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UNIVERSIDADE FEDERAL DO ESTADO DE RIO GRANDE DO NORTE - UFRN FACULDADE DE CIÊNCIAS DA SAÚDE DO TRAIRÍ - FACISA Disciplina: Psicopatologia Especial Docente: Ramon Jose Ayres Souza Discente: Erika Nayane Martins Marinho ESTUDO DIRIGIDO - UNIDADE II 1. Qual a relação entre o trabalho do sonho e o mecanismo de recalque? A definição freudiana do sonho como realização de um desejo está intrinsecamente ligada ao conceito de recalque. O recalque, conforme identificado nos estudos sobre histeria, envolve a repressão de eventos traumáticos e afetos não expressos. O que é reprimido ou recalque gera sintomas, e a análise de Freud busca a origem desse trauma, explorando a relação entre o recalque e os sintomas. A expressão dos desejos reprimidos ocorre nos sonhos, onde o desejo retorna do inconsciente para a consciência, tornando-se a realização do desejo. No entanto, esse retorno não é direto, uma vez que os desejos ressurgem de maneira disfarçada ou mesclada. Esse movimento entre recalcar algo e expressá-lo, chamado de retorno do recalcado, é resultado de uma negociação entre forças psíquicas, como a censura e o impulso de expressar o desejo. A relação entre sonho e sintoma é destacada, pois ambos representam expressões do que foi recalcado. Ambos são considerados retornos do recalcado, envolvendo um jogo ou negociação entre forças psíquicas. Os sonhos, compostos por restos diurnos e representações, são articulados pelo impulso de realizar um desejo. A interpretação dos sonhos como método analítico envolve analisar o conteúdo manifesto dos sonhos, a narrativa do analisando sobre o sonho. Esse esforço narrativo, chamado de elaboração secundária por Freud, busca estabelecer coerência, ordem e sequência lógica para o sonho, que, por natureza, é incongruente e sem lógica. A análise visa desvelar o conteúdo latente dos sonhos, os pensamentos oníricos reprimidos. O trabalho do sonho, que ocorre na passagem do latente para o manifesto, é caracterizado por mecanismos como condensação e deslocamento. A condensação comprime elementos sonhados, enquanto o deslocamento transfere representações de um contexto para outro. Esses mecanismos são cruciais para entender a formação do sonho e para desvendar o conteúdo latente. Em última análise, a análise freudiana dos sonhos destaca o conflito como um elemento estrutural fundamental, evidenciado pelas forças e direções contrárias presentes nas operações de defesa e resistência. Freud esmiúça essa estrutura intrincada na busca pelo significado subjacente aos sonhos e pelo acesso ao recalcado. Essa abordagem engloba uma espécie de "engenharia reversa" psíquica, revelando camadas de resistências e conflitos. 2. Por que afirmar que o território do trauma é “ao redor do irrepresentável”? A expressão "ao redor do irrepresentável" ao descrever o território do trauma aponta para a complexidade inerente a esse fenômeno, sugerindo que o trauma é uma experiência difícil de ser completamente compreendida ou comunicada. Esse entendimento é construído a partir da consideração de vários aspectos abordados por pensadores como Walter Benjamin, Cathy Caruth e Giorgio Agamben. O trauma, ao longo do século XX, foi central na compreensão da experiência humana na modernidade. Walter Benjamin, ao retomar a imagem freudiana do soldado pós-Primeira Guerra Mundial, ilustrou o desafio de representar o trauma. O soldado, apesar de vivenciar experiências traumáticas, era incapaz de nomeá-las, evidenciando a dificuldade inerente em expressar o que foi vivido. Cathy Caruth, renomada teórica cultural do trauma, caracterizou o fenômeno como uma "experiência paradoxal". Quanto mais intensa e violenta, mais complexa se torna a sua compreensão. A intensidade excessiva do trauma não permite uma expressão fácil, calcinando o sentido e desafiando a narrativa convencional. A aporia do trauma, destacada por Giorgio Agamben, ressalta as dificuldades fundamentais na representação do traumático. A "não coincidência entre fatos e verdade" indica uma crise na verdade quando se trata de expressar plenamente a experiência traumática. Essa dificuldade tem repercussões nas esferas social, política e cultural. A natureza anti narrativa do trauma também é enfatizada. Enquanto a cultura busca enquadrar e explicar o trauma, este resiste a ser contido em uma narrativa linear. A narrativa do trauma, paradoxalmente, traz a singularidade do traumático e desafia a organização convencional de eventos. Assim, a afirmação de que o território do trauma está "ao redor do irrepresentável" destaca a intrínseca incapacidade de traduzir completamente o trauma em linguagem ou símbolos. O trauma não é apenas um acontecimento do passado a ser superado, mas é, para além disso, uma experiência presente em constante reconstrução. A psicanálise, ao explorar as zonas irrepresentáveis e silenciadas, desempenha um papel crucial na compreensão e enfrentamento desse fenômeno, contribuindo para a criação de um novo laço social e para a reconstrução contínua da memória. Isso permite que as vozes e experiências marcadas pelo excesso traumático sejam incorporadas e compreendidas de maneira mais abrangente. 