo! Esbanja o seu salário 
semanal em uísque e prostitutas!
JAMIE
30
Meu salário, Deus meu!
TYRONE
Tem mais do que merece, e é graças a mim que o recebe. Se não fosse meu filho 
nenhum empresário lhe daria trabalho, tão lamentável é a sua reputação. Ainda tenho 
que me humilhar e mendigar um papel para você, dizendo que está regenerado, que 
agora é outro homem, embora saiba que tudo isso é falso!
JAMIE
Jamais quis ser ator. Você me obrigou a dedicar-me ao teatro.
TYRONE
Mente! Não queria outra coisa. Esperava que eu lhe conseguisse um emprego e bem 
sabe que só tenho influência no teatro. Diz que o obriguei. Não queria outra vida a 
não ser vagar pelos bares! Você se conformaria em passar o resto de sua existência 
preguiçosamente, e vivendo do meu dinheiro. Depois de tudo que gastei para o 
educar, só conseguiu foi ser expulso, de uma maneira desonrosa, de todos os colégios 
secundários que freqüentou!
JAMIE
Oh! por favor! Não desenterre essa velha história.
TYRONE
O fato de que tenha que voltar aqui cada verão para viver do meu dinheiro não é uma 
velha história.
JAMIE
Pago o teto e a comida, trabalhando no jardim. Assim lhe poupo um jardineiro.
TYRONE
Qual o quê! Até para isso quase preciso fustigá-lo. (Sua cólera se amaina e se dilui 
num queixume cansado.) Não me importaria em absoluto se ao menos sentisse de sua 
parte um pouco de gratidão. Mas só me agradece repetindo-me que sou um avaro 
repulsivo, fazendo pouco de minha profissão, caçoando de tudo que existe no 
mundo... exceto de si mesmo.
JAMIE (com um trejeito)
Isso não é verdade, papai. O que acontece é que você não me pode ouvir quando me 
censuro a mim mesmo.
TYRONE (olha-o com ar perplexo, e cita em tom maquinal)
 “Oh! ingratidão, a mais infame dentre todas as cizânias que se conhecem...”
31
JAMIE
Tinha certeza de que você viria com esse verso! Oh! Céus! quantos milhares de vezes 
deverei... (Interrompe a frase, cansado de discussão, e dá de ombros.) Está bem, 
papai. Sou um “boa-vida”. Sou tudo o que você quiser, contanto que ponhamos fim a 
esta discussão.
TYRONE (exortando-o, indignado)
Se ao menos fosse ambicioso, e não estúpido! Ainda é moço. Poderia destacar-se! 
Tem o talento necessário para ser um ator excelente. Tem-no de fato. É meu filho!
JAMIE (enfadado)
Esqueçamos a minha pessoa. O assunto não me interessa. Nem a você tampouco. 
(Tyrone cede. Jamie continua, em tom negligente) Como foi que começamos a falar 
de tudo isso? Ah! sim, referíamo-nos ao Dr. Hardy. Quando é que ele lhe telefonará 
para tratar do assunto de Edmund?
TYRONE
Ao meio-dia. (Pausa; na defensiva) Eu não poderia ter confiado Ed a um médico 
melhor. Hardy sempre o atendeu, desde garoto. Conhece como ninguém o seu 
organismo. Não é que seja tacanho, como pretende. (Com amargura) E o que poderia 
fazer por Edmund o melhor especialista dos Estados Unidos, agora que, 
deliberadamente, esbanjou a sua saúde com a vida absurda que tem levado desde que 
foi expulso da universidade?! Quando ainda estava na escola começou a viver assim, 
de modo imprudente e relaxado. Era o janota da Broadway, só para imitá-lo, embora 
não tivesse o seu organismo para poder suportar uma existência dessas! Você é um 
homenzarrão — sadio feito eu, ou pelo menos assim o fui na sua idade. Mas Edmund 
nunca passou de um feixe de nervos, tal qual a mãe! Durante anos e anos preveni-o de 
que seu corpo não poderia suportar uma vida daquelas, mas ele nunca quis me dar 
ouvidos, e agora é tarde demais.
JAMIE (asperamente)
Que quer dizer? Tarde demais por quê? Você fala como se acreditasse que...
TYRONE (num impulso de sua consciência que se sente culpada) 
Não seja idiota! Quis dizer apenas o que a todos é claro e evidente! A saúde de 
Edmund está abalada; e talvez durante muito tempo ele não passe de um inválido!
JAMIE (fita-o absorto, e comenta, ignorando a observação do pai)
Sei que os camponeses irlandeses crêem que a tuberculose é sempre fatal. E é 
provável que o seja de fato, quando se vive num casebre sobre um pântano; porém 
aqui, com um tratamento moderno.. adequado...
32
TYRONE
Acaso não o sei? Que disparates está dizendo aí? E não fale da Irlanda com essa 
língua suja, nem faça pouco de seus camponeses e casebres... (Em tom acusador) 
Quanto menos disser sobre a doença de Edmund, melhor será para a sua consciência! 
É mais culpado do que qualquer um!
JAMIE (ferido)
Isso é mentira! Não o admito, papai!
TYRONE
É a pura verdade! Exerceu sobre Edmund uma influência nefasta. Ao crescer, ele o 
admirava como a um herói! Que belo exemplo lhe oferecia! Que eu o saiba nunca lhe 
deu um só exemplo que não fosse péssimo. Fê-lo envelhecer prematuramente, 
entulhando-o do que crê ser a “sabedoria humana”; e isto quando Edmund ainda era 
jovem demais para compreender que era seu próprio fracasso que lhe envenenava a 
alma; que para você todo homem não passa de um canalha à venda e toda mulher de 
uma cretina ou uma prostituta.
JAMIE (defendendo-se novamente com uma espécie de indiferença e de cansaço)
Está bem. Sim; explicava a Edmund a verdade sobre os fatos da vida, mas somente 
quando o via excitado a ponto de fazer alguma asneira, e que sabia que ele zombaria 
de mim se eu tentasse dar-lhe um bom conselho... o tradicional conselho fraternal. 
Limitei-me a fazer dele um camarada, e fui absolutamente franco; para que dos seus 
erros ele tirasse a lição, e compreendesse que... (encolhe os ombros cinicamente) se 
não se pode ser um santo, ao menos deve-se ser cauteloso! (Seu pai respira 
fortemente, com desdém. Repentinamente, Jamie se sente comovido.) Sua acusação é 
absurda, meu pai. Você bem sabe tudo o que Ed significa para mim e a intimidade que 
sempré existiu entre nós dois... Não a que é usual entre irmãos... Eu faria tudo por ele.
TYRONE (impressionado, abranda-se)
Talvez tenha realmente acreditado que fosse para o seu bem, Jamie. Eu o sei. Não 
digo que o tenha feito de propósito, para prejudicá-lo.
JAMIE
Mesmo porque isso seria falso! Gostaria de ver alguém influir sobre Ed contra a sua 
vontade... Aquele seu jeito taciturno faz com que todos acreditem que podem manejá-
lo à vontade... Mas Edmund é muito esperto e só faz o que quer, e manda às favas 
todo o resto! Acaso tive alguma coisa que ver com as loucuras que andou praticando 
nesses últimos anos... correndo mundo como marujo, e tudo mais?!... A vida dele me 
parecia estúpida, e eu lho disse várias vezes! Acho que você bem pode calcular que 
não me agradaria muito permanecer encalhado na América do Sul, ou viver em 
33
tugúrios imundos, bebendo cachaça de má qualidade, não é verdade? Não, muito 
obrigado! Que me dêem a mim a Broadway e um apartamento com banheiro privado, 
e bares onde sirvam do melhor uísque, isso sim!
TYRONE
Você e a sua Broadway! Isso é o que faz de você o que é. (Com laivo de orgulho) 
Faça Edmund o que fizer, tem a coragem de seguir adiante, e não vem choramingar 
junto de mim, mal se encontra sem um centavo!
JAMIE
E por acaso não acaba sempre por regressar à casa sem dinheiro? E o que lucrou em ir 
para longe? Olhe para ele, como está agora! (Bruscamente envergonhado) Deus meu! 
Não tive a intenção de dizer o que disse... Foi indigno de minha parte.
TYRONE (ignorando as palavras do filho)
Edmund está fazendo progressos como jornalista. Julguei que ele tivesse, por fim, 
encontrado o emprego sonhado.
JAMIE (sarcástico e novamente enciumado)
Num jornaleco de um povoado insignificante! Ignoro que mentiras lhe são contadas, 
meu pai, mas o que me dizem a mim é que Ed não passa de um cronista muito 
folgado... Se ele não fosse seu filho... (Mais uma vez arrependido) Não, isto não é 
verdade! No jornal todos se alegram de tê-lo por companheiro e apreciam o material 
especializado que ele lhes proporciona. Alguns de seus poemas e paródias são 
realmente notáveis. (Novamente áspero) Masé claro que não será escrevendo coisas 
assim que ele chegará a grandes alturas. (Precipitadamente) Embora não haja dúvida 
de que começou com o pé direito.
TYRONE
Sim, começou bem. Costumava dizer sempre que queria ser jornalista, mas nunca se 
dispôs a começar desde o primeiro degrau.
JAMIE
Ora, papai! Pelo amor de Deus! Deixe-me em paz!
TYRONE (olha-o fixamente e logo desvia o olhar, e diz depois de uma pausa)
Que azar que Edmund tenha ficado doente precisamente agora! Isso não poderia ter 
acontecido em pior ocasião. (Acrescenta, sem conseguir disfarçar um certo mal-estar, 
quase furtivo) Nem para sua mãe tampouco. É terrível que isso a venha transtornar, 
logo agora, quando mais necessita de paz e despreocupação. Estava tão bem quando 
voltou há dois meses. (Sua voz torna-se trêmula e rouca.) Foi então o paraíso para 
mim. Esta casa tornou a ser um lar... Mas não preciso dizer-lhe isso, Jamie.
34
(Pela primeira vez, o filho o fita com simpatia e 
compreensão. Dir-se-ia que entre ambos acaba de surgir um 
sentimento comum no qual o velho antagonismo poderia ser 
olvidado.)
JAMIE (suavemente)
Sinto o mesmo, pai.
TYRONE
Sim. Desta vez, você deve ter notado como ela se mostra forte e segura de si. E uma 
mulher completamente diferente. Domina seus nervos, ou pelo menos os dominava 
até que Ed apareceu doente. Agora, sente-se nela a tensão e o medo que procura a 
todo custo reprimir. Oxalá pudéssemos ocultar-lhe a verdade, mas isso será 
impossível se tivermos que enviar Ed para um sanatório. O que agrava ainda mais a 
situação é que o pai de Mary morreu tuberculoso. Ela o adorava e nunca o esqueceu. 
Sim, vai ser duro para ela. Mas poderá reagir. Tem agora a força de vontade 
necessária. Devemos ajudá-la de todas as formas possíveis, Jamie!
JAMIE (comovido)
Naturalmente, papai. (Hesitante) A não ser os nervos, parecia estar muito bem esta 
manhã.
TYRONE (já com renovada confiança)
Nunca esteve melhor! Transborda de alegria e malícia. (Repentinamente franze o 
sobrecenho, olhando para Jamie.) Por que diz “parecia”? Por que não há de estar 
muito bem? Que diabo quer insinuar?!
JAMIE
Não me provoque mais, pai. Num assunto desta natureza, deveria ser possível 
falarmos, um com o outro, com franqueza e sem discutir.
TYRONE
Desculpe, Jamie. (Com voz tensa) Mas, vamos.. diga-me.
JAMIE
Nada tenho a dizer-lhe. Estava enganado, pronto! Referia-me, apenas, a esta última 
noite. Bem... você sabe como são essas coisas. Não consigo esquecer o passado. Nem 
dominar as minhas suspeitas. Como você o faz... (Com amargura) E isto é terrível.. é 
terrível também para mamãe! Ela sente que a observamos...
35
TYRONE (sombriamente)
Eu sei!! (Novamente tenso) E depois? Não pode falar claro por uma vez?
JAMIE
Mas se lhe afirmo que não há nada... E só essa minha maldita estupidez! Acordei hoje 
às três horas da madrugada e a ouvi caminhar para o quarto de hóspedes. A seguir foi 
ao banheiro. Fingi que dormia. Mamãe parou no corredor e ficou à espreita, como se 
quisesse ter certeza de que eu estava realmente dormindo.
TYRONE (fingindo não dar importância)
Ora! Céus! e é só isso? Ela mesma me disse que a sirene a havia despertado — e, 
desde que Edmund ficou doente, passa as noites subindo e descendo as escadas para 
ver como ele está.
JAMIE (com veemência)
É isso mesmo! Fica de ouvido colado à sua porta, escutando. (De novo vacilante) O 
que me assustou foi o fato de ela ter ido ao quarto de hóspedes. Lembrei-me de que, 
sempre que ela começa a querer dormir sozinha ali, é sinal de que...
TYRONE
Pois, desta vez, não se trata disso! E a explicação é muito simples. Aonde irá ela, à 
noite, para fugir dos meus roncos?! (Entrega-se a um acesso de cólera e de 
ressentimento.) Meu Deus! Não entendo como pode viver com uma mentalidade 
dessas, vendo sempre os motivos piores atrás de tudo o que acontece.
JAMIE (irritado)
Não me venha com suas críticas. Já lhe disse que me enganara. Não creia que isso me 
alegra tanto quanto o pensa.
TYRONE (apaziguador)
Tenho certeza de que no fundo é como diz, Jamie. (Pausa. Sua expressão torna-se 
cada vez mais preocupada. Fala lentamente, com um terror supersticioso.) Seria uma 
fatalidade se ela não pudesse evitar que a sua preocupação por Edmund... Foi quando 
esteve muito doente, logo após o nascimento de Ed que ela, pela primeira vez...
JAMIE
Mamãe não teve culpa nenhuma nisso!
TYRONE
Não a estou culpando.
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JAMIE (sarcástico)
Então, a quem é que você culpa? A Edmund por ter nascido?!
TYRONE
Seu estúpido! Ninguém teve culpa!
JAMIE
O único culpado foi aquele médico velhaco. A julgar pelo que mamãe conta, não 
passava de um charlatão vulgar, tal qual Hardy! Você não lhe quis pagar um médico 
de primeira...
TYRONE
Mente! (Furioso) Então eu é que tenho a culpa, hem! É aí que quer chegar, não é 
assim, seu vagabundo maldito?!
JAMIE (em tom de advertência, ouvindo sua mãe mover-se na sala de jantar)
Shss!
(Tyrone se levanta rápido e fica olhando para fora pela 
janela da direita. Jamie muda por completo de assunto.)
JAMIE
Bem. Se temos que recortar a sebe ali na frente, é melhor que comecemos logo. 
(Entra Mary que vem da sala de espera. Olha para ambos rapidamente, com ar de 
suspeita. Seus gestos são nervosos e pouco naturais.)
TYRONE (afastando-se da janela, e falando com a máxima naturalidade)
É sim. A manhã está linda demais, para que se fique em casa a discutir. Espie pela 
janela, Mary. Não há mais névoa no porto. Parece-me que o manto que se abatera 
sobre a cidade se dissipou.
MARY (aproximando-se)
Assim o espero, meu querido. (A Jamie, esforçando-se por sorrir) Ouvi quando 
sugeria ir trabalhar na sebe, Jamie. É de assombrar! Deve estar muito precisado de 
dinheiro, não, meu filho?
JAMIE (em tom brincalhão)
Quando é que não estou? (Pisca-lhe o olho e olha com ar de zombaria para o pai.) 
Espero receber pelo menos o soldo de cabo raso em fim de semana... e ir gastá-lo 
todinho na farra!
37
MARY (a alegria de Jamie parece nela não encontrar eco — suas mãos vão ajeitando a 
parte da frente do vestido)
Sobre que assunto vocês dois discutiam?
JAMIE (dando de ombros)
Os mesmos assuntos de sempre.
MARY
Ouvi que falava de um médico, e seu pai o acusava de ser maldoso.
JAMIE (apressadamente)
Ah, isso?! Eu estava dizendo que, para mim, o Dr. Hardy não era o melhor médico do 
mundo!
MARY (sente que Jamie está mentindo e replica num tom indeciso)
Oh! Não! Certamente que não é! Sou da mesma opinião. (Mudando de assunto, com 
um sorriso forçado) Essa tal de Bridget! Julguei que nunca me livraria dela! Contou-
me toda a vida de seu primo-irmão que trabalha na polícia de Saint Louis. (Nervosa e 
irritada) Pois bem. Se estava disposto a trabalhar na cerca, por que não vai de uma 
vez? (Precipitadamente) Aproveite o sol antes que volte a neblina. (Num tom 
estranho, como se falasse consigo mesma.) Sei, porém, que voltará... (De repente 
adivinha que ambos a olham fixamente e diz, nervosamente, agitando as mãos) Ou 
antes: quem o sabe é o reumatismo das minhas mãos. Prevê melhor o tempo do que 
você, James. (Contempla absorta suas próprias mãos como que possuída de uma 
repulsa que, ao mesmo tempo, a fascina.) Oh! como estão feias as minhas mãos! 
Quem poderia crer que já foram lindas?
(Eles a fitam, absortos, por sua vez, com um temor 
crescente.)
TYRONE (segura-lhe as mãos e as abaixa com carinho)
Vamos, vamos, Mary. Deixe de tolices. São as mãos mais encantadoras deste mundo! 
(Ela sorri, seu rosto se ilumina, e beija-o agradecida. Ele se volve para o filho.) 
Vamos andando, Jamie. Sua mãe tem razão de nos censurar. A única maneira de se 
começar a trabalhar é começar de fato a trabalhar! O sol ardente fará com que 
transpire e derretera um pouco toda essa banha que tem na barriga!
(Abre a porta telada, sai para o pátio e desce por uma 
escadinha ao jardim. Jamie se levanta, tira o paletóe vai até a 
porta. No batente volta-se; porém evita olhar para a sua mãe. 
Ela tampouco o encara.)
38
JAMIE (com uma ternura inquieta e desajeitada)
Todos nos orgulhamos de você, mamãe. Você nos torna tão felizes! (Ela se vira para 
ele, rígida, e o encara num desafio assustador. Ele continua num tom hesitante.) Mas 
você ainda deve tomar cuidado. E não se inquietar tanto por Edmund. Ele se há de 
curar...
MARY (com um olhar carregado de ressentimento)
É claro que se há de curar. E não sei o que você quer insinuar ao dizer-me que tenha 
cuidado...
JAMIE (magoado, encolhendo os ombros)
Está bem, mamãe. Lamento ter falado.
(Sai para o pátio. Ela espera, rígida, até que ele 
desapareça. A seguir deixa-se cair na cadeira em que Jamie 
estava sentado. Sua fisionomia revela um desespero assustado, 
e suas mãos correm sobre a mesa, mudando os objetos de 
lugar, sem finalidade alguma. Escuta os passos de Edmund 
que desce. Ao chegar ao pé da escada, tem um acesso de tosse. 
Ela se ergue de um salto como se quisesse fugir de tal som e 
caminha, rápido, até a janela da direita. Olha para fora, 
aparentemente serena, quando ele entra, vindo da sala da 
frente, com um livro na mão. Mary volta-se para o filho. Nos 
seus lábios há um sorriso maternal de boas-vindas.)
MARY
Ah! era você? Ia justamente subir para vê-lo.
EDMUND
Esperei que eles saíssem. Não quero envolver-me em discussões. Sinto-me mal, muito 
mal.
MARY (como que com ressentimento)
Oh! estou certa de que exagera! É tão garoto ainda! Gosta de nos afligir para que nos 
preocupemos com você. (Precipitadamente) Estou caçoando, meu filho. Compreendo 
como você deve sentir-se mal. Mas hoje está melhor, não é verdade? (Inquieta, 
segura-lhe o braço.) De qualquer modo, está muito fraco. Precisa descansar o mais 
possível. Sente-se que o ajeitarei confortavelmente. (Edmund senta-se na cadeira de 
balanço e sua mãe coloca-lhe uma almofada por trás das costas.) Assim; que tal está 
agora?
39
EDMUND
Ótimo! Obrigado, mamãe.
MARY (beijando-o com ternura)
Só precisa de uma coisa: é que sua mãe cuide de você. Com todo esse tamanho, 
continua sendo o garoto da família... não é isso mesmo?
EDMUND (segurando-lhe a mão, profundamente sério)
Não pense em mim. Cuide de si própria. Isto é o que importa.
MARY (desviando o olhar)
Mas eu o faço, querido. (Com um riso forçado) Meu Deus! não vê como engordei? 
Vou ter que alargar todos os meus vestidos. (Vira-se e caminha até as janelas da 
direita. Toma um tom frívolo e alegre.) Já começaram a podar a sebe. Pobre Jamie! 
Como o aborrece ter que trabalhar na frente da casa, onde pode ser visto por todos os 
que passam! Lá vão os Chattfield na sua Mercedes nova. Que lindo carro, não acha? 
Não é como o nosso Packard de segunda mão. Coitado do Jamie! Agachou-se atrás da 
cerca para que não o vejam! Os Chattfield cumprimentam seu pai, e este lhes 
responde como se o pano de fundo do teatro se abrisse e ele aparecesse para receber 
os aplausos! E veste aquela roupa velha e surrada que tentei por todos os meios fazê-
lo pôr de lado. (Percebe-se amargura na sua voz.) James deveria ter mais amor-
próprio e não dar tais espetáculos!
EDMUND
Qual! Papai faz muito bem em não se preocupar com a opinião alheia. E Jamie é um 
tolo de dar tanta importância aos Chattfield. Por Deus! quem jamais ouviu falar neles 
fora desse vilarejo?
MARY (com satisfação)
Ninguém. Tem toda a razão, Edmund. Não passam de “grandes sapos num pequeno 
charco”. Jamie é um tolo. (Interrompese enquanto olha pela janela, e logo à seguir 
continua, com um travo de inveja e insatisfação.) Contudo, os Chattfield, e toda a 
gente como eles, significam algo. Possuem casas decentes, de que não têm que se 
envergonhar. E amigos a quem recebem e que por sua vez os convidam. Não vivem 
isolados de todos. (Afasta-se da janela.) Não é que me interessam. Sempre odiei esse 
povoado e seus habitantes. Bem o sabe. Eu não queria viver aqui, mas seu pai 
agradou-se do lugar, insistiu em edificar esta casa, e agora tenho que vir todos os 
verões.
EDMUND
40
Bem... É sempre preferível do que passá-los num hotel de Nova York... não é 
verdade? E este lugarejo não é assim tão ruim. Agrada-me bastante. Talvez porque 
seja o único lar que já tivemos.
MARY
Esta casa nunca me pareceu um lar. Desde o inicio foi um fracasso! Tudo foi feito 
com a maior economia possível. Seu pai não quis gastar o necessário para pô-la em 
condições. É melhor que não tenhamos feito amizades por aqui. Eu me envergonharia 
se atravessassem o limiar de nossa porta. A James nunca lhe agradaram os amigos da 
família. Aborreceu-o sempre visitá-los ou recebê-los. Só lhe agrada acotovelar-se com 
homens no clube ou em algum bar. Jamie e você são como ele, mas a culpa não lhes 
cabe. Aqui nunca tiveram oportunidade de conhecer gente decente. Não seriam o que 
são se tivessem lidado com moças direitas, em vez de farrear com... Nunca se teriam 
desonrado dessa maneira... a tal ponto que nenhum pai respeitável permite a sua filha 
que apareça em público com vocês.
EDMUND (com irritação)
Ora, mamãe. Esqueça isso. E que importância tem? Se fosse assim, Jamie e eu 
morreríamos de tédio! E quanto ao velho... de que adianta falar?... não podemos 
mudá-lo.
MARY (censurando-lhe as palavras mecanicamente)
Não chame seu pai de velho. Seja mais respeitador. (Com tristeza na voz) 
Compreendo que é inútil falar. Mas às vezes sinto-me tão só.
EDMUND
De todos os modos você deve ser justa. Talvez a culpa a princípio tenha sido mesmo 
somente dele, de papai, mas você bem sabe que depois, mesmo que ele o tivesse 
aceito, não poderíamos receber gente aqui.. (Hesita, com ar culpado.) Quero dizer... 
você seria a primeira a não receber ninguém.
MARY (tem um sobressalto e seus lábios tremem de modo lastimável)
Não diga isso. Magoa-me quando o recorda.
EDMUND
Não leve a mal! Por favor, mamãe, estou tratando de ajudá-la. Porque não convém 
que você se esqueça... É preciso que você se lembre. Sempre... para estar de guarda... 
Você sabe o que já passou. (Com um ar desolado) Deus meu! Você deve compreender 
41
o quanto sofro ao fazê-la recordar tudo isso! Faço-o porque tem sido maravilhoso tê-
la novamente em casa, e seria tremendo...
MARY (aborrecida)
Por favor, querido. Sei que a sua intenção é das melhores, mas... (Na sua voz 
reaparece o mal-estar com que pretende proteger-se) Não compreendo por que diz de 
repente coisas assim. Por que lhe ocorrem essas idéias hoje?
EDMUND (evasivamente)
Por nada. Talvez porque me sinta desanimado e triste.
MARY
Diga-me a verdade. A propósito de que essa repentina desconfiança?
EDMUND
Mas não existe desconfiança alguma.
MARY
Oh! sim, bem que a pressinto. Seu pai e Jamie também desconfiam de mim... 
sobretudo Jamie.
EDMUND
Vamos! Não comece a imaginar coisas, mamãe.
MARY (suas mãos se agitam nervosamente)
A vida toma-se muito mais penosa quando se vive numa atmosfera de constantes 
suspeitas, sabendo que todos são levados a espionar-nos e ninguém confia em nós.
EDMUND
Isto é absurdo, mamãe. Todos confiamos em você.
MARY
Se ao menos eu tivesse para onde fugir por um dia ou uma tarde sequer... Uma amiga 
com quem falar... Oh! sobre nada de sério... apenas para rir e conversar e esquecer por 
algum tempo... alguém que não fosse essa empregada... essa pobre estúpida Cathleen.
EDMUND (inquieto, levanta-se e passa-lhe o braço em volta dos ombros)
Chega, mamãe, você se irrita sem motivo.
42
MARY
Seu pai sai. Encontra-se com os amigos no bar ou no clube. Você e Jamie também têm 
amigos e saem pelo seu lado. Mas, eu fico só — sempre tenho estado só.
EDMUND (em tom tranqüilizador)
Ora, mamãe, você bem sabe que isso não é verdade. Um de nós fica sempre com você 
ou a acompanha quando você dá um passeio de carro.
MARY (com amargura)
Porque receiam deixar-me a sós. (Voltando-se comaspereza) Insisto em que me diga 
por que agiu de uma maneira tão estranha na manhã de hoje... por que se achou na 
obrigação de me recordar...
EDMUND (hesita e se desabafa com ar de culpa)
É tolice, bem sei. Eu não estava dormindo a noite passada quando você entrou no meu 
quarto... E você não voltou ao seu quarto — aquele em que dorme com papai, e 
passou o resto da noite no de hóspedes.
MARY
Porque os roncos de seu pai me enlouqueciam! Pelo amor de Deus! Por acaso já não 
tenho dormido muitas vezes no quarto de hóspedes?... (Com amargura) Ah! mas já 
sei, já compreendo o que pensou... Foi então que...
EDMUND (com uma veemência exagerada) 
Não pensei nada!
MARY
Mas fingia dormir, para espionar-me melhor!
EDMUND
Não! Não! Eu o fiz porque se você descobrisse que eu estava com febre e não 
conseguia conciliar o sono, ainda ia afligir-se e contrariar-se!
MARY
Sem dúvida!... e Jamie também fingia dormir, e seu pai...
43
EDMUND
Basta, mamãe.
MARY
Oh! Não posso suportar que até você... (Ergue nervosamente as mãos ao cabelo para 
ajeitá-lo no seu gesto habitual, mecônico e ausente. De improviso, uma estranha 
expressão de vingança se insinua na sua voz.) Vocês bem mereciam que fosse 
verdade!
EDMUND
Mamãe! Não diga isto! Você fala assim quando...
MARY
Chega de suspeitas! Por favor, meu filho! Magoa-me assim. Eu não podia dormir 
porque pensava em você. Essa é a verdadeira razão. Desde que ficou doente, vivo tão 
preocupada... (Envolve-o com os braços e o estreita contra si com carinho protetor e 
ao mesmo tempo temeroso.)
EDMUND (num tom tranqüilizador)
Que tolice! Você bem sabe que isso não passa de um resfriado de verão, desses 
resfriados rebeldes...
MARY
Sim, naturalmente eu o sei.
EDMUND
Mas, escute-me, mamãe. Prometa-me que, mesmo que isto se transforme em alguma 
coisa de pior, você pensará que breve estarei curado, sem viver consumindo-se de 
aflição, e continuará a se tratar.
MARY (com temor)
Não quero ouvi-lo quando diz tolices. Não há motivos para que fale como se 
esperasse algo de terrível. Claro que lhe prometo! Dou-lhe a minha palavra de honra. 
(Com triste amargura) Mas, sem dúvida, recordará que essa palavra eu já a dei outras 
vezes.
EDMUND
Não.
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MARY (sua amargura se abranda até se transformar em resignada impotência)
Não o culpo, meu filho. Como poderia evitá-lo? Como conseguiríamos esquecer? 
(Com um ar estranho) É por isso que tudo se nos torna tão difícil... Não podemos 
esquecer.
EDMUND (agarrando-a pelo ombro)
Mamãe! Chega!
MARY (com um sorriso forçado)
Bem, querido! Não queria ser tão lúgubre assim! Não faça caso de mim... Venha, 
deixe-me tocar-lhe a cabeça. Mas... está tão fresca! Agora não tem febre...
EDMUND
Esqueça isso, mamãe. É você que...
MARY
Mas eu me sinto perfeitamente bem, meu querido. (Lançando-lhe um olhar rápido, 
estranho, quase tímido e ao mesmo tempo calculador) Só que, naturalmente, na 
manhã de hoje, depois de ter passado uma noite tão ruim, estou cansada e nervosa. Na 
verdade, deveria dormir um pouco até a hora do almoço. (Ele a fita com instintiva 
suspeita. Logo, porém, envergonhado de si mesmo, afasta rapidamente o olhar. Ela 
prossegue, nervosamente.) Que é que vai fazer? Ler um pouco aqui? Seria tão melhor 
que fosse tomar um pouco de ar e sol. Mas não se exponha demais. Para maior 
precaução, ponha um chapéu. (Interrompe o que está dizendo e o fita nos olhos. Ele 
foge ao seu olhar. Há uma pausa tensa. Logo a seguir, Mary fala em tom irônico.) Ou 
será que receia deixar-me só?
EDMUND (torturado)
Não! Não fale assim. Você deveria dormir um pouco. (Caminha até a porta telada e, 
num tom afetadamente jovial) Vou descer para ajudar Jamie a passar aquele mau 
pedaço. Gosto de ficar estendido na sombra e vê-lo trabalhar!
(Ri com esforço e ela o imita. Edmund sai logo para o 
patamar e desce a escadinha. A primeira reação de Mary é de 
alívio, e ela parece relaxar-se. Deixa-se cair numa das 
poltronas de vime que se acham por trás da mesa e joga a 
cabeça para trás, fechando os olhos. Porém sua tensão logo 
após reaparece. Abre os olhos e se inclina para a frente, num 
acesso de pânico nervoso. Começa a travar sua desesperada 
luta consigo mesma. Seus longos dedos deformados, de 
nódulos inchados pelo reumatismo, tamborilam sobre os 
45
braços da poltrona, como que impulsionados por uma vida 
própria, insistente, e que prescinde de seu consentimento.)
FIM DO ATO I
ATO II
CENA 1
Cenário: O mesmo; aproximadamente à uma hora menos 
um quarto. O sol agora não entra pelas janelas da direita. O 
dia ainda está bonito, porém cada vez mais sufocante, com 
uma leve cerração que paira no ar, amortecendo o brilho do 
sol. 
Edmund, sentado na poltrona que está à esquerda da mesa, 
lê um livro. Ou, antes, tenta concentrar-se na leitura do 
mesmo, sem, todavia, consegui-lo. Dir-se-ia que presta 
atenção a qualquer ruído que venha do primeiro andar. Seus 
gestos são nervosamente apreensivos, e parece ainda mais 
enfermo do que no ato precedente. Cathleen, a empregada, sai 
da sala dos fundos. Traz uma bandeja com uma garrafa de 
uísque e um jarro de água gelada. É uma robusta camponesa 
irlandesa, de vinte e poucos anos e rosto rechonchudo, de ar 
agradável, olhos azuis e cabelos negros. É amável, ignorante, 
desajeitada e dotada de uma estupidez integral, mas bem 
intencionada. Põe a bandeja sobre a mesa. Edmund pretende 
estar tão absorto na sua leitura que não se apercebe de sua 
presença, mas ela finge não reparar nisso.
CATHLEEN (com uma familiaridade loquaz)
Aqui está o uísque. Falta pouco para o almoço. Devo chamar o seu pai e o Sr. Jamie 
ou o senhor mesmo o fará?
EDMUND (sem erguer os olhos) 
Você pode chamá-los.
