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PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA Jair Messias Bolsonaro MINISTÉRIO DA JUSTIÇA E SEGURANÇA PÚBLICA Anderson Gustavo Torres SECRETARIA DE GESTÃO E ENSINO EM SEGURANÇA PÚBLICA Ana Cristina Melo Santiago DIRETORIA DE ENSINO E PESQUISA Roberto Glaydson Ferreira Leite COORDENAÇÃO GERAL DE ENSINO Juliana Antunes Barros Amorim COORDENAÇÃO DE ENSINO A DISTÂNCIA Juliana Antunes Barros Amorim COORDENAÇÃO PEDAGÓGICA Gisele Matos Gervásio COORDENAÇÃO GERAL DE GERENCIAMENTO DE PROJETOS PEDAGOGICOS E INOVAÇÃO Alessandra Veríssimo Lima Santos CONTEUDISTA Juvenildo dos Santos Carneiro REVISÃO TÉCNICA Francisco Luiz da Fonseca Issa Paulo Roberto Batista de Oliveira Virginia Canedo Bruzzone REVISÃO ORTOGRÁFICA Victória Pereira Vasconcelos de Abreu PROGRAMAÇÃO E EDIÇÃO Renato Antunes dos Santos DESIGNER Vinícius Alves de Sousa Renato Antunes dos Santos DESIGNER INSTRUCIONAL Vinícius Alves de Sousa SUMÁRIO Apresentação do Curso ............................................................................................ 7 Objetivos do Curso ................................................................................................... 8 Objetivo Geral ....................................................................................................... 8 Objetivos Específicos ............................................................................................ 8 Estrutura do Curso ................................................................................................ 9 Módulo 1 – Compatibilidade entre Direitos Humanos e Direitos Fundamentais e Eficiência da Segurança Pública ........................................................................... 10 Apresentação do módulo .................................................................................... 10 Objetivos do módulo ........................................................................................... 12 Estrutura do módulo ............................................................................................ 12 Aula 1 – Entendendo os direitos humanos e os direitos fundamentais ...... 13 1.1 Introdução – O que são os direitos humanos? ....................................... 13 1.2 Reflexões sobre os fundamentos e a razão de ser dos direitos humanos ...................................................................................................................... 15 1.3 Breve descrição sobre a evolução e as características dos direitos humanos ....................................................................................................... 17 1.4 Sistema interno e internacional e mecanismos de proteção aos direitos humanos ....................................................................................................... 19 1.5 Direitos humanos e direitos fundamentais em espécie ........................... 26 Aula 2 – O papel da segurança pública no Brasil .......................................... 29 2.1 Breve descrição do modelo de segurança pública no Brasil .................. 29 2.2 Das ações de segurança pública ............................................................ 30 2.3 Das ações de prevenção e de pronta resposta (repressão) ................... 31 2.4 Das atividades de investigação de polícia judiciária ............................... 33 2.5 Atuação das Forças Armadas no contexto da segurança pública – a garantia de lei e da ordem (GLO) ................................................................. 34 Aula 3 – Direitos humanos e direitos fundamentais aplicados nas ações dos profissionais de segurança pública ......................................................... 36 3.1 Introdução ............................................................................................... 36 3.2 Segurança pública e direitos humanos – um novo paradigma de cidadania no Brasil ....................................................................................... 37 Finalizando ........................................................................................................ 38 Módulo 2 – Violação dos Direitos Humanos e dos Direitos Fundamentais – Estudo dos Casos de Responsabilidade Funcional, Pecuniária e Penal ........... 39 Apresentação do módulo .................................................................................... 39 Objetivos do módulo ........................................................................................... 40 Estrutura do módulo ............................................................................................ 40 Aula 1 – Dos direitos e obrigações dos profissionais que atuam na segurança pública ............................................................................................ 41 1.1 Introdução ............................................................................................... 41 1.2 Ética, obrigações e deveres .................................................................... 42 1.3 Das regras de conduta em espécie ........................................................ 43 Aula 2 – Do uso legítimo da força ................................................................... 48 2.1 Monopólio do uso da força (legítima) ...................................................... 48 2.2 Do uso racional e diferenciado da força ................................................. 49 2.3 Outros aspectos sobre a atuação na segurança pública ........................ 54 Aula 3 – Casos de responsabilização do profissional de segurança pública por violação aos direitos humanos e aos direitos fundamentais ................. 57 3.1 Da responsabilidade no campo disciplinar ............................................. 57 3.2 Improbidade administrativa ..................................................................... 58 3.3 Casos de responsabilização por violação aos direitos humanos e aos direitos fundamentais .................................................................................... 60 3.3.1 Tentativa de fuga de presídio. Custodiado morto .......................... 60 3.3.2 Policial é condenado por homicídio e à perda do cargo público .... 62 3.3.3 Policiais são condenados por tortura de presos ............................ 63 3.3.4 Situação relacionada à prática de feminicídio ............................... 64 Finalizando ........................................................................................................ 66 Módulo 3 – Responsabilidade, Controle e Transparência: O Papel do Estado e dos Gestores na Tutela dos Direitos Humanos e dos Direitos Fundamentais .. 67 Apresentação do módulo .................................................................................... 67 Objetivos do módulo ........................................................................................... 67 Estrutura do módulo ............................................................................................ 68 Aula 1 – Segurança pública e o controle social ............................................. 69 1.1 Accountability – o dever do Estado e dos gestores de prestar contas .... 69 1.2 Construindo a confiança na segurança pública sob a perspectiva da tutela dos direitos humanos .......................................................................... 71 1.3 Efetividade dos mecanismos de controle das ações dos órgãos de segurança ..................................................................................................... 72 1.4 Transparência e acesso à informação - Lei nº 12.527/2011 ................... 74 Aula 2 – A responsabilidade do Poder Público e dos gestores na tutela dos direitos humanos .............................................................................................. 77 2.1 Introdução ...............................................................................................77 2.2 Construção de políticas públicas ............................................................ 77 2.3 Programa Nacional de Direitos Humanos - PNDH-3 e atuação do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos ............................ 79 2.4 Políticas de Segurança Pública .............................................................. 80 2.5 Atividade de inteligência de segurança pública e o respeito aos direitos humanos ....................................................................................................... 83 2.6 Proteção e assistência às pessoas vulneráveis...................................... 84 Aula 3 – Alinhando as ações Institucionais aos planos de segurança pública para a tutela dos direitos humanos ................................................... 86 3.1 Introdução ............................................................................................... 86 3.2 Formação, capacitação, aperfeiçoamento, qualificação e atualização ... 87 3.3 Disponibilização de instrumentos para atuação dos agentes de segurança pública - Lei nº 13.060/2014 e Portaria Interministerial nº 4.226/2010 .................................................................................................... 89 3.4 Estabelecimento de procedimentos operacionais padronizados - POP . 90 3.5 Valorização, saúde, qualidade de vida dos profissionais de segurança pública e seus familiares .............................................................................. 93 Finalizando ........................................................................................................ 97 Módulo 4 – Estudos dos casos de responsabilização internacional do Estado brasileiro em decorrência de violação dos direitos humanos no âmbito da segurança pública ................................................................................................... 