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1 Autor: Lucas Luiz Vieira Orientadora: Prof a . Dra. Maria Sueli Soares Felipe Co-orientadora: Prof a . Dra. Ana Karina Rodrigues Abadio Brasília - DF 2016 Pró-Reitoria Acadêmica Escola de Saúde e Medicina Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Ciências Genômicas e Biotecnologia EXPRESSÃO E PURIFICAÇÃO DO ALVO MOLECULAR RIM8 VISANDO O DESENVOLVIMENTO DE NOVAS DROGAS ANTIFÚNGICAS LUCAS LUIZ VIEIRA EXPRESSÃO E PURIFICAÇÃO DO ALVO MOLECULAR RIM8 VISANDO O DESENVOLVIMENTO DE NOVAS DROGAS ANTIFÚNGICAS Dissertação apresentada ao Programa de Pós- Graduação Stricto Sensu em Ciências Genômicas e Biotecnologia da Universidade Católica de Brasília como requisito parcial para a obtenção do título de mestre em Ciências Genômicas e Biotecnologia. Orientadora: Prof a . Dra. Maria Sueli Soares Felipe Co-orientadora: Prof a . Dra. Ana Karina Rodrigues Abadio Brasília 2016 Ficha elaborada pela Biblioteca Pós-Graduação da UCB V658e Vieira, Lucas Luiz. Expressão e purificação do alvo molecular Rim8 visando o desenvolvimento de novas drogas antifúngicas. / Lucas Luiz Vieira – 2016. 115 f.; il.: 30 cm Dissertação (Mestrado) – Universidade Católica de Brasília, 2016. Orientação: Profa. Dra. Maria Sueli Soares Felipe. Coorientação: Profa. Dra. Ana Karina Rodrigues Abadio 1. Micoses sistêmicas. 2. Paracoccidioides spp. 3. Alvo molecular Rim8. 4. Drogas antifúngicas. 5. Produção de proteínas recombinantes. I. Felipe, Maria Sueli Soares, orient. II. Abadio, Ana Karina Rodrigues, coorient. III. Título. CDU 606 Dedico este trabalho à minha família, que sempre acreditou em mim e me encorajou a perseguir meus sonhos. Em especial ao meu avô, Fernando, o qual demonstrava, com seu jeito brincalhão, grande admiração e felicidade em cada uma de minhas conquistas acadêmicas. AGRADECIMENTO Agradeço primeiramente a Deus, que me ama incondicionalmente, me deu forças e me segurou em Suas mãos para enfrentar situações nas quais minhas limitações humanas não me permitiam avançar. É Ele o meu socorro na hora da angústia, o alimento da minha alma e o meu sustento. Também agradeço à minha família, especialmente minha mãe, pai e irmão... Amo vocês! Conscientemente, sacrifiquei por este trabalho acadêmico o tempo que poderia ter dedicado a vocês, mas acredito ter sido uma boa causa. Mãe, o seu amor, cuidado, as palavras de apoio, as nossas conversas e risadas foram essenciais para a minha formação e foram, por muitas vezes, combustível para a minha vontade de continuar nessa empreitada. Obrigado por ser esse exemplo de determinação e superação, mãezinha. Pai, agradeço a preocupação comigo, o incentivo durante toda a vida e, principalmente, agradeço por ter aceitado tão bem os vários “nãos” que tive de dar aos convites de viagens e momentos de lazer em família. Espero estar mais perto de você de agora em diante. Lipe, meu “rimão”, obrigado por sempre estar comigo, me defender, me apoiar, me fazer sorrir e até por me irritar. Agradeço por se importar comigo e com meu trabalho, por se esforçar para entender meus experimentos e achar tudo interessante mesmo sendo tão longe da sua realidade. Mesmo com toda minha chatice e esquisitice, você sempre foi um exemplo pra mim. Diane, meu amor e melhor amiga, você é um presente de Deus para a minha vida. Agradeço a você pelo carinho, paciência, afeto, colo, companheirismo, preocupação, discussões acadêmicas e pelas conversas engrandecedoras. Você é uma pessoa maravilhosa e cativa todos à sua volta com sua amabilidade, além de ser uma excelente cientista. Saiba que você me motiva a me tornar uma pessoa melhor a cada dia e que esse trabalho não seria o mesmo sem o seu apoio. Estar com você me traz paz mesmo nos momentos de desespero. Espero compartilhar muitos e muitos anos de minha vida com você. Agradeço também à sua família, que sempre me acolheu e me faz sentir como parte dela. Um obrigado especial à Rosa pelos conselhos, puxões de orelha e o cuidado maternal que tem por mim. Agradeço a todos os meus amigos e colegas, que me incentivaram, apoiaram, aguentaram minhas lamentações e também ouviram muitos “não, hoje não dá” de minha parte, mas ainda assim, torciam muito por mim nessa jornada. Não vou citar nomes para não cair nas armadilhas de minha memória, mas cada um de vocês, sejam do colégio, faculdade, dos laboratórios da UCB, UnB ou HUB, tiveram sua parcela de contribuição para tornar esse trabalho possível. Tanto as discussões quanto os momentos de descontração com vocês foram essenciais para o meu crescimento e lucidez durante essa caminhada. Peço perdão pelos momentos de descontrole que posso ter tido com qualquer um de vocês... Obrigado por não desistirem de mim! Agradeço às professoras Maria Sueli e Ana Karina pela paciência na orientação, pelos ensinamentos, as discussões e a confiança em meu trabalho, tornando possível a sua realização. Agradeço também a todos os professores que, de alguma forma, ajudaram na minha formação acadêmica e na realização deste trabalho. Um obrigado especial aos membros participantes da banca de defesa (prof. as Cristine, Patrícia e Rosângela) por terem aceitado participar desse momento especial. Ao prof. André Nicola por diversos experimentos, aulas, sugestões e pelas conversas bastante enriquecedoras; à prof. a Larissa Matos pelas análises de DNA, conselhos