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fundamentos da filosofia unidade 1 (1)

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Prévia do material em texto

Autor: Prof. Vladimir Fernandes
Colaboradores: Prof. Nonato de Assis Miranda
Profa. Silmara Maria Machado
Profa. Renata Viana de Barros Thomé
Fundamentos de
Filosofia e Educação
Professor conteudista: Vladimir Fernandes
Doutor em educação pela Universidade de São Paulo. Mestre em filosofia pela Pontifícia Universidade Católica 
de São Paulo. Especialista em sociologia e história do trabalho pela Fundação Santo André, graduado em Filosofia 
pelo Centro Universitário Claretiano de Batatais. Atualmente é professor titular da Universidade Paulista e líder das 
disciplinas de Filosofia e de Fundamentos de Filosofia e Educação no curso de Pedagogia. Tem experiência na área de 
sociologia e de filosofia, com ênfase em epistemologia, ética e educação. Integrante do grupo de pesquisa “Políticas 
Públicas e Gestão de Práticas Educativas”, da Universidade Paulista.
© Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta obra pode ser reproduzida ou transmitida por qualquer forma e/ou 
quaisquer meios (eletrônico, incluindo fotocópia e gravação) ou arquivada em qualquer sistema ou banco de dados sem 
permissão escrita da Universidade Paulista.
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)
F363 Fernandes, Vladimir 
Fundamentos de Filosofia e Educação. / Vladimir Fernandes - 
São Paulo: Editora Sol, 2021.
104 p. il.
Notas: este volume está publicado nos Cadernos de Estudos e 
Pesquisas da UNIP, Série Didática, ISSN 1517-9230. 
1.Filosofia 2.Conhecimento 3.Educação I.Título
CUD 37.01
U512.73 – 21
Prof. Dr. João Carlos Di Genio
Reitor
Profa. Dra. Marilia Ancona Lopez
Vice-Reitora de Graduação
Vice-Reitora de Pós-Graduação e Pesquisa
Prof. Fábio Romeu de Carvalho
Vice-Reitor de Planejamento, Administração e Finanças
Profa. Melânia Dalla Torre
Vice-Reitora de Unidades Universitárias
Unip Interativa
Profa. Dra. Cláudia Andreatini
Profa. Elisabete Brihy
Prof. Marcelo Vannini
Prof. Dr. Luiz Felipe Scabar
Prof. Ivan Daliberto Frugoli
 Material Didático
 Comissão editorial: 
 Profa. Dra. Christiane Mazur Doi
 Profa. Dra. Angélica L. Carlini
 Profa. Dra. Ronilda Ribeiro
 Apoio:
 Profa. Cláudia Regina Baptista
 Profa. Deise Alcantara Carreiro
 Projeto gráfico:
 Prof. Alexandre Ponzetto
 Revisão:
 Leandro de Freitas
 Ana Fazzio
Sumário
Fundamentos de Filosofia e Educação
APRESENTAÇÃO ......................................................................................................................................................7
INTRODUÇÃO ...........................................................................................................................................................7
Unidade I
1 A CONDIÇÃO HUMANA ...................................................................................................................................9
1.1 A consciência mítica ............................................................................................................................11
1.2 A origem do Universo ......................................................................................................................... 14
1.3 Funções do mito ................................................................................................................................... 15
1.4 Mito e religião........................................................................................................................................ 17
1.4.1 A transição do mito para religião ..................................................................................................... 18
1.4.2 A relação signo e significado ............................................................................................................. 19
1.4.3 A relação simpática e a introdução do lógos ............................................................................. 19
1.4.4 Magia e sacrifício .................................................................................................................................... 20
1.4.5 Tabu e ética ............................................................................................................................................... 20
2 DO MITO À RAZÃO: O NASCIMENTO DA FILOSOFIA .......................................................................... 22
2.1 Os primeiros filósofos ......................................................................................................................... 24
3 SÓCRATES E A REFLEXÃO FILOSÓFICA .................................................................................................... 27
3.1 Sócrates: diferentes olhares ............................................................................................................. 29
3.2 Sócrates, segundo Aristófanes ........................................................................................................ 30
3.3 Sócrates, segundo Xenofonte .......................................................................................................... 31
3.4 Sócrates, segundo Platão .................................................................................................................. 32
3.5 O cidadão ateniense ............................................................................................................................ 35
3.6 Discurso de defesa ............................................................................................................................... 36
3.7 Condenação e discussão da pena .................................................................................................. 39
3.8 “Conhece-te a ti mesmo” .................................................................................................................. 42
3.9 O banquete.............................................................................................................................................. 44
4 LÓGICA FORMAL .............................................................................................................................................. 46
4.1 Argumento dedutivo ........................................................................................................................... 48
4.2 Argumento indutivo ............................................................................................................................ 48
4.3 Argumento por analogia ................................................................................................................... 48
4.4 Falácias ..................................................................................................................................................... 49
Unidade II
5 A TEORIA DO CONHECIMENTO NA ANTIGUIDADE E NA IDADE MÉDIA .................................... 57
5.1 Platão ........................................................................................................................................................ 57
5.2 Aristóteles ................................................................................................................................................ 62
5.3 A filosofia medieval: patrística e escolástica ........................................................................... 63
6 A TEORIA DO CONHECIMENTO NA IDADE MODERNA ..................................................................... 66
6.1 O racionalismo ....................................................................................................................................... 67
6.2 O empirismo ........................................................................................................................................... 69
6.3 O criticismo kantiano .......................................................................................................................... 70
Unidade III
7 EPISTEMOLOGIA, EDUCAÇÃO E CULTURA ............................................................................................. 76
7.1 Empirismo ea pedagogia diretiva ................................................................................................. 76
7.2 Apriorismo e a pedagogia não diretiva ....................................................................................... 77
7.3 Construtivismo e a pedagogia relacional ................................................................................... 78
7.4 Cultura e educação .............................................................................................................................. 78
7.5 Diversos tipos de cultura ................................................................................................................... 80
7.6 Pluralidade cultural e educação ..................................................................................................... 81
8 KANT, HANNAH ARENDT E A EDUCAÇÃO .............................................................................................. 84
8.1 Kant – educação para autonomia: a saída da menoridade ................................................ 84
8.2 Hannah Arendt: crise na educação ............................................................................................... 85
8.2.1 Hannah Arendt: autoridade e educação ....................................................................................... 89
7
APRESENTAÇÃO
Caro aluno,
Esta disciplina tem como objetivos:
• Refletir sobre as diferenças entre o ser humano e o animal e sobre o processo de humanização.
• Analisar as características do pensamento mítico e dos fatores que possibilitaram a transição da 
consciência mítica para o pensamento racional filosófico.
• Identificar a filosofia como uma reflexão profunda, rigorosa e global sobre os problemas que o ser 
humano enfrenta na construção de sua existência.
• Examinar o problema do conhecimento ao longo da história da filosofia.
• Estudar o conceito de cultura e considerar as relações entre cultura e educação.
• Analisar os pressupostos filosóficos da educação evidenciando as diferentes abordagens epistemológicas.
INTRODUÇÃO
O que vem a ser a filosofia? Será que a filosofia é necessária? Será que não podemos simplesmente 
seguir o nosso caminho e ignorar a filosofia? Afinal, o que leva o ser humano a filosofar? Qual a relação 
entre a filosofia e a educação?
Adiantamos que a filosofia não deve ser ignorada e que ela se faz necessária se quisermos viver de 
um modo mais consciente e consequente. Convidamos você a percorrer as páginas deste livro-texto na 
busca de elucidar algumas interrogações, estabelecer outras e, dessa forma, iniciar um rico diálogo com 
os pensadores que se dedicaram ao filosofar.
Seja bem-vindo e boa jornada!
8
9
FUNDAMENTOS DE FILOSOFIA E EDUCAÇÃO
DO MITO À FILOSOFIA
1 A CONDIÇÃO HUMANA
Figura 1 – O Homem Vitruviano de Leonardo da Vinci 
Disponível em: https://bit.ly/3htytpa. Acesso em: 13 set 2014.
O que é o ser humano? Pode-se dizer que existe uma natureza humana universal? Afinal qual a 
melhor forma de definirmos o ser humano e ao mesmo tempo o diferenciarmos dos outros seres vivos? 
É provável que muitos de vocês já se tenham feito essas perguntas. A necessidade de responder essas 
questões deve-se ao fato de as repostas servirem como pressupostos, os quais servirão de embasamento 
a análises posteriores.
Convido você a ler a seguir o relato sobre Amala e Kamala e a refletir sobre o tornar-se humano.
Na Índia, onde os casos de meninos-lobo foram relativamente numerosos, 
descobriram-se, em 1920 duas crianças, Amala e Kamala, vivendo no meio 
de uma família de lobos. A primeira tinha um ano e meio e veio a morrer um 
ano mais tarde. Kamala, de oito anos de idade, viveu até 1929. Não tinham 
nada de humano e seu comportamento era exatamente semelhante àquele 
de seus irmãos lobos.
Unidade I
10
Unidade I
Elas caminhavam de quatro patas apoiando-se sobre os joelhos e cotovelos para 
os pequenos trajetos e sobre as mãos e os pés para trajetos longos e rápidos.
Eram incapazes de permanecer de pé. Só se alimentavam de carne crua ou 
podre, comiam e bebiam como os animais, lançando a cabeça para frente e 
lambendo os líquidos. Na instituição onde foram recolhidas, passavam o dia 
acabrunhadas e prostradas numa sombra, eram ativas e ruidosas durante a 
noite, procurando fugir e uivando como lobos. Nunca choraram ou riram. 
Kamala viveu durante oito anos na instituição que a acolheu, humanizando-se 
lentamente. Ela necessitou de seis anos para aprender a andar e pouco 
antes de morrer só tinha um vocabulário de cinquenta palavras. Atitudes 
afetivas foram aparecendo aos poucos. 
Ela chorou pela primeira vez por ocasião da morte de Amala e se apegou 
lentamente às pessoas que cuidaram dela e às outras crianças com as 
quais conviveu.
A sua inteligência permitiu-lhe comunicar-se com outros por gestos, 
inicialmente, e depois por palavras de um vocabulário rudimentar, aprendendo 
a executar ordens simples (REYMOND, 1965, apud CAPALBO, p. 25-26).
