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Uma série de objetos voadores não identificados começa a aparecer nos céus da Califórnia. Surge em cena, então, uma deliciosa jornalista em princípio de carreira. E as coisas começam a acontecer... © 1965 – J F KRAKBERB José Alberto Gueiros Título original: SANGRE DE PERIODISTA Digitalização: JVS 400923/400925 Publicado no Brasil pela Editora Monterrey ANTES DE COMEÇAR A filha de Giselle, BRIGITTE MONTFORT, existe, em alguma parte do mundo, atuando sob outros nomes, em circunstâncias análogas às que são narradas agora neste livro. Sua verdadeira identidade, no entanto, deixa de ser esclarecida, por motivos bem plausíveis do Serviço Secreto. Nas últimas páginas das memórias de GISELLE, A ESPIA NUA QUE ABALOU PARIS, fica bem claro que a famosa heroína da Resistência Francesa, pouco antes de morrer fuzilada na prisão de Cherche Midi, na manhã de 15 de março de 1944, confessou à sua companheira de cárcere, Gabrièle Ladème, haver dado à luz uma filha, nas vésperas da Segunda Guerra Mundial. O pai da criança — explicou Giselle — fora um alemão que a abandonara grávida, mas lhe raptara a menina logo ao nascer. A famosa espiã morreu sem conhecer a própria filha, sem sequer saber do seu nome ou do seu paradeiro. Vinte anos depois, esta incógnita é revelada. A filha de Giselle surge nos Estados Unidos, bonita, elegante, corajosa e... Bem, é melhor começar a ler a história. CAPÍTULO PRIMEIRO Uma jornalista espetacular A moça morena aparentava vinte e cinco anos de idade e era verdadeiramente espetacular. Seu corpo, vestido num elegante costume de tweed, mostrava as formas, cientificamente equilibradas, de um modelo parisiense. Tinha os seios altos e agressivos, a cintura fina e arredondada, as ancas largas e suavemente desenhadas sobre as coxas grossas e roliças. E suas perna, longas e bem torneadas, eram um poema de simetria. — Por obséquio — disse ela, numa voz melodiosa e aveludada. — O senhor pode me informar se neste hotel lê- se muito o “Morning News”? O recepcionista do Airport Hotel permanecia de boca e olhos muito abertos, fascinado pela beleza da jovem. Afinal, pestanejou e conseguiu gaguejar: — Perdão, miss. Que foi que a senhorita perguntou? Estavam no hall do famoso estabelecimento de Los Ângeles, que ficava entre o Aeroporto Internacional e a Universidade de Loyola. A garota sorriu e repetiu a pergunta. Ele respondeu com outra interrogação: — Poderia me fornecer sua identidade, miss? — Com todo o prazer. Chamo-me Brigitte Montfort e sou repórter do “Morning News”, de Nova Iorque. Estamos fazendo uma estatística de interesse para o nosso jornal. — Perfeitamente, miss Montfort. A senhorita quer saber?... Sim, claro. Nosso hotel mantém assinaturas do seu jornal. Recebemos diariamente, duzentos exemplares do “Morning News”, que são distribuídos entre nossos hóspedes. É uma oferta da casa, todas as manhãs. — Era o que eu esperava — disse Brigitte, acentuando seu sorriso divino. — Agora, já que o senhor foi tão gentil, poderá me informar também, quem é o hóspede do quarto número 32? O rapaz da recepção endureceu o rosto. — Lamento, miss, mas não damos esse tipo de informação. Se se trata de algo... especial, a senhorita terá que se dirigir ao detetive do hotel. Nossos hóspedes não gostam de ser incomodados. Quer que chame o sargento Kildkind? — Obrigada — retrucou a morena, girando nos calcanhares. — Voltarei dentro de alguns minutos, para falar com o sargento. Havia poucos hóspedes sentados no living, mas todos estavam olhando para a anatomia da jovem. Ela atravessou o hall, batendo castanholas com os saltos dos sapatos, e saiu pela porta giratória. Havia um elevador em frente à porta. O ascensorista sentiu um baque no coração, quando viu aquela beldade encaminhar-se para ele. — Segundo andar — pediu Brigitte, entrando na gaiola de aço. O rapaz fechou a porta. — A senhorita é hóspede? — perguntou, amavelmente. — Claro. Acabei de chegar de Nova Iorque. E esqueci o biquíni no meu quarto. O elevador estremeceu e parou, no terceiro piso. Brigitte saltou e esperou que a porta se fechasse; depois, caminhou por um longo corredor atapetado, até atingir a porta no. 32. Não era um quarto; devia ser uma suíte. Ela respirou fundo e bateu na almofada da porta. Ninguém lhe respondeu. Bateu outra vez. Nada. Então, escolheu uma das chaves do molho e, depois de duas tentativas, conseguiu abrir a porta. Eram oito horas da manhã, mas as luzes da sala estavam acesas. Aparentemente, não havia ninguém na sala. E, então, viu o cadáver. Era um homem gordo, moreno, vestido com um pijama listrado. Seu peito exibia o furo de uma bala de grosso calibre, que lhe atingira o coração. Em seguida, ajoelhou-se e contemplou, pensativamente, aquele rosto contorcido pela agonia. Era um russo, sem dúvida alguma. Ela estava no bom caminho. Olhou para a porta do quarto que estava aberta, e pôs-se de pé, decidida a dar uma busca. Mas, nesse momento, seu sexto sentido a alertou. — Ti-pojiváiech? — disso uma voz gutural, às suas costas. — Não se mexa, diévushka! A repórter voltou-se lentamente. agarrada à máquina fotográfica, mas não teve oportunidade de usá-la. O homem que olhava para ela, à porta do banheiro, tinha uma pistola Markarov na mão erguida. Era alto, musculoso, e estava nu. — Peço perdão — disse Brigitte, formalizada. — Sou uma moça de respeito! Mas o outro não abaixou a arma. Nem cobriu a sua nudez ameaçadora. Pelo contrário. Ao contemplar a figura espetacular da jovem jornalista, sua nudez foi-se tornando cada vez mais ameaçadora. — Kac vac zovút? — perguntou, com voz rouca. — Como entrou aqui e... e fez isso? Seus olhos vermelhos indicaram o cadáver do homem moreno, estirado no tapete. — Permita-me que lhe faça idêntica pergunta — respondeu Brigitte, jogando a câmara fotográfica sobre uma cadeira. — Quem é você? Para ficarmos em igualdade de condições, suponho que eu também deva tirar a roupa... E, depois de despir rapidamente o casaquinho de tweed, começou a desabotoar a blusa de seda. A pistola tremeu, na mão do homem alto, mas ele não apertou o gatilho. Num instante, os belos seios de Brigitte despontaram, aprisionados pelo negro soutien. — Niet — disse ele, apavorado. — Pare com isso! Não quero escândalos! Se você insistir, eu... eu atirarei! Juro que atirarei! Mas sua atitude demonstrava que não estava cm condições de atirar em ninguém e sim de se atirar em cima de sua maravilhosa visitante. * * * Quem é Brigitte Montfort? Uma pergunta que devemos responder aludindo à uma certa jovem. É importante observar como surgiu ela, bonita, provocante, numa aura de olhares exclamativos, confundindo um porteiro de hotel de luxo em Los Ângeles e pedindo uma informação intrigante. Ela é a Filha de Giselle Montfort. Como viera parar ali? Em que circunstâncias? Por quê? Pequeno esforço de memória e retornemos ao capitulo final de “Giselle, a Espiã Nua Que Abalou Paris” A cena é o fundo de um cárcere imundo, na prisão de Cherche Midi. Naquele ano terrível de 1944, Paris ocupada pelas tropas nazistas, Giselle, a duas horas do fuzilamento, fala a Gabrièle Ladême, companheira de cela que sobreviveu para narrar o episódio final. A espiã, torturada pela proximidade da morte, implora: “Receba uma confissão, querida amiga! Não há padres que me possam visitar, neste momento. Eu preciso dizer... é necessário que alguém saiba... Eu tenho uma filha! Sim, uma filha! De um namorado alemão que amei antes de conhecer meu marido. Fui abandonada por esse namorado da juventude de Hitler. Que me deixou grávida. Vivi nove meses de sacrifícios e, depois, quando a menina nasceu, foi raptada. O nazista mandou tirá-la de mim! Nunca mais soube dela. Não sei como se parece. Nem o seu nome. Mas sei queestá viva, em algum lugar deste mundo. É preciso que eu lhe confesse isso, antes de morrer. Ah! Um poema de Rilke! — Quem, se agora eu gritasse, me ouviria, na escala dos anjos?” A confissão da condenada revela, claramente, que a menina, raptada ao nascer, jamais tivera ocasião de encontrar-se com a mie. Mas o Serviço Secreto francês descobriu, muitos anos depois o paradeiro desta personagem quase lendária. A filha de Giselle recebeu o nome de Brigitte no batismo de pai alemão, que mais tarde se soube tratar-se do estrategista Fritz Bierrenbach. Foi trazida para os Estados Unidos no início da conflagração mundial; entregue a parentes ricos de Bierrenbach, radicados em Nova Iorque, educada na Universidade de Colúmbia e naturalizada americana ao assumir a maioridade. Brigitte fez um brilhante curso de jornalismo e só depois de formada veio a saber, pelos seus pais de criação, que era filha ilegítima de um nazista de Hitler e de uma francesa da Resistência, ambos mortos, cada qual lutando pelo que achava certo. Brigitte não se deixou abater por tão violenta revelação, mas jurou a si mesma que dedicaria toda a sua vida ao combate a qualquer espécie de extremismo. E não deixava de sentir uma ponta de orgulho pelas façanhas de sua mãe, Giselle, cujas memórias leu e releu dezenas de vezes, antes de lançar-se ao jornalismo militante. Hoje, Brigitte Montfort é uma repórter de sucesso do “Morning News”, diário de enorme tiragem de Nova Iorque. Brigitte herdou de Giselle o feitiço da fêmea total. Sua simples presença, é acontecimento, é notícia, pelo menos para os que a encontraram na área de suas andanças. É uma catalizadora de olhares febricitantes. Qualquer observador, por mais tímido, deixa-se atrair pelo seu charme infinito. O início da carreira de repórter de Brigitte deve ser recordado aqui, numa espécie de revelação de seu temperamento. Durante o seu curso brilhante de jornalismo, ela