46
CATHLEEN
Por que seu pai não olha para o relógio de vez em quando? É o diabo em pessoa para 
atrasar as refeições e Bridget começa logo a me amaldiçoar, como se eu tivesse culpa! 
Contudo, o Sr. James é um homem e tanto, apesar da idade! O senhor nunca será 
bonitão como ele, nem o Sr. Jamie tampouco! (Ri.) Apostaria como o Sr. Jamie não 
perderia a oportunidade de interromper o trabalho para tomar o seu uísque, se tivesse 
um relógio para ver as horas.
EDMUND (renuncia à sua simulação, e sorri) 
E ganharia a aposta!
CATHLEEN
E vou ganhar mais outra ainda: é que o senhor me mandou chamá-los, de modo que 
possa tomar, às escondidas, o seu traguinho, antes que eles venham!
EDMUND
Ora veja! E eu que não tinha pensado nisto...
CATHLEEN
Ah! não?! Vamos, Sr. Edmund! Mal eu virasse as costas...
EDMUND
Mas, já que você me deu a idéia...
CATHLEEN (repentinamente pudica e virtuosa)
Eu nunca sugeri a um homem ou a uma mulher que tocasse em bebida alguma, Sr. 
Edmund. Foi isso o que matou um tio meu lá na Irlanda... (Abrandando-se) Mas é 
certo que um calicezinho de vez em quando não faz mal a ninguém, especialmente 
quando se está deprimido ou resfriado.
EDMUND
Obrigado por me ter fornecido uma boa desculpa. (Com forçada despreocupação) É 
melhor chamar também mamãe.
CATHLEEN
Para quê? Ela sempre vem na hora, sem que seja preciso chamá-la. Graças a Deus, 
aquela tem um pouco de consideração pelos empregados.
47
EDMUND
Mas é que ela está dormindo.
CATHLEEN
Não estava dormindo não, quando terminei a arrumação lá em cima. Estava recostada 
no quarto de hóspedes, com os olhos bem abertos. Disse-me que tinha uma terrível 
enxaqueca.
EDMUND (esforçando-se sempre mais por parecer despreocupado)
Bom, nesse caso chame somente papai.
CATHLEEN (indo até a porta telada e resmungando, mas com bonomia)
Não é à toa que todas as noites estou descadeirada! Não vou sair lá fora com este 
calor para me expor a uma insolação. Vou chamá-los daqui mesmo da entrada. (Sai 
pelo pórtico lateral, fechando com violência a porta telada, e vai até o hall da frente. 
Ao cabo de um momento, ouve-se a sua voz chamando) SenhorTyrone, Senhor Jamie! 
Já está na hora!
(Edmund, cujo olhar fixo revela temor, pondo de lado o 
livro, ergueu-se de um salto)
EDMUND
Oh! Senhor, que mulherzinha intolerável!
(Agarra a garrafa de uísque, serve-se de uma dose, 
acrescenta-lhe água gelada e bebe. Enquanto o faz, ouve 
alguém que entra pela porta principal. Precipitadamente, 
Edmund deposita o copo sobre a bandeja, torna a sentar-se e a 
abrir o livro. Jamie entra, vindo da sala da frente, trazendo o 
paletó no braço. Retirou o colarinho e a gravata e os tem na 
mão. Seca com um lenço o suor que lhe escorre da testa. 
Edmund ergue os olhos como se lhe tivessem interrompido a 
leitura. Jamie olha para os copos e a garrafa de uísque e, 
cínico, sorri.)
JAMIE
Pelo que vejo, anda bebendo um golezinho às escondidas, hem? Chega de comédias, 
Ed. Como ator você ainda é pior do que eu.
EDMUND (sorri)
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Sim, bebi enquanto podia fazê-lo.
JAMIE (pondo-lhe afetuosamente a mão sobre o ombro)
Antes assim. Por que haveria de me enganar? Por acaso não fomos sempre 
camaradas?
EDMUND
Não sabia quem era que vinha entrando.
JAMIE
Recomendei ao velho que consultasse as horas no seu relógio. Já estava a meio 
caminho quando Cathleen começou a chamar. Essa nossa selvagem andorinha 
irlandesa! Deveria antes ser um apregoador de trens!
EDMUND
Foi por isso que bebi. Por que não toma também um gole enquanto tem oportunidade?
JAMIE
Estava pensando justamente nisso. (Dirige-se apressado até a janela da direita.) 
Deixei papai conversando com o velho capitão Turner. E ainda estão lá os dois. (Volve 
até a mesa e bebe.) Agora é tratar de ocultá-lo de seu olhar de águia! (Como de 
hábito, grava na memória o nível de uísque na garrafa após cada dose. Calcula 
então duas medidas de água, derrama-as na garrafa e agita esta.) Pronto! Assunto 
resolvido! (A seguir põe água nos copos e os deixa sobre a mesa junto ao irmão.) E aí 
está a água que você está bebendo...
EDMUND
Está bem! Mas você não pensa, porventura, conseguir engana-lo, não é?
JAMIE
Talvez não, porém ele não o poderá provar. (Põe o colarinho e a gravata.) Espero que 
o velho não esqueça a hora do almoço, tão enlevado está em ouvir falar de si mesmo. 
Estou com fome. (Sentando-se á mesa defronte de Edmund, num tom de irritação) Por 
isso é que me aborrece trabalhar na cerca. O velho leva a representar uma comédia 
para cada imbecil que passa.
EDMUND (desanimado)
Tem fome? Que felizardo! No meu estado de espírito tanto se me dava nunca mais 
comer!
49
JAMIE (olhando-o preocupado)
Escute, rapaz. Você me conhece, nunca fui de sermões, mas o Dr. Hardy tinha razão 
quando recomendou que você suprimisse o uísque.
EDMUND
Oh! Já basta ter que fazê-lo logo mais à tarde, quando o Dr. Hardy me der a notícia má 
que me espera! Até lá, uns tragos a mais ou a menos não têm importância alguma.
JAMIE (hesitante, lentamente)
Prefiro que tenha o ânimo preparado para as más notícias. Assim o choque não será 
tão fone. (Observa que Edmund o olha fixamente.) Quero dizer que seu estado inspira 
cuidados e não seria conveniente que se iludisse.
EDMUND (nervoso)
Mas não me iludo. Sinto-me mal e sei que a febre e os calafrios que tenho à noite são 
sintomas sérios. Creio que a última hipótese sugerida pelo Dr. Hardy é a certa. Deve 
ser uma recaída daquela maldita malária.
JAMIE
Talvez seja, mas não fique demasiado seguro.
EDMUND
E por que não? Que supõe?
JAMIE
Homem de Deus! Como quer que eu o saiba? Não sou médico. (Bruscamente) Onde 
está mamãe?
EDMUND
Está lá em cima.
JAMIE (olhando para o irmão de um modo penetrante) 
 Quando foi que ela subiu?
EDMUND
Oh! creio que foi quando desci ao jardim. Disse-me que desejava dormir um pouco.
JAMIE
Você não me falou.
EDMUND (na defensiva)
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Para quê? Acaso tem isso alguma coisa de extraordinário? Estava fatigada. Dormiu 
mal a noite passada.
JAMIE
Eu o sei.
(Uma pausa. Ambos evitam encarar-se mutuamente.)
EDMUND
Essa maldita sirene também me impediu de dormir.
(Nova pausa.)
JAMIE
Ela então esteve sozinha lá em cima a manhã inteira. Você não a viu?
EDMUND
Não. Estive aqui lendo. Quis dar-lhe a oportunidade de descansar um pouco.
JAMIE
Ela vai descer para o almoço, não?
EDMUND
Sim, decerto.
JAMIE (em tom seco)
Decerto, nada! Talvez não queira almoçar. Ou recomece a almoçar sozinha lá em 
cima. Não seria a primeira vez, não é verdade?
EDMUND (com assustada angústia)
Basta, Jamie! Nunca lhe ocorre algo que não seja...? (Em tom persuasivo) Não há 
motivo para suspeitas. Cathleen a viu há pouquinho. Mamãe não a avisou de que não 
desceria para almoçar.
JAMIE
Então ela não estava dormindo?
EDMUND
Não, mas estava deitada, disse-me Cathleen.
JAMIE
51
No quarto de hóspedes.
EDMUND
Sim. Pelo amor de Deus, que há de mal nisso?
JAMIE (estourando)
Imbecil! Por que a deixou tanto tempo sozinha? Por que não ficou a seu lado?
EDMUND
Porque me acusou... e a você e a papai de espioná-la continuamente e de não confiar 
nela. Senti-me envergonhado. Sei como deve ser penoso para ela. E ela me deu sua 
palavra de honra.
JAMIE (com amargo cansaço)
Você já deveria saber que isto nada significa!
EDMUND
Desta vez, sim!
JAMIE
Isso é o que pensamos em outras ocasiões... (Debruça-se sobre a mesa e aperta 
afetuosamente o braço do irmão.) Escute aqui, Ed, sei que julgará que não passo de 
um canalha e de um cínico, mas lembre-se de que já conheço muito mais essa 
brincadeira do que você. Você nunca se apercebeu do que se passava até ingressar na 
escola preparatória. Papai e eu lhe escondíamos tudo. Mas eu já o sabia dez anos ou 
mais antes que nos víssemos forçados a lhe contar a verdade. Conheço o jogo de trás 
para diante e toda a manhã levei a meditar na maneira estranha por que ela agiu ontem 
à noite, quando julgou que estávamos dormindo. Não consigo pensar em mais nada! E 
agora você diz que ela conseguiu o que queria: que a deixassem sozinha lá em cima a 
manhã inteira.
EDMUND
Mas não foi nada disto! Você está louco!
JAMIE (conciliador)
Bem, Ed. Não vamos discutir. Quero crer, como diz, que estou louco. Sentia-me muito 
feliz porque começava a crer que, desta vez, realmente... (Interrompe a frase — 
olhando através da sala da frente para o vestíbulo — e apressadamente abaixa a 
voz.) Ela vem descendo. Você tinha razão. Não passo de um tipo desconfiado... 
(Ambos ficam tensos numa assustada expectativa cheia de esperança.) Com todos os 
diabos! Desejaria tomar outro uísque!
52
EDMUND
Também eu o desejaria.
(Tosse nervosamente, o que lhe provoca um verdadeiro 
acesso, que se prolonga. Jamie olha rapidamente na sua 
direção com preocupação e piedade. Chega Mary da sala da 
frente. No primeiro instante não se nota na sua pessoa 
mudança alguma, embora pareça menos nervosa e mais igual 
àquela que vimos pela primeira vez logo após o café. Mas... 
aos poucos observa-se que seus olhos têm maior brilho e há 
um certo alheamento na sua voz e no seu modo de ser, como se 
ela estivesse, por assim dizer, desgarrada de suas próprias 
palavras e ações)
MARY(aproxima-se inquieta de Ed e o abraça)
Você não deve tossir dessa maneira. Isso faz mal à garganta. Você não há de querer, 
além do resfriado, ter ainda por cima uma dor de garganta.
(Beija-o. Edmund para de tossir e a observa num rápido 
golpe de vista apreensivo. Mas, se desconfia de algo, a ternura 
com que a mãe o trata faz com que renuncie de pronto a 
qualquer suspeita, e creia apenas no que deseja crer naquele 
momento. Por outro lado, Jamie, após um único olhar 
perscrutador, sente que suas desconfianças são justificadas. 
Abaixa os olhos e os fixa no chão, e na sua fisionomia aparece 
uma expressão dura de amargurado cinismo. Mary continua a 
falar, recostada no braço da poltrona de Edmund, o braço em 
volta do filho, de modo que seu rosto fica por cima e por trásdo dele e ele não a pode fitar em cheio nos olhos.)
MARY
Mas pareço estar sempre a dizer-lhe que não deve fazer isto, que não deve fazer 
aquilo... Perdoe-me, querido. Quero simplesmente cuidar de você.
EDMUND
Eu sei, mamãe. E você? Descansou bastante?
53
MARY
Descansei sim. Sinto-me tão melhor! Estive deitada desde que você saiu. Era disso 
que eu precisava após uma noite tão ruim. Agora já não me sinto nervosa.
EDMUND
Que bom, mamãe!
(Acaricia-lhe a mão que Mary apoiou no seu ombro. Jamie 
lança ao irmão um olhar estranho, quase desdenhoso, como se 
lhe perguntasse se realmente pensa o que diz. Edmund nem o 
nota, mas o mesmo não acontece com Mary.)
MARY (num tom forçado de brincadeira)
Deus meu! Que ar mais compungido, Jamie! Que sucede agora?
JAMIE (sem encará-la)
Nada.
MARY
Ah! Esqueci-me de que você esteve trabalhando no jardim... Isso explica o seu 
desânimo, não é assim?
JAMIE
Se você quer crer que seja isso, mamãe.
MARY (mantendo o mesmo tom)
Esse é o efeito que parece sempre causar em você, não é verdade? É como que um 
menino grande! Não acha, Edmund?
EDMUND
É claro! É um tolo que se preocupa com a opinião alheia!
MARY (em tom distante)
É a única coisa que se pode fazer: não ligar... (Ela percebe o olhar acerbo que Jamie 
lhe lança e muda de assunto) Onde está o seu pai? Ouvi Cathleen chamá-lo.
EDMUND
Jamie disse que ele estava de conversa com o velho capitão Turner. Como sempre, 
chegará atrasado. 
54
(Jamie se levanta e se dirige até as janelas à direita, 
contente por ter um pretexto para se afastar)
MARY
Já disse a Cathleen, não sei quantas vezes, que ela deve ir procurá-lo onde ele estiver, 
e avisá-lo de que está na hora. Que idéia essa de ficar gritando de longe, como se aqui 
fosse uma pensão barata!
JAMIE (espiando pela janela)
Cathleen está lá embaixo agora. (Com sarcasmo) Interrompendo a célebre “Voz 
Maviosa”! Deveria ter mais respeito!
MARY (ríspida — deixando irromper a sua hostilidade contra o filho)
Você é quem deveria ser mais respeitoso. Pare de zombar de seu pai. Não o tolerarei 
mais! Deveria orgulhar-se de ser o seu filho! Ele pode ter seus defeitos. Quem não os 
tem? Mas trabalhou duro a vida inteira. Abriu o seu caminho; desde a ignorância e a 
pobreza até o apogeu que atingiu na sua profissão! Todos os demais o admiram e você 
deveria ser o último a fazer pouco dele — você que, graças a ele, nunca teve que fazer 
força nem trabalhar de verdade! (Ferido em cheio, Jamie se volta e a encara com um 
antagonismo acusador. O olhar de Mary vacila, com ar culpado, e ela prossegue num 
tom que já se aplaca) Lembre-se de que seu pai está ficando idoso, Jamie. Você 
deveria demonstrar-lhe um pouco mais de consideração.
JAMIE
Ah! Eu é que deveria?...
EDMUND (constrangido)
Oh! Acabe com isso, Jamie. (Seu irmão toma a olhar pela janela) E, pelo amor de 
Deus, mamãe, por que você se vira assim de repente contra Jamie?
MARY (com amargura)
Porque está sempre a escarnecer de alguém, sempre a buscar o ponto fraco de cada 
um. (Bruscamente há uma súbita mudança na sua entonação, que se torna distante e 
impessoal) Mas suponho que, afinal, foi o que a Vida fez dele e nada poderá mudá-lo. 
Nenhum de nós pode remediar as coisas que a Vida nos faz! Estão feitas antes mesmo 
que a gente se aperceba... e uma vez feitas nos levam a praticar outras tantas coisas 
até que, no fim, tudo se interpõe entre nós e o que quiséramos ter sido, e o nosso 
verdadeiro eu está para sempre perdido.
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(Edmund começa a se preocupar com a atitude estranha da 
mãe. Procura fitá-la nos olhos, mas Mary, obstinadamente, os 
desvia. Jamie volta-se para ela — mas, logo a seguir, torna a 
olhar pela janela)
JAMIE (em voz surda)
Estou com fome. Gostaria que o velho viesse logo. Tem sempre essa insuportável 
mania de nos fazer esperar e depois se aborrece porque a comida não está em 
condições.
MARY (com um ressentimento meramente automático e superficial, pois que, no íntimo, 
isso não a afeta)
Sim, isso é muito desagradável, Jamie. Nem você mesmo imagina o quanto! Não tem 
que dirigir uma casa com empregadas de passagem que não se importam com coisa 
alguma porque sabem que é um emprego transitório. As boas criadas estão todas em 
casas de famílias que têm o seu lar permanente, e não apenas uma casa de verão. E 
nem ao menos seu pai está disposto a pagar os ordenados que esse pessoal pede. 
Todos os anos tenho que lutar com novatas ignorantes e preguiçosas. Mas vocês já me 
ouviram dizer isso mil vezes a seu pai também. E é inútil. Ele acha que gastar em casa 
é botar dinheiro fora! Viveu demais em hotéis. Nunca nos melhores, naturalmente, 
mas nos de segunda classe. Ele não avalia o que seja um lar. Não se sente à vontade 
em casa. E, no entanto, deseja tê-la. Até se envaidece desta casa tão modesta. (Ri — 
um riso de quem acha graça, mas sem ânimo algum.) Na verdade, chega a ser 
engraçado! É um homem estranho, seu pai.
EDMUND (tentando novamente fitá-la nos olhos, contrafeito) 
Por que você divaga assim, mamãe?
MARY (volta prontamente a um tom casual, e lhe dá um tapazinho amistoso na face)
Oh! Por nada, querido. É tolice minha.
(Enquanto ela fala, Cathleen entra pelo hall dos fundos.)
CATHLEEN (loquaz)
O almoço está pronto, senhora. Fui à procura do Sr. Tyrone, como a senhora mandou. 
Ele disse que viria logo, mas continuou conversando com aquele homem, falando dos 
tempos em que...
MARY (com indiferença)
Está bem, Cathleen. Diga a Bridget que sinto muito, mas terá que esperar uns minutos 
mais, até que chegue o Sr. Tyrone.
56
(Cathleen murmura: “Sim senhora” e sai pela sala dos 
fundos resmungando.)
JAMIE
Que inferno! Por que não começamos a almoçar sem ele? Disse que não o 
esperássemos.
MARY (com um sorriso vago e divertido)
Não falava a sério. Ainda não o conhece? Ficaria tão sentido!
EDMUND (levanta-se de um salto, como se o alegrasse encontrar um pretexto para 
retirar-se dali)
Vou apurar isso de uma vez. (Sai pelo vestíbulo lateral. Ao cabo de um momento 
ouve-se sua voz, gritando exasperado.) Ei! Papai! Venha logo! Não podemos esperá-
lo o dia todo!
(Mary levantou-se e suas mãos tamborilam 
impacientemente sobre a mesa. Não olha para Jamie, mas 
sente o olhar cinicamente perscrutador com que este observa 
sua fisionomia e suas mãos.)
MARY(com ar tenso)
Por que você me olha assim?
JAMIE
Você sabe muito bem. (Volve-se para a janela.)
MARY
Não, não sei.
JAMIE
Ora, por Deus! Mamãe! Julga, por acaso, que me pode enganar? Não sou cego.
MARY (olhando-o de frente, o rosto de novo contraído numa expressão perturbada de 
tenaz negativa)
Não sei o que você quer dizer.
JAMIE
Não? Então observe o seu olhar no espelho.
EDMUND (vindo do hall)
57
Consegui que papai se pusesse a caminho. Estará aqui dentro de alguns segundos. 
(Olha sucessivamente para ambos. Sua mãe abaixa os olhos. Pergunta-lhe a 
contragosto) Que se passa, mamãe?
MARY (perturbada pela chegada do filho, desabafa-se numa excessiva excitação 
nervosa)
Seu irmão deveria envergonhar-se. Leva a insinuar não sei o quê...
EDMUND (virando-separa Jamie)
Vá para o raio que o parta!
(Dá um passo ameaçador na sua direção. Jamie lhe vira as 
costas, dando de ombros, e espia pela janela.)
MARY (ainda mais transtornada, segura com força o braço de Edmund)
Chega! Cale-se imediatamente. Como se atreve a usar de uma semelhante linguagem 
na minha presença? (Abruptamente seu tom e sua maneira de ser voltam ao estranho 
alheamento de há pouco.) Você faz mal em censurar seu irmão. Não pode deixar de 
ser o que o passado fez dele. Como seu pai tampouco não o pode, nem você... Nem eu 
mesma.
EDMUND (assustado, confiando desesperadamente contra toda lógica)
Jamie mente! Isso é mentira, não é, mamãe?
MARY (desviando sempre o olhar)
Mentira?... Que é mentira? Agora é você quem fala em enigmas como Jamie. (Nisso 
seus olhos se cruzam com o olhar angustiado e acusadordo filho. Ela balbucia) 
Edmund, não me olhe assim. (Afasta o olhar e torna a se mostrar estranhamente 
impessoal e serena.) Seu pai já está subindo a escada. Tenho que avisar a Bridget. 
(Sai pela porta dos fundos.)
(Edmund se adianta lentamente até a sua poltrona. Parece 
doente e desesperançado.)
JAMIE (da janela, sem se virar)
E então?
EDMUND (ainda se recusando a admitir algo diante do irmão, num débil desabafo)
Então o quê? Você não passa de um mentiroso! (Jamie torna a dar de ombros. Ouve-
se a porta telada do vestíbulo da frente que se fecha. Edmund diz em voz surda) Aí 
vem papai. Esperemos que não se preocupe muito com o nível do uísque na garrafa!
58
(Chega Tyrone da sala da frente, vestindo o paletó.)
TYRONE
Sinto ter-me atrasado. O capitão Turner parou para falar comigo, e ele quando começa 
a falar não há meios de a gente se livrar dele.
JAMIE (secamente, sem se virar)
Você deveria antes dizer: quando começa a “escutar”.
(Tyrone olha para o filho com hostilidade e se aproxima da 
mesa, medindo, num rápido golpe de vista, o conteúdo da 
garrafa. Jamie o percebe)
JAMIE
Não se preocupe. O nível da garrafa não baixou.
TYRONE
Não olhava para isto. (Causticamente) E como se provasse alguma coisa, estando 
você por perto! Conheço suas espertezas!
EDMUND (em tom apático)
Pareceu-me ouvi-lo dizer: “bebamos”.
TYRONE (vira-se para ele,franzindo a testa)
Ainda vá lá que Jamie tome um trago depois do duro trabalho que teve no jardim. 
Porém não chamei você. O Dr. Hardy...
EDMUND
Que Hardy vá para o inferno! Um trago não me matará. Sinto-me esgotado, papai.
TYRONE (olhando-o com ar inquieto, mas querendo demonstrar jovialidade)
Bom... beba! Já vamos comer. Verifiquei sempre que um uísque de boa qualidade 
tomado com moderação, como aperitivo, é o melhor dos tônicos. (Edmund se levanta, 
enquanto o pai lhe passa a garrafa, e se serve de uma boa dose de uísque. Tyrone 
fecha a cara, com ar autoritário) Eu disse: “com moderação”. (Serve-se por sua vez, 
e passa a garrafa a Jamie, resmungando) Falar a você em moderação seria perder 
tempo. (Fingindo não ter ouvido a observação, Jamie despeja no copo uma 
exagerada dose de uísque. O pai novamente franze o sobrecenho e logo, entregando 
os pontos, retoma o seu ar cordial, erguendo o copo) Bom! Bebo à saúde e à 
felicidade de todos!
59
EDMUND (ri com amargura)
Que boa pilhéria!
TYRONE
Que foi que você disse?
EDMUND
Nada. À sua saúde. (Bebem)
TYRONE (notando o ambiente)
Que aconteceu por aqui? Está uma atmosfera tão carregada e tão lúgubre que poderia 
ser cortada a faca. (Volta-se para Jamie com ressentimento) Você já conseguiu o 
uísque que queria... não é assim? A troco de que essa cara fechada?
JAMIE (dando de ombros)
Breve você também não se sentirá com disposição de cantar!...
EDMUND
Cale a boca, Jamie.
TYRONE (constrangido e mudando de assunto)
Pensei que o almoço estivesse pronto. Tenho uma fome de caçador. Onde está sua 
mãe?
MARY (regressando da sala dos fundos, grita)
Estou aqui. (Entra. Está excitada e seus modos são pouco naturais. Quando fala, 
olha para todos os lados, mas não encara o marido nem os filhos) Tive que acalmar a 
Bridget. Está furiosa porque você voltou tarde novamente, e não a censuro por isso. 
Disse que a comida está toda ressequida no forno, de tanto esperar, e que é bem feito 
para você... que pode comer ou deixar de comer, como preferir. (Com crescente 
irritação) Oh! Cansa-me tanto e me põe doente viver fingindo que isto aqui é um lar 
de verdade! Você não quer ajudar-me! Não sabe como se portar. Na realidade, você 
não quer ter um lar! Nunca quis. Desde o próprio dia em que nos casamos. Você 
deveria ter ficado solteiro, morar em hoteizinhos ordinários e receber seus amigos nos 
bares! (Acrescenta num tom estranho, como se falasse consigo mesma) Então nada 
disso teria acontecido.
(Todos a fitam fixamente. Tyrone agora compreende. 
Bruscamente transforma-se num velho, cansado, triste e cheio 
de amargura. Edmund lança um rápido olhar ao pai e sente 
que este já sabe; contudo, ainda tenta prevenir a mãe.)
60
EDMUND
Mamãe. Pare de falar. Por que não vamos almoçar?
MARY (estremece e imediatamente sua fisionomia readquire um ar de alheamento 
pouco natural. Chega a sorrir para si própria com divertida ironia)
É mesmo! É falta de consideração, de minha parte, estar assim desenterrando o 
passado, quando sei que seu pai e Jamie devem estar com fome. (Passa o braço pelo 
ombro de Edmund, com um carinho solícito, mas ao mesmo tempo longínquo) Espero 
que você hoje tenha apetite, meu filho. Você precisa comer um pouco mais. (Seu 
olhar se fixa na garrafa de uísque sobre a mesa ao lado dele. Severamente) Por que 
está aí esse copo? Você bebeu? Oh! Como é que você pode fazer uma loucura dessas? 
Não sabe, então, que é a pior coisa para você? (Volta-se para Tyrone) A culpa é sua, 
James. Como é que você o deixou beber? Quer matá-lo? Não se recorda de meu pai? 
Nem depois de fulminado queria parar de beber. Dizia que os médicos eram uns 
idiotas! Como você, achava que o uísque era um ótimo tônico! (No seu olhar aparece 
uma expressão de terror e ela balbucia) Mas, naturalmente, não há termos de 
comparação possível! Não sei porque eu... Desculpe-me, James, por censurá-lo. Não é 
um pequeno gole de bebida que vai prejudicar Edmund. Talvez até lhe faça bem e lhe 
abra o apetite.
(Afaga de brincadeira o rosto de Edmund, notando-se em 
todo o seu modo de agir o mesmo estranho desgarramento. 
Ele, num movimento brusco, desvia a cabeça. Ela finge não 
perceber, mas instintivamente se afasta.)
JAMIE (rispidamente, para disfarçar a sua tensão de nervos)
Pelo amor de Deus, vamos almoçar. Estive a manhã toda trabalhando naquela maldita 
terra debaixo da cerca. Já ganhei a minha comida. (Passa por trás de seu pai sem 
olhar para Mary e segura o braço de Edmund) Vamos, rapaz! Vamos comer a nossa 
ração!
(Edmund se levanta, evitando sempre o olhar de Mary. 
Ambos passam junto dela em direção à sala dos fundos.)
TYRONE (com voz sombria)
Sim; vão indo na frente com sua mãe, rapazes. Irei ter com vocês dentro de um 
momento.
(Mas eles saem sem esperá-la. Mary os segue com o olhar 
magoado e, quando chegam à sala dos fundos, prepara-se 
61
para segui-los. Tyrone contempla-a com olhos tristes e 
acusadores. Mary o sente e vira-se bruscamente sem ousar 
encará-lo.)
MARY
Por que você me olha dessa maneira? (Suas mãos se erguem e ajeitam o cabelo) É o 
meu cabelo que está despenteado? Sentia-me tão esgotada depois da noite passada, 
que achei melhor recostar-me um pouquinho agora pela manhã. Cochilei um pouco, e 
esse soninho me fez bem. Mas tenho certeza como tornei a me pentear assim que 
acordei. (Com riso forçado) Se bem que, como de costume, não pude encontrar meus 
óculos. (Asperamente) Por favor, não fique olhando para mim dessa maneira. Parece 
que me está acusando... (súplice) James, você não compreende!...
TYRONE (com cólera fria)
Compreendo que fui um imbecil acreditando em você. (Afasta-se dela e serve-se de 
uma boa dose de uísque.)
MARY (com o rosto contraído numa expressão de obstinado desafio)
Não sei o que você quer dizer com essa história de não acreditar em mim. Só tenho 
sentido, em minha volta, desconfianças, espionagens e suspeitas. (Num tom acusador) 
Você nunca bebeu mais de um uísque antes do almoço. (Com amargura) Sei o que me 
espera. Hoje à noite você estará bêbedo. Bem, não será a primeira vez... não é 
verdade?! Ou será a milésima? (Novamente exclama implorando) Oh! James, por 
favor! Você não compreende! Edmund me preocupa tanto. Tenho um tal receio que 
ele...
TYRONE
Não quero escutar as suas desculpas, Mary.
MARY (ferida)
Desculpas? Você quer dizer que...? Oh! Não é possível que você pense isso de mim! 
Não deve pensá-lo, James! (Toma-se a refugiar no seu mundo distante e impessoal, econtinua com ar negligente) Não vamos almoçar, meu bem? Não quero comer coisa 
alguma, mas sei que você deve estar com fome. (Tyrone se aproxima lentamente de 
Mary, que se acha parada no batente da porta. Caminha como um velho. Quando 
chega junto à mulher, esta desabafa lastimosamente) James. Esforcei-me tanto, 
tanto... Por piedade, creia em mim!
62
TYRONE (comovido a contragosto, mas impotente diante da situação)
É, Mary, suponho que talvez você tenha mesmo lutado... (Com revolta) Mas, por 
Deus, como é que não teve a força de vontade necessária para tocar para diante?!
MARY (cuja fisionomia tornou a se fechar na mesma teimosia negativa)
Não entendo de que fala. Força necessária para quê?!...
TYRONE (desesperançado)
Tanto faz. Agora é inútil...
(Continua a caminhar, e ela ao seu lado, até que ambos 
desaparecem na sala dos fundos)
CENA II
Cenário: O mesmo, meia hora depois. A garrafa de uísque 
foi retirada de sobre a mesa. Ao abrir-se o pano, a família, que 
acabou de almoçar, regressa da sala de jantar. Mary é a 
primeira a entrar em cena, vindo da sala dos fundos. O marido 
a segue. Não a acompanha como quando entraram juntos ao 
iniciar-se o primeiro ato. Evita olhar na sua direção ou tocá-
la. No seu semblante sentem-se a reprovação e os prenúncios 
de uma velha resignação, impotente e cansada. Jamie e 
Edmund vêm a seguir. A fisionomia de Jamie é dura, fechada 
num cinismo autoprotetor. Edmund tenta imitar essa atitude de 
defesa, mas sem lograr fazê-lo. Demonstra claramente estar 
aflito, além de fisicamente enfermo.
Mary mostra-se de novo nervosíssima, como se lhe tivesse 
sido excessiva a tensão durante o almoço em companhia dos 
seus. E, contudo, por outro lado — num estranho contraste —, 
sua fisionomia revela, com ainda maior evidência, aquele ar 
estranho e indiferente que parece alhear-se por completo do 
seu estado de nervos e dos conflitos que os abalam.
Ao entrar, Mary está proferindo uma verdadeira torrente de 
palavras que escorre de modo casual, na rotina de uma 
conversa familiar. Segundo parece, pouco lhe importa o fato 
63
de que os outros estejam dando, ao que diz, tão pouca 
importância quanto ela própria. Enquanto fala, caminha para 
o lado esquerdo da mesa e aí se detém, de frente para o 
público, uma das mãos tateando na blusa do vestido, a outra 
tamborilando no tampo da mesa. Tyrone acende o charuto e 
vai até a porta telada, olhando para fora. Jamie enche o 
cachimbo de fumo, que ele retira de um pequeno pote colocado 
sobre a estante de livros no fundo. Acende o cachimbo ao 
dirigir-se para a janela ao lado direito. Edmund senta-se junto 
á mesa, quase de costas para Mary, afim de não ter que 
observá-la.
MARY
Não adianta achar defeito em Bridget. Ela nem ouve o que se diz! Não posso 
ameaçar de despedi-la, porque, por sua vez, ela me ameaçaria de ir-se embora. E, 
quando o quer, faz todo o possível pra agradar. É pena que isso sempre aconteça 
justamente quando você chega atrasado, James. Bem... sempre há um consolo: pela 
maneira de ela cozinhar, nunca se sabe ao certo se está fazendo pelo melhor... ou pelo 
pior! (Mary ri — um risinho despreocupado de divertimento. Continua, indiferente) 
Não importa. O verão em breve estará passando, graças a Deus! A estação teatral se 
reabrirá e voltaremos aos hotéis e trens de segunda classe. Eu os detesto, igualmente, 
porém pelo menos não espero que sejam como um lar, e não tenho que me preocupar 
em tomar conta de casa. É absurdo pretender que Bridget ou Cathleen trabalhem 
como se isto aqui fosse uma casa de verdade. Sabem tão bem quanto nós que não o é. 
