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INT ROD UÇÃO À CON TABI LI DADE José Luiz dos Santos Paulo Schmidt INTRODUÇÃO À CONTABILIDADE José Luiz dos SANTOS Paulo SCHMIDT READER Porto Alegre 2018 Equipe Técnica Multidisciplinar de Graduação EAD: Profº José Luiz dos Santos Profº Edson Roberto Oaigen Profª Andréia Castiglia Fernandes Elisiane Alves Fernandes Professor Conteudista: José Luiz dos Santos Paulo Schmidt Revisão de Conteúdo: Professor José Luiz dos Santos Revisão Textual: Janaína Araújo Fiorenzano Bibliotecária: Josiane Fonseca da Cunha - CRB 10/1674 Equipe Técnica: LOOZ COMUNICAÇÃO Projeto Gráfico e Capa: Giovanni Castiglia Fernandes Catalogação na Fonte: Bibliotecária Josiane Fonseca da Cunha - CRB 10/1674 S237i Santos, José Luiz dos Introdução à contabilidade / José Luiz dos Santos e Paulo Schmidt. – Porto Alegre: Reader, 2018. 62 p. ISBN: 9788560200009 1. Contabilidade 2. Balanço patrimonial. 3. Informações contábeis. I. Schmidt, Paulo. CDU 657 SUMÁRIO CAPÍTULO 1: ANTECEDENTES DA CONTABILIDADE 5 1.1 OBJETIVOS DE APRENDIZADO DO CAPÍTULO 5 1.2 CONTABILIDADE: A ORIGEM DA NECESSIDADE INFORMACIONAL 5 CAPÍTULO 2: A CONTABILIDADECOMO CIÊNCIA 21 2.1 OBJETIVOS DE APRENDIZADO DO CAPÍTULO 21 2.2 A CLASSIFICAÇÃO DA CONTABILIDADE DENTRE OS RAMOS 21 DO CONHECIMENTO HUMANO 2.3 CAMPO DE APLICAÇÃO DA CONTABILIDADE 24 2.4 OBJETO E OBJETIVO DA CONTABILIDADE 25 2.5 FINS DA CONTABILIDADE 25 2.6 PRINCIPAIS TAREFAS DO CONTADOR 25 2.7 USUÁRIOS DAS INFORMAÇÕES CONTÁBEIS 25 CAPÍTULO 3: ESTUDO DO PATRIMÔNIO 27 3.1 OBJETIVOS DE APRENDIZADO DO CAPÍTULO 27 3.2 CONCEITO: 27 3.3 ASPECTOS DO PATRIMÔNIO 28 3.4 COMPONENTES DO PATRIMÔNIO 28 3.5 ESTRUTURA BÁSICA DO PATRIMÔNIO 30 3.6 ORIGENS E APLICAÇÕES DE RECURSOS 30 3.7 ELEMENTOS QUE COMPÕEM A CONTABILIDADE 31 3.8 EQUAÇÃO FUNDAMENTAL DO PATRIMÔNIO 32 3.9 SITUAÇÕES DO PATRIMÔNIO LÍQUIDO 33 3.10 NOÇÕES DE CAPITAL 33 CAPÍTULO 3: BALANÇO PATRIMONIAL 37 4.1 OBJETIVOS DE APRENDIZADO DO CAPÍTULO 37 4.2 FINALIDADE DO BALANÇO PATRIMONIAL 37 4.3 EXERCÍCIO SOCIAL 37 4.4 BASE LEGAL 38 4.5 ATIVO 38 4.6 PASSIVO 43 4.7 PATRIMÔNIO LÍQUIDO 45 4.8 CONTAS RETIFICADORAS 47 4.9 BALANÇO PATRIMONIAL PELO CPC 48 CAPÍTULO 5: DEMONSTRAÇÃO DO RESULTADODO PERÍODO 51 5.1 OBJETIVOS DE APRENDIZADO DO CAPÍTULO 51 5.2 CONCEITO DE GESTÃO 51 5.3 FASES DA GESTÃO 51 5.4 RESULTADO (RÉDITO) 51 5.5 PERÍODO ADMINISTRATIVO 53 5.6 EXERCÍCIO SOCIAL OU FINANCEIRO 53 5.7 EXERCÍCIO FINANCEIRO 53 5.8 DEMONSTRAÇÃO DO RESULTADO 53 REFERÊNCIAS 61 5 INTRODUÇÃO À CONTABILIDADE José Luiz dos Santos e Paulo Schmidt CAPÍTULO 1 ANTECEDENTES DA CONTABILIDADE 1.1 OBJETIVOS DE APRENDIZADO DO CAPÍTULO Após o estudo deste capítulo, o leitor deverá ser capaz de: 1. Explicar os antecedentes culturais, sociais e tecnológicos relacionados ao surgimento da contabilidade; 2. Relacionar o desenvolvimento da humanidade com o desenvolvimento da contabilidade. 1.2 CONTABILIDADE: A ORIGEM DA NECESSIDADE INFORMACIONAL 1.2.1 Arqueologia da contabilidade 1.2.1.1 As Primícias do Controle Contábil O início do trabalho de desvendar a gênese contábil, buscando identificar os primeiros sinais do uso da Contabilidade pelo homem pré-histórico, passa, preliminarmente, pelo entendimento de quando o homem surgiu na terra. Segundo Antón, Potts e Aiello (2014), os cientistas acredi- tam que muitas das características dos seres humanos teriam surgido no gênero Homo entre 2,4 e 1,8 milhões de anos atrás, na África. Embora os cientistas tenham reconhecido essas ca- racterísticas ao longo de décadas, eles estão reconsiderando os verdadeiros fatores evolutivos que as originaram. No entanto, para Antón, Potts e Aiello (2014), evidências fósseis sugerem que esses traços não surgiram como um único pacote, mas, em vez disso, vários ingredientes-cha- ve, que se acreditava terem definido o Homo, evoluíram em ancestrais anteriores, o Australopi- tecos, entre 3 e 4 milhões de anos atrás. Para Severinghaus e Brook (1999), o fim do último período glacial propiciou o surgimento das primeiras civilizações, em função do aquecimento do planeta, a aproximadamente 15.000 anos atrás, gerando um clima mais quente e úmido, permitindo ao homem a sua socialização e fixa- ção em terras férteis, proporcionando a criação das primeiras cidades. Esse é o período pré-histórico mesolítico, compreendido entre 10.000 a.C. e 5.000 a.C., foi marcado pelo aquecimento do clima da Terra, pondo fim ao período glacial. Sua caracterização como período pré-histórico deve-se ao fato de situar-se antes do aparecimento da escrita, fato 6 INTRODUÇÃO À CONTABILIDADE José Luiz dos Santos e Paulo Schmidt este que marcou o fim da pré-história. Essa mudança no clima terrestre favoreceu o surgimento das primeiras grandes comuni- dades junto às terras baixas do Oriente Próximo, região chamada de Mesopotâmia (terra entre rios), situado entre o Rio Tigre e Eufrates, especialmente onde abundantes nascentes tornavam essas áreas privilegiadas para o cultivo agrícola e para a criação de animais. Uma cidade pode ser definida, segundo Mark (2017), como um grande povoado urbano de comércio e administração com um sistema de leis e, geralmente, os meios regulamentados de saneamento. Para Mark (2017), as primeiras cidades que se encaixam nessas definições foram descobertas na região conhecida como Mesopotâmia entre 4.500 e 3.100 a.C., sendo a cidade de Uruk, hoje considerada a mais antiga do mundo, fundada em 4.500 a.C. Uruk, completa Mark (2017), é a única concorrente para o título de cidade mais antiga, que tem provas materiais e documentação escrita, sob a forma de textos cuneiformes, datando as atividades da comunidade a partir do primeiro período, sendo que sítios como Jericó, Sidon e Eridu, que se instalaram antes Uruk, falta o mesmo tipo de documentação. Em sítios arqueológicos do Oriente Próximo foram encontrados materiais utilizados por ci- vilizações pré-históricas que caracterizaram um sistema contábil utilizado entre 8.000 e 3.000 a.C., o qual era constituído de pequenas fichas de barro. Essas escavações revelaram fatos magnânimos para a Contabilidade, colocando-a como a mola propulsora da criação da escrita e da contagem abstrata. As primeiras cidades permitiram a socialização do ser humano e a necessidade de aumento na produção de alimentos. Para Burke e Ornstein (2017), uma maior eficiência de cultivo de ali- mentos fez com que o homem passasse a fixar residência e criasse laços mais fortes em deter- minadas localidades. A produção de alimento em excesso e o aumento da eficiência na produção agrícola, como defendem Burke e Ornstein (2017), fez com que as pessoas não envolvidas diretamente na pro- dução de alimentos, passassem a exercer outras atividades, tais como a produção de ferra- mentas, de cestas e outras artes que começaram a ser praticadas em maior escala. Essas mu- danças sociais geraram a necessidade da criação de novos níveis organizados de sobrevivência necessários ao convívio das pessoas. O excedente na produção de alimentos, segundo Burke e Ornstein (2017), gerou um novo fe- nômeno ainda não vivido pela sociedade primária: o excesso de alimentos poderia ser armaze- nado, comercializado ou utilizado como pagamentos de bens e serviços, gerando a necessidade da criação de formas rudimentares de controles e registros. Segundo Schmidt e Santos (2006) é possível se referir à arqueologia da Contabilidade, pois os vestígios encontrados de sistemas contábeis são produto do estudo científico de restos de culturas humanas derivadas de conhecimentos desenvolvidos em tempos pré-históricos. Essa nova fase no desenvolvimento do homem na Terra, principalmente nas áreas mais fér- teis como a antiga Pérsia e a Mesopotâmia, criou uma necessidade até então pouco conside- rada: o controle do produto da agricultura e da criação de animais. Era necessário um sistema para o registro da localização dessas mercadorias, seus proprietários, possíveis dívidas origi- nadas com suas transferências e também os direitos dos antigos proprietários.Todas essas novas situações deveriam ser identificadas e registradas pelos homens pré-históricos, mas como poderia ser possível se ainda não existiam a escrita e a contagem em sentido abstrato? A resposta para essa pergunta pode estar em trabalhos de pesquisa arqueológicos, que mesmo não tendo a intenção original de buscarem esta resposta, acabaram deparando-se na origem da Contabilidade. Segundo Schmidt e Santos (2006) para muitos estudiosos a origem da escrita não foi, como pensava os antigos, uma invenção espontânea e súbita; o alfabeto não teve origem divina como se acreditava até o século XVIII, nem a escrita iniciou com a pictografia (sistema primitivo de escrita em que se exprimiam as ideias por meio de cenas figuradas ou simbólicas). A teoria de que a escrita teve origem na pictografia perdurou por dois séculos, do século XVIII ao XX, quan- 7 INTRODUÇÃO À CONTABILIDADE José Luiz dos Santos e Paulo Schmidt do a escavação iniciada no princípio do século em Uruk, antiga cidade da Mesopotâmia e centro importante da civilização sumeriana, revelaram várias tábuas cuneiformes, bem como outras tábuas impressas de forma geométrica e outras formas. Em sítios arqueológicos em Israel, Síria, lraque, Turquia e Irã foram encontrados pequenos artefatos de barro, chamados de fichas, datando de 8.000 a 3.000 a.C. Escavações também revelaram a existência de outros artefatos de barro assemelhados a caixas contendo fichas no seu interior e impressões externas um costume sumeriano para identificar devedores ou outras pessoas. Datavam, os mais antigos, de aproximadamente 3.250 a.C. Esses artefatos eram deno- minados de envelopes (possuem formato de um cofre dentro do qual eram guardadas as fichas de barro), sendo que os mais antigos datavam de aproximadamente 3.250 a.C. As fichas de barro foram classificadas em duas categorias: fichas simples e complexas. As simples possuíam a forma de esferas, discos, cilindros, ovoides, triângulos, retângulos e reve- lam