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✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ Aula PROPRIEDADES ALGÉBRICAS DE R 1 O b j e t i v o s Ao final desta aula, você deverá ser capaz de: 1 identificar propriedades algébricas básicas dos números reais e aplicá-las em raciocı́nios matemáticos; 2 escrever demonstrações de propriedades básicas dos números reais usando adequadamente a linguagem matemática. ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ Fundamentos de Análise Real | Propriedades Algébricas de R INTRODUÇÃO O objetivo deste texto é estudar cuidadosamente, do ponto de vista matemático, as propriedades especı́ficas dos números reais que levam aos resultados conhecidos do Cálculo Diferen- cial. E também, discutir a questão do “infinito contı́nuo” de R, que permite a representação geométrica dos números reais como pontos de uma reta. Ou seja, o enfoque da disciplina de Fundamentos de Análise Real (FAR) será estudar o conjunto R a partir de suas propriedades. Para isto, um ponto de partida foi escolhido: certas propriedades básicas dos números reais serão enunciadas como axiomas, ou seja, assumidas como verdadeiras sem demonstração. A partir dos axiomas, todas as outras pro- priedades que você conhece poderão ser demonstradas usando a linguagem matemática e alguns métodos de prova que serão apresentados aos poucos. Especial atenção será dada à proprie- dade que distingue R do conjunto Q dos números racionais, que será apresentada na Aula 2, pois é esta a propriedade que faz o Cálculo funcionar. De modo geral, mesmo os alunos que já estudaram Cálculo ainda não conhecem esta propriedade, que é chamada “Axioma do Supremo”. Para começar, algumas convenções e notações preliminares. Como, em Análise, os números naturais são usados principal- mente para contagem e enumeração, convenciona-se que N= {1,2,3, . . .} , e, portanto, que zero não pertence a N. Assume-se que o leitor Com a convenção, na enumeração x1, x2, x3,. . ., o termo x1 indica o primeiro objeto, x2 o segundo, etc.. Leia o pequeno artigo do professor Elon L. Lima para a RPM em [?]. já tenha experiência com o conjunto Z dos números inteiros e com o conjunto Q dos números racionais, a saber, Z= {0,1,−1,2,−2,3,−3, . . .} e Q= � r ; r = p q , p,q ∈ Z, q 6= 0 � . Tem-se que N ⊂ Z ⊂ Q ⊂ R , e assim N, Z e Q são todos sub- conjuntos de R. Não existe representação padrão para o con- junto dos irracionais, geralmente escreve-se R \Q, indicando que são os números reais que não são racionais. Espera-se que as duas maneiras de representar um número real sejam fami- liares para você, leitor. Na primeira, geométrica, um número real é um ponto de uma reta onde já estejam assinalados 0 e 1 como pontos de referência. A outra, consiste em representar um 8 C E D E R J ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ A U L A 1 1 M Ó D U L O 1 número real como uma expansão decimal infinita, ou seja, uma expressão da forma Palavras e expressões em negrito no meio do texto, indicam que uma definição está sendo introduzida. Algumas definições virão separadas e numeradas. p,a1a2a3 . . . , onde p é um número inteiro e ai ∈ {0,1,2,3,4,5,6,7,8,9}, para i = 1,2,3, . . .. Os reais que são números racionais possuem expansões decimais periódicas, ou seja, têm uma parte que se repete indefinidamente, sendo que expansões terminando com infinitos zeros são escritas como decimais finitas. Veja os exemplos: 0,3333 . . . ; −8,123123123123123 . . . ; 4,250000 . . .= 4,25 . Em particular, um racional pode ser também representado como uma fração ordinária; a representação é única, se é escolhida uma fração irredutı́vel com denominador positivo. Enfim, os números racionais e suas propriedades já são seus conhecidos tanto do Ensino Médio quanto das disciplinas de Álgebra do seu curso. Há também os números reais irracionais, cuja expansão decimal infinita não é periódica, como por exemplo, √ 2= 1,414213 . . . ;p = 3,1415159 . . . ;1,01001000100001 . . ., que também já apareceram no Ensino Médio e nas disciplinas de Cálculo. Alguns aspectos das representações dos reais como ex- pansões decimais serão tratados ao longo do texto; no momento, seus conhecimentos prévios podem e devem ser usados para dar exemplos e contraexemplos para as afirmações estudadas. PROPRIEDADES ALGÉBRICAS DE R Uma operação binária em R é uma função que associa a cada par (a,b) de elementos de R um número real. No con- junto R dos números reais estão definidas duas operações bi- nárias: a adição, uma operação que associa a cada par (a,b) o número real a+ b, chamado soma de a e b, e a operação de multiplicação, que associa a cada par (a,b) o número real a · b, chamado produto de a e b. Em sı́mbolos matemáticos, escreve-se: Operação de Adição: + : R×R→R tal que (a,b) 7→ a+b C E D E R J 9 ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ Fundamentos de Análise Real | Propriedades Algébricas de R Operação de Multiplicação: · : R×R :→ R tal que (a,b) 7→ a ·b Estas operações satisfazem as seguintes propriedades, que são aqui estabelecidas como os axiomas a seguir. Axiomas são afirmações aceitas como verdadeiras sem necessidade de demonstração. ! Observe cuidadosamente como os axiomas são escritos na linguagem matemática simbólica e não simbólica. Particu- larmente, atente ao quantificador universal “para todo” (∀) e ao quantificador existencial “existe” (∃), pois eles fazem toda a diferença num enunciado. De modo geral, a vı́rgula logo após o objeto associado ao ∃ é lida como “tal que”, como ocorre em (A3), (A4), (M3) e (M4). (A) Axiomas da Adição: (A1) Comutatividade: para todos a,b ∈ R, a+b = b+a. ∀a,b ∈ R, a+b = b+a. Tenha em mente que não basta escrever “a+ b = b+ a”. É preciso frisar que a propriedade vale para quaisquer dois números reais. (A2) Associatividade: para todos a,b,c ∈ R, (a+b)+ c = a+(b+ c). ∀a,b,c ∈ R, (a+b)+ c = a+(b+ c). (A3) Existência do elemento neutro: existe um elemento em R, denotado 0, tal que a+0 = a para todo a ∈R. ∃ 0 ∈ R, ∀a ∈ R, a+0 = a. (A4) Existência do elemento simétrico: para cada a ∈ R, existe um elemento em R, denotado −a, tal que a+(−a) = 0. ∀a ∈ R, ∃−a ∈ R, a+(−a) = 0. (M) Axiomas da Multiplicação: 10 C E D E R J ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ A U L A 1 1 M Ó D U L O 1 (M1) Comutatividade: para todos a,b ∈ R, a ·b = b ·a. ∀a,b ∈ R, a ·b = b ·a. (M2) Associatividade: para todos a,b,c ∈ R, (a ·b) · c = a · (b · c). ∀a,b,c ∈ R, (a ·b) · c = a · (b · c). (M3) Existência do elemento neutro: existe um elemento em R, denotado por 1, tal que 1 6= 0 e para todo a∈R vale 1 ·a = a. ∃ 1 ∈ R, 1 6= 0 ∧ ∀a ∈ R, 1 ·a = a. O sı́mbolo ∧ indica o conectivo “e”, o mesmo usado na definição de interseção de conjuntos. (M4) Existência do elemento inverso: para todo a ∈ R, a 6= 0, existe um número real, denotado por 1a (ou a−1), tal que a · (1 a ) = 1. ∀a ∈ R, a 6= 0, ∃ 1 a ∈ R, a · � 1 a � = 1. (D) Axioma da Distributividade da Multiplicação em Relação à Adição: para todos a,b,c ∈ R, a · (b+ c) = a ·b+a · c. ∀a,b,c ∈ R, a · (b+ c) = a ·b+a · c. Um conjunto X dotado de operações + e · satisfazendo (A), (M) e (D) constitui uma estrutura algébrica chamada corpo. Em particular, R é um corpo. O conjunto Q também é um corpo com suas operações de adição e multiplicação; Z, com suas operações usuais, não é um corpo. (Por quê?) Antes de seguir adiante, resolva o Exercı́cio 1.1, que trata da linguagem matemática envolvida nos enunciados dos axiomas. Não olhe a resolução antes de tentar! Na sequência, o Prelúdio 1.1 trata dos enunciados condicio- nais e de como trabalhar com eles em Matemática. Ele deve ser estudado cuidadosamente. ♦ Prelúdio 1.1. blablabla C E D E R J 11 ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ Fundamentos de Análise Real | Propriedades Algébricas de R Considere P[x] e Q[x] enunciados referentes à variável x. Uma implicação(ou enunciado condicional) com hipótese P[x] e conclusão Q[x] é uma sentença matemática que tem uma das seguintes formas: “para todo x, se P[x] então Q[x]” ou, simplesmente, “se P[x] então Q[x]”. (⋆) Em linguagem simbólica, estas sentenças são escritas, respecti- vamente, como: ∀ x, P[x] ⇒ Q[x] e P[x] ⇒ Q[x] . Em implicações como as de (⋆), a hipótese P[x] é também chamada antecedente ou uma condição suficiente para Q[x]. Por seu lado, a conclusão Q[x] é também chamada tese ou uma condição necessária para P[x]. ✞ ✝ ☎ ✆ Exemplo 1.1. blablabl Exemplos de enunciados condicionais: (a) Se n ∈ N e n > 100 então n > 1000. (b) Para todo n ∈ N, se n > 100 então n > 1000. (c) Se x ∈ R e 4 ≤ x2 ≤ 16 então 2 ≤ x ≤ 4. (d) Para todos x,y,z ∈ R, se x · y = z · y então x = z. (e) Se x,y,z ∈ R, y 6= 0 e x · y = z · y então x = z. As implicações (a) e (b) acima têm o mesmo sentido: em ambas, a hipótese é “n ∈ N e n > 100” e a tese é “n > 1000”. No enunciado (c), a hipótese é “x ∈ R e 4 ≤ x2 ≤ 16” e a conclusão é “2 ≤ x ≤ 4”. Em (d), a hipótese é “x,y,z ∈ R e x · y = z · y” e a tese é “x = z”. O item (e) tem como hipótese as sentenças “x,y,z ∈ R, y 6= 0 e x · y = z · y” e como conclusão, “x = z”. 