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Autores: Prof. Celso Aurélio Tassinari Profa. Daniela da Cunha Souza Patto Colaboradores: Prof. Ricardo Scalão Tinoco Profa. Laura Cristina da Cruz Dominciano Química Aplicada para Engenharia Civil EN GC - R ev isã o: F ab ric ia - D ia gr am aç ão : F ab io - 2 2/ 11 /2 01 7 Professores conteudistas: Celso Aurélio Tassinari / Daniela Souza Patto Celso Aurélio Tassinari Nascido em São Paulo, é engenheiro químico formado pela Faculdade de Engenharia Industrial, especialista em Engenharia de Materiais pela Universidade Paulista (UNIP), mestre em Engenharia de Produção pela UNIP, doutor em Engenharia de Produção, na área de Gestão de Sistemas de Operação (linha de pesquisa: Produção mais Limpa e Ecologia Industrial), pela mesma universidade. Atuou como vice-diretor de pesquisas no Instituto de Pesquisas e Estudos Industriais da Fundação de Ciências Aplicadas, diretor de operações técnicas no Conselho Regional de Engenharia, Arquitetura e Agronomia do Estado de São Paulo. Atualmente, é professor titular da Universidade Paulista, ministrando aulas nos cursos de Engenharia e Ciências da Computação. Em 2012, assumiu a coordenação geral de estágios do Instituto de Ciências Exatas e Tecnologia da UNIP. Daniela da Cunha Souza Patto Nascida em São Paulo, é engenheira química formada pela Escola de Engenharia de Lorena (EEL-USP), mestre em Química pelo Instituto de Química da Unicamp, doutora em Ciências na área de Química Orgânica pelo Instituto de Química da Unicamp e pós-doutora pela Faculdade de Ciências Farmacêuticas da Universidade de São Paulo (USP). Atuou como química de pesquisa na indústria farmoquímica no desenvolvimento de produtos farmacêuticos e cosméticos, atuando também como auditora interna do sistema de gestão da qualidade (ISO 9001, ISO 14000 e Oshas 18000). Atualmente, é professora titular da Universidade Paulista, ministrando aulas nos cursos de Farmácia, Engenharia Civil e Elétrica. Em 2014 assumiu a coordenação auxiliar do curso de Gestão Ambiental. Além disso, é conteudista de materiais para a educação a distância, incluindo gravações de aulas. © Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta obra pode ser reproduzida ou transmitida por qualquer forma e/ou quaisquer meios (eletrônico, incluindo fotocópia e gravação) ou arquivada em qualquer sistema ou banco de dados sem permissão escrita da Universidade Paulista. Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) T213q Tassinari, Celso Aurélio. Química aplicada para engenharia civil. / Celso Aurélio Tassinari, Daniela Souza Patto. – São Paulo: Editora Sol, 2018. 132 p., il. Nota: este volume está publicado nos Cadernos de Estudos e Pesquisas da UNIP, Série Didática, ano XXIV, n. 2-040/18, ISSN 1517-9230. 1. Química aplicada. 2. Engenharia civil. 3. Corrosão. I. Patto, Daniela Souza. II. Título. CDU 54:62 EN GC - R ev isã o: F ab ric ia - D ia gr am aç ão : F ab io - 2 2/ 11 /2 01 7 Prof. Dr. João Carlos Di Genio Reitor Prof. Fábio Romeu de Carvalho Vice-Reitor de Planejamento, Administração e Finanças Profa. Melânia Dalla Torre Vice-Reitora de Unidades Universitárias Prof. Dr. Yugo Okida Vice-Reitor de Pós-Graduação e Pesquisa Profa. Dra. Marília Ancona-Lopez Vice-Reitora de Graduação Unip Interativa – EaD Profa. Elisabete Brihy Prof. Marcelo Souza Prof. Dr. Luiz Felipe Scabar Prof. Ivan Daliberto Frugoli Material Didático – EaD Comissão editorial: Dra. Angélica L. Carlini (UNIP) Dra. Divane Alves da Silva (UNIP) Dr. Ivan Dias da Motta (CESUMAR) Dra. Kátia Mosorov Alonso (UFMT) Dra. Valéria de Carvalho (UNIP) Apoio: Profa. Cláudia Regina Baptista – EaD Profa. Betisa Malaman – Comissão de Qualificação e Avaliação de Cursos Projeto gráfico: Prof. Alexandre Ponzetto Revisão: Fabrícia Carpinelli Ricardo Duarte EN GC - R ev isã o: F ab ric ia - D ia gr am aç ão : F ab io - 2 2/ 11 /2 01 7 Sumário Química Aplicada para Engenharia Civil APRESENTAÇÃO ......................................................................................................................................................7 INTRODUÇÃO ...........................................................................................................................................................8 Unidade I 1 CICLO HIDROLÓGICO ..................................................................................................................................... 11 1.1 Esgotamento da água potável ........................................................................................................ 13 1.2 Água do mar ........................................................................................................................................... 14 1.3 Água doce ................................................................................................................................................ 15 1.4 Qualidade da água ............................................................................................................................... 16 1.5 Padrões de qualidade da água ........................................................................................................ 17 1.6 A poluição nos meios aquáticos ..................................................................................................... 20 1.6.1 Matéria orgânica ..................................................................................................................................... 20 1.6.2 Organismos patogênicos ..................................................................................................................... 22 1.6.3 Nutrientes em excesso .......................................................................................................................... 22 1.6.4 Materiais em suspensão ....................................................................................................................... 22 1.6.5 Radioatividade ......................................................................................................................................... 22 1.6.6 Defensivos agrícolas e fertilizantes ................................................................................................ 23 1.6.7 Metais .......................................................................................................................................................... 24 1.6.8 Poluição térmica ..................................................................................................................................... 25 1.6.9 Plásticos ...................................................................................................................................................... 28 1.7 Principais usos da água ..................................................................................................................... 29 1.7.1 Agricultura ................................................................................................................................................. 29 1.7.2 Usos industriais........................................................................................................................................ 29 1.7.3 Geração de energia ................................................................................................................................ 29 1.7.4 Recreação ................................................................................................................................................... 30 1.7.5 Navegação ................................................................................................................................................. 30 1.7.6 Receptação de despejos ....................................................................................................................... 30 1.7.7 Abastecimento público .........................................................................................................................30 2 TRATAMENTO DE ÁGUA ............................................................................................................................. 31 2.1 Etapas do tratamento de água ...................................................................................................... 31 2.2 Recuperação de recursos hídricos ................................................................................................. 33 2.3 Reúso planejado da água .................................................................................................................. 34 2.4 Tipos de reúso ........................................................................................................................................ 35 2.5 Aplicações da água reciclada .......................................................................................................... 36 2.6 Reúso da água no Brasil .................................................................................................................... 36 3 CARACTERÍSTICAS FÍSICAS DA ÁGUA ..................................................................................................... 37 3.1 Características químicas e físico-químicas da água .............................................................. 39 3.2 Ensaio de Jar Test (ou Teste dos Jarros)....................................................................................... 42 EN GC - R ev isã o: F ab ric ia - D ia gr am aç ão : F ab io - 2 2/ 11 /2 01 7 4 UNIDADES DE CONCENTRAÇÃO ............................................................................................................... 48 4.1 Unidades clássicas ................................................................................................................................ 48 4.2 Unidades especiais de concentração ............................................................................................ 50 Unidade II 5 CORROSÃO ......................................................................................................................................................... 57 5.1 Corrosão em estruturas metálicas ............................................................................................... 57 5.2 Corrosão em estruturas de concreto ............................................................................................ 66 5.2.1 Concreto armado .................................................................................................................................... 67 5.2.2 Deterioração do concreto .................................................................................................................... 69 5.2.3 Lixiviação .................................................................................................................................................... 70 5.2.4 Outros tipos de degradação ............................................................................................................... 70 6 MEDIDA DA CORROSÃO ............................................................................................................................... 71 6.1 Taxa de corrosão ................................................................................................................................... 71 7 POTENCIAL DE ELETRODO ............................................................................................................................ 77 7.1 Variação do potencial de eletrodo com a concentração da solução .............................. 79 7.2 Potencial normal do eletrodo .......................................................................................................... 80 7.3 Eletrodo de hidrogênio ...................................................................................................................... 80 7.4 Pilhas galvânicas ................................................................................................................................... 81 8 PARTE EXPERIMENTAL ................................................................................................................................... 88 8.1 Reações anódicas e catódicas ......................................................................................................... 92 8.1.1 Reações anódicas (oxidação) ............................................................................................................. 92 8.1.2 Reações catódicas .................................................................................................................................. 93 8.2 Potenciais práticos – potenciais relativos .................................................................................. 93 8.2.1 Montagem de uma tabela de potenciais práticos..................................................................... 94 8.2.2 Influência do meio na inversão de polaridade ........................................................................... 94 8.2.3 Mecanismo da corrosão ....................................................................................................................... 96 8.3 Heterogeneidades ..............................................................................................................................100 8.3.1 Temperaturas diferentes ....................................................................................................................100 8.3.2 Aeração diferencial ..............................................................................................................................101 8.3.3 Concentrações diferentes ..................................................................................................................101 8.3.4 Meios corrosivos diferentes ..............................................................................................................102 8.3.5 Elementos de corrosão do tipo ativo-passivo ...........................................................................103 8.3.6 Metais diferentes ..................................................................................................................................103 8.3.7 Metais e meios diferentes .................................................................................................................104 8.3.8 Micro-heterogeneidades – pilha de ação local ........................................................................104 8.3.9 Solicitação mecânica diferencial ....................................................................................................104 8.4 Proteção contra a corrosão ............................................................................................................107 8.4.1 Proteção catódica .................................................................................................................................108 8.4.2 Proteção anódica ..................................................................................................................................112 8.5 Revestimentos .....................................................................................................................................113 8.5.1 Revestimentos metálicos ...................................................................................................................113 8.5.2 Revestimentos não metálicos inorgânicos ................................................................................. 114 8.5.3 Revestimentos não metálicos orgânicos ..................................................................................... 