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Psicologia: as etapas de desenvolvimento infantil segundo Piaget SST Silva, Vitor Lima da Psicologia: as etapas de desenvolvimento infantil segun- do Piaget / Vitor Lima da Silva Ano: 2020 nº de p.: 13 Copyright © 2020. Delinea Tecnologia Educacional. Todos os direitos reservados. Psicologia: as etapas de desenvolvimento infantil segundo Piaget 3 Apresentação Neste momento trataremos sobre o desenvolvimento infantil sob a ótica do renomado Piaget e sua teoria da psicologia genética. Em seguida, você conhecerá as etapas do desenvolvimento infantil segundo Piaget que são os períodos sensório-motor, pré-operacional, operacional concreto e operacional formal. Ainda refletirá quais contribuições estes estudos trouxeram para o ambiente educacional atual. Ao fim desta unidade, você estará apto a entender as contribuições da psicologia do desenvolvimento de Piaget para o campo da educação e compreender os principais conceitos e contribuições das suas teorias. Jean Piaget e a psicologia genética Jean Piaget (1896-1980) nasceu na Suíça e já apresentava ímpetos científicos desde sua infância. Em sua autobiografia, ele relata que desde os sete anos gostava de observar os pássaros, conchas marinhas e moluscos que ficavam ao redor dos lagos suíços. O seu interesse pela observação empírica e pela biologia não se limitou à infância. Ele licenciou-se em Biologia em 1915 e defendeu tese de doutorado em 1918, sobre moluscos de Valais, na Universidade de Neuchâtel (Suíça). Da Biologia à Epistemologia, este foi o percurso que Piaget traçou quando começou a se interessar pela questão do conhecimento e de como o adquirimos ao longo do nosso desenvolvimento. Este tema se tornou ponto crucial em sua trajetória de pesquisa e produção teórica. Piaget preocupou-se em entender como o conhecimento é adquirido pelo indivíduo e como esta capacidade, especificamente humana, diferencia radicalmente o ser humano das demais espécies. Piaget importou algumas ideias e conceitos da Biologia para o campo do desenvolvimento infantil. Para ele, o desenvolvimento é um processo contínuo de trocas entre o organismo vivo e o meio ambiente. Outra referência da Biologia utilizada é de que o organismo vivo está em processo constante de adaptação por meio da busca pelo equilíbrio com o meio ambiente. Neste sentido, Piaget pontua que: 4 [...] o desenvolvimento cognitivo do indivíduo ocorre através de constantes desequilíbrios e equilibrações. O aparecimento de uma nova possibilidade orgânica no individuo ou a mudança de alguma característica do meio ambiente, por mínima que seja, provoca a ruptura do estado de repouso – da harmonia entre organismos e meio – causando um desequilíbrio (OLIVEIRA & DAVIS, 1994, p. 38). Para Piaget, o desenvolvimento cognitivo é definido como um contínuo processo de busca pelo equilíbrio entre as capacidades cognitivas do indivíduo e as condições do meio. O processo de equilibração envolve dois mecanismos, a assimilação e a acomodação, que atuam no sentido de permitir ao indivíduo atingir um novo estado de equilíbrio. Na prática, esses dois mecanismos ocorrem simultaneamente. Assimilação É o mecanismo de significação, sem alteração da estrutura, destinada a novos elementos do meio. Acomodação É o processo no qual o indivíduo modifica estruturas internas a partir de situações externas às quais está submetido. Este pesquisador desenvolveu inúmeros experimentos práticos com grupos variados de crianças, e a influência dos estudos da Biologia possibilitou-lhe um rigor metodológico que aplicou nas pesquisas sobre o desenvolvimento intelectual da criança. Ele sistematizou os resultados e as informações obtidos nas pesquisas e produziu um amplo material teórico, que é comumente referenciado no campo da Psicologia da Educação. A principal preocupação de Piaget está em descobrir como a criança adquire novos conhecimentos. O enfoque de suas pesquisas é o desenvolvimento cognitivo da criança: ele preocupa-se mais com o desenvolvimento das estruturas mentais do que com os processos de aprendizagem em si. Segundo ele, o processo de desenvolvimento é gradual e contínuo e só é possível passar a uma nova etapa quando os requisitos da etapa anterior estão contemplados. A aquisição de novas qualidades do pensamento influencia no desenvolvimento global do indivíduo. 