3. Explique as duas teorias freudianas da angústia. A primeira teoria de Freud sobre a angústia está associada aos primeiros escritos freudianos sobre a clínica, especialmente no contexto das neuroses de angústia. Nessa perspectiva, a angústia é articulada à discussão sobre as neuroses de angústia e está ligada ao conceito de sexualidade. Para Freud, a sexualidade é central na estruturação do psiquismo, e o princípio de prazer-desprazer é fundamental. Ele destaca que o ser humano, movido pelo princípio de prazer, adia o prazer em função das circunstâncias da vida. A ideia de que o objeto de prazer é impossível implica que a satisfação nunca é absoluta, deixando sempre um "resto" mobilizador do sujeito. Na perspectiva freudiana, o ser humano deve vivenciar a perda do objeto para construir uma vida com uma marca própria. Suportar a perda é também suportar a falta do objeto, experimentando a angústia de castração. Assim, a primeira teoria de Freud associa as neuroses de angústia a questões sexuais, como o uso de técnicas contraceptivas, e destaca a deflexão da excitação sexual somática da esfera psíquica. Nas neuroses de angústia, a angústia é resultado de um processo quase exclusivamente somático, no qual a libido não é satisfeita nem empregada, ocorrendo um curto-circuito. No entanto, Freud em seguida reformula sua teoria da angústia em "Inibições, sintomas e angústia" (1926), onde a angústia é associada ao desamparo, uma condição primária do ser humano. Nessa perspectiva, a angústia é definida como um estado afetivo com um caráter acentuado de desprazer, liberado como um sinal para preparar o ego e evitar o reviver de situações traumáticas. Freud destaca a função econômica da angústia, relacionada à quantidade de excitação presente na mente, mas enfatiza que não é uma simples razão proporcional direta. Ele considera o aumento ou a diminuição da quantidade de excitação ao longo do tempo como determinante para a sensação de prazer ou desprazer. Ademais, Freud conclui que é a atitude de angústia do ego que aciona os mecanismos de defesa. A angústia não surge novamente no recalque, mas é reproduzida como um estado afetivo de conformidade com uma imagem mnêmica (se relaciona à memória e às representações mentais) preexistente. As experiências traumáticas originárias, que servem como protótipo para a experiência da angústia, ocorrem antes da constituição do complexo de Édipo, por volta dos três ou quatro anos de vida. Destarte, a primeira teoria de Freud associa a angústia a questões sexuais, especialmente nas neuroses de angústia, enquanto a segunda teoria a relaciona ao desamparo e à função econômica da quantidade de excitação. 4. Como você compreende a relação entre defesa e sintoma? Na psicanálise, a relação entre defesa e sintoma é fundamental para compreendero funcionamento do psiquismo. A defesa, conforme definida por Sigmund Freud, refere-se ao conjunto de manifestações de proteção do eu contra agressões internas (de ordem pulsional) e externas, que podem constituir fontes de excitação e desprazer. Essas defesas têm como objetivo evitar o enfrentamento direto com conteúdos psíquicos perturbadores. O sintoma, por sua vez, pode ser entendido como uma expressão visível ou manifesta de conflitos internos, muitas vezes ligados a experiências passadas e à dinâmica entre o consciente e o inconsciente. O sintoma é uma espécie de compromisso entre forças psíquicas em conflito, representando uma solução simbólica para lidar com esses conflitos. A relação entre defesa e sintoma se dá de modo em que as defesas são mecanismos utilizados pelo eu para evitar a consciência de desejos, pensamentos ou lembranças que seriam angustiantes. Esses conteúdos recalcados, no entanto, não desaparecem; em vez disso, eles podem se manifestar de maneiras simbólicas nos sintomas. Se uma pessoa tem um desejo inconsciente que é considerado socialmente inaceitável, o eu pode empregar mecanismos de defesa, como o recalque, para manter esse desejo fora da consciência. No entanto, esse desejo pode se manifestar de forma disfarçada em sintomas, como ansiedade, comportamentos obsessivos ou fobias. Em conclusão, a relação entre defesa e sintoma na psicanálise envolve o uso de mecanismos de defesa para lidar com conteúdos psíquicos perturbadores, enquanto os sintomas representam formas simbólicas desses conteúdos que conseguem encontrar expressão no consciente, apesar dos esforços defensivos. REFERÊNCIAS: Leite, S. (2011). Freud e as duas teorias de angústia. In Angústia (pp. 29-39). Rio de Janeiro: Zahar. Perrone, C., & Gallo de Moraes, E. (2014). Do trauma ao testemunho: caminho possível de subjetivação. In Clínicas do Testemunho. Reparação psíquica e Construção de Memórias (pp. 31-45). Porto Alegre: Editora Criação Humana. Garcia-Roza, L. A. (2009). O discurso do desejo: A interpretação de sonhos. In Freud e o inconsciente (Capítulo III, pp. 61-88). Rio de Janeiro: Editora Zahar.
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