116 8.6 Prevenção da corrosão .....................................................................................................................119 7 EN GC - R ev isã o: F ab ric ia - D ia gr am aç ão : F ab io - 2 2/ 11 /2 01 7 APRESENTAÇÃO Olá, aluno. Você deve estar se perguntando: por que estudar Química Aplicada? A Química éuma das ciências que explicam muitas transformações que ocorrem no nosso dia a dia. Você, provavelmente, já ouviu a citação de um químico francês, Antoine Lavoisier (1743-1794), “na natureza nada se perde, tudo se transforma”, que ficou conhecida como Lei da Conservação de Massas. O fato de não visualizarmos alguns processos não quer dizer que não existam. A matéria é constantemente transformada em nosso mundo, e vamos procurar entender essas transformações e as consequências que podem causar à natureza e à nossa saúde. O plano de ensino desta disciplina estabelece os seguintes tópicos a serem estudados: • processos de tratamento de água de abastecimento público; • processo de corrosão e proteção da corrosão em materiais. Vamos abordar também o tratamento da água, captada de mananciais ou rios, para o abastecimento público, suas etapas, como ocorrem e as dificuldades encontradas, porém vamos nos concentrar na etapa de coagulação e floculação. Nesta etapa, se faz necessária a adição de produtos químicos, que devem ser usados em quantidades específicas para que se obtenha o resultado desejado, isto é, a decantação das impurezas sólidas da água. Para isso, vamos realizar dois experimentos práticos: determinação do pH ótimo de coagulação e floculação de uma amostra de água e das quantidades econômicas de reagentes químicos a serem usados no tratamento de água para o abastecimento público. Com este conteúdo pretendemos despertar nos estudantes de Engenharia Civil uma consciência crítica quanto às características da água e seus vários tipos de utilização, visando à otimização do seu tratamento. Para isso, devemos ter conhecimento do objetivo do tratamento dela e de suas etapas, das metodologias de controle de qualidade para a água tratada e da legislação vigente para a utilização da água como recurso natural. Em seguida, estudaremos o processo de corrosão, dando ênfase ao processo de corrosão galvânica, através da formação de pilhas do tipo ativo-passivo. Podemos estudar estes eventos através de experimentos como constatação da diferença de potencial em uma pilha galvânica e inversão da polaridade de uma pilha galvânica por mudança do meio e heterogeneidades que determinam o surgimento da diferença de potencial (temperaturas, concentrações, meios diferentes, aeração diferencial, ativo-passivo). Não podemos deixar de estudar maneiras de prevenção e inibição, que serão consideradas através dos experimentos de constatação da ação de inibidores da corrosão, revestimentos anódicos e revestimentos catódicos, proteção por anodo de sacrifício e proteção por corrente imposta. 8 EN GC - R ev isã o: F ab ric ia - D ia gr am aç ão : F ab io - 2 2/ 11 /2 01 7 Estes conceitos são de extrema importância para o engenheiro civil, que vai desenvolver projetos utilizando diferentes materiais e deve estar alerta quanto à prevenção contra corrosão, prolongando a vida útil das estruturas. Sem mais, vamos ao que interessa. Bons estudos! INTRODUÇÃO A molécula de água é composta de um átomo de oxigênio e dois átomos de hidrogênio. Devido à diferença de eletronegatividade entre os átomos de hidrogênio e oxigênio e à sua geometria angular, a molécula de água é polar, sendo extremamente hábil para dissolver muitas substâncias iônicas e moleculares (polares). Outra propriedade importante da água é o calor específico, que relaciona a variação da temperatura com a quantidade de calor recebida (ou perdida) por unidade de massa da substância. Para a água o valor é alto, o que propicia a capacidade de absorver e liberar grandes quantidades de calor, com variações de temperatura muito pequenas. Dessa forma, podemos dizer que os oceanos mantêm a temperatura do planeta relativamente estável. Nos desertos, a escassez de água permite uma ampla variação de temperatura entre o dia e a noite. A água do planeta tem sido uma das maiores preocupações atuais, pois ela torna possível a vida como conhecemos e exige adequado gerenciamento e manutenção, visando melhorar a qualidade de vida. As consequências de cada ação sobre o recurso devem ser analisadas criticamente, uma vez que não apresentam evidências imediatas. Dessa maneira, surge a sensação de impunidade em relação aos impactos ambientais. Porém, mesmo que sutis e não evidentes de imediato, os efeitos se acumulam e intensificam a resposta da natureza. Vivemos em um planeta cuja superfície é coberta por aproximadamente 70% de água (VICTORINO, 2007). Estimamos que o volume total é de 1.390.000.000 km3. A água do planeta está distribuída nos oceanos e mares, como água salgada (97,2%) e água doce (2,5%). Apenas 0,3% da água doce está disponível nos rios, nos lagos e na atmosfera, para o uso humano; o restante desta água encontra-se nas calotas polares e nas geleiras (FELIX; CARDOSO, 2005). O alto calor específico é responsável pelas pequenas variações de temperatura nos meios aquáticos, mesmo quando quantidades grandes de calor são liberadas ou absorvidas por esses meios. Como os organismos aquáticos são sensíveis às variações bruscas de temperatura, o aumento delas pode causar sérios impactos ambientais. Atualmente, a maior parte das fontes de água doce encontra-se imprópria para o consumo, gerando gastos maiores para o tratamento a fim de torná-la potável. 9 EN GC - R ev isã o: F ab ric ia - D ia gr am aç ão : F ab io - 2 2/ 11 /2 01 7 Comparando-se a disponibilidade de água doce com a quantidade existente nas geleiras e calotas polares, poderiam ser consideradas essas últimas como fontes alternativas para o uso pelo homem. Porém, a distância dos centros consumidores inviabiliza a exploração delas, pois o transporte torna o custo da água muito elevado. Da mesma forma, a extração de água do subsolo a grandes profundidades também é bastante onerosa. Devido à heterogeneidade da distribuição da água doce, poucos países concentram mais da metade das reservas mundiais, e o Brasil faz parte deste grupo. Existem regiões extremante áridas e de umidade relativa muito baixa, como os desertos, e outras, como as florestas tropicais, com alta umidade relativa. Em parte, isso é causado pela irregularidade no regime de precipitações, que vamos estudar em seguida. 11 EN GC - R ev isã o: F ab ric ia - D ia gr am aç ão : F ab io - 2 2/ 11 /2 01 7 QUÍMICA APLICADA PARA ENGENHARIA CIVIL Unidade I 1 CICLO HIDROLÓGICO A água pode ser encontrada nos três estados físicos em razão das condições ambientais do planeta. Está distribuída em três reservatórios principais: oceanos, continentes e atmosfera. É mantida devido a uma troca contínua entre os estados físicos, que constitui o que se conhece como ciclo da água ou ciclo hidrológico (TUNDISI, 2003). A energia necessária à mudança de fase que resulta no transporte da água entre os compartimentos que formam o ciclo hidrológico é fornecida pelo Sol (FELIX; CARDOSO, 2005). O ciclo hidrológico pode ser definido como uma sequência de fenômenos através dos quais a água passa da superfície da crosta terrestre para a atmosfera e regressa àquela na forma de precipitação, como pode ser visto na figura a seguir. Geleiras Precipitação Evaporação Infiltração Oceano Água subterrânea Condensação Lagos e reservatórios Escoamento superficial Evaporação e transpiração Movimentação de vapor d’água Figura 1 – Ciclo hidrológico A precipitação pode ocorrer na fase sólida (neve, granizo) ou na fase líquida (chuva ou chuvisco). O granizo e a neve são formados quando o vapor d’água da atmosfera se condensa a uma temperatura inferior a 0 °C, passando diretamente para o estado sólido; se a condensação for lenta e progressiva, o gelo formará a neve (FELIX; CARDOSO, 2005). 12 EN GC - R ev isã o: F ab ric ia - D ia gr am aç ão : F ab io - 2 2/ 11 /2 01 7 Unidade I A água que precipita pode ter destinos diferentes nos continentes. Uma parte evapora e imediatamente é devolvida à atmosfera; outraparte pode se concentrar, formando os cursos de água; e o restante pode penetrar no solo, dividindo-se, podendo se acumular na parte superior, voltando à atmosfera por evapotranspiração. Uma outra é a que caminha pelo subsolo até atingir os lençóis aquíferos, constituindo o escoamento subterrâneo. Todas as formas que foram citadas alimentam os cursos de água que deságuam nos lagos e oceanos (FELIX; CARDOSO, 2005). A radiação solar aquece a superfície do planeta e é responsável pela evaporação contínua da água dos oceanos, rios e lagos. O vapor pode ser transportado para outros lugares devido à circulação de ventos da atmosfera. Durante o transporte, parte do vapor será condensado por causa do arrefecimento, formando as nuvens que podem originar a precipitação (FELIX; CARDOSO, 2005). O processo de evaporação de água dos mares, rios, lagos e outros reservatórios está intimamente ligado à ocorrência de chuvas. Alterações ambientais, como diminuição de pressão atmosférica ou aumento de temperatura, propiciam a evaporação. Uma vez na forma de vapor, as moléculas de água espalham-se homogeneamente na atmosfera, como resultado da difusão provocada pelos ventos. Isso poderia ocorrer se a atmosfera fosse composta somente de gases. No entanto, existem partículas higroscópicas que podem funcionar como núcleos de condensação para o vapor d’água. Estas pequenas partículas são recobertas por uma camada de água muito fina e são responsáveis pela formação de nuvens. Portanto, a presença de partículas na atmosfera é essencial para a formação da chuva. Esse fenômeno precisa de uma superfície para a condensação de gotas de água, e pode ser observado de maneira semelhante numa tampa sobre uma panela de água fervendo. Para formar chuva é preciso que as gotículas de água cresçam em volume suficiente para precipitar. Para que o crescimento ocorra, é preciso que a massa de ar úmida se forme e condições específicas de pressão e temperatura favoreçam a condensação do vapor de água. As partículas responsáveis pela formação das nuvens são higroscópicas (têm afinidade por água) e são formadas por reações do tipo ácido-base, que ocorrem na atmosfera. Muitos ácidos são encontrados na atmosfera e podem ser gerados através de atividades humanas ou por fontes naturais Existe apenas uma base presente na atmosfera em quantidade significativa, que é a amônia (NH 3). As moléculas do gás ácido (HCl) reagem com as moléculas de amônia formando pequenos cristais de cloreto de amônio (NH4Cl). HX + NH3 → NH4X A maior parte dos ácidos atmosféricos gerados pela oxidação de SO2 e NOx pode ser neutralizada pela amônia e produzir sais de amônio higroscópicos, na forma de material particulado, que são as menores partículas presentes na atmosfera. 13 EN GC - R ev isã o: F ab ric ia - D ia gr am aç ão : F ab io - 2 2/ 11 /2 01 7 QUÍMICA APLICADA PARA ENGENHARIA CIVIL Saiba mais Sobre o ciclo biogeoquímico da água, leia o artigo: CAMPOS, M. L. A. M.; JARDIM, W. F. Aspectos relevantes da biogeoquímica da hidrosfera. Cadernos Temáticos de Química Nova na Escola, São Paulo, n. 5, p. 18-27, nov. 2005. 1.1 Esgotamento da água potável A água potável parece assumir o papel que o petróleo tinha em 1973, uma commodity em crise, com capacidade de lançar a economia mundial num estado de choque. Mesmo o Brasil sendo privilegiado com 12% da água doce corrente, não vai conseguir escapar do estresse hídrico iminente, devido à escassez. Segundo ambientalistas, as reservas de água doce vão entrar em colapso ainda no século XXI, e nunca estivemos tão próximos desta realidade. As Nações Unidas divulgaram um estudo que prevê que 45% da população mundial (2,7 bilhões de pessoas) ficará sem água até 2025. Este problema já é realidade para 1 bilhão de pessoas no norte da África e no Oriente Médio (ANGELO; MELLO; VOMERO, 2016). Além da falta de água, ainda podemos citar problemas como a má distribuição e a contaminação do recurso. Cerca de 1,4 bilhão de pessoas não possuem acesso à água limpa e a cada 8 segundos, no mundo, morre uma criança por uma doença relacionada ao recurso, como disenteria e cólera. Várias das enfermidades do mundo são contraídas por causa da água poluída. Este problema se estende por todo o território brasileiro: não se restringe apenas aos grandes centros, como Recife e São Paulo, que já enfrentam racionamento sazonal, nem ao sertão do Nordeste, onde falta uma política de uso sustentável da água. A falta de racionalização do consumo de água e a deterioração das reservas de águas superficiais (rios) e subterrâneas (aquíferos), em conjunto com o aumento da população, produzem uma demanda de água de boa qualidade cada vez maior. Quanto ao desperdício, estima-se que as perdas cheguem a 36,4% da água tratada. Esse desperdício é devido às perdas no próprio sistema de distribuição de abastecimento público, com a utilização de encanamentos velhos, sem manutenção preventiva. Somado a isso, ainda ocorrem desperdícios de ordem cultural, como o hábito de lavar calçadas e tomar banhos demorados. Para solucionar o problema, é necessário informar a população sobre práticas sustentáveis de uso e desenvolver políticas públicas no setor hídrico que levem ao uso sustentável dos recursos naturais, ao aumento da disponibilidade da água e à melhoria na qualidade dela (CAZARRÉ, 2016). Atualmente, existem soluções eficazes para o desperdício – devemos apenas colocá-las em prática. Na irrigação, o sistema mais utilizado, por canais e aspersores, apresenta perdas de até 40%. Deve ser substituído pelo sistema de gotejamento, que apresenta perda de até 10%. Esse sistema é muito usado 14 EN GC - R ev isã o: F ab ric ia - D ia gr am aç ão : F ab io - 2 2/ 11 /2 01 7 Unidade I em Israel, onde já existem empresas especializadas em devolver a água usada ao subsolo. A água tratada é injetada em aquíferos naturais. Isso evita o avanço da água do mar pelo subsolo, no caso de aquíferos costeiros, e o afundamento do solo. A recarga de aquíferos é vantajosa em situações de picos de consumo, pois eles funcionam como grandes reservatórios naturais e evitam a diminuição da resistência do solo. Em Cingapura, país que importa água, o governo distribui para a população a chamada água potabilizada, obtida pelo tratamento de água poluída, que se torna própria para o consumo. 1.2 Água do mar A enorme camada de água salgada que cobre a maior parte do planeta está interligada e possui uma quantidade relativamente constante. Por isso, pode-se considerar haver um único oceano no mundo. Esse oceano é enorme. Seu volume é 1,39 x l09 km3, quase a totalidade da água da Terra (97,2%) (VICTORINO, 2007). A água do mar é imprópria para o consumo humano e para a maior parte dos usos comuns, devido ao alto teor de sal. A qualidade da água é estabelecida no Brasil pela Portaria nº 2.914, de 12 de dezembro de 2011, do Ministério da Saúde. Observamos que o teor de sal na água é limitado a cerca de 500 ppm (partes por milhão), uma quantidade muito menor que os 3,5% de sais dissolvidos na água do mar e, também, que o 0,5%, ou mais, presente na água salobra encontrada no subsolo de algumas regiões. Uma maneira de retirarmos o sal da água é o processo de dessalinização. Este processo pode ser realizado de duas maneiras distintas: através de um processo de destilação, no qual os sais ficam retidos no recipiente de origem devido ao alto ponto de ebulição, e por meio do processo de osmose reversa. A osmose é o processo no qual as moléculas de um solvente (no caso, a água) atravessam membranas. Nos equipamentos de osmose são usadas fibras com furos minúsculos, como as membranas semipermeáveis. A água é introduzida sob pressão nas fibras, e a água dessalinizada é recuperada. A maior usina de dessalinização do mundo está localizada em Jubail, Arábia Saudita. Esta usina dessaliniza cerca de 800.000 m3 de água, proveniente do mar do golfo Pérsico, por dia, fornecendo 50% da águapotável do país, através de osmose reversa. Tabela 1 – Constituintes da água do mar Constituinte Concentração aproximada em ppm Concentração aproximada em mol/L Cloretos 19,35 0,55 Sódio 10,76 0,47 Sulfatos 2,71 0,028 Magnésio 1,29 0,054 Cálcio 0,412 0,010 Potássio 0,40 0,010 Dióxido de carbono 0,106 2,3 x 10-3 Brometos 0,067 8,3 x 10-4 Ácido bórico 0,027 4,3 x 10-4 Estrôncio 0,0079 9,1 x 10-5 Fluoretos 0,0013 7,0 x 10-5 Adaptado de: Brasil (2011). 15 EN GC - R ev isã o: F ab ric ia - D ia gr am aç ão : F ab io - 2 2/ 11 /2 01 7 QUÍMICA APLICADA PARA ENGENHARIA CIVIL Usinas de dessalinização de água são cada vez mais comuns nos EUA. Foi inaugurada em Santa Bárbara, na Califórnia, em 1992, uma usina com capacidade para produzir 30 bilhões de litros de água potável por dia. O processo de osmose reversa, de operação manual, pode ser adquirido no mercado e usado em embarcações, acampamentos e viagens. Pode produzir até 4,5 litros de água por hora. 1.3 Água doce Em média, podemos considerar que uma pessoa consume 2 litros de água por dia. Nos países desenvolvidos, esse consumo pode atingir 300 litros por dia, incluindo consumo para higiene. Por dia, podemos estimar que são utilizados cerca de 8 litros de água para cozinhar e beber, 120 litros para a limpeza (da casa, de roupas), 80 litros para a descarga no banheiro e outros 80 litros para os jardins. Em vinte anos, nas contas da ONU, 4 bilhões de pessoas não terão acesso a água em quantidade suficiente para a sobrevivência, e boa parte da população estará sem água potável. Dados da Organização Mundial da Saúde mostram cerca de 7 milhões de mortes por ano, provocadas pela falta de saneamento ou pelo consumo de água contaminada. De forma indireta, o valor per capita inclui o consumo na indústria e na agricultura para produzir comida e outros itens. Por exemplo, para produzir o aço necessário para a construção de um automóvel de porte médio, gastam-se 100 mil litros de água. Lembrete Como vimos, a quantidade de água doce é uma pequena parcela da água total do planeta. Podemos considerar a água doce como uma das maiores riquezas do ser humano. A água doce pode ser formada por evaporação da água infiltrada na terra e da água dos oceanos. O vapor de água que se acumula na atmosfera é transportado pela circulação atmosférica global, retornando à terra na forma de chuva ou neve. Nas áreas urbanas, devido à impermeabilização do solo por meio das construções e da pavimentação das ruas, quando a precipitação chega ao solo, favorece o escoamento superficial, mais intenso por conta da pouca ou nenhuma capacidade de infiltração. Essa incapacidade de infiltrar no solo faz com que não ocorra evaporação da água na região, não havendo a formação de nuvens; assim, não ocorre precipitação, afetando a disponibilidade da água. Uma das principais causas de inundações urbanas é a falta de áreas para infiltração de água, causada pela impermeabilização do solo durante a urbanização. A utilização da água, na maioria das vezes, permite que ela incorpore materiais dissolvidos, de todos os tipos, provenientes ou não das atividades humanas. Com o aumento da população nas grandes cidades e o crescimento industrial, a água apresenta uma quantidade cada dia maior de poluentes, tornando o seu tratamento cada vez mais oneroso para a sociedade. 