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■ ■ ■ ■ ■ ■ ■ ■ A autora deste livro e a EDITORA ROCA LTDA. empenharam seus melhores esforços para assegurar que as informações e os procedimentos apresentados no texto estejam em acordo com os padrões aceitos à época da publicação, e todos os dados foram atualizados pela autora até a data da entrega dos originais à editora. Entretanto, tendo em conta a evolução das ciências da saúde, as mudanças regulamentares governamentais e o constante fluxo de novas informações sobre terapêutica medicamentosa e reações adversas a fármacos, recomendamos enfaticamente que os leitores consultem sempre outras fontes fidedignas, de modo a se certificarem de que as informações contidas neste livro estão corretas e de que não houve alterações nas dosagens recomendadas ou na legislação regulamentadora.Adicionalmente, os leitores podem buscar por possíveis atualizações da obra em http://genio.grupogen.com.br. A autora e a editora se empenharam para citar adequadamente e dar o devido crédito a todos os detentores de direitos autorais de qualquer material utilizado neste livro, dispondose a possíveis acertos posteriores caso, inadvertida e involuntariamente, a identificação de algum deles tenha sido omitida. Direitos exclusivos para a língua portuguesa Copyright © 2014 pela EDITORA ROCA LTDA. Uma editora integrante do GEN | Grupo Editorial Nacional Rua Dona Brígida, 701 – Vila Mariana São Paulo – SP – CEP 04111081 Tel.: (11) 50800770 www.grupogen.com.br|editorial.saude@grupogen.com.br Reservados todos os direitos. É proibida a duplicação ou reprodução deste volume, no todo ou em parte, em quaisquer formas ou por quaisquer meios (eletrônico, mecânico, gravação, fotocópia, distribuição pela Internet ou outros), sem permissão, por escrito, da EDITORA ROCA LTDA. Capa: Bruno Sales Projeto gráfico: Editora Roca Produção Digital: Geethik Ficha catalográfica G333 Gestão de UAN | Um resgate do binômio : alimentação e nutrição / organização Denise Balchiunas. 1. ed. São Paulo : Roca, 2014. 304 p. : il. ; 24 cm. Inclui bibliografia e índice ISBN 9788541204071 1. Nutrição. 2. Saúde Aspectos nutricionais. 3. Hábitos alimentares. 4. Qualidade de vida. I. Balchiunas, Denise. 1307042 CDD: 613.2 CDU: 613.2 Colaboradores Adriana Garcia Peloggia de Castro Doutora em Nutrição em Saúde Pública pela Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo (USP). Mestre em Nutrição pela Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP). Docente dos cursos de graduação e pós graduação em Nutrição do Centro Universitário São Camilo (São Paulo). Alexandre Lopez Hernandez Engenheiro. Mestre em Gestão Integrada em Saúde do Trabalho e Meio Ambiente. Diretor responsável pela Unidade de Negócio de Sustentabilidade da Key Associados. Docente das disciplinas da área de Gestão de Responsabilidade Social no curso de pósgraduação do Centro Universitário São Camilo (São Paulo). Carina Pioli Nutricionista pelo Centro Universitário São Camilo. Especializada em Padrões Gastronômicos pela Universidade Anhembi Morumbi e em Nutrição Clínica Funcional pelo Centro Valéria Paschoal. Chef de Cozinha. Docente do curso de Nutrição e Gastronomia e Coordenadora do curso de Tecnologia em Gastronomia do Centro Universitário São Camilo (São Paulo). Clara Korukian Freiberg Nutricionista pela Universidade de Mogi das Cruzes. Licenciada em Nutrição e Dietética pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita (UNESP). Mestre em Nutrição Humana Aplicada pela Universidade de São Paulo (USP). Docente de graduação do curso de Nutrição e de pósgraduação do curso de Gestão de Unidades de Alimentação e Nutrição do Centro Universitário São Camilo (São Paulo) e Docente de graduação do curso de Nutrição da Universidade de Guarulhos (UnG). Daniel Henrique Bandoni Nutricionista. Doutor em Nutrição em Saúde Pública pela Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo (USP) e Professor Adjunto do Instituto de Saúde e Sociedade da Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP). Déborah Fassina Nutricionista pela Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo (USP). Pósgraduada em Dinâmica da Segurança Higiênica e Tecnológica dos Alimentos pelo Instituto Brasileiro de Pósgraduação e Educação Continuada (INBRAPEC) e PróAlimento. Diogenes Carvalho Lima Diretor Executivo. Graduado em Administração de Empresas pela Faculdade de Administração Luzwell. Especializado em Administração Financeira pela Fundação Escola de Comércio Alvares Penteado (FECAP) e em Gestão de Recursos Humanos e Didática do Ensino Superior pela Universidade Mackenzie. Fabiana Poltronieri Doutora em Ciência dos Alimentos pela Faculdade de Ciências Farmacêuticas da Universidade de São Paulo (USP). Nutricionista pela Universidade Federal de Santa Catarina. Docente de graduação e pósgraduação do Centro Universitário São Camilo (São Paulo). Heide Landi Advogada. Doutora em Direito do Consumidor e Mestre em Direitos Difusos e Coletivos pela Universidade Metropolitana de Santos. Docente de cursos de graduação e pósgraduação do Centro Universitário São Camilo (São Paulo) e da Fundação Instituto de Administração (FIA). Liliana Paula Bricarello Nutricionista. Mestre em Ciências Aplicadas à Cardiologia pela Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP). Especializada em Bioética e Pastoral da Saúde pelo Centro Universitário São Camilo (São Paulo), em Nutrição em Cardiologia pela Sociedade de Cardiologia do Estado de São Paulo (SOCESP) e em Distúrbios Metabólicos e Risco Cardiovascular pelo Centro de Extensão Universitária (CEU). Docente de graduação e pósgraduação do curso de Nutrição do Centro Universitário São Camilo (São Paulo). Luis Hernan Contreras Pinochet Doutor em Administração de Empresas pela Escola de Administração de Empresas de São Paulo da Fundação Getulio Vargas. Mestre em Administração pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná. Especializado em Tecnologia daInformação pela FAE Business School (Paraná). Bacharel em Informática pela Universidade Positivo (Paraná). Professor Adjunto do Departamento de Administração da Escola Paulista de Política, Economia e Negócios (EPPEN) da Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP). Maria Cristina Rubim Camargo Nutricionista. Especializada em Administração pela Fundação Getulio Vargas e Mestre em Administração de Empresas pela Universidade Presbiteriana Mackenzie. Docente de graduação do curso de Nutrição e Coordenadora do curso de especialização em Gestão de Unidades de Alimentação e Nutrição do Centro Universitário São Camilo (São Paulo) Patricia Constante Jaime Nutricionista. Doutora em Saúde Pública pela Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo (USP) e Professora Associada do Departamento de Nutrição da Faculdade de Saúde Pública da USP. Rosana Freire Mestre em Administração de Empresas pela Universidade Metodista de São Paulo. Especializada em Gastronomia pela Universidade Anhembi Morumbi e em Gestão de Negócios em Hotelaria pela Fundação Armando Alvares Penteado. Docente de graduação da disciplina Técnica Dietética no curso de Nutrição no Centro Universitário São Camilo. Docente de pósgraduação da disciplina Gastronomia Hospitalar no curso de Nutrição Clínica no Instituto de Metabolismo e Nutrição (IMeN). Rosana Toscano Ferreira Nutricionista pela Universidade de Mogi das Cruzes (UMC). Licenciatura Plena pela Faculdade de Tecnologia de São Paulo (FATEC). Especializada em Homeopatia pela Universidade de Ribeirão Preto (UNAERP). Mestre em Nutrição Humana Aplicada pela Universidade de São Paulo (USP). Docente de graduação em Nutrição e de pós graduação em Gestão de Unidades de Alimentaçãoe Nutrição do Centro Universitário São Camilo (São Paulo). Docente do curso de graduação de Nutrição da Universidade Guarulhos (UnG). Sílvia Martinez Nutricionista. Mestre em Administração com ênfase em Gestão de Negócios e Marketing pela Universidade Metodista de São Paulo. Docente de graduação, pósgraduação e MBA em Marketing e Gestão de Negócios no Centro Universitário São Camilo (São Paulo). Consultora Estratégica de Marketing e Agronegócios. Sonia Maria Soares Rodrigues Pereira Mestre em Comunicação pela Universidade Mackenzie. Pósgraduada em Psicopedagogia pela Universidade Paulista (UNIP). Socióloga pela Fundação de Santo André. Docente de graduação e pósgraduação do Centro Universitário São Camilo (São Paulo). Prefácio É uma grata satisfação prefaciar este livro que aborda questões tão primordiais para o nutricionistagestor do século XXI. Ao refletir sobre a evolução da atuação do nutricionista – nossa profissão regulamentada há 47 anos no Brasil – pude perceber a importância deste livro. Para sua elaboração, professores e especialistas da área pensaram, com as habilidades e competências de um gestor, as diversas facetas da atuação desse profissional em unidades produtoras de refeições, comprometido que é com a saúde e a seguridade do alimento. Os capítulos abordam temas fundamentais para o aprimoramento do nutricionistagestor. Questões da área de microbiologia, de manipulação de alimentos, de legislação, de gastronomia e de promoção da saúde são abordadas do ponto de vista desse gestor, que é também comprometido com o planejamento e a sustentabilidade de suas atividades. Recomendo este livro não somente a nutricionistas, mas a todos os que buscam a excelência junto com informações práticas e aplicáveis à rotina diária de unidades produtoras de refeições. Parabenizo a querida professora Denise Balchiunas pela iniciativa. A escolha criteriosa de seus autores/colaboradores, que desenvolveram com excelência esses temas, foi sua grande iniciativa para fazer desta obra uma referência para a gestão de unidades produtoras de refeições. Andrea Polo Galante Apresentação Nos meus 29 anos de formação como nutricionista, tive a grata satisfação de conviver com muitos cenários institucionais e colegas de trabalho, que pautaram seus ideais na ciência da Nutrição, a qual traz no seu bojo a relação homemalimento como objeto de estudo, e por objeto de trabalho a alimentação e a nutrição. Vivenciei também momentos com outros profissionais de tantas outras áreas que acrescentaram não só indicadores para uma boa gestão, mas principalmente experiências de vida que muito me ajudaram a incorporar, de maneira mais profunda, os processos e decisões mais assertivos para um bom gerenciamento de unidade produtora de refeições. O importante de tudo isso foi compreender, humildemente, que saber que não sabemos nada nos impulsiona a descobrir o desconhecido, encarar desafios, sempre buscando, por meio de muita sensibilidade emocional, respeito profissional, conhecimento técnico e educação continuada, as melhores decisões para obtenção de resultados profícuos e sustentáveis, imprescindíveis a todos os atores que compõem a organização. Sendo assim, esta obra reflete, além da minha trajetória profissional enquanto gestora, docente de cursos técnicos, de graduação e pósgraduação, e coordenadora de curso de especialização em gestão de unidades de alimentação e nutrição, uma necessidade, sentida pelos profissionais, de retratar, de maneira simples e técnica, conhecimentos, habilidades e atitudes para o aprimoramento profissional do binômio nutricionistagestor em toda a sua amplitude de atuação e compromisso. Agradeço e parabenizo todos os colaboradores pelo competente trabalho desenvolvido, com o qual, com muita responsabilidade, comprometimento e dedicação, tornaram possível a concretização desta empreitada. Portanto, cabe a você, leitor, a tarefa de se deliciar e desvendar em sua totalidade as experiências e saberes que cada um desses renomados colaboradores lhe apresenta. Ótima leitura e sucesso a você, nutricionistagestor. Profa. MS. Denise Balchiunas Sumário Capítulo 1 Antropologia da Alimentação: Cultura e a Unidade de Alimentação e Nutrição Sonia Maria Soares Rodrigues Pereira Capítulo 2 Promoção da Saúde no Ambiente de Trabalho Adriana Garcia Peloggia de Castro, Daniel Henrique Bandoni e Patricia Constante Jaime Capítulo 3 Associação dos Fatores de Risco para Doenças Cardiovasculares com Qualidade de Vida entre Trabalhadores Clara Korukian Freiberg Capítulo 4 Planejamento Estratégico Maria Cristina Rubim Camargo Capítulo 5 Unidade de Alimentação e Nutrição e sua Interface com o Sistema Agroalimentar Sílvia Martinez Capítulo 6 Empreendedorismo Rosana Toscano Ferreira Capítulo 7 Integração de Sistemas de Gestão: A Questão da Gestão Ambiental e Responsabilidade Social Alexandre Lopez Hernandez Capítulo 8 Gestão Financeira Diogenes Carvalho Lima Capítulo 9 Gestão da Qualidade e Sistema de Certificação Maria Cristina Rubim Camargo Capítulo 10 Sistemas de Informação e Tendências na Gestão de Unidade de Alimentação e Nutrição Luis Hernan Contreras Pinochet Capítulo 11 Marketing em Serviços de Alimentação Sílvia Martinez Capítulo 12 Biossegurança Alimentar Liliana Paula Bricarello e Déborah Simone Fassina Capítulo 13 Alimentos Funcionais Fabiana Poltronieri Capítulo 14 Eventos e Serviços de Alimentação: Regras Gerais de Elaboração de Cardápios Carina Pioli e Rosana Freire Capítulo 15 Aspectos Legais da Responsabilidade Civil do Nutricionista Heide Landi Índice Alfabético A Antropologia da Alimentação: Cultura e Unidade de Alimentação e Nutrição Sonia Maria Soares Rodrigues Pereira alimentação é imprescindível para a sobrevivência humana, e, como é básica e vital, ela é também modelada, segundo Canesqui e Garcia,1pela cultura e sofre os efeitos da organização da sociedade. Desse modo, o ser humano, ao viver em grupo, organizase socialmente e constrói uma cultura carregada de simbologias, crenças, mitos e costumes alimentares.1 Isso indica que a maneira como comemos tem função estruturante para a organização social do grupo humano a que pertencemos e que somente o ser humano, de acordo com as suas necessidades de nutrientes encontrados nos produtos naturais, pode colocálos na forma de alimento, culturalmente construídos com a sua história, no seu meio e com as suas crenças, mitos e tabus. A cultura tornase, então, responsável pela seleção alimentar e pela imposição das normas que prescreve, proíbe ou permite o que comer, de acordo com Canesqui e Garcia.1 Para Gallian, em torno do ato de comer, os seres humanos, em inúmeras culturas e em todas as épocas, constituíram alguns dos procedimentos, rituais, imagens e símbolos mais fortes eeloquentes da História da humanidade.2 A partir desse ato fundamental, fruto da necessidade mais premente da vida, desenvolveramse práticas e costumes que muitas vezes fundam e dão identidade às diversas sociedades e tradições, o que possibilita traçar uma relação direta entre a essencialidade da vida individual e a essencialidade da vida coletiva ou da humanidade. A Antropologia da Alimentação exerce um papel importante para a sociedade, pois analisa os hábitos e concepções alimentares de diferentes grupos sociais, ajudando a entender todo o processo de transformação do ato alimentar e a perceber as consequências na alimentação atual. Portanto, as cozinhas e as artes culinárias dos povos primitivos continuam sendo temas de estudos da Antropologia, pois guardam histórias, tradições tecnológicas e procedimentos, entre outros elementoscontidos em sistemas socioeconômicos, ecológicos e culturais que possibilitam traçar a transformação do ato alimentar. No passado, a alimentação era demarcada geográfica e temporalmente, pois o alimento era pertinente à determinada região ou nação, determinando a divisão do tempo por meio da colheita e plantação repleto de simbologia; era responsável também pela interrupção do trabalho (refeição). O alimento estava presente nas festas religiosas, nas colheitas, no casamento, no batizado e em outras comemorações sempre como elemento principal do festejo. Era praxe enviar para o vizinho um pedaço de bolo ou partes do animal abatido, mantendo a sociabilidade do grupo. É desfeita recusar uma fatia de bolo oferecida nessas ocasiões, conforme afirma Corção.3 O bolo traduz uma mistura de elementos que, além de energéticos, significa a mistura de nossos sentimentos. Sua divisão simboliza a partilha de nossa vida. O primeiro pedaço, geralmente, é oferecido para a pessoa mais querida, o que às vezes causa embaraço. Comprovase, desse modo, que no comportamento alimentar de um indivíduo não existe apenas a busca pela satisfação das necessidades fisiológicas, podendose dizer que o comportamento alimentar engloba aspectos biológicos, cognitivos e afetivos. Diversos momentos da vida são marcados com alimentos, e o componente afetivo guia a escala de preferências e símbolos alimentares. Podese citar como exemplo disso a comida de ocasiões especiais, com a sua função utilitária e simbólica na demonstração de afeto, o ato de presentear pessoas com alimentos e os ritos de passagem, como batizados, aniversários, casamentos, formaturas e até funerais, segundo Canesqui e Garcia.1 Concluise que, de todos os atos naturais, o hábito da alimentação foi o único que o ser humano cercou de cerimonial e transformou, lentamente, em expressão de sociabilidade, ritual político e aparato de alta etiqueta. A alimentação tornase uma função simbólica de fraternidade, um rito de iniciação para a convivência familiar, entre outras coisas. As refeições propiciavam uma relação familiar. Criouse um ritual referente ao hábito de sentarse à mesa, envolvendo desde o local determinado para alguém sentarse até quem seria responsável por destrinchar a carne. E hoje, essa relação continua presente em todos os locais? As refeições são controladas pelas normas de um grupo, que ditam quem prepara ou serve o alimento, quem come junto ao grupo e quem limpa os pratos ao final do ato, a ordem dos pratos na refeição, a louça ou os talheres que devem ser usados e o comportamento à mesa. Essas relações são estabelecidas durante o curso da vida. Esse momento era respeitado por todos os familiares e não dependia da classe socioeconômica nem da atividade desempenhada pelos membros do grupo, demonstrando que as ocorrências alimentares estimulavam a sociabilidade e interrompiam a jornada de trabalho. Era a mulher que comandava a união ao redor da mesa, mas o homem era quem tinha mais privilégios. A mesa também demonstrava, por meio da louça e da prataria, a classe socioeconômica da família. Observase que a refeição era cercada de cerimonial, expressão de sociabilidade, ritual político e demonstração de etiqueta, ou seja, tratavase de um verdadeiro rito de iniciação para a convivência. Porém, com a urbanização do país, a entrada da mulher no mercado de trabalho e a crescente industrialização dos alimentos, valorizouse cada vez mais a praticidade e a redução do tempo para o preparo e o consumo dos alimentos. Essas transformações da sociedade, bem como a americanização dos costumes e a globalização, fizeram a alimentação adquirir uma nova dimensão e as famílias perderem sua essência, afastando as pessoas umas das outras. Assim, a refeição perdeu um pouco do seu caráter social e afetivo. A transformação dos costumes ocorreu em todo o planeta, em todas as sociedades e culturas e, ao se considerar os hábitos alimentares, outros costumes foram inseridos à mesa, não mais como um processo de aculturação, mas sim como massificação e padronização provenientes de um contexto político e econômico. Nesse contexto, a economia e a industrialização passam a exercer um papel importante, pela gama de produtos e apelo exercido, mostrando uma tendência à padronização nos diferentes segmentos sociais. Essa padronização tem como objetivo maior quantidade de vendas dos produtos industrializados: o que antes era artesanal, com características próprias, agora se torna produto comercializado em série; o que era peculiar a determinadas regiões tornase mundial; o que era ritual transformouse em praticidade e preocupação com o tempo. Os consumidores adquiriram a oportunidade de conhecer alimentos de regiões distantes e entrar em contato com culturas alimentares de outras partes do mundo. A cultura que era particular a determinados grupos tornase conhecida por meio das redes midiáticas. As últimas décadas do século XX foram marcadas por uma verdadeira revolução sociocultural, por um mundo mais integrado e globalizado, onde o impacto das revoluções culturais sobre as sociedades globais e a vida cotidiana local parece tão significativo e abrangente que justifica a afirmação de que a substantiva expansão da cultura que hoje vivenciamos não tem precedentes, como afirma Hall.4 Tal explosão cultural é atribuída a duas razões específicas. A primeira delas está relacionada às questões de conhecimento, uma vez que a cultura passou a ocupar posições mais relevantes nas ciências sociais. Segundo Du Gay, a cultura deixou de ser vista como um reflexo de outros processos – sejam econômicos ou políticos – e passou a ser considerada constitutiva do mundo.5 A segunda diz respeito à crescente importância de práticas culturais e institucionais em cada área de nossa vida social. Para Hall, são vários os fatores que integram essas duas razões. Entre eles está o avanço da tecnologia, principalmente no campo da informação, que tem modificado os meios de produção, circulação e troca cultural, conferindo à cultura papel central e constitutivo em todos os aspectos da vida social.4 De acordo com Yúdice, a globalização acelerou a transformação dos recursos, incluindo da cultura, usada a fim de melhorar aspectos sociopolíticos e econômicos.6 Ocorre uma espécie de inversão: investese na cultura não para promovêla, mas para obter vantagens, como, por exemplo, a difusão das marcas pela mídia. Ao mesmo tempo, a manutenção e a produção da cultura dependem desses investimentos. Kellner afirma que as narrativas e imagens produzidas e veiculadas pela mídia possibilitam a formação de uma cultura comum, ajudam a tecer a vida cotidiana, modelam opiniões, maneiras de pensar e comportamentos e fornecem parâmetros para as pessoas forjarem suas identidades.7 Atualmente, vivemos uma cultura comum, por intermédio da mídia, que é dominante e substitui os modos de cultura mais elevados (como foco de atenção e impacto para grande número de pessoas) e se caracteriza, entre outros fatores, por nos fornecer múltiplas e contínuas opções comuns de consumo. Dessa maneira, o mundo moderno, com a velocidade da comunicação, determina uma influência muito grande dos produtos intensamente ofertados pela produção massificada, que nem sempre são os mais indicados a uma alimentação saudável. Diante de tais transformações, o tempo e o espaço das refeições também mudaram, e a sociedade urbana industrial passou a realizar e valorizar as refeições rápidas feitas fora do espaço doméstico. É a quebra dos rituais que acompanhavam o ato alimentar. O que era um encontro familiar – sentaremse todosà mesa na hora do jantar e se deliciarem com a refeição em conjunto, um modo de marcar a união entre os membros de uma família – agora já não existe mais, e o tempo passou a ser o grande bem precioso. Portanto, para obterse refeições rápidas, passase a frequentar espaços públicos. A utilização de espaços públicos para vender lanches rápidos teve início nos EUA, no pósguerra. O modelo de produção em massa, ou o princípio fordista, ampliouse para diferentes tipos de produção, como o dojunkfood e o dos fastfoods. Com a globalização, o fastfood ganhou seu espaço e liderou a preferência pelos tipos de alimentação, conforme afirma Poulain.8 Essa preferência carregaria os aspectos que englobam o alimento. A relação de afeto que antes norteava a refeição nas trocas familiares e entre amigos hoje cede lugar a uma relação fria em que o companheiro do indivíduo é o aparelho de televisão, ou em que se come um sanduíche no intervalo de almoço, ou um pedaço de pizza, e se bebe um refrigerante, sozinho e de pé, no balcão de alguma lanchonete ou em outro espaço público. Não se valoriza mais o que se come, onde se come, com quem se compartilha o ato de comer. O desenvolvimento e a transformação cultural minimizaram a importância das refeições à mesa, assim como as atitudes e os sentimentos que se tem em relação à alimentação. Para suprir essa carência, o indivíduo passa a obter satisfação com a quantidade de comida ingerida. Uma das características desse modelo é o incentivo a comer mais. Essa tendência de comer além do que seria necessário induz a pensar que a sabedoria alimentar não tem conseguido acompanhar o desenvolvimento da sociedade moderna. Atualmente, os ascendentes números de obesos e de doenças emergentes, destacandose as doenças crônicas não transmissíveis (DCNT), passam a ser motivo de atenção, e os governos passam a repensar os hábitos alimentares da população. No Brasil, os hábitos alimentares que antigamente se assemelham aos hábitos dos franceses estão se aproximando cada vez mais dos modelos norteamericanos, embora, segundo Poulain, nos países pobres essas tendências de consumo estejam distribuídas diferentemente entre os segmentos de classes sociais de acordo com as possibilidades de acesso aos bens de consumo. No plano simbólico, os desejos, por si só, marcam uma inclinação a esse perfil alimentar, no qual prevalece a alimentação em espaços públicos.8 O Ministério da Saúde considera que o hábito de fazer refeições fora de casa esteja contribuindo para o aumento da prevalência de obesidade, pois tradicionalmente essas refeições costumam ser maiores e apresentar maior densidade energética e maior conteúdo de gordura total, gordura saturada, colesterol e sódio, segundo Lopes, Castro e Pereira.9Todas essas transformações fazem diferentes grupos começarem a refletir se está havendo ou não a perda da identidade nos hábitos alimentares. No Brasil, país de amplitude continental, o panorama alimentar é complexo e peculiar a cada região, traçado conforme a própria diversidade de condições históricas de apropriação e colonização. Portanto, seria um erro acreditar que as particularidades alimentares nacionais e regionais desaparecerão ou que estejam desaparecendo. Essas particularidades ainda são muito marcantes, pois, para teremse transformado em hábitos alimentares, elas foram eleitas, preferidas, selecionadas e processadas pela culinária regional. Na realidade, cada região brasileira tem uma característica, um toque particular no jeito de cozinhar, com seus cheiros, temperos, molhos e segredos culinários. Em geral, do Norte ao Sul do país consomese a mesma alimentação de antigamente, acrescida das heranças dos costumes e hábitos alimentares dos nossos colonizadores europeus, dos africanos e dos indígenas nativos. Também em todos os estados e cidades existem a mudança de valores, a grande quantidade de produtos ▶ ofertados pela produção massificada e a pressão exercida pelo setor produtivo, conforme já explanado. Portanto, quando se fala em refeição, temse sempre que retornar à formação da dieta alimentar do povo brasileiro considerando também sua diversidade regional, assim como o mercado de produtos industrializados e a mídia. Tudo isso conduz a uma mistura entre as especificações locais e as inovações culinárias, entrecruzandose, por um lado, os consumos, as práticas e os valores que permeiam a vida do indivíduo e, por outro, os discursos publicitários. Nessa discussão prevalece o medo da perda de identidade de um povo causada pela proliferação de fastfoods, selfservices e pela globalização da indústria alimentar. Também passa a ser foco dessas discussões no século XXI o resgate do passado, dos costumes, dos hábitos alimentares saudáveis e das tradições familiares. Discutese mercado e cliente e neste momento o protagonista é o trabalhador e o seu bemestar, sua qualidade de vida, sua motivação e satisfação. E como o nutricionista da Unidade de Alimentação e Nutrição (UAN) pode trabalhar para alcançar tais objetivos? É possível aos trabalhadores atingir melhor qualidade de vida? Cultura alimentar e qualidade de vida A qualidade de vida no trabalho é um fator importante a ser considerado durante o desenvolvimento das atividades de uma organização. É a partir do desempenho do trabalhador que as tarefas são realizadas, sendo indispensável que os funcionários estejam bem. Para um bom desenvolvimento da qualidade de vida, um dos passos a serem incentivados é o do bemestar alimentar. Por ele pelo qual passam os cuidados com uma alimentação correta em um local agradável e satisfatório, como citado por Isosaki et al.10 Já se analisou que a comensalidade contemporânea se caracteriza pela escassez de tempo para preparo e consumo de alimentos, pela presença de produtos gerados com novas técnicas de conservação e preparo, pelo vasto leque de itens alimentares, pelos deslocamentos das refeições de casa para estabelecimentos que comercializam alimentos, pelo arsenal publicitário, pela flexibilização de horários para comer agregada à diversidade de alimentos e pela crescente individualização dos rituais alimentares. Confirmase, dessa maneira, a mudança nos hábitos do povo brasileiro e, ao mesmo tempo, a existência de grupos que passam a olhar os dias de ontem com saudosismo, vendo nele mais qualidade de vida. Observase, na população em geral, desde outros tempos, a supervalorização dos alimentos de origem animal, principalmente a da carne e a da chamada mistura, e a pouca ênfase dada ao consumo de carboidratos e suas fontes alimentares. O brasileiro não tem o hábito de comer frutas, verduras e legumes; pelo contrário, prefere o arroz e feijão, que permeia todas as classes sociais, mesmo que seu consumo tenha diminuído nos últimos tempos. Um fato notório é a atual redução na quantidade consumida e na participação percentual das despesas de alimentação com o arroz e o feijão, uma vez que esses alimentos sempre foram considerados pratobase na mesa do brasileiro. Como era de se esperar, são nesses produtos que se verifica o menor diferencial de consumo entre os estratos de renda, pois eles estão presentes à mesa de todas as classes sociais. A pequena redução no consumo per capitadevese à substituição do arroz por outras fontes de calorias (principalmente as massas) e à inadequação do modo tradicional de aquisição do feijão às condições urbanas de vida e à crescente participação das mulheres no mercado de trabalho, como afirma Maluf.11Interessante notar que o arroz e feijão,apesar da diminuição do seu consumo e de conter os elementos saudáveis para uma boa dieta, faz parte da mesa de todas as classes sociais, permanecendo popular ao longo do tempo. Além disso, estudos mostram que o consumo tradicional à base de arroz e feijão seria um fator protetor contra a obesidade. Isso pode estar associado à prevenção à obesidade em função do seu baixo índice glicêmico. Dados recentes, conforme apontam LevyCostaet al., mostram a modificação dos hábitos alimentares associados à obesidade, como, por exemplo, o aumento do teor de gordura, o alto teor de açúcar e a diminuição do consumo de feijão e grãos, assim como um consumo modesto de frutas e verduras.12 Para Nunes et al., a obesidade é definida como uma doença multifatorial, devido aos fatores genéticos que possuem ação permissiva para os fatores ambientais, como inatividade física e má alimentação, e aos fatores psicológicos, psicossociais e culturais.13 É a manifestação clara de um estilo de vida sedentário, de mudança nos hábitos condicionados e de aumento de atividades que não causam gasto calórico, como assistir à televisão, jogarvideogames e usar computadores. Tudo isso, além de facilitar a obesidade devido ao elevado consumo de alimentos ricos em gordura e com alto valor calórico, atitude cada vez mais identificada entre a população atual, cria condições de carências nutricionais, o que faz as recomendações propostas de micronutrientes e macronutrientes não serem alcançadas, como indicam Albuquerque e Monteiro.14 ▶ De acordo com os dados discutidos, observase a intrínseca relação entre a transferência dos hábitos alimentares, após a industrialização dos alimentos, o aumento do uso da tecnologia e a sua crescente influência no índice de massa corporal (IMC). Com um mundo mais integrado e globalizado, além de as mulheres ocuparem seu lugar no mercado, as últimas décadas do século XX foram marcadas por uma verdadeira revolução cultural. Essa revolução ocorreu em todos os campos e hoje refletimos os benefícios e também os malefícios causados por tal processo, entre eles a mudança dos hábitos alimentares. Considerandose toda essa discussão, vêse que o problema, de fato, também afeta os trabalhadores, e, então, surge o questionamento: qual seria o papel da UAN diante do problema exposto? UAN e cultura alimentar A UAN é responsável pelo desenvolvimento de todas as atividades técnicas e administrativas necessárias para a produção de refeições, até a sua distribuição para a coletividade. O objetivo de uma UAN é fornecer refeições equilibradas nutricionalmente, produzidas preferencialmente sob supervisão técnica de um profissional da saúde, o nutricionista, visando a promoção da saúde dos usuários. Observase como é crescente, em todo o mundo, a preocupação das empresas com a promoção da saúde entre seus funcionários. Assim, investem em análise criteriosa e preventiva das condições de saúde dos trabalhadores, detectando os problemas nutricionais no seu estágio inicial e tratandoos para proporcionar, então, melhores condições de trabalho e, consequentemente, de vida aos funcionários. Os problemas nutricionais estão diretamente relacionados aos problemas do século, conforme discutido anteriormente, já que nem sempre estão de acordo com a proposta de uma alimentação saudável, além de também estarem associados à falta do hábito de consumo de determinados alimentos importantes no contexto nutricional. O local de trabalho pode ser destacado como espaço para a implantação de ações que estimulem mudanças nos hábitos alimentares. Portanto, a saúde do trabalhador também deve ser evidenciada por ações educativas em Nutrição. Os usuários de restaurantes coletivos poderiam adquirir hábitos alimentares mais adequados, por exemplo, pela oferta de alimentação apropriada e por ações de educação alimentar.10 O papel da educação nutricional está vinculado à produção de informações que sirvam como subsídios para auxiliar a tomada de decisões por parte dos indivíduos. Em se tratando de UAN, é importante que o nutricionista desempenhe o papel de educador tanto para os seus funcionários como para os seus clientes, além de oferecer também uma refeição que atenda às exigências sanitárias e nutricionais estabelecidas. Entre as funções do nutricionista destacase o planejamento de cardápios, com os quais, além das recomendações nutricionais, se propõe estudar o perfil do cliente de acordo com aspectos culturais. Outra função da UAN que necessita ser destacada é a de pesquisa sobre a melhoria da qualidade e objetivos da unidade. Para que haja uma alimentação adequada, existe a necessidade de conduzirse os comensais a uma avaliação constante do que se oferece e do se come e de ofertarse a oportunidade de resgate da sua culinária, valorizando o alimento caseiro, o momento da refeição com os colegas de trabalho, e escolhendo os alimentos e as inovações industrializadas que podem ser consumidas em menor escala, acarretando melhor qualidade de vida e maior valorização das diversidades. Aqui está a nutrição e acultura, ou mais precisamente aAntropologia da Alimentação com foco nas UAN. Portanto, a indústria de alimentos está presente não só na mudança de hábitos, como também vive um grande crescimento neste século, o que torna imprescindível a criação de um diferencial competitivo nas empresas por meio da melhoria da qualidade dos produtos e serviços oferecidos. As organizações estão descobrindo que precisam agir de modo diferente para sobreviver à competitividade que caracteriza o mercado atual. Segundo dados da Associação Brasileira de Empresas de Refeições Coletivas (ABERC), a realização de refeições fora de casa pelo brasileiro apresentou forte tendência de elevação nas últimas décadas. Em 2009, o mercado de refeições coletivas servia 13,68 milhões de refeições por dia, 6,18 milhões a mais que em 1998. Dessas, 8,5 milhões foram oferecidas por empresas prestadoras de serviço em UAN. De acordo com a mesma fonte, em 2010, as UAN no Brasil foram responsáveis pelo fornecimento de 14,89 milhões de refeições por dia. O rendimento do trabalhador apresenta relação direta com seu estado nutricional, que também auxilia o aumento da produtividade. Também não se pode ignorar que a refeição deve estar de acordo com os hábitos alimentares do trabalhador, ser segura do ponto de vista da higiene e ajustada à disponibilidade financeira do consumidor da UAN e da empresa. ▶Aspectos culturais e educação alimentar na UAN É importante que o nutricionista consiga associar saberes e práticas que potencializem seu papel de agente de promoção da saúde coletiva, tendo como base o entendimento da dimensão humana e não somente da orgânica, pois se trata de um processo biocultural. Assim, ele pode instigar o resgate da totalidade do ser humano ao trabalhar com a alimentação não apenas para nutrição do corpo, mas também para o sujeito biocultural. O alimento é carregado de simbolização, além dos nutrientes que o contemplam. Em todas as sociedades humanas, a comida é uma maneira de criar e expressar relações entre indivíduos. Quando o alimento é consumido em uma refeição coletiva, fica evidente a relação de cada indivíduo com os outros e com o mundo exterior. Então, as práticas alimentares indicam a história cultural e social do indivíduo e correspondem a procedimentos desde a escolha e a preparação até o consumo do alimento. A qualidade de vida envolve o ser cultural, os seus sentimentos e suas motivações, além de escolhas assertivasna refeição enquanto composição de prato. Quando se fala do papel de educador, também é necessário ter o olhar voltado para as questões culturais e do perfil de cada indivíduo. Para isso, não convém simplesmente lançar um programa para a redução do consumo de carne por meio de cartazes e panfletos, que até podem chamar a atenção do comensal, e sim, segundo Fagioli e Nasser, divulgar atividades mais dinâmicas, como reuniões em grupos, exibição de vídeos e participação em jogos, que despertam o interesse e motivam o comensal a mudar seus hábitos.15Fazendo uma pesquisa com questionários, e conhecendo um pouco mais dos costumes e da origem do trabalhador, as mudanças serão mais fáceis de realizar. A interação e o diálogo permeiam a construção do conhecimento que sedimenta a educação nutricional. Em algumas situações, por exemplo em uma grande indústria, na qual produção não pode parar, nem sempre existe a possibilidade de reunir grupos para atividades mais dinâmicas, e nem local apropriado para tanto. Nessa situação, em uma pesquisa sobre a proposta de mudar a quantidade de consumo de carne, verificouse como ponto negativo a não ocorrência de nenhum evento de integração dos funcionários durante o decorrer da pesquisa, o que corrobora as ideias de Fagioli e Nasser, que defendem a utilização de técnicas mais diretas.15,16 Nessa pesquisa foram utilizados cartazes com linguagem acessível e cores que se destacavam para a transmissão de informações. Percebeuse que elas não despertaram o interesse dos comensais em modificar o consumo excessivo de carnes. Ainda se comprovou que as preferências pessoais, as intolerâncias, as atitudes, as crenças e as influências sociais, que também constituem o hábito alimentar do indivíduo, também influenciaram na eficácia das atividades, conforme asseguram Oliveira e Alves.16 Os resultados de pesquisas sobre costumes e hábitos alimentares são muito interessantes, pois comprovam a prevalência da cultura regional e étnica ao longo do tempo, por exemplo, o papel da farinha nos hábitos alimentares de determinadas regiões, assim como comer arroz e feijão acompanhados de banana, apesar de toda a influência da cultura midiática. É interessante esse resgate da alimentação tradicional – em que se fala da batatadoce, do pinhão, da mandioca, entre outros inúmeros alimentos –, que pode integrar a UAN, não somente partindo da observação dos hábitos dos comensais, mas também partindo da História, na busca por uma alimentação mais saudável. Não se pretende fazer uma apologia aos costumes locais, principalmente porque existe uma gama de crenças, mitos e tabus que nem sempre contribuem para a construção de uma alimentação saudável. Afirmase, sim, a necessidade de se conhecer os comensais e seus hábitos, costumes e tradições, que foram construídos ao longo da sua história, para que se possam realizar intervenções adequadas. Isso é cultural, assim como as crenças, os mitos, os tabus e as escolhas alimentares, como citado em Vieira.17 É muito comum ouvir dos alunos de pósgraduação em UAN que já atuam na área que a proximidade do trabalhador na hora da escolha dos ingredientes que comporão seu prato torna suas escolhas muito mais eficazes. O trabalhador tem dúvidas, tem necessidade de conhecer suas escolhas, assim como tem necessidade de falar, comentar, pedir. No transcorrer deste capitulo falouse sobre a carência deixada pela falta dos rituais nas refeições, da socialização e do contato com a família. O sentimento de pertencimento, que também é relatado pelo nutricionista de UAN, aflora quando o trabalhador solicita um prato da sua terra, inclusive se comprometendo a trazer a receita, ou então diz que o cheiro de certo prato lembra sua infância, sua terra. O olfato é carregado de memória, assim como o paladar. Um fragmento do romance Em Busca do Tempo Perdido, de Proust, leva à reflexão de que o entendimento da realidade a partir do desenvolvimento da Psicanálise e da Psicologia ultrapassa o que o ser humano é capaz de perceber concretamente. A realidade, nesse contexto, é percebida como resultado das relações entre experiências e ▶ memórias e das sensações reconhecidas pelos sentidos humanos. É muito comum também o agradecimento ao nutricionista da UAN quando algo é feito com características locais. Hoje, discutese muito a necessidade da diversidade, e, para que se cumpram as funções de obterse uma melhor qualidade de vida, a pesquisa sobre características alimentares das regiões de onde os funcionários vieram é ponto fundamental. Não se fala aqui de uma festa regional brasileira, mas sim da adequação alimentar de acordo com a realidade dos trabalhadores, objetivando motivação, sentimento de pertencimento e, principalmente, o sentir se olhado, presente e valorizado no contexto do trabalho, visto que é na empresa o lugar onde o indivíduo passa a maior parte de seu tempo. Quando se almeja maior eficácia na educação alimentar, é muito importante pensar nas possíveis substituições, e não somente nas proibições alimentares. Pesquisar os desejos, as crenças, os hábitos alimentares dos comensais tende a trazer possibilidades de interação e intervenção na construção de hábitos mais saudáveis. Desde as primeiras civilizações, a luta pela sobrevivência obrigou os indivíduos a produzirem seus próprios regimes alimentares, acumulando ao longo do tempo um imenso cabedal empírico na interação com o meio ambiente, o que originou crenças e hábitos ligados à alimentação.17 Portanto, percebese a grande necessidade de se conhecer os comensais por intermédio de instrumentos de pesquisa rápidos, eficientes e com baixo custo, como é o caso do questionário. A comunicação adquiriu relevância diferenciada com a reestruturação produtiva, uma vez que todo o processo de trabalho deve ocorrer de maneira mais ágil, atendendo à velocidade das mudanças que se impõem às organizações. Em vez das informações grandemente filtradas que predominavam nos moldes do taylorismo, é fundamental que as ações se tornem cada vez mais comuns, de modo que sugestões, críticas e conflitos sejam apreciados pela organização para melhorar a qualidade dos seus produtos e serviços, aumentar a produtividade e atender adequadamente a clientela. A clientela em questão precisa de melhor qualidade de vida, focando escolhas adequadas e disponibilização de alimentos