traços de 8.000 a.C., e eram usadas principalmente em zonas rurais; as complexas, também com uma grande variedade de formas, porém com incisões ou pontuações e frequentemente perfuradas, eram usadas em muitas cidades e nos arredores dos templos. Esses pequenos ob- jetos de barro espalhados por várias partes na Terra eram moldados a mão e endurecidos com calor, medindo de 1 a 4 centímetros. Em sítios arqueológicos de Jarmo, lraque, foram encontra- das mais de 1.500 fichas datadas de 6.500 a.C. As fichas contábeis foram às antecessoras e propulsoras da escrita e da contagem no senti- do abstrato. Historicamente, a contagem envolveu três fases evolutivas: o início caracterizado pelo chamado correspondente um-por-um, passando para a contagem concreta, especialmen- te através de fichas, e chegando na contagem abstrata através dos números. A primeira fase envolvia a combinação de um sinal (por exemplo: um osso, uma concha do mar) com uma mercadoria (um carneiro, uma medida de grão, um coco), repetindo o sinal para cada unidade adicional do produto. A segunda fase, a contagem concreta, caracterizava-se pelo relacionamento através de fi- chas concretas (ou outros objetos similares) com palavras representando números específicos. Algumas expressões como uma dupla, uma braça, um par, indicavam o número dois, mas não necessariamente poderiam ser usadas em todas as situações. Na contagem concreta identifi- cava-se um conjunto de palavras ou fichas com um conjunto de coisas específicas. A noção de cardinalidade (medida de grandeza sem referência à ordem de sucessão) foi introduzida nessa fase. Essa contagem estava limitada a um escore de objetos. A última fase da evolução da contagem caracterizou-se pelo desenvolvimento dos símbolos numéricos, liberando a contagem de um conjunto específico de coisas, criando números gerais suficientes para a contagem de qualquer coisa e criando a noção abstrata de um, dois, três etc. Aos contadores de Uruk, segundo revelações de trabalhos arqueológicos, podem ser cre- ditadas a criação dos numerais e a revolução na contagem e na manipulação de dados. Eles inventaram dois sinais: os numerais (símbolos usados para representar números abstratos) e os pictográficos (símbolos usados para expressar mercadorias). Os numerais eram impressos, enquanto os pictográficos eram talhados. 1.2.1.2 Origem dos Primeiros Sinais de Controle Patrimonial A partir dessa nova realidade que o homem pré-histórico passou a viver, novas oportunida- des, bem como novas necessidades passaram a fazer parte de sua vida cotidiana. Dentre as novas necessidades, a de controlar seu patrimônio, foi uma das mais marcantes. As primeiras ferramentas criadas para registro de controle patrimonial, segundo Burke e Ornstein (2017), parecem ter sido inventadas há 12.000 anos nas Montanhas Zagros (cordilheiras situadas entre os países do Irã e Iraque). Essas primeiras ferramentas foram representadas por fichas (tokens) de argila simples que correspondiam a diferentes produtos. Seu uso, como afirmam Burke e Ornstein (2017), se espalhou por todo o Oriente Médio desde então, até cerca de 5.400 anos atrás. A Figura 1.1 apresenta alguns exemplos dos primeiros tokens utilizados ainda no período Ne- 8 INTRODUÇÃO À CONTABILIDADE José Luiz dos Santos e Paulo Schmidt olítico (considerado o último período pré-histórico), também denominado de Nova Idade da Pe- dra ou Idade da Pedra Polida. Esta figura, segundo Nashli e Moghimi (2013), apresenta tokens de sítios neolíticos no Irã, encontrados em depósitos de lixo, indicam que foram descartados após a colheita dos itens que eles representavam. Figura 1.1: Tokens de controle patrimonial no período Neolítico Fonte: Recuperado de NASHLI, Hassan Fazeli; MOGHIMI, Niloufar. Counting objects: new evidence from Tepe Za- gheh, Qazvin plain, Iran. Antiquity, v. 87, n. 336, 2013. Para Schøyen (2017a), a cerca de 8.000 a. C., os tokens passaram a substituir as contagens da forma mais simples, ou seja, a correspondência um-para-um, por meio da substituição por sím- bolos neolíticos de várias formas geométricas objetivando a contagem concreta, dependendo do tipo de ativo que deveria ser controlado. Esses tokens, segundo Schøyen (2017a), inicialmen- te, adotaram formas geométricas básicas, como esferas, tetraedros, cones, cilindros, discos, quadriláteros, triângulos etc. Eles eram guardados em cestas, potes de couro, tigelas de argila etc. Durante décadas, segundo Lawler (2001), arqueólogos no Iraque, Síria e Irã desenterram nu- merosas pequenas peças de argila (tokens) com diversas formas geométricas, com idades que variavam de cerca de 9.000 a 4.000 anos. Além dos tokens, eles também encontraram esferas ocas de argila, com marcações do lado de fora, que serviam de uma espécie de cofre para guar- da das fichas. A tese de que os tokens faziam referência a um determinado objeto, foi proposta, segundo Buccellati (2017) e Schroeder (1980), pela primeira vez em 1966, por Pierre Amiet - um arqueó- logo do museu do Louvre de Paris. Ele apontou a ligação conceitual entre os tokens e objetos individuais. A teoria de Pierre Amiet foi aprimorada por sua aluna: a arqueóloga Denise Schmandt-Besse- rat, professora da Universidade do Texas, Austin. O foco inicial do trabalho de Denise Schmandt-Besserat estava direcionado para a identifi- cação dos primeiros sinais de desenvolvimento da escrita e da contagem abstrata pelo homem pré-histórico, mas, segundo Mattessich (1994, p.7), acabou “...tropeçando na origem da Conta- bilidade”. Para Schmandt-Besserat (2009a), antes de estudar o significado cognitivo do sistema de tokens, é importante entender a origem e formação cultural da região. Para Schmandt-Bes- serat (2009a), os tokens começaram a aparecer no Crescente Fértil do Oriente Próximo, onde estão atualmente situados a Síria e o Irã, em torno de 7.500 a. C. Isto significa que a contagem coincidiu com a agricultura, e em particular, com a economia de redistribuição dos excedentes da agricultura.Tokens, segundo Schmandt-Besserat (2009a), provavelmente, foram utilizados para reunir os excedentes comunitários para a preparação das festas religiosas que constituí- ram o eixo central da economia de redistribuição. Os tokens ajudavam os líderes comunitários a manterem o controle dos bens recolhidos dos cidadãos e sua redistribuição como oferendas aos deuses e as várias necessidades da comunidade. Os tokens eram utilizados não apenas para controle patrimonial dos bens, mas, como o ho- mem ainda não havia desenvolvido a contagem abstrata, eram também utilizados para conta- gem concreta, especialmente de medidas de grãos, de frascos de óleo, de animais e de unida- des de trabalho em tempo e tarefas. Schmandt-Besserat (2009a) defende que a forma de representação dos objetos era muito variada. Como exemplo, demonstra que a representação de grãos em pequenas quantidades 9 INTRODUÇÃO À CONTABILIDADE José Luiz dos Santos e Paulo Schmidt era por meio de um token com formato de cone e em grandes quantidades na forma de esferas, de óleo na forma de ovoides, de animais como cilindros e de unidades de trabalho com tetra- edros. A Figura 1.2 apresenta exemplos de tokens descritos por Schmandt-Besserat (2009a), que representam fichas mais complexas, encontradas no sítio de Susa datando de 5500 a.C., representando (de cima, da direita para a esquerda) uma ovelha, um frasco de óleo, um lingote de metal, uma peça de vestuário, (abaixo, da direita para a esquerda) uma peça de vestuário, um item não identificado, um favo de mel, encontrados em Susa, Irã, datados de cerca de 3.300 a. C..Esses tokens se encontram expostos no museu do Louvre, no Departamento de Antiguidades Orientais, em Paris. Figura 1.2: Exemplos de tokens descritos por Schmandt-Besserat Fonte: Recuperado de Schmandt-Besserat, D. (2009a). Record Keeping before Writing, Marco Mancini and Barbara Turchetta, Eds., Scrittura e Scriture: Le Figure della Lingua. Atti del XXIX Convegno della Societa Italiana di Glotto- logia, Il Calamo, Roma.P. 67-80. O número de formas de tokens, segundo Schmandt-Besserat (2009a), era limitado a cerca de 12 em torno de 7.500 a. C., aumentando para cerca de 350 por volta de 3.500 a. C., quando começaram a aparecer as primeiras oficinas urbanas contribuindo para a economia de redistri- buição de bens. Alguns dos novos modelos de tokens passaram a representar matérias-primas como a lã e o metal, enquanto outros representavam produtos acabados, tais como têxteis, vestuário, joias, pão, cerveja e mel. Os tokens mais complexos, assumiram as formas dos itens que simboliza- vam, tais como roupas, vasos em miniatura, ferramentas e mobiliário. Os artefatos mais complexos, segundo Schmandt-Besserat (2009a), levaram muito tempo e necessitavam mais habilidade para serem modelados em comparação com os antigos de formas geométricas, como cones e esferas, o que sugere que especialistas foram os responsáveis por fabricá-los. A Figura 1.3 apresenta alguns exemplos de tokens mais complexos, desenvolvidos a partir dos modelos mais simples, assumindo, na visão de Schøyen (2017b), novas formas, linhas, pontos e vários novos formatos para atender as necessidades mais avançadas de controle pa- trimonial. Figura 1.3: Exemplos de Tokens mais complexos Fonte: Recuperado de Schøyen, M. (2017b, maio 24). An academic & educational resource from the private collection – complex counting tokens. Recuperado de: http://www.schoyencollection.com/mathematics-collection/pre-litera- te-counting/complex-counting-tokens-ms-4522-1. Uma das principais peculiaridades dos tokens, para Schmandt-Besserat (1977b), é a caracte- rística de tamanho pequeno, presente em todos os modelos, medindo em média de um a dois http://www.schoyencollection.com/mathematics-collection/pre-literate-counting/complex-counting-tokens-ms-4522-1 http://www.schoyencollection.com/mathematics-collection/pre-literate-counting/complex-counting-tokens-ms-4522-1 10 INTRODUÇÃO À CONTABILIDADE José Luiz