16 EN GC - R ev isã o: F ab ric ia - D ia gr am aç ão : F ab io - 2 2/ 11 /2 01 7 Unidade I O processo de autodepuração das águas ocorre pela ação de bactérias aeróbias e anaeróbias, que também atuam como repositores e consumidores de componentes gasosos do ar atmosférico e do meio aquático. Porém, com o aumento de material dissolvido na água, serão necessárias intervenções humanas para a melhoria da qualidade da água. Quantidade e qualidade adequadas da água são requisitos indispensáveis para suprir as necessidades dos seres vivos. 1.4 Qualidade da água A quantidade de oxigênio dissolvido na água é um dos principais indicadores de sua qualidade. A água solubiliza apenas 9 ppm/L de oxigênio dissolvido a 20 °C e a 1 atm de pressão, quando totalmente saturada com esse gás. O oxigênio necessário para a sobrevivência de peixes e de outras espécies aquáticas é de pelo menos 5 ppm. Durante o processo de autodepuração, as bactérias aeróbias consomem o oxigênio dissolvido na água, para degradar matéria orgânica e, assim, satisfazer suas necessidades energéticas. Este material orgânico é conhecido como biodegradável. O processo de degradação da matéria orgânica ocorre por reações de oxidação; dessa forma, substâncias complexas são quebradas em moléculas menores, sendo absorvidas pelo meio. Grande quantidade de material biodegradável na água prejudica sua qualidade, pois as bactérias aeróbias retiram dela o oxigênio necessário para manter a vida dos organismos aquáticos em equilíbrio. As fontes mais comuns desses materiais biodegradáveis ricos em matéria orgânica são: esgoto doméstico, resíduos da indústria de alimentos, efluentes de fábricas de papel e de usinas de processamento de carne, entre outros. Quando o oxigênio se encontra no meio, elementos como nitrogênio, enxofre, carbono, hidrogênio e fósforo, presentes na matéria orgânica, são transformados em bicarbonatos, nitratos, fosfatos e dióxido de carbono. Estas reações de oxidação, em alguns casos, podem consumir todo o oxigênio dissolvido, provocando a morte das bactérias aeróbias. Assim, as bactérias anaeróbias entram em ação no processo de decomposição, formando produtos como metano, amônia, fosfina e gás sulfídrico. Muitos destes compostos contribuem para os odores desagradáveis encontrados próximo a fontes poluídas. Nutrientes vegetais, como fósforo e nitrogênio, contribuem para a poluição da água, estimulando o crescimento de plantas aquáticas. A presença de algas flutuantes bloqueia a penetração da luz, impedindo a fotossíntese, que é uma fonte de produção de oxigênio dentro e fora da água. 17 EN GC - R ev isã o: F ab ric ia - D ia gr am aç ão : F ab io - 2 2/ 11 /2 01 7 QUÍMICA APLICADA PARA ENGENHARIA CIVIL Observação Acredita-se que aproximadamente 70% do suprimento de oxigênio do planeta provém da fotossíntese dos vegetais primitivos, como o plâncton e o fitoplâncton existentes nos corpos de água e no mar. Por meio do mesmo processo, é produzido o oxigênio necessário para a manutenção da vida dos organismos aquáticos. A impossibilidade de penetração da luz altera o processo de fotossíntese, diminuindo ou impedindo a produção do oxigênio. A eficiência da fotossíntese é comprometida pela redução da luz necessária para que o processo ocorra. Além da coloração mais escura da água, a turbidez (o aspecto turvo do meio) também é capaz de dificultar ou impedir a penetração da luz. A turbidez pode ser causada por material em suspensão, como partículas minerais e algas, que, quando entram em decomposição, provocam o crescimento de micro-organismos, causando a deterioração da água. A este processo se dá o nome de eutrofização (ou eutroficação). As principais fontes de nutrientes na água são: esgoto doméstico (detergentes contendo fosfatos e rejeitos do corpo contendo nitrogênio), escoamento de terras de agricultura (fertilizantes contendo tanto nitrogênio quanto fósforo) e escoamento de áreas de criação de animais (rejeitos de animais contendo nitrogênio). 1.5 Padrões de qualidade da água A Resolução nº 20 do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama), de 1986, dispõe sobre a classificação das águas doces, salobras e salinas do território nacional. Foi alterada pela Resolução nº 274, de 2000, revogada pela Resolução nº 357, de 2005, que dispõe sobre a classificação dos corpos de água e as diretrizes ambientais para o seu enquadramento, bem como estabelece as condições e os padrões de lançamento de efluentes, e dá outras providências. Esta, por sua vez, foi alterada pelas Resoluções nº 410/2009 e nº 430/2011. Aságuas salinas, salobras e doces são classificadas, de acordo com a qualidade necessária para seu uso, em 13 classes de qualidade. O quadro a seguir apresenta a classificação das águas segundo a Resolução nº 357/2005. Quadro 1 - Classificação das águas Classe Destinação Especial Abastecimento para consumo humano, com desinfecção; preservação do equilíbrio natural das comunidades aquáticas; e preservação dos ambientes aquáticos em unidades de conservação de proteção integral. Classe 1 Abastecimento para consumo humano, após tratamento simplificado; proteção das comunidades aquáticas; recreação de contato primário, como natação, esqui aquático e mergulho, conforme Resolução Conama nº 274, de 2000; irrigação de hortaliças que são consumidas cruas e de frutas que se desenvolvam rentes ao solo e que sejam ingeridas cruas sem remoção de película; e proteção das comunidades aquáticas em terras indígenas. 18 EN GC - R ev isã o: F ab ric ia - D ia gr am aç ão : F ab io - 2 2/ 11 /2 01 7 Unidade I Classe 2 Abastecimento para consumo humano, após tratamento convencional; proteção das comunidades aquáticas; recreação de contato primário, como natação, esqui aquático e mergulho, conforme Resolução Conama nº 274, de 2000; irrigação de hortaliças, de plantas frutíferas e de parques, jardins, campos de esporte e lazer, com os quais o público possa vir a ter contato direto; e aquicultura e atividade de pesca. Classe 3 Abastecimento para consumo humano, após tratamento convencional ou avançado; irrigação de culturas arbóreas, cerealíferas e forrageiras; pesca amadora; recreação de contato secundário; e a dessedentação de animais. Classe 4 Navegação e harmonia paisagística. Fonte: Brasil (2005). A Resolução nº 430/2011 dispõe sobre condições e padrões de lançamento de efluentes. Na sequência, as diretrizes a serem seguidas obrigatoriamente quanto à disposição de efluentes em corpos de água: Art. 8º É vedado, nos efluentes, o lançamento dos Poluentes Orgânicos Persistentes POPs, observada a legislação em vigor. Parágrafo único. Nos processos nos quais possa ocorrer a formação de dioxinas e furanos, deverá ser utilizada a tecnologia adequada para a sua redução, até a completa eliminação. Art. 9º No controle das condições de lançamento, é vedada, para fins de diluição antes do seu lançamento, a mistura de efluentes com águas de melhor qualidade, tais como as águas de abastecimento, do mar e de sistemas abertos de refrigeração sem recirculação. Art. 10 Na hipótese de fonte de poluição geradora de diferentes efluentes ou lançamentos individualizados, os limites constantes desta Resolução aplicar-se-ão a cada um deles ou ao conjunto após a mistura, a critério do órgão ambiental competente. Art. 11 Nas águas de classe especial é vedado o lançamento de efluentes ou disposição de resíduos domésticos, agropecuários, de aquicultura, industriais e de quaisquer outras fontes poluentes, mesmo que tratados. Art. 12 O lançamento de efluentes em corpos de água, com exceção daqueles enquadrados na classe especial, não poderá exceder as condições e padrões de qualidade de água estabelecidos para as respectivas classes, nas condições da vazão de referência ou volume disponível, além de atender outras exigências aplicáveis. 19 EN GC - R ev isã o: F ab ric ia - D ia gr am aç ão : F ab io - 2 2/ 11 /2 01 7 QUÍMICA APLICADA PARA ENGENHARIA CIVIL Parágrafo único. Nos corpos de água em processo de recuperação, o lançamento de efluentes observará as metas obrigatórias progressivas, intermediárias e final. Art. 13. Na zona de mistura serão admitidas concentrações de substâncias em desacordo com os padrões de qualidade estabelecidos para o corpo receptor, desde que não comprometam os usos previstos para o mesmo. Parágrafo único. A extensão e as concentrações de substâncias na zona de mistura deverão ser objeto de estudo, quando determinado pelo órgão ambiental competente, às expensas do empreendedor responsável pelo lançamento (BRASIL, 2011). Os efluentes provenientes de qualquer fonte poluidora poderão ser jogados diretamente em corpos de água receptores apenas se obedecerem às condições padrão previstas na Resolução nº 430/2011 do Conama, que são: • pH entre 5 e 9; • temperatura: inferior a 40°C, sendo que a variação de temperatura do corpo receptor não deverá exceder a 3°C no limite da zona de mistura; • materiais sedimentáveis: até 1 mL/L em teste de 1 hora em cone Inmhoff. Para o lançamento em lagos e lagoas, cuja velocidade de circulação seja praticamente nula, os materiais sedimentáveis deverão estar virtualmente ausentes; • regime de lançamento com vazão máxima de até 1,5 vez a vazão média do período de atividade diária do agente poluidor, exceto nos casos permitidos pela autoridade competente; • óleos e graxas: 1. óleos minerais: até 20 mg/L, 2. óleos vegetais e gorduras animais: até 50 mg/L; • ausência de materiais flutuantes; • demanda bioquímica de oxigênio (DBO 5 dias a 20°C): remoção mínima de 60% de DBO, sendo que este limite só poderá ser reduzido no caso de existência de estudo de autodepuração do corpo hídrico que comprove atendimento às metas do enquadramento do corpo receptor (BRASIL, 2011). 20 EN GC - R ev isã o: F ab ric ia - D ia gr am aç ão : F ab io - 2 2/ 11 /2 01 7 Unidade I 1.6 A poluição nos meios aquáticos Uma das principais causas da poluição nos meios aquáticos é o lançamento de despejos de origem humana, agrícola ou industrial. A utilização da água, para certos fins, pode ficar impedida devido ao tipo de substâncias presentes no despejo. O conceito de poluição deve ser analisado em conjunto com o uso pretendido para a água. Uma água considerada poluída para a recreação pode ter qualidade adequada para a irrigação, o uso industrial entre outros. A distinção deve ser feita entre os conceitos: • Poluição: acarreta desequilíbrio do ecossistema. • Contaminação: causada pela presença de micro-organismos e substâncias nocivos à saúde do homem. A presença de certos materiais num determinado corpo de água pode ser compatível à atividade daquele sistema, e não necessariamente produto de desequilíbrio ecológico. A relação entre a concentração dos elementos e substâncias químicas e a qualidade da saúde do homem e dos animais pode ser comprometida devido à mobilidade e à dispersão destes elementos e substâncias na água, governadas pelos princípios da geoquímica e da dinâmica das águas superficiais e subterrâneas. Fatores como pH, tipo e abundância de argilo-minerais, concentração de material orgânico, hidróxidos de manganês, ferro e alumínio, reatividade química de vários elementos, gradientes hidráulicos, porosidade e permeabilidade de materiais necessitam ser considerados neste tipo de estudo. Algumas vezes, os efeitos tóxicos de uma substância vão se manifestar em um local distante de onde ela foi lançada no meio ambiente, podendo atingir áreas pontuais ou regiões inteiras. Não é impossível que os produtos da degradação de um composto químico sejam mais tóxicos e mais persistentes no ambiente do que a substância original. Existem muitos poluentes, assim como formas de poluição, nos meios aquáticos. Podemos fazer algumas considerações sobre tais poluentes e suas formas mais comuns. 1.6.1 Matéria orgânica A decomposição da matéria orgânica ocorre devido à presença de micro-organismos chamados decompositores. A autodepuração do meio aquático é um processo natural. Sendo a matéria orgânica biodegradável, ela é degradada lentamente até o retorno da condição do meio à situação anterior. A biodegradação pode consumir quase todo o oxigênio dissolvido no meio, comprometendo a sobrevivência dos organismos vivos aquáticos. Quando não existe oxigênio dissolvido, os micro-organismos anaeróbios (que não precisam de oxigênio para viver) são responsáveis pela biodegradação. Como produto desta degradação há formação de substânciascomo metano e gás sulfídrico, que causam odor desagradável. 21 EN GC - R ev isã o: F ab ric ia - D ia gr am aç ão : F ab io - 2 2/ 11 /2 01 7 QUÍMICA APLICADA PARA ENGENHARIA CIVIL Algumas substâncias orgânicas complexas, que possuem cadeias com grande número de átomos de carbono (normalmente produzidos pelo homem), não podem ser decompostas pelos micro-organismos, ou o processo de degradação é muito lento, trazendo impactos ambientais graves para os corpos de água. O lançamento contínuo desses materiais num corpo de água faz com que a concentração deles aumente até atingir os níveis de toxidez ao homem e aos organismos vivos presentes naquele meio. Este processo ocorre com defensivos agrícolas e detergentes sintéticos e com lançamentos de petróleo e seus derivados, acidentais ou não. A presença de detergentes sintéticos nos meios aquáticos leva à formação de grande quantidade de espuma, que pode ser arrastada pelo vento para as regiões adjacentes, carregando parte dos poluentes presentes. A formação de espuma na água dificulta a troca de gases na interface ar-água e compromete a penetração da luz necessária à fotossíntese, que produz oxigênio para o meio. Tabela 2 – Padrões de lançamento de efluente Parâmetros inorgânicos Valores máximosmg/L Parâmetros inorgânicos Valores máximos mg/L Arsênio 0,5 Nitrogênio amoniacal 20,0 Bário 5,0 Prata 0,1 Boro 5,0 Selênio 0,3 Cádmio 0,2 Sulfeto 1,0 Chumbo 0,5 Zinco 5,0 Cianeto total 1,0 Parâmetros orgânicos Valores máximos Cianeto livre 0,2 Benzeno 1,2 Cobre dissolvido 1,0 Dicloroeteno total 1,0 Cromo hexavalente 0,1 Clorofórmio 1,0 Cromo trivalente 1,0 Estireno 0,07 Estanho total 4,0 Etilbenzeno 0,84 Ferro dissolvido 15,0 Fenóis totais 0,5 Fluoreto 10,0 Tetracloreto de carbono 1,0 Manganês dissolvido 1,0 Tricloroeteno 1,0 Mercúrio 0,01 Tolueno 1,2 Níquel 2,0 Xileno 1,6 Fonte: Brasil (2011). Muitos organismos, inclusive os decompositores, podem ser destruídos pelo aumento da concentração das substâncias que compõem os detergentes. Os defensivos agrícolas usados nas plantações próximas aos corpos de água podem ser arrastados pelas chuvas até eles; águas de irrigação também podem ser fontes de contaminação da água por substâncias ricas em nitrogênio. Essas águas podem ainda penetrar no solo, chegando aos aquíferos subterrâneos, os quais têm a qualidade de suas águas degradada. 22 EN GC - R ev isã o: F ab ric ia - D ia gr am aç ão : F ab io - 2 2/ 11 /2 01 7 Unidade I Vazamentos de petróleo e seus derivados podem ocorrer tanto próximo das áreas de extração como das áreas de consumo. Os impactos ambientais gerados são comumente grandes, devido às substâncias tóxicas contidas nesses produtos. Por exemplo, pode haver interferência nos mecanismos osmóticos existentes entre as plantas e o meio aquático, trazendo problemas também para a fauna de modo geral. A formação de uma camada sobrenadante bloqueia as trocas gasosas entre ar e água, dificultando a penetração da luz e impedindo a fotossíntese. 