O texto acima nos leva a refletir sobre o processo de humanização. Embora o ser humano possua um 
potencial racional, o desenvolvimento da sua humanidade depende de um processo de aprendizagem. Daí os 
questionamentos: como definir o ser humano? Como diferenciar o ser humano dos outros seres vivos?
Há muito tempo que o ser humano se depara com esses questionamentos, e as respostas, 
embora não divergentes, têm apontado enfoques diferentes. Platão buscou responder isso com 
base na relação entre o gênero próximo ao ser humano – bípede – e sua diferença específica 
– sem penas; dessa forma, chegou à definição do ser humano com um bípede implume. Com 
base na mesma analogia, mais conhecida e utilizada, tornou-se à definição de Aristóteles, ao 
conceber que o homem é um animal racional, ou ainda que o homem é um animal político, 
ênfase dada nos seus escritos sobre política. Marx e Engels, em Ideologia alemã, caracterizam o 
homem como um homo faber, homem fabricante, homem construtor de coisas. Ernst Cassirer 
no seu Ensaio sobre o homem defende a tese de que é mais adequado definir o homem como 
um animal symbolicum, um ser que se relaciona com o mundo através de um sistema simbólico, 
como a linguagem.
Exemplo de aplicação
E você, como define o ser humano? Qual a característica mais fundamental que distingue o ser 
humano dos outros seres vivos? Reflita.
11
FUNDAMENTOS DE FILOSOFIA E EDUCAÇÃO
Figura 2 – Cassirer, Ernst (1874-1945) 
Disponível em: https://bit.ly/2Xf4UjY. Acesso em: 13 set 2014.
 Saiba mais
Uma chave para a natureza do homem: o símbolo. In: CASSIRER, E. 
Ensaio sobre o homem: introdução a uma filosofia da cultura humana. Trad. 
Tomas Rosa Bueno. São Paulo: Martins Fontes, 1994. p. 50.
1.1 A consciência mítica
Figura 3 – Zeus, Poseidon e Hades 
Disponível em: https://bit.ly/3k72yMW. Acesso em: 13 set 2014.
12
Unidade I
Antes de abordarmos a reflexão filosófica propriamente dita, falaremos um pouco do pensamento 
mítico. Mas por que abordar o pensamento mítico? Porque o pensamento mítico é anterior à filosofia. 
Quando a filosofia surge, na Grécia antiga, ela se depara com um mundo povoado por concepções 
míticas. Um mundo “povoado” por deuses, deusas, heróis e monstros.
Afinal o que vem a ser mito? O que, em geral, as pessoas entendem por mito? 
Muitas pessoas definem os mitos como estórias desconexas, como fantasias criadas sem qualquer 
relação com a realidade ou como um conjunto caótico de supertições. Mas será que os mitos se limitam 
a essas definições?
Vamos tomar como exemplo um mito grego sobre o rapto de Cora. Personagens que aparecem 
nesse mito:
Deméter: deusa das colheitas.
Cora: filha de Deméter.
Hades: deus do subterrâneo.
Zeus: deus da região celestial.
Hermes: mensageiro dos deuses.
Figura 4 – O Rapto de Prosérpina [Perséfone]. Tolita 
Disponível em: https://bit.ly/2VE7bF3. Acesso em: 13 set 2014.
13
FUNDAMENTOS DE FILOSOFIA E EDUCAÇÃO
Cora, filha da deusa das colheitas, Deméter, brinca pelos campos verdejantes daGrécia. Cora é uma 
adolescente cheia de vida. Ela corre, pula, brinca com as flores e com as borboletas. Mas Cora não sabe 
que está sendo observada. Perto dali, Hades, deus do subterrâneo, observa Cora brincar e pensa: que 
bela adolescente essa Cora!
Hades então resolve raptar a doce Cora. Ele coloca em movimento sua carruagem puxada por dez 
fortes cavalos e parte em sua direção. Cora, ao perceber o que se passa, corre, mas em vão. Hades toma 
Cora em seus braços e a leva. No mesmo momento se abre no chão uma grande fenda, e a carruagem 
desce para o centro da terra.
Ao cair da noite, a mãe de Cora, Deméter, sente sua falta e sai à sua procura. Dois camponeses que 
presenciaram a cena contam-lhe o que aconteceu. Deméter fica louca de dor e desconsolada proíbe 
que as plantas, o capim, as árvores, as frutas e os cereais cresçam.
Os camponeses ficam preocupados e tristes, pois sem o crescimento das plantas eles irão 
perecer. Eles imploram aos deuses para que o verde retorne. Os deuses pedem para Deméter deixar 
a vegetação crescer, mas ela está irredutível: nada crescerá ou voltará a florescer enquanto Cora 
não voltar.
Zeus resolve intervir. Manda o mensageiro Hermes ao inferno falar com Hades para trazer Cora de 
volta. Mas ela só poderá voltar se não tiver comido nenhuma comida do reino dos mortos. O jardineiro 
informa a Hermes que ela havia comido sete sementes de romã. Dessa forma, Cora não poderia voltar. 
Mas Deméter não volta atrás de sua decisão e não permite que nada floresça.
Zeus então estuda o problema e propõe uma possível solução para o impasse: como ela comeu 
apenas sete sementes de romã, durante seis meses Cora ficará morando com Hades no subterrâneo, 
será sua esposa e se chamará Perséfone (aquela que causa destruição), que os romanos chamam de 
Proserpina. Durante os outros seis meses, Cora voltará e passará em companhia de sua mãe, Deméter.
Quando Cora está com sua mãe, esta fica muito feliz. Nesse período, a natureza reflete a felicidade 
de Deméter: a terra está coberta de verde com flores e frutos.
Quando vai se aproximando o momento de Cora partir, sua mãe vai ficando triste e a vegetação 
também começa a mudar. Quando Cora retorna ao subterrâneo com Hades, as folhas começam a secar 
e a cair. As plantas e os frutos cessam de crescer e nada mais floresce. Até o sol não brilha com a mesma 
intensidade de antes.
Quando novamente se aproxima o momento de Cora voltar, sua mãe vai ficando alegre e a natureza 
começa a florescer novamente. E assim sucessivamente.
14
Unidade I
Figura 5 – O Retorno de Perséfone. Frederic Leighton (1891) 
Disponível em: https://bit.ly/3nxFdWW. Acesso em: 13 set 2014.
Exemplo de aplicação
Qual o significado desse mito? Como a ciência explica o mesmo fenômeno abordado nesse mito? Reflita.
1.2 A origem do Universo
Segundo a Teogonia de Hesíodo, no princípio de tudo havia apenas o Caos (Kháos), uma espécie de 
vazio escuro ilimitado e indefinido. Depois, do seio do Caos, surgiu a Terra (Gaia). Nossa mãe Terra nasceu 
depois do Caos e de certa forma representa o seu contrário. Jean-Pierre Vernant (2000), explica que a 
Terra surge como forma distinta, separada, precisa; enquanto o Caos representa confusão, indistinção, 
desordem. A Terra é o chão do mundo, lugar onde os deuses, os homens e os bichos poderão andar 
com segurança.
 
 Lembrete
Teogonia: gr. theogonía, as “origem ou genealogia dos deuses”. Nas 
religiões politeístas, narração do nascimento dos deuses e apresentação da 
sua genealogia (Dicionário Eletrônico Houaiss da Língua Portuguesa).
Depois, em terceiro lugar, aparece Eros, que mais tarde se chamaria amor. Este é o Eros primordial, 
ainda não há o masculino e o feminino, é o Eros que expressa o impulso do Universo em se manifestar, 
de trazer à luz o que está oculto na escuridão.
15
FUNDAMENTOS DE FILOSOFIA E EDUCAÇÃO
A Terra (Gaia) é a mãe, é feminina, mas vai parir sem precisar se unir a ninguém. Gera do seu ventre 
o Céu (Urano) e as águas. Segundo Vernant (2000), ela dá à luz os seus contrários: se ela é chão firme, 
gera uma abóbada estrelada e gera também as águas e as ondas.
Eros atua de outra forma agora. Céu e Terra precisam se unir para gerar outros seres. Céu tem uma 
atividade incessante com a Terra. Terra fica grávida de vários filhos (os Titãs), que não encontram espaço 
para sair, já que o Céu está deitado constantemente sob a Terra.
Os filhos de Terra (Gaia) e Céu (Urano) são seis Titãs e suas irmãs Titânidas. Nascem também dois trios 
de gigantes: três Ciclopes, de um só olho cada um, e três Cem braços.
Separação entre Céu e Terra
A Terra fica furiosa por reter os filhos em seu ventre e pede para que eles ajudem a libertá-la das 
injúrias do pai. Ainda não há luz, já que Urano fica constantemente deitado sob Gaia.
Gaia elabora um plano. Gera dentro de si um tipo de foice, depois a coloca na mãe de Cronos, o 
mais jovem dos Titãs. Ele está no ventre da mãe e fica à espreita. Quando Urano se deita para possuí-la, 
Cronos corta o órgão sexual do pai e o joga por cima do ombro para as ondas do mar. Nesse ato Urano 
grita de dor e se afasta de Gaia, instalando-se no alto, onde está até hoje. Assim, separa-se o Céu da 
Terra e os filhos podem nascer.
Cria-se, dessa forma, um espaço livre entre o Céu e a Terra que possibilita a vida e a reprodução dos 
seres. Surgem agora o dia e a noite que se revezarão. Urano separado de Gaia não se une mais a ela, a 
não ser através das chuvas fecundantes, que irão gerar outros seres.
1.3 Funções do mito
Figura 6 – Busto de Homero. Louvre 
Disponível em: https://bit.ly/3z2Rmp7. Acesso em: 13 set 2014.
16
Unidade I
A palavra mito tem sua origem etimológica em mythos, que significa “palavra”, “o que se fala”. 
Quem era o “falador” desses mitos na Grécia antiga? De um modo geral, os mitos faziam parte da 
cultura e eram contados pelos pais, pelas amas de leite, pelas pessoas em geral, pelos aedos (isto é 
poetas cantores). Esses últimos, os poetas, tinham um papel de destaque na narrativa mítica, uma 
vez que eram considerados escolhidos pelos deuses para narrarem poeticamente os acontecimentos 
divinos. Em uma cultura oral, esses poetas vão pelas praças contando as estórias envolvendo os 
deuses e, assim sendo, ajudam a manter viva a memória do seu povo.