dos Santos e Paulo Schmidt centímetros. A coloração dos tokens poderia variar entre cor de argila, vermelho, cinza ou preto. A importância do uso dos tokens como ferramenta de controle patrimonial pela civilização pré-histórica, foi de grande importância, tanto que Schmandt-Besserat (2009a) é enfática ao afirmar que, por volta de 3300 a. C, os tokens ainda eram os únicos dispositivos da Contabilida- de para gerir a economia de redistribuição de ativos dos templos administrados pelos sacerdo- tes. Schmandt-Besserat (2009a) acrescenta, que a oferta de ativos para os templos era comum, especialmente para a preparação de festivais, porém, a frequência da entrega e os tipos de bens e suas quantidades passou a ser regulada e o não cumprimento pela população passou a ser penalizado. Essa nova realidade social, desencadeou um novo desafio para a contabilidade primitiva: a invenção de ferramentas menos frágeis para o controle patrimonial, surgindo os chamados envelopes, onde os tokens, especialmente das contas dos inadimplentes, pudessem ser mantidos em segurança até que as dívidas fossem pagas. A evolução da complexidade da sociedade mesopotâmica trouxe consigo alguns desafios aos responsáveis pelo controle patrimonial dessa sociedade. Um dos novos desafios foi a criação de envelopes de argila para guarda dos tokens. Os tokens foram, inicialmente, guardados em cestos de vime, em caçarolas de couro, em tigelas de barro, porém, nenhum desses utensílios garantiam a segurança de que os artefatos não seriam extraviados. Buscando uma maior segurança na guarda dessas peças, os homens pré-históricos criaram uma ferramenta para garantir que os tokens não seriam extraviados: os envelopes de argila. Algumas teorias foram desenvolvidas para explicar a utilização dos envelopes de argila. Schmandt-Besserat (2009a), por exemplo, relata que o montante de tokens era colocado em bolas de argila ocas e, para mostrar o conteúdo dos envelopes, os responsáveis pela guarda dos artefatos passaram a marcar na parte exterior dos envelopes os tokens que foram colocados no seu interior, além de selos de segurança, enquanto a argila ainda não estava seca. Essa marcação exterior resolveu um problema que inicialmente existia que era a verificação de quais peças foram colocadas no interior dos envelopes. A única forma de verificar o interior dos envelopes, seria quebrá-los, anulando as garantias. Schmandt-Besserat (1977b) aponta que esse problema foi resolvido, imprimindo na superfície do envelope uma série de marcas que representam a forma e o número de tokens que haviam sido colocados no seu interior. Muitas vezes, afirma Schmandt-Besserat (1977b), as marcações eram feitas de forma grosseira e em cima dos selos, às vezes pressionando-os na superfície ainda molhada do envelope de argila os mesmos tipos e quantidades de tokens que haviam sido colocados no seu interior. Para isso, também poderiam ser utilizados os dedos ou instrumentos pontiagudos. Estas inscrições externas, na opinião de Schmandt-Besserat (1977b), poderiam ser identi- ficadas por qualquer pessoa que tivesse o conhecimento do sistema simbólico utilizados nos tokens contábeis. A Figura 1.4 apresenta um envelope que contém 11 tokens complexos, representando segun- do Schøyen (2017c), contas ou acordos de salários de trabalhadores, medidas de algum metal, medidas grandes de cevada e medidas pequenas de alguma outra mercadoria. O conjunto com- pleto de tokens simples e complexos era composto de 4 tetraedros de 0,9x1,0 cm, 4 triângulos com 2 linhas incisas de 2,0x0,9 cm, 1 esfera de 1,7 cm de diâmetro, 1 cilindro de 2,0x0,3 cm e 1 parabolóide de 1,3, com diâmetro de 0,5 cm. Esse envelope está no acervo do The Norwegian Institute of Palaeography and Historical Philology, na cidade de Oslo, Noruega. 11 INTRODUÇÃO À CONTABILIDADE José Luiz dos Santos e Paulo Schmidt Figura 1.4: Exemplo de envelope com 11 Tokens complexos no seu interior Fonte: Schøyen, M. (2017c, maio 24). An academic & educationalresource from the private collection. – bulla-envelo- pe: 11. Recuperado de http://www.schoyencollection.com/mathematics-collection/pre-literate-counting/bulla-en- velope-ms-4631. Essa esfera de argila mede 6,5 cm de diâmetro, possui uma impressão externa, que carac- teriza um selo de garantia (Figura 1.5), representando uma fileira de homens caminhando à es- querda e de um predador atacando um veado. Figura 1.5: Detalhe do selo horizontal que aparece no envelope da figura 1.4 Fonte: Schøyen, M. (2017c, maio 24). An academic & educational resource from the private collection. – bulla-envelo- pe: 11. Recuperado de http://www.schoyencollection.com/mathematics-collection/pre-literate-counting/bulla-en- velope-ms-4631. Conforme Schøyen (2017c), somente 25 envelopes foram encontrados em escavações na re- gião de Uruk. O número total de envelopes já descobertos em todo o mundo é de 165 intactos e 70 fragmentados. Os envelopes não tinham dimensões fixas, podendo variar do tamanho de uma bola de golfe ao de uma bola de basquete. Dentre os envelopes encontrados em escavações em sítios arqueológicos na Síria e no Irã, foi encontrado um (Figura 1.6) que possuía 17 tokens e foi, até hoje, segundo Schøyen (2017d), http://www.schoyencollection.com/mathematics-collection/pre-literate-counting/bulla-envelope-ms-4631 http://www.schoyencollection.com/mathematics-collection/pre-literate-counting/bulla-envelope-ms-4631 http://www.schoyencollection.com/mathematics-collection/pre-literate-counting/bulla-envelope-ms-4631 http://www.schoyencollection.com/mathematics-collection/pre-literate-counting/bulla-envelope-ms-4631 12 INTRODUÇÃO À CONTABILIDADE José Luiz dos Santos e Paulo Schmidt o artefato que possuía o maior número de fichas. Esse envelope datava, segundo informações do museu Schøyen (2017d), entre 3700 e 3200 a.C., medindo 7 cm de diâmetro, com selos im- pressos na parte externa caracterizando uma fileira de homens cada um carregando um saco em sua cabeça para um grande caldeirão colocado em um suporte arredondado e outro selo apresentando uma linha de anéis no alto da esfera com a figura de homens. Além desses selos de segurança, esse envelope possui uma terceira impressão de um token de um tipo de disco grande ou o fundo de um grande cone, com diâmetro de 2,2 cm, podendo representar o conjunto de tokens colocados no seu interior. Esse envelope armazenava tokens representados por 1 es- fera com diâmetro de 1,5 cm, 8 esferas pequenas com diâmetros de 0,8 cm, 5 cones de 1,0 x1,5 cm e 3 cilindros de 0,4 x1,2 cm. Figura 1.6: Exemplo de envelope com 17 Tokens no seu interior Fonte: Recuperado de Schøyen, M. (2017d, maio 24). An academic & educational resource from the private collection – bulla-envelope. Recuperado de http://www.schoyencollection.com/mathematics-collection/pre-literate-counting/ bulla-envelope-ms-4632. Esses 17 tokens, na interpretação dos pesquisadores do museu Schøyen (2017d), represen- tavam contas de 300 dias salários de trabalhadores ou o direito de um trabalhador por 300 dias trabalhados, com uma taxa de 1,8 medidas de cevada por homem/dia de trabalho, totalizando salários que equivaliam a 540 medidas de cevada. Esse processo de registro era cercado de controles para garantir que a transação não sofresse nenhum tipo de alteração. Muitos dos envelopes analisados, segundo Woods (2010), possuíam selos externos que cor- riam no meio do envelope em linha horizontal e, em muitos casos, com um outro selo de uma linha correndo de cima para baixo no sentido vertical. Woods (2010) acrescenta a hipótese de que, com base nessas evidências históricas, os selos horizontais no meio do envelope poderiam representar um comprador ou um destinatário das mercadorias, enquanto que selos verticais poderiam representar o vendedor ou distribuidor ou talvez terceiros que teriam participado na operação ou atuaram como testemunhas. Na opinião de Woods (2010), os envelopes passaram a representar dispositivos que serviam de recibos de transações que envolviam venda de ativos, mediante a emissão do recibo de argila do valor e dos bens que estavam envolvidos na transação, considerando que, na opinião dele, existia uma maior necessidade de controle dos valores transacionados do que dos ativos que estavam nas mãos dos vendedores. Os selos passaram a representar mais uma garantia para os envolvidos em transações co- merciais. Era costume no antigo Oriente Médio, como aponta Schmandt-Besserat (1977b), tanto para os indivíduos, como para os estabelecimentos administrativos, possuírem uma pequena http://www.schoyencollection.com/mathematics-collection/pre-literate-counting/bulla-envelope-ms-4632 http://www.schoyencollection.com/mathematics-collection/pre-literate-counting/bulla-envelope-ms-4632 13 INTRODUÇÃO À CONTABILIDADE José Luiz dos Santos e Paulo Schmidt pedra esculpida com um padrão distinto que servia como uma marca de identificação. Esse mesmo padrão de garantia, passou a ser adotado nos envelopes, com a colocação de marcas, na forma de selos, para assinar e autenticar as transações. Schmandt-Besserat (1977b) sugere que alguns envelopes poderiam ser cobertos com até três ou quatro selos distintivos, sugerindo o uso de testemunhas para as transações, bem como o uso em possíveis cópias de envelopes, que eram enviados com emissários para realizar transações em outras localidades, além de servi- rem de garantia de outras informações, como dívidas, recibos de impostos e venda de terras. Além de vários tipos de selos de garantia, os envelopes poderiam variar de formato, como é o caso da Figura 1.7, que apresenta um modelo de envelope oval, medindo 2,5 cm por 6,5 cm, com uma corda presa nas extremidades, que, segundo Schøyen (2017e), possui um selo que repre- senta uma linha de animais andando para a esquerda e com dois homens de pé com os braços levantados. Figura 1.7: Envelope oval com uma corda presa nas extremidades Fonte: Recuperado de Schøyen, M. (2017e, maio 24). An academic & educational resource from the private collection – bulla: string of complex tokens. Recuperado de: http://www.schoyencollection.com/mathematics-collection/pre- -literate-counting/bulla-string-tokens-ms-4523. Esse envelope, que foi originalmente bloqueado nas extremidades com uma corda, possui um número de tokens complexos. Para Schøyen (2017e), esse envelope representa uma transação com materiais têxteis, tendo no selo a garantia de que nem o envelope e nem número de tokens pudessem ser violados ou quebrados. Diante disso, torna-se evidente que as transações comerciais eram representadas por trans- ferências de fichas de barro, refletindo a entrada ou saída física de ativos. Como por exemplo: a transferência de um carneiro de um pastor para outro representava a transferência de uma ficha de barro de um envelope para outro. Portanto, a entrada de uma ficha (representando um carneiro) dentro de um envelope (esse envelope representando um pastor “X” ou um curral) correspondia a um crédito na conta carneiro, contra um débito na conta pastor “X”, enquanto uma eventual saída dessa mesma ficha, desse mesmo envelope, caracterizava um crédito para a conta pastor “X” e a entrada dessa ficha em outro envelope (por exemplo, para o pastor “Y”) equivalente a um débito na conta pastor “Y”. Essa transferência de mercadorias de uma localização para outra caracteriza um sistema de partidas dobradas, pois efetivamente existe o registro de uma dupla entrada, apenas não existe o controle monetário dos sistemas contábeis de partidas dobradas, onde os valores são revisados para se certificar de que houve um lançamento a débito e a crédito com igualdade de valores. Assim, as características essenciais de um sistema de registro de partidas dobradas, segun- do Mattessich (1994) são estruturais e empíricas e podem ser resumidas nas seguintes: • simultâneo registro de dois aspectos de entradas e saídas em diferentes lugares (equiva- lentes, mas não necessariamente em contas idênticas) de um sistema;http://www.schoyencollection.com/mathematics-collection/pre-literate-counting/bulla-string-tokens-ms-4523 http://www.schoyencollection.com/mathematics-collection/pre-literate-counting/bulla-string-tokens-ms-4523 14 INTRODUÇÃO À CONTABILIDADE José Luiz dos Santos e Paulo Schmidt • a função da contabilidade junto com a utilidade de um controle empírico (fazer inventário e comparar com os registros) bem como com um controle tautológico não-monetário (os números e tipos de fichas no envelope devem ser exatamente iguais às impressões em sua superfície). Como uma forma de expressar o registro das relações sociais, os envelopes de barro repre- sentavam o débito ou o direito do proprietário em reclamar a mercadoria. A totalidade dos di- reitos era revelada através das impressões das fichas na sua superfície. Essas fichas impressas constituíam uma representação abstrata das fichas contidas no envelope. Essas impressões no exterior dos envelopes constituíam o total de itens individuais devidos por uma pessoa à outra, ou, por outro lado, o patrimônio próprio de uma pessoa. A entrada de uma ficha (representando um carneiro) em um envelope (representando a pessoa “A”) equivale ao débito na conta a receber “A” e crédito na conta carneiro. Esses registros caracterizavam as relações sociais semelhantes a uma dívida de uma pessoa e ao direito de reclamar esta dívida de outra pessoa. Segundo Schmidt e Santos (2006) para muitos pensadores contábeis, esse sistema de parti- das dobradas com fichas é considerado superior ao sistema de registro de partidas dobradas de hoje em dia, pois uma impressão sobre um envelope imediatamente revela-se como equivalente a um crédito de entrada em uma conta de patrimônio líquido, enquanto a transferência de uma ficha de envelope revela-se como um crédito de mercadoria ou alguma conta similar de ativo. Na versão mais sofisticada do sistema contábil pré-histórico com o uso ficha e envelope, fica evidente a dupla utilidade das fichas, pois sua impressão na superfície do envelope de barro re- presentava a realidade social da transação, ou seja, o direito do proprietário em relação ao ativo transacionado, e sua colocação dentro do envelope representava a realidade física, ou seja, o registro da movimentação da mercadoria. 1.2.2 Civilização Antiga Segundo Hendriksen (1999:41), as primeiras economias sofisticadas que se tem conhecimen- to surgiram no Oriente Médio e no Extremo-Oriente. A dinastia Shang, na China, remonta a 1600 a.C. e existem registros ainda mais antigos de uma cultura sofisticada na Índia que datam de 2300 a.C. O conhecimento dessas civilizações antigas atingiu seu ápice na Grécia antiga, onde se destacaram filósofos como Platão e Aristóteles, escritores como Homero e Sófocles e mate- máticos como Euclides e Pitágoras que influenciam o pensamento humano até os dias atuais. Por volta de 2000 a.C, os livros comerciais já eram obrigatórios no Egito. Os egípcios no afã de estruturar um complexo sistema de controle de impostos deram um grande passo no desen- volvimento da contabilidade ao escriturar suas contas com a sua moeda o shat de ouro ou prata. Entre 2100 e 1580 a.C ocorreu o apogeu agrícola e industrial na ilha de Creta, onde o Estado controlava toda a produção por intermédio de registros contábeis sistematizados, fatos esse consubstanciados na forma de tábuas de argila descobertos naquele local. Todavia, essas economias embora sofisticadas eram incompletas pois lhes faltava uma uni- dade de medida de valor. Com o surgimento da moeda e das medidas de valor, o sistema de contas ficou completo, sendo possível determinar as contas contábeis representantes do pa- trimônio e seus respectivos valores. Os historiadores possuem opinião difusa de que a primeira confecção de moeda tenha sido em Egina, pequena ilha no golfo de Atenas, em 869 a.C. feita de prata. As primeiras moedas que tiveram sua criação historicamente comprovada foram as de Lídia (na Ásia Menor), em 650 a.C., e na Grécia, em 600 a.C. Um marco histórico importante na evolução do conhecimento humano foi a invenção, pelos Fenícios, em 1100 a.C, da escrita alfabética (base para todas as escritas européias modernas). Segundo Schmidt e Santos (2006) um dos documentos contábeis mais evoluídos da Antigui- dade foi encontrado na Grécia e datava de 454 a 406 a.C. e pertencia ao templo de Atenas. Por volta do século III a.C., Alexandre, o Grande, discípulo de Aristóteles, criou o maior im- pério da Antiguidade e fundou a cidade de Alexandria em 332 a.C., local onde foi construída a maior biblioteca da Antigüidade, que após cem anos já continha mais de 500 mil manuscritos. 15 INTRODUÇÃO À CONTABILIDADE José Luiz dos Santos e Paulo Schmidt Esse é um marco importante não só para a história da contabilidade, mas para a história de todo o conhecimento humano, pois ali estava armazenada a maior parte do conhecimento humano da Antiguidade. Outro sistema de registros contábeis foi descoberto nas ilhas Cícladas datando de 454 a 90 a.C, o qual registrava os preços relativos dos produtos, o poder aquisitivo da moeda e o custo de vida daquela época. No século I os impérios clássicos da Eurásia (conjunto continental formado pela Europa e Ásia) viveram uma profunda crise. As incursões ao norte da China, nesse século, deram início a uma série de invasões que, nos quatro séculos seguintes, ameaçaram as civilizações estabele- cidas na Grécia, Roma, norte da China, Pérsia, Índia e Egito. Tais invasões foram causadas pelo avanço dos nômades da Ásia Central e resultaram no retrocesso da civilização do Mediterrâneo à China no início da Idade Média. As economias dessas regiões regrediram e se tornaram uma forma de autarquia patrimonial, ou seja, uma economia de subsistência. A Europa, principalmente, permaneceu atrasada. Foi um período de formação em que as sociedades primitivas fundiram-se em monarquias feudais. Mas o processo de consolidação foi lento e interrompido por incursões dos povos bárbaros. A Contabilidade, assim como todo ramo do conhecimento que avança com o desenvolvimento da cultura humana, não evoluiu neste período. No século II foram desenvolvidas as teorias astrólogas de Cláudio Ptolomeu, que influenciou o pensamento astronômico durante séculos e de onde surgiram os signos do zodíaco. Alguns registros contábeis datam desse período a exemplo dos agricultores egípcios que viviam às margens do rio Nilo e pagavam os coletores de impostos com cereais e linhaça. Pelo uso de água para irrigação, aos agricultores eram dados "recibos" que eram emitidos pelos co- letores, através do desenho, nas paredes de suas casas, de recipientes de cereais. Durante os séculos II e IV não houve eventos significativos relacionados ao conhecimento humano e a contabilidade. Em 455 d.C., a escassez de terras no Norte e no centro da Europa fez com que milhares de Vândalos e Godos (povos antigos da Germânia), saqueassem e vandalizassem o Império Romano, principalmente a cidade de Roma. Também os hunos, povo bárbaro asiático, sob o comando de Átila invadiram a Europa em meados do séc. V, forçando as tribos do Norte, ainda mais para oeste. Além disso, os anglos e os saxões, povos germânicos que habitavam na Alemanha, invadiram a Inglaterra entre os séculos V e VI, criando as bases de cultura anglo-saxônica. Esses eventos resultaram na dissipação do conhecimento grego e por volta de 646 d.C., quando os árabes chegaram em Alexandria, a grande biblioteca ali existente tinha sido comple- tamente destruída. Boa parte do conhecimento humano foi perdida devido a essa atrocidade cometida por povos desconhecidos. Nessa época, em Meca (atual Arábia Saudita), o profeta Maomé escreveu o Corão e fundou o Islã. Em menos de um século após a sua morte, os muçulmanos já haviam conquistado a maior parte da África e Oriente Médio e haviam penetrado na Europa sendo freados por Carlos Magno. A Espanha foi tomada pelos visigodos em 711 d.C., e a Sicília tornou-se uma província árabe. Entre 