1.6.2 Organismos patogênicos A presença de organismos patogênicos na água pode causar uma série de doenças, com vários impactos na saúde humana, podendo levar à morte. Muitos estudos realizados pela ONU mostraram que um grande número de pessoas no mundo tem sua saúde afetada pela falta de água tratada, por ingestão e uso de águas contaminadas com esses micro-organismos e pela falta de saneamento. 1.6.3 Nutrientes em excesso O esgoto doméstico e os dejetos de animais são ricos em fósforo e nitrogênio. A concentração elevada desses componentes pode levar à proliferação exagerada de algas, que prejudicam a utilização dos corpos de água para diversas finalidades, incluindo o tratamento para abastecimento público. Fertilizantes usados nas plantações e decomposição da matéria orgânica também acarretam o aumento da concentração dos elementos nos corpos de água. 1.6.4 Materiais em suspensão Materiais em suspensão atrapalham a penetração da luz no meio, diminuindo a velocidade de produção do oxigênio por fotossíntese, uma vez que a energia luminosa tem dificuldade de penetração, diminuindo sua intensidade na água. A turbidez, gerada pelos sólidos em suspensão, diminui a transparência da água, prejudicando a alimentação da fauna e da flora aquática, acarretando um desequilíbrio na cadeia alimentar. 1.6.5 Radioatividade O contato de materiais radioativos com os organismos vivos existentes na água se deve à incidência dos raios solares e à presença de substâncias radioativas próximo dos sistemas aquáticos. Geralmente, os níveis de radioatividade estão muito abaixo dos limites que causam danos. Porém a utilização da radioatividade pelo homem vem aumentando, sendo ela usada em muitas áreas, como geração de energia, conservação de alimentos, fins bélicos e pesquisas médicas. A maior desvantagem, e a mais preocupante, é que as substâncias radioativas, mesmo após esgotarem sua capacidade para a utilização, independentemente da aplicação, permanecem ativas por milhares (às vezes, milhões) de anos, causando prejuízos ao meio ambiente e ao homem. 23 EN GC - R ev isã o: F ab ric ia - D ia gr am aç ão : F ab io - 2 2/ 11 /2 01 7 QUÍMICA APLICADA PARA ENGENHARIA CIVIL Em 1983 foram proibidos despejos no mar e na atmosfera, mas, infelizmente, ainda não existem formas absolutamente seguras de descarte para essas substâncias. Atualmente, a maneira mais segura é armazenar resíduos radioativos em tambores ou recipientes impermeáveis de concreto, à prova de radiação, que devem ser enterrados em áreas geologicamente estáveis. Porém, estas precauções têm alto custo e nem sempre são cumpridas; os vazamentos são frequentes. A exposição descontrolada à radioatividade acarreta consequências danosas tanto ao homem como a outros organismos vivos. A exposição prolongada pode afetar o DNA, trazendo riscos para a reprodução humana pela ocorrência de deformações genéticas; pode ainda causar câncer e outras doenças. 1.6.6 Defensivos agrícolas e fertilizantes Praguicidas ou defensivos agrícolas são substâncias tóxicas utilizadas no combate às pragas, principalmente na agricultura. Estes organismos são considerados nocivos ao homem e aos seus propósitos. Os principais praguicidas são: • Herbicidas, usados para matar ervas daninhas. • Fungicidas, usados no combate a fungos e parasitas. • Inseticidas, usados contra insetos. • Nematócitos, que controlam os nematódeos parasitas. Os inseticidas, quando usados em excesso, podem se acumular no solo e ser ingeridos pelos animais que se alimentam da vegetação, dando início a um ciclo de contaminação. Com as chuvas, os produtos químicos usados como pesticidas podem infiltrar-se no solo, levando à contaminação dos lençóis freáticos. Eles podem ser carregados para rios, lagos e outros corpos de água, expandindo a área de contaminação. Assim, fertilizantes e defensivos utilizados em excesso na agricultura poluem o solo e a água dos rios, provocando a intoxicação de diversos seres vivos dos ecossistemas, podendo levar a óbito. O uso indiscriminado do DDT (diclorodifeniltricloroetano) contaminou o leite humano em algumas regiões dos EUA, que apresentou concentração do inseticida maior que a permitida por lei para o leite bovino. O DDT, assim como outros inseticidas e pesticidas, é capaz de se acumular nos organismos vivos. As ostras, por exemplo, que obtêm alimento por filtração da água, podem acumular grandes quantidades de DDT em seus organismos, concentrando-o até cerca de 70 mil vezes. Se estas forem consumidas por animais ou pelo homem, podem causar intoxicação, provocando a morte. O DDT pode ser absorvido pela pele ou ingerido com os alimentos e geralmente está associado a doenças do fígado, como cirrose e câncer. 24 EN GC - R ev isã o: F ab ric ia - D ia gr am aç ão : F ab io - 2 2/ 11 /2 01 7 Unidade I Saiba mais Para saber mais sobre o DDT, sua toxicidade e os problemasjá causados no mundo, leia o artigo: D’AMATO, C.; TORRES, J. P. M.; OLAF MALM, O. DDT (diclorodifeniltricloroetano): toxicidade e contaminação ambiental: uma revisão. Química Nova, São Paulo, v. 25, n. 6, p. 995-1002, nov./dez. 2002. 1.6.7 Metais A presença de metais na água sempre foi um grave problema ambiental, independentemente de serem concentrações muito baixas ou quantidades significativas, provenientes de atividades agrícolas, industriais ou de mineração. Metais pesados podem se acumular no organismo, acarretando uma série de doenças, as quais podem se desenvolver devido à falta de alguns metais no organismo. Podemos citar como exemplo: bócio (hipertrofia da tireoide), causado pela deficiência de iodo; anemias severas, nanismo e hiperpigmentação da pele decorrentes da deficiência de zinco; fluorose esqueletal e dentária causada pelo excesso de flúor; maior incidência de cáries dentárias pela deficiência em flúor; anencefalia causada pelo acúmulo de mercúrio; inapetência relacionada ao selênio. Embora haja controvérsia, ainda podemos citar: a relação entre a dureza da água e algumas moléstias cardiovasculares; entre o cádmio e a hipertensão e a arteriosclerose; entre o chumbo e a esclerose múltipla; além de entre uma ampla gama de elementos e diversos tipos de câncer. Estas associações são possíveis quando a exposição a estes metais provoca manifestações clínicas. Porém, muitas vezes, o desequilíbrio em pequenas quantidades de íons manifesta debilitações subclínicas de difícil diagnóstico. A água pode solubilizar a maioria dos metais, devido ao seu caráter polar. O acúmulo de metais nos corpos de água aumenta o potencial de impacto ambiental em razão de sua toxicidade, podendo ser cancerígenos ou causar alterações no DNA humano e dos seres vivos do meio aquático. Mesmo quando depositados no fundo dos rios e lagos, têm grande potencial de dano, pois podem sofrer dissolução pela alteração das condições químicas do meio. As concentrações dos despejos são limitadas pela Resolução nº 430 do Conama, porém o acúmulo destes nos meios aquáticos amplifica o dano para os micro-organismos sensíveis, interferindo em toda a cadeia alimentar. Como a mineração é uma atividade muito praticada no Norte do País, os rios da região apresentam concentrações crescentes de mercúrio, já que esse metal é usado por garimpeiros para separar o ouro do minério bruto. Grandes quantidades de mercúrio são usadas para a lavagem do minério, e sem nenhum tipo de cuidado ou tratamento são jogadas nos rios, envenenando e extinguindo diversas formas de vida. Peixes contaminados pelo metal, quando consumidos pelo homem, podem causar sérios 25 EN GC - R ev isã o: F ab ric ia - D ia gr am aç ão : F ab io - 2 2/ 11 /2 01 7 QUÍMICA APLICADA PARA ENGENHARIA CIVIL danos ao sistema nervoso, ao cérebro e à medula, órgãos onde o mercúrio se acumula. Muitas mortes e deformações genéticas na população já foram relatadas na história da humanidade. 1.6.8 Poluição térmica Poluição térmica é definida como a adição de calor indesejado ao ambiente, geralmente em corpos de água naturais. Neste caso, particularmente, poluição não é sinônimo de sujeira na água, mas a causa de danos ao ambiente aquático, podendo levar algum tempo para estes danos mostrarem consequências. Atualmente, as usinas geradoras de eletricidade a vapor são grandes fontes de água aquecida. Para completar o ciclo do vapor e aumentar a eficiência da usina de força, um condensador é acoplado após a turbina. A energia térmica é removida do vapor quente, no condensador, fazendo circular água fria por dentro das serpentinas. Esta água de refrigeração, quando não reutilizada no processo, é descarregada em um leito de água qualquer, como um lago ou um rio. Sabemos que é proibido pela Resolução nº 430 do Conama despejar efluentes acima de 40 ºC em corpos de água. Dessa forma, as usinas são obrigadas a resfriar a água antes de despejá-la em corpos de água. O aumento da temperatura das águas pode submeter alguns rios a um severo esforço térmico, principalmente durante os períodos de baixa vazão. Para a redução deste problema, as usinas de força construídas após julho de 1977 utilizam sistemas de resfriamento fechados. Assim, diminuem-se a retirada e a devolução da água diretamente a um rio ou lago. A emissão de resíduos térmicos ocorre tanto nas usinas acionadas por combustível nuclear como nas que usam combustíveis fósseis. Uma usina nuclear pode despejar aproximadamente 40% mais resíduos térmicos nas águas do que uma usina movida a combustíveis fósseis, para a mesma quantidade de energia elétrica, visto que as usinas nucleares trabalham em temperaturas bem superiores às usinas térmicas. Grandes quantidades de água passam pelo condensador. A maior parte dela pode ser reutilizada, já que passa apenas uma vez pelo condensador, mas absorve energia térmica capaz de provocar um aumento de 6 °C a 17 ºC na sua temperatura. Isso ocorre porque as usinas movidas a combustíveis fósseis possuem uma maior eficiência em relação ao uso da água de resfriamento, já que utilizam temperaturas mais elevadas de vapor. Podemos dizer também que parte do calor residual deixa a usina através de emissões de gases de combustão. Os impactos causados pela descarga de resíduos térmicos em um lago ou rio são muitos. Podemos citar algumas consequências causadas pelas temperaturas elevadas da água: • diminuição da capacidade da água de reter o oxigênio; • aumento da velocidade das reações químicas que ocorrem; • alterações nos padrões reprodutivos, comportamentais e de crescimento ao longo de toda a cadeia alimentar; • ocorrência de danos de longo prazo (até mesmo a morte) aos corpos d’água naturais (incluindo a eutroficação ou eutrofização). 26 EN GC - R ev isã o: F ab ric ia - D ia gr am aç ão : F ab io - 2 2/ 11 /2 01 7 Unidade I Um dos fatores mais importantes para a ocorrência da vida e o comportamento dos organismos é a temperatura. Nos animais de sangue frio, como os peixes e anfíbios, a temperatura corporal está conectada com a temperatura do ambiente. Alterações bruscas de temperatura podem afetar o metabolismo, as reações químicas que se processam no interior dos corpos dos animais de sangue frio. Acredita-se que exista uma dependência exponencial entre temperatura e taxa metabólica nestes animais, havendo duplicação a cada 10 °C. Um aumento no metabolismo provoca uma demanda maior de oxigênio. Infelizmente, a concentração de oxigênio dissolvido na água é inversamente proporcional à temperatura. À medida que a temperatura da água aumenta de 16 ºC para 35 ºC, a solubilidade do oxigênio na água cai de 10 ppm para 7 ppm. Alterações graduais são mais bem suportadas que alterações bruscas de temperatura. Declínios drásticos na população de peixes são provocados quando as temperaturas ultrapassam certo limite, mesmo que apenas alguns poucos graus. O limite superior para a vida aquática é de cerca de 34 °C. A reprodução e o crescimento dos peixes variam, em função da temperatura da água, entre as espécies. Geralmente, os peixes crescem mais rapidamente em temperaturas mais elevadas devido ao seu metabolismo acelerado. Para os peixes, as taxas de reprodução podem não ser afetadas em águas mornas. Mas os peixes não irão reproduzir-se acima de certas temperaturas. O intervalo de temperatura adequado para a reprodução é pequeno. Temperaturas altas podem causar a migração prematura de alguns peixes para uma nascente com o objetivo de se reproduzir, antes que as condições estejam adequadas. Peixes que nadam lentamente podem não ser capazes de evitar seus predadores a tempo. Isto pode ser significativo no comportamento reprodutivo dos peixes, que têm que nadar contra correntes fortes para atingir as nascentes para se reproduzir. O aumento da temperatura propicia a proliferação de bactérias causadoras de doenças, as quais podem diminuir radicalmente a população de algumas espécies.As mudanças no conjunto de uma comunidade aquática causadas por aumentos na temperatura podem ser difíceis de decifrar apenas observando, pois envolvem um número muito grande de variáveis. A maior parte dos estudos realizados até hoje, quanto aos efeitos térmicos sobre a vida aquática, foi realizado em laboratório e não em campo, e sem levar em consideração a comunidade como um todo. Acredita-se que mudanças de temperatura por períodos longos terão efeitos em toda a cadeia alimentar, do fitoplâncton, através das algas, até os peixes. Uma alteração em qualquer um dos elos pode afetar de forma irreversível a abundância de peixe. A água quente geralmente causa a extinção das espécies termicamente sensíveis. Haverá uma diminuição da diversidade de espécies dentro da comunidade, enquanto uma ou duas espécies dominantes terão suas populações aumentadas. O sistema de resfriamento pode ainda causar a morte de peixes, tanto ao passarem através do sistema de resfriamento como ao se chocarem com as telas protetoras da tubulação de captação de água. Outro fator importante é o cloro, adicionado às águas de resfriamento com o objetivo de reduzir o crescimento de lodo nas serpentinas do condensador. Muitos dos problemas ambientais ligados à poluição térmica agora estão sendo associados ao processo de cloração. 27 EN GC - R ev isã o: F ab ric ia - D ia gr am aç ão : F ab io - 2 2/ 11 /2 01 7 QUÍMICA APLICADA PARA ENGENHARIA CIVIL A eutroficação de lagos também pode ser decorrente das descargas de água quente, destruindo todo o ecossistema aquático. Naturalmente, as temperaturas variam de acordo com as estações do ano. No verão, o lago é estratificado termicamente. Na superfície, a água é aquecida pelos raios do Sol, formando uma camada quente chamada de epilímnio. Como a água fria é mais densa que a quente, ela fica no fundo, em uma camada denominada hipolímnio. A camada ou o estrato intermediário é conhecido como termoclino, cuja temperatura deve variar entre a temperatura da camada superior e a da inferior. Durante o inverno, as camadas de água fria e de água quente se misturam, visto que a água no estrato superior esfria e, então, afunda devido ao aumento da sua densidade. A transferência de calor ocorre por meio de um processo de convecção. A mistura carrega nutrientes do fundo do lago para a superfície, promovendo o crescimento biológico nas camadas superiores e gerando oxigênio para as camadas inferiores. A presença de uma usina de força pode desequilibrar este processo natural. Água fria é retirada do hipolímnio para ser usada no condensador do processo, e água quente é despejada no epilímnio. Isso promove um aumento da temperatura na superfície do lago, prolongando o período de estratificação, o que leva a um período de mistura menor e a uma diminuição da quantidade de oxigênio fornecida aos organismos dos estratos inferiores. A água retirada do fundo do lago possui nutrientes, como o nitrogênio e o fósforo, que são descarregados na superfície, estimulando o crescimento de vida vegetal, principalmente das espécies adaptadas a altas temperaturas. Várias espécies de alga podem se desenvolver de forma bastante rápida com o aumento da oferta de alimento (nutrientes), podendo formar uma espuma esverdeada ou uma camada de algas, cobrindo a superfície da água. Infelizmente, estas algas servem de alimento para um número pequeno de espécies, sendo tóxicas para as demais espécies. Quando as algas morrem e decantam no lago, elas se tornam alimento para os micro-organismos decompositores. Estes micro-organismos demandam oxigênio, reduzindo a disponibilidade do gás para a respiração dos peixes. Se houver o esgotamento do oxigênio presente no meio, o processo continuará com micro-organismos anaeróbios, que geram compostos com odores irritantes. Observação Eutroficação é o nome dado ao processo no qual um corpo de água é enriquecido pela adição de nutrientes extras, estimulando o crescimento de algas. O nome vem do grego eu = bem, bom, e trofos = nutrição. A eutroficação pode ocorrer durante o envelhecimento natural dos lagos, mas de forma acelerada pela adição de poluentes, como o fósforo do esgoto doméstico municipal (incluindo os detergentes domésticos), o nitrogênio dos fertilizantes e agrotóxicos usados na agricultura (que é carregado para o lago pelas chuvas ou pelo escoamento vertical das águas de irrigação) e os resíduos de calor descarregados pelas usinas de energia. 