Nunca foi — nunca o será.
TYRONE (com amargura, sem se virar)
Não, agora não o poderia mais ser. Mas já o foi, em outros tempos... antes que você...
MARY (seu rosto instantaneamente se fecha, numa atitude de confuso desafio)
Antes que eu o quê?... (Há um silêncio mortal.) Não, não. Seja o que for, não é 
verdade, meu bem. Isto aqui nunca foi uma casa. Você sempre preferiu o clube e as 
salas de bar. E para mim esta casa foi sempre tão solitária quanto um quarto sujo de 
hotel vagabundo. Numa casa de verdade, nunca nos sentimos sós. Você se esquece de 
que eu sei, por experiência própria, o que é um lar. Abri mão de um, para me casar 
com você — o lar de meu pai. (Imediatamente, levada por uma associação de idéias, 
vira-se para Edmund com uma ternura cheia de solicitude, porém estranhamente 
impessoal, tal como dantes.) Estou preocupada com você, meu filho. Você mal tocou 
na comida. Isso não é maneira de cuidar de sua saúde: que eu não tenha apetite, vá lá! 
64
Estou ficando gorda demais. Mas você precisa comer. (Com uma insistência 
maternal) Prometa que o fará, querido. Por mim...
EDMUND (com voz apagada)
Sim, mamãe.
MARY (acaricia-lhe a face e ele se esforça por não fugir ao afago)
Assim sim, fico contente.
(Há nova pausa de pesado silêncio. Nisso toca o telefone no 
vestíbulo da frente; há um sobressalto geral e todos 
permanecem tensos.)
TYRONE
Deixem que eu atendo. (Apressadamente) McGuire disse que me telefonaria. (Sai 
pela sala da frente.)
MARY (indiferente)
McGuire! Deve ter com certeza outra propriedade qualquer à venda, que ninguém se 
lembraria de comprar a não ser seu pai! Agora não importa mais, mas sempre me 
pareceu estranho que seu pai pudesse se permitir o luxo de viver comprando terrenos, 
mas nunca me pudesse dar uma casa. (Interrompe-se para escutar a voz de Tyrone 
vinda do vestíbulo.)
TYRONE
Alô. (Com forçada jovialidade) Oh! O senhor como está, doutor?
(Jamie se afasta da janela. Os dedos de Mary tamborilam 
com maior agitação sobre a mesa. A voz de Tyrone, 
procurando disfarçar, só torna ainda mais evidente o fato de 
que más notícias lhe estão sendo dadas.)
TYRONE
Sim... compreendo. (Precipitadamente) Bem. O senhor lhe explicará tudo isso quando 
ele for vê-lo esta tarde. Sim, irá sem falta. Às quatro horas. Passarei antes disso para 
conversar com o senhor. Tenho que ir de qualquer maneira ao povoado para tratar de 
uns negócios. Até logo, doutor.
EDMUND (numa voz opressa)
Pelo que parece, as notícias não foram boas.
65
(Jamie lança-lhe de esguelha um olhar cheio de piedade. 
Mas logo desvia o rosto e torna a olhar pela janela. A 
fisionomia de Mary revela um terror pânico, e suas mãos se 
agitam a esmo. Entra Tyrone. É evidente a tensão sob a 
máscara de naturalidade com que se dirige a Edmund.)
TYRONE
Era o Dr. Hardy. Pede que você vá vê-lo sem falta hoje às quatro horas.
EDMUND (em tom abafado)
Que foi que ele disse? Não que eu ligue a mínima!
MARY (descontrolando-se)
Não acreditaria no que ele diz nem que o jurasse sobre uma pilha de Bíblias! Não 
deve dar importância a nada do que ele disser, meu filho.
TYRONE (áspero)
Mary!
MARY (sempre mais excitada)
Oh! Todos nós sabemos porque é que você gosta dele, James! Porque é um médico 
barato! Mas, por favor... não procure me convencer a mim! Conheço muito bem o Dr. 
Hardy! É natural que o conheça depois de tantos anos. É um ignorante e um imbecil! 
Deveria existir uma lei que impedisse tipos como ele de exercerem a medicina. Não 
tem a menor idéia do que isso seja... Quando você está moribundo e quase demente, 
Hardy senta ao lado da cama, segura-lhe a mão e vem pregar sermões sobre a força de 
vontade!... (Seu rosto vinca-se numa expressão de profundo sofrimento trazido pelas 
amargas recordações. Por uns instantes perde toda a cautela. Com ódio e revolta, 
acrescenta) Ele deliberadamente humilha o doente! Força-o a pedir... a suplicar; trata-
o como um criminoso. Não compreende coisa alguma! E, no entanto, foi exatamente 
o mesmo tipo de charlatão vulgar como ele quem, pela primeira vez, me deu o 
medicamento; e você só soube do que se tratava quando já era tarde demais!... 
(Selvagemente) Odeio os médicos!São capazes de tudo... de tudo... contanto que se 
continue a ir consultá-los! Venderiam sua própria alma! E, o que é pior, venderiam até 
a nossa; e só o saberíamos ao nos encontrarmos mergulhados no inferno!
EDMUND
Mamãe, pelo amor de Deus, cale-se.
TYRONE (abalado)
Sim, Mary, não é o momento de...
66
MARY (repentinamente arrependida pelo que disse, balbucia confusa)
Eu... Perdoe-me querido. Você tem razão. De nada mais serve aborrecer-me agora. 
(Há nova pausa de profundo silêncio. Quando ela toma a falar, seu rosto está calmo e 
pacificado, e na sua voz e atitude reaparece a estranha indiferença.) Vou subir por 
alguns instantes. Vocês me desculpem. Tenho que ajeitar meu cabelo. (Acrescenta 
sorrindo) Isto é, se conseguir encontrar os óculos. Desço já.
TYRONE (ao vê-la caminhar para a porta, e repreensão)
Mary!!!
MARY (volta-se e o encara tranqüilamente)
Sim, querido, que é?
TYRONE (sentindo a inutilidade de tudo)
Nada.
MARY (com um estranho sorriso zombeteiro) 
Se desconfia tanto de mim, assim, pode subir para vigiar-me quando quiser.
TYRONE
Como se isso adiantasse alguma coisa. Você apenas adiaria... Não sou um carcereiro. 
E isto aqui não é uma prisão...
MARY
Não. Sei que continua na ilusão de que é um verdadeiro lar. (Prossegue rapidamente, 
com uma vaga contrição.) Sinto muito, querido. Não quis ser mesquinha... A culpa 
não é sua.
(Vira-lhe as costas e sai pela sala dos fundos. Tyrone e os 
filhos permanecem silenciosos. Aparentemente, aguardam que 
Mary chegue ao primeiro andar antes de recomeçarem a 
falar.)
JAMIE (com cínica brutalidade)
Mais outra espetadela no braço!
EDMUND (enraivecido)
Não fale dessa maneira!
TYRONE
67
Sim! Controla essa sua língua suja, e essa intolerável gíria de vagabundo da 
Broadway! Não tem piedade nem compostura? (Perdendo a calma) Deveria jogá-lo 
na sarjeta a pontapés! Mas se o fizesse, bem sabe quem choraria e imploraria por 
você, e se descobriria toda a sorte de desculpas, e se lamentaria até que eu o deixasse 
voltar!
JAMIE (cuja fisionomia se contrai num rictus de sofrimento)
Cristo! E acaso não sei? Você diz que eu não tenho piedade. Sinto por ela toda a 
piedade deste mundo. Avalio a luta tremenda que deve travar... uma luta muito maior 
do que a sua! Minha maneira de falar não significa que eu não tenha sentimentos... 
Simplesmente disse sem rodeios o que todos nós sabemos, e o que deveremos agora 
tornar a suportar. (Com amargura) Os tratamentos só dão resultado transitório. A 
verdade é que isso não tem remédio, e que fomos uns idiotas em esperar que... 
(Cinicamente) Eles nunca voltam!...
EDMUND (com menosprezo)
Meu Deus! Se eu tivesse os mesmos sentimentos que você...
JAMIE (momentaneamente ferido, dá de ombros e retruca em tom seco)
Julguei que os tinha... Seus versos não são dos mais alegres, nem tampouco as coisas 
que você lê e diz admirar. (Aponta a pequena estante da direita.) O seu favorito, por 
exemplo, de nome tão difícil de pronunciar!
EDMUND
Nietzsche. Você não sabe do que está falando. Nunca o leu.
JAMIE
Li o suficiente para saber que diz uma porção de tolices!
TYRONE
Calem-se os dois! Não há muito que escolher entre a filosofia que você aprendeu com 
os parasitas da Broadway e a que Edmund encontrou nos livros. Ambas estão podres 
até a medula. Vocês zombaram da religião em que nasceram e foram criados — a 
única religião verdadeira que é a Igreja Católica... — e, ao negá-la, destruíram-se a si 
próprios.
(Os filhos o olham com desdém. Esquecem suas diferenças 
e, nesta controvérsia, unem-se contra o pai.)
EDMUND
É esse o seu erro, papai.
68
JAMIE
Ao menos nós não fingimos. (Mordazmente) Não me parece que você tenha gasto 
tanto assim as suas calças, ajoelhando-se na missa!
TYRONE
É certo que não sou um bom católico quanto à observância dos ritos, que Deus me 
perdoe! Mas, ao menos, creio n’Ele. (Exasperado) E você está mentindo. Talvez eu 
não vá à igreja, mas todas as noites e todas as manhãs de minha vida eu me ajoelho e 
rezo.
EDMUND (irônico)
E você, alguma vez rezou por mamãe?
TYRONE
Sim. Rezo por ela há muitos anos.
EDMUND
Então Nietzsche deve ter razão! (Cita uma passagem de Assim Falava Zaratustra.) 
“Deus está morto. Matou-o a sua piedade pelo homem...”
TYRONE (fingindo não ter ouvido o que o filho disse)
Se sua mãe tivesse, ela também, rezado... Não repudiou a religião, porém esqueceu-se 
dela; e não lhe restam forças na alma para lutar contra a maldição que a domina. 
(Com resignação triste) Bem... o que adianta falar? Já vivemos com essa desgraça, e 
agora teremos de tornar a fazê-lo. Não há remédio. (Com amargura) Mas antes ela 
não me tivesse dado tanta esperança desta vez. Juro como nunca mais confiarei.
EDMUND
Não diga isso, papai. (Num desafio) Pois eu confio! Mamãe apenas recomeçou. Isto 
não a pode ainda ter dominado. Ela conseguirá deter-se a tempo. Falarei com ela.
JAMIE (num sacudir de ombros)
Agora nada mais poderá fazer. Ela o ouvirá, mas não escutará. Estará aparentemente 
aqui, mas na realidade se achará longe, fora do seu alcance. Sabe como ela fica.
TYRONE
Sim, é assim que esse veneno age sobre ela. A partir de agora, dia após dia se afastará 
de nós até o fim de cada noite...
EDMUND (angustiado)
69
Chega, papai! (Levanta-se bruscamente.) Vou vestir-me. (Ao sair, com amargura) 
Farei tanto barulho que mamãe não poderá suspeitar que a estou vigiando. (Sai pela 
sala da frente. Ouvem-se seus passos à medida que, ruidosamente, sobe a escada.)
JAMIE (depois de uma pausa)
O que disse o Dr. Hardy sobre Ed?
TYRONE (sombrio)
O que você suspeitava: tuberculose.
JAMIE
Maldita sorte!
TYRONE
Declarou-me que não havia dúvidas.
JAMIE
Ed terá que internar-se num sanatório?
TYRONE
Sim. E quanto mais cedo melhor, afirmou Hardy, tanto para ele como para os demais. 
Afirma que, dentro de seis meses a um ano, Edmund estará curado se obedecer às 
suas prescrições. (Suspirando, com tom lúgubre e ressentido) Nunca imaginei que um 
filho meu... Isso não vem do meu ramo familiar. Todos nós sempre tivemos pulmões 
fortes como os de um touro!
JAMIE
E que importância tem isso no caso? Para onde pensa o Dr. Hardy mandar Edmund?
TYRONE
É justamente para combinar essa questão que vou falar com ele.
JAMIE
Bem. Pelo amor de Deus, papai, escolha um lugar adequado e não algum sanatório 
barato de segunda classe.
TYRONE (ofendido)
Eu o mandarei para onde o médico achar preferível.
JAMIE
70
Mas, então, não recomece junto a Hardy com sua velha cantilena sobre impostos e as 
hipotecas.
TYRONE
Não sou nenhum milionário, para jogar dinheiro fora. Por que não hei de lhe dizer a 
verdade?
JAMIE
Porque Hardy pensará que você quer que ele escolha um lugar em conta, e porque 
saberá que essa não é a verdade... sobretudo se depois tiver conhecimento de que você 
esteve com McGuire e deixou que esse comerciante bajulador e vigarista lhe 
impingisse mais outra propriedade sem valor algum!
TYRONE (furioso)
Não se meta nos meus negócios!
JAMIE
Agora, trata-se de Edmund. Receio que você na sua crença de velho irlandês — que 
acha que a tuberculose é sempre fatal — julgue que seria um desperdício de dinheiro 
gastar mais, se pode gastar menos.
TYRONE
Mentiroso!
JAMIE
Está bem. Prove-me que o sou. É o que desejo. Por isso mesmo é que puxei o assunto.
TYRONE (ainda indignado)
Tenho muita esperança de que Edmund ainda venha a se restabelecer. E deixe a minha 
terra em paz com sua língua venenosa. É você mesmo que pode ficar zombando 
quando tem o mapa da Irlanda na própria cara!
JAMIE
Depois que a lavo, não! (Antes que seu pai reaja ao insulto dirigido à verde Erin, 
ajunta secamente, sacudindo os ombros)Bom, já disse tudo o que tinha a dizer. Agora 
depende de você. (Bruscamente) Que quer que eu faça hoje à tarde, já que você vai 
até o povoado? Fiz o que pude na cerca — agora é só podá-la um pouco mais. Mas já 
sei que você não há de querer que eu a apare.
TYRONE
Não. Você a estragaria, como estraga tudo omais.
71
JAMIE
Então é melhor que eu acompanhe Edmund ao povoado. A má notícia — após o 
ocorrido com mamãe — poderia abalá-lo muito.
TYRONE
Acompanhe-o. Não o deixe ficar muito desanimado. (Ajunta sarcasticamente) Se é 
possível, sem que faça disto um pretexto para se embriagar!
JAMIE
E onde conseguiria dinheiro? Que eu saiba, ainda se vende o uísque — ninguém o dá 
de presente. (Dirige-se à sala da frente.) Vou vestir-me.
(Pára no batente da porta, ao ver que sua mãe vem do 
vestíbulo, e lhe cede a passagem. Acentuou-se o brilho no 
olhar de Mary e seus gestos são ainda mais impessoais. Tal 
transformação se intensifica ainda no decurso da cena.)
MARY (distraída)
Você não viu meus óculos em algum lugar, Jamie? (Não encara o marido. Ele desvia 
o olhar, simulando não a ter ouvido, porém ela não parece esperar resposta alguma. 
Adianta-se e dirige-se a Tyrone, sempre sem o fitar.) Você não os viu... não é verdade, 
James?
(Sem que a mãe o perceba, Jamie se retira pela sala da 
frente.)
TYRONE (voltando-separa olhar pela janela telada) 
Não, Mary.
MARY
Que acontece com Jamie? Você está de novo a implicar com ele? Não deveria tratá-lo 
com tão pouco caso. Ele não tem culpa. Tenho certeza como seria outro se tivesse 
sido criado num verdadeiro ambiente de família. (Vai até as janelas da direita e diz, 
frivolamente) Como meteorologista, meu querido, você é uma calamidade! Olha só a 
neblina. Mal se vê a margem oposta.
TYRONE (procura falar com naturalidade)
É mesmo! Precipitei-me ao afirmar que a neblina se fora. Acho que teremos outra 
noite de nevoeiro.
72
MARY
Oh! Hoje a noite não me importa.
TYRONE
Acredito que não, Mary.
MARY (lançando-lhe rápido olhar, depois de uma pausa)
Não vejo Jamie trabalhando no jardim. Aonde é que ele foi?
TYRONE
Subiu para mudar de roupa. Vai acompanhar Edmund ao Dr. Hardy. (Satisfeito de ter 
um pretexto também para se afastar.) É melhor que eu faça o mesmo, ou chegarei 
tarde ao meu encontro no clube.
(Dá um passo em direção a sala da frente, porém ela, num 
movimento rápido e impulsivo, adianta-se e lhe segura o 
braço.)
MARY (com um acento suplicante)
Não vá ainda, meu bem. Não quero ficar só. (Precipitadamente) Quero dizer que 
ainda lhe sobra tempo. Sempre se gaba de poder vestir-se num décimo do tempo que 
levam os rapazes para fazê-lo. (Distraída) Queria dizer-lhe uma coisa. Que era 
mesmo? Esqueci. Alegra-me que Jamie vá ao povoado. Espero que não lhe tenha dado 
dinheiro algum.
TYRONE
Não.
MARY
Ele gastaria em bebidas, e já sabe que idéias maldosas e vis lhe ocorrem quando está 
bêbedo. Não é que importe nada do que ele disse esta tarde, mas sempre acaba por 
irritá-lo, sobretudo se você estiver também embriagado, o que, aliás, é provável que 
aconteça.
TYRONE (magoado)
Não acontecerá tal. Eu nunca me embriago.
MARY (com indiferentismo zombeteiro)
Oh! Já sei que você suporta muito bem a bebida. Como sempre! Um estranho custaria 
a percebê-lo. . . mas depois de trinta e cinco anos de vida conjugal!...
TYRONE
73
A prova é que nunca faltei a uma única representação teatral. (Com amargura) Se me 
embriago, não é você a pessoa mais indicada para me censurar. Nenhum outro homem 
terá tido maior motivo para fazê-lo...
MARY
Motivo? Que motivo? Sempre que você vai ao clube, bebe demais, não é assim? 
Sobretudo quando lá encontra o tal de McGuire. Ele se encarrega disso. Não pense 
que o estou censurando, querido. Faça como quiser. Não me importo.
TYRONE
Sei que você não se importa. (Volta-se para a sala da frente, ansioso por escapar.) 
Tenho que me vestir.
MARY (adianta-se de novo e, suplicante, o agarra pelo braço) 
Não, espere um pouco mais, meu bem. Eu lhe suplico! Pelo menos até que desça um 
dos meninos. Vocês todos vão me deixar tão depressa...
TYRONE (com amarga melancolia)
É você quem nos está deixando, Mary.
MARY
Eu? Que tolice é essa, James? Como poderia eu deixá-los? Não teria para onde ir... A 
quem iria visitar? Não tenho amigos...
TYRONE
A culpa é sua. (Pára e suspira com ar desamparado; a seguir tenta persuadi-la.) Há 
uma coisa que você poderia fazer esta tarde e que certamente lhe faria bem, Mary. Dê 
um passeio de automóvel. Afaste-se desta casa. Apanhe um pouco de sol e de ar 
fresco. (Ressentido) Afinal, comprei esse carro para você. Não gosto desses malditos 
veículos. Prefiro caminhar a pé ou tomar o bonde. (Com crescente mágoa) Tratei de 
ter um carro aqui à sua disposição para quando você voltasse do sanatório. Esperei 
que com isso você se alegrasse e distraísse o espírito. A princípio você costumava 
sempre dar uma volta, mas ultimamente é raro o dia em que sai. Custou-me caro; 
paguei uma quantia muito superior àquela de que eu podia dispor, e há ainda o 
motorista a quem devo dar casa, comida e um ordenado pesado, quer ele a leve a 
passeio ou não. (Com amargura sempre crescente) Um desperdício. O eterno 
desperdício que acabará me levando para um asilo de velhos. De que serviu? É como 
se eu tivesse atirado o dinheiro pela janela afora.
MARY (com calma indiferença)
74
Sim, foi mesmo um desperdício, James. Você não deveria ter comprado um carro de 
segunda mão. Foi enganado mais uma vez, como o é sempre, porque teima em fazer 
pechinchas e adquirir coisas usadas por baixo preço.
TYRONE
Mas esse carro é de uma das melhores marcas! Todos dizem que é superior a qualquer 
uma das modernas.
MARY (fingindo nem ter ouvido o que ele disse)
Foi outro esbanjamento de dinheiro contratar Smythe, que não passa de um simples 
ajudante de oficina, e nunca foi um motorista. Oh! É certo que seu ordenado é inferior 
ao de um verdadeiro chauffeur, mas imagino bem que ele compensa de sobra esse 
inconveniente com as propinas que lhe dão na garagem pelos serviços de conserto. O 
carro está sempre com algum defeito. Smythe se encarrega disso.
TYRONE
Não creio! Smythe pode não ser um motorista alinhado, próprio para servir a um 
milionário, mas é um homem honesto. Você é tão malévola quanto Jamie. Vive 
suspeitando de todo mundo!
MARY
Não se ofenda, querido. Não fiquei ofendida quando você me deu o carro. Sabia que 
você não me queria humilhar. Sabia que era esse o seu jeito de fazer as coisas. Senti-
me grata e comovida. Não ignorava que a compra do carro representava um sacrifício 
para você e que provava o bem que você me quer — à sua maneira, já se vê — 
mesmo porque você não podia realmente crer que isso me trouxesse algum benefício.
TYRONE
Mary! (Apertando-a bruscamente contra si, vencido) Mary querida! Pelo amor de 
Deus, por mim, pelos nossos filhos, pelo seu próprio bem, agora pare!...
MARY (por uns segundos, balbucia em confusão)
Eu... James!... Por favor! (Mas logo reaparece seu estranho e obstinado sentido de 
defesa.) Parar... o quê? De que me fala?!...
(Tyrone deixa cair os braços, angustiado. Num gesto 
impulsivo, é ela quem lhe põe o braço em volta da cintura.)
75
MARY
James, nós nos amávamos! E nos amaremos sempre! Lembremo-nos apenas disso, e 
não procuremos compreender o incompreensível, ou remediar o que não tem 
remédio... aquilo que a Vida nos fez e que não podemos desculpar ou explicar.
TYRONE (como se não tivesse ouvido, com amargor) 
Você nem ao menos se esforçará por fazê-lo?
MARY (deixando cair o braço com desânimo e afastando-se com ar indiferente)
O quê? O passeio de automóvel? Está bem. Eu o darei se você assim o quer, embora 
faça com que me sinta ainda mais só do que ficando em casa. Não tenho ninguém a 
quem convidar para passear comigo, e nunca sei para onde dizer a Smythe que me 
leve. Se tivesse uma pessoa amiga a cuja casa eu pudesse ir para conversar e rir um 
pouquinho... Mas, naturalmente, não tenho... nunca tive. (Sua expressão se torna 
cada vez mais distante.) No convento eu tinha tantas amigas! Meninas cujas famílias 
viviam em casas lindas. Eu costumava visitá-las e elas vinham também me ver na 
casa de meu pai. Mas, forçosamente,quando me casei com um ator — você sabe em 
que conceito eram tidos os atores naquele tempo! — muitas delas começaram a me 
evitar. E pouco depois de nos termos casado, veio logo o escândalo daquela mulher 
que foi sua amante e que o processou perante os tribunais. Desde então todas as 
minhas amigas ou tiveram pena de mim ou se afastaram. Odiei ainda mais as que se 
compadeceram.
TYRONE (sentindo-se culpado, mas ressentido)
Pelo amor de Deus, não revolva o que há tanto tempo está esquecido. Se o começo da 
tarde já remonta tão longe no passado... à noite, onde estará?
MARY (fitando-o num desafio)
Pensando bem, tenho mesmo que ir ao povoado. Preciso fazer umas compras na 
farmácia.
TYRONE (com desprezo mordaz)
Já dá um jeito de ter sempre escondido um pouco da droga, e obter novas receitas. 
Espero que acumule uma boa reserva para que não tornemos a ter outra noite feito 
aquela em que por ela clamava em altos gritos e saiu correndo de camisola para atirar-
se do cais.
MARY (ignorando o comentário do marido)
76
Tenho que comprar pasta para dentes, sabonetes e um creme para o rosto. (Mas de 
repente, dobra-se e implora lastimável) James, você não deve recordar isso! Não me 
deve humilhar assim!
TYRONE (envergonhado)
Perdoa-me, Mary. Sinto muito...
MARY (defendendo-se mais uma vez e num tom indiferente)
Não tem importância. Isto nunca aconteceu. Você deve ter sonhado. (Ele a fita, 
sentindo-se incapaz de ajudá-la.) Eu era tão sadia antes do nascimento de Edmund. 
Você não o pode ter esquecido, James. No meu corpo não havia um só nervo. Até 
viajando com você, uma temporada após a outra, depois de dormir semanas inteiras 
em hotéis baratos e em trens sem leito, de viver em albergues sujos, cuja comida era 
péssima, e de dar à luz meus filhos em quartos de aluguel, apesar de tudo isso eu 
sempre tive saúde. Mas o nascimento de Edmund foi a gota d’água que faz 
transbordar o copo. Estive tão doente. E o médico do hotel era um charlatão 
ignorante... Tudo o que ele sabia é que eu estava com dores. E foi-lhe tão fácil 
acalmar a dor!
TYRONE
Em nome de Deus, Mary, esqueça o passado.
MARY (com estranha serenidade objetiva)
Por quê? Como poderia esquecê-lo? O passado é o presente, não é não?! É igualmente 
o futuro. Todos nós tentamos evadir-nos dele, mas a Vida não o permite. 
(Continuando) Só censuro a mim mesma. Jurei, depois de ter perdido Eugene, que 
nunca mais teria outro filho. Foi por minha culpa que ele morreu. Se eu não o tivesse 
deixado com minha mãe para reunir-me a você por ocasião daquele giro teatral — só 
porque você me escreveu dizendo que sentia muita falta minha e que estava muito só 
—, Jamie não teria tido licença de entrar no quarto do bebê quando ainda estava com 
sarampo. (Sua fisionomia se torna dura.) Sempre me pareceu que Jamie o fez de 
propósito. Ele tinha ciúmes do pequenino. Detestava-o. (Ao ver que Tyrone tenta 
protestar) Oh! Bem sei que Jamie tinha apenas sete anos, mas nunca foi um menino 
tolo. Ele tinha sido avisado do risco que representaria para o bebê — que aquilo pode-
ria causar-lhe a morte. Ele o sabia. Nunca pude perdoá-lo.
TYRONE (com uma tristeza amargurada na voz)
E agora você retorna a Eugene? Será que não pode deixar que o nosso pobre filhinho 
morto descanse em paz?...
77
MARY (como se não tivesse ouvido)
Foi culpa minha. Eu devia ter teimado em ficar com o menino e não ter deixado que 
você me convencesse a partir ao seu encontro só porque eu o queria. Acima de tudo, 
não devia ter cedido quando você insistiu para que tivéssemos outro filho a fim de 
tomar o lugar de Eugene, porque esperava que assim eu me esqueceria de sua morte... 
Eu já sabia então, por experiência própria, que as crianças para serem bons filhos têm 
que ter um lar onde nascer; que as mulheres também precisam desse lar, se querem ser 
boas mães. Vivi sob o temor, o tempo todo em que esperava Edmund, prevendo 
sempre que alguma coisa terrível lhe ia acontecer. Sabia que, ao abandonar Eugene, 
provara que não era digna de ter outro filho, e que, se o tivesse, Deus me castigaria. 
Não devia ter tido Edmund.
TYRONE (com um olhar contrafeito em direção à sala da frente)
Mary! Tenha cuidado com o que diz. Se ele ouvisse, poderia pensar que você nunca o 
quis. Já se sente bastante mal sem que isto seja preciso.
MARY (com violência)
É mentira! Eu o queria. Mais do que qualquer outra coisa no mundo. Você não 
compreende! Digo que não devia tê-lo tido para o seu próprio bem. Nunca foi feliz 
nem o será. Nem tampouco saudável. Nasceu nervoso e sensível demais, e isso é por 
minha culpa. E agora, desde que está doente, levo a me lembrar de Eugene e de meu 
pai, e me sinto tão culpada, e tenho um tal receio... (Dominando-se numa transição 
instantânea, volta à sua atitude de firme negativa.) Oh! Eu sei que é um absurdo 
imaginar coisas horríveis quando não há motivo algum para tal! Afinal de contas, todo 
o mundo se resfria e se restabelece!
(Tyrone olha-a fixamente e suspira, sabendo que em nada 
lhe pode valer. Vira-se para a sala da frente, e avista Edmund 
que desce pela escada do vestíbulo.)
TYRONE (em voz baixa e rispidamente)
Aí vem Edmund. Por favor, procure dominar-se. Pelo menos até que ele saia. É o 
menos que pode fazer por ele.
(Espera, esforçando-se por tomar uma atitude agradável e 
paternal. Ela também espera, assustada, novamente dominada 
por um terror pânico, suas mãos tateando a esmo pela blusa 
do vestido, erguendo-se até o pescoço e o cabelo num 
movimento contínuo e automático. Quando Edmund aparece 
na porta, não ousa olhá-lo face a face. Dirige-se apressada 
para as janelas do lado esquerdo e olha para fora, as costas 
78
voltadas para a sala da frente. Entra Edmund. Mudou de 
roupa. Veste agora um terno de confecção de sarja azul-
marinha, de colarinho alto e duro, gravata e sapatos pretos. 
Tyrone diz com a cordialidade de um ator profissional.)
TYRONE
Bravos, você está muito elegante. Também eu vou subir para me preparar. (Dispõe-se 
a sair da sala.)
EDMUND (secamente)
Um momento, papai. Detesto trazer à baila assuntos desagradáveis, mas há o 
problema de condução. Não tenho um centavo para o bonde.
TYRONE (maquinalmente inicia uma de suas habituais preleções)
Você nunca terá um centavo enquanto não aprender o valor do... (Contém-se com ar 
envergonhado, contemplando o rosto doentio do filho; com inquieta piedade.) Mas 
você está aprendendo e muito, meu filho! Trabalhou de rijo antes de ficar doente. 
Progrediu magnificamente. Estou orgulhoso de você! (Retira do bolso um pequeno 
maço de notas e cuidadosamente separa uma. Edmund a toma, olhando-a 
rapidamente e sua fisionomia revela assombro. O pai torna a reagir na sua habitual 
forma sarcástica.) Obrigado. (Cita) “Muito mais afiado do que o dente da serpente 
é...”
EDMUND
...“um filho ingrato”. Já sei. Perdi o fôlego, papai. Perdi até a fala. Isto não é um 
dólar; são dez dólares!
TYRONE (aquem causa um certo mal-estar a própria generosidade)
Guarde-os no bolso. É provável que no povoado encontre alguns de seus amigos, e 
não poderia ser gentil e sociável sem dinheiro algum.
EDMUND
Você fala sério? Ora veja! Obrigado, pai. (Por um momento sente-se sinceramente 
tocado e agradecido. Logo a seguir, porém, observa a fisionomia do pai, com 
inquieta desconfiança.) Mas... por que... assim de repente?! (Com sarcasmo) O Dr. 
Hardy por acaso lhe disse que eu estava perdido? (Lê no rosto do pai uma profunda 
tristeza) Não! Nada disso! Minha piada foi detestável. Só a disse de brincadeira. 
(Num gesto impulsivo põe o braço em volta do pai e o abraça afetuosamente) Estou 
muito grato. De verdade, papai?!
TYRONE (sensibilizado, retribui-lhe o abraço) 
79
Não há de que, meu filho.
MARY (bruscamente volta-se para os dois num acesso de pânico confuso e assustada 
cólera)
Não o tolerarei!! (Martela ochão com os pés) Você está ouvindo, Edmund? Não 
tolerarei essas tolices mórbidas! Nem que você diga mais que vai morrer! São esses 
livros que vive lendo, esses livros que só contêm tristeza e morte! Seu pai deveria 
proibir que você os tivesse. E alguns dos poemas que você escreveu ainda são piores! 
Parece até que você não quer viver! Um rapaz de sua idade com toda a vida diante de 
si. Isso é somente uma “pose”, uma atitude copiada dos livros. Na realidade você nada 
tem de doente!
TYRONE
Cale-se, Mary.
MARY (adotando imediatamente um tom impessoal) 
Mas, James. É absurdo que Edmund esteja assim tão lúgubre, fazendo um tal alvoroço 
por nada. (Virando-se para o filho, mas evitando-lhe o olhar, com zombeteiro afeto) 
Não se preocupe, meu querido. Eu compreendo... (Aproxima-se.) Quer que o mimem, 
que o tratem com carinho e se aflijam por você. Ainda é tão garoto! (Põe o braço em 
volta do filho e o abraça. Edmund mantém-se ereto, sem ceder um passo à sua 
ternura. A voz de Mary começa a desfalecer.) Rogo-lhe, porém, querido, não leve isso 
tão longe assim, não diga esses horrores! Sei que é tolice de minha parte tomá-los a 
sério, mas não me posso impedir. Fiquei tão... tão assustada!
(Sua resistência baqueia, e oculta o rosto de encontro ao 
ombro do filho, soluçando. Edmund, comovido, a contragosto 
acaricia-lhe o braço, com uma ternura desajeitada.)