estagiara no “Morning News” e sua presença tinha revolucionado a redação do grande diário. Depois, ao concluir o curso com distinção, o gordo e rabugento Mike Grogan, diretor do jornal, não pudera deixar de atender à solicitação de insinuante “foca”. Brigitte obtivera um lugar de repórter de polícia, para começar a carreira. Um mês depois, suas reportagens tinham-na elevado no conceito de todos os demais redatores do jornal e conquistado a admiração secreta do próprio Miky. Brigitte ganhara uma coluna pessoal, na terceira página, onde passara a comentar, no seu estilo personalíssimo, os grandes acontecimentos políticos do país. Dois meses se passaram, e a jovem colunista transformou-se numa grande atração do “Morning News”. E numa enorme dor de cabeça para o seu gordo diretor. Miky Grogan estava na iminência de apelidar a jovem de “Terremoto” (Devido à tensão que provocava entre os seus colegas) quando o ambiente da redação esfriou um pouco. Brigitte tinha conhecido Frank Minello e a amizade dos dois acalmou as coceiras eróticas dos outros redatores. Frank Minello era o titular da página de esportes. Um rapaz alto e forte, moreno, de cabelos ondulados e sorriso sensual. Seu tipo de ítalo-americano, atlético e bonito, fazia dele a eterna caça das garotas de bom-gosto. Na primeira noite em que os dois saíram juntos, Frank bebeu um pouco além da conta e acabou caindo de quatro, aos pés da maravilhosa estátua grega; declarando-lhe o seu amor ardente. Já estavam no apartamento do rapaz, em Riverside, e Brigitte não quis decepcionar o seu admirador. Além disso, também gostava daquele tipo de cafajeste. Estendeu- lhe a mão, para que ele se pusesse de pé, e pediu-lhe que fosse mais prático e a ajudasse a tirar a roupa. Estava, realmente muito calor, pois o apartamento não possuía ar condicionado. A cama era macia e confortável. Brigitte também era. Quanto ao Frank revelou-se um infatigável cultor das virtudes de Adão. Depois desse primeiro contato, ele e ela, como bons colegas de jornal ficaram amigos firmes. Frank Minello nunca mais pôde se esquecer dos prazeres que sua amiguinha lhe proporcionara. Tornaram-se amigos firmes, mas não amantes. Brigitte nunca mais voltou ao apartamento de Riverside. Esse era o seu método de trabalho. A constância no amor, ela pensava, levava à saturação. E a bela morena não queria se cansar daquele excelente exemplar de troglodita... Por isso, continuou a tratá-lo com o mesmo carinho, a mesma ternura, mas nunca mais o deixou ir além das conveniências. Ela gostava de ter os homens, como cachorrinhos, lambendo seus sapatos. E Frank também passou a ser um cachorrinho. Com Miky Grogan a coisa era outra. Apesar de também estar “vidrado” pelas belas pernas de sua colunista, o gordo diretor do “Morning News” jamais foi além dos elogios banais e dos olhares concupiscentes. E Brigitte também não lhe dera mais do que isso: o direito de lhe ver as pernas e limpar a baba do queixo. Certa noite, Miky a convidou para jantar num night-club e se excedeu nas bebidas alcoólicas, recitando também uma ode à beleza pagã das filhas da Terceira República Francesa. Mas Brigitte recebeu a insinuação com um sorriso gentil, tirou-lhe a mão gorda de cima das coxas e respondeu: — Obrigado, papai. Foi o bastante para que o furibundo chefe da família mudasse de conversa. Mas continuaram bons amigos. E Miky prosseguiu afagando a doce esperança de experimentar, algum dia, as sensações proibidas daquele corpo espetacular. Eram 10 horas da manhã de domingo, 26 de janeiro. Pleno inverno. Nova Iorque amortalhada por uma nevasca. No seu novo e luxuoso apartamento da Quinta Avenida, Brigitte Montfort ouvia alguns discos de “yê-yê-yê”, enquanto bebericava uma taça de Perignon 55. Desde mocinha, sempre tivera predileção por esse tipo de champanha. Nisso, o telefone tocou. A garota saltou do sofá e atravessou a sala, para atender o chamado. Completamente nua, no ambiente morno, parecia uma gata branca espreguiçando-se ao sol. Apanhou o fone cor-de-rosa e respondeu, com voz doce, certa de que era Frank Minello, tentando um novo “programa”. Mas era Miky Grogan e não parecia disposto a recitar poemas de Omar Khayyam. — Alô? Miss Montfort? Venha imediatamente à redação! Sua grande chance chegou! Brigitte sorriu para o receptor. — Desculpe, chefe. Hoje é domingo... e eu estou nua. — Está o quê? — Inteiramente nua, bebendo champanha, numa dolorosa solidão. Neste momento, olho para o grande espelho da sala e me vejo tal como nasci. Aliás, preciso esfregar um pouco de “Moon Drops” no meu corpo... — Vista-se e venha! — rugiu o gordo. — Tenho um serviço especial para você! Dou-lhe apenas vinte minutos... ou você estará despedida! E cortou a comunicação. Brigitte deixou de sorrir. O caso parecia grave. Vestiu-se em cinco minutos e desceu, à procura de um táxi. Vinte e cinco minutos depois, estava entrando no gabinete do diretor executivo do ‘Morning News”. Como era domingo, a redação estava praticamente vazia. — Qual é o problema, chefe? Miky encontrava-se sozinho, enterrado na larga cadeira da secretária, com um lápis vermelho na mão e vários recortes de jornais debaixo do nariz. — Sente-se, Brigitte. Você vai para Los Ângeles, com tudo pago. Nosso correspondente na Califórnia acabou de me telefonar. Resolvi tornar você uma figura nacional. A linda jornalista sentou-se numa poltrona baixa e puxou as saias, pondo à mostra as longas pernas nuas. Miky esbugalhou os olhos, mas não disse nada; foi ela quem voltou a falar: — Quem morreu, em Los Ângeles? — Ninguém morreu ainda. É aquele caso dos discos- voadores. — Ah! Os discos-voadores... Brigitte já fizera alguns comentários, na sua coluna, sobre a recente aparição de novos UFOS na Califórnia. Mas não esperava que a história valesse uma viagem ao local. Muita gente tinha visto objetos voadores,em muitas partes do mundo, e a coisa já se tornara uma rotina. — Apareceu mais um UFO — continuou Miky Grogan, batendo com o lápis nos recortes de jornais. — o quinto, este mês. Há alguma coisa esquisita com esses pires, charutos e caçarolas! Desta vez foi um ovo! — Ovo? — fez Brigitte, polidamente. — Adoro ovos estrelados com bacon! — Um ovo cozido — rosnou o gordo. — Um objeto desconhecido, que desceu na estrada que vai de Barstow para o Arizona, em pleno deserto. Uma senhora viu os tripulantes saltarem e escapou de morrer queimada pelas suas armas atômicas. A mulher chama-se Grace Meadows e mora no local. Pensei em mandar o Raymond fazer a cobertura, mas ele está ocupado com aquele caso dos Vanderbilt. Então, resolvi lhe dar esta grande chance, Brigitte. Você não tem uma teoria sobre os discos- voadores? — Sim — murmurou Brigitte, interessada. — E, se desceu outro UFO ao leste da Califórnia, minha teoria deve estar certa. Agradeço-lhe a chance, chefe. Claro que vou para lá. Poderemos aumentar a tiragem do jornal, se desmascararmos os criadores desses aparelhos do diabo. — Você acha que eles são feitos na Terra? — perguntou o gordo, estreitando os olhos. — Suponho que sim. Pela menos, essa série que vem aparecendo na Califórnia. O senhor tem razão, chefe. Essa é a minha grande chance! A história começara justamente vinte dias antes, na madrugada de 5 de janeiro. Por volta da meia-noite desse domingo, alguns pescadores da costa oeste da Califórnia tinham visto um estranho objeto voador descer do céu e pousar no alto de uma rocha alcantilada, O UFO tinha o aspecto de um pires invertido e estava envolto em fumaça. Ficou cinco minutos em cima da rocha e, em seguida, levantou vôo na vertical, desaparecendo nas nuvens. Era ligeiro como um foguete. Cinco dias depois, outro UFO fora avistado nas proximidades de Fresno, ao norte de Los Angeles. Esse tinha a forma de um prato e descera na fimbria do deserto, diante de um casal de lavradores boquiabertos. Dois estranhos seres saíram da máquina voadora, observando ss cercanias, esguicharam um jato de fogo para o alto e voltaram, correndo, ao UFO, ao serem interpelados pelo casal; imediatamente, o prato se elevou nos ares e desapareceu, envolto em fumaça e fazendo um barulho assustador. O casal de lavradores declarara que os tripulantes do UFO mediam apenas um metro de altura, eram verdes e tinham antenas na cabeça. A Força Aérea começara a investigar o caso, mas não chegara a nenhuma conclusão, pois os estranhos seres não tinham deixado vestígios de sua passagem pela Terra. No dia 15 de janeiro, houve outra aparição. Dessa vez o UFO tinha a forma de um charuto e descera nos Montes Whitney, próximo da fronteira do Estado de Nevada. Apenas um automobilista que passava pelo local vira o aparelho descer e subir de novo, comunicando o fato às autoridades de Bishop. Ainda dessa vez não foram encontrados sinais do UFO. Finalmente, menos de uma semana depois, um novo objeto desconhecido em forma de caçarola descera misteriosamente a oeste da cidade de Las Vegas, já em território de Nevada, próximo de um bairro residencial. Diversas testemunhas tinham visto a caçarola-voadora pousar no deserto e seus estranhos tripulantes saltaram, para apanhar amostras de areia. Eram três anões, verdes, com tentáculos, as cabeças protegidas por capacetes transparentes. Um dos monstrengos empunhava uma espécie de canudo de alumínio, do qual saíam raios azulados. Ao chegar um carro da polícia ao local, os homúnculos entraram rapidamente na caçarola e escaparam do local, subindo vertiginosamente até as nuvens. Esse havia sido a última aparição de um disco-voador naquelas paragens. E, agora, Mike Grogan falava numa nova aparição, na estrada de Bartow, que também não ficava longe do Deserto de Mojave. Era preciso não esquecer que outros