Desse modo, o mito é uma forma de explicar o mundo, de atribuir sentido ao existente e assim 
tranquilizar o ser humano. Trata-se de uma verdade intuída, cuja autoria se perde no tempo, sendo, em 
geral, considerado como uma produção anônima e coletiva.
Os dois poemas épicos mais importantes da literatura grega (e também da literatura ocidental), 
Ilíada e Odisseia têm como possível autoria o poeta Homero. Por outro lado, há intérpretes que 
consideram que essas duas obras não foram escritas por um único poeta, mas sim por vários.
 Lembrete
Épico: 1 que relata, em versos, uma ação heroica. 2 relativo a, ou próprio 
de epopeia ou de heróis (Dicionário Eletrônico Houaiss da Língua Portuguesa).
A Ilíada aborda a guerra que aconteceu em Troia (em grego Ílion) envolvendo gregos e troianos. E a 
Odisseia narra o retorno de Troia de um de seus principais guerreiros, Ulisses (em grego Odisseu), para 
sua pátria Ítaca.
Mas os mitos não foram produzidos apenas na Grécia antiga. Diferentes povos em diferentes 
épocas produziram seus próprios mitos, como por exemplo, os mitos produzidos por tribos indígenas 
da floresta amazônica.
O ponto comum entre as diferentes concepções míticas é a busca por dar sentido ao mundo, por dar 
uma explicação para os fenômenos desconhecidos. Dessa forma,
pode-se dizer que o problema sobre o conhecimento sempre preocupou 
o ser humano, mesmo quando ele não tinha isso claramente explicitado. 
Encontramos no mito a primeira tentativa de se “conhecer” o mundo, ou 
de pelo menos de lhe atribuir um sentido. O homem primitivo diante de 
um mundo desconhecido, cheio de mistérios como o nascimento, a morte, 
a sucessão alternada entre dias e noites, as mudanças climáticas etc.,tinha necessidade de entender esse mundo. Essa necessidade é própria da 
condição humana já que o ser humano, diante do medo e do desconforto 
produzido pelo desconhecido precisa dar-lhe sentido. O caos necessita 
ser ordenado pela cosmogonia mítica para o ser humano encontrar o 
seu lugar. Da mesma forma que o ser humano teve de construir suas 
17
FUNDAMENTOS DE FILOSOFIA E EDUCAÇÃO
armas, ferramentas, roupas, moradia etc., teve também de construir uma 
linguagem, dar nome às coisas, atribuir sentido ao existente. Quando o ser 
humano chega ao mundo não existe um livro que contenha as respostas 
para suas inquietações. Precisa elaborar tanto o livro, quanto às respostas 
e as próprias perguntas. No pensamento mítico a força da tradição e do 
coletivo é muito intensa para que se desconfie de suas próprias concepções, 
mas no decorrer do processo dialético da história, chega-se a um momento 
em que se começa a desconfiar desse saber mítico. (FERNANDES, 2004).
 Observação
Cosmogonia: do gr. kosmogonía. Qualquer narrativa, doutrina ou 
teoria a respeito da origem do mundo ou do Universo (Dicionário Eletrônico 
Aurélio da Língua Portuguesa).
1.4 Mito e religião1
Segundo o filósofo Ernst Cassirer, mito e religião são formas distintas de atribuir sentido ao mundo, 
muito embora possuam como ponto de partida problemas comuns e fundamentais da vida humana. 
Entre esses problemas, destaca-se o da morte.
A ideia de que a morte seja algo natural e previsível da condição humana não está presente, segundo 
Cassirer, nem no mito nem na religião primitiva. “A concepção de que o homem é mortal, por sua 
natureza e essência, parece ser inteiramente estranha ao pensamento mítico e religioso primitivo” (1994, 
p. 140). A morte sempre aparece associada a causas não naturais, como magia, bruxaria entre outros. 
Cassirer, no seu Ensaio sobre o homem, endossa a tese que Herbert Spencer defende de “que o culto aos 
ancestrais deve ser considerado como a primeira fonte e a origem da religião” (1994, p. 141). Segundo 
Cassirer, essa é realmente uma prática comum em diferentes culturas, como em várias tribos indígenas, 
na Roma antiga ou mesmo na China. “Tudo isso mostra de maneira clara e inequívoca que temos aqui 
uma característica realmente universal, irredutível e essencial, da religião primitiva” (1994, p. 143).
Embora a morte se apresente a princípio como um mistério e possa desencadear o medo e, 
consequentemente, práticas para que o espírito não retorne, em geral, a tendência oposta é a que 
predomina. Os rituais são realizados para fazer com que os fantasmas dos mortos se tornem deuses 
familiares. Segundo Cassirer, o pensamento mítico e o religioso têm suas origens em iguais acontecimentos 
fundamentais da existência.
Em todo o curso de sua história, a religião permanece indissoluvelmente 
ligada a elementos míticos, e impregnada deles. Por outro lado o mito, 
mesmo em suas formas mais grosseiras e rudimentares, traz em si alguns 
1 O texto do item 1.4 a 1.4.5 foi extraído de Fernandes (2004).
18
Unidade I
motivos que de certo modo antecipam os ideais religiosos superiores que 
chegam depois. Desde o início, o mito é religião em potencial. O que leva de 
um estágio para outro não é nenhuma crise repentina de pensamento, nem 
qualquer revolução de sentimento (CASSIRER, 1994, p. 146).
Dessa forma, embora haja elementos comuns entre o mito e a religião, a forma como a religião 
trata esses elementos vai caracterizando seu distanciamento gradativo e, por fim, radical em relação ao 
pensamento mítico.
1.4.1 A transição do mito para religião
Segundo Cassirer, o mito é a forma mais primitiva de conformação espiritual do mundo. “Muito 
antes que o mundo se dê a consciência como um conjunto de ‘coisas’ empíricas e como um complexo de 
‘propriedades’ empíricas, se lhe dá como um conjunto de potências e influxos mitológicos” (1998, p. 17).
Assim, as demais formas simbólicas ou as demais formas compreensivas da realidade possuem no 
mito seu núcleo originário comum. Mas Cassirer não defende um progresso evolutivo semelhante ao 
de Comte, em que se passaria pela etapa do “teológico” ao “metafísico” e deste ao “positivo”. Para 
Cassirer não se chega a um puro estado racional em que o mito seria totalmente superado. Não existe 
tal processo evolutivo unidirecional, as formas simbólicas estão justapostas, são irredutíveis umas às 
outras e possuem o mesmo grau de objetividade. O que existe, na verdade, é um permanente conflito 
entre e intra as formas simbólicas. Nas palavras de Cassirer, no seu Ensaio sobre o homem: “Se existe um 
equilíbrio na cultura humana, só pode ser descrito como dinâmico, e não estático; resulta de uma luta 
entre forças opostas” (1994, p. 363). Essas forças opostas são as várias formas simbólicas, mito, religião, 
ciência etc., que na sua autoafirmação produzem esse equilíbrio conflituoso e, segundo Cassirer, em 
todas as atividades humanas existe “uma tensão entre estabilização e evolução, entre uma tendência que 
leva a formas fixas e estáveis de vida e outra que rompe com esse esquema rígido” (idem, p. 365). Assim, 
além do conflito existente entre as formas simbólicas, as antinomias da cultura, existe também dentro 
de cada forma simbólica uma tensão entre estabilidade e evolução. O homem encontra-se dentro dessas 
tendências, entre as forças da preservação e as forças da mudança. Como o homem é um ser dinâmico e 
criativo e também o próprio agente dessas forças, ocorre que quando uma força se torna preponderante 
e rompe com a antiga, tem-se a configuração de uma nova forma particular. Nas palavras de Cassirer,
Há uma luta incessante entre a tradição e a inovação, entre forças produtivas 
e criativas. Esse dualismo é encontrado em todos os domínios da vida 
cultural. O que varia é a proporção dos fatores opostos. Ora um fator, ora 
outro, parece preponderar. Essa preponderância determina em alto grau o 
caráter das formas isoladas e confere a cada uma delas a sua fisionomia 
particular (ibidem).
Quando as forças da mudança se tornam preponderantes, dialeticamente se desprendem do seu 
núcleo original configurando sua própria fisionomia e autonomia, ocorre uma mudança na visão de 
mundo dessa nova forma que já não a torna possível conviver com a qual pertencia.
19
FUNDAMENTOS DE FILOSOFIA E EDUCAÇÃO
Tal tensão também se faz presente no processo gradativo de transição do mito e da religião primitiva 
para a religião. Conforme exposto no Ensaio sobre o homem:
O interdito sob o qual a vida humana fora posta pelo pensamento mítico e 
religioso primitivo é gradualmente afrouxado, e finalmente dá mostras de ter 
perdido a sua força coesiva. Surge uma nova forma dinâmica de religião que 
abre uma nova perspectiva de vida moral e religiosa. Nessa religião dinâmica, 
os poderes individuais obtiveram a predominância sobre os simples poderes 
de estabilização. A vida religiosa alcançou sua maturidade e sua liberdade; 
quebrou o feitiço de um tradicionalismo rígido (p. 367).
Dessa forma, a transição do mito para a religião ocorre por um processo lento, gradual e dialético, 
resultante da tensão entre as forças de conservação e de transição no interior do pensamento mítico. Se 
ao final desse processo, se pode observar elementos comuns entre o mito e a religião, o mesmo não se 
pode dizer em relação à sua forma. Algumas das principais diferenças entre mito e religião podem ser 
apontadas nos seguintes aspectos: a) a relação signo e significado; b) a relação simpática e a introdução 
do lógos; c) magia e sacrifício; d) tabu e ética. Vejamos cada uma delas.
1.4.2 A relação signo e significado
O pensamento mítico não diferencia nem signo do significado nem imagem da coisa. O signo e a 
imagem estão como que “colados” aos atributos das coisas que designam e assumem;, dessa forma, 
as propriedades da própria coisa. Já no pensamento religioso há uma mudança radical em relação a 
esse aspecto. A religião, ao utilizar imagens e signos sensíveis em relação ao divino, utilizam-nos comorepresentação. Cassirer cita a crítica que Isaías (44-9) faz à adoração de imagens: 
Parte da lenha queima no fogo... E transforma sua sobra em um deus, em 
sua escultura; humilha-se diante dela, adora, e roga dizendo: livra-me, que 
meu deus és tu (...). Diante de um tronco de árvore tenho de me humilhar? 
(CASSIRER, 1998 , p. 295).
