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AS RAZÕES DA GUERRA DE CLAUSEWITZ E A GUERRA DE INDEPENDÊNCIA ANGOLANA TRI2 YANNICK EMANUEL CAMENHA MATIAS DRE 121154205 RESUMO O presente texto tem como finalidade fazer uma aproximação da teoria sobre a guerra de Von Clausewitz e a guerra de independência angolana de 75. É sabido que como membro do sul global, o país geralmente não tem certo enfoque acadêmico nas questões que o permeiam. Também, dentro do estudo das relações internacionais, é de certa forma difícil, criar-se uma aproximação entre acontecimentos em países africanos e as teorias e linhas de pensamento clássicas da matéria, visto que, essas teorias foram criadas em contexto e necessidades em que, preocupam-se apenas em explicar o acontecimentos desse período do seu surgimento. O texto preocupa-se basicamente em introduzir ao leitor o pensamento de Clausewitz referente à guerra e suas motivações, para posteriormente, explicar o contexto histórico do conflito em questão e por fim, tentar explicar tais acontecimentos sob a ótica desse autor escolhido. Para a conclusão, é deixado um questionamento que está mais ligado à adoção dessas premissas europeias para explicar acontecimentos africanos, sobre quais seriam as interpretações referentes às consequências desse primeiro conflito. SUMMARY This text aims to approach the theory of war by Von Clausewitz and the Angolan independence war of 75. It is known that as a member of the global south, the country generally lacks academic focus on the issues that surround it. Additionally, within the study of international relations, it is somewhat challenging to draw a connection between events in African countries and the classic theories and lines of thought in the field, given that these theories were created in contexts and needs that only concern explaining the events of their time. The text primarily seeks to introduce Clausewitz's thoughts on war and its motivations to the reader, and subsequently to explain the historical context of the conflict in question, and finally to attempt to explain these events from the perspective of this chosen author. In conclusion, a question is posed regarding the adoption of these European premises to explain African events, and what interpretations would be related to the consequences of this initial conflict. INTRODUÇÃO As guerras são, provavelmente, uma das tradições mais antigas na história da humanidade.Por diversas vezes, os homens entraram em conflito contra outros da mesma espécie, seja por disputas territoriais, por recursos, motivos religiosos ou até mesmo por pura dominação política. Durante os períodos mais intensos da modernidade humana, alguns estudiosos destacaram-se pela contribuição com estudos sobre a guerra e estratégia militar, tornando-se cânones no assunto e servindo de referência para estadistas e estrategistas por anos. Este é o caso de Carl Von Clausewitz. Carl Phillip Gottlieb von Clausewitz foi um militar do Reino da Prússia que ocupou o posto de general e é considerado um grande estrategista militar e teórico da guerra por sua obra Da Guerra. Neste ensaio, iremos explorar detalhadamente o conceito de razões da guerra para Clausewitz, examinando suas principais ideias e contribuições para a compreensão do fenômeno da guerra. Também, iremos explorar detalhadamente os principais acontecimentos, causas e consequências da Guerra de Independência de Angola, e analisá-los sob a ótica desses conceitos trazidos à luz por Clausewitz. CONTEXTO HISTÓRICO A guerra de independência angolana A Guerra de Independência de Angola foi um conflito armado que ocorreu entre 1961 e 1975, e teve como principal objetivo a libertação do domínio colonial português sobre o território angolano. Este processo de independência foi marcado por uma série de eventos e confrontos que resultaram em grandes perdas humanas e danos materiais. A luta pela independência de Angola teve suas raízes no período colonial, quando o país era uma colônia portuguesa e estava sujeito a um sistema de exploração e opressão por parte dos colonizadores. A população angolana, que era composta por diferentes grupos étnicos e culturais, começou a se organizar e a resistir contra a dominação portuguesa. Este movimento de resistência ganhou força com a formação de movimentos independentistas, como o MPLA (Movimento Popular de Libertação de Angola), a FNLA (Frente Nacional de Libertação de Angola) e a UNITA (União Nacional para a Independência Total de Angola), que tinham como objetivo comum a libertação do país do domínio colonial. O fim da ditadura de Salazar em Portugal teve um impacto significativo na independência de Angola. A ditadura de Salazar durou 41 anos, de 