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Com Sérgio Nogueira, o professor do Soletrando. 2 uso das palavras Licensed to Alessandra Leite da Silva - ale_ls@live.com Apresentação Quer simplificar o português, aprender com mais prazer e acabar com suas dúvidas? Este e-book trata do emprego correto de palavras e expressões pa- recidas e de falsos sinônimos, além de explicar por que devemos evitar modismos linguísticos. As videoaulas ampliam o conteúdo do livro digital, discutem as dú- vidas mais comuns e apresentam exemplos práticos para você enrique- cer seu conhecimento. É assim que o professor Sérgio Nogueira retoma os temas mais im- portantes e mais cobrados em provas de concursos e vestibulares, para que você possa (re)aprender sem dificuldades e sem traumas. Tudo com a experiência de quem há mais de 40 anos aproxima os brasileiros da língua portuguesa. Bom proveito! Licensed to Alessandra Leite da Silva - ale_ls@live.com Sumário Dúvidas? Todos temos! ................................................................. 4 Assim ou assado? ............................................................................. 6 Assim não é assado ......................................................................26 Modismos que de nada servem ............................................36 Licensed to Alessandra Leite da Silva - ale_ls@live.com Dúvidas? Todos temos! 4 Licensed to Alessandra Leite da Silva - ale_ls@live.com É verdade! Todos nós temos dúvidas. Dúvidas que vão além da grafia correta de uma palavra. Quantas vezes já não nos perguntamos não só sobre o jeito correto de escrever, mas também sobre a forma mais ade- quada de compartilhar um pensamento, uma ideia, uma informação? Conhecer as várias possibilidades que a língua oferece para se comu- nicar é indispensável para que você consiga escolher a que melhor aten- da às suas necessidades. Aqui pretendemos analisar alguns casos que frequentemente nos atormentam e às vezes nos perseguem. Alguns são problemas de grafia mesmo. Outros surgem na escolha, entre palavras sinônimas, do termo mais adequado para transmitir a informação desejada. Temos de enfren- tar – e isso requer certa dose de coragem – os modismos linguísticos e os jargões que ocupam cada vez mais espaço em nosso universo lexical. Não pense que sou apegado ao que é velho e ultrapassado e avesso ao que é novo e moderno. A questão é que, quando pretendemos tra- balhar com a língua culta, temos de respeitar as normas e as tradições linguísticas. Acredito que a língua, como a roupa que usamos, deve estar ade- quada à situação em que será inserida. Assim, do mesmo jeito que de- terminadas ocasiões exigem uma roupa mais formal e outras, uma rou- pa mais descontraída, algumas circunstâncias também podem exigir uma linguagem mais formal ou mais coloquial. Devemos, portanto, saber não só reconhecer o que cada momento exige, mas também adequar corretamente os diferentes níveis de lin- guagem às diversas situações de comunicação. 5 Licensed to Alessandra Leite da Silva - ale_ls@live.com Assim ou assado? 6 Licensed to Alessandra Leite da Silva - ale_ls@live.com Quantas vezes você já não se perguntou: Então, qual a forma correta? Escrevo junto ou separado? Esse substantivo é feminino ou masculino? Às vezes, questões simples podem gerar muitos problemas. Tentei listar aqui as dúvidas mais comuns que nos perseguem quan- do precisamos redigir um texto, principalmente em situações formais. Vamos a elas. A MORAL do jogador estava BAIXA ou O MORAL do jogador estava BAIXO? Não é raro uma palavra mudar de sentido ao trocar de gênero. É o que acontece, por exemplo, com o substantivo “capital”. Quando dize- mos “a capital”, estamos nos referindo a uma cidade sede de um país ou de um estado: Brasília é a capital do Brasil. Vitória é a capital do Espírito Santo. No entanto, a mesma palavra no gênero masculino, “o capital”, tem o sentido de “riqueza”, “patrimônio”: Os acionistas estão preocupados com o capital da empresa. Esta é uma companhia de capital aberto. Isso é o que acontece com a palavra “moral”. Quando empregamos o feminino “a moral”, estamos nos referindo a um conjunto de valores ou princípios que rege a conduta das pessoas em uma sociedade: 7 Licensed to Alessandra Leite da Silva - ale_ls@live.com Nesta escola, exige-se o respeito à moral e aos bons costumes. Ele não tinha a menor moral para repreender o cunhado. Já o substantivo masculino “o moral” significa “ânimo”, “disposição de espírito para realizar alguma tarefa”. Assim, se nos referimos à falta de vigor do atleta para enfrentar alguma situação adversa, devemos dizer que “O moral do jogador estava baixo”, pois, certamente, o que faltava a ele era ânimo, disposição. Veja mais exemplos: Elogios sempre elevam nosso moral. O moral da turma veio abaixo com a desclassificação. ACERCA DE sua vida, sei que ele voltou HÁ CERCA DE dois anos e mora A CERCA DE dois quilômetros daqui. Perceba que as expressões destacadas na frase acima, embora te- nham exatamente o mesmo som, têm significados muito diferentes. Aí que mora o perigo, pois, como falamos rigorosamente do mesmo jeito, na hora de escrever podemos nos confundir com a grafia correta de cada uma. Vamos, então, ver o significado dessas expressões. A locução prepositiva “acerca de” tem o mesmo sentido de “sobre”, “a respeito de”: Não declarou nada acerca de seus planos. Eles só discutem acerca de futebol. 8 Licensed to Alessandra Leite da Silva - ale_ls@live.com Escrita com o verbo “haver”, a expressão “há cerca de” pode in- dicar tempo transcorrido e, nes- se caso, é possível substituí-la por “faz aproximadamente”: Há cerca de dois dias ele partiu. Não nos vemos há cerca de cinco anos. O verbo “haver” pode ser uti- lizado também para indicar a existência de algo e, quando isso acontece, ele aceita ser substituí- do pelo verbo “existir”: Há cerca de duas mil pessoas esperando o benefício da aposentadoria. Já a expressão “a cerca de” significa “aproximadamente”, “mais ou menos” e deve ser utilizada em referência a distâncias ou tempo futuro: O estádio fica a cerca de duzentos metros da sede do clube. Só nos veremos novamente daqui a cerca de dois meses. Há ainda a expressão “cerca de”, que também significa “mais ou menos”, “aproximadamente” e é empregada para se referir a números, valores aproximados: Cerca de 300 atletas têm bons patrocínios. 