UFOS já haviam sido vistos naquele local, nos anos de 1946 e 52. Mas, isso, pertencia à história. Brigitte acompanhara com interesse o caso dos novos discos voadores e até fizera alguns comentários a respeito, em sua coluna. Mas outros acontecimentos políticos locais tinham atraído a sua atenção, fazendo-a esquecer-se daquele assunto apaixonante. — Quer que lhe forneça o material de que dispomos sobre as aparições anteriores? — perguntou o gordo diretor do “Morning News”. — Não há fotografias ainda. Apenas as declarações das pessoas que viram os discos. — Não se incomode — disse a linda repórter. — Tenho tudo na memória e sei que os depoimentos conferem, a respeito dos anões. Eles andam nus, se não me engana. — Sim, andam nus. Mas são verdes. E pequenos. — Isso é que é uma pena. Porém tudo confere. Os discos mudam de feitio, mas os tripulantes são sempre os mesmos. — Exato — acrescentou Miky, fazendo uma, careta. — Desta vez a senhorita Grace Meadows também viu os tripulantes e eles eram verdes e de baixa estatura. O lança- chamas atômico também deve ser o mesmo. Hoje de madrugada, os homúnculos falaram com a mulher, ameaçando-a com seus raios cáusticos. Pelo menos, foi o que me disse o nosso correspondente na Califórnia, que ouviu a palavra abalizada do inspetor Pitzer? — Quem é o inspetor Pitzer? — Um famoso agente do FBI, encarregado das investigações desde o caso de Las Vegas. O inspetor Pitzer embarcará, logo mais, para Los Angeles e, se você for esperta, poderá entrevistá-lo pelo caminho. Arranjei uma passagem extra no mesmo aviso da carteira. — Se o inspetor Pitzer está em Nova Iorque — obtemperou Brigitte — como é que o nosso correspondente o ouviu, na Califórnia? — Pelo telefone, pouco antes de falar comigo. Pitzer já sabia de tudo. Mas é um homem fechado como uma ostra. Talvez você consiga abri-lo, a bordo, se for bastante esperta. — A que horas sai o avião? — perguntou a linda repórter, olhando seu elegante relógio de pulso. — Dentro de duas horas. Além de esperta, você precisa ser ligeira. Uma entrevista exclusiva com o famoso intocável Alan Pitzer vale bem o sacrifício! Ele é uma autoridade em discos-voadores, você sabe. — Okay — disse Brigitte, levantando-se e ajeitando as saias. — Irei entrevistar a senhorita Meadows, na estrada de Barstow. E tenho o palpite de que essa será uma das maiores reportagens da minha vida! — Também acho — concluiu o gordo, piscando-lhe um olho. — a sua grande chance, menina! E talvez seja a única missão realmente sensacional que você terá, como repórter do “Morning”! Ele se enganava. Mas, então, a carreira daquela que seria a mais famosa espiã da CIA, Brigitte Montfort, estava apenas no começo. E Miky Grogan não era bom profeta. CAPÍTULO SEGUNDO O inspetor Pitzer cai no laço O jato Boeing da TWA estava pronto para decolar, quando Brigitte chegou ao aeroporto, atrapalhada com a máquina fotográfica e uma mala de mão. Um dos passageiros ajudou-a a subir a bordo, encarregando-se da malinha. — Obrigada — disse a morena, com um sorriso gracioso. — O senhor é muito gentil, senhor comissário. — Não sou o comissário de bordo; sou um passageiro. Por coincidência, o assento de Brigitte ficava ao lado do gentil cavalheiro. Sentaram-se e amarraram o cinto. No minuto seguinte, o aparelho decolou, tomando o rumo da costa oeste dos Estados Unidos. — Chamo-me Brigitte Montfort — disse a garota, depois que estavam no ar. — Não diga a ninguém, mas sou repórter do “Morning News”. Vou a Los Ângeles fazer a cobertura de um caso especial e não quero que o FBI suspeite disso. Esta é a minha grande chance. — Desde quando é crime os jornalistas exercerem a sua profissão? Não acredito que o FBI lhe crie complicações, miss Montfort. — É o que o senhor pensa — retrucou a beldade, pestanejando. — Meu chefe, Miky Grogan, disse que o inspetor Alan Pitzer é um carrasco, um “Durão”, e detesta as mulheres! Sei queele também viaja neste avião e preciso evitá-lo. — Talvez a senhorita se engane — rosnou. — Ou talvez seu chefe quisesse indispô-la com as autoridades. Na verdade, eu sou Charles Alan Pitzer, miss Montfort, e não tenho prevenção alguma contra as repórteres bonitas. E, já que seu chefe lhe falou tão mal de mim, faço questão de contradize-lo, facilitando seu trabalho profissional! Contudo, a entrevista com o famoso intocável não foi muito brilhante, nem deu muitos frutos. Depois da sua euforia inicial, o inspetor tornou-se desconfiado e reticente. Além disso, ainda tinha poucas informações sobre a aparição do ovo-voador na estrada de Barstow. — Era um ovo, realmente? — perguntou Brigitte. — Sim, era um ovo. Uma esfera de alumínio. Mas você saberá de tudo quando chegarmos a Los Ângeles. — Não pretendo contar tudo aos meus leitores — retorquiu a morena, mordendo a ponta do lápis. — Eu gosto sempre de trabalhar de acordo com as autoridades, para evitar aborrecimentos futuros. Antes de publicar a reportagem, inspetor, gostaria que o senhor a lesse e a liberasse, rubricando todas as páginas. O homem do FBI fez uma careta. — Eu? Mas... não temos censura, nos Estados Unidos! Você é bastante sensata para saber o que deve e não deve publicar. — Não! inspetor. Insisto em que o senhor deve ler a minha reportagem, antes de mandá-la para Nova Iorque! Confio mais no senhor do que em mim! — Não creio que seja necessário. Pode publicar o que quiser, desde que não alarme o público, com boatos e essas coisas. Se disser apenas a verdade, não haverá complicações. — Obrigada, inspetor. Nesse caso, já que o senhor me autorizou a publicar tudo, evitar-lhe-ei o incômodo de ler os meus artigos. O senhor os lerá, depois, no “Morning News”. Esta entrevista, que o senhor está me dando, não poderá prejudicar o FBI. Os discos-voadores já são domínio público. — Perdão, miss Montfort. Eu não estou lhe dando nenhuma entrevista! Não posso dizer nada sobre os discos- voadores. — Isso já é dizer alguma coisa. O FBI não pode falar. — Bem... Não sei, ainda, do que se trata. Tudo é especulação. Eu... Brigitte fez um gesto com o lápis no ar, sugerindo uma manchete. — “Tudo é especulação”, diz o inspetor Pitzer, agente secreto do FBI! Não pode dizer nada sobre os discos, pois não sabe nem do que se trata! O inspetor empalideceu. — Você não vai publicar isso! — Só se o senhor me proibir. — Pois está proibida! Você deturpa as minhas palavras! — O inspetor Pitzer proíbe a nossa repórter de dizer que ele não sabe de nada! — Chega! Você é muito atrevida! — Obrigada, inspetor. Já é o bastante, para começar. Os dois ficaram um minuto em silêncio, enquanto o jato sobrevoava Pittsburg. Depois, o inspetor olhou de esguelha para a garota. — Você é francesa? — Filha de francesa com alemão. Minha mãe morreu fuzilada pelos nazistas, lutando pela Resistência. Eu também sou um bocado resistente. — Estou vendo — rosnou o homem do serviço secreto. — Você é uma criatura pérfida e cruel! E sabe usar a língua! — O senhor ainda não viu nada. — Você tem graves defeitos morais, menina. Eu não queria ser seu inimigo! Aposto que se julga muito espertinha, hem? — Não aposte porque perderá. Eu não sou apenas espertinha, como sou teimosa! O senhor, por exemplo, está às aranhas, no caso dos discos-voadores. Não sabe se eles são de Marte ou de Moscou. Mas tem uma teoria. Eu tenho outra. — Qual é a sua teoria? — perguntou o detetive, com voz sumida. — Depois lhe direi. A sua é esta: os discos-voadores são comandados por seres inteligentes e obedecem a um plano preestabelecido. O inspetor Pitzer ficou de boca aberta. Falou: — Certo. Mas, isso, não era difícil de prever. O problema é por que eles descem ao longo da Califórnia? E por que mudam de feitio? — Mas a tripulação é sempre a mesma. — É verdade. Parece que a tripulação é sempre a mesma. Depois, falaram de outros assuntos e afastaram definitivamente a animosidade que pudesse ainda haver entre eles. Quando o avião baixou no aeroporto internacional de Los Ângeles, o inspetor continuava com a mala de Brigitte na mão. Desceram juntos a escada, seguidos por três agentes federais mal-encarados. — Você vai para algum hotel? — perguntou o detetive, tomando o braço da garota. — Terei prazer em levá-la até lá. — Para se ver livre de mim? — Talvez. — Obrigada. Vou alugar um helicóptero que me leve à estrada de Barstow. Meu dinheiro não é muito, mas tem que dar. Não tenho helicópteros do governo à minha disposição. Sou pobre e moro longe. — Okay — disse o inspetor, irritado. — Venha comigo! Você é minha convidada! Havia um Lockhead de seis lugares, da USAF, à disposição do FBI. O inspetor Pitzer confabulou com um de seus auxiliares e acomodou Brigitte na carlinga, ao seu lado. — É a primeira vez que vôo num helicóptero tão estável — disse ela. — Não balança nem nada! Sempre tive uma péssima opinião sobre este tipo de geringonça. O senhor é casado, inspetor Pitzer? — Como? Sim. Sou casado e tenho dois filhos. E minha mulher me adora. — Suponho que o senhor ainda não esteja farto dela. — Não. De maneira alguma. Vivemos muito felizes, — Parabéns. Isso muito me tranqüiliza. O senhor é tão insinuante que receei pela minha integridade física! Mas o senhor não é um lobo. — Oh, não, miss Montfort! — E o detetive sorriu, com orgulho. — Pode ficar descansada. Reconheço que você é muito bonita, mas não tem o que temer em minha companhia. Eu sou duro como urna pedra, quando se trata do cumprimento do meu dever! — Duro como uma pedra — suspirou Brigitte, pestanejando. — Que horror! O inspetor riu, mas não mudou de atitude. E a jovem repórter compreendeu que ele, realmente, era uma pedra. Pouco depois, chegaram a uma casa isolada, no meio do deserto, à beira da rodovia pavimentada que ia