5 As etapas do desenvolvimento segundo Piaget Piaget organizou as etapas do desenvolvimento de acordo com as habilidades predominantes na faixa etária de cada período. Como se trata de generalizações, a divisão dos períodos em faixa etária não é rígida. Apesar de todas as pessoas passarem por todas as fases, o início e o fim de um determinado período podem variar de acordo com as características biológicas do indivíduo, estímulos do ambiente e condições sociais e culturais. Período Sensório Motor O período sensório motor ocorre desde o nascimento até dois anos de idade. Nele a criança utiliza basicamente as percepções sensoriais e esquemas motores para interagir com o mundo que a cerca. A exploração do mundo externo se dá pelo corpo: para conhecer, é necessário interagir diretamente com as coisas. O recém-nascido possui vida mental restrita aos aparelhos reflexos, tais como a sucção. Com o passar dos dias, estes esquemas se modificam e ficam cada vez mais elaborados. Os reflexos inatos vão se aperfeiçoando com as experiências da criança e, juntamente com o desenvolvimento dos esquemas motores, ampliam as possibilidades de interação e exploração do mundo. Nesse período, a criança ainda não consegue representar, e a vida ocorre apenas no plano concreto do aqui-e-agora. Ela precisa pegar, morder, jogar, balançar e interage com as coisas num nível “pré-lógico”, baseado apenas nas percepções sensoriais da interação direta. 6 O desenvolvimento físico já avançou bastante nestes dois anos, o que dá suporte para o desenvolvimento de esquemas motores mais elaborados. Este processo de amadurecimento físico repercute diretamente na capacidade de a criança desenvolver novas habilidades e comportamentos, como sentar-se, andar e manusear objetos ao seu redor com certo nível de controle, o que amplia sua capacidade de explorar e atuar no ambiente. Outro processo importante neste período é a construção da noção de “eu”. O bebê começa a perceber os limites entre seu corpo e o mundo externo. Ele explora o próprio corpo e acumula registros diversos de sua própria emoção, que vai dando contorno ao seu autoconceito. Ele já admite que as outras coisas existam independentes dele: se retirarmos um brinquedo da mão de um bebê de 1 ano e o escondermos fora de suas vistas, ele permanece procurando com olhar, pois tem noção de que o objeto continua existindo. A experiência deixa de ser puramente imediata, e a realidade das coisas começa a ter uma estabilidade para além do momento percebido. Neste processo, a criança elabora sua organização psicológica básica, que inclui o desenvolvimento de sua experiência motora, perceptiva, afetiva, social e intelectual. O bebê não está mais imerso no mundo das emoções primárias e sai de uma posição passiva diante das coisas para começar a manifestar preferência afetiva por objetos e pessoas. A função simbólica surge e dá à criança a capacidade de representar o futuro. A partir daí, a criança não fica mais presa apenas nas percepções sensório motoras do aqui-e-agora. A função simbólica transforma radicalmente a maneira como o bebê interage com seu meio e cria as condições para ingresso no próximo período. É uma fase em que a inteligência e a afetividade estão interligadas por meio das interações sociais e estímulos oriundos das experiências com outras pessoas. No final desse período, a criança acumulou certa experiência sensório motora e demonstra Inteligência prática. Ela já consegue utilizar um instrumento para alcançar um objeto. Atenção 7 Período Pré-Operatório O período pré-operatório corresponde à faixa etária dosdois aos sete anos, fase conhecida também como primeira infância. Além desta mudança, a criança começa a externalizar o seu mundo interior pela linguagem, desenvolvendo a capacidade de representar e prever ações futuras. À inteligência prática desenvolvida no estágio anterior, a criança agrega esquemas representativos ou simbólicos que permitem antever uma ideia preexistente. Neste momento, ela consegue formar representações de carrinho, de avião, de papai, de regras sociais etc. O pensamento passa por um processo de desenvolvimento intenso. No início do período, os pensamentos são pura expressão de seus desejos e fantasias (jogo simbólico) e, no decorrer desta fase, a criança passa a usar sua referência de Eu para explicar o mundo. É um momento de “reconhecimento do eu, e a criança não consegue se colocar no lugar do outro: o trabalho em grupo torna-se difícil. Ao final do período, a criança passa a procurar explicação causal e finalista para tudo: é a fase em que ela quer saber o “porquê” de tudo. Neste