9 Licensed to Alessandra Leite da Silva - ale_ls@live.com A PRESIDENTE ou A PRESIDENTA declarou feriado nacional? Tanto faz. Você pode dizer “a presidente” ou “a presidenta”. Embora corram pela internet alguns comentários descaracterizando a forma fe- minina “presidenta”, ela existe. Já consta, inclusive, dos nossos melhores dicionários. Formar o feminino com o acréscimo da desinência “a” é a tendência natural da língua portuguesa. Dizemos o professor/a professora, o pin- tor/a pintora, o francês/a francesa. Mas há também algumas palavras que apresentam uma única forma para os dois gêneros, como o artis- ta/a artista, o dentista/a dentista, o atleta/a atleta. Já o substantivo “presidente” pertence a outra categoria. Ele faz parte do grupo das palavras que aceitam as duas possibilidades, como: o chefe/a chefe ou o chefe/a chefa; o parente/a parente ou o parente/a parenta; o presidente/a presidente ou o presidente/a presidenta. De acordo com a tradição da língua portuguesa e a fala da maioria dos brasileiros, a forma mais recomendável é a presidente. À MEDIDA QUE ou NA MEDIDA EM QUE o tempo passava, a saudade diminuía? O correto é “à medida que”, locução que exprime ideia de propor- ção. Podemos substituí-la por “à proporção que”, “ao mesmo tempo que”, “conforme”. À medida que o sol nasce, os medos desaparecem. Minha paciência diminui à medida que envelheço. 10 Licensed to Alessandra Leite da Silva - ale_ls@live.com A locução “na medida em que” envolve ideiade causa e pode ser substituída por “já que”, “uma vez que”, “porque”: Na medida em que não cabia mais recurso, o advogado abandonou o caso. Na medida em que não havia provas marcadas, os estudantes relaxaram e foram passear. CUIDADO! A forma “à medida em que” não existe. Essa redação foi MAIS BEM corrigida ou MELHOR corrigida? É muito comum as pessoas acharem que a expressão “mais bem” não deve ser utilizada. Acreditam que devemos sempre substituí-la pelo ter- mo “melhor”. Isso não é verdade. Antes de verbos no particípio (aqueles que geralmente terminam em -ado e -ido), o correto é empregar “mais bem” no lugar de “melhor”. Devemos, assim, dizer: Essa redação foi mais bem corrigida. Nesta semana, a roupa foi mais bem lavada. Aquele é o atleta mais bem pago do time. 11 Licensed to Alessandra Leite da Silva - ale_ls@live.com A mesma regra deve ser aplicada para a dupla “mais mal” e “pior”. Assim, antes de particípio, utilize “mais mal”: O carro de Marcelinho foi o mais mal colocado na corrida. Aquela moça é a mais mal paga do escritório. Essa confusão também se dá quando devemos escolher entre as formas analíticas – “mais bom”, “mais mau”, “mais grande” e “mais pe- queno” – e as formas sintéticas – “melhor”, “pior”, “maior” e “menor”. Utilize as formas analíticas quando se tratar de uma comparação entre duas qualidades de um mesmo ser: A casa é mais grande que pequena. Embora esse cão tenha te mordido, acho que ele é mais bom do que mau. Se for uma comparação entre qualidades de dois seres, empregue a forma sintética: Minha casa é maior que a casa da minha mãe. Esse aluno novo é melhor do que aquele que saiu. 12 Licensed to Alessandra Leite da Silva - ale_ls@live.com HAVIA ou HAVIAM muitas dúvidas na prova? O correto é: “Havia muitas dúvidas na prova”. O verbo “haver” no sentido de “existir” é impessoal, não tem sujeito. Portanto, deve ficar fixo na terceira pessoa do singular. Houve muitas injustiças no seu processo. Há crianças que choram sem razão aparente. O verbo “haver” também é impessoal quando tem o sentido de “acontecer”. Houve vários acidentes no feriado. Havia discussões por causa da distribuição de água potável. Na indicação de tempo transcorrido, o verbo “haver” também deve ficar na terceira pessoa do singular. Nesse caso, ele pode ser substituí- do pelo verbo “fazer”. Há (Faz) dois dias que não o vejo. Havia (Fazia) bem uns dez anos que ele desejava mudar de emprego. Por ter esse sentido de tempo que passou, evite empregar a expres- são “Há muito tempo atrás”, pois se trata de uma redundância, já que temos aqui dois termos (“há” e “atrás”) indicando tempo transcorrido. Note que a redundância “Há... atrás” só ocorre com o verbo “haver”. Nin- guém diz “Faz muito tempo atrás” ou “Faz dez anos atrás”. Outra dúvida muito frequente é sobre o emprego da preposição “a” e da forma verbal “há”. Como já dissemos, “há” é uma forma do verbo “haver” e pode ser substituída por outros verbos, como “existir”, “acon- 13 Licensed to Alessandra Leite da Silva - ale_ls@live.com tecer”, “fazer”. Já a preposição “a” não pode ser substituída por um ver- bo e deve ser empregada para exprimir distância ou tempo futuro: Ele parte daqui a dois dias. A estação de trem fica a dois quilômetros do centro histórico. Suas ideias vão DE ENCONTRO ÀS minhas ou AO ENCONTRO DAS minhas? Nesse caso, depende do que se queira dizer. Se houver concordância entre as ideias, se elas forem na mesma direção, use a expressão “ao en- contro de”. Assim, quando dizemos que “As medidas do governo foram ao encontro dos anseios da população”, estamos afirmando que as medidas do governo foram favoráveis aos anseios da população. Entretanto, a expressão “de encontro a” exprime uma discordância, uma ideia contrária, que vai em sentido oposto, como “dar um encon- trão”. Dizemos, por exemplo, que um carro vai de encontro ao poste quando bate de frente nele. É, portanto, muito importante saber usar essas locuções. Imagine a confusão que podemos causar ao usar uma no lugar da outra! Veja al- guns exemplos de uso dessas expressões: > A FAVOR Suas ideias vão ao encontro das minhas. A decisão dos empresários foi ao encontro das reivindicações dos trabalhadores. Esse prêmio veio ao encontro das minhas necessidades. O rapaz foi ao encontro da noiva. 