12 C E D E R J ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ A U L A 1 1 M Ó D U L O 1 Um exemplo para uma implicação “se P[x] então Q[x]” é um objeto matemático do universo de trabalho que satisfaz a hipótese P[x] e também satisfaz a tese Q[x]. Um contraexem- plo para uma implicação “se P[x] então Q[x]” é um objeto ma- temático do universo de trabalho que satisfaz a hipótese P[x] e não satisfaz a tese Q[x]. Voltando ao Exemplo 1.1, tem-se que o inteiro n = 1200 é um exemplo para o item (a) (e para (b)), pois satisfaz a hipótese e também a conclusão: n = 1200 > 100 e n = 1200 > 1000. Agora, n = 120 é um contraexemplo para (a) (e para (b)) pois satisfaz a hipótese e não satisfaz a tese: 120 ∈ Z e 120 > 100 mas não é verdade que 120 > 1200. Para o item (c), x = 3 é um exemplo, pois 3 ∈ R e 4 ≤ 32 ≤ 16, e também, 2 ≤ 3 ≤ 4, ou seja, x = 3 satisfaz as hipóteses e a conclusão. Agora, x = −3 satisfaz a hipótese de (c), já que −3 ∈ R e 4 ≤ (−3)2 ≤ 16, mas não é verdade que x=−3 satisfaça 2≤ x ≤ 4. Para o item (d), os reais x = z = 4 e y = 3 servem como exemplo, pois satisfazem x · y = z · y e também vale x = z. Um contraexemplo é obtido tomando-se x = 2, y = 0 e z = 3 pois 2,0,3 são reais e é verdade que 2 · 0 = 3 · 0 mas é falso que 2 = 3. O exemplo para o item (d) serve para o item (e) pois y 6= 0; para este último item, não se conseguem contraexemplos. Quase todas as afirmações em Matemática têm a forma de uma implicação ou podem ser reescritas neste formato. Implica- ções de conteúdo matemático são verdadeiras ou falsas de ma- neira exclusiva, ou seja, só podem ter um destes dois atributos. Uma implicação é falsa exatamente quando é possı́vel apresentar pelo menos um contraexemplo para ela e é verdadeira, quando não admite contraexemplos. Pode-se afirmar então que os enun- ciados (a)-(d) do Exemplo 1.1 são falsos. Basta um único con- traexemplo para garantir que uma implicação é falsa, mas nem sempre é fácil obter um: por exemplo, para a afirmação “se n ∈ N então n2 + n+ 41 é um número primo”, o menor con- traexemplo ocorre para n = 40, já que 402 +40+41 é múltiplo de 41. Por outro lado, em casos especiais, consegue-se ga- 40 · (40+1)+41 = 40 ·41+ 41= (40+1) ·41= 412. rantir que todos os objetos satisfazendo as hipóteses são exem- plos e portanto, que a afirmação é verdadeira (veja Exercı́cio 1.2 (iv)). Mas também pode ocorrer de ser impossı́vel garantir dire- tamente que não existem contraexemplos para uma implicação; é aı́ que entram as argumentações e os métodos de demonstração para garantir a verdade da afirmação. No decorrer deste texto, você vai aprender (ou recordar) vários dos métodos de provas e C E D E R J 13 ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ Fundamentos de Análise Real | Propriedades Algébricas de R as técnicas especı́ficas para o trabalho com os enunciados que aparecem em Análise Real. Para praticar, resolva o Exercı́cio 1.2 agora. Uma afirmação verdadeira em Matemática é chamada teorema, nome reservado às mais importantes, ou simplesmente proposição; também são usadas as denominações lema, usada para resultados auxiliares, e corolário, para um enunciado que seja uma consequência direta de outro mais importante. Uma demonstração (ou prova) para uma implicação é um encadea- mento lógico de raciocı́nios garantindo a verdade da afirmação a partir das suas hipóteses e de axiomas e/ou resultados já pro- vados. ! São duas as diretrizes gerais para demonstrar que um enun- ciado na forma condicional é verdadeiro: (i) usam-se a hipótese e axiomas e/ou resultados anterio- res (caso existam) para obter a conclusão. Jamais se pode usar a conclusão na demonstração! (ii) para demonstrar afirmações condicionais do tipo “pa- ra todos x,y ∈ U , se P[x,y] então Q[x,y]”, fixam-se objetos x, y arbitrários do conjunto universo U nas condições das hipóteses e raciocina-se para demons- trar a conclusão para estes objetos. Feito isto, garante- se que a afirmação é verdadeira para todos os objetos nas condições das hipóteses. Não vale trabalhar com x e y particulares, os objetos devem ser arbitrários e satisfazer as hipóteses. Estudar as demonstrações e depois tentar refazê-las, é um excelente exercı́cio para assimilar as técnicas e conseguir memorizar as definições e resultados já provados. Volte ao texto sempre que necessário! A seguir, são apresentados tipos de raciocı́nios aplicados para demonstrar que uma afirmação condicional sobre núme- ros reais é verdadeira e, também, as maneiras de descrever os raciocı́nios adequadamente. Tente identificar as duas diretrizes descritas acima nas demonstrações das diversas proposições tra- balhadas. Em Análise, o conjunto universo é R. Todas as proprie- dades do conjunto dos números reais envolvendo a adição e a multiplicação podem ser deduzidas por meio de raciocı́nios 14 C E D E R J ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ A U L A 1 1 M Ó D U L O 1 lógicos a partir dos axiomas (A), (M) e (D). Vários exemplos destas propriedades vão ser demonstradas a seguir. Certifique-se de entender o significado de cada enunciado, pois são proprie- dades algébricas conhecidas dos números reais. Proposição 1.1. blablabla (a) (Cancelamento da Adição) Para todos a,b,c ∈ R, se a+ c = b+ c então a = b. (b) Para todo a ∈ R, se a+a = a então a = 0. (c) Para todo a ∈ R, a ·0 = 0. Demonstração (a) As hipóteses são: a,b,c ∈ R e a+ c = b+ c. Por (A4), existe o número −c. Adicionar −c a ambos os lados da igualdade a+ c = b+ c não a altera (isto é uma proprie- dade da igualdade) e resulta (a+ c)+(−c) = (b+ c)+(−c). Por (A2), a+(c+(−c)) = b+(c+(−c)). Usando (A4), a + 0 = b + 0. Finalmente, por (A3), tem-se a tese a = b. Como a conclusão do item (a) foi obtida para os reais a,b,c satisfazendo as hipóteses, fixados arbitraria- mente no inı́cio da demonstração, garante-se que a afir- mação (a) é verdadeira. (b) Por hipótese, a+ a = a com a ∈ R. O mesmo procedi- (a+a)+ (−a) = a+(−a) ... complete ... a = 0 mento usado na demonstração do item anterior poderia ser usado (vide ao lado). Ao invés, a ideia aqui é usar o item (a), já provado. Para isto, a hipótese a+a = a de (b) deve ser reescrita de forma a fornecer um número para cance- lar, como na hipótese de (a). De fato, a+a = a pode ser reescrito como a+a = 0+a (note que nada foi alterado). Daı́ e da lei de cancelamento (a), pode-se afirmar então que a = 0. (c) Por hipótese, a ∈ R. A ideia é aplicar o item (b) para con- cluir que a · 0 = 0. Para isto, basta mostrar que a · 0+ a · 0 = a · 0. Ora, para provar que uma igualdade C ED E R J 15 ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ Fundamentos de Análise Real | Propriedades Algébricas de R é verdadeira, basta desenvolver um dos seus membros até obter o outro. Assim, Para demonstrar uma igualdade, desenvolve-se um dos seus membros até obter o outro. a ·0+a ·0 D= a · (0+0) (A3)= a ·0 . O enunciado obtido tem a forma da hipótese do item (b) para o número real a ·0. Como (b) já foi provado ser ver- dadeiro, aplicando-o, garante-se que vale a ·0 = 0. A demonstração da próxima proposição é deixada como exercı́cio. Faça-a depois de ter entendido e refeito as anterio- res autonomamente. Proposição 1.2 (Cancelamento da Multiplicação). blablabla Para todos a,b,c ∈ R, se ac = bc e c 6= 0 então a = b. Daqui em diante, a notação ab também indicará o produto a ·b. Demonstração Exercı́cio 1.3. Resolva antes de olhar a resposta. Atente para a correta utilização do Axioma (M4) e para uma maneira adequada de redigir o raciocı́nio. Na próxima proposição, demonstra-se que 0 é o único núme- ro real que satisfaz o Axioma (A3). Para demonstrar a unicidade de um objeto matemático a , a estratégia usual é: supor que Estratégia para demonstrar a unicidade de um objeto. existe um objeto b com as mesmas propriedades de a e racioci- nar para concluir que os objetos a e b são iguais. Procure iden- tificar esta estratégia na demonstração da próxima proposição. Proposição 1.3. blablabla O elemento neutro da adição em R é único. Demonstração Suponha que exista b ∈ R tal que a+b = a para todo a ∈ R. (1∗)Atente para a redação correta da propriedade do elemento neutro. Como 0 é um número real por (A3), então (1∗) vale, em particu- 16 C E D E R J ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ A U L A 1 1 M Ó D U L O 1 lar, para a = 0, ou seja, 0+b = 0. (2∗) Da mesma forma, como b ∈ R então o axioma (A3) vale, em particular, para a = b e fornece b +0 = b . (3∗) Por (A1), 0+b = b +0 e daı́, de (2∗) e (3∗) resulta que 0 = b . Logo, o elemento neutro da adição é único. A proposição a seguir estabelece que cada número real pos- sui um único elemento simétrico. A estratégia é a mesma da demonstração anterior, tente identificá-la. Proposição 1.4. blablabla Se a ∈ R então o elemento simétrico de a é único. Demonstração Por hipótese, a ∈ R. Por (A4), existe −a ∈ R tal que Quando proposições já provadas são aplicadas para demonstrar novos enunciados, é preciso garantir as condições das suas hipóteses. a+(−a) = 0. Suponha que exista b ∈ R com a mesma propri- edade de −a, isto é, tal que a+b = 0. Logo a+(−a) = a+b . Pela Proposição 1.1 (a), pode-se cancelar a, e assim −a = b . Logo, o elemento simétrico de a é único. A Proposição 1.4 estabelece que −a é o único número real que somado com o real a produz 0. Dela decorre que, se c é real e a+ c = 0 então c = −a; ou seja, para garantir que c ∈ R é o simétrico de a ∈ R basta mostrar que a+ c = 0. Esta é a estratégia utilizada na prova da próxima proposição, que deve ser estudada cuidadosamente. Proposição 1.5. blablabla Se a,b ∈ R então (−a) ·b = −(a ·b), ou seja, que (−a) ·b é o simétrico de a ·b. Demonstração Por hipótese, a,b ∈ R. Pela Proposição 1.4, basta provar que a · b+(−a) · b = 0. Desenvolve-se o membro esquerdo da Não vale aqui desenvolver a igualdade (−a) ·b =−(a ·b). C E D E R J 17 ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ Fundamentos de Análise Real | Propriedades Algébricas de R igualdade para obter a ·b+(−a) ·b = (a+(−a)) ·b = 0 ·b = 0 . Na sequência de igualdades, foram utilizadas (D), (A4) e a Pro- posição 1.1 (c), nesta ordem. Pela Proposição 1.4, conclui-se que (−a) ·b =−(a ·b). 