1932 a 1974, e teve um efeito profundo na política portuguesa. Durante esse período, Portugal governou Angola com mão de ferro, mantendo o país como uma colônia e reprimindo brutalmente qualquer tentativa de independência. No entanto, a partir da década de 1960, a pressão internacional começou a aumentar sobre Portugal para que concedesse a independência às suas colônias africanas. O movimento de independência em Angola ganhou força, liderado pelo MPLA (Movimento Popular de Libertação de Angola), UNITA (União Nacional para a Independência Total de Angola) e FNLA (Frente Nacional de Libertação de Angola). A ditadura de Salazar, no entanto, não cedeu facilmente. O regime português continuou a lutar ferozmente contra as forças independentistas em Angola, usando todos os meios necessários para manter o controle sobre a colônia. No entanto, a situação começou a mudar em 1974, quando ocorreu a Revolução dos Cravos em Portugal. O início da Guerra de Independência de Angola pode ser datado de 4 de fevereiro de 1961, quando ocorreu o massacre de manifestantes em Luanda, capital do país, por forças portuguesas. Este evento marcou o início de uma série de confrontos armados entre os movimentos independentistas e as forças coloniais portuguesas. A guerra se estendeu por mais de uma década, e foi marcada por intensos combates, massacres, deslocamentos em massa da população e violações dos direitos humanos. Durante a guerra, os movimentos independentistas receberam apoio de outros países africanos que também lutavam pela independência, como a República Democrática do Congo e a Zâmbia, bem como de potências estrangeiras, como a União Soviética e os Estados Unidos, que viam Angola como um campo de batalha na Guerra Fria. Este apoio externo contribuiu para a continuidade do conflito e para a internacionalização da guerra. A Guerra de Independência de Angola chegou ao fim em 1975, com a assinatura dos Acordos de Alvor, que estabeleceram o processo de transição para a independência do país. No entanto, a independência de Angola foi seguida por uma nova fase de conflitos, desta vez entre os movimentos independentistas, que disputavam o controle do país. Este período de instabilidade culminou na Guerra Civil Angolana, que durou até 2002 e teve um impacto devastador na população e na infraestrutura do país. As consequências da Guerra de Independência de Angola foram profundas e duradouras. O conflito deixou um legado de divisões étnicas e políticas, que ainda afetam a sociedade angolana até os dias de hoje. Além disso, a guerra resultou em um grande número de mortes, deslocamentos forçados e destruição, que teve um impacto significativo no desenvolvimento do país. A Guerra de Independência de Angola também teve repercussões a nível internacional, contribuindo para redefinir as relações de poder no continente africano e para influenciar a dinâmica da Guerra Fria. AS RAZÕES DA GUERRA DE CLAUSEWITZ E A GUERRA ANGOLANA A obra de Carl von Clausewitz, intitulada "Da Guerra", é uma das mais importantes e influentes no campo da teoria militar. Nesta obra, Clausewitz desenvolve um conceito abrangente e profundo das razões que levam à guerra, analisando as motivações individuais e coletivas, bem como os fatores políticos, econômicos e sociais que contribuem para a eclosão de conflitos armados. Para Clausewitz, as razões da guerrasão múltiplas e complexas, envolvendo uma combinação de fatores emocionais, racionais e estratégicos. Em primeiro lugar, Clausewitz destaca a importância das paixões humanas na geração de conflitos armados. Ele argumenta que o desejo de poder, a ambição, o orgulho e o medo são motivos poderosos que levam os indivíduos e as nações a recorrer à guerra. Além disso, Clausewitz reconhece a influência da natureza humana na formação das razões da guerra, observando que a agressividade, a competitividade e a busca por segurança são impulsos fundamentais que impulsionam os seres humanos em direção ao conflito armado. No entanto, Clausewitz também enfatiza que as razões da guerra não são apenas emocionais, mas também racionais. Ele argumenta que as decisões de guerra são tomadas com base em cálculos de custo-benefício, avaliações de risco e oportunidade, e considerações estratégicas e táticas. Para Clausewitz, a racionalidade está presente tanto nos líderes políticos e militares que tomam as decisões de guerra, quanto nos cidadãos e soldados que participam do conflito. Ele destaca que a busca por objetivos políticos, territoriais, econômicos e ideológicos é uma das principais razões racionais que levam à guerra, e que as nações estão dispostas a recorrer à violência quando percebem que seus interesses vitais estão em jogo. Além das motivações