14 Licensed to Alessandra Leite da Silva - ale_ls@live.com > CONTRA Suas ideias vão de encontro às minhas. A decisão dos empresários foi de encontro às reivindicações dos trabalhadores. Essa chuva veio de encontro aos meus planos. O ônibus foi de encontro ao muro. Ele foi fazer compras em Miami AO INVÉS DE ou EM VEZ DE passear em Paris? Você deve ter muito cuidado ao usar a expressão “ao invés de”, pois como tem o sentido de “ao contrário de”, ela só deve ser empregada quando houver a ideia de oposição: Ao invés de subir, ele desceu. Ela riu ao invés de chorar. Ela partiu ao invés de ficar. Entrou à esquerda ao invés de entrar à direita. Perceba que em todos esses exem- plos há ideias contrárias: subir é o con- trário de descer; rir é o oposto de chorar; esquerda é o contrário de direita. Assim, o correto é “Ele foi fazer compras em Miami em vez de passear em Paris”, pois fazer compras em Mia- mi não é o contrário de passear em Pa- 15 Licensed to Alessandra Leite da Silva - ale_ls@live.com ris. Nesse caso, a ideia é de troca, de substituição. Em lugar (em vez) de fazer compras em Miami, ele foi passear em Paris. É importante observar que, embora haja restrições para o uso da expressão “ao invés de”, que só deve ser empregada com sentido de oposição, a expressão “em vez de” pode ser usada em qualquer situa- ção, até com o sentido de oposição. Assim, em caso de dúvida, opte pela expressão “em vez de”. Quero saber ONDE ou AONDE ele estacionou o carro? Antes de revelar a forma correta, gostaria de chamar a atenção para a obrigatoriedade de a palavra “onde” referir-se sempre a um lugar. Isso quer dizer que não podemos empregá-la se não houver a ideia de espa- ço físico. Não podemos, por exemplo, dizer: “Esse é o momento onde eu mudei de opinião”, pois em “momento” não existe a ideia de lugar, não se trata de um espaço físico. Da mesma forma, fuja de frases como: “Ele só escreve histórias onde o personagem principal morre no final”; “Todos criticam a sociedade brasi- leira, onde tudo é permitido”. Nesse caso, no lugar do “onde”, o correto é usar “em que” ou “no qual”. Diga ou es- creva: “Esse é o momento em que/no qual mudei de opinião”; “Esse é o relatório em que/no qual eu li sobre os problemas 16 Licensed to Alessandra Leite da Silva - ale_ls@live.com da empresa”; “Ele só escreve histórias em que/nas quais o persona- gem principal morre no final”; “Todos criticam a sociedade brasileira, em que tudo é permitido”. Vamos, agora, voltar à nossa dúvida: devemos dizer “onde ele esta- cionou” ou “aonde ele estacionou”? Você já parou para pensar na razão de existirem as duas formas: “onde” e “aonde”? Exerce alguma função esse “a” antes do “onde” ou é só uma questão de gosto? Na verdade, esse “a” é uma preposição que, ligada à palavra “onde”, expressa ideia de movimento, de destino. A forma “aonde” só pode ser empregada quando na frase existir a ideia de locomoção, e isso só acontece quando usamos verbos que exprimem noção de movimento, como os verbos “ir”, “chegar”, “levar”, entre outros: Vou aonde eu quero. Não conheço o lugar aonde ele quer chegar. Levou cultura aonde ninguém imaginava. Se o verbo não apresentar a ideia de movimento, use “onde” para indicar o lugar: Quero saber onde ele estacionou o carro. Aquela é a casa onde eu nasci. Derrubaram o colégio onde eu estudei. Com a preposição “para”, use sempre “onde” com ideia de movimento. Não sei para onde ela gostaria de ir. Foi para onde quis. 17 Licensed to Alessandra Leite daSilva - ale_ls@live.com Não sei PORQUE ou POR QUE preciso aprender isso? Eis aqui uma dúvida muito frequente: o uso dos porquês. Também pudera: são tantas formas! Pode ser junto com acento, junto sem acen- to, pode ser separado com acento, separado sem acento. Vamos, então, ver cada uma das possibilidades e tentar esclarecer esse assunto de uma vez por todas. Por que Separado e sem acento, deve ser empregado nas seguintes situações: > Em perguntas diretas e indiretas, podendo ser substituído pelas expressões “por qual motivo”, “por qual razão”. Posso saber por que você chegou tarde ontem? (Por qual razão você chegou tarde ontem?) Gostaria de saber por que você chegou tarde ontem. (Gostaria de saber por qual motivo você chegou tarde ontem.) Ninguém sabe por que ele não apareceu. (Ninguém sabe por qual motivo/razão ele não apareceu.) > Quando puder ser substituído por “pelo qual”, “pelos quais”, “pela qual” e “pelas quais”. Estas são as condições de trabalho por que lutamos. (Estas são as condições de trabalho pelas quais lutamos.) Só ela sabe os caminhos por que passou. (Só ela sabe os caminhos pelos quais passou.) > Sempre que a palavra “motivo” estiver ligada ao “por que”. Nesse caso, ela pode vir escrita antes ou depois do “por que” e até mesmo estar subentendida na frase. 18 Licensed to Alessandra Leite da Silva - ale_ls@live.com Desconheço o motivo por que ele não para de chorar. Todos queriam saber por que motivo ele partiu sem se despedir. Não sei por que ele deixou de vir às aulas. (Não sei por que motivo ele deixou de vir às aulas.) Por quê Separado e com acento circunfle- xo, deve ser usado quando tiver o sen- tido de “por qual motivo” ou “por qual razão” e vier escrito no final da frase ou antes de uma pausa. Você chegou tarde ontem por quê? Você chegou muito tarde ontem. Gostaria de saber por quê. Ele deixou de vir às aulas e eu não sei por quê. Ele partiu sem se despedir. Ninguém sabe por quê, nem para onde ele foi. O deputado subiu ao plenário e, sem saber por quê, começou a ser vaiado. Porque Junto e sem acento, estabelece, geralmente, uma relação de causa ou introduz uma explicação. Deve ser empregado sempre que puder ser substituído por “pois”. Ele foi dormir cedo porque estava muito cansado. (Ele foi dormir cedo, pois estava muito cansado.) 19 Licensed to Alessandra Leite da Silva - ale_ls@live.com Ela ficou brava porque ele chegou tarde. (Ela ficou brava, pois ele chegou tarde.) Chegue cedo porque tem muito serviço a ser feito. (Chegue cedo, pois tem muito serviço a ser feito.) Há também outro caso do uso do “porque” junto e sem acento. Veja os exemplos: Maria ficou alegre porque João foi transferido? Só porque João foi transferido, Maria ficou alegre? Note que temos duas frases terminadas com ponto de interroga- ção, mas não usamos o “por que” separado. E sabe por quê? Porque não queremos saber o motivo de João ter sido transferido. Queremos saber se a transferência dele é a razão da alegria de Maria. Repare que não é possível substituir esse “porque” por “por qual motivo/razão” ou “por que motivo”, por exemplo. Ninguém diz “Maria ficou alegre por qual motivo João foi transferido” ou “Maria ficou alegre por que razão João foi transferido”. Porquê Escrito junto e com acento, é um substantivo. Deve ser empregado sempre que vier precedido de uma palavra modificadora, como artigo 20 Licensed to Alessandra Leite da Silva - ale_ls@live.com definido (o, os, a, as), artigo indefinido (um, uns, uma, umas), pronome adjetivo (teu, aquele, tanto...) ou numeral (três, dez, mil...). Ninguém entendeu o porquê de sua recusa. Não aguento mais tantos porquês. Dois porquês ficaram sem resposta. Depois de ler essa explicação, você conseguiu descobrir qual a frase correta entre as duas apresentadas no início do texto: “Não sei PORQUE preciso aprender isso” ou “Não sei POR QUE preciso aprender isso”? A forma correta é: “Não sei por que preciso aprender isso”, pois po- demos perceber que a palavra “motivo” está subentendida na oração: Não sei por que motivo