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Sob as Estrelas
Copyright © 2018 Amie Knight
Copyright © 2022 Editoria Five
Todos os direitos reservados.
Produção Editorial: Grupo Editorial Five
Arte de Capa: Bia Santana Design
Tradução: Laira Tomaz
Preparação e Revisão: Equipe Infinity
Diagramação: Carol Dias
Nenhuma parte do conteúdo desse livro poderá ser
reproduzida em qualquer meio ou forma — impresso, digital,
áudio ou visual — sem a expressa autorização sob penas
criminais e ações civis.
Esta é uma obra de ficção. Nomes, personagens, lugares
e acontecimentos descritos são produtos da imaginação da
autora. Qualquer semelhança com nomes, datas ou
acontecimentos reais é mera coincidência.
Sumário
Início
Prólogo
Capítulo 1
Capítulo 2
Capítulo 3
Capítulo 4
Capítulo 5
Capítulo 6
Capítulo 7
Capítulo 8
Capítulo 9
Capítulo 10
Capítulo 11
Capítulo 12
Capítulo 13
Capítulo 14
Capítulo 15
Capítulo 16
Capítulo 17
Capítulo 18
Capítulo 19
Capítulo 20
Capítulo 21
Sobre a autora
Sobre a editor
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DEDICATÓRIA
 
Para Jackson e Violet. Nunca se esqueçam que, às vezes, as
noites mais escuras produzem as estrelas mais brilhantes. Por
isso, olhem sempre para o alto. Amo vocês daqui até a lua.
Melhor ainda, amo vocês daqui até Plutão.
LIV
Presente
Só na escuridão você consegue ver as estrelas. Eu
sabia disso melhor do que ninguém. Ele também, mas por
razões diferentes.
Ele vivia no escuro.
Eu adorava as estrelas.
Que belo casal nós éramos.
Eu as exaltava, iluminada por suas luzes cintilantes.
Ele se escondia delas, envolto pelas sombras da
noite.
Eu dançava sob o brilho radiante.
Ele se ocultava na escuridão que as rodeavam.
Um céu de sonhos. Era isso o que elas eram para
mim.
Mas ele insistia em dizer que meus sonhos eram
apenas nuvens de gás, hidrogênio e poeira que entravam em
colapso em sua própria força gravitacional. Ele apontava para
o céu com seriedade, seu olhar austero, e me dizia que à
medida que as nuvens desmoronassem, a matéria em seu
ponto central começaria a esquentar. Aconchegada entre suas
pernas, nossas costas apoiadas no chão duro, ele dizia: Uma
estrela nasce bem naquele núcleo quente, no coração de uma
nebulosa em colapso, Luna. Aquela nuvem teve que morrer
pelos seus sonhos. Zombava.
Ele diz ciência e eu digo sonhos.
Eu era boba. Apenas uma garota com ideais e
desejos demais, que dependiam de todas aquelas luzes
cintilantes para se tornarem realidade. Ah, como eu amadureci
no último ano.
Achava tão lindo sermos como as estrelas. Ele e eu.
Nossa luz e escuridão. Só que agora, percebia o quão triste
era para nós dois termos tanto em comum com as estrelas que
eu tanto amava. Como nos unimos diante das circunstâncias
mais extenuantes. Por mais que tentássemos combatê-las
com cuidado, sem pressa, não conseguíamos. Estávamos
conectados, sem defesa, por uma força mágica e
desconhecida. Foi o encaixe perfeito. Quando finalmente
ficamos juntos, não foi uma simples faísca. Foi puro fogo.
Poderíamos ter deixado o mundo em chamas. Sem dúvida
deixamos. Queimamos ardentemente.
Intensamente. Até sermos extinguidos.
Mas como? Eu ainda ardia por ele.
Uma estrela se tornou realidade.
Um sonho nasceu.
No entanto, até mesmo as estrelas e os sonhos
morriam.
E, meu Deus, meu coração doía por isso.
Tic-tac. Tic-tac. O relógio na parede mostrava ser três
e vinte cinco da tarde. Cinco minutos e eu estaria livre. Não
livre para ir embora. Ou livre para amar. Ou livre de uma vez
por todas. Mas livre desta aula e de seus olhares. Engoli o nó
de emoção em minha garganta, e a saliva encheu minha boca
enquanto meu estômago se revirava. Estava me sentindo mal.
Mas não podia pensar nele aqui. Não onde as pessoas podiam
me ver. Não onde eu tivesse que compartilhá-lo.
Encarei o calendário próximo ao quadro branco, meu
joelho movia-se inquieto debaixo da carteira e meu coração
disparava.
Não chore, Livvy. Sua voz entrou em minha cabeça
sem esforço, com tanta liberdade que poderia ter sido a minha.
Mesmo com minha pulsação diminuindo, meus lábios ainda
tremiam. Mesmo que ele estivesse a quilômetros de distância,
sua calma se espalhava sobre mim como a rebentação.
Quatro dias. Faz quatro dias que estou aqui. Meu
inferno particular. Quatro longos dias desde que o vi. Desde
que senti seu cheiro. Desde que o senti. Fechando os olhos,
respiro com calma. As galáxias por trás das minhas pálpebras
fizeram com que eu as abrisse de novo.
O arrastar de uma cadeira no chão de azulejos
chamou minha atenção e, sem aviso, meu olhar se voltou para
a garota ao meu lado. Seus olhos se arregalaram e eu abaixei
minha cabeça quando a ouvi sussurrar apressadamente para a
outra garota.
— O que há de errado com ela?
Tudo estava errado comigo. Com o mundo.
O sinal não tão familiar tocou e, mesmo assim, eu
praticamente corri da sala de aula e do prédio, a sensação de
asfixia me fazendo voar. Meus chinelos batiam com raiva pela
rua enquanto eu atravessava o pátio em direção a entrada do
dormitório, onde parei e olhei para os quatro andares até ver
minha janela. Eu odiava aquela janela, este prédio. Respirei
fundo, ansiando pela capacidade de respirar que nunca se
concretizou.
A lembrança da voz sempre contida da minha
madrasta me atingiu.
— É para o seu próprio bem, Livingston. Ele é apenas
uma fase. Vai passar. Você vai ver. — Ela acariciou minha
cabeça como se eu fosse um animal e não uma filha. — Você
vai me agradecer depois, — ela disse naquele exato local. Seu
cardigã rosa-claro sendo soprado pela brisa sobre a blusa
branca perfeitamente passada.
Olhei para as pérolas ao redor de seu pescoço,
passando de irritada para enfurecida.
— Se ele é só uma fase que vai passar, então por
que raios eu estou aqui? — Falei com os dentes cerrados.
— Olha como você fala, Livingston. Damas não falam
desta maneira.
Ele não era só uma fase. Ele não era apenas uma
coisa qualquer. Como ele poderia ser algo qualquer quando
era tudo? Mesmo aos dezessete, eu sabia disso. Ele era único
— a estrela mais brilhante no meu céu.
Corri do elevador e das pessoas que eu sabia que
iriam ocupá-lo, e segui em direção à escada. Não aguentaria
ser encarada. Subindo rapidamente os degraus, eu as senti;
as lágrimas que segurei o dia inteiro. Elas atingiram meus
olhos como se fossem piscinas, escorrendo pelo meu rosto e
pescoço. Havia lágrimas demais para serem contadas.
Tristeza demais para ser carregada. Levei minha mão ao peito.
Queria poder transpassá-lo, agarrar meu coração e jogá-lo
escada abaixo. Como poderia ser minha fonte de vida e, ainda
assim, me machucar tanto? Abri a porta no topo da escada e
corri para o meu quarto, no quarto andar. Empurrando a porta,
um soluço atingiu minha garganta. Eu não aguentava mais.
Ecoava por todo o quarto e só piorava a dor em meu peito.
Aliviada e ao mesmo tempo devastada por estar sozinha, caí
na cama, apertando o travesseiro em meu rosto. Minhas
lágrimas deixaram o tecido encharcado e meu travesseiro
quase não encobria minhas lamúrias.
Pronto. Eu morreria de sofrimento. Era isso o que
estava acontecendo, certo? Nunca tinha vivido algo tão
debilitante. Tão excruciante. Tão horrível. Eu não me sentia
assim desde que perdi meu pai.
Como vou seguir em frente sem ele? Será que ele me
esqueceria? Nos esqueceria? Esqueceria as estrelas? Onde
ele estava agora? Estava bem? Estava tão dilacerado quanto
eu? Deitei de lado, puxei as pernas para o meu peito e as
segurei lá, balançando meu corpo.
E fiz o que tenho feito nos últimos dias. Pensei nele.
Em seus olhos azuis claros, emoldurados pelos cílios mais
grossos e escuros que já vi. Pensei nas pequenas rugas ao
redor de seus olhos quando ele me dava um de seus raros
sorrisos. Aqueles sorrisos que me faziam sentir como se fosse
a única garota do mundo. Imaginei seus lábios cheios e
rosados quando ele sorria, aquele dente torto em sua boca
que roubou meu maldito coração há mais de um ano.
Voltei a pensar em Adam Nova e seu jeito bad boy de
ser. Em suas respostas monossilábicas que me deixavam
louca. Seu longo cabelo escuro que eu amava acariciar. Sua
maneirade me amar que não se comparava a nenhuma outra.
Voltei para o nosso espaço e tempo. Para a campina
que separava nossas vidas e nossos corações. Para o
começo. Para o começo do fim.
Fiquei deitada no quarto lembrando de nós dois.
Lembrando de quando eu repousava sob nossas estrelas.
Quando eu vivia sob suas estrelas.
LIV
Passado
— Espere, Liv! — Ouvi alguém chamar atrás de mim,
mas fingi não ter ouvido. Eu estava em uma missão, e essa
missão era ficar o mais longe possível desta escola em um
curto período de tempo. — Liv! Sei que você está me ouvindo.
Ah, pelo amor de Deus, ele não ia desistir. Revirei os
olhos. Braden era idiota, mas, pelo visto, não tão idiota assim.
Quem teria imaginado?!
Coloquei um sorriso artificial no rosto e me virei.
Enfiando os polegares nas alças da mochila que estava em
meu ombros, perguntei:
— E aí?
Na verdade, eu não dava a mínima para o que estava
acontecendo. Só queria que ele largasse do meu pé para que
eu seguisse meu caminho. Depois de um dia inteiro brincando
de faz de conta com meus colegas metidos da escola e mais
uma hora de aula de piano que só suportei por causa da minha
madrasta, eu só queria ir embora daqui. Queria chegar em
casa, devorar meu jantar o mais rápido possível, e me
esconder em meu quarto. E em seguida, ver as estrelas.
Arqueei minha sobrancelha para Braden, expressão
que só poderia ser interpretada como desembucha logo.
Ele se mexia para lá e para cá nervosamente,
passava a mão pelo cabelo loiro, mas eu o conhecia. Sua
exibição exagerada não me enganava. No entanto, suas
palavras seguintes me deixaram em choque.
— Você vai ao baile?
Ele estava me chamando para sair? Ah, caramba,
não. Isso não estava acontecendo. Ele só podia estar
brincando. Senti meus olhos se arregalarem de pânico quando
olhei ao redor do pátio em busca de possíveis rotas de fuga.
Eu não iria ao baile. Muito menos com Braden. Por que ele
estava me convidando? Olhei para os meus tênis brancos que,
como nós do sul gostávamos de dizer, calçavam os pés das
pernas mais esguias já vistas, e para o meu uniforme de
colegial com saia plissada azul marinho e camisa polo branca.
Sim, percebi que era um clichê ambulante. Eu me aborrecia
comigo mesma.
Havia um monte de garotas que não tinham esguias
andando por aí. Que não eram tão altas. Tudo o que eu tinha a
oferecer quando o assunto era garotos, eram meus seios
grandes e, bem, eles eram grandes demais. Braden poderia
chamar qualquer garota do Preparatório Saint Ashley. Ou seja,
ele poderia muito bem escolher qualquer garota chique de toda
a requintada ilha de Saint Ashley.
Além do mais, Saint Ashley era tão pequena que todo
mundo se conhecia. Muito bem, se quer saber. Todos estavam
sempre envolvidos na vida dos outros. A dinâmica na ilha era
incestuosa demais para o meu gosto. Saint Ashley ficava bem
na costa de Madison, Carolina do Sul. Eu considerava a ilha
mais um resort do que um lugar para morar. Os nativos eram
ridiculamente ricos, moravam nas monstruosidades que
chamavam de mansões e que pontilhavam a costa leste da
ilha, e as crianças eram repugnantes de tão mimadas.
Tínhamos uma escola que ia da alfabetização até os doze
anos. Um mercado. E só Deus sabe como o modesto Piggly
Wiggly que ficava no meio da cidade, ainda estava lá de pé,
com uma elegante cafeteria em seu interior. O mercado era a
única coisa normal em Saint Ashley e, nem era tão normal
assim. Basicamente, o que quero dizer é que Livingston
Montgomery pertencia tanto a esta ilha quanto um peixe
pertencia à terra firme.
Eu era um peixe fora d’água ou, pelo menos, era o
que parecia na maioria dos dias. Não me entenda mal. Eu era
rica. Cheia da grana se você perguntasse à minha madrasta,
mas sou de origem humilde. As pessoas desta ilha nasceram
ricas. Elas morrerão ricas e nunca saberão o que é passar por
apertos na vida. Elas são o que os sulistas gostavam de
chamar de nascidas em berço de ouro. Eram respeitadas. Não
nasci com dinheiro, seria uma rica emergente aos vinte um
anos quando herdaria a fortuna do meu pai, e ninguém daqui
achava que os emergentes valiam muito. Estava cansada,
entediada e inquieta, vagando pela multidão com Louboutin,
Versace e Mercedes. Essas pessoas se orgulhavam do que
possuíam, mas não de quem eram. Era exatamente por isso
que jamais poderia sair com Braden.
Ele era o capitão do time de futebol americano que a
ilha inteira exaltava, mas a verdade é que eles eram ruins.
Demais.
Braden conseguiu, de alguma forma, enganar o
restante das garotas da escola com sua atuação recatada,
mas ele não me engana. Esse cara poderia ser um ótimo ator.
Nem mesmo sua boa aparência me seduziria. Como agora,
com o jeito tímido e adorável com que inclinava a cabeça, as
mechas loiras cobrindo seus olhos, ou com a maneira como
ele se balançava de um pé para o outro em uma
demonstração de nervosismo, mas eu sabia que Braden não
tinha nada de tímido. Ele agia como se fosse modesto, quase
retraído. Mas eu já vi e ouvi sobre coisas que ele tinha feito.
Afinal, ele era o melhor amigo do meu adorável irmão postiço.
Sem encontrar um modo de sair dessa conversa, eu
me virei e comecei a andar na direção que estava indo.
— Não vai rolar, Braden.
Não estava sendo maldosa, mas de jeito nenhum eu
deixaria Braden me levar a lugar algum. Sem contar que
Sebastian perderia a cabeça. Não que eu me importasse, mas
não precisava que ele ficasse no meu pé mais do que já
ficava.
— Espere, Liv. — Uma mão quente pousou sobre o
meu ombro. Soltei um longo e exausto suspiro antes de me
virar para encarar Braden. Eu estava procurando uma
desculpa para dizer não; ele estava me encurralando e isso
não me caía bem.
— Sebastian não vai gostar, — joguei essa como se
fosse o arremesso vencedor em uma partida de baseball.
Estava jogando sujo, mas esse era o jogo em Saint Ashley.
O brilho de Braden sumiu e eu quase me senti
culpada, até lembrar de sua conversa que ouvi sobre garotas
com meu irmão postiço. O jeito como eles humilhavam e
desrespeitavam todas as garotas com quem namoravam… Ele
passou a mão pelo cabelo em uma boa demonstração de
como seus bíceps se flexionavam. Sentia como se meus olhos
fossem saltar para fora da minha cabeça e a culpa foi embora
junto com minha paciência.
— Posso ir agora? — Meu ombro esbarrou no dele
quando iniciei uma rápida caminhada de vinte minutos para
casa.
Ele deu um passo ao meu lado.
— Seb não vai se importar, — sua voz era rude,
determinada, e percebi que isso seria mais difícil do que eu
imaginava. Ele queria mesmo sair comigo. Era cômico. Nós
nos conhecíamos fazia anos, e ele nunca tinha dado em cima
de mim. O que havia mudado?
Uma risada amarga escapou dos meus lábios.
— Sebastian vai matar você, Braden, e você sabe
disso. De qualquer forma, por que você quer sair comigo? A
tropa de garotas bonitas e burras finalmente se deu conta do
seu caráter?
Ele fazia todas as garotas da escola caírem aos seus
pés. Babarem por sua boa aparência e seu carrão.
Me alcançando, ele segurou entre seus dedos uma
grossa e longa mecha de cabelo castanho e a esfregou.
Inclinei minha cabeça para trás e acelerei meus passos.
— Sempre gostei de você, Liv.
Balancei a cabeça e senti meu rosto corar de
vergonha.
— Não, não gostou.
Ele parou na calçada de repente, me fazendo parar
também, e nossos corpos se tocaram. Eu me encolhi com o
contato.
— Não estou nem aí para o que Sebastian disser. Eu
quero você.
Seu olhar me lembrou o olhar de Sebastian, me
causando arrepios, mas eu não era de ficar sem jeito. Aprendi
desde os dez anos — quando meu pai se casou com o
demônio em pessoa e nos trouxe para este fim de mundo —
que eu teria que ser firme. Forte. Ou esta ilha e seus
habitantes me arrastariam para as profundezas e, em algum
momento, eu estaria submersa demais para voltar à superfície.
Ainda bem que eu era uma ótima nadadora. Meu pai fez
questão de que eu aprendesse a nadar antes de falecer.
— Não estou interessada. — Segurei minha mochila
com mais firmeza e disparei em uma corrida, deixando Braden
comendo poeira, seucabelo loiro e boa aparência apenas um
pontinho distante quando tive a chance de olhar para trás.
Caminhei pela rua principal, o mar de um lado e uma
fileira com lindas casas do outro. Você deve pensar que uma
garota de dezesseis anos estaria vivendo um sonho. Pelo
contrário, minha vida parecia um pesadelo do qual não
conseguia acordar enquanto caminhava pela ilha com a
sensação de que uma bola de boliche tinha se instalado em
meu estômago. Ir daquela escola até minha casa era como
trocar seis por meia dúzia. Eu odiava os dois, mas tinha só
dezesseis anos. Eu poderia suportar, conseguiria chegar ao
meu aniversário de vinte e um. Até que eu herdasse o dinheiro
que meu pai me deixou. Até que eu pudesse cair fora daqui.
Até lá, eu tinha minhas estrelas e minha campina.
Parei em frente a uma enorme casa de estuque. Faz
seis anos que estou aqui e ainda não me sentia em casa.
Agora que meu pai se foi, sabia que nunca me sentiria. Afinal
de contas, este não era o lugar que ele teria escolhido para
viver. Não, esta casa era a cara da Georgina. Dos tapetes
florais até as toalhas rosas penduradas no banheiro. Era
enjoativa e cheia de frescura com um lado imenso de cafonice.
O enorme chafariz no meio de nossa entrada circular de carros
dizia tudo. Sereias de pedra, cupidos, corações e água. Era
ridículo.
O meu olhar disparou para a esquerda e torci o nariz
para a BMW conversível vermelha estacionada na entrada de
carros. Ótimo, Sebastian já estava em casa. Ele geralmente
ficava no treino de futebol ou vagabundeando com os amigos
ou, ainda, tirando a virgindade de alguma desavisada para dar
um pé na bunda dela no dia seguinte, o que me livrava de sua
presença detestável. Mas não hoje.
Se não fosse pelo meu golden retriever, Harry, eu
provavelmente teria virado as costas e ido para a praia. Não
poderia deixá-lo sofrer sozinho.
Deixei meus ombros caírem ao subir os degraus e
entrar no grande saguão de mármore. Fechei a porta da frente
em silêncio, mas passos vindos da escada ecoaram, e soube
que não conseguiria ir para o meu quarto sem ser notada.
Sebastian. Ele podia ser atraente para algumas. Na
verdade, sabia que era pelo jeito como as garotas da escola
perdiam tempo com ele. Mas eu não. Tudo o que via era
maldade. Aquela maldade enorme e sombria que vivia em
Sebastian desde o momento em que o conheci anos atrás. Ela
transbordava de seus ouvidos e olhos como se fosse uma
névoa pesada que encobria o oceano pela manhã. Maldade.
Era tudo o que eu via.
— Livingston, — a maneira como ele disse meu nome
fez minha boca encher de saliva. Ele disse de forma reverente
e obscena. Sua voz era baixa, carregada com desejo e
falsidade. Fiquei arrepiada.
Ele se inclinou contra a parede da grande escadaria,
com todo aquele ar falso de indiferença, me impedindo de ir
para o meu quarto. Sim, eu sabia que para alguns, Sebastian
era lindo. Mas já vi em primeira mão as sombras que se
espreitavam nas profundezas da alma desse garoto sombrio.
Seus cachos macios, longos e castanhos, e seu sorriso branco
cintilante não me enganavam. Seus olhos castanhos e
brincalhões não me iludiam. Eu sabia quais tipos de jogos ele
queria jogar. Os do tipo que perturbam.
— Onde está Georgina? — Perguntei estupidamente,
como se ela fosse me salvar. Socorro, era cômico. Aquela
mulher só pensava em uma pessoa; nela mesma.
Uma risada amarga escapou de seus lábios.
— Sei lá. — Ele levantou o copo, tomou um gole e
finalmente desceu a escada em minha direção, como se fosse
dono do lugar. E de muitas maneiras, ele era. — Quem se
importa?
Fiquei parada. Não me afastei. Sabia por experiência
própria que no momento que eu demonstrasse fraqueza ele
estaria em cima de mim. Era o medo. Ele o amava. O predador
que vivia dentro dele podia farejá-lo. Ele rolaria nele,
mergulharia, e depois sorriria igual a um maníaco.
Seu mocassim elegante tamborilava no chão de
mármore à minha frente, e eu continuava parada como uma
estátua. Ele era apenas um ano mais velho que eu, mas
parecia ser muito mais alto e infinitamente forte.
Ele se inclinou, seu nariz quase tocava a curva do
meu pescoço, e eu sentia em seu hálito o cheiro do conhaque
caro que Georgina gostava de ter em casa. Fiquei com ânsia
de vômito.
Ele respirou fundo, como um homem ávido por ar.
Estava com fome de algo e isso me assustou. Me assustava
desde o início. Eu sempre soube.
— Humm, — sussurrou perto de meu pescoço, e eu
congelei quando seu nariz pairou sobre minha orelha, com
cuidado para não me tocar. Não, Sebastian era tão esperto
quanto assustador. Ele nunca me tocou. Ele se certificava de
nunca fazer nada que pudesse sobrar para ele depois. Era
terrivelmente paciente; estava esperando o momento certo
para atacar. Fazia isso há anos, me mantendo em alerta,
sempre com medo, sempre temendo.
Em pânico, mas tentando disfarçar o melhor que
pude, passei por ele, com cuidado para tocá-lo o mínimo
possível, e disparei pela escada para o santuário que era meu
quarto e a segurança que o lugar ainda me oferecia. Ele nunca
iria lá. Era o único lugar da casa que era meu.
— Você está cheirosa, Livingston. Do jeito que eu
gosto, — sua voz acentuada me fez parar nos degraus. Aquilo
me atingiu como um milhão de mãos sujas. Fiquei com enjoo.
Ele sempre me chamava de Livingston. Ele e a madrasta
perversa.
Senti o canto direito de minha boca se mover em um
sorriso, mesmo quando estava de costas para ele. Ajeitei
minha postura, pigarreei e me preparei para atingi-lo onde eu
sabia que iria doer. Desgraçado. Hoje eu venceria.
— Braden me chamou para sair hoje. — Subi a
escada correndo como um morcego que acabou de sair do
inferno, enxotei Harry para o quarto, e bati a porta atrás de nós
quando ouvi um copo quebrar lá embaixo.
Sim, o meu irmão postiço, Sebastian Carter West, era
ótimo em fazer jogos doentios, mas Livingston Rose
Montgomery estava ficando ainda melhor nisso, e isso me
assustava para caramba.
LIV
Eu tinha treze anos na primeira vez que cruzei a pé a
ponte da ilha de Saint Ashley até o continente. Hoje, estava
sozinha, mas naquela época, não. Nesta noite eu era como
uma ladra, que andava furtivamente, mas que só levava
consigo suas memórias.
A mão firme do meu pai envolvia a minha enquanto
fazíamos a travessia anos atrás. O cheiro de Old Spice no
nariz, o gosto de sal em meus lábios, um atípico carro
passando por nós. Tinha sido uma caminhada lenta, quase um
passeio. Naquela ocasião, ele mal podia andar, mas de
alguma maneira conseguiu cruzar a ponte. Ele não falava
muito. Não precisava. Éramos muito próximos um do outro, ele
e eu.
Em geral, nos comunicávamos através de pequenos
sorrisos e olhares que lançávamos em direção ao outro. Sim,
nós nos conhecíamos por dentro e por fora. As palavras não
eram necessárias entre nós. Naquela noite, as utilizamos
pouco enquanto andávamos pela calçada da ponte que
separava o continente da ilha. Minha mão estava quente na do
meu pai. Eu jamais esqueceria. Seria para sempre uma
daquelas noites que ficaria gravada em minha memória.
Principalmente porque foi a noite em que meu pai disse que
partiria logo. Uma parte de mim já sabia, mas uma parte ainda
maior estava em negação. Ele era tudo o que eu tinha. Minha
mãe tinha morrido ao me dar à luz. Certamente o destino
também não tiraria meu pai de mim.
Terminamos a travessia da ponte e entramos em uma
enorme campina do lado direito da estrada. Adentramos no
campo gramado até que tudo o que podíamos ver era a ponte
ao longe e as estrelas no céu, o oceano à distância, mas perto
o bastante para que ouvíssemos o som das ondas. Ele tirou o
cobertor azul que tinha colocado debaixo do braço esquerdo e
o estendeu na grama.
Nesta noite, usei o mesmo cobertor azul, só que em
vez de me deitar ao lado do meu pai com minha mão sobre a
dele, deitei sozinha, como fiz na maioria das noites que
consegui escapar para cá. E fiz o que ele me disse.
— Olhe para as estrelas, Liv. Se você se sentir
sozinha. Se você se sentir triste. Sempre estarei lá. — Ele se
virou para mim, seus olhos verdes solenes me prendendoem
seu abraço. — E aqui. — Tamborilou com os dedos sobre o
meu coração e, pensei que naquele momento, ele fosse
simplesmente parar de bater. Eu queria que parasse. Queria ir
com ele. Orei por isso nos meses que se seguiram. — Não
esqueça de olhar para cima, Liv.
Lágrimas encheram meus olhos e escorreram pelas
bochechas de uma quase mulher. Não é justo, eu quis gritar.
Como posso perder minha mãe e você?, quis berrar. Mas não
o fiz. Por ele. Apenas lhe dei um sorriso triste enquanto as
lágrimas inundavam minhas orelhas pequenas e as têmporas
sob meu cabelo castanho. Ele soltou um suspiro aliviado e
continuou deitado sobre o cobertor, apertando minha mão na
sua e colocando-a sobre seu peito. Senti as batidas contra a
parte de trás da minha mão. Inspirei a maresia e o cheiro do
meu pai naquela campina sob as estrelas. Seria a última vez
que ficaríamos sozinhos. A última vez que seria apenas nós
dois antes da chegada dos visitantes. A onda de despedidas
antes da morfina, das orações e do desfile interminável de
pessoas e enfermeiros.
“Olhe para as estrelas, Liv. Se você se sentir sozinha.
Não esqueça de olhar para cima”. Sempre estive sozinha.
Uma estranha em minha própria companhia. Apenas uma
garota cheia de sonhos e um passado cheio de assombrações.
Ainda assim, olhei para as estrelas e fiz um pedido. Ousei
sonhar. Por meu pai, um sonhador por si só. Por um homem
que construiu sua vida do zero. Por minha mãe, por uma vida
melhor. Por amor. E conversei com meus pais enquanto eles
se escondiam entre as estrelas. Contei para eles sobre o meu
dia, e orei para que eles ouvissem. Desejei ver uma estrela
cadente. Rezei pela paz. Não pela paz no mundo, porque
mesmo aos dezesseis anos, eu ainda era totalmente egoísta.
Não, rezei pela paz dentro de mim. E para ter forças para
continuar quando sentia que ninguém estava ao meu lado.
Naquela época eu não compreendia, mas aquela
seria a última vez que meu pai cruzaria aquela ponte de carro
ou a pé antes de sua morte.
Agora, eu sabia. Céus, eu sabia, mas odiava saber.
Por isso, vinha para cá nas noites em que a vida se
tornava difícil demais. Para a minha campina dos sonhos e
meu céu de desejos. Tentei não chorar esta noite. Não tem
sido tão ruim. Sebastian tem sido o que sempre foi. Mas não
era com ele que estava decepcionada; era comigo mesma.
Parecia que eu estava ficando como aquelas pessoas. Me
tornando maliciosa e maldosa. Negligente e egoísta; vingativa.
Uma calma que só esta campina poderia me dar, instalou-se
sobre mim. Senti meu pai aqui. Quase consegui imaginá-lo
deitado ao meu lado.
Rolei no cobertor até ficar de lado, olhando da ilha
para as luzes de Madison. Meu pai disse que lá não era
seguro para mim; mas aqui também não era. Madison era
linda com seu antigo encanto sulista, casas de estilo
neoclássico, e musgo espanhol. Mas não deste lado. Este era
o lado norte que me mantinha acorrentada a esta ilha e a esta
campina como se fosse uma prisioneira. Eu era medrosa
demais. Não era corajosa ou destemida. Eu havia sido
protegida daquele mal, talvez porque na vida eu já tenha
sofrido muito. Eu ainda era uma criança com uma dose
saudável de medo...
Mesmo assim, já tinha me aventurado um pouco para
aqueles lados e sabia que se eu me aproximasse furtivamente
do lado norte da campina, estaria sujo com cigarros, garrafas
quebradas e embalagens de camisinhas velhas. Eu sempre
me virava de costas e retornava para o cobertor azul e para os
meus sonhos. Isso porque eu sabia o que havia do outro lado
daquela ponte e da campina ao norte de Madison.
Vi o suficiente nas vezes que meu pai me levou para
passear. Cruzávamos a ponte na segurança do nosso carro
luxuoso e eu sempre encostava o rosto na janela, quase sem
entender o que estava vendo. Parecia um sonho meio
esquisito deixar a linda ilha de Saint Ashley e, dois minutos
depois, entrar naquilo que só poderia ser descrito como favela,
onde pessoas sem-teto, prostituição e drogas rolavam de
forma descontrolada. A divisão demográfica em Madison era
surpreendente, até para os meus jovens olhos. Eu sabia que
era errado. Ao que parecia, Madison tinha duas classes. A
muita rica e a muito pobre.
Disse para mim mesma que eu faria a diferença um
dia. Poderia fazer muito com o dinheiro que meu pai me
deixou. Não ficaria sentada nessa ilha pelo resto da minha
vida, vivendo alegremente sem saber o que estava
acontecendo com o mundo. Eu poderia mudar as coisas.
Ajudar.
Dias como o de hoje me fariam pensar o contrário,
mas eu sabia que não era assim. Estava me sentindo
estagnada. O confronto com Sebastian mexeu comigo. Estava
cansada daquilo. Exausta. Virei as costas para o céu, cruzei os
tornozelos e fechei os olhos. Era estranho. O jeito como me
sentia mais segura nesta vasta campina sob as estrelas do
que me sentia em casa.
Um farfalhar na grama e o estalo do que parecia ter
sido um galho chamou minha atenção e eu me sentei
rapidamente, olhando ao redor. Geralmente, eu trazia meu
golden retriever grande e pateta pela proteção que ele me
oferecia. Ele era doce e não faria mal a uma mosca, mas pelo
menos intimidava um pouco. No entanto, esta noite fui muito
cautelosa para não acordar Sebastian, por isso deixei o
cachorro em casa.
Eu costumava ficar atenta. Sabia por experiência
própria que não era a única que vinha aqui, mas acreditava
que este lado da campina, perto da ponte, era o mais seguro.
Estava claro que esse não era o caso. Não fui cautelosa. Três
homens que pareciam ser uns dois anos mais velhos do que
eu rodearam meu cobertor azul e ocultaram as estrelas com
seus corpos altos. Cada pelo do meu corpo se eriçou,
enquanto o pânico tomava meu peito.
— Caramba, pessoal, vejam o que temos aqui, — o
cara alto de cabelo escuro disse à minha frente. Sua calça
jeans suja e camiseta preta desbotada me disseram de que
lado da ponte ele era, e senti uma boa dose de medo.
Eu tinha bom senso suficiente para me mexer e tentar
me levantar do cobertor, mas o líder do grupo, que havia
falado antes, foi rápido como um raio e se agachou ao meu
lado. Puxei a bainha do meu vestido branco de verão para até
os meus tornozelos, fazendo questão de cobrir cada
centímetro meu.
Ele colocou uma mão firme sobre o meu ombro.
— Não, meu bem. Está tudo bem. Não precisa se
levantar por nossa causa. — Seus olhos castanhos e
indecentes me olhavam de cima a baixo. Sua mão foi do meu
ombro em direção ao meu tornozelo, todo o meu corpo ficou
rígido com o contato, mas tentei ao máximo não demonstrar.
— Qual é, cara. Deixe ela em paz. — Meu olhar se
afastou do meu tornozelo e disparou para o garoto atrás do
cara indecente. O loiro atrás dele passou a mão pelo cabelo.
— Vamos. — Ele olhou para o homem parado ao seu lado em
busca de ajuda, e meus olhos se voltaram para ele também,
esperando por algo. O negócio é que não parecia haver ajuda
por ali.
O cara estava me encarando. Não da maneira que
Sebastian fazia, mas como se estivesse tentando me entender.
Como se estivesse me analisando. Engoli em seco enquanto
assimilava seus olhos azuis congelantes escondidos atrás de
suas longas franjas pretas. Mas não, não foram aqueles olhos
que me fizeram parar, que aceleraram minha pulsação. Ele era
coberto por tatuagens. Elas não se escondiam debaixo das
mangas de sua camisa. Não, esse cara as vestia como se
fossem roupas. Elas cobriam seus braços e surgiam pela gola
em seu pescoço. Ele me intimidava. Talvez fossem as
tatuagens. Talvez os frios olhos azuis ou o fato de que ele não
estava sorrindo e dava a impressão de que não me ajudaria
em nada. Pelo contrário, ele me olhava como se quisesse me
desembrulhar e analisar todas as partes. A intensidade era
abrasadora, seu olhar inabalável.
Eu estava fodida. E eu não usava essa palavra à toa.
Nunca ninguém se aproximou de mim aqui. Se eu já tinha visto
pessoas que me assustavam? Sim. Mas sempre ia embora
antes que elas fizessem contato. Saía correndo. Nunca havia
sido encurralada, muito menos por três homens, onde dois
pareciam querer me comer viva em uma grande mordida.
Engoli o nóem minha garganta que era do tamanho de uma
bola de golfe.
Considerei minhas opções naquele cobertor. Eu me
levantaria e iria embora. Correria. Eles poderiam me alcançar,
mas eu era alta e rápida. Porém, os chinelos em meus pés
poderiam me desacelerar. Eu os deixaria para trás. Correria.
Lutaria mesmo que o medo me fizesse tropeçar.
O cara agachado perto de mim sorriu com presunção.
— O que você está fazendo aqui sozinha, meu bem?
— Ele olhou em direção à Saint Ashley antes de voltar seu
olhar para mim. — Você é da ilha, não é? Veio visitar a ralé
hoje? — Seus dedos rodeavam meu tornozelo e a pele
sensível atrás do meu joelho. Temor atravessou minha
garganta. Eu me afastei em um sobressalto, assustada e
irritada, com meu coração batendo tão forte na garganta que
conseguia senti-lo em todo o meu corpo.
— Vamos nessa, Boone. Vamos sair daqui, — o cara
loiro falava e puxava a manga da camisa de Boone. Enquanto
isso, o tatuado me encarava, seu olhar penetrante parecia
enxergar o outro lado da campina através de mim. Eu não
fazia ideia se ele queria me chutar ou me provar. Era
insuportável.
Eu não podia acreditar nisso. Quantas vezes por dia
uma garota podia ser assediada? Vim para cá para me distrair.
Olhei nos olhos do loiro e supliquei mentalmente a ele. Meu
Deus! Nem mais a minha campina sob as estrelas era segura.
Eu me sentia impotente. Tentei levantar, mas o homem
chamado Boone colocou a mão em meu joelho e me
empurrou, me mantendo sentada. O medo me atingiu como
gelo, e lágrimas invadiram meus olhos. Eu estava ferrada.
Seria estuprada e possivelmente morta na campina do meu
pai. Eu entraria para a estatística. Seria mais uma garota
imbecil que tomou uma decisão estúpida e se tornou um
número.
O meu olhar encontrou novamente os olhos azuis do
cara tatuado, e eles desceram até o meu joelho, para o local
onde a mão de Boone estava. Seu olhar se concentrou na mão
de Boone e se manteve fixo lá, me enrijecendo de medo.
Fechei os olhos, orando por alguém, algo, qualquer
coisa...
— Já chega.
Minhas pálpebras se abriram e, mais uma vez, meus
olhos se depararam com íris azuis. Notei que neste momento
todos os olhares estavam sobre ele. Sua declaração foi tão
clara, inesperada, tão brutal, que todos ficamos apenas
observando e aguardando.
— Agora, — ele concluiu de forma breve, seus lábios
rosados curvando-se lentamente a cada palavra,
determinados. Foi um comando; uma ordem e não um pedido.
Sua voz firme como um trovão no meio do campo tranquilo,
sua expressão indecifrável.
Boone revirou os olhos e soltou um suspiro, sua mão
se afastando da minha perna.
— Está bem. Vamos. Ela deve ser virgem de qualquer
maneira. — Ele se levantou rapidamente e limpou a calça,
como se não tivesse me matado de medo e agido como um
animal. Olhei para o cara com as tatuagens, tentando
agradecê-lo com o olhar, mas ele apenas me encarou. Seus
olhos azuis entediados. Inexpressivos.
Ele se virou e seguiu em direção ao lado norte de
Madison, sem olhar para trás, o loiro cambaleando atrás dele,
lançando olhares arrependidos sobre os ombros. Foi Boone
quem saiu por último deixando palavras de despedida, seu
olhar malicioso deslizando pelo meu corpo mais uma vez.
— É melhor ter cuidado por aqui durante à noite, meu
bem. É perigoso, sabia?
Era uma ameaça, mas pareceu uma promessa. Eu
sabia. E agora, sabia mais ainda. Lugar algum era seguro.
ADAM
A picada da agulha era boa. Boa demais. Estremeci
quando Raven tocou a pele na base do meu pescoço com a
tinta. Particularmente, eu era sensível ali. Algumas pessoas
deviam pensar que era por isso que vinha até aqui. Porque eu
gostava da dor. Porque eu me satisfazia com ela, mas isso não
era verdade. A verdade era que minhas tatuagens eram o
disfarce perfeito. Eu me escondia atrás das obras de arte que
cobriam meu corpo. Cada cor, cada imagem era uma história
que escondia a minha. Eu gostava disso. Quando as pessoas
me olhavam, elas não me enxergavam. Elas viam minhas
tatuagens. Elas não queriam conversar comigo, não queriam
me conhecer. Eu adorava e odiava.
— Quase terminando aqui, — Raven sorriu por trás
de seu nariz furado e cabelo desgrenhado. Éramos amigos
desde o primário e ela praticava sua arte em mim desde que
me entendo por gente. No ensino médio, eu era a tela em
branco perfeita e agora, aos dezenove anos, meu torso,
braços e grande parte do meu pescoço estavam quase
completamente cobertos. Escondidos. Do jeito que eu gostava.
— Sem pressa. — Eu não tinha nenhum lugar para ir.
Era um dos raros dias de folga do trabalho. Outro lugar em que
podia me esconder. E eu não estava a fim de ficar
perambulando pela rua com Boone e Grady, me envolvendo
sabe-se lá com o quê. Não tinha muita coisa para fazer neste
lado de Madison, na Carolina do Sul. Eu tinha dezenove anos
e era um pobre coitado como o restante das pessoas deste
lado da cidade. Mal conseguia me virar com o salário do meu
emprego de meio-período e trabalhava duro para conseguir
entrar na faculdade da região. A única coisa que tinha a meu
favor era Raven e as tatuagens que ela me dava de graça.
Raven era a salvação de muitas maneiras. Nos
conhecíamos desde o ensino fundamental. Ela se sentou perto
de mim no jardim de infância e o resto é história. Éramos duas
crianças desajeitadas que se aproximaram por causa de sua
estranheza. Nunca namoramos. Isso sempre esteve fora de
cogitação, principalmente porque Raven é lésbica e eu, bem,
sou um babaca. Ela conhecia todos os meus segredos; todos
os meus medos e inseguranças. E por mais que parecesse ser
durona com seu cabelo escuro, piercing no nariz e um monte
de tatuagens, ela ainda era a pessoa mais gentil e
compreensiva na minha vida.
— Não vai trabalhar hoje? — Ela perguntou em meio
ao zumbido da pistola de tatuagem, sem tirar o olhar da
agulha.
— Não.
Ela arqueou a sobrancelha direita.
— Nem vai dar um rolê com os caras? — Sua voz
estava cheia de sarcasmo e eu quase dei um sorriso. Raven
não se importava muito com Boone e Grady. Eu não a culpava
por isso. Ao longo dos anos eles provaram ser mais
encrenqueiros do que deveriam. Boone parecia estar elevando
o nível de babaquice ultimamente.