que ofereçam prazer e nutrição num ambiente de socialização e crescimento constante, com intervenções baseadas em pesquisas socioculturais. Crenças, mitos e tabus alimentares Existe uma influência muito forte da mídia da indústria alimentar sobre os indivíduos. Essa mídia tenta vender a homogeneização do gosto e do paladar. Por outro lado, crenças, mitos, tabus e hábitos são construídos ao longo da vida das pessoas e ficam enraizados. Portanto, o hábito alimentar é difícil de modificar, porque depende de fatores como cultura e condição socioeconômica. Necessitase de tempo e motivação interna para que as informações sejam percebidas como importantes e possam alterar os hábitos alimentares para que contribuam para melhor qualidade de vida do públicoalvo, visando ao benefício do organismo e à prevenção de doenças. O ato de alimentar inserese numa ordem cultural que se expressa no sistema de classificações alimentares e também em um conjunto de categorias, regras, prescrições, crenças, mitos e tabus. Para Collière, as crenças podem ser consideradas como um tipo de conhecimento, interiorizado a partir de hábitos de vida que representam um conjunto de maneiras de atuar, provocando modos de ser que possibilitam assegurar a continuidade da vida.18 Segundo o mesmo autor, crença é um costume a que um grupo aderiu e se baseia nanoção de bem e de mal, partindo da interpretação simbólica de uma maneira de fazer e de ser.18 Por outro lado, Gouveia afirma que algumas crenças consideram como suposta ação prejudicial a ingestão ou a mistura de certos alimentos, o que poderia causar prejuízos para o organismo do ser humano; entretanto, outras crenças podem mostrar relação positiva com os alimentos, afirmando seus benefícios para a saúde.19 Temos muitos exemplos, na nossa cultura, de alimentos que fazem mal se comidos à noite e fazem bem se comidos pela manhã, bem como de uma série de alimentos adequados para o período da gestação e da amamentação e para festas e rituais. Existem ainda alimentos “proibidos”, não sendo permitida a sua ingestão por constituirem tabus. Conforme Colding e Folke e Bynum, os tabus alimentares podem apresentar efeitos permanentes e, em geral, associamse a aspectos sociais e religiosos. Tabus temporários são limitados a certos períodos importantes dos ciclos de vida, em geral gravidez, menstruação e lactação.20,21 Para Castro, tabu é uma interdição, uma proibição categórica sem uma explicação racional.22 Interdição não é ordenada por ninguém, mas parece ser constituída por si mesma, sem nenhum fundamento nem insinuação de lógica. Existem muitos tabus em torno da alimentação, definidos como o que é proibido por crenças no sobrenatural. Nossa cultura é permeada por mitos alimentares, informações passadas de geração a geração pela tradição oral ▶ ou até mesmo por propagandas televisivas ou divulgados por mídias auditivas e escritas. Por exemplo, o trabalhador pode acreditar no emagrecimento a partir da redução da quantidade de refeições, vindo a desprezar uma refeição importante, o que causará a ele males à saúde e consequente diminuição da qualidade de vida no trabalho. Existem inúmeros mitos que se tornaram vivos ao longo da história e da cultura, como, por exemplo, “leite com manga faz mal”. Segundo Takushi et al., essa afirmação não corresponde com a realidade, visto que a combinação de manga com leite é muito saudável, pois a manga é rica em vitaminas e minerais, e o leite, em proteínas e vitaminas, formando, assim, uma “bela dupla”, sem que exista restrição formal para essa combinação.23 Vêse, então, que os mitos e o cientificismo não andam sempre juntos. Esses elementos culturais estão diretamente relacionados aos comensais, que nem sempre estão de acordo com a proposta de uma alimentação saudável, além da falta do hábito de determinados alimentos importantes no contexto nutricional e prescrições que permeiam a formação social e cultural do brasileiro. Há também as prescrições trazidas pelo homem do campo em relação às verduras e legumes, que não “enchem barriga”, à necessidade de quantidade e à “mistura” (carne) para poder ter força para o trabalho. O caráter simbólico do alimento diferenciase de acordo com a idade, situação social e outras variáveis. Em todas as faixas etárias encontrase uma alimentação entendida como apropriada, variando a adequação quanto ao gênero e a papéis sociais. Existe, portanto, um processo de socialização que procura mostrar o comportamento alimentar mais apropriado a diferentes segmentos da sociedade. A responsável pela transmissão da cultura é a linguagem, é a comunicação, e ela não se faz unicamente pela mídia, como foi discutido no início do capítulo. Fazse também pela transmissão oral, efetivada no grupo do qual o indivíduo faz parte. Uma pesquisa de campo com universitários concluiu que grande parte dos entrevistados apresentou mitos, tabus e crenças sobre a alimentação aos pesquisadores, corroborando ideia de que a escolaridade não muda conceitos aprendidos bem cedo e de que o que se aprende está inserido em um corpo substantivo de materiais culturais historicamente derivados.9 Então, não é a escolaridade ou a classe econômica que determina a existência de crenças, mitos e tabus. Citando Ramalho e Saunders, em uma sociedade, a proibição ou a prescrição de alimentos, segundo a teoria popular, repousa numa certa observação e experimentação, de maneira que, apesar de se diferenciarem dos modelos científicos oficiais, elas não devem ser simplesmente consideradas irracionais ou desprovidas de lógica e de consistência interna, mas devem ser captadas pela riqueza que contêm e vistas como possibilidades de encaminhamento de soluções para os problemas nutricionais.24 É necessário conhecer os comensais que fazem parte das UAN em seus aspectos culturais, pois muitas crenças permeiam a nossa história e mantêmse vivas, já que a cultura é transmitida de geração a geração. De acordo com Certeau, Giard e Mayol, os hábitos alimentares não podem ser entendidos como algo inerente ao ser humano, mas sim como hábitos adquiridos nas práticas culturais cotidianas de significação, presentes nas famílias, na mídia, nas escolas, nos grupos sociais, que ensinam paladares, sentimentos de prazer/desprazer, comportamentos e preocupações (ou não) com determinados alimentos.25 Confirmase, assim, a ideia já apresentada de que o conhecimento de crenças, hábitos e tabus dos comensais, organizado por meio de implantação de pesquisas, possibilita, com bases nos dados levantados, a criação de projetos de intervenção para a obtenção de uma alimentação mais saudável e maior qualidade de vida. Concluise, portanto, que intervenções nos hábitos alimentares terão mais sucesso se houver um conhecimento prévio da cultura alimentar dos comensais, pois desse modo se tem mais conteúdo para ser criada a intervenção, que pode ser individual ou grupal, dependendo dos objetivos. Considerações finais Observase que no último século, mais precisamente a partir da década de 1970, ocorreu a transformação mais profunda da História da alimentação humana, transferindo todo o processo que caracteriza a produção dos alimentos para as fábricas, alterando toda uma estrutura artesanal e, com ela, toda uma simbologia.1E como agir frente a todas essas modificações? Elas são totalmente saudáveis? Conforme discutido, hoje existe uma tendência muito grande à homogeneização do consumo, influenciada pela mídia, entre outros fatores. Persevera também, ao longo do tempo, certa desigualdade alimentar, na qual se observa um consumo diferencial de determinados alimentos. Crenças, tabus e mitos também são identificados e não são mais unicamente provenientes de seus grupos, pois ▶ 1. 2. 3. 4. 5. 6. 7. 8. existem mitos, hoje, que são transmitidos pela mídia. Surgem ofertas personalizadas, novos estilos de vida e a individualização alimentar. A industrialização e a globalização trouxeram transformações positivas e negativas, pois o acesso a produtos antes característicos de determinados grupos socioeconômicos foi ampliado de maneira mais abrangente. Do mesmo modo, produtos antes característicos de uma única região, devido à ampliação das redes de transportes e à tecnologia, são comercializados em toda parte, e até a sazonalidade dos alimentos deixou de ser natural, tornando a alimentação mais diversificada. Contudo, notase o impacto da preocupação com a saúde decorrente de escolhas alimentares adequadas e da quantidade ingerida, da individualidade que cresce, persistindo a desigualdade de acesso a determinados tipos de comida e a eleição de alimentos que carreguem uma bagagem sociocultural, o que condiciona certos estilos alimentares. Na sociedade industrializada, a relativa oportunidade de escolhas, assim como a sua acessibilidade, pode estar associada a problemas de saúde. Isso ocorre com quem não atinge suas necessidades nutricionais e também com aqueles que se excedem,principalmente no consumo de gorduras saturadas. Todo o trabalho do nutricionista da UAN deve ser baseado num grande projeto, que culminará com a conscientização do trabalhador sobre suas escolhas alimentares. Para tanto é preciso conhecer o perfil sociocultural do trabalhador, para que a mediação e a intervenção alimentares obtenham maior sucesso. A educação alimentar ainda deve comportar o atendimento às mais diversas necessidades dos funcionários e aos cuidados com a alimentação, que não devem ser negligenciados, visto que são importantes para a construção de uma dieta adequada que, além de trazer os nutrientes necessários, colabore para a construção de seres humanos saudáveis.11 O processo de alimentação passa não apenas pelo simples ato de digerir: o alimento é carregado de simbolismo, de história e de tradições. Mesmo que os fatores socioeconômicos, culturais e antropológicos sejam levados em consideração, eles não devem se sobrepor aos nutricionais, que visam à prevenção e à manutenção da saúde do ser humano. A saúde é um ponto importante, e a alimentação, que pode ajudar no bom desempenho do trabalho, é fundamental para sua promoção deixando o funcionário orgulhoso da sua performance na execução das suas atividades. A fomentação da qualidade de vida do trabalhador será evidenciada pela alegria e pelo seu bemestar na empresa ao realizar as suas atividades. O nutricionista da UAN deverá incentivar o convívio entre os participantes de um setor, promovendo a socialização de ideias, festas regionais e comemorações. Assim, os trabalhadores não se sentirão em um mundo estranho, mas sim engajados, participantes da transformação do ambiente dentro da empresa, incluindo a própria percepção de qualidade de vida que pode surgir com os encontros e redes de informações visando alcançar aos objetivos propostos. A educação nutricional nas unidades de nutrição e dietética deve ser vista como um instrumento destinado a mudar os hábitos alimentares, incentivar um estilo de vida saudável e desmistificar conceitos inadequados sobre a alimentação, contribuindo para incentivar sujeitos críticos e conscientes da busca de melhor qualidade de vida. Referências bibliográficas CANESQUI, A. M.; GARCIA, R. W. D. (org.). Antropologiae nutrição: um diálogo possível. Rio de Janeiro: Fiocruz, 2005. 306p. (Coleção Antropologia e Saúde) GALLIAN, D. M. C. A desumanização do comer. Estud. Av.,v. 21, n. 60, PP 179 – 184, 2007. Disponível em <www.scielo.org>. Acesso em: 20 set. 2007. CORÇÃO, M. 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Os indivíduos e grupos devem saber identificar aspirações, satisfazer necessidades e modificar favoravelmente o meio ambiente. A saúde deve ser vista como um recurso para a vida e não como um objeto de viver.1 Esse documento amplia o conceito de saúde, estabelecendo que ela seja fruto da alimentação, educação, moradia, renda, entre outros atributos, e define cinco áreas prioritárias: políticas públicas saudáveis, reforço à ação comunitária, desenvolvimento de habilidades, reorientação dos serviços de saúde e criação de ambientes saudáveis.1 Em relação ao ambiente, sua influência na promoção da saúde é percebida em três diferentes níveis: social, físico e macroambiental. O ambiente social referese ao espaço de relação do indivíduo com a família, com amigos, vizinhos e a comunidade. O macroambiente exerce uma influência mais distal sobre a saúde, abrangendo aspectos como meios de transporte, produção de alimentos, normas sociais, entre outros. O ambiente físico, que inclui locais como o de trabalho, escolas, supermercados, e outros, surge como um dos grandes cenários para estratégias de intervenção. No ambiente físico é possível acessar grandes grupos populacionais em espaços delimitados, criando oportunidades deescolhas saudáveis.2,3 Dentro desse contexto, os locais de trabalho são ambientes favoráveis para estratégias de promoção de saúde por diversos motivos. Em primeiro lugar, proporcionam acesso a um grande número de pessoas, e muitas delas não poderiam ser abordadas por outros meios. Em segundo, promovem acesso continuado, e assim programas de intervenção podem ser oferecidos aos indivíduos repetidamente. Em terceiro, o local de trabalho pode sofrer intervenções em diferentes níveis – individual, ambiental e organizacional, possibilitando a sustentação da mudança de comportamentos alimentares. Outro aspecto relevante é que um indivíduo adulto chega a passar um terço do seu dia no local de trabalho. Essa elevada taxa de contato propicia avaliações e intervenções continuadas, podendo levar a mudanças substanciais nos hábitos e comportamentos da população.4,5 Em decorrência dessas características, o local de trabalho é considerado propício às modificações de comportamento precursor de doenças, não apenas aquelas específicas da função ocupacional, mas também as relacionadas à dieta, atividade física e tabagismo.6,7 Isso tem causado interesse para a saúde pública, em parceria com empresas, pelo desenvolvimento de políticas de promoção da saúde nesse tipo de ambiente, em especial naqueles em que a necessidade de intervenção é maior, proporcionando mais impacto.8 A importância do ambiente de trabalho para prevenir doenças e promover saúde é reconhecida dentro da Estratégia Global para Promoção da Alimentação Saudável, Atividade Física e Saúde, da Organização Mundial da Saúde (OMS), que considera que as pessoas devem ter possibilidade de adotar decisões saudáveis no local de trabalho. Nesse ambiente, a promoção da saúde referese a estratégias deliberadas para melhorar comportamentos e resultados relacionados à saúde, que objetivam a redução do risco de doenças associadas. A abordagem desses programas pode ocorrer isoladamente ou de modo mais amplo. Alguns autores, recentemente, estão interessados em ações que proporcionem mais saúde, ou seja, que aumentem o número de casos de doenças prevenidas ou anos de vida ganhos.9 Se por um lado o conceito de promoção da saúde está se tornando cada vez mais relevante, tanto em instituições públicas como privadas, por outro, as ações de sucesso em um mercado globalizado valorizam a participação de uma força de trabalho saudável, tornando as empresas e organizações de trabalho aptas a competir no mercado, possibilitando um desenvolvimento social e econômico sustentável.10 A promoção de saúde no ambiente de trabalho pode ser definida como programas e políticas voltados para os trabalhadores e, em alguns casos, seus dependentes, para melhorar saúde e bemestar, incluindo aqueles que evitam a ocorrência ou a progressão de doenças e fatores de risco.11Os principais esforços de prevenção no local de trabalho geralmente são dirigidos para populações de trabalhadores sadios, oferecendo oportunidades para adoção de estilos de vida saudáveis. Exemplos de prevenção primária são programas de incentivo à prática de atividades físicas, à alimentação saudável, ao controle do peso, ao gerenciamento do estresse, ao consumo moderado de álcool, entre outros.11,12 As intervenções no ambiente de trabalho objetivando promover estilos de vida saudáveis devem ter como foco: redução das barreiras existentes nas mudanças ambientais; expansão das redes de parceiros nas empresas e comunidades; e fatores contextuais ligados ao comportamento. Além disso, são necessários mais estudos de promoção de saúde em locais de trabalho que realizem mudanças no ambiente e que tais estratégias sejam positivas na mudança de hábitos alimentares. Enquanto a educação e a informação têm apresentado um impacto limitado e, muitas vezes, com alto custo, as intervenções sobre as variáveis ambientais têm sido particularmente bem sucedidas.13,14 Uma pesquisa realizada no Canadá investigou o perfil de saúde e fatores de risco modificáveis de funcionários de empresas públicas, privadas e de saúde, e verificou que metade da amostra tinha de dois a quatro fatores de risco modificáveis (tabaco, sedentarismo, pressão alta e excesso de peso). Os trabalhadores do setor da saúde apresentaramse ligeiramente melhores, mas também necessitavam evoluir.15 Elaborouse uma pesquisa com empregados e empregadores a fim de saber a opinião desses grupos sobre programas de obesidade em empresas. A maioria dos indivíduos, em especial aqueles com maior nível econômico, de escolaridade e as mulheres, concordaram que a condução dos programas deve partir da empresa. Os empregadores acreditam ter um papel importante, porém acham que essa responsabilidade também é dos empregados, dos médicos e das seguradoras de saúde, bem como da indústria de alimentos. Nesse estudo, tanto empregados como empregadores apoiam a ideia de incentivar os funcionários a lidarem com seu peso. As grandes empresas parecem ter reconhecido isso e estão tentando desenvolver programas para administrar o problema.16 A obesidade aumenta as taxas de absenteísmo, assim como o presenteísmo, situação em que o funcionário está presente no trabalho e, em decorrência de não se sentir bem, mostra cinco comportamentos específicos: perda da concentração, repetição da tarefa, trabalho mais lento que o usual, fadiga e falta de produtividade; ou seja, diminuição da produtividade dos trabalhadores cujos problemas de saúde não necessariamente acarretaram absentismo. Em um estudo com empregados que trabalharam período integral, identificouse que, com exceção de homens com sobrepeso, as despesas médicas, absenteísmo e presenteísmo aumentaram com o incremento do Índice de Massa Corporal.17 A preocupação com o presenteísmo surgiu na década de 1990, como um grande desafio para manter os trabalhadores saudáveis e produtivos, devido ao número crescente de pessoas afetadas por condições crônicas de saúde e ao envelhecimento da população ativa, que é mais suscetível a essas condições. Os subsequentes aumentos dos gastos com os cuidados de saúde e a crescente consciência de perdas por presenteísmo estão aumentando mais a demanda por programas de promoção da saúde para os trabalhadores.18,19 Se inicialmente tais preocupações se concentravam nos países desenvolvidos, hoje os países em desenvolvimento, como o Brasil, já são intensamente afetados pelo envelhecimento da população e pela alta prevalência de doenças e agravos não transmissíveis. Estudo que investigou dados de funcionários obesos de empresas norteamericanas demonstrou que eles apresentaram maiores taxas de consultas médicas em ambulatórios e emergências, de hospitalizações e de absenteísmo e presenteísmo do que os empregados eutróficos. As ausências no trabalho não necessariamente geram custos aos empregadores, pois elas não são remuneradas e outros trabalhadores são capazes de “cobrir” os ausentes.20 Em compensação, o presenteísmo sempre apresenta um custo, já que o trabalhador está recebendo um salário integral, apesar da redução na produtividade.21 Muitos estudos realizados nesse ambiente têm encontrado resultados positivos para redução do tabagismo. As estratégias para abandono do tabagismo devem contar com a participação de outras pessoas, como amigos, familiares, colegas de trabalho e outros indivíduos que desejam que o fumante deixe de fumar. Essa abordagem mais ampla visa favorecer a redução de barreiras para escolhas saudáveis e pode incluir, em alguns casos, modificações ambientais, como, por exemplo, a de estrutura física.22,23 A OMS lançou o documentoInterventionson diet and physical activity: what works, uma compilação das evidências obtidas em estudos de intervenções no ambiente de trabalho, para promoção de alimentação saudável e prática de atividade física e concluiu que esse é um local propício para esses tipos de ações, principalmente as de modificações de ambiente, como alterações no padrão de cardápios oferecidos aos trabalhadores (aumentando as opções saudáveis e reduzindo o custo destas) e acesso a locais para prática de atividade física. Evidências de impacto mais consistentes derivam de intervenções multicomponentes e que envolvem a participação dos trabalhadores. Por fim, o documento aponta que quase todos os estudos de intervenção no ambiente de trabalho foram realizados na Europa ou na América do Norte e, assim, se fazem necessárias pesquisas em países em desenvolvimento.24 O local de trabalho proporciona um ambiente com recursos que podem incentivar e conscientizar os indivíduos sobre a importância da prática de atividade física a partir de programas de incentivo e apoio, influenciando um grande número de trabalhadores e suas respectivas famílias. A atividade física em locais de trabalho resulta em efeitos positivos para os trabalhadores, levando a melhorias significativas da saúde e diminuindo o absenteísmo e as licenças médicas, inclusive podendo causar retorno positivo ao empregador.25,26 Os empregadores que elaboram projetos de promoção da saúde no local de trabalho devem identificar um agente para atuar como líder de saúde ou de ligação da empresa, que possa dedicar o tempo necessário para construir relações de confiança com os parceiros, a fim de garantir o sucesso dos projetos. Essa pessoa é importante no sentido de facilitar comunicações, coleta de dados, apoio logístico no ambiente de trabalho, solução de problemas e influenciar as práticas de saúde.27 Diversos estudos vêm sendo conduzidos em diferentes locais de trabalho, com a participação de gestores, e eles podem contribuir para a efetividade das ações conduzidas nesses locais.2729 Thorsen et al. avaliaram, após 5 anos, a sustentabilidade da intervenção denominada 6 a Day Worksite Canteen Model Study, que incentivou o consumo de frutas e hortaliças em ambiente de trabalho. A principal conclusão do estudo a longo prazo foi que, em geral, as cantinas que participaram do programa, mesmo ao término da pesquisa, mantiveram instituídas as alterações alimentares. Os autores comentaram que entre as cinco razões que contribuíram para a sustentabilidade dessa intervenção está a participação dos gestores.30 Considerase que a presença de um gestor em locais de produção de refeição pode contribuir para a oferta de um padrão de consumo alimentar adequado. Deve ocorrer também a participação de gestores públicos orientando e fiscalizando políticas públicas que estabeleçam parâmetros que visem à alimentação saudável.31 Muitos fatores demonstram que os locais de trabalho podem ser bons ambientes para vários tipos de intervenção entre eles, os que se referem à promoção de alimentação saudável. No Brasil, existe uma política de alimentação criada para beneficiar o trabalhador, o Programa de Alimentação do Trabalhador (PAT), que se consolidou como um dos maiores programas sociais do Governo Federal e que existe desde 1976. Seu objetivo é melhorar a condição nutricional dos trabalhadores, repercutindo positivamente na qualidade de vida, na redução de acidentes de trabalho e no aumento da produtividade dos indivíduos, beneficiando, por meio da alimentação, especialmente os trabalhadores de baixa renda, uma vez que a concessão não pode ser em espécie. Um dos grandes avanços do PAT foi a revisão das exigências nutricionais, em 2006. Se anteriormente elas eram restritas às recomendações de calorias e proteínas, inadequadas ao perfil epidemiológico e nutricional atual da população adulta brasileira, as exigências agora contemplam outros nutrientes, como gorduras, gorduras saturadas, sódio e fibras. Além disso, contemplam também recomendações específicas para a oferta de frutas e hortaliças, estabelecendo que os cardápios das empresas beneficiárias devam oferecer pelo menos uma porção de frutas e uma porção de hortaliças nas refeições principais (almoço, jantar e ceia) e pelo menos uma porção de frutas nas ▶ 1. 2. 3. 4. 5. 6. 7. 8. 9. 10. 11. 12. 13. 14. 15. 16. 17. 18. 19. 20. refeições menores (desjejum e lanche). Desde a década de 1990, o PAT incluiu no programa a promoção de uma alimentação saudável, estimulando as empresas cadastradas a realizarem ações educacionais em Nutrição com ênfase na promoção da saúde, atendendo à promoção da Segurança Alimentar e Nutricional e ao Direito Humano à Alimentação Adequada. Sob esta perspectiva, é importante que os gestores diretos, responsáveis pela execução nas empresas, compreendam e concordem com as diretrizes do programa, pois são eles os formuladores de políticas de alimentação e nutrição.32 Um estudo com empresas cadastradas no PAT demonstrou que grande parte dos gestores dessas empresas desconhecia o programa como uma política social de alimentação e nutrição. Por outro lado, foi observado também que cerca de 40% das respostas mostraram preocupação com a qualidade da refeição e com a saúde dos trabalhadores.32Verificase a necessidade de desenvolvimento de ações de intervenção que possibilitam criar um ambiente de trabalho saudável e direcionado à população trabalhadora. Referências bibliográficas ORGANIZACIÓN MUNDIAL DE LA SALUD. Carta de Ottawa para la promoción de la salud. In: ORGANIZACIÓN PANAMERICANA DE LA SALUD.Promoción de la salud: uma antologia. Washington: OPAS, 1996. p. 36772. McLEROY, K. R. et al. 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Essa sociedade, “obesogênica”, tem sido estimulada cada vez mais a consumir uma alimentação prática, altamente processada, e muitas vezes não têm acesso a opções mais saudáveis. Isso resulta em um consumo alimentar extremamente calórico, com alta concentração de açúcares, sal e gorduras, e pobre em fibras, minerais e vitaminas. Muitas vezes, esse tipo de apelo alimentar encontrase no preço, no acesso ou na praticidade, sem contar que são saborosos e convenientes. Paralelamente, essa dieta calórica relacionase às atividades que os indivíduos desenvolvem ao longo do dia. Na maioria das áreas profissionais, vêse que se trabalha mais, porém com um gasto energético cada vez menor. As novas tecnologiascontribuem para uma produtividade maior em um intervalo de tempo menor. Tudo parece estar informatizado. Muitas das atividades profissionais são realizadas sentadas, ou em pé, quase parada, com alto nível de estresse, o que aumenta o sedentarismo e a obesidade. O ambiente de trabalho, o estilo de vida, o sedentarismo e o consumo alimentar do trabalhador, quando não adequados, predispõem o individuo a inúmeras doenças crônicas, comprometendo substancialmente sua produtividade nas atividades profissionais e no lazer, além de causar impacto econômico às famílias, o que reflete diretamente na qualidade de vida. Assim, essas condições constituem um verdadeiro problema de saúde pública, pois se está referindo à população economicamente ativa do país.1,2 A população brasileira, nas últimas décadas, experimentou grandes transformações sociais que resultaram em mudanças no padrão de saúde e consumo alimentar. Tais alterações acarretaram impacto na diminuição da pobreza e exclusão social e consequentemente da fome e desnutrição. Por outro lado, observase o aumento vertiginoso do excesso de peso em todas as camadas da população, apontando para um novo cenário de problemas relacionados à alimentação e nutrição fomentando o desenvolvimento de doenças crônicas.3 No Brasil, entre as doenças crônicas não transmissíveis (DCNT) destacase a obesidade, por ser tanto uma doença como um fator de risco para outras alterações clínicas, como acidente vascular encefálico, infarto, hipertensão arterial, câncer, diabetes e doenças respiratórias crônicas. É um problema de saúde pública da maior magnitude, pois as prevalências de sobrepeso e obesidade cresceram intensamente nos últimos 30 anos.4 Avaliando as quatro grandes pesquisas nacionais realizadas nos períodos de 1974 a 1975 e de 2008 a 2009, verificouse que as prevalências de excesso de peso e de obesidade aumentaram continuamente em ambos os gêneros. O excesso de peso, no sexo masculino, aumentou quase três vezes (de 18,5 para 50,1%) e, no sexo feminino, quase duas vezes (de 28,7 para 48%). A obesidade é ainda mais preocupante, pois, no mesmo período, aumentou mais de quatro vezes para homens (de 2,8 para 12,4%) e mais de duas vezes para mulheres (de 8 para 16,9%). Esses dados indicam que, em cerca de dez anos, o excesso de peso poderia alcançar dois terços da população adulta do Brasil, magnitude idêntica à encontrada na população dos EUA.5 Neste cenário epidemiológico, as DCNT correspondem a quase 70% das principais causas de morte no mundo e têm provocado perda de qualidade de vida e elevado número de mortes prematuras, atingindo todas as camadas da população, principalmente os grupos mais vulneráveis. Os avanços tecnológicos, a forte pressão psicológica, pouco tempo de lazer, atividades ocupacionais excessivas, baixos salários e dificuldades de acesso à assistência médica são considerados potenciais fatores de risco para o desenvolvimento de doenças cardiovasculares.6Aliados a esses fatores estão a alimentação pouco saudável, a falta de atividade física, o tabagismo e o consumo de bebidas alcoólicas como as principais causas de doenças, como as cardiovasculares, o diabetes tipo 2 e determinados tipos de câncer. Elas contribuem substancialmente para o aumento de morbidade, mortalidade e incapacidade física.7 Sob tal panorama, as doençasinfectocontagiosas gradativamente têm deixado de ser o principal foco de atenção em saúde, cedendo espaço para afecções relacionadas ao ambiente de trabalho, o qual, juntamente com outros fatores de risco, vem se destacando como um dos determinantes de DCNT. Temse demonstrado que muitos problemas de saúde pública são atribuídos aos fatores induzidos pelo ambiente de trabalho, que, associados ao estilo de vida sedentário, contribuem para deteriorar a qualidade de vida do trabalhador.8 O excesso de peso, além de atrapalhar a produtividade do funcionário, é o grande causador de doenças e acidentes no trabalho. Segundo Christopher Wanjek, autor de Food at Work– Workplace Solutions for Malnutrition,Obesity and Chronic Diseases (Comida no Trabalho – Soluções no trabalho para má nutrição, obesidade e doenças crônicas), os funcionários obesos tendem a faltar no trabalho duas vezes mais do que aqueles que apresentam peso normal.9 Para prevenir doenças, é necessário identificar e lidar com suas causas – os riscos de saúde subjacentes a elas. Cada risco tem suas próprias causas, e muitos têm raízes em uma complexa cadeia de eventos que se desencadeia ao longo do tempo. Essa cadeia consiste em fatores socioeconômicos, condições ambientais e de comportamento individual, conforme indica a Figura 3.1. A cadeia causal oferece possibilidades de intervenção. Como se pode ver pelo exemplo das doenças cardiovasculares, alguns elementos desencadeadores (pressão arterial alta, diabetes ou excesso de colesterol) atuam diretamente como fatores causais da doença e outros agem de modo indireto, incluindo inatividade física, fumo, álcool ou ingestão de gordura.10 Figura 3.1 Cadeia causal. Principais causas de doença cardíaca isquêmica (assetas indicam algumas, mas não todas, vias pelas quais essas causas interagem). Adaptado de Word Health Organization (WHO).10 Entre as doenças cardiovasculares, a hipertensão, apesar de ser uma doença controlável, é um marco importante, passível de ser medido clinicamente, e leva à doença cardiovascular sintomática. De acordo com a classificação do JNC 7 (The Seventh Report of The Joint National Committee on the Prevention, Detection, Evaluation, and Treatment of High Blood Pressure), indivíduos são considerados: (a) normais – quando a pressão arterial sistólica (PAS) for menor que 120 mmHg e a pressão arterial diastólica (PAD) menor que 80 mmHg; (b) préhipertensos – quando a PAS vai de 120 a 139 mmHg e/ou a PAD vai de 80 a 89 mmHg; (c) hipertensos, estágio 1 (Hipertensão arterial sistêmica 1 – HAS1) – quando a PAS estiver entre 140 e 159 mmHg e/ou PAD de 90 a 99 mmHg; e (d) hipertensos, estágio 2 (HAS2) – quando PAS ≥ 160 mmHg e/ou PAD ≥ 100 mmHg. São numerosos os estudos que estimam a prevalência de HAS no mundo, mas poucos concentramse na população do Brasil. As pesquisas nacionais mostram que o controle da hipertensão (< 140/90 mmHg) em geral é insatisfatório, variando de 20 a 39%, e que muitos desconhecem sua condição pressora.11 A hipercolesterolemia é outro fator de risco mensurável clinicamente. Em pesquisa realizada no Brasil pela Sociedade Brasileira de Cardiologia em amostra representativa, a hipercolesterolemia foi relatada por 21,6% dos adultos, ou seja, 1/5 da população estudada apresentou níveis de colesterol acima de 200 mg/d ℓ , níveis considerados comprometedores pelas entidades nacionais e internacionais de saúde. O estudo mostrou também que essa situação é mais grave nos indivíduos com menor grau de escolaridade. Analisando ainda a dislipidemia, verificouse que 13,9% da população estudada apresentou valores altos para triglicerídios, o que compromete ainda mais a saúde dos indivíduos.12 O controle glicêmico é outro ponto a ser avaliado, uma vez que o diabetes melito (DM) é considerado problema de saúde no mundo todo, por sua alta prevalência, pela incidência crescente e por associarse a debilitantes complicações crônicas, que, além de aumentarem os custos do sistema de saúde, diminuem a qualidade e a expectativa de vida dos portadores.13 No estudo de Nascimento Neto, 8% da população brasileira estudada apresentou glicemia entre 100 e 110 mg/dℓ, e 9%, níveis acima desses valores.12Considerandose que os valores de normalidade chegam até 99 mg/dℓ , o índice brasileiro de diabéticos sobe para 17%, enquanto nos EUA 7% da população apresenta um dos tipos de diabetes. Valores entre 100 e 110 mg/dℓ, embora sejam considerados níveis intermediários de glicemia, não preenchendo os critérios para DM, são altos demais para serem classificados como normais. Segundo a American Diabetes Association (ADA), esses indivíduos são considerados prédiabéticos, ou “intolerantes à glicose”.14 Essa categoria prédiabética causa grande preocupação, porque indivíduos nessas condições já apresentam riscos cardiovasculares mais elevados que os normais, embora mais baixos que os dos diabéticos.13,14 Se forem tomadas medidas para controlar o nível de glicose no sangue quando se tem prédiabetes, podese retardar ou impedir para sempre o aparecimento da diabetes tipo 2. As pessoas com prédiabetes apresentam maior risco de desenvolver doenças cardiovasculares. Indivíduos com prédiabetes apresentam risco 1,5 vez maior de doença cardiovascular em comparação com aqueles que apresentam níveis normais de glicose no sangue. Diabéticos apresentam risco 2 a 4 vezes maior de desenvolver doenças cardiovasculares.14 Indicadores de riscos coronarianos também podem ser utilizados, partindose da avaliação do índice de massa corporal (IMC) para obesidade global e da circunferência da cintura (CC) para obesidade central, conforme recomenda o protocolo de vigilância alimentar e nutricional (SISVAN) estabelecido pelo Ministério da Saúde.15Para determinação de riscos cardiovasculares elevados, o protocolo estabelece como pontos de corte valores para CC > 80 cm para mulheres e > 94 cm para homens. Valores acima dos pontos de corte recomendados são preditores de risco cardiovascular. Estudos nacionais mostram valores de normalidade ou de risco baixo em reduzida parcela da população. No estudo nacional de Nascimento Neto,1241,5% da população analisada apresentou valores dentro da normalidade. Entre os métodos antropométricos, os que se destacam para determinação de fator de risco coronariano são IMC, CC, razão cinturaquadril (RCQ) e índice de conicidade (IC, índice C).16 Embora muitos estudos já tenham comprovado os benefícios do exercício físico regular, uma expressiva parcela da população é sedentária. Entre os brasileiros, 83,5% não pratica exercícios habitualmente, e, na região Sudeste, essa proporção alcança 79,2% dos adultos.12Efetuaramse várias iniciativas para sensibilizar e conscientizar a população sobre adotar hábitos regulares de exercícios físicos; no entanto, a maioria das campanhas é muito pontual (um dia) e, por isso, causa poucos impactos positivos sobre a atitude das pessoas.1 Se o excesso de peso e a obesidade expressam essencialmente o desequilíbrio entre ingestão e utilização de calorias pelo organismo humano, a explicação para o aumento da frequência dessas condições deve ser procurada em mudanças nos padrões de alimentação e de atividade física da população. Estudos sobre padrões de atividade física da população brasileira são relativamente recentes. Portanto, são escassos e indiretos os dados disponíveis sobre a tendência secular do dispêndio energético dos brasileiros.5 As doenças cardiovasculares foram e continuam a ser, apesar de sua diminuição, a principal causa de mortes no Brasil. Considerando,então, o aumento na prevalência das DCNT e da obesidade em todo o mundo, a Organização Mundial da Saúde (OMS) propôs, em 2004, uma estratégia global de prevenção dessasdoenças, apoiada na promoção de padrões saudáveis de alimentação e de estilos de vida ativos. Um dos pontos abordados nesse documento foi a necessidade de fomentar mudanças socioambientais, em nível coletivo, para favorecer escolhas saudáveis em nível individual, o que contribuiria para a reversão desse quadro alarmante. A estratégia considera o local de trabalho como responsável por estimular escolhas saudáveis de alimentação e a prática de atividade física entre os trabalhadores. Os locais de trabalho têm sido considerados um excelente espaço para oferecer programas de promoção da saúde, em particular aqueles voltados para a redução de fatores de risco para doenças cardiovasculares.17 O documento elaborado pela OMS reafirma a necessidade de formulação e implantação de estratégias efetivas e integradas para a redução dos custos diretos e indiretos com morbidade e mortalidade relacionadas à alimentação inadequada e ao sedentarismo. Assim, a Estratégia Global indica como meta geral a promoção e proteção à saúde mediante ações sustentáveis em nível comunitário, tanto em âmbito nacional como mundial, com apoio a modos de vida saudáveis e com a participação dos profissionais de saúde de outros setores pertinentes.18 A responsabilidade compartilhada entre sociedade, setor produtivo e setor público é o caminho para a construção de modos de vida que tenham como objetivo central a promoção da saúde e a prevenção de doenças. Desse modo, é necessário construir estratégias intersetoriais de proteção à saúde e à vida.19 A fim de orientar sobre alimentação saudável, foi elaborado em 2005, pelo Ministério da Saúde, o Guia Alimentar para a População Brasileira, instrumento oficial que contém as primeiras diretrizes oficiais acerca dos hábitos alimentares saudáveis para a nossa população, implantando as recomendações preconizadas pela OMS. As orientações do guia são adequadas para a prevenção de DCNT, tais como diabetes e hipertensão, e compõem, o elenco de ações para prevenção da obesidade – que, por si só, aumenta o risco dessas e de outras doenças graves –, contemplando também questões relacionadas às deficiências nutricionais.20 Especificamente voltado para a classe trabalhadora, o Programa de Alimentação do Trabalhador (PAT), um programa do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) criado em 1977 tem como objetivo principal melhorar as condições nutricionais dos trabalhadores, facultando às empresas a dedução de despesas com a alimentação de seus funcionários. Desde 2002, o PAT incorporou a promoção da saúde ao seu eixo central. O PAT procura por meio da alimentação saudável, melhorar as condições nutricionais do trabalhador, aumentar sua resistência às doenças, o que repercutiria positivamente na qualidade de vida, desenvolver sua capacidade física e, consequentemente, o aumento de produtividade, aumentar a resistência à fadiga e reduzir acidentes de trabalho.21 Esse programa tem inquestionável relevância social; segundo dados do MTE, atualmente nove milhões de trabalhadores são diretamente beneficiados pelo PAT, que é bem aceito por grande parte dos trabalhadores e empresários, atores sociais diretamente envolvidos com o programa.22 O alvo do programa foi sempre o trabalhador, muitas vezes sem qualificação, visto como capital humano e força de trabalho, que precisa estar bem nutrido, saudável e bem treinado para a execução de suas atividades.23 A relevância do PAT é indiscutível, e suas vantagens vão além dos benefícios puramente econômicos. Certamente a boa alimentação do trabalhador é uma condição capaz de auxiliar a formar capital humano mais qualificado para que as empresas atinjam maior nível de competitividade, contribuindo para o Brasil ter uma atuação mais significativa dentro de um contexto econômico globalizado. Independentemente do aspecto humanitário de assegurar que a população esteja bem nutrida, vislumbrase na proposta do PAT um objetivo de saúde pública, visto que uma boa alimentação, além de reduzir problemas estritamente nutricionais, auxilia na prevenção de muitas doenças, ocasionando menor sobrecarga na demanda por serviços públicos de saúde.22 Hoje, a saúde do trabalhador está presente em todas as pautas de discussão. Zelar pela sua integridade física, mental e social em todos os segmentos é prioridade em todas as instâncias de trabalho. No tocante à alimentação, é preciso um cuidado maior, pois muitas vezes as principais refeições do trabalhador são realizadas no local de trabalho. Cabe a todos os gestores, de todas as áreas de atuação, o compromisso em criar ações promotoras de saúde para enfrentar e deter, principalmente, as DCNT com um plano de ação efetivo. Neste contexto, é importante conhecer a prevalência dos fatores de riscos cardiovasculares (isolados ou associados) em grupos de trabalhadores dentro de cada empresa. Conhecer o perfil nutricional, avaliar a condição física e o risco cardiovascular dos colaboradores é ponto de partida para uma proposta de intervenção adequada em todas as Unidades de Alimentação e Nutrição (UAN). Um trabalho integrado dentro de uma empresa pode perfeitamente ser realizado junto aos profissionais competentes de Medicina do Trabalho ou com as Comissões Internas de Prevenção de Acidentes de Trabalho (CIPA). Conforme propõe o SISVAN, é preciso criar ações integradas, com coleta de dados periódicos relevantes, para a prevenção e o controle de morbidades associadas ao estado nutricional. Em tal contexto, composto de uma série de indicadores, destacamse a análise do consumo alimentar e dos dados antropométricos e bioquímicos, com o objetivo de avaliar e monitorar o estado nutricional e alimentar da população assistida. Todos esses procedimentos poderiam ser realizados mediante ação integrada entre a Medicina do Trabalho e os profissionais de Nutrição.24 A Resolução CFN no 380/2005, do Conselho Federal de Nutricionistas (CFN), que dispõe sobre a definição das áreas de atuação desse profissional e suas atribuições, estabelece que cabe ao nutricionista realizar e promover programas de educação alimentar e nutricional ao trabalhador, tanto em instituições públicas com o privadas, por meio de ações, programas e eventos, visando à prevenção de doenças e promoção e manutenção da saúde. Cabe também ao nutricionista, planejar e participar de eventos, visando à conscientização dos empresários da área de alimentação coletiva e de representantes de instituições sobre sua responsabilidade pela saúde do trabalhador.25 O nutricionista da área da alimentação coletiva, seja institucional ou comercial, é responsável tanto pela administração das operações do processo produtivo como pela gestão da saúde da população atendida. As empresas que dispõem de UAN, objetivando oferecer aos trabalhadores uma refeição completa, têm de desenvolver um programa de educação alimentar para que as escolhas dos trabalhadores sejam adequadas. Muitos contratos das prestadoras de serviços em alimentação e nutrição disponibilizam uma refeição que apresenta uma variedade de gêneros e muitas opções para satisfazer as necessidades dos trabalhadores. São serviços do tipo self service, em que se oferece uma série de preparações que normalmente contempla, em quantidade e qualidade, as recomendações do Guia Alimentar para a População Brasileira. O problema é que, diante de tantas opções, muitas vezes, por falta de conhecimento, as escolhas em quantidade e variedade com queo trabalhador se depara extrapolam as suas próprias necessidades nutricionais. Temse encontrado refeições volumosas, extremamente calóricas, pobres em fibras, ricas em gordura saturada, proteínas e sal. Todas essas condições são favoráveis aos agravos da saúde e promovem o aparecimento de doenças cardiovasculares. Avaliar o consumo alimentar mediante monitoramento da quantidade e da variedade servida é um meio de analisar o estado nutricional da população assistida, propondo uma intervenção nutricional coletiva. Está claro que a promoção da saúde e a prevenção de doenças relacionadas direta ou indiretamente ao trabalho deve fazer parte da gestão de pessoas, dentro de uma estrutura organizacional empresarial. O serviço médico das empresas, um dos organismos especializados em detectar o clima organizacional, condições ambientais e de trabalho, juntamente com outros organismos internos (Segurança do Trabalho, CIPA, Recursos Humanos etc.), deve identificar e avaliar as situações de risco, propondo e/ou executando medidas que propiciem a manutenção da saúde e, portanto, da qualidade de vida do trabalhador.26 Em uma ação integrada, Medicina do Trabalho e profissionais da Nutricão poderiam criar procedimentos que pudessem promover a saúde do trabalhador de maneira mais holística, com levantamento do perfil de saúde corporativa, e, de acordo com os resultados, fazer intervenções. O Ministério do Trabalho estabeleceu, em 1994, o Programa de Controle Médico e Saúde Ocupacional (PCMSO), editado como Norma Regulamentadora no 7 (NR 07) da Portaria 3.214/78 e atualizado pela Portaria SIT no236, de 10 de junho de 2011.27 Esse programa é o conjunto dos procedimentos e condutas a serem adotados pelas empresas em função dos riscos aos quais os funcionários se expõem, durante a jornada de trabalho, no intuito de preservar sua saúde e integridade física. Fazem parte do PCMSO exames médicos obrigatórios que, por si só, já apresentam dados importantes quanto às condições de saúde dos trabalhadores, criando indicadores de risco de DCNT. As grandes empresas cada vez mais proveem recursos, informações, exames médicos complementares, programas de atividade física e programas nutricionais, entre outros, para evitar a ocorrência dessas doenças entre seus colaboradores.26 Se associado a esses dados se dispusesse do perfil nutricional de todos os trabalhadores de cada empresa, aqueles com diagnóstico de riscos iminentes poderiam ser mais bem assistidos, tanto em ação individual como em ação coletiva, dependendo dos resultados encontrados. Quanto ao nutricionista na empresa, poderia ser criado um protocolo para a vigência de seus procedimentos específicos. O Ministério da Saúde também recomenda o uso de indicadores antropométricos na avaliação do estado nutricional de indivíduos ou coletividades, com as vantagens do baixo custo, da simples realização, da facilidade de aplicação e padronização, e de não serem invasivos. A avaliação antropométrica é um método de investigação em Nutrição baseado na medição das variações físicas de alguns segmentos ou da composição corporal global. Ela possibilita a classificação de indivíduos e grupos segundo o seu estado nutricional.24 Outra vantagem da utilização de indicadores antropométricos é a grande quantidade de ferramentas e recursos metodológicos e técnicos disponíveis para a análise da situação nutricional, principalmente para comunicação e comparação dos resultados. Assim, o método antropométrico estimula o agrupamento dos diagnósticos individuais e torna possível traçar o perfil nutricional dos grupos estudados. Nos procedimentos de diagnóstico nutricional de adultos recomendase o uso da classificação do IMC proposta pela OMS1995.24 O IMC hoje também é conhecido como índice de adiposidade, pois apresenta forte associação à incidência das DCNT, já que se trata de fator de risco para inúmeros agravantes à saúde, como doenças cardiovasculares, HAS, dislipidemias, diabetes e alguns tipos de câncer.16 Para o cálculo do IMC (Tabela 3.1), adotase a seguinte fórmula: IMC = Peso (kg) / [Altura (m)]2 Tabela 3.1Pontos de corte do IMC estabelecidos para adultos.28 IMC (kg/m2) Diagnóstico nutricional <18,50 Baixo peso 18,50 – 24,99 Eutrofia (normalidade) 25 – 29,99 Sobrepeso 30 – 34,99 Obesidade classe I 35 – 39,99 Obesidade classe II >40 Obesidade classe III Vários estudos têm revelado que, do mesmo modo que o excesso de massa corporal traz riscos, o padrão de distribuição da gordura tem implicações diferenciadas para a saúde. O acúmulo de gordura na região abdominal está associado à elevação do risco de doenças crônicodegenerativas, principalmente cardiovasculares. Indivíduos com maior circunferência abdominal apresentam aumento de tecido adiposo visceral, que confere risco para distúrbios metabólicos.10 Devido ao aumento da obesidade, pesquisas sobre métodos simples, precisos e sensíveis que possam diagnosticar adequadamente o excesso de gordura corporal associados a agravos à saúde são incentivadas atualmente. Um indicador importante é a CC. A medida deve ser obtida com uma fita métrica inelástica, diretamente sobre a pele, na região mais estreita do abdome. A OMS recomenda os seguintes pontos de corte para a CC (Tabela 3.2): Tabela 3.2Risco de doenças associadas a complicações metabólicas.29 Classificação Sexo Homens (cm) Mulheres (cm) Sem risco < 94 < 80 Risco alto ≥ 94 ≥ 80 Risco muito alto ≥ 102 ≥ 88 ▶ 1. 