Enfim, no pensamento religioso não se concebe, como no pensamento mítico, que a imagem é o 
próprio deus e como tal é dotada de poderes, mas sim que a imagem apenas representa ou remete ao 
deus ou à divindade.
1.4.3 A relação simpática e a introdução do lógos 
Tanto no mito como na religião, Cassirer identifica uma crença na “simpatia pelo todo”, mas também 
que a simpatia religiosa é diferente da simpatia mítica.
No pensamento mítico, o homem está em comunhão com a natureza, como se fosse um único 
organismo. Os ritos garantem a continuidade dos ciclos da natureza e da existência humana. O 
homem intervém na natureza através de ritos e práticas mágicas. Já no pensamento religioso, a 
natureza passa a ser abordada do ponto de vista racional e não exclusivamente emocional.
20
Unidade I
Nenhuma religião pôde jamais pensar em cortar, ou sequer afrouxar, os laços 
entre o homem e a natureza. Mas nas grandes religiões éticas esse laço é feito 
e apertado em um novo sentido. A ligação simpática que encontramos na 
magia e na mitologia primitiva não é negada ou destruída; mas a natureza 
é agora abordada do ponto de vista racional, em vez do emocional. Se a 
natureza contém um elemento divino, ele não aparece na abundância da 
sua vida, mas na simplicidade da sua ordem (CASSIRER, 1994, p. 165).
Aqui também se pode exemplificar um novo enfoque. Enquanto o mito “explica” suas crenças de 
uma forma emocional, a religião utiliza o lógos, explica sua crença com base em argumentos racionais. 
Mesmo com relação àquilo que é “inexplicável”, passa-se a argumentar o porquê de tal condição. Na 
verdade, o lógos já se faz presente também na relação signo significado, na não identidade entre o 
representante e o representado.
1.4.4 Magia e sacrifício
Outro aspecto importante é a transformação da relação entre o ser humano e o divino. A 
relação mágica vai sendo lentamente substituída por um outro tipo de relação. “Em seu sentido 
original, todo sacrifício entranha um fator negativo: significa uma limitação do apetite sensível, 
uma renúncia que o eu se impõe a si mesmo” (CASSIRER, 1998, p. 274). O sacrifício se eleva 
acima da visão mágica, pois nesta inicialmente não há limitação para o cumprimento dos desejos 
humanos. A magia é um instrumento para “manipular” os desejos das forças espirituais e colocá-las 
a serviço do homem; ela não conhece limites na sua ação de submeter-se à vontade dos deuses. 
Já no sacrifício está presente outro elemento e direção. Desde os seus primeiros estágios, está 
presente a concepção de que o poder está relacionado proporcionalmente a uma autocontinência, 
a uma abstinência correlativa. Nesse ato negativo do sacrifício e do ascetismo emerge uma nova 
consciência de si e do divino. O homem toma consciência de que não é dotado de onipotência, 
mas que está sujeito a limites, e também que o divino é um poder superior não manipulável 
através da magia, mas que através da oração e do sacrifício pode ser aplacado. Quando o sacrifício 
deixa de ser meramente material, como por exemplo, de animais, para um sacrifício interno, de 
“veneração”, o que passa a ser importante não é mais o “conteúdo da oferenda”, mas sim a “forma 
de dar”. Aqui a oferenda é interiorizada e a verdadeira oferenda passa a ser a interioridade do 
homem. Cassirer identifica uma virada semelhante na religião profética em relação ao sacrifício. 
Cita Isaías (1:11-17): “Para que a mim, disse Jeová, a grande quantidade de vossos sacrifícios? 
Farto estou do holocausto de carneiros e do sebo de animais (...) Aprende a fazer o bem” (1925a, 
p. 278). Entre o homem e o divino se estabelece então uma relação essencialmente ética.
1.4.5 Tabu e ética
Outro elemento importante é a substituição do tabu pela ética. O tabu é marcado como algo 
proibido, sobrenatural e que não se deve ter contato (pode ser um objeto, um lugar, uma ação 
etc.) sob risco de castigo. No sistema de tabu, não há responsabilidade individual. Se alguém 
desrespeita o tabu, não é só ele que receberá castigo, mas toda sua família ou tribo. Deve-se 
então recorrer aos ritos de purificação para transferir a impureza para um “bode expiatório” ou 
21
FUNDAMENTOS DE FILOSOFIA E EDUCAÇÃO
a um pássaro e restabelecer o equilíbrio. Outro aspecto é que a contaminação pelo contato com 
o objeto tabu é de forma “mecânica”. Pouco importa se o contato com o mesmo foi proposital, 
acidental, por ignorância etc., a contaminação será certeira.
A ação do tabu é sempre mecânica; o contato com o objeto tabu comunica 
a sua infecção com tanta certeza quanto o contato com água comunica a 
umidade, ou com uma corrente elétrica comunica um choque elétrico (JEVONS 
apud CASSIRER,1994, p. 176).
Para Cassirer, nesse aspecto, no pensamento religioso, ocorrerá um gradual processo que levará a 
uma “mudança de sentido” em relação à pureza ou impureza dos objetos. Ele afirma que tal mudança 
pode ser encontrada no Velho Testamento e que ocorreu no desenvolvimento do judaísmo.
O ideal de pureza significa algo totalmente diferente de todas as concepções 
míticas precedentes. Procurar por pureza ou impureza em um objeto, em 
uma coisa material, passou a ser impossível. Mesmo as ações humanas, 
como tais, deixaram de ser vistas como puras ou impuras. A única pureza 
que tem significado e dignidade do ponto de vista da religião é a pureza do 
coração (CASSIRER, 1994, p. 177).
Essa mudança remete à outra também importante. O sistema de tabus obriga ao homem uma 
série de deveres e de obrigações. E entre esses há de comum o fato de serem totalmente negativos, 
sem nenhum caráter positivo. O sistema de tabus, embora seja, por um lado, uma importante 
forma de regular as ações humanas e a vida social, por outro lado, ele ameaça paralisar a vida 
com suas restrições. Já que em alguns casos não se pode comer determinados alimentos, andar ou 
ficar parado em determinados locais ou pronunciar tais palavras. Seu fio condutor é a proibição e 
consequentemente o medo e, derivado desta, a obediência passiva. Segundo Cassirer, as grandes 
religiões transformam essa submissão passiva em um sentimento positivo.
No entanto, os grandes mestres religiosos da humanidade encontraram um 
novo impulso (...). Transformaram a obediência passiva em um sentimento 
religioso ativo. Todas as religiões éticas superiores – a religião dos profetas 
de Israel, o zoroastrismo, o cristianismo – propuseram-se uma tarefa comum. 
Elas aliviam o peso intolerável do sistema de tabus, mas em compensação 
descobrem um sentido mais profundo de obrigação religiosa, que em vez de 
ser uma restrição ou compulsão é a expressão de um novo ideal positivo de 
liberdade humana (idem, p. 179).
Esse ideal positivo de liberdade humana é pautado na concepção de que o ser humano é dotado de 
livre-arbítrio, ou seja, é capaz de refletir sobre o bem e o mal, fazer escolhas e ser responsável por elas. 
Sua relação com o divino deixa de ser regulada pelo medo ou pela tentativa de manipulação através da 
magia para se tornar uma relação ética. Nesta relação, utiliza o lógos para entender o divino e praticar 
a virtude. 
22
Unidade I
 Saiba mais
Alguns filmes que podem propiciar uma inter-relação com os conteúdos 
da unidade:
A guerra do fogo. Dir. Jean-Jacques Annaud, 100 minutos, 1976.
A Odisseia. Dir. Francis Ford Coppola, 150 minutos, 1997.
O enigma de Kaspar Hauser. Dir. Werner Herzog, 110 minutos, 1974.
Sugestões de leitura 
CASSIRER, E. Ensaio sobre o homem: introdução a uma filosofia da 
cultura humana. Trad. Tomas Rosa Bueno. São Paulo: Martins Fontes, 1994. 
p. 129.
FERRY, L. A sabedoria dos mitos gregos: apreder a viver II. Trad. Jorge 
Bastos. Rio de Janeiro: Objetiva, 2009.VERNANT, J. O universo, os deuses, os homens. Trad. Rosa Freire d’Aguiar. 
São Paulo: Companhia das Letras, 2000.
2 DO MITO À RAZÃO: O NASCIMENTO DA FILOSOFIA
Figura 7 – Busto de Pitágoras. Cópia romana de original grego
Disponível em: https://bit.ly/3z2RAMZ. Acesso em: 13 set 2014.
23
FUNDAMENTOS DE FILOSOFIA E EDUCAÇÃO
Conforme foi abordado anteriormente, o mito é a primeira forma que o ser humano utilizou para 
dar sentido ao mundo. Ele é um tipo de saber afetivo, coletivo e dogmático. Mas chega um momento 
no decorrer do processo histórico que a explicação mítica passa a ser questionada, por aqueles que 
seriam conhecidos como os primeiros filósofos, pelos pré-socráticos, preocupados em buscar a arché, o 
princípio fundamental das coisas. Estes, agora, buscam dar uma explicação sustentada em argumentos 
racionais para o existente. Mas como foi possível o surgimento dessa busca de explicação racional para 
o existente em oposição ao pensamento mítico?
Essa transição foi um processo lento e gradativo e não significou o desaparecimento das concepções 
míticas. Segundo Jean Pierre Vernant, em As origens do pensamento grego, esse pensamento racional 
denominado de filosofia foi propiciado pelas formas de organização social, política e econômica da 
cidade-estado;, assim, pode-se afirmar que a filosofia é filha da polis grega.
O aparecimento da polis constitui, na história do pensamento grego, um 
acontecimento decisivo. Certamente, no plano intelectual como no domínio 
das instituições, só no fim alcançará todas as suas consequências; a polis 
conhecerá etapas múltiplas e formas variadas. Entretanto, desde o seu 
advento, que se pode situar entre os séculos VIII e VII, marca um começo, 
uma verdadeira invenção; por ela, a vida social e as relações entre os homens 
tomam uma forma nova, cuja originalidade será plenamente sentida pelos 
gregos. (VERNANT, 1998, p.41) 
O palco principal da cidade grega era a Ágora, a praça pública, o lugar em que há a autonomia 
da palavra. A palavra era tão valorizada que os gregos a transformaram numa divindade, Pheitó, que 
representa a força, a capacidade da persuasão. Não mais a palavra de ordem do rei divino, mas a palavra 
humana, buscando através do conflito, da discussão, um sentido e o convencimento pela persuasão. A 
palavra não é mais uma forma justa a priori, mas está exposta a contestação. A polêmica, a discussão, 
a argumentação são as regras do jogo intelectual e político, que é praticado à luz do sol, na Ágora, 
e tem como juiz o público, os cidadãos. Os conhecimentos, os conteúdos da cultura, não ficam mais 
restritos ao palácio, são agora expostos em praça pública a apreciações de todos, possuem um caráter 
de publicidade e passam a ser objeto de análise e de interpretação.