— Não. — Eu não estava com estômago para eles
esta noite. Assim como Raven, conhecia ele e Grady desde a
infância. Não éramos tão próximos quanto Raven e eu, mas
moramos no mesmo prédio decadente a nossa vida inteira.
Parecia que quanto mais velhos ficávamos, mais louco Boone
se tornava. Uma parte de mim entendia. Ele se sentia
estagnado como todos nós. Só que quanto mais velho Boone
ficava e quanto mais ele precisava suportar a nossa situação,
menos ele se importava. Ele estava ficando assustador. E
irritante para caralho.
Em meio ao zumbido e à ardência da agulha, pensei
na garota da campina. Aquela do vestido branco e cabelo
escuro de duas noites atrás. A que Boone colocou as mãos.
Senti meus punhos cerrarem e pude ouvir o estalar dos meus
dedos. Aquilo tinha me irritado de um jeito irracional. Eu era
quieto e reservado, e, geralmente, deixava Boone conduzir as
coisas. Por que eu me importava se ele tinha tocado em uma
daquelas vadias ricas da ilha? Sabia que ele não a
machucaria. Talvez a matasse de medo, mas não era
problema meu. Ou nunca tinha sido antes daquilo acontecer.
Mas o medo em seu rosto naquela noite me fez hesitar. Na
verdade, tudo nela me deixou hesitante. Ela tinha uma
aparência rara. Suas pernas eram esguias, seu rosto longo
demais. A oposição de sua boca larga e seu pequeno nariz
arrebitado era surpreendente, mas o que realmente me fez
hesitar foram seus olhos. Eles eram escuros, marrom
chocolate, com os cílios mais grossos e fartos que já vi.
Apesar do meu desejo de me afastar e deixar Boone
se divertir, fui incapaz de ignorar aqueles olhos. Aqueles
globos tristes e escuros imploravam por socorro. Garota idiota.
Ela não devia estar lá. Era perigoso. Muitos jovens não
entendiam que as regras de sua preciosa ilha não se
aplicavam ao lado norte de Madison. Aqui era um querendo
ferrar o outro. Nós trabalhávamos, roubávamos,
trapaceávamos.Não nos dávamos ao luxo de observar as
estrelas por diversão.
Ainda assim, minha mente não conseguia deixar de
pensar nela de vez em quando, e isso me irritava. Como uma
garota deitada em um campo sob as estrelas me deixava tão
irritado? Foi porque eu me preocupei com ela. E eu não
precisava de mais uma preocupação em minha vida. Já tinha
muita coisa na cabeça tendo que cuidar do meu pai deficiente.
Só que eu não conseguia evitar... Não pude deixar de pensar
que ela não teria tanta sorte na próxima vez que atravessasse
aquela ponte. Quantas vezes ela tinha contado com a sorte?
Droga, até onde eu sabia, a garota poderia estar lá neste
momento. O vestido branco esvoaçava ao seu redor. De longe
ela parecia a lua sobre uma cortina de milhares de estrelas no
céu. Mas ao que parecia, ela definitivamente já havia deitado
lá em outra ocasião; estava muito confortável naquele cobertor
azul e macio que empalidecia debaixo dela. Não pude deixar
de torcer e orar para que ela tivesse aprendido a lição naquela
noite e ficado longe daquela campina, na parte segura da ilha
que devia ser um mundo completamente diferente.
— Como está o meu coroa gato? — A voz de Raven
interrompeu meus pensamentos.
Revirei os olhos.
— Ah, porra. Pare de chamar meu pai dessa merda.
É nojento.
Ela deu de ombros.
— E daí? Mesmo sendo lésbica posso admirar
homens hispânicos atraentes, — ela arqueou as sobrancelhas.
Meu pai porto-riquenho causava aquele efeito nas
pessoas. A maioria das mulheres o achava bonito. Mesmo
com a perna deficiente, ele ainda atraía mulheres com
frequência. Ele foi brutalmente assaltado há cinco anos
quando voltava para casa de seu trabalho como mecânico na
cidade. Ele se recuperou por completo, com exceção de sua
perna direita que ficou ferrada. Não conseguia andar para cima
e para baixo como costumava fazer. Trabalhar com carros não
era uma opção e sua deficiência custava caro, por isso eu
trabalhava desde os quinze anos de idade. Também era por
isso que eu pressentia que nunca deixaria essa droga de
cidade e a situação ainda pior em que eu vivia.
Observei o rosto de Raven. Meu pai a adorava. E ela
o admirava. Eles tinham um relacionamento saudável e
perturbador de pai e filha, já que o próprio pai de Raven virou
as costas para ela e sua mãe. Eu me perguntava se era por
isso que Raven não gostava da maior parte dos homens. Meu
pai e eu éramos os únicos para ela.
— Ele está bem. Me perguntou hoje de manhã
quando você vai lá. Disse que você não tem ido visitá-lo
ultimamente.
Ela arqueou a sobrancelha.
— Não fui convidada.
Balançando a cabeça, disparei:
— Você não precisa ser convidada, idiota.
Ela fez beicinho e sorriu.
— Quanto amor, Nova, — deu uma piscadinha.
Raven era uma paqueradora atrevida. Até mesmo
com o sexo oposto, pelo qual ela não se interessava. Sua
última namorada era mais nova.
— Por falar nisso, o que está acontecendo com você
e Aspen? — A nova namorada de Raven tinha apenas
dezessete anos e eu a estava infernizando por isso. Porque
era isso que fazíamos.
Ela revirou os olhos de um jeito dramático.
— Qual é, Nova. Ela ainda era minha namorada na
semana passada, — ela apontou o dedo enluvado para mim.
— Além disso, não é tanto assim. Só dois anos mais nova do
que nós dois.
Ela desligou a pistola de tatuagem e limpou minha
pele levemente com uma toalha de papel.
— O que aconteceu?
Ela deu de ombros.
— Você sabe... O de sempre, — ela não me olhava.
— Sou basicamente uma diversão até elas retornarem para
seus namorados. — Seus lábios se contorceram de desgosto.
Várias garotas curtiam viver uma experiência com
Raven, mas não estavam a fim de algo mais sério. Para ela,
isso era uma droga, mas ainda éramos jovens, e eu sabia que
ela encontraria a pessoa certa algum dia.
Eu me sentei, segurando seu braço. Ela olhou para
mim e eu sorri.
— Não se preocupe. Algum dia você vai encontrar
alguém que esteja disposta a aturar suas maluquices.
Comigo já era uma história completamente diferente.
Duvidava que existisse uma pessoa para mim e, se existia,
havia menos de um porcento de chance de eu conhecê-la.
Minha vida era basicamente ficar em casa, ir para a escola e
trabalhar. Era raro quando eu tinha um dia para relaxar e, de
qualquer maneira, não era o melhor em socializar. Como
Raven gostava de dizer, eu era um excluído da sociedade,
mesmo quando ela me dizia isso de um jeito carinhoso.
Eu era reservado. Intimidador. Gostava de ser assim.
E estava claro que não era o melhor em dar palavras
de incentivo. Raven puxou o braço e começou a limpar,
ignorando por completo minhas zombarias.
— Vai sim. Você vai conhecer uma garota bacana um
dia, Rav. E dar um chute na minha bunda. — Eu a cutuquei
com o braço para que ela me olhasse.
Quando me olhou, tentei não afastar o olhar. Eu não
gostava de manter contato visual; achava a situação toda
extremamente difícil.
— Como vou conhecer alguém se continuo passando
meu tempo com essa sua cara fechada e assustadora? — Ela
se virou de costas, escondendo seu sorriso de mim.
— Você está certa. Sou um amigo terrível. Mas
poderia ser pior. Poderia ser o Boone.
Seus lábios se contorceram.
— Aff. Você me conhece, Adam. Aquele asqueroso
me causa arrepios.
Ela estava certa. Boone era um asqueroso. Eu
andava com ele mais por hábito do que por querer. Fiquei
imaginando se Boone causou arrepios à garota da campina.
Meu maxilar ficou tenso só de pensar. Eu não gostava do fato
de que odiava pensar que ele a fez se sentir daquela maneira.
Estava tarde. Talvez eu parasse no caminho de casa
para checar a campina. Ter certeza de que ela não estava
deitada lá como uma presa fácil. Talvez eu fosse conferir se
ela estava protegida de Boone e de qualquer outro que
pudesse esbarrar com ela.
Não.
Droga, não.
Não. Eu não podia fazer aquilo. Ela não era minha
para eu tomar conta.
— Em que tanto você está pensando aí? — Raven
estava passando pomada na minha tatuagem, lançando
olhares em minha direção de vez em quando.
— O que faz você pensar que estou pensando em
alguma coisa?
Fazendo uma careta, ela respondeu:
— O fato de que você está sempre pensando em
algo. — Ela apontou para o meio da minha testa. — E você
sempre fica com uma ruga aí quando está estressado.
Levantei a mão e esfreguei minha testa no lugar que
ela apontou e senti o vinco, mas argumentei mesmo assim:
— Não é verdade. E eu não me estresso.
— Verdade e tanto faz. Tive que olhar para sua cara
feia a vida toda. Eu a conheço melhor do que você mesmo.
Alisei a lateral do meu rosto com a mão.
— Algumas garotas acham essa cara muito sexy,
Rav.
— Pfttt, elas pensariam diferente se o conhecessem
como eu conheço, — ela riu.
Mas não era engraçado; ela estava certa. Grande
parte das mulheres não vivia ao meu redor. Sim, algumas
garotas curtiam o tipo bad boy e as tatuagens, mas isso perdia
o efeito rapidamente quando percebiam que eu não era o
namorado perfeito. Que eu não tinha tempo para joguinhos e
drama.
Raven terminou de fazer o curativo e eu tentei pagá-
la, mas, como sempre, ela recusou.
— Você é minha cobaia, não se esqueça disso.
Provavelmente vou dilacerar você qualquer dia, e isso será
pagamento suficiente.
Assenti e estendi meu punho para cumprimentá-la.
— Passe lá em casa no final de semana para ver meu
pai e eu. Estou de folga no domingo.
— Com certeza.
E então, eu estava jogado ao vento. Só que, nesta
noite, não ventava muito, nem mesmo perto da praia. Parei na
calçada para acender um cigarro. Era setembro e ainda estava
quente para caramba, como acontecia todos os anos nas
Carolinas. Pode ser que haja uma trégua em meados de
outubro.
De alguma forma, consegui passar longe da campina
no caminho de casa. Pulei algumas cercas e passei por alguns
quintais para evitá-la, determinado em não checar a garota
que parecia a lua, toda coberta de branco.
Caminhei pela rua de prédios degradados até
finalmente chegar ao meu. O fato de que as garotas não se
demoravam aqui por muito tempo, talvez fosse bom. Não dava
para trazê-las de volta a este lugar. Lixo, bitucas de cigarroe
algumas garrafas de cerveja emporcalhavam a entrada. Passei
chutando-as ao entrar, quase esbarrando em Mona.
Ela me deu um sorriso tímido e senti a ruga em minha
testa aparecer, desta vez de frustração. Merda. Raven estava
certa.
Os olhos chapados de Mona me avaliavam enquanto
eu tentava passar por ela e subir os sete andares até o meu
apartamento. O elevador era lerdo para caramba e eu
precisava escapar.
— Aonde você vai com tanta pressa, gatinho? Você
poderia entrar e ficar um pouquinho, — sua voz chegou ao
lugar em que eu estava, quase dois andares acima. Você
simplesmente não entrava no apartamento de Mona. Se
entrasse, acabaria em sexo. E então, sem que você soubesse,
ela cobraria. E se não fosse paga, não largaria do seu pé até o
cafetão traficante caçar e espancar você, e ainda assim, ela
seria paga. Boone aprendeu da pior maneira. Sorri ao lembrar
disso.
Abri a porta do apartamento e encontrei o lugar em
completo silêncio. Normalmente, meu pai ficava na sala com a
televisão ligada, relaxando em sua velha poltrona surrada. Dei
uma olhada na danificada cozinha estilo anos oitenta e
encontrei um bilhete na bancada dizendo que ele tinha ido
para a casa de Julius, no andar de baixo, jogar cartas.
Peguei um refrigerante na geladeira e andei pelo
apartamento me sentindo inquieto, enquanto olhava a
escuridão pela janela. Pisei sobre o tapete velho várias vezes.
O nosso apartamento era limpo comparado aos dos outros. Só
porque meu pai não podia mais trabalhar como mecânico, não
significava que ele não limpava e cuidava do lugar. Nunca
vivemos como a maioria das pessoas do nosso prédio.
Cuidávamos dos nossos escassos pertences. Afinal, eles eram
tudo o que tínhamos.
Sentei no sofá e verifiquei meu celular duas vezes,
sem realmente esperar encontrar alguma chamada perdida.
Havia apenas duas pessoas que me ligavam — uma estava lá
embaixo e a outra eu tinha acabado de ver.
Fui até a cozinha para descartar a lata de
refrigerante, e olhei para fora de novo, decidindo se precisava
de outro cigarro. Peguei meu celular, minha chave e cigarros, e
desci as escadas. Fumei dois cigarros em frente ao prédio até
não aguentar mais e, de repente, comecei a andar na direção
que eu não queria. Era como se meus pés tivessem vontade
própria. Quando se tratava daquela garota, era como se eu
fosse uma mariposa sendo atraída pela luz. Caminhei os três
quarteirões até a campina, sentindo que não era eu. Como se
eu fosse outra pessoa; como se fosse um louco.
Não levou muito tempo para que eu a visse ao longe,
só que desta vez ela tinha um cachorro deitado ao seu lado.
Parei longe o suficiente para que ela não me visse, mas eu
ainda conseguia vê-la.
Era difícil não enxergá-la deitada sobre aquele grande
cobertor azul com o cão gigante ao seu lado. Por que raios ela
tinha que vir para cá de novo? O que ela tinha na cabeça?
Fazia apenas dois dias desde que Boone a importunou. Ela
não tinha nenhum senso de autopreservação?
Uma enorme parte de mim queria ir até lá, puxá-la
pelo longo cabelo castanho e exigir que ela voltasse para a
ilha. Mas havia uma parte minúscula que só queria observá-la.
Percebi como aquilo era estranho. Ainda assim, pude
me sentir agachando no lugar onde a grama era mais alta e
difícil de ser atravessada, e a assisti falando sozinha. Eu a vi
contar as estrelas. Eu a observei fechar os olhos por minutos a
fio; parecia ter adormecido, mas eu sabia que não tinha porque
era óbvio que ela era uma daquelas pessoas inquietas que se
balançavam sobre os pés quando tentavam ficar paradas.
Inclinei a cabeça e semicerrei os olhos, tentando
enxergar mais do que apenas uma versão borrada à distância.
Merda, eu queria ver mais.
A observei por mais tempo do que deveria, até ela
finalmente se levantar, pegar o cobertor e sacudi-lo, tirando a
grama presa. Eu a vi dobrá-lo e colocá-lo debaixo do braço
direito, se virar e seguir em direção à ponte. E eu a assisti
cruzar aquela ponte até não conseguir mais ver a garota.
Eu realmente deveria me preocupar com o meu
comportamento. Mas tudo o que conseguia pensar enquanto
ela desaparecia, era na próxima vez. Traria um binóculo para
poder ver seu rosto, para ver seu olhar.
LIV
— Cotovelos, Melody Ann! — A senhora Donnelly
disse de seu lugar na extremidade da mesa.
Mel me lançou um olhar, revirou os olhos e,
lentamente, deslizou os cotovelos para fora da mesa de
mogno. Peguei o guardanapo do colo para esconder minha
risada.
— Por favor, senhorita Montgomery, sente-se direito.
Sua postura parece a de uma mulher de noventa anos. É
intolerável.
Eu queria rir de novo, mas mordi meus lábios. Eu
tinha que concordar; a minha postura era uma merda. Eu era
alta, desengonçada e me esforçava para esconder meus seios
grandes, me curvando, mas minha postura não gostava
nenhum pouco da casa da senhora Donnelly, porque nada,
nada era mais intolerável do que a casa dela.
O lugar era coberto por toalhas rendadas e bonecas
de porcelana que ficavam apoiadas nos cantos dos armários.
A coisa toda me dava arrepios.
Por mais que eu odiasse o modo como meus seios se
projetavam para frente quando eu me sentava, coloquei o
guardanapo sobre meu colo e endireitei a postura até que
estivesse alinhada à cadeira de madeira. Mantive minha
cabeça erguida e uma expressão calma no rosto, observando
as outras quatro garotas à mesa, todas parecendo tão
miseráveis quanto eu. Era tudo uma farsa. Estávamos
rodeadas por bolos, biscoitos e chá, o que era para ser
divertido, mas era qualquer coisa, menos isso.
Eram aulas de etiqueta e não havia nada de divertido
nelas.
— Como se diz, Livingston? — A senhora Donnelly
perguntou bem alto do outro lado da mesa, seu sorriso
extremamente meloso.
— Obrigada, senhora Donnelly. — Dei a ela o sorriso
mais falso que pude antes de desviar meu olhar para Mel e
seus olhos arregalados. Olhos que diziam: Me ajude antes que
uma das bonecas me coma.
Ela mordeu os lábios e levantou sua xícara de chá.
Pelo menos Mel e eu estávamos neste inferno juntas. E que
inferno. Mesmo que Mel tivesse nascido em berço de ouro, ela
achava tudo isso tão ridículo quanto eu. Aulas de etiqueta,
aulas de dança, era esse todo o encanto que acompanhava
uma debutante do sul. Era tudo uma loucura e exagerado e, se
meu pai estivesse vivo, eu sabia que ele não me sujeitaria a
isso de jeito nenhum. Mas eu não tinha outra família; apenas
Sebastian e Georgina. Tinha ficado animada quando nos
mudamos para cá anos atrás, apenas algumas horinhas de
distância da Georgia.
Discuti com Georgina por causa disso, mas desde os
meus dezesseis anos ela dizia que já era a hora.
— Nós, sulistas, amamos exaltar nossas mulheres,
não só por sua beleza e graciosidade, mas, principalmente,
por sua astúcia, inteligência e força. Ser uma debutante é
sobre isso, Livingston, — ela anunciou. Aquele pequeno
discurso me convenceu a dar uma chance àquilo tudo. Bem,
eu também não queria ouvir Georgina se queixando sobre o
assunto. Mas estava aprendendo rapidamente que isso era
mais sobre um bando de ricos esnobes exibirem suas filhas e
o quão perfeitas elas eram, e menos sobre inteligência e
astúcia. Graciosidade? Bem, todos sabiam que esse não era o
meu forte. E essas aulas eram desprezíveis.
— Certo, senhoritas. Vocês estão liberadas, e espero
que não cheguem atrasadas na próxima terça-feira. — A
senhora Donnelly lançou um olhar sério para mim e para Mel,
e eu segurei a risada. Esperava que a senhora Donnelly
estivesse aprendendo que não deveria esperar muito de nós.
Empurramos nossas cadeiras para trás com
educação, dissemos um adeus sorridente e subordinado à
senhora Donnelly, e nos apressamos em pegar nossas
mochilas e sair daquela casa. Adeus cheiro de aromatizantes!
— Você vai para casa? — Mel perguntou atrás de
mim na entrada de carros.
— Não tenho outro lugar para ir, — dei de ombros.
— Você podia passar um tempo comigo, Seb e
Braden.
Franzi o nariz. Não, Deus me livre, eu quis gritar, mas
apenas balancei a cabeça com um sorriso triste.
Mel e eu éramos amigas.
Não éramos melhores amigas,mas ela era uma das
poucas pessoas da ilha em quem eu confiava e podia contar.
Mel era uma boa pessoa apesar de sua família idiota e
arrogante. Nos conhecíamos desde quando me mudei para a
ilha com meu pai. Georgina nos apresentou imediatamente,
com a esperança de que seríamos amigas. A mãe de Mel era
a melhor amiga da minha mádrasta. O plano delas funcionou
de alguma forma. Gostei de Mel. Nos demos bem de imediato.
Nós simplesmente nos entendíamos. Mas eu sempre mantinha
em minha cabeça que, antes de tudo, ela era amiga de
Sebastian. Eles se conheciam a vida toda. Ela foi uma das
muitas, muitas garotas com quem Seb e Braden ficaram.
Aquilo tinha me deixado em estado de choque. Mel era uma
garota esperta. Por mais que eu tenha tentado, não consegui
convencê-la de fazer o contrário.
— Dispenso. — Joguei minha mochila sobre os
ombros e segui adiante.
Mel me alcançou e me cutucou com o ombro.
— Imaginei, mas eu tinha que perguntar.
Sorri, grata por ela ter perguntado, mesmo que eu
preferisse ter todas as minhas unhas arrancadas com alicate
do que sair com aqueles imbecis.
— E amanhã? Não temos aula de piano, nem de
etiqueta. Vamos levar Harry e Bailey ao parque depois da
escola?
Assenti.
— Boa ideia. — E era mesmo. Eu gostava de ficar
fora de casa o máximo que pudesse à noite. Ultimamente,
estava ficando cada vez mais difícil evitar Sebastian. Ele tem
passado menos tempo nos treinos de futebol e festejado ainda
mais com os amigos em casa. Comigo. Eu não era tola para
acreditar que ele estava fazendo aquilo por outro motivo além
de mim.
Pelo menos esta noite eu sabia que ele estaria fora.
Mel e eu nos despedimos em frente a casa dela, e
andei o restante do caminho para casa me sentindo mais leve
do que me sentia há dias por saber que Sebastian não estava
em casa. Toda a leveza se esvaiu quando vi o sedã preto na
entrada.
Jesus, era como se eu não conseguisse ter um
minuto de paz.
Fui me arrastando até os degraus e entrei na casa
pronta para enfrentar a ira de Georgina. Ela mudou desde que
meu pai se foi, ou talvez estivesse apenas colocando as
asinhas de fora. Eu não ligava para o porquê; só queria que
parasse.
Hoje, tive sorte. A casa estava silenciosa quando
entrei, exceto pelos ruídos das unhas de Harry no azulejo.
— Oi, amigão. Estou em casa. — Me inclinei,
esfregando sua cabeça, e ele me lambeu em agradecimento.
Preparei algo para o jantar sem fazer barulho para
não perturbar minha madrasta, caso ela realmente estivesse
em casa e dormindo. Depois de fazer a tarefa escolar por uma
hora, coloquei a coleira em Harry e peguei meu cobertor azul.
Eu sabia que era uma idiota, mas não conseguia me afastar.
Não sei o motivo, só sabia que era lá onde eu pertencia. E por
mais que eu soubesse que não era seguro, especialmente
após ter sido encurralada há algumas noites, não podia deixar
de ir até lá. Então, caminhei pela praia, pela rua e,
eventualmente, pela ponte. Fui para o meu lugar de sempre na
campina, atenta para a presença de estranhos. Estava
esticando meu cobertor azul quando o vi.
Estava em uma daquelas garrafas de vidro antigas de
Coca-Cola sobre a grama, a uns sessenta centímetros de mim.
Mas não foi isso que chamou minha atenção. Não, foi o fato de
parecer haver um papel branco dentro dela.
Fui até lá e peguei a garrafa. E com certeza tinha um
bilhete dentro. Sorri, intrigada com a possibilidade de que
pudesse ter encontrado o bilhete de alguém. Talvez fosse um
mapa do tesouro. Ah! Talvez fosse uma carta de amor.
Virando a garrafa, eu a chacoalhei e chacoalhei sem
sucesso, ansiosa e animada para ver o que estava escrito no
papel, caso houvesse algo. Ah, eu torcia para que tivesse.
Essa era a coisa mais entusiasmante que havia acontecido
comigo em anos.
Por fim, deslizei meu dedo indicador pelo gargalo da
garrafa e puxei o papel com cuidado para não rasgá-lo, e ele
se soltou. Eu o desdobrei cuidadosamente e, como era de se
esperar, havia uma caligrafia preta. Meu coração acelerou.
Que legal.
Mas aí, li as palavras e fiquei confusa. Não era o
bilhete romântico de alguém ou nada que realmente fizesse
sentido.
Sentei sobre o cobertor azul com a garrafa e o papel
em meu colo, Harry ao meu lado, tentando entender por que
alguém deixou aquilo na campina, e para quem. Poderia ter
sido para mim, certo? Alguma outra pessoa vinha até aqui
olhar para as estrelas ou alguém escreveu esse bilhete para
mim e o colocou nesta garrafa? Eu o examinei, agora mais
confusa do que intrigada.
 
Hoje é a sua noite de sorte. Olhe para cima como você sempre
faz. Mas, dessa vez, procure por uma estrela brilhante e
laranja no céu.
 
Eu olhei. Olhei para cima, escaneando o céu até
encontrá-la. Assim como dizia no bilhete, e lá estava ela, a
estrela quase vermelha em meio às outras brancas. Olhei
novamente o bilhete, meu coração saindo pela boca a cada
batida. Harry choramingou como se também estivesse
ansioso, e colocou a cabeça em meu colo. Eu o acariciei com
a mão trêmula.
 
É Marte, o “planeta vermelho”. Está mais próximo da Terra do
que esteve em quinze anos e não se aproximará novamente
pelos próximos dezessete, então, deite-se e aproveite
enquanto pode.
 
Virei o papel. Era isso? Levantei a cabeça,
observando a campina, mas não consegui ver muito no
escuro.
— Oláááá. Olá! — Chamei, desesperada para que
alguém aparecesse e dissesse que o bilhete era para ele.
Finalmente me levantei, com Harry junto a mim.
Caminhei ao redor do cobertor azul, procurando
cuidadosamente. Com certeza estava errada. Talvez o bilhete
da garrafa fosse para outra pessoa; foi isso o que disse a mim
mesma, assustada do jeito que estava. Mas eu não era boba.
Eu sabia. Sabia que era a única que ficava neste lugar. Era a
única que vinha aqui para observar as estrelas. Não, aquilo era
para mim e me deixou aterrorizada. Me deixou empolgada.
Sentei sobre o cobertor, me sentindo nervosa e
eufórica ao mesmo tempo. Olhei novamente ao redor,
pensando na noite em que os homens me cercaram. Boone
cercou. Mas e o loiro que tinha me protegido? Será que ele
voltou por mim?
Uma sensação de choque atingiu minha pele. Uma
faísca de algo novo e empolgante.
Tinha que ser isso. O loiro. Mesmo assim, eu não
podia ficar aqui e esperar. Seria burrice. E eu não era burra;
era uma medrosa. Então, fui embora, a garrafa ainda na
campina, mas o bilhete seguro com firmeza em minha mão.
LIV
Eu era uma tola. Super idiota. Boba. Uma jovem tola
e estúpida que não conseguia parar de pensar na garrafa e no
bilhete. Nem se tentasse. E eu tentei. Eu realmente tentei.
— O que você tem aí? — Mel indicou com a cabeça o
pedaço de papel em minha mão.
No flagra. Pega totalmente no flagra. Mas, nesses
três dias desde que encontrei o bilhete, esta não foi a primeira
vez que o examinei. Eu fiz mais do que examinar, na verdade.
Estava obcecada. Procurando por qualquer pista de quem o
pudesse ter escrito. Observei as letras difíceis de serem lidas,
escritas por acaso e rasgadas de um papel de caderno,
decidida de que tinha que ser de um garoto ou de um homem.
Apenas um homem escreveria com tamanho descuido,
deliberei. Parecia que eu tinha virado o papel umas mil vezes.
No silêncio do meu quarto. No silêncio das salas de aula.
Quando eu deveria estar prestando atenção às aulas de
etiqueta e, como agora, que deveria estar me preparando para
o início da aula de dança. Eu não conseguia parar. Sempre
que minha mente estava desocupada, ela voltava para o
bilhete, tentando descobrir quem o escreveu.
Dobrando-o rapidamente, eu o coloquei no bolso da
minha calça jeans e sorri.
— Nada.
— Sééério?
— Sim, sério, — respondi nervosa.
Seus lábios rosados se contraíram.
— Papo furado. É um bilhete romântico? — Seus
olhos brilhavam com a perspectiva de um caso amoroso.
Minhas bochechas coraram mesmo sabendo que estava longe
daquilo.
Desta vez, eu realmente ri de nervoso.
— Não mesmo. Você sabe que ninguém nesta ilha
gosta de mim, além de você.
Ela arqueou a sobrancelha para mim.
— Papo furado. De novo. E Braden gosta mesmo de
você. — Ela fez uns ruídosde beijo que me deixaram ainda
mais corada, e eu ri.
Balancei a cabeça, desconcertada.
— Eu nem entendo disso.
Ela prendeu seu cabelo loiro em um rabo de cavalo.
— O que você não entende? Você é linda e
inteligente.
Ela falou aquilo como se eu sempre tivesse sido linda
e popular, e que todos conheciam. Não era esse o caso.
Nunca fui uma das garotas populares daqui. E ninguém da
nossa escola ligava para o quão estudiosa eu era. Até a
semana passada. Agora Braden parecia ter me notado até
demais. Não tinha ideia do porquê ou como isso estava
acontecendo tão de repente. Eu só queria que parasse.
Dei uma cutucada em Mel com o ombro.
— Você também não é ruim. Mas, ainda assim, eu
não entendo. Ele nunca demonstrou interesse em mim, —
respondi, calçando sapatos de saltos.
Ela olhou para os meus seios.
— Eles poderiam ser gêmeos. Parecem ter dado o ar
da graça no último verão.
Olhei para eles. Ela não estava mentindo. Em quatro
meses, fui de quase despeitada para uma Pamela Anderson.
Tive um amadurecimento tardio, mas amadureci. Infelizmente.
Puxei a frente da minha blusa para longe dos meus
seios, tentando abrir espaço para aqueles bad boys e acenei
com a cabeça para Mel.
— Poderiam ser gêmeos mesmo.
— Meninas, — a senhora Donnelly falou do meio da
sala de estar. Toda a mobília havia sido empurrada para os
cantos e ela estava de pé lá no meio, em uma monstruosidade
rosa que ela devia considerar um vestido. Os saltos cor-de-
rosa quase me fizeram revirar os olhos, mas, honestamente,
eu estava acostumada. Era a mesma roupa da semana
passada.
— Formem pares! — Seus olhos dispararam em
minha direção e na de Mel. — Vocês duas não. Encontrem
outras parceiras.
Pelo amor de Deus! Aquela mulher nos odiava.
Eu me juntei à Olivia Drake. Ela era como um robô
perfeito, eu super me diverti. Só que não.
Após a aula, caminhei sozinha para casa já que a
mãe de Mel a levou para jantar. Estava chateada e não sabia o
motivo. Talvez fosse por causa da conversa sobre Braden.
Talvez por causa dos gêmeos. Ou talvez por causa das aulas
de debutante que estavam me deixando louca. Mas eu sabia
que não eram aquelas coisas. Sabia que era porque eu queria
mais do que examinar aquele bilhete. Eu queria voltar para lá.
Para a campina. Para ver se a garrafa de Coca-Cola ainda
estava lá. Era perigoso, mas eu estava curiosa.
A curiosidade matou o gato, Liv, tentei me animar no
caminho de volta para casa. Mais tarde, no meu quarto, deitei
na cama com Harry. Quando as estrelas surgiram no céu,
fiquei mais do que agitada. Tentei não pensar no bilhete na
garrafa ou na campina, por mais que eu a amasse. Foi o último
lugar onde passei momentos importantes com meu pai. Mas
eu sabia que não precisava ir até lá para conversar com ele.
Poderia conversar com ele aqui no meu quarto.
Mesmo assim, peguei meu cobertor e a coleira de
Harry, e saí. Estava praticamente correndo pela rua e pela
ponte. Estava úmido e o suor escorria pela minha testa e se
acumulava em minha lombar. Harry ofegava e fiquei
preocupada que ele pudesse ficar quente demais. Eu não tinha
trazido água, por isso desacelerei mesmo quando a
expectativa quase me matava.
Finalmente chegamos à campina e Harry e eu
corremos para o nosso lugar. Não estendi o cobertor, mas levei
a mão ao bolso e senti o bilhete que encontrei na última vez
que estive aqui. Sabendo que ele estava seguro, procurei pela
garrafa transparente no local onde a havia encontrado antes,
com um frio na barriga e arrepios em minha pele.
Se alguma vez eu pensei, mesmo que por um
segundo, que senti frio na barriga, eu estava errada, porque
quando vi a garrafa lá com outro pedaço de papel dentro, não
era apenas na barriga. Era no corpo todo.
Corri adiante, com medo de tocar a velha garrafa de
vidro, mas incapaz de me conter. Eu tinha que saber. Eu a
peguei com cuidado, como se fosse preciosa e não apenas
uma garrafa incolor em uma campina.
Deslizei meu dedo indicador pelo gargalo, a coleira de
Harry esquecida no chão. Mas eu nem me preocupei; ele
sempre ficava comigo. Aquela coleira estava lá mais para o
conforto e tranquilidade dos outros. Meu dedo encostou no
papel e senti uma faísca. Algo maior do que eu. Talvez maior
do que as estrelas. Era mais do que empolgação. Como se
estivesse ganhando vida. Era eletrizante e me iluminou por
dentro até que tive a sensação de que todas as estrelas acima
de mim estavam, repentinamente, vivendo em meu interior.
O bilhete escorregou para minha mão e eu olhei
novamente em volta da campina escura, desesperada para ver
quem o tinha deixado aqui.
Harry deitou aos meus pés enquanto eu
desembrulhava o bilhete. Não sei o que estava esperando,
mas não era isso.
 
Luna,
Está uma noite muito clara, por isso, encontre a estrela mais
brilhante do céu. Essa estrela reluzente, Sirius, é a principal da
constelação Cão Maior. Quase parece um boneco. Consegue
ver?
 
Procurei pela estrela mais brilhante do céu e, é claro
que ao olhar mais para baixo, parecia que havia um corpo com
braços e pernas. Dei um sorriso antes de voltar a olhar para o
bilhete.
 
Cão Maior representa o famoso cão grego, Laelaps. Existem
algumas histórias sobre sua origem, mas a mais comum é a de
que ele era tão rápido que foi elevado aos céus por Zeus.
Laelaps também é considerado um dos cães de caça de Órion
e o acompanhava pelo céu noturno em busca de Touro, assim
como seu cachorro acompanha você.
Até a próxima, quando eu a vir sob as estrelas.
 
Era só isso? Mais nada? Nem um nome ou uma dica?
Era o mesmo garrancho de antes, no mesmo tipo de papel de
caderno. E agora eu estava completamente convencida de que
tinha que ser para mim. Ele mencionou meu cachorro, pelo
amor de Deus. Ele estava me observando? Mas ele escreveu
“Luna”.
Tirei meu celular do bolso, frustrada, a empolgação
que havia sentido se esvaindo. Abri o navegador e pesquisei
por Luna.
 
Luna geralmente faz referência à Lua da
Terra — Luna (deusa), a antiga
personificação divina romana da Lua.
 
A lua? Uma deusa? Mas o que isso tinha a ver com a
lua? Eu queria respostas.
— Você está aí? — Gritei em meio a escuridão. —
Olá! — Girei em círculos na campina. Que tipo de jogo essa
pessoa estava jogando? Por um segundo pensei que talvez
fosse Braden ou Sebastian, e aquele pensamento causou
náuseas. E se tudo isso fosse apenas uma grande piada às
minhas custas? Ou talvez fosse o cara da outra noite. O que
tentou afastar Boone de mim.
Eu meio que esperava que o garoto loiro aparecesse
a qualquer momento na minha frente e dissesse que era
alguma pegadinha, mas isso não aconteceu.
Olhei novamente para a Cão Maior, mas não sorri.
Pela primeira vez, não queria olhar para as malditas estrelas.
Queria saber quem estava fazendo isso. Queria saber onde
essa pessoa estava. Quando ela me deixou aquele bilhete. Eu
tinha aproximadamente mil perguntas e nenhuma resposta.
Estava decepcionada. Então peguei meu cobertor, agarrei a
coleira de Harry e saí de lá. Admitia que estava chateada de
um jeito irracional com a pessoa misteriosa que estava me
deixando os bilhetes. Eu queria saber por quê! Como!
Como uma criança malcriada, fui pisando forte o
caminho todo de volta para casa, o que exigiu mais energia do
que eu imaginei. Estava cansada quando cheguei na mansão,
por isso não reparei no carro de polícia na entrada. Quando
abri a porta e vi o xerife Rothchild parado na antessala, parei,
espantada. Estava tarde. Por que ele estava aqui?
— Senhorita Montgomery! — Ele sorriu para mim
como se não fosse dez horas da noite e ele não estivesse
dentro da minha casa.
Lhe dei um sorriso fraco.
— Oi, xerife. Aconteceu alguma coisa? — Na minha
opinião, autoridades não apareciam para chamados tarde da
noite a menos que houvesse algo de errado. E eu não vi nada
alarmante.
Os saltos de Georgina batiam contra o azulejo
quando ela entrou na antessala e me deu um sorriso meigo
demais em meio ao seu batom vermelho.
— De forma alguma, Livingston. O xerife só deu uma
passada para tratar de negócios comigo. Você sabe que estou
planejando uma campanhade arrecadação de fundos para o
departamento de polícia.
Ela estava com a aparência muito boa para dez da
noite. Seu cabelo loiro oxigenado estava perfeitamente
arrumado, e sua maquiagem, sem defeitos. O vestido tubinho
preto não tinha um amassado que pudesse ser visto.
E eu não dava a mínima para o que ela fazia ou
deixava de fazer em seu tempo livre, especialmente com
relação ao departamento de polícia. Droga, eu nem entendia
por que o departamento precisava arrecadar fundos. O xerife
Rothchild era cheio da grana. Todos daqui eram.
Olhei de volta para o xerife e ele me deu uma
piscadela e um sorriso que me fez lembrar muito de Braden.
Isso não deveria me surpreender já que o xerife Rothchild era
pai dele. Eles se pareciam muito e algumas de suas feições
eram tão idênticas que assustavam, principalmente porque
Braden, até onde eu sabia, só ficava com ele nos finais de
semana. Seus pais estavam divorciados há mais tempo do que
eu estava na ilha.
O xerife olhou para mim e para Harry. O cobertor
embaixo do meu braço chamou sua atenção.
— Esteve na rua até tarde em dia de semana. — Seu
tom era ao mesmo tempo acusatório e questionador, mas não
dei confiança. Não era da sua conta o que eu fazia, por isso,
apenas sorri.
— Está muito tarde, — Georgina acrescentou. —
Espero que não tenha perdido as aulas desta tarde.
— Não, senhora, — respondi enquanto tirava Harry
da coleira.
Afastando o cabelo dos ombros, ela assentiu.
— Boa garota. Irei acompanhar o xerife até a porta.
Revirei os olhos. Aquela mulher não se importava
com o que eu fazia desde que eu fizesse as coisas que ela
queria. Ela não ligava até que horas eu ficava na rua ou com
quem eu saía. Nem eu ligava. Ou para onde eu ia, contanto
que não faltasse às aulas ou eventos sociais que ela queria
que eu fosse. Ela era um ótimo exemplo de mãe.
— Boa noite, Livingston, — o xerife disse sobre os
ombros enquanto eu seguia para a escada.
Dei um rápido aceno e disparei pelos degraus em
direção ao meu quarto com minha mão já dentro do bolso.
Tirei os bilhetes e os desdobrei, segurando-os em
minhas mãos. Por mais que eu ainda estivesse com raiva da
pessoa misteriosa, jamais esquecerei o que ela me fazia sentir.
Ela me deixava frustrada. Mais do que isso, me assustava. E
não pelo fato de que havia um desconhecido aleatório me
deixando bilhetes em uma garrafa na campina. Isso deveria ter
me apavorado, mas não apavorou, porque a minha vida nesta
ilha me amedrontava mais. Não, aqueles bilhetes pareciam um
monte de sonhos em um papel. Mesmo que fossem apenas
direções de para onde olhar no céu para ver a magia das
estrelas. Eles pareciam ser mais. Como se meu pai, quem
havia me dito para olhar para cima, os tivesse deixado lá para
eu encontrar. Sabia que não era esse o caso. Então, só
conseguia acreditar que ele tinha enviado alguém. Alguém que
me faria passar por tudo isso. Alguém que me deu algo tão
assustador que fazia minhas mãos tremerem em volta dos
papéis.
Esperança.
ADAM
Caramba, eu estava me transformando na porra de
um stalker, mas mesmo assim, continuei voltando, incapaz de
me manter afastado por um único dia sequer. Eu a observava.
Tudo começou com aquele bilhete na garrafa. Sabia que era
uma noite especial. Eu mesmo estaria olhando para Marte à
noite e, por alguma razão idiota, não podia suportar a ideia de
que ela o perdesse. Agora era eu quem não podia suportar
perdê-la de vista.
Às vezes, ela olhava ao longe, ficava irritada e
esbravejava. Eu ria, porque ela era fofa demais. Batia os pés e
ia embora, e eu ficava triste por vê-la ir, mas pelo menos sabia
que estava indo para a proteção de sua casa e não estava
deitada na campina implorando por encrenca.
Em outras noites, ela lia meu bilhete, deitava sob as
estrelas e procurava os planetas ou constelações que eram
visíveis naquela noite. Algumas vezes ficava nublado demais
para ver as estrelas, então eu deixava a garrafa vazia. Às
vezes, as estrelas pareciam estar tão perto que eu pensava
que talvez pudesse tocá-las, e deixava na garrafa, em um
pedaço de papel de caderno rasgado, o nome de uma
constelação para ela observar. Sim, as noites variavam
dependendo da visibilidade, mas uma coisa permaneceu a
mesma: eu. Eu sempre vinha e sempre observava. Isso
continuou de forma constante por semanas, eu deixava mais e
mais bilhetes, terminando cada um com minha assinatura: “até
a próxima, quando eu a vir sob as estrelas”. Era cafona e sem
graça, mas eu não ligava. Queria ver aquela garota sorrir pelas
lentes do meu binóculo, e eu consegui. Queria ter certeza de
que ela estava segura. Eu me preocupava que ela viesse para
cá sozinha. Ficava aflito por ela vir para cá em vez de ir para
casa.