685e 705 d.C. Jerusalém foi ocupada. Os muçulmanos haviam chegado até a Índia. Em 765 d.C. o império Islã transferia a capital para a recém fundada cidade de Bagdá (atu- al capital do Iraque). Ali, o segundo califa Al-Mansur adoeceu e os membros de sua corte, em busca de sua cura, descobriram, nos penhascos da Irlanda, o mosteiro Jundi Shapur, que era ocupado por seguidores de Nestorius, um antigo patriarca de Constantinopla, banido em 431 d.C., por prática de heresia. Os nestorianos haviam levado cópia de vários manuscritos antigos em seu exílio, e com isso o conhecimento grego havia sido preservado. Em consequência disso, Bagdá tornou-se o centro do conhecimento no primeiro milênio, foi quando surgiu o conceito de zero, com base na descoberta indiana, e junto com ele o sistema numérico existente atualmente, descoberto na escola de astrologia de Bagdá através do biblio- 16 INTRODUÇÃO À CONTABILIDADE José Luiz dos Santos e Paulo Schmidt tecário e maior matemático do califa Musa Al-Khwarizmi. Esse conhecimento não se limitou a Bagdá, mas espalhou-se pela África e chegou a Espa- nha, para onde havia fugido o último califa Umayyad, após a conquista do poder islâmico pelos Abbasids. Como esse novo conhecimento se originava de diversas culturas árabes, judeus e cristãos trabalhavam harmoniosamente nas universidades de Córdoba, Sevilha, Málaga e Gra- nada, transformando-as nos centros intelectuais da Europa. A ascensão do islamismo foi um dos eventos mais significantes e de maior repercussão da história medieval e moderna. Como forma de conter a expansão do islamismo, os cristãos do ocidente criaram as cruzadas medievais com o objetivo de expulsar os muçulmanos da Terra Santa. Mesmo com as constantes catástrofes das cruzadas que arrasaram os Estados cristãos do Oriente, esta guerra santa contribuiu para o renascimento do Mediterrâneo como via maríti- ma, utilizado para dar vigor às atividades comerciais das cidades costeiras da Itália. Entre estas cidades, Veneza conheceu a supremacia comercial de toda costa oriental, do Mediterrâneo à Rússia meridional. A cidade de Florença desenvolveu-se como um grande centro industrial es- pecialmente na fabricação de lã e seda. No ano 1.000, Pisa e Gênova estavam começando a emergir das derrotas sofridas nas mãos dos sarracenos (nome dado pelos ocidentais, na Idade Média, aos muçulmanos). Nessa época, das cidades italianas do Norte, apenas Veneza praticava comércio ultramar. Mas a idade de ouro da Espanha nova não durou muito. Em 1085 d.C. Toledo havia sucumbido aos exércitos cristãos. Em 1258 d.C., Bagdá foi tomada pelos mongóis, os quais eram chefiados por Kublai Khan. Porém, o Oriente proporcionou mais do que o conhecimento contido nos livros, tais como a invenção da pólvora e da bússola. O maior progresso, porém, foi a invenção da vela latina (triangular) por volta de 1250 d.C. em substituição à vela romana. Esta última era quadrada e ideal para o vento de popa, contudo, se o vento fosse contrário, a mesma era inútil, ou seja, não era possível viajar contra o vento, logo o comércio até então estava limitado a navegar em uma direção em uma época do ano e na direção oposta em outra época. A vela latina propiciou as viagens em qualquer época do ano, pois possibilitava a navegação contra o vento. Essa vela aliada à invenção do leme de popa, provavelmente transmitida pelos árabes a partir dos chine- ses, permitiu a invenção da caravela portuguesa, embarcação que levou Bartolomeu Dias ao Cabo da Boa Esperança em 1488, e foi à nau antecessora do galeão que transportou Colombo em 1492 à América. Os navios proporcionaram os meios de transporte, mas a necessidade dos navios surgiu em 1079, com a tomada de Jerusalém pelos turcos, fato este que fez com que o papa Urbano II, 16 anos mais tarde, declarasse a guerra santa, chamada de a Primeira Cruzada. Essas cruzadas, especialmente no final do séc. XI até o final do séc. XII impulsionaram o de- senvolvimento do comércio, principalmente entre as cidades italianas e o Oriente. Os cruzados necessitavam de navios e alimentos e em troca traziam sedas, especiarias e corantes. Em fun- ção disso, mercadores de Gênova, Amalfi e Veneza enriqueceram. Com o crescimento do comércio, a negociação individual ia sendo substituída pelo comércio por meio de representantes e associações os quais permitiam que os riscos das grandes nave- gações fossem compartilhados aliando a riqueza do capitalista à audácia dos jovens mercado- res. Surgia então uma sociedade denominada “commenda”, onde o capital fornecido pelo sócio capitalista commendator era como um empréstimo ao sócio ativo tractator. Esse mecanismo característico dessa sociedade evitava então o pagamento de juros, prática censurada pela Igreja na época. Esse fato foi marcante na história da contabilidade, pois surgia aí o postulado da entidade, que será tratado posteriormente, devido à necessidade do reconhecimento da firma como en- tidade separada e distinta das pessoas de seus proprietários, uma vez que esta relação exigia uma prestação de contas ao final da viagem para que se dividisse o lucro obtido. Contudo, o aumento do comércio em função das viagens teve um efeito colateral trágico: disseminar mais rapidamente as doenças e, em 1347, alguns marinheiros retornaram a Marselha 17 INTRODUÇÃO À CONTABILIDADE José Luiz dos Santos e Paulo Schmidt de Coffa, no Mar Negro, trazendo consigo a peste bubônica, que em um curto espaço de tempo se espalhou pela Europa e dizimou um terço da população desse continente, evento que ficou conhecido como a “peste negra”. Com a morte dessas pessoas, fortunas foram deixadas aos sobreviventes; a escassez de mão-de-obra fez subir os salários e o sistema feudal começou a declinar, uma vez que os cam- poneses deixavam o campo em função desses salários mais altos. A propriedade privada come- çou a suplantar a pose conjunta da Idade Média, estava surgindo aí a base de nossa sociedade. Na área do conhecimento, o efeito foi um aumento do custo de produção dos manuscritos em função da morte de tantos literatos. O final do século X foi marcante para a recuperação da Europa, em relação ao período pre- cedente de devastação e revés econômico. Cessadas as invasões, rapidamente a situação se inverteu. A abertura de novas terras para a lavoura foi a base do processo de recuperação. Ex- cedentes agrícolas tornaram-se disponíveis para o comércio, o que estimulou a fundação e o crescimento de cidades, mercados e feiras. 1.2.3 Civilização Moderna Como foi possível verificar, a Contabilidade na civilização antiga teve um papel insipiente. O fluxo transacional não exigia modelos complexos de controle, fazendo com que a Contabilidade não tivesse o avanço que teve nos séculos seguintes. Com o ressurgimento da atividade econômica, renasce, também, a importância da Contabi- lidade. Para MeIis (1950), o século XIII foi o período que marcou o fim da era da Contabilidade Antiga e o início da era da Contabilidade Moderna. O surgimento do comércio em grandes quantidades desencadeou a necessidade de controle patrimonial. A Contabilidade despontou como o instrumento capaz de fornecer as informações necessárias para o gerenciamento dos negócios. Como os mercados consumidores cresceram e transcenderam os muros das cidades, prin- cipalmente em cidades marítimas como Veneza, no mar Adriático, e Gênova, no Tirreno, tanto comerciantes como consumidores necessitavam de controle de suas mercadorias e de seus ne- gócios. O fluxo de dinheiro envolvido nestas transações aos poucos foi tomando vulto, surgindo, então, a necessidade de controle de entradas e saídas de caixa. A Contabilidade, naturalmente, foi criando sistemas para controle de toda essa movimentação patrimonial. Começaram a surgir as primeiras grandes obras que deram um passo decisivo para a fixação da Contabilidade como um instrumento útil no controle patrimonial. Pesquisas sobre a origem das técnicas de escrituração contábil transportam para o períodoentre os séculos XII e XIII, no norte da Itália, as primeiras manifestações práticas do uso do sistema de partidas dobradas em empresas. Após estas primeiras práticas contábeis é que seu uso se generalizou por toda Europa. Cidades como Florença e Gênova, entre outros centros comerciais, também desenvolveram o sistema de partidas dobradas, independentes do sistema veneziano apresentado por Luca Pacioli. Como ficou demonstrado anteriormente, mesmo que os primeiros sistemas de partidas do- bradas, com a utilização de fichas de barro, tenham sido utilizados na pré-história, embora o uso generalizado deste sistema de registro contábil tenha começado a ser implementado so- mente com o advento da chamada revolução comercial ocorrida após o século XII. Dois grandes motivos podem ser apontados como os propulsores do desenvolvimento dos sistemas contábeis de partidas dobradas: 1. o desenvolvimento econômico na área abrangida entre as cidades de Veneza, Gênova e Florença, criando um ambiente de negócios e um nível comercial bem mais sofisticado que o conhecido até então, dando origem a uma demanda por sistemas contábeis mais sofisticados; 2. a aprendizagem da tecnologia de impressão de livros na Alemanha e sua rápida disse- minação para os grandes centros comerciais da Europa, principalmente para o norte da 18 INTRODUÇÃO À CONTABILIDADE José Luiz dos Santos e Paulo Schmidt Itália. O desenvolvimento e a propagação das partidas dobradas auxiliaram o homem a atravessar o último período medieval experimentado pela Europa, facilitando a solidificação de um novo pe- ríodo histórico, onde novas formas de administrar e comercializar foram implantadas. O movi- mento Renascentista (movimento que, no começo dos tempos modernos, procurou renovar não só as artes plásticas e as letras, mas também a organização política e econômica da sociedade) e o capitalismo criaram novas condições sociais, permitindo que mais pessoas acumulassem bens e riquezas. Essa nova situação teve implicações nos