momento, ela já se mostra mais adaptada ao outro e ao real. A aquisição da linguagem é o fator de maior destaque no desenvolvimento da criança nesse período, pois implica mudanças substanciais nos aspectos intelectual, afetivo e social da criança. Atenção A criança não consegue realizar um distanciamento em relação ao seu próprio eu e, por isso, o pensamento, neste momento, é chamado de pensamento egocêntrico. Saiba mais 8 O pensamento pré-operatório depende da percepção momentânea da criança, podendo gerar distorções em relação à realidade. Apesar de as ações no período pré-operatório serem internalizadas, a criança não domina a noção de reversibilidade, que é uma das condições para que haja uma ação operatória. Isso quer dizer que a criança não consegue retornar mentalmente ao início de uma operação. Por exemplo: se pedirmos para uma criança de quatro anos acrescentar quatro limões a uma determinada quantidade de limões e depois para retirar quatro limões, ela não entenderá que ficou o mesmo número de limões que tinha no início, a não ser que ela conte o número de limões em cada momento da operação. Período Operatório-Concreto O período operatório-concreto ocorre entre sete e doze anos. Aos sete anos de idade, a criança possui características marcantes que a diferenciam do período anterior. O desenvolvimento mental superou a fase do pensamento egocêntrico e começa a construção lógica, o que possibilita a ela lidar com pontos de vistas diferentes. Por exemplo: se colocarmos em frente à criança dois recipientes, cada um com um litro de água, porém de formatos diferentes, de maneira que um seja perceptivelmente mais comprido que o outro, a criança automaticamente acreditará que existe mais água no recipiente que é mais comprido. No estágio pré-operatório, a criança não tem noção de conservação: mudando a aparência do objeto, ela pensa que muda também a quantidade, o volume, a massa e o peso do mesmo. Atenção 9 As ações interiorizadas tornam-se mais flexíveis, e a criança consegue executar a reversibilidade das operações, daí o período ser denominado operatório. Ela já entende, por exemplo, que 5-3=2, pois sabe que 2+3=5. Esta operação de reversibilidade reflete-se na capacidade de compreender a noção de conservação. O pensamento é pautado mais no raciocínio lógico do que na percepção. Deste modo, alterar o tamanho de um recipiente com a mesma quantidade de água não afeta a noção de que a quantidade de água se mantém a mesma. O pensamento operatório-concreto não sofre tanta influência da percepção, e a criança tem noção de conservação quanto à massa, ao peso e volume dos materiais. Ela também consegue estabelecer relações de causa e efeito, meio e fim, além de conseguir sequenciar eventos ou ideias. À medida que a criança se desenvolve, ela ganha autonomia e confiança em si, o que faz com que se distancie das ideias dos adultos e comece a organizar seus próprios valores morais. Aparece também a vontade própria como referência para a tomada de decisão em situações conflituosas. A capacidade de trabalhar em grupo e cooperar desenvolve-se ao longo deste período: ao final desta fase, a criança encontra no grupo de amigos um espaço de segurança e afeto. O sentimento de pertencer ao grupo ganha intensidade, e a convivência com a opinião dos adultos (especialmente dos pais) dá lugar aos enfrentamentos e embates. O reflexo no plano afetivo é caracterizado pelo desenvolvimento da habilidade interpessoal de cooperar com o outro e aceitar a existência das diferentes opiniões, tornando possível o trabalho em grupo, sem deixar de exercer sua autonomia. Saiba mais No período operatório-concreto, a criança irá formar o conceito de número, que no início estará atrelado ao objeto concreto. Curiosidade 10 Período Operatório-Formal O período operatório-formal inicia-se em torno dos 11 ou 12 anos e segue adiante. Neste período, ocorre a mudança do pensamento concreto para o pensamento formal ou abstrato. O adolescente ingressa no mundo das ideias e não necessita operar sobre o concreto, como na fase anterior. Os esquemas mentais estão mais complexos e progressivamente suportam raciocínios abstratos e generalizações teóricas. O fato de não precisar mais do mundo real para pensar sobre ele liberta o pensamento do adolescente do mundo concreto. Neste sentido, o adolescente, além de poder trabalhar no mundo concreto e real, também pode pensar no mundo como possibilidades. A capacidade de abstração passa a ser utilizada para pensar