profissionais, conversas amigáveis e até pelos puxões de orelha quando mereci; aos profs. Beatriz, João Alexandre e Napoleão pela ajuda e pelos “pitacos” para a melhora do trabalho. Agradeço à Universidade Católica de Brasília por ter me dado a oportunidade de continuar aprendendo e poder vislumbrar novos horizontes. Seus colaboradores sempre foram muito solícitos e, em certos momentos, companheiros noturnos de trabalho. À Universidade de Brasília, onde pude realizar a maior parte de meus experimentos e conhecer pessoas maravilhosas. Finalmente, agradeço ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), Fundação de Apoio à Pesquisa do DF (FAP-DF) pelo apoio financeiro sem o qual este trabalho não teria sido desenvolvido. Bem-aventurado o homem que acha sabedoria, e o homem que adquire conhecimento; pois melhor é o lucro que ela dá do que o da prata, e melhor a sua renda do que o ouro mais fino. Mais preciosa é do que os rubis, e tudo o que mais possas desejar não se pode comparar a ela. Provérbios 3:13-15 RESUMO Referência: VIEIRA, Lucas Luiz. EXPRESSÃO E PURIFICAÇÃO DO ALVO MOLECULAR RIM8 VISANDO O DESENVOLVIMENTO DE NOVAS DROGAS ANTIFÚNGICAS. 2016. 115 folhas. Dissertação (Mestrado em Ciências Genômicas e Biotecnologia). Universidade Católica de Brasília, Brasília-DF, 2016. Infecções fúngicas invasivas são um problema de saúde pública no mundo, já que aumentam a morbidade e o tempo de internação de pacientes. A micose sistêmica com o maior índice de mortalidade no Brasil, onde é considerada endêmica, é a paracoccidioidomicose, causada pelo fungo dimórfico Paracoccidioides spp. A tendência global de aumento da resistência aos agentes antifúngicos disponíveis comercialmente, o espectro limitado de atividade contra alguns fungos patogênicos e a preocupação com a toxicidade são evidências da necessidade de novas estratégias terapêuticas, sobretudo dodesenvolvimento de novas drogas antifúngicas. Nesse sentido, o gene essencial rim8 foi identificado por genômica comparativa como uma sequência ortóloga no genoma de fungos patogênicos humanos e ausente em humanos. Em fungos filamentosos e leveduras, a regulação da expressão gênica pelo pH envolve componentes de uma via de sinalização que levam à ativação proteolítica do fator de transcrição PacC/Rim101 em resposta à alcalinização do pH externo. O gene rim8 em leveduras ou palF em fungos filamentosos possui um papel essencial nessa cascata de sinalização, sendo importante para a interação patógeno-hospedeiro, aumento de virulência e sobrevivência do patógeno. Por isso, Rim8 é um alvo molecular promissor e bastante interessante para o desenvolvimento de drogas. O objetivo deste trabalho é otimizar a expressão heteróloga e purificação da proteína Rim8 de P. lutzii, visando realizar a caracterização estrutural e funcional da proteína para futuramente utilizá-la como alvo molecular para o desenvolvimento de drogas. O gene rim8 foi sintetizado quimicamente com cauda de histidinas e foi clonado em vetor pET-21a. A expressão heteróloga do gene foi padronizada usando duas estirpes de E. coli, obtendo as melhores condições para purificação com o uso de meio LB contendo 0,5% de glicose a 30°C por 2 h e 0,25 mM de IPTG e coquetel de inibidores de proteases. Os resultados da expressão e purificação foram analisados por SDS-PAGE e/ou confirmados por western blot. Realizou-se a imunização de camundongos BALB/c com a proteína purificada para obtenção de anticorpos anti-Rim8. A produção dos anticorpos foi confirmada por ELISA. A imunocitolocalização em células de P. lutzii mostrou que a proteína se encontra associada à membrana plasmática de forma difusa em pH ácido, em seguida apresenta focos localizados em resposta a um pH próximo da neutralidade e, por fim, migra para o interior da célula em pH alcalino. Sendo assim, pode-se inferir que o trabalho apresenta contribuições para o desenvolvimento de novas drogas antifúngicas, além de auxiliar o entendimento do processo biológico no qual a proteína RIM8 está envolvida. Palavras-chaves: Micoses sistêmicas; Paracoccidioides spp.; Alvo molecular Rim8; Drogas antifúngicas; Produção de proteínas recombinantes; ABSTRACT Invasive fungal infections are a major public health problem in the world, since they increase morbidity and patients’ hospitalization time. In Brazil, the highest mortality rate among the systemic mycoses is caused by an endemic disease named paracoccidioimycosis, which the etiologic agent is the dimorphic fungus Paracoccidioides spp. The worldwide increased resistance to the commercially available antifungal agents, their limited spectrum of activity against some fungal pathogens and concerns with their toxic side effects are reasonable evidence of the necessity of novel therapeutic strategies, especially the development of new antifungal agents. Thus, the essential gene rim8 was identified by comparative genomics as an orthologous sequence in the genome of human pathogenic fungi absent in the human genome. In filamentous fungi and yeasts, gene expression regulation by the ambient pH involves components of a signaling pathway that mediate proteolytic activation of the transcription factor PacC/Rim101 in response to alkaline environmental pH. The rim8 gene in yeasts, also called palF in filamentous fungi, performs an essential step in this signaling