dar em Kingman, no Arizona. O helicóptero desceu no alto de uma duna de areia e soltou os seus ocupantes. — Aqui nos separamos — disse o inspetor Pitzer, apertando a mão de Brigitte. — A volta será às nove horas. Você terá duas horas para tirar retratos. — Não vai me apresentar à senhorita Grace Meadows? — inquiriu a repórter com ar ingênuo. — Era só o que faltava! Faça a sua estrada, menina! Separaram-se com outro aperto de mão amistoso e, enquanto o agente do FBI e seus três comandados se dirigiam para a casa isolada, a linda repórter ficou parada, ao lado do helicóptero, olhando ao redor. — Posso ajudá-la em alguma coisa? — perguntou o piloto do helicóptero, aproximando-se. Era um rapaz esbelto, simpático, fardado de tenente- aviador. — Sim, poderia — respondeu a morena, batendo as pestanas. — Mas receio que isso seja contra as ordens do inspetor Pitzer... — Sou um oficial da Força Aérea — retrucou o rapaz. — E estou de folga até as nove horas. O inspetor Pitzer é nosso hóspede. — Nesse caso, talvez o senhor possa me fazer uma gentileza. Sou repórter do “Morning News”, como já deve saber, e tenho a incumbência de fotografar, do alto, o local onde desceu o disco-voador em forma de ovo. Confesso que não sei onde foi que ele desceu, nem tenho meios para... — O disco desceu ali adiante — informou o tenente, apontando para leste. — E é a segunda viagem que faço ao local. Mas é claro que não posso levá-la no helicóptero, sem ordem superior. — De qualquer maneira, obrigada — Brigitte suspirou. — Está muito calor, aqui. Vou caminhar, a pé, pela estrada, e talvez algum automobilista me dê uma carona. Eles gostam de ser gentis para com as moças de biquíni... E, num minuto, despiu o costume de tweed, exibindo os seus encantos físicos num maiô de duas peças. O piloto entortou os olhos. — Virgem Santa! Nisso, surgiu um carro, na estrada, aproximando-se a alta velocidade. Brigitte correu para a beira da rodovia, esticandoo polegar. Mas o jovem tenente foi mais ligeiro. — Venha — rosnou ele, agarrando-a pela cintura. — Eu a levo ao local. Não queremos escândalos, na Califórnia! O rapaz chamava-se Thompson e era natural de San Diego. Nervosamente, falou de sua família, de seus projetos para o futuro e da emoção que sentia ao entrevistar, pela primeira vez, uma repórter fotográfica em trajes menores. Minutos depois, estavam sobrevoando o local onde descera o ovo-voador. — Está tudo visto disse ela, voltando a sentar-se. — O ovo desceu num lugar plano, próximo da casa, mas não tão próximo que pudesse levar um tiro de espingarda. A senhorita Meadows é que caminhou até o UFO, para poder ver os homens verdes. E ela não devia levar nenhuma arma na mão. — Exato — gemeu o piloto, de olhos vidrados. — Posso, ao menos, beijar-lhe o rosto? Você é tão... tão cheirosinha! — Não — disse Brigitte, empurrando-o. — Desde quando os disciplinados rapazes da Força Aérea assaltam moças indefesas em helicópteros oficiais? Isso pode levar a um Conselho de Guerra, você sabe! Voltemos ao ponto de partida, Thompson. O piloto manobrou o aparelho e sobrevoou a casa isolada. — Devagar — disse Brigitte, alegremente. — Vou dizer “alô” ao inspetor Pitzer! Ele gostará de me ver aqui em cima! Havia um grupo de pessoas à porta da casa, olhando para o alto. Brigitte debruçou-se na carlinga e acenou entusiasticamente. A expressão do rosto do inspetor Pitzer, voltado para cima, era de completa perplexidade. — Isto me vai dar dores de cabeça — gemeu o tenente Thompson. — Desconfio que fiz besteira! — Não chore — retrucou a garota, enquanto se vestia com dificuldade. — Como você foi bonzinho, vai ganhar um beijo da titia. E acabou de gelar-lhe o sangue nas veias, beijando-o na boca. O helicóptero cambaleou e desceu no deserto, meio de banda, levantando um mundo de poeira. Brigitte agradeceu e saltou. Já estava escuro quando a linda jornalista alcançou a casa. O grupo de policiais levando a senhorita Meadows tinha partido para o local onde descera o UFO. Brigitte apenas encontrou um rapazinho tomando conta da casa. — Alô! — fez a moça, sorrindo amavelmente. — Mamãe está lá dentro? — Quem é você? — retrucou o moleque, com cara de cachorro danado. — Sou representante dos perfumes Avon — disse Brigitte, com voz melodiosa. — Avon chega... Vinha trazer uma amostra grátis de nosso novo produto, o disco-voador perfumado eletronicamente. O rapazinho coçou o nariz. — Que é isso? Vê lá se vai me morder! Brigitte tirou uma moeda da bolsa e exibiu-a, na palma da mão. — Parece uma pratinha de cinqüenta centavos, mas tem a propriedade de perfumar as gavetas. Veja que beleza! Estamos oferecendo este disco-voador a todos os clientes que viram algum UFO verdadeiro. Infelizmente, apenas sua mãe é que viu. Quero falar com ela. — Quem disse? — rosnou o moleque, arregalando os olhos para a moeda. — Ela não é minha mãe, é minha patroa. E eu também vi o ovo! — Como posso ter certeza disso? Se você tivesse visto o ovo, a polícia não o deixaria aqui. Eles o interrogaram? — Não — respondeu o rapazinho, agarrando a moeda. — Eles não perguntaram nada. Miss Meadows estava dormindo, quando a coisa chegou. Eu a chamei no quarto e lhe mostrei o grande ovo de prata, parado no meio do deserto. — Que horas eram? — Pouco depois da meia-noite. Eu não tinha sono e acendi a luz da varanda. Aí, ouvi o ronco e vi aquele negócio descer do céu. Devia medir mais de cinco metros e tinha muita fumaça. — Você também viu os anões? — Claro que vi. Miss Meadows correu para lá e eu fui atrás. Aí, abriu-se uma portinhola, por cima da fumaça, e saíram três garotos, vestidos de verde, com uma mangueira de regar jardins. — Eram garotos, mesmo? — Se não eram, pareciam. Nenhum homem tem aquela altura. E nenhum homem ia brincar com roupas verdes e capacetes de plástico. Eles falavam de um jeito esquisito. Brigitte tomava notas apressadas. — Você ouviu eles falarem? — Ouvi, mas não entendi “bulhufas”. Miss Meadows disse que eram risos. Deviam ser moleques comunistas. — E a mangueira de regar os jardins? Você viu sair água da mangueira? — Não — disse o garoto, com expressão séria. — Saía fogo! E por pouco eles queimavam miss Meadows. Ela é muito “corajuda”, a senhora não acha? — Você também é, Jack. — Meu nome é Butch. Sim, eu também fui “corajudo”! Vi tudo e eles não me viram. Miss Meadows não quer que saibam que eu também vi. — E como foi que o ovo desapareceu, Butch? — Do mesmo jeito. Os moleques queimaram a relva com o fogo da mangueira entraram no ovo e... zum! sumiram no alto! Foi ai que miss Meadows desmaiou. — Desmaiou? — Caiu durinha para trás! Mas não diga nada aos jornalistas. Ela também não quer que saibam que eu lhe joguei um balde de água na cara. — Foi só isso que os garotos fizeram? Conversaram com miss Meadows e queimaram a grama? — Foi. Eles não viram o outro homem, porque ele já tinha ido embora. E o outro homem também não chegou a ver nada. Brigitte sentiu um baque no coração. Era bom demais para ser verdade. — Então, havia outro homem? — Sim, senhora. Miss Meadows não sabe. Ninguém sabe. Mas eu sei. Ontem à noitinha chegou um Cadillac preto, pela rodovia, e parou perto de casa. Miss Meadows estava jantando. Eu vi um homem alto e moreno saltar e olhar ao redor, para o deserto. Havia outro homem dirigindo o carro. Uma hora depois, eles voltaram, mas miss Meadows não reparou o Cadillac. Eu reparei, porque já o tinha visto. O homem moreno continuava olhando para o deserto. — É verdade — murmurou Brigitte. — Então, esses homens do Cadillac não estavam aqui, quando o UFO desceu? — Penso que não. Acho que eles estavam procurando alguma coisa pelo deserto. Talvez fosse o jornal. — E voltaram de manhãzinha? — Voltaram e não voltaram — disse o moleque. — já então, aí estava cheio de gente. Por isso, o Cadillac passou direto e não parou. Mas o homem moreno estava lá dentro, com a cara no vidro da portinhola. Ele me olhou de maneira esquisita. — Espere um pouco, Butch! Que jornal é esse? Você disse que os homens estavam procurando um jornal? — Não. Eu disse que talvez fosse o jornal. — Que jornal? — Não vi. Mas, quando saltou do Cadillac da primeira vez, o homem moreno tinha um jornal na mão. Ai, deu o vento e o jornal escapou da mão dele. — E o jornal? — Sei lá. Foi-se com o vento. — Em que direção? — Também não sei. Pará o deserto. Na direção do ponto onde desceu o ovo, penso eu. Mas nunca mais ninguém viu o jornal. É difícil encontrar um jornal no deserto. Brigitte também achava que era difícil encontrar um jornal no deserto. Mas, se essa era a única pista do homem moreno do Cadillac, tinha que tentar encontrá-la. Talvez fosse o encarregado de escolher o “lugar” onde eles deveriam pousar... — A senhora quer mais alguma coisa? — perguntou o moleque, guardando a moeda de 50 cents. — Não, Butch. — Brigitte olhou para ele especulativamente. — Mas estou disposta a lhe dar cinco dólares, se você me trouxer um pedaço do jornal que voou para o deserto. Suponho que seja o “Pravda”. — É difícil, miss. — Mas não impossível. Você é o único que pode ganhar a recompensa, Butch. Eu sei que você é muito vivo! Vá buscar o jornal e não diga nada a ninguém. O moleque sorriu mostrando uma dentuça amarela e saiu correndo pelo campo aberto, na direção que um grupo de policiais que se aproximava. O inspetor Pitzer viu-o passar, como um foguete, e franziu o sobrolho. — Quem é aquele garoto? — perguntou, à mulher alta e magra que vinha a seu lado. Grace Meadows sorriu. — Um órfão, meu protegido. Ele estava dormindo, quando apareceu o ovo. Só eu é que vi a coisa. E repito que era impressionante, inspetor! — Okay — resmungou o detive. — Mas aconselho-a a não exagerar os acontecimentos,quando