Dessa forma, pode-se concluir com Vernant que as várias transformações que culminaram com a 
polis grega trouxeram em seu bojo a possibilidade de emergência do pensamento racional filosófico, ou 
seja, que a filosofia é filha da pólis.
Mas o que vem a ser filosofia? Do ponto de vista etimológico, a palavra é 
composta de philia, que significa união, amizade, amor fraterno e Sophia, 
que deriva de sophos, sábio e significa sabedoria. Assim a filosofia significa 
busca amorosa pela sabedoria, amizade ao saber. Segundo a tradição foi 
Pitágoras de Samos que cunhou a palavra filosofia. Para ele a sabedoria era 
atributo dos deuses e não dos seres humanos, mas estes poderiam desejá-la, 
poderiam buscar amorosamente a sabedoria transformando-se em filósofos 
(CHAUI, 1997, p. 19 e 20).
24
Unidade I
Conforme foi exposto, o pensamento filosófico é filho da pólis. O ponto de partida para a filosofia 
grega foram as poesias cosmogônicas.
Essas poesias explicavam o surgimento do mundo através de interpretações míticas. A passagem 
do pensamento cosmogônico para o pensamento cosmológico não se deu através de um salto, nem 
substitui por completo o anterior. Foi um processo lento e gradativo em que uma série de fatores, como o 
nascimento da cidade-estado, a invenção da escrita, das leis escritas, a invenção da moeda, contribuíram 
para que, assim como o poder e a organização da vida social, os mitos também fossem questionados. 
 Observação
Cosmologia: etim gr. kosmología, do gr. kósmos “lei, ordem, mundo, 
universo” + rad. gr. -logía “tratado, ciência, discurso” (Dicionário Eletrônico 
Houaiss da Língua Portuguesa).
Os aedos (poetas-cantores) são cultores da memória. Eles possuem a força da palavra e revelam a 
vida e a origem dos seres e do mundo. As concepções míticas são mantidas vivas pela tradição oral. 
Com a invenção e o uso da escrita, essas concepções passam a ser registradas. O rigor daquele que 
escreve é diferente do rigor daquele que fala, e as palavras, uma vez escritas, estão fixas, permitindo 
maior exame e reflexão posterior. Portanto, o uso da escrita tem uma contribuição fundamental para o 
questionamento das interpretações míticas.
Enquanto o pensamento mítico não questiona o seu conteúdo, o pensamento filosófico caracteriza-se 
pelo questionamento, pela investigação e argumentação racional para explicação da realidade. Embora 
o conteúdo da explicação desses primeiros filósofos tenha muita semelhança com o mito, a forma de 
explicar é diferente, ou seja, é uma forma investigativa racional.
2.1 Os primeiros filósofos
Os primeiros filósofos viveram por volta do século VII e VI a.C. Grande parte 
da obra desses filósofos pré-socráticos se perdeu no tempo e o que chegou 
à posteridade foram fragmentos e comentários que outros filósofos fizeram 
sobre eles. O problema que esses filósofos buscam responder é: Qual é a 
arché, o princípio ou fundamento das coisas existentes? Tales de Mileto, que 
é considerado o primeiro filósofo, defende que o princípio ou fundamento 
de todas as coisas é a água. Para Anaxímenes esse princípio primeiro é o ar. 
Já Demócrito defende que é o átomo. Para Heráclito o princípio primordial 
é o devir (mudança) representado pelo fogo. Empédocles entende que tudo 
se origina da combinação dos quatro elementos básicos: ar, fogo, água e ar. 
Vamos ver alguns dos pré-socráticos (BORNHEIM, 2003).
Tales de Mileto (624-547 a.C.) é considerado o primeiro filósofo. Ele ficou muito conhecido pelo 
feito notável de prever um eclipse que se confirmou no dia previsto: 28 de maio de 585 a.C. Para alguns 
25
FUNDAMENTOS DE FILOSOFIA E EDUCAÇÃO
autores, essa data simboliza o dia do nascimento da filosofia. Não se conhece fragmento dos escritos de 
Tales, mas é atribuída a ele a autoria de uma pergunta que ainda hoje produz muita controvérsia: Qual 
a origem de todas as coisas? Do que tudo é constituído? Para Tales: 
“A água é o elemento primordial de todas as coisas.” / “Tudo está cheio de deuses.”
Figura 8 – Heráclito. Detalhe de Escola de Atenas. Rafael 
Disponível em: https://bit.ly/2XcIPT9. Acesso em: 13 set 2014.
Heráclito de Éfeso (544-484 a.C.) era chamado por seus contemporâneos de “obscuro”, devido aos 
seus escritos serem de difícil compreensão. Conta-se que Sócrates, ao ler um livro dele, afirmou que para 
entendê-lo teria que ser um mergulhador de Delos, tal a profundidade dos seus pensamentos. Heráclito 
ficou conhecido como filósofo do devir. Algumas de suas principais ideias:
“A Physis [‘natureza’] ama ocultar-se.” / “Todas as coisas estão em movimento.” / “O movimento se 
processa através de contrários.” / “Nos mesmos rios entramos e não entramos, somos e não somos”. Ou: 
“Nunca entramos no mesmo rio duas vezes”, pois assim como o rio, nós também não somos mais os 
mesmos.” / “O conhecimento sensível é enganador e deve ser superado pela razão.”
Xenófanes de Colofón (580-577 a.C.) é considerado um precursor da doutrina de Parmênides 
e escreveu predominantemente em versos. Foi um filósofo rapsodo que declamava seus versos pelas 
cidades da Grécia. Defendeu que o elemento primordial de todas as coisas é a terra, mas se tornou 
famoso pela sua teologia e por seus ataques à “religião” popular grega e aos poetas. Criticavaos 
deuses antropomórficos de Homero e Hesíodo dotados de vícios e imoralidade, pois só se aprendiam 
com eles roubos, mentiras e adultérios. Para eles, os poetas criavam deuses à imagem e semelhança 
dos próprios homens: “Mas se os bois, os cavalos e os leões tivessem mãos ou pudessem pintar e 
realizar as obras que os homens realizam com as mãos, os cavalos pintariam imagens dos deuses 
semelhantes a cavalos, os bois semelhantes a bois, e plasmariam os corpos dos deuses semelhante 
26
Unidade I
ao aspecto que tem cada um deles.” / “Os etíopes dizem que os seus deuses são negros e de nariz 
chato, os trácios dizem que têm olhos azuis e cabelos vermelhos.”
Xenófanes defende a tese de que existe um único Deus, por isso Aristóteles afirma que ele foi o 
primeiro partidário do uno.
“Um só deus, o maior entre os deuses e os homens, não semelhante aos homens, nem pela forma, 
nem pelo pensamento.” / ”Vê tudo, pensa tudo, ouve tudo.” / “E sem esforço move tudo com a força 
do seu pensamento.” / “Permanece sempre imóvel no mesmo lugar; e não lhe convém mover-se de um 
lugar para o outro.”
Figura 9 – Parmênides
Disponível em: https://bit.ly/2Xf8daS. Acesso em: 13 set 2014.
Parmênides de Eleia (540-475 a.C.) É considerado principal destaque da escola eléatica (outros 
representantes: Xenófanes, Zenão, Melisso). Critica a concepção de Heráclito de que “tudo é movimento” 
e defende a imobilidade do ser. Há fragmentos de um poema de Parmênides conhecido com o título: 
Sobre a natureza. Nele Parmênides relata a revelação da verdade que lhe foi concedida por uma deusa. O 
filósofo-poeta Parmênides realiza uma viagem numa carruagem alada arrastado por fogosos cavalos e 
guiada pelas filhas do Sol. O véu que encobre a verdade é retirado da sua cabeça, e ele recebe a verdade 
desvelada pela fala da deusa. Ela lhe diz que há dois caminhos: o da verdade (alétheia) e o da opinião 
(doxa). Daí que para Parmênides a doxa se limita à impressão sensível e, por isso, comete erros. É apenas 
pelo pensamento (noûs) que se obtém a verdade, e dessa forma o ser coincide com o pensar, ou seja, o 
conteúdo do pensamento, pela via da razão, coincide com o conteúdo da realidade. Daí sua tese do ser 
como uno e imutável, já que conceber de outra forma leva a contradições. Ou seja, o ser não pode ser 
e não ser ao mesmo tempo, pois que seria uma contradição. Dito de outra forma, o que existe fora de 
mim deve coincidir com meu pensamento, com o lógos que desvela a verdade, se não coincidir é porque 
se está na via da doxa. Passagens: “O ser é e o não ser não é”; “O ser é uno e imutável”.
27
FUNDAMENTOS DE FILOSOFIA E EDUCAÇÃO
Apesar da oposição entre as teorias de Heráclito e Parmênides, é possível estabelecer pontos comuns 
entre eles. Ambos entendem que a verdade (alétheia) está no pensamento, e a opinião (doxa) está nos 
sentidos. O argumento de que “os sentidos enganam” era usado, dessa forma, para tentar provar teses 
contrárias como a de Heráclito: “tudo é movimento, a imobilidade é uma ilusão dos sentidos” e a de 
Parmênides: “não há movimento, a mobilidade é uma ilusão dos sentidos”. 
Embora tenham existido variadas explicações para a matéria primordial e que cada um dos 
pré-socráticos argumentasse que a sua teoria era a única verdadeira, a importância desse período 
reside no fato de que o pensamento mítico não mais convence e que esses filósofos se lançam 
na busca por investigar e por elaborar outras respostas para a explicação da realidade. Respostas 
produzidas pelo lógos e, portanto, dotadas de uma certa lógica racional.
Exemplo de aplicação
O que diferencia a explicação dos pré-socráticos das explicações míticas para a origem das 
coisas? Reflita.
 Saiba mais
O aparecimento da lógica: Heráclito e Parmênides. In: CHAUI, M. Convite 
à filosofia. São Paulo: Ática, 1997, p. 181.