pathway. It is important for host-pathogen interaction, leading to increased virulence and pathogen survival. Thus, Rim8 is a very interesting and promising drug target. The aim of this work is to optimize heterologous expression and purification of Rim8 protein from P. luzii to further perform its structural and functional characterization and also, to use it as a molecular target for drugs development. The rim8 gene was chemically synthesized with a histidine tag and cloned into a pET-21a vector. Heterologous expression of the gene was made using two strains of E. coli, obtaining the best conditions using LB medium with 0.5% glucose at 30 °C for 2 hours and 0.25 mM IPTG and adding protease inhibitor cocktail. The Rim8 heterologous protein was purified using a nickel affinity chromatography column. Expression and purification results were analyzed by SDS-PAGE and in some cases, confirmed by western blot. Immunization of BALB/c mice was performed with the purified protein to obtain anti- Rim8 antibodies. The antibody production was confirmed by ELISA test. The protein immunocitolocalization in P. lutzii cells showed a difuse protein-plasma membrane association at acidic pH. At neutral pH the fluorescence pattern is showed as localized foci in plasma membrane and later, with extracellular alcalinization, it migrates into the cytosol. Thus, it can be inferred that this work gives some contribution to the development of new antifungal drugs, but still must undergo further production steps, proteolysis reduction and protein purification to allow structural and functional characterization of Rim8. Keywords: Systemic fungal diseases; Paracoccidioides spp.; Molecular target Rim8; Antifungal drugs; Recombinant protein production; LISTA DE ILUSTRAÇÕES Figura 1- Distribuição geográfica dos grupos filogenéticos de Paracoccidioides spp. ........... 24 Figura 2- Mecanismo de ação de drogas antifúngicas. ............................................................. 30 Figura 3- Alinhamento múltiplo das sequências de aminoácidos de Rim8 de fungos patogênicos humanos. ............................................................................................................... 34 Figura 4- Modelo de recrutamento da maquinaria ESCRT mediada por Rim8 ....................... 37 Figura 5- Mapa do vetor de expressão bacteriano pET-21a (+) ............................................... 44 Figura 6- Esquema da produção em larga escala da proteína em sistema heterólogo. ............. 47 Figura 7- Ilustração esquemática do mapa do vetor pET-21a::rim8. ....................................... 63 Figura 8- Eletroforese em gel de agarose dos experimentos de digestão enzimática e PCR. .. 63 Figura 9- Relatório resumido da qualidade das reações de sequenciamento. .......................... 64 Figura 10- Alinhamento entre a sequência contígua obtida com o sequenciamento e a sequência desenhada antes da síntese gênica. .......................................................................... 65 Figura 11- Cinética de indução de expressão gênica das estirpes de E. coli em SDS-PAGE. . 65 Figura 12- Gel de SDS-PAGE acompanhado de revelação por western blot representativos da melhor condição de expressão do gene rim8. ........................................................................... 66 Figura 13- Gel de SDS-PAGE e western blot de Rim8 purificada por cromatografia por afinidade ao níquel.................................................................................................................... 67 Figura 14- Cromatograma de purificação em Äkta por IMAC. ................................................ 70 Figura 15- Western blot das alíquotas de eluição de IMAC por Äkta. ...................................... 71 Figura 16- Cromatograma da purificação em Äkta por exclusão molecular. ........................... 72 Figura 17- Western blot após cromatografia por exclusão molecular. ..................................... 72 Figura 18- Western blot de alíquotas de expressão usando os inibidores de protease apontados após análise do mapa de proteólise........................................................................................... 75 Figura 19- Cinética de produção de anticorpos anti-Rim8 no camundongo 3. ........................ 75 Figura 20- Imagens de leveduras de P. lutzii em DIC e MF após ligação deanticorpo anti- Rim8 à célula. ........................................................................................................................... 76 LISTA DE TABELAS Tabela 1- Dados estatísticos das dez infecções fúngicas invasivas mais frequentes. ............... 21 Tabela 2- Exemplos de fungos dimórficos e fatores desencadeantes da transição dimórfica. . 23 Tabela 3- Genes selecionados como potenciais alvos de novas drogas antifúngicas. .............. 34 Tabela 4- Enzimas de restrição utilizadas nas reações de digestão enzimática........................ 45 Tabela 5- Iniciadores utilizados para amplificação e sequenciamento de rim8. ...................... 46 Tabela 6- Parâmetros para otimização da produção de Rim8. ................................................. 48 Tabela 7- Parâmetros para otimização da produção e purificação da proteína Rim8. ............. 