negócios e, sem dúvida, nas práticas contábeis. Alguns eventos causaram o desenvolvimento econômico do norte da Itália depois do ano 1100. O primeiro foi o aumento rápido e generalizado da população, que ocorreu até metade do século XIV, quando uma praga reduziu a população para um terço e as oportunidades eco- nômicas oferecidas pelas Cruzadas. Além disso, a invasão dos turcos à Jerusalém, em 1075, e os conflitos com exércitos europeus por duzentos anos, criou um caminho fértil de comércio entre a Europa e o Oriente Médio. As cidades de Gênova, Veneza e Florença foram, ao longo da história, pontos de contato de negócios com o Oriente Médio. Essas três cidades cresceram, prosperaram e tornaram-se locais importantes de comércio com todo norte da Europa. Essa posição central no comércio mundial exercido por estas cidades, resultou em um aumento por todo tipo de serviço especializado, entre os quais inseriu-se a Contabilidade. A data precisa de quando foram introduzidos os primeiros sistemas contábeis utilizando par- tidas dobradas não é conhecida, mas uma das primeiras manifestações de seu uso para fins empresariais foi por volta de 1340, na cidade de Gênova. Esse primeiro sistema de partidas dobradas foi desenvolvido por um funcionário público que ficou responsável pela tesouraria da cidade de Gênova, por um período de um ano. No final des- te período, ele já possuía todo controle do caixa e de outros itens para prestar contas à comuni- dade. Esse ciclo contábil de um ano e o balanço das contas apresentadas por esse funcionário público criou uma necessidade fundamental de responsabilidade e controle sobre os negócios públicos. Os procedimentos de controle contábil das contas da tesouraria e a determinação de um ciclo contábil, determinados por ele, ajudaram a expandir os métodos contábeis nesta cidade. Sistemas incompletos de escrituração por partidas dobradas foram encontrados nas con- tas de Giovani Farolfi & Companhia, uma empresa de mercadores de Florença datados de 1299 e 1300 e nas de Rinieri Fini & Irmãos, que negociavam em feiras na região de Champagne, na França. Além disso, existem vários indícios que o sistema contábil de partidas dobradas surgiu simul- taneamente em várias localidades ao mesmo tempo, em resposta a pressões similares de novas condições econômicas, sociais e culturais vividas por estas regiões. O início do crescimento econômico de Florença datado de, aproximadamente, 1100, gerou a transformação de uma ci- dade agrícola e feudal em um centro cosmopolita de banqueiros e comerciantes. A primeira moeda de ouro cunhada na Europa foi em Florença, em 1252. Esse fato marcou a origem de um enorme sucesso comercial de vários negócios para Florença, especialmente ligados a atividade bancária. Grandes sociedades familiares foram criadas, levando Florença a se tornar o maior centro comercial da Europa. Isto, sem dúvida, gerou a necessidade do desen- volvimento de sistemas mais sofisticados para o controle dos negócios que os existentes na época, especialmente no que se refere ao registro das participações sociais. A Contabilidade desempenhou um importante papel neste momento inicial do desenvolvi- mento econômico da região, principalmente pelo tipo de sociedade participativa que estava surgindo na época. Era preciso que os registros das responsabilidades e dos montantes de participação nas sociedades ficassem corretamente guardados. Para isso, como afirma Mills (1994): livros contábeis foram abertos e no início do século XIV os primeiros manuscritos revelaram débitos e créditos em parágrafos verticalmente dispostos. Isto era uma evidência de que razões com sistema de partidas dobradas existiam desde 1335. 19 INTRODUÇÃO À CONTABILIDADE José Luiz dos Santos e Paulo Schmidt Um outro manuscrito encontrado em Florença, escrito entre 1330 e 1340, apresenta um so- fisticado sistema de partidas dobradas, criado de forma independente das outras regiões onde, também por esta época, aflorou o uso destes processos de registro de transações. Mesmo que o sistema de partidas dobradas tenha sido desenvolvido em mais de uma cidade simultaneamente, Veneza tornou-se a mais conhecida mundialmente, devido ao momento his- tórico vivido por esta cidade. No início do século XV, Gutenberg revolucionou o mundo com a invenção do tipo móvel (imprensa). Em 1457 foi publicado em Mainz um livro de Gutenberg, e em 1494, foi publicado o primeiro livro que apresenta o sistema de partidas dobradas. Veneza havia então se transformado no centro mundial da imprensa. O líder era Aldus Manu- tius que até a sua morte em 1515, havia traduzido todo o autor grego conhecido, para que nunca mais a destruição de uma biblioteca significasse o fim do conhecimento humano, foi este fato que viabilizou a publicação de Pacioli. A preocupação dos primeiros autores estava em descrever e apresentar exemplos de como registrar transações em livros contábeis através de partidas simples ou dobradas. A Contabili- dade, para eles, deveria preocupar-se especialmente com o processo de escrituração e com as técnicas de registro através dos sistemas de contas. Com o fim do feudalismo, a Europa viveu uma transformação econômica com um novo dire- cionamento voltado para o capitalismo. O aumento dos negócios e das atividades comerciais demandou o aumento de controle através de sistemas contábeis mais sofisticados e sistema- tizados. Com esses pensamentos transformadores muitos estudiosos contábeis da época procura- ram desenvolver modelos contábeis para apoiar o desenvolvimento econômico que o mundo, principalmente a Europa, estava vivendo. Para esses pensadores contábeis, o processo de escrituração contábil deve estar subordina- do ao funcionamento das contas. O objetivo das contas é sempre o de registrar uma dívida a re- ceber ou a pagar, ou seja, o processo central de registro do haver e do dever. Esta preocupação com o registro das contas a receber e a pagar coincide com a origem do crédito nas relaçõescomerciais, pois para a mesma pessoa existem duas situações distintas em relação ao crédito: ou está devendo ou tem a haver. Esse pensamento predominante dos estudiosos da época ca- racteriza a chamada Escola Contista. Assim, de acordo com os contistas, todas as contas deveriam ser abertas em nome das pes- soas que transacionavam com a empresa. Portanto, quem recebe um ativo da empresa para administrar, por exemplo o caixa, deve este montante à empresa, por isso uma conta devedora, pois a pessoa deve para a empresa. Por outro lado, quem entrega algo à empresa, por exemplo um fornecedor de bens, tem em haver relação a ela, ou seja, tem um crédito. Essa personificação característica do contismo explica porque o ativo é devedor, bem como porque o passivo é credor. A contabilidade, nessa época, traduzia as transações das pessoas que negociavam com a empresa, diferentemente do que ocorre hoje, onde o foco é traduzir a Contabilidade da empresa em relação aos seus agentes. Como o número de transações aumentou muito com o abandono do feudalismo e com o in- gresso em um regime sócio-econômico onde os meios de produção passaram a pertencer a qualquer pessoa que possuía capital, as relações de crédito entre compradores e vendedores também cresceram. Esse crescimento transformou, mesmo para os pequenos comerciantes, a forma de tratamento destas relações comerciais. As contas contábeis foram um dos mais há- beis instrumentos utilizados para registrar estas relações. O contismo, centrado no problema de evidenciar os saldos das contas a receber e a pagar e seguindo os princípios ditados pelos primeiros trabalhos escritos sobre técnicas comerciais, seguiu a regra de quem recebe deve e quem entrega tem a haver. As contas, na realidade, repre- sentam o conjunto de débitos e de créditos que uma pessoa tem em relação à outra. As contas a receber e a pagar, com o desenvolvimento da teoria das contas, ao longo dos anos, uniram-se a várias outras contas representando valores e outros bens como: dinheiro, mercadoria etc. Sua movimentação seguia os mesmos princípios ditados para as contas a receber: eram debitadas 20 INTRODUÇÃO À CONTABILIDADE José Luiz dos Santos e Paulo Schmidt quando aumentavam e creditadas quando diminuíam. Por outro lado, as contas de passivo deve- riam funcionar de forma equivalente à movimentação das contas a pagar, ou seja, aumentavam com créditos e diminuíam com débitos. O primeiro modelo impresso de partidas dobradas foi apresentado pelo frei Luca Pacioli, considerado um grande matemático do século XV e universalmente conhecido por ter incluído em sua obra “La Summa de Arithmetica, Geometria, Proportioni et Proportionalitá” o Tratado XI (do título IX), intitulado “De computis et scripturis”, onde está inserido o método de registro con- tábil de Partidas Dobradas, conhecido, na época, como o método de Veneza. Pacioli justificou a inclusão de seu tratado na “Summa” dizendo que decidiu inclui-lo por achar grandemente necessário ao mercado que deve saber registrar corretamente suas contas, a partida de crédito e de débito e seus correspondentes e também determinar os lucros e per- das de todo negócio. Para Pacioli, o comerciante deveria ser um bom conhecedor de registros contábeis e deveria, a qualquer momento, ter noção exata de suas transações. Essa obra foi dedicada ao Duque de Urbino (Príncipe Guidobaldo di Montefeltro) e foi escrito na língua materna para poder ser utilizado por todos os interessados, sem distinção. Era co- mum na época que os trabalhos científicos fossem escritos em latim e não em italiano. Embora, para os iniciantes no conhecimento contábil, Luca Pacioli seja apresentado como o criador das partidas dobradas, ele foi, na verdade, o primeiro grande divulgador desse sistema contábil de registro, pelo fato de coincidir a época de sua obra com a introdução da impressão na Itália. Na época da publicação do “Summa”, já existiam em Veneza por volta de 200 tipogra- fias funcionando. A escolha de Veneza como o