18 C E D E R J ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ A U L A 1 1 M Ó D U L O 1 Note que, na demonstração de uma implicação, a tese é a conclusão que se deseja estabelecer a partir das hipóteses e de re- sultados já provados anteriormente. Ao contrário das hipóteses, a conclusão não pode ser usada no raciocı́nio e não pode ser con- siderada como fato verdadeiro a priori. Portanto, não faz sen- tido afirmar numa demonstração que a conclusão é, de antemão, verdadeira. Não se pode usar a conclusão numa demonstração. A mesma ideia da Proposição 1.5 é usada na demonstração dos itens (a) e (d) da próxima proposição. Proposição 1.6. blablabla (a) Para todos a,b ∈ R, a(−b) =−(ab). (b) Para todo b ∈ R, (−1)b =−b. (c) Para todo a ∈ R, a =−(−a). (d) Para todos a,b ∈ R, (−a)(−b) = ab. (e) (−1)(−1) = 1. Demonstração (a) Faça o Exercı́cio 1.4, seguindo ideia análoga à da demons- tração da Proposição 1.5. (b) Fixado b ∈R, aplica-se a Proposição 1.5 com a =−1. (c) Por hipótese, a ∈ R. Como a+(−a) = 0 é verdade por (A4), então a =−(−a) , pela Proposição 1.4 . (d) Pode-se raciocinar como na Proposição 1.5. Ou então usar os itens anteriores, como segue: (−a)(−b) (a)= −((−a)b) (P.1.5)= −(−(ab)) (c)= ab. (e) É um caso particular de (d) para a = b = 1. Após ter estudado cuidadosamente as demonstrações das pro- posições anteriores, utilize raciocı́nios análogos para provar as afirmações a seguir. C E D E R J 19 ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ Fundamentos de Análise Real | Propriedades Algébricas de R Proposição 1.7. blablabla (a) O elemento neutro da multiplicação é único, isto é, 1 é o único número real com a propriedade (M3). (b) Se a ∈ R e a 6= 0 então o inverso multiplicativo de a é único. Demonstração Exercı́cio 1.5. Em (b), você deverá usar a Proposição 1.2 com atenção na redação adequada. Pela Proposição 1.7 (b), para garantir que um número real Estratégia para demonstrar que b ∈ R é o inverso multiplicativo do real a 6= 0. b satisfaça b = 1 a para um real a 6= 0, é suficiente provar que a ·b = 1. Esta ideia será utilizada na demonstração do item (b) da próxima proposição. Antes disto, no entanto, o próximo prelúdio apresenta uma outra técnica de prova. ♦ Prelúdio 1.2. blablabla Um tipo de raciocı́nio dedutivo às vezes utilizado para de- monstrar que uma implicação ∀ x, se P[x] então Q[x] é verdadeira é o chamado raciocı́nio indireto ou raciocı́nio por absurdo. Procede-se da seguinte forma: admite-se, como sempre, que a hipótese P[x] é verdadeira e Estratégia da demonstração por absurdo. supõe-se (por absurdo), que a conclusão Q[x] é falsa. Daı́, busca-se chegar a uma afirmação que contrarie a hipótese, P[x], ou contrarie algum fato já provado. Ocorrendo, a contradi- ção (ou absurdo) é decorrência da suposição de que a tese Q[x] é falsa; conclui-se daı́ que Q[x] é verdadeira, como desejado. Este tipo de raciocı́nio é muito adequado para a demonstração de certos tipos de enunciados, que você aprenderá a reconhecer com a prática, mas não deve ser, em princı́pio, a primeira técnica a ser empregada. 20 C E D E R J ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ A U L A 1 1 M Ó D U L O 1 O raciocı́nio por absurdo será utilizado na demonstração da Proposição 1.8 (a) a seguir. Estude-a cuidadosamente. Proposição 1.8. blablabla (a) Se a ∈ R e a 6= 0 então 1a 6= 0. (b) Se a ∈ R e a 6= 0 então a = 1 ( 1a ) . (c) Se a,b ∈ R, a ·b = 0 e a 6= 0 então b = 0. (d) Se a,b ∈ R e a ·b = 0 então a = 0 ou b = 0. Demonstração (a) Por hipótese, a ∈ R e a 6= 0. Logo, por (M4), existe o número real 1a . Suponha por absurdo que 1 a = 0. Então a · (1a) = a · 0 = 0. Mas por (M4), a · (1a) = 1. Destas duas afirmações decorre que 0 = 1, contradizendo (M3). Portanto, supor 1 a = 0 leva a uma contradição e este fato permite concluir que 1 a 6= 0. (b) Por hipótese, a ∈ R e a 6= 0. Por (a), 1 a 6= 0. Como vale (1a) ·a = 1 então 1( 1a ) = a , pela Proposição 1.7 (b). (c) Por hipótese, a,b ∈ R, a · b = 0 e a 6= 0. Logo existe o número real 1 a , que pode multiplicar ambos os lados da primeira igualdade para fornecer (1a) · (ab) = (1a) ·0. Daı́, por (M2)e Proposição 1.1(c), segue que ((1a) · a) · b = 0. Então, por (M4), 1 ·b = 0, e daı́, por (M3), b = 0. (d) Por hipótese, a,b∈R e a ·b= 0. Dois casos são possı́veis: É preciso deduzir a conclusão em cada caso possı́vel. a = 0 ou a 6= 0. Se a = 0, nada há a provar. Se a 6= 0 então b = 0, pelo item (c) acima. Conclui-se assim que, se vale ab = 0 então, necessariamente, a = 0 ou b = 0. A subtração é a operação binária que associa, a cada par (a,b) de reais, a diferença a−b definida por a−b := a+(−b). A divisão em R associa a cada par (a,b) de reais no qual b 6= 0, O sı́mbolo “:=” é usado para definir termos (objetos). o número real a b := a · � 1 b � , chamado quociente de a por b . A notação a 0 não faz sentido em Matemática. C E D E R J 21 ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ Fundamentos de Análise Real | Propriedades Algébricas de R A potenciação (ou exponenciação) de um real por um in- teiro é definida recursivamente como: dado a ∈ R, a1 := a, e, para cada n ∈ N, an+1 = an · a. E ainda, para cada real a 6= 0, define-se a0 := 1 e, para cada n ∈ N, a−n := 1 an = � 1 a �n . Em qualquer caso, an é chamado a potência de a com expoente n. Depois de estudar as demonstrações até agora, você pode praticar os raciocı́nios e a redação fazendo os Exercı́cios 1.6, 1.7 e 1.8. A ORDEM EM R As propriedades da relação de ordem > em R permitem es- tabelecer a noção de desigualdade entre números reais e tornam R um corpo ordenado, no sentido que será explicado. Assim como no caso da estrutura algébrica dos reais, certas proprieda- des básicas de > serão introduzidas como axiomas (os Axiomas de Ordem) e, a partir delas, todas as outras poderão ser deduzi- das. Assume-se, a partir de agora, a existência de um subconjunto de R, denotado por R∗+, cujos elementos são chamados números reais positivos. A próxima definição introduz a nomenclatura e as notações que serão utilizadas no restante do texto. Definição 1.1. blablabla Se a ∈R∗+, diz-se que a é um número real positivo (ou estri- tamente positivo) e escreve-se a > 0. Se a ∈ R∗+ ou a = 0, diz-se que a é um número real não negativo e escreve-se a ≥ 0. Se −a ∈ R∗+, diz-se que a é um número real negativo (ou estritamente negativo) e escreve-se a < 0. Se −a ∈ R∗+ ou a = 0, diz-se que a é um número real não positivo e escreve-se a ≤ 0. Pela definição acima, zero, e somente zero, é, ao mesmo tempo, um número real não positivo e não negativo. 22 C E D E R J ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ A U L A 1 1 M Ó D U L O 1 (O) Axiomas de Ordem: (O1) Para todos a,b∈R, se a> 0 e b> 0 então a+b > 0. (O2) Para todos a,b ∈ R, se a > 0 e b > 0 então ab > 0. (O3) Tricotomia : Se a ∈R então uma e somente uma das afirmações é verdadeira: a> 0 ou a= 0 ou −a> 0 . A propriedade (O3) é chamada tricotomia porque reparte R em três subconjuntos dois a dois disjuntos, ou seja, com interseção igual ao conjunto vazio /0: o subconjunto R∗+ dos números positivos, o subconjunto unitário {0} e o subconjunto dos números −a tais que a ∈ R∗+, que será denotado R∗− e cha- mado conjunto dos números reais negativos. Assim, (O3) es- tabelece que R é a união destes três subconjuntos: em sı́mbolos, R= R∗+∪{0}∪R∗−. As relações < e ≤ entre dois elementos quaisquer de R são definidas por meio da positividade do seguinte modo. Definição 1.2. blablabla Sejam a, b ∈ R. (a) Escreve-se a > b (ou b < a) para indicar que a−b > 0. (b) Escreve-se a ≥ b (ou b ≤ a) para indicar que a−b ≥ 0. A partir da Definição 1.2, convenciona-se que o enunciado a < b < c abrevia os dois enunciados a < b e b < c. De modo similar, a ≤ b ≤ c significa que vale a ≤ b e b ≤ c, a ≤ b < c abrevia a ≤ b e b < c, e assim por diante. Um corpo munido de uma relação de ordem parcial < sa- tisfazendo os axiomas de ordem é chamado corpo ordenado. Portanto R e Q são corpos ordenados. Proposição 1.9. blablabla (a) Se a,b ∈ R, a > b e b > c então a > c. (b) Se a,b ∈ R, uma e somente uma das seguintes relações ocorre: a > b ou a = b ou a < b . (c) Se a,b ∈ R, a ≥ b e b ≥ a então a = b. C E D E R J 23 ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ Fundamentos de Análise Real | Propriedades Algébricas de R Demonstração (a) Por hipótese, a,b ∈ R, a > b e b > c. Pela Definição 1.2 tem-se que a−b > 0 e b− c > 0. Daı́ e por (O1) tem-se (a−b)+(b− c)> 0. Mas (a−b)+(b− c) = a− c, pelo Exercı́cio 1.6(iii). Assim, a− c = (a−b)+(b− c)> 0 e, pela Definição 1.2, tem-se que a > c. (b) Por hipótese, a,b ∈ R. Logo, a−b ∈ R e, pela tricotomia (O3), exatamente uma das seguintes relações ocorre: a−b > 0 ou a−b = 0 ou − (a−b) = b−a > 0, veja o Exercı́cio 1.6(i), para a última igualdade. Daı́ e pelo item (a) da Definição 1.2 tem-se que uma e somente uma das relações é verdadeira: a > b ou a = b ou a < b. (c) Por hipótese, a,b ∈ R, a ≥ b e b ≥ a. Como a ≥ b então exatamente uma das relações é verdadeira: a> b ou a= b. Logo não é verdade que a< b. Como b ≥ a também é ver- dade, então vale exatamente uma dentre as duas relações, b> a ou b= a; portanto, b< a não é verdadeira. Conside- rando apenas as relações possı́veis, conclui-se que a = b. Proposição 1.10. blablabla (a) Se a ∈ R e a 6= 0 então a2 > 0. (b) 1 > 0. Demonstração (a) Sendo, por hipótese a ∈ R e a 6= 0, pela tricotomia vale a > 0 ou −a > 0. Será necessário obter a conclusão dese- O problema divide-se em dois casos, e assim, a conclusão desejada deve ser obtida em cada um. jada em cada um dos dois casos. Ora, se a > 0 então, por (O2), tem-se a2 = a · a > 0. E também, se −a > 0 então, por (O2), tem-se (−a) · (−a) > 0. Mas pela Proposição 1.6 (c) vale (−a)(−a) = aa = a2. Assim, a2 > 0 também neste caso. Portanto, vale a conclusão em qualquer dos ca- sos possı́veis e fica assim demonstrado que para um real arbitrário a 6= 0 vale a2 > 0. 