52 Tabela 8- Concentração dos inibidores de proteases utilizados após montagem do mapa de proteólise de Rim8. ................................................................................................................... 61 Tabela 9- Otimização da produção de proteína Rim8. ............................................................. 65 Tabela 10- Otimização da produção/purificação da proteína Rim8 em conformação nativa. . 68 Tabela 11- Análise da proteólise de Rim8 em sistema heterólogo em E. coli e enzimas envolvidas nesse processo. ....................................................................................................... 73 LISTA DE SIGLAS AEBSF - Cloridrato de 4-fluoreto de 2-aminoetilbenzenossulfonil AMPc - Adenosina monofosfato cíclico BCIP - 5-bromo-4-cloro-3-indolil-fosfato C-terminal – Extremidade carboxi-terminal DETAPAC – Ácido dietileno triamino pentacético DIC - Microscopia de contraste de interferência diferencial DIFP - Diisopropil fluorofosfato E-64 - N-(trans-Epoxisuccinil)-L-leucina 4- guanidinobutilamida EDTA - Ácido etileno diamino tetracético EGTA - Ácido etileno glicol tetracético ELISA - Enzyme-Linked ImmunoSorbent Assay ESCRT - Complexo endossomal de distribuição necessário para transporte HIV – Vírus da imunodeficiência humana HTS - Triagem biológica automatizada em larga escala (high throughput screening) IFI – Infecção fúngica invasiva IMAC – Cromatografia por afinidade a metal imobilizado IPTG - Isopropil-β-D-tiogalactopiranosídeo LB - Luria-Bertani Log - Função logarítmica MF - Microscopia de fluorescência MWCO - Limite de peso molecular (molecular weight cut-off) NA - Abertura numérica N-terminal – Extremidade amino-terminal NBT - Nitroblue tetrazólio NCBI - National Center for Biotechnology Information OD600 - Densidade óptica a 600 nm Pb – Pares de bases PBS - Tampão fosfato-salino PCM - Paracoccidioidomicose PCR – Reação em cadeia da polimerase pH – Potencial hidrogeniônico pNPP - p-nitrofenil fosfato PMSF - Fluoreto de fenilmetilsulfonil PS2 - Espécie filogenética 2 (do complexo Paracoccidioides brasiliensis) PS3 - Espécie filogenética 3 (do complexo Paracoccidioides brasiliensis) PS4 - Espécie filogenética 4 (do complexo Paracoccidioides brasiliensis) PVDF - Fluoreto de polivinilideno Rf - Razão da distância percorrida por uma banda de proteína no gel separador de SDS-PAGE pelo comprimento total deste gel S1 – Espécie 1 (do complexo Paracoccidioides brasiliensis) SDS - Dodecil-sulfato de sódio SDS-PAGE - Eletroforese em gel de poliacrilamida com SDS SIDA - Síndrome da imunodeficiência adquirida TB - Terrific Broth TBE – Tampão Tris-borato-EDTA TBS - Solução salina tamponada com Tris Th1 - Resposta imunológica de linfócitos T auxiliares 1 Th2 - Resposta imunológica de linfócitos T auxiliares 2 TMD - Domínios transmembrana UniProtKB - Universal Protein Resource Knowledge base UHTS - Triagem biológica automatizada em ultra larga escala (ultra high throughput screening) UV280 – Luz ultravioleta em comprimento de onda de 280 nm SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO --------------------------------------------------------------------------------------- 17 2 REVISÃO DE LITERATURA -------------------------------------------------------------------- 20 2.1 INFECÇÕES FÚNGICAS INVASIVAS ----------------------------------------------------- 20 2.2 FUNGOS DIMÓRFICOS ----------------------------------------------------------------------- 21 2.3 O GÊNERO PARACOCCIDIOIDES E A PARACOCCIDIOIDOMICOSE ------------ 23 2.4 TRATAMENTO DA PCM ---------------------------------------------------------------------- 26 2.5 DIFICULDADES TERAPÊUTICAS --------------------------------------------------------- 27 2.6 ALTERNATIVAS TERAPÊUTICAS -------------------------------------------------------- 32 2.7 VIA RIM/PAL DE REGULAÇÃO DO PH -------------------------------------------------- 35 2.8 PROTEÍNA RIM8 -------------------------------------------------------------------------------- 39 3 JUSTIFICATIVA ------------------------------------------------------------------------------------ 42 4 OBJETIVOS ------------------------------------------------------------------------------------------ 43 4.1 OBJETIVO GERAL ----------------------------------------------------------------------------- 43 4.2 OBJETIVOS ESPECÍFICOS ------------------------------------------------------------------- 43 5 MATERIAL E MÉTODOS ------------------------------------------------------------------------ 44 5.1 SÍNTESE QUÍMICA E CLONAGEM GÊNICA -------------------------------------------- 44 5.2 PREPARO DE CÉLULAS BACTERIANAS COMPETENTES E TRANSFORMAÇÃO POR CHOQUE TÉRMICO ---------------------------------------------- 45 5.3 CONFIRMAÇÃO DA CLONAGEM MOLECULAR DE RIM8 ------------------------- 45 5.4 ANÁLISE DA EXPRESSÃO GÊNICA ------------------------------------------------------ 46 5.5 OTIMIZAÇÃO DA EXPRESSÃO GÊNICA ------------------------------------------------ 47 5.6 PREPARAÇÃO DA AMOSTRA E PURIFICAÇÃO DA PROTEÍNA-ALVO -------- 48 5.6.1 Cromatografia por afinidade em aparato manual ---------------------------------- 50 5.6.2 Otimização da purificação manual ----------------------------------------------------- 51 5.6.3 Cromatografia por afinidade em Äkta ------------------------------------------------- 52 5.6.4 Diálise, renaturação e concentração da proteína ------------------------------------ 53 5.6.5 Cromatografia por exclusão