28 EN GC - R ev isã o: F ab ric ia - D ia gr am aç ão : F ab io - 2 2/ 11 /2 01 7 Unidade I Devido à eutroficação pelo excesso de esgoto humano, os rios que banham as grandes cidades do mundo tiveram sua fauna e sua flora destruídas, tornando-se esgotos a céu aberto. 1.6.8.1 Torres e lagoas de resfriamento Por causa dos impactos ecológicos da poluição térmica, a Resolução nº 430/2011 do Conama proíbe a descarga direta de efluentes com altas temperaturas no ecossistema aquático. O uso de torres de resfriamento é um dos meios mais utilizados para adequar os resíduos de calor, sem colocá-los diretamente em um sistema aquático. Atualmente, usinas térmicas geram mais de um terço da eletricidade dos EUA e usam lagoas ou torres de resfriamento. A utilização deste tipo de dispositivo tende a aumentar. A lagoa de resfriamento é um corpo d’água fechado, como um reservatório. Estas lagoas são rasas o bastante para permitir o valor máximo da razão entre a sua área de superfície e o seu volume, o que aumenta a perda de calor por evaporação. Calcula-se que uma usina de 1.000 MW precise de cerca de 5 km2 de área de lagoa de resfriamento para tratar um aumento permitido de 8 ºC na temperatura da água usada em seu sistema. Lagoas de resfriamento podem ter custos elevados se a usina de força estiver na proximidade de uma cidade, onde geralmente a área de terra custa mais caro. 1.6.9 Plásticos O tempo necessário para a degradação de polímeros, plásticos e elastômeros é de mais de cem anos, tornando esses materiais um dos maiores problemas ambientais da atualidade. O plástico é um dos produtos mais utilizados como matéria-prima para a produção de vários produtos e aplicações, devido às suas propriedades, como durabilidade, estabilidade e resistência a desintegração. Podemos afirmar que aproximadamente 100 milhões de toneladas de plásticos são produzidos por ano, dos quais cerca de 10% termina nos oceanos. O longo período necessário para sua decomposição promove o acúmulo do material que foi sintetizado, não foi tratado para descarte ou reciclagem e ainda está em algum lugar, assim como de seus eventuais resíduos. Sabe-se da existência de uma enorme camada flutuante de plástico com cerca de 1.000 km de extensão e 10 metros de profundidade no oceano Pacífico. Só para ter ideia, vai da costa da Califórnia, atravessa o Havaí e chega a meio caminho do Japão. Este é o maior depósito de lixo do mundo, com uma massa estimada em 100 milhões de toneladas, que contém plásticos de todos os tipos e formas. Ele é batizado por alguns pesquisadores de sopa plástica, tendo uma área de quase duas vezes o tamanho dos Estados Unidos. Já foi observada, em algumas áreas do oceano Pacífico, uma concentração de polímeros até seis vezes maior do que a de fitoplâncton, base da cadeia alimentar marinha. Atualmente, plásticos têm sido encontrados no estômago de várias espécies marinhas e aves, e acredita-se que, por sua variedade de cores e formas, foram e estão sendo ingeridos pelos animais 29 EN GC - R ev isã o: F ab ric ia - D ia gr am aç ão : F ab io - 2 2/ 11 /2 01 7 QUÍMICA APLICADA PARA ENGENHARIA CIVIL como meio de alimentação, causando deformações e lesões em animais de grande porte, podendo levá-los a óbito. Segundo a ONU, o plástico vem sendo considerado responsável pela morte de mais de 1 milhão de aves marinhas todos os anos – sem mencionar as outras espécies que vivem na área, como tartarugas marinhas, tubarõese centenas de espécies de peixes. 1.7 Principais usos da água 1.7.1 Agricultura Para a agricultura, os pré-requisitos são determinados em função do tipo de cultura a ser irrigada. Geralmente, a água precisa estar isenta de substâncias que sejam tóxicas para as plantas e para os seres humanos que consomem estes vegetais. Os maiores cuidados são exigidos pelas hortaliças, pois se trata de vegetais que são ingeridos na forma crua. Nesses casos, a água deve estar isenta de organismos patogênicos. Deve-se controlar a quantidade de sais dissolvidos na água, evitando-se o risco de interferência na atividade osmótica ou no metabolismo das plantas, ou ainda no aproveitamento de nutrientes. O excesso de sais pode levar à impermeabilização do solo, dificultando a aeração e a drenagem. Atualmente, os sistemas de irrigação gastam a maior parte dos recursos de água doce disponíveis ao homem. Quase toda a água usada carrega para os corpos d’água de superfície e para os aquíferos subterrâneos quantidades consideráveis dos agrotóxicos e fertilizantes utilizados na agricultura, provocando prejuízos aos ecossistemas aquáticos. 1.7.2 Usos industriais Para o processo industrial, os pré-requisitos de qualidade podem variar de acordo com o produto. Para a fabricação de bebidas, alimentos e produtos farmacêuticos, existe uma maior exigência de qualidade para a água usada. As indústrias de tecidos que utilizam processos de estamparia e tingimento precisam controlar a presença de sais e substâncias que possam manchar os produtos fabricados. A água destinada aos sistemas de resfriamento de qualquer tipo de processo não pode conter produtos corrosivos ou que provoquem acúmulo ou incrustações na tubulação. 1.7.3 Geração de energia A geração de energia a partir dos recursos hídricos não está livre de provocar impactos ambientais, mesmo sendo considerada uma fonte de energia limpa. Os maiores impactos não são causados durante a geração de energia, mas durante a construção das grandes usinas, nas quais ocorre a transformação de rios turbulentos e de grande velocidade em grandes lagos, lentos e de baixa turbulência, afetando todo o ecossistema aquático, que deverá estabelecer um novo equilíbrio para a nova realidade. A 30 EN GC - R ev isã o: F ab ric ia - D ia gr am aç ão : F ab io - 2 2/ 11 /2 01 7 Unidade I qualidade da água para esses usos requer apenas a inexistência de substâncias que sejam agressivas aos equipamentos empregados. 1.7.4 Recreação Consideramos formas comuns de recriação aquática: pesca, banhos, esportes aquáticos e esportes náuticos. Geralmente, corpos de água poluídos exalam mau cheiro e podem apresentar águas turvas ou corpos materiais sólidos em suspensão, que são inconvenientes para qualquer forma de recreação. Os esportes que não precisam de contato direto com a água, como a pesca e a navegação esportiva, têm um controle menos rígido em relação à qualidade das águas. Já natação e outros esportes aquáticos devem ser praticados apenas se o curso d’água não possuir organismos patogênicos e/ou substâncias tóxicas que possam ser ingeridas acidentalmente ou mesmo absorvidas pela pele. 1.7.5 Navegação Para que a navegação possa ser praticada em um corpo de água, algumas condições técnicas são necessárias, como profundidade do leito, velocidade do curso d’água e eventuais obras para a transposição de nível (barragens, eclusas). É importante que as vias estejam isentas de substâncias agressivas às partes da embarcação que têm contato com a água e que não contenham algas em demasia, nem substâncias poluentes que agridem o meio ambiente, trazendo danos à fauna e à flora. Os maiores impactos causados por esta atividade são provenientes de vazamentos de petróleo, que ocorrem em terminais petrolíferos e grandes petroleiros. 1.7.6 Receptação de despejos Infelizmente, no Brasil, ainda é prática comum lançar resíduos sem tratamento nos corpos d’água – resíduos dos mais diversos tipos e origens. A Resolução nº 430 do Conama estabelece a composição e as respectivas concentrações de substâncias que podem ser lançadas. Além dos parâmetros previstos na Resolução, devemos considerar as características específicas de cada leito. A capacidade de diluição de despejos depende da vazão do curso de água, bem como do tratamento dos efluentes para os quais a diluição necessária não será alcançada. Todas as condições exigidas para a preservação da fauna e da flora devem ser mantidas, mesmo nos locais de descarga dos efluentes. Maiores cuidados são requeridos nos casos em que os corpos de água são usados para o desenvolvimento de espécies pelo homem, como peixes e crustáceos. 1.7.7 Abastecimento público A água distribuída pelo sistema de abastecimento municipal é retirada de rios, lagos, fontes subterrâneas ou reservatórios, constituindo a maior parte da água potável (não causa prejuízos à saúde nem aos sentidos). Esta água precisa apresentar características sanitárias e toxicológicas adequadas, como não conter organismos patogênicos e substâncias tóxicas, para prevenir doenças e promover 31 EN GC - R ev isã o: F ab ric ia - D ia gr am aç ão : F ab io - 2 2/ 11 /2 01 7 QUÍMICA APLICADA PARA ENGENHARIA CIVIL o bem-estar da população. Dessa forma, é importante que a água captada nos mananciais passe por um tratamento, garantindo a qualidade exigida pela Resolução nº 357/2005 do Conama, antes de ser distribuída para consumo público. Antes do tratamento, a água bruta pode apresentar um aspecto barrento, turvo, com coloração que vai do amarelo ou marrom-claro ao marrom-escuro. A turbidez da água é devida às partículas de material em suspensão (argila, areia, microalgas etc). A coloração da água é proveniente de substâncias orgânicas dissolvidas ou finamente divididas. Na estação de tratamento da água (ETA), essas substâncias são removidas, tornando a água própria para o consumo humano. 2 TRATAMENTO DE ÁGUA 2.1 Etapas do tratamento de água O tratamento de água envolve processos químicos e físicos e ocorre em etapas. A adição de produtos químicos pode auxiliar na remoção de partículas em suspensão para tornar a água potável. A seguir, serão vistas as etapas do tratamento de água. Serão levadas em consideração as etapas do tratamento básico mais simples. Várias etapas podem ser adicionadas dependendo das substâncias presentes na água a ser tratada. Inicialmente, o fluxo de água passa por grades e telas, onde é feita uma filtração grosseira. Assim, são retirados corpos flutuantes de tamanho grande, como pedaços de galhos de árvores e plantas, e outros componentes que podem estar presentes. Dependendo das características da água bruta, pode ser realizada uma pré-cloração, visando facilitar a retirada de matéria orgânica e metais. Na sequência, a água segue para a etapa de coagulação e floculação, e nela são adicionados os produtos químicos que auxiliam a etapa de coagulação, basicamente sulfato de alumínio e cal. Podemos ainda adicionar o policloreto de alumínio (PAC). A reação química que ocorre é representada pela equação a seguir: Al2(SO4)3 + 3 Ca(OH)2 → 3 CaSO4 + 2 Al(OH)3 Observação Coagulação e floculação são fenômenos sequenciais e não são sinônimos. Coagular significa desestabilizar a partícula coloidal, diminuir as barreiras eletrostáticas entre partículas. Flocular é a aglomeração de várias partículas de tamanho coloidal, que se unem, aumentando de tamanho e ganhando peso para precipitar. Nas estações de tratamento de água, a coagulação ocorre logo no início, em algum ponto onde se tenha gradiente de velocidade alta, que promova a rápida dispersão do coagulante empregado. Dessa maneira, essa etapa do tratamento pode ser chamada de mistura rápida, e geralmente não é necessária 32 EN GC - R ev isã o: F ab ric ia - D ia gr am aç ão : F ab io - 2 2/ 11 /2 01 7 Unidade I a construção de um tanque específico para este fim, utilizando-se pontos de estrangulamentono canal de entrada de água na estação. Uma vez que as partículas foram desestabilizadas, a próxima etapa é a de formação dos flocos. Para que isso ocorra é necessário introduzir energia no meio de forma adequada. Deficiência de energia produz a formação de flocos pequenos, isentos de boas características de sedimentação. A energia excessiva pode causar a ruptura de flocos formados, e o fornecimento adequado de energia promove a formação de flocos grandes e densos, contendo ramificações que provocam entrelaçamentos entre os flocos, formando estruturas maiores e mais pesadas. Nas estações de tratamento de água, a etapa de floculação também é conhecida como mistura lenta. A floculação é influenciada pelas características físicas e químicas da água, como o pH, a alcalinidade, a temperatura e a distribuição de partículas, além de pela energia para a mistura. A presença de partículas maiores e sólidos em suspensão é importante, pois eles atuam como núcleos para a formação de flocos grandes e densos. A próxima etapa do processo é a decantação. Nesta etapa é promovida a retirada dos flocos formados sem a adição de produto químico. Pela ação da gravidade em tanques de formato retangular, os flocos são separados da água, normalmente, depositando-se no fundo do decantador. Outra forma de realizar a decantação é a flotação. Na etapa de flotação, os flocos são levados para a superfície do tanque devido à adição de água com microbolhas de ar, que promovem a flutuação dos flocos para depois serem removidos, ao contrário da decantação, em que os flocos vão para o fundo do tanque pela força da gravidade. A utilização de um decantador ou de um flotador em uma ETA depende das condições da água bruta na entrada. Na próxima etapa, a água decantada passa por unidades filtrantes, nas quais ocorre o processo de filtração. Geralmente o filtro é formado por um meio poroso granular, normalmente areia, contendo uma ou várias camadas, montado sobre um sistema de drenagem, com capacidade de reter e remover as impurezas que ainda estiverem presentes na água. Durante a filtração, os flocos restantes, que não foram removidos na etapa de decantação (ou flotação), serão retirados. Essa etapa remove a turbidez da água e também inicia a remoção de micro-organismos patogênicos. A filtração pode ser considerada uma barreira sanitária do tratamento, pois não podemos garantir uma adequada segurança da água com relação à presença de patógenos se ela não passar pelo filtro. Após a filtração, a água vai para o tanque de contato, no qual ocorrerão as etapas finais do tratamento. A desinfecção pode ser obtida pela ação de um agente físico ou químico (desinfetante), cujo objetivo é a eliminação dos micro-organismos patogênicos que possam transmitir doenças. No abastecimento público, geralmente são usados os seguintes agentes desinfetantes, em ordem de frequência: cloro, ozônio, luz ultravioleta e íons de prata. O uso de cloro na forma de hipoclorito de sódio também é muito comum. A Portaria nº 2.914/2011 determina que a companhia de saneamento entregue ao consumidor a água tratada com um teor mínimo de cloro residual livre de 0,2 mg/L. Porém, para que o cloro continue mantendo seu poder de desinfeção, a caixa d’água da sua residência deve ser mantida limpa, sendo lavada pelo menos duas vezes ao ano e mantida sempre tampada. 33 EN GC - R ev isã o: F ab ric ia - D ia gr am aç ão : F ab io - 2 2/ 11 /2 01 7 QUÍMICA APLICADA PARA ENGENHARIA CIVIL Saiba mais Leia mais sobre tratamento da água no artigo: GRASSI, M. T. As águas do planeta Terra. Cadernos Temáticos de Química Nova na Escola, São Paulo, edição especial, p. 31-40, maio 2001. A etapa de fluoretação da água é efetuada pela adição de compostos à base de flúor. O ácido fluossilícico (H2SiF6) é um desses compostos, o qual libera na água o ânion fluoreto, forma iônica do elemento químico flúor, um dos responsáveis pela redução da cárie dentária no Brasil. A adição de compostos de flúor na água de abastecimento público começou em 1953 no Espírito Santo, na cidade de Baixo Guandu, virando lei federal em 1974, expandida pelo País na década de 1980. Em 2006, beneficiava mais de 100 milhões de pessoas. As bactérias existentes na placa dental sintetizam ácidos que podem remover os minerais dos dentes (desmineralização), deixando-os propensos à formação da cárie. No entanto, quando ingerimos água fluorada por um longo período, esse fluoreto é incorporado ao organismo e aumenta sua concentração no sangue e na saliva, participando da etapa de recomposição dos minerais dos dentes (remineralização), tornando-os resistentes à cárie. Em grande parte do País o teor de flúor usado na água é de 0,6 a 0,8 mg/L. Na última etapa do tratamento, pela adição de cal hidratada (Ca(OH)2), ou hidróxido de sódio, ocorre a correção do pH (potencial de hidrogênio). Durante o tratamento, a água entra em contato com vários produtos químicos que conferem característica de acidez, sendo necessária a correção. Observação O pH pode ser entendido como uma medida da acidez da água. É medido numa escala que varia de 0 a 14. O valor 7 nessa escala indica a neutralidade e corresponde a uma substância que não é ácida nem alcalina. Números acima de 7 indicam alcalinidade e abaixo de 7 indicam acidez. A adição de cal no tratamento de água visa estabilizar o pH para que fique o mais próximo possível do valor 7. A Portaria nº 2.914/2011 estabelece que o pH mínimo para a água tratada deva ser 6 e no máximo 9,5. O aumento do pH também pode ter como objetivo a proteção da canalização de distribuição contra a corrosão, já que é normalmente utilizado o ferro fundido na sua construção. 