98 Apresentação do módulo .................................................................................... 98 Objetivos do módulo ........................................................................................... 98 Estrutura do módulo ............................................................................................ 99 Aula 1 – O regime de responsabilidade internacional do Estado em decorrência da violação institucional dos direitos humanos ..................... 100 1.1 Introdução ............................................................................................. 100 1.2 A Justiça Internacional na proteção dos direitos humanos ................... 102 1.3 Incidente de deslocamento de competência ......................................... 105 1.4 Tribunal Penal Internacional ................................................................. 106 Aula 2 – Casos julgados pela jurisdição contenciosa no âmbito do sistema internacional de proteção de direitos humanos .......................................... 109 2.1 Introdução ............................................................................................. 109 2.2 Principais casos de responsabilização internacional dos Estados nos Sistemas Regionais .................................................................................... 110 2.2.1 Corte Europeia de Direitos Humanos - Caso Tunikova e Outros contra a Rússia .................................................................................... 110 2.2.2 Comissão Interamericana de Direitos Humanos – Caso Maria da Penha Maia Fernandes contra o Brasil ................................................ 111 2.2.3 Corte Europeia de Direitos Humanos – Caso Ilicak contra a Turquia ............................................................................................................. 112 2.2.4 Comissão Interamericana de Direitos Humanos – Caso Nogueira de Carvalho e Outro contra o Brasil ..................................................... 113 2.2.5 Comissão Interamericana de Direitos Humanos – Caso Escher e outros contra o Brasil ........................................................................... 114 2.2.6 Comissão Interamericana de Direitos Humanos – Caso Garibaldi contra o Brasil ...................................................................................... 114 2.2.7 Comissão Interamericana de Direitos Humanos – Medidas provisórias contra o Brasil – Complexo Penitenciário de Pedrinhas .... 115 2.2.8 Corte Interamericana de Direitos Humanos – Caso Favela Nova Brasília contra o Brasil ......................................................................... 117 Aula 3 – A cooperação de organismos internacionais e de Organizações Não Governamentais para a proteção dos direitos humanos .................... 118 3.1 Introdução ............................................................................................. 118 3.2 Comitê Internacional da Cruz Vermelha (CICV) ................................... 119 3.3 Human Rights Watch (HRW) ................................................................ 121 3.4 Anistia Internacional ............................................................................. 122 3.5 Considerações Finais ........................................................................... 123 Finalizando ...................................................................................................... 125 Referências Bibliográficas ................................................................................... 126 7 Apresentação do Curso Caro(a) aluno(a), Seja bem-vindo(a) ao curso de Direitos Humanos: casos práticos nas ações de segurança pública. Assista ao vídeo introdutório do curso clicando aqui. O Curso “Direitos Humanos: casos práticos nas ações de segurança pública” é fruto da Política Nacional de Segurança Pública e Defesa Social (PNSPDS) instituída pela Lei nº 13.675/2018. Para além do PNSPDS, o processo de ensino e aprendizagem tem como base a Matriz Curricular Nacional da Secretaria Nacional de Segurança Pública (SENASP/MJSP) e é inspirado no Plano Nacional de Educação em Direitos Humanos (PNEDH). O curso é voltado para os profissionais integrantes do Sistema Único de Segurança Pública (SUSP) que atuam desde a prevenção, com patrulhamento diário nas ruas, garantindo a lei e a ordem, socorrendo pessoas, cuidando dos bens do Estado e das pessoas, fiscalizando o trânsito, intervindo em ocorrências, investigando, realizando perícias e diligências, fazendo escolta ou custodiando pessoas no sistema prisional. A proposta do processo de ensino-aprendizagem é estimular a reflexão sobre a real natureza de suas tarefas diárias e a promoção da dignidade da pessoa humana em favor de todos os seres humanos, de forma indistinta. Nesse sentido, a intenção é trabalhar apenas os temas mais relevantes e emergentes, indicando alguns meios e ferramentas para esse fim, porque a partir daí, por si só, o aluno dará continuidade na busca pelo conhecimento, habilidades e atitudes, com o intuito de guiar sua atuação profissional de forma adequada. O curso é composto por 04 (quatro) módulos e será desenvolvido na modalidade de Educação a Distância (EaD), observados os princípios de interação e autonomia dos alunos, mediante participação em discussões no Ambiente Virtual de Aprendizagem (AVA). https://www.youtube.com/watch?v=E_-piEW-dmI&list=PLDBQnR5u1Wk7RntO2cKs79F2ysdi46Xgq&index=1 8 Objetivos do Curso Objetivo Geral Difundir a promoção, a garantia e a proteção dos direitos humanos, o respeito aos direitos fundamentais e a garantia da cidadania e da dignidade da pessoa humana a partir da reflexão e análise dos problemas reais que se enfrentam na segurança pública. Objetivos Específicos • Identificar as bases dos direitos humanos e dos direitos e garantias fundamentais como valores de democracia e cidadania; • Reconhecer o papel dos órgãos de segurançapública, sob uma visão sistêmica e integrada para a promoção, garantia e proteção dos direitos humanos; • Demonstrar que a atuação da segurança pública em uma perspectiva democrática está em harmonia com os direitos humanos e os direitos e garantias fundamentais; • Reconhecer a importância, a dimensão e as consequências do uso da força como profissional de segurança pública responsável pela aplicação da lei; • Entender o papel do Estado e dos gestores na formação, capacitação, qualificação e disponibilização de instrumentos para atuação dos profissionais de segurança pública; • Identificar as boas práticas de valorização, saúde, qualidade de vida e da segurança dos profissionais de segurança pública e seus familiares; • Analisar alguns casos julgados pelo Poder Judiciário envolvendo a violação dos direitos humanos e dos direitos fundamentais durante o exercício das atividades de segurança pública ou em função delas; • Enumerar as consequências nas esferas (administrativa, penal e civil) decorrentes de responsabilização por violação aos direitos humanos e aos direitos fundamentais; e • Analisar casos práticos e conhecer a repercussão da responsabilização internacional do Estado brasileiro em decorrência da violação 9 institucional dos direitos humanos em ações desenvolvidas na área de segurança pública. Estrutura do Curso Este curso possui 40 horas e compreende os seguintes módulos: Módulo 1 – Compatibilidade entre os direitos humanos e direitos fundamentais e a eficácia da segurança pública. Módulo 2 – Violação dos direitos humanos e dos direitos fundamentais - estudo dos casos de responsabilidade funcional, pecuniária e penal. Módulo 3 – Responsabilidade, controle e transparência - o papel do Estado e dos Gestores na tutela dos direitos humanos e dos direitos fundamentais. Módulo 4 – Estudos dos casos de responsabilização internacional do Estado brasileiro em decorrência de violação dos direitos humanos no âmbito da segurança pública. 10 Módulo 1 – Compatibilidade entre Direitos Humanos e Direitos Fundamentais e Eficiência da Segurança Pública Apresentação do módulo Olá, tudo bem? Seus estudos sobre Direitos Humanos: casos práticos nas ações de segurança pública começam agora! Assista ao vídeo introdutório deste módulo clicando aqui. Nossa jornada tem como objetivo trabalhar as questões de ordem efetiva sobre o exercício das atividades de preservação da ordem pública e de incolumidade, ou seja, isenção de danos, das pessoas e do patrimônio, dando ênfase na proteção dos direitos à vida, à liberdade, à integridade física, à igualdade, dentre outros (aos direitos humanos). Antes, porém, preciso fazer uma introdução em relação à aceitação de compromissos por parte do Estado moderno (brasileiro), de seus órgãos e servidores em favor de cada cidadão. Você já ouviu falar sobre a existência de um contrato social (teorias contratualistas)? Lembre-se, em um contrato são estabelecidas cláusulas (regras) entre duas ou mais partes (pessoas) com a finalidade de criar, de maneira genérica, direitos ou benefícios e obrigações ou deveres para se alcançar um conjunto de finalidades. Mas, por que falar de contrato? Gosto de falar disso para iniciar a reflexão sobre o que é o Estado Moderno. Por que ele existe e para que serve? Para responder a essas perguntas é importante fazer um link desse princípio com a Constituição Federal (1988) porque, de certa forma, ela representa bem a noção de um contrato social, isto é, de um acordo entre os membros de nossa sociedade para estabelecer uma ordem social, na qual o Estado possui a autoridade sobre todos nós, por meio de um conjunto de regras, para alcançar o bem comum (interesse público). Nossa Constituição Cidadã de 1988 (CF/88) define bem a ideia de que a República Federativa do Brasil deve, dentre outras coisas, construir uma sociedade livre, justa e solidária, garantir o desenvolvimento nacional, erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais (art. 3º). Estamos diante de um Estado Democrático de Direito, uma organização político- administrativa, que busca atender as determinações do povo, por meio de seus https://www.youtube.com/watch?v=_le9VTPGhXk&list=PLDBQnR5u1Wk7RntO2cKs79F2ysdi46Xgq&index=2 11 representantes, em busca de proporcionar cidadania, respeito à diversidade política e à dignidade humana. A partir dessa perspectiva surgem as funções e os órgãos do Estado para regular a conduta de todos por meio das leis (Legislativo), para prestar serviços à população nas áreas de educação, saúde, segurança, mobilidade urbana, dentre outras (Executivo) e promover a justiça diante dos conflitos em sociedade (Judiciário). Para cumprir tais tarefas, cabe aos órgãos do Estado (com destaque especial para o Poder Executivo, que chamamos aqui de Administração Pública) as competências ou poderes, dentre eles o de regulamentar e o de polícia. Em outras palavras, a Administração Pública para cumprir com eficiência o seu papel de proporcionar o bem comum (nas áreas de educação, saúde, segurança, mobilidade urbana, dentre outras) tem o poder de fixar regras destinadas à organização e de como regular e limitar o exercício dos direitos individuais em prol da coletividade. Em resumo, considerando os deveres e direitos, ao lado da supremacia do interesse público e das prerrogativas, o Estado deve proporcionar o bem da coletividade (promover cidadania) e as pessoas se submetem à sua autoridade, seja por meio do pagamento de tributos (impostos, contribuições, taxas etc.) ou por meio do cumprimento das determinações das agências estatais. Aqui surge uma questão: diante da supremacia do interesse público e as prerrogativas, o Estado e seus órgãos podem exercer o poder e cumprir suas tarefas de forma absoluta e sem restrições sobre as pessoas? A resposta imediata é não! Você sabe bem disso. É uma noção básica, pois estamos em um Estado Democrático de Direito, certo? Mas sabe o que isso significa? Sabemos que a supremacia do interesse público e as prerrogativas constituem instrumentos essenciais para promover o bem comum, embora existam limites. Você sabe quais são e por quê? É exatamente aqui que entram os direitos e garantias fundamentais e os direitos humanos. Mas, afinal de contas, o que são e para que servem? Por que eles existem e estabelecem limites para o Estado? Quais são as implicações sobre as tarefas dos profissionais de segurança pública? A partir de agora buscaremos responder tais questionamentos. Para isso, preciso que você esteja aberto para se dedicar à leitura reflexiva de cada tópico apresentado, juntamente com a realização dos exercícios ao final, somados aos debates com seus colegas de turma e de profissão, pois isso é fundamental para 12 agregar aos conhecimentos, habilidades e atitudes no âmbito de suas tarefas diárias na segurança da sociedade. Vamos lá? Objetivos do módulo Os objetivos do módulo são: • Identificar a aplicação dos direitos humanos como valores de democracia e cidadania; • Reconhecer o papel dos órgãos de segurança pública de acordo com uma visão sistêmica e integrada; e • Demonstrar que a atuação da segurança pública em uma perspectiva democrática está em harmonia com os direitos humanos e os direitos e garantias fundamentais. Estrutura do módulo Este módulo compreende as seguintes aulas: Aula 1 – Entendendo os direitos humanos e os direitos fundamentais. Aula 2 – O papel da segurança pública no Brasil. Aula 3 – Direitos humanos e os direitos fundamentais aplicados à ação dos profissionais de segurança pública. 13 Aula 1 – Entendendo os direitos humanos e os direitos fundamentais 1.1 Introdução – O que são os direitos humanos? Já comentei nas linhas atrás que você deve possuir algum conhecimento sobre direitoshumanos, como, por exemplo: características, alcance, titularidade, evolução histórica, direitos e garantias fundamentais. Até porque existem orientações para que os cursos de formação, de aperfeiçoamento e especialização no âmbito da segurança pública devam dedicar um espaço sobre o tema na grade curricular. Mas, vamos imaginar que a sua rotina fez com que esses aspectos específicos sobre o assunto se perdessem no tempo, é hora de retomar os estudos, considerando os propósitos do nosso curso. É necessário que você tenha esse conhecimento para que suas ações (habilidades e atitudes) estejam alinhadas com os parâmetros que se espera de um profissional de segurança pública (não se esqueça das obrigações do contrato social). Vale alertar, porque, como representante do Estado, não basta apenas saber patrulhar as ruas, garantir a lei e a ordem, socorrer pessoas, abordar, conter agressões com o uso da força, fazer diligências de investigação, tirar a liberdade de alguém pela prática de um delito ou manter essa pessoa sob custódia. Dentro do contrato social que eu citei (regido pela CF/88 e legislação vigente), é preciso que você saiba dos limites da sua atuação (até onde você pode ir, quais são as balizas, fronteiras ou marcos), pois eles existem tanto para evitar os excessos, abusos e arbitrariedades, como também para garantir que o ser humano exista com dignidade. Então, volto à pergunta feita agora há pouco: para que servem os direitos humanos? O que são direitos a garantias fundamentais? Por que eles existem e estabelecem limites para o Estado e os profissionais de segurança? Assista ao vídeo abaixo, ele é importante para uma compreensão inicial acerca dos direitos humanos. 14 Opa! E aí? Podemos avançar? Então vamos à pergunta: o que são direitos humanos? Me diga, o que você, sinceramente, entende? Formule um conceito! Pegue aí um papel e uma caneta. É hora de escrever. Terminou? Por aqui, adotamos a concepção de que os direitos humanos são um conjunto de preceitos básicos, constituído de normas, mandamentos e ordens legais que vinculam, asseguram, preservam e protegem os “valores mais caros da existência humana” (MENDES; GONET BRANCO, 2018, p. 197). Esteja onde estiver e seja quem for, mesmo que em conflito com outras pessoas ou com o Estado e até mesmo praticando crimes. Acrescento que tais preceitos envolvem, para além da existência (sobreviver), a possibilidade mínima de satisfazer as necessidades fundamentais de saúde (física e mental), educação, segurança, emprego, lazer, dentre outros. É ter o direito de viver com dignidade de “ser humano”, ainda que descumprindo as leis e as convenções sociais. Você não concorda? Muito abstrato ou impossível de se cumprir? Pouco efetivo? Acha que estou errado ou que está faltando alguma coisa? Tudo bem. Pelo menos temos um marco inicial para recordar e começar uma reflexão sobre o assunto. Se você não concordar, sugiro a leitura de uma obra especializada, como, por exemplo, aquelas elencadas na Bibliografia deste curso. Existem várias. Espero por sua leitura. https://www.youtube.com/watch?v=uCnIKEOtbfc 15 Ressalto que os direitos humanos, em determinadas situações, poderão ser mitigados pelo Estado, nos termos do Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos - PIDCP (1992), art. 4º, n.1, contudo, eles possuem um “núcleo duro” que não pode ser afastado, conforme previsto no PIDCP, art. 4º, n.2 (como por exemplo, a cláusula pétrea – CF/88, art. 60, § 4ª), veja: Artigo 4 1. Quando situações excepcionais ameacem a existência da nação e sejam proclamadas oficialmente, os Estados parte do presente Pacto podem adotar, na estrita medida exigida pela situação, medidas que suspendam as obrigações decorrentes do presente Pacto, desde que tais medidas não sejam incompatíveis com as demais obrigações que lhes sejam impostas pelo Direito Internacional e não acarretem discriminação alguma apenas por motivo de raça, cor, sexo, língua, religião ou origem social. 2. A disposição precedente não autoriza qualquer suspensão dos artigos 6, 7, 8 (§§1 e 2), 11, 15, 16 e 18. 1.2 Reflexões sobre os fundamentos e a razão de ser dos direitos humanos O vídeo que você assistiu (sobre a história dos direitos humanos) transmite uma série de informações que abrange desde a antiguidade até os nossos dias atuais e traz um apanhado de caráter histórico, jurídico, político e social. Algo mais? Diga aí. Refletindo sobre o que o vídeo traz, dentre os vários eventos que se pode enxergar, chamo a atenção para as questões envolvendo os conflitos, divergências políticas, dominações territoriais ou disputas pelos bens da vida, em pequena ou grande escala (em sua vizinhança, entre Estados ou entre países). Você tem filhos? Sobrinhos? Enfim, deve saber que as crianças quando são contrariadas, principalmente quando estão entre elas, decidem suas divergências com tapas, choro, empurrões ou puxão de cabelo. José Roberto Castro Neves, quando escreveu a obra: “Como os advogados salvaram o mundo”, lembrou bem que a “convivência humana é complexa” (2020, p. 19) e com os interesses em jogo naturalmente surgem as divergências, solucionadas, às vezes, com violência. Nesse ambiente, posso destacar que a vingança privada ganhou espaço entre nós como forma de solucionar conflitos (lembra-se da Lei de talião? O “olho por olho e dente por dente”). Cito, ainda, a lei do 16 mais forte e os duelos com o uso de armas de fogo para a solução de uma disputa entre dois homens. Ultrapassando as controvérsias intramuros (dentro de um país), você sabe que a guerra é uma forma de resolver conflitos internacionais entre Estados (jus ad bellum – direito à guerra). Visitando a história, por muitos anos, o mais forte predominava outros e, não