for entrevistada por alguma jornalista. Não diga, por exemplo, que foi agredida pelos tripulantes do disco. Nós sabemos que eles não a ameaçaram. — Mas crestaram a grama com a sua arma atômica! Se eu estivesse na frente daquele jato de fogo. Aliás, senti um princípio de paralisação! Nesse momento, Brigitte foi ao encontro do grupo, empunhando a máquina fotográfica. Imediatamente, a senhorita Meadows assumiu uma pose teatral e ajeitou o penteado. A câmara funcionou duas vezes. — “Morning News” — anunciou Brigitte. — Como se sente agora, miss Meadows? — Bem, obrigada. Mas foi muito impressionante! Eu conversei com um habitante de Marte! Ele era verde e tinha apenas oitenta centímetros de altura. — Nu? — Foi uma coisa em que não reparei. Creio que ele usava uma farda verde, rente à pele. Evidentemente que tinha uma sunga, senão eu não lhe teria dirigido a palavra! Sou uma moça solteira e prezo muito a moral! — Se a senhorita conversou com ele, conhecia a sua língua. — Não conheço a língua de ninguém! — protestou a solteirona. — Sou uma moça humilde e mal falo a minha própria língua! Eles falavam em marciano, conforme tive ocasião de dizer ao inspetor Pitzer. O detetive acenou. — Sim, falavam um idioma estrangeiro. Miss Meadows não se lembra de nenhuma palavra. Eram apenas sons guturais que... Houve um silencio. A senhorita Meadows tinha os olhos arregalados pelo temor. — Desculpe — gemeu. — Tenho ordens para não dizer nada aos jornais! — Vovô é uma fera — rugiu o inspetor Pitzer, crescendo para Brigitte. — Não publique isso no seu jornal! Você é diabólica, miss Montfort! Ou será que está jogando com cartas marcadas? — Juro que não — sorriu Brigitte. E a entrevista continuou, sem que a senhorita Meadows contasse mais nada de interessante. — Não sei onde se meteu Butch — queixou-se a mulher, enquanto servia o café. — Esse moleque ainda acabará se perdendo no deserto! Às nove horas, o inspetor Pitzer deu por terminadas as investigações e anunciou sua decisão de voltar a Los Ângeles. Quando já iam subir para bordo, um ponto preto surgiu no deserto, banhado de luar, crescendo rapidamente. Era o moleque, esfalfado, com a língua de fora. Brigitte correu ao encontro dele. — Então? Junto do helicóptero a quinze metros de distância o inspetor Pitzer observava, desconfiado. Mas não podia ouvi- los. — Não encontrei o jornal inteiro — confidenciou Butch. — Só a primeira e a última folha. Acho que o resto se queimou. Estas páginas, mesmo, tem queimaduras, porque estavam perto do lugar onde o ovo desceu. Brigitte apanhou as folhas de jornal que ele lhe estendia e deu-lhe uma nota de cinco dólares. Por fim, também o fotografou, à luz do seu flash eletrônico. Quando voltou para bordo do helicóptero, o inspetor Pitzer estendeu a mão. — Permite-me? Ela lhe entregou docilmente as quatro páginas do “Morning News”. — É o seu jornal, não é? — comentou o detetive. — É. Sempre pagamos cinco dólares a cada freguês que nos devolver o casco. Ele examinou o jornal, cheirou-o e devolveu-o. No cabeçalho do “Morning News” que tinha um pedaço queimado via-se um carimbo: “Aiport Ho” E, ao lado, também se via uma anotação a lápis: “32”. — Qual é a sua idéia? — quis saber o inspetor Pitzer, logo que o helicóptero levantou vôo. — Não tenho nenhuma idéia — mentiu Brigitte. — O senhor pensa que este jornal veio de Nova Iorque, no ovo? Tem a data de ontem. — Claro que não penso isso — resmungou o detetive. — Mas estava próximo do local onde os marcianos fizeram experiência com o lança-chamas. Suponho que é isso o que você quer provar. O papel ainda cheira a petróleo. — Também notei, Mr. Holmes. Será que os marcianos de miss Meadows usaram petróleo gelatinoso no seu lança- chamas? Nesse caso, eles estão imitando os soldados americanos, com as suas bombas de napalm. — Não sei — grunhiu o agente do FBI. — É você que está dizendo. Oficialmente, continuo sem saber de nada! Brigitte olhou para ele com ar de suspeita. — O senhor está tão tranqüilo, inspetor, que dá para desconfiar... Aposto que descobriu uma prova melhor do que a minha. Por isso não me tomou o jornal. — Pode ficar com ele — sorriu o detetive. — Pode ficar com todos os papéis sujos de Deserto de Mojave. Se os anões eram russos e usaram um lança-chamas comum, a petróleo gelatinoso, é provável que nós tenhamos melhores provas do que uma simples folha de jornal... Na verdade, ele tinha recolhido duas provas melhores, no local em que descera o ovo-voador: parte da grama crestada e uma lata, contendo resíduos de petróleo queimado. Eles não queria que os jornais soubessem disso. Era muito desagradável confessar que espiões soviéticos estavam subindo e descendo impunemente em terras da Califórnia. E, o que era mais grave, apenas a 1.800 quilômetros de Cheyenne Mountain, onde está encerrado o cérebro da defesa atômica norte-americana! — A propósito, inspetor Pitzer — disse Brigitte, quando o helicóptero pousou no heliporto de Los Ângeles. — Li no meu jornal que o Circo de Moscou está se exibindo em São Francisco. Sempre adorei a troupe de anões daquele circo... O senhor também gosta, não é verdade? O homem do FBI olhou para ela, de boca aberta, mas não disse nada. Começava a ter medo de falar demais. CAPÍTULO TERCEIRO Brigitte encontra um aliado Foi por isso que, na manhã seguinte, ele procurou o Airport Hotel de Los Angeles e entrou na suíte 32. Agora, ali estava, diante de um homem nu e armada com uma Markarov tirando a própria roupa para distraí-lo. — Espere! — implorou. — Não atire! Tenho coisas ainda mais bonitas para lhe mostrar! Ela já estava só de sutiã e calcinhas. — Pare com isso! — rugiu o homem alto e musculoso. — Você não me convencerá! Encoste-se na parede! Ela obedeceu, tiritando de frio. De qualquer maneira, conseguira distraí-lo o bastante para não ser fuzilada sem julgamento. O outro adiantou-se, nu em pêlo, e ajoelhou-se ao lado do compatriota. Depois de um breve exame, confirmou a sua morte. — Um tiro no coração! Pobre e querido Boris! Você o matou, mulher pérfida e cruel! Agora, vou entregá-la à polícia! — Acha que pode fazer isso, tovarich? Ele voltou a pôr-se de pé, apontando-lhe a pistola. — Da! Você matou o meu camarada! Há uma lei, neste país capitalista, que castiga os assassinos! Onde pôs o revólver? — Eu matei o seu amigo? Não me faça rir! Foi você quem o matou! É você quem está com a arma na mão! Dessa vez, foi o homem nu quem pestanejou, confuso. Depois: — Eu estava no banho! Boris estava na sala! E, agora, Boris morreu! E eu encontrei você debruçada sobre ele! Kac vashie imia? — Meu nome é Brigitte Montfort — respondeu ela, sentando-se numa poltrona. — Sou repórter do “Morning News”, esse jornal que os senhores recebem todas as manhãs. Já leu a edição de hoje? Tem uma notícia que lhe interessa. Ela enviara sua reportagem, na noite anterior, pelo telefone direto de Miky Grogan — e sabia que sua entrevista com Butch fora publicada na primeira página. Nessa entrevista, aludira vagamente a um misterioso Cadillac preto, que o moleque teria visto duas vezes na estrada de Barstow. — Ah! — gemeu o russo alto e musculoso. — Você é uma jornalista? Mas, então, não tinha razões para matar Boris! Por quê? Não entendo mais nada! — Claro que não matei Boris — gritou a garota, irritada. — Pensei que você é que fosse o assassino! Quero, apenas, uma entrevista exclusiva, antes de pôr a polícia nos seus calcanhares. — Somos diplomatas — afirmou o russo alto, apanhando uma toalha e envolvendo-a nos quadris — Chamo-me Ygurin Nashimov e sou o subsecretário do Consulado Soviético Meu camarada, Boris Kashatov, era o adido naval. Não somos espiões! E não temos nada a ver com o mistério dos discos! — Estranho — comentou Brigitte.— Nesse caso, por que morreu o seu colega? E como? Mais calmo, o homem fez um gesto vago. — Não sei! Como? Eu estava tomando banho de chuveiro e não escutei nada! Ele ficou na sala e eu fui para o banheiro. E, de repente... Como foi que entraram aqui e fizeram isso? Você deve saber melhor do que eu! Brigitte estreitou os lindos olhos azuis. — Hum! Tive a impressão de ouvir passos, ao saltar do elevador, mas não vi ninguém. A porta estava fechada a chave e... O assassino talvez ainda esteja aqui dentro! Os dois olharam, receosamente, na direção da porta do quarto. O russo levantou-se sempre empunhando a Markarov e foi dar uma espiada dentro da alcova. — Não há ninguém — anunciou Ygurin Nashimov, regressando à sala. — Não posso compreender uma coisa destas! Talvez seja melhor chamar a polícia! De qualquer maneira, haverá escândalo. Mas eu não posso ficar com esse cadáver aqui dentro! E Boris precisa ser vingado! — Certamente, Ygurin. Talvez eu possa ajudá-lo, se você for sincero. Sei que você e seu amigo estão envolvidos no caso dos discos. Você não leu o meu jornal? O russo olhou, desconfiado, para a mesinha da sala. Em cima dela, via-se a edição especial do “Morning News”, recém-chegada de Nova Iorque. Brigitte abriu o jornal e mostrou-lhe a reportagem com fotografias da primeira página: “O MISTÉRIO DOS DISCOS” Por Brigitte Montfort, nossa enviada especial à Califórnia. O inspetor Alan Pitzer não pode falar sobre os discos- voadores — Tudo é especulação, diz o famoso agente secreto — Entrevista exclusiva com uma testemunha que viu o ovo antes da galinha — Um Cadillac misterioso fez o serviço de rastreamento — O FBI vai ao Circo de Moscou. O russo acenou. — Sim, isso eu compreendo. Você é Brigitte Montfort, repórter do “Morning News”. E pensa que sabe muito! — Sei o bastante para complicá-lo, Ygurin. Se você ler minha reportagem, também compreenderá que estou na pista certa. Aquele Cadillac preto, com dois homens