individuais e racionais, Clausewitz também examina as razões estratégicas e estruturais que contribuem para a eclosão de guerras. Ele observa que as relações de poder entre as nações, a competição por recursos escassos, as rivalidades geopolíticas e as alianças e coalizões entre os Estados desempenham um papel crucial na determinação das razões da guerra. Clausewitz argumenta que a luta pelo equilíbrio de poder e pela supremacia regional ou global é um dos principais motivos dos conflitos armados, e que as nações estão dispostas a recorrer à guerra para proteger seus interesses estratégicos e preservar sua segurança e soberania. Sua análise das razões da guerra oferece insights valiosos para a compreensão do fenômeno da guerra, destacando a interação complexa entre fatores humanos, políticos, econômicos e estratégicos na geração de conflitos armados. Ao examinar as razões da guerra, Clausewitz nos convida a refletir sobre a natureza humana, as dinâmicas do poder e as complexidades das relações internacionais, e a buscar formas de prevenir e resolver os conflitos armados de maneira mais eficaz e pacífica. Segundo Clausewitz, a guerra é a continuação da política por outros meios. Neste sentido, as razões da Guerra de Independência de Angola podem ser compreendidas a partir de uma análise das relações políticas e sociais que permeavam o contexto colonial angolano. A dominação portuguesa sobre Angola era baseada em relações desiguais e opressivas, que resultavam em exploração econômica e marginalização social da população nativa. Esta dinâmica de opressão e subjugação política pode ser entendida como a falha do sistema político em alcançar seus objetivos por meios pacíficos, o que, segundo Clausewitz, pode levar à guerra. Além disso, Clausewitz argumenta que a guerra é um instrumento político que visa atingir objetivos específicos, como a conquista de território, a garantia de recursos naturais ou a afirmação de identidade nacional. No caso da Guerra de Independência de Angola, a luta armada foi motivada pela busca da autodeterminação e da independência do jugo colonial português. A população angolana, privada de seus direitos políticos e econômicos, viu na guerra a única forma de alcançar a liberdade e a soberania sobre seu próprio território. Outro aspecto relevante da teoria de Clausewitz é a noção de que a guerra é um fenômeno complexo, influenciado por uma multiplicidade de fatores políticos, sociais, econômicos e culturais. No caso da Guerra de Independência de Angola, a complexidade do conflito pode ser atribuída à presença de atores internacionais, como potências estrangeiras interessadas na descolonização da África e movimentos de libertação nacional que buscavam apoio externo para sua causa. Esta rede de relações internacionais contribuiu para a intensificação e prolongamento do conflito, evidenciando a interconexão entre política e guerra, conforme proposto por Clausewitz. CONCLUSÃO Em suma, sobre as motivações da guerra serem emocionais ou mais racionais, é possível visualizar no conflito angolano, que existe a presença dos dois fatores. Por um lado, os angolanos propuseram-se a lutar pela independência do país motivados por um nacionalismo e por certo amor à pátria. Na perspectiva mais racional e análise de custo-benefício, o entendimento do momento político vivido pelo opressor também encorajou-os a tomarem a frente do combate rumo à libertação da exploração colonial. Apesar disso, o conflito interno que sucedeu a libertação colonial, e durou mais de 8 anos, leva-nos a questionar se, após a internalização de tais premissas, houve uma ‘inflação’ desse amor à pátria, levando grupos outrora parceiros de combate à digladiarem-se em razão do poder político, e se, esqueceu-se da análise racionalista, não levando em consideração que guerras por norma, geram mais prejuízos e instabilidade interna do que o quadro oposto. De certo que, pela lógica Clausewitziana, a guerra de independência angolana deu-se dentro dos ‘padrões’ descritos pelo autor, mas é necessário questionar-se se, esta mesma lógica não produz efeitos nocivos a médio e longo prazo. REFERÊNCIAS CLAUSEWITZ, Carl Von. Da Guerra. (Livro 1, Capítulo 1). PEREIRA, José Maria. O paradoxo Angolano. Uma política em contexto de crise BARBOSA, Mariana Oliveira. Revolução dos Cravos. História do mundo. Disponível em: https://www.historiadomundo.com.br/idade-contemporanea/revolucao-dos-cravos.htm ALTMAN, Max . Hoje na História: 1975 - MPLA proclama a independência de Angola . Opera Mundi . Nov 2020. Disponível em: https://operamundi.uol.com.br/hoje-na-historia/7513/hoje-na-historia-1975-mpla-proclama-a- independencia-de-angola
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