24 C E D E R J ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ A U L A 1 1 M Ó D U L O 1 (b) Como 1 = 12 é verdade por (M3) então, do item (a) pre- cedente, resulta que 1 > 0. Proposição 1.11. blablabla (a) Se a,b,c ∈ R e a > b então a+ c > b+ c. (b) Se a,b,c,d ∈ R, a > b e c > d então a+ c > b+d. (c) Se a,b,c ∈ R, a > b e c > 0 então ac > bc. (d) Se a,b,c ∈ R, a > b e c < 0 então ac < bc. (e) Se a ∈ R e a > 0 então 1a > 0. (f) Se a ∈ R e a < 0 então 1a < 0. Demonstração No que se segue, a,b,c,d ∈ R. (a) Por hipótese a > b, ou seja, a−b > 0. Note que o objetivo é mostrar que (a + c) > (b + c), ou seja, que (a + c)− (b + c) > 0. Mas (a + c)− (b + c) = a − b , pelo Exercı́cio 1.6(iv). Como a− b > 0 conclui-se que a+ c > b+ c. (b) Por hipótese a > b e c > d. Logo a−b > 0 e c−d > 0 . (∗) Pelo Exercı́cio 1.7, vale a igualdade (a+ c)− (b+ d) = (a− b)+ (c− d). Daı́, usando (O1) e (∗) conclui-se que (a + c) − (b + d) > 0. Logo, pela Definição 1.2, a+ c > b+d. (c) Por hipótese a > b e c > 0. Então a− b > 0. Daı́, de c > 0 e por (O2) tem-se ac− bc = (a− b)c > 0. Assim, ac > bc, pela Definição 1.2. (d) Por hipótese, a > b e c < 0. Logo, a−b > 0 e −c > 0 e daı́, por (O2), (a−b)(−c)> 0. Mas (a−b)(−c) =(a+(−b))(−c) = a(−c)+(−b)(−c) =− (ac)+bc = bc−ac , C E D E R J 25 ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ Fundamentos de Análise Real | Propriedades Algébricas de R onde, na sequência, foram usados o axioma (D), as Pro- posições 1.5 e 1.6 e (A1). Segue que bc−ac > 0 e, pela Definição 1.2, que bc > ac. (e) Por hipótese a > 0. Então a 6= 0 pela tricotomia, de onde segue, pela Proposição 1.8 (a), que 1 a 6= 0. Suponha, por absurdo, que 1 a < 0 (releia o Prelúdio 1.2). Usando o item (d) tem-se que a · � 1 a � < 0 · (1 a ), ou seja 1 < 0. Isto contradiz o item (b) da Proposição 1.10. Conclui-se que 1 a > 0. (f) Exercı́cio. A afirmação demonstrada na próxima proposição será muito útil no decorrer deste texto para mostrar que dois números reais sob certas condições são iguais. Proposição 1.12. blablabla Se a,b∈R e para todo número reale > 0 vale 0 ≤ a−b < e , então a = b. Demonstração É preciso, antes de tudo, entender que a hipótese do enun- ciado é: a,b ∈ R e vale 0 ≤ a− b < e para todo número real e > 0 . Suponha, por absurdo, que a 6= b. Daı́, pela tricotomia, exatamente uma das duas relações a < b ou a > b é verdadeira. Mas por hipótese, a−b ≥ 0 e daı́, a ≥ b. Logo não pode ocorrer a < b. Portanto, só resta possı́vel ocorrer a > b. Segue-se então que a− b > 0. Daı́, pode-se usar e = a− b na hipótese (isto é possı́vel, pois a hipótese é verdadeira para todo real e > 0, logo, em particular, para e = a−b). Chega-se então a a−b < a−b, que é um absurdo pela tricotomia. Conclui-se que a = b. 26 C E D E R J ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ A U L A 1 1 M Ó D U L O 1 EXERCÍCIOS A ideia nesta Aula 1 é usar somente as propriedades de reais já provadas; então, se ao demonstrar uma afirmação, precisar de alguma propriedade não provada, espera-se que você a demonstre previamente. Exercı́cio 1.1. Explique a diferença entre os enunciados dos axi- omas (A3) e (A4). Exercı́cio 1.2. Em cada item, indique as hipóteses e a conclusão, dê um exemplo e um contraexemplo caso existam, e diga se a implicação é verdadeira ou falsa, justificando suas afirmações. (i) Para todo x ∈ R, se x 6= 0 então −x < 0 . (ii) Se a ∈ R e a2 = 4 então a > 0 . (iii) Se x ∈ R e x(x2 − 2x+ 1) = 0 então x = 0 ou x = 1 ou x = 2. (iv) Todo elemento não nulo e par do conjunto A = {0,1,2,3,4, 5,6,7,8,9,10} divide 120. Exercı́cio 1.3. Mostre que: para todos a,b,c ∈ R, se ac = bc e c 6= 0 então a = b. Exercı́cio 1.4. Mostre, explicitando claramente o seu raciocı́nio, que se a,b ∈ R então a(−b) =−(ab). Exercı́cio 1.5. Mostre detalhadamente que: (i) o elemento neutro da multiplicação é único, isto é, 1 é o único número real com a propriedade (M3). (ii) se a ∈ R e a 6= 0 então o inverso multiplicativo de a é único. Exercı́cio 1.6. Mostre, detalhando seus raciocı́nios, que: (i) para todos a,b ∈ R, −(a+b) =−a−b. (ii) para todos a,b ∈ R, −(a−b) = b−a. (iii) se a,b,c ∈ R, (a−b)+(b− c) = a− c. (iv) se a,b ∈ R, (a+ c)− (b+ c) = a−b. Exercı́cio 1.7. Indique as definições e resultados utilizados na demonstração da afirmação: “para todos a,b,c,d ∈R, (a+c)− (b+d) = (a−b)+(c−d)”. C E D E R J 27 ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ Fundamentos de Análise Real | Propriedades Algébricas de R Demonstração Sejam a,b,c,d ∈ R. Então (a+ c)− (b+d) = (a+ c)+(−(b+d)) (1.1) = (a+ c)+((−1) · (b+d)) (1.2) = (a+ c)+((−1) ·b+(−1) ·d) (1.3) = ((a+ c)+(−1) ·b)+(−1) ·d (1.4) = (a+((−1) ·b+ c))+(−1) ·d (1.5) = ((a+(−1) ·b)+ c)+(−1) ·d (1.6) = (a+(−1) ·b)+(c+(−1) ·d) (1.7) = (a−b)+(c−d) (1.8) Exercı́cio 1.8. Decida se é falsa ou verdadeira a sentença abaixo, dando um contraexemplo no primeiro caso e uma demonstração no segundo: “se 1 = 0 então 1 = 1. ´´ Exercı́cio 1.9. Mostre, detalhando seus raciocı́nios, que: (i) Para todos a,b,c ∈ R com c 6= 0, −a+b c = −a−b c . (ii) Se a ∈ R e a 6= 0 então −1 a = −1 a = 1 −a . Exercı́cio 1.10. Se x,y ∈ R e 0 < x < y mostre que 0 < 1 y < 1 x . Exercı́cio 1.11. Mostre que: se x,y ∈ R e, para todo e > 0, vale x− y < e , então x ≤ y. Exercı́cio 1.12. Mostre que: se x,y ∈ R então xy ≤ � x2 + y2 � 2 , ou seja, que média geométrica, √ xy é menor ou igual à média aritmética, (x+ y)/2, para quaisquer reais x,y.) Sugestão: Use que (x− y)2 ≥ 0, justificando. Exercı́cio 1.13. Mostre que: se x ∈ R, x ≤ −10 e 6x−5 x+8 ≥ 7 então −61 ≤ x ≤−10. Exercı́cio 1.14. Mostre que: se x ∈ R, x < 1, x 6= −2 e 1 x+2 < 1 então x <−2 ou −1 < x < 1. 28 C E D E R J ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ A U L A 1 1 M Ó D U L O 1 RESOLUÇÃO DOS EXERCÍCIOS PROPOSTOS Exercı́cio 1.1. O axioma (A3) afirma que existe um número real, a saber 0, que tem uma certa propriedade com relação a cada (a todo) número real. Por outro lado, pelo axioma (A4), para cada número real a existe um real −a que tem uma propriedade relacionada exatamente com o número a. Exercı́cio 1.2. (i) As hipóteses são os enunciados “x ∈R” e “x 6= 0” e a con- clusão é “−x < 0” . Um exemplo é x = 3, pois o real 3 6= 0 e −3< 0. Um contraexemplo é x=−3, pois −3 é real não nulo mas −(−3) = 3 > 0. Como existe contraexemplo, a afirmação é falsa. (ii) As hipóteses são “a ∈ R” e “a2 = 4” e a conclusão é “a > 0” . Um exemplo é a = 2 pois para este real vale a2 = 4 e a > 0. Tomando-se o real a = −2, tem-se um contraexemplo, pois vale a hipótese (−2)2 = 4 mas não vale a conclusão, já que não é verdade que −2 > 0. A implicação é falsa. (iii) As hipóteses são “x ∈ R” e “x(x2 −2x+1) = 0” e a tese é “x= 0 ou x = 1 ou x = 2”. Para exemplos, basta tomar x = 0 ou x = 1, pois ambos os reais satisfazem a equação da hipótese e também a conclusão. Como é possı́vel garantir que não existem contraexemplos, pois só 0 e 1 satisfazem a equação dada, a afirmação é verdadeira. (iv) A hipótese é formada pelos enunciados “ x é par”, “x 6= 0” e “x∈A= {0,1,2,3,4,5,6,7,8,9,10}”, e “x divide 120” é a conclusão. Como exemplo, basta tomar x = 2, que é par, não nulo, elemento de A e divide 120. Como 2,4,6,8,10 são os elementos pares e não nulos de A e todos dividem 120, a afirmação é verdadeira. Notar que neste caso es- pecial foi possı́vel checar diretamente que não há contra- exemplos. Exercı́cio 1.3. Por hipótese, a,b,c ∈ R, a · c = b · c e c 6= 0. Logo 1 c ∈ R, por (M4), e daı́, multiplica-se a igualdade inicial por este número para obter (a · c) · � 1 c � = (b · c) · � 1 c � . C E D E R J 29 ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ Fundamentos de Análise Real | Propriedades Algébricas de R Usa-se (M2) para obter a · � c · 1 c � = b · � c · 1 c � e daı́ vem que a ·1 = b ·1, por (M4). Finalmente, por (M3), tem-se a = b. Exercı́cio 1.4. Por hipótese, a,b ∈R. Pela Proposição 1.4, basta provar que a ·b+a · (−b) = 0. De fato, a ·b+a · (−b) = a · (b+(−b)) = a ·0 = 0 , onde foram utilizadas (D), (A4) e a Proposição 1.1 (c), nesta or- dem. Conclui-se assim que (−a) ·b =−(a ·b), pela Proposição 1.4. Exercı́cio 1.5. (a) Suponha que exista a ∈ R tal que a ·a = a para todo a ∈ R. (∗) Como 1 é um número real por (M3), então (∗) vale em particular para a = 1, ou seja, a ·1 = 1. (2∗) Da mesma forma, como a ∈ R então o axioma (M3) vale em particular para a e fornece 1 ·a = a. (3∗) Por (M1), a · 1 = 1 ·a e daı́, de (2∗) e (3∗) resulta que 1 = a . Logo, o elemento neutro da multiplicação é único. (b) Por hipótese, a ∈ R e a 6= 0. Por (M4), existe 1 a ∈ R tal que a · � 1 a � = 1. Suponha que exista b ∈ R com a mesma propriedade de 1 a , isto é, que valha a ·b = 1. Logo a · � 1 a � = a · b. Daı́ e como a 6= 0, pode-se aplicar a Proposição 1.2 e cancelar a, obtendo 1 a = b. Logo, o in- verso multiplicativo de a é único. 