2.2 Recuperação de recursos hídricos Existem várias possibilidades de recuperação das águas já utilizadas. Porém, o grau de exigência de qualidade depende da utilização que se pretende para a água recuperada. O retorno do investimento precisa ser analisado em conjunto com outros parâmetros, como a necessidade da região, a disponibilidade ou o grau de escassez e os custos na exploração dos recursos hídricos. 34 EN GC - R ev isã o: F ab ric ia - D ia gr am aç ão : F ab io - 2 2/ 11 /2 01 7 Unidade I Em vários países do Oriente Médio os recursos hídricos são escassos e de difícil acesso, pois estão em reservatórios subterrâneos. Alguns países dependem da dessalinização da água do mar para a obtenção da maior parte da água necessária para o consumo. Nestas localidades, a agricultura praticamente não existe pela falta de recurso para a irrigação. Nestes casos, os gastos com a recuperação da água são compensados com a redução de outros gastos, como a importação de alimentos. Pesquisas buscando novas tecnologias para o reaproveitamento da água são realizadas de forma contínua em todo o mundo, visando complementar a produção insuficiente em alguns lugares ou evitar a escassez num futuro próximo. No Brasil, o desinteresse político engaveta projetos contendo soluções para o adequado gerenciamento dos recursos hídricos no Nordeste, permitindo a desertificação de grandes extensões de terra. O cultivo adequado dessas áreas poderia resolver o problema da falta de alimentos e da fome de parte da população da região, além de promover o trabalho no campo. Várias soluções simplistas devem ser evitadas, como a adotada na região de São Paulo, complementando o suprimento necessário para o abastecimento público com água de lugares situados a mais de 100 km, aumentando o custo e trazendo problemas legais e político-institucionais 2.3 Reúso planejado da água Reúso da água é o uso dessa substância por mais de uma vez. Isso pode ocorrer espontaneamente na própria natureza, no ciclo hidrológico, ou através da ação humana, de forma planejada ou sem controle. O reúso planejado da água pode ser realizado visando obter água potável ou não potável, por exemplo, para fim recreacional, recarga de lençol freático, geração de energia, irrigação,reabilitação de leitos de água e fim industrial. O reúso planejado da água faz parte da estratégia global para a administração da qualidade da água proposta pelo Programa da Organização das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA) e pela Organização Mundial da Saúde (OMS). Nela se prevê o alcance de três elementos importantes simultaneamente: 1. Proteger a saúde pública. 2. Manter a integridade dos ecossistemas. 3. Fazer uso sustentável da água. O reúso de água ou o uso de águas residuais não é um conceito recente e tem sido usado em todo o mundo há vários anos. Existem evidências de sua prática na Grécia Antiga, com o lançamento de esgotos e sua utilização na irrigação. Mas a necessidade crescente de água e sua falta têm feito do reúso planejado um tema da atualidade e de grande importância. Nesse sentido, podemos considerar o reúso de água como parte de uma atividade mais extensa que o uso eficiente ou racional da água. Temos que levar em consideração também os problemas gerados por perdas e desperdícios e a diminuição da produção de efluentes e do consumo de água. 35 EN GC - R ev isã o: F ab ric ia - D ia gr am aç ão : F ab io - 2 2/ 11 /2 01 7 QUÍMICA APLICADA PARA ENGENHARIA CIVIL Os esgotos tratados têm um papel importante no planejamento e na gestão sustentável dos recursos hídricos. Quando reservamos as fontes de água de boa qualidade para o abastecimento público e outros fins prioritários, o uso de esgotos contribui para a preservação dos recursos e coloca uma dimensão econômica ao planejamento dos recursos hídricos. O reúso diminui a demanda sobre os mananciais de água, substituindo a água potável por uma água de qualidade inferior, utilizada em atividades menos exigentes. Essa prática vem sendo muito discutida, colocada em evidência e usada em alguns países, estando baseada no conceito de substituição de mananciais. Tal substituição é possível dependendo da qualidade necessária para um uso específico. Assim, grandes volumes de água potável podem ser economizados no reúso quando se utiliza água de qualidade menor (geralmente efluentes pós-tratados) para atender às finalidades que podem prescindir desse recurso dentro dos padrões estipulados pela legislação. Saiba mais Para saber um pouco mais sobre como os esgotos são tratados, leia o artigo: GUIMARÃES, J. R.; NOUR, E. A. A. Tratando nossos esgotos: processos que imitam a natureza. Cadernos Temáticos de Química Nova na Escola, São Paulo, edição especial, p. 19-30, maio 2001. 2.4 Tipos de reúso A reutilização de água pode ser direta ou indireta e decorrente de ações planejadas ou não. O reúso indireto não planejado da água ocorre quando esta, utilizada em alguma atividade humana, é descarregada no meio ambiente e novamente utilizada a jusante, em sua forma diluída, de maneira não intencional e não controlada. Caminhando até o ponto de captação para o novo usuário, ela está sujeita às ações naturais do ciclo hidrológico (diluição, autodepuração). O reúso indireto planejado da água acontece quando os efluentes, depois de tratados, são descarregados de forma planejada nos corpos de águas superficiais ou subterrâneas, para serem utilizados a jusante, de maneira controlada, para atender a algum uso benéfico. Este pressupõe que exista também um controle sobre as eventuais novas descargas de efluentes no caminho, garantindo que o efluente tratado estará sujeito apenas a misturas com outros efluentes que também atendam ao requisito de qualidade do reúso objetivado. O reúso direto planejado das águas verifica-se quando os efluentes, depois de tratados, são encaminhados diretamente de seu ponto de descarga até o local do reúso, não sendo descarregados no meio ambiente. Esta prática é comum com a água destinada ao uso industrial ou à irrigação. 36 EN GC - R ev isã o: F ab ric ia - D ia gr am aç ão : F ab io - 2 2/ 11 /2 01 7 Unidade I 2.5 Aplicações da água reciclada A água reciclada pode ser utilizada em diversas ocasiões, as quais podemos ver a seguir: • Irrigação paisagística: ocorre em parques, campi universitários, cemitérios, campos de golfe, gramados residenciais, faixas de domínio de autoestradas, cinturões verdes, entre outros. • Irrigação de campos para cultivos: plantas alimentícias, viveiros de plantas ornamentais, plantio de forrageiras, plantas fibrosas e de grãos, proteção contra geadas. • Usos industriais: lavagem de pisos, água de processamento, refrigeração, alimentação de caldeiras, água de processamento, construção civil, irrigação de áreas externas de instalações industriais, como jardins e outras. • Usos urbanos não potáveis: combate ao fogo, sistemas de ar condicionado, irrigação paisagística, descarga de vasos sanitários, lavagem de ruas e pontos de ônibus, lavagem de veículos, sistemas decorativos aquáticos, como fontes e chafarizes. • Finalidades ambientais: indústrias de pesca, aplicação em pântanos e terras alagadas, aumento de vazão em cursos de água. • Usos diversos: construções, aquicultura, controle de poeira em movimentos de terra, dessedentação de animais etc. 2.6 Reúso da água no Brasil No Brasil, existe a prática de utilização de esgotos para a irrigação de hortaliças e de algumas culturas forrageiras, a qual é muito comum principalmente na zona rural. Porém, este procedimento não institucionalizado tem sido empregado até os dias atuais sem nenhuma forma de planejamento ou controle. Na grande maioria das vezes, é inconsciente por parte de quem o pratica, que usa águas muito poluídas de córregos e rios adjacentes para a irrigação de hortaliças e outros vegetais, alheio de que está fazendo algo que pode trazer graves prejuízos à saúde pública, dos consumidores, e promovendo sérios impactos ambientais. Quando falamos de reúso industrial, a prática em fase inicial começa a ser implementada, mas sempre associada a iniciativas isoladas, a maioria delas dentro do setor privado. A Lei nº 9.433, de 8 de janeiro de 1997, institui a Política Nacional de Recursos Hídricos, cria o Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos, regulamenta o inciso XIX do art. 21 da Constituição Federal e altera o art. 1º da Lei nº 8.001, de 13 de março de 1990, que modificou a Lei nº 7.990, de 28 de dezembro de 1989. Em seu capítulo II, art. 2º, inciso 1, estabelece, entre os objetivos da Política Nacional de Recursos Hídricos, a necessidade de “assegurar à atual e às futuras gerações a necessária disponibilidade de água, em padrões de qualidade adequados aos respectivos usos”. 37 EN GC - R ev isã o: F ab ric ia - D ia gr am aç ão : F ab io - 2 2/ 11 /2 01 7 QUÍMICA APLICADA PARA ENGENHARIA CIVIL Verificou-se, por intermédio dos planos diretores de recursos hídricos de bacias hidrográficas, em levantamento realizado a fim de conhecer mais profundamente a realidade nas diversas bacias hidrográficas brasileiras, que existem sérios problemas em relação à questão de saneamento básico, coleta e tratamento de esgotos e propostas para a implementação de planos de saneamento básico. Não encontramos atividades de reúso de água usando efluentes pós-tratados. Isso pode acontecer devido à falta de conhecimento do fato, desconhecimento das tecnologias de reúso e por motivos socioculturais. Levando em consideração que já existe atividade de reúso de água na agricultura em certas regiões do Brasil, a qual é realizada de maneira informal e sem cuidados ambientais e de saúde pública adequados, faz-se necessário regulamentar e promover o setor. Assim, é preciso criar estruturas de gestão, disseminação de informação, preparação de legislação e desenvolvimento de tecnologias compatíveis com as nossas condições culturais, socioeconômicas e técnicas. A Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo (Sabesp) já faz o reúso planejado em suas instalações de tratamento de água (recirculação de água de lavagem de filtros, por exemplo) e de esgotos. No setor industrial, várias empresasestão abertas para negócios em torno do reúso da água com sistemas apropriados de distribuição. A reutilização da água apresenta alguns atrativos, como menor preço, confiabilidade tecnológica e suprimento garantido. Quanto à qualidade, os riscos inerentes podem ser gerenciados adotando-se medidas de monitoramento, planejamento, controle e sinalização adequadas. Os principais processos industriais em que é permitido o uso de água reciclada são os de produtos da produção primária de metal, curtumes, carvão, petróleo, indústrias têxteis, papel e celulose e químicos. Ainda existe a possibilidade de fornecimento de água reciclada para outras áreas. Prefeituras da região metropolitana de São Paulo já utilizam água de reúso como alternativa para a limpeza de ruas e pátios, irrigação e rega de áreas verdes, além de para a desobstrução de rede de esgotos e águas pluviais e limpeza de veículos. 3 CARACTERÍSTICAS FÍSICAS DA ÁGUA Odor e sabor As duas sensações se manifestam conjuntamente, o que torna difícil sua separação. Essas características dependem dos sais e gases dissolvidos. Como o paladar humano tem sensibilidade distinta para os diversos sais, poucos miligramas por litro de alguns sais (ferro e cobre, por exemplo) já são detectáveis, enquanto várias centenas de miligramas de cloreto de sódio não são percebidas. Algumas fontes naturais podem exalar cheiro de ovo podre devido à presença de H2S (gás sulfídrico). Da mesma forma, as águas que possuem matérias orgânicas em decomposição (turfa, por exemplo) também podem apresentar H2S. Já metais como ferro e manganês podem conferir sabor metálico à água, favorecendo o desenvolvimento das bactérias, causando maus odores e coloração à água; além disso, estes compostos podem ainda obstruir as canalizações. O quadro a seguir mostra o sabor apresentado pela água em função do componente dissolvido. 38 EN GC - R ev isã o: F ab ric ia - D ia gr am aç ão : F ab io - 2 2/ 11 /2 01 7 Unidade I Quadro 2 – Sabor na água Sal dissolvido Sabor Cloreto de sódio (NaCl) Salgado Sulfato de sódio ( Na2SO4) Ligeiramente salgado Bicarbonato de sódio (NaHCO3) Ligeiramente salgado a doce Carbonato de sódio (Na2CO3) Amargo e salgado Cloreto de cálcio (CaCl2) Fortemente amargo Sulfato de cálcio (CaSO4) Ligeiramente amargo Sulfato de magnésio (MgSO4) Amargo e doce Cloreto de magnésio (MgCl2) Amargo e doce Gás carbônico (CO2) Adstringente, picante Turbidez É a medida da dificuldade que um feixe de luz leva para passar por uma quantidade padrão de água. Podem causar turbidez os resíduos sólidos em suspensão (argila, coloides, matéria orgânica etc.). A medida desta propriedade é feita de forma comparativa com um equipamento portátil chamado de turbidímetro. Ao passar pelo analito, o espalhamento de um feixe de luz é comparado com o espalhamento de um feixe de igual intensidade ao atravessar uma suspensão padrão. Quanto maior o espalhamento, maior o valor turbidez. A coloração da água aumenta a medida da turbidez, pois absorve luz. Sólidos em suspensão Equivalem à carga sólida em suspensão e que será separada por filtração simples ou decantação. Temperatura A temperatura da água depende de sua origem e localização. A variação de temperatura de águas superficiais pode acompanhar as alterações da temperatura ambiente; as águas subterrâneas apresentam menor alteração, pois não interagem com a atmosfera. As águas provenientes de lençóis freáticos pouco profundos estão mais sujeitas a ter sua temperatura alterada. Em maiores profundidades, a temperatura da água sofre influência do grau geotérmico local (em média 1 ºC a cada 30 m). No lençol Guarani, são comuns temperaturas de 40 a 50 ºC nas partes mais profundas. Na maioria das regiões vulcânicas ou de falhas, águas aquecidas podem emergir à superfície, originando as fontes termais. Cor A coloração tem origem na dissolução de substâncias orgânicas e inorgânicas. A água pura, e em grandes volumes, apresenta coloração azulada; na presença de ferro, é arroxeada. Quando a água é rica em manganês, apresenta cor negra; os ácidos húmicos deixam a água amarelada. O procedimento de medida da coloração é comparativo. A cor do analito é comparada à cor de soluções padrão de 39 EN GC - R ev isã o: F ab ric ia - D ia gr am aç ão : F ab io - 2 2/ 11 /2 01 7 QUÍMICA APLICADA PARA ENGENHARIA CIVIL platina-cobalto. Também podemos usar discos coloridos de vidro, cujas cores são calibradas com as soluções de platina-cobalto. Uma unidade de cor equivale àquela produzida por 1 mg/L de platina, na forma de íon cloroplatinado. O valor do pH exerce influência no resultado desta medida. A cor é motivada por material sólido em suspensão (turbidez), que deve ser retirado antes de se fazer a medida. Para águas relativamente límpidas, a medida pode ser realizada sem a preocupação com a turbidez. Dessa forma, a cor obtida é chamada de aparente. A água não deve possuir nenhuma cor para ser potável. Segundo a OMS, o índice máximo permitido deve ser 20 mg Pt/L. Condutividade elétrica Os sais presentes na água, dissolvidos e ionizados, transformam-na num eletrólito com capacidade de conduzir a corrente elétrica. Podemos estimar o teor de sais dissolvidos pela medida de condutividade de água, pois existe uma relação proporcional entre a concentração de sais dissolvidos e a condutividade elétrica. Esta medida pode ser realizada usando-se um condutivímetro, e a resposta encontrada apresenta como unidade o mho (inverso de ohm, unidade de resistência). A condutividade aumenta com a temperatura. Portanto, utiliza-se 25 ºC como temperatura padrão e pode ser necessário realizar a correção da medida em função da temperatura se o condutivímetro não a fizer automaticamente. Sólidos totais dissolvidos (STD) É a soma das concentrações de todos os constituintes minerais presentes na água. A medida de condutividade elétrica multiplicada por um fator pode gerar uma estimativa confiável do teor de sólidos totais dissolvidos em água. Segundo a OMS, o limite máximo permitido de STD na água é de 1.000 mg/L, segundo o padrão de potabilidade. 