EDMUND
Não chore, mamãe. (Seu olhar se cruza com o do pai)
TYRONE (com voz rouca, agarrando-se a uma absurda esperança)
Talvez se você pedisse agora à sua mãe o que queria pedir-lhe há pouco... (Tateia à 
procura do relógio) Oh! Céus! Como já é tarde! Tenho que me apressar.
(Sai a passos largos pela sala da frente. Mary ergue a 
cabeça. Sua expressão volta a ser solícita e maternal. Parece 
ignorar as lágrimas que lhe sobem aos olhos)
80
MARY
Como se sente, querido? (Passa a mão na testa do filho.) Sua testa está um pouquinho 
quente, mas isso é por ter estado no sol. Tem muito melhor aspecto do que hoje pela 
manhã. (Segura-lhe a mão) Venha sentar-se aqui comigo. Não deve ficar assim tanto 
tempo de pé. Precisa aprender a poupar as suas forças. (Obriga Edmund a se sentar e 
senta-se ao lado, no braço da poltrona, rodeando-lhe o ombro para que ele a possa 
olhar face a face.)
EDMUND (tentando iniciar um apelo que sabe será inútil) 
Escute-me, mamãe...
MARY (interrompendo-o logo)
Não, não! Não fale. Recoste a cabeça e procure descansar. (Persuasivamente) Sabe? 
Acho que seria muito melhor se ficasse em casa esta tarde e eu cuidaria de você. A ida 
até o povoado nesse bonde velho e imundo será exaustiva num dia sufocante como o 
de hoje. Tenho certeza de que você se sentiria muito melhor ficando aqui em casa 
comigo.
EDMUND (em voz surda)
Você esquece que tenho hora marcada com o Dr. Hardy. (Tratando de retomar o seu 
apelo) Escute, mamãe...
MARY (rapidamente)
Você pode telefonar-lhe dizendo que não se sente bem. (Num tom excitado) Ir vê-lo é 
simplesmente perder tempo e jogar dinheiro fora. Ele nada mais fará senão mentir! 
Pretenderá que o caso é grave porque é disso que ele vive! (Com uma risadinha dura 
e mordaz) Aquele velho idiota! A única coisa que sabe fazer a respeito de medicina é 
tomar um ar solene e doutrinar sobre as vantagens da força de vontade!
EDMUND (tentando olhá-la nos olhos)
Mamãe, por favor, preste atenção. Quero pedir-lhe uma coisa. Você... você apenas 
recomeçou. Você tem essa força de vontade. Nós todos a ajudaremos. Estou disposto a 
tudo. Você o tentará, não, mamãe?
MARY (murmurando suplicante)
Por favor, não... não fale de coisa que não entende!
EDMUND (numa voz vencida)
Está bem! Entrego os pontos! Já sabia que tudo era inútil.
MARY (como sempre, negando obstinadamente a realidade)
81
De qualquer maneira, não sei a que é que você se refere. Porém, uma coisa sei: é que 
você deveria ser a última pessoa a... Mal voltei do sanatório, você ficou doente. O 
médico que me tratou disse que eu precisava ter calma e paz na minha casa, sem 
contrariedades e desde então só tenho feito é me preocupar com você. (Como que 
distraída) É... mas isso não é desculpa! Só estou tentando explicar. Não é uma 
desculpa! (Abraça-o e implora) Prometa-me, querido, que não pensará que isso seja 
uma desculpa!
EDMUND (com melancolia)
Que outra coisa posso pensar?
MARY (retirando lentamente o braço, novamente com ar distante e indiferente)
Sim, suponho que você não pode mesmo deixar de suspeitar.
EDMUND (envergonhado, porém ainda com amargura) 
Que esperava, então?
MARY
Nada, não. Não o censuro. Como poderia você crer em mim se eu própria não creio? 
Minto tanto!! Antigamente nunca o fazia. Agora sou forçada a mentir, especialmente 
para mim mesma! Preciso enganar-me. Mas... como querer que me compreenda 
quando eu própria não o faço? Nunca entendi nada disso... Só que um dia, há bastante 
tempo, descobri que minha própria alma já não me pertencia! (Faz uma pausa. Logo 
a seguir abaixa a voz e prossegue num estranho murmúrio confidencial.) Mas um dia 
virá, querido, em que tornarei a encontrá-la — algum dia quando já esteja 
restabelecido e eu o veja sadio, feliz e triunfante, e em que eu não tenha mais que me 
sentir culpada... dia em que a Santa Virgem Maria me perdoará, devolvendo-me a fé 
no Seu Amor e a Piedade que eu tinha nos meus tempos de colégio, e em que eu possa 
tornar a rezar e a invocá-la — quando Ela vir que ninguém mais neste mundo acredita 
em mim nem por um momento. Ela então acreditará; e com Sua ajuda será tudo tão 
fácil. Escutarei os meus próprios gritos de dor e de angústia mas, ao mesmo tempo, 
sorrirei sem medo porque estarei segura de mim mesma. (E, como Edmund 
permanece silencioso sem saber o que dizer, acrescenta tristemente) Naturalmente 
nisso também você não pode crer... (Levanta-se da poltrona e caminha até a janela 
do lado direito. Olha para fora e em tom casual continua) Pensando bem, é melhor 
você ir mesmo ao povoado. Esqueci que eu ia dar uma volta de automóvel. Tenho que 
passar na farmácia. Você não haveria de querer acompanhar-me lá. Na certa você se 
sentiria tão envergonhado!
82
EDMUND (numa voz quebrada)
Mamãe, não vá!
MARY
Suponho que você repartirá com Jamie esses dez dólares que seu pai lhe deu. Vocês 
sempre repartem tudo... não é verdade? Como bons camaradas. Já calculo o que Jamie 
fará com a sua parte: irá embriagar-se em algum lugar onde possa encontrar-se com o 
único tipo de mulher que lhe agrada e lhe interessa. (Vira-se para o filho, suplicando 
atemorizada) Edmund, prometa-me que você não vai beber. É tão perigoso! Você sabe 
o que o Dr. Hardy disse..
EDMUND (com ironia)
Pareceu-me compreender que ele não passava de um velho imbecil!
MARY (num tom que inspira dó)
Edmund! (Ouve-se a voz de Jamie no hall da frente, chamando: “Vamos indo, Ed”. A 
maneira de ser de Mary torna-se de novo distante) Vai, Edmund, Jamie o espera. 
(Caminha até o batente da sala da frente) Aí vem seu pai também. (Tyrone grita: 
“Vamos, Edmund”. Mary beija o filho com afeto distante) Se você voltar para jantar, 
procure não chegar atrasado. E diga o mesmo a seu pai. Você sabe Bridget como é. 
(Ele lhe vira as costas e se vai. Tyrone diz em voz alta, do vestíbulo: “Até logo, 
Mary”. A seguir, Jamie: “Até logo, mamãe’. Ela responde: “Até logo”.)
(Ouve-se a porta telada da frente que se fecha após a saída 
dos três. Mary se aproxima da mesa e permanece de pé, uma 
das mãos tamborilando sobre a mesa, a outra erguendo-
separa ajeitar o cabelo. Relanceia o olhar pela sala com uma 
expressão de temor e desamparo, e murmura para si mesma)
MARY
Como se está só aqui nesta sala. (Seu rosto se endurece e revela um profundo 
desprezo de si mesma) Mais uma vez você está mentindo a si própria! No fundo você 
queria ver-se livre deles. O despeito e a repulsa que sentem por você não lhe fazem 
boa companhia! Você está aliviada porque foram embora. (Ri —um pequeno riso 
angustiado)Mas, então... oh! minha Mãe do Céu, por que me sinto tão 
desesperadamente só?!
FIM DO ATO II
83
ATO III
CENÁRIO
O mesmo. São pouco mais ou menos seis e meia da 
tarde. Na sala começa a escurecer rapidamente, devido 
ao nevoeiro que vem do Estreito, semelhante a um 
manto branco que, do lado de fora, recobrisse as 
janelas. De um farol que se encontra mais adiante na 
entrada do porto, chega, a intervalos regulares, o 
ulular de uma sirene que geme como uma fêmea em 
dores de parto; e do próprio porto, intermitentemente, 
ouve-se o sinal de aviso dos iates ali ancorados.
Como na cena que precedeu o almoço — no ato 
anterior — sobre a mesa encontram-se a garrafa de 
uísque, os copos e um jarro de água gelada.
Em cena, Mary e a empregada Cathleen, a qual está 
de pé à esquerda da mesa, com um copo vazio na mão, 
como se o tivesse esquecido. Percebe-se que ela bebeu. 
No seu rosto de expressão atoleimada, mas jovial, 
aparece um sorriso satisfeito e lisonjeado.
Mary está mais pálida do que dantes, e seus olhos 
revelam um brilho pouco natural, acentuando seu 
estranho desapego do mundo que a cerca. Fechou-se 
ainda mais sobre si mesma, e encontrou refúgio e alívio 
em um sonho onde a realidade presente não passa de 
uma aparência que se deve aceitar e dissimular com a 
maior indiferença — até com cruel cinismo — ou 
ignorar por completo. Por momentos, em toda a figura 
de Mary assoma um quê de juvenil, de misteriosamente 
alegre e espontâneo, como se o seu espírito tivesse sido 
liberto para tornar a ser a ingênua colegial sem 
complexos e alegre do seu tempo de convento. Mudou 
de vestido para dar o seu passeio de automóvel — um 
vestido simples, mas que se sente ser custoso e de boa 
qualidade e que lhe assentaria muito bem, não fosse a 
maneira negligente — quase desleixada — com que o 
usa. Seu cabelo não se acha mais rigorosamente 
penteado — um tanto desgrenhado, caem-lhe algumas 
mechas para um lado. Conversa com a empregada, com 
uma certa familiaridade, como se Cathleen fosse uma 
velha e íntima amiga. Ao levantar-se o pano, Mary está 
parada junto à porta telada, olhando para fora. Ouve-
se o gemido da sirene.
MARY (com a vivacidade de uma jovem, achando graça)
Oh! Essa sirene!! Você não acha que é horrível, Cathleen?
CATHLEEN (com maior familiaridade do que a habitual, porém sem deliberada 
impertinência, visto que gosta sinceramente da patroa)
Acho, sim, senhora. Parece um fantasma anunciando a morte de alguém!
MARY (continua falando como se não tivesse ouvido. Durante quase todo o 
diálogo seguinte, percebe-se que ela retém Cathleen ao seu lado, como 
um mero pretexto para poder falar)
Hoje não me incomodo. Mas ontem à noite quase me pôs louca! Fiquei 
acordada, sem poder dormir, numa angústia insuportável.
CATHLEEN
Isso é mau agouro... Voltando ontem do povoado, fiquei apavorada. Cheguei a 
pensar que Smythe — esse macaco horrendo — nos faria emborcar numa vala 
ou esmagar contra alguma árvore! Não se via um palmo adiante do nariz. 
Gostei bem que a senhora me fizesse sentar atrás, ao seu lado. Se eu viesse na 
frente, junto daquele macaco... Smythe não pode ficar com aquelas horríveis 
mãos quietas. Basta ter a menor oportunidade e começa a beliscar a gente na 
perna ou... bem... a senhora sabe onde é, não é? Desculpe, mas é a pura 
verdade!
MARY (sonhadora)
Eu não me referia à neblina, Cathleen. Na realidade adoro esse nevoeiro!
CATHLEEN
Dizem que faz bem à pele.
MARY (prosseguindo)
Encobre-nos o mundo e dele nos oculta. Sente-se que tudo está mudado — que 
nada mais é o que parecia ser. Ninguém nos pode atingir nem tocar.
CATHLEEN
Eu não me importaria tanto assim se Smythe fosse um tipo insinuante como 
alguns dos motoristas que conheço — quero dizer — contanto que não 
passasse de certos limites, porque sou uma moça direita... Mas, tratando-se de 
um anão como esse... Eu até já disse pra ele: Você pensa que eu estou em 
apuros para me meter com um macaco feito você?... E já o avisei de que um 
dia desses dou-lhe um tapa daqueles de que ele não se esquecerá tão cedo! E 
dou mesmo!
MARY
Como me irrita essa sirene! Não nos deixa em paz! É como se o tempo todo 
levasse a nos recordar alguma coisa... a nos advertir... e a nos chamar. 
(Sorrindo de modo estranho) Mas esta noite não conseguirá fazê-lo! Não 
passará de um som desagradável. Não me recordará coisa alguma! (Com um 
riso brincalhão e juvenil) Exceto talvez os roncos do Sr. Tyrone! Diverte-me 
sempre tanto pirraça-lo por causa dos seus roncos. Sempre roncou — 
sobretudo quando bebe muito, mas é como um menino grande, não gosta de 
admiti-lo! (Ri e se aproxima da mesa.) Bem... Acho que eu também devo 
roncar às vezes, e a mim tampouco agradaria reconhecê-lo. Não tenho, 
portanto, o direito de caçoar dele, não é verdade? (Senta-se na cadeira de 
balanço à direita da mesa)
CATHLEEN
Oh! É claro! Mas toda a gente sã ronca. Dizem que é sinal de saúde. 
(Preocupada) Que horas serão? Tenho que voltar à cozinha. A umidade piora o 
reumatismo de Brídget e ela então fica que nem um demônio. Vai me arrancar 
a cabeça! (Larga o copo sobre a mesa e dá um passo em direção à sala dos 
fundos.)
MARY (num impulso, apreensiva)
Não, não vá, Cathleen. Não quero ficar só, por enquanto.
CATHLEEN
A senhora não ficará só por muito tempo. Daqui a pouquinho o patrão e os 
rapazes estarão de volta.
MARY
Não, não creio que voltem para o jantar. Têm hoje um pretexto bom demais 
para se deixar ficar pelos bares onde se sentem à vontade. (Cathleen a fita 
intrigada, estupidamente perplexa. Mary prossegue sorrindo) Não se preocupe 
com Bridget. Direi a ela que precisei de você e a retive junto a mim — e 
depois, quando você for, lhe levará uma boa dose de uísque. Ela então não 
ficará mais aborrecida.
CATHLEEN (sorrindo, tranqüilizada)
É certo que não, senhora. É a única coisa que a põe de bom humor. Gosta 
muito de um traguinho!
MARY
Tome outro uísque, se quiser, Cathleen.
CATHLEEN
Não sei se devo. Já bebi bastante. (Estende a mão para a garrafa.) Bom... Um 
gole a mais não me fará mal. (Serve-se.) Á sua saúde, senhora. (Bebe, sem se 
dar o trabalho de acrescentar água ao uísque.)
MARY (perdida nas suas recordações)
Na verdade tive muito boa saúde, antigamente, Cathleen. Mas isso foi há tanto 
tempo!
CATHLEEN (novamente preocupada)
O patrão por certo vai notar que a garrafa está mais vazia. Para essas coisas 
tem um olhar de lince.
MARY (divertida)
Oh! Vamos pregar-lhe uma peça. A mesma de que Jamie costuma sempre 
lançar mão: e só medir algumas doses de água e derramá-las na garrafa.
CATHLEEN (faz o que a patroa manda e diz com uma risadinha tola)
A metade desse uísque será água! Que Deus nos acuda. O patrão vai perceber 
pelo gosto da bebida!
MARY (com indiferença)
Não. Quando voltar para casa já estará bêbedo demais para notar a diferença. 
Julga ter uma boa desculpa para afogar suas mágoas!
CATHLEEN (com filosofia)
Todo homem de verdade tem as suas fraquezas. Não daria um níquel por um 
abstêmio. É gente sem nervos. (Numa perplexidade tola) Uma boa desculpa? A 
senhora quer dizer a saúde do Sr. Edmund, não é, senhora? Sente-se que o 
patrão anda muito preocupado com ele.
MARY (põe-se logo na defensiva, numa atitude rígida, de dureza, mas — coisa 
estranha — sua reação é maquinal, como se não atingisse o fundo de sua 
emoção)
Não seja boba, Cathleen! Por que havia ele de estar preocupado com Edmund? 
Uma gripezinha à toa não tem a menor importância. E o Sr. Tyrone não 
costuma preocupar-se com coisa alguma, a não ser o dinheiro, os negócios e o 
receio de acabar seus dias na miséria! Bom... quero dizer: fora disso nada o 
preocupa seriamente. Porque de fato não o avalia nem o compreende... (Com 
um risinho afetuoso e indulgente) Meu maridoé um homem muito estranho, 
Cathleen.
CATHLEEN (como que vagamente ressentida pela apreciação da patroa em 
relação ao marido)
Bem... de qualquer forma é um homem bondoso, fino e bem bonitão, senhora. 
Não ligue tanto assim às suas fraquezas...
MARY
Oh! Não ligo não. Eu o amo com imensa ternura há trinta e seis anos. Isso 
prova que sei o quanto no fundo ele é digno de ser querido... só que não pode 
deixar de ser o que é, não é assim mesmo?
CATHLEEN (tranqüilizada)
É sim, senhora. A senhora deve querer muito bem ao patrão porque qualquer 
um pode ver que ele adora até o chão em que a senhora pisa! (Lutando contra 
o efeito da última dose de uísque e tentando conversar direito) A propósito... 
Como se explica que a senhora nunca tenha entrado para o teatro?
MARY (ofendida)
Eu?! Como lhe ocorreu uma idéia tão absurda dessas? Fique sabendo que fui 
criada num lar respeitável e educada no melhor convento do oeste. Antes de 
conhecer o Sr. Tyrone, mal suspeitava da existência do teatro. Era uma moça 
muito piedosa. Até pensava em me fazer freira. Nunca senti o menor desejo de 
ser atriz.
CATHLEEN (sem rodeios)
Pois eu não imagino a senhora freira! Tenho certeza como a senhora raramente 
pisa numa igreja, que Deus a perdoe.
MARY (como se não a tivesse ouvido)
Nunca me senti bem no ambiente de teatro. Nem mesmo quando o Sr. Tyrone 
insistia para que eu o acompanhasse, nos seus giros teatrais. Pouco me dava 
com o pessoal da companhia ou com qualquer pessoa vinculada à cena. Não 
que tenha prevenção contra os atores. Sempre foram gentis comigo e eu com 
eles. Mas ao lado deles nunca me senti à vontade. A sua vida não é a minha 
vida. Sempre se interpôs entre mim e... (Erguendo-se bruscamente) Mas não 
falemos das coisas do passado, que já não têm mais remédio!... (Vai até a 
porta de entrada e olha para fora.) Como está forte o nevoeiro. Nem se vê o 
caminho. Toda a gente do mundo poderia passar por aqui... e eu não o saberia. 
Quisera eu que sempre fosse assim. Já começa a escurecer. Daqui a pouco já 
terá anoitecido, graças a Deus. (Virando-se, em tom indeciso) Foi bondade sua, 
Cathleen, fazer-me companhia na tarde de hoje. Ter-me-ia sentido muito só se 
tivesse ido ao povoado desacompanhada.
CATHLEEN
É claro! E, por acaso, para mim não é mais agradável dar um passeio num 
lindo carro do que ficar aqui ouvindo as mentiras de Bridget acerca de seus 
parentes?! Foi como se eu estivesse de folga. (Interrompe-se e, tolamente, 
acrescenta) Só de uma coisa não gostei.
MARY (hesitante)
De que, Cathleen?
CATHLEEN
Da atitude daquele farmacêutico quando lhe entreguei a sua receita. 
(Indignada) Que desaforo!
MARY (com fingido espanto)
Que quer dizer, Cathleen? Que farmácia? Que receita? (Rapidamente, 
enquanto a empregada a contempla, por sua vez, espantada) Ah! 
Naturalmente! Eu havia esquecido! O remédio para o reumatismo das minhas 
mãos. Mas... o que disse o homem? (Com indiferença) Não que eu me importe 
com isso, contanto que tenha aviado a receita.
CATHLEEN
Pois eu me importei! Não estou habituada a que me tratem como uma ladra. O 
farmacêutico me olhou e perguntou com ar desaforado: “Onde é que você 
conseguiu essa receita?” E eu respondi: “Isso não é da sua conta, mas já que 
quer saber, é para a senhora em cuja casa trabalho, a Sra. Tyrone, que está 
sentada ali fora esperando no carro”. Isso fez com que ele cerrasse o bico. 
Espiou pela porta, viu a senhora e exclamou: “Ah!” E então foi buscar o 
remédio.
MARY (numa voz hesitante)
É, ele me conhece. (Senta-se na poltrona á direita da mesa. Acrescenta numa 
voz serena, distanciada) Tenho que tomar esse remédio porque é a única coisa 
que consegue acalmar-me a dor... toda a dor... quero dizer, de minhas mãos. 
(Ergue as mãos e as contempla com pena e melancolia) Agora já não tremem. 
Pobres mãos! Parece incrível! Antigamente eram o que em mim mais atenção 
chamava — assim como os meus olhos e cabelos. Além disso, eu era muito 
bem feita de corpo. (Sua voz torna-se cada vez mais distante, perdida no seu 
sonho.) Eram mãos de musicista! Gostava tanto de tocar piano! No convento, 
estudava música com afinco, horas por dia... se é que se pode chamar estudo o 
que se faz com prazer! A Madre Elisabeth e a minha professora diziam que eu 
tinha mais talento do que qualquer outra das alunas que tinham passado por 
suas mãos. Meu pai pagava-me aulas particulares. Ele me mimava. Concedia-
me tudo aquilo que eu lhe pedia. Queria mandar-me estudar na Europa assim 
que eu terminasse o curso no colégio das freiras. Eu teria ido à Europa se não 
me tivesse apaixonado pelo Sr. Tyrone. Ou teria entrado para o convento. Eu 
só tinha dois sonhos: ou ser freira — e dos dois este era o mais lindo — ou ser 
pianista e dar concertos. (Faz uma pausa e fita fixamente as próprias mãos. 
Cathleen pisca os olhos para afugentar o sono e a embriaguez) Há tantos anos 
que não toco piano! Nem que o quisesse, não poderia fazê-lo com esses dedos 
deformados! Quando me casei, durante algum tempo ainda tratei de não 
abandonar a música. Mas foi impossível... Os hotéis de passagem, as pensões 
baratas, os trens imundos, tendo filhos, vivendo como ave de arribação, sem ter 
a minha casa... (Contempla as suas mãos com fascinada repulsa) Veja, 
Cathleen, como estão feias! Tortas e mutiladas! Parecem ter sofrido algum 
horrível acidente! (Ri — um risinho estranho e inesperado) E na realidade foi 
isso mesmo! (Bruscamente esconde as mãos atrás das costas) Não quero mais 
olhar para elas. Ainda me fazem maior mal do que a sirene, recordando-me 
de... (A seguir, com desafiadora segurança) Mas nem elas mesmo podem me 
atingir agora. (Põe as mãos diante de si e as fita, fixa e intencionalmente. Logo 
a seguir diz em tom sereno) Estão distantes. Eu as vejo, mas a dor se foi.
CATHLEEN (cada vez mais perplexa na sua estupidez)
A senhora tomou o remédio! É certo que está agindo sobre a senhora de uma 
maneira esquisita. Se eu não o soubesse, julgaria até que a senhora tivesse 
tomado um tragozinho!
MARY (sempre distante e sonhadora)
Isso suprime a dor. Faz com que se retroceda no tempo, até que ela não nos 
alcance mais. Somente o passado é real... o passado em que se foi feliz. (Uma 
pausa. E como se suas palavras fossem uma evocação que tivesse o dom de 
reacender a felicidade, todos os seus gestos e sua expressão fisionômica logo 
se transformam. Parece mais jovem. Nela aflora algo da inocente aluna de 
colégio religioso, e timidamente sorri) Se você acha o Sr. Tyrone bonito agora, 
Cathleen, devia tê-lo visto quando eu o conheci! Era considerado um dos 
homens mais belos do país. As meninas de colégio que o haviam visto 
trabalhar no teatro ou que o conheciam de fotografia tinham loucura por ele. 
Era um ídolo das garotas de então! No fim do espetáculo, as mulheres se 
postavam junto à porta do seu camarim só para vê-lo sair. Você pode imaginar 
minha emoção quando papai me escreveu contando que travara amizade com 
James Tyrone e que eu lhe seria apresentada quando eu fosse para casa passar 
as férias de Páscoa. Mostrei a carta a todas as colegas e — oh! como elas me 
invejaram! Antes de mais nada, papai me levou ao teatro para vê-lo 
representar. Era um drama sobre a Revolução Francesa e ele fazia o papel de 
um nobre. Não pude afastar os olhos dele o tempo todo. Chorei quando o 
jogaram na prisão... e depois tive raiva, com medo que meus olhos e meu nariz 
ficassem vermelhos! Meu pai me dissera que logo após a peça iríamos até os 
bastidores, ao seu camarim. E assim fizemos. (Dá uma risadinha excitada e ao 
mesmo tempo tímida) Sentia-me tão encabulada que nada soube fazer senão 
gaguejar e corar feito uma tolinha! Mas ele não parecia achar-me tão tola 
assim. Sei que ele gostou de mim desde o momento em que fomos 
apresentados um ao outro. (Com coqueteria) Acho que, afinal de contas, meu 
nariz e meusolhos não estavam vermelhos! Eu era realmente muito bonita 
naquela época, Cathleen. E ele — com maquilagem e no seu traje de nobre que 
lhe ia tão bem — era ainda mais lindo que qualquer um dos meus sonhos mais 
loucos! Era diferente dos outros homens comuns, como alguém vindo de um 
outro mundo. E ao mesmo tempo era simples, bondoso, modesto. Não era 
vaidoso nem convencido. Apaixonei-me na mesma hora. E ele também se 
apaixonou logo por mim... disse-mo depois. Esqueci todos os meus projetos de 
fazer-me freira ou de ser pianista. Só queria uma coisa: ser sua esposa. (Faz 
uma pausa, o olhar perdido no vácuo, os olhos impregnados de sonho, 
estranhamente brilhantes, e na boca um sorriso de êxtase, terno e próprio de 
uma adolescente) Foi há trinta e seis anos, mas eu o revejo tão claramente 
como se fosse esta noite. Amamo-nos desde então! E em todos esses trinta e 
seis anos nunca houve em volta de seu nome o mais ligeiro sopro de escândalo. 
Quero dizer, a respeito de... qualquer outra mulher. Nunca, desde que me 
conheceu! Isso me tem feito muito feliz, Cathleen, tem-me ajudado a esquecer 
tantas outras coisas!...
CATHLEEN (combatendo a sonolência que a bebida lhe provocou)
É um gentil cavalheiro, e a senhora uma mulher de sorte. (Preocupada) Posso 
levar o uísque para Bridget? Daqui a pouco é hora do jantar e tenho que ajudá-
la na cozinha. Se não lhe der algo que a acalme...
MARY (ligeiramente exasperada por ter sido arrancada de seu sonho e trazida 
de volta à realidade)
Sim, sim, vá. Não preciso de você agora.
CATHLEEN (com alívio)
Obrigada, senhora. (Pega um copo e com ele caminha até a sala dos fundos) A 
senhora não ficará só por muito tempo. O senhor e os rapazes...
MARY (impaciente)
Não, não. Não virão. Diga a Bridget que não os esperarei. Pode servir o jantar 
às seis e meia em ponto. Não tenho fome, mas me sentarei à mesa e 
acabaremos de uma vez com isso.
CATHLEEN
A senhora deveria comer qualquer coisa. Que remédio estranho é esse que a 
senhora toma que lhe tira assim o apetite?
MARY (recomeçou novamente a se deixar arrastar pelos seus devaneios; 
mecanicamente reage)
Que remédio? Não sei a que é que você se refere. (Desejando fazer com que 
ela se afaste) É melhor que você vá levar o uísque para Bridget.
CATHLEEN
Sim, senhora.
(Sai pela sala dos fundos. Mary espera até que ouve 
fechar-se, por trás de si, a porta da copa. Logo se 
recosta na cadeira numa sonolência relaxada, olhando 
fixamente no vácuo. Seus braços estão caídos sobre os 
braços da poltrona — suas mãos, de longos dedos 
deformados, de nódulos sensíveis e intumescidos, 
largadas numa imobilidade total. Na sala, aos poucos 
escurece. Reina um silêncio de morte. Nisto, chega de 
fora o gemido melancólico da sirene, seguido por um 
verdadeiro coro de sinetas, abafado pela neblina, que 
ressoa dos barcos ancorados no porto. O rosto de Mary 
não trai o menor sinal que revele ter ela ouvido o ruído, 
mas suas mãos começam a mover-se em espasmos e 
seus dedos, por um momento, agitam-se no ar. Franze a 
testa e meneia a cabeça maquinalmente, como se pelo 
cérebro lhe tivesse passado uma mosca, incomodando-
a. Perde logo o seu ar remoçado e juvenil, e se 
transforma numa mulher envelhecida, triste e amarga)
MARY (com irônica amargura)
Não passo de uma velha tola e sentimental. Que há de maravilhoso no encontro 
entre uma colegialzinha romântica e boba e um ídolo das matinês juvenis? Era 
muito mais feliz antes de saber que ele sequer existia, no convento onde rezava 
à Virgem Maria!... (Com angustiado anelo) Ah! Se eu pudesse reencontrar a 
minha Fé perdida e recomeçar a rezar... (Faz uma pausa e começa a recitar a 
ave-maria, num tom monótono e inexpressivo) Ave Maria, cheia de graça. O 
Senhor é convosco. Bendita sois entre as mulheres... (Com sarcasmo) Crê, 
então, que a Virgem Santa se deixará enganar por uma morfinômana 
embusteira, só porque recita essas palavras?! Não pode iludi-La! (Ergue-se 
bruscamente. Leva as mãos ao cabelo, ajeitando-o no usual e mecânico 
cacoete) Tenho que subir. Não tomei o suficiente... Quando a gente recomeça, 
nunca sabe ao certo a dose necessária! (Vai até a sala da frente e se detém no 
batente da porta ao ouvir vozes no caminho. Tem um sobressalto, sentindo-se 
culpada) São eles... (Volta precipitadamente e torna a sentar. Com ar 
obstinado e hostil e em tom ressentido) Por que voltaram? Não queriam 
voltar... e eu preferia muito estar só... (De súbito opera-se nela uma 
transformação total. Mostra-se pateticamente aliviada e ansiosa) Oh! Como 
estou contente que tenham vindo! Sentia-me tão só. (Ouve-se a porta da frente 
que se fecha e Tyrone chama com voz inquieta)
TYRONE
Você está aí, Mary?
(Acende-se a luz do vestíbulo que se reflete na sala 
da frente e se projeta sobre sua esposa. Mary se ergue 
da cadeira, seu rosto iluminado de afeto, e responde 
com sofreguidão)
MARY
Estou aqui sim, querido. Na sala de estar. Estava esperando você.
(Entra Tyrone pela sala da frente. Edmund o segue. 
Nota-se que Tyrone bebeu muito, mas é apenas o seu 
olhar um tanto vidrado e um certo embotamento no 
modo de falar que o revelam. Edmund também passou 
da conta, sem muito efeito aparente. Só que suas faces 
encovadas e os olhos brilham febris. Param no limiar 
da porta e observam Mary inquiridoramente. O que 
vêem só faz é confirmar suas piores suspeitas. Mas, no 
momento, Mary não se apercebe dos olhares que a 
condenam. Beija o marido e o filho. Sua atitude é 
exageradamente efusiva. Eles aceitam a contragosto os 
seus carinhos. Ela fala, muito excitada.)
MARY
Estou tão contente que vocês tenham vindo! Já tinha perdido a esperança! 
Receei que vocês não voltassem para casa. A noite está lúgubre e há uma tal 
cerração! Deve estar muito mais alegre nos bares lá do povoado, onde há gente 
com quem conversar e contar piadas. Não! não o neguem! Sei muito bem 
como vocês se sentem, e não os censuro em absoluto! Por isso mesmo é que 
ainda lhes fico mais agradecida por terem voltado para casa. Estava aqui tão só 
e desanimada. Venham e sentem-se um pouco. (Senta-se atrás da mesa à 
esquerda. Edmund, à esquerda da mesma, e Tyrone na cadeira de balanço, à 
direita.) Daqui a pouco o jantar estará pronto. Na verdade, vocês hoje 
chegaram um pouco cedo demais. São milagres que acontecem!... Aqui está o 
uísque, meu bem. Quer que o sirva? (Serve-o sem esperar resposta.) E você, 
Edmund? Não devo incitá-lo a beber, mas um golezinho antes do jantar, como 
um aperitivo, não pode fazer-lhe mal algum. (Serve o uísque ao filho. Nem 
Edmund nem o pai fazem o menor movimento para pegar os copos. Ela 
continua a falar, como que ignorando o silêncio de ambos.) Onde está Jamie? 
Mas... é certo! Não voltará enquanto ainda tiver no bolso o suficiente para 
pagar mais um gole! (Estende os braços e aperta a mão do marido, com 
tristeza na voz.) Temo que Jamie esteja perdido para nós há muito tempo já! 
(Seu rosto se endurece.) Mas não devemos permitir que arraste Edmund 
consigo, como gostaria de fazê-lo. Tem ciúmes porque Edmund sempre foi o 
menino mimado da família... Como antigamente teve ciúmes de Eugene. Não 
se dará por satisfeito enquanto não fizer de Edmund um fracassado, tão sem 
remédio quanto ele próprio...
EDMUND (angustiado)
Basta, mamãe, basta!