raras vezes, exercia sua dominação de forma arbitrária e absoluta, com violência desmedida, com crueldade e tirania (e ainda hoje isso ocorre com certa frequência em algum lugar do mundo). Para exemplificar, Neves (2020, p. 21) citou que o povo de Uruk, no segundo milênio antes de nossa era, na Mesopotâmia, dirigiu uma reclamação aos deuses com o fim de libertá-los da tirania de seu Rei Gilgamesh, pois ele era arrogante, se achava o dono da cidade e pisoteava os súditos como um touro selvagem. Assim, a capacidade física constituía uma característica essencial para dominar grupos humanos, os animais, a natureza e o território, até para garantir a segurança e o bem-estar de todos. Por outro lado, essa força era utilizada fora dos limites para manter o poder. Dentro desse ambiente, com a evolução do homem, as tribos deram lugar às sociedades organizadas, que formaram cidades, nações e países. Então, aos poucos, a capacidade física deixou de ser essencial para dominar esse novo arranjo institucional (obs.: ressalto que ela não deixou de ser usada. O Estado detém o monopólio do uso da força). O ser humano descobriu que as divergências e a defesa de seus interesses poderiam também ser resolvidas sem agressão física, sem brigas, sem tapas, empurrões, puxão de cabelo, duelos ou guerras. Esse fenômeno amadureceu com a evolução das civilizações, com o surgimento da noção de cidadania e de educação do povo. Desde o código de Manu (Índia, Século II antes da nossa era), as pessoas e os Estados passaram a empregar outros meios para solucionar conflitos, principalmente com o uso da “palavra”, do discurso e da diplomacia (NEVES, 2020, p. 25). Assim, com o uso dos argumentos e teses, a “palavra” passou a ser usada para a defesa de interesses. Obviamente, nessa nova ordem, passou a ser essencial o domínio da oratória e da escrita para se apresentar os fundamentos e os argumentos necessários perante as autoridades com o objetivo de persuadir ou convencer e adquirir um resultado favorável. Dentro dessa lógica, as regras jurídicas tomaram lugar de17 destaque como instrumento para regular a solução de cada caso, em um conjunto de disposições interpretadas e aplicadas por uma autoridade e, às vezes, pelas próprias pessoas. Lembre-se da conciliação ou da mediação de conflitos. A propósito, me diga uma coisa, você já chegou a resolver alguma ocorrência com tais meios? Busque em sua memória. Como ocorreu? Foi melhor que usar a força? Voltando à importância do Direito, tem-se que ele é destinado a conduzir a convivência dos indivíduos em sociedade e a relação do povo com o Estado. Segundo Norberto Bobbio, na obra “A Era dos Direitos” (1992, p. 55), isso funciona por meio de um sistema de regras que busca reduzir os impulsos agressivos dos indivíduos através de estímulos positivos (compensações, recompensas, condecorações e honrarias) ou negativos (restrição de direitos e liberdades e uso de atos de coerção e penas). Vale ressaltar que, como representante do Estado e profissional de segurança pública, você está submetido ao Direito, à legislação vigente (vinculado ao princípio da legalidade) e é dentro do Estado de Direito que se encontra uma forma de conter os excessos e as práticas ilícitas daqueles que exercem o poder. Desse modo, as normas são dirigidas tanto para o povo como para o Estado, compreendendo os Poderes (Legislativo, Executivo e Judiciário) e Órgãos (ex.: forças policiais e de defesa, corpos de bombeiros militares, guardas municipais e agências de trânsito). Nas obras doutrinárias sobre direitos humanos você vai identificar que a razão essencial de sua existência é a de limitar o exercício da autoridade por aquele que detém poder, para que não haja abusos, tirania nem opressão, visando resguardar a dignidade da pessoa humana. Norberto Bobbio (1993, p. 23), ao discorrer sobre o impulso de universalização, por meio da Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948), afirma que o seu fundamento é o de proteger reivindicações básicas, além de sua compreensão e do consenso obtido entre os representantes do Estado e da sociedade. 1.3 Breve descrição sobre a evolução e as características dos direitos humanos Ao tratar da evolução histórica, Napoleão Casado Filho (2012, p. 27) evidencia que as ideias de liberdade, igualdade, justiça e tratamento digno a cada ser humano foram concebidas em diversas civilizações, ao longo dos tempos, em 18 maior ou menor grau, e nem sempre foram protegidas por leis, mas em costumes, valores e tradições. Em suma, o que se vê é que a defesa de direitos da pessoa humana é resultado de uma construção temporal lenta e marcado por conquistas, o que ocasionou em muitas mortes e derramamento de sangue. Quando pesquisei a literatura especializada, encontrei diversas informações sobre a origem de direitos em favor das pessoas. Por exemplo, André Carvalho de Ramos (2020, p. 28) registra o reconhecimento de direitos individuais na codificação de Menes – antigo Egito (3100-2850 a.C). Em seguida, cita o Código de Hamurabi – Mesopotâmia (1792-1750 a.C.), o Cilindro de Ciro – Babilônia (539 a.C.), Confúcio – China (Séculos VI e V a.C.). SAIBA MAIS! Do vídeo apresentado há pouco para você, destaco a informação de que a origem dos direitos humanos coincide com o texto veiculado no Cilindro de Ciro, em 539 a.C, de cujo teor se extrai as premissas de liberdade e igualdade do povo hebreu na Babilônia. Para confirmar isso, identifiquei que realmente este seria o marco de nascimento dos direitos humanos, pois o Cilindro de Ciro é “considerado por grande parte dos historiadores o primeiro tratado do Direito do Homem” (ALTAVILA, 1989). Enfim, normas sobre o tema foram sendo aprovadas pelas civilizações na idade antiga, na idade média, moderna e contemporânea. Os atos legislativos de Grécia e Roma inspiraram a ordem jurídica de diversas civilizações no decurso dos séculos. Nesse espaço histórico, há lugar para a influência marcante da tradição judaico-cristã. Sucedem-se também as revoluções burguesas e as ideias liberais, notadamente, as revoluções Gloriosa, Americana e Francesa. 19 Em termos de normas sobre direitos humanos que inspiraram as constituições e leis fundamentais das nações ao redor do mundo na atualidade, põem-se em evidência as seguintes, dentre outras: a Magna Carta – Inglaterra (1215), o Petition of Rights – Inglaterra (1628), Habeas Corpus Act – Inglaterra (1679); Bill of Rights – Inglaterra (1689), Declaração de Direitos de Virgínia – EUA (1776), Declaração de Direitos do Homem e do Cidadão – França (1789) e a Declaração Universal dos Direitos Humanos – ONU (1948). Ao lado disso, é importante evidenciar para você que os direitos humanos reúnem alguns traços característicos (que marcam a sua identidade e distinção), dentre eles: Universalidade, Indisponibilidade, Inalienabilidade e irrenunciabilidade, Imprescritibilidade, Indivisibilidade, interdependência e complementaridade, Historicidade e proibição do retrocesso, Aplicabilidade imediata e caráter declaratório e Vinculação dos Poderes Públicos e da Sociedade (MENDES e GONET BRANCO, 2018, p. 208 a 229). Vamos tratar disso de forma pontual. 1.4 Sistema interno e internacional e mecanismos de proteção aos direitos humanos Eu gostaria de registrar um ponto relevante e que diz respeito às ações de segurança. Na atualidade, segundo Norberto Bobbio (1992, p. 24), tendo por marco a consolidação da Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948), as discussões envolvendo os direitos humanos não priorizam justificá-los, e sim protegê-los. Isso compreende o reconhecimento de novas pretensões, diante do surgimento de novas carências humanas. Espere aí! É oportuno lhe fazer uma pergunta: Você sabe qual é a diferença entre direitos humanos e os direitos fundamentais? E aí você pergunta: e tem diferença, é? Já ouviu falar do Direito Internacional dos Direitos Humanos e do Direito Internacional Humanitário? Para desmistificar tais questões, eu olhei o livro de Valério Mazzuoli (2019, p. 23). De acordo com ele a expressão “direitos humanos” está relacionada ao direito internacional público (que corresponde ao que se chama de Direito Internacional dos Direitos Humanos), aplicado nas relações entre os Estados na órbita internacional, por meio de declarações, pactos, tratados e convenções para cuidar dos direitos civis, políticos, econômicos, sociais e culturais, dentre outros. 20 No apanhado literário do Comitê Internacional Cruz Vermelha (ROVER, 2013, p. 25) consegui verificar que o Direito Internacional Humanitário tem a ver com situações de conflito armado (lex specialis), notadamente, para proteger as vítimas das guerras (feridos e doentes, náufragos, prisioneiros e civis), com participação primordial da Organização das Nações Unidades e do Comitê Internacional Cruz Vermelha (CICV). SAIBA MAIS! Visite o portal do Comitê Internacional Cruz Vermelha (CICV) e saiba mais sobre suas ações clicando aqui. Concluímos, então, que os direitos humanos são consagrados na órbita internacional por meio de tratados e convenções (ex.: Pacto de São José da Costa Rica, Convenção contra a Tortura e outros Tratamentos Cruéis, Desumanos ou Degradantes). Por sua vez, os direitos fundamentais constituem os direitos humanos https://www.icrc.org/pt/onde-o-cicv-atua/americas/brasil 21 reconhecidos, inseridos e protegidos pela esfera jurídica de cada país, normalmente veiculada à Constituição (ex.: Título II da CF/88), sem prejuízo de existirem em normas fora do texto constitucional. Dito isso, é importante anotar que os “direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte” (CF/88, art. 5º, § 2º). Além disso, cumpre evidenciar que os “tratados e convenções internacionaissobre direitos humanos que forem aprovados, em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros, serão equivalentes às emendas constitucionais” (CF/88, art. 5º, § 3º). Até o presente momento, somente a Convenção sobre os Direitos das Pessoas Portadoras de Deficiência (2007) alcançou esta condição, sendo uma norma constitucional, na forma do art. 5º, § 3º, da CF/88, tendo sido inserida na legislação brasileira por meio do Decreto Legislativo nº 186, de 9 de julho de 2008 e do Decreto nº 6.949, de 25 de agosto de 2009. ✓ Você já leu que os Direitos e garantias fundamentais são os Direitos Humanos reconhecidos pela República Federativa do Brasil e funcionam como uma limitação ao uso do poder, durante as ações de segurança pública, notadamente no uso da força, a fim de conter os excessos e a prática de atos ilícitos por parte dos profissionais da segurança pública. ✓ Então, FIQUE ATENTO, pois, diante dos casos de excesso, caracterizada a violação aos direitos fundamentais e aos direitos humanos, naturalmente recairá sobre o profissional de segurança a responsabilização nas esferas civil (reparação de danos, improbidade), penal e administrativa (disciplinar). ✓ Iremos estudar sobre o assunto no Módulo 2 – Violação dos Direitos Humanos - estudos dos casos de responsabilidade funcional, pecuniária, disciplinar e penal. 