Algo me dizia que essa garota precisava de alguém
para fazê-la sorrir, para cuidar dela, e eu jurei há dez anos que
nunca decepcionaria alguém que precisasse de minha ajuda
de novo. Ela pode até ter se assustado na primeira vez, mas
agora, parecia estar adorando, e eu não me cansava dela.
Todas as noites eu corria para cá. Meu pai chegou a comentar
sobre minha ausência mais de uma vez. Até Raven tinha
notado que não estive muito presente ultimamente. Fiquei com
medo do que aquilo dizia sobre mim — preferir observá-la ao
invés de ficar com meus amigos e família.
Luna, eu a chamava como a lua. Porque não
conseguia tirar da cabeça sua imagem de vestido. Ela, branca
como leite, usando um longo vestido branco, deitada na
campina, parecendo a lua em meio às estrelas.
Eu me escondi na grama alta, atrás de uma única
árvore a uns cem metros de distância. A observei enquanto
abria meu bilhetes, um pequeno sorriso no rosto, e a olhei
fixamente enquanto ela observava as estrelas. Ela falava
sozinha, com o cachorro, até fechou os olhos e ficou deitada
lá. Eu estava viciado, como um drogado que prometia ser a
última vez e voltava dia após dia, dizendo a mim mesmo que
isso não se repetiria de novo. Sabia que era mentira. Não
conseguia parar. Mas também não era bom com as palavras.
Nunca fui. Sempre fui do tipo quieto e reservado. Esses
bilhetes eram a coisa mais doida e extrovertida que já tinha
feito sem que fosse por puro egoísmo. Não sabia como parar e
percebi como aquilo era assustador. Quanto mais eu a
observava, menos eu me importava. Eu só queria estar perto
dela.
ADAM
Eu já tinha feito muitas coisas na vida que não foram
inteligentes. Assaltei lojas de conveniência. Roubei cigarros e
bebidas alcoólicas. Colei nas provas. Matei aula. Usei drogas.
Não dei um beijo em minha mãe antes de ir para a escola no
último dia em que a vi com vida. Fiz tudo isso, mas, por
alguma razão, enquanto eu seguia a garota da campina e
atravessava a ponte, tive a sensação de que essa era a coisa
mais estúpida de todas.
De alguma maneira, sabia que estava fora de mim,
não apenas por estar perseguindo alguém. Nem mesmo por
saber que o xerife Rothchild me odiava e estava procurando
um motivo para me jogar na cadeia. Não, não foram essas
coisas que me fizeram hesitar quando finalmente alcancei o
lado da ponte que ficava na ilha. Não, era ela. A garota sem
nome que observava as estrelas. Duas semanas observando-a
e eu estava obcecado. O que aconteceria quando eu
descobrisse onde ela morava? Qual era o nome dela? Deus,
eu queria saber. Queria saber tudo. Cores favoritas, comidas
que amava, por que ela ficava deitada na campina. Queria
saber como era sua voz. Quantos anos ela tinha. Droga, ela
parecia ser bem jovem. Queria saber todas aquelas coisas.
Era como se meu cérebro pudesse explodir com tudo o que eu
queria perguntar a ela. E aquilo... aquilo era o mais
apavorante. Eu queria demais. Mas sabia que todas aquelas
coisas não eram para mim. Por isso, tinha ficado longe. Até
agora, no caso. E foi por esse motivo que soube que eu era
burro para caralho.
Ainda assim, eu a segui até em casa como um otário.
Fiz questão de manter meus olhos abertos por causa do Xerife
Babaca e de ficar longe o suficiente para que ela não pudesse
me ver. Passei a maior parte da minha vida me escondendo,
mas os últimos quatorze dias foramum verdadeiro exercício e
eu me sentia um profissional. Chegamos em sua casa na praia
que ficava a dez minutos da ponte. Quer dizer, alguns
poderiam chamar aquilo de casa, mas eu chamava de
mansão. Ela entrou com o cachorro e eu fiquei parado na
calçada, observando. Notei, no caminho até a casa, que
gostava do jeito como ela andava. Não era como se estivesse
passeando ou dando uma volta em um ritmo acelerado. Não,
ela caminhava sobre a ponta dos dedos e quase nunca usava
os calcanhares. Era adorável e me lembrava um salto lento.
Eu sabia que ela era rica. Deu para perceber por suas
roupas e pelo simples fato de que ela era da ilha, mas isso me
surpreendeu. Olhei para os carros caros na entrada, meus pés
se aproximando e entrando no jardim sem que eu me desse
conta. Eu estava registrando cada pequena informação que
conseguia — seu endereço e a cor de sua casa — quando
ouvi o ranger da porta se abrindo e soube que estava fodido.
Muito fodido, porque não conseguia me mover. Eu me sentia
colado no chão, esperando, quase que aguardando esse
momento. Era como se eu tivesse vindo até aqui para que isso
acontecesse. E talvez tenha sido isso mesmo. Era como se eu
não pudesse esperar mais um dia para ficar perto dela. Eu era
um idiota.
O barulho da coleira do cachorro foi seguido por
passos e lá estava ela, o mais perto que já esteve de mim
desde o dia com Boone e Grady. Lá estava, pernas muito
magras, lábios muito cheios e tudo mais. Estava começando a
gostar daquela boca que parecia ter muitos dentes. Ela usava
uma legging preta e uma camiseta larga. Minha boca ficou
seca, passei a mão pelo cabelo, mas não conseguia me
mexer. Meu coração disparou dentro do peito, minha
respiração acelerada.
Ela continuou vindo em minha direção até parar na
parte superior da entrada de carros e eu fiquei na parte de
baixo. Estava descalça e seu cabelo estava solto, movendo-se
com a maresia que vinha do oceano, e seus olhos... eles
estavam sobre mim.
Ela me olhou com os olhos semicerrados enquanto o
cachorro se deitava aos seus pés. Ótima proteção que ele era.
Eu continuava olhando, com medo de me mover. Queria vê-la
de perto e sabia a loucura que era, mas não dava a mínima.
Era como se estivéssemos em um tipo de transe
estranho e distorcido até que ela finalmente falou.
— Você. — Isso foi dito em um sopro de descrença e
acusação.
Não foi uma pergunta e eu não costumava falar
muito, por isso, trouxa do jeito que era, fiquei lá, encarando-a.
Ela se aproximou devagar, o cachorro logo atrás, até
que tivesse caminhado toda a extensão da entrada de carros e
parou a menos de trinta centímetros de mim. Meu coração
reverberava no peito. Eu não era um stalker de verdade, mas
tive a sensação de que esta noite poderia ser a primeira vez
na história da minha vida que alguém me chamaria de um.
Ela franziu o cenho ao olhar para mim.
— Você me seguiu da campina até aqui? — Ela
mordiscou o lábio nervosamente. Eu queria tocá-lo com meu
dedo, implorá-la para que não machucasse aquela boca que
eu estava começando a gostar.
Ao invés disso, assenti, sem saber o que dizer,
deixando seu tom profundo, quase sensual, me inundar. Sua
voz não era como eu havia esperado e, ah, como esperei...
Pensei nessa garota mais do que poderia admitir. Então,
prestei atenção, esperando por suas próximas palavras, mas
tudo o que conseguia ouvir eram os estrondos do meu
coração.
Isso foi um erro, mas era um que eu não tinha poder
para reparar.
Seus olhos castanhos ficaram vidrados em
pensamento e dispararam de volta para mim.
— Espere. Então você… — Seu dedo apontou em
minha direção. — Você… Ah, meu Deus. Foi você quem me
deixou os bilhetes? — Ela estava incrédula, mas ninguém ficou
mais chocado do que eu com as merdas que fiz nas últimas
semanas.
Assenti novamente, erguendo a mão e procurando
pela linha minúscula em minha testa sobre a qual Raven tinha
falado. Pressionei o vinco, irritado. Por que ela estava tão
surpresa que fosse eu? Quem ela pensou que era? Estava
irado de um jeito absurdo com o outro cara que estava
stalkeando essa garota, e eu nem sabia o nome dela. Eu era
louco.
Levei a mão ao bolso para pegar um cigarro e o
isqueiro, esperando que a nicotina me acalmasse.
— Mas pensei que fosse… — Sua voz se esvaiu
quando acendi meu cigarro.
Arqueei a sobrancelha, indicando para que ela
continuasse e me dissesse quem ela pensou que estivesse
observando-a e deixando os bilhetes. Eu provavelmente
mataria esse cara.
Ao invés disso, ela se afastou e apontou para mim de
novo.
— Você está fumando? — Ela torceu o lábio em
desaprovação.
Assenti novamente com a cabeça.
Foi a vez dela de ficar indignada.
— Você fala pelo menos?
Assenti de novo e ela balançou a cabeça, incrédula,
antes de diminuir o espaço entre nós e arrancar o cigarro da
minha boca tão rápido que me pegou de surpresa. Fiquei
perplexo. As pessoas não arrancavam nada de mim. Elas
tinham medo. O que não era o caso dessa garota ousada. Eu
deveria saber disso.
— Fumar é nojento, — ela disse baixinho como se
não fosse nada de mais, mas eu sabia que para ela, era.
A garota se abaixou e apagou a ponta do cigarro no
chão da entrada de carros antes de se levantar e colocá-lo no
bolso.
Dei um sorriso sarcástico.
— Você vai ficar com isso?
Seus olhos arderam de raiva.
— Não, vou jogar no lixo porque não sou porca.
— Porquinha, — murmurei, balançando a cabeça.
Ela estava sendo adorável. A garota das pernas muito
longas e boca grande, que eu não conseguia tirar da cabeça,
também era fofa demais. Eu estava ferrado.
Queria abrir um sorrisão para sua ternura, mas
segurei minha felicidade dentro do peito. Só Deus sabia que
isso sempre tinha um preço. E eu estava cansado de pagar
por isso.
— Você beija sua mãe com essa boca cheia de
fumaça? — Ela perguntou sarcástica, claramente irritada com
o meu sorriso.
Baixei minha cabeça e dei um passo para trás,
passando a mão pelo meu cabelo escuro. Queria contar coisas
a essa garota. Coisas que eu não devia contar, como o fato de
que eu não beijava mais a minha mãe. Em vez disso, fiz a
pergunta que estava me atormentando desde que ela pareceu
surpresa que era eu quem tinha deixado os bilhetes.
— Quem você pensou que fosse?
Seu rosto se contorceu em confusão.
— O quê?
Endireitei minha postura e lambi os lábios antes de
responder.
— Quem você achou que estava deixando os
bilhetes?
Eu me sentia vulnerável de um jeito estranho naquele
momento, esperando pela resposta que não gostei nem um
pouco. Por que me importava quem escrevia para ela ou não?
Ou quem mais a considerava a coisa mais intrigante do
mundo? Pelo amor de Deus, ela era apenas mais uma vadia
rica da ilha. Por que eu me importava com o que ela estava
prestes a dizer?
A garota mordiscou o lábio de novo e eu continuei
querendo estender a mão para soltá-lo de seus dentes. Era um
gesto sedutor, até mesmo inocente, o que a tornava ainda
mais atraente.
— Não sei. — Ela franziu o cenho, pensativa, e olhou
para longe, quase como se não quisesse me responder. Mas
então seu olhar retornou para mim. — Pensei que fosse o
outro cara…
— Boone? — Interrompi em voz alta.
Uma expressão enojada cruzou seu rosto.
— Meu Deus, não. Ele não. O loiro. O outro cara.
Soltei um longo suspiro acompanhado de uma risada
sarcástica.
— Grady? — O cara não tinha nem terminado o
ensino médio e ela pensava que ele sabia algo de astronomia.
Eu teria rido se a situação toda não tivesse me aborrecido
tanto.
Seu olhar se iluminou.
— Esse é o nome dele?
Peguei o maço de cigarro de novo.
— Você gosta dele ou algo do tipo?
— O quê? Não!
Fui para a rua e acendi meu cigarro longe dela. Ela
começou a me seguir.
— Para onde está indo?
— Para casa.
— Mas eu nem sei o seu nome! — Ela gritou e bateu
o pé. Quase sorri de novo.
Eu me virei e comecei a andar de volta para a ponte.
Também não sabia o nome dela e eu queria perguntar, mas só
em saber onde ela morava, como era sua voz e as caretas que
fazia quando estava irritada foi suficiente por hoje.
Pegaria tudo o que descobri e iria embora antes que
ela mefizesse matar um dos meus amigos mais antigos.
— Deixa para a próxima, — respondi, tentando ao
máximo não olhar para trás. Não queria lhe dar o gostinho de
saber o que ela tinha feito comigo. Não quando ela pensava
que Grady havia deixado a droga dos bilhetes. Isso não me
surpreendia. Foi ele quem tentou afastá-la de Boone, mas
porra, fui eu quem pôs fim em tudo. Fui eu quem a observou
todas as noites. Fui eu quem lhe contou sobre as estrelas.
Grady é o caralho.
Eu estava revirando os olhos quando a ouvi gritar
atrás de mim.
— Amanhã! Você vai me contar amanhã.
LIV
— Liv, você me ouviu? Liv!
Meus olhos dispararam para Mel e abandonaram a
vista do oceano.
— Desculpe, — falei ofegante ao seu lado, enquanto
corríamos pela praia.
Era fim de semana e tínhamos nos levantado cedo
para correr porque nossos pais insistiram. Nada de estar
acima do peso para sua festa de debutante. Revirei os olhos.
Mel falava repetidamente sobre um cara que conheceu em
uma festa outra noite, mas eu era uma péssima amiga porque
tudo o que conseguia pensar era na noite passada.
E mesmo que estivesse observando o lindo nascer do
sol na praia da Carolina, eu não o notei de verdade. Não,
ainda estava presa à entrada de carros, descalça e com o cara
tatuado parado na minha frente. Imagine o choque. Nunca
sonhei nem por um momento que era ele quem estava
deixando os bilhetes. Principalmente porque a pessoa que os
deixava para mim conhecia muito sobre as estrelas, mas
aquele cara? Ele não parecia saber muito sobre nada, com
exceção de como se envolver em encrenca.
Mas era ele. Olhos azuis dolorosamente frios e tudo
mais. Ele ficou lá parado em toda sua beleza no anoitecer. Não
sei o que me possuiu e me fez voltar para fora naquela noite.
No fundo, eu já sabia. Aquelas tatuagens coloridas que se
destacavam em sua pele como pequenos quadros na parede
branca de um museu. Seu cabelo negro e comprido demais,
seus olhos me devorando.
Finalmente o conheci, ele me seguiu até em casa e
ficou lá, parado, aparentemente perdido no começo e, de
repente, aborrecido. Comigo foi diferente. Eu me senti segura
com ele. Arranquei o cigarro de sua linda boca e exigi saber
seu nome. Sorri ao lembrar daquele momento. Que ousadia.
Fui muito foda.
— O que você está pensando?
— Nada, — ofeguei, limpando o suor da minha testa.
Eu não diria a ninguém sobre o garoto tatuado. Não,
ele era um segredo meu. Além do mais, se Georgina
descobrisse sobre ele, ficaria possessa. Aquelas tatuagens e
pose de bad boy não eram bem a praia dela. Não que eu não
quisesse contar para Mel. A questão é que eu não podia. Eu
queria contar tudo. Essa era uma das coisas mais
empolgantes que já aconteceu comigo. É claro que queria
compartilhar com ela, mas sabia que não devia.
Ela parou no meio do caminho e se inclinou, tentando
recuperar o fôlego. Seus olhos azuis brilhavam.
— Você conheceu alguém.
Ri de nervoso e continuei minha corrida como se ela
não tivesse adivinhado tudo.
— O quê? Não! Você está doida.
— Não, não estou, — ela disse, sentando e esticando
as pernas. — Você nunca fica avoada assim. Mas agora eu
entendi. Você sonhou acordada a manhã inteira.
Neguei na cara dura.
— De jeito nenhum. Nunca fiquei com ninguém da
ilha. Você sabe disso.
Ela arqueou as sobrancelhas.
— Ah, então você conheceu alguém que não é da
ilha?
Meu rosto ficou em chamas.
— Não. Não há ninguém. Só estava pensando sobre
as coisas da escola, as aulas de etiqueta e o baile de
debutante idiota que está se aproximando. Estou
sobrecarregada, não apaixonada, sua doida!
Ela começou a andar lentamente de volta para casa e
eu a acompanhei.
— Não disse que você estava apaixonada. Disse que
você conheceu alguém.
— Você está errada. — Se era para mentir, você tinha
que se agarrar à mentira.
O olhar que ela me lançou demonstrava que sabia
que eu estava mentindo, por isso apenas sorri e pisquei os
olhos docemente.
— Então tá. Não me conte sobre o seu namoradinho.
Contraí os lábios antes de dizer:
— Como você sabe que não é namoradinha? —
Lambi os lábios e ela percebeu o gesto.
Seus olhos ficaram arregalados.
— Minha nossa! É?
Parei na praia para que eu pudesse rir.
— Fala sério, Mel, — eu disse em meio a risadas. —
Você me conhece há anos. Não acha que eu teria falado se
fosse lésbica?
Ela jogou as mãos para o alto.
— Como eu poderia saber? Você parece o Fort Knox
com tantos segredos. Você guarda tudo com tanto cuidado.
Seu rosto estava corado e ela cruzou os braços
contra o peito. Eu conhecia Mel tempo suficiente para saber
que ela estava ficando chateada, mas continuei rindo até que
ela finalmente se aproximou, me olhando nos olhos.
— Você é uma idiota, Livingston Montgomery! — Seu
rabo de cavalo balançou quando ela se virou e saiu andando
como um furacão pela praia.
Eu sorri e gritei:
— Não! Mas sim, eu gosto de um pau!
Nunca tive um pau na vida, então não sabia se
gostava ou não, mas não pude perder a oportunidade de
atazanar Mel.
Ela parou o tempo suficiente para disparar um olhar
em minha direção enquanto gritava:
— Que engraçado.
Corri para alcançá-la, ainda rindo baixinho. Puxei seu
rabo de cavalo esvoaçante.
— Não fique chateada, Mel. Eu só estava brincando.
Ela me olhou pelo canto do olho e tentou segurar um
sorriso.
— Eu sei. Mas você ainda é uma idiota.
Assenti.
— Eu sou. Você me perdoa?
— Vou pensar no seu caso.
— Ótimo. Não quero que a única pessoa de toda
Saint Ashley que gosta de mim de verdade, fique aborrecida
comigo.
Ela revirou os olhos.
— Você é tão dramática. Não sou a única pessoa que
gosta de você.
— É sim, — falei distraída.
— Braden gosta de você.
— Braden gosta de qualquer uma que tenha uma
vagina, Mel. Ele não conta.
Ela cutucou meu ombro.
— Você devia dar uma chance a ele. Ele é um cara
bacana, tem dinheiro e o pai dele é o xerife.
Não disse para Mel que aquelas qualidades não
significavam nada para mim. Não, eu queria um homem que
me achasse extraordinária. Que me amasse. Eu só queria um
homem. Não um garoto que se considerava importante por
causa de sua classe social. O amor não podia ser medido com
dinheiro.
Chegamos em minha casa bem a tempo de evitar
mais conversas sobre Braden, então, acenei para Mel e entrei,
grata por ser final de semana, quando as aulas de etiqueta e a
escola eram inexistentes. E apesar de eu não ir à campina nos
finais de semana, eu iria hoje à noite, porque falei para ele
“amanhã” e, finalmente, já era amanhã. Foi uma longa espera
a noite toda em minha casa, imaginando qual seria o nome
dele. Imaginando o que ele diria para mim. Eu mal consegui
dormir.
Estava sonhando acordada com o garoto das
tatuagens de novo, quando fui até a geladeira pegar uma
garrafa de água gelada. Me virei, fechei a porta e colidi com
um corpo forte.
— Ai! — Minha garrafa de água rolou pelo chão e
Sebastian se abaixou para pegá-la.
Fiquei parada lá, encarando-o enquanto ele
bloqueava a saída da cozinha. Estendi minha mão, esperando
ele me devolver a garrafa mesmo sabendo as merdas que ele
costumava fazer.
O idiota não me devolveu; pelo contrário, ele a
manteve firme em sua mão bem ao seu lado.
— Vem pegar, Livingston.
E eu fui. Me estiquei o bastante para não ter que
chegar nem um centímetro perto dele e arranquei a garrafa de
sua mão.
— Dá para sair do caminho? — Rebati, minha mão
firme ao redor da garrafa.
Ele assentiu.
— Claro.
Comecei a seguir adiante, mas ele ainda bloqueava
minha passagem, então recuei, decidida a não chegar perto
para que ele não pudesse fazer algo sinistro, como me cheirar
ou sussurrar em meu ouvido. O pensamento me causou
arrepios.
Ele sorriu e fiquei enjoada. Ele sempre fazia isso;
fingia ser amigável e depois aplicava o golpe mortal.
— Vou sair. No momento em que me disser onde tem
ido todas as noites.
Engoli em seco. Apavorada que ele soubesse. Com
medo de que ele tivesse me seguido. Pensei que fosse
cuidadosa. Sempre fiz questão de saber se ele estava em
casa ou esperava até que todos estivessem dormindo. Percebi
como eu estava errada. Sebastian estava sempre me
observando, sempreesperando por um momento de fraqueza
para atacar. Sempre buscando um jeito de se meter na minha
vida.
Dei de ombros e olhei para o chão. Eu era uma
péssima mentirosa, mas mentiria o quanto pudesse. De jeito
nenhum contaria para Sebastian sobre a campina do meu pai.
Sobre os bilhetes. Sobre o cara tatuado que me esperava lá.
Fiquei desnorteada. Como eu sairia hoje? Será que
ele ficaria observando e aguardando eu sair? Será que me
seguiria pela ponte e arruinaria o único lugar que eu ainda
tinha? Arruinaria minha chance de finalmente conversar com o
garoto que tinha acabado de aparecer?
— Não tenho conseguido dormir. — Dei chutinhos no
azulejo com meu tênis e mais suor se acumulava nas minha
costas. Era como se eu estivesse sob uma lâmpada de
aquecimento, e não sob o olhar atento de Sebastian. — Às
vezes vou até a praia. Acho que é estresse por causa do baile.
Por conta de todas as aulas com a senhora Donnelly.
Olhei para ele de forma breve para ver se tinha
acreditado na mentira. Seus lábios estavam contraídos, como
se ele estivesse pensando, e houve um rápido segundo em
que pensei que sairia impune.
— Sozinha?
Olhei para ele, atordoada com a pergunta. Ele
colocava todos os garotos da escola para correrem. Com
quem ele achava que eu estava indo caminhar?
— Sim. Sozinha, — respondi baixinho, nauseada e
cansada disso. Cansada de ter que me preocupar com
Sebastian. Exausta dos interrogatórios e intimidações. Exausta
de me preocupar constantemente. De pisar em ovos.
— Uhm, — ele resmungou, seus olhos castanhos
pensativos, sua altura, ameaçadora. Sebastian era grande,
forte e inteligente. Podia ser uma combinação mortal quando
queria. Mas ele deve ter decidido me dar uma folga, porque se
moveu para o lado e eu não perdi tempo imaginando o porquê.
Corri para o quarto, direto para o chuveiro.
Tranquei a porta e, enquanto tomava banho, presumi
que ser cuidadosa já não era mais o suficiente. Ele estava no
meu pescoço. Não poderia correr o risco de ele descobrir
sobre a campina, meus bilhetes sobre as estrelas ou meu
garoto tatuado. Ele os tiraria de mim com toda brutalidade
possível, e eu não podia correr esse risco.
Terminei de tomar banho a tempo de me juntar à
minha madrasta e seu filho para o jantar. Comemos em
silêncio, mas os olhos de Sebastian nunca estiveram tão
atentos. Eles raramente se moviam para longe de mim,
mesmo enquanto ele cortava o bife.
Soltei um bocejo ao fim do jantar, alegando estar
exausta, e fui para a cama. Harry e eu subimos os degraus,
apaguei as luzes e deslizei para debaixo das cobertas com
meu celular, Harry aquecendo meus pés. No meu celular,
assisti vídeos no YouTube até tarde para ter certeza de que
todos estavam dormindo, especialmente o babaca louco do
Sebastian.
Não levei Harry. Fiquei com medo de que os ruídos
de suas unhas contra o chão pudessem acordar alguém,
portanto, éramos apenas eu e meu cobertor azul andando
sorrateiramente pela noite.
Orando para que o garoto tatuado ainda estivesse
esperando por mim, corri pela ponte em minha calça preta de
yoga e camiseta do Preparatório Saint Ashley, meus chinelos
azuis beliscando meus dedos. Passei pela grama com a
rapidez de um raio, a agitação servindo de estímulo, quando
cheguei ao meu lugar na campina. Esperei até mais tarde para
ter certeza de que todos estavam dormindo mesmo. Olhei ao
redor, procurando pela minha garrafa de Coca-Cola, mas, o
mais importante, procurando o garoto.
Nada. Nada de garrafa de refrigerante. Nada de
bilhete. Nada. As nuvens estavam tão densas esta noite que
não havia estrelas. Eu poderia ter chorado.
— Oláááá, — gritei, mas fui recebida pelo silêncio.
Minha respiração ficou pesada e meu coração parecia
dar pancadas em meu peito. Ai, meu Deus. Era o fim. Ele não
estava aqui. Ele não deixou nenhum bilhete. Estava tudo
acabado. Ele se cansou de mim depois da noite passada. Eu
tinha certeza de que uma crise de pânico era assim. Não
entendi por que estava tão devastada. Tinha acabado de
conhecê-lo, mas acho que essa era a razão por eu estar tão
triste. Não cheguei a saber seu nome, por que ele deixou os
bilhetes ou como ele sabia tanto sobre as estrelas.
As lágrimas queimavam meus olhos quando joguei o
cobertor no chão à Deus-dará e me sentei. Estava mais do que
decepcionada. Levei as mãos ao rosto, tentando segurar as
lágrimas. Fui idiota. Por que criei expectativas com um bad boy
tatuado? Eu não era assim. Mas ele me iludiu. Ele me iludiu
com as estrelas, com os bilhetes românticos e a droga da
gar…
— Você está atrasada, — uma voz profunda me
afastou do meu tormento.
Olhei para cima através da minha visão embaçada e
lá estava ele, a fonte de toda minha tristeza. Deus, ele era
bonito, e não porque eu estava aliviada em vê-lo. Ele estava
parado bem acima de mim, mas eu ainda conseguia ver os
músculos embaixo de sua camiseta branca apertada que
combinava com a calça jeans escura e apertada. Meus olhos o
devoraram como se ele fosse meu lanche favorito. Movi meu
olhar para as botas pretas que pareciam ser imitações de uma
Dr. Martens, e eu estava praticamente desmaiando. Ele era
intimidador, mas Deus, era lindo. Meu olhar percorreu seu
corpo e as tatuagens que surgiam pela gola de sua camiseta,
em seu pescoço. E aquele maxilar. Era firme e quadrado —
inflexível. Eu queria tocá-lo. Então meus olhos encontraram os
olhos azuis e gelados dele. Eles não sorriam. Não eram
amigáveis mas, ainda assim, meu estômago deu uma
cambalhota enquanto eu o observava. Seu cabelo estava
bagunçado, como se ele não penteasse há algum tempo, mas
isso não importava. Era perfeito assim.
Ele era o típico bad boy, mas tudo nele era bom
demais.
Não conseguia parar de olhar, e foi provavelmente
por isso que ele finalmente perguntou:
— Você vai chegar para lá ou o quê?
— Ah, — murmurei atordoada, chegando para o lado
para abrir espaço no cobertor azul.
Quando ele estava sentando, minha mente de
repente voltou a funcionar.
— Espere! — Exclamei.
De agachado, ele voltou a ficar de pé do meu lado.
— O quê? — Ele parecia alarmado.
Por mais que eu me sentisse fascinada, não deixaria
que ele fosse outra pessoa em minha vida que me controlasse
e passasse por cima de mim.
Olhei para o cobertor azul.
— Você tem que me dizer seu nome antes de se
sentar no cobertor do meu pai, garoto tatuado.
Ele arqueou perigosamente sua sobrancelha em
minha direção.
— Garoto tatuado?
Falei uma palavra em resposta, deixando seus olhos
arregalados. Ele só podia estar brincando. Ele também tinha
apelidos para mim.
— Luna?
Ele assentiu, pensativo, antes de responder.
— Adam. Adam Nova.
Pisquei, sem acreditar.
— Nova?
Como a estrela. A estrela que resplandecia até
explodir. Eu tinha certeza que uma supernova era assim.
Parecia impossível que um cara que conhecia as estrelas
tivesse um sobrenome daquele. Ele devia ser muito
convencido.
— Sim, — ele disse, sentando perto de mim como se
fizéssemos isso a vida toda. Como se não fosse uma grande
coisa. Como se eu não estivesse sentindo frio na barriga.
Como se não fosse o acontecimento mais épico da minha
adolescência.
— Você está brincando?
— Não.
Sabe o quê? Eu queria saber mais. Como um cara
que conhecia as estrelas tinha o sobrenome Nova?
— Você vai explicar?
— Não, — ele resmungou ao se reclinar para trás,
observando o céu encoberto.
Deitei perto dele. Foi tão esquisito quanto você
poderia imaginar. Eu estava tensa e assustada, apenas uma
garota de dezesseis anos que nunca havia beijado, muito
menos deitado com alguém em um cobertor sob as estrelas.
Então, fiz o que normalmente faço quando me sinto
envergonhada e estranha: falei, porque eu era o tipo de
pessoa que não conseguia evitar.
— Quer saber o meu?
Sua cabeça se moveu lentamente em minha direção
e, mais uma vez, aqueles olhos azuis estavam sobre mim, me
causando arrepios e uma sensação de que estava pegando
fogo.
— Quero saber o quê? — Sua voz dava a entender
que ele não ligava para o que eu estava falando, mas aqueles
olhos contavam outra história. Diziam que ele não se cansava
em me ouvir.— Meu nome, — zombei de sua pergunta.
Ele se aproximou de mim.
— Claro.
Ai. Meus. Deus. Será que Adam Nova já teve alguma
conversa normal em sua vida ou elas eram sempre assim:
super complicadas? Caramba, seria incrível se ele pudesse
articular um único pensamento.
— Então por que não perguntou?
Ele deu de ombros.
— Imaginei que você fosse me dizer.
— Quando deixava os bilhetes?
Seu olhar estava de volta para o céu.
— Assim que escurecia aqui fora.
— E depois?
— Depois eu esperava.
— Por quê?
— Não sei, — ele disse para as nuvens.
— E quando eu finalmente chegava aqui? O que você
fazia?
Ele respirou fundo e ficou quieto. Pensei que não
fosse responder, mas sua voz e o que ele disse me
surpreendeu.
— Eu observava.
Fiquei estatelada no chão de tão chocada. De queixo
caído enquanto tropeçava em minhas próximas palavras.
— Por quê?
Sua cabeça pareceu virar em câmera lenta e seus
olhos chocaram com os meus como em uma colisão entre dois
caminhões.
— Porque eu não conseguia deixar de observar.
Arrepios atingiram minha pele e senti meu peito ficar
apertado. Não poderia descrever o que senti naquele
momento. Eu me senti assustada. Empolgada. Lisonjeada.
Ninguém me observava além de Sebastian. Ninguém se
preocupava sem ser ele, por razões que não eram corretas. E
por mais que Adam fosse estranho à sua própria maneira, algo
me dizia que ele era seguro. Fiquei deitada sobre o cobertor,
olhando para o céu com espanto, em choque. Ele me
observava. Colocava bilhetinhos na garrafa e me observava
abri-los e ao deitar naquele mesmo lugar para admirar as
estrelas. Por quê? Porque ele não conseguia deixar de me
observar. Eu não estava acreditando.
— Vai me contar ou não?
Saí de meu deslumbre e voltei a olhar para ele, mas
Adam estava olhando para o céu de novo.
— Contar o quê?
— Seu nome, — ele sussurrou.
Pude sentir o meu sorriso. Ele queria saber, mesmo
que não tivesse perguntado. Eu queria saber um milhão de
coisas sobre ele, mas sabia que ele seria osso duro de roer.
Então fiz o que a adolescente que gostava de um garoto fazia:
banquei a difícil. E cara, estava mesmo fingindo, porque eu já
estava na dele.
— Amanhã.
ADAM
Já era amanhã e eu estava animado. Isso
provavelmente não era uma coisa boa. Passei a manhã inteira
viajando com os feromônios que a garota a quem eu chamava
de Luna deixou para trás ontem. Ela era como uma droga. Eu
praticamente acordei num pulo para trabalhar nesta manhã.
Era ridículo e eu ainda não conseguia parar de pensar nela por
mais que tentasse. Saí do trabalho, vim para minhas aulas da
tarde, e as aguentei sentado sem ouvir uma única palavra.
Que bom que minhas notas estavam boas porque sabia que
os próximos dias seriam comigo sentado aqui, pensando
naquele momento. O momento em que lhe contei a verdade. A
verdade que não tinha nem admitido para mim mesmo ainda.
Porque eu não consigo deixar de observar.
O que havia de errado comigo? Nunca fiquei tão
agitado por causa de algo ou de alguém. Esse não era eu; era
tão diferente de mim. Não conseguia parar de ir até ela, de vê-
la. Eu não queria parar.
Meu Deus, nossos rostos estiveram tão próximos
naquela noite que tudo o que eu teria que fazer era me inclinar
para frente e minha boca teria tocado a dela. Seu olhar
liquefeito falava por si só naqueles segundos após minha
confissão, e não diziam as coisas que pensei que diriam. Ela
não estava com raiva ou assustada, ou chateada.
Surpreso, voltei a me deitar, imaginando se alguma
vez algo chegou a assustar aquela garota destemida.
— Senhor Nova, permaneça aqui depois da aula, — o
professor Johnson interrompeu meus pensamentos.
A aula de inglês tinha terminado, todos estavam
levantando para ir embora e lá estava eu, ainda sonhando
acordado com a garota cujo nome eu não sabia.
A garota ao meu lado passou por mim e fez questão
de passar a mão sobre a tatuagem em meu braço.
— Tatuagens legais, — ela murmurou sedutoramente
antes de me lançar um olhar que dizia “pode me encontrar no
meu carro lá no estacionamento e me possuir no banco de
trás”. Eu recebia muito esses olhares, mas eles não me
interessavam. Eu não tinha mais tempo ou disposição para
relacionamentos aleatórios.
Pegando a mochila, me levantei e caminhei pela sala,
ignorando a garota e sabendo que levaria o sermão do século
por não prestar atenção na aula.
— Sente-se, Adam. — Ele apontou para a carteira na
frente da sala e pegou alguns trabalhos em sua mesa.
Curioso para saber o que estava acontecendo, eu me
sentei, observando-o. Ele se virou e colocou algo sobre minha
carteira. Com o cenho franzido, olhei para o papel. Era meu. O
mesmo trabalho que entreguei há alguns dias.
Ele se sentou na carteira ao meu lado e indicou o
papel.
— Precisamos conversar sobre esse trabalho.
— Ok, — respondi. Eu sabia como me safar: sendo
indiferente. Vesti minha indiferença como uma armadura. Era o
único jeito de ser que eu conhecia.
— É brilhante. Seu trabalho é incrível. O modo como
usou química e matemática para descrever a evolução das
estrelas e dos planetas…
— Caramba, isso de novo não, professor. Essa é a
droga de uma aula inglês. — Eu me levantei, pronto para vazar
de lá, porque sabia o que estava por vir. Alguns professores
não tinham que se preocupar tanto, mas este se preocupava, e
por mais que me fizesse sentir lisonjeado e alimentasse meu
ego, também me irritava porque ele nunca entendia a minha
situação.
Ele se levantou e me seguiu enquanto eu ia em
direção à porta.
— Fala sério, Adam. Você sabe que inglês é bom. E
eu sei que sou apenas um astrônomo amador, mas você, filho,
é muito mais do que isso. Não pertence a essas escolas
técnicas insignificantes.
Parei e me virei até ficarmos frente a frente e eu
mentir na cara dura.
— Eu gosto daqui.
Por que ele não me deixava em paz? Eu não tinha
escolha. Frequentava a escola para ter acesso ao ensino
básico e esperava que um dia tivesse dinheiro suficiente para
ir para uma universidade perto daqui.
Ele balançou a cabeça.
— Papo furado, Adam. Seu boletim do ensino médio
e suas notas do ano passado, não indicam que você gosta
daqui. Elas demonstram que você está entediado. Você é
extremamente habilidoso e pertence à uma das melhores
escolas de Astronomia e Astrofísica do país. Não merece ficar
apodrecendo aqui. Deixe-me ajudá-lo.
Ele tentou colocar a mão no meu ombro, mas eu me
afastei e corri para a porta.
— Não estou interessado, professor, — menti de
novo. Não gostava de mentir, mas era muito mais fácil do que
a verdade. A verdade é que eu não poderia deixar meu pai se
virando sozinho. Não com seu mísero salário de aposentadoria
por invalidez. Não, ele precisava do meu salário também. Essa
escola técnica insignificante teria que servir por agora. Merda,
que tal alguém me dar alguns créditos por sequer frequentar a
escola?
Por mais que eu guardasse um ressentimento do
tamanho de Júpiter, continuava animado para ir até a campina.
Puto com a minha situação e mais puto ainda com o fato de o
professor ter insistido, caminhei pela grama, exausto após uma
manhã de trabalho e escola o dia inteiro. Tudo parecia tão
monótono. Sem fim.
Como sempre, ela estava lá, esperando. Só que
dessa vez, estava procurando por mim.
— Oi, — ela disse baixinho do cobertor, seu cachorro
cochilando no chão ao seu lado.
Agitei a cabeça na direção do cachorro.
— Laelaps.
Ela balançou a cabeça, rindo.
— Não, apenas o bom e velho Harry.
Eu me sentei perto dela, minha coxa coberta pela
minha calça jeans pressionada contra sua coxa desnuda.
— E você?
Ela estendeu a mão e eu não pude fazer nada além
de segurá-la. Nos cumprimentamos.
— Livingston Rose Montgomery, ao seu dispor, — ela
disse com um forte sotaque sulista que quase me fez sorrir.
Mas ao invés disso, deitei sobre o cobertor e olhei
para as estrelas, ainda cansado do dia e de cabeça quente
com a aula.
— Nossa, hoje foi uma merda. Odeio as aulas de
etiqueta e tive duas hoje. Duas! Quanta tortura uma garota de
dezesseis anos precisa aguentar? Ser sulista não é fácil,
Nova. — Ela cutucou minha perna e euresmunguei em
reconhecimento sem dizer uma palavra.
Dezesseis. E eu tinha dezenove. Ela era jovem
demais para mim, mas eu estava atraído por ela de um jeito
tão justificável que não pude negar.
Já estava me sentindo melhor só de estar ao lado
dela. Era como se um peso tivesse sido removido dos meus
ombros. Como se estudar na escola técnica e cuidar do meu
pai não fosse assim tão ruim, desde que a garota estivesse
aqui.
— O que acha que isso significa, Adam? — Ela
estava observando as estrelas.
— O quê? — Murmurei.
Ela indicou o céu com o queixo.
— Isso.
Meu olhar se moveu para o céu e depois para ela.
— Acho que significa que diante da grandiosidade
das coisas, somos pequenos, insignificantes. Veja como o
universo é enorme, — falei em voz baixa.
Ela se virou para mim devagar, seu rosto sério.
— Mas podemos fazer a diferença diante de coisas
tão pequenas, certo?
Eu não conseguia suportar a esperança em seu olhar.
A pergunta queimava em minha língua.
— É isso o que quer? Fazer a diferença?
Olhando para o céu, ela respondeu:
— Claro.
E foi isso. Uma única palavra que dizia tudo. Não
tinha dúvida de que Livingston mudaria o mundo.
Ela só ficou em silêncio por alguns minutos após
nossa conversa antes de começar a falar sobre as tarefas da
escola, seu cachorro e sua amiga Mel. Eu ouvi tudo sem dizer
uma palavra sequer. Caramba, aquela garota falava. Mas eu
não queria saber sobre aquelas coisas. Queria saber coisas
mais pessoais. Mais íntimas.
Quando ela finalmente parou de falar e ficou olhando
para o espaço, perguntei algo que fiquei a noite toda
pensando.
— Por que você faz isso?
Ela virou a cabeça para me olhar, seus olhos estavam
arregalados. Com o queixo caído, ela levou a mão ao peito.
— Você, — apontou para o meu rosto, — acabou
mesmo de abrir a boca e movimentá-la enquanto sons saíam
dela?
Revirei os olhos e suspirei, deitando minha cabeça,
antes de virá-la para o lado, lhe dando um olhar de pouco
caso.
Ela riu.
— O quê? Tudo o que disse foi duas palavras. Estou
chocada neste momento. Poderia cair morta aqui. A terra está
se movendo sob os meus pés. Sinto o céu desabar…
Quase ri de sua palhaçada.
— Isso é uma música, não é?
— Não sei. É? — Ela riu, sendo completamente
meiga e me jogando de volta ao silêncio. Eu não precisava
falar. Só Deus sabia que ela poderia falar o suficiente por nós
dois.
— Por que eu faço o quê?
— Fica deitada aqui o tempo todo? Vem para essa
campina quando poderia ficar no conforto de sua casa na ilha?
Fala sozinha como se fosse louca? — Minhas perguntas eram
intermináveis quando o assunto era Livingston Montgomery.
Disse a mim mesmo que era apenas curiosidade. Mentira.
Disse a mim mesmo que era porque ela era intrigante. Mentira.