preciso aprender isso. Os senadores não estavam A PAR ou AO PAR do assunto? Embora apresentem uma grande semelhança sonora, as expres- sões “a par” e “ao par” são muito diferentes quanto ao significado. A expressão “a par de” significa “estar ciente”, “tomar conhecimento”, “inteirar-se”. Portanto, a frase correta é: “Os senadores não estavam a par do assunto”, pois podemos, por exemplo, substituir o termo “a par” por qualquer um dos sinônimos apresentados: Os senadores não estavam cientes/não tomaram conhecimento/não se inteiraram do assunto. Já a expressão “ao par de” deve ser empregada para expressar uma relação de equivalência, de igualdade em operações cambiais: O dólar não está mais ao par do real; agora, ele está ao par do euro. 21 Licensed to Alessandra Leite da Silva - ale_ls@live.com O time tem uma torcida TODA-PODEROSA ou TODO-PODEROSA? Essa é uma dúvida muito frequente. E também muito compreen- sível, pois nos acostumamos a flexionar o pronome indefinido “todo” para concordar com o substantivo que ele modifica. Dizemos: Todo dia e toda hora, todo homem e toda mulher, todo pagamento e toda conta. O problema é que, no composto “todo-poderoso”, a palavra “pode- roso” é um adjetivo, não um substantivo, e o que modifica um adjetivo é um advérbio. Nesse caso, trata-se de um advérbio de intensidade, pois tem o sentido de “inteiramente poderoso”. Assim, sendo um advérbio, deve ficar invariável, ou seja, não aceita a forma feminina nem a forma plural. Conclusão: o correto é “O time tem uma torcida todo-poderosa”, “Os times têm torcidas todo-poderosas”. Quando esse composto for um substantivo e estiver se referindo a Deus, deve ser grafado com letra maiúscula: O Todo-Poderoso não nos deixará cair em tentação. O gato escondeu-se DEBAIXO ou DE BAIXO da mesa? As duas formas existem, mas não podem ser usadas indistintamen- te. Devemos grafar “de baixo”, separado, quando pudermos substituir por “de cima”. O tiro veio de baixo. (O tiro veio de cima.) A parte de baixo do prédio precisa de reformas. (A parte de cima do prédio precisa de reformas.) A garagem fica no andar de baixo. (A garagem fica no andar de cima.) 22 Licensed to Alessandra Leite da Silva - ale_ls@live.com Já a forma “debaixo”, numa só palavra, significa “sob”, “embaixo”. É empregada em oposição à palavra “acima” e, geral- mente, vem seguida da preposição “de”. O gato escondeu-se debaixo da mesa. (sob a mesa) Enfiou a cabeça debaixo do travesseiro. (sob o travesseiro) Ele descansa debaixo da árvore. (sob a árvore) E a duplinha “em baixo” e “embai- xo”, como fica? Veja a dica: escreve-se “embaixo”, tudo junto, quando puder ser substituído por “em cima”, separado. Não havia monstros embaixo da cama. (Não havia monstros em cima da cama.) Ele guardava dinheiro embaixo do colchão. (Ele guardava dinheiro em cima do colchão.) Gostava de ficar embaixo da árvore. (Gostava de ficar em cima da árvore.) Você só deve escrever “em baixo”, separado, quando a palavra “bai- xo” for um adjetivo: O rosto foi esculpido em baixo relevo. (o relevo era baixo) Ela se dirigiu a todos em baixo tom. (o tom da fala era baixo) As crianças acordaram em baixo astral. (o astral das crianças estava baixo) 23 Licensed to Alessandra Leite da Silva - ale_ls@live.com A PRINCÍPIO ou EM PRINCÍPIO, queria muito me casar, mas mudei de ideia? É muito comum as pessoas confundirem essas duas expressões. Mas cuidado: embora sejam muito parecidas, não querem dizer a mesma coi- sa. “A princípio” significa “inicialmente”, “antes de tudo”. Portanto, diga: A princípio, queria me casar, mas mudei de ideia. A princípio, gostaria de cumprimentar os presentes. Já a expressão “em princípio” tem o sentido de “em tese”, “em teoria”. Todos os cidadãos, em princípio,são iguais perante a lei. Sou, em princípio, contra o aborto. É bom lembrar que alguns dicionários já consideram “a princípio” e “em princípio” sinônimos no sentido de “inicialmente”. Na mesma linha, ainda temos a expressão “por princípio”, que quer dizer “por convicção”. Por princípio, sou contra todo tipo de ditadura. 24 Licensed to Alessandra Leite da Silva - ale_ls@live.com O submarino vai IMERGIR ou EMERGIR? Aí depende do que se queira dizer. “Imergir” significa “para dentro d’água”; e “emergir” é “para fora d’água”. Banho de imersão é aquele que se toma “dentro d’água”. Quando um submarino vem à tona, ele emerge. O prefixo “i” de “imergir” significa “para dentro”; e o prefixo “e” de “emer- gir” significa “para fora”. É o mesmo caso dos prefixos “in/im” (para den- tro) e “ex” (para fora): importação, exportação; internar, externar... Com certa frequência ouvimos após algumas reuniões de execu- tivos: “Depois de muita discussão, a solução do problema finalmente acabou imergindo”. Isso quer dizer que a solução “afundou”. Na verda- de, o que se quer dizer é que “a solução do problema acabou emergin- do”, ou seja, “veio à tona”, “surgiu”, “finalmente apareceu”. Recebeu uma ajuda de CUSTAS ou de CUSTO? Toda ajuda é de custo. Você pode receber uma ajuda para pagar as custas de um processo, mas não existe “ajuda de custas”. Portanto: Recebeu uma ajuda de custo. Arcou com as custas do processo sozinho. Certamente você já ouviu: “Ele vive às custas do pai” ou “Está vivendo às custas da namorada”. Embora seja usual entre os falantes da língua portuguesa e alguns autores já aceitem essa construção, a locução pre- positiva “às custas de” deve ser evitada. É preferível seguir a tradição: Ele vive à custa do pai. Está vivendo à custa da namorada. 25 Licensed to Alessandra Leite da Silva - ale_ls@live.com Assim não é assado 26 Licensed to Alessandra Leite da Silva - ale_ls@live.com Quando nos propomos a escrever um bom texto, devemos tomar muito cuidado com sua construção. Sabemos que um texto, para ser con- siderado bem escrito, deve, por exemplo, evitar a repetição. Pode ser a repetição de estruturas linguísticas, de ideias e até mesmo a de palavras. O problema se dá quando – na intenção de evitar a repetição de pa- lavra – buscamos um sinônimo para substituí-la. Se a pesquisa por um sinônimo não for muito criteriosa, corre-se o risco de tropeçar em um falso sinônimo. Os falsos sinônimos são aquelas palavrinhas que muita gente acre- dita que têm o mesmo significado, mas que, contrariando o uso comum, significam coisas distintas. Vamos, a seguir, ver algumas dessas palavras que podem compro- meter o sentido da mensagem que se quer transmitir. A passeata pede a DESCRIMINALIZAÇÃO ou a LEGALIZAÇÃO da maconha? Antes de analisarmos a diferença entre “descriminalização” e “legalização”, vamos comentar o neologismo “descriminalizar”, que surgiu como sinônimo de “descriminar”. Essa nova palavra já consta de nossos melhores dicionários e é muito usada nos meios jurídicos. Acho, inclusive, que ela é muito útil, pois evita a possível confusão entre os parônimos “descriminar” (deixar de ser crime) e “discriminar” (listar, separar). O que não podemos, de jeito nenhum, é confundir “descriminalizar” (ou descriminar) com “legalizar”. Quando a passeata pede a descrimina- 27 Licensed to Alessandra Leite da Silva - ale_ls@live.com lização da maconha, ela quer que o usuário da maconha não seja visto como criminoso, que o ato de fumar maconha deixe de ser crime. Isso não significa tornar a maconha um produto legal. Com a descriminali- zação, o usuário deixaria de ser um fora da lei, mas a venda da maconha continuaria a ser proibida, e os traficantes continuariam a ser presos. Por sua vez, uma passeata pela legalização da maconha pede que o produto seja considerado legal, o que implicaria a normatização de seu comércio e de seus vendedores. O aluno QUESTIONOU o professor ou O aluno PERGUNTOU ao professor? Embora muitas pessoas empreguem os verbos “questionar” e “per- guntar” indiscriminadamente, eles não são sinônimos. Há muita dife- rença entre querer saber algo (perguntar) e colocar alguma coisa em dúvida (questionar). Na frase “O aluno questionou o professor”, temos um aluno que não concorda com o professor e põe o que ele diz em dúvida. Já na frase “O aluno perguntou ao professor”, temos um aluno que, ávido de conheci- mento, pede um esclarecimento, uma resposta ao professor. Veja outros exemplos: O advogado questionou a decisão do juiz. (O advogado colocou em dúvida a decisão do juiz.) O motorista perguntou ao policial se deveria virar à direita ou à esquerda. (O motorista indagou o policial, ele espera por uma resposta do policial.) 28 Licensed to Alessandra Leite da Silva - ale_ls@live.com A diretoria vai analisar o MESMO problema de ontem. / A diretoria vai analisar um problema IGUAL ao de ontem. Perceba que o “mesmo”, no caso, não pode ser substituído pela pala- vra “igual” sem prejuízo à mensagem original. Na primeira frase, entende- mos que a diretoria vai analisar o problema de ontem, que ainda não foi resolvido. Já na segunda, vemos que a diretoria vai analisar um problema IGUAL ao de ontem, mas se trata de um novo problema. Não conseguiu ver a diferença? Então, analise mais estas duas frases: Mariana foi à festa com a mesma camisa de Teresa. Mariana foi à festa com a camisa igual à de Teresa. Notou como as informações são distintas? Na primeira frase, Maria- na e Teresa usam a mesma roupa, o que sabemos ser impossível, pois dois corpos não podem ocupar o mesmo espaço ao mesmo tempo. Na segunda frase, fica claro que a camisa de Mariana era igual à de Teresa. Portanto, eram duas camisas para duas pessoas. Já pensou se disséssemos “Pedro namora a mesma garota que João”? Isso significaria que os dois dividem a namorada. Mas se dissés- semos que “Pedro namora uma garota igual à de João”, isso indicaria que os dois namoram garotas muito parecidas, seja na aparência física, seja na forma de agir. Assim, fica claro que devemos usar a palavra “mesmo” quando es- tivermos nos referindo a um único ser, e a palavra “igual” quando se tratar de seres diferentes que apresentam semelhanças. 29 Licensed to Alessandra Leite da Silva - ale_ls@live.com Drummond escreveu INÚMEROS ou NUMEROSOS poemas? Será que o poeta escreveu tantos poemas que ficou impossível contá-los? Provavelmente, não! Mas essa é a mensagem que se trans- mite quando empregamos a palavra “inúmeros”. “Inúmeros” é sinônimo de “incontáveis”. Portanto, podemos di- zer que são inúmeras as estrelas no céu, que são inúmeros os grãos de areia no deserto, mas não podemos dizer que o atleta ganhou inúmeros prêmios. Certamente, o atleta ganhou numerosos prê- mios, muitos prêmios, possíveis de contar. Assim, não confunda “inúmeros” (incontáveis) com “numerosos” (muitos). Evite, dessa maneira, situações constrangedoras, como dizer a um rapaz que sua noiva já teve inúmeros namorados. A empresa ficou totalmente ARRUINADA ou totalmente DESTRUÍDA? É muito diferente dizer que a empresa ficou arruinada e dizer que a empresa ficou destruída. “Arruinado” não quer dizer que ficou “em ruínas”. “Arruinado” quer dizer que foi “levado à ruína”, ou seja, perdeu seus bens, sua riqueza. Já “destruído” quer dizer “destroçado”. A empresa pode ter ficado des- truída por causa de um terremoto, de um incêndio, da explosão de uma bomba... Pode-se, ainda, dizer que depois que a empresa foi totalmente destruída, seus donos ficaram totalmente arruinados. 30 Licensed to Alessandra Leite da Silva - ale_ls@live.com O delegado teve seu carro ROUBADO ou FURTADO? Embora pareçam sinônimos, não são. Quando um objeto é furta- do, não há violência, nem física nem verbal. O ladrão furta na surdina, sem que a vítima perceba o que está acontecendo. Quando dizemos que um objeto foiroubado, pressupõe-se que a vítima sofreu algum tipo de ameaça, que ela foi forçada a entregar o objeto. Assim, se numa viagem de ônibus abrem a bolsa daquela senhora distraída e levam sua carteira sem que ela note, dizemos que ela foi vítima de um furto. Porém, se ela é ameaçada com uma arma e obrigada a entregar a carteira, ela é vítima de um roubo. De qualquer jeito, seja furtado ou roubado, o certo é que o delegado de polícia ficou sem o carro ou, como deve constar nos relatórios poli- ciais, “ele teve seu veículo locomotor subtraído”. Os operários reivindicam SUPLEMENTAÇÃO ou COMPLEMENTAÇÃO salarial? Perceba que, em cada frase, os operários estão reivindicando coi- sas distintas. Na primeira, eles pedem uma verba extra, uma quantia 31 Licensed to Alessandra Leite da Silva - ale_ls@live.com adicional para somar ao salário. Na segunda, eles estão brigando por uma parte complementar, que poderia ser uma segunda parte do salá- rio que não foi paga. Para ficar mais claro, pense na seguinte situação: reivindicar uma suplementação de salário pode ser, por exemplo, pedir para ganhar pela primeira vez um 14º salário. Já reivindicar uma comple- mentação salarial seria exigir o pagamento devido da segunda par- cela do 13º salário. Numa partida de futebol, então, a etapa complementar é o segundo tempo do jogo, e a etapa suplementar, a prorrogação. Ele TEM uma linda família e POSSUI uma casa bem grande. Embora os dicionários apresentem os verbos “ter” e “possuir” como sinônimos, nem sempre é possível substituir um pelo