22 ATENÇÃO! ✓ De acordo com a CF/88, ART. 5º, § 4º: “O Brasil se submete à jurisdição de Tribunal Penal Internacional a cuja criação tenha manifestado adesão”. O Decreto nº 4.388/2002 Promulga o Estatuto de Roma do TPI. Conheça o TPI acessando o website clicando aqui. ✓ O TPI é o encarregado pelas ações de responsabilidade internacional de natureza penal, relativo aos casos de genocídio, crimes de guerra e crimes contra a humanidade. Chamo sua atenção para o fato de que a dignidade da pessoa humana possui amplo espectro de proteção territorial, cultural, político, jurídico e social, tanto na esfera global quanto no âmbito das nações (CASADO FILHO, 2012, p. 56). Nesse ambiente, destaco que, com o término da II Guerra Mundial, foi criada a Organização das Nações Unidas – ONU (24/10/1945), com o objetivo principal de preservar a paz mundial, promover os direitos humanos, contribuir com o desenvolvimento econômico e com o progresso social, sem se descuidar do meio ambiente e da ajuda humanitária em casos de desastres naturais, conflitos armados ou pobreza extrema. Você deve saber que a Declaração Universal dos Direitos Humanos foi instituída pela ONU (1948). Atualmente a ONU é composta por 193 Estados Membros, dentre eles, o Brasil. Na estrutura da ONU temos o Conselho de Direitos Humanos, cujo papel é o de monitorar e recomendar medidas para a Assembleia Geral da ONU (composta por representantes dos Estados Membros) tanto sobre a implementação de tratados como sobre os casos de violação de direitos humanos. O resultado desse amplo trabalho se instrumentaliza por meio de “comentários gerais” ou “recomendações gerais”, que não possuem caráter vinculante (denominada de soft law). SAIBA MAIS! Conheça mais sobre a ONU, clicando aqui. https://www.icc-cpi.int/ https://www.un.org/en/about-us 23 FIQUE ATENTO! ➢ O Governo brasileiro editou atos normativos (decretos) com o objetivo de inserir tais pactos, convenções e tratados da ONU na ordem jurídica pátria, portanto, eles têm aplicabilidade em nosso território e o descumprimento pode acarretar responsabilização, ou seja, são de caráter vinculado, inclusive, e principalmente, na segurança pública. Essas são os principais pactos, convenções e tratados redigidos e em vigor no âmbito da ONU: 1) Carta das Nações Unidas; 2) Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948); 3) Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos (1966); 4) Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais (1966); 5) Convenção para a Prevenção e Repressão do Crime de Genocídio (1948); 6) Convenção contra a Tortura e outros Tratamentos ou Penas Cruéis, Desumanos ou Degradantes (1984); 7) Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher (1981); 8) Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Racial (1965); 9) Convenção sobre os Direitos das Crianças (1989); e 10) Convenção sobre os Direitos das Pessoas Portadoras de Deficiência (2007). ANOTA AÍ! ➢ Complementando os tratados e convenções sobre direitos humanos, segue uma relação de normas editadas pela http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/1930-1949/d19841.htm https://www.ohchr.org/EN/UDHR/Pages/Language.aspx?LangID=por http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/1990-1994/d0592.htm http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/1990-1994/d0591.htm http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/1990-1994/d0591.htm http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Atos/decretos/1952/D30822.html http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Atos/decretos/1952/D30822.html http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/1990-1994/d0040.htm http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/1990-1994/d0040.htm http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/2002/d4377.htm http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/2002/d4377.htm http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/1950-1969/D65810.html http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/1950-1969/D65810.html http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/1990-1994/d99710.htm http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2009/decreto/d6949.htm http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2009/decreto/d6949.htm 24 ONU, voltadas para o uso da força ou detenção (portanto, de seu interesse profissional), que não associam os Estados Membros nem as forças de segurança e de defesa, conhecidas por soft law, mas servem de base para integrar as leis, regulamentos e atos de interpretação (ROVER, 2013, P. 110): ✓ Regras de Mandela (antigas Regras Mínimas para o Tratamento de Presos - adotadas pelo 1º Congresso das Nações Unidas sobre a Prevenção do Crime e o Tratamento dos Delinquentes, realizado em Genebra em 1955 e aprovado pelo Conselho Econômico e Social em 1957 e 1977); ✓ Código de Conduta para os Funcionários Responsáveis pela Aplicação da Lei (CCFRAL) - adotado pela Assembleia Geral das Nações Unidas em 1979; ✓ Declaração dos Princípios Básicos de Justiça para Vítimas da Criminalidade e do Abuso do Poder (Declaração das Vítimas), adotada pela Assembleia Geral da ONU em 1985; ✓ Regras Mínimas das Nações Unidas para a Administração da Justiça de Menores (Regras de Beijing), adotadas pela Assembleia Geral da ONU em 1985; ✓ Conjunto de Princípios para a Proteção de Todas as Pessoas Sujeitas a Qualquer Forma de Detenção ou Prisão (Conjunto de Princípios), adotado pela Assembleia Geral da ONU em 1988; ✓ Princípios Básicos sobre o Uso da Força e de Armas de Fogo por Funcionários Responsáveis pela Aplicação da Lei (PBUFAF), adotados pelo Oitavo Congresso das Nações Unidas para a Prevenção do Crime e o Tratamento dos Delinquentes, realizado em Havana, Cuba, em 1990; ✓ Princípios Básicos e Diretrizes sobre o Direito às Medidas de Recurso e Reparação para Vítimas de Graves Violações ao Direito Internacional dos Direitos Humanos e ao Direito https://drive.google.com/file/d/1ROUgsvU_1kMVlaWTzH8WpgkGqWtJxEGU/view?usp=sharing https://drive.google.com/file/d/1R0VUizLZroitXZn4HAxM9GeNEgAXu-5M/view?usp=sharing https://drive.google.com/file/d/1R0VUizLZroitXZn4HAxM9GeNEgAXu-5M/view?usp=sharing https://drive.google.com/file/d/1NwQzzWk7C7uxUk0Mvu6V7WpA_fNf4gqP/view?usp=sharing https://drive.google.com/file/d/1NwQzzWk7C7uxUk0Mvu6V7WpA_fNf4gqP/view?usp=sharing https://drive.google.com/file/d/156OWAe7rQwCBT9JptbbGn1XFidm3-Fld/view?usp=sharing https://drive.google.com/file/d/156OWAe7rQwCBT9JptbbGn1XFidm3-Fld/view?usp=sharinghttps://drive.google.com/file/d/1Vpcy6l-EtlPKn3xwwDjvejTh65en40C5/view?usp=sharing https://drive.google.com/file/d/1Vpcy6l-EtlPKn3xwwDjvejTh65en40C5/view?usp=sharing https://drive.google.com/file/d/1R0VUizLZroitXZn4HAxM9GeNEgAXu-5M/view?usp=sharing https://drive.google.com/file/d/1R0VUizLZroitXZn4HAxM9GeNEgAXu-5M/view?usp=sharing https://drive.google.com/file/d/1Xm4WyuPf6wePJeG_o9HaEs2C_xFiCymh/view?usp=sharing https://drive.google.com/file/d/1Xm4WyuPf6wePJeG_o9HaEs2C_xFiCymh/view?usp=sharing https://drive.google.com/file/d/1Xm4WyuPf6wePJeG_o9HaEs2C_xFiCymh/view?usp=sharing 25 Internacional Humanitário, adotados pela Assembleia Geral da ONU em 2005. Além da ONU, a proteção dos direitos humanos é assegurada de forma regional, considerando aqui o Continente Americano (ao lado da União Africana, da Liga dos Estados Árabes, Associação de Nações do Sudeste Asiático, União Europeia). Aqui no Brasil, nós estamos inseridos e sob a jurisdição do Sistema (Regional) Interamericano de proteção dos direitos humanos (com origem histórica na carta de Bogotá – Carta da Organização dos Estados Americanos de 1948). Com efeito, temos em evidência a Organização dos Estados Americanos (OEA), formada pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos – CIDH e pela Corte Interamericana de Direitos Humanos – Corte. Registra-se que, diante dos casos de violação e arbitrariedade por parte de um Estado, ele será responsabilizado no âmbito da Corte Interamericana de Direitos Humanos. A responsabilização busca reparar um prejuízo causado, mediante indenização pecuniária ou imposição de obrigação de fazer ou não. A responsabilidade internacional de natureza penal ocorre no âmbito do Tribunal Penal Internacional (TPI), mas somente para os casos de genocídio, crimes de guerra e crimes contra a humanidade. SAIBA MAIS! Conheça sobre o papel do Corte Interamericana de