2. 3. 4. Outro indicador de obesidade central utilizado como preditor de doenças coronarianas é o IC, ou índice C. A principal vantagem do uso do índice C, em comparação com a CC, é que ele possibilita comparações imediatas do padrão de distribuição da gordura corporal em indivíduos com diferentes medidas de peso e estatura. Valores elevados do índice C estão mais fortemente associados aos fatores de risco predisponentes às doenças cardiovasculares e metabólicas do que a outros indicadores antropométricos de obesidade abdominal.30 Quando os valores encontrados estiverem acima do ponto de corte estabelecidos os indivíduos apresentarão risco coronariano elevado (RCE). O índice C foi determinado por Valdez em 1991 e analisado em 1993, aplicando medidas de peso, estatura e circunferência abdominal à seguinte equação matemática:31,32 Em um estudo realizado com a população brasileira, determinouse que os pontos de corte indicadores de risco coronariano pelo Índice C seriam os propostos na Tabela 3.3.33 Tabela 3.3Pontos de corte, sensibilidade e especificidade do índice C como discriminador de RCE.33 Índice C Ponto de corte Masculino 1,25 Feminino 1,18 Índice C = índice de conicidade; RCE = risco coronariano elevado. Vale ressaltar que o monitoramento sistemático e periódico desses dados torna possível não só uma intervenção nutricional pontual, mas também uma avaliação do programa de intervenção, da produtividade do trabalhador e do índice de absenteísmo e afastamentos por problemas de saúde. As empresas, quando investem nesse tipo de programa, esperam resultados, pois se faz necessário entender que há uma estreita relação entre custo e benefício no desenvolvimento de promoção de saúde, meio ambiente e recursos humanos. Que essas ações de programas de saúde e qualidade de vida no trabalho não sejam privilégio apenas dos trabalhadores de grandes corporações, pois muitas delas já têm um programa próprio desenvolvido, instituído e reconhecido. Muitas empresas já reconhecem sua importância no crescimento sustentável das pessoas que as constituem. Que sejam também o marco do desenvolvimento das pequenas e médias empresase que sejam instituídas em curto prazo. Este é o grande desafio. Referências bibliográficas BAREL, M. et al. Associação dos fatores de risco para doenças cardiovasculares e qualidade de vida entre servidores da saúde. Rev. Bras. Educ. Fís. Esporte,São Paulo, v. 24, n. 2, p. 293303, abr./jun. 2010. BRASIL. Ministério da Saúde (MS). 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Departamento de Atenção Básica.Orientações para a coleta e análise de dados antropométricos em serviços de saúde: Norma Técnica do Sistema de Vigilância Alimentar e Nutricional SISVAN / Ministério da Saúde, Secretaria de Atenção à Saúde, Departamento de Atenção Básica. – Brasília: Ministério da Saúde, 2011. 76 p.: il. – (Série G. Estatística e Informação em Saúde) (BRASIL, 2011b). RESOLUÇÃO CFN no 380/2005. Dispõe sobre a definição das áreas de atuação do nutricionista e suas atribuições, estabelece parâmetros numéricos de referência, por área de atuação e dá outras providências. 167a. Sessão Plenária, Brasília, 9 de dezembro de 2005. AZEVEDO, V.; KITAMURA, S.Saúde e qualidade de vida nas corporações.Qualidade de vida no ambiente corporativo. Campinas: IPES Editoria. p. 167173, 2008. BRASIL. Ministério do Trabalho e Emprego.Segurança e saúde no trabalho. [siteda Internet]. Brasília; Ministério do Trabalho e Emprego; Normas Regulamentadoras 2011. 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Sensitivity and specificity of the conicity index as a coronary risk predictor among adults in Salvador, Brazil. Rev. Bras. Epidemiol., São Paulo, v. 7, n. 3, 2004. E ▶ Planejamento Estratégico Maria Cristina Rubim Camargo ste capítulo busca levar aos profissionais que trabalham em Unidades de Alimentação e Nutrição (UAN) a aprendizagem de uma metodologia que possibilite a concepção de planos estratégicos, viáveis na prática, que lhes garantam melhores resultados no ambiente de trabalho. Planejamento estratégico consiste na formulação/adoção de um método que torna possível uma determinada empresa obter vantagem competitiva para superar seus concorrentes. Para obter vantagem competitiva, uma empresa precisa buscar um fator diferencial que leve o cliente a preferir seu serviço em detrimento da concorrência.1 Porter afirma que uma empresa sem planejamento corre o risco de transformarse numa folha seca, que se move ao capricho dos ventos da concorrência.2 De fato, o administrador que não exerce a sua função de planejador acaba por concentrarse excessivamente no operacional, atuando principalmente como um bombeiro que vive apagando incêndios, mas que não consegue enxergar onde está a causa deles. A Figura 4.1mostra um modelo que serve de base para a elaboração de um planejamento estratégico.3 Figura 4.1 Modelo para elaboração de plano estratégico. Adaptado de Certo.3 A elaboração de um plano estratégico tem início com a análise dos ambientes externo e interno. Assim, sugere se que o primeiro passo seja o conhecimento mais detalhado sobre o negócio de alimentação. O termo unidade de alimentação e nutrição abrange estabelecimentos comerciais, industriais (indústrias e empresas) e institucionais (creches, escolas, hospitais, instituições de curta e longa permanência, entre outros) que preparam e fornecem alimentação pronta para o consumo, quaisquer que sejam seus produtos (cardápio), serviços e porte. O negócio de alimentação O negócio de alimentação consiste em oferecer um serviço ao cliente, que normalmente traz consigo uma • • expectativa (serviço esperado), conforme mostra a Figura 4.2. Figura 4.2Representação de uma UAN que recebe o cliente com uma expectativa do serviço a ser prestado: serviço esperado. Quando se trata de um estabelecimento comercial, a escolha normalmente é feita pelo cliente, que, entre inúmeras ofertas do bairro, da região ou da praça de alimentação, faz a escolha a partir de suas expectativasversus o pacote e o processo de serviço oferecido pelo estabelecimento. No entanto, quando o cliente encontrase em restaurantes industriais ou institucionais, não tem possibilidade de escolha, visto que normalmente não tem outra opção, tendo que se submeter ao pacote e ao processo de serviço oferecido pelo estabelecimento, conforme mostra aFigura 4.3. Isso acontece nas creches, nos colégios, nos hospitais ou nos restaurantes de coletividade afastados de pontos movimentados. Figura 4.3Representação da experiência vivida pelo cliente em uma UAN. Outra característica desse negócio, também evidenciada na Figura 4.3, é que a experiência vivida pelo cliente é percebida conforme o que lhe foi entregue, normalmente pelo pessoal de linha de frente. Segundo Fitzsimmons, o pacote de serviços consiste nos benefícios implícitos e explícitos, executados dentro de instalações de apoio, utilizando bens facilitadores, conforme definidos a seguir:4 Instalações de apoio: são os recursos físicos que devem estar disponíveis antes de oferecer o serviço, como o ambiente, o layoutdo restaurante, seu mobiliário, seus utensílios e a decoração Bens facilitadores:produtos adquiridos ou consumidos pelo comprador, cujos itens constam do cardápio; alternativas de outros produtos, como prato de verão, grelhados, entre outros; a maneira de distribuição dos alimentos; uma balança à saída do restaurante; e alternativas para evitar filas ou tornar o tempo de espera menos desgastante para o cliente • • • • • • • Serviços explícitos:características essenciais ou intrínsecas, benefícios facilmente sentidos pelo cliente, como refeição saborosa, com temperatura adequada e elaborada com higiene Serviços implícitos:características extrínsecas, benefícios psicológicos que o cliente pode sentir sutilmente, como segurança higiênicosanitária, bom atendimento, detalhes, cuidados e sensação de bemestar e de prazer. Todas essas características são notadas pelo cliente e formam a base para a sua percepção do serviço, cabendo ao gerente de serviços oferecer uma experiência que seja compatível com o pacote de serviços desejado e acordado. O processo de serviços consiste na maneira pela qual o serviço é prestado e normalmente apresenta as seguintes características: O cliente pode ser parte integrante do processo, podendo, inclusive, afetar a qualidade do serviço prestado, o que ocorre quando ele se serve vagarosamente, dificultando a velocidade da fila e do atendimento A produção e o consumo são simultâneos, o que não possibilita estocar alguns alimentos, por serem perecíveis. Algumas empresas estão investindo em tecnologia para melhorar essa condição por meio de resfriadores rápidos, processos como o cook and chill, entre outros A capacidade é perecível com o tempo, considerando que os serviços de alimentação são oferecidos em alguns períodos do dia e que um lugar vago ou um cliente que leva mais tempo para servirse pode interferir na produtividade A escolha do local é ditada pela localização do trabalho, do lazer ou da residência do cliente, que vai até o restaurante para usar o seu serviço O grau de intensidade da relação entre cliente e força de trabalho cresceu nos últimos anos. A automação e a utilização de sistemas de informação apresentaram grandes avanços nos momentos de “porcionar” e fracionar quantidades, tirar o pedido, cobrar, entre outras atividades. O que o cliente não enxerga ao fazer uso do serviço são os bastidores dessa entrega. Na Figura 4.4, existe uma linha que representa uma linha imaginária de visibilidade do cliente, ou seja, os aspectos que ele não consegue ver durante a prestação de serviços, mas que fazem muita diferença na qualidade do atendimento. Do outro lado da linha de visibilidade está a percepção da gerência quanto à expectativa do cliente, o que dá origem às inúmeras especificações de qualidade do serviço que precisam ser passadas para o pessoal da linha de frente, para que a entrega do serviço de alimentação esteja de acordo com o que foi planejado. As áreas de apoio, como recursos humanos, financeiros, suprimentos, sistemas de informação, pesquisa e desenvolvimento, também devem estar bem alinhadas com o propósito da UAN, para que suas atividades e decisões reforcem a especificação de qualidade do serviço a ser oferecido. Figura 4.4Representação completa de um serviço de alimentação com o que é percebido pelo cliente e o que é realizado nos bastidores, separados pela linha da visibilidade. ■ ▶ • • • • • ▶ Etapa 1 – Analisar o ambiente interno e externo A análise ambiental deve ser feita tanto na abertura de um novo negócio de alimentação como no momento em que um profissional assume o gerenciamento de uma UAN. Ambiente externo Para analisar oambiente externo, é importante que o gestor levante informações sobre os seguintes aspectos: Socioculturais:preferências, hábitos alimentares, cultura, nível educacional, estilo de vida, distribuição etária e geográfica da populaçãoalvo da empresa. O crescente envelhecimento da população brasileira aumenta a preocupação com a saúde e a qualidade de vida. A valorização da gastronomia e a preocupação com o sabor e com a preparação dos pratos têm sido elementos presentes no cenário atual. As pessoas mais bem informadas tendem a valorizar produtos e serviços de qualidade assegurada, que somem sabor à segurança higiênico sanitária, a técnicas culinárias adequadas e a escolhas saudáveis, além de preocuparemse mais com o meio ambiente, com a sustentabilidade e com a possibilidade de contribuir para causas sociais Legais: impostos, taxas aplicáveis ao setor e leis como a criação da Lei Orgânica de Segurança Alimentar e Nutricional (Lei n°. 11.346, de 15 de setembro de 2006), que consiste na concretização do direito de todos ao acesso regular e permanente a alimentos de qualidade, em quantidade suficiente, sem comprometer o acesso a outras necessidades essenciais. Essa lei tem como base práticas alimentares promotoras de saúde que respeitem a diversidade cultural e que sejam ambiental, cultural, econômica e socialmente sustentáveis. As legislações municipal, estadual e federal vigentes, no que se refere às condições higiênicosanitárias, devem ser consideradas, uma vez que influem no layout a ser adotado e nos recursos necessários para um investimento financeiro que seja capaz de atender a todos os requisitos regulatórios vigentes Políticos/governamentais:políticas governamentais de incentivo ou restrição, influências políticas e de demais grupos de interesse, como a crescente participação da mulher no mercado de trabalho e a expansão da classe C, que atualmente mostra maior poder aquisitivo Econômicos: juros, câmbio, renda, nível de emprego, inflação, índices de preços. Com a estabilidade de preços, há maior geração de emprego e renda Tecnológicos:pesquisa e desenvolvimento de produtos da área, avanços tecnológicos e custos envolvidos. Não é estranho que o percentual das despesas com alimentação fora do lar, no total das despesas das famílias brasileiras, cresceu de 24,1% (segundo a Pesquisa ded Orçamento Familiar – POF 2002 e 2003) para 31,1% (POF 2008 e 2009), ou seja, representa quase um terço dos gastos com alimentos. A estimativa é que em 2014 esse percentual chegue a 37%. Por outro lado, o cenário atual traz algumas preocupações, pois a POF (2008 e 2009) apresenta números alarmantes de obesidade em nossa sociedade, e o avanço das doenças crônicas não transmissíveis (DCNT) tende a aumentar. Com o afastamento da mulher das atividades domésticas, as famílias estão aumentando o número de vezes que se alimentam fora do lar, reduzindo o consumo de grãos e perdendo os bons hábitos alimentares antes cultivados. Portanto, é preciso orientar os usuários a fazerem escolhas mais saudáveis. O negócio de alimentação cresceu significativamente nos últimos anos, além de ter evoluído na mesma proporção. Esse crescimento e essa evolução foram bastante influenciados pela exigência dos usuários no que se refere à variedade de produtos e serviços disponíveis. A maior procura de serviços de alimentação e nutrição torna maior a necessidade de encontrar alternativas criativas e concretas que possibilitem a melhoria constante e sistemática da qualidade e da produtividade dessas organizações, garantindo um diferencial competitivo. Esse desafio só poderá ser superado se houver um gerenciamento inovador e capacitado. Ambiente interno Depois de analisar o ambiente externo e identificar as principais oportunidades e ameaças do negócio, cabe a seus gestores analisar o ambiente interno da organização, de modo a identificar os pontos fortes que deverão ser realçados pela administração, eventualmente usados como vantagem competitiva, e os possíveis pontos fracos que precisarão ser minimizados durante a gestão por meio do planejamento estratégico da organização. O primeiro passo pode ser identificar quais das competências exigidas para o negócio podem ser consideradas pontos fortes ou fracos da organização. A Figura 4.5 mostra um rol de competências necessárias para cada ponto do modelo do negócio de alimentação e que pode servir de check list inicial para análise, devendo ser completado por outras competências específicas do negócio e do ambiente em que estiver inserido. Figura 4.5Representação completa de um serviço de alimentação com as respectivas competências organizacionais. É necessário um entendimento completo das dimensões competitivas e das limitações das atividades antes que uma empresa comece a formular sua estratégia de serviços. As falhas apresentadas pelos concorrentes também podem ser aproveitadas pela empresa para melhorar o seu produto e ganhar em diferencial. É importante lembrar que as inovações em serviços não são patenteáveis e normalmente não exigem grande capital. Exemplos disso são a introdução dos conceitos de refeiçãoselfservice, por quilo ou mesmo de serviçosdelivery e drivethrough. Segundo Porter, toda organização tem cinco forças competitivas: os concorrentes, os entrantes potenciais, os substitutos, os clientes e os fornecedores.2 A rivalidade entre concorrentes é determinada pelo seu número, pelo tamanho do empreendimento e pelas condições de competição existentes (demanda do serviço, integração das empresas do segmento, armas competitivas utilizadas). O potencial de entrada de novos concorrentes (novos entrantes) é determinado pela quantidade e intensidade das barreiras à entrada existente no segmento, assim como pela reação dos concorrentes existentes. Existem poucas barreiras à entrada de novos competidores na área de alimentação. A entrada de um novo concorrente forte no mercado, o aumento ou a diminuição da demanda de clientes podem exigir uma revisão no plano estratégico e um possível reposicionamento da organização. Os substitutos podem ser as empresas que disponibilizam outros serviços que atendem a uma certa necessidade. Muitas vezes, o carrinho de cachorroquente que fica na porta de empresa pode ser um substituto. Os fornecedores também são uma força competitiva, e, dependendo do seu poder de barganha, essa força é definida, entre outros fatores, pelo tamanho do fornecedor, pela importância do seu insumo e pelas vantagens que ele oferece para a empresa cliente. Assim sendo, as pequenas organizações levam desvantagem ao negociar com seus fornecedores em função do volume de compras. As grandes companhias, ao contrário, ganham poder de barganha ao negociar grandes volumes com os fornecedores. O uso de centrais de distribuição também tem auxiliado a negociação de grandes volumes com entrega centralizada. ■ ■ ▶ ▶ Os clientes também são outra força competitiva e dependem do poder de barganha dos compradores do produto, que é maior quando os consumidores têm mais opções de compra e possibilidade de trocar de marcas, sem maiores custos, o que normalmente ocorre nas praças de alimentação ou nas regiões onde o número de concorrentes é grande. Existem oportunidades mínimas para economia de escala, já que as pessoas costumam fazer refeições nos mesmos horários e o número de assentos disponíveis no local define o número máximo de usuários simultâneos. Empresas de grande porte e empresas que produzem muitas refeições em um mesmo local também se beneficiam mais e ganham mais poder ao negociar com empresas prestadoras de serviços de alimentação do que com empresasque servem poucas refeições por turno de trabalho. Ao empreender cada uma dessas análises, o gestor terá examinado o ambiente externo, definindo suas oportunidades e ameaças, e o ambiente interno, assim como as forças e as fraquezas da organização. A partir daí, uma empresa pode escolher e implantar uma estratégia genérica, a fim de obter e sustentar sua vantagem competitiva. Etapa 2 – Estabelecer a diretriz organizacional: missão, visão e objetivos A missão da empresa consiste na sua razão de ser e determina a sua identidade. A escolha da missão por uma organização é o elemento essencial para a sua gestão e não deve ser confundida com o próprio produto/serviço oferecido. Quando isso acontece, a organização se restringe à mera produção do bem ou do serviço, sem conseguir enxergar a sua verdadeira razão de ser, o que pode limitar sua perspectiva em termos de atuação estratégica no mercado. A empresa de chocolates finos Kopenhagen é um exemplo interessante, pois estabeleceu como missão a venda de presentes, e não simplesmente de chocolates finos. Isso possibilitou à empresa criar uma estratégia diferenciada, cobrando um preço superior por seus produtos. Se o seu negócio fosse apenas produzir e vender chocolates, os concorrentes seriam as empresas Lacta, Garoto, Nestlé... Além de explicitar bem sua missão e divulgála, é preciso que os gestores também definam claramente a visão e os objetivos da empresa. A visão consiste num macroobjetivo, não necessariamente quantificável a longo prazo, que expresse em que ponto e como a organização pretende estar no futuro. A visão é um elemento motivador, que energiza a empresa e cria um ambiente propício ao surgimento de novas ideias. Toda visão tem um componente racional, que é produto da análise ambiental, e um componente emocional, que é produto da imaginação, da intuição e da criatividade dos gestores. Por isso, todo processo de planejamento é composto também de certa dose de feeling, em que aos fatos e dados é adicionada a capacidade empreendedora e visionária daqueles que estão planejando. Etapa 3 – Formular a estratégia genérica e as estratégias funcionais Sugeridas por Porter, as três estratégias genéricas – liderança em custos, diferenciação e foco no mercado – têm sido usadas para obter vantagem competitiva.2 Liderança global em custos Essa estratégia requer instalações com eficiência de escala, rígido controle sobre custos e despesas gerais e frequentemente uso de tecnologia inovadora. Ter uma posição de baixo custo proporciona uma defesa contra a concorrência, pois os menos eficientes não sobrevivem no mercado. Implantar essa estratégia requer fortes investimentos em equipamentos de última geração, preços agressivos e perdas iniciais para conquistar fatias de mercado. Exemplo de empresa que adota esta estratégia é o Wal Mart, cujo slogan é Every day low price*. Outras características das empresas que adotam tal estratégia são: a procura de clientes de baixo custo; a padronização de um serviço personalizado; a redução da interação no atendimento em serviços; a redução dos custos de rede, como ocorre na Federal Express (FedEx); e as operações de serviçooffline, como a adotada pela Blockbuster, na qual o cliente devolve filmes em horários em que a loja está fechada. Diferenciação ▶ ▶ ▶ ▶ Criação de um serviço que é percebido como único. Essa estratégia não ignora custos, mas sua característica principal consiste em criar a lealdade do cliente e mantêlo disposto a pagar pelos produtos que a empresa oferece. As principais características dessa estratégia são tornar tangível o intangível, reduzir o risco percebido pelo cliente, valorizar o treinamento de pessoal, garantir a qualidade e personalizar o produtopadrão, em contrapartida à padronização de um serviço personalizado, adotada pelas empresas que escolhem a liderança de custo. Focalização É construída a partir da ideia de satisfazer a um mercadoalvo particular tão bem quanto às necessidades específicas do mesmo mercado. É importante definir um mercadoalvo restrito para conhecer exatamente as necessidades de seus clientes. Consiste na aplicação da liderança global em custos da diferenciação de um segmento de mercado em particular. Riscos Tanto as empresas que optam pela liderança no custo como as que adotam a diferenciação correm o risco de serem imitadas pelos concorrentes. As empresas que optam pela liderança de custo correm o risco de mudança na tecnologia que possa exigir grandes investimentos, enquanto as que adotam a diferenciação podem ter suas bases incorporadas e menos valorizadas pelos clientes. As empresas que adotam a estratégia de enfoque podem assistir a seu segmentoalvo tornarse menos atrativo em termos estruturais, além de poderem acompanhar seus concorrentes, com alvos amplos, dominarem o segmento. As três estratégias genéricas sugeridas por Porter podem produzir quatro possibilidades, duas com alvo amplo – liderança de custo e diferenciação – e outras duas com alvo estreito – enfoque em liderança de custo e enfoque em diferenciação. Em qualquer uma delas, não se pode esquecer que somente com a concentração total no cliente e no atendimento às suas necessidades se conseguirá uma base de clientes leais. Michael Porter afirma que quem opta pelo meiotermo mostra sua incapacidade de fazer escolhas de como competir em seu segmento. Tal organização aspira usar as duas e acaba não conseguindo nenhuma, tornando suas ações inconsistentes.2Segundo o autor, uma empresa no meiotermo só terá lucros atrativos se a estrutura for altamente favorável, ou se tiver a sorte de ter concorrentes que também se encontram no mesmo estágio. As organizações do segmento de alimentação no Brasil nos têm mostrado que aprenderam que tal afirmação é verdadeira, uma vez que passaram a criar, dentro de uma mesma entidade corporativa, unidades de negócio, inclusive com marcas próprias, que seguem estratégias genéricas diferentes. No entanto, segundo Porter, correm o risco de comprometer a capacidade de alcançar sua vantagem competitiva.1 Definida a estratégia genérica, a organização tem como definir vantagens competitivas e apresenta subsídios para a tomada de ações em cada área funcional. Formulação de estratégias funcionais As estratégias funcionais descrevem as tarefas específicas que devem ser executadas para implantarse a estratégia genérica da empresa. São elas: vendas e marketing, administração e financeiro; pesquisa e desenvolvimento; operações; suprimentos; sistemas de informação; recursos humanos; e atendimento ao cliente. Definição de objetivos e metas Para cada uma das estratégias funcionais, é importante que sejam definidos objetivos e metas, a fim de possibilitar o acompanhamento do desempenho da organização em relação à participação de mercado, inovação, produtividade, lucratividade, qualidade, equipe, sustentabilidade e responsabilidade social. As metas definidas para cada um dos objetivos devem ser mensuráveis; alcançáveis, porém desafiadoras; e consistentes a curto e longo prazos. A Etapa 3 deve ser concluída com a elaboração do plano estratégico, que deve conter todos os pontos descritos nesse capítulo, desde a análise dos ambientes externo e interno até a escolha da estratégia genérica e de cada uma das estratégias funcionais definidas. O plano pode ser elaborado usandose o conceito 5 W (What, Who, Why, Where, When) e 2 H (How eHow much), que deve explicitar:5 • • • • • • • ■ When? (Onde?) – Especificar a área da empresa na qual a ação deve ser feita Why? (Por quê?) – Citara vantagem competitiva ou razão da ação ser realizada What? (O quê?) – Descrição da(s) ação(ões) a ser(em) realizada(s) Who? (Quem?) – Especificar de quem é a responsabilidade e, quando necessário, especificar também a autoridade When? (Quando?) – Especificar o prazo final (p. ex., até tal data e não a partir de tal data, uma vez que essa data deve ser usada para checar se a ação foi realizada dentro do prazo) How? (Como?) – Descrição da maneira a ser realizada determinada ação How much?(Quanto custa?) – Especificar o valor financeiro que a empresa está disposta a desembolsar para executar a ação. A Tabela 4.1mostra um exemplo prático da utilização desses conceitos. Etapa 4 – Implantar e controlar a estratégia Implantar a estratégia significa realizar as ações previstas, enquanto controlar consiste no acompanhamento dos objetivos e metas definidos no plano. Esse controle pode ser feito usando um impresso baseado no modelo apresentado naTabela 4.2. De qualquer modo, as metas devem ser revisadas periodicamente, de maneira que não engessem a organização e possam ser alteradas conforme houver alguma mudança importante nos ambientes externo e interno. Tabela 4.1Exemplo do preenchimento de um dos objetivos. Onde? Área de Pesquisa e Desenvolvimento Por quê? Aumento da presença de crianças no restaurante O quê? Criar cardápio kids Como? Criar receitas Realizar testes de aceitabilidade com o público infantil Descrever processo e equipamentos Validar segurança higiênicosanitária por meio de análises microbiológicas Montar treinamento para os manipuladores Lançar dois cardápios para o público kids Quando? Até o dia 31 de agosto do ano vigente Quem? João da Silva – gerente de P&D Quanto custa? R$ 20.000,00 (vinte mil reais) Tabela 4.2Modelo de acompanhamento. Área Objetivo Meta Acompanhamento trimestral 1 2 3 4 P&D Criar 2 ▶ 1. 2. 3. 4. 5. 6. cardápio kids Para Ansoff e McDonnell,6 a atividade de administração estratégica tem maior potencial no cumprimento futuro dos objetivos organizacionais, uma vez que estão mais sensíveis às mudanças ambientais, com maior capacidade de reação. O planejamento estratégico da unidade de alimentação é um instrumento importante para quem quer abrir um novo negócio, mas pode ser elaborado pelo gestor de unidades que já existem, especialmente quando um novo profissional assume sua gestão. O plano deve ser revisado periodicamente, sempre que fatores internos e externos estiverem interferindo nos resultados organizacionais. Os demais capítulos deste livro abordam assuntos de relevância para o segmento e podem constituir fator de vantagem competitiva para sua unidade em consonância com o ambiente externo que se apresenta. Cabe a cada leitor avaliar seus pontos fortes e fracos, assim como suas habilidades e competências, para escolher o fator de vantagem competitiva mais adequado às condições disponíveis. Referências bibliográficas PORTER, M.Vantagem competitiva:criando e sustentando um desempenho superior. Rio de Janeiro: Campus, 1993. PORTER, M.Estratégia Competitiva:Técnicas para análise de indústrias e da concorrência. Rio de Janeiro: Campus, 2004. CERTO, S.; PETER, J. P.Administração estratégica:planejamento e implantação da estratégia. São Paulo: Makron,1993. FITZSIMMONS, J. A.; FITZSIMMONS, M. J. Administração de serviços:operações, estratégia e tecnologia de informação. Porto Alegre: Bookman, 2000. CAMPOS, V. F.Gerenciamento da rotina do trabalho do diaadia. Nova Lima: Editora Falconi, 2004. ANSOFF, H. I; McDONNELL, E. J.Implantando a administração estratégica. São Paulo: Atlas, 2000. * _________ N. do A.: Preço baixo todo dia. P Unidade de Alimentação e Nutrição e sua Interface com o Sistema Agroalimentar Sílvia Martinez ara entender a interface da Unidade de Alimentação e Nutrição (UAN) com o sistema agroalimentar fazse necessário conceituar sistema agroalimentar, agronegócios e cadeia agroalimentar, termos que surgiram na década de 1950 e que somente no início do século XXI foram definitivamente compreendidos no Brasil devido à evolução da economia. O conceito deagronegócios tem sido largamente difundido com base na ideia de um fluxo de agregação de valor, desde a indústria de insumos, passando pela produção rural, pelas agroindústrias, pela distribuição, e chegando, por fim, aos consumidores finais. Essa visão, baseada em estudos pioneiros desenvolvidos por Davis e Goldberg em 1957, é citada por Neves et al.1 em 1997, que enfatizam a orientação de sistemas agroindustriais, referindose ao fluxo de transformações de uma determinadacommodity com vistas a atender às exigências dos consumidores finais. Segundo Neves e Zylbersztajn,2 osistema agroalimentar(SAG) é visto, então, como um conjunto de relações contratuais entre empresas e agentes especializados, cujo objetivo final é disputar o consumidor de determinado produto. Tem ampla aplicação que vai desde o desenho de políticas públicas até a arquitetura e formulação de estratégias corporativas. Esses autores apresentam um modelo de sistema agroindustrial que engloba os elementos necessários à sua análise descritiva (agentes, relações, setores, organizações de apoio, ambiente institucional) e pode ser aplicado a cadeias produtivas em geral. Para compreender mais facilmente essas etapas podese usar o modelo de Neves.2Ele, observa a inserção do serviço de alimentação ou da UAN (Figura 5.1). Figura 5.1 Modelo de sistema agroalimentar. Adaptado de Neves et al.2 O conceito de SAG desperta interesse por ser mais abrangente do que o da cadeia produtiva (cadeia vertical de produção), mostrando a importância dos ambientes institucional (governo, cultura, educação, costumes etc.) e organizacional (associações, cooperativas, informação etc.) para o funcionamento dos componentes da cadeia. Uma vez definido o SAG, é necessário identificar a cadeia produtiva. De acordo com Farina e Zylbersztajn apudMargarido et al.,3 a cadeia produtiva é definida como um subsistema de um SAG que privilegia as relações entre agropecuária, indústria de transformação e distribuição em torno de um produtoespecífico principal. É ainda entendida como uma sucessão de operações verticalmente organizadas de atividades produtivas, desde a produção até o consumidor final (Figura 5.2). Figura 5.2 Etapas da cadeia produtiva de um commodity. Adaptado de Neves.4 Segundo Neves et al.,1 a agregação das cadeias produtivas possibilita visualizar as relações tecnológicas e comerciais dos segmentos no interior do SAG, fornecendo os elementos necessários para o entendimento de sua dinâmica frente às mudanças técnicas, organizacionais e institucionais. Para o Ministério da Saúde, de acordo com a Portaria no1.428/MS, de 26 de novembro de 1993,5cadeia alimentarcompreende todas as atividades relacionadas à produção, ao beneficiamento, ao armazenamento, ao transporte, à industrialização, à embalagem, à reembalagem, à comercialização, à utilização e ao consumo de alimentos, considerandose suas interações com o meio ambiente, o ser humano e seu contexto socioeconômico. Desse modo, é consenso que oagronegócio é um conjunto de atividades de uma ampla cadeia produtiva, que abrange desde a produção de matériasprimas e insumos (sementes, adubos, máquinas agrícolas, fertilizantes etc.), de origem agropecuária, até o processamento industrial e a comercialização de produtos, com a chegada do produto final ao consumidor (queijos, biscoitos, massas, frutas etc.). Dentro dessa visão o SAG dividese em: • • • • • • • ▶ ■ • • Cadeia de produção:relacionase às atividades envolvidas no processo de fabricação Cadeiade suprimentos:envolve a fabricação e a logística entre unidades produtivas e também a distribuição do produto final do fornecedor ao cliente. Da matériaprima ao usuário final. É mais abrangente e atende à demanda da globalização. Assim, incluise a utilização de produtos pelos processadores, como restaurantes e varejo em geral, o que torna possível destacar que o segmento de preparo e comercialização de alimentos prontos para o consumo ou refeições está diretamente relacionado ao agronegócio, pois é interdependente dele, bem como participa efetivamente da cadeia e de todo o SAG. Essa abordagem é relativamente recente para o conceito econômico brasileiro e, tratando se de um país que tem forte ação em agronegócios, seu espectro de abrangência ampliase consideravelmente. A UAN interfere diretamente nos dois tipos de cadeias, já que recebe produtos dentro do fluxo e ao mesmo tempo o influencia, na medida em que requisita modificações e adaptações aos produtos de acordo com suas especificidades. Esse processo é encontrado, por exemplo, em empresas de refeições coletivas, que, no departamento de controle de fornecedores, estabelecem critérios para cortes de carnes, impactando a agroindústria ao solicitar que os cortes sejam desenvolvidos de acordo com suas necessidades (Tabela 5.1). Tabela 5.1Elementos fundamentais do SAG.4 Os agentes: importação e exportação As relações entre os agentes: sistema de logística Os setores: cárneos, lácteos etc. As organizações de apoio: ABIA, ABERC O ambiente institucional: restaurantes e indústrias ABERC = Associação Brasileira de Empresas de Refeições Coletivas; ABIA = Associação Brasileira da Indústria de Alimentação. Agentes que compõem o sistema agroindustrial Produção primária Os agentes atuantes na produção de matériaprima para a indústria de alimentos representam um dos elos mais conflituosos dos agronegócios. Por um lado, eles estão distantes do mercado final; portanto, nem sempre têm informações claras sobre os consumidores e seus níveis de consumo, além de estarem, por vezes, distantes geograficamente do consumidor final. Cabe à produção primária (insumos) fornecer os subsídios necessários para a agricultura, de modo que ela atenda a todas as exigências de qualidade de seus compradores. Apesar da intensa competição no setor, a comercialização de insumos agrícolas no Brasil é uma atividade próspera. O mercado de insumos agropecuários movimenta mais de US$10 bilhões por ano e compreende a distribuição de fertilizantes, máquinas, defensivos, produtos veterinários, mudas, entre outros produtos. É fundamental que essa etapa inicial do SAG seja constantemente alimentada por informações sobre o consumidor final ou sobre o usuário dos insumos, necessitando de políticas públicas claras e adequadas à manutenção de um sistema próspero. Nesse ambiente produtivo, é possível encontrar a ação indireta das UAN, com a agregação de valor ao produto agrícola e a diferenciação de mercado potencial por meio da interferência nas características da embalagem de transporte para comercialização e industrialização dos alimentos com: Criação e variação nos padrões de qualidade Avaliação da perecibilidade e sazonalidade do produto • • • • • ■ • • • • ■ Estabelecimento de modelos de controles sanitários e segurança do alimento Desenvolvimento de novos alimentos e novos produtos Avaliação do uso de condicionantes biológicos e climáticos Preocupação quanto a questões de sustentabilidade, como a produção de alimentos no manejo sustentável e de alimentos orgânicos Desenvolvimento e construção da marca e rotulagem. Agroindústria Os agentes que atuam na fase de transformação do alimento são denominadosagroindustriais. Eles podem ser classificados como de primeira transformação, que adiciona atributos ao produto sem transformálo, ou de segunda, quando o produto de origem primária sofre transformação física. Tratase de um conjunto de atividades exercidas por empresas de portes variados, desde empresas familiares até grandes conglomerados internacionais. Por um lado, a agroindústria lida com o seu cliente, que é o agente distribuidor, como supermercados ou varejos e atacados, visto que necessita vender o seu produto. Por outro, lida com o seu supridor, o setor primário, com quem deve dividir margens da venda do produto. Essa interrelação é