morenos, era o carro do Consulado Soviético! — Não preciso perguntar — queixou-se o soviético. — Você encontrou o jornal que Boris perdeu no deserto! Esse jornal tinha o nome deste hotel carimbado na margem. — Soltou um suspiro. — Você tem razão, garota. Mas de nada lhe servirá denunciar-nos à contra-espionagem americana. A polícia não encontrará provas de nossas atividades secretas. Não somos espiões oficiais. Somos diplomatas e temos imunidades. Meu camarada achava que um disco talvez descesse entre Barstow e a fronteira do Arizona. — Achava? Ou tinha certeza disso? O russo sacudiu a cabeça, impaciente. — Niet! Você pensa que esses discos são fabricados pela União Soviética? Pensa que nós estamos ligados a esses malditos anões verdes? — Será difícil você me convencer do contrário. — Pois não estamos — afirmou Ygurin, convictamente. — Vou-lhe mostrar o meu passaporte, diévushka. Por ele, você verá que nós chegamos aos Estados Unidos apenas há cinco dias, logo depois da descida daquela caçarola em Las Vegas. Mas nós não estávamos aqui, quando desceram os discos anteriores; estávamos em Moscou! — Agentes especializados em UFOS? — perguntou Brigitte, com ar de dúvida. O russo depositou a Markarov em cima do “Morning News”, na mesinha. — Mais ou menos. Somos técnicos em cinegética e vigarice espacial. Eu lhe explico. Quando começaram a surgir esses discos-voadores na Califórnia, o Kremlin desconfiou de um ardil dos americanos, tendente a deixar a União Soviética em má posição perante a opinião pública mundial. Os imperialistas americanos podiam estar fabricando os discos para pôr a culpa nos socialistas soviéticos! O fato é que os discos não foram feitos por nós! — Não mesmo? E os anões verdes, falando russo? — Ninguém pode provar que eles são russos! — A senhorita Meadows ouviu algumas palavras russas, ditas pelos monstrengos. — Não entendo! — gemeu o diplomata. — Nós pertencemos ao Centro de Pesquisas sobre falsos UFOS, um departamento autônomo da KGB, e fomos encarregados, pelo nosso governo, de decifrar o mistério dos discos, desmascarando aqueles que pretendem intrigar a União Soviética. Viemos para a Califórnia, como diplomatas creditados junto ao consulado, e estudamos o caso. A constância no aparecimento dos UFOS nos intrigou. De cinco em cinco dias, um aparelho misterioso descia ao longo da Califórnia, sempre por volta da meia-noite. Então, Boris traçou um plano. Na opinião dele, um novo UFO deveria descer abaixo de Las Vegas, na noite do dia 20, deste mês. Fomos até à casa da senhorita Meadows, no Cadillac do consulado, e observamos as vizinhanças. Foi aí que Boris perdeu o jornal. Mas não tivemos sorte. Quando o ovo desceu, perto da casa, nós estávamos vigiando a fronteira do Arizona. O lápis de Brigitte voava sobre o caderninho de apontamentos. — E vocês não viram nada? — Nada! De manhã, voltamos pela estrada de Barstow e soubemos, então, que o UFO ali aparecera. A teoria de Boris estava certa. Isto é um truque dos americanos para complicar a União Soviética! É uma provocação imperialista! Nós não fabricamos esses UFOS! Temos muito respeito pelo povo americano e seríamos incapazes de lançar o, pânico entre a população civil! — Pode ser que vocês não tenham fabricado os discos — disse, depois. — Mas, os Estados Unidos também não o fabricaram! — Pois sim que não! Você acredita no Pentágono? — Acredito nas minhas observações pessoais. Não são os Estados Unidos que estão provocando esta onda de pânico! Ora, se não foram vocês, nem eles... então, quem foi? — Sei lá! — grunhiu o russo, perplexo. — Se não foram vocês, nem nós... esses discos vêm de Marte! Sim, eles vêm de outro planeta! — Então, por que mataram Boris? O tiro que ele recebeu no peito partiu de uma pistola terrena. Eu diria que foi uma Colt 44. — Não entendo! Por que fizeram isso? — Porque seu amigo sabia demais! A teoria de Boris estava certa, conforme você disse. E, agora, nós também sabemos demais! E o Airport Hotel não é um lugar muito seguro para quem sabe tanto! Mal acabou de falar, notou que a expressão do rosto de seu interlocutor se modificava. Ygurin estava olhando para a porta da suíte, por cima de seu ombro, com os olhos negros muito arregalados. — Tishiná! Aí vem o... Inesperadamente, as luzes da sala se apagaram. Alguém tinha torcido o comutador, O russo saltou, como uma mola, e agarrou na Markarov. No mesmo instante soou uma expressão abafada e um clarão amarelo iluminou a sala. “Plof!” Um tiro de pistola, provida de silenciador. Alguém estava atirando, junto da porta do corredor, que fechara depois de ter entrado na suíte. Ygurin Nashimov tombou por cima da mesinha, agarrado à Markarov, e foi ao chão. Brigitte também saltou, quase ao mesmo tempo, e escondeu-se atrás da poltrona. “Plof!” Outro tiro seco, semelhante ao espocar de uma garrafa de champanha. O russo não se moveu mais. “Plof!” O atirador desconhecido estava alçando a bela repórter! Uma nova bala roçou o ombro da garota e furou o assoalho. Ela rastejou, por trás da mesinha caída, e estendeu a mão, apalpando o braço inerte de Ygurin. — Estou ferido — gemeu o russo. — Defenda-se, diévushka! E dobrou o braço, com extrema dificuldade, entregando- lhe a Markarov. “Plof!” Brigitte sentiu a bala zunir junto ao seu ouvido. A escuridão favorecia o pistoleiro. A bela jornalista rodopiou, arrastando a mesa virada, e empunhou a Markarov com as duas mãos, disparando na direção da porta. Dessa vez, a detonação foi ensurdecedora. Um espelho se quebrou, com um fragor impressionante. O pistoleiro misterioso escapara, com medo de levar a pior. Brigitte ergueu-se, dominando o tremor das pernas e foi acender a luz. Agora, os dois falsos diplomatas russos estavam mortos, um ao lado do outro. E a bala, que penetrara nas costas de YgurinNashimov, era idêntica à que furara o coração de seu camarada Boris Kashatov. Aqueles dois não podiam mais falar. E ela, Brigitte Montfort, ainda não sabia o que dizer! Mas, se a teoria de Boris estava certa, a de Brigitte também estava. Ela pensara o mesmo, ao estudar o mistério dos discos. Então, Brigitte começou a pensar na China de Mao-Tse-tung... Seria algum truque de Lin-Piao? Não teve tempo para novas conjeturas. Súbito, ouviu-se um vozerio confuso, no corredor, e a porta foi aberta violentamente. Um grupo de pessoas excitadas penetrou na sala, liderado por um homem baixo e gordo, de óculos escuros. — Que está acontecendo aqui? — rugiu ele. Brigitte agarrou na máquina fotográfica e preparou-se para correr. Tinha que escapar; custasse o que custasse! Mas o caminho da fuga estava bloqueado pelos outros hóspedes, que palravam excitados. — Creio que houve um acidente — balbuciou Brigitte, enfiando a correia da câmara fotográfica no pescoço. — Ouvi tiros e, quando entrei aqui, encontrei dois homens mortos! Receio que um tenha atirado no outro! Todos se adiantaram, soltando gritinhos, cercaram os corpos dos dois russos. A toalha de Ygurin tinha caído e a aparência dele não era muito elegante. Brigitte escorregou pelo meio dos mirones, mas o homem gordo agarrou-a brutalmente pelo braço, impedindo-a de alcançar a porta. — Um momento, miss! Onde pensa que vai? — Estou à procura de um bom ângulo para trabalhar... Dito isto, sorriu polidamente, ergueu a câmara e bateu duas chapas do local, abrangendo os cadáveres. — Não se mexa! Você não me tapeia! Ouvimos os tiros, neste quarto! E você estava aqui, em companhia das vítimas! Você terá que se explicar direitinho! Eu... Brigitte encarou-o, pestanejando graciosamente. — Oh, perdão! O senhor é o detetive do hotel? — Ya! Sou o sargento Kildkind, da polícia estadual! Isto é, sou o ex-sargento Kildkind. Atualmente, exerço as funções de detetive deste hotel! — Caiu em si e deu um berro: — Você está presa! E eu não tenho satisfações a dar- lhe! — Seja mais polido, sargento! Posso lhe dizer duas palavras em particular? — Okay! Será melhor que você confesse tudo! Venha até o corredor. Saíram e o sargento fechou a porta. Não havia ninguém no corredor do terceiro andar. Todos os hóspedes tinham entrado na suíte 32. — Qual é o seu problema? — inquiriu o gordo, com expressão de simpatia. Brigitte compreendeu que podia ter nele um aliado. — Sou repórter do “Morning News”. Esse mesmo jornal que o Airport Hotel distribui pelos quartos dos hóspedes. Não tenho nada a ver com esse duplo assassínio. Eu também fui agredida por um pistoleiro misterioso. Escapei por um triz. Há um assassino à solta nesta casa, sargento! O gordo tinha os olhos velados pela dúvida. Não sabia como agir. — Tolices! — rosnou. — Se houvesse um assassino aqui, eu lhe daria voz de prisão! Há um pouco de exagero nisso, menina. Mas talvez você não tenha matado os dois diplomatas. Estou propenso a acreditar na sua inocência. Seus olhos azuis e cândidos não mentem. Mas não posso deixá-la em liberdade. Você terá que se explicar com a polícia e, talvez, com o FBI! Este caso está me cheirando a intriga internacional! — Também me cheira, sargento. Mas já vi que o senhor é um homem digno e um bom chefe de família. Que diria, se sua filha se visse envolvida num assassinato político? Olhe para mim como se estivesse contemplando sua filha! — Mildred nunca se veria envolvida nesta espécie de encrencas — rosnou o policial. — Mas você terá que se explicar, contando tudo o que sabe! E você deve saber de muita coisa! — Engana-se, sargento. Não sei de nada. Vim entrevistar esses diplomatas, a serviço de meu jornal, e eles foram liquidados diante das minhas vistas! E eu quase ia também para o bebeléu! Estou nervosíssima, sargento! Veja meus seios, como palpitam de emoção! Acredite em mim, por favor! Sou inocente! E não me convém ser