seu próprio mundo e questionar os modelos próximos, principalmente dos pais. Neste processo, o adolescente tende a ficar mais interiorizado e distante da família, mantendo as reflexões críticas em relação à sociedade. É um segundo momento de (re)constituição da identidade do indivíduo. O período da adolescência é marcado por conflitos, necessidade de contrariar o modelo dos pais e questionar as regras. Com o decorrer do tempo, o adolescente encontra um equilíbrio entre seus ideais e a realidade possível e constata a importância da reflexão para atuar sobre o mundo real. Piaget pontua que a personalidade começa a se formar no final da infância, entre oito e doze anos. Neste período, o indivíduo inicia a organização das próprias regras, valores e a afirmar a própria vontade. Estas características agrupam-se num projeto de vida que passa a nortear as escolhas e preferências do sujeito. Este processo não é rígido e nem linear, pelo contrário, ele é dinâmico e mutável, assim como o próprio período da adolescência. Assista ao filme “Kids” dirigido por Larry Clark, e identifique características típicas da adolescência e os desafios e conflitos que rondam esse período do desenvolvimento humano, permeado por rebeldia e contestação às normas estabelecidas. Veja o trailer disponível em: http://youtu.be/Myzec1dgSqc Saiba mais 11 O período operatório-formal representa o mais alto grau de complexidade do desenvolvimento cognitivo. O amadurecimento da capacidade cognitiva do sujeito adulto se dá em termos qualitativos e de profundidade, já que as experiências da vida continuam oportunizando aprendizados. Contribuições dos estudos de Piaget para educação Jean Piaget revolucionou a Educação, pois seus estudos derrubaram paradigmas relacionados à aprendizagem. As ideias de Piaget continuam sendo estudadas e aplicadas no mundo todo. Como ideia nuclear, o pesquisador defendeu uma metodologia inovadora na busca de formação de cidadãos criativos e críticos. Para ele, o professor deve orientar os estudantes no caminho da aprendizagem, de forma a favorecer a autonomia no aprender. Conforme esclarece Vieira e Lino (2007), Jean Piaget, por meio de seus estudos na área da biologia concluiu que o desenvolvimento biológico é um processo de adaptação ao meio em que vive o indivíduo, que depende da sua maturação tanto quanto das condições desse meio. O cientista leva esta concepçãopara estudos sobre o desenvolvimento humano, especialmente o cognitivo. Quanto à questão do desenvolvimento moral, Piaget destaca o papel ativo da criança na construção do pensamento, assim como a importância da interação social para essa construção. Desses estudos, para os quais Piaget utilizou a concepção das regras, são destacadas duas fases de desenvolvimento moral: a heterônoma e a autônoma. Para o autor, essa concepção das regras traz uma manifestação concreta do egocentrismo, que é característica do pensamento da criança pequena, o que equivale à sua incapacidade para fazer diferenciação de perspectivas. Desta forma, supõe que as regras são iguais para todos e que são criadas por aquele a quem entendem como autoridade, geralmente o adulto. “[...] a criança na fase de heteronomia moral concebe as regras sociais como entidades externas às pessoas e aos contextos, com caráter imutável e absoluto”, esclarecem Vieira e Lino (2007, p. 201). 12 Fechamento Estudamos os quatro aspectos básicos do desenvolvimento humano: o aspecto físico-motor, o aspecto intelectual, o aspecto afetivo-emocional e o aspecto social. Vimos que o enfoque das pesquisas de Jean Piaget é o desenvolvimento cognitivo da criança, onde ele preocupa-se mais com o desenvolvimento das estruturas mentais do que com os processos de aprendizagem em si. Identificamos que o autor importou ideias e conceitos da biologia para o campo do desenvolvimento infantil e postulou quatro estágios. Por fim, vimos que seus estudos trouxeram contribuições para o campo da educação pois estes derrubaram paradigmas relacionados à aprendizagem. 13 Referências OLIVEIRA, Z. R., DAVIS. C. Psicologia na Educação. São Paulo: Cortez 1994. Piaget, J. Psicologia e Pedagogia. Rio de Janeiro, Forense Universitária, 1998. VIEIRA, F.; LINO, D. As contribuições da teoria de Piaget para a pedagogia da infância. In OLIVEIRA-FORMOSINHO, J.; KISHIMOTO, T.M.; PINAZZA, M.A. (org) Pedagogia (s) da infância: Dialogando com o passado, construindo o futuro. Porto Alegre: Artmed, 2007.
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