Não, eu não me cansava dela. Estava obcecado. Queria saber
sobre tudo. Queria enxergar as estrelas através do seu olhar.
Ela arqueou as sobrancelhas.
— Louca? Nossa. Acho que prefiro você calado. Na
verdade, acho que era melhor quando você só deixava os
bilhetes na garrafa.
Eu apenas encarei, esperando minhas respostas,
tentando não deixar suas palavras me atingirem. Eu era
quieto, reservado. Quem me conhecia diria que era tímido e
desajeitado. A maioria das outras pessoas pensava que eu era
um bandido idiota. Não devia ter feito as perguntas daquela
maneira. Não era bom com as palavras, sentimentos, nem
mesmo pessoas, para falar a verdade. Além de tudo isso,
ainda estava mal-humorado para caralho por causa da aula e
descontando sobre ela.
Ela soltou um longo suspiro e engoliu em seco.
— Você não deveria presumir coisas sobre as
pessoas, Adam. Nem tudo é o que parece. — Ela me deu um
olhar desaprovador. — E você não faz ideia de como é a
minha vida. Acredite, não há nada de, — ela fez aspas com os
dedos, — confortável.
Eu apenas a encarei, sem saber o que dizer,
principalmente porque sabia que ela estava certa. Não deveria
tirar conclusões precipitadas sobre as coisas. Uma parte de
mim ficou mal por isso, mas a parte mais lúcida sabia que lá
ela estava mais protegida. Na ilha. Longe de mim. E
definitivamente longe deste lado da cidade.
Ela franziu o cenho, seu maxilar contraído.
— O que você está olhando? — Ela grunhiu,
levantando-se e agachando ao lado do cobertor. Ela começou
a enrolá-lo até não conseguir mais, porque eu ainda estava
deitado. — Você já pode sair daí.
— Sei que posso.
Ela puxou o cobertor.
— Saia do meu cobertor, garoto tatuado.
— Que maturidade, — eu disse com indiferença.
Ela puxou o cobertor com força, enquanto seu
cachorro andava de um lado para o outro, nervoso, mas não
me movi, nem tentei. Ela estava sendo fofa demais e eu sorri.
— Não ligo para essa porra de maturidade! Tenho
dezesseis anos. Posso ser imatura se eu quiser, seu babaca!
— Ela gritava e meu sorriso só aumentava.
— Você beija sua mãe com essa boca, mocinha?
Ela hesitou e olhou para mim com os dentes
semicerrados, antes de puxar o cobertor com força e me fazer
rolar na grama. Soltei um palavrão ao cair de cara no chão.
Ela bateu com o cobertor em mim enquanto o
enrolava.
— Não, eu não beijo minha mãe, seu babaca idiota,
detestável e preconceituoso. Não a beijo porque meus pais
estão mortos e venho até aqui para conversar com eles. Venho
para cá para encontrar paz. — Ela passou por mim como se
eu fosse um pedaço de merda que devia ser evitado para não
grudar em seus sapatos, e se apressou em direção à ponte
que a levaria para casa.
E eu era. Um grande pedaço de merda. Meu Deus,
enfiei os pés pelas mãos. Fiquei me perguntando para quem
ela voltaria, se seus pais estavam mortos. E me senti um mau
caráter. Um grande mau caráter. Não por conta do que
conversei com ela ou do que disse. Fui apenas eu mesmo. Já
tinha desistido há muito tempo dos ideais que as pessoas
achavam corretos sobre o que eu deveria fazer ou dizer. No
geral, eu falava o que queria. E na maioria das vezes era
estranho e não era legal, mas era sempre com honestidade.
Não, eu não me sentia mal por nossa conversa. Fiquei mal
porque ela tinha perdido os pais. Mal por ela vir aqui para
conversar com bolhas de gás e calor, e não com pessoas.
Fiquei mal por ela sentir, por alguma razão, que este lugar era
mais seguro para ela do que sua casa na ilha.
— Livingston Rose Montgomery! — Gritei, levantando
do chão.
Ela não se virou, mas jurava que vi seu cachorro me
olhar com desprezo. Droga, eu merecia. Não parecia certo ir
atrás dela. Pensei que pudesse assustá-la e essa era a última
coisa que queria. Precisava que ela retornasse do mesmo jeito
que necessitava de ar, mas não a espantaria.
— Livingston! — Gritei ainda mais alto. Ela não olhou
para trás ou fez menção de que havia me escutado, com
exceção do lento movimento de seu dedo do meio erguendo-
se sobre sua cabeça enquanto ela continuava andando, seus
quadris se movendo lentamente, o que me fez perceber que
ela tinha uma bunda grande.
Ri baixinho. Ela era fogo. Fiquei surpreso por não ter
sido todo queimado. Já estava contando os segundos para vê-
la novamente.
LIV
Eu poderia ter levado na esportiva. Poderia ter
evitado a campina e deixado Adam se virar. Só que eu não era
assim. Não fiz isso. Não consegui. Percebi que aturar a escola
e as aulas de etiqueta durante o dia não era tão ruim, quando
sabia que Adam estaria lá à noite. E por mais que ele fosse
reservado e mal abrisse a boca, eu me sentia segura. Era
como se eu tivesse uma intenção. Subitamente, Adam era
meu propósito. Ele fazia com que os dias fossem muito mais
fáceis. Mas eu não sabia exatamente o que aquilo dizia sobre
mim... Que um garoto que só conheci pessoalmente há uma
semana, me afetava daquela maneira, era tão assustador
quanto emocionante.
Às vezes eu vinha para a campina quando dava
meia-noite e fazia questão de ser mais cuidadosa ao sair. Até
caminhava na praia antes de atravessar a ponte para ter
certeza de que ninguém estava me seguindo. Eu não arriscaria
Adam; não quando passar tempo com ele me fez tão feliz nos
últimos dias. Ele não era tagarela e eu estava completamente
de boa com isso porque ele era real. Nãohavia pretextos ou
delicadezas entre nós. Confiava nele completamente porque
ele não tinha nada a ganhar com nossa amizade além de mim.
Ele valorizava a mim e não ao meu dinheiro ou minha herança.
Braden, que ainda insistia em me levar para sair, não
tinha sido capaz de arruinar o meu bom humor. Até Georgina e
Sebastian estavam distantes ultimamente. Era o que eu
pensava até ouvir uma batida na porta do meu quarto
enquanto fazia a tarefa de casa. Foi como se eu os tivesse
conjurado.
— Oi, — falei, sem me mexer na cadeira, porque se
fosse Sebastian, eu não abriria aquela porta nem por todo o
dinheiro do mundo.
— Eu gostaria de falar com você por um instante,
Livingston, — Georgina falou suavemente do outro lado da
porta.
Revirei os olhos e respirei fundo, tentando me
preparar emocionalmente para a conversa. Eu fazia isso
sempre que ela pedia para conversar, porque nunca era sobre
algo importante para mim ou relativo a alguma coisa que me
interessava. Não, a única vez que Georgina quis conversar foi
quando precisou de mim para algo que a beneficiaria.
Coloquei o sorriso mais falso no rosto e abri um
pouco a porta.
— Sim?
Ela olhou dos meus olhos para o restante da porta
antes de pigarrear e dizer com sarcasmo:
— Posso entrar?
Meu sorriso esquisito ficou ainda maior mesmo
quando o meu cérebro parecia que fosse explodir. Odiava
quando eles entravam no meu quarto. Este era o único lugar
que podia chamar de meu além da campina no outro lado da
ponte. Mas andei para trás e abri a porta. Eu não gostava de
tirar Georgina do sério. Depois que meu pai morreu, ela se
transformava em uma louca quando ficava irritada. Nunca fui
muito fã dela. Nem quando eles namoravam, nem quando meu
pai nos trouxe para a ilha por causa dela. Muito menos quando
eles se casaram, mas cheguei a conclusão de que não teria
que lidar com ela pelo resto da vida como ele, que parecia
gostar de sua companhia.
Não ser muito fã dela tinha se tornado praticamente
odiá-la desde a morte do meu pai. Ela mudou muito; deixou de
ser uma esnobe moderada e tornou-se uma doida pirracenta
quando não conseguia as coisas do seu jeito.
— O que houve? — Perguntei em um tom agradável.
Ela estava usando um caro terninho com saia cinza e
blusa rosa-claro por baixo. As pérolas sempre presentes
estavam penduradas em seu pescoço e grandes brincos de
diamante adornavam suas orelhas. Seu cabelo estava
arrumado em um coque solto. Ela estava muito bem vestida
para as nove da noite. Mas, desde que a conheci, nunca vi
aquela mulher mal vestida. Nem sei se ela tinha pijamas.
Georgina sentou na minha cama, as pernas cruzadas
nos tornozelos, com toda sua classe sulista.
— Queria conversar sobre o baile de debutante que
está se aproximando.
Eu estava confusa. O que precisávamos conversar?
Eu já estava fazendo todas as aulas idiotas e já tínhamos
encomendado meu vestido.
— Sim? — Fiquei de pé do outro lado do quarto, me
preparando para o pior, e eu não estava errada.
Ela puxou um fiapo do meu edredom e isso me
deixou extremamente aborrecida.
— Gostaria que você fosse com Braden de
acompanhante.
Respirei fundo e antes que pudesse me conter, o
pânico tomou conta de mim e transbordou pela minha boca.
— O quê? Mas por quê?
Suas costas ficaram perfeitamente eretas, sua
sobrancelha loira arqueou e me desafiou a abrir a boca
novamente.
Um sorriso meloso se formou em seus lábios e ela
ajeitou a saia. Eu conhecia aquela técnica. Era o jeito de
Georgina começar o papo furado. Era uma tática de
paralisação que ela usava até organizar as ideias e estar
pronta para utilizá-las. Já a vi fazer aquilo com meu pai cinco
mil vezes e mais ou menos umas cem comigo.
Revirei os olhos e cruzei meus braços na defensiva.
Ela não iria decidir quem eu levaria ao baile. Essa era uma
decisão minha.
— Braden é um bom garoto. Vem de uma boa família.
Seu pai é o xerife e ouvi dizer que ele gosta de você, — ela
terminou a última parte com um tom cantarolado que me fez
contrair os lábios e torcer o nariz. — Ah, pare com as caretas
dramáticas, Livingston. Não é nada de mais. É apenas um
baile, pelo amor de Deus.
Eu não podia acreditar. Era ela quem estava sentada
aqui fazendo drama sobre quem eu deveria levar ao meu baile
de apresentação e eu não tinha dito uma palavra. Ainda assim,
era eu quem estava sendo dramática. Nem queria ir ao baile.
O absurdo que era tudo isso quase me levou ao limite.
Não iria bater o pé ou gritar ou chorar como uma
adolescente. Não lhe daria o prazer em me ver sendo
dramática. Então, em vez disso, perguntei com calma:
— Por que eu não posso convidar quem eu quero
para o baile?
Seus olhos se arregalaram em um espanto fingido
enquanto ela analisava as unhas feitas da mão direita.
— Ah, então você tem alguém em mente?
Engoli em seco. Eu tinha alguém em mente, mas ele
tinha tatuagens e em noventa e nove porcento do tempo um
mau comportamento. Tinha certeza de que ele estava na
faculdade e eu ainda não tinha terminado o ensino médio.
Georgina o detestaria e o pensamento me fez sorrir.
— Talvez, — engasguei.
Ela me olhou com frieza. Estava começando a ficar
com cara de louca. Aquela que normalmente resultava em um
de seus épicos colapsos maternais.
— Desembucha.
Meu Deus, eu era cagona demais, então respondi:
— Na verdade, ninguém especial, mas tem alguns
garotos bonitinhos que gostaria de levar.
— Braden também é bonitinho, — ela entoou, se
levantando e vindo em minha direção. — E eu confio nele; é o
melhor amigo de Sebastian. Cuidará bem de você.
Aposto que sim. Sei como ele e Sebastian cuidavam
bem das meninas.
— Está combinado então, sim? — Ela passou por
mim antes que eu pudesse dizer algo. Apertou meu braço com
firmeza e depois saiu. A única evidência de sua presença era o
meu edredom amarrotado e o cheiro de perfume caro no ar.
Estiquei meu edredom de novo e fui até a
escrivaninha batendo o pé. Não vou àquele maldito baile com
Braden. Eu sumiria antes disso; não iria de forma alguma. Na
maior parte do tempo, eu deixava aquela vaca mandar em
mim, mas não a deixaria decidir com quem devo sair. Levaria
Adam ao baile nem que fosse a última coisa que eu fizesse,
caso contrário, não haveria baile de debutante algum.
Eu odiava o modo como Georgina me controlava,
mas até que eu fosse adulta e pudesse cair fora daqui, eu não
tinha muita escolha. Para as pessoas da ilha, éramos a família
perfeita. Ninguém suspeitava da bagunça que ficava
escondida atrás das portas fechadas.
Ainda estava irada algumas horas depois quando a
casa ficou completamente silenciosa. Tinha ouvido Sebastian
ir dormir e, mesmo que estivesse cansada das várias noites
que fiquei até tarde na rua com Adam, saí de casa com Harry
ao meu lado desta vez.
Por mais que eu ficasse sempre animada em ver
Adam, esta noite foi diferente. Deixei as bobagens de
Georgina arruinarem meu humor. Então, quando cheguei à
campina e vi que Adam já estava sentado na grama, não lhe
cumprimentei como sempre fazia. Mas Harry, sim. Ele e Adam
tinham se tornado melhores amigos. Eu o vi tentando sentar
seu corpo grande no colo de Adam enquanto eu estendia o
cobertor, sentindo só um pouquinho de ciúmes.
Me deitei sobre o cobertor, soltando um longo suspiro.
Estava feliz por estar fora daquela casa, mas ainda estava
mais do que irritada.
Adam se sentou perto de mim e Harry se acomodou
ao lado dele. Olhei para Harry como se ele fosse um traidor.
— O que foi? — Adam perguntou olhando para mim.
Fiz o melhor que pude para dar de ombros deitada no
chão.
— O mesmo de sempre.
— Mentira, Livvy. O que está rolando?
Quase dei um sorriso. Ele me chamou de Livvy,
ninguém nunca havia me chamado assim. Foi tão doce. Tão
doce que desejei poder saborear aquele momento e não
apenas senti-lo.
Balancei a cabeça como se não fosse responder, mas
respondi, porque era Adam e eu. E eu não podia negar mesmo
se não quisesse falar sobre aquilo.
— É só a minha madrasta.
— Sua madrasta?
Não tínhamos conversado sobre meus pais desde a
noite em que gritei para ele que vinha para cá conversar com
minha mãe e meupai já que eles estavam mortos. Ele pareceu
entender que eu contaria mais quando estivesse pronta, por
isso não me pressionou. Eu admirava isso em Adam. Ele não
era intrometido ou impaciente. Não, ele esperava; era como
uma pedra.
— Tenho uma madrasta alucinada e esnobe, e um
irmão postiço aterrorizante que tenho certeza que quer afogar
o ganso comigo.
Seu corpo se enrijeceu ao meu lado e a frieza varreu
seu olhar como se fosse uma nevasca.
— O que você disse?
— Disse que tenho uma madrasta aluci…
Ele ergueu a mão.
— Pule essa parte e vá direto para o seu irmão
postiço aterrorizante.
Dei de ombros de novo.
— Acho que ele quer dormir comigo. Ele é pavoroso e
inconveniente.
A raiva cobriu seu rosto. Adam irritado era algo
assustador.
— Ele tocou você?
Balancei a cabeça.
— Não, ele é cuidadoso com relação a isso. Só é
muito direto e diz coisas.
Afastei o olhar porque aquilo me envergonhava.
Nunca contei para ninguém e isso não acontecia quando meu
pai estava vivo. Não sei se ele se intimidava, mas assim que
meu pai faleceu, Sebastian começou suas bizarrices. Nunca
fomos muito próximos, mas agora eu o odiava.
— Que tipo de coisas? — Ele se exaltou. A cada
segundo que passava ele ficava ainda mais assustador, mas
eu apenas sorria. Lá no fundo eu sabia que este cara nunca
me machucaria. O frio na barriga falava por si só. Esse
nervosismo que eu sentia, era pelo fato de ele ser tão protetor
comigo.
— Coisas idiotas. Não acho que ele faria algo. Ele
sabe que nunca beijei um garoto. Os caras da escola ficam
longe de mim. — Fiquei com vergonha de toda a informação
que estava dando. — Não quero falar sobre isso.
Ele se levantou do cobertor em tempo recorde,
colocou a mão no bolso, tirou o maço de cigarros e um
isqueiro. Andou de um lado para o outro na minha frente, para
frente e para trás, acendendo um cigarro. Deu algumas
tragadas antes de parar e levar as mãos aos olhos, o cigarro
pendendo na mão direita.
— Porra. É por isso que você não quer voltar para
casa. É por isso que vem para cá.
Dei um sorriso triste.
— Não totalmente. Meu pai me trazia aqui antes de
morrer. Foi onde ele se despediu. — Senti meu nariz arder,
sinal de que as lágrimas estavam por perto, por isso afastei o
olhar e encarei a ponte ao longe.
Eu o senti se sentar perto dos meus pés e notei o
cheiro da fumaça do cigarro. Tinha um aroma bom. Doce e
picante ao mesmo tempo. Olhei para ele através de minhas
pálpebras pesadas e percebi que o cigarro era marrom.
— O que está fumando?
Ele o tirou da boca e o olhou enquanto soprava anéis
de fumaça. Nunca fui de me sentir atraída por bad boys. Eu
gostava de garotos legais. Gentis. E talvez Adam fosse todas
essas coisas também, mas, naquele momento, ele parecia ser
muito, muito mau. Com seu cabelo escuro desgrenhado e
tatuagens, sentado com as pernas para cima, os cotovelos
apoiados sobre os joelhos, um doce e delicioso cigarro
pendurado em sua boca. Isso me causava coisas que eu não
sabia que estava preparada para sentir. Meus mamilos ficaram
rígidos embaixo do sutiã. O lugar entre minhas pernas doía.
— Cravos.
— Uhmm. São cheirosos, — suspirei. Minha nossa!
Eu tinha falado de um jeito sexy, com a voz rouca, e Adam
apenas observou. Ele me olhou de cima a baixo. Lembrei que
ele gostava de me observar, e deixei que o fizesse até se
levantar e começar a andar de um lado para o outro de novo.
Sorri, sabendo que ele estava desconfortável. Algumas
pessoas podiam não ser capazes de decifrar Adam Nova, mas
eu não era uma delas. Eu o conhecia há semanas e sabia que
quanto mais ele se afastava, mas desconfortável estava.
Eu o olhei rapidamente quando ele apagou o cigarro
com o pé. Adam pegou a bituca do chão e colocou dentro do
bolso antes de sentar ao meu lado e deitar sua cabeça perto
da minha.
— Me conte sobre o seu pai.
Eu queria falar, queria contar tudo para ele naquele
momento. Mas ele tinha escondido muitas coisas de mim.
Ainda estava escondendo e eu queria saber mais sobre ele.
Ao que parecia, tudo o que fazíamos na maior parte do tempo
era falar sobre mim, meus dias e problemas, amores, o que eu
gostava e o que odiava. Então, escolhi um assunto que achava
fácil de ser discutido.
— Primeiro me conte sobre suas tatuagens.
Eu estava olhando para o céu, mas podia sentir o seu
olhar em meu rosto. Não houve resposta, só um silêncio que
parecia interminável, mas que devia ter durado apenas um
minuto até que ele falasse.
— Eu gosto delas.
Sorri e o encarei. Meus olhos se arrastaram sobre o
tigre em seu pomo-de-adão.
— Disso eu já sabia, Nova. O que acha de falar sobre
o porquê você gosta delas?
Ele mordeu o lábio inferior e me encarou por um
segundo antes de responder.
— Eu me sinto seguro com elas.
Por instinto, movi minha mão entre nós, para mais
perto da mão dele, até elas se tocarem. Eu queria entrelaçar
meus dedos aos dele. Adam parecia tão vulnerável naquele
momento e eu sabia como deve ter sido difícil. Queria abraçá-
lo. Eu queria fazer com que ele se sentisse seguro.
Queria perguntar por que ele se sentia seguro com
elas, mas tive a sensação de que poderia estar passando dos
limites quando ele já tinha dividido algo tão pessoal.
Na tentativa de deixar a conversa mais leve, e não
vou mentir, era a oportunidade de tocá-lo e eu dificilmente
fazia aquilo, passei o dedo sobre a parte de trás de sua mão
onde sabia que havia um lobo tatuado.
— E quanto a ele? Quem é? — Sorri.
Ele não sorriu de volta, mas seu olhar sim.
— Este é Lupus.
Não pude deixar de sorrir.
— Lupus, hein?
— Sim, lobo em latim e uma das oitenta e oito
constelações da astronomia moderna.
Quem era esse garoto? As coisas que ele sabia... As
coisas que ele dizia… Ele era uma grande contradição da qual
eu não enjoava nunca. Suas tatuagens e atitudes gritavam
“bad boy”, mas seu jeito de pensar? Gritava nerd. Eu adorava.
Indiquei o tigre em seu pescoço com a cabeça.
— E esse cara?
Ele passou a mão sobre o tigre antes de responder.
— Este é o Tigre Branco do Leste. É uma
constelação chinesa e representa o leste e o outono.
Gesticulei em direção ao seu corpo.
— São todas constelações?
— Não todas. Algumas são estrelas. Algumas são
planetas. Galáxias.
— Quem as faz? — Parecia que estávamos
progredindo. Ele estava se abrindo; seus olhos brilhavam
como uma criança no Natal. Seus intensos olhos azuis
estavam cheios de paixão.
— Raven, somos melhores amigos, trabalha na
Slinging Ink, no centro.
Olhei para as tatuagens mais uma vez antes de
responder.
— Ele é muito talentoso.
Adam me lançou um olhar engraçado antes de
assentir e dizer:
— Sim.
— E como aprendeu tanto sobre as estrelas?
Uma parede se instalou entre nós como a batida de
uma porta. A paixão sumiu. A conexão foi perdida e voltamos à
estaca zero. Fiquei surpresa por ele não ter se levantado para
fumar e andar de um lado para o outro de novo. Não, ele
apenas se virou, com a cara fechada. Ele era uma porta
trancada, mas pelo menos me respondeu.
— Minha mãe, — disse baixinho e contra gosto.
Como se fosse doloroso falar sobre isso. — Ela era uma
astrônoma. Não de verdade, mas amadora. Ela estudava as
estrelas e planetas por diversão.
Fui solidária a ele. Ela era. Ela estudava. Tudo no
passado. Ele também tinha perdido alguém que amava. Meu
Deus, eu queria abraçá-lo. Mas estava com medo de que ele
se distanciasse de mim para sempre. Independente do que
fosse aquilo, não estava pronta para que chegasse ao fim.
— Ela o ensinou?
Ele soltou um suspiro desconfortável antes de
responder.
— É, acho que sim, — respondeu para o céu como se
não suportasse olhar para mim. Ele estava se escondendo.
Sempre se escondia, e eu me perguntava se era por isso que
as tatuagens o faziam se sentir seguro.
Seus olhos percorreram os meus.
— Agora, fale sobre o seu pai.
E eu falei. Contei para ele que minha mãe morreu ao
dar à luz e que meu pai nunca me culpou. Ele me amava
apesar do que a minha presença fez com que ele perdesse.
Contei que era um artista batalhador, um pintor. Que fomos
pobres boa parte da minha vida até que um dia, ele foi
descoberto.E como em um turbilhão, fomos de pobres
coitados à ricaços. Foi surreal. Falei sobre como ele esteve
doente por anos antes de falecer, mas que era um bom pai e
que eu sentia saudade todos os dias.
Em meio a tudo isso, senti as costas da mão de
Adam tocar a minha, até que nossas mãos se sobrepuseram e
seus dedos se juntaram aos meus. Ele os acariciou
lentamente, seus dedos sentindo todas as rugas da minha
mão antes de agarrá-la por completo. Eu imaginava que era
assim que ele fazia a maior parte das coisas, com muita
reflexão, metodicamente, devagar, com carinho. Quando ele
finalmente embalou minha mão na sua, aconteceu. Meu
coração ficou quente e inchado no peito, aquele calor se
espalhou para fora, queimando meu corpo inteiro, fazendo
com que eu me sentisse quente por toda parte. Parecia uma
febre. Era a minha primeira vez. As mãos entrelaçadas. Esse
calor. Tudo por causa de um simples toque de mãos. Era a
primeira vez que tinha palpitações e não seria a última.
Não enquanto Adam estivesse por perto.
LIV
Encarei a campina vazia à minha frente como se
fosse um lugar desconhecido e, acho que de alguma forma,
era. Fazia tanto, tanto tempo que não ficava aqui sozinha.
Fazia um mês que eu saía às escondidas para ficar junto de
Adam sem que ninguém soubesse além de nós dois. Ele
sempre estava aqui, esperando por mim. Com exceção dos
últimos três dias. E que porcaria de dias. Sentia que
enlouqueceria sem ele.
Era o terceiro dia e nem sinal de Adam. Senti o
pânico aumentar. Talvez fosse isso. Estava há semanas com
aquela sensação. Quando eu me aproximava de Adam, ele se
afastava. Quase como se eu o assustasse. Como se ele
quisesse ficar só na amizade. Quantas vezes no último mês eu
implorei com o olhar e o coração para que me beijasse? Para
que me abraçasse?
Ele nunca tinha feito mais do que segurar minha mão
e isso já foi muito significativo. Mas nossa, eu queria mais.
Queria tudo dele. Queria todas as fantasias adolescentes que
há uma semana pareciam idiotas. Queria que Adam Nova
fosse meu namorado, droga.
Olhei ao redor da campina de novo em busca de um
bilhete em uma garrafa ou de alguma indicação de que ele
esteve aqui. Fiz aquilo todos os dias nos últimos três dias e,
durante o meu trajeto de hoje até aqui, eu já sabia. Sabia que
ele não estaria aqui, por isso não me surpreendi, fiquei apenas
muito desapontada. Passei basicamente os últimos dias no
mundo da lua, preocupada com ele. Preocupada com nós dois.
Fiquei ali, criticando a mim mesma como fiz ontem e
anteontem por não ter pedido o número dele. Por não exigir
que ele me dissesse como contactá-lo. Mas parecia tão
romântico — nós nos encontrando nesta campina sob as
estrelas, e algumas vezes deitando aqui e conversando por
horas. Bem, era eu quem mais falava. Na maior parte do
tempo, Adam ainda era um livro fechado. Mas às vezes ele se
abria e me mostrava uma página, e aqueles dias eram como
joias raras, pedras preciosas. Sim, aqueles dias. Aqueles
momentos íntimos que eu guardava bem no meio do meu
coração. Nossas noites juntos eram agradáveis. Algumas
vezes apenas olhávamos para o céu, em silêncio. Agora eu
percebia o erro que foi, porque não havia nenhuma maneira de
entrar em contato com ele. Nenhuma forma de saber se ele
estava bem. Nenhum jeito de saber se ele estava me
ignorando.
Eu nem sabia onde ele morava. Andei de um lado
para o outro na campina, roendo as unhas, pensando que eu
deveria ter trazido Harry. E se alguém se aproximasse de mim
já que ele não estava aqui? Eu estava sozinha.
Pensei em todas as coisas que Adam me contou
enquanto estávamos deitados aqui e percebi que ele não havia
dito muito. Exceto que Raven fez suas tatuagens e trabalhava
no Slinging Ink.
Poderia ir até lá e perguntar ao Raven se ele o tinha
visto. Deus, eu era patética. Mas estava preocupada de
verdade. Tinha certeza que se Adam não pudesse
comparecer, ele tentaria entrar em contato comigo. Além disso,
se ele estivesse tentando se livrar de mim, podia fazer a
gentileza de falar na minha cara.
Tirei o celular do bolso e abri o aplicativo de mapas,
digitando o nome do estúdio de tatuagem enquanto andava em
direção ao norte de Madison.
Eram só quinze minutos de caminhada. Eu
conseguiria; era uma garota valente e confiante. Estava
andando havia apenas cinco minutos quando me dei conta de
que aquilo poderia ser um erro. Estava escuro, as ruas eram
muito mal iluminadas e vi mais moradores de rua nos últimos
cinco minutos do que tinha visto em toda minha vida. Me
pediram cigarro, dinheiro e comida. E se o traje fosse um
indício, tinha certeza de que vi uma prostituta.
Quando cheguei no Slinging Ink, estava tão nervosa
que o ruído de um sino ao abrir a porta quase me matou de
susto. Olhei para cima depois de quase ter caído na soleira da
porta e me deparei com o que parecia ser um cara coberto de
tatuagens e piercings no rosto, sentado atrás do balcão de
madeira, sorrindo. Ele aparentava ser só uns dois anos mais
velho do que eu e, por mais que fosse coberto por desenhos e
metal, era lindo de um jeito devastador, com cabelo curto e
loiro bem arrumado, e olhos azuis cintilantes que pareciam
estar cheios de bom humor. Ao que parecia, ele estava
curtindo me ver quase caindo de bunda no chão.
Puxei um pouco a bainha de minha camiseta,
tentando arrumá-la porque me sentia tão fora do lugar e com
os nervos à flor da pele. Pigarrei de uma forma esquisita
enquanto me aproximava do balcão, mas antes que pudesse
dizer qualquer coisa, o cara falou.
— Como posso ajudá-la, querida?
Se eu achava que antes estava nervosa... engano
meu! Abri minha boca e a fechei umas cinco mil vezes, afinal,
o que uma pessoa que estava caçando um garoto que ela
realmente gostava diria para um dos homens mais bonitos que
ela já tinha visto?
Seus olhos percorreram todo o meu corpo, me
fazendo sentir quente e agitada. Balancei de um lado para o
outro e engoli em seco.
— Vai fazer uma tatuagem? — Ele sorriu com malícia
antes de puxar a argola em seu lábio para dentro da boca e
chupá-la. — Posso fazer em você.
Ah, aposto que sim.
Abanei meu rosto com a mão direita e sorri
desajeitada.
— Estou à procura de Raven?
Com isso, seu sorriso se desfez e ele remexeu na
argola com a língua antes de murmurar:
— Claro que está. — Ele balançou a cabeça. —
Aquela vaca tem sorte.
Ele desapareceu rapidamente atrás de uma partição
preta que separava a área de espera do resto do estúdio.
A sensação é de que tive que esperar uma
eternidade, mas no momento que olhei para o celular, vi que
só tinham passado quinze minutos antes de uma mulher
deslumbrante de cabelos escuros aparecer atrás do balcão.
Seus braços claros lindíssimos eram cobertos por
tatuagens de flores coloridas que se estendiam para baixo das
mangas de sua camiseta. O cabelo escuro estava em um
estiloso corte pixie, totalmente raspado em uma das laterais. O
outro lado do cabelo pendia sobre um de seus olhos castanho-
esverdeados. Seu rosto era fino com bochechas proeminentes
e ela tinha um dos lábios mais rechonchudos e convidativos
que já tinha visto, mesmo quando estavam cobertos de batom
preto.
Ela usava uma camiseta preta com uma estrela
grande no meio e os dizeres Planetário de Madison.
Ela sorriu para mim enquanto eu a encarava.
— Posso ajudá-la?
— Ah. Ah. Uhm. — Olhei atrás dela, esperando que
Raven fosse aparecer por trás da partição a qualquer
momento. — Estou procurando Raven.
Seu sorriso aumentou e desta vez ela exibiu seus
dentes alinhados e brancos como pérolas, e abriu os braços.
— Eu sou Raven.
Fiquei de boca aberta, mas meus modos sulistas não
me desapontaram e estiquei o braço sobre o balcão para
cumprimentá-la. Soltei sua mão e dei um passo para trás, sem
saber o que dizer.
Raven, o melhor amigo de Adam e tatuador, era uma
garota. Uma garota linda pra caramba. Ela não era magricela,
muito menos tinha um corpo de adolescente. Não, ela era uma
mulher, com curvas, graciosidade, e minha nossa, sabia como
usar delineador como uma profissional. Eu não usava nem
batom ou máscara de cílios; eu queriamorrer.
— O que posso fazer por você?
— Estou à procura de um amigo.
Suas sobrancelhas se arquearam.
— Ah, é? — Ela deu uma piscadinha e senti meu
rosto corar.
Pigarreei.
— Adam. Você conhece Adam Nova?
Seu olhar se iluminou em reconhecimento. Fiquei
aliviada e aborrecida, imaginando que essa havia sido a coisa
mais idiota que já fiz na vida.
Ela me olhou lentamente desde o topo da minha
cabeça até as pontas dos meus dedos do pé antes de
perguntar:
— Você está procurando Adam?
Ela disse “você está” como se fosse a coisa mais
inacreditável do mundo. E acho que só de olhar para mim, ela
pôde ver que eu não era daqui. Que estava fora do lugar. Que
Adam e eu éramos completamente diferentes.
— Sim. Uhm. Temos um compromisso toda semana
desde o último mês, mas não tenho notícias dele há três dias.
— Um compromisso? Que droga havia de errado comigo?
Amassei a bainha da minha camiseta. — Estou preocupada.
Deus, essa mulher linda provavelmente pensava que
eu estava perseguindo seu namorado. Eu era uma
adolescente idiota e deixei um cara me iludir. Com as estrelas,
pelo amor de Deus. Precisava dar o fora daqui antes que me
fizesse de boba ainda mais.
— Quer saber? — Eu me virei para ir em direção à
porta. — Esquece. Isso foi um erro.
Raven se apressou para fora do balcão e ficou
parada em frente a porta a qual eu estava prestes a passar e
levantou a mão.
— Não, espere, — sua expressão ficou séria. —
Espere um pouco. Vou ligar para ele.
Pegando o celular no bolso de trás da calça, ela me
deu um pequeno sorriso e voltou para trás do balcão, sentando
em um banco e colocando os pés sobre a bancada. Ela me
deu outra piscadinha e eu corei até a alma.
— Eiii, Nova, — Ela falou o nome dele como se já o
tivesse dito mil vezes, de milhares de maneiras diferentes, e
senti meu constrangimento se transformar em raiva.
Escutei, sem conseguir evitar, mas com medo de que
ele dissesse para ela me mandar embora. Que ele estava
cansado de mim.
— Você tem guardado segredos de mim, seu babaca,
— ela entoou, sem nunca tirar os olhos de mim.
Raven escutou com atenção, as sobrancelhas
arqueadas como se tivesse achado a coisa toda muito
intrigante.
— Tem uma amiga sua aqui procurando por você. —
Houve uma pausa. — Aham. — Foi como um ronronar,
deliberadamente sexy e fofo ao mesmo tempo. Então, com
olhos brilhantes, ela perguntou: — Qual é o seu nome, linda?
— Liv, — sussurrei, mas ela deve ter prestado
bastante atenção, porque não teve problema em dizer meu
nome para Adam.
— Bem, é melhor você se apressar. Ry estava de
olho nela e eu, bom, estou com meus dois olhos nela, —
Raven concluiu com uma risada e desligou.
Ela me encarou, seu sorriso havia sumido, seu olhar
cheio de perguntas. Ela me olhava como se eu fosse um
quebra-cabeça que tentava montar.
Com olhos observadores, ela finalmente disse:
— Ele está a caminho. Falou para você esperar aqui.
Um momento de pânico me atingiu como um trem de
carga. Que merda eu estava fazendo aqui? Ele ficaria tão
irritado por eu ter vindo atrás dele. Raven o encontrou com
facilidade, então certamente se ele quisesse, teria ido me ver.
Será que ela ficaria aborrecida quando ele chegasse? Isso foi
um grande erro e eu já estava me sentindo envergonhada.
Raven deve ter visto o medo em meu rosto porque se
levantou, caminhou pela sala e parou em frente a porta
enquanto dizia:
— Opa, opa, opa, linda. Ele disse que era para você
não sair.
Por mais que eu nunca tenha sido beijada, nunca
tenha sido tocada de forma sexual, naquele momento eu sabia
que estava fodida.
ADAM
Eu ia matar Livingston Montgomery. Assim que
tivesse certeza de que ela estava viva e ilesa. Esses eram
meus pensamentos enquanto eu corria pelas ruas de Madison.
Que diabos ela estava pensando vindo aqui sozinha? Tinha
muita coisa sobre Liv que ainda não conhecia, mas sabia que
ela era esperta. Muito mais esperta do que estava sendo
agora.
Eu estava tão irritado, tão furioso com ela. Não
planejava deixar meu pai sozinho. Ele precisava de mim neste
momento, mas Liv tomou a decisão por mim quando veio me
procurar. Eu queria ter ido até a campina e deixado ao menos
um bilhete para ela, mas não pude. Não tenho nem
conseguido ir à escola ou ao trabalho nos últimos três dias.
O meu coração retumbava enquanto eu passava
pelas ruas enxergando tudo através dos olhos dela. O bairro
estava cheio de sem-tetos carentes e famintos. Prostitutas e
lixo. Esta região era um mundo diferente. Um mundo que eu
tinha certeza que ela nunca viu antes. Ela deve ter ficado
apavorada e, quando cheguei ao estúdio de tatuagem, minha
raiva cedeu lugar à preocupação.
Passei apressado pelas portas, quase derrubando
Raven no caminho, os familiares sinos tilintando sobre minha
cabeça. E lá estava ela, de pé em um canto perto de uma
planta velha, parecendo aterrorizada e tão bonita que eu não
conseguia recuperar o fôlego. Ela estava usando o vestido
branco com alças que eu amava e não sabia se deveria beijá-
la ou lhe dar umas palmadas. Deus, como eu senti falta dela.
Não parei de pensar nela nos últimos três dias.
Liv parecia deslocada naquele estúdio. Porque aquele
era o meu mundo. Só a tinha visto na ilha ou na campina. Era
como se eu a tivesse inventado, mas vê-la aqui, neste estúdio
de tatuagem sombrio do meu lado da cidade, colocou coisas
que eu nunca havia considerado em perspectiva. Uma delas
era o fato de que Livingston Montgomery não pertencia a este
lugar. Não, ela pertencia à sua mansão na praia, dirigindo
carros de luxo e usando coisas caras. À vida boa.
A realidade disso tudo me atingiu enquanto eu corria
na direção dela e a puxava para os meus braços. Meu Deus,
ela era um colírio para os meus olhos. Eu nunca tinha
abraçado Liv e quando a envolvi em meus braços e a segurei
perto do meu peito, percebi que estava perdendo muita coisa
boa.
Eu a abracei com força, grato por ela estar bem e,
naquele momento, tinha total consciência do quanto senti falta
dela nos últimos três dias e aquilo me assustava.
Desfiz nosso abraço e a segurei, minhas mãos sobre
seus ombros.
— Que droga você tinha na cabeça para vir até aqui?
Liv estava sorrindo há dois minutos, mas agora nem
tanto. Sua expressão se fechou, ficou triste num primeiro
momento, depois todo o seu corpo se retesou e seus olhos
ficaram cheios de raiva.
— Quem você pensa que é para falar comigo desse
jeito? — Ela se afastou e empurrou minhas mãos.
Raven riu e eu a olhei sobre o ombro.
— Ah, não me olhe assim. O que há com você,
Nova? Tem escondido as gatinhas de mim, — ela lançou um
olhar para Liv que me deixou extremamente irritado, antes de
voltar seus olhos para mim. Raven semicerrou os olhos, me
estudando com aquele tipo de curiosidade que me deixava
nervoso. — Por quê? — Ela perguntou com seriedade.
Mas eu não conseguia pensar em nada além de tirar
Liv daqui e devolvê-la para o lugar onde pertencia: a ilha.
— Depois, — falei entre os dentes enquanto pegava a
mão de Liv e a puxava em direção à rua. Ela praticamente
corria atrás de mim quando chegamos ao outro quarteirão.
— Me solta, seu bruto! — Ela gritou, tentando puxar
sua mão de mim.
— Não. — Segurei a mão dela com mais firmeza
quando paramos para deixar os carros passarem.
— Não? Para onde está me arrastando? — Ela tentou
soltar a mão mais uma vez, mas continuei segurando-a. — Faz
uma hora que você furou comigo pelo terceiro dia consecutivo
e agora não quer me deixar ir embora?
— Eu não furei com você porra nenhuma, — olhei de
forma afiada. — Não tínhamos um encontro combinado, Liv, e
eu tinha coisas para fazer.
— Ótimo, então deixe-me ir. Agora quem tem coisas
para fazer sou eu.
O comportamento dela só fez minha raiva aumentar.
A garota não se importava com sua segurança. Isso ficou claro
para mim no momento em que ela voltou para a campina
depois de Boone ter colocado as mãos nela. Estava ainda
mais claro agora. Como ela podia se arriscar vindo aqui para
me procurar a essa hora da noite?
Parei na calçada, me virando até que estivéssemos
cara a cara.
— Que droga você tinha na cabeça paravir até aqui
sozinha? Você não percebe a burrice que é?
Seus dentes trincaram de raiva.
— Me chame de burra mais uma vez, Nova! Atreva-
se! — Ela gritou na minha cara.
Agarrando sua mão, eu a puxei para a rua
novamente, desta vez na velocidade da luz, arfando de tanta
irritação.
— Aonde está me levando? — Ela berrou atrás de
mim.
— Para casa, — falei por cima do ombro quando senti
um gota de chuva bater em minha bochecha. Ótimo! Era o que
eu precisava, a porra de um temporal em meio a tempestade
de merda que era minha vida neste momento.
Ela puxou o braço com força, sua mão escapando da
minha.
— Não preciso que você me leve para casa, Adam.
Sei como chegar lá sozinha. — Ela entrou em um beco escuro
que ficava entre dois prédios antigos de tijolos. Soltei um
suspiro, pedindo paciência enquanto corria para alcançá-la. De
jeito nenhum eu a deixaria andar por esse bairro sozinha de
novo. Eu queria gritar.