interrogada pela polícia, antes de terminar as minhas reportagens em Los Angeles. Entende? Não me convém cair nas mãos do FBI! — Ah! — grunhiu o gordo, encarando-a suspicazmente. — Então, você sabe de alguma coisa e quer guardar segredo, hem? — Será melhor que eu não seja interrogada, por enquanto. Dou-lhe a minha palavra de honra de que não matei os homens! — E também não sabe quem os matou? — Não, também não sei. — Mas vai saber, não é? — Talvez. Deve ser um assunto palpitante. E eu sou jornalista. O gordo acenou, refletindo profundamente. — É política, com certeza... Coisa dos russos! — Com certeza. Mas ainda não entrei no miolo da questão. Se o senhor me deixar em liberdade, nós dois podemos agir de acordo e desmascarar o culpado. Que lhe parece? — Sim, talvez. Eu gostaria de desmascarar o culpado, para receber as honras da descoberta! — O sargento Kildkind parecia divertido. — Afinal, mataram dois homens no Airport e eu, como detetive da casa... Ya, eu gostaria de ser o herói do romance! — O senhor receberá essa honra, sargento! Dou-lhe a minha palavra! Posso ir? — Ainda não! Você deve saber de muita coisa, garota, e representa perigo para a segurança nacional! Esses dois russos eram espiões, com certeza. Ontem, saíram no Cadillac do consulado e só voltaram hoje de manhã. O FBI estava de olho neles. Você também anda atrás dos discos, não é? Brigitte suspirou. — Vejo que o senhor é mais esperto do que eu pensava. Sim, sargento. Minha reportagem prende-se aos discos que têm aparecido na Califórnia. Mas ainda não sei o que pensar a respeito. — Não sabe, mesmo? Eu tenho uma teoria. São os russos que usam esses discos, para amedrontar a América! Mas eles não conseguirão! Somos um povo unido, apesar de nossa mistura de raças! O que nos estraga são os negros e os judeus, mas ainda haveremos de ficar livres deles! O sargento baixou a voz. — Esses UFOS estão ameaçando a base ultra-secreta de Vanderberg! — A base de quê? — Vanderberg, a base dos satélites militares, lançados, num cinturão ao redor do mundo! Eles sabem, os russos! A base fica aqui e os patifes já devem tê-la localizado! Por isso apareceram os discos. Não é uma boa teoria? — Excelente. Vou pô-la no meu jornal. E direi que foi o senhor quem a inspirou. “O sargento Kildkind teme por Vanderberg!” — Meu primeiro nome é Karl. Não quer tirar o meu retrato? Brigitte voltou a suspirar, impaciente. — Boa idéia. Não se mexa, por favor. E não faça cara de idiota. A máquina fotográfica funcionou e o retrato do sargento saiu sorridente. Brigitte escreveu alumas palavras no caderninho e voltou a encarar o seu novo aliado. — Pronto. Posso ir? Deixe-me escapar, sargento, e o senhor ficará famoso! Nós dois, em segredo, podemos vencer os russos! Posso ir agora? Ainda tenho que escrever um artigo e levar o material ao aeroporto! O gordo olhou-a pensativamente, lutando contra si mesmo. Depois, decidiu-se. Sua mão gigantesca fez um afago na cintura da repórter. — Okay, Brigitte Montfort! Você é uma garota bonita e esperta. Vou confiar em você. Vá-se embora, mas não deixe de ficar em contato comigo! Vou-lhe arranjar um quarto secreto, no porão deste hotel, onde você poderá estabelecer o seu quartel-general. Morou? Nós dois, juntos, iremos longe, pedaço de mau caminho! E fez menção de beijá-la entre os seios. Brigitte escapou de suas garras e partiu, célere, pelo corredor. Só depois que estava na rua é que refletiu sobre as últimas palavras do sargento Kildkind, e sentiu um arrepio na espinha. Como é que o gordo sabia que ela era Brigitte Montfort? CAPÍTULO QUARTO Brigitte também tem um plano Nessa tarde, Miky Grogan recebeu, pelo malote da TWA, uma das mais sensacionais reportagens do “Morning News”. Nela, Brigitte completava algumas reticências de seu artigo anterior e prometia uma grande surpresa para osleitores, no final da série de reportagens. E ela, Brigitte Montfort, enviada especial do “Morning News” a Los Ângeles, prometia esclarecer tudo antes do fim do mês. Para começar, já tinha uma pista. Era verdade. A extraordinária repórter já tinha uma pista, mas precisava de confirmação. Por isso, resolveu aceitar o convite do sargento Kildkind, estabelecendo o seu quartel-general num quarto modesto do Airport Hotel, por baixo das escadas que iam dar na lavanderia. — O essencial — disse ela, ao seu novo aliado — é que ninguém saiba onde me encontro. Não conheço a identidade do homem que matou os dois agentes soviéticos e não me sinto segura em nenhuma parte da cidade. Você garante que aqui não entra ninguém? — Garanto — afirmou o sargento, lambendo os beiços lascivos. — Aqui ninguém a incomodará, queridinha. E logo mais, a noite, quando fecharem a lavanderia, o silêncio e a solidão serão absolutos. — Diga-me uma coisa, sargento. Como foi que você descobriu que eu era Brigitte Montfort? Eu não lhe disse o meu nome! O gordo sorriu. — Sou o detetive do hotel, não sou? O rapaz da recepção me falou em você. O resto, não foi difícil de deduzir. Eram, então, seis horas da tarde. Brigitte jantou no quarto enquanto o sargento Kildkind olhava com interesse para as suas anotações. Por fim, às sete e meia, o último funcionário da lavanderia foi-se embora, fechando a porta do corredor. Brigitte ouviu os seus passos leves, subindo as escadas. Daí a pouco, outros passos desceram a mesma escada e a maçaneta da porta girou vagarosamente. Mas a porta estava fechada a chave. — Quem é? — perguntou Brigitte, correndo a vestir um peignoir. Uma chave girou na fechadura e a porta se abriu. Era apenas o sargento Kildkind. — Puxa! — exclamou Brigitte, sorrindo. — Pensei que fosse o meu pistoleiro! Mas ele deve ser mais magro do que você... O sargento não achou graça. Parecia nervoso. — Ele pode estar por aqui, filhinha! Há um novo hóspede no hotel, com cara de carniceiro! Você já olhou na lavanderia? — Não. Você acha que há perigo? — Venha comigo. Você dirá se há ou não. Alguém pode entrar pelo beco. Venha ver uma coisa. Ele tinha fechado a porta do quarto, ao entrar; quando se dirigiam para essa porta de mãos dadas alguém bateu violentamente. O sargento Kildkind empalideceu, desabotoou o casaco e levou a mão ao coldre da pistola. — Não — sussurrou Brigitte. — Espere! Escondeu o gordo atrás de uma cortina, que servia de porta para o armário, e foi abrir. No umbral da porta, estava o inspetor Pitzer, ladeado por dois outros agentes do FBI. — Alô, ,niss Montfort! Permite-me? — Alô, titio! Como foi que me descobriu? — Estava fugindo de mim? — Não especialmente do senhor. Entre. E não repare na bagunça. O inspetor entrou, olfateando o ar, e postou-se na frente da cortina. Depois, fez um sinal aos seus agentes. Os dois federais cercaram a cortina. — Okay! — disse o inspetor, em voz alta. — Pode sair daí! E conserve as mãos à vista! O sargento Kildkind saiu, com cara de cachorro batido. Ao reconhecê-lo, Pitzer deu uma risada. — É você, sargento? Por que não disse logo? Eu não podia adivinhar! — Já conhece o meu amigo Kildkind? — disse Brigitte, sorrindo. — Ele também tem uma teoria sobre os discos. — Vim buscar você por causa disso — replicou Pitzer com voz séria. — Andei à sua procura pela cidade toda e não a encontrei. Você tinha que estar aqui. — Obrigada pelo interesse. Gostou da sua entrevista? — Muito. Você está presa! — Como disse? — Digo que você está presa, incursa num dos artigos da Lei de Segurança Nacional! Você não ouviu os meus conselhos e fez sensacionalismo em torno do episódio do ovo de Barstow. E você vai para o xadrez! — Eu? O sargento Kildkind tentou interferir. — Espere, lá, inspetor! E a liberdade de imprensa? — É um crime espalhar boatos tendenciosos — replicou o federal, secamente. — E também é crime atribuir declarações capciosas a funcionários do governo! Não se meta, sargento, se não quiser ser processado também! O sargento calou-se, intimidado. — Sua reportagem talvez não saia amanhã — rosnou o inspetor. — Vocês estão abusando! E este assunto dos UFOS não é brincadeira! Falta pouco para que vocês estabeleçam o pânico no país, atribuindo aos russos a manufatura dos discos! — Eu não escrevi isso — protestou Brigitte. — Ainda não sei se foram os russos ou os chineses. Calou-se. O homem do FBI tinha-se curvado para o mapa da Califórnia, em cima da mesa, e examinava os riscos que ela traçara, entre as coordenadas. — Que é isto? — Psicanálise — respondeu Brigitte. — Sempre faço rabiscos nos países, quando estou pensando noutra coisa. — Neste caso, parece que você estava pensando nisto mesmo! — ele encarou a moça, com ar severo. — Você sabe de mais alguma coisa, além daquilo que publicou no seu jornal! Não confio em você, miss Montfort! Trata-se da segurança nacional. Não podemos facilitar. Como foi que encontrou a pista dos dois falsos diplomatas russos? — Pelo jornal queimado, Lembra-se? Eles estiveram na estrada de Barstow, atrás do UFO. Mas não chegaram a ver nada. — Contudo, descobrimos que você ficou trancada, com eles, na suíte 32. O que foi que eles lhe disseram, antes de serem assassinados? — Não seja ciumento, inspetor! Eles não me disseram nada. Morreram na minha frente, durante a entrevista. Pergunte ao sargento se não é verdade. O gordo confirmou, com voz sumida. Estava alarmado com a presença dos federais. — Não sou cúmplice dela — gemeu depois, sacudindo a cabeça. — Emprestei-lhe este quartinho porque ela estava com medo de ser apanhada pelo homem que matou os russos. Isso foi o que ela disse. Eu apenas quis ser gentil. E ia dar-lhe voz de prisão a qualquer momento. — Claro — ironizou o inspetor. — Você sempre foi muito gentil, Kildkind. Conhecemos a sua ficha. Miss Montfort deve se dar por muito feliz em ter escapado