outro. Rigorosa- mente, “possuir” significa “ter a posse de”, “ter a propriedade de”, “po- der dispor de”. Trocando em miúdos, podemos dizer que só possuímos aquilo que é possível comprar ou vender. Veja: Ele possui uma casa na praia. Ela possui um carro esporte. Nós possuímos muitos bens no estrangeiro. Mas não podemos, por exemplo, dizer que “Mariazinha possui belos olhos”. Nesse caso, devemos optar pelo verbo “ter”, que tem um senti- 32 Licensed to Alessandra Leite da Silva - ale_ls@live.com do mais amplo. Veja alguns exemplos que não aceitam a substituição do verbo “ter” por “possuir”: Os empregados têm direitos adquiridos. A empresa tem cinco empregados doentes. Esse poste tem cinco metros de altura. Eles têm filhas encantadoras. Ainda não tivemos notícias de casa. A casa tem dois andares. Esse rapaz não tem juízo. Assim, tenha muito cuidado ao empregar o verbo “possuir”. Na dúvida, para não errar, use o verbo “ter”. Ela estava NUA. / Ela estava PELADA. / Ela estava DESPIDA. É muito interessante notar como palavras que todos aceitam como sinônimas podem apresentar cargas semânticas tão diferentes. Esse é o caso do trio “nua”, “pelada” e “despida”. Para você ter uma ideia do que estamos falando, é só pensar, por exem- plo, no caso de sua avó que (por razões que não nos cabe investigar) apre- sentou-se na sala totalmente sem roupa. 33 Licensed to Alessandra Leite da Silva - ale_ls@live.com Depois do choque, você diria que viu sua avó nua, pelada ou despi- da? Certamente, você escolheria o qualificativo “despida” para referir-se a sua avó. Agora, pense nas fotos publicadas pelas revistas masculinas de bom gosto. Os editores dessas publicações vendem uma ideia de refinamen- to, dizem tratar-se de “nus artísticos”. Rejeitam o rótulo de revista de “mulher pelada”, pois, como o adjetivo “pelada” tem carga pejorativa, eles não querem ser identificados com nenhum tipo de baixaria. Observe como a palavra “nudez” transmite uma carga de sensua- lidade que a palavra “despida” não tem. Num consultório médico, por exemplo, a paciente fica despida e não nua. Pelada, então, nem pensar. Portanto, dizemos que nossa mãe e nossa avó ficam despidas, a mo- delo da capa de revista fica nua e, para a louca que invade o campo de futebol, dizemos que está pelada. O terremoto deixou muitos DESABRIGADOS ou DESALOJADOS? À primeira vista, parece não haver diferença entre ficar “desabriga- do” e “desalojado”, já que em qualquer das situações a vítima do terre- moto ficou sem poder entrar em casa. Mas não é verdade. Há, sim, uma diferença entre ficar desabrigado e ficar desalojado. Quem ficou desabrigado ficou sem casa para morar, sua casa foi des- truída pelo terremoto. Quem ficou desalojado não perdeu a casa, o imóvel não foi destruído, mas está em situação de risco. Por isso, tornou-se desalo- jado quem precisou sair de casa para se abrigar em um lugar mais seguro. 34 Licensed to Alessandra Leite da Silva - ale_ls@live.com O plágio RENDEU-LHE ou CUSTOU-LHE um processo? Usados como sinônimos, esses verbos têm sentidos bem diferen- tes. “Render” tem carga positiva. Dizemos, por exemplo, que “O dinhei- ro rende na poupança”, “Tal marca de sabão em pó rende mais que as outras”, “Divulgar o escândalo rendeu à modelo uma proposta para es- trelar um filme”. Por isso, é inapropriado usarmos o verbo “render” com a palavra “pro- cesso”, que tem carga negativa. Ser processado por plágio não é nada positivo. Imagine um cantor cuja música (plagiada, diga-se) esteja fazen- do um grande sucesso. O plágio pode custar-lhe um processo daqueles! No segundo tempo, o time espera REVERTER ou INVERTER o placar? Muitas vezes, comentaristas da TV ou redatores de cadernos espor- tivos presenteiam-nos com essas pérolas: “O time espera reverter o re- sultado e continuar na briga pelo título”. Nem com a ajuda do juiz ou de um poderoso cartola o time conseguirá essa proeza. “Reverter” significa “voltar ao que era”; “inverter” significa “mudar para o oposto”. Um time que está perdendo por 1 x 0 e quer “reverter o placar”, na verdade está querendo “anular o gol adversário” e voltar ao 0 x 0. Uma tarefa impossível, não é? Se o desejo é fazer 2 x 1, por exemplo, o time quer é inverter o placar, passar da derrota para a vitória. 35 Licensed to Alessandra Leite da Silva - ale_ls@live.com servemnada que deModismos 36 Licensed to Alessandra Leite da Silva - ale_ls@live.com A língua, como toda expressão social, sofre as influências de seus usuários. Estes, às vezes, elegem determinadas palavras ou expressões para serem exaustivamente usadas e relegam ao limbo outras palavras ou expressões tachadas de cafonas. Os modismos devem ser evitados não por representarem um erro – alguns estão errados mesmo –, mas sobretudo por provocarem o em- pobrecimento vocabular e dificultarem o desenvolvimento de estilos pessoais, mais criativos. Veja os casos a seguir. Meu supervisor vai estar analisando sua solicitação. Que o brasileiro gosta do gerúndio todos nós sabemos. Basta com- parar nosso modo de falar com o dos nossos irmãos portugueses. En- quanto dizemos “As crianças estão brincando”, “O cachorro está dor- mindo”, “O sol está brilhando”, os portugueses dizem “As crianças estão a brincar”, “O cachorro está a dormir”, “O sol está a brilhar”. O problema é que, de uns tempos para cá, o gerúndio tornou-se uma praga. O uso exagerado, provavelmente, constitui o modismo mais cha- to que somos obrigados a ouvir. Essa mania de utilizar três verbos (vai estar analisando) para dizer o que poderia ser dito com apenas um (ana- lisará) ou no máximo dois (vai analisar) invadiu toda a comunicação, principalmente aquela com as centrais de atendimento telefônico. Certamente, todos nós já fomos vítimas de frases como “O técnico vai estar visitando sua casa”, “O gerente vai estar verificando seu caso”, “A senhora vai estar recebendo uma comunicação em breve”. 