— Você não pode ir para casa sozinha, Liv. Não é
seguro aqui. Não devia ter vindo, principalmente à noite.
— Vá embora, Adam! — Sua voz ecoou entre os dois
prédios que nos rodeavam.
— Por quê? — Gritei. Ela estava sendo insensata,
agindo como louca, e eu não conseguia entender o que ela
queria que eu fizesse.
Ela parou na minha frente e vi uma, duas, três gotas
de chuva baterem em seus ombros descobertos.
— Por quê? — Ela parecia incrédula. — Vamos
mesmo fazer isso? Se é para questionarmos as coisas, então
tenho perguntas pra caralho.
Eu me encolhi ao som da palavra “caralho”. Era raro
ouvir Liv xingando, e aquilo doía meus ouvidos. Ela era boa
demais para aquele tipo de palavra. Doce demais, perfeita
demais.
— Por que ficou três dias sem ir me ver? — Ela
ergueu a mão, levantando um dedo de cada vez. — Por que
não me conta nada? E o mais importante… — Ela hesitou,
como se quisesse causar um efeito dramático, então fechei a
boca como qualquer homem inteligente faria. — Por que não
me contou que Raven era uma garota, porra?
Apontei meu dedo na cara dela.
— Pare de falar palavrão, cacete, — resmunguei.
Meu Deus, eu era tão contraditório, mas era exatamente isso o
que Liv fazia comigo; me levava à loucura.
Ela soltou uma risada sarcástica, olhando para o céu
e, naquele momento, parecia que estava chamando os deuses
da chuva porque o céu se abriu e enormes gotas caíram sobre
nós.
Agarrei a mão dela e corri para uma pequena
marquise que mal nos cobria. Com a parte da frente do meu
corpo, eu a empurrei contra a parede, tentando mantê-la seca,
mas foi inútil. Estávamos encharcados e ficando ainda mais
molhados a cada segundo.
Ela me olhou através de seus cílios espessos e
ensopados.
— Por que não me contou que Raven era uma
garota? Ela é sua namorada? Por que mentiu para mim?
Caramba, era isso o que ela pensava? Essa garota
estava fora de si. Eu não era capaz de pensar em ninguém
além dela desde que a vi pela primeira vez. Será que ela não
entendia? Não conseguia enxergar?
— Não menti para você. Só não a corrigi quando
pensou que ela era um cara. — Afastei meu cabelo da testa e
a encarei, atenuando minha voz. — Não achei que fosse
importante. E nunca mais falamos sobre ela. Acabei
esquecendo.
Seus lábios se contraíram.
— Você esqueceu? Que conveniente. Você também
esqueceu de me encontrar nos últimos três dias?
Usei minha força contra o seu corpo, até que minhas
pernas estivessem entre as dela, meu torso pressionado em
seus seios volumosos que eu não conseguia tirar da cabeça
fazia mais de um mês.
Puta merda, era gostoso ficar assim. Em casa,
pressionado contra ela desta forma, eu, estupidamente, me
inclinei e coloquei o rosto em seu pescoço, apreciando o
cheiro da chuva e de minha Luna.
Respirando fundo, ergui a cabeça e encostei a testa
na parede ao lado dela com meus lábios em seus ouvidos.
— Você me conhece, Livvy. Jamais poderia esquecer
você. Nem ontem. Nem hoje. Nem amanhã. Nunca. — Isso era
pura verdade. Passei semanas tentando tirá-la da minha
cabeça, mas foi em vão.
Um arrepio a atingiu com o meu sussurro e seu corpo
tenso se derreteu contra o meu como manteiga. Ela passou os
braços ao redor do meu pescoço e apoiou o rosto na minha
camisa molhada enquanto a chuva nos golpeava. Só então eu
me dei conta que por mais que abraçar Liv tenha sido uma das
melhores coisas da vida, não se comparava de forma alguma
com ser abraçado por ela.
Desfrutei daquele abraço como se estivesse sob a luz
do sol e não daquela chuva gelada. Não pude evitar. Levantei
as mãos e segurei a lateral de seu pequeno rosto com formato
de coração, e usei meu polegar para erguer seu queixo, assim
poderia ver seus olhos.
Os olhos castanhos emoldurados pelos cílios mais
grossos que já tinha visto me encaravam com tanto sentimento
que eu sabia que seria o meu fim. Esta garota era boa demais
para mim. Encantadora demais. Incrível demais. Ela acabaria
comigo. E eu estava começando a ficar tranquilo com isso. O
que eu não estava gostando era de arruiná-la.
— Por que você se esconde de mim, Adam Nova? —
Ela perguntou com suavidade, seus olhos buscando dentro
dos meus as respostas que eu não conseguiria dar.
Não poderia responder. Não sabia como, por isso,
encostei minha testa na dela, nossos lábios quase se tocando,
meu coração a mil. Porque eu sabia o que estava prestes a
acontecer. Eu ansiava por isso. E estava apavorado.
Com o cabelo castanho colado na cabeça, o vestido
branco encharcado e sua mão sobre minha bochecha, ela
perguntou:
— Por que não me deixa entrar na sua vida?
Meu Deus, ela queria entrar na minha vida. Eu
também queria. Mas não sabia como deixar as pessoas se
aproximarem. Desde que perdi minha mãe, mantive uma certa
distância das pessoas. Não podia dar essa abertura para Liv.
Não para a Liv de olhar sonhador e otimismo infalível mesmo
quando havia perdido seus pais. Como poderia deixá-la entrar
em minha vida quando ela era pura luz e eu não era nada
além de escuridão?
— Não sei como, — mal consegui falar. Até onde eu
lembrava, era a primeira vez que eu despia minha alma, meu
coração.
Tristeza irradiava de seu olhar quando ela ficou na
ponta dos pés, seu rosto intimidador perto do meu, e senti
meus olhos se fecharem diante da perspectiva do que eu sabia
que aconteceria. Por mais que tenha lutado contra isso
durante semanas, era o que eu queria mais do que qualquer
coisa.
Sua respiração tocou minha boca.
— Vou ensinar você, — ela murmurou contra os meus
lábios e senti os efeitos do toque suave deles por todo meu
corpo.
Seus lábios estavam sobre os meus, beijando meu
lábio inferior de leve e depois chupando o superior. Soltei um
grunhido. Não podia acreditar. Esta garota... Eu não iria beijá-
la, mas ela ligou o foda-se e me beijou assim mesmo.
Ela era destemida, descarada e maravilhosa. E era
minha se eu a quisesse. Eu não a merecia. Aqueles beijinhos
foram inesperados, surpreendentes e incríveis, e antes que me
desse conta do que estava fazendo, eu a puxei para o mais
perto possível, e capturei sua boca, mordendo seu lábio macio.
Colocando minha língua dentro de sua boca de um jeito
selvagem. Sonhei em prová-la por tanto tempo que agora
parecia um animal com sua presa, incapaz de enxergar pela
fome e pelo tempo.
Deveria ter pensado no fato de que este era o
primeiro beijo dela, mas a verdade era que também parecia
ser o meu, então fui egoísta. O primeiro toque de nossas
línguas, as primeiras mordidinhas de seus dentes, a primeira
sucção de seus lábios. Foi diferente de qualquer beijo que eu
já tinha experimentado e fui transportado de volta para a
campina, sob as estrelas. Cometas rasgaram o céu, meteoros
atingiram a Terra, asteroides explodiram.
Esqueça o papo sobre colocar fogo no mundo. Liv e
eu? Nós destruiríamos o universo.
Minhas mãos estavam em seu cabelo.
Minha boca esmagada contra a sua.
Meus pés firmes na calçada.
Mas meu juízo tinha desaparecido.
Não havia lógica para beijos como esses.
Não, esses beijos eram paixão enlouquecida,
insanidade — loucura.
— Uhm, — ela gemeu em minha boca, e eu absorvi
tudo. Queria tudo dela. Queria minha boca em cadaparte do
seu corpo. Então, movi minha boca para o pescoço dela, em
direção ao ponto vazio na base de sua garganta, lambendo e
chupando.
Caramba, tudo o que conseguia pensar era nos
outros lugares que queria provar. A cavidade na parte de cima
do seu ombro. O topo e as extremidades dos seus seios. O
buraco do seu umbigo. O lugar macio atrás dos seus joelhos.
A saliência em seu tornozelo. A umidade entre suas pernas.
Eu estava bêbado, embriagado por meus
pensamentos e seus gemidos quando ouvi um ruído próximo
que me fez recuar e olhar ao redor do beco escuro e chuvoso,
até finalmente olhar de volta para Liv, que sorriu.
— Era provavelmente um gato. — Seus olhos
inocentes e redondos me olharam.
Eu a olhei e também sorri.
— Talvez. Mas preciso tirá-la da chuva e levá-la para
um lugar seguro. — Segurei sua mão, mas ela não aceitou.
— De jeito nenhum. Você tem algumas perguntas
para responder antes de me levar com você, Nova.
Meu Deus, essa garota me faria responder todas as
suas perguntas debaixo dessa porra de chuva, no meio da
noite. Eu queria bater minha cabeça na parede atrás dela.
— Mas nos beijamos. Está tudo certo, — falei
qualquer coisa e tentei fazer com que ela esquecesse isso até
chegarmos a um lugar seco e seguro.
— Errado. Eu beijei você, — ela piscou os olhos. —
Eu dou as ordens.
— Certo, anda longo. Está chovendo. — Afastei o
cabelo molhado da testa.
— Raven é sua namorada?
— O quê? Claro que não, — respondi horrorizado.
Ela semicerrou os olhos.
— Ela já foi sua namorada?
Meu Deus. Eu não podia fazer nada além de rir do
absurdo que era esta situação.
— Caramba, você está pirando. Vamos sair da chuva
e eu conto tudo.
— Não, — seu olhar dizia muito sobre sua
determinação, então apenas respondi a pergunta.
— Raven nunca foi minha namorada.
— Você já transou com ela?
— Nunca.
— Já a beijou?
Belisquei meu nariz, me sentindo descontrolado.
— Não.
Sua expressão se encheu de confusão.
— Hã?
— Ah, pelo amor de Deus, o que é agora? — Chovia
em um fluxo constante e a marquise mal nos abrigava.
— Não entendo por quê.
— Por que o quê? — Quase gritei.
— Porque nunca a beijou ou tentou ter alguma coisa
com ela. Raven é linda e parece fazer o seu tipo.
Por que ela não conseguia compreender? O que fazia
o meu tipo era sua loucura em observar as estrelas e ter
conversas debaixo da chuva. Então, me inclinei e segurei seu
queixo.
— Nunca fiquei com Raven porque ela não faz o meu
tipo, Liv. Não, o meu tipo é uma pé no saco da ilha que quer
discutir por uma hora na chuva e que ama as estrelas. Esse é
o meu tipo, baby. Ok?
Ela assentiu com um olhar deslumbrado.
— Ok, — murmurou.
Grato por ter finalmente conseguido fazê-la entender,
soltei seu rosto e dei um passo para trás.
— Além do mais, nunca fiquei com Raven porque ela
é lésbica e nunca nos interessamos um pelo outro.
— Ahhh, — ela arfou, o espanto colorindo suas
feições.
Assenti com a cabeça.
Ela franziu o cenho e me deu a mão antes de me
puxar pelo beco debaixo da chuva.
— Bem, você devia ter dito isso logo, Nova. Está um
frio do caramba e ficamos conversando na chuva como dois
loucos, — ela parecia irritada. — Eu poderia pegar uma
pneumonia.
Não consegui evitar. Inclinei a cabeça para trás e
gargalhei. O som da risada ecoou ao nosso redor e ficamos
colados um ao outro no beco escuro e imundo. Olhei para ela,
minhas bochechas doendo de tanto rir. Ela sorriu para mim e
percebi que eu estava feliz. Pela primeira vez em muito tempo,
esta garota me fez sorrir e gargalhar, e eu estava feliz. Era ao
mesmo tempo bom e doloroso, ali na escuridão, sentindo
como se um raio de luz estivesse à espreita. Pois eu sabia que
esse tipo de felicidade custava caro. Sabia que era temporário.
Sabia que duraria pouco. Disse a mim mesmo que tudo o que
podia fazer era aproveitar enquanto fosse possível.
LIV
Eu estava andando pelas ruas escuras com Adam,
mas não enxergava nada porque minha mão segurava a dele
como se pertencesse àquele lugar, pelo amor de Deus. Era
grande e cálida, e pensei que meu coração fosse explodir. Ele
tinha me beijado. Fui beijada. Não foi um simples beijinho.
Claro, eu tomei a iniciativa e o beijei primeiro, mas sentia que
estava na hora e que já estava farta de esperar. Eu só não
esperava aquilo. Não esperava a investida de sua língua ou as
mordidinhas de seus dentes. Não esperava uma completa
invasão. E achava que os primeiros beijos não deveriam ser
como o que Adam me deu. Porque não foi um beijo
atrapalhado, caótico, estranho. Não, foi um daqueles para
arruinar todos os beijos. Um que colocaria no chinelo todos os
futuros beijos que eu desse. E o gosto dele… Adam tinha
gosto de fumaça adocicada, hortelã e pura essência
masculina. Eu não conseguia parar de pensar nisso. Estava
obcecada. E por mais que tenha passado apenas dez minutos,
sabia que ainda pensaria nisso daqui a dez anos. Era um beijo
para ser recordado. Sim, as palpitações estavam a todo vapor.
Estava divagando na paralisia causada pelo beijo
quando percebi que não estávamos indo em direção à
campina ou à ilha. Caminhávamos por uma rua com prédios
antigos, a chuva em uma constante garoa.
— Para onde estamos indo?
Ao que parecia, eu ainda estava atordoada e ao tocar
meus lábios, percebi que eles ainda estavam inchados e
quentes. Tudo o que conseguia pensar era no quanto eu
queria mais beijos de Adam. Agora. O tempo todo. Em
qualquer lugar. Em todos os lugares.
— Para casa.
Larguei sua mão.
— Mas o caminho para minha casa não é este.
— Não, mas para a minha é.
— Ah, — foi tudo o que consegui dizer. Adam estava
me levando para a casa dele. O que estava acontecendo? Tive
a sensação de que estava sonhando. Ele estava me beijando.
E segurando minha mão, e agora me levava para casa. Fiquei
imaginando se conheceria a família dele. Estava quase ficando
tonta.
Passamos pelo lado ruim da cidade e, eventualmente,
chegamos a um prédio deteriorado. Mesmo sabendo que
Adam não tinha muito, finalmente entendi o quão humilde ele
era.
Meu pai e eu fomos de classe média baixa antes de
ele alcançar o sucesso. E enquanto eu passava pelos
corredores e subia as escadas do edifício, percebi que nunca
fomos tão humildes quanto Adam e sua família. Não, isto era
classe baixa. Nossos sapatos molhados guincharam contra o
chão e havia um leve cheiro de mofo no ar.
— Para onde está indo, gatinho? — Uma voz
feminina soou atrás de nós.
Eu me virei e encontrei o que parecia ser uma garota
debilitada, não muito mais velha do que eu, saindo de seu
apartamento.
Adam lançou-lhe um rápido olhar antes de dizer:
— Vá dormir, Mona.
Os olhos vidrados me analisaram e ela sorriu.
— Quem é que temos aqui?
— Não é da sua conta.
Segui Adam pela escada e deixamos Mona para trás.
Eu me senti mal por ela.
— Que triste, — resmunguei, seguindo Adam.
Ele deu de ombros.
— Todo este lugar é triste, Liv. Por que acha que
encontro você na campina?
Ele não estava me escondendo? Ou me ignorando?
Ele estava me protegendo desse lado de sua vida e aquilo me
deixava ainda mais triste. Desta vez, por Adam.
Com o tilintar de suas chaves, ele abriu a porta do
apartamento e nos dirigimos para um carpete marrom e gasto,
e para um sofá marrom que não era tão melhor, mas o lugar
parecia limpo e cheirava a limpeza. Era um ambiente integrado
com uma sala de estar de tamanho decente anexada a uma
pequena área de jantar na lateral e uma pequena cozinha no
canto. Em cada extremidade do cômodo havia duas portas que
eu acreditava que levavam aos quartos.
Foi então que me ocorreu. E se Adam morasse aqui
sozinho? Nunca perguntei a idade dele. Meu Deus do céu, e
se ele só parecesse novo, mas tivesse vinte e três anos? Puta
merda, aquilo não ia colar com a minha madrasta. De qualquer
forma, as tatuagens e cigarros provavelmente seriam
suficientes para enlouquecê-la.
— Quantos anos você tem?
Ele sorriu.
— Agora ela pergunta.
Meu peito apertou em pânico porque Adam estava
com um ar muito presunçoso.
— Meu Deus, você tem trinta, não é? Meu Deus do
céu! — Comecei a andar de um lado para o outro da sala.
Adam revirouos olhos e balançou a cabeça devagar.
— Relaxe, doidinha. Tenho só dezenove.
Ufa. Quase tive um infarto.
— Espere um segundo, — ele disse, tirando a camisa
molhada, e achei que meus olhos fossem ficar vesgos.
Caramba, ele era bonito. Quer dizer, ele já era bonito quando
estava vestido, mas ficava ainda mais quando não estava. —
Preciso dar uma olhada no meu pai.
Ah, então o pai dele estava aqui.
— Hijo[1], é você? Quem está com você?
Adam quase sorriu para mim.
— Sim, pai, sou eu. Tem alguém comigo.
— Uma amiga, talvez? Estou escutando uma garota,
hijo?
Um sorriso absoluto cobriu os lábios de Adam desta
vez, enquanto ele revirava os olhos para o pai, mas eu mal
reparei, porque os mamilos e o abdômen e, meu Deus, aquela
calça abaixo da cintura. Deus, a pele dele era levemente
bronzeada e seu torso era longo e musculoso. Queria olhar
fixamente. Muito. Por isso, foi um pouco esquisito quando
encarei e afastei o olhar e depois encarei e afastei o olhar de
novo. Esperava que ele não tivesse notado, mas, se o calor
em seus olhos fosse algo em que eu pudesse me basear, ele
com certeza tinha percebido.
— Estou indo, pai. Um segundo.
Adam jogou a camisa sobre a bancada da cozinha e
se virou na direção de um quarto escuro fora da sala principal.
— Traga sua amiga também, Adam. Quero vê-la.
Adam olhou para mim, claramente constrangido,
antes de me chamar para segui-lo. Puxei a bainha do meu
vestido molhado e ajeitei o cabelo. Eu conheceria seu pai
parecendo um rato molhado. Ótimo.
Ele acendeu a luz quando entramos no pequeno
quarto com o mesmo carpete marrom. Era pouco decorado. Só
havia uma fotografia das estrelas sobre a cama de casal. Uma
cômoda solitária foi colocada contra a parede oposta. Nada
mais ocupava o quarto além de uma mesinha lateral que ficava
perto da cama. E no meio dela, um grande homem hispânico
estava sentado. Um homem de meia-idade e boa aparência.
Ele tinha uma gaze na testa e deu um enorme sorriso
quando me viu.
Adam foi até a cama enquanto eu fiquei perto da
porta, tentando ser invisível. Eu estava uma pilha de nervos.
Nunca tinha conhecido outros pais.
— Como está se sentindo, pai? Alguma dor? Fome?
— Adam tentou cobri-lo mas o homem corpulento se sentou
ainda mais e afastou suas mãos.
— Saia da frente, filho, saia. Estou tentando conhecer
sua amiga. Chegue mais perto, nena linda[2]. — Ele acenou
em minha direção e eu me movi enquanto Adam se afastava
com um sorriso.
Ele me observou e eu o observei. Seus olhos tinham
cor de chocolate e mesmo com seu cabelo comprido demais e
rugas que marcavam os cantos de seus olhos gentis, eu
imaginava que aquele homem havia sido lindo na juventude.
Até porque, não era ruim olhar para ele.
— Meu filho tem bom gosto, não é? – Ele disse, sua
expressão animada e cativante.
Não pude deixar de sorrir de volta, apesar de ter
corado até a alma.
— Qual é o seu nome, niña[3]?
— Livingston.
Para alguém que ainda não sabia, ele foi muito rápido
em responder.
— Um lindo nome para uma linda garota. Entendo por
que meu filho não tem ficado em casa ultimamente. — Ele
lançou um olhar de entendimento para Adam antes de voltar a
me olhar. — Sou José. É um prazer conhecê-la, Livingston.
Onde você trabalha? Frequenta a escola? Onde mora?
Quantos anos você tem?
— Ok, ok, pai! Já chega de interrogação por hoje.
Você tem que descansar e eu preciso pegar uma muda de
roupa para Liv. Ela está encharcada da chuva.
— Tudo bem, mas você tem que trazê-la de volta
quando eu estiver me sentindo melhor. Vou preparar a lasanha
de sua mãe e ela poderá me contar tudo.
Adam pegou um pouco de água na jarra sobre a
cômoda, colocou um copo sobre a mesinha ao lado da cama e
fez questão de verificar se seu pai estava coberto.
— Mal posso esperar, — ele resmungou.
Uma saudade explodiu dentro de mim. Ver Adam
junto de seu pai obviamente gentil, fez com que eu sentisse
falta do meu.
Adam apagou a luz no caminho para fora do quarto,
enquanto seu pai dizia:
— Foi um prazer conhecê-la, Livingston.
Sorri para José, convicta de que ele era incrível.
— Foi um prazer, senhor Nova.
Ele balançou a cabeça e levou a mão ao peito.
— Assim você me ofende, niña! Não sou velho.
Senhor Nova é o meu pai. Me chame de José, sim?
Eu ri.
— Ok, José.
— Perfecto. — Ele olhou para Adam. — Boa noite,
hijo. Te amo.
Ao sairmos do quarto, Adam respondeu:
— Eu também amo você, pai.
Enquanto o seguia pela sala de estar, não pude
deixar de pensar em como ele tinha sorte por ter um pai tão
amoroso. Ele era excêntrico, com certeza, mas eu apostava
que eles se divertiam muito juntos. Apostava que a gaze na
testa de seu pai era a razão pela qual eu não o via há dias.
— Você esteve cuidando do seu pai, — eu estava
afirmando o óbvio. E quando entramos no quarto de Adam, ele
me deu uma explicação que fez com que eu me sentisse uma
merda por pensar que estivesse me ignorando.
— Sim, ele caiu da escada há alguns dias e bateu a
cabeça. Os malditos elevadores estavam quebrados. Este
prédio de merda… Ele gosta de descer e jogar baralho com os
amigos. Ele tem uma perna ruim e não pode usar a escada,
mas eu estava na escola. Mona o encontrou e chamou uma
ambulância. Eles o mantiveram internado por uns dias e eu
não podia deixá-lo. — Seu olhar suave me dizia que ele
pensou em mim enquanto esteve cuidando do pai. Que ele
queria ter me avisado sobre o que estava acontecendo.
— Eu sinto muito. Fico feliz por ele estar bem e em
casa.
Adam inclinou a cabeça.
— Sim, eu também.
— E acho que deveríamos ter o número um do outro
para que isso nunca aconteça de novo, — eu ri.
— Como assim? Não gostou de conhecer Raven e ter
nossa primeira discussão em um beco escuro e debaixo da
chuva?
O fato de ele ter dito “nossa primeira discussão” me
causou uma sensação boa. Como se realmente existisse um
“nós” e que fôssemos ficar juntos tempo suficiente para
brigarmos de novo. Não havia mais ninguém no mundo com
quem eu quisesse discutir além de Adam. Especialmente se
todas as discussões terminassem com o beijo. A febre.
O quarto de Adam não era muito diferente do de seu
pai. Era minimamente decorado e assim que entramos, ele
começou a tirar o que havia restado de suas roupas. Eu me
virei para lhe dar privacidade e o ouvi dando um riso abafado.
Meu rosto queimou. Queria vê-lo tirar a calça molhada. Queria
mesmo, mas achava que nesta noite, já tive tudo o que
poderia suportar com aquele beijo e aquele abdômen.
O meu coração martelava no peito enquanto eu ouvia
o farfalhar das roupas. Finalmente, Adam apareceu na minha
frente com nada além de uma calça esportiva de cintura baixa,
segurando uma camiseta preta e um short preto de academia.
Eu o encarei porque, meu Deus, tinha fantasiado com este
garoto nas duas últimas semanas. Droga, tinha fantasiado com
ele antes mesmo de conhecê-lo, mas nada se comparava à
realidade, e ela era espetacular. Aqueles mamilos chamavam
meu nome; eu queria tocá-los, prová-los. Caramba, aqueles
músculos definidos em V acima de sua calça eram o melhor
tipo de distração.
Adam pigarreou e voltei meu olhar para ele.
— Você vai ficar a noite toda aí parada, encarando?
— Ele riu antes de advertir: — Você deveria tirar essas roupas
molhadas antes que fique doente.
Arqueei a sobrancelha.
— Aposto que você diz isso para todas as garotas. —
Mas ele estava certo. Eu estava praticamente batendo o
queixo, mas ficaria feliz em morrer congelada se pudesse olhar
para ele a noite inteira.
Seu rosto estava sério.
— Jamais. Nunca trouxe uma garota aqui em casa
além de Raven.
— Sério? — Eu era a única garota que ele havia
trazido para conhecer seu pai e ver seu quarto? Por quê?
Como?
— Sim, agora, troque de roupa.
Ele se virou para me dar privacidade, tirei minhas
roupas e coloquei as dele. Elas cheiravam a Adam e, de
repente, senti a necessidade de me embolar em uma de suas
pilhas de roupa. Meu Deus, ele tinha um aroma sensual. Eu
tinha me metido em uma roubada.
Ele pegou meu vestido do chão e o pendurou nas
costas da cadeira que ficava na mesinha ao lado da cama.
— Você terá problemaspor não estar em casa? Está
ficando tarde.
— Não sei nem se eles sabem que não estou lá. —
Fazia tempo que desisti de me preocupar se eles se
importavam.
Sua expressão dizia tudo: ele achava aquilo tudo uma
droga. Mas ao invés de dificultar a situação, ele apagou a luz,
segurou minha mão e me levou até a cama. Se deitou e deu
um tapinha no espaço perto dele. Estava tão empolgada por
estar em seu quarto e estar prestes a deitar em sua cama, que
quase não percebi. Por pouco não reparei no brilho das
estrelas, planetas e constelações que cobriam as paredes e o
teto na escuridão.
— Ai, meu Deus. Que lindo. — Girei ao redor do
quarto, de braços abertos, sentindo como se flutuasse no
espaço. Estava muito escuro e tudo o que consegui ver eram
as estrelas radiantes e planetas. Era uma das coisas mais
legais que já tinha visto.
— Vem. São quase iguais às da campina, — ele
disse, indicando o espaço ao seu lado, e eu o achava louco
porque eram muito melhores.
Engatinhei até ele, o cabelo molhado balançando em
meu rosto. Ele estava deitado no meio da cama e fiquei
imaginando onde queria que eu deitasse se estava tomando
conta da porra toda.
— Aqui, — ele indicou, batendo no peito, e senti meu
rosto esquentar. Não deixei a timidez me impedir de escalar
seu corpo como se fosse uma árvore e deitar minha cabeça na
curva de seu pescoço, meu rosto sobre a solidez de seu peito.
Ele me envolveu em seus braços e dobrou uma perna para
que a minha ficasse entre ela e eu estava praticamente
montada em sua coxa.
— Uhm, — gemi porque era tão gostoso, não só de
um jeito excitante. Fazia muito tempo desde que alguém me
abraçou e nunca havia sido alguém que não fosse da família.
Senti seu queixo no topo da minha cabeça. Estava
feliz e me aconcheguei ainda mais nele, meu corpo mole como
gelatina.
— Amei o seu quarto.
Era o pedacinho de um lindo céu neste prédio
disforme. Em uma parte assustadora da cidade. Era a cara de
Adam. O quarto era como um farol na escuridão. Assim como
ele.
— Obrigado. Minha mãe me ajudou a decorá-lo.
Eu queria perguntar como ela havia morrido. O que
aconteceu, mas, ao invés disso, fiz uma pergunta mais fácil de
ser respondida.
— Como ela era?
Sua resposta foi rápida.
— Incrível. O nome dela era Jennifer, mas meu pai
sempre a chamou de Jenny. Ela tinha cabelo loiro comprido e
encaracolado, e olhos azuis.
Isso explicava os olhos azuis deslumbrantes de
Adam.
— Ela era vegetariana, amava fazer yoga e estar ao
ar livre. Meu pai costumava brincar chamando-a de hippie,
mas ela não se importava com o que pensavam dela. Minha
mãe era calada, desajeitada e propensa a ter crises de
depressão, mas amava as estrelas e adorava me contar sobre
elas.
Eu o abracei.
— Ela devia ser maravilhosa.
— E era, — foi apenas um sussurro, mas consegui
ouvi-lo em alto e bom som. Tive a sensação de que aquele
sussurro era um pedido de ajuda. Um apelo para conversar
sobre o que aconteceu. Era como se ele suplicasse para que
eu soubesse e entendesse.
— O que aconteceu? — Murmurei em seu peito.
Pude sentir o seu esforço para encarar a tristeza.
— Ela se suicidou. Com comprimidos. Eu a encontrei
um dia quando cheguei em casa.
O meu corpo se enrijeceu diante da informação. Não.
Eu não conseguia assimilar o fato de Adam ter perdido alguém
daquele jeito e meu coração ficou em pedaços por ele. Não
conseguia imaginar um dos meus pais me deixando por
vontade própria. Não podia nem imaginá-lo encontrando-a.
Lágrimas irromperam em meus olhos e fiquei tão triste que fiz
outra pergunta.
— Quantos anos você tinha?
— Nove.
— Meu Deus, Adam. Eu sinto muito, — engasguei, e
pensei ter sentido um beijo no topo da minha cabeça.
— Tudo bem. Foi há muito tempo. Ela sempre lutou
contra a depressão. Ela costumava trabalhar na ilha, sabia?
Fazendo faxina.
— Sério?
— Sim. Ela não tinha um diploma nem nada parecido,
mas gostava de cuidar das outras pessoas, então foi uma boa
opção. Até que um de seus patrões abusou dela. Esse foi o
começo do fim. Ela nunca se recuperou.
Eu levantei a cabeça e cravei meu olhar sobre
intensos olhos azul celeste.
— Sexualmente?
— Sim.
— Meu Deus. Isso é horrível.
— Sim. Ela não foi a mesma depois disso. Nunca
mais se recuperou. Nunca mais melhorou. Não importava
quantas vezes ela fosse ao psicólogo. Não importava quantos
remédios ela tomasse. Não importava quantas vezes meu pai
tentou protegê-la. Ela parou de sair de casa até para ver as
estrelas. Ela era carinhosa demais, muito gentil. Sensível
demais. Isso acabou com ela.
Deus, parecia que meu peito tinha sido rasgado.
Estava despedaçada por Adam e por seu amável pai. E por
sua mãe que passou por algo tão horrível.
— E a pessoa que fez isso? O que aconteceu?
Adam afastou seu olhar de mim e encarou a parede
próxima a nós, sua expressão dizendo tudo.
— O que normalmente acontece quando alguém da
ilha nos maltrata. Nada.
— Nada? — Eu sentei, me sentindo indignada, com
raiva, dor e incontáveis sentimentos por essa família. — Nada?
— Minha voz foi ficando mais alta.
Hostilidade e injustiça estampavam suas feições.
— Você não entende, Liv? O dinheiro dá poder às
pessoas. Controle. Não temos dinheiro aqui, mas lá vocês
estão nadando nele. Todos vocês têm poder enquanto nós
sofremos. Nós pagamos.
Não gostei da maneira como ele me envolveu
naquilo, pois embora eu morasse lá, aquela não havia sido
uma escolha minha. Eu era apenas uma criança. Não era um
deles. Era apenas eu mesma. Livingston Rose Montgomery.
Filha única de Daniel Montgomery. Amante das estrelas.
Obcecada por Adam Nova. Eu não me importava ou tinha
conhecimento sobre o que acontecia na ilha e todo o dinheiro.
Eu me afastei, me sentindo culpada por algum
motivo, por algo que não tinha nada a ver comigo. Mas será
que estava me sentindo culpada por associação? A ponte que
separava Adam e eu seria a mesma que nos afastaria?
— Não. Não faça isso.
— Não fazer o quê? — Perguntei enquanto me
sentava e olhava para ele.
— Se afastar de mim. Não estava falando sobre você,
Livvy. Falava sobre eles. Você não é um deles.
Amoleci, soltando um longo suspiro e voltando a me
deitar. Estava sendo irracional. Era um sentimento
incontrolável. Eu era muito jovem. Não poderia mudar o
mundo, muito menos aquela pequena ilha. Não queria mais
falar sobre aquilo. Isso me transformava em uma egoísta e
fazia com que eu me sentisse o oposto de Adam. Era como se
estivéssemos a milhares de quilômetros de distância e não
deitados juntos na cama, por isso, mudei de assunto.
— Me conte como eles se conheceram. — Me
aconcheguei, beijando a parte perfumada de seu pescoço, e
soltei um breve gemido.
— Quem? — Ele grunhiu como se estivesse com dor,
mas, pela contração dos músculos de seu abdômen sob minha
mão, sabia que estava excitado com meus beijos.
— Sua mãe e seu pai. — Me acomodei e dei uma
folga ao coitado. Meu palpite era que não seria a primeira vez
dele, e eu ainda não tinha certeza se estava pronta para dar o
próximo passo.
Ergui o queixo e o olhei no escuro. Vi a pequena
curva de seus lábios e me dei conta de que estava curtindo ver
seus sorrisos ultimamente. Ao que parecia, ele não fazia muito
isso antes de nos conhecermos, mas agora ele sorria muito
para mim. Isso me fazia bem.
— Meu pai ama contar essa história, — Adam soltou
uma pequena risada que senti por todo meu corpo. — Ele é
melhor nisso, mas vou tentar.
Ele ficou em silêncio e eu o belisquei.
— Bem, não faça suspense, Nova.
— Ok! — Ele exclamou, afastando a mão que usei
para beliscá-lo e colocando-a sobre seu peito, sobre seu
coração. — Meu pai trabalhava com carros antes de se
machucar. Minha mãe estava no meio da estrada com o carro
quebrado, não muito longe daqui, então meu pai parou. Ele
gosta de dizer que ela estava curvada sobre o capô do carro e
que já sabia que se casaria com ela porque ela tinha a bunda
mais bonita da Carolina do Sul.
Adam riu e eu o acompanhei.
— Ele consertou o carro dela e pediu seu número. Ela
se recusou educadamente, então ele anotou o nome e o
número dele em um pedaço de papel e o prendeuno console
do carro dela. Minha mãe dizia que não poderia ter deixado de
ligar para o lindo homem que a resgatou. Especialmente
alguém com o sobrenome Nova. Uma estrela. E com seu amor
pela astronomia, ela dizia que só podia ser o destino.
Eu sorria como uma boba em seu peito.
— Isso é tão fofo.
— Aham. Como seus pais se conheceram?
— Não foi assim tão romântico quanto os seus.
— E daí? Me conte.
Eu contei. Conversamos sobre meus pais. Sobre
seus amigos. Sobre a escola e o trabalho deles. Passamos a
maior parte da noite nos braços um do outro até eu cair no
sono em algum momento no meio da nossa conversa sobre
bichos de estimação na infância.
Foi uma das noites mais tristes e agradáveis da
minha vida. Uma que eu jamais esqueceria.
[1] Hijo (espanhol) – Filho.
[2] Nena linda (espanhol) – garota linda.
[3] Niña (espanhol) – menina.
ADAM
— Bem, só estou dizendo que se eu fosse a fim de
garotas, com certeza ficaria com você, — Liv disse com
naturalidade ao sorrir para Raven.
Raven sorria radiante e aquilo me fez rir daquelas
duas doidas. Estávamos discutindo a então inexistente vida
amorosa de Raven e sua dificuldade em encontrar uma garota
bacana.
— Ficaria? — Raven disse de volta. — Por algum
motivo achei que não fosse o seu tipo.
Liv pareceu surpresa antes de responder:
— Eu tenho um tipo, Raven. Gente do bem. E acho
que você tem muito disso.
Raven me olhou com olhos arregalados por cima das
batatas-fritas e ketchup.
— Ai, meu Deus, — ela colocou a mão sobre o
coração. — Ela é perfeita, — olhou para o teto da lanchonete
em que estávamos. — Por favor, Deus, se existe uma garota
perfeita para ele, tem que existir uma para mim, certo?
Chutei a canela de Raven gentilmente debaixo da
mesa e ela me olhou com uma expressão de raiva, porém,
brincalhona.
— O quê? Ela é bonita, divertida, inteligente e rica.
Fiquei mal-humorado com a menção do dinheiro de
Liv. Não gostava de falar sobre isso. Era um assunto
controverso para nós — aquela ilha, o dinheiro dela…
Pareciam ser maiores do que a ponte que separava a ilha de
Madison. Não queria pensar sobre o que aquele dinheiro
significaria para nós ou para nosso futuro. O que eu poderia
oferecer para ela?
Liv não notou minha mudança de humor. Ela apenas
riu de Raven antes de dizer:
— Ainda não. Lembre-se, só receberei meu dinheiro
quando tiver vinte e um anos. Até lá, minha madrasta tem todo
o controle.
— Que droga, — Raven estava mastigando o pedaço
de gelo do seu chá quando respondeu.
— É, — Liv deu de ombros como se não fosse grande
coisa. Essa era a reação normal dela com relação a sua
família, mesmo quando eu sabia que eles não eram os mais
legais. Ela agia como uma sonhadora. Isso me deixava
perplexo. Depois de tudo o que ela perdeu e com sua situação
atual, ela ainda conseguia sonhar. Eu tinha desistido disso há
muito tempo. Meus sonhos caíram no esquecimento quando
minha mãe decidiu que não tinha mais vontade de viver, muito
menos de sonhar.
— Bem, é melhor irmos andando. — Eu amava estar
junto de Raven e Liv. Desde a noite em minha casa há
algumas semanas, não nos encontrávamos mais só na
campina. Na maior parte do tempo, eu buscava Liv em casa
depois que todos iam dormir. Ela me mandava mensagem
quando achava que era seguro e eu ficava feliz em garantir
que ela chegasse à campina em segurança. Em algumas
noites, como a de hoje, conseguíamos encontrar Raven para
um jantar tardio na lanchonete que ficava do outro lado da rua
do estúdio de tatuagem.
— Sim, — Raven se levantou e saiu da cabine. —
Está na hora de voltar ao trabalho. Tenho uma cliente, — ela
arqueou as sobrancelhas repetitivamente.
— Imagino que ela seja gata? — Liv perguntou.
— Aham, — Raven respondeu. — Ela tem uns
peitões.
— Meu Jesus, — exclamei, meu rosto ficando quente.
Raven contraiu os lábios.
— Você não se importava em conversar sobre peitos
comigo antes de Liv aparecer.
Meu Deus. Liv deu risada e eu a empurrei para a
porta com minha mão em sua lombar, enquanto Raven
gargalhava.
Todo mundo se abraçou. As garotas se abraçaram
duas vezes e Liv e eu iniciamos nossa caminhada de volta à
campina, o cobertor azul embaixo do meu braço, sua mão na
minha. Caminhávamos em silêncio e foi nesse instante que me
dei conta do que estava acontecendo, com sua mão
segurando a minha. Nosso silêncio dizia tudo. Eu tinha uma
namorada, porra. Tinha deixado de ser o cara que observava
esta garota como um louco, seguindo-a até em casa, e agora,
olhe para nós. Estávamos andando de mãos dadas pelo meu
bairro. Liv era minha namorada. Passei para ela o cobertor que
estava debaixo do meu braço e levei a mão ao bolso para
pegar um cigarro e isqueiro.
Eu precisava de um maldito cigarro imediatamente.
Não estava chateado ou irritado com a chance de ela ser
minha. Eu amava que ela fosse minha. Aquilo só me deixava
com um medo do caramba.
Liv me lançou um olhar de decepção ao ver o cigarro
em minha boca, mas tempos de desespero exigiam medidas
desesperadas. Ela não falou nada, apenas continuou andando
em silêncio e eu fiquei imaginando se ela sabia. Se sabia
como isso era difícil para mim. Deixá-la entrar em minha vida.
E aquilo era mais do que assustador porque significava que
ela já me conhecia muito bem.
Merda. Andei mais rápido de mãos dadas com ela,
soprando a fumaça, esperando aliviar o pânico que irrompia
por todo o meu corpo. Chegamos à campina e ela estendeu o
cobertor com delicadeza até que estivesse esticado e pronto
para deitarmos.
Ela se deitou e me observou andar de um lado para o
outro, ainda em silêncio. E, caramba, eu até queria que ela
perguntasse o que estava errado, mas era evidente que Liv já
sabia.
Apaguei o cigarro e fiquei de pé diante dela,
encarando. Ela estava olhando para o céu, até que parou e
seu olhar encontrou o meu. Ao invés de questionar o que
estava fazendo ali, ela esticou a mão para mim. Sua mão
pequena com unhas rosas. Elas eram bonitas, delicadas e
fofas. Não pude resistir. Sentei sobre o cobertor e me inclinei
para trás. Assim que me acomodei, sua mão segurou a minha.
Ela não foi devagar e carinhosa ao pegá-la. Ela não pediu.
Agarrou minha mão com rapidez e a levou ao peito antes de
cobri-la com a outra.
E foi assim que meu coração desacelerou. Meu
desespero diminuiu e minha pele formigou com uma calidez
que me deixava atordoado. Deus, como ela sabia? Como esta
garota sabia o que eu precisava quando nem eu mesmo fazia
ideia?
Olhei para ela, mas seus olhos estavam fechados,
então aproveitei a oportunidade para encará-la. Afinal, quantas
vezes na vida eu pude olhar para uma pessoa tão linda sem
que ela soubesse?