fundamental para manter o SAG. Atualmente, grandes conglomerados têm monopolizado o mercado de varejo e atuado diretamente na indústria, com o desenvolvimento de marcas próprias que agregam grande valor à marca e também forçam a criação de produtos segmentados e adequados aos mercados. A UAN interfere na agroindústria por meio de: Projeto do produto:desenvolvimento de novos alimentos e novos produtos com vistas a atender ao mercado atacadista ou varejista Projeto do processo:estabelecimento de critérios para o desenvolvimento dos produtos com vistas a melhorar ou manter aspectos nutricionais e gastronômicos Conformação:adequação às normas certificadoras de qualidade para a área de alimentos e alimentação exigidas pelos órgãos certificadores/regulamentadores ou do Estado, como Anvisa e Ministério da Agricultura Serviços associados ao produto:desenvolvimento de serviços que podem contribuir para melhor relação entre fornecedor e cliente em pré e pósvenda. Outro quesito fundamental na atualidade para o sucesso de organizações na área de alimentação, considerando suas especificidades técnicas, legais e de mercado, é o desenvolvimento de fornecedores para a cadeia de suprimentos e para a cadeia de produção. Dentro do SAG, outro fator que o afeta diretamente é a logística de alimentos e produtos para a cadeia. Setores como distribuidores de cesta de alimentos, atacadistas, varejistas e atacarejos vêm impactando sobremaneira as relações dentro das cadeias, uma vez que suas especificidades são determinadas pelas necessidades de mercado, cada vez mais crescentes e adaptáveis ao cliente. As agroindústrias têm investido muito no desenvolvimento de marcas próprias para varejos e food service; com isso, esses segmentos passam a oferecer produtos e serviços mais competitivos e adequados à demanda de seus mercados, hoje segmentados e regionalizados. Em serviços de restaurantes comerciais, matériasprimas antes dificilmente acessíveis têm sido desenvolvidas a fim de contribuir para a temática dos estabelecimentos, mantendo o negócio em índices de diferenciação muito competitivos nas grandes capitais do país. Como exemplo, encontramse restaurantes com temática alternativa, ovolactovegetarianos, que atuam junto a fornecedores de matériasprimas e pequenas indústrias para fornecer produtos orgânicos vindos diretamente de fazendas nos arredores da cidade onde os restaurantes estão situados, facilitando a logística, o controle de qualidade e a certificação, diminuindo custos e criando diferenciação quanto à variedade do cardápio oferecido. Essa adequação é visivelmente observada também nas cadeias de fastfood. Várias agroindústrias especializaramse em produzir determinados alimentos apropriados aos padrões dos cardápios oferecidos por esses estabelecimentos, como vegetais e produtos de panificação que possuem gramatura, formato, características nutricionais e de armazenamento adequados aos padrões dos pontos de venda. Atacado Da mesma maneira que ocorre no varejo, a distribuição de alimentos para grandes centros urbanos passa por ■ plataformas centrais, cujo papel é concentrar fisicamente o produto e possibilitar que agentes varejistas se abasteçam. Esse pilar das cadeias produtivas foi fortemente abastecido de tecnologia da informaçãopara o desenvolvimento de processos de logística e supply chainavançados. As transformações que afetam os sistemas produtivos também chegam ao setor de grande distribuição, pelo fato de que surgem plataformas de distribuição privadas, em geral associadas às redes de distribuição varejistas. Outro ponto de observação passa pelo surgimento de plataformas especializadas ou mercados alternativos especializados em produtos específicos, que passam a ter vantagens de eficiência quando comparados com as plataformas de distribuição multipontos. Observase uma crescente abertura no mercado para empresas especializadas em segmentos ou grupos de alimentos, como cárneos e frutas, que chegam a criar um nicho de varejo especializado. Como no varejo, o segmento atacadista ou de distribuição em massa passou a estabelecer uma forte ligação com a agroindústria e a desenvolver produtos e serviços adequados a mercados segmentados. Eles seguem uma tendência global e vêm consolidando cada vez mais o crescimento do mercado food serviceou de alimentação fora do lar. Empresas de fornecimento de cestas de alimentos têmse especializado em fornecer produtos e serviços além das chamadas cestas básicas e, por agregação de valor, têm oferecido produtos adaptados às necessidades de seus clientes. Essa mudança pressionou o mercado a constituir um sistema de logística apropriado, e muitas dessas empresas passaram a comercializar seus produtos em regiões específicas das cidades para grupos segmentados. Contribuíram para isso os sistemas de importação e exportação de produtos. Sabese ainda que esse setor carece de grandes obras de infraestrutura estatal que possibilitem fazer fluir mais rapidamente e de modo adequado os produtos que saem e chegam ao país. Grandes cadeias de restaurantes por vezes se veem obrigadas a constituir empresas paralelas de comércio exterior para facilitar os processos que são gravemente atingidos por questões políticoeconômicas e regulatórias, a fim de garantir agilidade. Outras questões que impactam fortemente os processos de importação e exportação são as fiscais e econômicas, que aumentam custos de produção e consequentemente o preço final de um produto. Grandes redes possuem capacidade de negociação por comercializar lotes expressivos, baixando o custo unitário da matériaprima ou de produtos, mas isso já não é observado entre pequenos negócios, o que não permite sua alavancagem, nem a aquisição de produtos exclusivos e o acesso às novidades do setor, principalmente as de equipamentos de cozinha. Varejo A função de distribuir produtos em grandes centros passou a ser altamente especializada e realizada por agentes com diferentes características. Convivem no universo da distribuição tanto as grandes cadeias transacionais de supermercados como as cadeias de importância local. Existem no varejo outros importantes e tradicionais elos entre a indústria e o consumidor, como padarias, açougues, pequenos restaurantes etc. O varejo de alimentos passa por grandes mudanças em todo o mundo, em especial com o aumento da importância dos aspectos de qualidade, o que induz ao aumento da relevância das marcas, dos selos de qualidade e de aspectos de rastreabilidade dos alimentos. O contato direto com o consumidor final torna possível ao varejo ser importante gerador de dados de comportamento da compra e de tipo de consumo, que pode abastecer os grandes centros distribuidores e também a ponta inicial da cadeia produtiva sobre como os produtos precisam chegar a ela. Esse tipo de informação passa a ser fundamental para a regionalização dos serviços e produtos e para melhor atender ao consumidor. Empresas que investem nesse pensamento se destacam nos agronegócios. Isso já havia sido identificado por Neves e Zylbersztajn,2 quando citaram que: (...) é inegável o poder de coordenação exercido pelos grandes supermercados, o que lhes confere também grande responsabilidade na gestão da qualidade dos alimentos disponíveis para consumo. Para Neves, Lazzarini e Chaddad Filho,1 o setor de distribuição, constituído de atacado e varejo, cresce em importância e poder de negociação nas relações do sistema agroalimentar, pois identifica mais facilmente as tendências de consumo e coordena o fluxo de informações e mercadorias na cadeia produtiva. Dentro do canal de distribuição da cadeia devese observar o canal que disponibiliza o alimento ao consumidor, conhecido como food service oualimentação fora do lar. Segundo a Associação Brasileira da Indústria de • • • • • • • • • • Alimentação (ABIA),6as indústrias fabricantes de alimentos, assim como os produtores de alimentos in natura, contam com quatro grandes canais de distribuição de seus produtos no mercado interno: atacado e distribuição, varejo, a própria indústria efood service. Porém o consumidor final só tem contato direto com dois desses canais: o varejo e o food service. Conforme indica a ABIA,6 o primeiro canal é o da rede varejista, que apresenta grande concentração nos supermercados. Neles, os consumidores adquirem os produtos separadamente para preparo e consumo em seus lares. O segundo canal de distribuição aberto ao consumidor final é o food service, por meio do qual os estabelecimentos chamados de “operadores” preparam as refeições para o consumo fora do lar. Portanto, o mercado do food service para as indústrias é o do fornecimento de mercadorias, produtos e serviços aos estabelecimentos públicos ou privados, que preparam e fornecem alimentação (alimentação preparada fora do lar) aos consumidores (Figura 5.3 e Tabela 5.2). Figura 5.3 Tipos de refeição e seus locais de preparo e de consumo, de acordo com a classificação da Food Distributors International.4Catering = serviços de alimentação para transportes marítimos, aéreos e terrestres. Tabela 5.2 Novos e tradicionais ambientes defood service. Padarias Refeição transportada Escolas Indústrias Comissaria Hotelaria hospitalar Serviços prisionais Instituições públicas Serviços de campanha (canaviais e eventos abertos) Plataformas de petróleo (off shore) • • • • • • • • • • – – Obras de infraestrutura (PAC) Restaurantes verdes Cafeterias e fastfoods Finger foods e slow foods Segmentação de empresas de refeições coletivas com produtos diferentes Benefícios em alimentação/vale alimentação/vale refeição Franquias Varejo de conveniência: postos de gasolina e restaurantes de estrada De acordo com Viana e Sabio,7 no Brasil o termo norteamericano "food service" pode ser traduzido comoserviços de alimentação ou comounidades de alimentação e nutrição. São as refeições feitas no local de trabalho, de lazer, em hotéis, hospitais, entre outros, ou ainda as refeições consumidas em residências, mas preparadas em restaurantes, empresas de produtos congelados etc. Serviços de alimentação envolvem desde compras, distribuição de alimentos, insumos, equipamentos, embalagens, serviços e armazenagem até o preparo e o fornecimento das refeições. Segundo a ABIA, o food service é bastante amplo, abrangendo mais de oito subcanais de distribuição, que podem ser divididos em dois segmentos (Figura 5.4): Rede de serviços públicos, que engloba canais governamentais como postos de saúde, hospitais, presídios e escolas. Essa rede se caracteriza por não perseguir lucro com a atividade de distribuição ou preparação dos alimentos Rede de serviços privados, que também pode ser classificada em dois grupos: Comercial, em que os serviços de alimentação são a principal fonte de receita da empresa (fastfood, delivery, hotéis, quick service,lanchonetes, bares, restaurantes comerciais, rotisserias, refeições coletivas, atacadistas, distribuidores, supermercados, padarias, confeitarias, sorveterias,vending, chocolaterias, cafeterias etc.) Não comercial, que oferece o serviço de alimentação como parte de diferencial competitivo mais amplo (hospitais, clínicas,catering aéreo e de transportes, motéis/pousadas, entre outros). Figura 5.4 Análise do crescimento do canalfood service nos últimos anos no Brasil, segundo estudo da ABIA.6 Como se observa, a distribuição de alimentos industrializados via canal food servicecresceu à média anual de 12,3% contra 11% do varejo tradicional. Figura 5.5Crescimento acumulado do food service, segundo ABIA.8 ▶ • • • • • ▶ • • • Figura 5.6Segmentação de distribuição por unidade de negócio dofood service, segundo ABIA.9 Rastreabilidade de matériaprima e desenvolvimento de fornecedores Atualmente, as empresas do segmento alimentício encaram o grande desafio de identificar fornecedores que atendam aos requisitos comerciais, sanitários e técnicos. O desenvolvimento de fornecedores para a cadeia agroalimentar tem por objetivo melhorar os processos e produtos sob o aspecto tecnológico, de segurança e de higiene, agregando valor à cadeia competitiva. Podese buscar o desenvolvimento por tipos de produtos como: Fornecedores de insumo Fornecedores de matériaprima Fornecedores de embalagem Fornecedores de produto acabado (parceiros) Fornecedores de serviço de armazenamento. Nesse processo, a empresa contratante poderá identificar quesitos diversos por meio da embalagem e das informações contidas no rótulo. Itens como CNPJ e endereço, que constam da informação obrigatória do rótulo, são identificadores das condições legais de existência do fornecedor. Um técnico à frente da compra de matériaprima deverá solicitar ao fornecedor amostras de produtos para o processo de seleção. Muitas vezes, são apresentadas amostras que não contêm o rótulo de venda do produto, e sim um rótulodemonstração. Isso pode mascarar ilegalidades de fabricação e de comercialização de produtos. O recebimento de amostras idênticas àquelas que serão comercializadas e o confronto das informações do rótulo com o cadastro do fornecedor podem minimizar problemas futuros. A checagem de tais dados deve ser pressuposto básico na seleção de fornecedores. Desafios e tendências para ofood service Nesse ambiente que tem crescente demanda e desempenho forte influência no SAG, vislumbrase que para o sucesso é necessário atentarse aos seguintes desafios: Desenvolver cozinha experimental/receituário:os restaurantes e UAN devem fazer uso dessa ferramenta, que é forte aliada no controle de qualidade sanitário, mão de obra, custos, fornecedores, entre outros Melhorar a apresentação dos pratos: a gastronomia vem solicitando cada vez mais que a matériaprima e os produtos garantam a qualidade do produto final para o cliente Utilizar novas tecnologias:inúmeros processos tecnológicos referentes a equipamentos e matériasprimas são lançados anualmente. É imprescindível que o gestor da unidade esteja atento a isso para manter o padrão de diferenciação e competitividade do negócio, além de racionalizar custos operacionais • • • • • • • • • • ▶ ■ Desenvolver o uso culinário de alimentos funcionais e regionais: a regionalidade e a alimentação alternativa vêmse destacando como pressupostos de diferenciação para produtos e serviços Desenvolver novas técnicas de preparo: novos procedimentos gastronômicos e culinários têm contribuído nas UAN para a criação de cardápios diferenciados e adequados à clientela local Proporcionar e preservar a segurança alimentar: fator imprescindível para a melhoria a e manutenção dos serviços Treinar equipes e capacitar colaboradores:cada vez mais a gestão de pessoas é fator determinante para o sucesso da UAN dentro do SAG Formar gestores:cada vez mais os serviços dentro do SAG devem ser realizados por profissionais especializados e conhecedores da complexidade desse sistema Adequar valor nutricional às necessidades do perfil epidemiológico:com o aumento da obesidade como epidemia global, entre outras doenças crônicodegenerativas, os produtos e serviços oferecidos pelo SAG para a UAN devem privilegiar fundamentos de qualidade de vida e proporcionar melhor padrão nutricional Estudar e controlar porções:o uso racional dos alimentos visando à educação nutricional e à educação para o consumo é fator a ser considerado para a consecução dos princípios da sustentabilidade Valorizar a gastronomia regional: a regionalidade vem sendo cada vez mais observada pelos restaurantes e por diferentes tipos de serviços de alimentação como fator de diferenciação de mercado Desenvolver a rastreabilidade:contribuir para a utilização cada vez mais efetiva de processos de certificação e rastreamento da cadeia de produção e distribuição, a fim de garantir e manter produtos e serviços adequados ao mercado global Contribuir para o sistema de hospitalidade (turismo/hotelaria/gastronomia):o crescimento desse segmento na economia brasileira, alavancado por grandes eventos mundiais, tais como Olimpíadas e Copa do Mundo, vem pressionando o país a prepararse para oferecer serviços de alimentação modernos e produtivos. Produtos diferenciados para diferentes segmentos Com a modernização de equipamentos e serviços, muitas UAN passaram a focar suas plataformas de negócios para outras necessidades, como o desenvolvimento de serviços de marca própria, a adaptação aos grandes eventos, como restaurantes em estádios de futebol e aeroportos, o aumento na especialização de produtos e serviços para restaurantes de estrada e lojas de conveniência em postos de gasolina e o aumento da distribuição de franquias alimentícias em países emergentes e em desenvolvimento. Encontramse atualmente muitos serviços brasileiros sendo exportados para países africanos, por exemplo. Consumidores Tratase do ponto focal para onde converge o fluxo dos produtos do SAG. O produto final é adquirido pelo consumidor para satisfazer as suas necessidades alimentares, que variam de acordo com renda, preferências, faixa etária e expectativas, entre outros elementos. Vários estudos ressaltam o crescimento da alimentação fora do lar, principalmente nas grandes capitais brasileiras. Atualmente, 25,8% do orçamento do brasileiro é destinado a refeições fora do lar, segundo dados do IBGE, podendo chegar a mais de 30% em grandes centros urbanos como a Grande São Paulo (Figura 5.7).10 Figura 5.7 Evolução da participação da alimentação fora do lar nos gastos totais com alimentos.10Adaptado de IBGE/POF: ABIA. ▶ 1. 2 3. 4. 5. 6. 7. 8. 9. 10. Nesse amplo espectro sobre o qual se pode observar o SAG e a UAN, novos modelos de negócios emergem, como restaurantes verdes, que impactam fortemente os pressupostos ambientais, como a gastronomia hospitalar, que traz um novo olhar sobre a alimentação oferecida no sistema de saúde e sobre a sua interrelação com a hotelaria hospitalar, e como a propagação de modelos saudáveis de restaurantes que privilegiam condutas equilibradas em alimentação e nutrição. Referências bibliográficas NEVES, M. F.; LAZZARINE, S. G.; CHADDAD FILHO, A. P. M.Cenários e perspectivas para o agrobusiness Brasileiro. 1997. Disponível em:favaneves.org. Acessado em: 12/11/2009. NEVES, Marcos Fava; ZYLBERSZTAJN, Decio. Economia e Gestão dos Negócios Agroalimentares. São Paulo: Pioneira, 2000. MARGARIDO, M. A.; LIMA, L. A. F.; SILVA, P. A. G. O agronegócio nos investimentos diretos brasileiros.Informações Econômicas, São Paulo, v. 39, n. 9, set. 2009. NEVES, Marcos Fava; LAZZARINI,Sérgio G.; CHADDAD FILHO, Fábio R.;Gestão de negócios em alimentos. São Paulo: Pioneira Thomson Learning, 2003. BRASIL, Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância Sanitária. Portaria no 1.428, de 26 de novembro de 1993. Regulamentos Técnicos sobre Inspeção Sanitária, Boas Práticas de Produção/ Prestação de Serviços e Padrão de Identidade e Qualidade na Área de Alimentos. ABIA. II Congresso Internacional de Food Service 2009.Disponível em: <http://www.abia.org.br/cfs2009/telas/food service.asp>. Acesso em: 02 mar., 2010. VIANA, Mayra Monteiro; SABIO, Renata Pozelli. Quem come fora come mais hortifruti. Revista Hortifruti Brasil.CEPEA – ESALQUSP, n. 78, abril de 2009. Food Service News.Perfil. Disponível em: <http://www.foodservicenews.com.br/publicidade.php>. Acesso em: 02 mar, 2010. Food Service News.Rotisserias se especializam cada vez mais.Disponível em: <http://www.foodservicenews.com.br/materia.php?id=350>. Acesso em: 10 fev., 2010. Pesquisa de Orçamentos Familiares – POF.Em 30 anos, importantes mudanças nos hábitos de consumo dos brasileiros. Disponível em: <http://www.ibge.gov.br/home/presidencia/noticias/19052004pof2002html.shtm>. Acesso em: 10 fev., 2010. O Empreendedorismo Rosana Toscano Ferreira campo do empreendedorismo atualmente tem sido motivo de destaque em diversas publicações. Muitas áreas de especialização têm surgido com o objetivo de estudar o empreendedorismo. Filion distingue, para o empreendedor, as seguintes dimensões: comportamentos; sistemas de atividade; processos empreendedorísticos; intraempreendedorismo e empreendedorismo corporativo; tecnoempreendedorismo.1 Existem diferenças entre as correntes que abordam o empreendedorismo, porém duas correntes básicas são atualmente definidas: a dos economistas, que se iniciou com Richard Cantillon (16801734) e JeanBaptist Say (17671832) e se desenvolveu com Joseph A. Schumpeter (18831950), associando o empreendedor ao desenvolvimento econômico, à inovação e à busca de oportunidades; e a corrente dos comportamentalistas, que se desenvolveu a partir dos estudos de David McClelland e que cresceu a partir da década de 1970, com ênfase na criatividade e intuição, que coloca em evidência as características psicológicas e sociológicas do perfil do empreendedor.1,2 O termoempreendedor(entrepreneur) tem origem francesa e significa "aquele que assume riscos e começa algo novo". O primeiro a lançar os alicerces desse campo de estudo, considerado o pai do empreendedorismo, foi Jean Baptist Say, um economista francês que define o empreendedor como o indivíduo capaz de transferir os recursos econômicos de um setor com baixa produtividade para um setor com produtividade elevada e com maiores rendimentos.1,3 Schumpeter associou o empreendedorismo à inovação: a essência do empreendedorismo está na percepção e no aproveitamento de novas oportunidades no âmbito dos negócios; tem relação com criar uma nova forma de uso dos recursos em que eles sejam deslocados de seu emprego tradicional e sujeitos a novas combinações.4 Um empreendedor é alguém que exerce controle sobre uma produção que não seja direcionada só para o seu consumo pessoal, de maneira que o dono de uma empresa pode ser tão empreendedor quanto um executivo ou um operário em uma grande corporação (McClelland, apudFilion).1 Para Filion, o empreendedor é: uma pessoa criativa, marcada pela capacidade de estabelecer e atingir objetivos e que mantém alto nível de consciência do ambiente em que vive, usandoa para detectar oportunidades de negócios. Um empreendedor que continua a aprender a respeito de possíveis oportunidades de negócios e a tomar decisões moderadamente arriscadas que objetivam a inovação.1 Portanto, “um empreendedor é uma pessoa que imagina, desenvolve e realiza visões”.1 ▶ • • • • • • • • • • • • • • • ▶ O empreendedor “proporciona a energia que move toda a economia, alavanca as mudanças e transformações, produz a dinâmica de novas ideias, cria empregos e impulsiona talentos e competências”.5 No final do século XIX e início do século XX, os empreendedores foram frequentemente confundidos com os administradores, sendo vistos apenas desempenhando as funções administrativas de planejamento, organização, direção e controle, com foco no aspecto econômico.6No entanto, eles possuem características que os diferenciam e estão empenhados em aperfeiçoálas. Características do empreendedor Pesquisas demonstram linhas mestras para os empreendedores identificarem as características que os tornam bemsucedidos. Embora não se tenha nenhum perfil científico, as características mais comuns do bom empreendedor estão demonstradas naTabela 6.1. Os empreendedores têm a capacidade de anteciparse aos fatos, de criar oportunidades de negócios, de desenvolver produtos e serviços e de propor soluções inovadoras; enfrentam os obstáculos aplicando estratégias de acordo com cada situação, fazem sacrifícios pessoais e despendem esforços extras nas atividades desenvolvidas no dia a dia. São comprometidos, procuram satisfazer ou superar as expectativas quanto às exigências de qualidade, buscam informações, definem metas e objetivos com clareza, são persuasivos, independentes e autoconfiantes, mantêm seu ponto de vista e, a partir de um planejamento, monitoram sistematicamente os resultados a fim de mudar as estratégias, se preciso. Tabela 6.1Características dos empreendedores, segundo Dornelas.6 Visionários Dedicados Organizados Sabem tomar decisões Otimistas Planejadores Fazem a diferença Independentes Possuem conhecimentos Buscam oportunidades Líderes Assumem riscos calculados Determinados e dinâmicos Bem relacionados Criam valor para a sociedade Para Morais, os empreendedores não acreditam em fracassos e demonstram disposição e coragem para superar os obstáculos.7 Por terem o sucesso como objetivo, esperam sempre o melhor e estão sempre preparados para vencer. Para Bueno, Leite e Pilatti, o empreendedor está empenhado em aperfeiçoar as características que o diferencia dos outros e busca autoconhecimento e atualização em relação ao meio em que atua.8 O empreendedor apresenta sensibilidade para os negócios, visão financeira e capacidade de identificar e aproveitar oportunidades, transformando ideias em realidade para melhorar a vida das pessoas, da comunidade e da sociedade. Por meio da combinação de características como criatividade, imaginação e perseverança, adquire habilidade para converter projetos em resultados concretos e bemsucedidos no mercado.5 O espírito empreendedor pode também estar presente em todas as pessoas que, mesmo sem iniciar o seu próprio negócio, são engajadas e comprometidas em alcançar os objetivos de uma organização, que trabalham e assumem riscos moderados e apresentam soluções inovadoras continuamente. Elas são consideradasintraempreendedores. Características do empreendedor no setor de alimentação ▶ O segmento de alimentação representa atualmente 2,4% do PIB brasileiro; além disso, o hábito de alimentação fora de casa cresce cada vez mais e corresponde a 26% dos gastos dos brasileiros com alimentos.9 Portanto, o setor requer de seus gestores, nutricionistas, gastrônomos, gerentes e proprietários um sentido de empreendedorismo bastante apurado. Tratase de um setor com enorme potencial na geração de trabalho, com cerca de um milhão de empresas que produzem seis milhões de empregos diretos em todo o país. Para manter equipes motivadas e preparadas para ofertar um tratamento adequado para os clientes há necessidade de se contar com um gestor com atitude empreendedora. As equipes são responsáveis pela produtividade, pela qualidade e pelaexcelência na prestação de um serviço, e também pelo diferencial e pelo sucesso organizacional; portanto, cabe ao líder desenvolver competências e habilidades por meio de orientação, transmissão de conhecimento, estímulo, valorização e recompensa, a fim de constituir um ambiente de trabalho salutar e harmonioso, mantendo o padrão e a qualidade do produto final. No binômio alimentaçãonutrição e na gastronomia, a cada momento surge uma nova alternativa de negócio e uma nova expectativa por parte dos clientes, cada vez mais exigentes. Os gestores devem ser criativos e saber tomar decisões que atendam aos desafios desse cenário, superando situações de adversidade e se diferenciando da concorrência. Qualquer ação criativa é imediatamente notada pelo mercado consumidor, fidelizando o cliente, promovendo maior movimento com reflexo positivo. O espírito empreendedor envolve paixão pela atividade. Esse sentimento é o principal fator para a automotivação do líder, tornandoo capaz de inovar e impulsionar o desenvolvimento de produtos e serviços, em que, no caso do setor da alimentação, o sabor e o atendimento são aspectos fundamentais para o sucesso. O planejamento também merece destaque. Ter ampla visão do negócio implica ganhos com produtividade mais eficiente e menores perdas relativas ao desperdício, haja vista a alta perecibilidade da maioria dos produtos. Todas as atividades, assim como os eventos relacionados ao segmento de alimentação, dependem de planejamento, organização e adoção de estratégias e controles eficazes que promovam um negócio sustentável dentro de um mercado em expansão. Formação do empreendedor Empreendedores inatos são aqueles que nascem com capacidade de empreender; porém, é possível desenvolver características fundamentais para o sucesso de um negócio.6 O ensino da arte de empreender em universidades teve um crescimento elevado a partir da década de 80.10 O avanço tecnológico, a sofisticação da economia e dos meios de produção e serviços alavancou a necessidade de formalizar conhecimento sobre o empreendedorismo.6 Considerandose uma retrospectiva do panorama mundial, em 1947 a Harvard Business School criou o primeiro curso sobre gerenciamento de pequenas empresas. Em 1953, na New York University, Peter Drucker ministrou o primeiro curso sobre empreendedorismo e inovação. A University of Colorado, em 1956, promoveu uma conferência sobre desenvolvimento de pequenos negócios, que fez surgir o International Council for Small Business (ICBS), a maior associação voltada para pesquisas sobre empreendedorismo na ocasião. Em 1978, a Babson College of Boston, um dos maiores centros de formação de empreendedores do mundo, instituiu a Academy of Distinguished Entrepreneurs, visando premiar os empreendedores de “classe mundial”.10 No Brasil, o ensino sobre empreendedorismo está consolidandose como disciplina nos cursos de graduação e pósgraduação dos principais centros acadêmicos do país, apresentando uma evolução desde 1981.11 Para se formar um empreendedor devese ensinar estratégias metodológicas concentradas no desenvolvimento do autoconhecimento, que despertem aptidões como a iniciativa, a autonomia, a autoconfiança e a ousadia, a perseverança, a criatividade, a liderança, a flexibilidade, a visão estratégica e a visão sistêmica, o senso de oportunidade, a praticidade, a assertividade e o espírito inovador.10 Outra habilidade que o empreendedor deve adquirir é oknowhow para traçar objetivos, identificar oportunidades de negócios e saber como explorálas, desenvolver novas ideias, ter visão de futuro, antecipandose aos fatos, planejar e estruturar organizações e projetarse nessas organizações.12 Um meio de tornarse empreendedor é aprender o comportamento empreendedor a partir de experiências vivenciadas no cotidiano, maneiras de como administrar as adversidades e a lidar com fatores internos e externos ao negócio, assim como novos meios de tomar decisões, analisar situações, refletir e correr riscos.8 O gestor, para ser um empreendedor, deve vizualizar o que quer realizar a partir de suas necessidades e buscar, além da formação acadêmica que garante o desenvolvimento pessoal e profissional, meios para identificar as suas ■ ■ limitações quanto ao autoconhecimento e reconhecer os próprios sentimentos, a automotivação e o relacionamento interpessoal, com o propósito de aperfeiçoar esses aspectos ligados ao comportamento e à qualidade pessoal, base para o bom desempenho das organizações. A criatividade e a capacidade de inovação são atributos essenciais de um indivíduo empreendedor, assim como a liderança. Alguns aspectos sobre essas duas características básicas devem ser destacados, pois, de acordo com essa concepção, os empreendedores conseguem “fazer a diferença” com qualidade e valores diferenciados dos demais indivíduos. Criatividade O ser humano tem a capacidade inata de ser criativo. O que difere entre as pessoas é o grau desse potencial, que depende do meio, de estímulos, das limitações apresentadas e dos bloqueios impostos.13O exercício do potencial de criatividade ligase à psicologia do indivíduo, tal como o comportamento se liga à personalidade.13 Para desenvolver o potencial criativo é preciso estar disposto a superar os bloqueios e ter atitudes a partir das quais serão aplicadas soluções criativas para os desafios do dia a dia. É preciso uma avaliação constante das ações tomadas, bem como autoconhecimento, que é extremamente valioso para o desenvolvimento do comportamento criativo.13 A motivação é fundamental para promover mudança, que é a matériaprima da criatividade. Quando se realiza uma tarefa com entusiasmo, ou quando metas ou objetivos são propostos, acendese uma força interior, despertase uma energia contagiante para alcançálos, mobilizando competências e contribuindo para o crescimento da capacidade criativa.14 A realização pessoal é outro caminho para provocar a motivação necessária à criatividade. A pessoa certa no cargo certo, exercendo uma função que a motiva, transformase numa pessoa dinâmica e criativa, que exige o máximo de si e corresponde à expectativa das organizações.14 Não basta que a pessoa seja inteligente e, dentro do seu campo, competente. A pessoa criativa deve ser independente, necessitando de uma mente estocada de informações advindas de uma curiosidade geral, flexível para adaptarse a novas situações, disposta a rever valores, sensível e com capacidadede de comunicação.15 O potencial de criatividade de cada ser humano é ilimitado e muitas vezes permanece adormecido. A busca dos caminhos para o desenvolvimento da criatividade possibilita a revelação dos recursos necessários para a evolução desse processo, bem como a maneira de afastar seus inimigos. Vários fatores, tanto pessoais como profissionais inibem a criatividade dentro das organizações. Entre os mais comuns, podemse citar: medo do ridículo; timidez; pessimismo; acomodação; insegurança; excesso de regras; bomsenso ao extremo; convicção do sucesso; busca excessiva por certezas; falta de abertura para novas ideias; a rigidez na gestão; e atitudes autoritárias. O mais importante é abandonar qualquer julgamento inicial que possa abortar o processo, evoluindo e aparando arestas para uma conclusão sem julgamentos precipitados, e conscientizarse da necessidade de mudança de comportamento a fim de facilitar o desenvolvimento da criatividade. Os momentos de descontração, quando a mente não está atrelada ao raciocínio lógico, são perfeitos para as ideias criativas. É comum, depois de se procurar arduamente a solução de algum problema, visualizar a resolução exatamente no momento emque se afasta e se relaxa a mente, acomodando e eliminando a barreira da impossibilidade de ser criativo. Liderança O dicionário Michaelis afirma que líder é: “1. Chefe, guia; 2. Tipo representativo de um grupo; 3. Chefe de um partido político”.16Segundo o dicionário Infopédia, líder é: “1. Chefe, orientador, ou pessoa que chefia uma empresa, uma corrente de opinião ou um grupo; 2. Representante de uma bancada parlamentar; 3. Desporto: equipe ou atleta que ocupa o primeiro lugar em qualquer competição desportiva”.17 A liderança, portanto, é uma função do líder, chefia ou de alguém orientado à função de liderar. Segundo Vergara, liderança é a competência de alguém em exercer influência sobre indivíduos e grupos, de modo que tarefas, estratégias e missões sejam realizadas e resultados sejam obtidos. Os ingredientes que compõem essa competência encontramse na aprendizagem contínua.18 Na visão de Chiavenato, “a liderança é um tipo de influência pessoal por meio da qual o empreendedor – o líder – influencia o comportamento dos subordinados para direcionálo e impulsionálo rumo aos objetivos que se pretende alcançar”.5 No contexto gerencial, o gestor tem como atividades primordiais planejar, organizar, dirigir, controlar e tomar decisões, com a finalidade de alcançar objetivos predeterminados, portanto passa a ser seguido e respeitado pelo cargo que ocupa e não pela pessoa em si. Por outro lado, a liderança fundamentase na competência do gestor em influenciar pessoas e grupos, de tal modo que eles passam a seguir o líder pela sua qualidade, pela admiração à pessoa e pela sua missão dentro da organização, em busca de estratégias e soluções para a obtenção de resultados.19 Dessa maneira, entendese que liderança é diferente de gerenciamento. O gerenciamento está relacionado a organizar recursos, enquanto a liderança está relacionada a influenciar as pessoas para obterse resultados e lidar com desafios.19 Existem comportamentos e ações que precisam ser liderados. O gestor, ao liderar sua equipe, deve estimular os colaboradores a desenvolverem suas carreiras, melhorarem seu desempenho, fazerem escolhas cuidadosas, comprometeremse com a empresa, terem uma visão clara do futuro e serem éticos.18 As pessoas são capazes de realizar obras incontestáveis. No entanto, é preciso saber conduzilas e estimulálas por meio da liderança e da motivação. Liderança e motivação constituem o alicerce da administração participativa das pessoas.5 Segundo Vergara, a liderança é um processo contínuo de aprendizagem.18 O líder precisa aprender que diante de determinadas situações responderá a valores e crenças que para ele parecem adequados e verdadeiros, porém não necessariamente o são para os outros. É preciso conhecer as características pessoais, os valores, e as expectativas dos liderados e mostrar sensibilidade para identificar as diferenças e conseguir transformar motivações em ações. Por fim, é necessário compreender o contexto organizacional e social para aplicar um estilo de liderança específico conforme as exigências e características da situação. Atualmente, a tendência é a de que o líder é aceito não pelo nível hierárquico que ocupa, e sim pela maneira de relacionarse e direcionar a equipe. A autoridade passa a ser uma conquista, porém devese levar em conta os objetivos a serem alcançados, a equipe e as atividades a serem executadas para que a liderança seja eficaz.5 O líder tem de ser o seu próprio líder. Desse modo, desenvolve com a sua equipe, com os seus pares e na própria organização características de liderança, procurando em cada ação vivenciálas. A valorização dos colaboradores, o reconhecimento do trabalho, a transparência nas ações, a imparcialidade, o respeito, o fazer bem feito e não o mais fácil são qualidades essenciais para adquirir o comprometimento da equipe na execução de novos projetos idealizados pela empresa. O líder deve ter força e energia para executar ações, estar preparado para adversidades e persistir a fim de vencer as barreiras, realizar ações em conjunto com a equipe, estar disponível para transmitir seus conhecimentos à equipe, apresentar a qualidade do saber comunicar, entender as ameaças e as oportunidades do mercado e ser um exemplo e positivo, criando um ambiente saudável e incutindo confiança para o desenvolvimento do trabalho. A criatividade e o espírito inovador são fatores fundamentais para o sucesso do empreendedor na área de alimentação, principalmente quando se trata do produto final e serviços. No setor de alimentos industrializados, o empreendedor deve estar atento a novos alimentos, novos ingredientes e novos produtos que vão ao encontro das atuais expectativas de mercado e que asseguram o sucesso de uma empresa a longo prazo. É preciso considerar que as mudanças na composição de um produto podem demandar mais tempo em função da regulamentação e legislação. Assim, características empreendedoras aplicadas, como criatividade e inovação direcionadas ao desenvolvimento da embalagem e da apresentação de um produto, a fim de tornálo atrativo e competitivo no segmento, são fundamentais para o aumento de vendas e o crescimento da empresa. Um exemplo clássico é o dos ovos de páscoa e panetones, que apresentam poucas mudanças em termos de formulação, mas promovem, na criatividade de embalagens e promoções o seu diferencial, conquistando a atenção do consumidor. No setor de serviços de alimentação, incluindose em um segmento compreendendo os restaurantes do tipofast food, os restaurantes tradicionais, os focados em certos tipos de alimentos, os restaurantes a quilo ou pratos feitos e os hotéis, cafés e bares, e em outro as refeições coletivas para empresas, escolas, universidades e instituições sociais, o empreendedor deve estar atento, todos os dias, às alterações que agregam valor ao seu produto. Os clientes buscam conveniência, prazer, entretenimento, variedade, rapidez, atendimento e preço justo, demandas que devem ser atendidas prontamente pelo estabelecimento. O líder deve apresentar sensibilidade para identificar as necessidades dos clientes e, ao mesmo tempo, identificar os anseios da equipe a fim de moldála e direcionála para apresentar um produto que seja a solução para um problema ou necessidade de alguém. O empreendedor desse setor deve acompanhar as mudanças constantes sem se deixar influenciar pelo medo ou ▶ pelas barreiras, fugindo do estável, encarando os desafios e buscando novas alternativas que atraiam os clientes. As pequenas mudanças relativas ao ambiente, à capacitação e à motivação da equipe no que se refere ao modo de atendimento, à atenção e ao carinho que devem ser disponibilizados ao cliente, assim como as alterações de cardápio, tanto em relação à apresentação com ao desenvolvimento de novas receitas ajustadas à cultura local, são decisões claras de um profissional criativo e inovador que apresenta características exigidas pelo mercado atual. Processo empreendedor nos novos negócios O mundo sofreu várias transformações a partir do século XX, momento em que ocorreram mudanças devido ao desenvolvimento da tecnologia que criou novas invenções em todos os segmentos.6 A chegada do século XXI foi marcada por algumas características: o mundo globalizado e a emergência de uma nova sociedade – que se convencionou chamar de sociedade do conhecimento – trouxeram inúmeras transformações em todos os setores da vida humana. O progresso tecnológico é evidente e a importância dada à informação é incontestável.20 Um novo ambiente de negócios está surgindo, levando as organizações a um processo de transformação tanto na maneira de realizar seus negócios como na estrutura interna. Essas mudanças decorremda crescente globalização, do alcance da maturidade de amplos segmentos do mercado e do avanço das telecomunicações, da capacidade de difusão de informações e do uso intenso da Tecnologia da Informação e da Gestão, que têm provocado alterações na natureza do trabalho.8 O processo de interação de quebra de barreiras geográficas, sociais, culturais e comerciais e a sofisticação dos meios de produção e serviços implicam na necessidade cada vez maior de empreendedores renovarem conceitos econômicos, criarem novas relações de trabalho e empregos, além de novos paradigmas, e aplicarem estratégias inovadoras e inteligentes que respondam às demandas do mercado.6 O processo empreendedor engloba todas as atividades relacionadas à criação de novos negócios, ou seja: identificar e avaliar uma oportunidade de acordo com as necessidades de mercado; desenvolver um plano de negócios que abarque um conjunto de informações sobre o futuro empreendimento e defina suas principais características e condições para proporcionar uma análise de viabilidade e de riscos; captar os recursos necessários para programar o negócio, como talento – pessoas, tecnologia – ideias e capital – recursos; e gerenciar a empresa.5 Segundo Dominguinhos, Pereira e Silveira, níveis de conhecimento elevados, assim como experiência profissional, estão fortemente associados a maior propensão para identificar oportunidades empreendedoras.21 As qualificações formais, as competências técnicas e o knowhowadquirido durante a trajetória profissional são essenciais para a criação de um negócio. Segundo esses autores, as redes pessoais e empresariais desempenham um papel relevante na mobilização de recursos externos, como acesso a clientes, fornecedores, capital e contratação de empregados, sendo fundamentais em todas as fases do processo empreendedor, impulsionando o empreendimento.21 A crise econômica que abalou o mundo em 2010 criou incertezas quanto aos novos negócios e aos negócios em desenvolvimento, pois não se tinha ideia acerca de sua dimensão. O Brasil, ao contrário do que foi observado em crises econômicas mundiais anteriores, estava mais preparado e protegido, inclusive em termos de reservas e recursos próprios. Houve, portanto, otimismo de grande parte dos investidores em relação ao país, que mantiveram seus projetos com os devidos ajustes. É possível verificar que essa crise não prejudicou o empreendedorismo no Brasil; muito pelo contrário, contribuiu com o aparecimento de novas oportunidades para as micro e pequenas empresas, além de ter incentivado a continuidade de projetos que estavam em andamento. Com a sua primeira edição em 1999, a pesquisaGlobal Entrepreneurship Monitor (GEM) é o maior estudo contínuo sobre a dinâmica empreendedora do mundo. Nos seus 13 anos de existência, já foram consultados mais de 80 países. Em 2010, o Brasil participou pela 