TYRONE (abatido)
Sim, Mary. Quanto menos você disser agora... (A Edmund com uma voz 
ligeiramente empastada) Com tudo isso há alguma coisa de exato na 
advertência de sua mãe. Tome cuidado com seu irmão ou lhe envenenará a 
vida com sua maldita língua viperina!
EDMUND (como antes)
Oh! Basta você também, papai.
MARY (continua como se não tivesse dito nada)
Ao ver Jamie tal qual é agora, custa crer que foi algum dia onosso garotinho! 
Você se lembra que criança sã e feliz ele era, James? Apesar de todos os hotéis 
baratos, trens sujos e das pensões com sua comida infecta, ele nunca ficava 
zangado, nem doente. Sorria sempre... ria para tudo. Quase nunca chorava. 
Eugene foi tal qual ele, sadio e feliz, durante os seus dois aninhos de vida... 
antes que, devido a minha negligência, eu lhe causasse a morte!
TYRONE
Oh! meu Deus! Como fui estúpido de voltar para casa!
EDMUND
Papai, cale-se!
MARY (sorri para Edmund com uma ternura distante)
Era Edmund quem tinha mau gênio, ele que sempre se irritava e assustava sem 
motivo algum. (Acariciando-lhe a mão e pirraçando-o) Todos costumavam 
dizer, querido, que você chorava por qualquer ninharia!
EDMUND (sem poder reprimir a sua amargura)
Talvez pressentisse que havia uma boa razão para não rir!
TYRONE (repreendendo-o em tom compassivo)
Vamos, vamos, rapaz. Não leve a sério o que...
MARY (como se não o tivesse ouvido, com tristeza)
Quem teria acreditado então que, com o tempo, Jamie viria a ser o que é: uma 
vergonha para nós! Você se lembra, James, quando ele foi para o colégio 
interno; durante anos recebíamos sempre os boletins mais elogiosos! Todos 
gostavam dele. Os professores comentavam a sua inteligência e a facilidade 
que ele tinha para aprender as lições. Mesmo depois, quando começou a beber 
e que tiveram que expulsá-lo, ainda nos escreveram dizendo-nos o quanto o 
lamentavam, visto ser ele um estudante tão brilhante e apreciado de todos. 
Prediziam-lhe um belo futuro, se, algum dia, aprendesse a levar a vida a sério! 
(Interrompe-se e ajunta, num tom impessoal, estranho e triste.) É uma pena! 
Pobre Jamie... Custa-se a crer... (Nela já se operou nova transformação. Seu 
rosto se endurece e encara o marido com acusadora hostilidade.) Não, não é 
difícil compreender o porquê. Você fez dele um ébrio. Desde que abriu os 
olhos pela primeira vez na vida, sempre o viu bebendo. Sempre havia uma 
garrafa sobre a mesa no quarto barato de hotéis ordinários em que ficávamos, e 
se Jamie, em criança, tinha algum pesadelo ou a menor dor de estômago, o 
remédio que você lhe dava era uma colher de uísque para acalmar.
TYRONE (ferido)
Então sou eu que tenho a culpa de que um homenzarrão vadio se tenha 
transformado num bêbedo vagabundo!... hem? Foi para ouvir isso que voltei 
para casa?! Devia tê-lo imaginado! Quando você está com todo esse fel na 
alma, procura lançar a culpa sobre todo o mundo, menos sobre si mesma.
EDMUND
Papai, você mesmo me disse que não prestasse atenção! (Ressentido) De 
qualquer forma, é verdade! Você fez o mesmo comigo. Lembro-me dessa tal 
colherada de uísque de cada vez que eu acordava com um pesadelo!
MARY (num tom distante, nostálgico)
Sim, quando era pequenino tinha sempre pesadelo. Você nasceu com medo! 
Porque eu senti tanto medo de trazê-lo ao mundo... (Faz uma pausa — e logo 
após prossegue no mesmo tom) Peço-lhe que não culpe seu pai, Edmund. Não 
pode agir de melhor maneira. Aos dez anos deixou de ir à escola. Seus pais 
eram irlandeses — daqueles irlandeses turrões e ignorantes, esmagados pela 
pobreza. Estavam, sem dúvida, sinceramente convencidos de que o uísque era 
o melhor medicamento possível para uma criança doente ou assustada.
(Tyrone, colérico, parece disposto a dizer alguma 
coisa em defesa de sua família, porém Edmund 
intervém)
EDMUND (asperamente)
Papai! (Mudando de assunto) Vamos ou não tomar esse uísque?
TYRONE (dominando-se e em voz abafada)
Tem razão. Sou um idiota de dar atenção ao que ela diz. (Toma o copo com 
indiferença) Beba com vontade, rapaz!
(Edmund bebe, porém Tyrone fica absorto olhando 
para o copo que tem na mão. Imediatamente aquele 
nota a considerável quantidade de água acrescida ao 
uísque. Franze a cara e afasta o olhar da garrafa, 
lançando-o de relance à sua mãe. Dispõe-se a dizer 
algo, todavia contém-se a tempo)
MARY (mudando de tom, continua)
Perdoe-me pela amargura das minhas palavras, James. Tudo isso já vai tão 
longe!... Porém magoou-me um pouco a sua atitude quando você lamentou ter 
voltado para casa. Eu me senti tão feliz, tão aliviada, quando você voltou... 
fiquei tão grata! É triste e aborrecido ficar aqui sozinha, cercada por essa 
neblina quando anoitece.
TYRONE (sensibilizado)
Também eu me alegro de ter vindo, quando reencontro em você a verdadeira 
Mary.
MARY
Sentia-me tão isolada que retive Cathleen a meu lado, só para ter com quem 
falar. (Sua atitude e expressão voltam a ser de uma tímida menina de 
convento) Sabe o que eu contei a ela, querido? A noite em que meu pai me 
levou ao seu camarim e em que me apaixonei por você. Lembra-se?
TYRONE (profundamente comovido, em voz rouca) 
Acha que algum dia poderia esquecê-lo, Mary?
(Edmund desvia os olhos de ambos, com tristeza e 
mal-estar)
MARY (com ternura)
Não. Sei que me ama ainda... apesar de tudo!
TYRONE (seu rosto se ilumina e suas pálpebras batem, retendo as lágrimas; 
com serena força)
Sim! Que Deus me seja testemunha. Sempre e para sempre, Mary!
MARY
E eu também o amo, querido. Apesar de tudo.
(Há uma pausa durante a qual Edmund se move 
contrafeito. Mary torna a revestir-se de seu estranho ar 
desligado, como se falasse com indiferença de gente a 
quem visse de uma longa distância.)
MARY
Devo, porém, confessar-lhe, James, que, embora nunca pudesse deixar de amá-
lo, nunca me teria casado com você se eu soubesse que você bebia tanto. 
Recordo-me da primeira noite em que seus amigos do bar tiveram que trazê-lo 
até a porta do nosso quarto do hotel; bateram e trataram de correr, antes que eu 
a abrisse. Ainda estávamos na nossa lua-de-mel, você se lembra?
TYRONE (com culpada veemência)
Não, não me lembro! Não foi na lua-de-mel! E nunca na minha vida tiveram 
que me botar na cama, nem faltei a um só espetáculo em que tomasse parte.
MARY (como se não tivesse ouvido)
Durante horas e horas eu tinha esperado naquele horrível quarto de hotel. 
Inventava para você uma série de desculpas. Procurava convencer-me de que 
você devia ter ficado preso por algum motivo ligado ao seu trabalho. Eu sabia 
tão pouco de teatro! Mas comecei a ficar com medo, apavorada! Imaginei toda 
espécie de acidentes horríveis! Ajoelhei-me e supliquei a Deus que não tivesse 
acontecido nada com você!... E foi aí que eles o trouxeram carregado e o 
deixaram defronte da porta.... (Com um leve suspiro de tristeza) Ainda não 
previa a freqüência com que isso se repetiria nos anos a seguir, quantas vezes 
da mesma maneira teria que esperar sozinha naqueles horrorosos quartos de 
hotel... Acabei por me acostumar...
EDMUND (explodindo, enquanto fita o seu pai com olhar acusador)
Deus meu! Não é de estranhar que... (Controla-se e ajunta rispidamente) 
Quando é que vamos jantar, mamãe? Já deve estar na hora.
TYRONE (afundado num sentimento de vergonha, que procura ocultar, consulta 
o seu relógio)
Sim, já deve estar na hora. Vejamos. (Olha fixamente o relógio, sem vê-lo. Em 
tom de súplica) Mary, não poderia esquecer?
MARY (com indiferente piedade)
Não, querido. Mas eu perdôo. Sempre perdoei. De sorte que não deve sentir-se 
assim culpado. Lamento ter de recordar-lhe. Não desejo estar triste nem 
entristecê-lo. Quero lembrar-me somente da época feliz do nosso passado. 
(Torna a transformar-se na jovem ingênua, alegre e tímida) Lembra-se do dia 
do nosso casamento, meu bem? Tenho certeza de que nem se lembra como era 
o meu vestido de noiva! Os homens não reparam nessas coisas! Não lhes dão 
importância! Mas foi algo de muito importante para mim, isso eu asseguro! 
Como fiquei nervosa e preocupada. Sentia-me tão excitada, tão feliz!... Meu 
pai me dissera para comprar o que quisesse, sem ligar ao preço. “O melhor 
nunca é bastante bom” — declarou. Creio que ele me mimava demais. Minha 
mãe, não. Era muito severa e piedosa. Acho que tambémtinha ciúmes de mim. 
Não aprovou o meu casamento, especialmente tratando-se de um ator. Acredito 
que ela esperava que eu me fizesse freira. Costumava repreender meu pai. 
Levava resmungando: “Quando eu comprar alguma coisa, você nunca mais 
venha me dizer que repare no preço! Você está estragando essa menina de tal 
maneira que tenho pena de seu marido, se ela algum dia se casar! Esperará que 
ele lhe dê a lua. Não será nunca uma boa esposa!” (Ri afetuosamente) Pobre 
mãe! (Sorri para o marido, com inesperada coqueteria) Estava, porém, 
enganada... não é verdade, James? Nunca fui má esposa... não é verdade?
TYRONE (em voz rouca, deixando de sorrir) 
Não me estou queixando, Mary.
MARY (por cuja fisionomia passa uma sombra de culpa) 
Pelo menos, sempre o quis do fundo do meu coração e... apesar das 
circunstâncias, fiz tudo o que era possível! (Desvanece-se a sombra do seu 
rosto, que retoma sua tímida expressão de adolescente) Pouco faltou para que 
aquele vestido de noiva custasse a vida à minha modista e a mim mesma! (Ri) 
Eu era tão exigente! O vestido nunca me parecia estar suficientemente a gosto! 
Por fim, a costureira se negou a tocar mais nele, com receio de acabar por 
estragá-lo. Pedi-lhe que saísse do quarto, para que eu pudesse examinar-me a 
sós diante do espelho. Oh! Como eu me sentia satisfeita e envaidecida! Disse a 
mim mesma: “Apesar de o nariz, a boca e as orelhas serem um pouquinho 
grandes demais, esses defeitos são compensados pelos olhos e cabelos, e pelo 
corpo e as mãos. É tão bonita quanto qualquer das atrizes que ele tenha 
conhecido, e isso sem precisar de maquilagem”. (Faz uma pausa, franzindo a 
testa como que se esforçando por recordar) Por onde andará agora o meu 
vestido de noiva? Guardei-o numa mala, embrulhado em papel de seda. 
Sonhava ter uma filha, e, quando chegasse a hora dela se casar... Não poderia 
comprar um vestido de noiva mais lindo, e eu sabia, James, que você nunca lhe 
diria que comprasse o que quisesse, sem ligar ao preço. Haveria de querer que 
ela descobrisse por aí alguma pechincha!... Era um vestido de cetim macio, 
reluzente, debruado de uma maravilhosa renda antiga duchesse, com uns 
pequenos babados em volta da gola e das mangas e cujas pregas eram 
drapeadas nas costas, fazendo um efeito de “anquinhas”. A blusa tinha 
barbatanas e era muito ajustada ao corpo. Lembro-me de que, quando me vesti, 
tive que conter a respiração para que minha cintura ficasse a mais fina 
possível. Meu pai consentiu até que eu pusesse a renda sobre os sapatos de 
cetim branco e em redor do véu, com botões de flores de laranjeira. Oh! Como 
eu gostava daquele vestido! Era tão lindo!! Onde estará agora?! Quando eu me 
sentia muito só, costumava retirá-lo da mala, mas sempre me fazia chorar, de 
modo que, afinal, há muito tempo já desisti... (Torna a franzir a testa) Onde o 
terei guardado?... Provavelmente em alguma daquelas malas velhas lá no 
sótão. Um dia desses preciso dar uma busca.
(Interrompe-se, o olhar absorto fixo diante de si. 
Tyrone suspira e sacode a cabeça desanimado. Olha 
para o filho como que a lhe pedir solidariedade, mas 
Edmund tem os olhos postos no chão.)
TYRONE (num tom forçado de despreocupação)
Não lhe parece que já é hora de jantarmos, querida? (Numa débil tentativa de 
ironia) Você está sempre ralhando comigo porque chego atrasado. Hoje que, 
por uma vez, fui pontual, é o jantar que está tardando! (Ela não parece ouvi-lo. 
Tyrone continua com ar jovial) Bom. Se ainda não posso comer, ao menos 
posso beber. Tinha-me esquecido disso! (Bebe o seu uísque. Edmund o 
observa. Tyrone franze a testa, olha para a mulher com um olhar penetrante e 
ao mesmo tempo receoso; brutalmente a interpela) Quem andou tocando no 
meu uísque?! A metade é água pura! Jamie tinha saído e de todas as maneiras 
não exageraria dessa forma o seu truque habitual. Qualquer imbecil o notaria 
logo! Responda-me, Mary! (Com asco e cólera) Espero em Deus que agora 
você não tenha dado para beber além de...
EDMUND
Cale-se, papai. (Sem olhar para a mãe, pergunta-lhe) Você ofereceu uísque a 
Cathleen e a Bridget, não foi, mamãe?
MARY (num tom casual e indiferente)
Foi sim, naturalmente. Elas trabalham muito e ganham pouco. E sou a dona da 
casa — tenho que impedir que vão embora. Além do mais, quis fazer um 
agrado a Cathleen, porque lhe pedira que me acompanhasse ao povoado e 
levasse à farmácia minha receita para ser aviada.
EDMUND
Mas, mamãe, pelo amor de Deus! Você não pode confiar nela. Você quer que 
todo mundo venha a saber?
MARY (sua fisionomia se fecha obstinada)
Saber o quê?! Que eu sofro de reumatismo nas mãos e tenho que tomar um 
remédio para passar a dor? Por que me deva envergonhar disso?! (Vira-se para 
o filho, com antagonismo cruel e acusador — quase uma vingativa 
hostilidade) Nunca soube o que era reumatismo antes de você nascer! Pergunte 
a seu pai.
(Edmund desvia o olhar e se retrai)
TYRONE
Não faça caso, filho. Isso não quer dizer nada. Quando ela chega ao ponto de 
recorrer à velha desculpa — tão absurda — do reumatismo nas mãos, é que já 
está fora do nosso alcance.
MARY (vira-se para ele com um sorriso provocante e estranhamente triunfante)
Fico contente que você finalmente tenha percebido isso, James. Agora, talvez, 
você e Edmund parem com essa mania de viver querendo que eu me recorde... 
(Abruptamente, num tom prático e objetivo) Por que não acende a luz, James? 
Está ficando escuro. Sei que lhe desagrada fazê-lo, mas Edmund já lhe provou 
que uma lâmpada acesa não gasta tanto assim! Não há razão alguma para que o 
seu receio do asilo de velhos o leve a ficar tão avaro!
TYRONE (reage maquinalmente)
Nunca disse que uma lâmpada gastava muito! O que enriquece a companhia de 
eletricidade é acender uma aqui, outra acolá... (Levanta-se abruptamente e 
acende o abajur.) Mas sou é um tolo de discutir com você... (Para Edmund) 
Vou buscar uma nova garrafa de uísque, filho, e aí, sim, vamos beber de 
verdade! (Sai pela porta dos fundos.)
MARY (achando graça - no seu jeito impessoal e distante)
Ele vai se esgueirar furtivamente até a porta externa da adega, de modo que as 
empregadas não o vejam. No fundo, sente-se envergonhado de guardar o seu 
uísque fechado a cadeado! Seu pai é um homem estranho, Edmund. Levei 
muitos anos até conseguir entendê-lo! Você precisa fazer um esforço para 
também compreender e desculpá-lo e não mostrar esse desdém pela sua 
avareza. Lembre-se que o pai dele abandonou a mulher e os seis filhos dois 
anos após terem chegado aos Estados Unidos. Disse-lhes que tinha o 
pressentimento de que breve ia morrer, e que sentia saudades da Irlanda e 
queria voltar, para lá fechar os olhos. De modo que partiu, e de fato morreu. 
Seu pai teve que trabalhar numa oficina quando tinha apenas dez anos de 
idade.
EDMUND (protesta surdamente)
Ora, mamãe! Pelo amor de Deus! Já ouvi papai contar mais de mil vezes essa 
história da oficina!
MARY
Sim, querido — você teve que ouvir essa história uma porção de vezes, mas 
duvido muito que jamais tenha tentado compreendê-la...
EDMUND (como se não tivesse ouvido, numa voz magoada)
Escute-me, mamãe. Você ainda não se distanciou tanto de nós, que se esqueça 
de tudo. Você nem me perguntou o que o médico me disse hoje à tarde. Não 
lhe importa?!
MARY
Não diga isso, meu filho. Assim me fere.
EDMUND
Mamãe, o que tenho é grave, O Dr. Hardy agora já tem certeza.
MARY (rígida, mas com uma teimosia desdenhosa, defendendo-se contra a 
verdade)
Oh! Esse velho charlatão embusteiro! Eu o avisei de que ele inventaria.
EDMUND (numa dolorosa obstinação)
Ele chamou um especialista para me examinar, a fim de estar perfeitamente 
seguro.
MARY (ignorando essa informação)
Não me fale de Hardy! Se você tivesse ouvido o que o médico do sanatório 
achouda maneira por que este me tratou! Aquele sim, sabia, realmente, alguma 
coisa. Declarou-me que Hardy devia era ser preso. Que era um verdadeiro 
milagre que eu não tivesse ficado louca. Eu lhe disse que isso me acontecera 
uma vez naquela noite em que saí correndo de camisola para me atirar do cais 
na água. Você se lembra, não é verdade? E, com tudo isso, você ainda quer que 
eu preste atenção ao que Hardy diz. Ah! Não!...
EDMUND (com tristeza)
Lembro-me perfeitamente. Foi quando papai e Jamie acharam que não podiam 
mais ocultar-me a verdade. E então Jamie me contou... Chamei-o de 
mentiroso! Tentei dar-lhe um soco na cara. Mas, no fundo, sabia que ele não 
estava mentindo. (Sua voz treme e seus olhos começam a se encher de 
lágrimas.) Céus! E desde então a vida se tornou um inferno!
MARY (roída de pena)
Oh! Meu filhinho, não chore! Assim me faz sofrer tanto!
EDMUND
Perdoa-me. Mas foi você quem primeiro tocou no assunto. (Com amarga e 
teimosa insistência) Escute-me, mamãe. Preciso dizê-lo, quer você queira, quer 
não. Terei que ir para um sanatório!
MARY (atordoada como se tal possibilidade nunca lhe tivesse ocorrido)
Ir para um sanatório? (Com violência) Não! Não o consentirei! Como se atreve 
o Dr. Hardy a aconselhar semelhante coisa sem me consultar? Como se atreve 
o seu pai a permiti-lo? É meu filho. Que ele se ocupe de Jamie! (Com 
crescente exasperação e angústia) Sei por que James quer mandá-lo para um 
sanatório. Para afastá-lo de mim. Sempre quis fazê-lo. Sempre teve ciúmes dos 
meus filhos. Sempre arranjou meios de fazer com que eu os largasse. Foi isso o 
que causou a morte de Eugene! E é sobretudo de você que tem ciúmes. Sabe 
que eu o quero mais do que a qualquer um porque...
EDMUND (angustiado)
Oh! Será que você não pode parar de dizer absurdos, mamãe? Deixe de jogar 
sempre a culpa de tudo sobre ele! E por que se opõe tanto assim a que eu me 
afaste agora? Tenho partido tantas outras vezes e nunca me pareceu que isso 
lhe dilacerasse o coração!
MARY (amarga)
Receio que no final das contas não tenha mesmo muito sentimento. 
(Tristemente) Querido, você deve compreender que ao descobrir que sabia da 
verdade... só podia alegrar-me com o fato de estar longe... onde não me 
pudesse ver...
EDMUND (com voz embargada)
Oh! Mamãe, não diga isso. (Estende as mãos às cegas e segura a de Mary; 
porém a solta quase imediatamente, esmagado de novo por sua horrível 
amargura.) Você fala tanto no seu amor por mim... e nem sequer presta atenção 
quando tento explicar-lhe o quanto estou enfermo.
MARY (numa transição brusca para uma atitude maternalmente jactanciosa)
Vamos, vamos! Não falemos mais nisso! Se me recuso a ouvir é porque sei que 
se trata apenas das mentiras ignorantes de Hardy!
(Edmund se retrai. A mãe insiste num tom forçado e 
zombeteiro em que se sente um oculto e crescente 
ressentimento)
MARY
Você é tão parecido com seu pai, querido. Gosta tanto de fazer uma cena por 
uma coisa à toa para poder ser trágico e dramático! (Com um riso, fazendo 
pouco do que lhe foi dito) Se eu o encorajasse, um pouquinho que fosse, a 
primeira coisa que você me diria é que estava para morrer.
EDMUND
Há pessoas que morrem disso... Seu próprio pai...
MARY (ríspida)
Por que você o menciona? Não há comparação possível entre o caso dele e o 
seu. Ele estava tuberculoso. (Enraivecida) Detesto quando você começa a ficar 
assim lúgubre e mórbido. Proíbo-lhe que me recorde a morte de meu pai, está 
me ouvindo?
EDMUND (o semblante duro e sério)
Sim, mamãe. Quisera Deus que eu não a tivesse ouvido. (Levanta-se e fica de 
pé, contemplando-a fixamente com um ar que a condena. Com profunda 
amargura) É muito duro, por vezes, ter-se por mãe uma morfinômana. (Ela 
tem um violento sobressalto. De seu rosto toda a vida parece esvair-se, 
deixando-o com uma aparência de máscara de gesso. Imediatamente Edmund 
desejaria poder retirar o que disse, e murmura desolado) Perdoe-me, mamãe. 
Eu estava irritado. Você me magoou muito.
(Há uma pausa em que se ouvem a sirene e as sinetas 
dos barcos)
MARY (caminha lentamente para as janelas à direita; parece um autômato; 
quando fala, na sua voz há uma nota como que apagada, morta, 
distante)
Ouve só essa horrível sirene... E as sinetas. Por que o nevoeiro faz com que 
tudo pareça tão desolado e perdido?!
EDMUND (a voz quebrada)
Eu... não posso ficar mais aqui. Não quero jantar.
(Sai apressadamente pela sala da frente. Ela 
continua olhando pela janela até que ouve fechar-se 
atrás do filho a porta da rua. Então retorna e se senta 
na cadeira com o mesmo olhar perdido no seu rosto 
lívido.)
MARY (numa voz vaga)
Preciso subir... O que eu tomei não foi bastante. (Pausa. Com um desesperado 
anelo) Espero que um dia, sem querer, eu tome uma dose excessiva. Não teria 
coragem de fazê-lo deliberadamente. A Santíssima Virgem, então, não me 
perdoaria nunca mais...
(Ouve o marido que regressa e se vira ao vê-lo entrar 
pela sala dos fundos, tendo na mão uma garrafa de 
uísque que acaba de desarrolhar. Tyrone está furioso.)
TYRONE (indignado)
O cadeado está todo arranhado. Aquele patife do nosso filho tentou forçar a 
fechadura com um pedaço de arame, como já fez em outra ocasião. (Com 
satisfação, como se aquilo fosse um duelo perpétuo de engenho e esperteza 
entre o filho mais velho e ele) Mas, desta vez ele fez papel de bobo! É um 
cadeado especial, que nem um ladrão profissional conseguiria forçar. (Deixa a 
garrafa sobre a mesa e, repentinamente, repara na ausência de Edmund) Onde 
está Edmund?
MARY (com um ar vago e distante)
Ele saiu. Talvez tenha ido novamente ao povoado encontrar-se com Jamie. 
Suponho que lhe reste algum dinheiro, e que esse dinheiro lhe esteja 
queimando os bolsos. Disse que não queria jantar. Pelo que vejo, esses dias ele 
não tem tido apetite algum. (Obstinadamente) Mas isso não passa de um 
simples resfriado de verão. (Tyrone a observa demoradamente e sacode a 
cabeça sem saber o que fazer. Serve-se de uma boa dose de uísque e a sorve de 
um trago só. Mas a tensão é excessiva para Mary e, repentinamente, esta 
rompe em soluços) Oh! James, estou com tanto medo! (Levanta-se, abraça-se 
a ele e esconde o rosto no seu ombro, soluçando) Sei que ele vai morrer!
TYRONE
Não diga isso! Não é verdade! O médico me garantiu que em seis meses ele 
estaria curado!
MARY
Não acredite nisso. Sei quando está fingindo. E será tudo por minha culpa! 
Nunca devia ter tido Edmund. Teria sido muito melhor para ele. Eu não lhe 
poderia então causar dano algum. Edmund não teria que saber que sua mãe não 
passa de uma morfinômana... e odiá-la por isso!
TYRONE (a voz trêmula)
Cale-se Mary, pelo amor de Deus! Ele lhe quer bem. Ele sabe que isso foi uma 
maldição que caiu sobre você sem que você dela tivesse consciência, contra. a 
sua vontade. Ele se orgulha de que você seja sua mãe! (Bruscamente, ao ouvir 
que abrem a porta da copa) Silêncio. Aí vem Cathleen. Você não há de querer 
que ela a veja chorando?!
(Mary se volta para as janelas da direita, enxugando 
rapidamente os olhos. Ao cabo de uns segundos, 
aparece a empregada no limiar da porta da sala dos 
fundos. Seu andar é incerto e ela sorri de modo 
grotesco)
CATHLEEN (tem sobressalto ao ver Tyrone; diz com ar solene)
O jantar está servido, senhor. (Alteando a voz desnecessariamente) O jantar 
está servido, senhora. (Esquece seu ar digno e interpela Tyrone com uma 
familiaridade bem-humorada) Então o senhor veio, hem?! Está bem! A Bridget 
é que vai ficar furiosa! Eu disse a ela que a madame tinha avisado que o senhor 
não viria jantar. (Notando a censura no olhar do patrão) Não olhe para mim 
dessa maneira! Se bebi uns goles, não roubei uma só gota. Fui convidada!
(Volta-se com dignidade e altivez e sai pela porta dos 
fundos)
TYRONE (suspirae apela para toda a sua bonomia de ator)
Vamos, minha cara. Vamos jantar. Tenho um apetite de caçador!
MARY (aproxima-se dele; seu rosto parece de novo ser de gesso, e seu tom é o 
mais distante possível)
Você terá que me desculpar, James. Não poderia comer coisa alguma. Estou 
com muita dor nas mãos. Acho que o melhor que tenho a fazer é ir para cama e 
descansar. Boa noite, querido. (Beija-o maquinalmente e se volta para a sala 
da frente)
TYRONE (áspero)
Você vai subir para tomar um pouco daquele maldito veneno, não é assim? 
Antes que a noite termine você parecerá um fantasma enlouquecido!
MARY (começando a andar — no mesmo tom que adota sempre, alheio e 
desligado)
Não sei a que você se refere, James. Quando bebe demais você diz umas coisas 
mesquinhas e amargas... Você é tão perverso quanto Jamie ou Edmund!
(Afasta-se e sai pela porta da sala da frente. Ele fica 
parado por um momento sem saber que fazer. Não 
passa de um pobre velho triste, vencido e desorientado. 
Caminha penosamente pela sala dos fundos em direção 
à sala de jantar.)
FIM DO ATO III
ATO IV
CENÁRIO
O mesmo. Por volta de meia-noite. A lâmpada do 
vestíbulo foi apagada, de sorte que não vem luz alguma 
da sala da frente. Na salinha de estar está aceso apenas 
o abajur para leitura, que se acha sobre a mesa. Do 
lado de fora, o manto de cerração parece mais denso 
do que nunca. Ao levantar-se o pano, ouve-se a sirene 
e, logo a seguir, as sinetas de sinalização dos navios no 
porto. Tyrone acha-se sentado junto à mesa. Usa 
pincenê e joga paciência. Tirou o paletó e veste um 
velho chambre. A garrafa de uísque na bandeja está 
três quartos vazia. Sobre a mesa vê-se outra garrafa 
cheia que Tyrone trouxe da adega para ter à mão uma 
boa reserva de bebida. Está embriagado, e se trai pela 
maneira fixa e vagarosa pela qual observa cada uma 
das cartas a fim de se certificar delas, jogando-as, a 
seguir, como que indeciso quanto ao seu propósito. Seu 
olhar mostra-se vago e brumoso. Sua boca relaxada. 
Mas, apesar de todo o uísque tomado, não conseguiu 
escapar ao seu tormento, e ali está como apareceu no 
final do ato precedente: um pobre velho triste e 
vencido, esmagado por uma resignação sem 
esperanças.
Ao se erguer o pano, acabou de jogar uma paciência 
e recolhe as cartas. Embaralha -as desajeitadamente, 
deixando cair umas duas no soalho. Apanha-as com 
dificuldade e novamente recomeça a embaralhá-las, 
quando ouve alguém que entra pela porta da frente. 
Espia por sobre o pincenê na direção do vestíbulo de 
entrada.
TYRONE (com voz pastosa)
Quem está aí? É você, Edmund?
(A voz de Edmund responde laconicamente “Sim”. 
Logo a seguir evidentemente o jovem esbarra em 
alguma coisa no hall que está ás escuras. Ouve-se sua 
voz soltando uma praga. Ao cabo de uns instantes 
acende-se a luz do vestíbulo. Tyrone franze o sobrolho e 
diz, alteando a voz.)
TYRONE
Apague essa luz antes de entrar.
(Edmund, todavia, não o faz. Entra atravessando a 
sala da frente. Está bêbedo; porém, como o pai, suporta 
bem a bebida, e sua fisionomia pouco revela do seu 
estado, exceção feita aos olhos, de uma agressividade 
desafiadora. Tyrone fala, a princípio, num tom de 
afetuosa acolhida e com um certo alívio.)
TYRONE
Alegro-me com a sua chegada, filho. Sentia-me muito solitário. (Magoado) 
Você fez muito mal em fugir e em deixar-me aqui à noite, só, sabendo que... 
(Com irritação, em tom áspero)Já lhe disse que apague esta luz! Não estamos 
dando uma festa. Não há motivo para termos a casa toda iluminada a esta hora, 
queimando dinheiro!
EDMUND (irritado)
Iluminadíssima! Uma só lâmpada! Puxa!! Todo mundo deixa acesa uma luz na 
entrada, antes de ir deitar-se. (Esfrega o joelho.) Pouco faltou para que eu 
fraturasse o joelho no porta-chapéus.
TYRONE
A luz acesa daqui ilumina o vestíbulo. Você teria podido ver o caminho se não 
estivesse bêbedo!
EDMUND
Se eu não estivesse bêbedo? Essa é boa!
TYRONE
Não tenho nada a ver com o que os outros fazem! Se querem desperdiçar o seu 
dinheiro estupidamente, só por fanfarronada, que o façam!
EDMUND
Uma única lâmpada! É o cúmulo. Não seja tão sovina! Já lhe provei em 
algarismos que, se você deixar acesa uma lâmpada durante a noite inteira, não 
lhe custará mais do que um gole de uísque!
TYRONE
Vá pro diabo com os seus algarismos! A prova está nas contas que devo pagar.
EDMUND (sentando-se defronte ao pai, desdenhosamente) 
Sim. Os fatos nada significam para você, não é verdade?! A única verdade é o 
que lhe convém crer! (Sarcasticamente) Shakespeare, por exemplo, era um 
católico irlandês..
TYRONE (obstinado)
Certamente que o era. Os seus dramas o provam.
EDMUND
Pois não o era; e seus dramas nada provam a não ser na sua opinião. (Com 
ironia) O Duque de Wellington também era outro bom católico irlandês, não?!
TYRONE
Nunca disse que fosse bom. Foi um renegado, mas de qualquer modo, um 
católico.
EDMUND
Pois tampouco o era. O que acontece simplesmente é que você quer acreditar 
que só um general católico irlandês poderia vencer Napoleão!
TYRONE
Não vou discutir com você. Pedi-lhe que apagasse a luz do vestíbulo.
EDMUND
Já ouvi — mas pelo que me diz respeito, continuará acesa.
TYRONE
Não tolerarei sua insolência! Você me obedecerá, sim ou não?
EDMUND
Não. Se teima em ser um avarento maníaco, apague-a você mesmo.
TYRONE (com cólera crescente e ameaçadora)
Escute. Tenho tolerado muitas coisas de sua parte, porque as loucuras que você 
cometia me levavam a crer que você não estava no seu juízo perfeito. 