Suas bochechas arredondadas estavam coradas da
caminhada e seu cabelo castanho sedoso esvoaçava, tocando
suavemente minha bochecha. Era a coisa mais macia que já
tinha sentido na vida e tinha um perfume tão bom. Eu queria
beijar seu nariz pequeno e redondo. Provar seus lábios
carnudos e rosados.
Ela era deslumbrante, de tirar o fôlego, e estava me
transformando em um idiota romântico.
Ela usava uma camiseta cor-de-rosa que não tinha
nada além de uma faixa de tecido ao redor de seu busto. Não
havia mangas e, caramba, ela tinha clavículas e ombros
bonitos. E seios generosos que parecia estar exibindo para
mim o máximo possível ultimamente. Com base em seu
decote, esta noite não foi exceção. Eles subiam e desciam a
cada respiração e eram tão tentadores. Ela estava provocando
um homem faminto e não levaria muito tempo até que eu
surtasse e matasse minha fome.
— Feche os olhos, Nova, — suas palavras me tiraram
do delírio induzido pela paixão que ela havia provocado. Seus
olhos ainda estavam fechados, mas seus lábios sorriam.
— Por quê? — Eu queria observá-la. Ela sabia que
eu gostava disso.
Seu sorriso ficou ainda maior com a minha pergunta.
— Porque não se pode sonhar de olhos abertos.
Eu me apoiei sobre o cotovelo para que meu rosto
ficasse bem acima do dela. Eu conseguia sentir o gosto de seu
hálito doce.
— Tenho certeza que posso, – sussurrei. Porque os
meus sonhos não se comparavam aos momentos que eu
passava comela. Ela era o sonho. Ela era a única para mim.
Liv abriu os olhos ao ouvir minhas palavras, seu
sorriso tinha sumido e em seu lugar havia um olhar de
surpresa.
— O quê?
Beijei seu nariz como eu queria e sorri para ela.
— Saia comigo.
Ela franziu o cenho, confusa.
— Eu estou saindo com…
Balancei a cabeça.
— Não, Liv. Saia comigo. Eu a busco e nós saímos.
Para um lugar especial. Deixe-me levá-la a um encontro.
— Você quer me levar a um encontro? – Suas
palavras foram um sussurro e tinham um tom de descrença.
Como ela não conseguia enxergar? Eu estava obcecado por
ela; viciado em seus lábios. Meu coração só ficava feliz
quando estava com ela.
— Sim.
Ela engoliu em seco antes de responder.
— Tá.
Tá. Fiquei satisfeito. Contente. Voltei a deitar ao lado
dela. Liv olhava fixamente para as estrelas e meus olhos
estavam grudados nela.
— O que você vê quando olha lá para cima?
Ela mordeu o lábio inferior, pensativa, antes de
responder.
— Um milhão de possibilidades. Um mundo de
sonhos, esperança, desejos. — Ela olhou para mim. — O que
você vê?
Dei de ombros.
— Ciência, — minha resposta foi fácil. Prática.
Ela ficou desapontada.
— Só isso?
Olhei para o céu de novo.
— E escuridão.
Pelo canto do olho, pude vê-la sorrindo para mim. Ela
sentou e aproximou seu rosto do meu.
— Ah, mas não há escuridão onde não há luz, Adam.
Segurando minha mão, Liv voltou a deitar. Ela me
fazia sentir mais leve. Melhor. Maior. Iluminado. Eu sorria como
um bobo. Liv observou as estrelas calada e eu a observei em
silêncio por um tempo.
Ela finalmente olhou para mim e apertou minha mão,
me dando um olhar confuso.
— O que você está fazendo?
Ela sabia o que eu estava fazendo. Sabia que a
estava observando. Mas eu sabia que estava fazendo muito
mais do que isso. Por mais que eu me sentisse constrangido
com a verdade, olhei dentro de seus olhos e lhe contei, porque
ela merecia.
— Sonhando.
Seu rosto corou e ela se iluminou por dentro.
— Ah, não. Não pode fazer isso.
— Fazer o quê? — Perguntei, me sentando para
encará-la.
Mordendo os lábios, ela respondeu:
— Nem pense em ficar melhor do que já é, Nova. Não
acho que meu coração de dezesseis anos consegue suportar.
Pude ver o reflexo de centenas de estrelas em seus
olhos. Parecia que meu coração ia explodir.
— Você ainda não viu nada, Montgomery, — e a
beijei como se minha vida dependesse disso.
LIV
— Garota, o que tem acontecido com você
ultimamente? Você perdeu duas aulas de etiqueta e chegou
atrasada na escola três vezes nas últimas três semanas. —
Olivia Drake, a garota robô, estava me seguindo pelo corredor
da escola e me interrogando.
— Estive ocupada. Nada de mais. — Parei no meu
armário e o abri.
Seus lábios se contraíram.
— A senhora Donnelly não pensou o mesmo. Você
deveria ter visto a cara dela quando não apareceu na aula de
dança ontem à noite.
Quase sorri de tão feliz que fiquei por não ter visto a
cara dela na noite passada. Saí sorrateiramente de casa para
ficar com Raven e Adam. Foi muito melhor do que ser pisada
pela garota robô.
— Ela ficou aborrecida e vai pirar se não aparecer
hoje. Só queria deixar você avisada, — ela disse, se afastando
do armário e se juntando a um grupo de garotas que passava
pelo corredor.
Soltei um suspiro, grata por ela ter ido embora.
— O que a princesa perfeita queria?
Dei um pulo ao ouvir a voz de Mel, surpresa por vê-la
atrás da porta do meu armário aberto. Eu o fechei e olhei para
ela.
— Caramba, que susto!
Coloquei o livro de matemática na mochila e a
pendurei em meu ombro enquanto caminhava pelo corredor.
— Então?
— Então, o quê?
— O que ela queria?
— Ah, me avisar que a senhora Donnelly está irritada
comigo.
Ela riu.
— Está mesmo.
Eu ri.
— Fazer o quê, não é? — E eu realmente me sentia
assim. Daria tudo certo no baile. Não precisava de aulas para
ser uma dama da sociedade sulista. Eu já era uma, droga.
Saímos da escola e fomos para a aula de etiqueta.
Não queria faltar hoje. Não precisava que a senhora Donnelly
fosse me dedurar para a louca da Georgina.
— Então, desembucha. Por onde tem andado
ultimamente? Você nunca falta às aulas e nunca chega
atrasada.
Eu sorri; não consegui evitar. Estava tão contente
com Adam. Queria contar para todo mundo. Queria espalhar
aos quatro ventos. E Mel era a coisa mais próxima que eu
tinha de uma melhor amiga. Já havia revelado coisas para ela
no passado, como a loucura de Georgina e as patifarias de
Sebastian. Eu não conseguia deixar para lá... Queria falar
sobre Adam.
— É um garoto?
Aquele foi o meu fim. Não pude mais segurar.
— Sim, — dei um gritinho como a boa colegial que eu
era.
— Ai, meu Deus! — Ela gritou e pulamos na rua de
mãos dadas.
Quando finalmente nos acalmamos, ela disse:
— Caramba, garota. Agora você vai ter que contar
tudo e só tem quinze minutos antes da aula começar, então,
desembucha. Quero todos os detalhes.
— Bem, tenho um encontro marcado neste fim de
semana. — Eu estava totalmente me gabando, mas, fazer o
quê? Estava morrendo para colocar para fora tudo e qualquer
coisa sobre Adam Nova.
— Quem é ele? Onde ele vai levar você?
— Não sei! Ele diz que é uma surpresa e você não o
conhece. Eu o conheci na cidade.
Seu sorriso enfraqueceu.
— O que você foi fazer lá?
— Não sei. Às vezes vou até lá.
Seus olhos se estreitaram.
— Há quanto tempo está vendo ele? Como sabe que
é seguro?
Ela não parecia feliz por mim. Não, ela não estava
nem um pouco satisfeita.
— Estamos nos vendo há algumas semanas. — Eu
estava sendo vaga de propósito. Não precisava de um sermão
dela ou que se sentisse desapontada por eu não ter contado
nada assim que conheci Adam.
Estávamos quase na porta da senhora Donnelly,
então, quando ela parou de andar, eu também parei.
— Você conhece esse garoto há apenas algumas
semanas e irá a um encontro com ele? Na cidade? E vai ser
surpresa? — Ela balançou a cabeça. — Isso não me parece
seguro, Liv.
Segurando sua mão, eu a puxei pelo resto do
caminho para a aula, enquanto dizia:
— Está tudo bem, eu confio no Adam. Ele é um cara
muito bacana e inteligente. Você o adoraria, Mel.
Ela contraiu os lábios e franziu o cenho.
— Adam? Qual é o sobrenome dele caso você
desapareça e a gente precise procurá-la no fundo do oceano?
Revirei os olhos.
— Meu Deus, Mel. Não imaginei que poderia ser tão
dramática. — Contei o suficiente para acalmá-la e tirá-la do
meu pé. — O nome dele é Adam Nova e ele estuda na
Madison Tech. Ele é um nerd que ama astronomia. Duvido
muito que me jogue no oceano.
Deixei os cigarros e as tatuagens de lado, além do
jeito de bad boy. O que foi difícil, porque aquelas tatuagens
eram inebriantes e eu queria gritar para o mundo o quanto eu
as amava.
— Quando será esse encontro surpresa? — Ela ainda
parecia muito desconfiada.
— Neste final de semana. — E ainda era terça-feira.
Parecia demorar uma eternidade.
— Não sei por que não pode sair com Braden. Ele
passa o tempo todo pensando em você. Ele é da ilha e não é
perigoso.
Não disse para ela que me sentia mais segura com
Raven e Adam do que com as pessoas daqui.
— Braden não é para mim, Mel.
Subimos os degraus da senhora Donnelly. Outras três
garotas estavam de pé na varanda, o que nos fez interromper
nossa conversa. Fiquei mais do que aliviada. Estava cansada
de discutir sobre Adam. Eu não pararia de encontrá-lo. E não
sairia com Braden. Assunto encerrado.
— O que estão fazendo aqui fora? — Mel tentou dar
uma olhada na porta da senhora Donnelly.
— Acho que a aula de hoje está cancelada. Tem um
aviso na porta dizendo que ocorreu um imprevisto, — Olivia, a
garota robô, respondeu.
Passei pelo grupo de garotas. Realmente havia um
bilhete na porta que dizia que a aula seria amanhã.
Sensacional. Meu coração disparou. Eu poderia ver Adam. Ele
saía da aula por volta das cinco. Eu poderia encontrá-lo na
casa dele.
Peguei o celular e o avisei por mensagem que estava
indo para lá. Mel me olhou com cautela quando coloquei o
aparelho na mochila.
— Vai encontrar o namoradinho?
— Sim, — dei ênfase na palavra, calando a boca dela
com eficácia.
Desci osdegraus e segui para a ponte.
— Cuide-se, Liv, — eu a ouvi gritar atrás de mim.
Respondi Mel com um sinal de positivo. Fiquei
surpresa com ela. Mel era sempre tão espontânea e, entre nós
duas, era a mais rebelde. Pensei que fosse apoiar o meu
namoro com Adam. Sua reação foi surpreendente e não gostei
nem um pouco.
O sol estava começando a se pôr no momento em
que eu atravessava a ponte. Me sentei por lá e assisti o pôr do
sol antes de ir para a cidade. Quando cheguei à casa de
Adam, estava um pouco mais tarde do que eu imaginava.
Ainda não tinha recebido uma resposta dele, então tentei abrir
a porta pelo lado de fora, mas não consegui. Estava trancada
por dentro. Havia um interfone velho na parte de fora do prédio
onde você podia discar os números dos apartamentos. Apertei
o botão para o apartamento de Adam mas nada aconteceu.
Meu palpite era que estava tão destruído quanto o resto do
edifício.
Então, fiquei sentada nos degraus da frente por mais
de uma hora e nada de Adam me responder. Me mantive
entretida com o dever de casa. Estava profundamente imersa
nos clássicos da minha aula de literatura quando alguém
sentou ao meu lado, quase me matando de susto.
— Opa, olha quem está aqui, — Boone sorriu para
mim com seus dentes amarelados e senti minha respiração
ficar presa. — Eu me lembro de você. É a garota da campina.
— Seu hálito cheirava a algum tipo de bebida e eu me afastei,
indo em direção ao corrimão que ficava na lateral do pórtico.
Já tive um incidente com esse cara horroroso. O medo me
atingiu de uma maneira cortante por estar sozinha desta vez.
Ele sorriu maldosamente.
— O que está fazendo aqui? Veio me procurar?
Eu me levantei e tentei descer os degraus, mas ele
me encurralou, me empurrando ainda mais para dentro do
pórtico escuro, sob a pequena marquise.
Minhas costas estavam contra a porta quando tentei
responder com convicção.
— Estou esperando um amigo. — Tentei parecer
calma, mas tinha certeza que a hesitação em minha voz me
entregou, porque ele deu um sorrisinho doentio que me
causou arrepios.
— Aposto que veio até aqui para ficar com um dos
garotos da cidade, hein? Tenho certeza que aqueles ricaços
babacas da ilha não dão o que você precisa. — Ele se
aproximou até que seu rosto ficasse a centímetros do meu e
meu corpo estivesse colado à parede atrás de mim.
Pressionei a lateral do meu rosto contra a porta, mas
não adiantou. Ele encostou seu nariz no meu. Adam tinha feito
a mesma coisa numa outra noite, mas isso foi diferente. Eu
estava assustada e sem controle. Senti uma única lágrima
escorrer pela minha bochecha.
— Aposto que gostaria que eu fodesse você bem
aqui, contra esta porta, não é, sua piranha? Sei bem do que as
garotas da ilha gostam.
Minha voz ficou presa na garganta. Tentei gritar,
chorar, mas nada aconteceu.
Ele tentou colocar sua perna entre as minhas, mas
levantei meu joelho com o máximo de força que consegui e o
atingi no saco. Ele grunhiu mas ainda me mantinha presa à
porta e, por mais que eu o empurrasse e arranhasse e
batesse, era inútil. Ele era grande demais, forte demais, e eu
era pequena e fraca.
— Você vai pagar por isso, sua vagabunda.
Outra lágrima escorreu livremente quando lembrei da
noite em que Adam ficou tão aborrecido comigo por ter ido
procurá-lo no trabalho de Raven. Fazia sentido agora. Ficou
tudo muito claro naquele momento. Ele estava certo. Eu fui
burra.
Finalmente, consegui libertar minha voz e um lamento
se espalhou por todos os lados quando a mão de Boone
alcançou meus seios, apertando um deles com força antes de
rasgar o tecido da minha regata com brutalidade. Um dos
lados da minha regata estava rasgado, revelando meu sutiã, e
eu gritei de novo. Fechei os olhos e, com toda a minha força,
eu o chutei, gritei, soquei e soquei, lágrimas jorrando pelo meu
rosto, gritos explodindo de minha boca.
De repente, eu estava chutando e socando o ar.
Confusa, abri os olhos e Boone não estava mais lá. Tudo o
que conseguia ver era o borrão de dois corpos na calçada
enquanto eu escorregava para o chão. Meu corpo tremia à
medida que a adrenalina era eliminada. Nunca tive tanto medo
na vida.
Os corpos na calçada pararam e de repente meu
cérebro registrou o que eu estava vendo. Adam estava em
cima de Boone. Seu rosto vermelho de raiva. Seu antebraço
na garganta dele. O rosto de Boone estava vermelho e seus
olhos arregalados, mas ele já não lutava mais.
— Vou matar você! — Adam gritou na cara de Boone,
saliva voando de seus lábios.
Eu me arrastei pelos degraus, sem confiar em minhas
pernas vacilantes. Tinha que ajudá-lo. Ele ia fazer algo do qual
se arrependeria. Eu não podia permitir que ele fizesse aquilo;
não por minha causa.
Boone emitiu alguns ruídos, mas Adam estava fora de
si.
— Vou acabar com você. Colocou as mãos nela.
Você colocou as mãos nela, caralho! — Ele gritava na cara de
Boone.
— Por favor, — chorei, tentando chamar sua atenção,
mas foi apenas um sussurro, quase um suspiro. — Por favor,
— tentei de novo. Desci os degraus o mais rápido que pude e
me arrastei até Adam. Coloquei a mão sobre o seu braço. —
Por favor, — falei de novo.
Ele virou a cabeça para mim, mas seu antebraço
continuou no pescoço de Boone. Seus olhos furiosos
pousaram sobre os meus e, a princípio, pensei que ele não
tivesse me visto. Era como se estivesse em um outro lugar, em
um tempo diferente.
Toquei sua bochecha com minha mão trêmula.
— Ei, está tudo bem.
Vi o reconhecimento surgir em seu olhar, mas ele foi
rapidamente substituído por tristeza. Seu rosto desmoronou
diante dos meus olhos e, por mais que eu estivesse vivendo
um dos momentos mais emocionalmente tensos da minha
vida, fui solidária a ele.
Seus olhos ficaram cheios de lágrimas que nunca
seriam derramadas. Sua expressão era de pura tortura e
devastação.
— Ele tocou você, — ele sussurrou e eu acariciei sua
bochecha com meu polegar.
Lágrimas frescas escorriam pelas minhas bochechas.
— Ele colocou as mãos em você, — grunhiu. Ele
olhou para o meu ombro e para o rasgo na camiseta, e seus
olhos ficaram enlouquecidos, seu corpo retesado de fúria.
Como se ainda fosse possível, ele apertou mais a
garganta de Boone.
— Ele machucou você! — Adam berrou.
— Não, — chorei. — Estou bem. Eu prometo, estou
bem, — tentei acalmá-lo.
Mas ele voltou seu olhar violento para Boone e tive a
sensação de que isso estava longe de terminar. Eu me levantei
com as pernas bambas, preparada para evitar que Adam
fizesse o que eu sabia que ia acontecer, mas não tive a
chance de fazer nada.
O xerife Rothchild apareceu do nada.
— Entre no carro, Livingston, — ele ordenou ao meu
lado e então se aproximou de Adam, tirando-o de cima de
Boone, com um braço ao redor do pescoço dele, o outro em
sua cintura.
Eu não entrei no carro. Fiquei lá para ter certeza de
que Adam estava seguro.
Boone se mexeu na calçada, tentando
desesperadamente recuperar o fôlego. Ele tossiu, ofegante, e
até poderia me sentir mal por ele, mas sabia, no fundo do meu
coração, que esse cara era perverso e tinha planejado fazer
mais do que rasgar minha camiseta e me assustar.
— Me solta! — Adam gritou para o xerife, mas
Rothchild o ignorou por completo.
— Entre no maldito carro, Livingston! — Ele gritou
para mim ao invés de lidar com Adam.
Olhei ao redor, procurando pelo carro do xerife, e o vi
a um quarteirão de distância, mas não suportava a ideia de
deixar Adam quando ele estava daquele jeito.
— Não posso, — sussurrei despedaçada. — Preciso
ter certeza de que ele está bem.
Enquanto isso, Adam perdia a cabeça.
— Sai de cima de mim, caralho! — Ele gritava para o
xerife. — Tire suas mãos de mim, seu desgraçado!
Boone finalmente se levantou do chão e correu. O
xerife não pareceu se importar com sua fuga. Ele parecia mais
focado em Adam e meu estômago se revirou só de pensar em
dar de cara com Boone de novo. Por que ele não foi atrás de
Boone?
O xerife Rothchild jogou Adam no chão, segurando-o.
— Entre no carro, Liv. Estou falando sério. Agora. Eu
cuido dele.
Senti que não tinha escolha, então segui em direção
ao carro,mas não antes de gritar:
— Ele não me machucou! Foi Boone! Boone estava
me machucando. Ele estava me protegendo!
Eu olhava para Adam e o xerife a cada passo que
dava. Ele não parecia o estar machucando, mas também não
estavam tendo uma conversa amigável. O xerife estava em
cima dele e o segurava, ameaçador. Raiva irradiava dos dois
quando cheguei à lateral da viatura de polícia.
Sentei dentro do carro por mais dois minutos, minhas
mãos tremendo enquanto eu assistia a interação entre eles.
Nunca me perdoaria se Adam se envolvesse em problemas
por me proteger. Só quando o xerife o empurrou deixando-o no
chão e voltou para o carro, que eu me perguntei como o xerife
Rothchild tinha nos encontrado. Até onde eu sabia, ninguém
tinha chamado a polícia ou visto o que aconteceu. E ele não
havia chegado com a sirene ligada. Eu a teria visto e escutado.
Como ele me encontrou?
Apenas uma pessoa sabia que eu estava vendo
Adam. E só havia contado para ela algumas horas atrás. A
raiva queimava dentro de mim. Não existia ninguém em quem
eu pudesse confiar? Não havia ninguém do meu lado além do
meu garoto tatuado da cidade? Traição me atingiu como a
mais quente das chamas. Jurei que não cometeria um erro tão
crucial novamente — ser confiante e presunçosa.
O xerife Rothchild abriu a porta e entrou no carro. Ele
se sentou soltando um suspiro pesado e esfregou os punhos
sobre os olhos, como se sua noite tivesse sido estressante. É,
a minha também foi, cara. A minha também.
Puxei a parte de cima da minha camiseta que cobria
meu sutiã e a segurei lá enquanto ele dava partida no carro.
Ele ficou quieto por cerca de dois minutos antes de falar. Suas
palavras foram cuidadosas, lentas, calculadas.
— Eu me preocupo com você, Livingston.
Eu não disse nada porque não acreditava que ele se
importasse comigo, mas eu era sulista, e os bons modos que
nos eram ensinados diziam que se não tínhamos nada
agradável para falar, era melhor ficarmos calados. Além do
mais, ele evitou que Adam matasse Boone esta noite, então
pensei que estava lhe devendo um pouco de decoro.
— Georgina se preocupa com você também.
Bufei e ele me lançou um olhar de repreensão antes
de voltar sua atenção para a estrada.
— Você não pertence à cidade. Madison não é
segura. Você não tem nada para fazer aqui.
Minhas costas ficaram rígidas enquanto eu revirava
os olhos. Ele estava certo de muitas maneiras. Aqui não era
seguro, mas nada me afastaria de Adam.
— Não quero mais vê-la aqui novamente. Seu pai
também não teria gostado. Você me ouviu?
Aquilo me enfureceu. Como ele ousava usar meu pai
como um truque para me afastar de Adam? Queria falar que
ele não sabia porra nenhuma sobre o meu pai, mas só olhei
pela janela da frente e fingi que não escutei sua pergunta. Eu
estava fervendo de raiva.
E Mel… Eu havia contado para ela hoje, mas pelo
visto, não levou muito tempo para que me delatasse. Eu me
sentia nauseada, devastada e muito triste naquele momento.
Não tinha ninguém e agora, eles tirariam Adam de mim. Eu
ficaria sozinha de novo. Eu não suportaria. Mais lágrimas
escorreram pelo meu rosto. Ele ia contar para Georgina. Ela
nunca mais me deixaria sair de casa. Eu era menor de idade.
Não tinha controle nenhum.
— Você me entendeu, Livingston? — Desta vez não
foi uma pergunta. Foi uma ordem. Era como se eu estivesse
me desfazendo em milhões de pedaços. A doçura das últimas
semanas estilhaçada à minha volta enquanto eu soluçava.
Quando atravessamos a ponte e entramos na ilha,
tive a sensação de que meu coração estava de volta à cidade,
com Adam. Eu me perguntei se ele estava bem. Queria
abraçá-lo. Queria segurá-lo. Eu só queria ele.
Ao chegarmos em casa naquela noite, esperava que
o xerife fosse entrar e contar a Georgina o que tinha
acontecido. Mas ele não contou. Apenas me deixou na porta
da frente com minha regata rasgada e tudo mais. Desabei
contra a porta da varanda e chorei. Não por mim, não pela
minha camiseta rasgada. Não pela minha inocência em
declínio. Não, chorei por Adam Nova.
ADAM
Quanto alguém poderia odiar a si mesmo? Essa era a
pergunta que eu fazia sempre que me olhava no espelho. Não
foi suficiente ter que encontrar minha mãe morta depois de
sofrer um abuso sexual? Não foi suficiente o fato de eu não ter
conseguido ajudá-la ou protegê-la? Agora eu também tinha
que suportar a tortura que era saber que não poderia proteger
a garota que eu amava? Era isso mesmo. Eu a amava, porra.
E não podia fazer nada para mantê-la em segurança.
Fiquei me encarando no espelho do banheiro. Eu não
era bom para ela. Ela não pertencia a este lugar. E por mais
que eu odiasse o xerife Rothchild, ele estava certo, eu
precisava ficar longe de Liv. Era o melhor para ela. Era o
inferno para mim.
Toquei o pequeno corte em meu lábio. Ardeu, mas eu
apostava que não se comparava às feridas que Liv sofreu por
dentro. Toda vez que pensava na noite anterior, eu me sentia
enojado, louco, furioso.
Concluí o meu dia na escola e fiquei no laboratório
até escurecer para fazer um trabalho. Meu celular estava sem
bateria. Ficava aborrecido toda vez que pensava no meu
celular sem bateria. A culpa era minha. Ver as mensagens dela
quando finalmente o recarreguei e o liguei quase acabou
comigo. Ela estava lá esperando por mim. Tinha terminado as
aulas mais cedo e queria estar comigo.
E Boone. Aquele filho da puta. Eu ainda queria matá-
lo toda vez que lembrava de chegar aos degraus da varanda
do prédio e ouvir o grito de Liv. Alguma coisa se apossou de
mim, algo que nunca seria capaz de explicar. Selvagem. Essa
era a única palavra que me descrevia.
Eu o arranquei de cima dela, uma fúria incontrolável
queimando dentro de mim. Não lembro de jogá-lo no chão ou
de usar meu braço para estrangulá-lo. Tudo parecia um
pesadelo agora. Ver o rosto de Liv coberto por lágrimas, sua
súplica para que eu parasse. Sua regata rasgada deixou
minha alma em pedaços.
Eu não havia protegido minha mãe e também não a
protegi. Se ela continuasse por perto, não levaria muito tempo
até que seu espírito também fosse danificado. Até que este
lugar consumisse cada fragmento de sua bondade e cuspisse
seu corpo sem vida, sem restar nada. Eu não podia deixar
aquilo acontecer. Eu tinha que protegê-la. De Boone. De
Madison. De mim.
Ao que parecia, meu celular vibrava na bancada pela
centésima vez e eu o peguei. Ver o nome de Liv piscando na
tela não me surpreendeu. Eu era um babaca. Um verdadeiro
otário porque ela passou a manhã inteira me mandando
mensagens e eu não respondi. Não sabia como contar para
ela que isso não podia continuar. Que tínhamos que pôr um
fim no que quer que fosse.
O que quer que fosse. Como se eu não soubesse.
Mas eu podia fingir, droga. Eu era bom nisso. Olhei para o
celular de novo e abri o monte de mensagens de Liv que
ignorei o dia todo.
Liv: Me liga.
Liv: Você está bem?
Liv: Podemos conversar?
Liv: Por favor, fale comigo.
A última mensagem fez com que eu quisesse
arrancar meu coração e jogá-lo da ponte que nos separaria
para sempre e não apenas com relação à distância. Pensei
sobre o que fazer ao descer a escada e fumar um cigarro na
frente do prédio. A visão do pórtico revirava meu estômago.
Não, não, independente do que eu sentia por ela, não podia
deixá-la voltar aqui. Não podia arriscar.
Peguei o celular e respondi Liv dizendo que a
encontraria em trinta minutos na praia que ficava do outro lado
da rua da casa dela. Mesmo aos dezenove anos, eu não era
imaturo ou idiota o bastante para terminar por telefone. Além
disso, eu tinha que vê-la. Só mais uma vez.
Subi a escada correndo, orando para que eu não
encontrasse Boone andando por aí. Não queria ser preso hoje.
Abri a porta do apartamento, pronto para gritar para o
meu pai que estava saindo quando o vi sentado na cadeira da
sala.
— Vou dar uma saidinha, pai.
A gaze tinha sumido de sua testa e ele parecia
melhor. Fiquei aliviado. Ele era tudo o que eu tinha; precisava
cuidar dele.
— Está indo ver a Liv?
Assenti e procurei pela chave da porta em cima da
mesa.
— O que os pombinhos vão fazerhoje?
Eu tentei sorrir. Tentei mesmo. Não queria preocupá-
lo com isso.
— Só vamos à praia.
Ele assentiu com a cabeça e vi quando seus olhos
focaram em meu lábio.
— O que aconteceu com seu lábio, hijo?
— Nada, pai. Está tudo bem. Só umas besteiras entre
mim e Boone.
Meu pai não deixava passar nada. Ele era um bom
pai apesar da nossa situação de merda.
— Essa coisa entre você e Boone tem a ver com a
Livingston? — Seus olhos eram como uma máquina de raio-x.
Às vezes eu achava que ele conseguia enxergar através de
mim.
Olhei em volta da sala, para qualquer lugar que não
fosse ele. Porque se meu pai me perguntasse sobre o que
aconteceu entre mim e Boone, e eu tivesse que contar sobre
Liv, perderia o controle. Choraria como a porra de um bebê. E
eu não tinha tempo para chorar ou para me importar.
Precisava cortar relações e seguir com a minha vida. Era o
melhor para todos.
— Vejo que não está pronto para conversar sobre
isso. Mas quando estiver, estou aqui, ok?
Ainda assim, não olhei para ele. Só assenti, peguei a
chave e passei pela porta como o diabo foge da cruz. Tive o
cuidado de me manter longe do xerife Rothchild. Não
precisava que ele pegasse no meu pé mais do que o normal.
Cheguei à praia em tempo recorde. Estava cinco
minutos adiantado, mas não importava porque ela já estava lá.
Liv estava sentada sobre as dunas, olhando o oceano. Fiquei
parado e a observei por alguns minutos, sabendo que esta
seria a última vez que eu a veria. A última vez que poderia
observá-la.
O sol estava se pondo sobre o oceano, mas eu mal
notei. Seu lindo cabelo castanho esvoaçava em seu rosto. Ela
estava usando uma camiseta larga e legging preta. Seus pés
descalços estavam pressionados na areia e ela parecia muito
triste olhando o mar.
Droga. Aqui vou eu.
Meu All Star levantava a areia enquanto eu
caminhava na direção dela. Percebi o momento em que ela
soube que eu estava lá. Seu corpo se enrijeceu quando virou a
cabeça para o lado e me viu andando em sua direção. Ela se
levantou em um pulo e correu como nunca ao meu encontro.
Antes que eu soubesse o que estava fazendo, ela
estava em meus braços e eu a segurava, minhas mãos em
sua cintura. Suas pernas ao meu redor. Ela me puxou para
perto e afundou seu rosto em meu pescoço. Seu corpo tremia
contra o meu. Ela chorava e eu não conseguia suportar. Vim
até aqui para terminar com ela. Para dizer adeus à minha
primeira namorada. À garota que eu achava que amava. E ao
invés disso, minhas mãos percorreram suas costas e eu a
reconfortei.
Sentei nas dunas com ela ainda enrolada em mim
como um cobertor aquecido.
— Shhh. — Afastei o cabelo do seu rosto e sussurrei
em seu ouvido. Eu não podia suportar. Sua dor acabou
comigo.
Quando finalmente se acalmou, ela se apoiou em
meus joelhos e me beijou suavemente. Suas mãos seguraram
o meu rosto e acariciavam a barba por fazer em meu maxilar.
— Você está machucado, — ela sussurrou, beijando
o pequeno corte em meu lábio.
Segurando suas mãos, balancei a cabeça.
— Não, estou bem.
— Desculpe, — ela murmurou.
Eu a puxei para perto de novo, abraçando-a com
força, abrigando-a em meus braços.
— Não é culpa sua.
A afastei para que pudesse ver meu rosto. A
seriedade. Assim ela entenderia que o que eu estava dizendo
era verdade.
— Foi culpa do Boone. E minha. Eu não a protegi. —
Senti meu maxilar ficar tenso diante do inevitável. O que eu
sempre soube que aconteceria desde o começo.
Estava escuro agora, as estrelas aparecendo para
iniciar o espetáculo.
Eu as olhei fixamente enquanto ela falava.
— Não é culpa sua. Você avisou para eu me cuidar.
— Não importa, — respondi para o céu. — Não
podemos mais continuar com isso. — Pisquei para segurar a
emoção que estava prestes a transbordar.
Ela recuou até ficar de joelhos e sentar sobre minhas
pernas.
— Isso? Não podemos continuar com isso?
Não conseguia encará-la. Eu não faria isso. Destruiria
meu coração que já estava partido.
Mas ela não me deixaria em paz. Segurando meu
rosto com firmeza, Liv me obrigou a olhá-la.
— Isso? Você quer dizer nós? É isso o que você quer
dizer com isso?
Fechei os olhos. Não podia olhar para a mágoa em
sua expressão nem mais um segundo.
— Não, fique de olhos abertos enquanto parte o meu
coração, Adam. É o mínimo.
Abri os olhos lentamente. Seu olhar devastou minha
alma.
Eu não sabia o que dizer. Não sabia de nada que
pudesse fazê-la entender. Droga, eu sabia o que tinha que
acontecer, mas até eu tive dificuldade em entender que a vida
era injusta para caramba. Então, entreguei tudo o que tinha, a
minha verdade.
— Não posso protegê-la, — as palavras pareciam
serragem em minha boca, densa e seca.
Ela empurrou meu peito.
— Você não precisa.
— Somos de dois mundos diferentes. Isso nunca vai
funcionar. Merda, faz apenas dois meses e já não está
funcionando. — Caramba, eu estava mentindo. Os últimos dois
meses foram incríveis. Abrir mão dela me mataria.
Agora Liv parecia irritada.
— O quê? Por causa do Boone? Você vai terminar
comigo por causa de uma noite com um cara perverso?
Eu precisava fazê-la enxergar. O meu mundo estava
cheio de caras ruins. Agarrei seus braços e a sacudi.
— Você não entende? — Gritei, minha voz falhando.
— O mundo está cheio de pessoas más, Liv. Essas pessoas
nunca nos deixarão em paz.
E ela não sabia nem a metade. Não eram apenas as
pessoas da cidade que poderiam nos separar.
Ela se afastou de mim e se levantou, me olhando
como se não soubesse quem eu era. Foi como se uma flecha
em chamas atingisse minha alma. Fui o primeiro homem que
beijou você. O primeiro homem que a tocou. Sou seu e você é
minha, eu quis gritar, mas não podia. Porque estava acabado.
— É nisso que somos diferentes, Adam. Eu jamais
deixaria alguém me separar de você.
— Isso não é justo. — Me levantei, agora aborrecido.
Ela andou em minha direção e parou, pé com pé.
Cabeça com cabeça. Coração com coração.
— Sabe o que não é justo? Você desistir de mim. De
nós. Isso não é justo.
Ela me feria por toda parte. Eu queria abraçá-la.
Queria sacudi-la. Ela queria que eu lutasse por nós, mas eu
não podia porque estava ocupado demais lutando por ela. Eu
preferia passar o resto dos meus dias em amargura se isso
significasse que ela estaria protegida e feliz.
Engoli como se tivesse areia em minha garganta e
olhei para as estrelas. Elas pareciam diferentes hoje. Não
estavam tão brilhantes. Não estavam tão bonitas.
— Você e eu, Liv? Não fomos escritos nas estrelas,
— engasguei com a mentira. Aquilo deixou um gosto terrível
em minha boca.
Mas ela tinha resposta para tudo.
— Então iremos reescrevê-las.
Tudo era tão fácil para ela. Minha Luna, a sonhadora.
— Não posso, — sussurrei.
— Não pode, o quê? — Seus lindos olhos castanhos
cintilavam de lágrimas enquanto ela me olhava.
— Colocá-la em risco. Estou com medo. Não posso
perder você. — Parecia que eu estava me afogando no mar
bem à minha frente, embora eu estivesse a salvo na areia.
Ela balançou a cabeça lentamente antes de erguer a
mão e acariciar meu maxilar com tanta delicadeza que parecia
temer que eu fosse quebrar.
— Então você vai me jogar fora? Eu não sou ela,
Adam. Não sou ela. Não preciso ser salva. Só preciso de você.
Encostei minha testa na dela e soltei um longo
suspiro que parecia ter segurado por anos. Como ela sabia?
Como essa menina-mulher conseguia verbalizar meus medos?
Mas ela estava certa, ela não era minha mãe.
— Eu sei, — sussurrei em seus lábios.
Por trás de seus cílios, seus olhos gentis me
observavam. Aqueles olhos eram de matar e impossíveis de
dizer não. Eles seriam o nosso fim.
— Ficaremos bem se estivermos juntos, — ela
passou a mão sobre meu cabelo e fechei os olhos. Eu me
derreti todo, cacete. — Somos você e eu, Nova. Você e eu
contra o mundo.
Ela não sabia como estava certa. Movi meu nariz
sobre o seu, inalando seu perfume refrescante. Tinha quase
certeza que aquele era o cheiro da inocência, mas não podia
confirmar. Nunca estive tão perto dela.
Eu a queria. Não podia desistir dela, não importava
como eu sabia que era a coisa certa a ser feita.— Me beije, — ela sussurrou e isso foi tudo. Aquele
pedido foi suficiente.
Minha mão percorreu a parte de trás de seu pescoço
até chegar em seu cabelo solto. Eu o prendi em minhas mãos
e virei a cabeça dela do jeito que eu queria; do jeito que eu
precisava.
Pressionando minha boca sobre a dela, eu gemi.
Provando-a, beijando-a como se tivesse esperado uma
eternidade. Não escondi nada. Mordi e chupei seus lábios.
Devorei sua boca até beirar a insanidade. Eu a deitei de costas
e me posicionei sobre ela, me acomodando no ponto sensível
entre suas coxas. Liv estava deliciosamente quente naquele
lugar e seu calor envolvia meu corpo com perfeição.
— Posso? — Sussurrei em seus lábios, meus olhos a
devoravam. Eu não conseguia parar. Estava louco. Não sabia
nem o que estava perguntando. Podia, o quê? Beijá-la? Prová-
la? Amá-la? Ficar com ela?
Meu olhar desviou de sua barriga nua, descoberta
pela camiseta, para o topo de suas coxas flexíveis, passando
pelos seus seios e pela curva suave que ligava o pescoço à
sua garganta. Aquele ponto macio e perfumado onde eu queria
enterrar meu rosto para sentir seu cheiro. Minha boca ficou
cheia d’água. Meu corpo a desejava. Eu estava faminto e só
Liv poderia me satisfazer.
Seu torso se arqueou em uma linda curva, seus seios
empurrando meu peito, seu corpo precisando de mim como o
meu precisava do dela.
— Por favor, — ela implorou.
Aquela única palavra e eu estava arruinado. Era
provável que eu fosse um garoto de treze anos de novo.
Queria ser ousado, imaturo. Queria me apressar. Queria tomar,
saquear e roubar cada pedacinho que ela não estaria disposta
a me dar. Deus, eu queria ser egoísta, beijá-la e prová-la como
o louco que era. Soltei um suspiro entrecortado, tentando
recuperar um pouco de sanidade, um pouco de compostura.
Lentamente, com cuidado, levantei sua camiseta, expondo seu
sutiã de renda delicado, com um pequeno laço no meio que
me deixou ávido. Eu não era bom para ela. Aquele laço era a
prova disso. Ela era doce. Usava rendas e lacinhos, e eu era
coberto por tinta escura e desespero. Isso era errado, mas
parecia tão certo e tão gostoso.
Meu dedo traçou aquele laço e subiu para a região
bem no meio de dois círculos brancos, leitosos, que
imploravam pela minha boca. Mas não tive pressa. Só seria
possível ver seu lindo corpo pela primeira vez, uma única vez.
Eu só poderia vivenciar nossas primeiras vezes apenas uma
vez na vida e não queria esquecer de nenhuma. Queria
guardá-las para o momento que Liv finalmente percebesse que
eu não era digno dela. Que nunca daríamos certo. Eu do lado
errado da ponte, ela do lado certo. Todos contra nós.
Olhando em seus profundos olhos castanhos e seu
rosto carinhoso, não pude deixar de pensar em alguns
cenários. E se eu não morasse do outro lado da ponte? E se
ela não vivesse na ilha? E se eu fosse bom o bastante para
ela? E se nossos passados e presentes não tivessem sofrido o
impacto de uma colisão frontal? E se, porra.
Naquele momento, ver seus olhos brilhando de
desejo, seu corpo ruborizado e quente, seus lábios rosados
por causa dos meus, parecia que algo além de uma mera
ponte nos separava. Parecia que éramos de mundos distintos.
Universos, inclusive. Ela era linda. E eu era apenas eu. Adam
Nova. Um pobre garoto introvertido, com medo das pessoas,
que temia o sucesso, apavorado com o fracasso, revoltado
com minha condição. O que eu teria para oferecer a esse
anjo? Porra nenhuma, mas isso não me parou. Nada pararia.
Continuei a invasão. Era tudo o que eu sabia fazer.
Então, eu me inclinei, capturando sua boca em um beijo
abrasador que fez minhas bochechas doerem de tão doce que
ela era. O beijo foi simplesmente delicioso. Eu estava fodido.
— Meu Deus, você é tão linda, — gemi, tomando
seus lábios de novo, provando cada canto, cada cavidade de
sua boca com minha língua, e nossa, ela era gostosa. Melhor
do que tudo o que já experimentei. Liv gemeu e eu engoli em
seco, desesperado por seus ruídos. Eu queria tudo. Queria
ela. Droga, mas a vida não era justa. Senti suas mãos cálidas
em meu cabelo e na lateral do meu rosto, sua pele quente
contra a minha, antes de deslizar sobre as tatuagens em meu
pescoço. Parei e a observei fixamente, nossos olhares presos
um ao outro como se já tivéssemos feito aquilo milhares de
vezes, nossas almas envolvidas de um jeito irreal.