11avez. Verificouse, nessa pesquisa que apenas a China tem mais empreendedores do que o Brasil.22 Isso demonstra a vocação empreendedora dos brasileiros, pois o empreendedor é um dos grandes responsáveis pelo crescimento da economia e do desenvolvimento sustentável de um país, incentivando o desenvolvimento social e ambiental e consequentemente elevando o bemestar da população. A taxa de atividade empreendedora observada foi de 17,5%; considerandose uma população adulta no país em torno de 120 milhões de pessoas, esse valor representa 21,1 milhões de brasileiros empreendendo em 2010.22 O crescimento da atividade empreendedora no país não é apenas quantitativo, mas também qualitativo. O ▶ empreendedorismo por oportunidade, mais benéfico para a economia do país, foi maior quando comparado com o empreendedorismo por necessidade; a proporção foi de 2,1 empreendedores por oportunidade para cada empreendedor por necessidade.22 Ainda no Brasil em 2010, entre os empreendedores por oportunidade, 43% buscavam maior independência e liberdade na vida profissional; 35,2% desejavam aumentar a renda pessoal; 18,5% procuravam apenas manutenção de sua renda pessoal, enquanto 3,3% citaram outros motivos para empreender, ou seja, 78,2% vislumbraram uma oportunidade de aprimorar a vida com o negócio que abriram.23 Administração empreendedora Organizações são unidades sociais estruturadas a fim de alcançar objetivos específicos. Elas podem ser consideradas um organismo social vivo, pois estão em constante mudança, e utilizamse de métodos adequados para alcançar os objetivos propostos, promovendo desenvolvimento e busca da excelência.24 As organizações podem ser empresas, indústrias, hospitais, escolas ou universidades e, ainda, lucrativas, não lucrativas, governamentais, não governamentais, nacionais, multinacionais ou mundiais.24 Devem investir nos recursos e nas competências para obter uma administração de sucesso. O dicionário Michaelis (2012b) afirma que administração é: 1. Ato de administrar; 2. Governo; 3. Direção de estabelecimento; 4. Casa onde se trata de assuntos de administração pública ou particular; 5. O corpo de funcionários administrativos de uma repartição pública ou de uma empresa particular; 6. Ato de ministrar (sacramento); 7. Ação de dar a tomar (medicamentos); 8. Estudo dos fatos e princípios da arte de administrar.25 Segundo o dicionário Infopédia, administração é: “1. Ação ou efeito de administrar; 2. Gestão de negócios públicos ou privados; governo; 3. Gestão (de negócios, patrimônio); 4. Gerência; 5. Direção (de empresa)”.26 A administração, portanto, é uma função do gestor. As empresas necessitam de um esforço especial para se tornarem empreendedoras e inovadoras; não se pode partir do pressuposto de que o empreendimento e a inovação são atividades naturais, criativas e espontâneas. A administração empreendedora pode ser alcançada por qualquer empresa, desde que ela se empenhe para isso.3 A administração empreendedora requer diretrizes para sua aplicação: a primeira é a inovação. Cada administrador de uma empresa deve estar consciente de que a inovação deve fazer parte da rotina e, como tal, ser considerado um dos fatores determinantes para preservar a organização. A segunda é a necessidade de análise e diagnóstico do ciclo de vida dos atuais produtos, serviços, mercados, canais de distribuição, processos e tecnologias, pois eles têm vida limitada. A terceira é a necessidade de formular um plano empreendedor com objetivos para a inovação e prazoslimite, uma vez que se tem ciência da lacuna de inovação e de sua necessidade.3 Fernandes e Santos realizaram um estudo para investigar as consequências da orientação empreendedora naperformanceempresarial e comparar sua influência com a de outros tipos de orientação organizacional.27 Foi desenvolvido e testado um modelo teórico retratando os interrelacionamentos entre orientação e cultura organizacional – orientação empreendedora, orientação para o mercado e aprendizagem organizacional – e seu impacto no sucesso das inovações e naperformanceempresarial. Foram aplicados questionários aos principais executivos: (75% homens e 59% diretores comerciais) de 157 empresas de diversos tamanhos e setores de atuação, (52 empresas revendedoras de aço para outras empresas, 30 do setor agroindustrial e 75 fabricantes de diversos produtos de aço), pertencentes aos três estados da região Sul do país. De acordo com os autores, os efeitos da orientação empreendedora naperformanceempresarial são maiores do que aqueles da orientação para o mercado, os quais influenciam mais fortemente o sucesso das inovações. Essas duas orientaçõessão complementares e seu efeito conjunto fornece resultados compatíveis com as ações empresariais. O empreendedorismo tornase uma questão de relevância para as organizações pois apresentam efeito fundamental naperformance e no impacto indireto no sucesso das inovações. Uma empresa, comunidade ou região que possua cultura empreendedora, fundamental ao desenvolvimento econômico, é diferenciada, pois consegue aproveitar novas oportunidades e, com essa inovação, desenvolve um ambiente de trabalho pautado em estratégias e planejamento, alicerces da cultura empreendedora, criando forte vantagem competitiva para si e consequente aumento de oportunidades de negócios.28 Russo e Sbragia realizaram um estudo transversal com 164 gerentes de projetos, na maioria homens, pós graduados e experientes, com a finalidade de avaliar se as características de um empreendedor quando incorporadas no perfil de um gerente se refletem em projetos mais bemsucedidos do ponto de vista empresarial. Para definição das características do empreendedor corporativo, no instrumento de pesquisa foram empregadas as mais significativas qualidades associadas à pessoa empreendedora, e, para avaliar essas dimensões, foi utilizado o teste de tendência empreendedora geral (TEG), desenvolvido na Unidade de Formação Empresarial e Industrial da Durham University Business School. Os dados obtidos mostraram que as associações positivas, ainda que de baixa magnitude, encontradas entre o nível de tendência empreendedora do gerente e o nível de sucesso dos projetos reforçam a indicação de que as organizações precisam preocuparse em criar mecanismos incentivadores para essa função, utilizandose de visão e estratégias claras, estímulos à diversidade, cultura interna propícia e instrumentos motivacionais. Segundo os autores, seria importante limitar os fatores inibidores ao aproveitamento das características empreendedoras do gerente de projetos, como burocracia, centralização do poder, cultura resistente a mudanças e ambiente tradicional e paternalista.29 As empresas devem instituir uma cultura visionária em todos os níveis organizacionais, de modo que a característica visionária não seja encontrada apenas no líder, mas em todos os colaboradores também, incentivando atitudes próativas e empreendedoras.30 Segundo Martens, Freitas e Andres, a orientação empreendedora e o gerenciamento empreendedor caracterizam uma organização empreendedora, ou seja, uma organização com postura empreendedora.31 A organização empreendedora apresenta cinco dimensões, a saber: inovatividade; assunção de riscos; próatividade; autonomia; e agressividade competitiva. A inovatividade referese a apoiar novas ideias, novos experimentos, os quais resultam em novos produtos, serviços ou processos. A assunção de riscos é a tendência da organização a assumir riscos e envolverse em projetos de alto risco. A próatividade é comprovada naquelas organizações que buscam novas oportunidades, se antecipam ao mercado e procuram olhar sob a perspectiva do futuro para novos negócios, apresentando iniciativas inovadoras, favorecendo mudanças e influenciando o ambiente. A autonomia tem relação direta com a equipe; a organização favorece a ação independentemente das pessoas. E a agressividade competitiva está relacionada ao comportamento da empresa em atuar competitivamente com os concorrentes, responder a tendências e demandas que já existem no mercado e apresentar respostas frente às ações da concorrência. Recursos intangíveis, como a capacidade de inovação de uma empresa, têm sido constantemente apontados como a fonte de vantagem competitiva da empresas de sucesso, porém a literatura refere dificuldades na mensuração da inovação e no estabelecimento da sua relação com o desempenho das empresas. Brito, Morganti e Brito desenvolveram um estudo com o objetivo de analisar a relação entre a inovação e o desempenho de empresas no ambiente brasileiro, utilizando dados da Pesquisa Industrial – Inovação Tecnológica do IBGE, considerando desempenhos como o de crescimento e o de lucratividade. Verificaram que o investimento em inovação teve uma relação positiva e estatisticamente significativa com a maior taxa de crescimento da empresa, enquanto a hipótese de que o investimento em inovação estivesse associado à maior lucratividade foi rejeitada; portanto, o esforço inovador tende a afetar mais o crescimento de uma organização do que sua lucratividade.32 Embora as atividades inovadoras sejam intangíveis pela sua própria natureza, é necessário que a empresa, para ser receptiva à administração empreendedora, inclua em suas metas de avaliação e controle a avaliação do desempenho inovador. Primeiramente, é preciso fazer umfeedback dos resultados de cada projeto inovador de cada área em relação às suas expectativas iniciais. Dessa maneira, é possível identificar a confiabilidade e a qualidade dos esforços inovadores. Em seguida, é necessário desenvolver um monitoramento sistemático, examinando em conjunto se os planos empreendedores estão no caminho certo ou não, se vale a pena continuar investindo ou não nos produtos e nos processos de cada área, sem se esquecer de analisar o desempenho inovador dos concorrentes. E, para finalizar, a empresa também deve avaliar o desempenho inovador dos objetivos, além de sua posição empresarial e no mercado como um todo. Essa avaliação, embora nem sempre passível de quantificação, torna possível agir com deliberação, com base no conhecimento e em análise rigorosa, não arbitrária e subjetiva.3 O panorama dos negócios está se modificando frente ao mercado globalizado, instável e altamente competitivo, exigindo que as empresas busquem uma administração empreendedora, investindo de modo contínuo em inovação de produtos, processos e estratégias de mercado. Elas são constituídas de profissionais com características empreendedoras, capazes de identificar novas oportunidades de negócios, que apresentam visão de futuro e são criativos, líderes, inovadores, arrojados e são persistentes, profissionais que buscam alcançar os objetivos propostos e contribuir para seu crescimento e desenvolvimento. ▶ 1. 2. 3. 4. 5. 6. 7. 8. 9. 10. 11. 12. 13. 14. 15. 16. 17. 18. 19. 20. 21. 22. 23. 24. 25. 26. 27. Referências bibliográficas FILION, L. J. Empreendedorismo: empreendedores e proprietáriosgerentes de pequenos negócios.Rev. Admin. São Paulo, v. 34, n. 2, p. 528, abr./jun. 1999. DUTRA, I. S.; PREVIDELLI, J. J. Fatores condicionantes da mortalidade de empresas: um estudo dos empreendedores de micro e pequenas empresas paranaenses. Rev. Cap. Cient., Guarapuava, PR, v. 3, n. 1, p. 2950, jan./dez. 2005. DRUCKER, P. F.Inovação e espírito empreendedor (entrepreneurship):prática e princípios. 2a ed. São Paulo: Pioneira, 1987. 378 p. SCHUMPETER, Joseph A. 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A Revolução Industrial é, certamente, um marco na escala de intervenção humana no meio ambiente. Segundo Robert: “O começo de tudo pode ser atribuído à invenção de um homem. O homem era Thomas Newcomen. O invento foi a bomba a vapor. O ano era 1712 e o que começou foi a Revolução Industrial”.1 O invento da bomba a vapor resolveu o problema, na Inglaterra, da água nas minas de carvão, que precisava ser retirada para que os mineiros aproveitassem melhor o tempo de mineração. Com isso, a natureza começou a ser explorada pela força de uma máquina visando ao aumento da produtividade. A partir daí, o modelo de gerenciar as organizações continuou sendo, predominantemente, aumentar a produtividade a qualquer custo, incluindo o custo ambiental e o social. Os recursos naturais eram percebidos como ilimitados, originando a extraçãodescontrolada. Do mesmo modo, os resíduos oriundos da exploração retornavam poluídos à natureza, devido à suposição de que, por maiores que fossem os impactos e a poluição, a própria natureza daria conta deles.1 Esse foi o modelo adotado pela Revolução Industrial – retirar, fabricar, desperdiçar e poluir visando ao aumento da produtividade do trabalho, ao crescimento e à prosperidade.2 Embora a Revolução Industrial realmente tenha proporcionado crescimento econômico, melhoria da qualidade de vida em alguns países e aumento da expectativa de vida, trouxe também uma série de impactos negativos para a natureza e a sociedade. Ela deu origem ao capitalismo moderno aumentando a possibilidade de crescimento, expandindose até hoje, porém com um custo socioambiental elevadíssimo, fazendo circular alto capital criado pelo ser humano, mas acarretando em declínio do capital natural em recursos utilizados pela humanidade. Segundo Hawken, nós herdamos 3,8 bilhões de anos de capital natural, mas, se mantivermos o uso descontrolado e desenfreado desses recursos, muito pouco desse capital restará ao final do século XXI.2 O desenvolvimento acelerado inverteu os papéis de escassez de recursos humanos e abundância dos recursos naturais, e, após dois séculos de aumento da produtividade do trabalho, o capital humano passou a ser o recurso em abundância, e os recursos naturais, os recursos escassos. Esse modelo criou uma série de externalidades que produziram degradações ambientais que poderiam causar problemas irreversíveis na natureza e na sociedade, refletindo no desenvolvimento da economia mundial. A economia globalizada tem como referência central o crescimento econômico dos países e das organizações. Tal crescimento requer modelos de gestão direcionados para as alternativas com maiores retornos, em que o capital pode ser mais rentável. Porém, tal crescimento requer a aplicação de práticas responsáveis considerando a sociedade e o meio ambiente. ▶ Nesse cenário, na busca de um processo contínuo de crescimento, as organizações passam a depararse com novas e maiores demandas provenientes da sociedade, cujo modo de consumo e necessidades encontramse em constante mudança. Como consequência surgem continuamente novos insumos, formulados por novos elementos, que acarretam novos rejeitos, sejam efluentes, resíduos sólidos ou emissões de gases, o que resulta em novos potenciais impactos, pois são esses os novos agentes geradores de grandes riscos ao meio ambiente e à sociedade. Diante desse modelo de crescimento, a relação dos negócios com as questões socioambientais alterna momentos de sinergia e de antagonismos, resultando num processo de constante e crescente degradação dos ecossistemas naturais e da base de recursos ambientais, decorrente de impactos contínuos e cumulativos, como os desmatamentos,a desertificação, as mudanças climáticas, a poluição das águas e do solo, potencializados por eventos agudos, como os grandes acidentes ambientais.3 Ressaltando a necessidade de mudança, Milton Friedman, Prêmio Nobel de Economia e mentor da Escola de Chicago, resume a visão empresarial do último século: “O negócio do negócio é o negócio”,2destacando o fato de a preocupação com o meio ambiente e com a sociedade não ter sido adequadamente inserida na pauta das organizações e do mercado. O foco da gestão empresarial ainda é o lucro a qualquer preço, considerando os recursos sociais e ambientais abundantes e ilimitados. Os investimentos socioambientais realizados pelas organizações até pouco tempo eram considerados uma ação de marketing ou uma obrigação legal, mas jamais algo lucrativo ou relacionado à estratégia de crescimento da organização.3 Podese afirmar que, hoje, esse cenário se altera devido aos desafios trazidos pela globalização e devido ao mundo capitalista exigir a conquista de níveis cada vez maiores de competitividade e produtividade, porém com uma preocupação crescente com a legitimidade socioambiental das empresas e mercados. Isso vai ao encontro das ideias de Formentini e Oliveira, ressaltado que o atual ambiente empresarial aponta para dois pontos extremos: o aumento da produtividade, em função das tecnologias e da difusão de novos conhecimentos, que leva as empresas a investirem mais em novos processos de gestão, buscando a competitividade, e o aumento nas disparidades e desigualdades da nossa sociedade, que obrigam as organizações a repensarem os sistemas econômicos, sociais e ambientais.4Essa visão divergente do mundo empresarial é a questãochave para a reestruturação dos modelos de negócios. Organizações, governos e sociedade precisam unir esforços na busca de um novo saber, repensando suas posturas e estratégias para crescimento e desenvolvimento enquanto há tempo. Evolução do conceito A preocupação com os problemas ambientais ganha escala e repercussão no final da década de 1960 e no início dos anos 1970. Tais preocupações pareciam ser apenas locais e sua solução se resumia à regulamentação das fontes de poluição advindas das chaminés e de canos de escapamentos.5 Discussões sobre os impactos ambientais causados pelo desenvolvimento e pela industrialização aconteceram após a criação do Clube de Roma, na Itália, formado por cientistas que estavam preocupados com os impactos causados pelo crescimento econômico e com a disponibilidade dos recursos naturais do planeta. Nos mesmos anos, Aurélio Peccei e o grupo reunido no Clube de Roma começam a alertar sobre os limites do crescimento, em sintonia com o trabalho de economistas como Nicholas GeorgescuRoegen, admitindo pela primeira vez que, no futuro, o desenvolvimento poderá coexistir com o encolhimento ou a estagnação da economia, mas não com o crescimento.3 O relatório “Os limites do crescimento”, elaborado por Meadows, Randers e Meadows, marca o início dos estudos do relacionamento entre meio ambiente e crescimento econômico e enfatiza que a exploração e a degradação dos recursos naturais limitariam o crescimento da economia mundial.6 Ainda nessa época surge o termodesenvolvimento sustentável, originado do conceito de ecodesenvolvimento. Em 1972, na Suécia, acontece a Conferência das Nações Unidas sobre o Ambiente Humano, promovida em Estocolmo, que discute a relação entre desenvolvimento e meio ambiente.7Porém, no início da década de 1980, segundo Holliday, o esforço pelo desenvolvimento parecia ter fracassado, e grande parte dos países apresentava estagnação econômica e grandes dívidas. O meio ambiente estava mal gerenciado, e nem os programas das Nações Unidas pareciam apresentar grandes resultados nesse ponto.8 A questão ambiental retorna à agenda política, inserindo os problemas ambientais no contexto global, visto que os problemas causados por chuvas ácidas, camada de ozônio e aquecimento global atingiam diversos países. Os cientistas buscavam as causas não mais em chaminés e tubos de escapamentos, mas também na natureza das atividades humanas.5 Estudos e relatórios são apresentados com a mesma conclusão de que a maneira de se produzir o desenvolvimento das organizações e consequentemente dos países é insustentável, tornando o conceito de desenvolvimento sustentável pauta principal das discussões relacionadas ao meio ambiente e ao desenvolvimento. Em 1987, a Assembleia Geral das Nações Unidas instituiu a Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (World Commission on Environment and Development, WCED) composta de 21 membros, sob a presidência da PrimeiraMinistra de Meio Ambiente da Noruega, Gro Harlem Brundtland. Essa comissão, conhecida como Comissão de Brundtland, inseriu o desenvolvimento sustentável como tema constante em seu relatório, "Nosso Futuro Comum".9 Segundo o relatório: Não pode haver um único esquema de desenvolvimento sustentável, já que os sistemas econômicos e sociais de cada um diferem de país para país. Cada nação terá de avaliar as implicações concretas de suas políticas. Mas apesar destas diferenças, o conceito de desenvolvimento sustentável deve ser encarado como um objetivo de todo o mundo.9 De acordo com Holliday, além do conceito de desenvolvimento sustentável, outra iniciativa da Comissão pode ser considerada duradoura. Nas últimas páginas do relatório, instouse que se fizessem os preparativos para uma conferência internacional sobre o desenvolvimento sustentável.8 Em 1992, a discussão sobre o desenvolvimento sustentável volta a ganhar ritmo, quando a Organização das Nações Unidas (ONU) traz 108 presidentes e primeirosministros para participarem da Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento. Vinte mil representantes civis discutem o mote atribuído, por muitos, ao cientista e ambientalista norteamericano Barry Commoner – “pensar globalmente, agir localmente” –, por meio do Fórum Global, o que consolidou o conceito de desenvolvimento sustentável e lançou uma série de documentos fundamentais, tais como a ConvençãoQuadro de Mudanças Climáticas, a Convenção da Diversidade Biológica e a Agenda 21.3 Nesse último documento, cada país comprometeuse a definir sua própria agenda, promovendo parcerias e introduzindo meios de implantação de soluções para os impactos do desenvolvimento sustentável, revertendo os processos de insustentabilidade do modelo de desenvolvimento em vigor. A Agenda 21 contém recomendações de como acelerar de modo consistente a substituição dos atuais padrões de desenvolvimento vigentes no mundo, sendo que o objetivo comum a ser alcançado não está restrito apenas à preservação do meio ambiente, mas também ao desenvolvimento sustentável que introduz nessa discussão a busca do equilíbrio entre crescimento econômico, equidade social e preservação ambiental.10 Em 2002, a ONU promove outro encontro internacional, conhecido como Rio+10 ou Eco 2002, realizado em Joannesburg, na África do Sul. Nessa conferência, além de representantes dos países envolvidos, participaram também representantes de agências das Nações Unidas, organizações não governamentais, instituições financeiras e parte da sociedade. Seu principal objetivo foi buscar um consenso na avaliação geral das condições atuais e nas prioridades para ações futuras. Vinte anos passados, sediamos a Rio+20, que teve como principal objetivo revalidar o compromisso dos países e analisar a evolução dos compromissos assumidos na Eco 92. Podese ressaltar que, em paralelo com os impactos socioambientais decorridos do desenvolvimentoe da industrialização, a preocupação com o meio ambiente e com a sociedade é amplamente debatida em diversos fóruns globais e locais, embora poucos resultados sejam apresentados. Ainda assim, há meios de se interpretar o conceito de desenvolvimento sustentável, porém todos eles têm as mesmas características e parecem derivar para um consenso quanto ao conceito básico e às estratégias necessárias para sua consecução.9Nesse sentido, o desenvolvimento sustentável propõese, com prioridade, a reduzir as desigualdades sociais que cada vez mais separam países pobres de países ricos, criando fossos intransponíveis entre nações e também entre regiões, estados e municípios de um mesmo país. É imperativo, portanto, que se criem mais empregos e renda, além da busca constante pela valorização do capital humano e das conquistas no campo social. O fim último e essencial do desenvolvimento sustentável é, pois, a garantia de vida com qualidade para todos.10 Destacase, então, que o conceito de desenvolvimento sustentável não é único, mas converge para um consenso; sua essência é cada vez mais difundida e assimilada pelas organizações, o que possibilita um direcionamento em suas atitudes e a definição de suas estratégias. ▶ ▶ Modelo de gestão: integração de conceitos O desafio trazido pelo mundo globalizado e em desenvolvimento desenfreado resulta no desdobramento dos compromissos políticos assumidos pelas nações em relação ao mundo corporativo. Assim, as organizações precisam repensar seus modelos de negócios, objetivando valorar as ações de responsabilidade ambiental e social no seu core business. Os modelos de gestão conhecidos e aplicados pelas organizações, de certa maneira, seguem o mesmo princípio básico: planejamento, implantação, verificação e melhorias. Também se pode seguir o tradicional ciclo de gestão e melhoria do PDCA: plan(planejamento e estabelecimento de metas e objetivos); do(definição de métodos e ações para alcance das metas); check(acompanhamento da implantação das ações e alcance dos resultados); e action(agir no sentido de consolidar os ganhos obtidos e o alcance dos objetivos). Tal ciclo de gerenciamento foi criado na década de 1920 por Walter A. Shewarth, e em 1950 ficou conhecido como o ciclo de Deming, em tributo ao “guru” da qualidade, William E. Deming. Porém, tal método foi utilizado, na maioria das vezes, pelas organizações, com foco principal em melhoria de processos produtivos, com as definições de metas e objetivos relacionados à qualidade de seus produtos e ao aumento de sua produtividade. Diante dos fatos apresentados em relação aos impactos ambientais e sociais que estamos sofrendo, as organizações poderiam atrelar as metas de desempenho operacional – foco em resultado financeiro e satisfação de clientes – a metas de desempenho social e ambiental, seguindo os mesmos princípios básicos de gerenciamento. Desse modo, destacase o modelo de excelência da gestão, estabelecido pela Fundação Nacional da Qualidade, inspirado no Prêmio Deming (Japão), criado em 1951, e no Malcolm Baldrige National Quality Award (Estados Unidos), criado em 1987. Ele demonstra a integração das questões sociais e ambientais como modelo de negócio das organizações, além de descrever claramente a participação das lideranças na formulação das estratégias e planos, utilizando as informações e conhecimento que detêm de seu negócio e de seu mercado, considerando as necessidades e expectativas não somente dos clientes, mas também da sociedade. Nesse momento, destacase a inserção das expectativas da sociedade que incorpora as questões de responsabilidade social, bem como os impactos ambientais. Ainda assim, o modelo de gestão considera a implantação dessas estratégias por meio das pessoas (novamente considerando as questões sociais das pessoas que movem as organizações) e dos processos, culminando no resultado global da organização. Instrumentos de gestão Segundo Holliday, a questão do desenvolvimento sustentável é ignorada na maioria das organizações em todo o mundo. Porém, alguns líderes de negócios aderiram a esse conceito ao perceberem que, por trás desse movimento, há um esforço sério de desenvolvimento econômico para atender às necessidades das atuais populações para reagirem positivamente, comparando a sustentação do planeta com a sustentação da organização. Por outro lado, o mercado financeiro exige cada vez mais que as empresas cresçam. Muitos líderes perceberam que, para alcançar esse crescimento, a abordagem do desenvolvimento sustentável abre novas alternativas de crescimento. As organizações devem modificar seus sistemas de tomada de decisão e definição de estratégias considerando não mais apenas os aspectos econômicos, mas também os aspectos ambientais e sociais. Essa mudança de atitude virá em consequência das pressões exercidas pelas autoridades legais e pelas exigências internacionais e locais e de todas as suas partes interessadas. De acordo com Schmidheiny, há um crescimento do número de empresas de grande porte que estão adotando as estratégias de desenvolvimento sustentável e comprometendose com elas publicamente.5 Essas empresas estão ampliando seus conceitos e se comunicando mais abertamente com as partes interessadas. São consideradas aqui partes interessadas os públicos relevantes com interesses pertinentes à companhia ou ainda indivíduos ou entidades que assumam algum tipo de risco, direto ou indireto, em face da sociedade. Entre outros, destacamse: acionistas, funcionários, comunidade, clientes, fornecedores, credores, governos e organizações não governamentais.11 Os mecanismos, impostos ou voluntários, se forem adotados de maneira burocrática, podem acarretar custos para as organizações sem que agreguem valor ao seu negócio. Para gerar valor ao negócio da organização é preciso que as empresas insiram em sua estratégia a visão e a prática de contabilidade dos indicadores de sustentabilidade, como instrumentos de geração de valor, utilizando as ferramentas como instrumentos proativos de mudança de comportamento dos funcionários, integrando as práticas de sustentabilidade em toda a organização, em vez de confinálas em um departamento especializado. Diversas organizações têm uma visão convergente para esse conceito. Algumas empresas, por exemplo, vem informando há tempos que os acionistas lucram se a empresa atender às expectativas e necessidades legítimas de suas partes interessadas. Segundo Tapscott: A escola de pensamento que diz que a empresa, em troca dos muitos privilégios, benefícios e proteções que obtém junto a estas entidades, tem obrigações recíprocas para com elas, e que seu sucesso duradourodepende do alinhamento entre tais interesses e sua missão central. Ao fazer isso, a empresa tem a obrigação de minimizar ou compensar suas "exterioridades" negativas – impactos nocivos sobre as pessoas ou meio ambiente que resultam de suas atividades. E tem também a obrigação de tratar tais entidades com reciprocidade e responsabilidade, buscando a opinião delas para saber como esperam que seus interesses sejam considerados, e depois atenderem seus compromissos firmados. Em todos estes aspectos, a empresa deve identificar e trabalhar junto com suas partes interessadas. A razão para isso não é a obrigação ou a ética. É antes o fato de que, se as empresas agirem assim, terão maiores chances de prosperar.12 De acordo com Almeida, há empresas que lamentaram que seus produtos haviam se tornado sinônimo de trabalho escravo, horas extras e abusos funcionais e, que, mesmo depois de terem sido apanhadas praticando esses tipos de ações e terem reconhecido seu erro, lutavam para mudar seucomportamento, mas não conseguiam se livrar da imagem negativa.13 A mudança de visão das organizações empresariais requer instrumentos, ferramentas e metodologias para suportar as alterações necessárias em seus modelos de gestão. Nas últimas duas décadas, comprovase o desenvolvimento de diversos instrumentos, muitos deles desenvolvidos de maneira voluntária pela sociedade civil, buscando a promoção de melhores práticas sobre os conceitos de sustentabilidade, incluindo a questão da prestação de contas, na rotina empresarial. Tais instrumentos surgem em resposta à demanda de um comportamento empresarial mais responsável que se tornou crescente na atualidade. Em sua maioria, esses instrumentos começam como mecanismos de adesão voluntária, sendo transformados, à medida que as organizações os adotam como referência, em normas alterando o cenário em que as organizações operam.13 Muitos deles tratam de modo isolado alguns elementos ou dimensões da sustentabilidade. Nesse sentido, principalmente as normas de sistemas de gestão têm como foco, em sua maioria, um único tema, como meio ambiente, saúde e segurança ocupacional, segurança da informação, gerenciamento de riscos, governança corporativa, entre outros. Por outro lado, há instrumentos mais abrangentes que englobam as dimensões econômica, ambiental e social da sustentabilidade. Ainda nesse sentido, há instrumentos que interferem mais nos processos operacionais e outros que impactam em formulação de políticas e estratégias das organizações, culminando no processo de transparência e prestação de contas. A Figura 7.1mostra um esquema evolutivo de um processo de implantação de estratégias que abrangem questões ambientais e sociais, além das questões econômicas das organizações, por meio de alguns exemplos de instrumentos e metodologias mundialmente reconhecidas.13 Figura 7.1Instrumento de sustentabilidade, segundo Almeida.13 • • • • • • • ▶ Destacamse alguns instrumentos e ferramentas acerca do tema: Global compact:iniciativa desenvolvida pela ONU com o objetivo de mobilizar a comunidade empresarial para adoção de valores fundamentais na área dos direitos humanos, das relações de trabalho, do meio ambiente e do combate à corrupção em suas práticas gerenciais Metas do milênio:documento que consolidou várias metas estabelecidas nas conferências mundiais ocorridas ao longo dos anos 1990, estabelecendo um conjunto de objetivos para o desenvolvimento tecnológico e a erradicação da pobreza no mundo, que engloba: erradicar a extrema pobreza e a fome; alcançar o ensino básico universal; promover a igualdade de gêneros e a autonomia das mulheres; reduzir a mortalidade infantil; melhorar a saúde materna; combater HIV/AIDS, a malária e outras doenças; garantir a sustentabilidade ambiental; estabelecer uma parceria mundial para o desenvolvimento ISO 14.001: norma de sistema de gestão ambiental que visa identificar e controlar os aspectos e impactos ambientais das instalações, dos processos e dos produtos das organizações OHSAS 18.001:norma de sistema de gestão de saúde e segurança ocupacional, que visa auxiliar as empresas a controlar os riscos de acidentes no local de trabalho SA 8.000: norma de sistema de gestão que estabelece padrões para as relações de trabalho, passível de auditoria e certificação Accountability SARBOX (SarbanesOxley):lei norteamericana cujo principal objetivo é estabelecer controles internos por meio de estruturação de processos de auditorias e comitês a fim de recuperar a credibilidade do mercado de capitais, evitando a incidência de novos erros, como os que contribuíram para a quebra de grandes empresas Global Reporting Initiative (GRI):diretrizes para elaboração de relatórios de sustentabilidade que podem ser utilizados como instrumento de gestão organizacional. Por outro lado, um cuidado deve ser tomado pelas organizações. Os instrumentos de gestão, sejam impostos ou voluntários, representam custos altos para as empresas. Se forem adotados de maneira formal e burocrática, agregarão pouco valor às organizações.13 Princípios da gestão ambiental e responsabilidade social Para as organizações determinarem os assuntos que afetam seus negócios, se faz necessário a identificação dos interesses de cada parte interessada por meio de um processo de engajamento. Com isso, a organização cria a oportunidade das partes interessadas se manifestarem, promovendo discussões que podem acarretar mudanças reais.8 O World Business Council for Sustainable Development (WBCSD) define o diálogo de múltiplas partes interessadas como uma ferramenta para engajar simultaneamente diferentes pessoas em discussões importantes e, ao mesmo tempo, como um processo para que as organizações dialoguem com outras instituições e pessoas que mostram interesse por suas atividades.14 Desse modo, as organizações precisam determinar que temas e indicadores refletem os impactos econômicos, ambientais e sociais mais relevantes para cada uma delas, sem observar apenas as demandas e necessidades internas, mas também fatores que possam influenciar de maneira substancial suas partes interessadas. De acordo com as diretrizes do GRI:14 Para determinar se uma informação é relevante, devese utilizar uma combinação de fatores internos e externos, entre os quais a missão geral e a estratégia competitiva da organização, preocupações expressas diretamente pelosstakeholders, expectativas sociais mais amplas e o raio de influência da organização sobre entidades tanto upstream(a cadeia de suprimentos, por exemplo) quantodownstream(como os clientes). As avaliações de materialidade também deverão levar em conta as expectativas básicas expressas em normas e acordos internacionais que a organização deve cumprir.15 A Tabela 7.1destaca os requisitos e indicadores globais das diretrizes do GRI que devem ser considerados no processo de identificação dos impactos significativos e relevantes na criação de valor para as organizações sob os aspectos econômico, ambiental e social. Tabela 7.1Indicadores e requisitos globais das diretrizes do Global Report Iniciative.15 Dimensão Requisitos Econômica Desempenho econômico Presença no mercado Impactos econômicos indiretos Ambiental Materiais Energia Água Biodiversidade Emissões, efluentes e resíduos Produtos e serviços Conformidade legal Transporte Geral Social – Desempenho referente a práticas trabalhistas e trabalho decente Emprego Relações entre os trabalhadores e a governança Saúde e segurança no trabalho Treinamento e educação Diversidade e igualdade de oportunidades Social – Desempenho referente a direitos humanos Práticas de investimento e de processos de compra Não discriminação Liberdade de associação e negociação coletiva Trabalho infantil Trabalho forçado ou análogo ao escravo Práticas de segurança • • • • • • • • • • • • Direitos indígenas Social – Desempenho referente à sociedade Comunidade Corrupção Políticas públicas Concorrência desleal Conformidade Social – Desempenho referente à responsabilidade pelo produto Saúde e segurança do cliente Rotulagem de produtos e serviços Comunicações demarketing Conformidade Compliance A identificação dos temas e requisitos mais relevantes para o negócio da organização é uma das principais etapas dentro do modelo de gestão das organizações. Precisam ser considerados diversos fatores de influência nesse processo, desde o negócio da organização, incluindo suas estratégias de crescimento, o mercado onde atua, seus produtos e clientes, passando pelas questões legais relacionadas ao produto, aos processos e instalações das empresas, até as questões relacionadas às comunidadesvizinhas e à cadeia de fornecedores, bem como a questão da criação de resíduos e consumo de recursos naturais. Tal é a complexidade da definição dos temas mais relevantes (Princípio da Materialidade) que alguns instrumentos de gestão, como o próprio GRI, vêm desenvolvendo suplementos setoriais a fim de subsidiar às organizações princípios específicos para alguns setores. Como exemplo, destacase a elaboração do suplemento setorial de alimentos destinado a todas as empresas do setor, incluindo todas as empresas envolvidas no processamento de alimentos, bem como o comércio decommoditiesrelacionadas ao processamento de alimentos e de pescados e empresas fabricantes de bebidas. Empresas que produzem álcool, tabaco e madeira, varejistas de alimentos e empresas que fornecem insumos para agricultores, como pesticidas e fertilizantes, poderão utilizarse de algumas partes do suplemento.16 Segundo a própria metodologia, os desafios específicos para a indústria de alimentos podem ser elencados nos seguintes tópicos: Ajudar a disponibilizar alimentos seguros, saudáveis e com preço acessível Impactos nas mudanças climáticas e riscos apresentados à base de recursos pelas mudanças climáticas Envolvimento em áreas rurais de países em desenvolvimento Cadeias de suprimentos globais e complexas Vulnerabilidade e capacidade de pequenos produtores nas cadeias de suprimentos de alimentos Envolvimento de governos Influência na saúde e bemestar dos consumidores Impactos da exaustão dos recursos naturais e dependência de recursos naturais Consequências da exaustão de recursos naturais já escassos Bemestar dos animais, especialmente em operações de larga escala ou industriais Práticas comerciais justas e éticas Uso de embalagens e impactos a elas associados no meio ambiente e na saúde. ▶ ▶ 1. 2. 3. 4. 5. 6. 7. 8. 9. 10. 11. 12. 13. 14. 15. 16. ▶ Considerações finais Abordouse aqui um breve histórico sobre o desenvolvimento industrial e como as discussões sociais e ambientais são inseridas nesse contexto. Apresentouse também um modelo de gestão que aborda a questão do desenvolvimento econômico das organizações, sendo o lucro seu foco principal, sem a preocupação como custo social e ambiental. Além disso, percebese também que as questões ambiental e social que permeiam os negócios das organizações são temas complexos e abrangentes, que apresentam especificidades para cada setor de atuação. Os modelos de gestão e seus instrumentos e metodologias servem como referência de implantação de processos que integram as questões ambientais e sociais, com a economia e lucratividade do mundo corporativo. Tais modelos devem ser perseguidos pelos empreendedores e empresários a fim de garantir a perenidade de seu negócio. O desafio das organizações deve ir muito além da preocupação de integrar os sistemas de gestão ambiental e responsabilidade social. O desafio é entender, em sua empresa, quais critérios ambientais e sociais são fundamentalmente relevantes para garantir a sobrevivência de seu negócio e como integrálos ao plano estratégico de negócio da organização. Referências bibliográficas ROBERT, KH. The natural step, São Paulo: Willis Harman House/Cultrix/Amanakey, 2002. HAWKEN, P.Capitalismo natural: criando a próxima revolução. São Paulo: Editora Cultrix, 2007. SCHARF, R.Manual de negócios sustentáveis. São Paulo: Amigos da Terra – Amazônia Brasileira; Fundação Getúlio Vargas, Centro de Estudos em Sustentabilidade, 2004. FORMENTINI, M.; OLIVEIRA, T. M. Ética e Responsabilidade Social – Repensando a Comunicação Empresarial.Revista Comunicação Organizacional.Rio Grande do Sul. Disponível em: <http://www.pucrs.br>. Acesso em: 12 jun. 2012. SCHMIDHEINY, S.Mudando o rumo:uma perspectiva empresarial global sobre desenvolvimento sustentável e meio ambiente. Rio de Janeiro: Editora da Fundação Getúlio Vargas, 1992. MEADOWS, D.; RANDERS, J.; MEADOWS, D.Limits to growth:the 30year update. Vermont: Chelsea Green Publishing, 2004. ROMEIRO, A. R. Desenvolvimento sustentável e mudanças institucionais: notas preliminares. Rev. Pósgrad. Econ. Univers. Fed. Fluminense, v. 1, n. 1, jun. 1999. HOLLIDAY, C.Cumprindo o prometido: casos de sucesso de desenvolvimento sustentável. Rio de Janeiro: Editora Campus, 2002. BRUNDTLAND, G. H. Nosso futuro comum. 2a ed., Rio de Janeiro: Editora da Fundação Getúlio Vargas, 1991. Agenda 21 Brasileira – Ações Prioritárias/Comissão de Políticas de Desenvolvimento Sustentável e da Agenda 21 Nacional – 2001. Índice de Sustentabilidade Bovespa (ISE) – 2008 Disponível emhttp://www.bovespa.com.br/Mercado/RendaVariavel/Indices/FormConsultaApresentacaoP.asp?Indice=ISE. Acesso em: 10 out. 2007. TAPSCOTT, D.; TICOLL, D. A empresa transparente. São Paulo: M. Books do Brasil Ltda, 2005. ALMEIDA, F. Os desafios da sustentabilidade:uma ruptura urgente. 