O PENSAR FILOSÓFICO
3 SÓCRATES E A REFLEXÃO FILOSÓFICA1
Afinal o que vem a ser filosofia? Será que a filosofia é uma disciplina que “com a qual ou sem a qual o 
mundo continua tal e qual”? Será que é um emaranhado de questões que nunca chega a uma conclusão 
consensual? Será que é um conjunto de conceitos complexos que só interessa a estudiosos do assunto?
A filosofia muitas vezes é taxada de “inútil”, de subversiva, de perturbadora da ordem etc. Mas por 
que será que a “mãe” de todas as ciências costuma ser tão maltratada?
Pode-se começar questionando o que leva o ser humano a filosofar? Platão, no Teeteto (155 d), 
afirmou que a filosofia começa com o thaumátzein, com o admirar-se com o espantar-se, tese reafirmada 
por Aristóteles na sua Metafísica (982 b13). Mas admiração e espanto em relação a quê? Admiração e 
espanto diante de um mundo carregado de interrogações, cujas explicações por vezes não satisfazem 
ou sobre o qual não se possui as respostas. Aí então, diante de interrogações que se configuram como 
problemas, inicialmente sem solução, experimenta-se um misto de assombro e admiração. Assombro 
1 O texto deste item foi extraído do capítulo 4 de Fernandes (2006).
28
Unidade I
diante do próprio espetáculo da natureza, da multiplicidade de coisas existentes, de fatos surpreendentes, 
das diferentes formas de vida, dos astros que brilham e que deslizam na abobada celeste e, também, 
admiração, por suscitar um sentimento de estranhamento por algo que se apresenta como não óbvio, 
não comum, que oculta alguma possível conexão lógica.2
Para Saviani (2000), o que leva o ser humano a filosofar são os problemas com que ele se defronta 
no decorrer da sua vida. “Eis pois, o objeto da filosofia, aquilo de que trata a filosofia, aquilo que 
leva o homem a filosofar: são os problemas que o homem enfrenta no transcurso da sua existência” 
(p. 10). Dessa forma, se podemos dizer que são problemas que levam o homem a filosofar o que 
devemos entender, então, por “problemas”? Segundo Saviani, em geral toma-se problema como 
sendo sinônimo de questão, mas isso não é suficiente para caracterizar um problema. Por um lado, 
as questões lidam com respostas já conhecidas e, por outro lado, mesmo que as respostas sejam 
desconhecidas, esse fato, por si só não é suficiente para caracterizar um problema. As pessoas 
podem desconhecer muitas coisas e mesmo assim isso pode não constituir um problema, como 
por exemplo: quantas vezes uma pulga precisa saltar o comprimento de suas próprias pernas para 
atravessar a muralha da China?3 A questão pode despertar alguma curiosidade, a qual mesmo 
não satisfeita, não se configura como problemática para a filosofia. Segundo Saviani é necessário 
resgatar a “problematicidade do problema”, isto é, resgatar a essência que revela sua verdadeira 
concreticidade. Segundo ele, a essência do problema encontra-se na necessidade. O ser humano, 
ao produzir continuamente sua própria existência, enfrenta o ineludível: problemas, configurados 
como necessidades que não podem ser ignorados, pois a resolução desses problemas é de vital 
importância para a existência humana. Dessa forma, diante dos problemas, o ser humano deve 
refletir em busca de esclarecê-los, elucidá-los. Daí que, para Saviani, a filosofia pode ser definida 
como uma reflexão radical, rigorosa e de conjunto sobre os problemas que a realidade apresenta.
Exemplo de aplicação
Por que segundo Saviani são os problemas que levam o ser humano a filosofar? O que são 
problemas? Reflita.
2 Pode-se ampliar e ao mesmo tempo retroceder esse assombro e admiração como impulso para filosofia, como 
também impulso para o mito (é verdade que se tratam de graus diferentes, já que a admiração e espanto da filosofia podem 
ser movidos por uma explicação mítica e o contrário não ocorre). O homem primitivo, diante de um mundo desconhecido, 
cheio de mistérios como o nascimento, a morte, a sucessão alternada entre dias e noites, as mudanças climáticas etc, tinha 
necessidade de entender esse mundo. Essa necessidade é própria da condição humana já que o ser humano, diante do 
medo, da admiração e do desconforto produzido pelo desconhecido precisa dar-lhesentido. O caos necessita ser ordenado 
pela cosmogonia mítica para o ser humano encontrar o seu lugar. 
3 Essa questão foi inspirada em outra semelhante utilizada por Aristófanes, na comédia As nuvens. Sócrates é 
ridicularizado e retratado como um sofista que vive no “pensatório” e num dado momento encontra-se ocupado 
investigando sobre quantas vezes uma pulga pode saltar o tamanho dos próprios pés.
29
FUNDAMENTOS DE FILOSOFIA E EDUCAÇÃO
 Saiba mais
A atitude filosófica. In: CHAUI, M. Convite à filosofia. São Paulo: Ática, 
1997, p. 11.
3.1 Sócrates: diferentes olhares4
Figura 10 – Sócrates. Museu do Louvre
Disponível em: https://bit.ly/3z8j8QQ. Acesso em: 13 set 2014.
Estudar o pensamento de Sócrates implica enfrentar duas dificuldades iniciais, que se desdobram 
em outras. A primeira dificuldade é que ele não deixou nada escrito de próprio punho ou mesmo 
não ditou nada para alguém escrever. A segunda dificuldade é que os relatos sobre Sócrates contêm 
enfoques diferentes. Da primeira dificuldade apontada decorre a interrogação: por que Sócrates 
nada escreveu? Da segunda dificuldade apontada decorre o questionamento: é possível conciliar 
esses diferentes enfoques e aproximar-se do “verdadeiro” Sócrates? Vamos começar explorando 
essa última interrogação.
Como Sócrates não deixou nada escrito, tudo o que se sabe a seu respeito se deve ao registro feito 
pelos seus discípulos e comentadores. As três fontes diretas, daqueles que conviveram com Sócrates e 
escreveram sobre ele são as de Aristófanes, Xenofonte e de Platão. Vamos ver cada um desses enfoques.
4 O texto do item 3.1 a 3.7 foi extraído dos capítulos 1 e 2 de Fernandes (2009).
30
Unidade I
3.2 Sócrates, segundo Aristófanes
Figura 11 – Aristófanes
Disponível em: https://bit.ly/393OcH1. Acesso em: 13 set 2014.
O comediógrafo Aristófanes (450-385 a.C.), retrata Sócrates na sua comédia As nuvens 
(SÓCRATES,1972), de 423 a.C., época em que Sócrates contava com cerca de 47 anos. Sócrates é 
apresentado como um charlatão, um tipo esquisito que desdenha dos deuses e adora as nuvens. 
A trama ocorre, em linhas gerais, da seguinte forma: Estrepsíades é um fazendeiro idoso arruinado 
por dívidas contraídas para sustentar sua mulher e principalmente seu jovem filho, que é viciado em 
corridas de cavalos. Estrepsíades vai então até o “pensatório”, um casebre onde reside Sócrates e outros 
descalços e pálidos discípulos, em busca de aprender como se livrar dos seus credores. Chegando ao 
pensatório, encontra Sócrates dependurado em um cesto, no alto, adorando as nuvens. Ao invés de 
Zeus, as nuvens são adoradas e consideradas as causadoras verdadeiras das chuvas e dos trovões. Como 
Estrepsíades tem dificuldade em aprender as lições, envia Fidipides, seu filho, para ser aluno de Sócrates. 
Fidipedes, com os ensinamentos aprendidos, consegue ajudar seu pai a desvencilhar-se dos credores. Por 
outro lado, Estrepsíades acaba por se arrepender, pois é surrado pelo próprio filho. Fidipedes bate em seu 
pai e prova, através dos raciocínios aprendidos, que a sua ação é justa. E mais, defende que agora pode 
fazer qualquer coisa e justificar suas ações.
Dessa forma, Sócrates é ridicularizado e representado como um charlatão, um sofista que 
ensina raciocínios capciosos, ensina como o raciocínio injusto pode vencer o raciocínio justo. 
Segundo Hector Beinot, “Aristófanes representa um Sócrates bastante similar àquele dos seus 
acusadores de 399. Conhecer Sócrates somente por Aristófanes seria como avaliá-lo por aqueles que 
o condenaram à morte” (2006, p.29). Para Beinot, apesar da representação feita por Aristófanes, 
que caracteriza Sócrates como um sofista, paradoxalmente depreende-se também da sua representação 
elementos que aproxima Sócrates da tradição que o considerava um sábio, íntegro e não interesseiro.
31
FUNDAMENTOS DE FILOSOFIA E EDUCAÇÃO
Assim, o Sócrates de Aristófanes, apesar de ser uma imagem cômica, 
pintada a partir de um ponto de vista conservador e defensor dos 
valores tradicionais, coincidem em grande parte com o Sócrates de 
outros testemunhos: é pobre, anda sempre descalço, vive em uma 
casa humilde; defende contra as imagens sensíveis as verdadeiras 
realidades que supostamente existem em uma região superior; o seu 
método é o diálogo e a dialética; interroga sempre pelo ser das coisas 
e leva os interlocutores à contradição; o resultado do seu método é a 
negatividade que supera as crenças e os valores dos homens comuns 
(idem, p. 30).
3.3 Sócrates, segundo Xenofonte
Figura 12 – Xenofonte
Disponível em: https://bit.ly/2VHr3Ho. Acesso em: 13 set 2014.
Xenofonte foi contemporâneo de Sócrates e seu discípulo, mas não conviveu com ele durante 
muito tempo. Xenofonte era militar e por vezes permanecia muitos anos afastado de Atenas, 
inclusive, quando ocorreu a condenação e a morte de Sócrates, estava em campanha militar e não 
pôde presenciar. Ele faz referências a Sócrates em várias de suas obras, como no Simpósio e na 
Econômica, mas as obras consideradas mais importantes pelos estudiosos do assunto são os Ditos 
e feitos memoráveis de Sócrates5 e a Apologia de Sócrates.
Na Apologia de Sócrates (SÓCRATES, 1972), Xenofonte aborda um diálogo que teve o amigo de 
Sócrates, chamado Hermógenes, com o próprio Sócrates a respeito da não preocupação de Sócrates em 
preparar uma apologia, uma defesa para o dia do seu julgamento, que se aproximava. Aborda também 
algumas falas de Sócrates durante o seu julgamento. Já nas Memoráveis, Xenofonte aborda várias 
passagens da vida de Sócrates e vários diálogos que teve com seus contemporâneos.