— Você também é lindo.
Um calor tomava conta do meu rosto à medida que
meu coração disparava. Nunca ninguém me chamou de lindo.
O mundo não podia amar você quando se escondia dele. Mas
Liv... ela me enxergava. Além das minhas tatuagens. Além das
minhas peculiaridades. Além das minhas sombras. Ela não
ligava para minha introversão. Ela me enxergava como
ninguém mais. E me achava bonito, mesmo com todos os
meus defeitos.
Apoiei meu rosto na base de seu pescoço, cuidando
para que as emoções que eu sabia que brilhavam em meus
olhos, ficassem escondidas. E ela permitiu que eu as
escondesse, porque sabia que eu precisava. Ela simplesmente
sabia. Como sempre.
Eu não iria me apropriar. Eu cederia. Era isso o que
ela merecia. Se eu me apropriasse, ia querer ficar com ela
para sempre e Livingston Montgomery não era alguém que eu
podia ter. Ela era um empréstimo do universo, o meu próprio
milagre que anda e fala.
Pisquei para afastar as lágrimas em meus olhos e
passei a língua sobre a cavidade de sua clavícula, lhe
causando arrepios. Sorri em seu ombro antes de me mover e
parar bem acima daquele laço. Lambi a base de seu pescoço
com lentidão.
Tê-la me levava aos céus. Saber que não poderia
ficar ela me levava ao inferno.
Eu me acomodei entre suas pernas, deslizando a
mão sobre o cós da sua calça de elastano que envolvia sua
bunda com perfeição.
— Sim? — Perguntei, olhando para ela, incerto, ainda
chocado por Liv me querer do mesmo jeito que eu a queria.
Ela fechou os olhos quando um “por favor” escapou
de seus lábios. Quanto a mim? Caí de cabeça no
esquecimento. Eu estava perdido. Seu perfume em meu nariz,
sua pele colada à minha, seu coração batendo contra o meu.
Ela era boa demais para ser verdade.
Puxei a alça do seu sutiã enquanto minha outra mão
deslizava para a umidade escondida sob sua calcinha. E meu
Deus, como estava molhada. Tão molhada, pronta para mim.
Gemi, terminando de baixar a alça e expondo seu mamilo rosa
escuro, duro e preparado para minha boca. Eu o capturei,
consumindo-o enquanto meu dedo se aproximava ainda mais
do local úmido. Suas mãos agarraram meu cabelo, ela
arqueou o corpo em uma súplica sem palavras. Encontrei o
ponto quente e movimentei meu dedo, testando, verificando se
não a estava machucando; meu pau mais duro do que nunca
contra o zíper da minha calça jeans. Eu queria arrancá-la e
colocá-lo lá, bem no meio dela.
— Deus, por favor. — Ela puxou meu cabelo com
mais força e tentou guiar minha mão. — Por favor, entre em
mim. Me toque. Faça alguma coisa. Qualquer coisa, — ela
ofegou.
Qualquer coisa... Eu queria fazer de tudo.
— Shhh, — eu a tranquilizei, murmurando em seu
peito, com medo de que alguém pudesse ouvi-la, mesmo
sabendo que este trecho da praia estava vazio. Mas aqueles
ruídos, aquelas palavras, eram só para mim. Eram minhas. Ela
era minha, nem que fosse só por este momento, apenas neste
lugar.
Coloquei meu dedo dentro dela e era tão apertado e
quente que por pouco não gozei. Bem aqui, sob as estrelas,
ainda de calça. Porra, que gostoso.
Me movendo sobre seu corpo, beijei seus seios, seu
maxilar, a ponta do seu nariz, minha mão massageando-a;
minhas emoções à mostra.
Encostei minha testa sobre a dela e deslizei o dedo
completamente, preenchendo o espaço apertado. Quando
pressionei o polegar em seu clitóris, seus olhos se abriram,
encontrando os meus em meio a um arquejo.
— Como se sente? — Sussurrei em seus lábios,
fazendo movimentos circulares enquanto inseria e tirava e meu
dedo devagar, decidido que queria senti-la ao máximo. Não
vou mentir, saber que eu era o único homem que a havia
tocado, saber que seria o primeiro que lhe daria prazer, me
deixou louco.
Ela arfou e me agarrou, segurandomeu pulso contra
ela, sentando sobre meus dedos.
— Como se sente, Liv? — Passei a língua sobre seus
lábios. — Fale para mim, — pedi. Meus medos e cautela já
não existiam. No lugar deles havia necessidade e desejo.
Ela me olhou com um olhar cheio de cobiça.
— É como voar, — ela ofegou e arqueou as costas.
— Meu Deus, — gemeu, empurrando minha mão ainda mais.
— É como se eu estivesse caindo.
Assisti sua queda. Ela tremeu em meus braços e se
contraiu ao redor da minha mão. Fiz questão de esfregar meu
polegar nela, puxando-a lentamente para baixo, mas com a
certeza de que consumi tudo que pude.
A pele do seu peito brilhava de suor e eu me inclinei,
provando-o.
— Uhmm, — ela gemeu, parecendo satisfeita e, por
mais que eu tivesse acabado de levá-la ao orgasmo, tudo o
que conseguia pensar era em minha boca entre suas pernas,
meu pau em minha mão, lhe dando prazer novamente.
Essa garota.
Ela era o meu fim.
Era meu divisor de águas.
Eu não sabia disso na época. Mas agora, eu tinha
certeza.
LIV
Minhas mãos tremiam um pouco enquanto eu
passava gloss em meus lábios. Estava trinta minutos
adiantada. Sentei na cama e coloquei um par de botas
marrons. Não fazia ideia de onde Adam me levaria esta noite.
Só sabia que teríamos um encontro e eu estava super
animada. Era meu primeiro encontro de verdade e estava
muito nervosa, mas se fosse como a nossa noite na praia, eu
estava animada.
Naquela noite as coisas tinham mudado. Nosso
relacionamento evoluiu, apesar das tentativas de Adam em
terminar comigo. Ele se abriu, confessou seus maiores medos
e eu soube, desde a noite em seu apartamento quando ele me
contou sobre sua mãe, o porquê que ele se escondia. Ele não
queria se machucar. Não queria perder mais ninguém. Você
não podia perder as pessoas que amava se não abrisse o seu
coração para elas.
Parei na frente do espelho em meu quarto e puxei a
bainha do meu vestido jeans. Era curto, mas o objetivo era
esse, certo? Eu queria ficar sexy para Adam, especialmente
depois da nossa noite nas dunas. Harry parou ao meu lado, de
frente para o espelho.
— Como eu estou, amigão? — Arqueei minhas
sobrancelhas para ele no espelho.
Uma de suas orelhas se ergueu e ele soltou um
resmungo.
— Entenderei isso como um elogio, — murmurei mais
para mim mesma do que para o cachorro.
Desde a noite nas dunas que tenho me preocupado
com a possibilidade de Adam terminar comigo. Naquele dia,
fiquei tão feliz em vê-lo bem que me atirei em seus braços,
aliviada. E ele me arrasou, me arrasou com suas palavras. Eu
sabia que estava assustado; eu também estava, mas queria
correr o risco. Só podia torcer para que Adam também
quisesse.
As dunas... Meu Deus, nunca me senti daquele jeito.
Claro que eu já tinha me tocado, mas ter alguém que você
ama lhe tocando, era algo completamente diferente.
Eu andava de um lado para o outro do quarto,
nervosa. Parando no meio do caminho, me dei conta dos meus
pensamentos. Ai, meu Deus, eu amava Adam? Ai, meu Deus,
sim. Eu o amava e agora, tudo o que conseguia pensar era
nele me tocando de novo.
Ou eu tocando nele. Sim, gostei dessa ideia também.
E tinha que admitir que eu estava bonita hoje. Uma melhora
considerável em relação aos moletons e leggings que usava
quando não estava com o uniforme da escola.
Passei os últimos dois dias matando as aulas de
etiqueta e evitando Mel. Não estava pronta para o confronto
inevitável que eu sabia que teria com ela. O que ela fez foi
jogo sujo, eu nunca a teria dedurado daquele jeito. Uma parte
de mim não entendia o porquê de Mel ter feito aquilo. Tudo o
que sabia era que estava mais do que agradecida por
Georgina e Sebastian não estarem em casa neste momento.
Se estivessem, com certeza teríamos uma briga, porque vou
sair com Adam Nova aconteça o que acontecer.
Arrumei meu cabelo em uma grossa trança lateral.
Dei uma mexida nela e verifiquei se minha máscara de cílios
não estava borrada. Não era muito boa em fazer maquiagem
ou me arrumar, mas queria muito estar bonita para o meu
primeiro encontro com Adam.
O combinado era que ele me buscasse a qualquer
minuto, e me perguntei onde iríamos e o que faríamos, já que
ele disse que queria fazer surpresa. Eu não sabia de nada
além de que ele viria me buscar. Ele tinha insistido nisso.
A campainha tocou e conferi meus dentes no espelho
para ter certeza de que não estavam manchados de gloss.
Peguei minha bolsa e desci a escada com as pernas bambas,
Harry em meu encalço. Eu estava nervosa para caramba.
Não sei por quê. Já tinha saído com Adam várias
vezes, mas dessa vez parecia algo diferente. Grandioso.
Cambaleei em minhas botas ao atender a porta. O ar
úmido me atingiu quando a abri, mas não foi o calor que tirou
meu fôlego. Lá estava ele. O garoto que estrelava em todas as
minhas fantasias. Só que ele era bem mais bonito do que nos
meus sonhos.
Ele claramente penteou o cabelo escuro e usou gel
para colocá-lo para trás e afastá-lo do rosto, assim eu poderia
enxergar seus lindos olhos azuis. Ele me olhou da cabeça aos
pés enquanto meus olhos o devoravam, desde sua jaqueta de
couro preta até a camiseta branca que usava por baixo e sua
calça jeans escura que ele vestia como se fosse uma segunda
pele. Fiquei imaginando como ele havia entrado nela ao
mesmo tempo em que pensava sobre como eu entraria nela.
Minhas bochechas coraram com o pensamento enquanto eu
encarava as imitações das botas que ele sempre usava.
— Meu Deus do céu. Você está tentando me matar,
— ele disse como se tivesse lido a minha mente.
Olhei para cima e seus olhos gentis fitavam minhas
pernas. Era como se eles fossem me tocar. Arrepios
irromperam em minhas coxas. Eu sorri.
— Não, gosto muito de você para matá-lo.
— Graças a Deus, — ele disse, dando um passo à
frente e abraçando minha cintura. — Senão eu não poderia
fazer isto, — Adam beijou minha testa, em seguida, o meu
nariz, até finalmente chegar aos meus lábios.
Abri minha boca, ansiosa para sentir seu gosto.
Parecia ter passado dias quando na realidade, eu o tinha
beijado na noite anterior em nosso cantinho sob as estrelas.
Ele interrompeu nosso beijo, sorrindo. Ver Adam sorrir
daquele jeito era como o Paraíso na Terra. Ele mal sorria
quando nos conhecemos. E, nossa, ele tinha um perfume
delicioso.
— Você está cheiroso, — murmurei em sua jaqueta.
Senti o perfume do couro e fumaça e alguma colônia
maravilhosa na qual queria me esbaldar. Puxei a gola de sua
jaqueta. — Você se arrumou para mim.
Adam mordeu o lábio e seus olhos flertavam comigo.
Segurando minha mão, ele me puxou pela porta, degraus
abaixo, para onde um carro velho estava estacionado.
— Onde conseguiu um carro?
Adam não dirigia e seu pai também não. Eles usavam
o transporte público para todos os lugares ou então iam
andando.
— Peguei emprestado com Raven. — Ele deu
batidinhas no teto do carro e abriu a porta para mim. Entrei,
me sentindo nas alturas. Eu tinha um cara tatuado, sexy, que
abria as portas dos carros para mim e usava perfume. Ele
tinha pegado o carro emprestado, tinha penteado o cabelo e
passado gel. Ele gostava de mim. Muito.
Meu estômago deu uma cambalhota quando ele
fechou a porta do carro e deu a volta. Brinquei com a bainha
do meu vestido, nervosa, enquanto ele entrava e dava partida
no carro.
Adam me olhou antes de se aproximar lentamente
para que ficássemos cara a cara. Pensei que fosse me beijar
até eu perder os sentidos. Ao invés disso, ele recuou ao
passar o cinto de segurança pelo meu corpo e prendê-lo no
lugar.
— Minha carga preciosa, — ele murmurou.
Meu coração se transformou em uma poça grande e
derretida naquele banco.
— Para onde estamos indo? — Perguntei quando
saímos da entrada de carros. Eu estava desorientada. Muito
empolgada.
— Já falei. É surpresa.
Dei uma olhada ao redor do carro e notei que era
bem cuidado e limpo até demais.
— Raven deve amar muito você para deixá-lo pegar o
carro dela.
Ele deu de ombros.
— Somos amigos quase a minha vida inteira.
— E Boone?
Seu corpo ficou tenso à menção do nome dele e me
senti uma boba por tê-lo mencionado. Mas tinha escapado.Afinal, eles estavam juntos naquela noite na campina. Na
verdade, foi a primeira vez que nos conhecemos oficialmente.
— Boone não é um amigo. Ele era mais como um
conhecido. E estará morto quando eu finalmente o encontrar
de novo.
Eu me virei no banco e peguei a mão que estava em
seu joelho e a segurei.
— Não quero que você faça nada com ele. Você vai
arranjar problema. Deixe a polícia cuidar disso. Tenho certeza
que o xerife Rothchild está atento a isso.
Adam bufou e deu um olhar raivoso em minha direção
antes de voltar a olhar para a estrada.
— É isso o que pensa, Liv? Sério?
Eu não entendi. Era dever da polícia nos proteger.
Por que ele pensaria o contrário?
— Não entendi.
Paramos em um estacionamento escuro, Adam
retirou o cinto e se virou para mim. Meu queixo estava
aconchegado no calor de sua palma. Ele deslizou o polegar
sobre meu lábio.
— Você é um doce, baby. E inocente. Inocente
demais.
Afastei o meu queixo de sua mão. Ele fez aquilo
parecer algo ruim; minha doçura.
— O que isso quer dizer, Adam?
— Nada, — ele disse com rispidez, saindo do carro.
Ele deu a volta e abriu a porta para me ajudar a sair.
Eu me apoiei contra a porta fechada, esperando respostas
mesmo que elas custassem o nosso primeiro encontro.
— O que significa? Que sou muito inocente...
Ele se inclinou, beijando a ponta do meu nariz como
costumava fazer.
— Nada. Sinto muito. Você é perfeita do jeito que é.
Eu não mudaria um fio de cabelo da sua cabeça. — Seus
olhos ficaram tristes, por isso não questionei. — Vamos nos
divertir nesta noite, ok? — Ele sussurrou as palavras em meus
lábios. Eu estava arrepiada quando assenti.
Ele deu um passo para trás com um sorriso, mas seu
olhar carregava um cansaço que me preocupava. Abrindo a
porta traseira do carro, ele arqueou as sobrancelhas e esticou
o braço, tirando uma linda cesta de piquenique do banco.
— Vamos fazer um piquenique? — Perguntei
enquanto ele segurava minha mão e me levava na direção do
prédio de tijolos com um domo circular.
— Sim. Um piquenique sob as estrelas.
Adam soltou minha mão, pegou as chaves do bolso e
começou a abrir a porta do edifício.
— Como vamos fazer um piquenique sob as estrelas
se estamos entrando?
Seus olhos estavam mais claros agora, mais calmos.
— Você vai ver.
Foi aí que vi o letreiro do Planetário de Madison.
— Meu Deus! — Segurei sua mão para que parasse
de abrir a porta. — Não podemos entrar aí. Não está aberto,
Adam!
Ele terminou de destrancar a porta e segurou o
chaveiro no alto, balançando-o.
— Mas eu tenho a chave, — ele disse, com um
sorriso brincalhão.
Fiquei com medo de termos problemas.
— Como que você tem a chave?
Ele abriu a porta e me conduziu para dentro com uma
de suas mãos em minhas costas e a outra carregando a cesta
branca.
— Sabe, é uma coisa meio louca. Às vezes, quando
você trabalha em algum lugar, eles lhe dão uma chave. Assim
você pode entrar e sair.
Parei em uma recepção enorme com pisos de
mármore cintilantes, um balcão de atendimento ao cliente e
um planeta gigante na parede que parecia ser Saturno.
Eu estava maravilhada.
— Você trabalha aqui?
Olhei ao redor, tentando imaginá-lo trabalhando neste
lugar bacana mas totalmente sofisticado. De repente, senti
como se não o conhecesse.
— Sim, desde os quinze anos. Comecei varrendo o
chão e essas coisas. Agora comando as apresentações
infantis pela manhã antes de ir para a escola.
Ele comandava as apresentações infantis? Eu nem
achava que Adam tinha um emprego. Pensava que ele fosse
para a escola e cuidasse do pai.
— Apresentações infantis? — Olhei para ele, todo
relaxado, a cesta pendurada na mão.
— Sim, faço apresentações para grupos escolares
pelas manhãs. Sou o que eles chamam de Ator do Show
Estelar.
Ele se mexia de um pé para o outro e olhava ao redor
do lugar como se o que ele havia me dito não tivesse
chacoalhado meu mundo. Como se não fosse a coisa mais
louca, inesperada e incrível que ele já tinha me contado sobre
si mesmo.
— Você trabalha aqui? E ensina às crianças sobre as
estrelas? — Perguntei, espantada.
Ele me olhou como se eu fosse maluca.
— Sim?
Sinceramente, não conseguia acreditar. O meu
namorado tatuado, fumante, mal-humorado, que não era de
muitas palavras, trabalhava em um planetário. Ensinando às
crianças sobre as estrelas que ele tanto amava.
Eu estava chocada. E se por um segundo pensei que
não podia adorá-lo ainda mais, estava errada. Completamente.
Errada.
Ainda assim, me perguntei se deveríamos estar aqui
quando o lugar estava fechado. Jamais ousaria prejudicar o
emprego de Adam, nem se fosse por um encontro super legal.
Olhei o grande ambiente novamente e fui até o mural
de Saturno.
— Deveríamos estar aqui?
Adam segurou minha mão.
— Está tudo bem, Liv. Eu prometo.
Ele me levou por um corredor que parecia não ter fim
antes de entrarmos em uma sala de cúpula. Olhei ao redor,
impressionada com o tamanho e escuridão.
Ele colocou nossa cesta de piquenique no chão, no
meio da sala. Era como se milhares de cadeiras nos
rodeassem em um anfiteatro. Abrindo a cesta, ele sorriu para
mim e tirou um cobertor, abrindo-o no chão.
— Sente-se, — ele indicou o cobertor.
— Nunca estive em um planetário, — falei com
animação.
— Sério? — Ele parecia surpreso.
Assenti ao sentar sobre o cobertor, verificando se
meu vestido cobria minha bunda.
Adam levantou o dedo.
— Já volto.
Ele me deixou na sala escura por alguns minutos.
Queria dar uma espiada na cesta, mas deixei para lá.
O domo que ficava acima da minha cabeça se
iluminou em um céu repleto de estrelas e por pouco não perdi
o fôlego. Eu não tinha ideia do quão real seria. De como seria
de perto. Era quase melhor do que minha campina sob as
estrelas.
Adam retornou e o espetáculo começou. As estrelas
se moviam algumas vezes, parecendo vir em nossa direção.
Outras vezes, elas pareciam se afastar. Uma coisa
permaneceu a mesma: eu estava encantada. Adam apontou
para o céu, sua voz grave me inundando enquanto ele contava
histórias, lendas e mitos sobre as estrelas.
Às vezes eu o observava, deslumbrada. Sua paixão,
seu amor por astronomia era maior do que eu pensava. Ele
era brilhante, surpreendente, e eu achava que nunca
conheceria outro homem na vida que chegasse aos pés de
Adam Nova. Ele era incrível e eu me surpreendia com o fato
de ele ter se escondido todo esse tempo.
Em algum momento no meio de sua apresentação,
ele pegou um hambúrguer de fast-food na cesta de vime e o
entregou a mim. Destampou uma garrafa de refrigerante antiga
de vidro e me deu. Isso me fez lembrar dos bilhetes na garrafa
e sorri feito boba.
Comi e bebi meu refrigerante enquanto milhares de
estrelas dançavam sobre mim ao som da voz de Adam. Foi o
encontro mais perfeito de todos os tempos.
E ficou ainda melhor quando Adam terminou a
apresentação dizendo:
— Até a próxima, quando eu a vir sob as estrelas.
Soltei um riso no meio de um gole de Coca-Cola e o
gás queimou meu nariz.
— Ai, meu Deus. Você diz isso todas as vezes?
— Todas as vezes, — ele sorriu para mim.
Fingi um olhar sério.
— Veja só, pensava que fosse só para mim.
Ele diminuiu o espaço entre nós e levou seus lábios
aos meus.
— Ultimamente parece que tudo o que faço é só para
você.
— É? — Sussurrei de volta, lisonjeada.
— Uhm, — ele gemeu em minha boca, me provando.
Empurrou as embalagens e garrafas vazias para longe e se
arrastou sobre mim, e enquanto isso não deixou de me beijar.
Não foram como os beijos na chuva. Esses eram metódicos,
apimentados com uma doçura que parecia ser a antítese
habitual de Adam. Ainda assim, eles não me surpreenderam.
Aprendi a não esperar nada de Adam porque era muito
provável que ele provaria que eu estava errada. Algumas
vezes, das melhores maneiras possíveis.
Mas eu queria os beijos apaixonados. Enlouquecidos.
Como aqueles na noite de chuva. Então, pressionei meu peito
contra ele e passei os dedos sobre seu cabelo. Funcionou. Ele
grunhiu e me beijou com força, como eu queria.
De repente, éramos duas estrelas colidindo.
Eletrizantes. Em chamas. Mas como tudo o que Adam fazia,
elefoi devagar. Lambeu o céu da minha boca, mordeu meu
lábio inferior e chupou a sensação de fisgada. Durante todo
esse tempo, suas mãos percorreram a extensão de minhas
coxas até seus dedos tocarem as laterais da minha calcinha.
Ele afastou o cabelo da minha testa e se inclinou para me
olhar nos olhos.
— Tudo bem? — Ele perguntou.
Não houve um segundo em que questionei aquilo que
ele estava perguntando.
Assenti e reivindiquei seus lábios de volta, a febre
retornando e queimando dentro de mim como um fogo
incontrolável. As articulações de seus dedos passaram por
minha calcinha, bem no ápice de minhas coxas, e eu gemi.
— Gosto disso, — ele murmurou contra minha boca.
— Amo quando faz esses ruídos, — suas palavras pareciam
entorpecidas, como se ele tivesse bebido demais; mas não,
ele estava embriagado de mim.
Minha pele formigava, minhas mãos tremiam. O ponto
entre as minhas pernas doía. Se ele estava embriagado de
mim, então eu estava chapada dele. Eu o desejava. Suas
mãos empurraram meu vestido para cima até eu sentir o ar frio
em minhas coxas. Enquanto ele tirava minha calcinha, eu
levantei os quadris, me sentindo mais poderosa do que nunca.
Tinha a sensação de que flutuaria em direção ao céu estrelado
acima de nós, mas a intensidade de seu olhar me manteve
presa ao chão. Eu desejava. Ansiava.
Precisava que ele me tocasse. Queria senti-lo.
Deslizando minha palma sobre seu peito, continuei com meus
olhos colados aos dele. Nunca havia feito isso; tocado um
garoto. Mas com Adam, isso não importava. Eu sabia que não
tinha uma forma errada de fazer aquilo. Então prossegui,
passando por seu abdômen definido, pela maciez logo abaixo.
Devagar, bem devagar porque sabia que era assim que ele
gostaria. Apalpei sua ereção; primeiro com suavidade. Ele
soltou um suspiro pesado que me fez contrair minhas coxas.
Depois, como firmeza, até que estivesse segurando toda o seu
comprimento. Até que ele estivesse gemendo e eu movesse
minha mão para cima e para baixo, segurando-o sobre sua
calça jeans e ele estivesse suando e xingando.
— Porra, — Adam grunhiu, sua testa molhada
encostada na minha. — Caramba, eu quero você. — As
palavras saíram rasgando sua garganta.
— Então me tome, — respondi, me sentindo forte,
convincente, poderosa. Eu não estava apenas chapada,
estava voando. Algumas garotas perdiam a virgindade na
parte traseira de uma caminhonete, em uma estrada
empoeirada. Outras perdiam em pequenas camas de solteiro
na casa de seus pais. Mas não, eu perderia a minha sob as
estrelas, com meu garoto favorito do mundo, no encontro mais
romântico de todos. Eu estava pronta.
Fechando os olhos, ele balançou a cabeça, sua testa
colada na minha.
— Não. Sua primeira vez deveria ser especial,
deveria…
— Deveria ser com você, — eu o interrompi. —
Deveria ser aqui com você. Porque a minha primeira vez
deveria ser exatamente como eu quero. E eu quero você. —
Beijei um de seus olhos fechados. — Aqui. — Beijei o outro. —
Agora.
Ele abriu lentamente os olhos. Afastou sua cabeça da
minha, a pequena ruga no meio em sua testa estava funda de
preocupação.
— Tem certeza?
— Absolutamente. — Movi minha mão pelo seu
comprimento de novo antes de apertá-lo. — Positivamente. —
Minhas mãos estavam sobre ele. Meu vestido estava na
cintura. O que ele achava que estava acontecendo aqui?
— Meu Deus, — ele resmungou. — Eu sabia que
você me mataria hoje quando a vi neste vestido.
— Não é um jeito ruim de morrer, — raciocinei.
E ele sorriu. Isso fez meu coração palpitar. Fez
minhas pernas e meu corpo todo virarem geleia.
Ele beijou a ponta do meu nariz e comecei a entender
que aquela era uma coisa nossa. Gostava de ter algo só nosso
com Adam.
Ele se acomodou entre minhas pernas com um olhar
de determinação no rosto. E me beijou. Devagar. Com doçura.
Cuidadosamente. Até estar me tocando. Me acariciando.
Puxando a parte de cima do meu vestido, ele afagou meus
seios com beijos leves e delicados que faziam minha pele
irromper em arrepios. Ele sussurrou no meio do meu peito que
eu era linda.
Suas mãos percorreram meu busto e a região sob as
alças do sutiã, puxando-as para os lados enquanto empurrava
meu vestido mais para cima, me expondo.
Adam colocou um mamilo na boca e eu tremi
embaixo dele, sua mão subindo pela minha coxa em direção à
minha pelve.
— Ai, meu Deus, — suspirei enquanto ele me
chupava e acariciava, meu coração leve.
Ele beijou todo o caminho até meu seio e girou a
ponta do meu mamilo com a língua, enviando uma onda de
eletricidade por todo meu corpo.
— Por favor, — implorei, sentindo que não era
suficiente. Sentindo que queria tudo. Ele e eu, juntos, quando
eu gozasse dessa vez.
— Shhh, — Adam me acalmou em meio a suas
mordidas que me levavam à loucura. — Preciso deixá-la
pronta. Não quero machucar você. Nunca.
Seus dedos entraram em mim enquanto beijava cada
parte disponível do meu corpo que ele conseguia alcançar com
a boca. No momento que se afastou e pegou a carteira do
bolso, eu estava suada, ofegante e necessitada.
— O que você está fazendo? — Exigi saber,
querendo-o de volta entre minhas pernas, me preenchendo.
Ele tirou um preservativo da carteira e abriu a
embalagem com o dente.
— Cuidando de você, — respondeu, deslizando a
mão entre nós.
Em seguida, voltou a me tocar. Dois dedos
deslizaram para dentro de mim enquanto seu polegar
massageava meu clitóris. Era gostoso demais. Parecia a
combinação perfeita entre dor e prazer. Ele mordeu o lóbulo da
minha orelha e sussurrou:
— Goze para mim, Liv.
Não demorou muito para que acontecesse. Foi antes
de eu abrir os olhos. As estrelas poderiam estar tremeluzindo
acima de mim, mas eu estava desmoronando. Com força e
rapidez. Antes que eu atingisse o chão, ele estava lá, bem na
minha entrada, empurrando, seu polegar ainda em meu
clitóris, seus lábios nos meus.
Bastou uma investida para que ele me penetrasse, eu
continuava desabando, a sensação deixando a queda ainda
mais próxima.
Ele estava no limite, sua respiração entrecortada, e
completamente imóvel quando me beijou. Adam me beijou
como se eu fosse a única garota que já tivesse beijado. Como
se eu fosse a primeira e a última. Como se eu o possuísse.
Quando afastou sua boca e encostou a bochecha
contra a minha, esperei que fosse me prender ao chão e fazer
suas obscenidades comigo. Eu já tinha visto vídeos. Ouvi
rumores. Sabia como os garotos transavam.
Mas eu deveria ter sido mais esperta.
Porque se tratava de Adam.
— Tudo bem? — Ele sussurrou.
Uma lágrima escorreu sobre o meu rosto antes
mesmo que eu a sentisse.
— Estou mais do que bem, — suspirei, com medo de
que esse garoto tão doce tivesse que lidar com meus soluços
descontrolados na noite mais importante da minha vida. —
Estou ótima.
Sua bochecha deslizou sobre a minha até nossos
olhares se cruzarem. Sua mão acariciou minha bochecha e
afastou a lágrima indesejada com o polegar antes de começar
a se mexer dentro de mim. Ele manteve um ritmo lento e eu
observei meu doce e carinhoso Adam até ele se perder. Até
ele investir contra mim uma última vez com um grunhido de
tirar o fôlego.
A primeira vez da maioria das garotas era uma
confusão de mãos, dentes e dor. Mas a minha não. Não, a
minha foi uma noite na qual eu lembraria pelo resto da minha
vida como a experiência mais romântica de todas. Meu
namorado tatuado tinha me dado as estrelas. Isso me fez
querer lhe dar o universo.
LIV
— Feliz aniversário! — Ouvi um grito atrás de mim.
Olhei ao redor e encontrei Braden e Mel. Os dois estavam
sorrindo, então também coloquei um sorriso no rosto.
Eu tinha feito um ótimo trabalho evitando Mel
ultimamente. Ainda estava muito irritada com o fato de ela ter
me entregado só Deus sabe para quem. Poderia ter sido
minha madrasta. Poderia ter sido Sebastian. Tudo o que eu
sabia era que o xerife Rothchild sabia onde me encontrar.
Todas as vezes que pensei em contar aquilo para ela, eu me
lembrava dela dando com a língua nos dentes como se
tivéssemos seis e não dezesseis anos — dezessete agora — e
ficava com vontade de gritar.
— Valeu, — eu dissepara Mel sem um pingo de
gratidão, mas com muita mesquinharia.
Braden caminhou em minha direção e me puxou para
um abraço.
— Feliz aniversário, linda. Tem algum plano para
hoje?
Eu tinha. Tinha o mesmo plano de todas as noites.
Meu plano era ir para casa, esperar todos irem dormir e sair
escondida para ver meu namorado.
Adam. Meu Deus. Não conseguia pensar nele sem
ficar com aquele olhar todo apaixonado. Antes ele já me
enlouquecia, mas agora que fizemos amor, algo mudou. Meus
sentimentos ficaram mais intensos. Sentia uma conexão com
ele que parecia mais forte do que antes e bem mais madura.
Talvez mais madura do que eu esperava, porque ele me fazia
querer fazer coisas loucas, como esquecer a escola, essas
pessoas falsas, essa ilha idiota e metida, e fugir com ele.
Graças a Deus Adam era bem mais responsável e
racional do que eu.
— Obrigada, Braden. — Recuei de seu abraço e
coloquei um pouco de distância entre nós. Não queria passar a
impressão errada. Porque apesar de seus flertes e investidas,
essa porta estava firmemente fechada. Estava trancada,
droga. Mesmo se Adam e eu não estivéssemos juntos, Braden
e eu jamais teríamos chance.
Comecei a acreditar que ele talvez fosse um cara
bacana, mas não fazia o meu tipo. No entanto, ele era
paciente e sempre foi legal comigo quando eu o dispensei. Ele
era fácil de lidar; muito diferente de Sebastian. Ele era um
playboy, mas eu não esperava ter problemas se nunca o
namorasse.
— Não, sem planos. Apenas um jantar com Sebastian
e Georgina, e depois, cama. — Caramba, eu estava ficando
boa em mentir. Não sabia se ficava orgulhosa ou
envergonhada.
Braden puxou o lábio para dentro da boca e o mordeu
antes de dizer:
— Ou você poderia sair comigo. Prometo que vai ser
divertido.
Ah! Aposto que sim. Aquela mordida no lábio dizia
tudo.
— Não, obrigada. Estou cansada hoje e preciso lavar
meu cabelo, — devolvi de brincadeira.
Ele bateu no peito com a mão, agarrando a camiseta
sobre o coração.
— Droga, Liv, você sabe como machucar um cara. —
Ele se virou para Mel. — Ela acabou de usar a velha desculpa
sobre ter que lavar o cabelo?
Mel deu risada.
— Sim.
— Foi o que pensei. Vejo que não há esperança aqui.
Tenham uma boa noite, meninas. — Ele nos saudou de um
jeito zombeteiro e nos deixou sozinhas no corredor.
Eu não sabia o que dizer. Foi estranho para caramba,
eu não estava preparada para uma briga e ela parecia querer
dizer algo, qualquer coisa na verdade.
Puxei minha mochila sobre os ombros e segui em
direção à saída da escola. Não tinha andado nem três metros
quando ela disse:
— Por que você está zangada comigo?
— Não estou zangada, — menti, sem olhar para trás.
Continuei andando e não levou muito tempo até eu escutar
seus passos bem atrás de mim.
— Está sim.
Tentei ignorá-la e continuar andando, mas Mel não
desistiu e finalmente segurou meu braço para me fazer parar
no pátio da escola.
— O que foi? — Ela perguntou, como se não
soubesse.
Eu estava de saco cheio das palhaçadas dela e, de
repente, fiquei ansiosa por aquele confronto que estive
evitando há dias.
— Você me entregou. Contei um segredo para você,
Mel. Algo que não falei para ninguém e você contou.
Ela tirou a mão do meu braço e pude vê-la engolir em
seco. Deu um passo para trás e encarou o chão.
Foi o que pensei. Foi ela mesmo e agora não tinha
volta. Ela não conseguia nem se defender. Isso só me irritou
mais.
Me virei e comecei a andar para casa. Era um dos
raros dias em que não tinha que fazer nada depois da escola e
era meu aniversário. Eu não deveria ter que lidar com essa
merda.
Os passos atrás de mim eram um sinal de que Mel
estava correndo em minha direção.
— Espere, Liv. Desculpe. Fiquei preocupada com
você. — Ela me alcançou, ofegante. — Não pode ficar
chateada por eu ter me preocupado.
Balancei a cabeça.
— Não, estou chateada comigo mesma. Pensei que
você fosse a única pessoa em quem eu pudesse confiar.
Estava errada. Mas não cometerei o mesmo erro de novo.
Continuei andando mesmo quando ela parou.
— Qual é, Liv. Fala sério! — Ela gritou atrás de mim,
mas foda-se. Eu estava cansada de pessoas assim. Não
precisava de mais negatividade na minha vida do que eu já
tinha. E havia muita naquela casa.
Mas no fundo do meu coração eu sabia que seria por
pouco tempo. Em menos de um ano eu iria para a faculdade.
Georgina e este lugar não me controlariam. E assim que eu
tivesse o dinheiro que meu pai me deixou, não precisaria mais
de ajuda. Agradecia a Deus todos os dias pelo bom-senso do
meu pai em ter deixado o dinheiro para mim e não para
Georgina, porque estava claro que aquela mulher casou com
ele por dinheiro. Eu odiava isso. Odiava pensar que meu pai
tinha sido enganado por ela. Ele a amava.
Entrei em casa e dei de cara com um animado Harry.
Apostamos corrida ao subir a escada, larguei a mochila no
chão do meu quarto e peguei os livros para fazer o dever de
casa. Fiquei concentrada naquilo por uma hora quando
Georgina me enviou uma mensagem para dizer que o jantar
estava pronto.
Quase revirei os olhos diante de sua frieza. Era meu
aniversário, droga. Pude sentir o cheiro de frango cozido
enquanto descia os degraus, decepcionada. Meu pai sempre
me levava para comer comida mexicana no meu aniversário e
Georgina sabia disso. Não fazíamos mais isso desde que ele
morreu. Não fazíamos mais um monte de coisa desde a morte
dele.
A mesa estava posta. Os utensílios de porcelana fina
eram visíveis e os guardanapos rosa-claros dispostos ao lado
dos pratos. Sorri porque meu pai detestava aqueles
guardanapos. Ele não gostava muito de nada rosa ou com
estampa floral.
Georgina sorriu por trás de uma taça de vinho na
ponta da mesa e eu me sentei na cadeira à direita.
— Feliz aniversário, Princesa.
Princesa. Ela costumava me chamar assim antes do
meu pai morrer. Quando ela ainda estava fingindo que gostava
e se preocupava comigo. Às vezes eu me perguntava se era
tudo uma encenação ou se a morte do meu pai fez com que
ela mudasse. De qualquer forma, agora, era uma droga.
— Obrigada.
A cozinheira trouxe a refeição: frango assado e
salada, e eu sabia que não teria bolo. Meu Deus, que saudade
eu sentia da minha amada comida mexicana.
Estava na metade de um pedaço de frango quando
Sebastian finalmente decidiu se juntar a nós. Meu ânimo
despencou quando ele se sentou. Quase terminamos a
refeição sem ele.
— Sebastian, que legal da sua parte juntar-se a nós.
Não teve treino de futebol hoje?
Até eu conseguia ver que o garoto era puro suor.
Georgina estava ocupada demais bebendo seu vinho e
vivendo dentro do seu próprio mundinho. Quase me senti mal
por ele naquele momento, mas então lembrei o babaca que ele
era comigo.
— Acabei de sair do treino. — Um prato de comida foi
colocado na sua frente e ele o devorou em tempo recorde.
Colocando a última garfada de comida na boca, ele me olhou
rápido do outro lado da mesa antes de baixar o olhar. — Feliz
aniversário, Livingston.
Foi esquisito, para dizer o mínimo. Não tínhamos o
costume de falar coisas legais para o outro. Antes do meu pai
falecer nos tratávamos com indiferença e, quando ele
começou a ficar sinistro, eu o evitei como uma praga.
— Valeu, Seb, — murmurei, colocando o garfo em
meu prato vazio, desejando que esse jantar terminasse e eu
pudesse me esconder no quarto até a hora de encontrar Adam
na campina.
— Então, tenho pensado sobre o baile.
Ah, merda, eu não gostava quando Georgina pensava
sobre alguma coisa. Primeiro, as aulas, depois um vestido
louco e extravagante, e então, Braden. Sem contar o que ela ia
propor agora.
Mexi no guardanapo em meu colo.
— Sim?
— Precisamos de um tema. Faltam só duas semanas
agora. Eu ia usar rosa-claro. Mas estou curiosa para saber se
você gostaria de um tema especial para o baile?
— Estrelas, — respondi antes que eu mesma
percebesse o que estava dizendo.
Sebastian ergueu a cabeça depressa e seu olhar
encontrou o meu com uma intensidade que fez meus ossos
tremerem.
— Estrelas! Que lindo. É uma ideia brilhante. Tão
romântica, — Georgina exclamou, tomando um grandegole do
seu vinho.
Por mais que eu estivesse olhando para qualquer
coisa menos Sebastian, pude sentir seus olhos sobre mim. Me
queimando com seu olhar raivoso.
Dei um sorriso genuíno para Georgina. Era óbvio que
ela achava uma boa ideia porque dificilmente me elogiava.
Apesar de abominá-la às vezes, eu ainda ansiava por elogios
como qualquer outra jovem.
— Às estrelas! — Georgina brindou sozinha já que
Sebastian e eu não tínhamos taças de vinho. — Será lindo.
Mal posso esperar para vê-la naquele vestido. Ficará
encantadora.
Sorri de novo até me lembrar que ela não ficaria tão
feliz quando descobrisse que eu não levaria Braden. Mas
fiquei contente assim mesmo. Este jantar de aniversário foi
melhor do que eu imaginava.
— Posso me retirar? — Sebastian perguntou e senti
minhas sobrancelhas arquearem. Ele nunca pedia permissão.
Sempre se levantava e saía. Todos estavam sendo tão legais
hoje. Era estranho.
— Claro. Não pedi para a cozinheira preparar um bolo
ou sobremesa. — Ela concentrou sua atenção em meus seios.
— Achei que deveria cuidar do seu peso.
Meu corpo se contraiu. Eu me encolhi, tentando
esconder meus seios grandes. Ela me pegou de surpresa.
Desprevenida. Me bajulou antes de desferir o golpe. Eu queria
chorar.
Sebastian arrastou a cadeira com raiva. Jogou o
guardanapo no prato e praticamente correu para o quarto.
Pedi licença em voz baixa e fiz o mesmo antes que
eu chorasse na frente daquela megera. Normalmente eu me
controlava. Não deixava que ela afetasse minha auto-estima.
Eu sabia que era boa; que eu era bonita. Meu pai sempre fez
questão que eu soubesse disso.
Tinha passado da meia-noite quando desci os
degraus e saí de casa. Estava tarde e, desde que conheci
Adam, não estava passando muito tempo com meu cachorro,
por isso peguei a coleira e meu cobertor, e saímos juntos. O
tempo estava mudando. As noites estavam mais frias, por isso
vesti um casaco grosso por cima da camiseta e da legging
antes de sair.
Eu sorria ao atravessar a ponte. Estava longe, mas
conseguia ver Adam à distância. Isso... Isso era o que estava
esperando para o meu aniversário o dia todo. Sabia que ele
tinha me visto, porque ele parou e, de repente, estava
correndo pela campina, assim como Harry e eu.