30 C E D E R J ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ A U L A 1 1 M Ó D U L O 1 ! Sobre o trabalho com a linguagem matemática Neste inı́cio, é fortemente recomendável que você, tal como feito no texto, também mencione a cada passo, os Axiomas, Proposições e Exemplos que estão sendo usados, pois a cada vez que voltar ao texto para revê-los, estará reforçando seu estudo e ajudando na memorização destes resultados, que acabará acontecendo pela prática. Perceba que é muito mais fácil entender o raciocı́nio de uma outra pessoa se ela menci- ona os resultados que está usando a cada passo. Esta atitude - mencionar ou nomear a propriedade que está sendo usada - é completamente diferente de “enunciar” a propriedade, o que é desnecessário. Ressalte-se que o importante não é saber o “número” do Axioma ou Proposição, mas conhecer, entender e saber aplicar corretamente a propriedade expressa por cada um, garantindo as condições das suas hipóteses quando for o caso. No decorrer do trabalho, gradualmente, as proprieda- des mais elementares deixarão de ser mencionadas. Exercı́cio1.6. No que se segue, a,b,c,d são números reais. (i) −(a+b) (1)= (−1)(a+b) (2)= (−1) ·a+(−1) ·b (3)= −a+(−b) (4)= −a−b, onde foram usadas, na sequência, a Proposição 1.6(b) em (1), o axioma D em (2), a Proposição 1.6(b) em (3) e notação de diferença em (4). (ii) −(a−b) (1)= −(a+(−b)) (2)= −a− (−b) (3)= −a+b (4)= b+(−a) (5)= b−a, onde foram usados, em sequência: de- finição de diferença em (1), o item (i) acima em (2), a Proposição 1.6(c) em (3), (A1) em (4) e definição nova- mente em (5). Esta sequência de raciocı́nios não é a única que pode ser aplicada; seria possı́vel usar a unicidade do simétrico (Proposição 1.4), mostrando que (a−b)+(b− a) = 0. (iii) Na sequência de igualdades abaixo, são aplicadas: notação de diferença, (A2), (A4), (A3) e a notação novamente. (a−b)+(b− c) = (a+(−b))+(b+(−c)) = = (a+(−b+b))+(−c) = = (a+0)+(−c) = a− c . C E D E R J 31 ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ Fundamentos de Análise Real | Propriedades Algébricas de R (iv) Na sequência de raciocı́nios abaixo (há outras), foram apli- cados, pela ordem: notação de diferença, o item (i) acima, (A1), (A2) duas vezes, (A4) e (A3). (a−b)+(b− c) = (a+ c)+(−(b+ c)) = = (a+ c)+(−b− c) = = (a+ c)+(−c−b) = = ((a+ c)+(−c))−b = = (a+(c+(−c)))−b = = (a+0)−b = a−b . Exercı́cio 1.7. Foram usados: a notação de diferença em (1.1), a Proposição 1.6(b) em (1.2), o Axioma (D) em (1.3), o Axi- oma (A2) em (1.4), o Axioma (A2) seguido do (A1) em (1.5), o Axioma (A2) em (1.6), o Axioma (A2) em (1.7) e, de novo, a notação de diferença em (1.8). Exercı́cio 1.8. Como não há objetos matemáticos satisfazendo a hipótese, não há contraexemplos para a sentença. Então ela é verdadeira. Neste caso é até possı́vel oferecer uma demonstração. De fato, por hipótese, 1 = 0. Logo, 0 = 1 também é verdade. Somam-se os termos de cada um dos lados das igualdades para obter 1+ 0 = 0+ 1. Daı́, por (A3), vem que 1 = 1. Sentenças condicionais que são verdadeiras porque não há objetos satisfa- zendo o antecedente são ditas vacuamente satisfeitas. A afir- mação “ /0 ⊂ A, para todo conjunto A” (ou seja, “∀A conjunto, se x ∈ /0 então x ∈ A”) da Teoria de Conjuntos é deste tipo; para prová-la, raciocina-se por absurdo. Exercı́cio 1.9. No que se segue, a,b,c indicam números reais. (i) Supondo c 6= 0, basta mostrar que a+b c + −a−b c = 0. De fato, a+b c + −a−b c = (a+b) · 1 c +(−a−b) · 1 c = = ((a+b)+(−a−b)) · 1 c = 0 · 1 c = 0 , onde foram usadas a definição de quociente, o Axioma (D), o Exercı́cio 1.6(ii) e a Proposição 1.1(c). A conclusão segue da unicidade do elemento simétrico, Proposição 1.4. 32 C E D E R J ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ A U L A 1 1 M Ó D U L O 1 (ii) Fixado a 6= 0, é preciso mostrar que o simétrico de 1 a pode ser expresso de duas formas, −1 a = −1 a e −1 a = 1 −a . Para provar a primeira, usando a Proposição 1.6(b) e definição de quociente tem-se −1 a = (−1) · 1 a = −1 a . Usando esta igualdade, para provar a segunda basta mos- trar que (−a) · �−1 a � = 1, pois (−a) · � 1 (−a) � = 1 e o elemento inverso é único. Assim (−a) · �−1 a � = (−a) · � −1 a � = a · 1 a = 1 , onde, na sequência foram usadas a primeira igualdade mos- trada, a Proposição 1.6(d) e o Axioma (M4). A conclusão segue da unicidade do elemento simétrico, Proposição 1.4. Exercı́cio 1.10. Por hipótese, x,y ∈ R e 0 < x < y. Daı́, x > 0 e y> 0. Portanto pela Proposição 1.11 (e) tem-se 1 x > 0 e 1 y > 0. Usando que 1 y > 0, x < y e a Proposição 1.11 (c) chega-se a � 1 y � · x < � 1 y � · y. Daı́, por (M4), � 1 y � · x < 1. Usando esta desigualdade, que 1 x > 0 e novamente a Proposição 1.11 (c), tem-se �� 1 y � · x � · � 1 x � < 1 · � 1 x � . Por (M2) e (M3) segue que ( 1 y ) ·(x ·(1 x ))< 1 x . Por (M4) chega-se a � 1 y � ·1< 1 x . Por (M3) resulta 1 y < 1 x . Daı́, conclui-se que 0 < 1 y < 1 x . C E D E R J 33 ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ Fundamentos de Análise Real | Propriedades Algébricas de R ! Sobre o trabalho com a linguagem matemática Note que todas as passagens do raciocı́nio acima foram expli- citadas e as propriedades mencionadas, para o pleno entendi- mento de quem lê a prova, no caso, você. Além disso, para aplicar tanto o item (e) quando o item (c) da Proposição 1.11, as hipóteses necessárias para a utilização de cada item foram explicitadas - isto sempre precisará ser feito, mesmo que os enunciados tenham sido mencionados anteriormente. Tome este cuidado ao provar os itens extras a seguir: • Se x,y ∈ R e x < y < 0 então 1 y < 1 x < 0. • Se x,y ∈ R e x < 0 < y então 1 x < 0 < 1 y . Exercı́cio 1.11. Por hipótese: x,y ∈ R e x− y < e para todo e > 0. Suponha, por absurdo que x > y. Daı́, x−y > 0. Portanto, fazendo em particular, e = x−y na hipótese, tem-se x−y< x−y. Mas isto é um absurdo, pela tricotomia. Logo, x ≤ y. Exercı́cio 1.12. Da hipótese, x,y ∈ R tem-se que x−y ∈ R. Daı́ e da Proposição 1.9, resulta (x− y)2 ≥ 0. Assim O sı́mbolo “∴” significa “logo”, “portanto”, “daı́”. Por outro lado, o sı́mbolo “ ⇒” indica o enunciado “ P[x] ⇒ Q[x] ”, que simboliza a implicação “se P[x] então Q[x]”. x2 −2xy+ y2 ≥ 0 ∴ x2 + y2 ≥ 2xy Como 1 2 > 0 então 1 2 � x2 + y2 � ≥ 1 2 (2xy)= � 1 2 ·2 � xy= xy, onde foram usados a Proposição 1.11(c) e (M4). Exercı́cio 1.13. Por hipótese: x ∈ R, x ≤ −10 e 6x−5 x+8 ≥ 7. Não se pode afirmar que 6x−5 ≥ 7(x+8). Por quê? Porém vale 6x−5 x+8 −7 ≥ 0. Daı́, 6x−5−7x−56 x+8 ≥ 0 o que implica −x−61 x+8 ≥ 0. Por definição de quociente e propriedade de ordem, tem-se que (−x−61 ≥ 0 e x+8 > 0) ou (−x−61 ≤ 0 e x+8 < 0). Daı́ (x ≤−61 e x >−8) ou (x ≥−61 e x <−8). Como não existe x ∈ R satisfazendo x ≤ −61 e x > −8 conclui-se que −61≤ x<−8. Mas, por hipótese, x≤−10; logo −61≤ x<−10. 34 C E D E R J ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ A U L A 1 1 M Ó D U L O 1 Na resolução de 1.13, não foram indicados explicitamente os axiomas e proposições utilizados. Em contrapartida, todas as passagens foram apresentadas com clareza, de forma a não deixar dúvidas para você, leitor. Note que (6x−5) (x+8) ≥ 7 não implica necessariamente 6x−5 ≥ 7(x+8). Isto só vale no caso em que x+8 > 0, isto é, x >−8. No caso, x <−8 o que vale é 6x−5 ≤ 7(x+8). Como não se sabe qual das duas opções é a verdadeira, trabalha-se com a formulação alternativa acima, que dispensa saber o sinal de x+8. Exercı́cio 1.14. Por hipótese, x ∈ R, x < 1, x 6=−2 (e portanto, 1 x+2 ∈R) e 1x+2 < 1. Então 1x+2 −1 < 0, o que permite dizer que 1−x−2 x+2 = −x−1 x+2 < 0. Por definição de quociente e propriedade de ordem, (−1−x > 0 e x+2< 0) ou (−1−x < 0 e x+2> 0) . Resolvendo as desigualdades, obtém-se x < −1 e x < −2 ou x >−1 e x >−2, o que implica x <−2 ou x >−1. Juntando com a hipótese x < 1, vem que x <−2 ou −1 < x < 1, como se queria. Em 1.14, a hipótese x 6=−2 garante a existência do inverso de x+ 2, que já aparece na hipótese. C E D E R J 35 ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ Fundamentos de Análise Real | Supremo e Ínfimo de conjunto 36 C E D E R J ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ Aula SUPREMO E ÍNFIMO DE CONJUNTO 2 O b j e t i v o s Ao final desta aula, você deverá ser capaz de: 1 conhecer e saber aplicar as principais proprieda- des de valor absoluto de um número real; 2 escrever os raciocı́nios para demonstrar propo- sições simples envolvendo os conceitos de va- lor absoluto, supremo e ı́nfimo de conjunto de números reais, usando adequadamente a lingua- gem matemática; 3 escrever os raciocı́nios para demonstrar que um dado número real é o supremo ou ı́nfimo de um conjunto de reais, usando adequadamente a lin- guagem matemática. ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ Fundamentos de Análise Real | Supremo e Ínfimo de conjunto INTRODUÇÃO Esta aula começa recordando o conceito de valor absoluto em R e, a partir dele, o de distância entre dois números reais,que será importante para descrever a ideia de aproximação, pre- sente nas noções de limite, continuidade e derivada de função. Também são apresentados os conceitos de supremo e ı́nfimo de subconjuntos de R, para que o Axioma do Supremo possa ser in- troduzido. Este axioma é o que estabelece a principal diferença entre Q e R e é a propriedade especial de R que faz o Cálculo funcionar: por exemplo, depende dele a demonstração do Te- orema do Valor Intermediário, já conhecido da disciplina de Cálculo e que será estudado na Aula 10. VALOR ABSOLUTO EM R A propriedade de tricotomia da relação de ordem em R per- mite estabelecer o conceito de valor absoluto (ou módulo), como segue: Definição 2.1. blablabla Seja a ∈ R. O valor absoluto (ou módulo) de a é o número real, denotado |a|, que satisfaz: |a|= a, se a ≥ 0 , e |a|=−a, se a < 0. Por exemplo, |2|= 2 e |−2|= 2. Decorre diretamente da Definição 2.1 que |a|≥ 0 para todo a ∈ R . Note que a Definição 2.1 afirma que |a| = a nos casos a > 0 e a = 0. ♦ Prelúdio 2.1. blablabla Se P[x] e Q[x] são sentenças matemáticas sobre um objeto x, o enunciado “se Q[x] então P[x]” é chamado recı́proca do enunciado “se P[x] então Q[x]”. Uma implicação pode ser verdadeira sem que sua recı́proca o seja. Por exemplo, a implicação “se x ∈R e x ≥ 10 então x ≥ 1” é verdadeira, mas sua recı́proca, “se x ∈R e x ≥ 1 então x ≥ 10” é falsa, pois x = 2 fornece um contraexemplo: 2 ∈ R e 2 ≥ 1 e 38 C E D E R J ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ A U L A 2 1 M Ó D U L O 1 não é verdade que 2 ≥ 10. Quando a implicação “ se P[x] então Q[x]” e sua recı́proca “se Q[x] então P[x]” são ambas verdadeiras, escreve-se P[x] se e somente se Q[x] (em sı́mbolos: P[x] ⇔ Q[x]) . Estes enunciados são chamados equivalências ou biimplica- ções. Diz-se também que P[x] e Q[x] são enunciados equiva- lentes, significando que eles têm o mesmo valor lógico, ou seja, são ambos verdadeiros ou ambos falsos. É usual dizer ainda que P[x] é condição necessária e suficiente para Q[x] e vice-versa, isto é, que Q[x] é condição necessária e suficiente para P[x]. As propriedades de módulo que se seguem são muito impor- tantes. Note que, pela própria forma da definição, a demonstra- ção de uma afirmação envolvendo módulo muitas vezes requer a separação em casos. Estude com cuidado os raciocı́nios desen- volvidos a seguir e depois tente refazê-los de maneira autônoma. Proposição 2.1. blablabla (a) Para todo a ∈ R, |a|= 0 se e somente se a = 0. (b) Para todo a ∈ R, |−a|= |a|; (c) Para todos a,b ∈ R, |ab|= |a||b|; (d) Se a,c ∈ R e c ≥ 0 então |a| ≤ c se, e somente se, −c ≤ a ≤ c; (e) Se a ∈ R então −|a|≤ a ≤ |a|. Demonstração (a) Por hipótese (geral) a ∈ R. (⇒) Por hipótese, |a| = 0. Suponha, por contradição, que a 6= 0. Pela tricotomia, a > 0 ou a < 0. Ora, no primeiro caso tem-se, pela Definição O sinal “⇒” indica aqui o sentido da implicação que será provada: no caso, “se |a|= 0 então a = 0”. 