Desculpei-o, e nunca ergui a mão contra você. Mas há sempre a gota d’água 
que faz transbordar o copo! Você vai obedecer e apagar aquela luz; ou senão, 
com todo o seu tamanho, tão certo quanto eu estou aqui, levará uma surra de 
que não se esquecerá nunca! (Bruscamente lembra-se de que Edmund está 
doente e se sente logo arrependido e culpado.) Perdoe-me, filho. Esquecia-me 
de que... Não devia fazer-me perder assim a calma.
EDMUND (agora também envergonhado de si mesmo)
Esqueça isso, papai. Eu também lhe peço desculpas. Não tinha o direito de 
aborrecê-lo por uma bagatela. Creio que passei da conta na bebida. Apagarei 
essa maldita luz. (Faz menção de se levantar.)
TYRONE
Não, fique onde está. Deixe-a acesa.
(Ergue-se bruscamente, cambaleando um pouco na 
sua embriaguez, e começa a acender as três lâmpadas 
do candelabro — visivelmente compadecido de si 
próprio — de uma maneira a um tempo dramática e 
grotescamente infantil)
EDMUND (que observa a cena com um crescente senso de humor, sorri com 
afetuosa zombaria)
Esta é uma cena, papai. Você é maravilhoso...
TYRONE (senta-se, encabulado, e resmunga)
É isso! Caçoa desse velho tolo! Do pobre ator de estradas! Mas a cena final 
será de qualquer modo o asilo, e isso não me parece propriamente cômico! (Ao 
ver que Edmund ainda sorri, muda de assunto.) Bom... não vale a pena 
discutir... Não é um vagabundo como o seu irmão. Renunciei a toda esperança 
de que aquele rapaz venha a ter um pouco de juízo. E, por falar nisso, por onde 
andará ele?!
EDMUND
Como quer que eu saiba?
TYRONE
Julguei que tivesse ido ao povoado procurá-lo.
EDMUND
Não. Fui até a praia. Não o tornei a ver desde a tarde.
TYRONE
Pudera! Se você fez a tolice de repartir com ele o dinheiro que lhe dei!...
EDMUND
Naturalmente. Ele sempre reparte comigo o que tem.
TYRONE
Então é fácil adivinhar onde deve estar metido: em algum bordel.
EDMUND
E caso esteja mesmo... então o quê?! Por que não?
TYRONE
Por que não? Hem!... E, com efeito, o lugar ideal para ele. Que eu saiba, nunca 
sonhou, a não ser com rameiras e uísque!
EDMUND
Ora, papai. Pelo amor de Deus! Se você já recomeça com isso, vou-me 
embora!
TYRONE (em tom conciliador)
Bem... bem. Não direi mais nada. Deus sabe que o assunto também não me 
agrada. Quer beber um gole comigo?EDMUND
Ah! Boas falas!
TYRONE (passando-lhe a garrafa maquinalmente) 
Faço mal em lhe oferecer mais uísque. Você já bebeu bastante.
EDMUND (servindo-se uma dose grande, numa voz de ébrio) 
Bastante ainda não é propriamente o que se chama uma farra! (Devolve-lhe a 
garrafa.)
TYRONE
No seu estado de saúde é prejudicial.
EDMUND
Esqueça a minha saúde. (Ergue o copo) Saúde!
TYRONE
Saúde! (Bebem) Se você foi até a praia a pé, deve estar molhado e enregelado.
EDMUND
Qual nada! Entrei no bar, na ida e na volta.
TYRONE
A noite de hoje não é a mais indicada para longas caminhadas.
EDMUND
Gosto do nevoeiro. Estava precisando disso mesmo. (Sua voz é típica de ébrio 
e com efeito parece realmente.)
TYRONE
Você devia ter bastante critério para não arriscar-se a...
EDMUND
Para o inferno com o seu critério!! Todos somos uns doidos. Para que 
precisamos de critério?! (Cita sardonicamente uns versos de Dowson.)
Nem o riso, nem o pranto duram muito...
Nem tampouco o amor, o desejo e o ódio;
Creio que não mais deles participamos,
Uma vez franqueado o grande mortal...
Não são longos os dias de rosas e de vinho!
De um sonho brumoso
Emerge o nosso caminho por um pouco de tempo
[ - a seguir se fecha
Novamente num sonho...
(Com os olhos fixos no vácuo) A névoa estava onde eu queria estar. No 
caminho, a alguns passos daqui, não se podia ver esta casa. Nem se adivinhava 
sequer a sua presença. Nem tampouco a das outras casas da avenida. Só se 
podia distinguir alguma coisa a poucos metros de distância. Não encontrei 
vivalma... Tudo era irreal. Até o menor ruído. Nada parecia ser o que realmente 
é. Era isto que eu desejava. Estar a sós comigo mesmo num outro mundo, onde 
a verdade é mentira, e a vida pode ocultar-se de si mesma. Mais adiante do 
porto — onde a estrada se cruza com a praia — perdi até a noção de que estava 
em terra firme. A neblina e o mar pareciam confundir-se. Era como se eu 
caminhasse para o fundo do mar. Como se há muito, muito tempo, eu me 
tivesse afogado. Como se eu fosse um fantasma surgido da bruma, e o nevoeiro 
o fantasma do mar. Era uma tal sensação de paz: não ser mais do que um 
fantasma dentro de outro fantasma! (Repara que o pai o observa fixamente 
com um misto de inquietude e censura irritada; então sorri zombeteiro) Não 
olhe para mim como se eu tivesse ficado maluco!... O que digo tem sentido 
comum. Quem quer encarar a vida tal qual é, se pode evitá-lo?!... São as três 
Górgonas numa só. Quem as fitar face a face é convertido em pedra. Ou então 
é Pã. Você o vê e morre — por dentro — naturalmente... e tem que seguir 
vivendo como um espectro.
TYRONE (impressionado e ao mesmo tempo com uma certa revolta)
Há em você um poeta — não há dúvida — porém um tanto mórbido. (Com um 
sorriso forçado) Para o diabo com esse seu pessimismo! Já me sinto, assim 
como estou, bastante deprimido. (Suspira) Por que você não recorda 
Shakespeare e esquece os poetastros de terceira classe?! Nele encontrará o que 
quer exprimir... e tudo o que merece ser dito. (Cita, fazendo valer sua voz 
harmoniosa)
Somos da substância de que são feitos os sonhos; 
E nossa curta vida se conclui no sono.
EDMUND (irônico)
Bravos! Isso é lindo! Mas não era isso o que eu estava tentando dizer. “Somos 
da substância de que é feito o esterco”, isso sim! De modo que devemos 
embriagar-nos e esquecer. Isto era o que eu pretendia dizer.
TYRONE (com desaprovação)
Ora! Guarde esses sentimentos tolos para você. Não lhe devia ter dado esse 
uísque.
EDMUND
Arrancou-me dos sonhos, não há dúvida! E a você também! (Sorri, com 
afetuosa pirraça.) Embora você nunca tenha faltado a uma única 
representação!... (Agressivamente) Mas, afinal... Que mal há em se ficar 
bêbedo? Acaso não é isso o que buscamos?! Nós não precisamos enganar-nos 
mutuamente, papai. Ao menos por esta noite. Sabemos bem o que tentamos 
esquecer. (Precipitadamente) Mas, não falemos mais nisso. Agora é inútil.
TYRONE (com voz surda)
É... O que nos resta fazer é tratar de nos resignar... mais uma vez.
EDMUND
Ou embriagar-nos o suficiente para podermos olvidar... (Recita, e recita bem, 
num tom apaixonado, amargo e irônico a tradução de Symons do poema em 
prosa de Baudelaire)
“Embriague-se. Somente isto importa: é o único problema! Se não quer sentir 
o horrível peso do Tempo que pesa sobre os seus ombros e o esmaga, 
embriague-se sempre.
“Com quê? Com vinho, com poesia ou com virtude. Com o que queira. Porém 
embriague-se.
“E se, por vezes, na escadaria de um palácio, ou na borda verdejante de um 
vale, ou na desolada solidão de seu quarto, despertar e sentir que a embriaguez 
se dissipou em parte ou totalmente, pergunte que horas são ao vento, à onda, à 
estrela, ao pássaro, ao relógio, a tudo que voa, ou suspira ou se move, ou canta, 
ou baila... e o vento, a onda, a estrela, o pássaro e o relógio lhe responderão: É 
hora de embriagar-se! Embriaguem-se todos, se não quiserem ser os escravos 
martirizados do Tempo! Embriaguem-se sem cessar. Com vinho, com poesia, 
com virtude, ao seu bel-prazer !“
(Sorri para o pai, de modo provocante)
TYRONE (mal-humorado)
Se eu fosse você não me preocuparia com a parte referente à virtude! (Com 
desdém) Puá!! São tolices mórbidas! O pouco de verdade que essa poesia 
contém, você a pode encontrar dita com outra grandeza por Shakespeare. (Com 
ar estimativo) Todavia, você a recitou muito bem, filho. Quem é o autor?!
EDMUND
Baudelaire.
TYRONE
Nunca ouvi falar dele.
EDMUND (sorri provocando o pai)
Também escreveu um poema sobre Jamie e a Broadway.
TYRONE
Aquele patife! Tomara que perca o último bonde e tenha que pernoitar no 
povoado.
EDMUND (continua, fazendo caso omisso do comentário paterno)
Embora Baudelaire fosse francês, nunca tivesse conhecido a Broadway e 
morresse antes do nascimento de Jamie... Contudo ele a conheceu e à velha 
Nova York. (Recita a tradução do epílogo de Baudelaire, feita por Symons.)
Com o coração em paz galguei a altura escarpada
Da cidadela e, como de uma torre, avistei a cidade,
O hospital, o bordel, o cárcere e os infernos
Em que o mal surge suave como uma flor.
Tu sabes, ó Satanás, protetor de minha mágoa,
Que ali, a essas horas, não subi em busca de
[lágrimas inúteis,
Senão como um velho triste, fiel e libidinoso,
Disposto a sorver o prazer dessa grande rameira
Cuja beleza infernal me rejuvenesce;
Quer estejas dormindo cheia de pesados vapores,
Saturada do dia, ou que, engalanada,
Apareças embelezada pelos véus de renda dourada
[da noite
Eu te amo, cidade infame!
As prostitutas e os perseguidos podem proporcionar
[prazeres muito seus,
Que o vulgo nunca logrará entender.
TYRONE (irritado e aborrecido)
Que sujeira mórbida! De onde tira esse seu péssimo gosto literário?! Sujeira, 
pessimismo e desespero!! É outro ateu, na certa. Quando se nega Deus, nega-
se toda esperança. Isto é o que acontece. Se se tivesse ajoelhado...
EDMUND (como se não o ouvisse, sardonicamente)
Você imagina Jamie perseguido por si mesmo e pelo uísque, escondendo-se 
num quarto de hotel da Broadway com alguma marafona gorda — agradam-
lhe as mulheres gordas — e recitando-lhe Cynara de Dowson?!!! (Recita em 
zombaria, porém com profundo sentimento.)
A noite toda, sobre mim senti bater o seu tíbio coração;
Durante toda a noite esteve estendida entre
[os meus braços, perdida no amor e no sonho. 
Por certo eram doces os beijos de sua mercenária
[boca rubra.
Mas eu estava desolado, e enfermo ainda de uma
[velha paixão
Quando despertei, e descobri que amanhecia...
Eu lhe fui fiel, Cynara, à minha maneira.
(Sarcasticamente) E a pobre obesa rainha de ficção não entende uma só 
palavra disso tudo, mas suspeita que a insultam! E Jamie nunca amou Cynara 
alguma, e nunca foi fiel a ninguém, nem mesmo à sua maneira! Mas ali está 
ele, estendido, ludibriando-se com a idéia de que é um ser superior e que 
desfruta prazeres que “o vulgo nãoé capaz de entender”! (Ri.) É algo de 
absurdo — de completamente absurdo!
TYRONE (imprecisamente, numa voz espessa)
É loucura, isso sim! Se quisesse ajoelhar-se e rezar. Ao renegar Deus, renega a 
sanidade.
EDMUND (sem responder a isso)
Mas... quem sou eu para me julgar superior? Cometi a mesma estupidez. E 
tudo isso não é mais absurdo do que o caso do próprio Dowson, quando, 
inspirado pelos vapores do absinto, escreveu a uma vivandeira imbecil que 
julgou ser ele um pobre ébrio demente e lhe deu o fora para se casar com um 
criado... (Ri, com solidariedade grave e sincera) Pobre Dowson! O álcool e a 
tuberculose deram cabo dele! (Estremece e por um momento parece aflito e 
receoso. Com defensiva ironia) Talvez mais valha eu mudar de assunto.
TYRONE (sombrio)
Mas de onde vem esse seu gosto literário? Essa sua maldita biblioteca!... 
(Aponta para a pequena estante de livros no fundo.) Voltaire, Rousseau, 
Schopenhauer, Nietzsche, Ibsen! Ateus, loucos, imbecis!... E os seus poetas! 
Esse Dowson e esse Baudelaire e Swinburne e Oscar Wilde e Poe! 
Freqüentadores de prostitutas e degenerados! Bah! E pensar que ali tenho... 
(indica a estante maior) três ótimas coleções de Shakespeare que você poderia 
ler.
EDMUND (provocante)
Dizem que ele também era um ébrio.
TYRONE
Pois mentem! Não duvido que lhe agradasse um gole ou outro — é uma 
fraqueza própria de todo verdadeiro homem — porém sabia beber sem 
envenenar o cérebro com morbidez e imundícies! Não o compare com essa 
gentalha que há por ai! (Aponta novamente para a estante menor.) Esse seu 
Zola é um sujo!... E Dante Gabriel Rossetti, que não passa de um 
morfinômano! (Tem um sobressalto, com uma expressão de culpa.)
EDMUND (secamente)
Talvez seja prudente mudarmos de assunto. (Pausa.) Você não me pode acusar 
de desconhecer Shakespeare. Por acaso não ganhei de você certa vez cinco 
dólares, quando apostou comigo que eu não seria capaz de aprender um de 
seus principais papéis numa semana, como você o fazia antigamente, quando 
estudava o seu repertório? Aprendi o papel de Macbeth, e recitei-o na 
perfeição, dando-me você a deixa.
TYRONE (em tom aprovador)
É verdade. Você o fez. (Sorri zombeteiramente e suspira.) Mas sofri horrores 
— eu o recordo — ao ouvi-lo assassinar os versos daquela maneira!... Teria 
preferido pagar a aposta sem o obrigar a provar-me que sabia de cor! (Ri e 
Edmund sorri. Nisso Tyrone estremece ao ouvir ruído no primeiro andar, e diz 
com receio) Ouve? É ela que caminha. Julgava que tivesse adormecido.
EDMUND
Esqueça isso! Vamos tomar outro uísque? (Pega a garrafa, serve-se e a repõe 
no lugar, com forçada indiferença, enquanto o pai se serve por sua vez.) 
Quando foi que mamãe se deitou?
TYRONE
Mal você foi embora. Não quis jantar.
EDMUND
Por nada. (Alçando o copo) À sua saúde.
TYRONE (maquinalmente)
À sua saúde, filho. (Bebem. Tyrone torna a escutar o ruído no andar de cima. 
Aflito) Ela está caminhando muito. Queira Deus que não desça.
EDMUND (numa voz abafada)
Sim... A essa altura seria apenas um fantasma que ronda o passado. (Faz uma 
pausa. Ajunta, sucumbido.) Leva a evocar o tempo em que eu ainda não tinha 
nascido...
TYRONE
Acaso não faz o mesmo comigo? Recorda a época em que não me conhecia. 
Como se os seus únicos dias felizes tivessem sido os que passou em casa de 
seu pai, ou no convento, rezando e tocando piano. (Enciumado e ressentido na 
sua amargura.) Já lhe disse que aceitasse com reservas as suas recordações. 
Seu lar maravilhoso era como outro qualquer... Seu pai longe estava de ser o 
nobre cavalheiro irlandês, magnífico e generoso, que ela descreve. Era muito 
gentil, uma companhia agradável... uma boa prosa. Simpatizei com ele e ele 
comigo. Era, além do mais, um homem próspero nos negócios — possuía uma 
mercearia — era um homem capaz. Mas tinha também o seu ponto fraco. Ela 
me condena por beber, mas se esquece que o pai fazia o mesmo. É verdade que 
nunca tocou numa gota de álcool até os quarenta anos; mas depois também 
tratou de recuperar o tempo perdido! E se converteu num assíduo bebedor de 
champanha! Fazia disso um grande alarde: só bebia champanha! Foi o que 
acabou com ele — isso e a tuberculose! (Pára bruscamente, olhando de 
relance para o filho.)
EDMUND (sarcasticamente)
Parece que não conseguimos evitar os assuntos desagradáveis, não é mesmo?!
TYRONE (suspira tristemente)
É sim. (Com um patético esforço para ser jovial) Que tal uma partida ou duas 
de cassino, hem?
EDMUND
De acordo.
TYRONE (baralhando desajeitadamente as cartas)
Não podemos trancar a porta e ir para a cama até que Jamie chegue no último 
bonde — o que espero não se dará! — e, de qualquer forma, não quero subir 
antes que ela esteja dormindo.
EDMUND
Nem eu tampouco.
TYRONE (continua a baralhar mal as cartas, esquecendo-se de as dar)
Conforme lhe dizia, deve aceitar com reservas as suas recordações. Refiro-me 
aos seus estudos de piano; ao seu sonho de ser concertista. Essa idéia foi-lhe 
inculcada pelas freiras que a adulavam. Era a aluna predileta. Queriam-lhe 
muito bem, por ser muito piedosa. Mas as freiras são umas ingênuas quando se 
trata da vida cá de fora, no mundo. Ignoram que nem uma só — entre um 
milhão de jovens pianistas — chega a realizar aquilo que parecia prometer. Era 
verdade que sua mãe tocava bastante bem para uma colegial, mas isso não é 
bastante para crer que pudesse ser...
EDMUND (interrompe-o, áspero)
Se vamos jogar... por que você não dá as cartas?
TYRONE
Ah?!... Sim, é verdade. (Dá as cartas, calculando erroneamente a distância 
entre ambos.) E a idéia de que podia ser freira! Isso foi o pior de tudo! Sua 
mãe foi uma das moças mais lindas que jamais vi. E ela sabia disso. Era 
provocante e coquete, debaixo de toda a sua timidez e de seus rubores. Não 
fora feita para renunciar ao mundo. Espocava de saúde, de alegria de viver... do 
desejo de amar!...
EDMUND
Papai, por favor... Por que não apanha suas cartas?
TYRONE (apanha-as com ar sombrio)
Sim, vejamos o que tenho aqui! (Tyrone e Edmund olham as cartas que têm na 
mão, sem lhes prestar atenção. Nisso ambos estremecem. Tyrone sussurra) 
Ouça só!
EDMUND
Ela está descendo.
TYRONE (precipitadamente)
Joguemos. Finja não notar sua presença, e ela logo tornará a subir.
EDMUND (olhando para a sala da frente — com alívio)
Não a vejo. Deve ter começado a descer e depois voltado atrás.
TYRONE
Graças a Deus!
EDMUND
Sim! É horrível vê-la no estado em que deve estar agora. (Com amargurada 
tristeza) O mais penoso é o verdadeiro muro de confusão que mamãe ergue em 
volta de si. Ou antes — digamos — o manto de bruma em que ela se esconde... e 
se perde! Deliberadamente! Isso é o mais dantesco no caso! Sente-se que nela 
algo há que age propositadamente — para fugir do nosso alcance; para se ver 
livre de nós; para esquecer que existimos! É como se, apesar de nos amar, ela nos 
odiasse!
TYRONE (repreende-o com doçura)
Vamos, filho, não diga uma coisa dessas. Não é ela. É essa maldita droga.
EDMUND (com amargura)
Se ela a toma, é justamente com essa finalidade. Pelo menos sei que hoje ela o 
fez para isso. (Bruscamente) É minha vez, não é? Aí vai. (Joga a carta.)
TYRONE (joga automaticamente — com afetuosa censura)
Ela tem estado terrivelmente preocupada com a sua saúde, por mais que tente 
disfarçá-lo. Não seja demasiadamente duro para com ela, Ed. Leve em conta 
que ela não é responsável. Quando esse desgraçado veneno toma conta de 
alguém...
EDMUND (seu semblante torna-se duro e fita o pai com um amargo olhar de 
acusação)
Não devia tê-la dominado! Sei muito bem que a culpa não é dela! E sei de 
quem é! É sua! De sua maldita avareza! Se tivesse gasto o seu dinheiro num 
médico competente, quando ela adoeceu após o meu nascimento, mamãe nem 
sequer saberia que existia morfina! Mas você a pôs nas mãos de um charlatão 
de hotel, que não quis reconhecersua ignorância e escolheu o caminho mais 
fácil, sem ligar a mínima coisa ao que a ela aconteceria depois. Tudo porque 
cobrava barato! Mais outra de suas “pechinchas”!
TYRONE (ferido e encolerizado)
Basta! Como é que você ousa falar de uma coisa que ignora por completo?! 
(Tentando controlar-se) Você precisa ver o meu lado da questão, filho. Como 
podia eu adivinhar que aquele médico era um charlatão? Tinha boa reputação.
EDMUND
Entre os bêbedos do bar do hotel, seguramente!
TYRONE
Isso não é verdade! Pedi ao dono do hotel que me indicasse o melhor.
EDMUND
Sim, sei disso! E ao mesmo tempo você se lastimava, a dizer que terminaria os 
dias num asilo de velhos, como que insinuando que queria um médico barato! 
Conheço o seu sistema! Por Deus, é natural que o conheça depois do que se 
deu na tarde de hoje!
TYRONE (sentindo-se culpado,já pronto a se defender) 
Na tarde de hoje? Que aconteceu?
EDMUND
Agora não mais importa. Estamos falando de minha mãe. Digo que, por mais 
desculpas que você arranje, sabe perfeitamente que a culpa foi toda de sua 
avareza.
TYRONE
E eu digo que você não passa de um mentiroso! Cale a boca agora mesmo, ou 
eu...
EDMUND (sem ligar ás suas palavras)
... quando você descobriu que mamãe se havia habituado à morfina... por que 
não a mandou para um sanatório onde a curassem logo de início, quando ainda 
podia ser salva? Não! Isso teria significado gastar um pouco mais! Aposto 
como você lhe afirmou que lhe bastava ter “força de vontade”! No fundo, é o 
que você continua achando, apesar do que lhe disseram os médicos — os 
médicos que realmente entendem do assunto.
TYRONE
Você está de novo falseando a verdade! Hoje sei que não é assim... mas... como 
podia sabê-lo então? Que conhecia eu de morfina? Levei anos a perceber o que 
se passava. Julgava que sua mãe não se havia curado inteiramente de sua 
doença, e era só. Você pergunta por que não a mandei para um sanatório? 
(Com amargura) E por acaso não o fiz? Gastei milhares e milhares de dólares 
em tratamentos! Foi um dinheiro jogado fora. De que lhe serviu? Sempre 
tornava a recomeçar...
EDMUND
Porque você nunca lhe deu algo que a ajudasse a largar a droga! Mamãe não 
tinha outro lugar a não ser este casarão úmido, perdido num lugarejo que ela 
detesta; e até para reformá-lo você se negou a gastar o seu precioso dinheiro, 
enquanto continua comprando terrenos e deixando-se ludibriar por qualquer 
espertalhão que lhe acene com uma mina de ouro ou de prata, ou algum outro 
embuste para enriquecer depressa! Você arrastou mamãe nas suas tournées, e a 
deixou dormir em pensões miseráveis onde não tinha nem com quem falar; e 
esperar em hotéis sórdidos que você voltasse bêbedo, depois que se fechavam 
os bares! Cristo! Tem alguma coisa de extraordinário o fato de um doente não 
ter querido curar-se?! Quando penso nisso, chego a odiá-lo.
TYRONE (arrasado)
Edmund! (Num acesso de ira) Como se atreve a falar assim com seu pai, seu 
cachorro insolente?! Depois de tudo o que fiz por você!
EDMUND
Agora é a isso que chegamos: ao que você está fazendo por mim!!
TYRONE (sentindo-se novamente culpado, e sem relevar as palavras do filho)
Você deixe de repetir as acusações falsas de sua mãe. Ela mesmo só as lança 
quando dominada pela droga! Nunca a arrastei contra a sua vontade nas 
minhas viagens. Naturalmente queria tê-la ao meu lado. Amava-a. E ela me 
acompanhava porque também me amava e desejava estar comigo. É esta a 
verdade, diga o que disser sua mãe quando está fora de si. E não havia motivo 
para se sentir solitária. Podia ter relações e conversar com os atores de minha 
companhia. Eles estavam igualmente com os seus filhos. E eu insistia — 
apesar da despesa — para que tomássemos uma ama que nos ajudasse nas 
viagens com vocês.
EDMUND (com amargura)
Sim, foi sua única generosidade, e isso porque você tinha ciúmes por mamãe 
se ocupar demais conosco, e você queria se ver livre de nós. Foi mais outro 
erro seu! Se ela tivesse tido que tomar conta de mim, ocupando-se e distraindo 
assim o seu espírito, talvez não pudesse...
TYRONE (espicaçado, num impulso de vingança)
Quanto a isto, se você insiste em julgar os fatos pelo prisma por que ela se vê 
quando está fora de si, para começar, se você não tivesse vindo ao mundo, ela 
não teria...
EDMUND (bruscamente vencido e angustiado) 
É certo... Avalio o que ela sente, papai...
TYRONE (protestando, contrito)
Não! Não sente nada disso! Ela o quer tanto bem quanto qualquer outra mãe. 
Eu só disse isso porque você me levou a um tal extremo de raiva, esgravatando 
o passado... como se você me odiasse...
EDMUND (com tristeza)
Não tinha intenção, papai. (Inesperadamente sorri e caçoa, com um laivo de 
embriaguez.) Sou como minha mãe. Não posso deixar de lhe querer bem... 
apesar de tudo.
TYRONE (sorri também por sua vez, ligeiramente ébrio)
Eu poderia dizer o mesmo. Você não vale grande coisa, meu filho. É um desses 
casos de: “Algo de pouca valia... porém meu”. (Ambos riem alcoolizados, 
porém com sincero afeto, Tyrone muda de assunto.) E nossa partida, a quem 
toca jogar?
EDMUND
Parece-me que é você. (Tyrone joga uma carta que Edmund compra, e tornam 
a esquecer o jogo.)
TYRONE
Não deve ficar desanimado demais com a má notícia que lhe deram hoje, filho. 
Ambos os médicos me garantiram que —se obedecer direito às instruções 
recebidas no sanatório para onde vai — estará curado dentro de seis meses — 
um ano, no máximo.
EDMUND (novamente hostil)
Não caçoe de mim!... Você não acredita nisso.
TYRONE (com excessiva veemência)
Claro que acredito! Por que não haveria de acreditar, se tanto Hardy quanto o 
especialista...
EDMUND
Você sabe muito bem que eu vou morrer!
TYRONE
Que absurdo! Está louco!
EDMUND
E assim sendo, para que gastar dinheiro?! Por isso, você me manda para uma 
fazenda do Estado...
TYRONE (confuso, não querendo reconhecer-se culpado)
Que fazenda do Estado é essa?! É o sanatório de Hilltown — foi o que me 
disseram. E os médicos garantiram-me que era o lugar ideal para a sua saúde.
EDMUND (ferino)
Porque é barato! Ou antes, porque não cobra nada... ou quase nada. Não minta, 
papai! Você sabe muito bem que o sanatório de Hilltown é uma instituição do 
Estado. Jamie bem que suspeitou que você iria para cima de Hardy com suas 
eternas lamentações e seu “receio do asilo de velhos”... Hardy confirmou essa 
suspeita quando Jamie lhe arrancou a verdade.
TYRONE (furioso)
Aquele patife bêbedo! Eu o enxotarei a pontapés! Envenenou sempre o seu 
espírito contra mim, desde que você atingiu a idade do uso da razão.
EDMUND
Você não pode negar que é verdade o que eu disse sobre a granja do Estado, 
não é?
TYRONE
Não é verdade da maneira pela qual você a interpreta! E se é o Estado que 
administra o sanatório, que mal há nisso?! É muito natural. O Estado tem verba 
necessária para manter um estabelecimento melhor que qualquer sanatório 
particular. E por que não havia eu de aproveitar tal circunstância? É um direito 
que me assiste, e a você também. Somos vizinhos desse distrito. Sou 
proprietário. Ajudo a mantê-lo. Pago impostos...
EDMUND (com amarga ironia)
Sim, com propriedades avaliadas num quarto de milhão.
TYRONE
Não é verdade. Está tudo hipotecado.
EDMUND
Hardy e o especialista sabem o quanto você tem. Só imagino o que pensaram 
de você quando o ouviram lastimar-se de que assim acabaria os dias num asilo, 
e insinuar que preferia entregar-me à caridade do Estado!!
TYRONE
Mentira! Disse-lhes, apenas, que não podia permitir-me o luxo de um sanatório 
de ricos porque não tinha meios para isso. Esta é que é a verdade.
EDMUND
E logo depois você foi encontrar-se com McGuire para que ele o tapeasse, 
mais uma vez, num dos seus fraudulentos negócios de venda de terras! (Como 
o pai se apronta a negar) Não negue, papai. Encontramos McGuire no bar do 
hotel, após a sua partida. Jamie puxou conversa e, como que de brincadeira, 
perguntamos-lhe se havia jogadoo anzol para fisgar você. Ele piscou o olho e 
se pôs a rir.
TYRONE (ainda numa débil tentativa de negar a verdade) 
É um embusteiro, se disse que...
EDMUND
Não minta! (Com crescente veemência) Meu Deus! Desde que parti e vivi por 
minha conta e soube o que significava trabalhar de sol a sol por uns poucos 
dólares e não possuir um centavo e sentir fome e acampar nos bancos das 
praças por não ter onde dormir, esforcei-me por fazer-lhe justiça, papai, porque 
compreendi as penúrias de sua infância. Tentei encontrar atenuantes para você. 
Céus! Se não fizesse isso, era de se ficar louco nesta maldita família! Tratei de 
me desculpar a mim mesmo, levando em conta todos os maus pedaços que 
passei. Tratei de pensar, como mamãe, que você não pode deixar de ser como 
é, nessa questão de dinheiro... Mas, por Deus... esse seu último ardil foi o 
cúmulo! Chega a me dar náusea! Não pela maneira incrível por que você me 
está tratando. Para o inferno com isso! Também eu, a meu modo, o tenho 
tratado mal por mais de uma vez... Mas... pensar que, quando um filho seu está 
tuberculoso, você é capaz de se exibir diante de toda a gente do povoado, como 
um miserável avarento! Por acaso pensa que Hardy não fará comentários, e 
que todos aqui não virão a saber?! Por Deus! Será que você não tem amor 
próprio nem o menor brio?! (Estourando de raiva) E não pense que eu deixarei 
que você se saia bem desta! Não irei para nenhuma dessas malditas instituições 
do Estado, para poupar-lhe uns miseráveis dólares que lhe permitam ainda 
comprar outras propriedades sem valor algum... Velho sovina!! (Engasga-se de 
ódio, sua voz treme e ele se torce num acesso de tosse.)
TYRONE (encolheu-se na cadeira ante a violência desse ataque, e seu remorso 
supera-lhe a cólera; balbucia)
Cale-se! Não diga isso! Está bêbedo! Não me importam as suas palavras. Pare 
de tossir, rapaz. Fica todo exaltado por uma ninharia. Quem disse que o 
forçaria a ir para Hilltown? Pode ir para onde quiser. Não me importa o quanto 
custe. Não me chame de avaro só porque não quero que os médicos me 
julguem um milionário a quem possam explorar. (Edmund parou de tossir. 
Parece cada vez mais fraco e doente. Seu pai o olha fixamente, temeroso) Você 
está enfraquecido, filho. Tome um gole.
EDMUND (pegando a garrafa e enchendo o copo até a borda, com uma voz que 
desfalece)
Obrigado. (Bebe de um só trago.)
TYRONE (serve-se de bastante uísque, esvaziando a garrafa, e bebe; inclina a 
cabeça e contempla com ar ausente as cartas da mesa e, em tom 
indeciso)
A quem toca a vez de jogar? (Continua sombriamente, sem ressentimento) 
“Um velho sovina”... E, talvez tenha razão! Talvez eu não possa mesmo deixar 
de sê-lo, se bem que durante toda a minha vida — desde que tive dinheiro — 
joguei-o sobre os contadores dos bares para pagar a bebida a todos que neles se 
achavam; ou o emprestei a pobres diabos vagabundos que nunca mo 
devolveram... (Com um sorriso sarcástico de desdém por si próprio que lhe 
distende a boca) Mas, naturalmente, isso só acontecia nos bares, quando eu 
estava saturado de uísque! Não podia pensar da mesma maneira quando me 
achava em casa e não tinha bebido. E foi em casa mesmo que descobri o valor 
de um dólar; que em mim brotou o medo do asilo de velhos!!! Desde então 
nunca mais pude crer na minha boa estrela. Sempre temi que se apagasse e que 
me tirassem tudo o que tenho. Porém o fato é que quanto mais propriedade se 
possui, mais a salvo a gente se sente. Talvez não seja lógico, mas é a realidade. 