37 Licensed to Alessandra Leite da Silva - ale_ls@live.com Esse gerundismo, além de duro de ouvir, passa a ideia de falta de comprometimento. Na mensagem “O gerente vai estar verificando seu caso”, parece que o gerente não está nem aí para seu caso, que não vai analisar coisa nenhuma. Veja como, simplificadas, as mensagens ficariam mais diretas e en- fáticas, além de demonstrarem mais comprometimentode quem fala: O técnico vai visitar sua casa. O gerente verificará seu caso. A senhora receberá uma comunicação em breve. O ensino da língua portuguesa a nível de escola vai mal. Considerada por muitos morta, a expressão “a nível de” ainda não foi devidamente enterrada. Não é raro ouvirmos frases em que esse mo- dismo aparece, como “A nível de produção industrial, o Brasil teve um ótimo desempenho internacional”, “A nível de variedade, o cardápio é excelente”, “As crianças de hoje sabem tudo a nível de informática”. Muitas pessoas, inclusive, perguntam-me se o correto, nesses ca- sos, não seria usar a expressão “em nível de” no lugar de “a nível de”. Cuidado! Nos casos acima também não devemos usar “em nível de”, pois nenhuma das frases está se referindo ao nível, à superfície, ao patamar, à altura do que quer que seja. Por não se tratar de nenhuma espécie de nível, a expressão “a nível de” é totalmente desnecessária nas frases em questão. Veja: O ensino da língua portuguesa nas escolas vai muito mal. A variedade do cardápio é excelente. 38 Licensed to Alessandra Leite da Silva - ale_ls@live.com A produção industrial do Brasil teve um ótimo desempenho internacional. As crianças de hoje sabem tudo de informática. Somente quando há a ideia de “planos, alturas, níveis” diferentes é que podemos usar a expressão “em nível”. Em “A violência deve ser com- batida em nível municipal”, a expressão “em nível” foi corretamente uti- lizada, pois existem outros níveis – o estadual e o federal, por exemplo. Já a locução “ao nível de” deve ser usada quando tiver o sentido de “à mesma altura de”, “no mesmo plano de”. Morávamos em uma casa ao nível do mar. A bala alojou-se ao nível da terceira vértebra. Esse problema deve ser resolvido junto ao departamento de pessoal. Na minha infância, a expressão “junto a” indicava alguma coisa que estava ao lado. A padaria fica junto à igreja. (ao lado da igreja) O livro está junto aos cadernos. (ao lado dos cadernos) Mariazinha está ali, junto ao noivo. (ao lado do noivo) Fica, assim, muito estranho dizer que “o problema deve ser resolvido junto ao departamento de pessoal”. Devemos en- 39 Licensed to Alessandra Leite da Silva - ale_ls@live.com tender que o problema será resolvido ao lado do departamento? Perce- ba o absurdo que esse modismo produz em frases que nos acostuma- mos a ler todos os dias em jornais, como “Os assalariados agora podem obter empréstimo com juros mais baixos junto às financeiras creden- ciadas”. Será que há uma porta ao lado das financeiras credenciadas oferecendo empréstimo com juros baixos aos assalariados? Não seria muito mais simples dizer que o problema será resolvido NO departamento de pessoal e que os assalariados podem obter em- préstimos NAS financeiras credenciadas? Com certeza! Se eu conseguir me recuperar e se o técnico me der outra chance, eu entro em campo no domingo. Analisando todas as possibilidades que o nosso craque tem de su- perar para entrar em campo, fica difícil entender de onde saiu o “com certeza”. E você não precisa ser fã de futebol para já estar cansado de ouvir essa expressão. Atu- almente, é moda as pessoas começarem suas respostas com a descontextualizada locu- ção adverbial “com certeza”. Virou um abre- -alas, uma introdução que não quer dizer absolutamente nada. Pior: é usada mesmo quando não se tem certeza nenhuma. 40 Licensed to Alessandra Leite da Silva - ale_ls@live.com Trata-se, sem dúvida alguma, de uma moda. E como tal, esperamos que seja passageira. O professor foi afastado por conta de uma crise nervosa. É incrível como a locução prepositiva “por conta de” entrou na moda e espalhou-se tão rapidamente. Há quem diga que ela vem para ocupar o espaço deixado pela quase defunta “a nível de”. O certo é que o uso indiscriminado dessa expressão esvaziou seu sentido original de “em razão de” e ela, como um curinga, passou a ocupar o espaço de outras locuções com as quais não tem nenhuma afinidade. Se você duvida do poder de penetração dessa locução prepositiva, en- tre no seu buscador eletrônico preferido, tecle “por conta de” e peça que sua pesquisa seja feita apenas entre as notícias. Você vai ficar pasmo, as- sim como eu fiquei, ao constatar a que ponto ela já invadiu a mídia. Transcrevo, aqui, algumas que encontrei: “Síria é condenada pela ONU por conta de massacre.” “Detidos com crack são liberados por conta da greve de peritos.” “Cidades gaúchas racionam água por conta da seca.” “Trânsito de Recife sofre alteração por conta do jogo com Náutico.” “Santos Dumont é fechado para pousos por conta de nevoeiro.” “Série C pode ser adiada por conta de indefinições na justiça.” “Time tenta adiar jogo por conta de convocados.” 41 Licensed to Alessandra Leite da Silva - ale_ls@live.com Antes de entrar no elevador, verifique se o MESMO encontra-se parado neste andar. Outro modismo que devemos evitar é o emprego da palavra “mes- mo” no lugar de um pronome substantivo. Isso acontece quando as pessoas não querem repetir um substantivo citado anteriormente no texto e tascam os chatíssimos “o(s) mesmo(s), a(s) mesma(s)”. Confira alguns exemplos desse uso inadequado: “Os atletas foram treinar hoje de manhã e os mesmos ficaram para almoçar no clube.” “O delegado apreendeu dois pacotes de cocaína, e depois descobriu que os mesmos haviam desaparecido de sua sala.” “Queria muito conversar hoje com o Carlos, mas descobri que o mesmo havia viajado cedo.” “Encontrou o vizinho no mercado e ofereceu ao mesmo uma carona.” “O policial parou o motorista e pediu os documentos do mesmo.” Há muitas maneiras de se livrar desse vício insuportável. Basta pen- sar um pouquinho e certamente a solução aparecerá. 42 Licensed to Alessandra Leite da Silva - ale_ls@live.com Em alguns casos, você pode simplesmente eliminá-lo: Os atletas foram treinar hoje de manhã e ficaram para almoçar no clube. Em outras frases, é possível substituí-lo por uma palavra equivalente: O delegado apreendeu dois pacotes de cocaína, e depois descobriu que a droga havia desaparecido de sua sala. O mais comum é poder substituir a palavra “mesmo” por um prono- me pessoal, demonstrativo ou possessivo: Queria muito conversar hoje com o Carlos, mas descobri que ele havia viajado cedo. Encontrou o vizinho no mercado e ofereceu-lhe uma carona. O policial parou o motorista e pediu seus documentos. No caso das famosas plaquinhas que enfeitam as portas dos eleva- dores, ficaria muito mais claro e elegante inverter a frase e eliminar a palavra “mesmo”: Antes de entrar, verifique se o elevador está parado neste andar. Isso não significa que devemos eliminar de vez a palavra “mesmo”. Veja algumas situações em que seu uso é corretíssimo: > Empregado como reforço após substantivos ou pronomes pessoais. Nesse caso, equivale a “próprio” ou “própria”. Eu mesmo (próprio) testemunhei a seu favor. As crianças mesmas (próprias) prepararam a festa surpresa. Eles prejudicaram a si mesmos (próprios). 