molecular ------------------------------------------------ 54 5.7 ELETROFORESE EM GEL DE POLIACRILAMIDA CONTENDO SDS ------------ 55 5.8 WESTERN BLOTTING -------------------------------------------------------------------------- 56 5.9 IMUNOCITOLOCALIZAÇÃO DA PROTEÍNA RIM8 ----------------------------------- 57 5.9.1 Produção de anticorpos policlonais ---------------------------------------------------- 57 5.9.2 Localização intracelular da proteína Rim8 ------------------------------------------- 58 5.10 CONSTRUÇÃO DO MAPA DE PROTEÓLISE DA PROTEÍNA RIM8 ------------- 58 5.11 INIBIDORES ESPECÍFICOS PARA A PRODUÇÃO DE PROTEÍNA RIM8 ------- 60 6 RESULTADOS --------------------------------------------------------------------------------------- 62 6.1 ANÁLISE DO VETOR RECOMBINANTE ------------------------------------------------- 62 6.2 EXPRESSÃO GÊNICA ------------------------------------------------------------------------- 65 6.3 PURIFICAÇÃO DA PROTEÍNA RIM8 ------------------------------------------------------ 67 6.3.1 Cromatografia por afinidade - método manual ------------------------------------- 67 6.3.2 Cromatografia por afinidade - método automatizado ----------------------------- 69 6.3.3 Cromatografia por exclusão molecular ----------------------------------------------- 716.4 MAPA DE PROTEÓLISE ---------------------------------------------------------------------- 73 6.5 PRODUÇÃO DE PROTEÍNA RIM8 COM USO DE INIBIDORES ESPECÍFICOS - 74 6.6 PRODUÇÃO DE ANTICORPOS ANTI-RIM8 E IMUNOCITOLOCALIZAÇÃO --- 75 7 DISCUSSÃO ------------------------------------------------------------------------------------------ 87 8 CONCLUSÃO ---------------------------------------------------------------------------------------- 87 9 PERSPECTIVAS ------------------------------------------------------------------------------------- 88 10 REFERÊNCIAS ------------------------------------------------------------------------------------ 89 11 APÊNDICE ----------------------------------------------------------------------------------------- 113 17 1 INTRODUÇÃO As infecções fúngicas invasivas (IFIs) têm emergido como problema de saúde pública em todo o mundo. Isso se deve ao alto índice de morbi-mortalidade, capacidade de elevar o tempo/custo de internação dos pacientes, e principalmente, pelo aumento de relato de IFIs como infecções nosocomiais e em indivíduos imunossuprimidos (Murray et al., 2009; Kauffman et al., 2011; Metin et al., 2011; Pfaller et al., 2011). As IFIs vêm se desenvolvendo de forma acentuada nesse grupo de indivíduos que, além de desenvolverem formas clínicas mais severas das micoses e estarem mais susceptíveis às infecções por fungos oportunistas, apresentam índices de mortalidade mais elevados (Prado et al., 2009; Ribeiro et al., 2009). Dentre os fungos causadores de micoses sistêmicas estão os oportunistas e os primários e, dentro deste último grupo está enquadrado o fungo termodimórfico causador da paracoccidioidomicose, Paracoccidioides spp. Esta doença, restrita à América Latina, é considerada a oitava maior causadora de morte entre as doenças infecciosas e parasitárias predominantemente crônicas ou recorrentes. Ela possui caráter granulomatoso e é adquirida através da instalação da levedura após a inalação de conídios encontrados na forma sapróbica no solo e vegetação (Shikanai-Yasuda et al., 2006; Koneman et al., 2008; Brasil, 2009). Há certo tempo o aumento constante da resistência a agentes antifúngicos vem sendo observado e há poucas possibilidades terapêuticas efetivas, como polienos, fluoropirimidinas, azólicos e equinocandinas (Baddley e Moser, 2004; Da Matta et al., 2007; Mikulska et al., 2011; Cuenca-Estrella, 2014). O desenvolvimento de novas drogas pode ser bastante dispendioso, demorado e apresenta grandes chances de falha. Apesar disso, nota-se a necessidade de investigar novos métodos de controle da doença ou o desenvolvimento de novas drogas antifúngicas. Nesse sentido, os métodos in silico têm se mostrado alternativas promissoras (Wills et al., 2000; Kontoyiannis e Lewis, 2002; Saidani et al., 2009; Paul et al., 2010; Kauffman et al., 2011). Em trabalho realizado por Abadio et al. (2011) foram encontrados, através de buscas realizadas na literatura, 57 genes considerados essenciais ou importantes para a viabilidade de Aspergillus fumigatus, Candida albicans e/ou Paracoccidioides lutzii (Roemer et al., 2003; Felipe et al., 2005; Hu et al., 2007). Estes genes foram utilizados como base para a realização de uma análise por genômica comparativa, visando identificar genes conservados em patógenos e ausentes no genoma humano. Foi realizado o alinhamento das sequências gênicas com o genoma de oito fungos patogênicos, sendo identificado, dentre outros, o gene essencial rim8 como um possível alvo de novas drogas antifúngicas. A sequência da proteína Rim8 foi 18 utilizada para a realização de alinhamento múltiplo, o que mostrou a presença de domínios conservados em todas as sequências fúngicas (Abadio et al., 2011). O gene rim8 codifica para uma proteína envolvida na transdução de sinal, dependente do pH, o que provoca a ativação proteolítica de um fator transcricional em resposta ao pH alcalino (Herranz et al., 2005; Herrador et al., 2010). Esta via de sinalização é aparentemente conservada entre os fungos e regula várias respostas ao ambiente