local para publicação de seu trabalho deve-se, especialmente, ao fato de Veneza ter sido, na época, a cidade com as principais tipografias e centro do comér- cio mundial. O “Summa” foi impresso em duas partes, cada uma com paginação própria. A primeira par- te está dedicada, praticamente, à aritmética e álgebra. Esta primeira parte, que inclui alguns cálculos comerciais, foi dividida em oito títulos e apresentada nas primeiras 150 páginas. O restante da primeira parte, com 74 páginas, consiste do nono título, que possui 12 tratados, no qual está incluído o famoso tratado XI. A segunda parte do “Summa” é composta de 76 páginas e é dedicada à geometria. Hoje, quinhentos anos após a primeira publicação da obra “La Summa de Arithmetica, Geome- tria, Proportioni et Proportionalitá”, o leitor tem dificuldade de entender, ou de simplesmente ler o livro, devido a sua característica semigótica de impressão e de um grande número de abre- viaturas, criando grandes dificuldades ao leitor não habituado com escrita antiga. Assim, constata-se que um conjunto de eventos, qual seja a escrita, o desenvolvimento arit- mético, o uso da moeda como denominador comum, que se denomina capacidade de expressão e um outro conjunto de eventos de natureza institucional, tais como: conceito de propriedade privada, desenvolvimento do crédito, acumulação de capital, foram os principais fatores que influenciaram a criação do conceito de entidade e do cálculo do lucro, e foi na Itália do século XIV que convergiram parte considerável da sabedoria acumulada de gerações de estudiosos da Grécia, Mesopotâmia, Egito, Índia e Oriente Médio. As mudanças políticas e doenças destruíram a antiga ordem social e lançaram a base de uma nova ordem social. Portanto, a contabilidade foi um produto do Renascimento vivido pela Europa. 21 INTRODUÇÃO À CONTABILIDADE José Luiz dos Santos e Paulo Schmidt CAPÍTULO 2 A CONTABILIDADE COMO CIÊNCIA 2.1 OBJETIVOS DE APRENDIZADO DO CAPÍTULO Após o estudo deste capítulo, o leitor deverá ser capaz de: 1. Diferenciar arte, técnica e ciência; 2. Definir a contabilidade como uma ciência factual social; 3. Identificar o campo de aplicação da contabilidade; 4. Definir o objeto e objetivos da contabilidade; 5. Identificar as principais tarefas do contador; 6. Identificar os principais usuários da contabilidade. 2.2 A CLASSIFICAÇÃO DA CONTABILIDADE DENTRE OS RAMOS DO CONHECIMENTO HUMANO 2.2.1 Aspectos Introdutórios Embora a comunidade contábil tenha comemorado há poucos anos o quingentésimo ani- versário da publicação da obra de Luca Pacioli, ainda não existe unanimidade sobre a natureza teórica e doutrinária da Contabilidade. Por um lado, existem grupos de pensadores contábeis que defendem que a Contabilidade é uma técnica ou uma arte; por outro, existe um grupo que defende a sua natureza como ciência. Essa controvérsia sobre a natureza da disciplina contábil, embora possa parecer, num pri- meiro momento, despertar interesse apenas da academia, vem centrando as atenções de ou- tras áreas da comunidade contábil, como as associações profissionais, pois essa polêmica tem reflexo direto nos blocos econômicos (Mercosul, Nafta, Comunidade Econômica Européia etc.) que buscam mercados comuns, pois, dentro desses blocos “sem barreiras”, ambiciona-se a har- monização de normas e procedimentos contábeis. 2.2.2 A Contabilidade como uma Arte Os primeiros tratadistas contábeis centraram suas atenções no estudo das contas, espe- 22 INTRODUÇÃO À CONTABILIDADE José Luiz dos Santos e Paulo Schmidt cialmente nas formas de registro, ou seja, como afirma Viana (1955), a Contabilidade era “en- tendida como a arte de levar as contas”. Não existia, nesse período inicial, a preocupação com a sistematização doutrinária da Contabilidade. Para os defensores da Contabilidade como arte, este substantivo não traduz a expressão do belo, mas a capacidade que tem o homem de pôr em prática uma ideia, valendo-se da faculdade de dominar a matéria.A discussão em torno da classificação da Contabilidade como arte pode cair por terra através de uma análise mais apurada do substantivo arte. Segundo Tesche (1991) “Arte é a manifestação do belo, produto de intensas emoções estéticas do artista, ligado a condições diversas de épo- ca, de povo, de cultura”. Embora, no entendimento comum, arte possa representar todo tipo de atividade ordenada. Em geral pode-se dizer que “a arte tem por objetivo exprimir a beleza, e a ciência formular a verdade”. Defender que a Contabilidade é uma arte, portanto, vai de encontro ao seu próprio significa- do, especialmente no que tange que a arte representa uma manifestação da criatividade e de emoções do homem, ou seja, exprime o sentido de beleza criadora. Contabilidade, ao contrário, caracteriza-se por representar uma conjugação de elementos lógicos e racionais que não se manifestam através do espírito criador do belo artístico. Talvez, o mais próximo do belo que a contabilidade tenha se aproximado tenha sido em re- lação à beleza da forma da escrita dos registros contábeis, no tempo em que eles eram feitos através da escrita. 2.2.3 Contabilidade como uma Técnica Para se classificar a contabilidade como uma técnica ou uma ciência, é necessário que antes se proceda a uma breve incursão sobre o significado desses substantivos. Técnica representa um processo ordenado, isto é, segundo regras, de qualquer atividade humana. Em sua acepção original, técnica significa toda realização de coisas sensorialmente perceptíveis ao serviço de uma necessidade ou de uma ideia; denota, por conseguinte, a habi- lidade ou destreza, tanto para o necessário (produzir coisas) quanto para o belo (tornar visível uma ideia). Em razão disso, o vocábulo, técnica indica o formal, as regras comunicáveis da dita realiza- ção (por exemplo, de tocar piano). A técnica, em oposição à arte, é a utilização de recursos e forças da natureza endereçada a satisfazer as necessidades humanas. Enquanto ofício manual (a técnica artesanal) se limitou, durante muito tempo, a aplicar me- ros instrumentos (meios para atuar corporalmente, em sentido estrito: sem aumento da força de trabalho) e as chamadas máquinas de trabalho (ferramentas movidas à mão, com acréscimo de força operativa, por exemplo, a cunha, a roldana), a técnica da época moderna (técnica mo- derna) progrediu até chegar a usar máquinas de força (ferramentas movidas por forças naturais; por exemplo, a máquina a vapor). Esse progresso só se tornou possível graças a um amplo conhecimento da natureza. Por- tanto, técnica pode ser definida como o aproveitamento ordenado dos recursos e das forças naturais, baseado no conhecimento da natureza e colocado a serviço da satisfação das neces- sidades humanas. Diante da definição do substantivo técnica, que sinteticamente significa a realização de coi- sas sensorialmente perceptíveis, denotando habilidade ou destreza, tanto para a produção de coisas quanto para a exteriorização de ideias, ou seja, técnica indica o formal, o como fazer, constata-se que a contabilidade possui uma técnica intrínseca que faz parte de seu processa- mento. No entanto, a atividade contábil, caracterizada por um conjunto de atitudes e atividades ra- cionais que objetiva o sistemático conhecimento econômico e financeiro de uma entidade, não pode ser reduzida a uma técnica realizatória de uma atividade. 2.2.4 Análise do Substantivo Ciência Segundo Schmidt e Santos (2006) entende-se por ciência todo conhecimento que se deduz 23 INTRODUÇÃO À CONTABILIDADE José Luiz dos Santos e Paulo Schmidt pela razão, portanto reflexivo, sustentado na racionalidade lógica. De acordo com Trujillo Fer- rari (1982) “ciência é um conjunto de atitudes e de atividades racionais, dirigidos ao sistemático conhecimento com objetivo limitado, capaz de ser submetido à verificação“. Analisando esta peculiaridade científica, percebe-se que a ambiguidade conceitual da Con- tabilidade pode ser resultado do não entendimento do aspecto técnico inerente ao processo científico. A tecnicidade sendo intrínseca (fazendo parte) à maioria das ciências pode resultar em uma inepta conclusão de que Contabilidade é uma técnica e não uma ciência. As ciências possuem objetivos e objeto. O objetivo é a preocupação em distinguir a carac- terística comum ou as leis gerais que regem determinados eventos. Objeto em sentido amplo (lato) é tudo aquilo a que se dirige o ato consciente de um sujeito. Em sentido restrito (stricto), objeto significa não toda ou qualquer ação conhecida ou desejada, mas unicamente aquela que está diante do sujeito, com independência deste e ao qual este se deve amoldar. O objeto divide-se em material e formal. Objeto material é aquilo que se pretende estudar, analisar, interpretar ou verificar de modo geral. Objeto formal é o enfoque especial, em face de que as diversas ciências possuem o mesmo objeto material. Assim, o que caracteriza cada ciência é o seu objeto formal, ao passo que o mesmo objeto material pode ser comum a várias ciências, a exemplo dos bens que são objeto material da Con- tabilidade, Direito e Economia. 