2.1, que |a|= a > 0, contrariando a hipótese. No segundo caso, |a|=−a > 0, pois a < 0. Aqui, também, a hipótese inicial é contrariada. Logo, não é possı́vel que seja a 6= 0. Conclui-se que a = 0. (⇐) Por hipótese, a = 0. Daı́ e da Definição 2.1 tem-se que |a|= 0. C E D E R J 39 ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ Fundamentos de Análise Real | Supremo e Ínfimo de conjunto (b) Seja a ∈ R. Então a ≥ 0 ou a < 0 pela tricotomia. Será necessário concluir que |− a| = |a| em cada caso. Su- ponha inicialmente que a ≥ 0. Então −a ≤ 0. Daı́ e da Definição 2.1, |a| = a e |− a| = −(−a) = a. Portanto, |a| = |− a| neste caso. Suponha agora a < 0. Então |a|=−a. Mas como agora −a > 0, tem-se |−a|=−a, e portanto, |a| = |−a| também neste caso. Conclui-se que vale o resultado em qualquer caso. (c) Exercı́cio 2.1(i). Considere as quatro possibilidades para o par de números a e b e demonstre a conclusão em cada caso. (d) Por hipótese (geral) a,c∈R com c≥ 0. (⇒) Por hipótese, |a| ≤ c. É preciso mostrar que −c ≤ a e que a ≤ c. Para isto, suponha primeiramente que a ≥ 0 (veja explicação na lateral). Então a = |a| ≤ c. Além disso, −c ≤ 0 ≤ a. Sendo a hipótese uma afirmação sobre |a|, para poder aplicá-la é preciso considerar os dois casos, a ≥ 0 e a < 0, e mostrar a conclusão em cada caso. Portanto, vale a conclusão −c ≤ a ≤ c no caso a ≥ 0. No caso em que a < 0, usando a Definição 2.1 e a hipótese vem que −a = |a| ≤ c. Logo, −c ≤ a. Além disso, a < 0 ≤ c. Portanto, vale a conclusão −c ≤ a ≤ c também no caso a < 0. Logo, vale a conclusão em qualquer dos dois casos possı́veis. A implicação (⇒) está provada. (⇐) Por hipótese, −c ≤ a ≤ c, ou seja, a ≤ c e −c ≤ a. Como é preciso concluir algo sobre |a|, consideram-se os dois casos possı́veis e mostra-se a conclusão em cada um. Ora, no caso a ≥ 0 tem-se |a| = a ≤ c; e se a < 0 então |a|=−a ≤ c. Portanto, em qualquer caso, |a|≤ c. (e) Para a ∈ R, como |a| ≤ |a|, segue do item (d) que −|a|≤ a ≤ |a|. Na demonstração da próxima proposição, serão aplicados os resultados já provados ao invés da separação em casos (que também poderia ser utilizada). É mais uma forma de raciocı́nio para você aprender. Trata-se de uma das mais importantes pro- priedades da noção de valor absoluto de um número real, muito usada nas aplicações: a desigualdade triangular. Proposição 2.2 (Desigualdade triangular). blablabla Se a,b são números reais então |a+b|≤ |a|+ |b|. 40 C E D E R J ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ A U L A 2 1 M Ó D U L O 1 Demonstração Sejam a,b ∈R. Da Proposição 2.1(e) tem-se que −|a|≤ a ≤ |a| e −|b| ≤ b ≤ |b|. Adicionando membro a membro e usando o Exercı́cio 1.6(ii), resulta que −(|a|+ |b|)≤ a+b ≤ |a|+ |b|. Daı́ e da Proposição 2.1(d) tem-se |a+b|≤ |a|+ |b|. Decorre do resultado acima que Corolário 2.1. blablabla Para todos a,b ∈ R, ||a|− |b||≤ |a−b|. Demonstração Sejam a,b ∈ R. Então vale a = (a− b) + b. Aplica-se a desi- gualdade triangular para obter |a|= |(a−b)+b|≤ |a−b|+ |b|. Adicionando −|b| a ambos os membros resulta Aqui, um pequeno truque para fugir da separação em casos: aplicar a desigualdade triangular a uma igualdade (verdadeira) conveniente. |a|− |b|≤ |a−b|. (⋆) Analogamente, como b = (b−a)+a, aplica-se a desigualdade triangular para obter |b| = |(b− a)+ a| ≤ |b− a|+ |a|. Segue daı́ que −(|a|− |b|)≤ |b−a|. Mas pela Proposição 2.1(b), tem- se que |b− a| = |− (a− b)| = |a− b|. Pode-se então escrever que −(|a|− |b|)≥ |a−b|, ou equivalentemente, que −|a−b|≤ |a|− |b|. (⋆⋆) De (⋆), (⋆⋆) e Proposição 2.1(d) conclui-se que ||a|− |b||≤ |a−b|. Neste ponto, depois de estudar e refazer, de forma autônoma, as demonstrações anteriores, faça os Exercı́cios 2.1 e 2.2. A RETA REAL O apoio fornecido pela representação geométrica dos núme- ros reais como pontos de uma reta é bastante forte e influencia a nomenclatura: de fato, números reais costumam ser chamados de “pontos da reta”. Nesta interpretação, o módulo |x| de x ∈ R fornece a distância de x à origem da reta. Em termos precisos, tem-se: C E D E R J 41 ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ Fundamentos de Análise Real | Supremo e Ínfimo de conjunto Definição 2.2. blablabla A distância entre dois números reais x e y é definida como |x− y|. Em particular, |x| é a distância entre x e 0. Por exemplo, a distância entre x = −3 e y = 4 é igual a |−3−4|= 7 e a distância de x ao zero é |−3−0|= 3. Considerando-se uma reta no sentido usual da Geometria Euclidiana, para localizar os reais na reta, marca-se nela um ponto, denotado O, que será chamado origem. Este ponto di- vide a reta em duas semirretas, sendo a da direita designada positiva e a outra, negativa. Depois, marca-se um outro ponto Lembrar que a existência dos números reais irracionais foi admitida como verdadeira no inı́cio da Aula 1. à direita de O, denotado U , por exemplo. O segmento OUé então usado como unidade de comprimento (de medida 1). Para marcar os números, o 0 (zero) é associado à origem O, o número 1 ao ponto U , e a ideia é associar um número x > 0 a um ponto P da semirreta positiva cuja distância ao ponto O seja igual a x uni- dades e, para x < 0, associar um ponto P′ na semirreta negativa a −x unidades da origem. Deste modo, os inteiros podem ser marcados na reta usando-se o segmento de extremos 0 e 1 como medida e, também, os números racionais, considerando subdi- visões deste segmento. De fato, se m e n são inteiros positivos, para marcar m/n na reta divide-se a unidade em n partes iguais e tomam-se m partes. A precisão destas marcações depende da escala (comprimento de OU) utilizada. −0.4 −0.2 0.2 0.4 0.6 0.8 1 1.2 1.4 1.6 1.8 2 2.2 2.4 −0.2 0.2 0.4 0.6 0.8 1 1.2 OA = √ 2 O A A1 B B1 C C1 D D1 Figura 2.1: Para cada n ∈N, como marcar √n com régua e com- passo: o ponto A1 é √ 2, B1 é √ 3, etc.. Você deve lembrar dos números construtı́veis das aulas de Construções Geométricas, aqueles números que expressam com- 42 C E D E R J ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ A U L A 2 1 M Ó D U L O 1 primentos de segmentos que podem ser construı́dos com régua (sem graduação) e compasso. Todos os inteiros e racionais são construtı́veis e também, todas as raı́zes quadradas de tais nú- meros. Por exemplo, com o compasso é possı́vel transferir o tamanho da diagonal de um quadrado de lado 1 para a reta real e, assim, marcar √ 2. Veja na Figura 2.1 como marcar os reais da forma √ n, n∈N, no eixo das abscissas (horizontal) de um plano cartesiano. Note que o inı́cio é um triângulo retângulo isósceles de catetos com medida 1. A hipotenusa deste primeiro triângulo dá a medida do maior cateto do segundo triângulo retângulo, a hipotenusa do segundo dá a medida do maior cateto do terceiro triângulo retângulo, e assim por diante. Todos os triângulos retângulos construı́dos possuem um cateto de medida 1. Esta construção pode ser obtida da “Espiral de Teodoro de Cirene”, também chamada “Espiral Pitagórica”, que aparece na Figura 2.2. É possı́vel mostrar que √ n é irracional sempre que n é um natural primo (o caso n = 2 será mostrado mais adiante). Desta forma, têm-se exemplos de números irracionais cuja localização na reta real pode ser feita com precisão. −4 −3 −2 −1 1 2 3 4 5 −4 −3 −2 −1 1 2 3 √ 1 √ 2 √ 3 √ 4√ 5 √ 6 √ 7 √ 8 √ 9 √ 10 √ 11 √ 12 √ 13 √ 14 √ 15 √ 16 √ 17 A B C 1.41 1.73 1 1 D E 1 2 F 1 2.24 G 1 2.45 H 1 2.65 I 1 2.83 J 1 3 K 1 3.16 L1 3.32 M 1 3.46 N 1 3.61 O 3.74 P 1 3.87 1 Q4 1 R 1 4.12 1 Figura 2.2: Espiral de Teodoro de Cirene ou Espiral Pitagórica. Prova-se que todo número construtı́vel é um número algé- brico, ou seja, é a raiz de uma equação polinomial com coefici- entes inteiros anx n +an−1x n−1 + . . .