Os bancos abrem falência e o nosso dinheiro desaparece; mas sabemos que 
podemos conservar a terra que se acha debaixo dos nossos pés. (Seu tom 
torna-se de repente desdenhosamente superior) Você disse que compreendia os 
obstáculos que tive que vencer na minha infância. Que pode você 
compreender? Você teve tudo: amas, escolas, universidades, se bem que não 
quisesse terminar os estudos. Tinha alimentos, roupa. Oh! Já sei que trabalhou 
no duro — trabalho pesado! — que vagou sem teto nem dinheiro por esse 
mundo afora, e eu o respeito por isso. Mas, para você, isso não passou de 
romantismo e aventura! Foi um jogo, nada mais!
EDMUND (com sombrio sarcasmo)
Sim!... Sobretudo quando tentei suicidar-me na taverna de Jimmie, o Padre, e 
quase o consegui...
TYRONE
Você não estava no seu juízo perfeito... Nenhum filho meu pensaria jamais 
em... Você estava bêbedo!
EDMUND
Naquela hora, não tinha bebido uma só gota. Foi por isso que o fiz... Tinha tido 
tempo demais para pensar...
TYRONE (com uma irritação típica de bêbedo)
Não comece outra vez com essa maldita morbidez de ateu! Não quero 
aborrecer-me dando-lhe ouvidos! Procurava apenas fazê-lo compreender... 
(Com menosprezo) ...Que sabe você do valor de um dólar? Quando eu tinha 
dez anos, meu pai abandonou minha mãe e foi morrer na Irlanda. O que fez, 
aliás, bem depressa; e bem que o merecia! Espero que esteja torrando nas 
profundezas do inferno! Confundiu um veneno para ratos com farinha ou 
açúcar, ou qualquer coisa parecida! As más línguas disseram que não foi mero 
engano, mas isso é mentira. Na minha família ninguém nunca quis...
EDMUND
Pois eu apostaria como não foi um engano!
TYRONE
Aí vem você mais uma vez com a sua morbidez! Seu irmão meteu-lhe isso na 
cabeça. Para ele a pior das suspeitas é sempre a única verdade aceitável! Mas, 
não importa! Minha mãe, estrangeira em terra alheia, viu-se abandonada com 
quatro filhos de tenra idade: eu, uma irmã um pouquinho maior e dois 
irmãozinhos. Os meus dois irmãos mais velhos tinham partido para outras 
cidades e não nos podiam ajudar. Já lhes custava bastante ganhar o pão de cada 
dia! Nossa pobreza nada teve de romântico! Fomos desalojados por duas vezes 
da miserável pocilga que considerávamos o nosso lar; e jogaram à rua os 
móveis destrambelhados que minha mãe possuía. Ela e os meus irmãozinhos 
choraram tanto! Eu também chorei, se bem que me esforçasse por conter-me, 
pois era o homem da família! Aos dez anos de idade, para mim acabou-se a 
escola. Trabalhei doze horas por dia numa oficina mecânica, aprendendo a 
fazer limas. Era um alpendre imundo onde a chuva se infiltrava pelo telhado; 
onde se torrava de calor no verão; e no inverno não havia aquecimento: as 
mãos inchavam de frio! A única claridade existente penetrava por umas 
janelinhas escuras de tanta sujeira, de modo que, nos dias nublados, eu tinha 
que me inclinar até quase tocar com os olhos as limas, a fim de conseguir vê-
las. E quanto pensa que me pagavam por isso? Cinqüenta centavos por 
semana! E minha pobre mãe lavava e esfregava durante todo o dia e minha 
irmã mais velha cosia enquanto os meus irmãozinhos ficavam tomando conta 
da casa. Nunca tínhamos roupa ou comida bastante que chegasse para todos. 
Lembro-me muito bem de um dia de Ação de Graças — ou talvez tenha sido 
Natal, não sei mais... — em que um homem, em cuja casa minha mãe fazia 
limpeza, deu-lhe um dólar de gorjeta e no trajeto de regresso ela o gastou 
inteirinho em alimentos. Lembro-me como nos abraçou e beijou, e como nos 
disse, enquanto corriam as lágrimas pelo seu rosto cansado: “Louvado seja 
Deus! Por uma vez na vida, teremos o suficiente!” (Enxuga as lágrimas) Era 
uma boa mulher, uma mulher forte e serena. Nunca houve outra mais corajosa 
e melhor.
EDMUND (comovido)
Sim, devia sê-lo...
TYRONE
Só temia uma coisa: envelhecer e morrer no asilo de velhos. (Faz uma pausa 
— a seguir acrescenta com amarga ironia) Foi nessa época que aprendi a ser 
mesquinho. Um dólar valia tanto então! E quando se aprendeu uma lição 
destas, custa-se a desaprendê-la. Sente-se um impulso incontido de procurar 
sempre fazer pechinchas. Se essa granja-sanatório do Estado pareceu-me a 
mim uma pechincha, deve perdoar-me. Os médicos me garantiram que era um 
estabelecimento adequado. Precisa crerem mim, Edmund. E eu lhe juro como 
nem por um momento pensei mandá-lo para lá, se não quisesse ir. (Com 
veemência) Você pode escolher o sanatório que quiser! Não me importa o que 
custar. Posso permitir-me qualquer preço! O que lhe agrade... dentro do 
razoável... (Diante de tal ressalva, um sorriso torce os lábios de Edmund. 
Dissipou-se o seu ressentimento. Seu pai continua com um tom propositada-
mente despreocupado e casual) Há um outro sanatório que o especialista 
também recomendou. Disse ser considerado entre os melhores do pais. É 
subvencionado por um grupo de industriais, milionários todos eles, em 
beneficio — antes de tudo — de seus próprios operários. Mas pode ser 
admitido por sermos residentes no distrito. Esse estabelecimento acha-se es-
corado por uma tal soma de dinheiro que, para se manter, não necessita cobrar 
muito caro; o preço é de apenas sete dólares por semana, porém, na realidade, 
vale dez vezes mais! (Acrescenta precipitadamente) Não o quero induzir a 
fazer coisa alguma filho — por favor, compreenda-me. Estou somente 
repetindo o que me disseram.
EDMUND (dissimulando um sorriso,fala com negligência)
Oh! Já sei! A oportunidade parece mesmo ser das melhores para mim. Assim 
fica o problema solucionado de vez. (Bruscamente mostra-se de novo aflito e 
angustiado) De qualquer maneira... agora tanto se me dá! Esqueçamos isso! 
(Mudando de assunto) E a nossa partida? Quem é a jogar?!
TYRONE (mecanicamente)
Não sei... Acho que sou eu! Não, é você. (Edmund tira uma carta; seu pai a 
compra. Mas, quando, por sua vez, se dispõe a jogar, torna a esquecer a 
partida) Sim, creio que a Vida me deu uma lição demasiado severa, e ensinou-
me a superestimar o valor de um dólar. E veio a hora em que esse erro arruinou 
uma magnífica carreira de ator!... (Tristemente) Nunca confessei isso a 
ninguém, rapaz; porém, na noite de hoje, sinto-me tão deprimido, que é como 
se tudo tivesse acabado para mim... E de que, então, me serviriam as vaidades, 
as jactâncias ou um falso orgulho?! Aquela maldita comédia que comprei por 
uma ninharia, e na qual tive tanto sucesso — um grande sucesso comercial! — 
estragou-me a vida com sua promessa de fácil fortuna. Eu não queria fazer 
mais nada! E, quando dei pela coisa, já me havia convertido em um verdadeiro 
escravo dessa peça amaldiçoada!! Experimentei representar outras, mas aí já 
era tarde demais. O público já me havia identificado com aquele papel e não 
compreendia ver-me noutro. E tinha razão! Eu havia perdido o meu talento em 
anos de fácil repetição, sem aprender um só papel novo, sem nunca mais 
trabalhar de verdade! Fazia trinta a quarenta mil dólares líquidos de lucro por 
temporada, sem despender o menor esforço! A tentação era demasiado forte! E, 
no entanto, antes de comprar essa nefasta peça, eu era considerado um dos três 
ou quatro jovens atores de mais futuro nos Estados Unidos! Trabalhara com o 
máximo empenho, abrindo mão de um bom emprego de mecânico para ser 
substituído no elenco de uma companhia, só pelo amor que tinha ao teatro! 
Vivia louco de ambição! Lia todas as obras dramáticas existentes. Estudava 
Shakespeare como se estuda a Bíblia. Educava-me a mim mesmo. Com 
esforço, consegui libertar-me do meu sotaque irlandês que era bastante forte. 
Que entusiasmo tinha por Shakespeare! Teria, de bom grado, representado 
qualquer de suas obras, sem receber um centavo, só pela satisfação de viver na 
atmosfera de sua sublime poesia! E posso dizer que a interpretava a contento! 
Sentia-me inspirado por ela. Se eu tivesse insistido, poderia ter chegado a ser 
um grande intérprete shakespeariano. E tinha consciência disto! Em 1874, 
quando Edwin Booth veio trabalhar no teatro de Chicago, onde eu já era a 
primeira figura, representei, certa noite, o papel de Cassius, enquanto ele fazia 
o de Brutus. Em outra ocasião, trocamos os papéis: encarnei Brutus e ele 
Cassius. Também interpretei Otelo e ele Yago, e assim por várias outras vezes. 
Ao ver-me em Otelo, Booth comentou com o seu empresário: “Este jovem está 
fazendo o papel de Otelo melhor do que eu próprio!” (Com orgulho) E isto 
quem disse foi Booth, o maior ator de sua época, o maior talvez de todas as 
épocas! E era a expressão da verdade! Eu tinha apenas vinte e sete anos! 
Quando me lembro, compreendo que aquela noite foi o ponto culminante de 
minha carreira!! Havia chegado onde queria chegar. E, durante algum tempo 
ainda, continuei subindo, com uma ambição sempre crescente! Casei-me com 
sua mãe. Pergunte-lhe como eu era então. Seu amor foi um incentivo a mais 
para as minhas aspirações. Mas... no fim de uns poucos anos, minha boa sorte 
— que acabou por ser má! — fez com que eu topasse com o grande “negócio” 
da minha vida! A princípio não julguei que fosse tal. Era um belo papel 
romântico que eu sabia poder desempenhar melhor do que ninguém. Essa peça, 
desde o início, veio a ser um formidável sucesso de bilheteria! E então a vida 
me levou até onde eu queria chegar: a um lucro líquido de trinta e cinco a 
quarenta mil dólares por temporada! Era uma verdadeira fortuna naquela 
época... ainda o é hoje! (Com amargura) Não sei que diabos queria então 
comprar que valesse a pena eu... Bem, de nada mais adianta rememorar isso 
agora! É tarde para arrependimentos! (Olha distraidamente as cartas) Sou eu a 
jogar, não?
EDMUND (comovido, olha-o com compreensão e responde em voz lenta)
Alegro-me que você me tenha contado tudo isso, papai. Agora eu o conheço 
muito melhor.
TYRONE (com um sorriso apagado e forçado)
Talvez não devesse tê-lo feito. Talvez, no fundo, ainda me despreze pelo que 
agora sabe. É uma triste forma de convencê-lo do valor de um dólar! (Como se 
essa frase nele suscitasse automaticamente uma habitual associação de idéias, 
olha com ar desaprovador o lampadário aceso) O brilho de todas essas luzes 
extras me irrita os olhos. Vê algum inconveniente em que eu as apague? Não 
precisamos delas e não há por que enriquecermos a companhia de eletricidade!
EDMUND (reprimindo uma absurda vontade de rir, em tom amável)
Não — claro que não. Pode apagá-la.
TYRONE (levanta-se pesadamente e, cambaleando, encaminha-se, de modo 
mecânico, até as lâmpadas, enquanto torna às suas divagações 
anteriores)
Não, não sei que diabos queria eu comprar... (Apaga, com um estalido, uma 
das lâmpadas) Juro pelo que há de mais sagrado, Edmund, que me 
conformaria em não possuir um único acre de terra nem um só centavo no 
banco... (apaga com novo estalido outra lâmpada) ... e me resignaria em não 
ter outro lar a não ser o asilo de velhos, contanto que eu pudesse olhar para trás 
e sentir que fora de verdade o magnífico ator que poderia ter sido! (Apaga a 
terceira lâmpada; permanece aceso somente o abajur de leitura. Torna a se 
sentar pesadamente. De repente Edmund não consegue mais reprimir uma 
gargalhada terrivelmente irônica. Tyrone mostra-se ferido) Por que diabos está 
você rindo dessa maneira?!!
EDMUND
Não estou rindo de você, papai. E sim da Vida! É tão loucamente absurda!
TYRONE (resmungando)
Lá vem você de novo com suas idéias doentias! A Vida nada tem de ruim... 
Somos nós que. . . (Cita): “O mal não está em nossas estrelas, Brutus, mas em 
nós mesmos, que não passamos de uns pobres diabos !“ (Uma pausa. 
Acrescenta melancólico) Quando Edwin Booth me elogiou no Otelo, pedi ao 
meu empresário que anotasse todas as suas palavras e, durante anos, guardei-as 
na minha carteira. Costumava sempre relê-las, até que me causaram um mal-
estar que não tive mais coragem de enfrentá-las! Por onde andarão agora essas 
anotações? Na certa estarão jogadas por aí, em algum canto desta casa! 
Lembro-me, no entanto, que as guardei cuidadosamente...
EDMUND (com irônica tristeza)
Talvez estejam em algum velho baú do sótão, junto como vestido de noiva de 
mamãe... (Ao notar que seu pai o fita, ajunta rapidamente) Pelo amor de Deus, 
se vamos jogar cartas, joguemos de uma vez !...
(Compra a carta que o pai tirou. O jogo prossegue 
por um momento, como se fossem autômatos a jogar 
uma partida de xadrez. Mas Tyrone interrompe o jogo 
ao ouvir um ruído que provém do primeiro andar.)
TYRONE
Ela ainda está caminhando de um lado para outro! Quem sabe quando 
adormecerá!
EDMUND (toga, com ar tenso)
Por favor, papai, esqueça isso! (Serve-se de uísque. Tyrone pensa protestar, 
mas, desanimado, desiste de fazê-lo. Edmund bebe. Larga o copo. Sua 
expressão fisionômica muda totalmente. Quando fala, dir-se-ia que 
deliberadamente se entrega á embriaguez, e que procura esconder o seu 
íntimo por trás de uma atitude de ébrio.) Sim, mamãe caminha lá por cima 
como um espectro que ronda o passado. E nós fingimos esquecer, porém. 
procuramos perceber o mais leve ruído. Escutamos a umidade da neblina 
gotejar dos olmos como o bater irregular de um extravagante e desconjuntado 
relógio de parede... ou como as lágrimas aborrecidas de uma marafona, que 
caem numa poça de cerveja rançosa sobre a mesa de um bar. (Ri, com a auto-
aprovação de um ébrio) Esta última frase não esteve má, hem?! E é minha! 
Não é de Baudelaire! Pode crer! (Com loquacidade) Você acaba de me relatar 
alguns momentos culminantes de suas recordações. Quer ouvir as minhas? 
Estão todas elas ligadas ao mar. Aí vai uma: foi quando eu viajava num veleiro 
rumo a Buenos Aires... a favor dos ventos alísios e com lua cheia. O velho 
barco fazia quatro nós por hora. Achava-me estendido no tombadilho, olhando 
em direção à popa — a água salpicava-me com sua espuma, e os mastros 
resplandeciam lá no alto, na brancura de suas velas despregadas ao luar. Tudo 
aquilo me embriagava com sua beleza e o ritmo de seu canto; e, por uns 
momentos, esqueci-me de mim mesmo... na verdade, esqueci-me até da 
própria Vida! Senti-me livre! Dissolvi-me no mar! Converti-me em velas 
brancas e espuma voadora! Transformei-me, também eu, em beleza e ritmo! 
Fundi-me no luar, no barco, no firmamento vagamente estrelado! Integrei-me, 
sem passado nem porvir, na paz e na unidade do universo e, numa selvagem 
alegria, em algo maior que a minha vida ou a vida do homem: a própria Vida 
em si!... Deus — se você assim o prefere! Lembro-me também de outra 
ocasião, no American Line, quando estava de vigia na torre de guarda e 
cumpria o quarto do amanhecer. Dessa vez o mar estava sereno. Sentia-se 
apenas o preguiçoso trepidar da coberta e o suave e sonolento balanço do 
navio. Os passageiros dormiam, e nem um só tripulante havia à vista. Não se 
ouvia o menor ruído humano. Por trás de mim e à minha frente, brotava a 
negra fumaça das chaminés. Eu sonhava, esquecido de minha missão de vigia. 
Sentia-me só, isolado ali no alto, e via arrastar-se a madrugada como um sonho 
pintado sobre o céu e o oceano que juntos dormiam. E aí foi que chegou o 
momento de estática liberdade. A paz... o fim de toda busca, o ponto final, a 
alegria da plena realização, além dos temores pequeninos e das mesquinhas 
ambições humanas — além dos sonhos e das aspirações!... E de outras vezes 
em minha vida — quando a nado entrava pelo mar adentro, ou estava a sós, 
estendido na praia — experimentei a mesma maravilhosa sensação! Converti-
me no sol, na areia quente, nas verdes algas ancoradas nas rochas, balouçando-
se ao vaivém da maré! Como a visão da beatitude de um santo! Como o véu 
que encobre o mistério, ao ser descerrado por uma Mão invisível! Por um 
segundo vislumbramos o segredo e — ao vislumbrá-lo — nele nos 
integramos... fugazmente alcançamos o seu sentido. Mas, logo a seguir, a Mão 
invisível deixa recair o véu, e novamente ficamos sós, perdidos na bruma, e 
continuamos a avançar aos tropeções, sem saber para onde nem para quê! 
(Com um sorriso que mais parece uma careta) Foi um grande erro ter eu 
nascido homem! Teria sido muito mais feliz como... um peixe, ou uma 
gaivota!! Assim, serei sempre um estranho, que nunca se sente em casa, que 
não quer realmente a ninguém — e a quem, em troca, ninguém quer! — que 
nunca está onde deveria estar, e que vive continuamente um tanto quanto 
enamorado da morte!..
TYRONE (olhando impressionado para o filho)
Não há dúvida de que em você existe o estofo de um poeta! (Protestando 
constrangido) Mas é absurdo dizer que ninguém o quer e que deseja a morte...! 
É de uma morbidez doentia!
EDMUND (sardônico)
“Estofo de poeta”! Qual nada! Temo que eu seja apenas como o tipo que 
mendiga um cigarro. Nem sequer há nele o “estofo” de um fumante. Tem 
somente o hábito de fumar... Não poderia alcançar o que há pouco tentei 
explicar-lhe; só fiz foi tartamudear... É o máximo que sei fazer... e que farei, se 
viver, naturalmente... Bem. Pelo menos terá sido de um fiel realismo. O 
tartamudeio é a nossa forma de eloqüência — a dos que vivem afundados na 
neblina! (Pausa. Ambos se erguem de um salto ao perceberem um rumor que 
vem de fora, como se alguém ao tentar entrar em casa, tivesse tropeçado e 
caído nos degraus da frente. Edmund sorri e comenta) Bom... isso parece ser o 
irmão ausente... Com certeza regressa num bom pileque!
TYRONE (enrugando a testa)
O patife! Pegou a tempo o último bonde! Que azar! (Levanta-se) Ponha-o na 
cama, Edmund. Vou até a entrada. Ele tem uma língua de peste quando está 
bêbedo. Só faria era me enfurecer.
(Sai em direção ao pórtico lateral no momento em 
que se ouve a porta da frente bater com força atrás de 
Jamie. Edmund observa, divertido, o irmão que 
caminha ziguezagueando através do vestíbulo da frente. 
Jamie entra na sala de estar. Está completamente 
bêbedo e mal se sustém sobre as pernas. Tem os olhos 
vidrados, o rosto intumescido, a fala pastosa, a boca 
frouxa como a do pai. Nos lábios traz um sorriso 
zombeteiro.)
JAMIE (cambaleando e piscando os olhos, grita em altas vozes, do vão da porta)
Olá! Olá... pessoal!...
EDMUND (em voz áspera)
Nada de gritos!...
JAMIE (fitando-o, sempre a pestanejar)
Oh! Olá, garoto! (Muito sério) Estou bêbedo feito uma perua!!
EDMUND
Agradeço-lhe por me ter confiado o seu grande segredo!
JAMIE (sorri tolamente)
É mesmo! Uma informação desnecessária, hem?! (Dobra-se e bate nas calças, 
na altura dos joelhos) Tive um acidente sério! Imagine que os degraus da 
frente tentaram pisotear-me!! Aproveitaram-se da cerração para fazer com que 
eu me extraviasse. Devia haver um farol aí fora. Aqui dentro também está 
escuro feito breu! (Franzindo a testa) Que diabo é isso?! Parece um velório! 
Lancemos um pouco de luz sobre esse local. (Avança titubeando para a mesa, 
recitando versos de Kipling)
Vau, vau, vau do rio Kabul, 
Vau do rio Kabul nas trevas
Não te afastes dos bordões ferrados que te
[guiarão de maneira segura
Para cruzar o vau do rio Kabul nas trevas!
(Busca, ás apalpadelas, o lampadário, e consegue acender, uma a uma, as três 
lâmpadas) Agora sim, melhorou muito. Para o inferno com o Gaspard!! Onde 
está aquele velho avarento?!
EDMUND
Lá fora, na entrada.
JAMIE
Não há de pretender que vivamos na Cela Negra de Calcutá! (Seu olhar se 
detém na garrafa cheia de uísque) Senhor! Será que estou com delirium 
tremens?! (Estende a mão trêmula e agarra a garrafa) Por Deus é uma garrafa 
de verdade! Que se passa com o velho na noite de hoje?! Deve estar 
“ossificado” para se ter esquecido que a deixou do lado de fora! Agarre a sua 
oportunidade... pelo gasganete!! É esta a chave do meu sucesso! (Despeja a 
bebida no copo.)
EDMUND
Já cheira mal! Recende a cachaça! Mais uma bebida e cairá por terra!
JAMIE
A sabedoria fala pela boca das crianças. Guarde para si as palavras sensatas, 
sim, garoto?! Mal saidos cueiros! (Deixa-se cair numa cadeira, segurando o 
copo cuidadosamente)
EDMUND
Está bem. Se quer ficar inconsciente, vá lá!!
JAMIE
Não consigo. É este o problema, Já bebi o bastante para afundar um navio, mas 
não consigo afogar-me a mim próprio.. Bem — sempre resta a esperança... 
(Bebe.)
EDMUND
Passe-me a garrafa. Também eu tomarei um gole.
JAMIE (repentinamente com ar solícito de um irmão mais velho, retendo a 
garrafa)
Não, não vai tomar coisa alguma. Pelo menos, enquanto eu estiver por aqui. 
Lembre-se das recomendações do médico. É possível que ninguém mais se 
importe caso venha a morrer — mas eu me importo... Meu irmão caçula! 
Quero-lhe muito, Ed. Todo o resto já desapareceu. Só tenho a você. (Aproxima 
de si a garrafa) De modo que nada de bebidas, se eu o puder evitar... (Sob o 
seu sentimentalismo de ébrio há uma real sinceridade)
EDMUND (irritado)
Ora, deixe disso!
JAMIE (sente-se magoado e sua expressão torna-se dura)
Não acredita que eu me importe, não é assim? “Simples desvarios de um 
bêbedo”... é o que pensa! (Empurra-lhe a garrafa) Pois bem! Continue 
bebendo e suicide-se de uma vez!
EDMUND (ao vê-lo magoado por suas palavras, diz afetuosamente)
Sei que isso o preocupa, Jamie, e estou deixando de beber. Mas esta noite não 
conta. Que diabo! Tantas coisas aconteceram no dia de hoje! (Serve-se de 
uísque) À sua saúde! (Bebe)
JAMIE (por um momento parece ficar sóbrio; com um olhar de pena)
Eu sei, Ed. Foi um dia penoso para você. (Com cínico sarcasmo) Aposto como 
o velho Gaspard nem tentou impedi-lo de beber. Provavelmente queria arranjar 
um bom pretexto a fim de poder mandá-lo para a granja do Estado... onde vão 
os enfermos indigentes! Quanto mais depressa você morrer, menos gastos fará! 
(Com ódio e desprezo) Que canalha é esse nosso pai! Deus meu! Se figurasse 
num romance, ninguém acreditaria!
EDMUND (defendendo-o)
Não é tanto assim, Jamie! É só tratar de compreendê-lo um pouco, e conservar 
o bom humor!
JAMIE (cínico)
Já vejo que o velho esteve representando para você a velha cena de lágrimas, já 
tão conhecida, hem?... Consegue sempre tapeá-lo! Porém a mim não. Nunca 
mais tornará a enganar-me.. (Lentamente) Se bem que, de certo modo, tenha 
pena dele... por uma coisa... Mas até disso teve a culpa! (Precipitadamente) 
Ora! Que vá tudo para o inferno! (Pega a garrafa, despeja mais uísque no 
copo e demonstra de novo estar bêbedo) Sinto que este último uísque me está 
pondo por terra. Creio que será o suficiente para deixar-me inconsciente. É o 
que eu desejo. Você disse ao velho que, segundo o Dr. Hardy, esse tal sanatório 
não passa de uma instituição de caridade?!
EDMUND (de má vontade)
Sim. Declarei-lhe que não iria para lá. Agora já está tudo combinado. 
Respondeu-me que eu poderia ir para onde quisesse. (Acrescenta sorrindo, 
sem ressentimento) “Dentro do razoável”, já se vê...
JAMIE (imitando o pai)
“Decerto, rapaz, tudo dentro do razoável...” (Mordaz) Isto significa outro 
sanatório barato! O velho Gaspard, o avarento de Os Sinos. Aí está um papel 
que nosso pai poderia representar até sem maquilagem!
EDMUND (irritado)
Ora, cale a boca, sim?! Já o ouvi chamá-lo de “Gaspard” um milhão de vezes!
JAMIE (dá de ombros —falando com dificuldade)
Está bem! Se você está de acordo, que ele faça o que bem quiser! É você quem 
vai morrer! quero dizer... oxalá tal não aconteça!
EDMUND (mudando de assunto)
Que é que você fez esta noite no povoado? Foi à casa de Mamie Burns?
JAMIE (completamente embriagado, meneia a cabeça afirmativamente)
Claro que fui! Em que outro lugar teria encontrado uma companhia feminina 
adequada?!... E amor... Não se esqueça do amor! O que é o homem sem o amor 
de uma boa mulher?! Uma casa vazia, nada mais!
EDMUND (com um risinho oco, abandonando-se, por sua vez e completamente, 
à embriaguez)
Está doido!
JAMIE (recita com prazer versos de A Casa das Mulheres de Oscar Wilde)
Então, voltando-se para o meu amor, disse-lhe:
‘Os Mortos estão bailando com os Mortos,
O Pó está rodopiando com o Pó!’
Ela, porém, ouviu o som do violino,
Abandonou-me e entrou...
O Amor penetrou na casa da Luxúria...
Repentinamente, então, a melodia tornou-se falsa.
Os bailarinos cansaram-se da valsa!
(Interrompe-se com ar sombrio) Isto não é lá muito exato... Se meu amor 
estava comigo nem o vi! Deve ter sido um fantasma! (Faz uma pausa) 
Adivinhe qual das sereias de Mamie elegi para gratificar-me com seu amor de 
mulher?!... Isso até o fará rir, rapaz! Escolhi Violeta, a “Gorda”!
EDMUND (rindo)
Não! Não é possível! Deveras?! Que mau gosto! Violeta deve pesar uma 
tonelada! Por que diabo você a escolheu?! Por brincadeira?!
JAMIE
Qual brincadeira, qual nada! Foi algo de muito sério! Quando cheguei à casa 
de Mamie, sentia-me profundamente deprimido ao pensar na minha sorte e na 
de todos os demais vagabundos do mundo! Estava pronto a chorar e me 
desabafar em qualquer colo feminino. Sabe a disposição em que se fica quando 
Baco acorda em nosso peito a tecla do sentimentalismo! Mal cheguei à porta, 
Mamie pôs-se a contar-me todos os seus problemas. Queixou-se de que os 
negócios andavam mal, e me disse que ia despedir Violeta, a “Gorda”. Só a 
conservava ali porque sabia tocar piano. Mas ultimamente a mulher dera para 
beber. Vivia “alta” demais para poder tocar, e não fazia a sua féria. Os 
fregueses não a queriam mais. E, se bem que fosse uma pobre criatura, tola, 
mas de bom coração, e ela, Mamie, tivesse muita pena, pois não imaginava de 
que outra forma Violeta poderia ganhar a vida — “negócio, afinal, era negócio, 
e ela não se podia pagar o luxo de dirigir uma casa para rameiras obesas”! 
Então tive pena da pobre Violeta e gastei dois dos seus dólares para 
acompanhá-la ao primeiro andar. Sem quaisquer intenções desonestas, aliás... 
Agradam-me as mulheres gordas, como sabe, mas não a esse ponto! Queria 
apenas ter uma pequena conversa de coração aberto acerca da infinita tristeza 
da Vida!
EDMUND (sempre ébrio, rindo)
Coitada da Violeta! Aposto como você lhe recitou versos de Kipling e 
Swinburne e Dowson, e saiu-se com aquele célebre trecho: “Eu te fui fiel, 
Cynara, à minha maneira...”
JAMIE (com um sorriso sem graça)
Claro... enquanto o velho Baco despertava em mim sua suave música 
sentimental... Ela o suportou durante algum tempo. Mas, logo depois, 
aborreceu-se. Julgou que eu a tivesse levado ao primeiro andar por deboche! 
Lançou-me em rosto mil impropérios! Gritou-me que valia mil vezes mais do 
que um tipo à toa como eu, um bêbedo que só sabia era recitar versos!! 
Começou depois a chorar; e tive que lhe assegurar que eu a amava de verdade, 
justamente porque era assim gorda! Eu próprio quis crer no que afirmava — e, 
então, fiquei... para prová-lo. Isto a fez muito feliz! Beijou-me quando sai, e 
declarou-me que estava apaixonadíssima por mim! Choramos um pouco mais 
no corredor, mas tudo terminou bem. Só que Mamie Burns julgou que eu tinha 
ficado louco!
EDMUND (citando com mofa)
“As prostitutas e os perseguidos podem proporcionar prazeres muito seus que 
o vulgo jamais compreenderá...”
JAMIE (meneando a cabeça com ar de ébrio)
E isso mesmo! Com efeito, foi uma farra! Que pena você não ter vindo 
comigo, Ed! Mamie Burns perguntou por você. Lamentou saber que você anda 
doente. Lamentou-o sinceramente. (Faz uma pausa e prossegue, sempre na 
sua embriaguez, em tom de ator cômico e vulgar) Hoje à noite, rapaz, abriram-
se os meus olhos para uma carreira magnífica que o destino me reserva! Vou 
devolver às focas amestradas a arte de representar! São elas a sua mais perfeita 
expressão! Aplicarei, na sua devida esfera, os talentos naturais que Deus me 
concedeu, e alcançarei, dessa maneira, a culminância do êxito! Serei o amante 
da mulher obesa de Circo de Barnum e Bailey!! (Edmund ri. O estado de 
ânimo de Jamie se transforma,convertendo-se em orgulhoso desdém) Bah! 
Imagine só seu irmão rendendo-se aos encantos da mulher gorda, num mísero 
bordel de província! Eu que fiz esperar e suplicar as mulheres mais belas da 
Broadway! (Cita uns versos da Sextina de Tramp-Royal de Kipling) “De modo 
geral, experimentei todos os alegres caminhos que nos levam pelo Mundo.” 
(Com a voz impregnada de melancolia) Esses “caminhos alegres” não passam 
de meras palavras! São as trilhas penosas que contam! Levam-nos rapidamente 
ao nada... a parte alguma! Foi aí que cheguei: a parte alguma!... Onde todos 
nós vamos parar no final, embora a maioria dos incautos não o queira 
reconhecer!
EDMUND (gracejando)
Basta! Daqui a pouco você estará chorando!...
JAMIE (tem um sobressalto e, por um segundo, olha fixamente para o irmão, 
com hostilidade; sobriamente retruca)
Não fique... atrevido demais, hem?! (Brusco) Mas tem razão! Que os remorsos 
vão pra o inferno! Afinal, a gorda Violeta é uma boa mulher, e alegro-me por 
ter estado com ela! Foi um ato de caridade. Curei-lhe a tristeza e passei uns 
bons momentos. E uma pena que não me tenha acompanhado, rapaz! Teria 
esquecido todas as suas preocupações. De que lhe serve voltar para casa, se se 
entristece com o que não tem mais remédio? É o fim — tudo agora acabou — 
não resta mais a menor esperança! (Pára — balançando a cabeça tontamente e 
cerrando os olhos. — Abre-os de repente, ergue o olhar e com o rosto duro 
recita em tom de mofa)
Se me enforcassem na mais alta colina
Minha mãe, oh! minha mãe
Sei qual o amor que me seguiria ainda...
EDMUND (com violência)
Cale essa boca!
JAMIE (em tom cruel e mordaz em que aflora um travo de ódio) 
Onde está aquela cabeça louca? Foi dormir?