2.2.5 Contabilidade como uma Ciência Dentre os estudiosos que defendem a natureza científica da contabilidade, também existe divergência quanto ao ramo científico a que pertence a contabilidade. Para alguns, é uma ciên- cia social, para outros uma ciência natural, embora a grande maioria dos defensores da conta- bilidade como ciência, acreditam que ela seja uma ciência factual e não formal, como pensava Giovanni Rossi e outros que tangenciaram a escola matemática como Pierre Garnier, Jean Du- marchey e Rene Delaporte. Essa discussão, diante da extensão histórica da contabilidade (aproximadamente de dez sé- culos), é recente e frutífera, pois a defesa da contabilidade como um ramo de conhecimento científico não ultrapassa mais de um século, muito pouco diante da grandiosidade do surgimen- to dos primeiros sistemas contábeis ainda no período pré-histórico mesolítico. Obviamente, não se poderia afirmar que a contabilidade sempre foi uma ciência, ao contrá- rio, afirmar que a contabilidade se manifestou, inicialmente, como uma técnica é uma asseve- ração irrefutável. Assim, embora os primeiros sinais da contabilidade, como afirma Mattesich (1994), tenham aparecido 8.000 a.C., a contabilidade somente tornou-se conhecida da sociedade após a publi- cação da obra de Pacioli, em razão de alguns fatos históricos coincidentes com a publicação do “La Summa de Arithmetica Geometria, Proportioni et Proportíonalítá”. Certamente, Pacioli não foi o inventor das partidas dobradas. Anteriormente a ele, vários es- tudiosos da Contabilidade já haviam escrito sobre este método de registro contábil, como foi o caso de Benedetto Cotrugli que escreveu, em 1484, o manuscrito, que inicialmente contou com pouquíssimos exemplares, denominados: “II Iibro deII’arte di mercatura” defendendo o registro contábil em partidas dobradas. Este trabalho de Cotrugli foi impresso somente cento e quinze anos após a publicação do manuscrito original. Pacioli, ao contrário, teve a sorte de escrever sua obra em uma época em que a impressão de livros já havia sido introduzida na Itália pelos alemães Corrado Schweinheim e Arnold Pannartz, embora o primeiro livro impresso tenha sido feito na China em 853. Essa coincidência coloca Pacioli como o grande divulgador da técnica contábil de registro por partidas dobradas, como já foi apresentado anteriormente, ainda que não seja verdadeira a afirmação de que ele tenha sido o primeiro a apresentar este método de registro contábil. Além disso, na opinião de Popper (1986), o domínio de um dos campos está incluído no outro, ou seja, o domínio de um dos campos representa um componente de um sistema que inclui o domínio do outro. Transportando esta afirmação para o campo contábil, verifica-se que a con- 24 INTRODUÇÃO À CONTABILIDADE José Luiz dos Santos e Paulo Schmidt tabilidade possui campos de investigação contíguos coma economia, com a administração, que resulta em um inter-relacionamento entre as disciplinas. Diante desta exposição, a classificação da contabilidade como uma disciplina de nature- za não científica, toma-se mais difícil; portanto, optou-se pela classificação da contabilidade como uma ciência. A Contabilidade, dentre as classificações científicas existentes, enquadra-se como uma ci- ência factual, tendo em vista que apresenta as características necessárias para ser considera- da uma ciência, além de exibir os elementos característicos de uma ciência social, pois, embora seus fenômenos não se confundam com os sociais, o fator social é preponderante. Os usuários da contabilidade sofrem passivamente pressão da massa social e dos fenômenos econômicos. Com base nos elementos apresentados, optou-se por incluir a contabilidade como uma ci- ência factual. Dentre as ciências factuais, a que melhor traduz a natureza da contabilidade é a social. Portanto, definiu-se, que a contabilidade é uma ciência factual social. A natureza social da contabilidade traduz-se na preocupação pela qual a compreensão da maneira com que os indi- víduos ligados à área contábil criam, modificam e interpretam os fenômenos contábeis, sobre os quais informam seus usuários; representa a realidade que deve ser observada por esse ramo do conhecimento humano. A preocupação do contabilista não está apenas em apreender, quantificar, registrar e infor- mar os fatos contábeis da entidade, mas em analisar e revisar estes fatos, demonstrando suas causas determinantes ou constitutivas. Embora essa classificação possua uma certa unanimidade em termos de comunidade con- tábil, existem grupos que não aceitam esta posição, negando, em casos extremos, a própria autonomia da disciplina contábil. Como consequência direta dessa falta de consenso em rela- ção à natureza da disciplina contábil, qualquer tipo de tentativa de harmonização de normas e procedimentos contábeis, tanto em termos de comunidades econômicas como em termos de comunidades acadêmicas, poderá gerar resultado insatisfatório para o crescimento da conta- bilidade como disciplina autônoma. Diante do exposto, verifica-se que embora a Contabilidade, mesmo que de forma não siste- mática, já exista a mais de 10.000 anos, ainda não existe unanimidade sobre sua natureza. Para alguns, ela classifica-se como arte; para outros, como técnica ou, ainda, como ciência. Mas, apesar desses posicionamentos controversos, optou-se pela classificação da contabilidade como uma disciplina de natureza científica enquadrando-se como uma ciência factual, social, considerando que o fator social é preponderante na atividade contábil. 2.3 CAMPO DE APLICAÇÃO DA CONTABILIDADE A Contabilidade é uma Ciência social factual que tem por objeto o estudo das variações, qua- litativas e quantitativas ocorridas no patrimônio das entidades. Assim, a função da contabilidade é a de captar, registrar, acumular, estudar e interpretar (analisar) os fenômenos contábeis originados da gestão patrimonial de pessoas físicas ou jurí- dicas. A CONTABILIDADE , capta, registra, acumula, estuda e interpreta os FATOS CONTÁBEIS , isto é, os fenômenos que afetam a situação patrimonial, financeira e econômica das PESSOAS Físicas entidades com fins lucrativos Jurídicas entidades sem fins lucrativos 25 INTRODUÇÃO À CONTABILIDADE José Luiz dos Santos e Paulo Schmidt 2.4 OBJETO E OBJETIVO DA CONTABILIDADE O objeto formal da contabilidade, que delimita o campo de abrangência dessa ciência que se pretende estudar, analisar, interpretar e verificar de modo geral, é o estudo do patrimônio das entidades em seus aspectos qualitativos e quantitativos. O objetivo de uma ciência, como já definido anteriormente, tem a preocupação de distinguir a característica comum às leis gerais que regem determinados eventos. O objetivo da Contabilidade, então, pode ser estabelecido como sendo o de fornecer infor- mação como suporte à tomada de decisão, tanto dos usuários internos, como dos usuários externos das entidades. 2.5 FINS DA CONTABILIDADE Os principais fins da contabilidade são os de assegurar o controle do patrimônio e fornecer informações sobre a sua composição e as variações patrimoniais, bem como sobre o resultado das atividades econômicas desenvolvidas pelas entidades. 2.6 PRINCIPAIS TAREFAS DO CONTADOR As principais tarefas desenvolvidas pelo contador são: • Escriturar as operações; • Elaborar as demonstrações contábeis; • Elaborar o planejamento tributário da entidade; • Elaborar as declarações (obrigações acessórias da empresa). 2.7 USUÁRIOS DAS INFORMAÇÕES CONTÁBEIS Considera-se usuário da informação contábil toda a pessoa física ou jurídica que tenha inte- resse na avaliação da situação e do progresso de determinada entidade, seja ela empresa, com fins lucrativos ou não, ou mesmo patrimônio familiar. Os usuários podem ser separados em dois grupos: usuários internos e usuários externos. Os usuários internos são aqueles que atuam dentro da empresa, tais como funcionários, ad- ministradores, gerentes etc. O administrador, como um dos principais usuários internos, utiliza a contabilidade para fins de controle e planejamento da entidade. CONTROLE ► Verificar se a organização está agindo de acordo com os planos e políticas previamente traçadas (medir desempenho). PLANEJAMENTO ► Definição de planos e políticas futuras com base nas informações con- tábeis. Os usuários externos são os investidores, sócios, acionistas, fornecedores de bens e ser- viços, as instituições financeiras, o governo, os sindicatos, a Comissão de Valores Mobiliários (CVM), entidades de classe etc. Cada um desses usuários possui um interesse específico nas informações contábeis. Por exemplo, ao Governo interessa tanto para a cobrança de tributos como para coletar dados es- tatísticos (IBGE), aos fornecedores para a análise da capacidade de pagamento, as instituições financeiras para concessão de crédito, aos investidores interessa obter informações para deci- dir sobre as melhores alternativas de investimentos. 26 INTRODUÇÃO À CONTABILIDADE José Luiz dos Santos e Paulo Schmidt 27 INTRODUÇÃO À CONTABILIDADE José Luiz dos Santos e Paulo Schmidt CAPÍTULO 3 ESTUDO DO PATRIMÔNIO 3.1 OBJETIVOS DE APRENDIZADO DO CAPÍTULO Após o estudo deste capítulo, o aluno deverá ser capaz de: 1. Diferenciar Patrimônio de Patrimônio líquido; 2. Conceituar bens, direitos e obrigações; 3. Conceituar ativo, passivo e patrimônio líquido; 4. Compreender as várias definições de capital existentes. 3.2 CONCEITO: Patrimônio é o conjunto de bens materiais e imateriais, direitos e obrigações avaliáveis em moeda e vinculados à entidade pela propriedade, posse ou controle, dos quais a mesma possa dispor no desenvolvimento dos seus negócios. É o conjunto de bens, direitos e obrigações pertencentes a uma ou mais pessoas físicas ou a uma pessoa jurídica, utilizado na atividade econômica ou social, com a finalidade lucrativa ou não. 28 INTRODUÇÃO À CONTABILIDADE José Luiz dos Santos e Paulo Schmidt 3.3 ASPECTOS DO PATRIMÔNIO O patrimônio não é objeto de estudo exclusivo da contabilidade, mas é também objeto de estudo de outras ciências, a exemplo do Direito, que estuda as relações jurídicas a ele rela- cionadas, e da Economia que estuda a maximização da sua utilização, já que os mesmos são escassos etc. Do ponto de vista contábil, o patrimônio pode ser visto sob dois aspectos: aspecto qualitati- vo e aspecto quantitativo. 3.3.1 ASPECTO QUALITATIVO Considera as espécies de elementos que compõem o patrimônio. O patrimônio das entida- des, objeto de estudo da contabilidade é composto de diversos bens econômicos heterogêne- os, sob esse aspecto a contabilidade estuda a natureza dos elementos que o compõe, como máquinas, edificações, dinheiro, valores a pagar, valores a receber, estoques etc. 3.3.2 ASPECTO QUANTITATIVO Refere-se à expressão dos elementos patrimoniais em valores e é representado pela dife- rença aritmética
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