5 Também conhecida e citada apenas como Memoráveis.
32
Unidade I
Os escritos de Xenofonte costumam ser considerados simplistas e pouco profundos sobre os 
problemas abordados por Sócrates. Segundo Beinot:
Não sendo filósofo, Xenofonte não nos retrata com maior precisão o 
desenvolvimento dos argumentos socráticos, pouco nos transmite a respeito 
de problemas teóricos mais complexos, apenas se preocupa em recordar a retidão 
da vida de Sócrates e as regras morais que propunha aos seus seguidores.
Apesar da simplicidade dos escritos de Xenofonte, porém, o seu retrato 
de Sócrates coincide, na maioria dos aspectos, com o de outros autores 
(BEINOT, 2006, p. 31).
Segundo Louis-André Dorion (2006), os escritos de Xenofonte oferecem uma imagem 
“alternativa” ao Sócrates de Platão, uma vez que é “o único retrato completo, proveniente dos 
meios socráticos, que poderíamos contrastar com o de Platão” (2006, p.75). Segundo Dorion, 
o testemunho de Xenofonte não deve ser desacreditado, muito pelo contrário, ele deve ser 
reabilitado das várias críticas que o eclipsaram no século XIX, uma vez que esse testemunho só 
pode colaborar com a questão socrática. 
Na visão de Beinot:
A característica fundamental e mais insistentemente desenvolvida no 
Sócrates de Xenofonte, no entanto, é sem dúvida esse elogio do esforço, do 
exercício e do trabalho. Trata-se de uma negatividade que procura completar 
e muitas vezes até aperfeiçoar a natureza, sobretudo no âmbito das virtudes 
humanas (idem, p. 35).
3.4 Sócrates, segundo Platão
Figura 13 – Platão
Disponível em: https://bit.ly/3ntRwUn. Acesso em: 13 set 2014.
33
FUNDAMENTOS DE FILOSOFIA E EDUCAÇÃO
Aristócles, mais conhecido pelo apelido de Platão, quando contava com vinte anos, em 408 a.C., 
conheceu Sócrates, que tinha cerca de sessenta anos. Até a condenação de Sócrates, em 399 a.C., Platão 
conviveu com seu mestre, portanto, por quase uma década presenciou os vários diálogos que Sócrates 
realizou com seus discípulos e opositores.
É atribuída a Platão a autoria de mais de trinta diálogos e, entre esses, vinte e nove são considerados 
autênticos, ou seja, não há dúvidas que seu autor seja mesmo Platão. Sócrates se faz presente em 
vinte sete desses diálogos e quase sempre aparece como personagem principal, como aquele que 
conduz a discussão.
Os Diálogos de Platão, seguindo uma ordem cronológica, costumam ser classificadosem três 
grupos ou mesmo quatro. Os primeiros são chamados de “Diálogos da juventude” ou “Diálogos 
socráticos”. Segundo Marcondes (2000), são diálogos muito próximos ao pensamento de Sócrates 
e, em geral, aporéticos. Quando Platão retorna da sua viajem a Sicília (388 a.C.) e funda a Academia 
em Atenas (387 a.C.), identifica-se, nos seus escritos, um afastamento em relação ao pensamento 
de Sócrates e uma centralização no desenvolvimento da teoria das ideias. Temos aí os “Diálogos 
da fase intermediária”. Posteriormente, temos os “Diálogos da maturidade” em que Platão faz uma 
revisão e uma reformulação da sua teoria das ideias ou das formas. Cabe dizer que não há um 
consenso sobre a classificação dos diálogos e que entre os estudiosos de Platão há controvérsias 
sobre a ordem cronológica. A classificação abaixo se encontra em Marcondes (1998), que por sua 
vez toma como base as obras de D. Ross (1951) e Bormann (1973):
Diálogos socráticos: Apologia de Sócrates; Íon, ou Sobre a Ilíada; Hipias 
menor: ou Sobre a falsidade; Laquês, ou Sobre a coragem; Carmides, ou 
Sobre a moderação; Críton, ou Sobre o dever; República (politeia), livro I; 
Hípias maior, ou Sobre a beleza, Eutifron, ou Sobre a piedade; Lisis, ou Sobre 
a amizade.
Diálogos da fase intermediária: Protágoras, ou Sobre os sofistas; Górgias, 
ou Sobre a retórica; Menexeno, ou Oração fúnebre; Eutidemo; O banquete 
(Symposium), ou Sobre o bem; Fédon, ou Sobre o amor; Ménon, ou Sobre 
a virtude; A República (Politeia) ou Sobre a justiça; Fedro, ou Sobre a alma.
Diálogos da maturidade: Crátilo, ou Sobre a correção dos nomes; Teeteto, 
ou Sobre o conhecimento; Parmênides, ou Sobre as formas; O sofista, ou 
Sobre o ser; O político, ou Sobre a monarquia; Filebo, ou Sobre o prazer.
Diálogos da fase final: Timeu, ou Sobre a natureza; Crítias, ou Sobre a 
Atlântida; As leis (Nomoi); Epinomis.
Diálogos de autenticidade discutível: Alcebíades, I e II; Hiparco; Anterestai; 
Teages; Clítofon; Mino; O filósofo; Treze cartas, das quais são consideradas 
autênticas as III, a VII (a mais famosa e importante) e a VIII (MARCONDES, 
1998, p. 55).
34
Unidade I
Retomemos a questão colocada inicialmente: é possível conciliar esses diferentes enfoques e nos 
aproximarmos do “verdadeiro” Sócrates? Conforme foi afirmado, Sócrates ocupa um lugar de destaque 
na obra de Platão e segundo alguns estudiosos seria através dos seus escritos que poderíamos nos 
aproximar do “verdadeiro” Sócrates.66 Segundo Benoit,
[...] enquanto Aristófanes era um escritor de comédias e Xenofonte um 
ensaísta que mescla memória, opiniões próprias e ficção, Platão era 
efetivamente um filósofo. Ainda que possa ter desenvolvido (e, portanto, 
transformado) o pensamento de Sócrates em alguns pontos, para conhecer 
a Sócrates como e enquanto filósofo, só nos resta realmente recorrer a 
Platão (BENOIT, 2006, p. 36).
Por outro lado as citações anteriores de Benoit permitem traçar pontos comuns entre os 
diferentes enfoques, o que vem a corroborar para a aproximação com o “verdadeiro” Sócrates.
Outra questão inicial que ficou em aberto é: por que Sócrates nada escreveu? Pode-se afirmar 
que os filósofos gregos, de um modo geral, desconfiavam da escrita, a linguagem escrita era 
vista como um pharmakon - uma droga, isso significa que ela, por um lado, pode salvar do 
esquecimento, mas por outro lado, pode ser mal-interpretada. Segundo Wolff, essa desconfiança 
em relação a escrita encontra seus motivos, entre outros, naqueles apresentados por Platão no 
diálogo Fedro:
O texto escrito sofre de três males congênitos: primeiramente ele é fixo e 
“a quem lhe dirige a palavra, ele se contenta com significar uma coisa única, 
sempre e de uma vez por todas”; em segundo lugar, uma vez publicado, 
o texto vive sua própria existência e se dirige da mesma maneira a todos, 
seja qual for a competência do interlocutor; enfim, entregue a si mesmo, é 
incapaz de se defender sem a presença de seu autor e de responder a seus 
adversários (WOLFF, 1987, p. 37).
Dessa forma, Sócrates nada escreveu e preferia exercitar a filosofia ao vivo nas praças e mercados, 
assim poderia argumentar e contra-argumentar, evitando os males da escrita apontados acima. 
Platão, visando minimizar esses males da escrita, faz seus registros em forma de diálogos, dessa 
forma, procura manter na escrita a dinâmica do diálogo tal como foi pronunciado ao vivo e assim 
consegue explicitar os argumentos e contra-argumentos da discussão.
6 Embora implique também algumas dificuldades, como separar o pensamento de Sócrates do pensamento de 
Platão? Segundo Aristóteles a teoria das eiaideias não foi desenvolvida por Sócrates, mas há estudiosos que defendem que 
a mesma já estava presente em Sócrates. Tal problema não será objeto de investigação deste trabalho.
35
FUNDAMENTOS DE FILOSOFIA E EDUCAÇÃO
3.5 O cidadão ateniense
Figura 14 – Detalhe de Escola de Atenas. Rafael. Sócrates (direita) e Alcibíades
Disponível em: https://bit.ly/3tBmCuh. Acesso em: 13 set 2014.
Sócrates (470-399 a.C.), nasceu em Atenas, no distrito de Alopécia, era filho da parteira Fenareta 
com o escultor Sofronisco. Viveu no século V a.C., no chamado “Século de Ouro”, século do apogeu 
político, cultural, econômico e militar de Atenas. Foi casado com Xantipa e também há relatos que 
teve outra esposa, chamada Mirto, no período em que a poligamia foi permitida e incentivada para 
equilibrar a população. Teve três filhos, provavelmente dois com Xantipa, Lamprocles e Menexeno e 
outro com Mirto, chamado Sofronisco (BENOIT, 2006, p.23). Herdou do pai a profissão de escultor à 
qual parece ter se dedicado por algum tempo, antes de abraçar a missão suscitada pela revelação do 
oráculo de Delfos.
Em março de 399 a.C., quando Sócrates contava com cerca de setenta anos, foi chamado ao tribunal 
de Atenas para se defender das acusações depositadas contra ele. Meletos, um jovem e pouco conhecido 
poeta, levou até o magistrado a seguinte acusação: “Sócrates é culpado de não reconhecer como deuses 
os deuses da Cidade e de nela introduzir novos; também é culpado de corromper a juventude. A pena 
solicitada é a morte” (WOLFF,1987). Mas Meletos não estava sozinho nessa acusação, havia também o 
orador Licon e o político Anito. Segundo explica Wolff:
A lei ateniense reconhecia de fato a todo cidadão o direito de acusar um 
outro sob juramento. Mas no caso o distinto Meletos é apenas um testa 
de ferro; a queixa foi redigida pelo orador Licon, e ambos são teleguiados 
por um mais poderoso, Anito: um dos chefes populistas da restauração da 
democracia, provavelmente não assaz seguro do êxito da queixa para ousar 
nela imiscuir de imediato seu nome (idem, p. 83).