43 Licensed to Alessandra Leite da Silva - ale_ls@live.com > Quando for um advérbio e puder ser substituído por “de fato”, “realmente”. O deputado votou mesmo (de fato) a favor do projeto da ficha limpa. Os operários entram mesmo (realmente) em greve. > Quando vier precedido de artigo definido e tiver o sentido de “a mesma coisa”. Discutir não é o mesmo que brigar. O piloto correu risco de morte. Há bem pouco tempo, todos nós corríamos risco de vida. E tomáva- mos muito cuidado para não morrer. De uns anos para cá, começamos a ouvir que essa expressão estaria em desacordo com o sentido que pretendia transmitir, pois o ato de viver não acarreta risco. Baseados nessa reflexão, muitos meios de comunicação passaram a empregar a expressão “risco de morte”, já que a morte sim seria um risco a ser evitado. No entanto, se vamos aderir a esse modismo, devemosfazê-lo de forma consciente. Nada de dizer por aí que a expressão “risco de vida” é inadequada semanticamente. “Risco de vida” quer dizer “risco para a vida” ou, como defendem alguns, trata-se da elipse do verbo “perder”, que estaria subentendido antes da palavra “vida”: risco de perder a vida. De qualquer jeito, não se trata de escolher a forma certa em detri- mento da errada – já que as duas dizem a mesmíssima coisa –, mas de escolher a forma que mais lhe agradar. 44 Licensed to Alessandra Leite da Silva - ale_ls@live.com Como estava literalmente morta de fome, resolveu parar em qualquer lugar para comer. Eis aqui um clássico acontecimento sobrenatural. Não consigo imaginar nem como nem por que a falecida resolveu comer. Mas con- sigo imaginar o susto que as pessoas levaram ao ver a falecida entran- do no restaurante. Ora, gente, “literalmente” é um advérbio que significa “ao pé da le- tra”, “exatamente”. Isso quer dizer que se ela estava literalmente morta de fome, ela havia falecido por inanição, morrera por falta de comida. O que a impossibilitaria de locomover-se, inclusive para comer. Esse advérbio é muito importante quando se pretende escla- recer o interlocutor de que a expressão utilizada deve ser enten- dida no seu sentido literal, e não no sentido figurado. Na frase “O jurado ficou literalmente de queixo caído”, por exemplo, devemos concluir que sua mandíbula ficou deslocada, impossibilitando-o de fechar a boca. Portanto, tenha muito cuidado ao utilizar o advérbio “literalmente”. Evite dizer bobagens, como “O jogador literalmente perdeu a cabeça” (a não ser que você tenha visto sua cabeça rolar no campo); “O torcedor literalmente ex- plodiu de raiva” (bom, nesse caso, voaram pedaços para todos os lados); “Essa casa literal- 45 Licensed to Alessandra Leite da Silva - ale_ls@live.com mente não cabe no meu bolso” (se não se tratar de uma miniatura, ela certamente não cabe no meu bolso, nem no de ninguém). Igualmente perigoso é o uso indiscriminado do adjetivo “verdadei- ro”. Assim como o advérbio “literalmente”, esse adjetivo só deve ser empregado quando significar “com o sentido real da palavra”. Deve-se evitar empregá-lo com ideia intensificadora. Portanto, fuja de frases do tipo “A rua se transformou em um verdadeiro rio”; “O Maracanã virou um verdadeiro campo de batalha”. “Pontual”, “sinalizar” e outras pérolas A repetição excessiva que caracteriza os modismos também che- gou ao adjetivo “pontual” e ao verbo “sinalizar”. Quantas vezes não ouvimos frases como “Esse é um problema pon- tual”; “Isso foi um caso pontual”? Nada contra esse adjetivo, que signi- fica “esporádico”, “específico”, “restrito”. O problema é que ele está por toda a parte. É bom lembrar também que “pontual” é “quem chega na hora marcada, quem cumpre o horário estabelecido”. Outro modismo que merece destaque é o verbo “sinalizar”, que in- vadiu sem cerimônia a linguagem jornalística. Veja alguns exemplos: “A decisão do governo sinaliza manutenção da política cambial”; “A alta do dólar sinaliza uma elevação dos preços em geral”; “Opção por mais um zagueiro sinaliza que o time jogará na defensiva”; “O governo ainda não sinalizou uma nova proposta”. Será que custa muito variar um pouco? Veja: 46 Licensed to Alessandra Leite da Silva - ale_ls@live.com A decisão do governo aponta para a manutenção da política cambial. A alta do dólar evidencia uma elevação dos preços em geral. Opção por mais um zagueiro indica que o time jogará na defensiva. O governo ainda não apresentou uma nova proposta. Veja mais alguns modismos que infestam nossos textos: “O acidente deixou o saldo de duas vítimas” (os dois coitados morrem e ainda viram “saldo”); “A polícia ainda contabiliza os mortos” (pelo visto, contabilida- de e morte andam juntas); “O problema ficou ainda maior com a desala- vancagem das vendas”; “Amanhã vamos restartar os nossos trabalhos”. Alguns dos exemplos nem merecem comentário. Para dar jeito nes- se modismo sem graça, basta fazer algumas substituições ou eliminar palavras desnecessárias. Veja: O acidente deixou duas vítimas. (ou fez duas vítimas) A polícia ainda não totalizou os mortos. O problema ficou ainda maior com a queda das vendas. Amanhã vamos reiniciar nossos trabalhos. 47 Licensed to Alessandra Leite da Silva - ale_ls@live.com ISBN: 978-85-907365-9-2 R. Elvira Ferraz, 250, conj. 505 – 04552-040 – São Paulo – SP CNPJ 04.963.593/0001-42 Concepção e realização: Gold Editora Coordenação geral: Isabel Moraes LIVRO DIGITAL Texto: Sérgio Nogueira, Carla Tullio (redatora assistente) Assistência editorial: Ana Beraldo Arte: LIT Design Foto de capa: Bel Pedrosa Ilustrações: Marcos Müller Revisão: Sandra Miguel VIDEOAULAS Apresentação: Sérgio Nogueira Roteiro: Sérgio Nogueira, Carla Tullio, Bárbara Mello EQUIPE DE ESTÚDIO Produtora contratada: Uzumaki Comunicação Direção: Jefferson Gorgulho Peixoto Fotografia: Rodolfo Figueiredo Som direto: Luiz Fujita Jr. Produção e TP: Tainah Medeiros Maquiagem: Luciana Sales EQUIPE DE EXTERNAS Fotografia: Christian Puig Produção: Ana Beraldo Assistência de produção: Luciana Sutil EQUIPE DE EDIÇÃO E PÓS-PRODUÇÃO Edição: Priscila Viotto, Christian Puig, Luciana Sutil Locução: Ângela Benhossi Ilustrações: Marcos Müller Motion designer: Tiago Almeida Santos Revisão: Bárbara Mello, Kiel Pimenta Licensed to Alessandra Leite da Silva - ale_ls@live.com 6. Análise sintática 7. Pontuação 8. Concordância 9. Regência 10. Construção de texto 1. Ortografia 2. Uso das palavras 3. Classe de palavras 4. Verbos 5. Pronomes Licensed to Alessandra Leite da Silva - ale_ls@live.com