alcalino. Além disso, está envolvida na patogênese, é importante para interação patógeno-hospedeiro, sendo apontada como possível alvo de novos antifúngicos (Davis, 2003; Peñalva e Arst, 2004; Bastidas et al., 2008; Davis, 2009; Cornet e Gaillardin, 2014). Considerando o exposto e tendo como base o amplo conhecimento dos aspectos biológicos e moleculares de P. lutzii pelo grupo, além do trabalho anterior realizado para a escolha de potenciais genes-alvo de novos antifúngicos, percebe-se a potencialidade de rim8 como alvo molecular de agentes antimicóticos. Assim, este trabalho visou expressar e purificar a proteína Rim8, além de fornecer suporte para futuras análises físico-químicas da proteína por técnicas biofísicas. Para isso, buscou-se produzir e purificar a proteína recombinante em sistema heterólogo e identificar sua citolocalização. 19 2 REVISÃO DE LITERATURA 2.1 INFECÇÕES FÚNGICAS INVASIVAS As micoses podem ser subdivididas em superficiais, subcutâneas e sistêmicas (também chamadas disseminadas ou invasivas) (Molinaro et al., 2009; Murray et al., 2009; Kavanagh, 2011). Nas duas últimas décadas, as infecções fúngicas invasivas (IFIs) evidenciaram-se de forma mais proeminente nas nações pouco desenvolvidas. Isso porque elas exigem maior precaução clínica, principalmente, devido ao crescente número de indivíduos com a imunidade prejudicada. Nesses casos, as micoses sistêmicas e oportunistas são achados frequentes que geram agravamento dos quadros clínicos, aumento da mortalidade e dos custos hospitalares (Vaz et al., 2007; Prado et al., 2009; Kauffman et al., 2011; Kim et al., 2011; Metin et al., 2011). O desenvolvimento de diferentes alternativas terapêuticas é claramente capaz de elevar o tempo de sobrevivência da população. Em contrapartida a isso está o crescimento do número de imunossuprimidos, tais como indivíduos em antibioticoterapia de amplo espectro prolongada, transplantados, pacientes oncológicos e portadores do vírus da imunodeficiência humana (HIV) (Vaz et al., 2007; Ribeiro et al., 2009; Kauffman et al., 2011). No Brasil estima-se que 3,8 milhões de pessoas apresentem infecções fúngicas severas, com uma incidência que pode chegar a 249 casos por ano a cada cem mil habitantes (Giacomazzi et al., 2015). As IFIs são causadas predominantemente pelos fungos Blastomyces dermatitidis, Coccidioides immitis, Histoplasma capsulatum, Paracoccidioides spp., Penicillium marneffei, Sporothrix schenckii, além dos oportunistas Aspergillus spp., Candida spp., Cryptococcus sp., Fusarium spp., Pneumocystis spp. e zigomicetos (também oportunistas) como Mucor sp. e Rhizopus sp. (Tabela 1) (Severo et al., 2010; Colombo et al., 2011; Kauffman et al., 2011; Brown et al., 2012; Sifuentes-Osornio et al., 2012; Brasil., 2013; Sirignano et al., 2014). Embora ainda sejam negligenciadas, deve-se levar em consideração que essas infecções apresentam altos índices de morbidade e mortalidade, têm diferentes níveis de severidade, além de gerarem altos custos hospitalares. Segundo Ashley et al. (2012), o custo de tratamento de uma IFI é de aproximadamente $ 32.000, podendo chegar a cerca de $ 80.000 excluindo-se desse número as comorbidades e possíveis complicações posteriores (Prado et al., 2009; Ribeiro et al., 2009; Kim et al., 2011). Sendo assim, algumas medidas devem ser adotadas para minimizar essas infecções, como a prevenção por meio de campanhas educativas, combate a fatores de risco, melhoramento de métodos diagnósticos e o 20 desenvolvimento de novas estratégias terapêuticas (Kauffman et al., 2011; Ashley et al., 2012). Tabela 1- Dados estatísticos das dez infecções fúngicas invasivas mais frequentes. * A maior partedos dados é estimada em dados disponíveis na literatura. Micoses endêmicas podem ocorrer em várias regiões do mundo, porém os dados são bastante limitados. Para esse tipo de micose, os autores realizaram uma estimativa das infecções por ano e a mortalidade em um local específico, onde há bastantes dados disponíveis. Doença (espécie mais frequente) Localização Infecções com risco de morte/ano* Taxa de mortalidade (% na população infectada)* IFIs oportunistas Aspergilose (Aspergillus fumigatus) Global > 200.000 30 – 95 Candidíase (Candida albicans) Global > 400.000 46 – 75 Criptococose (Cryptococcus neoformans) Global > 1.000.000 20 – 70 Mucormicose (Rhizopus orizae) Global > 10.000 30 – 90 Pneumocistose (Pneumocystis jirovecii) Global > 400.000 20 – 80 Micoses endêmicas por fungos dimórficos* Blastomicose (Blastomyces dermatitidis) Centro-oeste e meio- atlântico dos EUA ~ 3.000 < 2 – 68 Coccidioidomicose (Coccidioides immitis) Sudoeste dos EUA ~ 25.000 < 1 – 70 Histoplasmose (Histoplasma capsulatum) Centro-oeste dos EUA ~ 25.000 28 – 50 Paracoccidioidomicose (Paracoccidioides spp.) Brasil ~ 4.000 5 – 27 Peniciliose (Penicillium marneffei) Sudeste asiático > 8.000 2 – 75 Fonte: Adaptado de Brown et al. (2012). 