O fato é, como se sabe, que Sócrates foi julgado e condenado à morte, ou para ser mais preciso 
ao suicídio, já que a pena impunha a obrigatoriedade em beber a cicuta. Isso posto, vamos analisar 
36
Unidade I
algumas passagens da defesa feita por Sócrates, perante o tribunal de Atenas. Tal análise visa explicitar 
os motivos que culminaram com a sentença de morte e, também, qual a relação com o modo socrático 
de filosofar. 
3.6 Discurso de defesa
O diálogo Apologia de Sócrates, de Platão, começa com Sócrates dirigindo seu exórdio aos presentes 
no tribunal, logo após a fala dos seus acusadores. Ele discursa:
Não sei, atenienses, que influência exerceram meus acusadores em vosso 
espírito; a mim próprio, quase me fizeram esquecer quem sou, tal a força de 
persuasão de sua eloquência. Verdade, porém a bem dizer, não proferiram 
nenhuma (PLATÃO, 1978, p. 13).
Segundo Sócrates, seus acusadores foram tão eloquentes e pintaram um Sócrates tão diferente 
dele mesmo, que fez ele quase esquecer quem era, porém não proferiram nenhuma verdade. Assim, 
Sócrates se propõe a relatar toda a verdade. Vai se defender de duas classes de acusadores: os antigos 
e os mais recentes. Os acusadores antigos são numerosos, mas, segundo Sócrates, não é possível dizer 
os seus nomes, pois essas acusações foram espalhadasem forma de boato e de modo inconsequente. 
Mas pode-se dizer que essa boataria teve sua origem na comédia As nuvens, de Aristófanes.7 Dela se 
depreende que Sócrates é um charlatão, um investigador das coisas celestes e das coisas que estão 
debaixo da terra, alguém que faz a razão mais fraca vencer a mais forte e ensina os outros a fazerem 
o mesmo. As acusações recentes, conforme foi abordado no item anterior, são aquelas depositadas 
por Meletos e seu grupo, que reza que Sócrates é um corruptor da juventude, alguém que não crê nos 
deuses da cidade, mas sim em outras divindades. Sócrates busca explicar a origem das calunias 
contra ele:
Um de vós poderia intervir: “Afinal Sócrates, qual é a tua ocupação? Donde 
procedem as calúnias a teu respeito? Naturalmente, se não tivesses uma 
ocupação muito fora do comum, não haveria esse falatório, a menos que 
praticasses alguma extravagância. Dize-nos, pois, qual é ela, para que não 
façamos nós um juízo precipitado”... Alguns de vós achareis, talvez, que 
estou gracejando, mas não tenhais dúvidas: eu vós contarei toda a verdade 
(idem, p. 16).
Sócrates irá recorrer a duas testemunhas em seu favor, o deus de Delfos e Querefonte:
Ora, certa vez, indo a Delfos [Querefonte], arriscou essa consulta ao oráculo 
– repito senhores; não vós amotineis – ele perguntou se havia alguém mais 
sábio que eu; respondeu a Pítia que não havia ninguém mais sábio. Para 
testemunhar isso, tendes aí o irmão dele, porque ele já morreu (idem, p. 17).
7 Conforme foi abordado anteriormente. 
37
FUNDAMENTOS DE FILOSOFIA E EDUCAÇÃO
São duas testemunhas respeitadas, Querefonte e o deus de Delfos, Apolo, mas ambas ausentes no 
tribunal. Querefonte era conhecido e respeitado, mas está morto. O deus Apolo, mesmo que presente 
estará invisível e não falará em defesa de Sócrates. Mas qual a importância do Oráculo de Delfos na 
cultura grega? Era mera supertição ou digno de consideração? Pode-se afirmar que o Oráculo de Delfos 
era muito considerado e respeitado. Era comum antes de decisões importantes, como sobre guerras, que 
se recorresse ao Oráculo. Apesar de muitas respostas serem dúbias e enigmáticas a interpretação correta 
das mesmas poderia ser de grande valia.8 E quem era Apolo? Na mitologia grega Apolo é o deus solar, 
deus da luz e da razão, o deus do conhecimento, do equilíbrio e da harmonia.9 Portanto, é um deus 
muito respeitado e venerado. 
Quando ficou sabendo da consulta e da resposta do oráculo, Sócrates diz que ficou perplexo:
Quando soube daquele oráculo, pus-me a refletir assim: “Que quererá dizer 
o deus? Que sentido oculto pôs na resposta? Eu cá não tenho consciência 
de ser nem muito sábio nem pouco; que quererá ele, então, significar 
declarando-me o mais sábio? Naturalmente, não está mentindo, porque isso 
lhe é impossível” (ibidem).
Figura 15 – Ruinas do oráculo de Delfos
Disponível em: https://bit.ly/39aGsCV. Acesso em: 13 set 2014.
8 O rei Creso da Lídia fez um desafio ao oráculo: o que faria cem dias depois da consulta? O oráculo respondeu: “...
fustiga meus sentidos o sabor da tartaruga e do cordeiro cozidos em bronze”. Era isso que o rei pretendia: cozinhar uma 
tartaruga e um cordeiro em uma panela de bronze. Confiante, posteriormente, perguntou: Deveria guerrear com a Pérsia? O 
oráculo respondeu “Se cruzar o rio Hális destruirá um grande império”. O rei foi confiante para a guerra e teve o seu Império 
destruído. Outro exemplo: diante da invasão persa em Atenas o oráculo foi consultado e respondeu: “Apenas a muralha de 
madeira resistirá”. Os gregos interpretaram que a “muralha de madeira” eram as embarcações, assim guerrearam pelo mar 
e conseguiram vencer os persas.
9 De certa forma se opõe ao deus Dioniso ou Baco, que é o deus do vinho, do delírio místico da desmedida, da hybris. 
38
Unidade I
Dessa forma, não é pouca coisa a afirmação de que “Sócrates é o homem mais sábio”, pois foi uma 
afirmação feita pelo próprio deus Apolo. O que leva o próprio Sócrates à perplexidade, uma vez que é 
impossível ao deus mentir. Dessa forma, Sócrates empreende uma investigação para elucidar o sentido 
oculto da resposta do deus. 
Uma vez que não se considera sábio, Sócrates passa a investigar aqueles que se passam por sábios. 
Vai dialogar com um político e conclui que ele se passa por sábio, mas não é. “Parece”, diz Sócrates, 
“que sou um nadinha mais sábio que ele exatamente em não supor que saiba o que não sei” 
(PLATÃO, 1978, p. 17). Vai falar com outro político e sai com a mesma impressão, além de perceber 
que ganhou o ódio dele e de muitos outros circunstantes. “Depois disso, não parei, embora sentisse, 
com mágoa e apreensões, que me ia tornando odiado; não obstante, parecia-me imperioso dar a 
máxima importância ao serviço do deus” (idem, p. 18).
Depois dos políticos, Sócrates passa a investigar os poetas. Conclui que eles dizem muitas 
coisas belas por inspiração, mas nada sabem do que dizem. Depois vai ter com os artesãos e 
entende que esses por praticarem bem a sua arte acham que sabem também dos outros assuntos, 
mas não sabem. Sócrates tem consciência que com essa investigação conseguiu irritar muitas 
pessoas: “Dessa investigação é que procedem, Atenienses, de um lado, tantas inimizades, tão 
acirradas e maléficas, que deram nascimento a tantas calúnias, e, de outro, essa reputação de 
sábio” (idem, p. 19).
Sócrates também explica que a dedicação a “serviço do deus”, ou seja, a “missão socrática” 
desencadeada após a revelação do oráculo lhe consumiu todo o tempo, o que explica sua precária 
condição financeira: “Essa ocupação não me permitiu lazeres para qualquer atividade digna de 
menção nos negócios públicos nem nos particulares; vivo numa pobreza extrema, por estar a 
serviço do deus” (idem, p. 19). Mas além dos desafetos, Sócrates também teve discípulos:
Além disso, os moços que espontaneamente me acompanham [...] 
imitam-me muitas vezes; nessas ocasiões, metem-se a interrogar os 
outros; suponho que descobrem uma multidão de pessoas que supõem 
saber alguma coisa, mas pouco sabem, quiçá nada. Em consequência, os 
que eles examinam se exasperam contra mim e não contra si mesmos, 
e propalam que existe um tal Sócrates, um grande miserável, que 
corrompe a mocidade (idem, p. 19).
Esses jovens discípulos imitam o seu mestre e desmascaram pessoas que fingem saber, mas não 
sabem. Com isso Sócrates recebe a ira também destes, além da acusação de corromper a juventude.
39
FUNDAMENTOS DE FILOSOFIA E EDUCAÇÃO
3.7 Condenação e discussão da pena
Após Sócrates explanar várias outras considerações sobre as acusações que sofre, chegou o 
momento da votação. Sócrates foi condenado10 e passou-se a discutir sobre sua pena. “Ora”, diz 
Sócrates, “o homem propõe a sentença de morte. Bem; e eu que pena vos hei de propor em troca, 
Atenienses?” (Platão, 1978, p. 33). Sócrates defende que não merece nenhuma pena, muito pelo 
contrário, deve ser tratado como um benfeitor da cidade e, dessa forma, merece ser sustentado 
no Pritaneo, como se fazia com os heróis de guerra. Sócrates explana que não pode propor ser 
desterrado, uma vez que se nem os seus concidadãos o suportam, com outros povos seria pior. Como 
outra opção, Sócrates diz que se tivesse muito dinheiro proporia pagar uma multa, mas como não 
tem, só poderia pagar uma mina de prata. Com a interferência de Platão e outros discípulos presentes 
ao julgamento, Sócrates aumenta a proposta da multa para trinta minas de prata, já que estes se 
fizeram proponentes e fiadores dessa quantia.
Com as propostas de Sócrates sobre sua pena ele conseguiu irritar ainda mais muitos dos 
presentes no tribunal, não restando praticamente outra alternativa senão a pena capital. No livro 
O julgamento de Sócrates, de I.F. Stone, ele defende a tese que, na verdade, Sócrates queria morrer. 
Segundo Stone, Sócrates poderia facilmente ter conseguido sua absolvição e o próprio júri, a princípio, 
não estava disposto a condená-lo a morte. Mas, Sócrates fez tudo, segundo Stone, para que a pena

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