3.1 Características químicas e físico-químicas da água pH É a medida da concentração hidrogeniônica (H+) na água. A razão entre íons hidrogênio (H+) e hidróxido (OH-) determinam o quanto a água é ácida ou básica. Na água pura, os íons H+ estão em equilíbrio com os íons OH- e seu pH é conhecido como neutro, ou seja, igual a 7. Se existir a predominância de íons (H+), o pH vai ter valor entre 0 e 7 (0 < pH < 7), e a água terá características ácidas. Se existir predominância de íons (OH-), o pH estará entre 7 e 14 (7 < pH < 14), e a água possuirá caráter alcalino (ou básico). Na agricultura, o valor de pH pode interferir no equilíbrio de dissociação ou grau de ionização, principalmente de alguns inseticidas, mudando sua atividade biológica. Alcalinidade É a medida total de compostos químicos capazes de neutralizar ácidos existentes na água, isto é, a concentração de substâncias presentes na água e que agem como tampão (estabilizador do pH). Se numa água quimicamente pura (pH = 7) for inserida uma pequena quantidade de um ácido fraco, seu pH mudará instantaneamente. Já na água com alguma alcalinidade a inserção de uma pequena 40 EN GC - R ev isã o: F ab ric ia - D ia gr am aç ão : F ab io - 2 2/ 11 /2 01 7 Unidade I quantidade de ácido fraco não causará alterações em seu pH, pois os íons alcalinos presentes irão neutralizar o ácido. Em águas subterrâneas, a alcalinidade aparece principalmente devido à presença de carbonatos e bicarbonatos, bem como aos íons silicatos, boratos, hidróxidos, fosfatos e amônia. Alcalinidade total é o somatório da alcalinidade produzida pelos íons presentes numa água. Águas que percolam rochas calcárias (calcita = CaCO3) normalmente possuem alcalinidade alta. Em muitos estados brasileiros, granitos, rochas comuns e gnaisses apresentam poucos minerais quepossam gerar a alcalinidade das águas. A alcalinidade total de uma água pode ser medida em mg/L de CaCO3. Constituintes iônicos de presença mais comum As águas subterrâneas possuem, geralmente, uma maior concentração de sais dissolvidos do que as águas superficiais. Este fato é reflexo dos substratos rochosos percolados e pode variar em função do comportamento geoquímico dos compostos envolvidos: • Bário (Ba): de presença rara nas águas naturais, apresenta-se na forma de barita (BaSO4) ou feldspatos ricos em bário. Atividades que podem acrescentar bário ao meio ambiente incluem: a perfuração de poços e a produção de vidros, defensivos agrícolas, pigmentos e fogos de artifício. É um elemento muito tóxico acima de 0,7 mg/L de teor. Sua ingestão acima do limite pode causar aumento da pressão sanguínea por vasoconstrição e bloqueio do sistema nervoso. A Resolução nº 357 do Conama limita em 0,7 mg/L a presença máxima de bário em águas de abastecimento público. • Cádmio (Cd): em águas naturais, sua concentração geralmente não ultrapassa 0,001 mg/L. O despejo de cádmio no ambiente ocorre por meio de combustíveis fósseis, pigmentos, baterias, acessórios fotográficos, defensivos químicos, soldas, equipamentos eletrônicos, lubrificantes, corrosão de tubos galvanizados e refinarias de minérios. Seu potencial tóxico é grande, principalmente quando se acumula em organismos aquáticos, o que torna possível sua entrada na cadeia alimentar e sua chegada ao homem. Sua ingestão promove arteriosclerose, inibição no crescimento, disfunção renal, hipertensão, doenças crônicas em idosos e câncer. A Resolução nº 357 do Conama limita seu teor em 0,001 mg/L. • Cálcio (Ca): sua concentração nos lençóis freáticos costuma variar entre 10 e 100 mg/L. Pode ser encontrado na forma de minério (calcita, dolomita e apatita), que é umas das principais fontes naturais de cálcio. Como o carbonato de cálcio é pouco solúvel em água pura, sua presença nas águas ocorre na forma de bicarbonato e sua solubilidade depende da concentração de gás carbônico dissolvido, o que está intimamente ligado à temperatura e à pressão do meio. Dessa forma, essas variáveis determinam sua concentração nas águas, sua precipitação e consequente formação de incrustações. • Chumbo (Pb): pouco comum nas águas naturais, mas pode ser introduzido facilmente no meio ambiente por atividades e produtos humanos, como: plásticos, tintas, pigmentos, encanamentos, soldas e metalurgia. É muito tóxico e tem efeito cumulativo no organismo, causando uma doença crônica chamada saturnismo. Os efeitos da intoxicação por chumbo são: irritabilidade, dor 41 EN GC - R ev isã o: F ab ric ia - D ia gr am aç ão : F ab io - 2 2/ 11 /2 01 7 QUÍMICA APLICADA PARA ENGENHARIA CIVIL de cabeça, tontura, perda de memória. A intoxicação aguda pode ser diagnosticada pela sede intensa, inflamação gastrointestinal, sabor metálico na boca, vômitos e diarreias. O chumbo ainda pode provocar retardamento físico e mental, perda da concentração e diminuição da capacidade cognitiva em crianças. Em adultos são comuns aumento da pressão arterial e problemas nos rins. A Resolução nº 357 do Conama limita em 0,01 mg/L a concentração máxima de chumbo nas águas de abastecimento público. • Cloretos (Cl−): o cloro é encontrado em teores inferiores a 100 mg/L. Pode formar vários compostos muito solúveis e tende a se enriquecer, junto com o sódio, a partir das zonas de recarga das águas subterrâneas. Teores maiores indicam contaminação por água do mar e por aterros sanitários. • Cobre (Cu): podemos considerar como fontes de cobre a corrosão de tubos de cobre e de latão, as indústrias de mineração, fundição, galvanoplastia e refino. Nas águas superficiais naturais, seu teor é normalmente inferior a 0,020 mg/L, e nas águas subterrâneas é menor que 1 µg/L. No homem, a ingestão de grandes doses pode provocar corrosão e irritação da mucosa, problemas renais e hepáticos, irritação do sistema nervoso e depressão. Nas águas de abastecimento público seu teor máximo é 0,009 mg/L, conforme a Resolução nº 357 do Conama. • Ferro (Fe-): a concentração limite de ferro em águas de abastecimento público é 0,3 mg/L. Este limite foi determinado por causa do sabor ruim e de problemas estéticos que o ferro provoca, pois o organismo humano precisa de até 19 mg de ferro por dia. Muito comum nas águas subterrâneas em concentrações abaixo de 0,3 mg/L, na forma de sais solúveis (Fe²+). Pode formar compostos solúveis, principalmente hidróxidos. Sofre oxidação facilmente em presença de ar, formando o hidróxido férrico, que é insolúvel e precipita, conferindo cor forte à água. Assim, águas com alto teor de ferro, ao serem retiradas do poço, são incolores, mas ao entrarem em contato com o oxigênio do ar ficam amareladas, com aparência desagradável. O ferro, como o manganês (sistematicamente está presente junto com o ferro), quando se oxida, precipita sobre as louças sanitárias, azulejos e roupas, causando manchas. • Flúor (F): o flúor é um elemento presente naturalmente e em pequenas quantidades nas águas naturais (0,1 a 2,0 mg/L). Siderurgia, fundições, indústria do alumínio, de esmaltados, teflon, vidro, etc. são atividades que podem introduzir o elemento nas águas. Em concentrações pequenas, pode gerar benefícios à saúde humana, principalmente em crianças, provocando o endurecimento de dentes e ossos. Sendo muito eficiente na prevenção da cárie dentária, é adicionado nas águas de abastecimento público em concentrações próximas a 6 ppm. Em concentrações maiores passa a ser prejudicial, causando o escurecimento dos dentes e a perda de resistência dos dentes e ossos (fluorose dental e esquelética) tanto em seres humanos como em animais. • Magnésio (Mg): ocorre com concentrações entre 1 e 40 mg/L nas águas subterrâneas. Forma sais cuja solubilidade reduz com o aumento de temperatura, o que provoca a formação de depósitos e incrustações em sistemas de troca de calor, caldeiras e outros. 42 EN GC - R ev isã o: F ab ric ia - D ia gr am aç ão : F ab io - 2 2/ 11 /2 01 7 Unidade I Juntamente com o cálcio, promove a dureza das águas. A dolomita (mineral natural) é um dos mais importantes fornecedores naturais de magnésio. Nos oceanos, sua concentração pode atingir valores em torno de 1.400 mg/L. A análise de sua concentração, em conjunto com a de cálcio, em aquíferos subterrâneos litorâneos apresenta uma indicação sobre a intrusão marinha. • Manganês (Mn): a concentração encontrada em águas naturais é sempre abaixo de 0,2 mg/L e apresenta-se na forma de óxido de manganês bivalente. Sua ocorrência está associada à presença de ferro por razões geoquímicas. • Níquel (Ni): o teor de níquel máximo permitido em águas de abastecimento é 0,025 mg/L, de acordo com a Resolução nº 357 do Conama. Nas águas naturais, sua concentração está em torno de 0,1 mg/L. Este metal ainda pode ser obtido como resíduo de: queima de combustíveis fósseis, fundição e ligas, e galvanoplastia. Teores acima de 11,0 mg/L podem ser encontrados em áreas de mineração. A intoxicação por níquel afeta nervos, coração e sistema respiratório e pode causar dermatites em pessoas sensíveis. • Nitratos (NO3 − ): as concentrações de nitratos nas águas, geralmente, encontram-se abaixo de 5 mg/L. O padrão de potabilidade da OMS limita sua concentração em 10 mg/L. No sistema digestivo, o nitrato é convertido em nitroaminas, que são cancerígenas. Interferem no mecanismo de transporte de oxigênio pela hemoglobina no sangue e podem causar danos neurológicos devido à má distribuição de oxigênio, dificuldade de respiração (falta de ar) e até morte por asfixia. A utilização intensiva de fertilizantes na agricultura é uma das fontes de nitratos na água. • Potássio (K): embora o elemento seja muito presente na crosta terrestre, aparece em pequena quantidade nas águas subterrâneas, pois é fixado com facilidade pelas argilas e muito consumido pelos vegetais.Em águas subterrâneas, seu teor médio é menor que 10 mg/L. • Sódio (Na): o sódio é um elemento químico muito presente nas águas de lençóis freáticos, pois gera sais muito solúveis. Nas águas subterrâneas, a concentração de sódio pode variar entre 0,1 e 100 mg/L. O teor de sódio na água é um fator limitante de seu uso na agricultura. Em aquíferos litorâneos, a presença de uma maior concentração de sódio na água pode estar relacionada à intrusão da água do mar. O valor máximo de sódio na água potável recomendado pela OMS é 200 mg/L. 3.2 Ensaio de Jar Test (ou Teste dos Jarros) Trata-se de um método muito utilizado nas ETAs para otimizar o processo de tratamento de um determinado tipo de água, quando não se conhecem suas características e comportamento. É um procedimento de pesquisa que permite adequar o tratamento e estipular a quantidade econômica de reagentes adicionados, sem que haja diminuição da qualidade da água tratada. Pode ser realizado para a determinação de dados experimentais que auxiliem o projeto de 43 EN GC - R ev isã o: F ab ric ia - D ia gr am aç ão : F ab io - 2 2/ 11 /2 01 7 QUÍMICA APLICADA PARA ENGENHARIA CIVIL câmaras, nas quais ocorrem etapas do tratamento, como a de mistura rápida e a de floculação na estação. Promove ainda: • melhoria do processo de tratamento através da comparação da ação de diferentes coagulantes e polímeros, bem como de suas quantidades e concentrações; • testes com novos coagulantes e polímeros (mais comuns); • otimização de processos para a retirada de substâncias causadoras de gosto e odor; • determinação do teor ótimo de cloro; • determinação do teor de permanganato de potássio; • determinação do teor de carvão ativado em pó; • estudo da formação de subproduto da cloração (THM); • testes com novos produtos químicos; • testes de tratabilidade para novos mananciais. Os produtos químicos geralmente usados são: • Coagulantes: sais de ferro ou alumínio (mais usados); sais polimerizados de alumínio (PAC); orgânicos (tanato e polímeros). • Alcalinizantes: suspensão de hidróxido de cálcio; solução de hidróxido de sódio; solução de barrilha (soda cáustica). • Auxiliar de coagulação: sílica ativada; polímeros (catiônico de alta carga e baixo peso molecular). • Auxiliar de floculação: polímeros (catiônico, aniônico e não iônico), todos de médio a alto peso molecular e média a baixa carga ou nenhuma. • Desinfetantes e oxidantes: hipoclorito de sódio; hipoclorito de cálcio; água de cloro. O objetivo do ensaio é determinar o pH ótimo de floculação e a quantidade econômica de coagulante para certa amostra de água. Dependendo de sua origem, a água tem seu próprio valor de pH de floculação ótimo. Ao estipular qual é esse valor e realizar o tratamento de maneira a preservá-lo, o tratamento será eficiente, consumindo menor quantidade de floculante, gerando maior remoção de cor e turbidez, promovendo melhor decantação, o que proporcionará maior tempo de uso dos filtros (menor número de paralisações para a lavagem deles) e redução da alumina residual. 44 EN GC - R ev isã o: F ab ric ia - D ia gr am aç ão : F ab io - 2 2/ 11 /2 01 7 Unidade I Soluções necessárias • solução saturada de Ca(OH)2 (hidróxido de cálcio), que deverá ser filtrada no momento de seu uso; • solução de Al2(SO4)3 (sulfato de alumínio) a 10% (ou 1 g/L). Esta solução possui 10.000 mg/L de sulfato de alumínio, portanto é uma solução de concentração 10.000 ppm. Equipamentos • aparelho de Jar test; • pHmetro; • turbidímetro; • agitador magnético. Materiais Vidraria e materiais diversos de laboratório. Etapa 1 – Determinação do pH ótimo de floculação Procedimento para a determinação do pH ótimo de floculação Serão necessários 12 litros de água para esta etapa. O pH desta água varia na faixa de 5,0 a 6,5. Dessa forma, foi proposto realizar o experimento variando o pH na faixa de 5,4 a 6,4. Outras faixas poderão ser estudadas de acordo com o conhecimento de informações adicionais sobre a água considerada. Nesta etapa será adicionada uma quantidade fixa e em excesso de sulfato de alumínio 10% em cada frasco. A concentração de sulfato em cada frasco após a adição deverá ser 20 ppm. Será útil conhecer as quantidades de hidróxido de cálcio a serem adicionadas nos frascos do aparelho para que o pH deles varie dentro da faixa considerada. Procedimento prévio da etapa 1 1. Meça a turbidez da água bruta. 2. Em 1.000 mL (ou 2.000 mL) de água bruta, adicione o volume necessário da solução de sulfato de alumínio que garanta a concentração de 20 ppm na quantidade de água contida num béquer. 45 EN GC - R ev isã o: F ab ric ia - D ia gr am aç ão : F ab io - 2 2/ 11 /2 01 7 QUÍMICA APLICADA PARA ENGENHARIA CIVIL 3. Instale o pHmetro para que ele forneça a medida de forma contínua. 4. A seguir, goteje, lentamente, de uma bureta, a solução de hidróxido de cálcio. 5. Mantenha o conjunto sobre um agitador magnético na menor rotação possível. 6. Acompanhe a variação do pH. 7. Anote o valor consumido “v” de hidróxido de cálcio quando o pH for 5,4. 8. Continue o gotejamento até que o pH atinja o valor 6,4 ,quando deverá ser anotado o valor “V” consumido de hidróxido de cálcio. 9. Calcule o incremento Δ em mL através da expressão: Δ = (V - v) / 5 Preparação do ensaio Coloque 2.000 mL de água bruta em cada frasco do aparelho. Adicione em cada frasco o volume necessário de sulfato de alumínio para que a concentração seja 20 ppm em todos os frascos. Adicione os volumes de hidróxido de cálcio conforme a tabela a seguir: Tabela 3 Número do frasco 1 2 3 4 5 6 Volume em mL V v + Δ v + 2Δ v + 3Δ v + 4Δ V 10. Sequência de agitação • agitação rápida (160 rpm) por 1 minuto; • agitação intermediária (100 rpm) por 10 minutos; • agitação lenta (30 rpm) por 5 minutos; • repouso por 15 minutos. 11. Cumpridas estas etapas, escolha o frasco onde ocorreu o melhor resultado. A escolha deve estar baseada no maior número de parâmetros dos listados a seguir: 46 EN GC - R ev isã o: F ab ric ia - D ia gr am aç ão : F ab io - 2 2/ 11 /2 01 7 Unidade I • boa coagulação; • tamanho dos flocos (grandes ou pequenos); • boa sedimentação; • aspecto final. 12. Escolhido o frasco que apresentou melhor resultado, realize a medida do pH dele, determinando o pH ótimo de floculação. 13. Meça a turbidez da água no frasco escolhido. Se desejar um resultado melhor, podem-se considerar os valores de pH dos frascos imediatamente anterior e posterior como limites inferior e superior para estabelecer uma nova faixa de pesquisa e realizar um novo ensaio. Etapa 2 – Determinação da quantidade econômica de floculante A partir de novas amostras da água bruta, serão adicionados volumes crescentes da solução de sulfato de alumínio, de forma a garantir que dentro deles as concentrações variem de 10 a 20 ppm, com incremento de 2 ppm entre dois frascos consecutivos. A seguir, o valor do pH de cada frasco será ajustado ao valor determinado na primeira etapa, pela adição controlada da solução de hidróxido de cálcio. Será útil conhecer a quantidade de hidróxido de cálcio a ser adicionada no primeiro frasco, o qual conterá 10 ppm de hidróxido de alumínio. Como o sal sulfato de alumínio ao ser adicionado na água sofre hidrólise, formando ácido sulfúrico (ácido forte) e hidróxido de alumínio (base fraca), a solução formada tem caráter ácido. À medida que a quantidade adicionada nos frascos aumentar, maior volume de hidróxido de cálcio será necessário no ajuste do pH. Se o volume necessário para o primeiro frasco é conhecido, para ajustar o segundo, pode-se escorrer diretamente o volume do primeiro e gotejar somente a quantidade necessária para obter o mesmo valor de pH. Repetindo esse procedimento para os demais frascos, o tempo total gasto para ajuste de pH nesta fase fica reduzido. 