das suas garras. Já tivemos duas queixas contra você, de duas chinesinhas da lavanderia. Você é um tarado, sargento, e por isso foi expulso da corporação! Quando ainda pertencia à Policia Estadual, atacou uma menina de onze anos, no Griffith Park! Aposto que você também queria enfiar a cabeça de miss Montfort na máquina de lavar e, enquanto ela se debatia... — Nunca! — gritou o gordo, lívido de pavor. — Nunca pensei nisso! Aquelas chinesinhas eram duas débeis mentais! Eu jamais iria pegar à força duas garotas sujas como aquelas! Brigitte sorriu. Começava, a conhecer melhor o sargento Kildkind... — Não, inspetor — disse ela, despindo o peignoir. — O sargento não me fez nenhuma proposta indecorosa. O gordo engoliu em seco e não disse nada. A figura de Brigitte, em sutiã e calcinhas, fazia-lhe mal aos nervos. — Deixe-o em paz, inspetor — continuou a linda repórter, vestindo a saia de xadrez. — Eu não farei queixa contra ele. E ele não foi meu cúmplice, realmente. Eu é que lhe pedi para me arranjar um quarto sossegado no hotel. — Okay — decidiu o federal. — Por esta vez, passa. Mas tome cuidado, sargento! Nós temos a sua ficha. Nunca mais se meta em encrencas. — Vamos embora — rosnou o inspetor Pitzer, depois de dar uma rápida busca no quarto. — Se quiser, pode levar a sua câmara. Assim, terá com o que se divertir, a caminho do xadrez... A linda jornalista pôs a câmara a tiracolo e sorriu para o sorumbático sargento Kildkind. — Ânimo, colega! Não se deixe intimidar! Eu confio em você. Você não ia me levar para a lavanderia, não é mesmo? Tome conta dos meus documentos e não deixe ninguém mexer aqui. Eu voltarei, sargento. Os dois federais agarraram-na gentilmente pelos braços e levaram-na para fora. O inspetor Pitzer foi atrás deles. E o sargento Kildkind, frustrado em seus intentos, ficou de pé, no meio do quarto, olhando com raiva para o mapa daCalifórnia. Havia um Packard Clipper, de modelo antigo, no estacionamento do hotel. O inspetor e Brigitte sentaram-se, sozinhos, no banco traseiro. Os outros dois federais cumprimentaram a ficaram na beira da calçada. O carro zarpou, dirigido por um chofer de óculos escuros. — Agora, podemos conversar à vontade —disse o detetive, sorrindo. — Para onde vamos? — perguntou Brigitte, — O chofer sabe o caminho. Vamos descer por Inglewood, até Torrance, dar a volta na Harbor Freeway e voltar pelo Wates. Um passeio muito agradável. Brigitte. Vamos falar no Circo de Moscou? Ela semicerrou os olhos, cada vez mais desconfiada. Tinha as pernas bem fechadas e a saia puxada até os joelhos. — O senhor vai se vingar de mim? — Até que não — disse o detetive, encarando-a. — Você estava certa. — Não diga! Sobre o Circo de Moscou? — Sim. Se tentou me tirar da jogada com um blefe, enganou-se nas cartas. Você tinha uma seqüência! Estive no circo, em São Francisco, e descobri que havia um anão misterioso, chamado Albert. Ele sumiu logo que a troupe chegou aos Estados Unidos. Mas não era russo. — Também não devia ser marciano... Ou era? — Não, não era marciano. Era austríaco. Desapareceu, no mês passado, antes de começarem a aparecer os UFOS. E foi visto em Los Angeles, no princípio deste mês. Parece que andou rondando o Airport Hotel... — Que coincidência! Isso é novidade, para mim. — Você não podia saber tudo. Agradeça-lhe a sugestão, Brigitte. Também lhe agradeço a reportagem sobre os discos e a lição que me deu. Fui um imbecil, não “apertando” aquele garoto! — Butch? Coitado! Era tão insignificante... — Mas foi ele quem lhe deu a “dica”. As declarações do moleque valiam mais do que as da solteirona. Você nos passou para trás, Brigitte. — Por isso estou presa, não é? — Que é que você acha? — Ainda não sei o que pensar. O senhor é muito misterioso, inspetor Pitzer! Por que não vai diretamente ao ponto? — Estou chegando lá. Telefonei, ainda há pouco, para Washington. E tenho uma proposta a fazer-lhe. — Uma proposta? — Brigitte arregalou os lindos olhos azuis. — Do FBI? — Exato. Assunto confidencial. Você pode escolher o seu destino, Brigitte. Ou a cadeia, ou... — Ou?... — Recebi ordens para convidá-la a entrar para o FBI. — Repita isso; por favor. — Recebi ordens para lhe propor o seu ingresso nos quadros do FBI. Você pode aceitar ou recusar. Estamos numa democracia. A recusa implicará na sua prisão, por medida de segurança nacional. — Isso é chantagem! — Tome-o como entender. Não podemos facilitar, permitindo que você desmoralize o nosso serviço secreto, E você, agora é um elemento precioso, para o esclarecimento do mistério dos discos. Recebi ordens para... — Não — cortou Brigitte, dilatando as narinas. — O senhor não recebeu ordens; o senhor deu essas ordens! É o senhor que quer me neutralizar, dando-me um emprego público, para que eu fique quieta e calada! Mas sabe o que eu penso da sua proposta? Pode pegar no seu emprego e... — Não seja malcriada! Quanto é que você ganha no “Morning News”? — Uma miséria. Mas sou jornalista e jamais trairei o meu chefe! Sou leal a quem me paga! Nem que vocês me oferecessem mil dólares por mês... — É essa, aproximadamente, a quantia que estou autorizado à oferecer-lhe. Duzentos dólares por semana, mais as despesas extra. E você não precisará deixar o “Morning News”. — Não entendo — gemeu Brigitte, piscando. — Eu não precisarei pedir demissão? Não trairei a confiança de Miky? — Não. Miky Grogan não precisará saber que você trabalha para nós. Sua função de repórter não atrapalhará suas missões especiais. Pelo contrário. Como jornalista, você terá maiores facilidades para se locomover, a serviço do FBI. Pense bem, Brigitte! Não quero que me dê uma resposta precipitada. Caiu outro silêncio no carro. Iam passando em frente ao sistema espacial da USAF, junto à Aerospace Corporation. Brigitte olhou para fora, procurando pôr em ordem os pensamentos. Nunca esperara receber uma proposta daquelas, de maneira tão inesperada! Voltou-se para o inspetor Pitzer, retorcendo as mãos. — Se eu aceitasse, Miky teria que saber. Não escondo nada dele. — Só ele e eu saberíamos. Precisamos muita discrição, no serviço secreto. A sua admissão no FBI será uma espécie de curso vestibular para o ingresso na CIA. Depois que uma pessoa se mete no serviço secreto, só sai para morrer ou fugir para a Suíça. Pense bem e responda. Aceita? Brigitte tinha vontade de rir e chorar. Estava nervosíssima. A responsabilidade era muito grande. Pensou no futuro que a esperava, como espiã, contra-espiã, ou fosse lá o que fosse. Nunca sonhara em ser outra coisa senão jornalista. Mas a idéia de trabalhar para o governo, defendendo a democracia numa profissão tão cheia de emoções, a tentava. Parecia-lhe ouvir a voz insinuante de uma serpente, comparando-a a Mata Hari e a James Bond. E, depois, havia o fator cívico. Ela já considerava os Estados Unidos como sua pátria. E, se tivesse a cooperação do FBI no caso dos discos-voadores, teria maiores chances de chegar viva ao final das investigações. Sobretudo, o que a encantava era trabalhar com um homem tão simpático como o inspetor Charles Alan Pitzer. — Então? — perguntou este, impaciente. — Já se passaram os dois minutos. — Aceito — disse Brigitte, com voz rouca. — Duzentos dólares por semana, mais as despesas extra em champanha e perfumes franceses. E um novo apartamento, de luxo, na Quinta Avenida. Em troca, eu ajudarei o FBI, com minhas reportagens no “Morning News”. Vocês terão sempre uma cópia. — Oh, não! — exclamou o inspetor, sério. — Queremos a primazia. Você só publicará aquilo que for do nosso interesse. A partir deste momento, miss Montfort, você é minha funcionária e só recebe ordens minhas! Para começar, dê-me informes pormenorizado sobre os seus planos, na caça aos UFOS! Você nunca mais me apanhará desprevenido! — Nada feito — retrucou a garota, afundando no assento. — Se vocês querem me usar, apenas como um dente da engrenagem, prefiro os meus cinqüenta dólares semanais! Quero liberdade para agir, inspetor. Só trabalharei para o FBI com autonomia. Posso receber suas ordens e reportar-lhe as informações que julgar útil, mas os senhores não entrariam nos escaninhos do meu cérebro! Não sou um computador eletrônico! Ou liberdade de ação, ou nada feito! — Mas as normas do FBI... — Pense bem! O senhor tem dois minutos para decidir! Caiu um novo silêncio no carro. O homem do FBI mordia nervosamente o lábio inferior. — Okay, menina. Autonomia. Mas ponha-me sempre a par de suas andanças e seus palpites. Brigitte empertigou-se e apertou-lhe a mão, com energia. Depois, começou a falar. Mas disse apenas aquilo que lhe convinha, sem aludir ao seu plano para desmascarar os anões dos UFOS. O inspetor Pitzer ouviu tudo calado, tamborilando com os dedos no encosto do banco. Afinal, perguntou: — Mas os russos falaram, não? — Só um deles. Ygurin Nasimov. Foi morto por algum agente dos UFOS, é claro. Os homens que manejam os discos querem que as autoridades pensem que se trata de uma ameaça soviética. Ygurin e Boris eram técnicos em chantagem espacial e foram mortos porque iam provar que a Rússia não tinha nada a ver com os UFOS. O senhor entende alguma coisa, chefe? — Não. Você já pensou na China Popular? — Já. Mas tenho uma idéia melhor. De qualquer maneira, em primeiro lugar temos que agarrar um UFO. Ou, pelo menos, fotografá-lo. — Meio difícil, você não acha? — Nem tanto — respondeu a bela repórter, sorrindo maliciosamente. — Agora, sou uma agente do FBI, com privilégios federais. Tenho um plano, sim senhor, mas ainda não posso revelar os seus detalhes. Está tudo aqui dentro, num escaninho do meu cérebro. — Cuidado — advertiu o inspetor Pitzer, encarando-a.
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