+a1x+a0 = 0, C E D E R J 43 ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ Fundamentos de Análise Real | Supremo e Ínfimo de conjunto para algum n. Mas nem todo número algébrico é construtı́vel. Por exemplo, a raiz real da equação polinomial de terceiro grau x3 − 2 = 0 não é construtı́vel (foi provado por Gauss que um número algébrico é construtı́vel se e somente se ele for raiz de uma equação polinomial com coeficientes inteiros e grau que seja uma potência de 2 e de nenhuma tal equação de grau me- nor). Os resultados mencionados neste parágrafo estão fora do escopo deste texto. Para uma excelente análise crı́tica de como os irracionais são introduzidos no Ensino Médio e um estudo detalhado da correlação deste tópico com o conteúdo de Análise na Licen- ciatura, ver a monografia MIRELLE. Para uma articulação dos irracionais com problemas em Geometria ver MOSER E BOR- TOLOSSI. Números reais que não são algébricos são chamados transcendentes. Números transcendentes são necessariamente irracionais. O número p , por exemplo, é transcendente, e por isto, não é construtı́vel, ou seja, dado um segmento de reta to- mado como unidade, não é possı́vel traçar outro segmento a par- tir do primeiro que tenha p unidades de comprimento. Na Aula 4, será mostrado que a localização na reta de qualquer número irracional não construtı́vel pode ser estimada usando números racionais de forma a obter um ponto tão próximo quanto dese- jado (ou seja, com quantas casas decimais se queira). No decorrer deste estudo, será desenvolvida a teoria neces- sária para garantir que a reta real é realmente um modelo para a estrutura formada por R e seus axiomas, ou seja, que existe uma correspondência biunı́voca entre a reta real e R. Esta represen- tação será usada como apoio geométrico desde já para facilitar o entendimento de alguns conceitos, mas não deverá servir como justificativa para os raciocı́nios: de fato, as demonstrações sem- Os raciocı́nios nas demonstrações devem ser justificados com base nos axiomas e resultados já provados, não em desenhos. pre deverão ser apoiadas nos axiomas e nos resultados já prova- dos. A relação de ordem em R determina importantes subcon- juntos chamados intervalos. Considerando a representação geo- métrica mencionada acima, estes intervalos podem ser pensados como segmentos da reta real. Você certamente já conhece estes subconjuntos e as notações especı́ficas usadas para designá-los. 44 C E D E R J ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ A U L A 2 1 M Ó D U L O 1 Considere a,b ∈ R com a < b.1 (a,b) := {x ∈ R ; a < x < b}, [a,b] := {x ∈ R ; a ≤ x ≤ b}, (a,b] := {x ∈ R ; a < x ≤ b}, [a,b) := {x ∈ R ; a ≤ x < b}, (−¥,b) := {x ∈ R ; x < b}, (−¥,b] := {x ∈ R ; x ≤ b}, (a,+¥) := {x ∈ R ; x > a}, [a,+¥) := {x ∈ R ; x ≥ a}. Os intervalos dos tipos (a,b), [a,b], (a,b] e [a,b) são chama- dos intervalos limitados com extremos a e b e podem ser vis- tos geometricamente como segmentos da reta real: o primeiro é chamado um intervalo aberto, o segundo é um intervalo fechado. Os intervalos dos tipos (a,+¥), (−¥,b), [a,+¥) e (−¥,b] são ditos ilimitados e podem ser identificados geometri- camente com semirretas. É também comum escrever R= (−¥,+¥). Atente para o fato de que −¥ e +¥ são apenas sı́mbolos convenientes, que se leem “menos infinito” e “mais infinito”, respectivamente, e não representam números reais. A próxima definição fornece uma ideia de proximidade entre pontos que será fundamental para estabelecer os conceitos de limite de uma sequência e de uma função num ponto, que serão vistos nas Aulas 5 e 11, respectivamente. Definição 2.3. blablabla Sejam a,e elementos de R com e > 0. A vizinhança de centro em a e raio e é o conjunto Ve(a) := {x ∈ R ; |x−a|< e} de todos os reais x cuja distância a a é menor do que e . Ora, pela Proposição 2.1 (d), se x,a,e ∈ R com e > 0 então x ∈Ve(a)⇔ |x−a|< e⇔−e < x−a < e⇔ a−e < x < a+e. (2.1) Conclui-se pelas equivalências em (2.1), que a vizinhança Ve(a) de centro a e raio e é um intervalo aberto, a saber, Ve(a) = (a− e,a+ e). 1Alguns textos consideram conjuntos unitários e o conjunto vazio como intervalos, mas isto não será feito aqui. C E D E R J 45 ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ Fundamentos de Análise Real | Supremo e Ínfimo de conjunto ✞ ✝ ☎ ✆ Exemplo 2.1. blablabl A vizinhança de centro em 5 e raio 2 (a = 5 e e = 2) é V2(5) = {x ∈ R ; |x−5|< 2}= {x ∈ R ; 3 < x < 7}, pois, para cada x ∈R, |x−5|< 2 se e somente se 3 < x < 7. Re- almente, o intervalo (3,7) é o conjunto dos reais cuja distância a 5 é estritamente menor do que 2. O AXIOMA DO SUPREMO Assim como R, o conjunto Q é um corpo ordenado, pois satisfaz as mesmas propriedades algébricas e de ordem que R. O conjunto Q tem propriedades que o distinguem dos conjuntos N e Z: por exemplo, nem sempre existe um número inteiro entre dois inteiros dados, mas, entre dois racionais sempre existe um racional. Você já havia reparado nisto? Veja oExercı́cio 2.5. Por outro lado, é possı́vel mostrar que Q possui certas “lacunas”, como estabelece a próxima proposição. Proposição 2.3. blablabla Não existe um número racional x que seja solução da equação x2 = 2. Demonstração Os argumentos que garantem que a raiz quadrada de um natural n ≥ 3 é natural (exata) ou irracional, são também baseados na decomposição de n em fatores primos como para n = 2, que permite mostrar que as raı́zes não exatas não podem ser escritas como o quociente de dois números inteiros. Suponha por absurdo que existe x em Q satisfazendo x2 = 2. Como x ∈ Q, existem p,q ∈ Z com q 6= 0 tais que x = p q , sendo que pode-se considerar que p e q não possuem divisores comuns (se não fosse assim, bastaria reduzir a fração). Então x2 = 2 im- plica p2 = 2q2. Assim, p2 é par, e portanto p é necessariamente par. Pode-se escrever então p = 2m, para m ∈ Z. Consequente- mente, 2q2 = p2 = 4m2 , ou seja, q2 = 2m2. Isto diz que q2 é par, e daı́ q é par. Portanto, p e q são pares o que é uma contradição pois, pela escolha inicial, eles são primos entre si (logo, não possuem divisores comuns). Esta contradição decorre da suposição da existência de um número racional x sa- tisfazendo x2 = 2. Conclui-se que a equação x2 = 2 não possui solução no corpo Q dos racionais. 46 C E D E R J ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ A U L A 2 1 M Ó D U L O 1 É claro que não é possı́vel mostrar que a equação x2 = 2 ad- mite solução em R com base nos axiomas já estudados, se não, isto poderia ser provado paraQ. São justamente os números irra- cionais os reais que preenchem as “lacunas” ou “deficiências” de Q e permitem a representação geométrica de R como uma reta, o que é fundamental para que o Cálculo Diferencial e Integral fun- cione. Então, para poder justificar perfeitamente a Matemática por trás das ideias intuitivas do Cálculo é necessário introduzir um outro axioma, que permita garantir que não há “lacunas” em R. Neste texto, como aplicação dos estudos realizados, será mostrado como o Axioma do Supremo garante a existência de solução para x2 −2 = 0. Antes de apresentar o Axioma do Supremo, algumas noções preliminares precisam ser introduzidas. Definição 2.4. blablabla Seja A um subconjunto de R. (a) Um número real s é uma cota superior para A quando x ≤ s para todo x ∈ A. Em sı́mbolos: s ∈ R é uma cota superior para A ⇔ ∀x ∈ A, x ≤ s . (b) Um número real i é uma cota inferior para A quando i ≤ x para todo x ∈ A. Em sı́mbolos: i ∈ R é uma cota inferior para A ⇔ ∀x ∈ A, i ≤ x . Definição 2.5. blablabla Seja A um subconjunto de R. (a) A é chamado conjunto limitado superiormente quando existe alguma cota superior para A (diz-se, neste caso, que o conjunto A possui uma cota supe- rior). Analogamente, A é chamado conjunto limitado inferiormente quando existe uma cota inferior para A ( diz-se também, neste caso, que o conjunto A possui uma cota inferior). (b) Diz-se que A é um conjunto limitado quando A é li- mitado superiormente e inferiormente. Estude cuidadosamente o Exemplo 2, voltando à Definições C E D E R J 47 ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ Fundamentos de Análise Real | Supremo e Ínfimo de conjunto 2.4 e 2.5 sempre que necessário. ✞ ✝ ☎ ✆ Exemplo 2.2. blablabl (a) Sejam a,b ∈ R, a 6= b. O conjunto A = (a,b) é um con- junto limitado superior e inferiormente. De fato, como A= {x∈R ; a< x< b}, vê-se, pela própria definição de A, que o real a e todo real menor do que a é uma cota inferior para A e que b e todo real maior que b é uma cota superior para A. Exatamente o mesmo ocorre para os subconjuntos de R da forma [a,b], (a,b] e [a,b), por isso são todos di- tos intervalos limitados. É muito importante notar que Uma cota superior ou inferior para um conjunto pode pertencer ou não ao conjunto, revise a Definição 2.4. uma cota pode pertencer ou não ao conjunto. Quando se diz “o conjunto S possui cota superior” (respectivamente, “possui cota inferior”), isto significa, pela Definição 2.4, que existe tal cota, mas não necessariamente que a cota pertença ao conjunto. (b) Se A ⊂ R é limitado superiormente então A possui infini- tas cotas superiores. Analogamente, os subconjuntos de R limitados inferiormente têm infinitas cotas inferiores. Por exemplo, 2 e todo real maior do que 2 é cota superior dos conjuntos (0,2), {0,−3,−27,2} e de (−¥,2]. Assim Cotas (superiores ou inferiores) não são únicas. também, 3 e qualquer real menor do que 3 é uma cota in- ferior para os conjuntos {5,4,3, 7 2 ,3 √ 2}, [3,6] e (3,+¥) . (c) Os subconjuntos de R da forma (−¥,b), (−¥,b], (a,+¥), [a,+¥), (−¥,+¥) são chamados intervalos ilimitados, pois não são limitados superiormente ou inferiormente ou ambos: de fato, o primeiro e o segundo são conjuntos limi- tados superiormente mas não são limitados inferiormente, o terceiro e o quarto são conjuntos limitados inferiormente mas não limitados superiormente e o último intervalo é um conjunto que não é limitado inferiormente e nem superior- mente. Os sı́mbolos−¥ e +¥, que não são números reais, indicam exatamente esta ideia de inexistência de cota in- ferior e superior, respectivamente, para estes conjuntos. (d) O conjunto n 1 2 ,−1 4 , 1 5 ,−5 2 , √ 3,− √ 2 o é limitado (−5 2 é uma cota inferior e √ 3 é uma cota superior, verifique!). Na verdade, todo conjunto finito é limitado, um resultado As noções de conjunto finito e infinito serão estudadas na Aula 4. No momento, basta uma noção básica destes termos. Se precisar, consulte um livro de Ensino Médio ou Cálculo. que se pode provar usando indução matemática (demons- trações por indução matemática serão recordadas na Aula 48 C E D E R J ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ A U L A 2 1 M Ó D U L O 1 4). Note que a recı́proca desta afirmação não é verdadeira. De fato, nem