Direitos Humanos (Corte) acessando o portal eletrônico clicando aqui. A Convenção Americana sobre Direitos Humanos (Pacto de São José da Costa Rica), de 22 de novembro de 1969, foi promulgada por meio do Decreto nº 678/1992. Clique aqui para acessar. No Módulo 4 iremos tratar sobre casos de responsabilização internacional do Estado brasileiro em decorrência de violação dos direitos humanos no âmbito da segurança pública. https://drive.google.com/file/d/1Xm4WyuPf6wePJeG_o9HaEs2C_xFiCymh/view?usp=sharing https://www.oas.org/pt/CIDH/jsForm/?File=/pt/cidh/mandato/que.asp http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/d0678.htm 26 1.5 Direitos humanos e direitos fundamentais em espécie A evolução histórica dos direitos humanos nos remete a um conjunto de preceitos de proteção que foram sistematizados, organizados e categorizados com o passar do tempo (MAZZUOLI, 2019, p. 49). O surgimento de novos direitos não implicou e nem implica na perda ou na extinção daqueles já conquistados, mesmo diante dos eventos momentâneos e ocasionais, tais como epidemias, crises políticas, econômicas, sociais etc. Em outras palavras, surgindo uma nova pretensão para tutelar à dignidade humana, ela se soma aos que já existem e os detentores de poder devem respeitar o que está vigente (a CF/88, art. 60, §4º, prevê como impossível a proposta de emenda constitucional tendente a abolir os direitos e garantias individuais – cláusula pétrea). Daí o caráter de complementaridade, historicidade e proibição do retrocesso que você já estudou anteriormente. Aqui, estamos falando em geração de direitos humanos. Olha só, ao buscar em sua memória, de quando você estudou sobre o assunto, você deve ter identificado que a evolução histórica dos direitos humanos compreende, essencialmente, 03 (três) gerações ou dimensões (aplicada pelos teóricos que entendem não existir geração), que correspondem ao lema da revolução francesa (1789): liberdade, igualdade e fraternidade (MENDES; GONET BRANCO, 2018, p. 200). Vamos relembrar: Primeira geração Diz respeito aos direitos de liberdade ou de defesa, destinados a proteger os indivíduos contra as intervenções indevidas do Estado, o qual deve se abster de realizar determinadas práticas por constituírem violação ao âmbito essencial da dignidade humana (vida, liberdade, integridade física, honra, patrimônio, privacidade etc.). A nossa CF/88 relaciona essa listagem de direitos no art. 5º. Segunda geração Está ligada ao dever de prestação, no sentido de que o Estado deve fazer algo para assegurar a igualdade material (não se limitando à igualdade prevista na lei – de natureza formal) entre as pessoas. Estão relacionados, dentre outros, aos 27 direitos econômicos, sociais e culturais (ex.: saúde, educação, previdência). Conforme o art. 6º da CF/88. Terceira geração Compreende os direitos difusos ou coletivos, relacionados à fraternidade ou solidariedade, com ênfase à garantia de um ambiente ecologicamente equilibrado. Vide o art. 225 da CF/88. Alguns estudiosos acrescentam mais gerações de direitos humanos. Para melhor visualizar essas gerações, baseado nos estudos de Paulo Bonavides, Mazzuoli (2019, p. 52) foi criada a seguinte figura: Figura 1: Gerações de direitos humanos Fonte: MAZZUOLI, 2019, p. 52. Para além das gerações de direitos, devemos identificar o rol específico. Então, indico a leitura da já citada Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948), que reúne 30 (trinta) artigos. Você já leu? Não!? Então leia! Aproveite os links já relacionados acima sobre os principais pactos, convenções e tratados 28 redigidos e em vigor no âmbito da ONU. Lei também o Título II da CF/88, clicando aqui. Eis, então os direitos humanos e o rol de direitos e garantias fundamentais. Olhando para essa figura e para a listagem de normas que indiquei, faço uma pergunta para você: Qual ou quais gerações e normas sobre direitos humanos e direitos e garantias fundamentais se encontram relacionadas com o campo da segurança pública? Muita coisa, né? Dentro desse cenário, posso lhe afirmar que, para além de limitação, os direitos humanos constituem o objeto de seu trabalho. Vamos ver? http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm#:~:text=T%C3%8DTULO%20II,E%20GARANTIAS%20FUNDAMENTAIS http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm#:~:text=T%C3%8DTULO%20II,E%20GARANTIAS%20FUNDAMENTAIS 29 Aula 2 – O papel da segurança pública no Brasil 2.1 Breve descrição do modelo de segurança pública no Brasil Costumo afirmar que o modelo brasileiro de segurança pública é marcado por uma estrutura de tarefas divididas em duas partes de procedimentos que vão desde a prevenção até a repressão (CF/88, art. 144). Para entender o que eu estou falando, peço que você visualize a Figura 2 e leia o todo o art. 144 da Constituição: Figura 2: Visão sistêmica da seguração pública Fonte: Conteudista. 30 Bom, o que eu poderia dizer? Em síntese, olhando para o esquema acima (Figura 2), podemos enxergar uma representação estática das tarefas do Estado no campo da segurança pública, mas é preciso interpretar, dar vida a esse desenho. Sendo bem simples na explicação, peço que você identifique uma linha central na qual se pretende retratar uma sucessão de acontecimentos da vida, envolvendo a conduta humana (ação ou omissão) e da natureza. Ao centro, uma explosão na linha de eventos, que pode ser uma conduta humana, geradora de violência, crimes ou desordem, ou, ainda, um acontecimento da natureza, que causa calamidade, desastres, acidentes, incêndios, todos eles com potencialidade para causar danos e prejuízos aos bens da vida ou à paz social, com potencial de grave perturbação ou subversão da Ordem. É aí que entra o Estado, concebido pela sociedade (organizada), para promover o bem de todos (CF, art. 3º) e, nesse caso, seus órgãos (de segurança pública). Efetivamente, nessa linha de acontecimentos, o PoderPúblico deve desenvolver ações para que tais eventos lesivos não ocorram, ou, se ocorrerem, a paz seja resgatada imediatamente ou mediatamente. Em suma, existe um conjunto de órgãos e instituições, em uma perspectiva sistêmica e integrada, dedicados a manter a ordem pública, assegurar um ambiente controlado, para afastar as pessoas e os seus bens (vida, integridade física, liberdade, patrimônio, etc.) de riscos e perigos provocados por eventos da natureza ou por conduta humana lesiva/ofensiva (violência, infração penal, calamidades, catástrofes), aplicando-se técnicas, procedimentos e métodos próprios, observando sempre o teor da ordem jurídica. Vamos passear por tais ações. 2.2 Das ações de segurança pública Você sabe bem que as ações dos profissionais de segurança são concebidas para garantir e resguardar uma situação de paz social, de ordem pública, um ambiente de normalidade almejada pela coletividade e pelos indivíduos, protegendo os bens mais caros para a sociedade, de acordo com o que é prescrito nas normas legais, estabelecendo um grau adequado de coexistência pacífica entre as pessoas. Quando se fala em ordem pública é preciso lembrar-se de um cenário de convivência social materializada pelo controle e estabilidade na segurança, 31 salubridade e tranquilidade públicas, como, por exemplo, nas regras de trânsito, na exploração da atividade econômica em bares, restaurantes, casas de show, cinemas, shoppings, nas atividades culturais, nos esportes etc. Em síntese, são medidas para preservar os setores econômicos, urbanístico, fundiário, ambiental, de saúde pública, dentre outros. Nesse contexto, vale registrar que as forças de segurança recebem uma listagem de atribuições diversificadas que abrangem desde o controle social, regulando as relações interpessoais, com o eventual emprego da força, de forma racional e diferenciada, o socorro, a assistência às populações carentes, o apoio às atividades comunitárias, o reforço aos demais órgãos nas atividades de saúde, a fiscalização tributária e sanitária, dentre outras. Clique aqui para acessar a Lei nº 13.060/2014, art. 5º; Portaria Interministerial nº 4.226/2010. 2.3 Das ações de prevenção e de pronta resposta (repressão) As ações preventivas e de pronta resposta (repressão) são desempenhadas por meio de procedimentos de distribuição de efetivo em locais que, após o devido planejamento (com análise cotidiana dos dados estatísticos ou georreferenciamento de ocorrências - identificação geográfica dos pontos críticos de criminalidade e violência), indiquem algum potencial para a ocorrência de fatos que venham abalar a paz social, a ordem pública, precedendo, inclusive, o eventual emprego das Forças Armadas, considerando um estado de legalidade extraordinário. Algumas vezes, tais ações recaem sobre os direitos e liberdades de pessoas, sendo necessário o emprego de medidas de restrição para a preservação da ordem pública e do bem-estar das pessoas e do patrimônio. Dizendo de outra forma, com ênfase na Figura 2, essa tarefa é direcionada essencialmente à prevenção, por meio das medidas de orientação e advertência à população em geral, incluindo, quando necessário, o socorro de pessoas em situação de emergência ou sujeitas à sensível vulnerabilidade social. É possível, ainda, que se tenha de empregar a força, de maneira racional e diferenciada, mediante adequação entre meios e fins, desde que estritamente necessário ao atendimento do interesse público (vide Lei nº 13.060/2014, art. 5º; Portaria Interministerial nº 4.226/2010), para conter ou incapacitar temporariamente https://dspace.mj.gov.br/bitstream/1/3871/2/PRI_GM_2010_4226.html 32 aqueles que violem as regras de conduta social, com eventual prisão do agente infrator em flagrante delito (CPP, arts. 301 e 302). Na Figura 2 é necessário destacar, ainda, as