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LOUETTE, Anne.Compêndio para a sustentabilidade:ferramentas de gestão de responsabilidade socioambiental. São Paulo: Editora Antakarana Cultura Arte Ciência LTDA, 2007. VEIGA, J. E.Desenvolvimento sustentável: o desafio do século XXI. 2a ed. Rio de Janeiro: Editora Garamond, 2006. VEIGA, J. E. Do global ao local.Campinas, São Paulo: Armazém do Ipê (Autores Associados), 2005a. E ▶ ■ Gestão Financeira Diogenes Carvalho Lima ste capítulo tem como objetivo principal capacitar os leitores a identificar relatórios financeiros, instrumentalizandoos de modo a controlar receitas e despesas, por intermédio doplanejamento e controle orçamentário, propiciando condições para que relacionem os diversos tipos de relatórios, a fim de tomar decisões acerca das aplicações das receitas e despesas. Visa, ainda, conceituar a evolução da administração financeira e orçamentária nas empresas, criar as condições para a correta elaboração de orçamentos e projeções financeiras, bem como apresentar os objetos da gestão financeira, seus relatórios e sua interrelação com as demais áreas da organização, para melhorar o desempenho técnico profissional dos gestores num mundo cada vez mais globalizado. Farseá uma abordagem à gestão de compras e estoques, para possibilitar aos leitores uma visão mais abrangente da área de materiais, função das mais importantes e complexas da atividade empresarial e sua correlação com a gestão financeira. Planejamento e controle orçamentário Administrar é prever, planejar, organizar, coordenar, dirigir e controlar atividades que constituem o objetivo do empreendimento. O trabalho administrativo corresponde a um processo que se inicia com a previsão e termina com o que positivamente foi realizado. Dessa maneira, o planejamento é considerado um fator preponderante para ajudar a garantir sua sobrevivência e seu desenvolvimento, porém, especialmente a longo prazo, encerra um paradoxo: ninguém pode prever o futuro. Não existem previsões certas para o futuro; poderãoexistir apenas suposições ou conclusões bastante razoáveis sobre o quê de real pode acontecer futuramente. Quanto mais precisas as previsões, melhor poderá ser o planejamento. Previsão é o esforço para verificar quais serão os eventos que poderão ocorrer ou registrar uma série de probabilidades. Planejamento é a determinação das providências a tomar, é o suporte para a tomada de decisão. O planejamento não somente auxilia a tomada de decisão, mas também coopera com a alta administração da empresa na coleta de informações, verificação de problemas e recomendação dos procedimentos a serem adotados para a formulação da política da empresa. Por meio de um plano operacional que indique as metas a alcançar e os esforços que realmente podem e devem ser feitos para a concretização dos objetivos, podese elaborar o planejamento orçamentário. O planejamento orçamentário deve ser elaborado sempre em moeda forte ou índices que transmitam a realidade econômica ao longo do tempo. Conforme diretrizes, esses índices de projeção são estimados para a confecção do orçamento global do negócio para um período préestabelecido. Visando atingir o planejamento orçamentário fixado para o período, o gerente deve analisar os relatórios de controle diariamente, para que possa tomar medidas corretivas, quando necessário. Planejamento orçamentário O orçamento representa a expressão quantitativa, em unidades físicas, medida de tempo, valor monetário e outros, dos planos elaborados para o período subsequente, em geral, mensal e para doze meses. Poderá ser global, no sentido de alcançar todas as atividades da empresa em um determinado período, ou parcial, previsões dos programas próprios para cada aspecto das suas atividades. Para a execução correta do processo orçamentário é necessário projetar, manter e controlar o sistema orçamentário compreendido basicamente no conjunto de projeções por elementos das operações da empresa e de relatórios de controle orçamentário. O fluxo da Figura 8.1 é a representação gráfica do orçamento, desde o início (plano operacional) até a conclusão (apuração da margem de contribuição). Visando exemplificar a elaboração de um orçamento, a seguir serão estudados textos do livro Planejamento e Controle Orçamentário para Restaurantes de Coletividade, deste mesmo autor. ▶ ▶ Figura 8.1 Orçamento global. CIP = custo indireto de produção, MOD = mão de obra direta. Orçamento do número de refeições (orçamento de vendas) Com informações coletadas no Departamento de Recursos Humanos, podese estimar o número de refeições por dia e, verificando o horário e dias de trabalho, há condições de calcular o total de refeições no mês (Tabela 8.1): Tabela 8.1Orçamento do número de refeições. Produto Dias úteis Refeições/dia Total de refeições/mês A 22 2.723 59.903 B 22 653 14.366 Total 3.376 74.269 Geralmente, utilizase o número de dias úteis, pois, dessa maneira diluemse melhor os custos fixos, já que nesses dias o número de refeições costuma ser maior. Nos restaurantes A e B, o produto é o tipo de refeição que deverá ser servida. Orçamento das receitas operacionais Para elaborar o planejamento orçamentário das receitas operacionais, utilizase o orçamento do número de refeições para preparar as projeções da receita obtida com a venda dos produtos A e B, de acordo com aTabela 8.2. Tabela 8.2Orçamento das receitas operacionais. Produto Total de refeições/mês Preço unitário (R$) Total da receita (R$) A 59.903 1,18 70.685,54 B 14.366 1,64 23.560,24 Total 74.269 94.245,78 ★ Formação do preço de venda O preço é um valor estabelecido para que se possa vender um determinado produto ou serviço. Sua composição se dá pela formação dos custos de produção e administração, acrescidos da margem de lucro e complementado pela devida recuperação de impostos. Os preços são formados de maneira a atender à necessidade da empresa no que tange à sua receita. A recuperação dos impostos é calculada após a apropriação dos custos e da expectativa de lucro, conforme demonstrado a seguir: Custo de mão de obra direta: R$ 0,23 + Custo indireto de produção: R$ 0,04 + Custo de produção: R$ 0,45 + Despesas administrativas: R$ 0,13 ▶ ▶ ▶ ▶ − Crédito de ICMS: R$ 0,04 = Custo mercadoria vendida: R$ 0,81 + Margem de lucro (30%): R$ 0,24 = Preço de venda sem impostos: R$ 1,05 O preço de venda sem impostos será acrescido dos devidos impostos por meio do cálculo “por dentro”, ou seja, dividese esse preço pelo seguinte índice: Orçamento de produção Tendo sido elaborado o orçamento de vendas (receitas), a próxima tarefa é preparar o orçamento de produção, com a especificação de cada produto (itens de produção), com base no cardápio mensal, que deverá estar pronto 30 dias antes do mês considerado. Orçamento de compras de matériaprima Estabelecidas as necessidades em termos de unidades físicas a ser produzidas, a etapa seguinte deve ser a formulação de planos para aquisição do material exigido, conforme o orçamento de produção. Neste caso, devemse levar em consideração os estoques iniciais e finais de matériaprima, para adquirir somente o necessário para a produção. Orçamento dos custos de matériaprima O orçamento do custo de matériaprima para a produção (Tabelas 8.3 e 8.4) é baseado na especificação do cardápio valorizado, conforme os preços encontrados no orçamento de compras (mapa comparativo de preços). Esse valor pode ser apurado de maneira mais simples, porém menos eficiente, calculandose a média dos custos de matériaprima do mês anterior acrescidos da variação do índice preestabelecido, normalmente, a inflação. Tabela 8.3Orçamento dos custos unitários de matéria prima. Produto Custo alimentar (R$) Custo descartável (R$) Custo limpeza (R$) Custo unitário (R$) A 0,38 0,02 0,01 0,41 B 1,07 0,04 0,04 1,15 Tabela 8.4Orçamento dos custos totais de matéria prima. Produto Custo unitário (R$) Refeições/mês Custo total (R$) A 0,41 59.903 24.560,23 B 1,15 14.366 16.520,90 Total 74.269 41.081,13 O custo total de matériaprima deve representar um certo percentual da receita estimada; caso este custo ultrapasse o percentual, o cardápio deverá ser revisto até que se adeque ao índice estabelecido. Orçamento de despesa com mão de obra direta Para transformar os produtos adquiridos em produtos acabados, a empresa normalmente faz uso de serviços de mão de obra nas proporções e taxas de remuneração mensal. Fazem parte da taxa de mão de obra direta (MOD) todos os encargos sociais, férias, 13o salário, descanso remunerado, feriados etc.; a taxa deve ser global, mesmo que alguns pequenos erros existam na previsão desses itens. A determinação do custo da mão de obra direta é feita de acordo com o exposto naTabela 8.5. Tabela 8.5Orçamento dos custos de mão de obra direta (MOD). Produto Salário direto (R$) Encargos (R$) Adicionais (R$) Custo MOD (R$) A 3.779,73 4.535,67 216,60 8.532,00 B 2.490,00 2.988,00 210,00 5.688,00 Total 6.269,73 7.523,67 426,60 14.220,00 No caso específico de restaurantes de coletividade, o custo da mão de obra direta deve ser considerado como custo fixo, pois ele está relacionado diretamente ao número de funcionários e não ao número de refeições produzidas. Devemse evitar ao máximo os custos com adicionais, principalmente horas extras. ★ Mão de obra direta É aquela relativa ao pessoal que trabalha diretamente sobre o produto em elaboração, sendo possível a averiguação de qual o tempo despendido e de quem executou o trabalho, sem necessidade de qualquer apropriação indireta ou rateio. Se houver qualquer tipo de alocação por meio de estimativas ou divisões proporcionais, passa a desaparecer a característica “direta”. ★ Mão de obra indireta ▶ ▶ • • • • • • • • Pode ser classificada como aquela que, commenor grau de erro e arbitrariedade, pode ser alocada ao produto, como a de um operador de grupo de máquinas; aquela que só é apropriada por meio de fatores de rateio, de alto grau de arbitrariedade, como o das chefias de departamentos etc. Devido à evolução da tecnologia, há uma tendência à redução da mão de obra direta, que é normalmente variável, pois só se caracteriza como direta a que foi efetivamente utilizada na produção. Os tempos não trabalhados costumam deixar de fazer parte da mão de obra direta, tornandose custos indiretos para rateio dos produtos. Fazem parte da taxa de mão de obra direta todos os encargos sociais, férias, 13o salário, descanso semanal remunerado, horas extras, adicional noturno, transporte, alimentação e outros. Produtividade A produtividade está diretamente ligada à quantidade e qualidade do trabalho empenhado por um funcionário para a realização de determinada tarefa. Julgase que quanto maior o número de tarefas esse funcionário possa realizar, maior será sua produtividade. Isto não é totalmente verdade, tendo em vista que a qualidade daquilo que se faz é mais importante, pois, se o mesmo funcionário tiver que refazer a tarefa, sua produtividade será menor, motivo pelo qual é melhor fazer pouco e bem feito a ter que refazer. Sendo assim, o gestor de negócios deve incentivar seus colaboradores a fazer bem feito desde o início, para que seja feito apenas uma vez, evitando o retrabalho. Após adquirir tal capacidade, o funcionário pode desenvolver a capacidade de fazer bem feito e mais rápido; para que isso ocorra, são necessários investimentos em treinamento e tecnologia. ★ Produtividade financeira Este cálculo da produtividade da mão de obra verifica qual a participação do custo da mão de obra no preço do bem ou serviço. Em que: C. MOD dia = custo de mão de obra direta por dia Ct. MOD = custo total de mão de obra direta DU = dias úteis (dias efetivamente trabalhados) P. mês = quantidade produzida por mês P. dia = quantidade produzida por dia PV = preço de venda R = rentabilidade ★ Produtividade operacional A produtividade operacional mede qual a quantidade de trabalho que um determinado funcionário está realizando no decorrer de determinado período, normalmente, 30 dias. Em que: DU = dias úteis (dias efetivamente trabalhados) P. mês = quantidade produzida por mês P. dia = quantidade produzida por dia PO = produtividade operacional No func. = número de funcionários responsáveis pela produção/mês Orçamento de despesas com impostos A operacionalização das empresas normalmente é do tipo venda ou prestação de serviços. Para cada tipo de faturamento existe um imposto específico, devido à sua atividade. Imposto é o tributo cuja obrigação tem por fato gerador uma situação independente de qualquer atividade específica relativa ao contribuinte. Os tributos que incidem sobre o faturamento são: Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISS), Programa de Integração Social (PIS) e Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins). ICMS e ISS são tributos fiscais; PIS e Cofins são tributos de seguridade social. ★ Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) O ICMS é instituído pelo governo estadual, e suas alíquotas e maneiras de contabilização são definidas pela Assembleia Legislativa de cada Estado. As principais características do ICMS são: Não cumulativo, ou seja, gera direito ao crédito Seletivo, pois as alíquotas são diferentes para cada tipo de produto comercializado Incluso no preço de venda. O crédito de ICMS só é proporcionado por matériasprimas que compõem o custo direto do produto, isto é, mercadorias que serão incluídas, transformadas ou não, nos produtos (refeições). São considerados custos diretos do produto: Produtos alimentares em geral Material descartável e embalagens. Algumas mercadorias não geram o crédito do ICMS por não serem tributadas nem incentivadas. Neste caso, sua entrada não gerará o crédito, mas sua revenda sob forma de insumo criará um débito. Desse modo, não é a mercadoria que foi tributada, mas sim o novo produto (refeição), que dela também foi composta. Para efeito de planejamento, nossa experiência e as estatísticas estimam um crédito de ICMS em torno de 8,5% do volume médio de compras. ★ Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISS) O ISS é de competência dos municípios e sua alíquota é definida pelas respectivas Câmaras Municipais. Características principais do ISS: Cumulativo, ou seja, não gera direito ao crédito Seletivo Incluso no preço de venda. O ISS é resultante da aplicação de determinado percentual (alíquota) sobre o valor de uma nota fiscal de serviços. • • • ▶ ▶ ▶ ★ Programa de Integração Social (PIS) e Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins) Esses tributos são resultantes da aplicação de um percentual sobre o faturamento das empresas. As alíquotas são, respectivamente, 0,65% e 3%. Para a elaboração do orçamento apresentado a seguir e para tornar o exemplo mais detalhado, considerase, para efeito de exemplificação, o faturamento do tipo venda de refeições para um restaurante situado no Estado de São Paulo, e que não tenha optado pelo sistema de contabilização do imposto deferido, ou seja, a empresa apenas recolhe o ICMS sobre o valor da nota fiscal de venda, e com isso, não gera direito a crédito. As alíquotas desses tributos são: ICMS: 8,4% PIS: 0,65% Cofins: 2%. O total do imposto a recuperar será de 11,05%. O cálculo do orçamento de despesas com impostos é realizado conforme demonstrado naTabela 8.6. O valor do débito de impostos é resultado da multiplicação do valor total da nota fiscal pelo percentual de 11,05%, que é o somatório de ICMS, PIS e Cofins. Tabela 8.6Orçamento das receitas operacionais e impostos. Produto Receita (R$) Débito (R$) Crédito (R$) Imposto a pagar (R$) A 70.685,54 7.810,75 2.087,62 5.723,13 B 23.560,24 2.603,41 1.404,28 1.199,13 Total 94.245,78 6.922,26 O valor do crédito é resultado da multiplicação da média de compras pelo valor estimado de 8,5%. Esse percentual é resultado de anos de estatísticas e experiências, devendo ser tomado somente para efeitos de planejamento, tendo em vista que as compras serão realizadas no decorrer do período. A correta apropriação do crédito de ICMS será feita por meio do imposto destacado na nota fiscal das mercadorias adquiridas. Orçamento de custos indiretos de produção Para completar as projeções dos custos e das despesas necessárias a gerar o total dos gastos de produção associados ao volume de receita operacional orçados, necessitase estimar os valores correspondentes a certos itens de natureza fixa ou variável em relação à receita total, conforme as necessidades das empresas (Tabela 8.7). Orçamento de despesas administrativas Esta etapa conclui o planejamento das despesas operacionais (Tabela 8.8). Receitas e despesas extraoperacionais Citaramse como exemplos de receitas extraoperacionais as vendas de produtos como leite, café e chá, pois estes não estão envolvidos diretamente na produção das refeições (produto principal), então, como o próprio nome já diz, são produtos extraoperacionais (Tabelas 8.9 a 8.11). Tabela 8.7Orçamento dos custos indiretos de produção. Itens Valor mensal estimado (R$) Manutenção de equipamentos 500,00 Reposição de utensílios 500,00 Reposição de equipamentos 500,00 Material para escritório 350,00 Despesas diversas de produção 200,00 Outros (energia elétrica, combustíveis etc.) 1.000,00 Total 3.050,00 Tabela 8.8Orçamento de despesas administrativas. Cargos Salários diretos (R$) Encargos (R$) Total (R$) Adm. restaurante 2.000,00 2.400,00 4.400,00 Nutricionista 2.000,00 2.400,00 4.400,00 Técnicos 1.200,00 1.440,00 2.640,00 Outros 1.200,00 Total 12.640,00 Tabela 8.9Receitas extraoperacionais. Produto Quantidade/dia Dias úteis Quantidade/mês Preço (R$) Total (R$) Leite 322 27 8.694 1,70 14.779,80 Café 750 27 20.2501,45 29.362,50 ▶ ▶ ▶ Chá 75 27 1.650 1,35 2.227,50 Total 46.389,80 Tabela 8.10Despesas extraoperacionais. Produto Custo unitário (R$) Quantidade/mês Custo total (R$) Leite 1,10 8.694 9.563,40 Café 0,98 20.250 19.845,00 Chá 0,70 1.650 1.155,00 Total 30.563,40 Tabela 8.11Impostos (débito e crédito) das receitas extraoperacionais. Produto Receita Débito Crédito Imposto a pagar Leite 14.779,80 1.633,17 812,89 820,28 Café 29.362,50 3.244,56 1.686,83 1.557,73 Chá 2.227,50 246,14 98,18 147,96 Total 46.389,80 5.123,87 2.597,90 2.525,97 Com o fechamento desta etapa, encerrase o planejamento dos custos de produção, reunindo as despesas com matériaprima, mão de obra direta e custos indiretos de produção. Demonstração de resultados do exercício A demonstração de resultados do exercício (DRE) representa a confrontação das receitas e despesas relativas a determinado período (Tabela 8.12). Em uma economia com baixo índice de inflação, o lucro operacional teria um valioso conteúdo informacional; porém, as flutuações no poder de compra da moeda, de certa maneira, distorcem as grandezas relativas dos números que vão das receitas operacionais até o lucro operacional. Resultado financeiro O resultado financeiro é a diferença entre as receitas e as despesas financeiras. Tabela 8.12Demonstração de resultados do exercício (DRE). Itens Valor (R$) (+) Receitas operacionais 94.245,78 (−) Impostos 6.922,26 (−) Mão de obra direta 14.220,00 (−) Custo indireto de produção 3.050,00 (−) Custo de produção 41.081,13 (−) Despesas administrativas 12.640,00 (+) Receitas extraoperacionais 46.389,80 (−) Impostos 2.525,97 (−) Despesas extraoperacionais 30.563,40 (=) Lucro operacional 29.632,82 ★ Receitas financeiras As receitas financeiras decorrem das aplicações financeiras, tais como títulos de mercado aberto (fundo de aplicações financeiras, fundo de commodities, outras aplicações com liquidez imediata) e aplicações financeiras de curto e médio prazos (certificado e recibo de depósito bancário [CDB e RDB], letras de câmbio, outras). Também são considerados como receitas financeiras os descontos financeiros obtidos por antecipação de pagamento a fornecedores. As aplicações financeiras são avaliadas pelo custo de aquisição mais os ganhos incorridos até a data de fechamento da demonstração de resultados do exercício. ★ Despesas financeiras As despesas financeiras compreendem os juros pagos pelos empréstimos, mais as comissões bancárias, as correções monetárias e cambiais e outras possíveis taxas cobradas pelas instituições financeiras relacionadas aos empréstimos. Cabe lembrar que os descontos que a empresa concede aos seus clientes por antecipação de pagamento, após haver faturado, e atrasos nos pagamentos a fornecedores também são tratados como despesas financeiras. Métodos de análises vertical e horizontal Os métodos de análises vertical e horizontal, de certo modo, completamse e se sobrepõem, ao mesmo tempo em que prestam valiosa contribuição à análise da evolução econômica da empresa. • • • ■ ★ Análise vertical O primeiro propósito da análise é mostrar a participação relativa de cada ítem de uma demonstração de resultado em referência a determinado total (Tabela 8.13). Tabela 8.13Análise vertical. Demonstração de resultados 2011 2012 Valor(R$) % Valor(R$) % (+) Receitas operacionais 8.025 33.974 (−) Impostos 887 3.754 Lucro bruto 7.138 100 30.220 100 (−) CMV (−) Mão de obra direta 2.006 28,1 9.494 31,4 (−) Custo indireto de produção 80 1,1 379 1,2 (−) Custo de produção 3.691 51,7 16.628 55 (−) Despesas administrativas 161 2,2 879 2,9 (=) Lucro operacional I 1.200 16,8 2.840 9,4 (+) Resultado não operacional 300 4,2 435 1,4 (=) Lucro operacional II 1.500 21 3.275 10,8 CMV = custo da mercadoria vendida. Pela análise vertical da demonstração de resultados apresentada, observase que o custo da mercadoria vendida(CMV) correspondeu a 83,1% da receita operacional no período encerrado no ano de 2011, enquanto em 2012 foi de 90,5%. A análise vertical tomada num período isolado permite que se compare o percentual de determinado item com seu correspondente em outro período ou em outra empresa ou setor. Quando se dispõe de dados de mais de um período, conhecese a evolução relativa e a representatividade do item ao longo do tempo. A função do administrador será buscar as causas das variações, quando expressivas. Queda na margem bruta, como no exemplo, pode indicar crescimento nos custos maior que o crescimento do preço de venda. Analisando de maneira geral a demonstração apresentada, pela análise vertical, podese verificar que a queda na margem bruta pode ser decorrência de vários fatores: Elevação dos custos em função da queda no volume de produção e, portanto, diluição dos custos fixos por menor volume Aumento nos salários ou matériasprimas Perda de eficiência na produção, bem como aumentos que interferiram nos preços de venda ou nos custos. Em cada caso, portanto, é necessário que o administrador busque as causas das variações expressivas, mesmo que sejam aparentemente favoráveis à empresa. ★ Análise horizontal O propósito da análise horizontal (Tabela 8.14) é possibilita o exame da evolução de uma série de valores. Viuse, pela análise horizontal, que a receita operacional no ano de 2012 chegou a ser de 323,3% maior que a receita operacional de 2011, enquanto o CMV chegou a ser de 359,3% no mesmo período. Decorre daí a queda na margem de lucro operacional de 21%, em 2011, para 10,8%, em 2012. No exemplo apresentado foram feitas as análises vertical e horizontal para o período de um ano. É importante que se façam essas análises a cada fechamento de mês, pois elas são muito eficientes como instrumento de acompanhamento e controle do planejamento orçamentário. Tabela 8.14Análise horizontal. Demonstração de resultados 2011 2012 Variação (%) Receitas operacionais 8.025 33.974 323,3 (−) Impostos 887 3.754 Lucro Bruto 7.138 30.220 323,3 (−) CMV Mão de obra direta 2.006 9.494 373,2 Custo indireto de produção 80 379 373,7 Custo de produção 3.691 16.628 350,5 (=) Lucro operacional I 1.200 2.840 136,6 (+/−) Resultado não operacional 300 435 45 Lucro operacional II 1.500 3.275 118,3 CMV = custo da mercadoria vendida. Controle orçamentário O controle orçamentário é feito com base na emissão de relatórios, comparandose e analisandose constantemente os resultados reais alcançados durante o período de execução dos planos, tendo em vista o que estes últimos previam ou programavam e, quando necessário, utilizandose medidas corretivas. ▶ ▶ Então, controlar é registrar os resultados que vão ocorrendo durante a execução dos planos e orçamentos; desse modo, a formalização do controle orçamentário dáse por meio de relatórios de execução. Fases do controle O controle é um processo cíclico e é composto de quatro fases. ★ Estabelecimento de padrões Os padrões representam o desempenho desejado, proporcionam um meio para estabelecer o que se deverá fazer. Podem ser expressos em tempo, dinheiro, unidades físicas ou índices. ★ Observação de desempenho Para se controlar um desempenho atual, devese pelo menos conhecer algo a respeito desse desempenho no passado. A eficácia de um sistema de controle depende da informação imediata sobre os resultados passados. ★ Comparação entre o desempenho atual e o esperado A comparação da atuação com o que foi planejado não busca apenas localizar variações, erros ou desvios, mas também torna possível a predição de outros resultados futuros. Um bom sistema de controle, além de proporcionar rápidas comparações, permite localizar possíveis dificuldades ou mostrar tendências significativas para o futuro. A comparação desses resultados geralmente é feita com meios de apresentação, como gráficos, relatórios, índices, porcentagens, medidas estatísticas etc. ★ Ação corretiva As medidas e os relatórios de controle indicam quando as atividadescorrentes não estão levando aos resultados desejados e permitem condições para a tomada de ação corretiva. O objetivo do controle é exatamente indicar quando, quanto, onde e como se deve executar a correção. A ação necessária é tomada a partir dos dados qualitativos fornecidos nas três etapas anteriores do processo de controle. A essência do controle é a ação corretiva que ajusta as operações aos padrões predeterminados e sua base é a informação que esses relatórios geram. Relatórios de controle ★ Controle de gestão operacional O controle de gestão operacional (CGO) (Tabela 8.15) é um documento que permite verificar diariamente o planejamento orçamentário. Ele, além de expressar os valores obtidos, cria condições de medidas corretivas para a correta alocação dos diversos recursos até o último instante do período considerado. • Número de dias úteis São considerados dias úteis aqueles nos quais são servidas, no mínimo, 50% da média de refeições/dia. No exemplo da Tabela 8.15, o mês considerado teve 20 dias úteis. • Número de refeições (quantidade) É a quantidade total de refeições servidas no dia. A variação do número de refeições por dia útil exerce grande influência na margem bruta do dia, visto que as despesas fixas têm peso inversamente proporcional ao número de refeições, ou seja, quanto menor o número de refeições, maior será o custo fixo unitário, devido à menor diluição dos mesmos custos. Tabela 8.15Exemplo de controle de gestão operacional (CGO). Dia Refeições Receita bruta (R$) Imposto (R$) Receita líquida (R$) Alimentar (R$) Descartáveis e limpeza (R$) Mão de obra direta (R$) Diversos (R$) Crédito de ICMS (R$) Total de despesas (R$) Resultado bruto (R$) Margem bruta (%) 4 1.079 2.220 245 1.975 1.241 139 662 139 117 2.840 109 6 5 2.226 4.580 506 4.074 2.745 85 662 12 240 3.264 808 20 6 1.981 4.076 450 3.626 2.895 335 662 2 274 3.620 7 0 7 1.981 4.076 450 3.626 2.659 184 662 1.119 241 4.383 758 21 8 1.555 3.199 353 2.846 1.067 140 662 56 102 1.823 1.020 36 Total 8.822 18.151 2.004 16.147 10.607 883 3.310 1.348 974 15.174 968 6 Subtotal 8.822 18.151 2.004 16.147 10.607 883 3.310 1.348 974 15.174 968 6 11 1.981 4.076 450 3.626 2.356 129 662 28 211 2.964 659 18 12 1.582 3.255 359 2.896 2.154 77 662 11 189 2.715 178 6 13 1.981 4.076 450 3.626 2.589 370 662 61 232 3.459 398 11 14 1.781 3.664 404 3.260 2.458 114 662 18 218 3.034 224 7 15 1.981 4.076 450 3.626 1.918 126 662 47 173 2.580 1.045 29 18 1.582 3.255 359 2.896 1.589 83 662 11 142 2.203 690 24 19 1.981 4.076 450 3.626 1.526 86 662 669 137 2.806 818 23 20 1.508 3.101 342 2.759 1.875 102 662 11 168 2.482 274 10 Total 14.377 29.579 3.264 26.315 16.465 1.096 5.296 856 1.470 22.243 4.286 16 Subtotal 23.199 47.730 5.268 42.462 27.072 1.979 8.606 2.204 2.444 37.417 5.254 12 22 1.981 4.076 450 3.626 2.005 125 662 5 181 2.616 1.007 28 25 1.981 4.076 450 3.626 2.105 146 662 7 191 2.729 895 25 26 1.288 2.649 292 2.357 1.212 146 662 76 115 1.981 374 16 27 1.453 2.989 330 2.659 1.111 438 662 239 131 2.319 338 13 ■ ▶ ▶ 28 1.981 4.076 450 3.626 1.956 100 662 26 174 2.570 1.054 29 29 1.981 4.076 450 3.626 1.758 126 662 1 160 2.387 1.237 34 30 1.981 4.076 450 3.626 1.897 86 662 12 168 2.489 1.136 31 Total 12.646 26.018 2.872 23.146 12.044 1.167 4.634 366 1.120 17.091 6.041 26 Mês 35.845 73.748 8.140 65.608 39.116 3.146 13.240 2.570 3.564 54.508 11.295 17 Part.(%) − 59,6% − 4,8% − 20,1% − 3,9% + 5,4% − 83% + 17% • Receitas totais É o valor recebido, referente ao fornecimento dos diversos tipos de refeições. A receita total é composta das receitas operacionais e extraoperacionais (no exemplo, o restaurante não obteve receitas extraoperacionais). • Impostos Na Tabela 8.15, a alíquota de imposto é de 11,05% (ICMS, PIS e Cofins) e o crédito de ICMS foi abatido diretamente dos CMV. • Custo das mercadorias vendidas O CMV é composto de despesas com mão de obra direta, custo indireto de produção, custo de produção e despesas administrativas. Por uma questão de didática, demonstraramse no exemplo as despesas consolidadas, mas para melhor análise e controle é fundamental que no CGO essas despesas apareçam isoladamente. • Lucro operacional Lucro é a diferença entre a receita líquida (receita deduzida de impostos) e o CMV. • Margem bruta Margem bruta indica, em termos percentuais, quanto representa o resultado (lucro) em relação à receita total menos impostos (receita líquida). ★ Relatório de resultado operacional O relatório de resultado operacional (RRO) (Tabela 8.16) consolida um determinado período do controle de gestão operacional, normalmente, 15 dias, para que se possa efetuar uma análise mais abrangente da gestão orçamentária da empresa. Tabela 8.16Exemplo mensal de relatório de resultado operacional (RRO). RRO Planejado Posição dia 15 Realizado (fechamento) No de dias úteis 20 9 20 No de refeições/dia 379 387 385 No de refeições/mês 7.580 3.483 7.700 Preço unitário (R$) 3,40 3,40 3,40 Receita bruta total (R$) 25.772,00 11.842,20 26.180,00 Imposto (R$) 2.847,81 1.308,56 2.892,89 Receita líquida total (R$) 22.924,19 10.533,64 23.287,11 CMV (R$) 20.080,00 9.488,00 19.980,00 Lucro operacional (R$) 2.844,19 1.045,64 3.307,11 Margem bruta (%) 14,20 11 16,6 CMV = custo das mercadorias vendidas. Com o RRO, podese elaborar o relatório de posição e previsão de resultados, que servirá para tomar as ações corretivas que se fizerem necessárias para alcançar os objetivos traçados no planejamento orçamentário. O relatório de posição, elaborado normalmente no dia 15 de cada mês, permite verificar a necessidade ou não de ações corretivas. No exemplo, podese observar que o CMV no nono dia útil (posição dia 15) representava 90% da receita líquida, desviandose do planejado, que era 87,6%. De posse desses dados, podemse tomar ações corretivas para alcançar o resultado planejado. As providências necessárias para corrigir os desvios foram tomadas prontamente, pois, no fechamento, ou seja, quando se apurou o resultado final (realizado), o CMV passou a representar 85,8% da receita total, menor do que o planejado. Análise do custovolumelucro Uma das mais importantes classificações dos custos e das despesas operacionais que se faz para finalidades gerenciais é a que leva em conta o total de uma delas dentro de uma unidade de tempo (normalmente o mês) e a relaciona com o volume de atividade da empresa. Ponto de equilíbrio É quando as receitas totais se igualam aos custos e despesas totais. Acima deste ponto, existe lucro e, abaixo, prejuízo. Admitase, por exemplo, que um restaurante tenha a seguinte característica em termos de gastos: Custos e despesas variáveis: R$ 2,20 por refeição Custos e despesas fixas: R$ 38.000,00 por mês Preço: R$ 3,40 por refeição Com isso, em cada refeição vendida há uma "sobra" de R$ 1,20, já que o preço é R$ 3,40 e os custos e despesas variáveis são R$ 2,20. Para se obter “sobras” totais suficientes para a cobertura dos custos e despesas fixas totais (CDFT) de R$ 38.000,00, basta dividir essa importância pela sobra unitária de R$1,20. Isso leva à conclusão de que são necessárias 31.667 refeições/mês para se chegar ao ponto de equilíbrio, ou seja, uma receita de venda total de R$ 58.727,27. Margem de contribuição unitária A essa "sobra" comentada dáse o nome técnico de margem de contribuição unitária, que é a diferença entre a receita de venda de uma refeição e a soma dos custos e despesas ▶ • • ■ • • • • • • ▶ variáveis dessa mesma refeição. Tipos de ponto de equilíbrio O estudo do ponto de equilíbrio reflete as quantidades ou valores a serem operacionalizados para se cumprir com as obrigações dos custos fixos. Os pontos de equilíbrio podem ser: Ponto de equilíbrio de unidades produzidas Ponto de equilíbrio contábil. ★ Ponto de equilíbrio de unidades produzidas O ponto de equilíbrio em unidades (Un) é obtido pela divisão do CDFT pela margem de contribuição unitária (MCu),ou seja: Então, podese concluir que o restaurante terá que produzir e vender 31.667 refeições no mês para fazer frente aos custos e despesas fixas totais. ★ Ponto de equilíbrio contábil Para se obter o ponto de equilíbrio contábil ou em valor monetário, basta multiplicar essas unidades encontradas no cálculo do ponto de equilíbrio de unidades produzidas pelo preço de venda unitário. Assim, saberseá qual a receita total necessária a tal equilíbrio: Em que: Qt = quantidade de refeições produzidas Pu = preço unitário de venda RT = receita total (Qt × Pu) CVu = custo variável unitário MCu = margem de contribuição unitária (Pu CVu) CDFT= custo e despesas fixas totais Por intermédio do estudo do ponto de equilíbrio e do correto conhecimento dos custos e despesas fixas podemse fazer projeções bastante aproximadas do fechamento mensal da empresa. Dessa maneira, o estudo do ponto de equilíbrio pode ser considerado também como instrumento de planejamento e controle orçamentário, além de auxiliar a tomada de decisão. Com base nos estudos abordados, podese concluir que o planejamento orçamentário é um instrumento essencial ao gerente que deseja se antecipar à determinada situação, para que possa previamente tomar medidas ou decisões para alcançar os objetivos estabelecidos. Como visto, o importante instrumento de verificação e acompanhamento do planejamento é o controle orçamentário, que é feito com relatórios periódicos que fornecem base para a análise dos resultados obtidos e a confirmação de os objetivos serem ou não alcançados, conforme os planos traçados no planejamento. Concluise, então, que a relação planejamento/controle se manifesta por acompanhamento apropriado do progresso das metas e dos objetivos incorporados aos planos. Sendo assim, o administrador de restaurante terá o retorno para avaliação da necessidade ou não de correções. É pelo planejamento orçamentário que se fornecem as informações sobre os resultados a serem alcançados e os possíveis lucros, para que a alta administração possa tomar as decisões que atinjam os objetivos globais da empresa. Fatores que influenciam os custos Faz parte da gestão de recursos financeiros tentar movimentar a empresa utilizando o menor volume possível de capital próprio. Para alcançar esse objetivo, o gerente deve buscar: Reduzir o tempo e o ciclo da produção, acelerandoa de tal modo que o seu volume de capital necessário possa circular diversas vezes durante determinado período, normalmente um ano, produzindo diversas séries do mesmo bem ou serviço Reduzir o tempo de estocagem, mesmo com o sacrifício de uma parte dos lucros (mediante diminuição do preço de venda), de modo que os estoques de bens produzidos (estoque de produtos acabados) possam rapidamente se converter em recursos a serem aplicados em novas séries de produção Obter participações de capital de terceiros para o desenvolvimento da indústria, de tal maneira que o volume do capital de terceiros não desequilibre as taxas de rendimento do capital próprio. O capital de terceiros é introduzido na empresa não somente para auxiliar a produção, como também para auxiliar as vendas. O capital de terceiros auxiliares da produção pode ser classificado em três tipos: Empréstimos para formação das instalações, máquinas e equipamentos Empréstimos para formação do ativo circulante, fornecidos por instituições financeiras (bancos) Créditos de curta duração não em dinheiro, e sim no modo de entrega de bens e serviços a prazo pelos fornecedores. A correta alocação dos recursos financeiros disponíveis deve ser uma preocupação constante do gerente, pois a competitividade está cada vez mais acirrada e, para ganhar da concorrência, a diferença poderá residir nos custos. Perdas Durante muitos anos, as empresas se habituaram a conviver com a perda e o desperdício. É fundamental notar que tanto um como outro são custos indiretos de produção, e podem estar presentes na mão de obra ou na matériaprima; portanto, são relativamente fáceis de serem identificados. A perda física não é percentualmente igual à financeira (Tabela 8.17). Tabela 8.17Perdas físicas x perdas financeiras. Quantidade (%) Recursos financeiros (R$) (%) 10 11,11 20 25 30 42,86 ▶ ■ 1. 2. 3. 4. 5. 6. 7. 8. 9. ▶ • 40 66,67 50 100 Planejamento financeiro O processo de planejamento financeiro está centrado no fluxo de caixa ou orçamento de caixa, o qual frequentemente é chamado de previsão de caixa. O orçamento de caixa baseiase nas previsões de vendas e insumos. Há dados internos e externos de previsão; sugerese o uso combinado de ambos. É importante prever o fluxo de caixa e, consequentemente, as necessidades financeiras da empresa, em especial, empresas com um padrão de vendas sazonal. A fim de reduzir a incerteza no orçamento de caixa, podese usar a análise de sensibilidade ou simulação por computador, como no exemplo a seguir. Orçamento de caixa (fluxo de caixa) O objetivo do orçamento de caixa (Tabela 8.18) é mostrar quais os períodos em que a empresa pode antecipar suas despesas ou deixar para depois as compras, ou seja, como organizar as receitas e despesas (entradas e saídas). Exemplo: A companhia AT vendeu R$ 50.000 em março e R$ 60.000 em abril. As vendas previstas para maio, junho e julho são de R$ 70.000, R$ 80.000 e R$ 100.000, respectivamente. A empresa tem um saldo de caixa de R$ 5.000 em 1o de maio e deseja manter um saldo mínimo de caixa de R$ 5.000. Fornecidos os dados seguintes, elabore e interprete um orçamento de caixa para os meses de maio, junho e julho. Vinte por cento das vendas são à vista, 60% são cobrados no próximo mês e os 20% restantes são cobrados 2 meses após a venda A empresa recebe outras receitas de R$ 2.000 por mês As compras, todas a dinheiro, devem ser de R$ 50.000, R$ 70.000 e R$ 80.000 para os meses de maio a julho, respectivamente Pagamento de aluguéis de R$ 3.000 por mês Ordenados e salários correspondem a 10% das vendas do mês anterior A empresa pagará dividendos de R$ 3.000, em junho, para os acionistas Em junho, pagará o principal e juros no valor de R$ 4.000 Programou para julho uma compra de equipamento no valor de R$ 6.000, à vista Imposto de renda de R$ 6.000 é devido em junho. Tabela 8.18Fluxo de caixa. Fluxo de caixa Março Abril Maio Junho Julho Entradas Vendas à vista (R$) 10.000 12.000 14.000 16.000 20.000 Vendas 30 dias (R$) 30.000 36.000 42.000 48.000 Vendas 60 dias (R$) 10.000 12.000 14.000 Outras receitas (R$) 2.000 2.000 2.000 Total das entradas (R$) 10.000 42.000 62.000 72.000 84.000 Saídas Compras (R$) 40.000 50.000 70.000 80.000 Aluguéis (R$) 3.000 3.000 3.000 Salários (R$) 6.000 7.000 8.000 Dividendos (R$) 10.000 3.000 Principal + juros (R$) 2.000 4.000 Equipamentos (R$) 6.000 Imposto de renda (R$) 6.000 Total das saídas (R$) 0 0 59.000 93.000 97.000 Saldo de caixa (R$) 3.000 21.000 13.000 Caixa inicial (R$) 5.000 8.000 13.000 Empréstimos (R$) 0 0 0 Caixa final (R$) 8.000 13.000 26.000 Caixa mínimo (R$) 5.000 5.000 5.000 Saldo final de caixa (R$) 3.000 18.000 31.000 Análise e interpretação do exemplo Com base no fluxo de caixa, podese verificar que: No mês de junho, a empresa necessita de um empréstimo no valor máximo de R$ 13.000, podendo chegar até R$ 8.000, se ela abrir mão de sua política de caixa, que é de permanecer com um saldo em caixa no valor de R$ 5.000 • • ▶ No mês de julho, a empresa continua necessitando de um empréstimo, pois a operacionalização de suas atividades não conseguiu gerar recursos para fazer frente às despesas correntes. Então, precisa de, no máximo, R$ 26.000, abrindo mão da política de caixa, ou de R$ 31.000 A companhia AT precisa urgentemente de melhor planejamento financeiro, pois suas receitas estão menoresque suas despesas, principalmente nos meses de junho/julho. O formato básico do orçamento de caixa é tal que recebimentos e pagamentos para cada período podem ser facilmente contrapostos para se chegar ao fluxo líquido de caixa (saldo de caixa) em cada período (ver exemplo). Somando o saldo inicial de caixa ao fluxo líquido de caixa, podese estimar o saldo final de caixa. Após subtrair o saldo mínimo de caixa do saldo final de caixa (caso a empresa tenha essa política), podese determinar o financiamento total exigido ou saldo de caixa excedente. Bibliografia CHIAVENATTO, I.Teoria geral da administração. 6aed. rev. e atual., v. I. São Paulo: Campus, 2001. CORREA, J.Gerência econômica de estoques e compras. 4a ed. Rio de Janeiro: FGV, 1983. DIAS, M. A. P.Administração de materiais. 4a ed. São Paulo: Atlas, 1996. FLORENTINO, A. M. Custos: princípios, cálculos e contabilização. 9aed. Rio de Janeiro: FGV, 1984. LIMA, D. C.Planejamento e controle orçamentário.Osasco: Silvaz, 1993. MARTINS, E.Contabilidade de custos. 9a ed. São Paulo: Atlas, 2003. SANVICENTE, A. Z. Administração financeira. 