Larguei a coleira de Harry e o cobertor azul no chão,
e pulei nos braços de Adam, desesperada por seus lábios. Ele
não me decepcionou. Me pegou no colo e envolvi minhas
pernas em sua cintura. Harry saltou sobre nós, empolgado por
ver Adam.
— Feliz aniversário, linda.
Respirei fundo, chocada.
— Como sabia?
Ele sorriu com um falso ar de timidez.
— Não sei. Pode ser que eu tenha dado uma olhada
nas suas redes sociais. Por falar nisso, seu Instagram é
patético.
Eu não usava muito o Instagram ou Facebook.
Apenas o mínimo possível e mal postava alguma coisa.
Gostava de viver o momento. Só Deus sabia quantos deles
ainda restavam.
Eu o abracei bem apertado.
— Obrigada pelos parabéns.
Adam recuou e olhou para mim.
— Foi um bom dia?
Eu me aconcheguei nele de novo.
— Agora é.
Adam estendeu o cobertor sem que eu me soltasse
dele. Foi estranho, engraçado e um entretenimento muito bom
vê-lo tentar esticar o cobertor enquanto eu me agarrava a ele
como um macaco.
Ele se sentou, comigo em seu colo, minhas pernas ao
seu redor e se apoiou sobre as mãos.
— Você vai me soltar?
— Nunca, — sussurrei. A febre estava de volta e ele
nem estava me tocando. Naquele momento, eu soube. Não
era febre. Era amor. Meu Deus, eu amava tanto esse garoto
que chegava a me queimar com isso.
— Tenho um presente para você.
Eu me inclinei em seu colo.
— Tem?
Ele sorriu para mim descaradamente. Misericórdia,
ele ficava tão gostoso quando fazia aquilo. Tão lindo que eu
queria transar com ele bem aqui nessa campina.
Ele me levantou do seu colo e me colocou sentada ao
seu lado, sem esforço. Uma brisa gelada atingiu minhas
orelhas, então puxei o capuz sobre a cabeça enquanto Adam
tirava uma caixinha do bolso da sua jaqueta de couro.
Não estava embrulhada. Era uma daquelas caixas
douradas de papel que vinham as jóias. Devo ter parecido
surpresa quando peguei a caixa da sua mão. Eu a olhei
fixamente, me sentindo nervosa de repente. Ninguém tinha me
dado um presente hoje. Ninguém me dava presentes de
aniversário desde a morte do meu pai.
Abrir aquela caixa era um momento significativo. Em
tempos normais, eu teria arrancado a tampa igual uma louca.
Mas eu lembrava como Adam segurou minha mão pela
primeira vez. Devagar, com cuidado, delicadamente. Então,
levantei a tampa, sem pressa, puxando o algodão branco que
cobria a parte de cima.
E lá, aninhado em meio ao branco, havia um anel
dourado. Eu o tirei da caixa, prendendo a respiração. Era uma
faixa fina aberta na frente. Em uma das extremidades havia
uma estrela e, na outra, uma lua. Eu o olhei, pensando em
como era perfeito. Era como se a estrela e a lua se
encontrassem, da mesma forma como Adam e eu nos
conhecemos na campina naquela noite. Adam Nova, a estrela,
e eu, sua Luna, a lua. Era mais que perfeito. Era delicado,
simples e eu o amei de imediato. Meus olhos ardiam de
emoção quando o coloquei em meu dedo. Não pude olhar para
ele. Fiquei com vergonha do quanto tinha amado. De como
aquela peça de ouro era importante para mim. E então, ele
elevou ainda mais o nível e me deixou impressionada.
— Era da minha mãe.
Virei a cabeça para ele.
— O quê? — Ofeguei, mal conseguindo falar. Não.
Ele não deveria me dar algo tão precioso. Eu não merecia.
Comecei a tirar o anel, mas ele segurou minha mão, me
interrompendo.
— Não. Ela gostaria que o tivesse. — Ele deitou
sobre o cobertor e me puxou junto dele, até que eu estivesse
encostada em seu peito. — Ela teria amado você e seu amor
pelas estrelas.
Não sabia o que dizer. Meu coração poderia ter
explodido no peito de tão imenso que estava. E a febre tinha
retornado. Tão forte. Tão quente. Não consegui me segurar.
Uma lágrima escorreu pelo canto do meu olho sobre a
camiseta dele que estava embaixo da minha cabeça.
— Acho que eu amo você, — sussurrei. Essa
sensação era isso, certo? O calor. Esse sentimento envolvente
que parecia controlar cada decisão, cada pensamento, cada
coisa em minha vida.
Seu corpo ficou rígido embaixo do meu antes de
erguer o braço que me abraçava para afastar o cabelo do meu
rosto.
— O que você disse?
Pigarreei, nervosa, com medo de ter levado as coisas
longe demais. Apavorada que isso o afastasse de mim. Mas
mais apavorada ainda que ele nunca soubesse, que nunca
entendesse o quanto eu me importava com ele. Então, falei de
novo, com mais convicção desta vez.
— Acho que amo você, Nova. — Eu estava olhando
para o céu. A lua estava grande, redonda e branca. Lua cheia.
E as palavras seguintes saíram com facilidade, porque eu
estava falando sério, muito sério. — Acho que eu o amo daqui
até aquela lua.
Ele me envolveu em seus braços com firmeza. Me
abraçou tão apertado que pude ouvir as batidas aceleradas do
seu coração. Sua respiração ficou mais rápida e ele me
apertou mais ainda.
Aqueles segundos em que não disse nada e só me
abraçou me deixaram com medo. Não sabia se tinha cometido
um grande erro ou se foi a melhor decisão da minha vida.
Me agarrei a ele, esperando e rezando para que não
fosse a última vez que eu fizesse aquilo, quando ele inclinou a
cabeça e encostou sua boca em meu ouvido.
— Só para deixar claro. Eu não acho que amo você,
Livvy. Eu tenho certeza. Tenho certeza que a amo. Soube que
amava você desde a primeira vez que a vi sob as estrelas. E
sei que vou continuar amando você daqui a cinquenta anos.
Droga, não amo você apenas daqui até aquela lua, baby. Amo
você daqui até Plutão, mesmo que leve dezenove anos para
chegar lá.
Eu pensei que fosse morrer. Era como se meu
coração tivesse congelado no peito. Não tinha ideia do que
dizer. Só queria repetir aquelas palavras na minha cabeça até
memorizá-las para sempre. Queria que ele as escrevesse e as
colocasse dentro de uma garrafa e as deixasse aqui para mim
todos os dias, para sempre.
Estava surpresa, abalada, e não sabia como lidar
comuma situação madura assim, então, disse a primeira coisa
que passou pela minha cabeça.
— Dezenove anos?
Senti seu peito tremer debaixo de mim com uma
risada.
— Sim. Mais ainda do que é necessário para chegar
à lua. — Ele me apertou.
Ai. Meu. Deus. Eu ia desmaiar. Estava surtando. Ele
me amava. Muito.
— Esse é o melhor aniversário de todos, — sussurrei
para ninguém em especial e o peito de Adam tremeu
novamente.
— Acho que será difícil superá-lo no ano que vem,
hein?
Ano que vem. Ele falava sobre estar comigo no
próximo ano. E ele me amava. Eu o amava e por uma fração
de segundos sob as estrelas, tudo estava perfeito.
Decidi que era o momento de soltar a bomba. Esperei
o máximo que pude e já que falávamos sobre amor, achei que
seria difícil para ele recusar.
— Já que você me ama e eu amo você, faz sentido
eu levar você ao baile de debutantes.
Ele deu uma risada abafada.
— Não acho que combino com bailes de debutantes,
Livvy.
— Mas você iria por mim, certo? — Fiz uma cara de
cachorro sem dono.
Ele revirou os olhos enquanto sorria.
— Talvez.
Ficamos lá deitados, nós dois, rodeados pela
escuridão, mas tudo parecia reluzir. Eventualmente, o sol
começou a surgir no céu, e Adam insistiu em me acompanhar
de volta para casa.
Ele me beijou no quarteirão anterior — Harry
caminhava ao nosso redor — e me olhou durante todo o
caminho até em casa. Eu só sabia disso porque olhei para trás
umas cinco mil vezes, para o desânimo de Harry. E lá estava
ele, me observando com meu cobertor azul esquecido debaixo
do braço. Eu o pegaria de volta outra hora, disse para mim
mesma, apaixonada demais para me importar. Ter seus olhos
sobre mim era a melhor coisa, depois de suas mãos.
Eram cinco e meia da manhã quando Harry e eu
finalmente passamos pela entrada de carros e chegamos à
porta. Mas hesitei, certa de que tinha escutado vozes,
segurando Harry pela coleira. Ainda estava escuro do lado de
fora, mas pude ver sombras na varanda. Puxei Harry para a
lateral da casa a fim de nos escondermos. Ajoelhando, rezei
para que ele ficasse quieto, abraçando-o e sussurrando
elogios.
Nesse meio tempo, tive a sensação de que estava em
um outro universo. Não pude acreditar. Georgina estava de
pijama e sua cara cheia de maquiagem. Também não acreditei
quando a vi beijando o xerife Rothchild. Em nossa varanda. Às
cinco e meia da manhã. Fiquei ajoelhada lá, paralisada. Nunca
a vi beijar ninguém além do meu pai. Não que fosse um
problema vê-la seguindo em frente. Mas por que ela estava
escondendo isso? Porque era óbvio que estava. As roupas do
xerife estavam amarrotadas. E ela estava usando um roupão
de seda por cima de só Deus sabe o quê. Talvez nada. Eles
não estavam apenas se beijando. Eles estavam dando uns
amassos, caramba.
Por fim, eles se despediram e o xerife andou alguns
quarteirões e entrou em um carro à paisana que imaginei ser
seu veículo pessoal. Espiei para ver se Georgina ficou olhando
ele ir embora como uma boba apaixonada. Depois de ter
certeza que ela tinha entrado, sentei perto de um arbusto com
Harry, com a sensação de que meu mundo tinha sido abalado.
Por que o xerife Rothchild e Georgina estavam se
escondendo? Por que não assumiam que estavam
namorando? Não conseguia pensar em uma única pessoa que
fosse se importar. Será que Sebastian sabia? Braden? Que
porra estava acontecendo?
ADAM
— Você está tão bonito, filho. — Havia lágrimas nos
olhos do meu pai. Tentei ignorar a leve ardência nos meus, me
olhando no espelho da cômoda. Quando meu pai ficava
emocionado, eu também ficava. Os Nova eram uma gente
sensível.
— Obrigado, pai. — Ajeitei a gravata em meu
pescoço, nervoso. Nunca pensei que veria o dia em que usaria
um terno. Para minha sorte, meu pai tinha um amigo que me
deixou pegar emprestado o de seu filho. Um par de sapatos
velhos que ficavam no armário do meu pai e apertava um
pouco meus pés, e estava pronto.
Não fiquei tão mal. O terno cinza de três peças
pareceu um pouco exagerado demais quando o vi pela
primeira vez, mas cavalo dado não se olhava os dentes. Eu o
vesti com a esperança de que não fosse muito escandaloso,
mas até que deu certo. Serviu como uma luva. Sabia que Liv
adoraria. Cortei o cabelo, fiz a barba, usei gel e coloquei o
perfume que eu sabia que a deixava louca.
Tinham passado apenas algumas semanas desde a
nossa noite no planetário, mas descobri que gostava de deixá-
la louca por mim sempre que eu podia. Acho que ela gostava
tanto quanto eu. Não tivemos muitas oportunidades de
ficarmos sozinhos e eu não podia levá-la escondida ao
planetário a hora que eu quisesse. Não queria arriscar meu
emprego, mas os poucos momentos que tínhamos a sós,
passávamos abraçados, minhas mãos em seu cabelo, meus
lábios sobre os dela. Não enjoávamos um do outro e parecia
que a cada dia eu a amava mais.
Aquela garota me fazia sonhar. Fazia tempo que parei
de pensar que não daríamos certo. O fato de que ela morava
em Saint Ashley e eu em Madison não importava. Não
importava se a sua família não aprovasse. Minha sonhadora
me fazia sonhar. Ser capaz de sonhar novamente me deixava
mais feliz do que havia me sentido há muito tempo. Ela até me
convenceu a ir a este baile. Mas quem eu estava enganando?
Preferia morrer do que permitir que alguém acompanhasse a
minha namorada.
Dei um abraço de despedida em meu pai e, com a
chave de Raven na mão, desci os degraus da entrada do
prédio onde tinha parado o carro. Eu estava nervoso por estar
prestes a conhecer a família de Liv, então fiquei do lado de
fora do edifício e fumei dois cigarros. Raven me daria uma
surra se eu fumasse em seu carro impecável.
O trajeto foi tão agonizante quanto eu pude imaginar,
mas quando estacionei na entrada e subi os degraus até a
porta, senti a empolgação que sempre sentia quando sabia
que ela estaria por perto.
Toquei a campainha e já precisava de outro cigarro.
Não houve resposta, então toquei mais uma vez, inquieto.
Por fim, a porta foi aberta alguns centímetros e lá
estava uma mulher mais velha com cabelo loiro, maquiagem e
vestida com perfeição.
— Posso ajudá-lo? — Ela perguntou com um sotaque
sulista.
Sorri e puxei o colarinho da minha camisa, nervoso.
Não tenho nada a perder.
— Meu nome é Adam. — Estendi minha mão pela
brecha da porta. — Estou aqui pela Livingston.
A porta se abriu mais e a mulher que eu imaginava
ser a madrasta de Liv, saiu para a varanda e fechou a porta
silenciosamente sem tirar os olhos de mim.
— Tenho certeza de que houve um erro, — ela disse.
Meu maxilar doía com o sorriso forçado em meus
lábios, mas o mantive lá quando respondi:
— Sou o acompanhante da Liv para o baile.
Só de ver o ultraje em seu rosto, entendi por quê Liv
não contou que eu viria. O vestido branco e justo que a mulher
usava ficava ridículo contra a vermelhidão de seu rosto e
pescoço. Seus olhos pareciam querer saltar das órbitas e eu
teria rido se não fosse a necessidade em ter que agradar essa
mulher para continuar vendo minha namorada.
A porta foi aberta de repente atrás da mulher. Ela
quase caiu para trás, mas conseguiu segurar o batente.
Liv passou pela porta e pela mulher para ficar ao meu
lado na varanda. Meu Deus, que visão. Ela estava com um
vestido de seda rosa-claro que deixava sua pele angelical. Era
sem alças e revelava a extensão de seus ombros e o topo de
seus seios. Fiquei com água na boca ao olhar para o busto
apertado. A parte de baixo se alargava como um grande sino.
Suas bochechas estavam rosadas e seu cabelo estava preso
em um emaranhado atrás da cabeça. Os cachos pendurados
ao redor de seu rosto sem maquiagem. Parecia uma princesa.
Ela me deu um olhar cansado ao se virar em direção
à madrasta.
— Georgina, vejo que já conheceu Adam.
Georgina se endireitou e me encarou antes de dizer:
— Não estou entendendo, Livingston. Pensei que
Braden seria seu acompanhante. — Ela puxou o colar de
pérolas em seu pescoço e fiquei grato por não ser a única
pessoa desconfortável para caramba. Eu estava cheio de
vergonha. Naquele momento, o que eu mais queria era ser
bom o suficiente para a famíliade Liv. Não era sobre posição
social ou dinheiro. Eu queria que eles me aprovassem.
Liv não parecia nem um pouco nervosa quando olhou
para Georgina e falou de um jeito simples de entender:
— Eu disse não para Braden. Adam será meu
acompanhante esta noite.
Quanta classe, Liv. Ela não perdeu a calma. Não se
aborreceu.
Georgina engasgou e, de repente, toda aquela coisa
sulista de se fingir de morta não passava de puro
estarrecimento.
— Mas não pode. Braden estará aqui a qualquer
momento.
Colocando seu braço sobre o meu, Liv disse:
— Você não deveria tê-lo convidado para me
acompanhar. Não é justo com ele. — Vi que ela estava triste
por Braden. — Vamos, Adam. Não quero me atrasar em uma
noite tão importante. — Ela colocou um sorriso no rosto
enquanto andávamos pela calçada, mas pude ver o
constrangimento em seus olhos.
— Livingston Rose Montgomery, não ouse entrar
neste carro! — Georgina gritava da varanda.
Liv parou na calçada e olhou para Georgina com um
suspiro que demonstrava seu cansaço com relação a tudo,
não apenas a este momento, mas com todas as bobagens
daquela mulher.
— Não a deixarei ir ao baile com este… — Ela
hesitou e olhou fixamente para as tatuagens em meu pescoço
que podiam ser vistas pelo colarinho da camisa. Ela me olhava
como se eu fosse uma merda em seu sapato. Como se eu
fosse um pedaço de lixo em seu quintal. Uma erva daninha em
seu jardim. — Gangster! — Georgina terminou.
O peito de Liv ficou vermelho. Seus olhos a fuzilavam.
Ela parecia pronta para matar.
— Então eu não irei.
Ela segurou minha mão e me puxou para o carro,
pisando firme sobre os calcanhares. Eu tinha certeza que a
madrasta dela havia dito alguma coisa, mas foi difícil de
entender em meio ao farfalhar do seu vestido enquanto nos
arrastava para o carro. Abri a porta para ela; Liv entrou e a
fechou antes que eu tivesse chance. Corri para o outro lado,
ansioso para entrar no carro antes que Georgina viesse atrás
de nós.
Entrei no veículo, liguei o motor e dirigi para a rua em
tempo recorde.
A respiração irritada de Liv era o único ruído dentro
do carro silencioso. Dava para perceber que ela queria gritar.
— Sinto muito, Adam. Muito mesmo. Para ser
honesta, não imaginei que ela seria tão desagradável.
Coloquei a mão sobre sua coxa e virei para direita,
indo em direção ao salão onde estava acontecendo o baile.
— Está tudo bem.
Ela balançou a cabeça.
— Não, não está. Eu deveria ter sido franca com ela.
Deveria ter contado que iria com você.
Apertando seu joelho, murmurei:
— Mas daí eu não teria tido o prazer de ser chamado
de gangster, — ri. — Em que porra de ano estamos, afinal?
Gangster? Quem ainda usa essa palavra?
Pelo canto do olho pude vê-la sorrir um pouco antes
de se conter novamente.
— Isso foi maldade, — ela disse as palavras como se
a machucasse. Como se ela não pudesse suportar o fato de
alguém ser maldoso comigo.
— Ei, olhe para mim.
Liv me olhou com seus olhos castanhos delicados
que sempre me deixavam com vontade de beijá-la.
— Já escutei coisa pior na vida. Ok? — Mas não
pude evitar a minha próxima pergunta. — Agora, quem é
Braden?
Ela revirou os olhos e se encolheu sobre o banco.
— Apenas um garoto que ela quer que eu namore.
— E ele quer namorar você? — Eu destruiria essa
ilha antes de vê-la envolvida com Braden.
Ela ergueu os ombros levemente e afastou o olhar
enquanto eu observava a estrada. Aquela foi a resposta que
eu precisava, mas não arruinaria esta noite tão importante por
causa de ciúmes. Poderíamos conversar mais tarde. Queria
que hoje fosse a noite dela. Queria que fosse especial.
Movi minha mão até sua coxa, a maciez do vestido
sob minha palma.
— Você está linda. — E eu falava sério. Ela parecia
uma daquelas princesas dos filmes da Disney, só que mais
bonita porque era de verdade.
Ela contraiu os lábios e me olhou com olhos
entreabertos.
— Pareço uma grande bomba de creme cor-de-rosa.
Soltei um riso abafado, porque ela estava certa.
— Princesa Bomba de Creme, — murmurei,
arqueando as sobrancelhas. — É melhor nos apressarmos
antes que eu estacione só para comer você.
Suas bochechas ganharam um tom rosado
encantador e ela riu ao estacionarmos no salão. Eu me sentia
mais leve. Como se no fim das contas, esta noite não fosse ser
um show de horrores.
Eu não podia estar mais errado.
LIV
Se houvesse uma maneira de rastejar pelo chão do
carro de Raven para me esconder de Adam, eu o teria feito. Já
tinha passado da fase de constrangimento e estava
mortificada. Meu Deus, eu não esperava que Georgina fosse
reagir tão mal. Foi culpa minha não ter avisado, mas para ser
bem justa, nunca falei que levaria Braden ao maldito baile. E
depois do dia que tive, estava cansada. Tive que preparar um
discurso que Georgina me contou de última hora e passei
grande parte do dia fazendo o cabelo.
Adam deu a volta no carro e me ajudou a sair, o que
não foi uma tarefa fácil com esse vestido ridículo que Georgina
insistiu que eu vestisse. Ainda estava com raiva, chateada,
extremamente irritada. Eu esperava conseguir sair dessa pelo
bem de Adam. Georgina estaria aqui, assim como uma
tonelada de gente da escola. Braden também, sem dúvida.
Senti meu estômago revirar enquanto seguíamos em direção
ao prédio.
— Espere. — Adam parou na calçada e me puxou.
Dois dedos acariciaram meu queixo quando ele me olhou. —
Esta noite será ótima.
Arqueei uma sobrancelha para ele.
— Repita comigo. Esta noite será ótima.
Minha outra sobrancelha também se juntou à
diversão.
— Não consigo ouvir você, — ele entoou.
— Que coincidência, porque não disse nada.
— Fala sério, vamos conseguir. Adam Nova e Liv
Montgomery contra o mundo. Você não esqueceu, certo? —
Seus olhos azuis brilhavam como estrelas gêmeas.
Esqueci sim. Por um momento deixei que Georgina
me chateasse e mexesse comigo. Mas as palavras de Adam
fizeram meu coração pular. Ele não me deixou esquecer. O
garoto pessimista que conheci há alguns meses, não existia
mais. Em seu lugar havia um romântico. Se ele podia acreditar
que esta noite seria incrível, então eu também podia.
Sorri para ele. Caramba, ele estava tão gostoso que
poderia ser comido. E não precisou estar vestido igual a uma
bomba de creme como eu. O terno que estava vestindo
combinou de um jeito lindo. As tatuagens que apareciam aqui
e ali o deixavam ainda mais bonito. Ele tinha um perfume
maravilhoso.
— Meu Deus, você está cheiroso, — eu disse, me
inclinando e fungando em seu pescoço. Meu nariz o percorreu
e ele soltou um gemido.
— Continue fazendo isso e teremos que largar essa
festa para lá para fazermos uma só nossa.
Dei um passo para trás e o olhei suplicante.
— Podemos? — Eu não estava brincando. Nem um
pouco.
Ele me pegou pela mão e começou a me puxar para
o local.
— De jeito nenhum. Esta é sua noite especial e
também é a noite em que terei a oportunidade de dizer para
todos esses ricaços babacas que Livingston Montgomery é
minha.
Ri atrás dele ao entrarmos no corredor. Se Adam não
tivesse me animado, as decorações teriam. Luzes cintilantes
estavam penduradas pelo salão principal e o lugar estava
pouco iluminado. Um globo gigante pendia no meio do teto que
tinha estrelas recortadas. A luz projetava estrelas pelas
paredes e no chão enquanto girava. Havia estrelas por toda
parte. Pelo menos Georgina tinha acertado e respeitado meus
desejos. A pista de dança estava vazia, mas o salão não. As
pessoas estavam espalhadas por todos os lados e cantos do
salão e, o fato de todos terem parado para nos encarar quando
entramos, não passou despercebido. Uma enorme parte de
mim queria sair correndo e ir para a campina. Para nossas
estrelas. Um lugar onde as pessoas não nos julgavam.
Engoli o nó em minha garganta enquanto Adam
apertava minha mão de um jeito tranquilizador, antes de me
fazer girar e me segurar em seus braços.
— Vamos dançar.
A música já estava tocando quando ele me rodopiou
e começou a me guiar prontamente em uma valsa.
Arregalei os olhos à medida que ele me guiava pelo
salão com facilidade, sem esforço. Sorri apesar de estar
nervosa.— Como você sempre consegue me surpreender?
— Ei, você subestima os Nova. Meu pai me ensinou a
dançar assim que comecei a andar, Liv. De que outra forma eu
conquistaria as mulheres? — Ele riu.
Aquilo não me surpreendeu nem um pouco. José
Nova era um paquerador.
E lá estávamos nós, em nosso próprio mundinho. Ele
conseguiu. Eu mal reparei nos sussurros e olhares. Não.
Éramos apenas Adam e eu. Contra o mundo.
Até o momento em que um garoto que eu não
conhecia nos interrompeu depois de três músicas e pediu
permissão para dançar comigo. Adam foi educado e deu um
passo para o lado com um sorriso. Mas ficou nos arredores do
salão e bebeu um ponche sem tirar os olhos de mim enquanto
dançava com outros garotos.
Quando ele finalmente interrompeu, fiquei aliviada.
Tinha que ficar conversando sem parar, perdendo meu tempo.
Encostei a cabeça sobre seu ombro, inalando seu cheiro
familiar.
— Obrigada, — sussurrei.
Seu peito vibrou com uma risada baixinha.
— Não tem que me agradecer. Se eu tivesse que vê-
la dançar com mais alguém hoje, perderia a cabeça. Este baile
é para eu manter minha sanidade.
Dançamos mais duas músicas em um silêncio
abençoado antes de me dar conta que deveria andar pelo
salão e socializar. Foi o que fiz, com a mão de Adam em
minhas costas. Percorremos o salão e falamos com amigos da
família e da escola, mas fiz questão de evitar o canto em que
Georgina e o xerife Rothchild estavam.
Fomos até a mesa pegar umas bebidas, quando
Braden parou na minha frente, bloqueando meu caminho.
— Oi, Liv. — Seu sorriso animado aliviou o receio que
eu sentia de encontrá-lo. Ele não parecia chateado ou deixado
de lado por eu ter recusado sua companhia esta noite.
Ainda assim, disse apenas um pequeno “olá” e tentei
passar por ele. Estranheza era pouco para descrever o que eu
estava sentindo com Adam e ele respirando o mesmo ar.
Ele passou a mão pelo cabelo e a esticou em direção
a Adam.
— Sou Braden Rothchild.
A ruga na testa de Adam apareceu com força total
com a menção do nome de Braden. Esperava que ele fosse
perder a cabeça ou ignorá-lo completamente, mas não contava
com a pergunta que veio em seguida.
— Filho do xerife Rothchild?
A mão de Braden ainda estava estendida, então ele a
recolheu e colocou no bolso.
— Sim, eu mesmo.
— Uhm, — Adam resmungou para Braden e a
estranheza atingiu um nível completamente diferente.
Eu interferi. Meus costumes sulistas não me
deixariam fazer o contrário.
— Braden, este é Adam. Meu acompanhante esta
noite e meu namorado de vez em quando.
Os olhos de Braden ficaram arregalados, mas seu
sorriso não vacilou.
— Legal. É um prazer conhecê-lo, cara.
Adam não tentou nem responder com um igualmente
ou vá se foder. Só ficou parado, enraizado naquele lugar,
olhando fixamente para Braden.
— Bem, estamos indo pegar ponche, com licença.
— Claro, mas guarde uma dança para mim, — ele
falou enquanto passávamos por ele. Senti o corpo de Adam
ficar tenso atrás de mim.
Peguei sua mão e o levei até a tigela de ponche,
preocupada que pudesse haver uma briga no meu baile.
Interessante. Briga no baile.
Peguei um copo de ponche enquanto Adam se
apoiava na mesa, emburrado. Já era aquele papo de que seria
uma noite incrível.
— Não gosto daquele cara.
— Que cara?
Ele olhou para mim, irritado.
— Certo, por que você não gosta de Braden? —
Tomei um gole do ponche.
Ele cruzou os braços.
— Por vários motivos, sendo o primeiro o fato de que
ele quer a minha garota.
Sorri. Não pude evitar mesmo sabendo que deveria.
Ouvi-lo me chamar de sua garota e ficar todo na defensiva,
aguçaria os sentidos de qualquer garota de dezessete anos.
— Vem, seu homem das cavernas. Vamos dançar, —
murmurei, colocando minha bebida sobre a mesa.
— Estou falando sério, Liv.
— Eu sei, — assenti.
Ele me envolveu em seus braços e entramos no ritmo
da pista de dança.
— Não confio nele.
Hesitei, chocada.
— Como assim? Braden é inofensivo, Adam.
Ele se inclinou e beijou a ponta do meu nariz, me
puxando para mais perto.
— Só não fique sozinha com ele. Promete?
Faria qualquer coisa por ele. Especialmente quando
era tão importante, por mais que eu não entendesse.
— Ok, — sussurrei.
— Obrigado, — Adam murmurou.
Nós dançamos e eu fiz um discurso agradecendo
Georgina por toda dedicação e pela presença de todos. Fiz
questão de que fosse bem meloso, só para ela. Demos mais
uma volta pelo salão, desta vez cumprimentando Mel e
Sebastian. Adam também não ficou nada impressionado com
ele, mas não deixou que isso estragasse nossa noite.
Era minha festa de apresentação, mas parecia ser
mais a apresentação de nós dois. Agora todos sabiam. E
ninguém podia fazer nada enquanto estivéssemos aqui
dançando. Não, nenhuma dessas pessoas ousaria fazer uma
cena e envergonhar a si mesmas ou o nome de suas famílias.
À medida que a noite caminhava para o fim, fiz
questão de me despedir e agradecer a todos por terem vindo.
Não queria que Georgina ficasse irritada com aquilo também.
Levando em conta seus olhares, sabia que ela já estava
morrendo de raiva com o meu acompanhante desta noite.
Quando todos já tinham ido embora e só quem restou
foi a equipe, eu e Adam, ele me puxou de volta para a pista de
dança e me rodopiou até meu grande vestido bomba de creme
flutuar no ar. Soltei uma risada quando ele me trouxe para
perto e me inclinou para trás.
Seus lábios tocaram os meus antes que ele me
puxasse de volta.
— Finalmente tenho você só para mim.
— Ganancioso, — murmurei, beijando-o desta vez.
— Só por você.
Dançamos por mais uma hora sob as luzes cintilantes
de pelo menos mil estrelas de mentira.
Não foi uma noite incrível. Não chegou à minha lista
de cinco noites favoritas com Adam, mas não foi tão ruim
quanto eu esperava.
Suspirei aliviada quando ele me girou uma última vez.
Sobrevivi à parte difícil. Mostrei para todos que eles não
poderiam nos separar.
Juntos, éramos imbatíveis.
Apenas meia hora depois percebi como estava
errada.
ADAM
A luz da varanda estava acesa na casa de Liv quando
estacionamos. Estava preocupado com o tipo de castigo que a
madrasta dela lhe daria quando ela entrasse em casa.
— Parece que ela está esperando você, — eu disse
do meu lado no carro, nervoso. Ela também olhou para a casa,
ansiosa.
— Bem, é melhor você me dar um beijo de boa sorte.
Acho que vou precisar.
Eu me inclinei sobre o console do carro entre nós e
beijei seu pequeno nariz redondo.
Ela agarrou minha gravata antes que eu pudesse
recuar.
— Hã, hã, hã. Vou precisar que me beije de verdade
antes de ir para a batalha.
Foi o que fiz. Enfiei minha língua em sua boca,
provando a doçura natural de Liv, minha Livvy, minha Luna.
Pressionei meu peito contra o dela até que estivesse
encostada no banco e a beijei para caramba.
Desta vez, quando recuei, ela me abraçou e usou os
polegares para acariciar minhas bochechas.
— Eu amo você daqui até a lua, Nova. — A
sinceridade em seu olhar me impressionou e me senti o cara
mais sortudo do mundo inteiro.
— Eu amo você daqui até Plutão, Montgomery, — eu
disse, pressionando meus lábios sobre os dela mais uma vez.
Mais tarde, eu me consolaria com o fato de que as
últimas coisas que dissemos um para o outro foram as mais
importantes que já havíamos dito.
Porque, como em um pesadelo, a porta foi aberta
com força atrás de mim e eu estava no chão. Mal tive tempo
para registrar que dois corpos masculinos me pressionavam
contra o asfalto. Um com o cotovelo na garganta e o outro com
o joelho no estômago. Uma barreira de membros, mãos e
partes do corpo me bombardearam, me deixando
desorientado.
Um grito. Liv, pensei, enquanto tentava lutar para sair
do chão, mas foi uma tentativa inútil. Havia dois deles e um de
mim. Eles me pegaram de surpresa. Não levou muito tempo
para que eu fosse arrastado pelo asfalto para a entrada de
carros.
Dois grandalhões me seguravam e mantinham meus
braços presos atrás de mim. Outros dois me rodeavam.
Braden e Sebastian. Caramba, que droga estava
acontecendo? Mas não consegui me concentrar neles. Não, só
conseguia ouvir os gritos de Liv ao longe.Pelo canto do olho, vi Georgina sair na varanda. Ela
tinha tirado o vestido extravagante e estava com uma mala
marrom na mão.
— Entre no carro, Liv.
— Não! — Eu a ouvi gritar. Ela estava do outro lado
do jardim, mas os capangas que me rodeavam não permitiam
que eu a visse.
— Você procurou por isso. Agora entre nesta porra de
carro! — Georgina gritou.
Tentei lutar contra os dois homens que me
seguravam. Puxei e tentei ao máximo me libertar.
— Segurem ele, pessoal, — Sebastian ordenou, e
senti meu sangue ferver.
— Liv! — Gritei. — Liv!
— Por favor! — Pude ouvi-la gritar quando um outro
homem a empurrou para dentro de um sedã preto. Fiquei
enojado. Isso não podia estar acontecendo.
Georgina jogou a mala dentro do porta-malas do
veículo antes de olhar para mim, da mesma maneira como
tinha olhado mais cedo. De um jeito que me fazia sentir
inferior.
— Tirem esse lixo daqui, — ela disse, antes de se
sentar no banco do motorista.
Ela arrancou com o carro no momento em que um
punho golpeou a maçã do meu rosto. Uma explosão de dor me
atingiu como uma bala acertando seu alvo, mas nunca tirei os
olhos do carro. A mão de Liv estava encostada na janela preta,
seu rosto histérico manchado de lágrimas atrás dela.
Nenhum golpe no rosto se comparava a ter que vê-la
daquele jeito, se afastando de mim.
O próximo soco foi no estômago e me mandou direto
para o chão. Os homens que me seguravam deixaram que eu
caísse sobre o asfalto. Perdi Liv e o carro de vista quando levei
um chute na boca. Sangue cobriu meus dentes e gengivas, o
gosto de ferro intenso em minha boca. Tentei levantar. Tinha
que chegar ao carro de Raven e Liv.
— Fique no chão, — Sebastian disse, com uma
tranquilidade mortal em sua voz, e então, levei um chute por
trás da cabeça. Os golpes vieram de todos os lados. A dor
irradiava por todo meu crânio. Minhas costelas gritavam de
agonia e, ainda assim, eu me levantei. Lute, meu cérebro
confuso gritava para mim. Lute por ela. Eu não iria
decepcioná-la.
Foi o pontapé doentio em minha testa que acabou
comigo. Sangue jorrava em meus olhos. Sofrimento preenchia
cada centímetro do meu corpo. Eles iam me matar, bem aqui,
no jardim de Liv com o lindo oceano do outro lado da rua.
Fiquei pensando se eles jogariam meu corpo no mar.
Através da cortina de sangue e dor, vi o lampejo de
luzes azuis. A polícia. Graças a Deus. Alívio passou por mim
como uma corrente elétrica.
Todos se afastaram, mas por mais que eu tentasse,
não conseguia me mexer. Rolei no chão, lutando contra a
escuridão que ameaçava tomar conta de mim. Não podia
permitir. Obriguei minha mente a manter-se em alerta. Eu tinha
que encontrar Liv.
O arrastar de sapatos no asfalto fez com que eu
abrisse os olhos. A poucos centímetros do meu rosto havia um
par de botas pretas que complementavam o uniforme da
polícia. Minha pequena fração de alívio desapareceu do nada
junto com a garota que eu amava. Estava acabado. Fodido.
Totalmente ferrado.
— Cacete, vocês fizeram um estrago nele, — o xerife
Rothchild disse, e fechei os olhos. Era isso. Não sabia o que
estava por vir, mas sabia que não seria nada bom. Não com
este homem envolvido.
Um criminoso.
Um estuprador.
Ele me pegou do chão e eu teria gritado e lutado se
pudesse, mas eles me destruíram. Eu não tinha mais nada.
Estava à beira de perder a consciência.
— Me ajude a colocá-lo no carro, Braden.
Eles me empurraram para o carro, mas não antes de
eu cuspir sangue na cara do xerife Rothchild.
Ele pegou um lenço no bolso e limpou a bochecha
enquanto me encarava deitado no banco traseiro da viatura.
— Garotos, quebrem a janela da parte da frente da
casa pelo lado de fora. Certifiquem-se de que pareça um
arrombamento. Chamaremos isso de legítima defesa. — Ele
não tirou os olhos de mim em nenhum momento.
O xerife bateu a porta, entrou na parte da frente do
carro e deu partida. Não tinha ideia de onde ele estava me
levando. Mal conseguia levantar a cabeça, pensar com
lucidez.
— Entendo por quê Livingston gosta tanto de você,
Adam. Tem a boa aparência de sua mãe, com certeza.
Aqueles olhos. Eles também me arruinaram.
Uma náusea me atingiu e engasguei enquanto
implorava pela escuridão. Queria que ela me levasse, porra.
Não podia ouvi-lo falar sobre a minha mãe.
— Mas eu avisei a você. Na última vez que nos
vimos, falei para ficar longe dela. Mas vocês, garotos da
cidade, são burros pra caralho e nunca obedecem. — Ele
respirou fundo. — Igual ao idiota do Boone. Ele deveria vigiar
você e seu pai, mas teve que mexer com Livingston. Não
conseguem deixar o pau miserável de vocês dentro das
calças, conseguem? — Ele deu uma risada impiedosa. — Eu
entendo. Sempre quis o que não era meu também.
Lágrimas escorreram de minhas bochechas para o
banco de couro embaixo de mim. Eu queria morrer. Este
homem… ele tirou de mim tudo o que eu amava. Duas vezes.
Não demorou muito para que o carro parasse, mas
não consegui nem levantar a cabeça para ver onde
estávamos. Ele me arrastou para fora do carro.
— Vamos lá, seu saco de merda deplorável. Levante-
se.
Eu me apoiei sobre ele, que se aproximou do meu
ouvido.
— Não entrará em contato com Liv de novo,
entendeu? Seria uma pena se seu pobre pai fosse atacado
novamente, não acha? Pode ser que dessa vez ele não
escape.
Arfei, o choque disparando uma nova onda de dor
pelo meu corpo. Não. Meu pai não. Ele ria, sua maldade
ecoando em meus ouvidos.
— O que foi? Não pensou que aquilo foi aleatório,
pensou?
Recuei com toda minha força e cuspi de novo, desta
vez, atingindo seu sapato.
— Seu filho da puta, é melhor tomar cuidado com
quem você mexe.
Ele me arrastou pelo estacionamento, para um prédio
que nunca tinha visto por dentro em todo o tempo que vivi em
Madison.
Já dentro do Presídio do Condado de Madison, ele se
aproximou o suficiente para que só eu pudesse ouvir.
— Sua mãe. Ela era única. Eu amei quando ela
implorou. Nas duas vezes.
Fechei os olhos e prendi a respiração, suplicando
pela inconsciência, mas ciente demais sobre o que ele estava
dizendo.
— Especialmente na noite em que fui ao seu
apartamento. Ela estava fazendo muito escândalo. Causando
problemas para mim. — Seu mau hálito fez meu lábio ferido se
contorcer. — Ela implorou pela vida. E por você quando enfiei
os comprimidos na garganta dela, com uma arma em sua
cabeça.
Balancei a cabeça, atordoado.
— Nããão! — Gritei. A agonia e tristeza me
dilaceraram. Estive tão feliz nos últimos meses. Estava na hora
de pagar por isso.
Ele me empurrou para o chão sem um pingo de
cuidado.
— Prendam-no. Arrombamento e invasão da casa
dos Montgomery. Lesão corporal grave também. A senhora
Montgomery estará aqui pela manhã para abrir uma
ocorrência.
Fiquei deitado lá, sangrando e não só por mim. Mas
pela minha mãe. Meu pai. Por Liv.
— Não se preocupe, Adam. Braden cuidará de Liv, —
o xerife Rothchild disparou ao sair.
Não. Por favor, não. Tristeza corria em minhas veias.
Tormento explodia dentro de mim. Cada osso do meu corpo
latejava. Mas não era apenas dor que queimava dentro de mim
enquanto estava deitado no chão da cadeia.
Não, era algo muito maior.
Vingança.
 
Continua…
Amie Knight é uma leitora desde que se lembra e
uma amante de romances desde que pôde colocar as mãos
nos livros de sua mãe. Uma esposa e uma mãe dedicada, com
muito amor por música e maquiagem, ela nunca será vista
saindo de casa sem suas sobrancelhas e os cílios feitos.
Quando não está lendo e escrevendo, você pode
encontrá-la cantando no carro com seus filhos ao som de R&B,
country e outras músicas dos anos 90.
Amie se inspira em sua infância em Columbia,
Carolina do Sul, e não consegue se imaginar morando em
outro lugar que não seja no sul.
 
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	PrólogoCapítulo 1
	Capítulo 2
	Capítulo 3
	Capítulo 4
	Capítulo 5
	Capítulo 6
	Capítulo 7
	Capítulo 8
	Capítulo 9
	Capítulo 10
	Capítulo 11
	Capítulo 12
	Capítulo 13
	Capítulo 14
	Capítulo 15
	Capítulo 16
	Capítulo 17
	Capítulo 18
	Capítulo 19
	Capítulo 20
	Capítulo 21
	Sobre a autora
	Sobre a editor

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