47 EN GC - R ev isã o: F ab ric ia - D ia gram aç ão : F ab io - 2 2/ 11 /2 01 7 QUÍMICA APLICADA PARA ENGENHARIA CIVIL Procedimento prévio da etapa 2 Colocar num béquer 1.000 (ou 2.000) mL da água bruta. Adicionar a solução de sulfato de alumínio de forma a garantir a concentração de 10 ppm dentro do béquer. Instalar o pHmetro no conjunto, de forma que se tenha a medida contínua do pH. Manter um conjunto sobre um agitador magnético, na menor velocidade possível. De uma bureta, gotejar a solução de hidróxido de cálcio até obter o valor do pH determinado na primeira etapa. Depois de ajustar o pH de todos os frascos ao valor ótimo, proceder a agitação de acordo com o seguinte: • agitação rápida (160 rpm) por 1 minuto; • agitação intermediária (100 rpm) por 10 minutos; • agitação lenta (30 rpm) por 5 minutos; • repouso por 15 minutos. Cumpridas estas etapas, deve-se definir o frasco onde houve o melhor resultado. A escolha deve estar fundamentada no maior número de parâmetros dos listados a seguir: • boa coagulação; • tamanho dos flocos (grandes ou pequenos), • boa sedimentação; • aspecto final. O frasco que apresentou melhor resultado contém a quantidade econômica de reagente para o tratamento. Medir a turbidez da água no frasco escolhido. Desejando um resultado mais preciso, podem-se considerar os valores de concentração dos frascos imediatamente anterior e posterior como limites inferior e superior de concentração para estabelecer uma nova faixa de pesquisa e realizar um novo ensaio. Notas 1) Deve-se considerar que a água do manancial sofre alterações em suas características durante o ano. Tais mudanças decorrem de eventos climáticos, floração de algas etc. Portanto, a reprodutibilidade dos resultados é sempre referida a uma época e às características da água bruta testada. 2) É desejável que sempre se trabalhe com percentual de remoção, e não medidas diretas, para poder comparar a eficiência com diferentes características da água bruta. 48 EN GC - R ev isã o: F ab ric ia - D ia gr am aç ão : F ab io - 2 2/ 11 /2 01 7 Unidade I 3) Para uma caracterização da água bruta, outros dados devem ser conhecidos. Os principais são: turbidez, cor aparente, pH, alcalinidade, ferro e manganês, potencial zeta, números de partículas etc. 4) Há ainda outros parâmetros menos comuns, que também podem ser analisados, como: carbono orgânico total (COT), carbono orgânico dissolvido (COD), análise de UV 254; correlacionando com carbono orgânico, número de algas, compostos causadores de gosto e odor, toxinas, entre outros. 4 UNIDADES DE CONCENTRAÇÃO A concentração é uma grandeza utilizada para indicar as quantidades relativas dos componentes de uma mistura. As misturas podem ser homogêneas (as que apresentam uma única fase) e heterogêneas (as que apresentam duas ou mais fases). As misturas homogêneas podem ser sólidas, líquidas e gasosas. As gasosas serão estudadas em outro momento. As sólidas e líquidas são normalmente chamadas soluções. Numa solução chamamos soluto a parte dissolvida e solvente a parte que dissolve. A água, por sua abundância e baixo custo, é considerada o solvente universal. Assim, numa solução líquida, toda vez que não for indicado o solvente, deve-se entender que ele é a água. Para expressar a concentração das soluções, podem ser usadas as unidades clássicas da Química. 4.1 Unidades clássicas As unidades de concentração que serão usadas neste curso são: Densidade Embora não seja propriamente uma unidade de concentração, para uma solução, fornece uma orientação sobre a concentração dela. É a relação entre a massa da solução e o volume da solução. massa da solução d volume da solução = em g/mL Observação: para gases e misturas gasosas, é dada em g/L Relação entre massa do soluto e volume da solução É a relação entre a massa do soluto em gramas e o volume da solução em litros. massa do soluto em gramas C = volume da solução em litros em g/L 49 EN GC - R ev isã o: F ab ric ia - D ia gr am aç ão : F ab io - 2 2/ 11 /2 01 7 QUÍMICA APLICADA PARA ENGENHARIA CIVIL Porcentagem em massa de soluto É a massa de soluto existente em 100 g de solução. massa do soluto % P = x 100 massa da solução Concentração em quantidade de matéria ou em mols por litro É a relação entre a quantidade de matéria do soluto e o volume da solução em litros. M = quantidade de matéria do soluto volume da solução em litros em mol/L Lembrando que a quantidade de matéria do soluto é dada por: massa do soluto n = Msoluto Em que Msoluto é a massa molar do soluto. Pode-se escrever: M = massa do soluto x volume da solução em litrosMsoluto em mol/L Concentração em quantidade de matéria do soluto por quilograma de solvente É a relação entre a quantidade de matéria do soluto e a massa do solvente em quilogramas. W = massa do soluto x massa do solvente em quilogramasMsoluto em mol/kg Exemplo de cálculo com as unidades clássicas A fim de proteger superficialmente peças de ferro da corrosão, prepara-se uma solução adicionando-se 11,3 g de molibdato de zinco (ZnMoO4) a 858,7 g de água. Supondo que a densidade da solução seja 1,061 g/mL, calcular a concentração dessa solução nas formas apresentadas. 50 EN GC - R ev isã o: F ab ric ia - D ia gr am aç ão : F ab io - 2 2/ 11 /2 01 7 Unidade I De acordo com os dados, tem-se: massa do soluto: 11,3 g massa do solvente: 858,7 g massa da solução: 11,3 + 858,7 = 870 g volume da solução = massa da solução densidade = 870 1,061 ≅ 820 mL massa molar do ZnMoO4 = 225,4 g/mol Cálculos: massa do soluto em gramas 11,3 C = -3volume da solução em litros 820x10 = ≅ 13,78 g/L % P = massa do soluto x 100 massa da solução = 113 870 100 , x ≅ 1,3% M = massa do soluto M da solu o em litrossoluto x volume xçã = 113 225 4 8 , , 220 310x - ≅ 0,061 mol/L W = massa do soluto M do sol em quilogramassoluto x volume vente = 113 2 , 225 4 858 7 310, , -x x ≅ 0,058 mol/kg 4.2 Unidades especiais de concentração Em certas situações, é comum o uso de unidades especiais para indicar a concentração. Por exemplo: na água que sai de uma estação de tratamento, são adicionados 0,6 g de flúor a cada 1.000 L de água tratada. Considerando a densidade da água 1 g/mL (o que equivale a 1 kg/L), tem-se: 0,6 gramas de flúor em 1.000 kg de água (ou 1.000.000 g). Para calcular a porcentagem em massa de flúor na solução, deve-se considerar que: m soluto = 0,6 g m solvente = 1.000.000 g e msolução = 1.000.000,6 g % P = 0,6 x 100 0,00006% 1.000.000,6 ≅ 51 EN GC - R ev isã o: F ab ric ia - D ia gr am aç ão : F ab io - 2 2/ 11 /2 01 7 QUÍMICA APLICADA PARA ENGENHARIA CIVIL Parte por milhão A fim de evitar a escrita de números tão pequenos, como o calculado anterior, utiliza-se uma unidade especial chamada parte por milhão (ppm). Como o próprio nome diz, esta unidade significa: número de partes em um milhão de partes. Ou seja, 1 ppm pode significar: 1 mg do soluto em 1.000.000 mg do solvente, ou 1 mg do soluto em 1.000 g do solvente, ou 1 mg do soluto em 1 kg do solvente. Quando a água é o solvente, admitindo-se dH2O = 1 g/mL, é válida a seguinte correspondência: 1 ppm = 1 mg/L = 1 g/m3 = 1 kg/1.000 m3 Dessa forma, a adição de 0,6 g de flúor a cada 1.000 L (1 m3) de água significa uma concentração em flúor de 0,6 ppm. A vantagem do uso desta unidade é que, ao informar que a concentração de flúor é 0,6 ppm, pode-se entender: 0,6 mg de flúor em 1 L de água, ou 0,6 g de flúor em 1 m3 de água, ou 0,6 kg de flúor em 1.000 m3 de água. Parte por bilhão Para certos contaminantes extremamente tóxicos, os limites de tolerância de concentração são muito menores, para evitar riscos à saúde. Nestes casos, utiliza-se a unidade chamada parte por bilhão (ppb), que significa: número de partes em um bilhão de partes. Seguindo o mesmo raciocínio anterior, em se tratando de água, tem-se: 1 ppb = 1 mg/m3 =1 g/1.000 m3 = 1 kg/1.000.000 m3 Embora tais unidades ainda sejam de uso corrente em algumas situações, elas devem ser evitadas e substituídas pelas correspondentes do Sistema Internacional sempre que possível. Porém, é de extrema importância não só conhecê-las como ter o domínio do uso delas, pois são muitas as publicações, normas e até mesmo leis e decretos em que são citadas. Em massa: ppm = mg/kg ou g/t e ppb = µg/kg ou mg/t 52 EN GC - R ev isã o: F ab ric ia - D ia gr am aç ão : F ab io - 2 2/ 11 /2 01 7 Unidade I Em volume: ppm = µL/L ou mL/m3 (≡ cm3/m3) e ppb = nL/L ou µL/m3 Em quantidade de matéria ou número de mols: ppm = µmol/mol ou mmol/kmol e ppb = nmol/mol ou µmol/kmol Pode-se então expressar a concentração de flúor na água tratada do exemplo dado como: 0,6 mg de flúor/kg de água tratada ou 0,6 g de flúor/t de água tratada ou ainda, como foi visto, 0,6 ppm. Sistema Internacional No Sistema Internacional de Unidades, a escrita de números muito pequenos ou muito grandes é feita com o auxílio dos prefixos previstos naquele sistema, conforme a tabela a seguir. Tabela 4 – Prefixos do Sistema Internacional Prefixo Símbolo Multiplique a unidade por: Prefixo Símbolo Multiplique a unidade por: deca da 101 deci d 10− 1 hecto h 102 centi c 10− 2 kilo k 103 mili m 10− 3 mega M 106 micro µ 10− 6 giga G 109 nano n 10− 9 tera T 1012 pico p 10− 12 peta P 1015 femto f 10− 15 exa E 1018 atto a 10 − 18 zetta Z 1021 zepto z 10 − 21 yotta Y 1024 yocto y 10 − 24 Fonte: Sistema... (2012, p. 34). Exemplo de cálculo com as unidades especiais Considere que, ao ser ligado numa manhã fria, o motor de um automóvel jogue, por segundo, no ambiente 700 µmol de NO e 850 µmol de CO. Se a garagem onde se encontra o automóvel mede 8,5 x 5 x 3,2 m e o motor é mantido em funcionamento por 3,2 minutos, pergunta-se: a) Quais as concentrações dos poluentes em mg/m3 após 3,2 minutos de funcionamento ? b) Considere que as condições ambientais sejam as condições normais de temperatura e pressão (CNTP) e calcule as concentrações em ppm. 53 EN GC - R ev isã o: F ab ric ia - D ia gr am aç ão : F ab io - 2 2/ 11 /2 01 7 QUÍMICA APLICADA PARA ENGENHARIA CIVIL O número de mols de cada contaminante será obtido multiplicando-se as quantidades lançadas por segundo pelo tempo total de funcionamento do motor (192 s). Assim: nNO = 700 x 192 = 134.400 µmol nCO = 850 x 192 = 163.200 µmol Multiplicando-se as quantidades de mols pelas respectivas massas molares, obtêm-se as massas de cada contaminante. mNO = 134.400 x 30 = 4.032.000 µg ≡ 4.032 mg mCO = 163.200 x 28 = 4.569.600 µg ≡ 4.569,6 mg O volume da garagem representa o volume de ar e é dado por: V = 8,5 x 5 x 3,2 = 136 m3 Dividindo-se a massa de cada contaminante pelo volume da garagem, obtêm-se as concentrações de acordo com o solicitado no item (a). CNO = 4.032 136 ≅ 29,65 mg/m3 e CCO = 4.569,6 136 = 33,6 mg/m3 b) para calcular as concentrações em ppm, deve-se relacionar o volume de cada contaminante com o volume da garagem. Se as condições ambientais são as CNTP, o volume de cada contaminante pode ser obtido considerando-se que 1 mol de qualquer gás em CNTP ocupa 22,4 L. Assim, multiplicando-se o número de mols de cada contaminante por 22,4, obtém-se o volume em litros do contaminante. Portanto: vNO = 134.400 x 22,4 = 3.010.560 µL vCO = 163.200 x 22,4 = 3.655.680 µL Com o volume de cada contaminante em 136 m3 (136.000 L) de ar, a concentração em ppm será obtida conhecendo-se o volume de contaminante em 1.000.000 L de ar. Para o NO 3.010.560 x 10−6 L de NO em 136 x 103 L de ar Cppm em 10 6 L de ar 54 EN GC - R ev isã o: F ab ric ia - D ia gr am aç ão : F ab io - 2 2/ 11 /2 01 7 Unidade I Para o CO 3.655.680 x 10−6 L de NO em 136 x 103 L de ar Cppm em 10 6 L de ar CNO = (3.010.560 x 10 −6 x 106) / 136 x 103 ≅ 22,1 ppm CCO = (3.655.680 x 10 −6 x 106) / 136 x 103 ≅ 26,9 ppm Resumo Atualmente, a maior parte das fontes de água doce encontra-se imprópria para o consumo, gerando gastos maiores para torná-la potável. Comparando-se a disponibilidade de água doce com a quantidade existente nas geleiras e calotas polares, poderiam ser consideradas essas últimas como fontes alternativas para o uso pelo homem. Porém, a distância dos centros consumidores inviabiliza a exploração delas, pois o transporte torna o custo da água muito elevado. Da mesma forma, a extração de água do subsolo a grandes profundidades também é bastante onerosa. Em média, podemos considerar que uma pessoa consome 2 litros de água por dia. Nos países desenvolvidos, esse consumo pode atingir 300 litros por dia, incluindo consumo para higiene. Por dia, podemos estimar que uma pessoa utilize, aproximadamente, 8 litros para cozinhar e beber, 120 litros para limpeza (lavagem de roupas, limpeza da casa), 80 litros para descarga no banheiro e outros 80 litros para os jardins. Em 20 anos, nas contas da ONU, 4 bilhões de pessoas não terão acesso a água em quantidade suficiente para a sobrevivência e boa parte da população estará sem água potável. Dados da Organização Mundial da Saúde mostram cerca de 7 milhões de mortes por ano provocadas pela falta de saneamento ou pelo consumo de água contaminada. A Resolução nº 20 do Conselho Nacional do Meio Ambiente, de 1986, dispõe sobre a classificação das águas doces, salobras e salinas do território nacional. Foi alterada pela Resolução nº 274, de 2000, e revogada pela Resolução nº 357, de 2005, que dispõe sobre a classificação dos corpos de água e diretrizes ambientais para o seu enquadramento, bem como estabelece as condições e padrões de lançamento de efluentes, e dá outras providências. Esta, por sua vez, foi alterada pelas Resoluções nº 410/2009 e nº 430/2011, que dispõem sobre as condições e padrões 55 EN GC - R ev isã o: F ab ric ia - D ia gr am aç ão : F ab io - 2 2/ 11 /2 01 7 QUÍMICA APLICADA PARA ENGENHARIA CIVIL de lançamento de efluentes. As águas salinas, salobras e doces são classificadas, de acordo com a qualidade necessária para seus usos, em 13 classes de qualidade. O tratamento de água envolve processos químicos e físicos e ocorre em etapas. A adição de produtos químicos pode auxiliar na remoção de partículas em suspensão, para tornar a água potável. As etapas do tratamento de água são: filtração, coagulação e floculação, flotação, filtração e desinfecção. Várias etapas podem ser adicionadas dependendo das substâncias presentes na água a ser tratada. Exercícios Questão 1. (Enem 2003) Considerando a riqueza dos recursos hídricos brasileiros, uma grave crise de água em nosso país poderia ser motivada por: A) Reduzida área de solos agricultáveis. B) Ausência de reservas de águas subterrâneas. C) Escassez de rios e de grandes bacias hidrográficas. D) Falta de tecnologia para retirar o sal da água do mar. E) Degradação dos mananciais e desperdício no consumo. Resposta correta: alternativa E. Análise das alternativas A) Alternativa incorreta. Justificativa: a redução de áreas agricultáveis não irá interferir na disponibilidade de água no País. B) Alternativa incorreta. Justificativa: as águas subterrâneas não se esgotarão, pois elas são parte do ciclo natural das águas. C) Alternativa incorreta. Justificativa: as grandes bacias hidrográficas e os maiores rios não serão escassos, porque a quantidade de água existente nesses cursos d’água é enorme, podendo haver a redução de seu volume. 56 EN GC - R ev isã o: F ab ric ia - D ia gr am aç ão : F ab io - 2 2/ 11 /2 01 7 Unidade I D) Alternativa incorreta. Justificativa: o País possui muitas reservas de água doce. Portanto,não há necessidade de dessalinizar a água do mar. E) Alternativa correta. Justificativa: uma crise de água em território brasileiro pode ser desencadeada pela intensa degradação dos mananciais, diminuindo seu volume e comprometendo a sua qualidade. Outro aspecto que pode contribuir para esse fato é o desperdício, pois o uso exagerado e desnecessário desse recurso natural tem como consequência uma diminuição no volume dos cursos d’água. Questão 2. (UTFPR 2008) A água apresenta inúmeras propriedades que são fundamentais para os seres vivos. Qual, entre as características a seguir relacionadas, é uma propriedade da água de importância fundamental para os sistemas biológicos? A) Possui baixo calor específico, pois sua temperatura varia com muita facilidade. B) Suas moléculas são formadas por hidrogênios de disposição espacial linear. C) Seu ponto de ebulição é entre 0 e 100 °C. D) É um solvente limitado, pois não é capaz de se misturar com muitas substâncias. E) Possui alta capacidade térmica e é solvente de muitas substâncias. Resolução desta questão na plataforma.