ações de defesa civil e de socorros de urgência, prevenção e extinção de incêndios, proteção, busca e salvamento de vidas humanas, prestação de socorro em casos de afogamento, inundações, desabamentos, acidentes em geral, catástrofes, calamidades públicas etc. Aqui, é preciso falar também da proteção de bens, serviços, logradouros públicos municipais e instalações do Município, compreendendo a proteção sistêmica da população, o regime de colaboração e integração com os órgãos de segurança pública para a paz social, a pacificação de conflitos, atentando para o respeito aos direitos fundamentais das pessoas, dentre outras medidas (§ 8º do art. 144 da CF/88 e Lei nº 13.022/2014). Além disso, de acordo com o § 10 do art. 144 da CF/88, introduzido pela Emenda Constitucional nº 82/2014, a segurança viária, exercida para a preservação da ordem pública e do bem-estar das pessoas e do seu patrimônio nas vias públicas, compreende a educação, engenharia e fiscalização de trânsito, como também outras atividades previstas em lei, que assegurem ao cidadão o direito à mobilidade urbana eficiente. Por fim, torna-se claro a segurança do sistema penal compreendida como uma das tarefas no campo da segurança pública (CF/88, art. 144, § 5º-A). PARA REFLETIR! Aí vêm as perguntas: 1) Diante das ações de prevenção e de pronta resposta, considerando o teor do art. 5º, inciso II, da CF/88, seria possível abordar alguém sem fundada suspeita (CPP, art. 244)? O que você acha? Uma dica: olhe o art. 13-A, inciso III, da Lei nº 10.671/2003 (Estatuto do torcedor). E aí? É possível que se estenda para outras ações (ex.: intensificação de policiamento ou fiscalização de trânsito)? E a busca pessoal em advogado que comparece ao sistema prisional para orientar um cliente custodiado? 2) Outra coisa: Imagine que uma equipe de serviço tenha sido acionada para 33 atender uma ocorrência, cuja infração penal se procede na Justiça Criminal por meio de ação penal privada. Pergunta-se: o Chefe da equipe ou o comandante da guarnição pode obrigar a vítima/ofendido e a testemunha a comparecerem na delegacia? E se o crime for de ação penal pública? 3) E nos casos de socorros de urgência, o que justifica o uso de equipamentos para romper obstáculos (ex.: veículos em acidentes, portas residenciais, etc)? 4) O que poderia justificar a tomada de medidas nesses casos? E se você não agir? Como explicar isso para a sociedade e para os órgãos de controle (ex.: Justiça, Comissão de Direitos Humanos)? 2.4 Das atividades de investigação de polícia judiciária No âmbito das ações de resposta imediata (medidas adotadas quando ocorrem crimes) e mediata (providências realizadas depois dos fatos terem acontecido), evidenciam-se as atividades de apuração de infração penal e de polícia judiciária, exercidas pelas polícias Federal e Civil, mediante colheita de informações sobre a autoria e materialidade de crimes/delitos e contravenções, além do cumprimento de determinações das autoridades judiciárias, como, por exemplo, no mandado de prisão, na busca e apreensão de bens, na realização de perícias e etc. (CPP, art. 6º: depoimentos, acareações, objetos apreendidos, laudos, documentos; interceptação telefônica – Lei 9.296/1996; colaboração premiada, captação ambiental de sinais, ação controlada – Lei nº 12.850/213; CPP, art. 13). Seus atos, em regra, são documentados em inquéritos policiais que, uma vez encaminhados à justiça criminal, têm por finalidade subsidiar o exercício da ação penal por seus titulares - na ação penal pública, o Ministério Público, por meio da denúncia, na ação penal privada, o ofendido/vítima ou representante legal, através da queixa-crime (CF, art. 144, § 1º e 4º; CPP, arts. 4º a 6º e 13; Lei nº 12.830/2013). Portanto, as polícias Civil e Federal exercem suas atribuições após a ocorrência do fato-crime. Ah! A Polícia Federal também atua preventivamente, além da Polícia Rodoviária e Ferroviária Federal. Não concorda? Então leia os §§ 1ºa 3º do art. 144 da CF. E aí? Elas atuam preventivamente? 34 Lembre-se, ainda, que, na repressão imediata, o Corpo de Bombeiros Militar realiza exames nos locais de incêndios, documentado em laudo, com o objetivo de esclarecer as causas do evento (ex.: no âmbito do DF, art. 2º, inciso II, da Lei nº 8.255/1991). Também deve ser lembrado o fato de que as polícias militares e os corpos de bombeiros militares exercem atividade de repressão imediata, no campo da polícia judiciária militar, envolvendo a investigação de crimes militares, seja por inquérito policial militar ou do auto de prisão em flagrante (IPM e APF). O tema tem previsão nos estatutos dessas instituições, tendo por fundamento, ainda, o art. 125, §§ 4º e 5º, da CF/88, aplicando-se, portanto, o Código Penal Militar – CPM (Decreto-Lei nº 1.001/1969) e o Código de Processo Penal Militar – CPPM (Decreto-Lei nº 1.002/1969). 2.5 Atuação das Forças Armadas no contexto da segurança pública – a garantia de lei e da ordem (GLO) Quando esgotados os instrumentos ordinários e diante da falência das forças de segurança pública dos Estados, elencados no art. 144 da CF/88, surge imediatamente a necessidade de resgatar a normalidade e o controle social, com ações de Garantia da Lei e da Ordem (GLO), conforme estabelece a parte final do art. 142 da CF/88, regulado pela Lei Complementar nº 97/1999 (arts. 15 e 16-A) e pelo Decreto nº 3.897, de 24 de agosto de 2001. Porém, quando estão esgotados os instrumentos destinados à preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio? Quando, em determinado momento, estejam indisponíveis, inexistentes ou insuficientes ao desempenho regular de sua missão constitucional e legal (LC 97/99, art. 15, § 3º). Ainda assim, é muito abstrato. Essa questão depende da análise de cada caso, envolvendo a manifestação dos governantes. Saiba que, as ações de GLO abrangem o emprego das Forças Armadas em variados tipos de situações e atividades, em face das diversas formas com que perturbações da ordem e ameaças à incolumidade das pessoas e do patrimônio podem se apresentar (vide item 25, art. 2º, do R200 – aprovado pelo Decreto 88.777/1983) e leva em conta o disposto no Decreto nº 3.897/2001, especialmente 35 os arts. 2º, 3º, 4º e 5º, que fixam as diretrizes para o emprego das Forças Armadas na GLO. Nessa ordem, vale destacar o planejamento realizado para a execução das ações de GLO, o qual deve ser elaborado em um contexto de segurança integrada, podendo ser prevista a participação das seguintes instituições e órgãos: Poder Judiciário; Ministério Público; Segurança Pública. Outros órgãos e agências, dos níveis Federal, Estadual e Municipal também poderão participar. Cabe à autoridade competente (governador), por meio de ato formal (decreto), transferir o controle operacional dos órgãos de segurança pública necessários ao desenvolvimento das ações, para a autoridade encarregada das operações. Daí decorre a razão para as PMs e os CBMs serem designados constitucional e legalmente como forças auxiliares e reservas do Exército. A decisão presidencial de emprego das Forças Armadas deve ser comunicada ao Ministro da Defesa, por meio de documento oficial, que indicará a missão, os demais órgãos envolvidos e outras informações necessárias. Após a determinação do Presidente da República, o Ministro da Defesa expedirá a diretriz pela qual serão ativados os órgãos operacionais das Forças Armadas que desenvolverão a operação da GLO. A Marinha, o Exército e a Aeronáutica poderão ser empregados de forma conjunta ou singular. A atuação das forças de segurança é integrada com emprego do serviço de inteligência e deve observar a razoabilidade, a proporcionalidade e a legalidade. Na GLO desenvolvem-se ações de polícia ostensiva, de natureza preventiva ou repressiva, que se incluem na competência, constitucional e legal, das polícias militares (patrulhamento, revista de pessoas, de veículos terrestres, de embarcações e de aeronaves; e prisões em flagrante delito), observados os termos e limites impostos, a estas últimas, pela ordem jurídica. Com isso, não cabe às Forças Armadas promover a investigação de infração penal de competência das Polícias Civis e Federal (Vale uma questão de prova aqui?). Com o resgate da ordem/normalidade ocorre a reversão e a desmobilização das Forças Armadas e demais Forças e órgãos estatais, eventualmente acionados. Nesse sentido, as forças de segurança do Estado assumem o domínio das ações. 