2.2 FUNGOS DIMÓRFICOS Sendo adaptados a diversos ambientes, os fungos são conhecidos por serem ubíquos na natureza. Conquanto tenham sido identificadas menos de 100.000 espécies de fungos (até o ano de 2011), estima-se a riqueza fúngica global em 1,5 a 5,1 milhões de espécies (Hawksworth, 2001; O'brien et al., 2005; Kavanagh, 2011). Dentre as espécies conhecidas, cerca de 200 a 500 estão relacionadas a infecções em humanos. No entanto, somente cem espécies são capazes de causar doenças em indivíduos hígidos e apenas uma pequena parcela destas é responsável por causar a maior parte das infecções (Kauffman et al., 2011; Kavanagh, 2011). Os fungos patogênicos humanos são didaticamente divididos em patógenos primários, quando o organismo é capaz de causar infecção em indivíduos saudáveis, e patógenos 21 oportunistas, quando há a necessidade de imunossupressão do hospedeiro (Murray et al., 2009; Kavanagh, 2011). Em uma classificação microscópica básica, os fungos são designados como: (a) multicelulares ou filamentosos, quando apresentam estruturas ramificadas (hifas), crescimento apical e os esporos produzidos sendo chamados de conídios; (b) leveduriformes, quando apresentam apenas uma única célula com multinucleações, crescimento por brotamento e esporos sendo chamados de blastoconídios; (c) dimórficos, quando apresentam a habilidade de apresentarem tanto a forma filamentosa (em geral, saprofítico) quanto a leveduriforme (normalmente infecciosa) em diferentes fases do ciclo de vida. O dimorfismo permite ao organismo a adaptação ambiental, o desempenho de certas funções relacionadas ao desenvolvimento, e a capacidade de infectar o hospedeiro (Koneman et al., 2008; Murray et al., 2009; Ruiz-Herrera, 2012). Todos os agentes fúngicos patógenos primários causadores de infecções invasivas são dimórficos. Eles são conhecidos por ocasionarem infecções respiratórias através da inalação de partículas infectantes que, ao entrarem em contato com a mucosa respiratória, usam o dimorfismo como fator de virulência e adquirem sua forma infecciosa (Koneman et al., 2008; Murray et al., 2009). Sabe-se que a transição dimórfica gera, além da mudança na forma da célula, alteração na atividade metabólica, da estrutura e composição da parede celular, formação de moléculas antigênicas e expressão de características relacionadas à virulência (Felipe et al., 2005; Ruiz- Herrera, 2012). Os principais agentes desencadeantes dessa transição são a temperatura, pH, nutrientes (por exemplo, a fonte de carbono ou nitrogênio), além de condições internas capazes de induzir fatores morfogenéticos (Ruiz-Herrera, 2012). Exemplos de fungos dimórficos com seus agentes desencadeantes da transição dimórfica são exibidos na Tabela 2. 22 Tabela 2- Exemplos de fungos dimórficos e fatores desencadeantes da transição dimórfica. Espécie Fator desencadeante Exigência para formação de micélio Candida albicans Mudança na temperatura Aumento de temperatura pH Neutro Fonte de Carbono N-acetilglicosamina (GlcNAc) Outro Soro humano Coccidioides immitis Mudança na temperatura Diminuição de temperatura Paracoccidioides spp. Mudança na temperatura Diminuição de temperatura Blastomyces dermatitidis Mudança na temperatura Diminuição de temperatura Histoplasma capsulatum Mudança na temperatura Diminuição de temperatura Mucor rouxii Oxigênio Alta tensão Fonte de Carbono Não fermentável Mucor racemosus Atmosfera Aeróbica Fonte de Carbono Não fermentável Fonte: Adaptado de Ruiz-Herrera (2012). 2.3 O GÊNERO PARACOCCIDIOIDES E A PARACOCCIDIOIDOMICOSE Tanto os fungos termodimórficos do gênero Paracoccidioides spp. quanto a infecção causada por eles, a paracoccidioidomicose (PCM), foram descritos primeiramente por Adolpho Lutz (1908). Anos mais tarde, Almeida (1930) estudou a morfologia fúngica de forma mais aprofundada, descreveu o gênero Paracoccidioides e manteve a espécie brasiliensis como já havia denominado Splendore (1912). Até o ano de 2006 acreditava-se que essa era a única espécie do fungo, porém estudos filogenéticos alteraram esse preceito. Matute et al. (2006) estudaram 65 isolados do fungo e sugeriram a existência de, no mínimo, três espécies filogenéticas crípticas que formam o complexo Paracoccidioides brasiliensis: espécie 1 (S1), espécie filogenética 2 (PS2), espécie filogenética 3 (PS3). Carrero et al. (2008) analisaram sequências codificadoras e não codificadoras de 21 isolados do fungo. Desses, 20 isolados foram classificados como pertencentes a um dos três grupos descritos por Matute et al. (2006) e um isolado (Pb01) foi classificado como uma nova espécie filogenética, nomeada Pb01-like. Então, Teixeira et al. (2009) estudaram 88 isolados e identificaram 17 deles como pertencentes ao grupo Pb01-like. A partir de análises de recombinação, esse mesmo estudo demonstrou alta divergência entre Pb01-like e os outros grupos, sendo proposto que ele fosse classificado como uma nova espécie, chamada P. lutzii (Teixeira et al., 2009). Esses resultados foram corroborados por outros estudos (Salgado-Salazar et al., 2010; Desjardins et al., 2011). Por fim, Salgado-Salazar et al. (2010) apontaram que, por haverem diferenças importantes dentro do grupo, alguns isolados dentro de S1 devessem ser classificados como outra espécie filogenética pertencente ao complexo P. brasiliensis, sugerindo a existência da 23 espécie filogenética 4 (PS4), o que também é apontado por Theodoro et al. (2012) e Teixeira et al. (2014). Alguns estudos foram feitos para tentar correlacionar as diferenças filogenéticas com aspectos geográficos, genômicos, proteômicos e resistência a drogas, por exemplo (Ruiz- Herrera, 2012). Assim, descobriu-se que o grupo S1 é o mais bem distribuído, sendo encontrado na Argentina, Brasil, Paraguai, Peru, Uruguai e Venezuela; PS2 está presente no