todo conjunto limitado é finito: os intervalos limitados do item (a) acima servem de contraexemplo. ♦ Prelúdio 2.2. blablabla Em Matemática, é importante saber como estabelecer a ne- gação de uma sentença (ou enunciado) P[x]. Por exemplo, ao fa- zer uma demonstração por absurdo, é preciso formular a negação da conclusão. A negação de uma sentença P[x] é uma outra sentença, denotada aqui por ∼P[x] que tem valor lógico oposto ao de P[x]. De fato, pelo Princı́pio Lógico da não-contradi- Princı́pio Lógico da não-contradição: uma sentença matemática não é verdadeira e falsa ao mesmo tempo, não podendo contradizer-se. ção, dada uma sentença P[x], uma e somente uma das duas afirmações ocorre: P[x] é verdadeira ou ∽P[x] é verdadeira. Da mesma forma, ou P[x] é falsa ou ∽P[x] é falsa, excluden- temente. Particular atenção deve ser dada à negação de sentenças en- volvendo quantificadores. Os quantificadores universal “∀” ( lê- se “para todo”, “para cada”, “para qualquer”, etc.) e existen- cial “∃ ” (lê-se “existe” significando “existe pelo menos um”) delimitam a abrangência de sentenças abertas do tipo “x > 3” ou “3x+5 = 12”, permitindo que lhes seja atribuı́do um valor lógico que elas não têm a priori. De fato, não se pode dizer se “x > 3” é sentença verdadeira ou falsa. Mas, das sentenças ∀x ∈ R, x > 3 e ∃x ∈ R, x > 3 pode-se dizer que a primeira é falsa e a segunda, verdadeira. Sentenças matemáticas abertas são aquelas das quais não se pode dizer se são verdadeiras ou falsas, pois nelas ocorrem variáveis. Considerando S um conjunto, a sentença quantificada ∀x ∈ S, Q[x] (2.2) expressa exatamente a mesma ideia que a implicação Se x ∈ S então Q[x] , (2.3) e por isto, têm o mesmo valor lógico. De fato, (2.2) (e também 2.3) é verdadeira quando Q[x] é verdadeira para todo x ∈ S. Importante: já foi visto que a implicação (2.3) é falsa exatamente Rever a definição de contraexemplopara uma implicação na Aula 1. quando existe x ∈ S tal que Q[x] é falsa, ou seja, tal que ∼Q[x] é verdadeira. Logo, o mesmo vale para (2.2): ∼ (∀x ∈ S, Q[x]) C E D E R J 49 ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ Fundamentos de Análise Real | Supremo e Ínfimo de conjunto ou seja, “não é verdade que para todo x∈ S, vale Q[x]”, significa que ∃x ∈ S,∼ Q[x] . Daı́ vem que: “não é verdade que existe x∈ S satisfazendo Q[x]”, que, em sı́mbolos, escreve-se como ∼ (∃x ∈ S, Q[x]) , significa que ∀x ∈ S, ∼ Q[x] . Por exemplo, se A = {1,−2, 9 2 , √ 2,p}, a sentença ∀x ∈ A, x ≤ 4 (2.4) que afirma que 4 é uma cota superior para A (ou, equivalente- mente, que A é conjunto limitado superiormente por 4) é falsa; de fato, sua negação ∃x = 9 2 ∈ A, x > 4 , é que é uma sentença verdadeira. Observe que (2.4) pode ser escrita também como Se x ∈ A então x ≤ 4 . Particularmente, será importante, na continuação deste es- tudo, entender como são descritas, em linguagem matemática, as seguintes afirmações: “ não é verdade que c seja uma cota superior para o conjunto A” e “não é verdade que d seja uma cota inferior para A”, onde c e d indicam números reais. Em sı́mbolos, escreve-se ∼ (∀x ∈ A, x ≤ c) e ∼ (∀x ∈ A, x ≥ d) . Como visto, as negações são descritas, respectivamente como ∃x ∈ A, x > c e ∃x ∈ A, x < d . Por exemplo, 2 não é uma cota superior para o conjunto A = {x ∈ R ; x < 2,5} pois existe x = 2,1 ∈ A tal que 2 < 2,1. Também, −5 2 não é uma cota inferior do conjunto B = {2,−2, 1/2,−1/2,3,−3,4,−4} , pois existe b =−3 ∈ B tal que −3 <−5/2. Faça esboços na reta para ilustrar. 50 C E D E R J ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ A U L A 2 1 M Ó D U L O 1 Depois de refazer os raciocı́nios do prelúdio anterior, prati- que com o Exercı́cio 2.6. Segue, finalmente, a definição de supremo de um conjunto, que permitirá que seja enunciado o Axioma do Supremo. Definição 2.6. blablabla Seja A um subconjunto de R limitado superiormente. Um número real s é chamado supremo de A quando s é a menor das cotas superiores de A, ou seja, s é uma cota superior de A e é a menor de todas elas. Notação: s = supA. Para s ∈ R , s = supA ⇔ � (S1) s é uma cota superior de A e (S2) s é a menor das cotas superiores de A . ⇔ ( (S1) a ≤ s para todo a ∈ A e (S2) se c ∈ R e c < s então c não é cota superior de A | {z } . ⇔ � (S1) ∀ a ∈ A , a ≤ s e (S2) se c ∈ R e c < s então existe a ∈ A tal que c < a . Note como a condição (S2) é reformulada na linguagem natural para poder ser expressa apropriadamente na linguagem matemática, usando as noções preliminares trabalhadas. Para a formalização das definições acima é fundamental en- tender que: dizer que s é “a menor das cotas superiores do con- junto A” significa dizer que “ se um número é menor do que s então ele não é uma cota superior para A”. Com isto, as duas condições da definição podem descritas em linguagem ma- temática como acima, usando as ideias apresentadas no Prelúdio 2.2. Procedimento análogo é feito também para definir a maior das cotas inferiores de um conjunto. Neste caso, deve ser en- tendido que a sentença “i é a maior das cotas inferiores de um conjunto A” significa o mesmo que “se um real é maior do que i então ele não é uma cota inferior de A ”. C E D E R J 51 ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ Fundamentos de Análise Real | Supremo e Ínfimo de conjunto Definição 2.7. blablabla Seja A um subconjunto de R limitado inferiormente. Um número real i é chamado ı́nfimo de A quando i é a maior das cotas inferiores de A, ou seja, i é uma cota inferior de A e é a maior de todas elas. Notação: i = infA. Para i ∈ R , i = infA ⇔ � (I1) i é uma cota inferior de A e (I2) i é a maior das cotas inferiores de A . ⇔ ( (I1) i ≤ a para todo a ∈ A e (I2) se d ∈ R e d > i então d não é cota inferior de A | {z } . ⇔ � (I1) ∀ a ∈ A , i ≤ a e (I2) se d ∈ R e d > i então existe a ∈ A tal que a < d . ✞ ✝ ☎ ✆ Exemplo 2.3. blablabl Para A1 = {0,−2, √ 3,3/5}, tem-se supA1 = √ 3 e infA1 =−2. Para A2 = {x ∈ R ; 2 ≤ x < 7} vale supA2 = 7 e infA2 = 2. O conjunto A3 = {x ∈ R ; x < √ 2} tem supA3 = √ 2 mas não existe ı́nfimo de A3. Para A4 = � 1 n ; n ∈ N � , vale supA4 = 1 e infA4 = 0 . Os conjuntos Z, Q e R não admitem supremo nem ı́nfimo. Na sequência, você vai aprender a dar justificativas para as afirmações do Exemplo 2.3. Neste momento, procure entender 52 C E D E R J ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ A U L A 2 1 M Ó D U L O 1 os conceitos através dos exemplos dados. Algumas propriedades do supremo e do ı́nfimo de um con- junto são obtidas diretamente das definições. Proposição 2.4. blablabla Seja A ⊂ R. Então: (a) O supremo de A, se existe, é único. E o ı́nfimo de A, se existe, é único. (b) Se s0 é uma cota superior de A e s0 ∈ A então s0 = supA. (c) Se i0 é uma cota inferior de A e i0 ∈ A então i0 = infA. Demonstração No que se segue, A é um subconjunto de R. (a) Suponha que os reais s1 e s2 sejam ambos supremos de A. Então, pela Definição 2.6, ambos são cotas superiores de A e ambos são menores do que quaisquer outras cotas superiores de A. Mas daı́ tem-se que s1 ≤ s2 e s2 ≤ s1. Segue que s1 = s2 e a afirmação está provada. A outra afirmação prova-se de forma análoga e deve ser feita como exercı́cio. (b) Suponha que s0 ∈ R seja uma cota superior de A e que s0 ∈A. Então a condição (S1) da Definição 2.6 é satisfeita Para mostrar que um real é o supremo de um conjunto, o procedimento é mostrar as duas condições da definição. por hipótese. Seja agora c ∈ R tal que c < s0. Então c não é uma cota superior de A pois, por hipótese, s0 ∈ A e c < s0. Assim, a condição (S2) da Definição 2.6 também é satisfeita, e portanto, s0 = supA. (c) Exercı́cio. Considere atentamente os exemplos a seguir e as justificati- vas apresentadas para as afirmações. C E D E R J 53 ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ ✐ Fundamentos de Análise Real | Supremo e Ínfimo de conjunto ✞ ✝ ☎ ✆ Exemplo 2.4. blablabl (a) Para A1 = {x ∈ R ; −1 ≤ x ≤ 1}, −1 ∈ A1 e −1 é uma cota inferior de A1, pela própria definição do conjunto. Daı́ e do item (c) da Proposição 2.4, tem-se que −1 = infA1. Por raciocı́nio análogo, mostra-se que 1 = supA1. (b) Para o conjunto A2 = {a ∈R ; a < 1}, o real 1 é uma cota superior pois a ≤ 1 para todo a ∈ A2. Portanto, 1 satisfaz a condição (S1). Aqui 1 /∈ A2, logo não se pode usar o item (b) da Proposição 2.4. Deve-se mostrar diretamente que a condição (S2) da Definição 2.6 é satisfeita. Para isto, seja c ∈ R tal que c < 1. Então c+1 2 ∈ R sendo que c < c+1 2 < 1, ver Exercı́cio 2.5. Portanto, existe a = c+1 2 ∈ A2 tal que c < a. Assim, nenhum número real c < 1 é uma cota superior de A2, ou seja, provou-se que vale a condição (S2) para o número 1. Fica então garantido que 1 = supA2. Por outro lado, A2 não é limitado inferiormente e portanto não existe ı́nfimo de A2. (c) Considere o conjunto A3 = {a ∈ R ; −2 < a < 3}. Então infA3 = −2. De fato, −2 é uma cota inferior de A3, pois −2 ≤ a para todo a ∈ A3. Isto comprova a condição (I1) da Definição 2.7. Note que A3 é limitado inferiormente por −2 mas −2 /∈ A3. Portanto, não se pode aplicar a Proposição 2.4, é preciso mostrar diretamente que vale a condição (I2) da Definição 2.7. Para isto, seja d ∈R tal que d >−2. Então Aqui é preciso considerar separadamente os casos d < 3 e d ≥ 3, mostrando a conclusão em cada um. Faça esboços na reta real. pode-se ter d < 3 ou d ≥ 3. Suponha primeiramente que d < 3 (neste caso, d ∈ A3, mas isto não interessa aqui, fo- que na conclusão). Como −2 < d, existe a = −2+d 2 ∈ R satisfazendo −2 < a < d; daı́ −2 < a < 3 e portanto, a ∈ A3. Assim, a conclusão vale no caso d < 3. Suponha agora d ≥ 3. Mas daı́, existe, por exemplo, a = 1 ∈ A3 tal que a < d (na verdade, qualquer elemento de A3 serve neste caso,
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