36 Aula 3 – Direitos humanos e direitos fundamentais aplicados nas ações dos profissionais de segurança pública 3.1 Introdução Você já deve ter ouvido o discurso opositivo entre atuação das forças de segurança e de defesa (que corresponde às Forças Armadas, em especial na GLO) e cumprimento dos direitos humanos. Eu já li em alguns estudos acadêmicos a menção clara de que embora os regimes autoritários tenham sido superados pela democracia, os princípios e valores desta nova ordem não foram percebidos e implementados de forma imediata, principalmente nos aparatos das forças de segurança. Afirma-se que os mecanismos de atuação para a manutenção da ordem pública no período de ditadura permaneceram. Tanto que empregam como exemplo, o fato de que o uso da força continua ultrapassando os limites da legitimidade e tem assumido a configuração de violência, repetindo vários instrumentos do período de repressão, tais como: tortura, detenções violentas, mortes sob custódia, abuso da força letal, controle violento (fora dos limites normais) de manifestações públicas, intimidação e vingança (COSTA, 2004, p. 11-82). E você, o que acha disso? Concorda? PARA REFLETIR! • Vamos ser claros e diretos, os direitos humanos existem para proteger bandidos? A autoridade policial se esvaziou com a quantidade “enorme” de direitos na Constituição? • Leia o artigo: “Direitos Humanos e Cultura Policial na Polícia Militar do Estado do Paraná”, escrito por Lopes, Ribeiro e Tordoro, clicando aqui; • Enriqueça sua cultura com o artigo de Ricardo Balestreri, sob o título: “Um novo paradigma de segurança pública”, clicando aqui. • Então, qual a sua impressão no âmbito da sua Instituição? Comente no Ambiente Virtual. https://www.scielo.br/j/soc/a/ZMfxT3qyztdJs6d9V8fNjdm/?format=pdf&lang=pt https://books.scielo.org/id/c46v3/pdf/costa-9788523212322-04.pdf 37 3.2 Segurança pública e direitos humanos – um novo paradigma de cidadania no Brasil Vamos reforçar nossas compreensões. A sua atuação recai sobre os direitos e liberdades das pessoas geralmente para: preservar a ordem pública, proteger pessoas e bens e também para controlar comportamentos ilícitos, a fim de afastar as pessoas de riscos e perigos. Você deve, ainda, realizar averiguações e identificar situações de violência e atos ilícitos. O socorro de pessoas em situação de emergência faz parte de suas tarefas. Você faz abordagens, identifica eventos de crime e violência e emprega, quando necessário, a força (racional e diferenciada), para conter, incapacitar temporariamente e capturar pessoas, prendendo-as pela prática de um ilícito penal, formalizando as medidas cabíveis perante a autoridade competente. No fim das contas, conforme constatado por Ricardo Balestreri (2005, p. 24), você é o verdadeiro protetor dos direitos humanos, pedagogo de cidadania, pois, além de defender, nos ensina sobre a vida, a liberdade, a integridade física, o patrimônio, dentre outros direitos e bens. Em suma, o que se pode dizer é que sua atuação somente é considerada legítima, republicana e democrática se houver respeito aos direitos humanos e aos direitos e garantias fundamentais, os quais garantem a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade. Mas, e se houver a notícia de grave violação aos direitoshumanos e a direitos fundamentais por ocasião de uma ação de segurança pública, atribuída a um profissional que deveria cumprir suas obrigações? O que deve ser feito? Quais as consequências? Os próximos Módulos serão dedicados a responder esses questionamentos. 38 Finalizando Para atingir os objetivos deste módulo, você aprendeu sobre: • Os conceitos, características, fundamentos e a razão de ser dos direitos humanos e dos direitos e garantias fundamentais, como valores de democracia e cidadania; • O papel dos órgãos de segurança pública, sob uma perspectiva sistêmica e integrada; e • A existência de uma atuação efetiva da segurança pública para tutela dos direitos humanos e observância aos direitos e garantias fundamentais. 39 Módulo 2 – Violação dos Direitos Humanos e dos Direitos Fundamentais – Estudo dos Casos de Responsabilidade Funcional, Pecuniária e Penal Apresentação do módulo Saudações! Como vai? Bom te ver de volta. Vamos progredir mais? Assista ao vídeo introdutório deste módulo clicando aqui. Na primeira etapa do curso fizemos um breve resgate sobre as condições básicas que norteiam os direitos humanos e os direitos fundamentais, buscando indicar um caminho de aproximação com as atividades de segurança pública. Naquela oportunidade, percebemos que os procedimentos para garantir a lei e a ordem, proteger as pessoas e bens possuem convergência com os valores essenciais de cada indivíduo e da sociedade. Ficou claro que, mesmo diante das situações em que algumas pessoas caminham para um confronto, praticando violência ou crime, sua dignidade humana deve ser preservada pelas forças policiais e de segurança. Entretanto, restaram algumas questões no ar, tais como: e se houver a notícia de grave violação aos direitos humanos e a direitos fundamentais por ocasião de uma ação de segurança pública, atribuída a um profissional que deveria cumprir suas obrigações? O que deve ser feito? Quais são as consequências? Então, convido você a dedicar seu tempo agora para que possamos encontrar as respostas. É hora de avançar! https://www.youtube.com/watch?v=d59i0StNy6Q&list=PLDBQnR5u1Wk7RntO2cKs79F2ysdi46Xgq&index=3 40 Objetivos do módulo Este módulo tem por objetivos: • Identificar os preceitos de ética, obrigações e deveres no exercício das ações de segurança pública; • Reconhecer a importância, a dimensão e as consequências do uso da força como profissional de segurança pública responsável pela aplicação da lei; • Identificar alguns casos julgados pelo Poder Judiciário envolvendo a violação dos direitos humanos e dos direitos fundamentais durante o exercício das atividades de segurança pública ou em função da condição de agente aplicador da lei; e • Analisar as consequências na esfera administrativa, penal e civil decorrentes de responsabilização por violação aos direitos humanos e aos direitos fundamentais. Estrutura do módulo Este módulo compreende as seguintes aulas: Aula 1 – Dos deveres e obrigações dos profissionais que atuam na segurança pública. Aula 2 – Do uso legítimo da força. Aula 3 – Casos de responsabilização do profissional de segurança pública por violação aos direitos humanos e aos direitos fundamentais. 41 Aula 1 – Dos direitos e obrigações dos profissionais que atuam na segurança pública 1.1 Introdução Você estudou com afinco no Módulo 1 sobre as atribuições de manter a ordem pública e assegurar um ambiente controlado para afastar as pessoas e os seus bens de riscos e perigos provocados por eventos da natureza ou por conduta humana lesiva/ofensiva, aplicando-se técnicas, procedimentos e métodos próprios, observado o conteúdo da ordem jurídica, notadamente, dos direitos fundamentais e dos direitos humanos. Você viu que tais ações recaem sobre os direitos e liberdades de pessoas, com eventual emprego de medidas de restrição para a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio. Tais procedimentos compreendem a prevenção, por meio das medidas de orientação e advertência à população em geral, incluindo, quando necessário, o socorro de pessoas em situação de emergência ou sujeitas à sensível vulnerabilidade social. Bem nobre, não é? Em alguns casos de pronta resposta (repressão), o emprego da força se mostra necessário (inclusive para tirar a vida – em casos extremos, conforme prevê os Princípios Básicos sobre Utilização da Força e de Armas de Fogo - PBUFAF, PB 4, 5, 9 e 11), para conter ou incapacitar temporariamente aqueles que violem as regras de conduta social, com a eventual prisão do agente infrator em flagrante delito. Aqui começam os desafios, pois o uso da força é um elemento que deve ser previamente analisado para que seja aplicado de forma adequada, sob pena de ocorrer consequências indesejadas, considerando o permanente risco de sua vida e de sua integridade física e das pessoas envolvidas em uma ocorrência. Daí a importância das técnicas e dos procedimentos operacionais básicos (POPs). Muito além disso, para que se possa assegurar o cumprimento adequado dessas ações, é necessário se ter um olhar atento ao regime jurídico específico, exigindo-se capacidade física, intelectual, mental, psicológica, moral e ética. https://drive.google.com/file/d/1b5pqChVicmw49d_4tKwvSRz_j4argMne/view?usp=sharing https://drive.google.com/file/d/1b5pqChVicmw49d_4tKwvSRz_j4argMne/view?usp=sharing 42 1.2 Ética, obrigações e deveres Foi posto em evidência anteriormente que para a condição de um profissional de segurança pública exige-se as aptidões moral, ética, física e intelectual (assunto tratado no PBUFAF, PB 18, 19, 20 e 21). Essa condição tem por finalidade principal legitimar o profissional de segurança no exercício de suas tarefas frente à sociedade, principalmente por ser um agente do Estado na busca pelo bem-estar de todos. PARA REFLETIR! O que esperar de alguém a quem se dispõe o uso do poder, inclusive de natureza física? Como considerar legítimo um profissional de segurança combater o crime de estupro, se ele pratica essa conduta? E o que pratica violência doméstica? E o tráfico de entorpecentes? E a extorsão? E o tráfico de armas? Tais questões passam pela discussão de como se deve comportar em serviço e fora dele. Isto é, sobre a ética. Você sabe o que é ética? No livro de Álvaro Valls, sob o título “O que é Ética?” (1994, p. 5), destaco a afirmação de que “é daquelas coisas que todo mundo sabe o que são, mas que não são fáceis de explicar, quando alguém pergunta”. Bom, eu me arrisco a trabalhar uma noção sobre isso. Sem ingressar no rigor doutrinário, a ética diz respeito à orientação sobre a maneira de se comportar de acordo com os valores e princípios morais que regem uma sociedade, isto é, a forma com a qual o indivíduo deve agir para alcançar um objetivo, para atender suas necessidades e anseios, e respeitando o modo de viver das demais pessoas, portanto, praticando o bem. SAIBA MAIS! Assista ao vídeo sobre ética em ambientes profissionais, clicando aqui. https://drive.google.com/file/d/1b5pqChVicmw49d_4tKwvSRz_j4argMne/view?usp=sharing https://www.youtube.com/watch?v=pEXhGE7Fd6s 43 Refletindo um pouco mais, posso indicar que a ética inserida no contexto profissional é denominada como deontologia, isto é, um conjunto de normas que regulam a prática das atividades do cargo que se ocupa e das funções que se exerce, a fim de assegurar o cumprimento da missão fixada em normas legais (ex.: preservar a ordem, tutelar os bens mais caros da sociedade – vida, liberdade, integridade física, patrimônio etc.). Nesse plano de ideias, você deve se lembrar de que o Estatuto de sua profissão define um conjunto de obrigações e deveres, dos quais se tem a ética ou a deontologia. SAIBA MAIS! A propósito, recomendo que você leia o estatuto
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