(Edmund estremece como se fora agredido. Há um 
silêncio tenso. O rosto de Edmund apresenta-se lívido e 
doentio. De repente, num acesso de ódio, levanta-se de 
um salto.)
EDMUND
Canalha!
(Dá-lhe um soco que resvala pelas maçãs do rosto. 
Por um momento Jamie chega a erguer-se em parte da 
cadeira e reage disposto a lutar. Mas, como que 
repentinamente, cai em si e reavalia a brutalidade do 
que disse. Afunda-se na cadeira como uma massa 
inerte.)
JAMIE (arrasado)
Obrigado, rapaz. É certo que o mereci. Não sei porque disse isso. Foi o álcool 
com certeza. Você já me conhece, Ed.
EDMUND (cuja raiva se dissipa pouco a pouco)
Sei que você não o teria dito nunca se não fosse por... Mas, Jamie... Por mais 
bêbedo que esteja, isso não se desculpa! (Depois de uma pausa, num tom 
desolado) Lamento tê-lo alcançado... Você e eu nunca brigamos... (Afunda-se 
também na cadeira.)
JAMIE (num timbre rouco)
Não tem importância. Foi bom que me tivesse atingido! É essa minha língua 
suja! Quisera eu poder cortá-la! (Ocultando o rosto entre as mãos numa voz 
abatida) É por isso que estou assim arrasado. Desta vez mamãe me enganou. 
Na realidade acreditei que ela tinha largado o vício. Ela supõe que sempre 
penso o pior, mas desta vez imaginei o melhor... (Sua voz vacila.) Acho que, 
por enquanto, ainda não lhe poderei perdoar... Isto significa tanto para mim! 
Acreditava que, se ela conseguisse dominar o seu vício, eu também dominaria 
o meu!
(Começa a soluçar, e o que há de pungente no seu 
pranto é que é o pranto de um homem lúcido, não de 
um ébrio.)
EDMUND (pestanejando, afugenta as lágrimas)
Deus meu! Pensa por acaso que não sei como você se sente?! Chega, Jamie!
JAMIE (tentando controlar os soluços)
Soube o que se passava com mamãe muito antes de você. Nunca esqueci o 
momento em que o descobri: surpreendi-a quando tomava a droga com uma 
seringa. Cristo! Nunca imaginara que mulheres — a não ser prostitutas — 
tomassem drogas. (Pausa.) E depois, mais essa história de você ficar 
tuberculoso! Isso me arrasou. Temos sido mais do que irmãos. Você é o único 
companheiro que jamais tive. Quero-lhe um bem imenso, Ed. Faria qualquer 
coisa por você.
EDMUND
Eu sei, Jamie. (Dá-lhe uma palmadinha no braço.)
JAMIE (controlou o pranto; afasta as mãos do rosto e diz com estranha 
amargura)
Meu Deus! Aposto como depois de ter ouvido mamãe e o velho Gaspard 
dizerem tantas vezes que sempre espero pelo pior, você agora é capaz de 
suspeitar que penso comigo mesmo: nosso pai já está velho e não viverá muito, 
e, se você morrer, mamãe e eu ficaremos com tudo que ele tem — assim 
provavelmente espero que...
EDMUND (indignado)
Cale a boca, imbecil. Que diabo pôs essa idéia louca na sua cabeça! (Fitando-o 
com ar acusador) Sim, isto é o que eu gostaria de saber. Como lhe veio essa 
idéia?
JAMIE (confuso, novamente com ar de ébrio)
Não seja tolo! Vocês sempre suspeitam o pior! Já cheguei a um estado tal que 
não posso evitar. (Com ressentimento) Que é que você pretende? Acusar-me? 
Não se faça de sabido comigo. Aprendi muito mais sobre a vida do que você 
nunca o saberá. Não pense que pode enganar-me só porque leu um montão de 
palavreado pedante! Você não passa de um garoto que cresceu demais. O 
queridinho da mamãe e do papai! A esperança da família! Ultimamente deu 
para ficar convencido! Sem motivo algum! Tudo por causa de uma meia dúzia 
de versos publicados num jornaleco de um povoadozinho à toa! Com mil 
diabos, rapaz, eu publicava coisas muito melhores na revista do colégio! É 
bom que você desperte e compreenda que não fará maravilhas! Você deixa que 
os provincianos idiotas daqui o adulem com bonitas palavras sobre o seu 
futuro... (Bruscamente seu tom de voz revela cansaço e contrito 
aborrecimento. Edmund desvia o seu olhar do irmão, procurando não dar 
ouvidos às suas palavras.) Esqueça isso tudo, rapaz! Que inferno! Já sabe que 
nunca falo a sério. Ninguém se orgulha mais do que eu de que comece a 
triunfar! (Afirmativo) E por que não me haveria de orgulhar? Seria mero 
egoísmo. Seus sucessos são uma honra para mim. Mais do que ninguém 
ocupei-me de sua educação. Fui eu que o instruí sobre a vida e as mulheres, de 
modo que não fizesse papel de tolo nem caísse em erros que não gostaria de 
cometer. E quem o animou a ler os poetas? Swinburne, por exemplo? Eu! E — 
como em outros tempos desejei escrever — sugeri-lhe que escrevesse. Para 
mim você é mais do que um irmão. Eu o fiz! É o meu Frankenstein.
(Sua voz adquiriu um tom altaneiro de ébrio que se 
gaba. Edmund agora sorri divertido.)
EDMUND
Está bem. Sou seu Frankenstein. Então vamos beber. (Ri.) Que louco!
JAMIE (com ar sombrio)
Tomarei um gole. Você não. Tenho que cuidar de sua saúde. (Inclina-se com 
um sorriso inexpressivo, afetuosamente chocho e segura a mão do irmão) Não 
fique assustado com esse negócio de sanatório. Que diabo! Você se sairá dessa! 
Seis meses e estará novamente em forma! Vai ver que nem está tuberculoso 
nem nada!... Esses médicos são uns farsantes! Há anos disseram-me que eu 
deixasse de beber, ou seria logo um homem morto... e aqui estou! Não passam 
de uns embusteiros! Fazem não importa o quê, só para tirar o dinheiro da 
gente! Apostaria como toda essa história da granja do Estado não passa de 
politicagem e trapaça! Certamente os médicos receberão sua comissãozinha 
por doente que mandem para lá!
EDMUND (agastado e ao mesmo tempo divertido)
Você é um número, Jamie! No dia do juízo final andará, na certa, dizendo a 
todos que o julgamento depende da soma que puder dar!
JAMIE
E terei razão! Ponha alguns dólares na mão do Juiz Supremo, e você se 
salvará! Mas, se não tiver dinheiro, pode ir logo para o inferno!! (Sorri ante a 
própria blasfêmia, e Edmund também não pode deixar de rir. Jamie continua) 
“Portanto, leve sempre dinheiro na sua carteira... “É este o melhor estimulante 
na vida! (Num tom de motejo) O segredo do meu grande sucesso! Veja até onde 
me levou... (Solta a mão de Edmund para despejar mais uma dose de uísque 
no copo, e a sorve de um só trago. Contempla o irmão com afetuosa emoção. 
Segura-lhe de novo a mão,e começa a falar-lhe com uma voz pastosa, mas 
com estranha e convincente sinceridade) Escute, Ed. Você vai partir. Talvez 
não tenhamos outra ocasião para conversar assim — ou eu não torne a estar 
embriagado a ponto de ousar dizer-lhe a verdade. Devo, portanto, fazê-lo 
agora. É algo que eu devia ter confessado a você, há muito tempo... para o seu 
próprio bem. (Hesita, em luta consigo mesmo. Edmund o olha fixamente, 
surpreendido e com certo mal-estar. Jamie, bruscamente, desabafa-se) Desta 
vez não serão invencionices de bêbedo, mas a pura verdade... In vino veritas... 
sabe?! Mais vale, pois, que me tome a sério. Quero pô-lo em guarda contra 
mim mesmo. Nossos pais têm razão. Tenho exercido uma péssima influência 
sobre você. E, o que é pior, eu o fiz deliberadamente...
EDMUND (constrangido)
Cale-se. Não quero saber.
JAMIE
Vamos, Edmund. Você tem que me ouvir. Agi de má fé, com intenção de fazer 
de você um vagabundo. Ou, pelo menos, uma parte de mim mesmo agiu assim. 
Uma grande parte que há tanto tempo já morreu em mim! Aquela que odeia a 
Vida! Refiro-me aos ensinamentos que lhe dei para que você aprendesse com 
os meus próprios erros. Fingia crer nisso, mas era uma farsa! Fiz com que 
meus erros parecessem certos; e minha bebedeira romântica; e as prostitutas 
umas sereias fascinantes, em vez de serem as pobres decaídas estúpidas e 
enfermiças que são! Zombei do trabalho como se fosse um jogo de néscios! 
Não queria ver você triunfar e eu perder no confronto. Queria que você 
fracassasse. Tinha sempre ciúmes de você: o “filhinho” da mamãe... o predileto 
do papai! (Olha fixamente para o irmão com crescente animosidade) E foi o 
seu nascimento que empurrou mamãe para a morfina. Sei que a culpa não foi 
sua, homem! Com tudo isso, maldito seja!! não posso deixar de o odiar...
EDMUND (quase assustado)
Jamie! Pare com isso! Você está louco!...
JAMIE
Não me leve a mal. Eu lhe quero mais bem do que o odeio. E o fato de 
confessar-lhe tudo isto agora é a prova. Corro o risco de que passe a me 
detestar — e, afinal, você é tudo que me resta. Não pensava, porém, ir tão 
longe, dizer-lhe toda a verdade até o fim. Não sei o que me levou a fazê-lo. 
Quis que compreendesse o meu desejo de vê-lo triunfar mais do que ninguém. 
Mais vale, porém, que esteja alerta, porque, ao mesmo tempo, farei todo o 
possível para o seu fracasso! Não posso evitá-lo. Odeio-me a mim próprio. 
Tenho que me vingar. Vingar-me dos demais... e, sobretudo, de você... É como 
na Balada do Cárcere de Reading de Oscar Wilde. O homem estava morto e, 
por isso, tinha que matar a quem amava. Assim é que deveria ser. O que há de 
morto em mim espera que não se cure nunca. Talvez até se alegre que mamãe 
tenha retomado a morfina!... Requer companhia... Não quer ser o único 
cadáver dentro desta casa! (Ri um riso cruel e torturado.)
EDMUND
Céus! Jamie! Você está realmente ficando louco!
JAMIE
Pense bem e verá que tenho razão. Torne a pensar, quando estiver já longe de 
mim, no sanatório. Deve compreender que precisa amarrar-me uma pedra ao 
pescoço, Ed, expulsar-me de sua vida... considerar-me morto... dizer a toda 
gente: “Tive um irmão, mas ele já morreu”... E, à sua volta... cuidado comigo! 
Estarei à sua espera, com minha eterna cantilena de “velho camarada”, pronto 
a estender-lhe cordialmente a mão e a dar-lhe — na primeira ocasião — uma 
punhalada certeira pelas costas!...
EDMUND
Cale a boca, por piedade! Que eu seja amaldiçoado se continuar a ouvi-lo!
JAMIE (sem prestar atenção aos protestos do irmão)
Mas não se esqueça de mim. Lembre-se de que o avisei... para seu próprio 
bem. Acredite-me: não há maior amor do que este: o daquele que salva o seu 
irmão de si mesmo! (Seu timbre de voz demonstra o quanto está ébrio. 
Balança a cabeça) É tudo. Agora sinto-me melhor. Confessei-me. Sei que me 
absolverá, não? Procure compreender, Ed. É um rapaz e tanto! E é natural que 
o seja! Afinal, fui eu que o formei!! Vá, pois, e trate de curar-se. Não se deixe 
morrer comigo. É tudo o que lhe peço, pois é tudo o que me resta. Que Deus o 
guarde. Amém.
(Afunda num dormitar de bêbedo, sem adormecer 
por completo. Desolado, Edmund oculta o rosto entre 
as mãos. Tyrone entra pela porta telada, vindo do 
pórtico. Sua roupa está úmida de neblina e traz a gola 
levantada em torno do pescoço. Sua fisionomia severa 
revela aborrecimento e, ao mesmo tempo, compaixão. 
Edmund não se apercebe de sua chegada.)
TYRONE (em voz baixa)
Por sorte adormeceu. (Edmund olha sobressaltado para o pai) Julguei que não 
parasse de falar. (Abaixa a gola da roupa) Mais vale que o deixemos ficar onde 
está para que cozinhe a bebedeira! (Edmund permanece em silêncio. Tyrone o 
fita e prossegue) Ouvi suas últimas palavras. Eu o preveni, Edmund... Espero 
que você leve em conta o aviso, agora que o mesmo veio dos próprios lábios 
de seu irmão. (Edmund não dá sinal de o ter ouvido. Tyrone acrescenta, com 
compaixão) Mas não tome demasiado a sério, meu filho. Jamie gosta de 
exagerar o que nele há de pior, quando está assim embriagado. Mas ele lhe 
quer bem. É a única coisa que naquele rapaz resta de bom! (Olha para Jamie 
com amarga melancolia) Que belo espetáculo para mim!! O meu primogênito 
que tanto esperei levasse avante o meu nome com honra e dignidade — e que 
parecia ser uma tão brilhante promessa!...
EDMUND (penalizado)
Cale-se, papai. Você não pode calar-se?!...
TYRONE (servindo-se de uísque)
... Um lixo humano! Uma mina, um pobre trapo, ébrio, acabado e liquidado!... 
(Bebe)
(Jamie mostra-se inquieto, adivinhando a presença 
do pai e tentando sair do seu torpor. Abre os olhos e, 
pestanejando, olha para Tyrone que, de cara fechada, 
retrocede um passo, na defensiva)
JAMIE (repentinamente, apontando-lhe o dedo e recitando com ênfase teatral)
Chegou Clarence, o pérfido, frívolo e perjuro Clarence
Que me apunhalou nos campos junto a Tewksbury. 
Agarrai-o, ó Fúrias!, e atormentai-o...
(Ressentido) Que diabo você tanto olha?! (Recita, com ironia, versos de 
Rossetti)
Olha-me na cara. Eu me chamo ‘Podia Ter Sido’.
Também me chamam ‘Já Não Sou’, ou ‘Demasiadamente
[Tarde’ ou ‘Adeus’...
TYRONE
Sei muito bem disso e garanto-lhe que não me agrada encará-lo!
EDMUND
Chega, papai!
JAMIE (em tom de zombaria)
Tenho uma ótima sugestão para você, papai. Torne a representar Os Sinos nesta 
temporada. Há, nessa peça, um papel notável que pode fazer até sem 
maquilagem! O do velho Gaspard, o Avarento! (Tyrone dá-lhe as costas, 
esforçando-se por conter a sua cólera)
EDMUND
Jamie, cale a boca.
JAMIE (mordazmente)
Afirmo como Edwin Booth nunca pôde apresentar uma interpretação tão 
brilhante quanto a das focas amestradas. As focas são animais sinceros e 
inteligentes. Nada de trapaças na arte de representar! Reconhecem que são 
meramente artistas saltimbancos que ganham o seu peixe de cada dia!
TYRONE (ferido, volta-se furioso para o filho) 
Seu parasita ordinário!
EDMUND
Papai, você quer provocar aqui uma discussão que fará com que mamãe desça 
lá de cima?! Jamie, vá dormir! Você já falou mais do que devia!
(Tyrone volta as costas a Jamie)
JAMIE (falando com dificuldade)
Bem... bem, rapaz. Não estou procurando briga. Estou com muito sono 
demais!
(Cerra os olhos, e cabeceia. Tyrone aproxima-se da 
mesa e senta-se, virando a cadeira, de modo que não 
possa ver Jamie. Logo após, mostra-se também 
sonolento.)
TYRONE (num tom desanimado)
Queira Deus que ela já tenha ido para a cama, a fim de que eu possa ir deitar-
me! (Dormitando) Estou cansadíssimo! Já não agüento mais passar uma noite 
de vigília como antigamente. Estou velho... velho e cansado! (Com um enorme 
bocejo que por um pouco lhe desarticula os maxilares) Os meus olhos se 
fecham. Acho que vou tirar um cochilo. Por que não faz o mesmo, Edmund? 
Assim passará o tempo até queela...
(Sua voz se apaga. Os olhos se cerram; o queixo 
pende; e ele começa a ressonar pesadamente através da 
boca aberta. Edmund permanece sentado, numa forte 
tensão. Ouve um ruído e, num sobressalto, pende o 
corpo para frente, na ponta da cadeira, e olha para a 
porta da frente do hall. Ergue-se de um salto, aflito e 
aterrorizado. Por um segundo, dá a impressão de que 
vai esconder-se na sala de trás. Nisso, senta-se 
novamente e espera, desviando o olhar, as mãos 
aferradas aos lados da poltrona. Repentinamente 
acendem-se as cinco luzes do lampadário na sala da 
frente; e alguém nela começa a tocar ao piano a 
introdução de uma das valsas mais conhecidas de 
Chopin. Toca de maneira hesitante, com os dedos que 
parecem endurecidos, como uma colegial desajeitada 
que pela primeira vez tentasse tirar uma música. Tyrone 
estremece e, imediatamente, volta a si. Jamie joga a 
cabeça para trás e abre os olhos. Por um momento os 
três homens escutam petrificados. A música cessa de 
modo igualmente inesperado, e Mary aparece no limiar 
da porta. Usa um penhoar azul-celeste sobre a 
camisola de dormir e nos pés descalços, umas lindas 
chinelas adornadas de pompons. Está mais pálida do 
que nunca e seus olhos parecem enormes. Brilham 
como reluzentes jóias negras. O que há de peculiar é 
que seu rosto parece agora extraordinariamente jovem. 
Dir-se-ia que toda a experiência e os desgostos 
passados dela se esfumaram. É como uma máscara 
marmórea de juvenil inocência — os lábios 
entreabertos num tímido sorriso. Seu cabelo branco 
está repartido em duas longas tranças que lhe caem 
sobre o busto. Traz sobre um dos braços, de modo 
negligente, um vestido de noiva de cetim branco, de 
modelo antiquado, debruado de renda duchesse, e que 
ela deixa arrastar pelo assoalho como se já tivesse 
esquecido que o tem na mão. Hesita no vão da porta, 
relanceando o olhar, pela sala, a testa contraída com 
um ar de perplexidade — como quem veio em busca de 
alguma coisa mas, em caminho, distraiu-se, esquecendo 
de que se tratava. Os três homens a fitam em silêncio. 
Mary mal se apercebe da presença deles. Avista-os 
mecanicamente, como avista os demais objetos da sala: 
os móveis, as janelas, os trastes familiares que aceita 
naturalmente como habituais, mas para os quais não 
olha porque está demasiado preocupada para reparar 
na sua presença.)
JAMIE (rompendo o pesado silêncio, tão penoso, com cáustica amargura, e já 
na defensiva)
A Cena da Loucura! Entra Ofélia!!...
(O pai e o irmão viram-se para ele, revoltados. 
Edmund é o mais ligeiro, e, com o dorso da mão, dá-lhe 
uma bofetada na boca.)
TYRONE (a voz trêmula de fúria reprimida)
Muito bem, Edmund! Que miserável! Asqueroso! Tratando-se de sua própria 
mãe!...
JAMIE (murmura, com ar culpado, e sem ressentimento)
Está bem, rapaz. Foi merecido! Mas já lhe disse quanta esperança eu tinha de 
que... (Cobre o rosto com as mãos e começa a chorar.)
TYRONE
Amanhã, se Deus quiser, hei de pô-lo na rua, a pontapés!! (Os soluços de 
Jamie dissipam-lhe, todavia, aos poucos, a cólera. Volta-se; sacode-o pelo 
ombro, e suplica) Jamie, pelo amor de Deus, pare com isso!
(E então Mary fala... Os três novamente permanecem 
petrificados, os olhos fitos nela, num silêncio mortal. 
Mary não prestou a menor atenção ao incidente. Foi 
apenas uma parte da atmosfera familiar da sala, um 
fundo de quadro que não a afetou nem perturbou. E ela 
fala, em voz alta, consigo mesma, não com eles...)
MARY
Toco mal agora! Irmã Teresa vai passar-me um pito! Dirá que não é justo para 
com meu pai, que gasta tanto dinheiro para que eu tenha aulas particulares. E 
ela tem razão! Não é mesmo justo, quando ele é tão bom e generoso e se 
orgulha tanto de mim! De hoje em diante preciso todos os dias praticar um 
pouco. Mas... aconteceu uma coisa horrível com as minhas mãos. Os dedos 
ficaram tão duros! (Ergue as mãos e as examina com angustiada 
perplexidade) As juntas estão inchadas, tão feias! Tenho que ir à enfermaria e 
mostrá-las à Irmã Marta. (Com um sorriso doce de afetuosa confiança) Ela já é 
velha e um tanto maluca! Mas, mesmo assim, gosto muito dela; e, no seu 
armariozinho de remédios, ela tem com que curar todas as doenças! Ela me 
dará uma pomada qualquer para passar nas mãos, e me recomendará que reze à 
Santíssima Virgem... e ficarei logo boa! (Esquece-se das mãos e caminha para 
dentro da sala, arrastando pelo chão o vestido de casamento que leva no 
braço. Olha em volta, com um olhar vago, a testa novamente franzida) 
Vejamos! O que foi mesmo que vim buscar aqui?! Como estou ficando 
distraída! É terrível isso!! Estou sempre sonhando e me esquecendo das 
coisas...
TYRONE (com voz abafada)
Que é que ela traz no braço, Edmund?
EDMUND (com tristeza)
Suponho que seja o seu vestido de noiva...
TYRONE
Deus meu! (Levantando-se e vedando-lhe o caminho. Num tom de profunda 
angústia) Mary! Já não é bastante doloroso que... (Controlando-se, com terna 
persuasão) Vamos, minha querida! Deixe que eu leve. Você acabará por pisá-lo 
e rasgá-lo. Sem contar que se manchará arrastando-se assim pelo chão. Depois 
você ficará triste.
(Ela o deixa segurar o vestido, olhando para ele com 
um olhar abstrato, vindo de algum recanto distante de 
sua alma, sem reconhecê-lo mais, sem afeto nem 
animosidade.)
MARY (com a tímida polidez de uma jovem bem educada para com um senhor de 
idade que a alivia de um peso)
Obrigada, o senhor é muito gentil. (Olha para o vestido com interesse e 
perplexidade) É um vestido de noiva. Lindo, não é verdade? (Uma sombra 
atravessa-lhe o rosto e ela parece sentir um vago mal-estar) Agora sim, 
recordo-me. Encontrei-o no sótão, escondido dentro de uma mala. Mas, não sei 
para que o queria. Vou ser freira... quero dizer, se eu conseguir encontrar... 
(Relanceia o olhar pela sala. Torna a franzir a testa) O que estarei 
procurando? Sei que é alguma coisa que perdi.
(Afasta-se de Tyrone, que lhe parece tão-somente um 
obstáculo a lhe obstruir o caminho)
TYRONE (exortando-a com desespero)
Mary!
(Mas não consegue atravessar a muralha de 
preocupação atrás da qual ela se move. Não parece 
ouvi-lo. Ele desiste, desanimado, fechando-se em si 
mesmo. Até sua embriaguez, que é a sua forma de 
defesa, dissipa-se, deixando-o sombrio e desamparado. 
Deixa-se cair na poltrona, sustentando nos braços o 
vestido de noiva com um cuidado inconsciente, 
desajeitado e ligeiramente protetor.)
JAMIE (retira a mão do rosto; seus olhos estão fixos na mesa; de repente, não se 
contém mais; sombriamente)
É inútil, papai. (Recita versos de A Despedida de Swinburne, e os recita bem, 
com simplicidade, porém com amarga tristeza)
Levantemo-nos e separemo-nos; ela não o saberá.
Vamos até o mar, como os grandes ventos
Carregados de areia e de espuma...
De que serve estarmos aqui?
É inútil! Que assim são todas as coisas
E o mundo é amargo como uma lágrima!
E ela não saberá como essas coisas são.
Embora procuremos explicar-lhas.
MARY (olhando em redor)
Há alguma coisa de que sinto uma falta tremenda. Não é possível que se tenha 
perdido para sempre.
JAMIE (volta-se para fitá-la face a face e não consegue reprimir por sua vez 
uma exortação suplicante)
Mamãe! (Mary nem parece ouvi-lo. Jamie desvia o olhar, com um ar 
impotente) Para o diabo!... Afinal de que serve chamá-la! É inútil. (Torna a 
recitar vasos de A Despedida com crescente amargura)
Vamo-nos daqui, canções minhas, ela não as ouvirá.
Vamo-nos daqui juntos, sem temor.
Guardai silêncio agora, pois foi-se a hora do cantar.
E foram-se também todas as velhas coisas que
[nos eram caras.
Ela não te ama a ti nem a mim, como todos nós
[a amamos.
Sim.Ainda mesmo que feito anjos lhe cantássemos
[ao ouvido,
Ela não nos ouviria.
MARY (olhando em volta, prossegue)
... Alguma coisa de que sinto uma falta terrível! Lembro-me de que quando a 
tinha nunca me sentia só nem assustada. Não a posso ter perdido para sempre! 
Se pensasse isso, eu morreria! Porque então não haveria mais esperança! 
(Move-se como uma sonâmbula pelas costas da poltrona de Jamie. A seguir 
caminha para diante em direção à esquerda, passando por trás de Edmund.)
EDMUND (vira-se num impulso e lhe agarra o braço; ao chamar por ela, na 
sua súplica há um quê de menino ferido e perplexo)
Mamãe, o que eu tenho não é um simples resfriado de verão! Estou 
tuberculoso!
MARY (por um segundo parece que o desespero do filho rompeu a barreira e a 
atingiu; ela estremece e sua expressão é de terror; aturdida, como que 
dando uma ordem a si própria, exclama)
Não!! (E instantaneamente mais uma vez ela se afasta. Murmura em voz 
suave, porém de um modo impessoal) Não procure tocar-me. Nem me deter. 
Não fica bem, agora que espero ser freira.
(Edmund a solta. Ela continua a andar pela 
esquerda, até a extremidade do sofá, sob as janelas, e 
se senta, de frente para o público, as mãos juntas sobre 
o colo com a atitude recatada de uma jovem colegial.)
JAMIE (lança ao irmão um olhar em que há um estranho misto de compaixão e 
enciumado regozijo)
Seu tolo! Não vê que é inútil? (Recita ainda um trecho do poema de 
Swinburne)
Vamos adiante — vamos adiante. Ela não nos verá. 
Cantemos todos juntos uma vez mais — certamente
[ela — também, 
Recordando os dias e as palavras que se foram,
Voltar-se-á um pouco para nós, a suspirar. Mas nós 
Vamo-nos daqui; já nos fomos, como se nunca
[aqui tivéssemos estado.
Não! Embora todos os homens que vissem se
[apiedassem de mim,
Ela não nos veria mais...
TYRONE (procurando libertar-se de seu torpor e abatimento)
Oh! Somos uns idiotas de lhe prestar atenção. Toda a culpa é dessa maldita 
droga. Porém nunca a vi afundar-se nela tão completamente como hoje. 
(Asperamente) Passa-me essa garrafa, Jamie! E deixe de recitar essa poesia 
mórbida. Não a admito mais em minha casa.
(Jamie lhe empurra a garrafa. Tyrone se serve sem 
desarranjar o vestido de noiva que continua a suster 
cuidadosamente sobre o outro braço e os joelhos, e 
empurra de volta a garrafa para o filho. Jamie se serve 
e a passa para Edmund que por sua vez despeja uma 
dose no copo. Tyrone ergue o seu copo e 
mecanicamente os filhos o imitam — mas antes que 
possam beber, Mary recomeça a falar — e eles abaixam 
lentamente os copos e os deixam sobre a mesa, 
esquecidos dos mesmos.)
MARY (olhando para o vácuo com olhar sonhador; seu rosto parece 
extraordinariamente juvenil e inocente; nos seus lábios nota-se um 
sorriso confiante e timidamente ansioso, enquanto fala consigo mesma)
Conversei com Madre Elisabeth. É tão doce e boa !... Uma verdadeira santa. 
Gosto muito dela. Talvez seja até um pecado, mas a quero mais do que a minha 
própria mãe. Porque sempre me compreende mesmo antes que eu diga uma só 
palavra. Seus bondosos olhos azuis penetram logo fundo no meu coração. Dela 
não posso ocultar coisa alguma. Nem a posso enganar, mesmo que fosse tão 
mesquinha que desejasse fazê-lo. (Meneia a cabeça num gesto de ligeira 
rebeldia, com um certo despeito juvenil) Contudo, acho que desta vez não foi 
compreensiva assim! Eu lhe disse que queria ser freira. Expliquei-lhe como 
estava segura de minha vocação e que tinha rezado à Santíssima Virgem, 
pedindo-lhe que me desse essa certeza, e que dela me achasse digna. Contei à 
madre que eu tinha tido uma visão quando rezava na capelinha de Nossa 
Senhora de Lourdes, na pequena ilha junto ao lago. Disse-lhe que sabia — tão 
certo quanto estava ali ajoelhada — que a Virgem havia sorrido para mim e me 
tinha abençoado, dando-me seu consentimento. Mas a Madre Elisabeth achou 
que eu devia ter ainda maior certeza e provar que não fora simplesmente 
imaginação minha! Disse-me que, se estava tão segura assim, não me devia 
importar se me pusessem à prova, mandando-me para casa depois da minha 
formatura, para que eu levasse uma vida igual à das outras moças, assistindo a 
festas e bailes e me divertindo como elas fazem. E que, se ao cabo de dois anos 
eu me sentisse ainda tão certa da minha vocação, então, sim, poderia voltar 
para vê-la e tratarmos novamente do assunto. (Sacode a cabeça indignada) 
Nunca imaginei que a santa madre me pudesse dar tal conselho! Fiquei mesmo 
chocada com isso. Respondi-lhe que, decerto, atenderia à sua sugestão, mas 
que achava que era simplesmente perda de tempo. Depois que a deixei, senti-
me muito desorientada. Fui então à capela e rezei à Virgem Santíssima, e 
novamente encontrei a paz porque sabia que ela ouvira a minha prece e que me 
amaria sempre... e que nunca permitiria que o mal me atingisse, conquanto que 
eu não perdesse a minha fé... (Faz uma pausa e uma expressão de crescente 
mal-estar se estende sobre o seu rosto. Passa a mão na testa como se tentasse 
afastar de seu espírito conturbado teias de aranha. Em tom vago e distante) 
Isso se passou no inverno do meu último ano de estudos. Depois, na 
primavera... aconteceu alguma coisa comigo... Sim, agora eu me recordo... 
Apaixonei-me perdidamente por James Tyrone e durante algum tempo fui tão 
feliz...
(Olha fixamente diante de si, mergulhada no seu 
sonho triste. Tyrone se agita na cadeira. Jamie e 
Edmund permanecem imóveis.)
FIM
	LONGA JORNADA
	NOITE ADENTRO
	EUGENE O’NEILL
	UM LAR PROVISÓRIO
	UMA ÁRDUA JORNADA
	JAMIE TYRONE, seu primogênito
	CENÁRIOS
	ATO I
	CENÁRIO
	TYRONE
	MARY
	MARY
	MARY
	MARY
	MARY
	MARY
	MARY
	MARY
	MARY
	MARY
	MARY
	MARY
	JAMIE
	EDMUND
	MARY
	MARY
	MARY
	MARY
	MARY
	MARY
	Não! Não! Eu o fiz porque se você descobrisse que eu estava com febre e não conseguia conciliar o sono, ainda ia afligir-se e contrariar-se!
	MARY
	MARY
	MARY
	EDMUND
	MARY
	ATO II
	CENA 1
	CATHLEEN
	CATHLEEN
	CATHLEEN
	CATHLEEN
	CATHLEEN
	EDMUND
	EDMUND
	EDMUND
	JAMIE
	JAMIE
	MARY
	MARY
	MARY
	MARY
	MARY
	MARY
	CENA II
	MARY
	MARY
	Mais outra espetadela no braço!
	JAMIE
	E você, alguma vez rezou por mamãe?
	JAMIE
	JAMIE
	MARY
	MARY
	MARY
	MARY
	MARY
	MARY
	MARY
	MARY
	MARY
	MARY
	MARY
	FIM DO ATO II
	CENÁRIO
	CATHLEEN
	CATHLEEN
	CATHLEEN
	CATHLEEN
	CATHLEEN
	MARY
	MARY
	CATHLEEN
	MARY
	CATHLEEN
	CATHLEEN
	CATHLEEN
	CATHLEEN
	CATHLEEN
	MARY
	MARY
	MARY
	MARY
	MARY
	MARY
	MARY
	MARY
	MARY
	FIM DO ATO III
	ATO IV
	CENÁRIO
	TYRONE
	EDMUND
	EDMUND
	TYRONE
	EDMUND
	EDMUND
	EDMUND
	EDMUND
	EDMUND
	Ora, deixe disso!
	JAMIE
	Minha mãe, oh! minha mãe
	Chegou Clarence, o pérfido, frívolo e perjuro Clarence
	MARY
	Mamãe, o que eu tenho não é um simples resfriado de verão! Estou tuberculoso!
	FIM

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