2a ed. São Paulo: Atlas, 1983. O Gestão da Qualidade e Sistema de Certificação Maria Cristina Rubim Camargo profissional que atua em unidades de alimentação e nutrição tem enfrentado o desafio de garantir a satisfação dos clientes, a retenção de seus colaboradores e ainda assegurar a obtenção de lucro. Assim, o questionamento mais comum desses profissionais tem sido: seria possível atender a todas essas expectativas? Este capítulo dedicase a apresentar a adoção de um sistema de gestão da qualidade como um caminho seguro para alcançar tais objetivos. O conceito da gestão da qualidade teve origem no Japão, na década de 1950, a partir de nomes como Deming, Juran, Crosby e Feigenbaum. Cada um desses gurus seguiu uma filosofia e adotou uma série de princípios. Deming, que havia participado ativamente, na década de 1940, dos programas de mobilização para a qualidade, nos Estados Unidos, foi para o Japão, onde, juntamente com Juran, tornouse o principal responsável pela disseminação dos conceitos de controle da qualidade.1 Deming foi também responsável pela popularização do ciclo PDCA (planejar, executar, verificar e agir [plan, do, check, act]), desenvolvido por Walter Shewart.2O ciclo consiste em um processo de desenvolvimento de melhorias contínuas, sendo representado por um círculo em que cada quadrante representa uma atividade gerencial para a busca de melhorias. O primeiro quadrante representa a atividade de planejar (plan); o segundo, a atividade de fazer (do), enquanto o terceiro significa verificar (check) e o quarto, a ação na correção de eventuais distorções (action). Para Deming, o envolvimento da alta administração no processo é determinante no sucesso da implantação, pois o poder decisório é fator indispensável para interferir nas causas e modificar a filosofia e os sistemas de produção. Segundo ele, a qualidade é definida consoante às exigências e às necessidades do consumidor; e como elas estão em permanente mudança, as especificações de qualidade também devem ser alteradas constantemente. Juran define qualidade como “adequação ao uso”, recomendando que o “uso” seja avaliado pelo cliente.3 Assim como Deming, ele considera que a maioria dos problemas de qualidade de uma organização é causada por seus dirigentes e não pelos trabalhadores, e estabelece que a qualidade seja composta de três processos gerenciais: o planejamento, o controle e a melhoria. Um dos pontos de destaque de sua contribuição à gestão da qualidade foi a introdução da dimensão humana em sua análise. Crosby define qualidade como conformidade aos requisitos.4 Essa abordagem é inteiramene voltada para o cliente e enfatiza que a qualidade é tangível, gerenciável e mensurável. Crosby focou seu trabalho na mudança cultural da organização, na qual todos os colaboradores entendem ser pessoalmente responsáveis pela prevenção, detecção e solução de problemas. Nos anos 1960, o uso prático da estatística como ferramenta para o controle de processo se consolidou e foram lançadas as bases para a implantação dos conceitos do controle de qualidade (TQC, total quality control), desenvolvidos por Feigenbaum.5 De acordo com sua abordagem, a qualidade é um instrumento estratégico que deve preocupar todos os trabalhadores. Mais do que uma técnica de eliminação de defeitos nas operações • • • ▶ industriais, a qualidade é uma filosofia de gestão e um compromisso com a excelência. É voltada para o exterior da empresa, com base na orientação para o cliente, e não para seu interior, redução de defeitos. Qualidade de produto e serviço é a composição total das características de um produto e serviço emmarketing, engenharia, manufatura e manutenção, de modo que vão ao encontro das expectativas dos clientes. Foi nesse ambiente que o parque industrial japonês, ainda infante, serviu de palco, no pósguerra, para a implementação de todos esses conceitos. Antes da Segunda Guerra Mundial, os produtos japoneses eram famosos por seus preços baixos e sua má qualidade. O sucesso alcançado pelas empresas japonesas na conquista de mercados antes dominados pelas empresas ocidentais foi obtido pela alta qualidade e baixos preços de seus produtos, conseguidos por meio de uma excelência em manufatura. A adoção da gestão da qualidade, utilizada como arma competitiva, proporcionou aos produtos japoneses a conquista de mercados, devido à sua superior qualidade e confiabilidade, assim como à sua melhor resposta às necessidades e oportunidades do mercado. Enquanto isso, as empresas ocidentais perderam capacidade de competitividade e foram superadas pela indústria japonesa, sendo que as principais razões, segundo Corrêa e Gianesi, foram:6 A excessiva especialização de funções, o que acabou dificultando a comunicação e a integração rápida e eficaz entre os setores de uma organização Os administradores ocidentais estavam mais preocupados com assuntos relacionados aos setores demarketing e finanças do que com questões tecnológicas, próprias do setor de produção. Isso levou também a que fossem tomadas decisões baseadas em considerações a curto prazo, que trouxessem resultados rápidos (investir em publicidade e promoções), e não decisões relacionadas a melhorias estruturais e infraestruturais, cujos resultados só apareceriam a longo prazo As empresas não deram importância às mudanças ocorridas no mercado mundial, que passou a demandar maior qualidade e variedade de produtos, e também não apresentaram alternativas de como a manufatura deveria mudar para atender a essas necessidades. Surge, então, a necessidade de mudanças devido aos desafios impostos pelo mercado, no qual a competição se tornava cada vez mais acirrada, fazendo com que as empresas que não se adaptavam às novas premissas tivessem sua sobrevivência ameaçada. Globalização e normas ISO 9000 Com a globalização da economia, a partir de 1973, tornouse imperativa a uniformização dos sistemas da qualidade adotados pelos diversos países. Para tal, seria necessária a criação de normas internacionais sobre requisitos de sistemas da qualidade.7 A International Organization for Standardization (ISO), criada em 1947, é uma organização internacional, privada e sem fins lucrativos, com sede em Genebra, na Suíça. A ISO elabora normas internacionais sobre produtos e serviços. A Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), fórum nacional de normalização voluntária, é membrofundador da ISO e representa o Brasil naquela organização. Em 1979, a ISO formou o Comitê Técnico (TC, technicalcommittee) 176 para tratar da gestão e garantia da qualidade, pois vinha se preocupando com o aumento das exigências dos diferentes mercados mundiais, que, acompanhadas do surgimento de sistemas nacionais de garantia a consumidores, estavam causando obstáculos ao crescimento do comércio internacional. Iniciouse, então, no âmbito do TC176, um processo de elaboração de normas para harmonização dos requisitos dos sistemas da qualidade, utilizandose como referência a norma britânica BS5750 e a norma canadense Z299. O conjunto de normas da série ISO 9000 foi aprovado em 1987, no âmbito internacional, com a finalidade de especificar requisitos para a implantação de sistemas de gestão da qualidade nas empresas e ser condição mínima para a comercialização de produtos no mundo todo. A partir dos requisitos definidos pelas normas ISO 9000, tornouse possível a adoção de certificação dos sistemas da qualidade das empresas por organismos independentes, considerados de terceira parte, garantindo confiabilidade na auditoria e eliminando a necessidade de as empresas serem avaliadas por cada um dos seus clientes. Da mesma maneira, facilitou e uniformizou a qualificação de fornecedores de uma empresa. Conforme ressalta Fernandes, é importante diferenciar a certificação de sistemas da qualidade da certificação de produtos.7 Enquanto a certificação de sistemas é o resultado da verificação da conformidade aos requisitos e ▶ • • procedimentos de gestão adotados pela empresa segundo o que define o requisito da norma vigente, a certificação de produtos atesta o atendimento das características específicas de um produto. Para a certificação de produtos, fazse necessária a realização de testes e ensaios nos produtos, o que exige, em alguns casos, laboratórios capacitados e adequados ao tipo de produto. A decisão de uma empresa pela adoção de um sistema de gestão da qualidade pode ter origem na exigência de um cliente ou como fator de vantagem competitiva sobre a concorrência, não pela certificação em si, que hoje não é mais um diferencial mercadológico, visto que uma grande parte das empresas já é certificada, mas pelo modo inteligente e enxuto com que o sistema pode ser projetado e pelos resultados que proporcionam, podendo agregar importante valor para a organização. Isso pressupõe que a certificação por si só não agrega valor organizacional se os processos não forem revistos e se a construção do sistema de gestão da qualidade não for coerente com a missão, os valores e os objetivos organizacionais. O sucesso só será comprovado se o resultado final atender às necessidades e expectativas do cliente. Desde 1987, a norma passou por algumas revisões que entraram em vigor em 1994 e 2000, sendo a atual de 2008, que foi elaborada para apresentar maior adesão à família da NBR ISO 14000 – sistema de gestão ambiental. Além da qualidade e do meio ambiente, outros processos como segurança, saúde ocupacional eresponsabilidade social estão sendo normatizados. Várias empresas estão vendo a integração dos sistemas de gestão como uma excelente oportunidade de reduzir custos, optando pela criação de um sistema de gestão integrado. Gestão da qualidade no segmento de alimentação coletiva Os profissionais de nutrição que atuam em unidades de alimentação e nutrição podem trabalhar em empresas com duas modalidades de serviços: Autogestão (serviço próprio):a empresa assume toda a responsabilidade pelo processo de produção de refeições para seus colaboradores, desde contratação de pessoal, aquisição de matériaprima até distribuição das refeições aos usuários Terceirização (serviços de terceiros): o fornecimento das refeições é formalizado por intermédio de contrato firmado entre a empresa prestadora de serviços e a compradora. A terceirização de serviços de alimentação no Brasil foi mais efetiva na década de 1980. Na época, os profissionais que trabalhavam na modalidade de autogestão, apesar de se dedicarem ao processo de produção de refeições, eram influenciados pelo sistema de gestão adotado pelo core business da empresa. Por exemplo, quando o serviço de alimentação estava inserido em uma indústria metalúrgica ou automotiva, a gestão sofria influência da gestão adotada pela organização. Os serviços de alimentação em empresas multinacionais, em especial indústrias de alimentos, já apresentavam enfoque em processos e maior preocupação com a satisfação de clientes, mesmo que fossem colaboradores da mesma empresa, considerados como clientes internos. Nas empresas terceirizadas, o conceito de qualidade passou a ser mais difundido somente no governo do então presidente Fernando Collor de Mello, que, em 11 de setembro de 1990, sancionou a legislação alusiva ao Código de Proteção e Defesa do Consumidor. O Código entrou em vigor no dia 11 de março de 1991, mudando completamente a relação entre fornecedores e consumidores no país. Só então o segmento passou a se preocupar e rever suas práticas de manipulação de alimentos em função do novo Código. Em 1993, o Ministro de Estado da Saúde aprovou a Portaria 1.428, que contempla o “Regulamento Técnico para Inspeção Sanitária de Alimentos”, as “Diretrizes para o Estabelecimento de Boas Práticas de Produção e de Prestação de Serviços na Área de Alimentos” e o “Regulamento Técnico para o Estabelecimento de Padrão de Identidade e Qualidade (PIQ) para Serviços e Produtos na Área de Alimentos”. A mesma Portaria determinou que os estabelecimentos relacionados à área de alimentos adotassem, sob responsabilidadetécnica, as suas próprias boas práticas de produção e/ou prestação de serviços, seus programas de qualidade, e atendessem aos padrões de identidade e qualidade para produtos e serviços na área de alimentos, em consonância com o estabelecido na Portaria. A partir dessa Lei é que surge a necessidade de redigir um Manual de Boas Práticas, descrevendo cada um dos processos operacionais realizados nas unidades de alimentação e nutrição. Pela primeira vez, a maneira de executar algumas atividades, especialmente as relacionadas à higienização, à manipulação e ao preparo de alimentos, passa a ▶ ser discutida e definida entre os profissionais da área. Mesmo a adesão à Norma Brasileira ISO 9000 sendo uma decisão voluntária, uma vez que não existe exigência legal, a primeira empresa prestadora de serviços de alimentação coletiva foi certificada em 1995, no Brasil, estando entre as primeiras 600 empresas brasileiras a se certificar. A busca pela certificação não teve como objetivo a comercialização dos seus serviços, pois, na época, o mercado ainda não obrigava seus terceiros a obter a certificação. A decisão deveuse à necessidade de padronização das atividades desenvolvidas nos diversos sites, de adoção de uma abordagem a processos, de garantir a previsibilidade de resultados, de qualificação de seus fornecedores, dentre outras, que permitisse melhor gestão organizacional. Desde então, outras empresas buscaram a certificação e o segmento foi se desenvolvendo. As práticas adotadas por essas empresas foram se tornando práticas do mercado e passaram a fazer parte do negócio de alimentação de coletividades, sendo adotadas mesmo por empresas que não são certificadas, sem que saibam que estão atendendo a algum requisito da Norma. De lá até os dias atuais, a legislação nos âmbitos federal, estadual e municipal vem inserindo cada vez mais requisitos para que um sistema de gestão da qualidade seja implantado na rotina das unidades de alimentação e nutrição. Atualmente, a Portaria no 2.619, de 6 de dezembro de 2011, do município de São Paulo, que aprova o Regulamento Técnico de Boas Práticas, estabelececritérios e procedimentos operacionais padronizados (POP) para a produção de alimentos e traz grandes avanços no sentido de incorporar exigências ligadas à implantação de um sistema de gestão da qualidade, tais como controle de documentos, controle de registros e respectivos prazos de retenção, identificação e rastreabilidade, calibração de equipamentos e instrumentos de medição, manutenção preventiva e corretiva de equipamentos. Infelizmente, ainda hoje existem profissionais que não trabalham em unidades certificadas e que, por essa razão, desconhecem os requisitos da Norma e os ganhos de uma organização ao adotar a gestão da qualidade como prática organizacional. Na rotina diária dos serviços de alimentação dessas empresas, a falta de qualidade pode ser reconhecida em inúmeras situações como produtosrecebidos e manipulados fora da especificação de qualidade, retrabalhos, ajustes, altos índices de sobra e de resto, colaboradores sem orientação adequada, reclamações de clientes, dentre outras. Por outro lado, a qualidade pode ser reconhecida pela satisfação do cliente, resultados previsíveis e colaboradores produtivos e envolvidos com as metas estabelecidas. Inúmeras empresas estatais e multinacionais têm contribuído para a disseminação da adoção de sistema de gestão da qualidade ao exigir a certificação de seus fornecedores/prestadores de serviços de alimentação em seus editais de licitação e de concorrência, respectivamente, como barreira à entrada de empresas de menor qualificação. Muitos gestores se preocupam com o valor do investimento necessário para adoção de um sistema de gestão da qualidade, no entanto, não calculam o custo da falta de qualidade de seus produtos e serviços, principalmente ao longo do tempo. Abordagem de processos A norma ISO 9000 promove a adoção de abordagem ao processo, e uma empresa é formada por um conjunto de processos interligados. Os processos operacionais em unidades de alimentação costumam ser a seleção e a qualificação de fornecedores, o recebimento, o armazenamento, o prépreparo, o preparo e a distribuição das refeições. Os processos de apoio mais comuns são gestão de pessoas, compras ou aquisição, gestão de custo e serviço de atendimento ao cliente. A norma ISO 9000:2000, que trata de fundamentos e vocabulário, define processos como o “conjunto de atividades interrelacionadas ou interativas que transforma insumos (entradas) em produtos (saídas)”.8 A Figura 9.1exemplifica um processo de recebimento, cuja entrada é a matériaprima que chega do fornecedor e a saída é a matériaprima devidamente inspecionada e aprovada quanto à especificação, à quantidade e ao prazo de validade. Além de ser o produto (saída) do processo de recebimento, a mesma matériaprima inspecionada e aprovada tornase o insumo (entrada) do próximo processo produtivo; nesse caso, a entrada do armazenamento. • • • • • Figura 9.1Abordagem ao processo de recebimento em uma unidade de alimentação e nutrição. A realização de um processo exige a disponibilização de recursos pelo gestor que viabilizem a execução da atividade de modo eficiente e eficaz. Alguns exemplos de recursos usados no recebimento podem ser: Documentos: a ordem de compra; a relação de fornecedores homologados por produto a ser recebido; a relação de marcas aprovadas por produto; a especificação da matériaprima comprada do fornecedor (condições de transporte, temperatura, características organolépticas, dentre outras) e que serve de parâmetro para inspeção ao recebimento Pessoal:colaborador treinado para realizar a inspeção ao recebimento Equipamentos de monitoramento e medição: balança calibrada para pesagem do produto e termômetro calibrado para conferência de temperatura ao recebimento, quando aplicáveis ao produto Registros: planilha para registro da inspeção ao recebimento e da temperatura do produto ao recebimento, quando aplicável. O registro evidencia as condições de recebimento e deve ser usado para garantir a rastreabilidade do produto final Financeiros: o valor disponível para gastos com matériaprima deve ser considerado desde o primeiro momento, quando se define o que comprar e em que especificação. A decisão pela certificação da unidade de alimentação e nutrição normalmente não é do gestor, mas da empresa em que ela está inserida. De qualquer maneira, muito se beneficia o profissional que participa da implantação do sistema de gestão da qualidade ou aquele que gerencia uma unidade já certificada e que precisa dar seguimento ao trabalho, uma vez que as auditorias internas e externas de acompanhamento vão exigindo adequação do profissional quanto aos requisitos do sistema de gestão. A Figura 9.2mostra o modelo de um sistema de gestão da qualidade de um serviço de alimentação e nutrição, cuja modalidade de serviço seja terceirizada, em que a entrada engloba os requisitos contratuais, o tipo de cardápio, as gramagens pactuadas e as expectativas estipuladas em contrato; enquanto a saída engloba o fornecimento do produto e a prestação de serviço que atenda à necessidade e à expectativa dos clientes. Como mostra aFigura 9.2, responsabilidade da direção, gestão de recursos, realização do produto, medição, análise e melhoria de processos são os requisitos que precisam ser definidos para a implantação de um sistema de gestão da qualidade segundo a norma NBR ISO 9001:2008.8 No entanto, a certificação pode ocorrer em unidades cuja modalidade de administração é de autogestão. Nesse caso, as exigências do órgão certificador são menores, não porque esse tipo de serviço mereça menos rigor, mas porque o escopo da certificação está relacionado ao negócio principal da empresa e não ao serviço de alimentação. Por exemplo, quando uma empresa metalúrgica busca a sua certificação, os auditores devem definir tempo para auditar a unidade de alimentação, mas como um processo de apoio. Por outro lado, o tempo de auditoria de uma unidade de alimentação em um hospital deve ser maior, pois se trata de um processo que tem grande influência no negócio, uma vez que o tratamento do paciente e seu grau de satisfação com a alimentação tem relevância no tratamento, inclusive na escolha do hospital pelo paciente/cliente. ▶ ■ • • • • • • • • Figura 9.2 Modelo de um sistema de gestão da qualidade em empresa de serviços de alimentação. Construir o sistema de gestão da qualidade segundo os requisitos da ABNT NBR ISO 9001:20089 Neste tópico não se pretende descrever as mesmas informações que constam na norma, que pode ser adquirida na Associação Brasileira de Normas Técnicas, mas sim abordar aspectos práticos que possam ajudar o leitor a entender alguns de seus requisitos. Documentação e registros Os documentos necessários para compor o sistema de gestão da qualidade são, pelo menos: Declaração documentada da política da qualidade e dos objetivos da qualidade, estabelecida em mural e disponível para conhecimento de todos os colaboradores e clientes Manual da qualidade Procedimentos documentados exigidos pela norma, quais sejam: controle de documentos, controle de registros, auditoria interna, controle de produtos não conformes, ação corretiva e ação preventiva Manual de boas práticas de manipulação da unidade operacional Registros requeridos pela norma e os necessários para assegurar o planejamento, a operação e o controle eficazes de seus processos Documentos de origem externa, como leis, laudos e atestados. É preciso que todo documento emitido pela empresa tenha uma identificação com, no mínimo, as informações que poderão constar do cabeçalho ou do rodapé do documento emitido: identificação da empresa, nome do documento, aprovação do documento com espaço previstopara a assinatura do responsável pela aprovação, data da emissão, número e data da revisão do documento e paginação, sempre com a página em questão e a página final do documento (p. ex., 05/20, significando que se está lendo a página 5 de um documento que tem 20 páginas no total). A Tabela 9.1mostra como disponibilizar todas as informações. A alteração de uma informação no documento deve estar de algum modo identificada, cabendo ao responsável pela aprovação do documento escolher e adotar uma maneira de sinalizar a mudança, sendo que grafar com determinada cor e sublinhar são algumas possibilidades de evidenciar a alteração. É importante que todos os envolvidos no sistema de gestão saibam reconhecer a sinalização adotada, a fim de identificála no documento. Um documento precisa ser alterado por várias razões: Alteração na legislação que indique mudança no procedimento Alteração de algum dos recursos usados no decorrer do processo que interfira na maneira de realizar a atividade • • Identificação de erro ou engano na redação Alteração no modo de realizar o procedimento, por ação corretiva, preventiva ou de melhoria do processo. Tabela 9.1Exemplo dolayout da página de um documento. Logo da empresa Nome do documento Emissão: xx/xx/xxxx Revisão: 01 Data revisão: xx/xx/xxxx Página: X/Y Conteúdo do documento no tamanho definido pela organização Desenvolvido por: nome/departamento Aprovado por: assinatura Uma vez alterado, o documento precisa ser trocado nos locais de uso, para substituir o que está vigente. O documento substituído é denominado “obsoleto” e deve ser identificado (carimbado) e guardado para consulta e histórico da correção e melhoria dos processos. Uma listamestra deve ser elaborada, de modo a definir quem deve receber cada um dos documentos existentes e disponíveis para uso, podendo ser elaborada conforme a Tabela 9.2. Tabela 9.2Exemplo de listamestra para controle de documentos. Logotipo da empresa Listamestra para controle de documentos Emissão: xx/xx/xxxx Revisão: 01 Data revisão: xx/xx/xxxx Áreas que recebem cópia controlada Documento Alta direção Gestão de pessoas Área de compras Área comercial Unidade operacional Manual da Qualidade X X X MBPM X X X PRO 01 – Controle de (...) X X PRO 02 – Controle de (...) X X MBPM = manual de boas práticas de manipulação. Essa listamestra vai auxiliar no momento de recolher o documento obsoleto das áreas e enviar a alteração executada. É importante garantir que a vigência de um documento esteja compatível com a capacidade de distribuição das 1. 2. 3. 4. 5. 6. 7. 8. 9. 10. 11. 12. 13. 14. 15. 16. ■ • • cópias controladas nos seus locais de uso e com o tempo que os envolvidos terão para adequar suas práticas, seja para que as áreas tenham tempo de tomar as providências necessárias, seja para treinar a equipe na realização do procedimento alterado. Do mesmo modo que uma lei, ao ser publicada, define uma data a partir da qual passa a entrar em vigor. Registros são impressos, os quais, preenchidos, registram cada uma das situações requeridas pela norma:9 Análise crítica pela direção Educação, treinamento, habilidade e experiência do pessoal envolvido no sistema de gestão Fornecer evidência de que os processos de realização e o produto resultante atendem aos requisitos Entradas do projeto e desenvolvimento relativas a requisitos de produto Resultado da análise crítica do projeto e desenvolvimento Resultado da verificação do projeto e desenvolvimento Resultado da validação do projeto e desenvolvimento Resultado da análise crítica de alterações do projeto e desenvolvimento Resultado das avaliações do processo de aquisição Validação dos processos de produção e prestação de serviços Identificação unívoca do produto; propriedade do cliente que for perdida, danificada ou considerada inadequada ao uso Base usada para calibração ou verificação de equipamentos de monitoramento e medição Resultado da calibração e verificação de equipamentos de monitoramento e medição Auditorias internas e seus resultados; pessoa autorizada a liberar o produto para entrega ao cliente Natureza das não conformidades e ações subsequentes executadas, incluindo concessões obtidas Resultados das ações corretivas e das ações preventivas executadas. Para tanto, devem ter um cabeçalho com pelo menos as seguintes informações: identificação da empresa, nome do registro e tempo de retenção. O tempo de retenção de cada registro pode ser definido pela organização, levando em conta a necessidade de manter o registro guardado para qualquer consulta ou auditoria interna e externa, seja de ISO ou dos órgãos ligados à Vigilância Sanitária. Projeto e desenvolvimento O termo “projeto e desenvolvimento” costuma ser uma área ou um departamento dentro das organizações responsáveis pela criação de novos produtos e serviços. Entre suas atribuições, destacamse: o planejamento de um novo produto ou serviço, como desenho ou protótipo; a definição de todas as suas especificações; a análise crítica; a verificação e a validação do projeto e desenvolvimento. Conhecido nas indústrias, o termo ainda é pouco utilizado no segmento de prestação de serviços, que não está habituado a realizar o projeto e desenvolvimento de serviços, apenas de produtos. Por essa razão, durante muitos anos esse requisito da norma pôde ser definido como não aplicável. No entanto, algumas empresas de serviços passaram a considerar o requisito como parte do sistema de gestão da qualidade, a fim de validar os novos serviços que colocavam no mercado e, a partir dos bons resultados, passou a ser exigido em todas as organizações, independentemente de ser de produtos ou serviços. As indústrias de alimentos também estão habituadas ao termo, mas as unidades de alimentação e nutrição tiveram que entender como esse novo requisito faria parte de suas atividades. O termo passou a ter duas interpretações quando aplicado neste segmento: A abertura de uma nova unidade operacional, normalmente quando se trata de uma empresa prestadora de serviço, ou seja, uma empresa terceirizada Os novos serviços oferecidos por uma unidade, como um jantar que não existia ou novas preparações de um cardápio, especialmente quando se trata de uma unidade de alimentação de um sistema de autogestão. Outra característica específica do segmento de alimentação é a dificuldade de validação do projeto e desenvolvimento antes da entrega do produto ao cliente. Esse é o motivo para a coleta de amostras de todas as • • • • • • • • ■ preparações das refeições prontas servidas, que devem permanecer guardadas até que as consequências de um produto contaminado possam ser detectadas. Na indústria de alimentos, a validação do projeto e desenvolvimento pode ser feita em laboratório, em função do tempo que separa a produção da venda e do consumo. Mas, ainda assim, uma amostra de cada lote produzido é guardada até sua data de validade. Mais do que um termo, incorporar o conceito de projeto e desenvolvimento traz uma importante contribuição para o segmento de alimentação, uma vez que nos ensina a planejar todo novo produto, serviço e, especialmente, uma nova unidade. Produto pode ser uma nova receita ou preparação do cardápio. Serviço pode ser uma alteração no serviço atual, como um novo buffet ou um evento. A inauguração de uma nova unidade de alimentação, seja autogestão ou terceirizada, deve ser detalhadamente planejada, em especial no que tange ao levantamento de todos os recursos para garantir que a alta direção assegure a disponibilização de todos eles. A necessidade de adotar esse requisito é uma garantia para o gestor da unidade de alimentação e nutrição, e tem sido um fator determinante para assegurar o atendimento àsexpectativas citadas no início do capítulo: a satisfação dos clientes, a retenção de talentos e a obtenção de lucro. Caso uma dessas expectativas não seja contemplada, por falha no desenvolvimento da proposta ou porque o custo não esteja compatível com o preço, será possível identificar essa diferença já na fase de planejamento e não depois da implantação do novo produto e serviço, tendo se tempo suficiente para a adequação ou para negociar com o cliente com relação à não implantação ou adequação de preço. Uma vez decidida a busca da certificação, recomendamse os seguintes passos: Adequação completa à legislação específica do segmento, que tem início com a criação e a implantação do Manual de Boas Práticas de Manipulação de Alimentos e de seus respectivos POP, não da empresa como um todo, mas adaptada aos recursos específicos para a unidade operacional que busca a certificação, conforme as condições das edificações e de todos os recursos disponíveis, incluindo a qualificação da equipe ali alocada. Os procedimentos operacionais devem ser, no mínimo, os definidos na legislação Todas as empresas precisam de um Manual de Boas Práticas para ir para o sistema. Não é indicado que o próximo passo seja dado sem que a alta direção esteja ciente dos custos definidos de todas as adequações estruturais, pois costuma ser esse o maior custo na implantação de um sistema de gestão da qualidade em unidades de alimentação Definição de um profissional para ser representante, junto à alta direção, das atividades específicas para a obtenção da certificação. Esse profissional normalmente não é o gestor da unidade, mas alguém da administração, da área da qualidade ou da área técnica da empresa, o qual fica responsável pelos requisitos da norma sobre as atividades que devem ser normatizadas e implantadas pelas áreas: comercial, de aquisição, de gestão de pessoas, administrativofinanceira e da alta direção Escolha da empresa para buscar a certificação. Muitas empresas estão disponíveis hoje no mercado, inclusive com experiência no segmento de alimentação de coletividades Qualificação de pessoas, no que tange à norma: os envolvidos no sistema de gestão devem ter conhecimento da norma e alguns devem ser qualificados para ser auditores internos. É indicado que os cursos para conhecimento da norma e de formação de auditor interno sejam oferecidos pelo organismo certificador escolhido para a auditoria de certificação. Os colaborados devem compreender a política da qualidade, entender seu papel no sistema e reconhecer quanto suas atividades interferem na qualidade Criação do manual da qualidade descrevendo cada requisito da norma, sendo que alguns já podem ser praticados pela organização, outros vão requerer adequação e, ainda, outros não existem e terão que ser implantados para atendimento à norma Implantação do manual da qualidade: aos poucos, a prática vai levando à adequação do modelo e do que foi descrito, de modo que sejam feitos ajustes contínuos até que esteja escrito exatamente o que a empresa realiza no seu dia a dia e que seja praticado tudo da maneira como está descrito nos manuais e procedimentos da organização Qualificação de pessoas no que tange aos novos procedimentos implantados. E, por fim, agendar uma préauditoria para checar a adesão do sistema de gestão da qualidade, para que, finalmente, seja agendada a auditoria de certificação. Prazo para obtenção da certificação ■ • • • • • • • • ▶ ▶ O tempo necessário para preparar uma unidade de alimentação e nutrição para a certificação depende do estágio de adequação à legislação vigente, do envolvimento das pessoas que executam as atividades e, em especial, do interessee disposição da alta direção em prover recursos para a implantação das atividades necessárias para a adoção de um sistema de gestão da qualidade, segundo os critérios definidos pela norma. Se, no passado, as unidades de alimentação e nutrição levavam cerca de 1 ano para a implantação de um sistema de gestão adequado à norma, hoje o tempo costuma ser de 3 meses, especialmente em função de que a adequação a alguns dos requisitos se tornou prática de mercado e em função das exigências legais que foram sendo incorporadas ao segmento de alimentação coletiva. Valor do investimento Os investimentos necessários também dependem do grau de adequação em que a empresa se encontra, devendo ser considerados, em especial, os seguintes valores: Atendimento às questões legais em relação às edificações do local Atendimento às questões legais em relação à especificação e à frequência de uso dos produtos de higienização ambiental, de pessoal e de equipamentos e utensílios Atendimento às questões legais em relação ao pessoal, como, por exemplo: exames médicos e laboratoriais periódicos, e equipamentos de proteção individual Calibração periódica de equipamentos de monitoramento e medição Manutenção preventiva de equipamentos Realização de cursos externos para qualificação de pessoas, pelo menos de formação de auditor interno Contratação de empresa de consultoria para a implantação da norma, quando necessário Contratação da empresa de certificação. Contudo, é também importante calcular e levar em consideração os custos da falta de qualidade, já mencionados e que normalmente não são mensurados. É preciso lembrar que esses custos devem ser abatidos do valor do investimento. Melhoria de processos e resultados A busca da melhoria de processos e de seus resultados tem sido a grande promessa do processo de certificação. No entanto, o grande ganho para o segmento de alimentação de coletividades é a previsibilidade dos resultados dos processos e a qualificação da equipe, que trabalha mais motivada e mais segura da sua importância, exigindo menos do gestor da unidade, que ganha mais tempo para o aprimoramento dos processos, para a fidelização de clientes e para a inovação. Requisitos da norma considerados inteligentes Alguns requisitos são considerados inteligentes, pois sua adoção, ao longo do tempo, garantem a melhoria contínua do sistema de gestão da qualidade da organização e, por consequência, de seus resultados, quais sejam: a auditoria interna, a análise de dados e a melhoria contínua. Diferentemente das auditorias externas, realizadas por organismos certificadores, os auditores internos conhecem e vivenciam as práticas da organização e podem identificar seus processos mais críticos. Além disso, tornamse conhecedores de áreas com as quais não se envolvem no dia a dia, visto que o auditor interno não pode auditar seu próprio trabalho, o que permite melhoria na relação entre os processos internos. O acompanhamento periódico e sistemático de indicadores da qualidade permite a análise de dados, permite demonstrar a eficácia do sistema de gestão e avaliar onde ações preventivas e de melhorias podem ser adotadas. A melhoria contínua dos processos tornouse essencial para toda organização que pretenda sobreviver e se manter competitiva no atual mercado globalizado. A prática de benchmarking tem se tornado um instrumento poderoso de melhoria, buscando alcançar vantagem competitiva por meio do aprendizado das melhores práticas do mercado. Essa prática deve ser usada nos processos em que a organização se sinta mais frágil e que necessite buscar referências externas para aprimorálos. Obenchmarking não precisa ser feito em empresas do mesmo ▶ ▶ 1. 2. 3. 4. 5. 6. 7. 8. 9. segmento; pelo contrário, buscar soluções em empresas de outras áreas traz grande melhoria para os processos que antes se apresentavam com resultados aquém do almejado. Importância das auditorias externasperiódicas A manutenção garante que o organismo certificador realize auditorias periódicas no sistema de gestão, de modo a agregar uma visão externa para os envolvidos e para a alta direção, ajudando a enxergar os problemas que estão sendo tratados inadequadamente, os pontos de melhoria e as oportunidades não detectadas no dia a dia da organização, além de ser um momento em que toda a organização pode refletir sobre os resultados organizacionais. Ganham as empresas e os gestores que conseguem usar as auditorias externas como maneira de agregar valor ao seu negócio e, consequentemente, aos seus clientes. A escolha do órgão certificador deve ser feita do mesmo modo que se escolhe um fornecedor de qualquer outro produto ou serviço da empresa, pois não se trata simplesmente de escolher aquele de menor preço, mas o de maior retorno de investimento. Tendo acesso às informações aqui descritas, fica difícil acreditar que o processo de certificação de uma empresa seja algo ultrapassado. Algumas pessoas, por falta de informação e conhecimento, acreditam que, com o tempo, esse será um assunto esquecido, mas, na verdade, o processo de certificação é uma das primeiras etapas da busca da qualidade e que, se bem utilizado, pode garantir os anseios tão almejados: a satisfação dos clientes, a retenção de talentos e ainda a obtenção de lucro. Enfim, o caminho é longo e precisa ser percorrido. Mãos à obra! Referências bibliográficas DEMING, W. E.Qualidade: a revolução da administração. Rio de Janeiro: Marques – Saraiva, 1990. CAMPOS, V. F.Gerenciamento da rotina do trabalho do dia a dia. Nova Lima: Falconi, 2004. JURAN, J. M.; GRYNA, F. M.Controle da qualidade. São Paulo: Makron, 1991. CROSBY, P. B.Qualidade é investimento. Rio de Janeiro: José Olympio, 1986. FEIGENBAUM, A. V. O poder do capital gerencial.Rio de Janeiro: Qualitymark, 2003. CORRÊA, H.L.; GIANESI, I. Just in time. MRP II e OPT: um enfoque estratégico. São Paulo: Atlas, 1993. FERNANDES, W. A. O movimento da qualidade no Brasil. Porto Alegre: Edelbra, 2011. ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS.Sistemas de gestão da qualidade – Fundamentos e vocabulário. NBR ISO 9000:2005. Rio de Janeiro: ABNT, 2000. ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS.Sistemas de gestão da qualidade – Requisitos. NBR ISO 9001:2008. Rio de Janeiro: ABNT, 2008. N ▶ Sistemas de Informação e Tendências na Gestão de Unidade de Alimentação e Nutrição Luis Hernan Contreras Pinochet a busca pela competitividade, as organizações procuram avançar em seus controles e em suas informações gerenciais. Como maneira de alcançar estes objetivos, elas utilizam sistemas de informação que possam colaborar com o crescimento dos negócios, a maior segurança nas informações pruduzidas, a análise e a redefinição dos processos, bem como a possibilidade de melhorar a gestão para o desenvolvimento de novas estratégias. Frente a um cenário cada vez mais competitivo, as organizações sabem que, para continuar operando no futuro, é imprescindível manteremse atualizadas e agir rápido na busca por aumento da produtividade, melhoria da qualidade, maximização no desempenho dos colaboradores, redução de custos, busca de vantagens competitivas, formulação de novas estratégias, melhoria dos controles internos, do relacionamento com os clientes e, principalmente, melhorias no acesso à informação, conforme Rodrigues e Assolari.1 Portanto, é necessário que os gestores conheçam a estrutura organizacional de sua empresa, os processos, os serviços e obtenham informações gerenciais precisas e confiáveis para tomar decisões rápidas e eficientes, tornando as empresas mais competitivas em relação aos seus concorrentes, oferecendo benefícios diferenciados, resultando em melhorias para os clientes, para a sociedade e, inclusive, melhorias financeiras para a própria organização. Para Laudon e Laudon, os funcionários das organizações de modo amplo não podem ignorar os sistemas de informações, porque estes desempenham um papel fundamental nas organizações atuais.2 Eles afetam diretamente o modo de decidir, planejar e gerenciar os funcionários, e, cada vez mais, determinam quais produtos serão produzidos, onde, quando e como. Nesse sentido, os profissionais que atuam na área de gestão de unidade de alimentação e nutrição, dentro e fora das organizações, prestando serviços em alimentação institucional, clínica, saúde pública, gestão de negócios emarketing, esportivo, entre outros, tornamse importantes agentes e colaboradores com as novas tendências tecnológicas que são implementadas nas organizações. Gestão do recurso informação O conceito degestão de recursos de informação (GRI), apresentado por Cornella como uma nova linha de pensamento, instituído a partir da década de 1980, permite estabelecer a relação entre informação, sistemas de informação e tecnologia da informação.3 A GRI é a gestão integrada da informação (interna e externa e das tecnologias da informação) aplicada às áreas estratégicas e aos fatores críticos de competitividade da • • • • • • ■ organização.4 Segundo Owen (1989), o modelo geral para a GRI está fundamentado em três aspectos:5 O conteúdo da informação é o que importa para a empresa, e não seu tipo ou suporte Os gastos com informação e tecnologia da informação devem ser entendidos como investimento, o qual propiciará a redução de custos de operação, transação e coordenação A necessidade de organizar e ordenar os recursos de informação e tecnologia da informação. O modelo de Owen apresenta três componentes na gestão de recursos de informação, como são apresentados naFigura 10.1:5 Figura 10.1Componentes da gestão de recursos de informação. Adaptado de Owen.5 I = informação; SI = sistema de informação; TI = tecnologia da informação. Informação (I): o modo organizado para apresentar e usar o conhecimento das pessoas para a gestão empresarial Sistemas de informação (SI):qualquer sistema usado para prover informações (incluindo seu processamento), qualquer que seja sua utilização.6 O SI cria um ambiente integrado e consistente, capaz de tratar e fornecer informações necessárias a todos os usuários7 Tecnologia da informação (TI): a adequada utilização das ferramentas de informática, comunicação e automação, juntamente com as técnicas de organização e gestão alinhadas com a estratégia de negócio, com o objetivo de aumentar a competitividade da empresa.7 Portanto, para que uma empresa tenha êxito na gestão do seu negócio, é de extrema importância saber usar o recurso informação. Mais que isso, é necessário estar organizado e aplicar de modo integrado a informação no seu sentido mais amplo, envolvendo o conhecimento necessário para a gestão das empresas, os sistemas de informação e a tecnologia da informação, ou seja, os componentes da gestão de recursos de informação, como meio para alcançar os objetivos da empresa. Para isso, é importante estabelecer um modelo organizacional que possibilite o uso integrado dessas técnicas e ferramentas.8 Importância da gestão da informação Para Spinola e Pessôa, a informação é uma ferramenta poderosa para uma organização, pois, por meio dela, podese ter o domínio dos diversos parâmetros que regem a sua dinâmica.7 Nos sistemas empresariais, a informação é reconhecida como o recurso mais importante para a tomada de decisões, sendo necessário haver uma malha de informações abrangendo diversos aspectos técnicocientíficos, administrativos, mercadológicos, econômicos, legais, ambientais e políticos.9 Segundo McGee e Prusak, as informações constituem um importante insumo estratégico, capaz de influenciar o negócio da empresa, tornandosecada vez mais a base para a competição.10 A informação representa um recurso de vital importância para o sucesso das organizações, porque uma empresa será mais competitiva quanto mais se destacar na exploração e no uso da informação para produção de conhecimento e souber aplicálo para desenvolver novas oportunidades de negócios.11 Considerando essas diversas abordagens, a informação e seu adequado gerenciamento constituem fatores críticos de sucesso para as empresas na era atual, e sua importância está fundamentada nos seguintes aspectos: • • • • • • ■ • • • • • • ■ A informação tornase cada vez mais a base da competição A informação deve ser considerada como um dos principais recursos da empresa, devendo ser gerenciada com a mesma preocupação que os recursos tradicionais (finanças, materiais, pessoas, entre outros) Uma estratégia adequada está fundamentada em obter informações do ambiente, do desempenho e da realidade da organização A informação é a base do processo de tomada de decisões e o instrumento de comunicação e desdobramento de objetivos O registro de dados relacionados aos fatos, processos e atividades da empresa possibilita a obtenção de informação e é a essência do controle A informação é a base do conhecimento, e o uso do conhecimento é uma condição necessária para o sucesso da empresa. Informação como recurso estratégico Porter destaca que a essência da formulação de uma estratégia está em relacionar a empresa ao seu ambiente.12Define estratégia competitiva como o conjunto de ações defensivas ou ofensivas para criar uma posição sustentável no mercado e poder enfrentar as cinco forças competitivas (clientes, fornecedores, concorrentes diretos, novos concorrentes e substitutos) e obter retorno sobre o investimento. Oliveira complementa, definindo estratégia como caminho, maneira ou ação, estabelecidos e adequados para alcançar os resultados da empresa, representados por seus objetivos, desafios e metas.13 Moura relaciona a estratégia ao conjunto de decisões que são tomadas, visando definir a direção a ser seguida para se posicionar frente ao ambiente.8 Para McGee e Prusak, o gerenciamento estratégico da informação representa um problema que se divide em três partes:10 Necessidade de se definir uma estratégia Capacidade para compreender e executar a estratégia definida Integrar definição e execução de modo efetivo. À medida que a integração da estratégia e sua execução tornamse o desafio organizacional mais importante, o papel da informação como ferramenta essencial para chegar a essa integração fica mais claro. Ao focalizar a informação, as empresas poderão abordar a maneira pela qual serão capazes de obter desempenho superior e transformar a estratégia em alguma coisa concreta e operativa. Essa abordagem de definição, execução e integração para se tratar a estratégia oferece três perspectivas relativas à informação a serem examinadas: Informação e definição da estratégia:informação sobre o ambiente competitivo e sobre a organização atual auxilia os executivos a identificarem tanto as ameaças quanto as oportunidades para a empresa, e cria o cenário para uma resposta competitiva mais eficaz. A informação funciona também como um recurso essencial para a definição de estratégias alternativas Informação e execução da estratégia: a TI propicia novas alternativas para elaboração de processos que criam e oferecem produtos e serviços. A informação representa uma das ferramentas mais importantes e maleáveis a serem utilizadas pelos executivos para diferenciar produtos e serviços. Em alguns casos, a informação é o próprio produto Informação e integração: ofeedback da informação sobre desempenho é essencial para a criação de uma organização flexível, na qual existe um constante “aprendizado”, que imediatamente implementa a realização estratégica de seus objetivos quando estes se tornam ineficazes. Tendências no processo de informatização Quando se investe em tecnologia somente para acompanhar os concorrentes e as inovações tecnológicas do mercado, podese acabar causando apenas custos adicionais, em vez de benefícios; por isso, devese primeiramente considerar sua real utilização. Aquelas organizações que incorporam elementos vistos como legítimos no ambiente tendem a ser vistas como legítimas, o que, por sua vez, tem implicações sobre o risco dos ativos organizacionais.14 Além disso, tão importante quanto a escolha da tecnologia adequada é a maneira como será conduzida sua implementação, como serão reestruturados os processos internos e, principalmente, como será trabalhada a ▶ ▶ informação por ela gerada. Campos e Teixeira verificaram que, entre os recursos tecnológicos, a tecnologia da informação – complexo tecnológico que envolve computadores,software, redes de comunicação eletrônica públicas e privadas, rede digital de serviços de telecomunicações, protocolos de transmissão de dados e outros serviços – tem sido apontada como importante fator para potencializar o desenvolvimento dos processos produtivos e da gestão das organizações.1517 Logo, a tecnologia da informação cumpre papel significativo ao ser utilizada como recurso para subsidiar a administração geral das firmas, quando: a) fornece elementos para a definição de estratégias empresariais; b) apoia gestores no acompanhamento dos negócios; c) promove maior rapidez na comunicação interna e com fornecedores e clientes; d) agiliza tarefas burocráticas; e) facilita a execução de atividades administrativas; f) ajuda na gestão da produção. Tapscott e Caston ressaltam que são necessárias mudanças nos processos organizacionais para que a tecnologia implantada surta efeitos positivos em ambientes reestruturados para um novo modo de atuação.18 Assim, a adoção de tecnologia, em particular dos sistemas de informação, se destaca como elemento integrador e útil para promover a reestruturação das organizações. Aplicações bem concebidas de tecnologia da informação possibilitariam às empresas se tornarem mais planas com a eliminação de camadas gerenciais, e a tecnologia da informação é um importante elemento na reestruturação não só de processos de negócios, mas de toda a empresa. Outro fator relevante a se considerar é em que medida a tecnologia influencia e é influenciada pela ação das pessoas. São vários os grupos de interesse – acionistas, empregados de diversos níveis, fornecedores, parceiros de negócio e clientes – atuantes nas organizações. Congregar os desejos desses grupos não é tarefa fácil, ainda mais quando as fronteiras das organizações estão se tornando cada dia mais tênues, não havendo mais separações claras entre os agentes internos (recursos humanos) e os externos (clientes, fornecedores e concorrentes). Portanto, a tecnologia da informação, segundo Rezende (2005), pode ser entendida como o conjunto de recursos computacionais para manipular dados e gerar informações e conhecimentos.19 É possível perceber que os sistemas de informações, os quais contam com a tecnologia da informação cada vez mais avançada, constituem uma ferramenta essencial para o desenvolvimento das operações e no auxílio das tomadas de decisões. Tal tendência é comprovada com a afirmação de Souza e Saccol, ao dizerem que as tecnologias geradoras de informações, como, por exemplo, o planejamento de recursos empresariais (ERP, enterprise resource planning), são as ferramentas mais usadas no Brasil e no mundo, nas médias e grandes empresas.20 Serviços deoutsourcing de tecnologia da informação A prestação de serviços deoutsourcing é uma das modalidades que mais tem crescido na área de tecnologia da informação. O conceito vem evoluindoao longo dos anos, tornandose um importante fator de competitividade para as empresas. Numa tradução pura e simples,outsourcing nada mais é que terceirização, mas quando se fala em estratégia de negócios, o outsourcing das áreas de tecnologia transformase em uma ferramenta imprescindível para aumentar, simultaneamente, produtividade e rentabilidade e proporcionar maior vantagem competitiva. Empresas de todos os segmentos estão adotando as parcerias com especialistas para gerir a área de tecnologia da informação. Hoje, a maioria das grandes companhias tem algum processo terceirizado. A tecnologia da informação, como qualquer outra atividade ou serviço, também segue esta tendência, embora com muitas peculiaridades, em que o custo e o foco na atividade central deixam de ser os principais fatores decisivos, mas definidos conforme a estratégia organizacional, especificamente para se manter o controle sobre prazos e qualidade dos serviços de TI.21 Do ponto de vista da gestão, com ooutsourcing da TI, as empresas podem se dedicar integralmente ao foco principal das suas atividades. A incorporação de profissionais mais bem qualificados para o suporte tecnológico propicia resultados de mais qualidade aos serviços e mais disponibilidade do pessoal interno para o negócio da empresa propriamente dito. Os problemas começam ainda na contratação do serviço terceirizado. A maioria das solicitações de propostas (RFP,request for proposals) não focaliza aspectos de níveis de serviços relacionados ao negócio, provavelmente porque, ao definir a estratégia de terceirização, as áreas de tecnologia da informação não envolvem osstakeholders corretos. Após a contratação, as organizações não definem um modelo de aferição do serviço de maneira eficaz, ou seja, com medições e metas estabelecidas para melhoria contínua de serviços. Centros de serviços compartilhados Em um contexto de mercado cada vez mais competitivo, as empresas necessitam revisar o modo como ▶ • • • • • • • • • • • executam seus processos de apoio/suporte administrativo e como vinculálos à melhor produção de valor para os resultados da organização, e uma das alternativas adotadas são os centros de serviços compartilhados (CSC) ou shared services center.22 Affonso e Martins verificaram que estes centros são entendidos como um modelo de organização de processos operacionais pelo qual uma área específica da organização, caracterizada em sua essência como uma área de atividademeio, ou uma empresa terceirizada, presta serviços, a partir de um mesmo ponto de atendimento, para as demais unidades da organização, no que tange à execução das atividades de suporte ou back office.23 Martins e Amaral apontam serem numerosos os desafios enfrentados pelas organizações antes da obtenção dos benefícios esperados pela implementação de um CSC, tais como: mudanças nas formas e nos procedimentos operacionais; conscientização das pessoas para operar dentro de um novo formato; instituição de uma visão orientada para o “cliente interno” a partir dos CSC; aglutinação das diversas subsidiárias para “adotar” o CSC com processos comuns para todos; automatização dos procedimentos manuais e medição dos benefícios.24 Quanto à utilização de tecnologia da informação no CSC, Martins e Amaral consideram que uma das maneiras usadas para reduzir os custos dos serviços no CSC e também agregar valor ao negócio é a introdução de novas tecnologias, sendo de extrema importância a tecnologia relacionada a sistemas de suporte e estruturação de base de dados, fluxo eletrônico e digitalização de documentos e geração de informação, apresentando várias tecnologias mais importantes na atualidade.24 Ainda avaliando a execução de processos pelo CSC, Magalhães defende a necessidade da existência de ferramenta que regule o relacionamento do CSC com seus usuários, de modo a melhor se desenvolver e operar sem conflitos, ferramenta essa denominadaacordo de nível de serviço (SLA, service level agreement), contendo especificações de serviços fornecidos, padrões de serviço ao cliente, preço, princípios operacionais e metas de melhoria no serviço.25 Estratégias de benchmarking em tecnologia da informação Uma das ferramentas de melhoria mais difundidas é obenchmarking, definido como a busca pelas melhores práticas nas indústrias, que levarão ao desempenho superior.26 Benchmarking é um processo contínuo e sistemático para avaliar produtos e processos de trabalho de organizações que são reconhecidas como representantes das melhores práticas, com a finalidade de melhoria organizacional.27 Embora o processo básico seja o mesmo, existem alguns tipos debenchmarkingdiferenciados pelo “alvo” ou “objeto” da sua atividade. São basicamente três tipos: Benchmarkinginterno: realizado dentro da própria organização, entre suas várias unidades ou departamentos. É mais um processo de conhecimento das práticas internas Benchmarkingcompetitivo:realizado pela comparação com empresas que são competidoras diretas da organização. É muito útil para posicionar o desempenho frente à concorrência Benchmarkingfuncional/genérico:realizado por identificação das melhores práticas em qualquer tipo de organização que estabeleceu uma reputação de excelência na área específica sujeita ao benchmarking. O benchmarkingcria uma alternativa à maneira tradicional de se estabelecer metas e objetivos, ampliando o foco no ambiente externo e trazendo outros benefícios à gestão e estratégias de negócios que devem ser considerados, pois o benchmarking são modelos ou práticas de gestão a serem seguidos ou que relatam as melhores práticas relativas ao uso estratégico da TI. A seguir são apresentados alguns de seus benefícios: Identifica e utiliza as tendências de mercado Traz novas ideias e facilita a troca de experiências Melhora a gestão por meio do aprendizado contínuo Subsidia planejamentos, orçamentos e estudos (entre eles, os de mercado) Demonstra o posicionamento relativo de custos e identifica oportunidades de melhoria Orienta a empresa no processo de seleção e priorização dos projetos e metas de melhoria e dos recursos a serem alocados Reduz os riscos de erros na seleção e adoção de ferramentas de gestão e de tecnologia Reduz a demanda de consultorias e, consequentemente, os custos. ■ • • • • • • ▶ ▶ Sistemas de informação Laudon e Laudon definem um sistema de informação baseado em computadores como um sistema que utiliza a tecnologia da computação para executar parte das funções de processamento do sistema. Um sistema de informação é parte integrante de uma organização e é produto de três componentes: tecnologia, organização e pessoas.28 Segundo Bio, um sistema de informação, para facilitar o planejamento, precisa retratar o ambiente externo, as condições de mercado e as condições internas da empresa.29 Na concepção de Walton, os resultados econômicos ou comerciais são, em geral, o índice mais direto de como um sistema implementado está realizando seu potencial.30 Polloni afirma que um sistema de informação deve alcançar o mais rapidamente possível seus objetivos de armazenamento e fornecimento de informações para a organização, em formato, tempo e custos apropriados.31Assim, um sistema de informação eficaz deve: Produzir informações realmente necessárias, confiáveis, em tempo hábil e com custo condizente, atendendo aos requisitos operacionais e gerenciais da tomada de decisão Ter por base diretrizes capazes de assegurar a realização dos objetivos, de maneira direta, simples e eficiente Integrarse à estrutura da organização e auxiliar na coordenação das diferentes unidades organizacionais Ter um fluxo de procedimento (internoe externo ao processamento) racional, integrado, rápido e de menor custo possível Contar com dispositivos internos que garantam a confiabilidade das informações de saída e adequada proteção aos dados controlados pelo sistema Ser simples, seguro e rápido em sua operação. Sistemas legados De Sordi (2003) verificou que, na prática, a expressãosistemas legados é utilizada para caracterizar os sistemas mais antigos da empresa, como os sistemas de processamento em lote (batch) e os sistemas transacionais online. Nesse sentido, os sistemas legados foram concebidos dentro de uma visão funcional por áreas ou divisões das empresas, com arquivos de dados específicos.32 Sistemas legados, ou seja, sistemas críticos em uso há determinado período e desenvolvidos com tecnologia supostamente ultrapassada, apesar de antigos, são essenciais para as organizações, porque guardam os registros históricos de seus negócios. Na contramão dos avanços da tecnologia, em constante evolução e inovação, esses sistemas legados costumam estar presentes nas organizações em estruturas desatualizadas. Portanto, muitos deles já não possuem mais contratos de prestação de serviço, em função de, muitas vezes, as empresas prestadoras de serviços não existirem mais no mercado. Atualização e inclusão de novos sistemas e tecnologias em uma organização são constantes, tornando imprescindível que novos sistemas sejam integrados aos antigos, interagindo e compartilhando dados, processos e funcionalidades, no conceito de escalabilidade e modularização. Nesse sentido, sistemas legados são aplicações de valor crítico para o negócio nas empresas, conforme Umar, ou qualquer sistema de informação que resista significativamente à modificação e à evolução, segundo Brodie.33,34 Sistemas integrados de gestão e enterprise resource planning Percebese que o ERP é uma solução de negócio que permite à empresa automatizar e integrar a maioria de seus processos, compartilhar práticas de negócio e dados comuns pela empresa e disponibilizar a informação em tempo real. Sistemas dessa natureza não são mais que um sistema de informação, sendo caracterizados como sistemas de gestão e, portanto, adquiridos com o intuito de tornar os processos empresariais mais ágeis e extrair informações mais acuradas da empresa. Sendo um sistema de alta complexidade, o ERP é considerado uma evolução dos sistemas conhecidos como planejamento de requisição de materiais (MRP,material requirement planning) e seu sucessor, o planejamento dos recursos de produção (MRP II, manufacture resources planning). O ERP foi resultado, portanto, da evolução desses sistemas, que foram agregando sistematicamente novas funções. O MRP visa calcular, de modo eficiente, as quantidades de matériasprimas e insumos necessários para que a produção atenda à programação de vendas, sem formação excessiva de estoques. Portanto, o objetivo principal do MRP era auxiliar o suprimento. O MRP II agrega a seu antecessor o planejamento e controle de todos os recursos produtivos, tais como disponibilidades de máquinas, mão de obra e componentes estruturais, dos itens a serem produzidos, bem como a gerência do processo produtivo, evitando ineficiências, movimentações desnecessárias de recursos produtivos e estoques excessivos de matériasprimas, insumos e produtos acabados. Nesse sentido, o MRP II tinha como objetivo planejar a produção, envolvendo todos os recursos necessários. Finalmente, o ERP, com suporte a múltiplas línguas e moedas, pode planejar completamente uma organização global emultisite, agregando aos seus antecessores funções de gerenciamento de fábrica, recursos humanos, finanças, vendas, distribuição, transportes, controle de ativos, contabilidade, compras, controle de armazéns e estoques, contas a pagar e a receber, manutenção, qualidade e controle de custos, dentre outras.35 A Figura 10.2 ilustra o processo de evolução desses sistemas e a natureza das funções agregadas em cada uma de suas versões. Figura 10.2 Processo de evolução dos sistemas. Adaptado de Colangelo Filho.35ERP = planejamento de recursos empresariais; MRP = planejamento de requisição de materiais; MRP II = planejamento de recursos de produção. Costa verificou que o software ERP propõe alguns benefícios à organização.36 Os que mais se destacam são melhoria no processo de gestão, integração dos processos de negócio da organização, “obtenção de vantagem competitiva”, reestruturação do negócio e informação em tempo real aos funcionários, fornecedores e distribuidores. Ao se decidir pela utilização de sistemas ERP, as empresas esperam obter diversos benefícios, principalmente na percepção de Souza e Zwicker (2000), em relação à integração do sistema de informação, ao incremento das possibilidades de controle sobre os processos da empresa, à atualização tecnológica, à redução de custos de informática, ao retorno sobre o investimento e ao acesso à informação em tempo real para a tomada de decisão sobre a cadeia produtiva.37 Caldas e Wood Jr. apresentam as vantagens mais citadas pelas empresas: incremento da integração entre as áreas e lugares, incremento da integração da informação, processo de melhoria na qualidade da informação, oportunidade para repensar os processos e melhoria no nível de controle.38 No entanto, Bergamaschi e Reinhard afirmam que os projetos do ERP são considerados caros, demorados e complexos, o que os torna naturalmente projetos arriscados, principalmente pelo investimento feito em tempo e dinheiro. Também pode ser uma regra geral para projetos ERP custar e demorar mais do que se espera, sendo alta a taxa de fracasso.39 Sob esse foco, Caldas e Wood Jr. citam como principais desvantagens da implementação do ERP: incapacidade do sistema em se adequar às necessidades específicas da organização, perda das funçõeschave da organização devido aos requisitos do sistema, redesenho superficial dos processos, alta dependência de um único fornecedor e excessivo controle.38 Os fatores críticos para a implementação do ERP, na visão de Jarrar et al., incluem apoio da alta gerência, ▶ visão clara do negócio e questões específicas do ERP, tais como estratégia do ERP e configuração dosoftware.40 Para os autores, entretanto, as questões mais importantes estão relacionadas à reengenharia dos processos de negócio e à integração de vários processos centrais do sistema. O sucesso da implementação do sistema ERP tem sido frequentemente atribuído a dois fatores: o sistema ERP é configurado e executado dentro do prazo e do orçamento; e o processo de implementação deve ser em larga escala, ou seja, devemse considerar as pessoas, o produto e a planta da empresa. Defendem a ideia de que muitas implementações falham devido à falta de foco nos processos de negócio e na gerência da mudança. Portanto, o ERP só poderá trazer resultados significativos se for bem implementado. Para isso, a solução está no treinamento de pessoal e nos investimentos na área de tecnologia da informação. O processo de implementação de tecnologia da informação ou sistema de informação é complexo e, para que tenha êxito, é preciso, desde a decisão pela implementação, estudar o contexto no qual atuará e formar um ambiente propício para garantir seu desenvolvimento, a implementação e sua aceitação de uso. A literatura ainda aponta fatores críticos de sucesso no processo de implementação. Jarraret al. afirmam que os principais fatores críticos de sucesso são subjacentes a uma das seguintes categorias: aceitação da alta gerência, infraestrutura de TI, reengenharianos processos existentes e gerência da mudança.40 Segundo Lima, Carrieri e Pimentel, a operacionalização do ERP também permite ampliar os benefícios da integração de processos e da geração de uma base de dados única além dos limites “físicos” da organização, envolvendo clientes, fornecedores e criando uma “cadeia” de valor.41 São as chamadas soluções de gerenciamento do relacionamento com clientes (CRM,customer relationship management) e de gerenciamento da cadeia de suprimentos (SCM, supply chain management), que utilizam tecnologiasweb integradas ao ERP. Assim, visam agilizar e reduzir custos nas operações de compra e venda com seus parceiros comerciais. Gestão de suprimentos e sistemas integrados Assumpção, Souza e Robles consideram que a gestão de cadeias de suprimentos (GCS) é estratégica pelos seus objetivos de coordenação entre as operações entre empresas que mantêm relações comerciais ao buscar o estabelecimento de parcerias para a solução de problemas conjuntos e integração de seus fluxos físicos e de informações no atendimento à demanda final.42 A cadeia de suprimentos, de acordo com Swaminathan, Smith e Sadeh, pode ser definida como uma rede de entidades de negócios autônomos ou semiautônomos responsáveis coletivamente pelas atividades de compras, produção e distribuição associadas a uma ou mais famílias de produtos.43 Lee e Billington possuem uma definição similar, na qual afirmam que uma cadeia de suprimentos é uma rede de entidades que compram matériasprimas, transformamnas em produtos intermediários e, então, em produtos finais, que são entregues aos consumidores por sistema de distribuição.44 A Figura 10.3apresenta, sob a forma de diagrama, um exemplo de cadeia de suprimentos. Os materiais fluem do fornecedor de matériaprima pelas plantas de produção intermediárias, que transformam a matériaprima em produtos intermediários (também conhecidos como componentes ou peças). Estes são montados no próximo nível para formar produtos. Os produtos são enviados para os centros de distribuição e de lá para os varejistas e consumidores. Poirier e Reiter consideram o SCM um sistema que envolve todos os elementos de uma cadeia de produção, do fornecedor de matériaprima até a entrega do produto (ou serviço) pelo comércio varejista (ou pela empresa prestadora de serviços) ao consumidor final, visando à otimização da cadeia de valores como um todo.45 • • • Figura 10.3 Exemplo de cadeia de suprimento. Adaptado de Lee e Billington.44 Maçada, Feldens e Santos verificaram que essa ideia é derivada da premissa segundo a qual a cooperação entre os membros da cadeia de valores reduzirá os riscos individuais e poderá, potencialmente, melhorar a eficiência do processo logístico, eliminando perdas e esforços desnecessários.46,47 Slack et al. distinguem os diversos termos utilizados para descrever a gestão de diferentes partes da cadeia de suprimentos, considerando que a gestão da cadeia de suprimentos está relacionada à gestão do fluxo de materiais e informações entre as unidades produtivas.48 A gestão de suprimentos é a função da empresa que lida com a interface das unidades produtivas e seus mercados fornecedores. Neste contexto, ela é estruturada para a tomada de decisão em três aspectos: estratégicos, gerenciais e operacionais, abarcando as seguintes atividades: Gestão logística (fluxos de materiais e informações para a empresa) Gestão de materiais (estoques disponíveis e sua reposição para atendimento dos sistemas produtivos) Gestão da qualidade (conferência da conformidade à recepção das compras e desenvolvimento de fornecedores, no caso de novos produtos necessitarem de componentes específicos). A importância da gestão de suprimentos – também denominada, por Ballou, gestão de compras – para a GCS se baseia no controle do atendimento das necessidades de materiais para prover os sistemas de produção que atendem à demanda final (gestão do fluxo de produção), buscando evitar reprogramações do sistema produtivo dos parceiros da empresa a montante – efeito chicote.49Assim, a área de suprimentos tem a responsabilidade de coordenação entre fornecedores e áreas de programação das operações, continuidade de suprimento, pesquisa de novas fontes ou programas de desenvolvimento de fornecedores. O objetivo principal de suprimentos é apoiar a produção e/ou organização de revenda, oferecendo materiais e produtos no tempo certo ao menor custo total. De acordo com Bowersox e Closs, as informações recebidas de clientes e sobre eles fluem pela empresa na maneira de atividades de vendas, previsões e pedidos.47Estas são filtradas em planos específicos de compras e de produção. No momento do suprimento de produtos e materiais, é iniciado um fluxo de bens de valor agregado que ▶ resulta na transferência de propriedade de produtos acabados aos clientes. Nesse processo, verificamse duas ações interrelacionadas – fluxo de materiais e fluxo de informações – que devem ser coordenadas, dado que o fluxo de informações segue caminhos paralelos, porém com sentido inverso ao fluxo de materiais. A coordenação integra processos gerenciais de planejamento e programação e ocontrole das operações de rotina na relação dos macroprocessos logísticos de suprimentos (inbound logistics), de planta (plant logistics) e de distribuição (outbound logistics); ou seja, a relação que se dá desde os clientes até os fornecedores, apoiada pelos fluxos físicos de materiais e pelo de informação, de modo a consubstanciar a GCS.47 A coordenação objetiva a integração de planos que especificam objetivos estratégicos, restrições de capacidade, necessidades logísticas, posicionamento de estoque, necessidades de fabricação e necessidades de suprimento. Já a programação e o controle das operações são referentes à gestão de pedidos, ao processamento de pedidos, às operações de distribuição, à gestão de estoque, ao transporte e à expedição e ao suprimento. Estes dois níveis de informação – coordenação e programação e controle – são conectados pela previsão da demanda e sofrem retroalimentação sobre os níveis de estoque para a tomada de decisão. A função suprimento é responsável por processos gerenciais e rotineiros/operacionais para atender aos objetivos estratégicos e às necessidades das operações das empresas, respectivamente. O apoio à função de suprimentos se deve a esta função estar, cada vez mais, sendo considerada como recurso estratégico pelas empresas. Sendo assim, buscase sua integração às demais funções da empresa por meio de sistemas de informação, entre os quais se destaca o sistema ERP, apresentado a seguir. Tecnologias da informação na gestão da cadeia de suprimentos Conforme Boyson, Corsi e Verbraeck, a TI pode ajudar a superar os problemas que afetam as cadeias de suprimento.50 Os autores apontam o intercâmbio eletrônico de dados (EDI,electronic data interchange) como um exemplo de TI que possibilita a redução de erros e o aumento da eficiência dos processos de trabalho entre clientes e fornecedores, fazendo conversões e troca de dados. Os principais problemas enfrentados pelas cadeias de suprimento e que são foco na implantação de tecnologia são níveis de inventário inadequados, ordens de entrega e recebimento não cumpridas e problemas na transmissão de informações. Tecnologias como EDI, sistema de gerenciamento de armazém (WMS,warehouse management system), rastreamento de frotas, códigos de barra, entre outras, estão sendo utilizadas para que seja possível o processamento de mais informação, de maneira mais precisa, com maior frequência e de uma quantidade maior de fontes dispersas geograficamente. A tecnologia da informação torna possíveis publicação, armazenamentoe utilização dessa crescente abundância de informações por intermédio de sofisticados sistemas de análise, modelagem e apoio à decisão.50Na tabela 10.1 são apresentados alguns sistemas de informação utilizados na gestão da logística. Tabela 10.1Sistemas de informações logísticas (tecnologias e definições).46 Sistemas de gestão de armazéns (WMS) Sistema que mantém controle e rastreamento do movimento de estoques por meio dos depósitos, desde o recebimento até a expedição. O WMS gerencia a utilização de recursos como espaço e pessoal Identificação por radiofrequência (RFID) Tecnologia que sustenta comunicações sem fio para leitura e transmissão de dados. São utilizados nas cadeias de suprimento por etiquetas rastreáveis que possibilitam o controle do posicionamento de produtos Rastreamento de frotas Equipamentos de rastreamento de frotas são comumente utilizados em caminhões e reboques, de modo a acompanhar a localização e alimentar sistemas de informação. Podem empregar • tecnologias como satélites ou sistemas celulares para a localização dos móveis Códigos de barras Sistemas de etiquetas padronizadas para identificação de produtos. Esses códigos são usados para obtenção de dados por parte dos sistemas de informações logísticas Intercâmbio eletrônico de dados (EDI) Sistema para intercâmbio de dados por tecnologia eletrônica, que possibilita transmissões de dados mais ágeis entre parceiros da cadeia de suprimentos Estoque administrado pelo fornecedor (VMI) Tem como objetivo fazer com que os fornecedores, por meio de um sistema de EDI, verifique as necessidades do cliente em relação a um produto, no momento certo e na quantidade certa Compras eletrônicas (eprocurement) Sistemas empregados para automatização dos processos de compra. Podem utilizar a internet como plataforma, de modo a possibilitar maior integração com fornecedores Sistemas integrados de gestão (SIG) Têm como objetivo apoiar a gestão organizacional, integrando os processos e operações da empresa, mantendo uma base unificada de informações ★ Outras estratégias de sistemas de informação emergentes Strategic sourcing (ou strategic source): metodologia utilizada, em especial, pelas áreas de suprimentos, em que se analisa profundamente o custo total de aquisição de cada família de produtos ou serviços por meio de seu mapeamento, entendimento e avaliação das especificações desses materiais, níveis de serviço e de seu mercado fornecedor (Figura 10.4). Conforme o processo apresentado naFigura 10.4, é possível revisar todos os custos externos que afetam os produtos finais, bem como os custos internos de utilização, financeiro e de logística, sendo possível, também, avaliar otimizações na estrutura dos produtos, achar um ponto ótimo que atenda aos requerimentos e níveis de serviço que maximizem o custobenefício de determinada aquisição, ampliando o conhecimento do mercado fornecedor, melhorando a qualidade do material e agilizando, assim, o fluxo de atendimento do mercado. Desse modo, explorando o poder de compra e identificando uma vantagem competitiva, ostrategic sourcingpossibilita maior potencial de redução de custos e aumento de desempenho da cadeia produtiva, com melhoria da qualidade e agilidade dos processos operacionais. Um profissional dostrategic sourcingdeve harmonizar a qualidade do serviço com garantia de redução de custos, a tecnologia, a capacitação dos profissionais de compras e o monitoramento dos resultados, como fatoreschave na incorporação deste modelo funcional nas empresas • • • ■ Figura 10.4 Modelo funcional do strategic sourcing. Adaptado deM2M Consultoria.51 Spend analysis(análise de gastos): tem como objetivo organizar e entender a distribuição dos gastos e consumos ao longo de um período, identificando tendências, oportunidades de negócios e melhores estratégias para o processo de aquisição. O spend analysis abrange o levantamento e a definição das categorias de compras por meio de informações históricas de volumes comprados; volumes de requisições, cotações, pedidos e contratos; equalização do número de fornecedores e, ainda, informações do modelo de compras, comofrequência, rotatividade de fornecedores, sinergias de demandas, modelo de entrega e armazenagem. Esta análise detalhada resulta num plano que inicia com a priorização das ondas de sourcing, privilegiando as categorias com maior potencial de economia e menor impacto operacional para a empresa Sistema Público de Escrituração Digital (SPED): oSPED visa promover a atuação integrada dos fiscos nas três esferas de governo (federal, estadual e municipal), uniformizar o processo de coleta de dados contábeis e fiscais, bem como tornar mais rápida a identificação de ilícitos tributários. Dentre os benefícios vislumbrados para os contribuintes com a implantação desse sistema, destacase a redução de custos, além de simplificação e agilização dos processos que envolvem o cumprimento de obrigações acessórias. O SPED é composto de vários módulos: escrituração contábil digital, escrituração fiscal digital, nota fiscal eletrônica e conhecimento de transporte eletrônico, dentre outros Nota Fiscal Eletrônica (NF–e):foi criada para substituir o modelo impresso tradicional. Pela definição oficial, consiste num documento de existência apenas digital, emitido e armazenado eletronicamente, com o intuito de documentar uma operação de circulação de mercadorias ou uma prestação de serviços ocorrida entre as partes. Sistemas de informação na indústria alimentar Martinelli Jr. pesquisou as modificações ocorridas na indústria alimentar a partir da década de 1980, principalmente nos países desenvolvidos.52 O autor verificou que, na indústria de alimentos, a emergência de formas mundiais de oligopólio e a ampliação e a modificação nos padrões da concorrência e do consumo fizeram com que grandes empresas alimentícias modificassem suas regras no embate concorrencial. Outra constatação foi que as empresas têm se esforçado para maior integração e adaptabilidade aos mercados alimentícios, frente aos novos parâmetros sociais emergentes da globalização econômica e cultural. ▶ ■ A indústria alimentícia tem relacionamentos a montante com fornecedores de matériasprimas, embalagens e maquinários.53Segundo Rattner et al., as matériasprimas classificamse em três grupos: agrícola (canadeaçúcar, algodão, soja, palma, frutas e legumes, café, arroz, milho, trigo, cevada, sorgo, aveia e cacau), pecuária (carne de bovinos, caprinos e suínos; leite e derivados do leite) e marítima (peixes de águas doce e salgada). Dentre as matériasprimas destacamse também as provenientes da indústria química, ou seja, fabricantes de aditivos ou de ingredientes específicos, como conservantes e agentes tamponantes (bicarbonatos, carbonatos, citratos, cloretos, lactatos, ortofosfatos e sulfatos de cálcio, magnésio, sódio, lítio e potássio).54 Em relação às produtoras de alimentos processados, apresentase o setor de distribuição, incluindo indústrias reprocessadoras, atacadistas e distribuidores, importadores, distribuidores internacionais, cadeias de varejo e segmentos da cadeia de refeições fora do lar, nacionais e internacionais.53 A indústria da alimentação brasileira concentrase na região Sudeste (49,1%), sendo que o estado de São Paulo representa 24,3%. A seguir, vêm as regiões Sul (22,2%), Nordeste (17,5%), CentroOeste (7,7%) e Norte (3,6%). Quanto ao valor adicionado, a região Sudeste também é a mais importante e o estado de São Paulo responde sozinho com 37,8% do valor da produção brasileira de alimentos.55 Metodologia de pesquisa O estudo realizado baseouse em revisão bibliográfica sobre a temática proposta (adoção de sistemas de informação para apoio aos processosde negócios da empresa) e numa pesquisa por intermédio de estudo de caso de uma empresa do setor alimentício que adotou uma série de estratégias tecnológicas, utilizando fontes de evidências em fontes secundárias. A pesquisa foi norteada com o objetivo geral de que o uso efetivo de sistemas de informação para apoio aos processos de negócios em empresas do setor alimentício contribui para a gestão de suprimentos e compra, pois é capaz de apoiar tanto as atividades operacionais quanto as atividades estratégicas e táticas. A revisão bibliográfica baseouse em publicações nacionais e internacionais, artigos acadêmicos e visitas asites especializados. Estudo de caso: Empresa Alpha*terceiriza serviços usando sistemas integrados de informação para padronização e unificação de cadastros A Empresa Alpha é uma das principais empresas de agronegócio e alimentos do país, conquistando a liderança em originação de grãos e processamento de soja e trigo, na produção de fertilizantes, na fabricação de produtos alimentícios e em serviços portuários. É uma das maiores exportadoras do Brasil (a primeira em agronegócio), contribuindo de maneira substancial para o saldo positivo da balança comercial e para as divisas para a economia nacional. A Empresa Alpha adotou, na sede de GasparSC, o conceito de CSC. A estrutura, responsável poroutsourcing de TI, foi implantada pela Sonda Procwork e irá conduzir os 377 processos e 800 transações realizadas na empresa nas áreas financeira, de controladoria, fiscal e de recursos humanos. Apenas pelo departamento de Recursos Humanos da empresa transitam informações e procedimentos de 5,6 mil funcionários dos 27 sites que compõem o conglomerado da indústria no país. Até a implantação desse modelo, as atividades deste e de outros departamentos eram executadas por sistemas legados. Agora, porém, passam a ser centralizadas pelo ERP da empresa SAP (System Analyze and Programmentwicklung), também implantado pela Sonda Procwork. O objetivo das implementações, tanto do centro de serviços compartilhados quanto do ERP, foi apoiar o crescimento da empresa, que está diversificando atividades e mirando novos mercados. No centro de serviços estão 190 profissionais, sendo a maioria excolaboradores da empresa, que pertenciam às áreas que tiveram parte de suas atividades absorvidas pela nova estrutura. Isto possibilitou a continuidade das atividades com maior qualidade. Esses profissionais deixaram de ser staff da Empresa Alpha e passaram a assumir as principais atividades do centro de serviços compartilhados, o que os coloca numa posição de destaque na indústria alimentícia. O contrato do centro de serviços compartilhados foi de 5 anos, renovável. No local, haverá o compartilhamento ▶ de atividades operacionais com outras empresas, o que irá gerar serviço em escala, criando condições para redução de custos. O modelo implantado agora no Brasil deverá servir, em breve, debenchmarking para as outras operações globais da indústria. Quando a empresa decidiu pelo conceito de outsourcing de serviços, chegou o momento ideal também para substituir os sistemas legados por um ERP, principalmente favorecendo a área financeira da organização. O próximo passo foi redesenhar todos os processos da companhia, baseandose no que é oferecido pelo SAP e, em seguida, preparar a parametrização do sistema para a implementação de novas funções. A partir da aquisição da Usina Moema – uma das dez maiores usinas sucroalcooleiras do Brasil – e do Terminal Marítimo do Guarujá (Termag), a Empresa Apha ampliou seu contrato com a Astrein, empresa especializada em soluções e softwarepara gestão de ativos,facilities e centrais de cadastro, com intuito de unificar os cadastros e a classificação fiscal dos itens das novas empresas do grupo. Cliente da Astrein há mais de 5 anos, a Empresa Alpha já utiliza soluções para gerenciamento de manutenção e padronização de dados para a central de cadastro em mais de 20 unidades da companhia, onde tal projeto se iniciou em sua divisão Alimentos. Na sequência, realizou a padronização para a divisão Fertilizantes e agora buscou a consolidação de seu cadastro com os itens da Usina Moema e Termag. A empresa está investindo em qualificação e padronização, estendendo a metodologia para todas as unidades da empresa, visando, com isso, a ganhos com economia nas compras centralizadas, otimização de atividades e mão de obra, estabelecimento de contratos de fornecimentos corporativos (EPI, Itens de escritório, elétricos, entre outros), melhoria do perfil das compras realizadas por meio de análises por categorias, melhoria no planejamento de compras, indicadoreschave e implantação de compras eletrônicas com o modelobusiness to business(B2B) para algumas empresas. Nesse sentido, a empresa firmou novos contratos com uma empresa terceirizada para ampliar a padronização e, assim, buscar a unificação de cadastros. Com a solução da Astrein, as empresas recémadquiridas terão uniformização das descrições técnicas, unificação de cadastros, governança para atender novos itens, dados confiáveis e alinhamento dos dados às exigências fiscais, como Nomenclatura Comum do Mercosul (NCM), SPED e nota fiscal eletrônica, além de outros benefícios. Com sede em São Paulo e mais de 20 anos de experiência, a Astrein atua no desenvolvimento desoftware, treinamento e serviços nas áreas de centrais de cadastro, gestão de ativos, gestão de facilities. A Empresa Alpha agora oferece a plataforma de serviços compartilhados Astrein (SSA, shared services Astrein), que tem como objetivo reunir, em uma solução, todas as ferramentas necessárias para operação e gestão de processos, permitindo ganhos de produtividade, aumento do nível dos serviços, melhorias contínuas e redução de custos. Além disso, a empresa contratada também tem forte atuação no mercado de soluções de padronização técnica das descrições de materiais, serviços, fornecedores, clientes e classificação fiscal de itens (NCM e IPI), dispõe de serviços relacionados para viabilizar a completa adequação dos cadastros para atender às iniciativas como unificação de cadastros para implantação de ERP,eprocurement, strategic sourcing, spend analysis, além das adequações necessárias para atender às exigências do Sistema Público de Escrituração Digital e da Nota Fiscal Eletrônica. Considerações finais O estudo de caso na Empresa Alpha, bem como o referencial apresentado, permitiu entender melhor como ocorre o processo de implementação de novas tecnologias de informação em uma organização. A necessidade de a empresa se adequar ao ambiente (interno e externo) traz para as organizações evolução e revolução constantes em todo o seu processo organizacional; entretanto, é preciso conduzir o processo de mudança de maneira segura e efetiva, já que, quando se trata de inovação tecnológica, o que se tem é uma transição de um modo de realizar o trabalho, manual ou parcialmente automatizado, para um modo totalmente automatizada e informatizada. Os sistemas de informação, quando implementados numa empresa, fazem parte de um contexto técnico e social da organização. A implementação de uma nova tecnologia não é fator determinante para a competitividade, apesar de a maioria das organizações pensar assim. Por isso, não basta somente ter um sistema de informação, cujas características sinalizam para obtenção de competitividade, ou seja, é preciso que, além de se adequar à organização, integrar as diferentes áreas, racionalizar os processos e gerar informações seguras e em tempo real, ▶ 1. 2. 3. 4. 5. 6. 7. 8. 9. 10. 11. 12. 13. 14.15. 16. 17. 18. 19. 20. 21. esse sistema torne possível à organização conhecer mais sobre suas possibilidades em relação à tecnologia e à sua utilização, principalmente empregando as informações geradas como recurso estratégico. Com as observações feitas no estudo de caso, foi possível comprovar que, no processo de implementação, devem ser usados vários elementos estruturantes para a obtenção de êxito e adequação efetiva do sistema à organização. Sob esse foco, a implementação de um sistema de informação deve acontecer considerando fatores associados às pessoas, à estrutura, à estratégia e à tecnologia, em associação e interrelação consistente e coerente com o todo organizacional, e também considerar as empresas fornecedoras desses sistemas como parceiras estratégicas, já que elas terão forte participação no apoio das transformações organizacionais no que se refere à revisão dos processos administrativos. Nesse contexto, é importante citar que somente a tecnologia, ou seja, a sua utilização de maneira isolada, não traz benefícios à organização: é preciso que ela seja inserida num contexto maior e faça parte de uma estratégia que envolva toda a organização. Referências bibliográficas RODRIGUES, M.; ASSOLARI, L. M.A tecnologia da informação ERP e seus benefícios na gestão de processos e crescimento dos negócios. XXXI Encontro Nacional de Pósgraduação em Administração (EnAnpad), Rio de Janeiro, 2007. LAUDON, K. C.; LAUDON, J. 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