Brasil e Venezuela; PS3 é restrito à Colômbia; PS4 encontrado somente na Venezuela; e P. lutzii é encontrado predominantemente nas regiões norte e centro-oeste brasileira, apesar de não ser restrito a ela (Figura 1) (Richini-Pereira et al., 2009; Teixeira et al., 2009; Theodoro et al., 2012; Teixeira et al., 2014). Com relação à genômica, foi descoberto que P. lutzii possui um genoma maior (39,2 Mb) que isolados de S1 e PS2 (30 e 29 Mb, respectivamente), apresentando também maior quantidade de genes, menor similaridade de sequência com os outros isolados e contém aproximadamente o dobro da quantidade de elementos transponíveis no genoma (Desjardins et al., 2011). Nos aspectos bioquímicos,foram demonstrados perfis proteômicos diferentes entre representantes dos quatro grupos e que estão de acordo com a distância filogenética encontrada (S1 sendo considerada um grupo independente, PS3 mais próxima de S1 que de PS2, e P. lutzii demonstrando maior divergência entre todas). Dados relacionados à quantidade de proteínas envolvidas na glicólise e fermentação alcoólica apontam uma maior utilização do metabolismo anaeróbico em P. lutzii (Felipe et al., 2005; Pigosso et al., 2013). Outros estudos apontaram diferentes alterações entre as espécies, como o fato de isolados P. lutzii serem mais sensíveis à associação trimetoprim com sulfametoxazol, terem menor abundância do antígeno gp43 (tem papel na modulação da resposta imune e também é muito usado para o diagnóstico sorológico), e terem os conídios mais alongados que os de isolados de P. brasiliensis, corroborando o fato de serem espécies distintas (Hahn et al., 2003; Teixeira et al., 2009; Desjardins et al., 2011; Theodoro et al., 2012; Pigosso et al., 2013; Teixeira et al., 2014). Embora haja necessidade de estudos mais aprofundados, essas alterações podem trazer até mesmo manifestações clínicas diferentes, como virulência e tropismo por certos órgãos (Molinari-Madlum et al., 1999; Teixeira et al., 2014; Siqueira et al., 2016). 24 Figura 1- Distribuição geográfica dos grupos filogenéticos de Paracoccidioides spp. Fonte: Adaptado de Teixeira et al. (2009) No ambiente, a cerca de 25°C, este fungo ascomiceto vive saprofiticamente no solo, onde exibe sua forma filamentosa contendo propágulos infectantes (conídios) que são inaladas pelo hospedeiro ou, raramente, pela inoculação de esporos através da pele (Shikanai-Yasuda et al., 2006; Bocca et al., 2013; Góes et al., 2014). Ao atingir os bronquíolos e alvéolos pulmonares (36-37°C) o fungo adquire a forma de levedura e estabelece o complexo primário. Desta forma ele está apto a causar infecções profundas em órgãos e disseminar pelo corpo através da via hematogênica ou linfática. Embora algumas vezes o fungo permaneça em estado quiescente no hospedeiro (paracoccidioidomicose infecção), muitas vezes ele é reativado, gerando lesões em mucosas, pele, linfonodos, pulmões e outros órgãos (Shikanai- Yasuda et al., 2006; Koneman et al., 2008; Brasil, 2009; Molinaro et al., 2009; Da Costa e Da Silva, 2014; Fabris et al., 2014; Góes et al., 2014). A PCM é uma patologia de caráter granulomatoso que tem evolução progressiva. Ainda que variem em cada indivíduo, as manifestações clínicas podem ser divididas em: (a) forma aguda/subaguda (ou juvenil), com média a elevada severidade e presente em 3-5% dos pacientes. Comum em crianças, adolescentes e adultos jovens de ambos os sexos; 25 (b) crônica (ou adulta), com diferentes graus de severidade, com lesões uni- ou multifocais, encontrada em mais de 90% dos casos. Mais comum em homens de 30 a 60 anos; (c) sequelar (ou residual), que se caracteriza pela fibrose gerada em resposta ao processo inflamatório granulomatoso e está presente em 30,3% dos casos na forma crônica e 6,3% na aguda (Paniago et al., 2003; Shikanai-Yasuda et al., 2006; Brasil, 2009; Bocca et al., 2013). Os casos autóctones da PCM estão restritos à América Latina, com uma faixa que vai do México à Argentina. No Brasil ocorrem 80% dos casos, sendo considerada a micose sistêmica mais prevalente, porém Argentina, Colômbia e Venezuela também apresentam grande quantidade de casos (Koneman et al., 2008; Brasil, 2009; Da Costa e Da Silva, 2014; Fabris et al., 2014; Coutinho et al., 2015; Martinez, 2015). Ela afeta homens e mulheres principalmente de 30 a 50 anos de idade numa proporção de 5-15 homens para cada mulher. Essa diferença parece ocorrer devido à influência do hormônio feminino 17-β-estradiol na diminuição do crescimento das células leveduriformes e da habilidade de transição dimórfica do fungo; da diferença entre as respostas imunológicas relacionadas ao gênero sexual; ou ainda, à maior exposição do homem ao solo nas áreas rurais (Brasil, 2009; Murray et al., 2009; Pinzan et al., 2010; Shankar et al., 2011; Sifuentes-Osornio et al., 2012; Bernin e Lotter, 2014). A PCM uma doença endêmica nas zonas rurais e afeta principalmente agricultores, indivíduos que trabalham diretamente com o solo e trabalhadores da construção civil. Ela é considerada um grave problema de saúde pública, visto que gera manifestações clínicas na fase mais produtiva da vida, tem longo tempo de tratamento, alta possibilidade de incapacitar o indivíduo, altas taxas de recidivas, elevada taxa de mortalidade em indivíduos jovens e pela importância social e econômica da doença (Brasil, 2009; Pinto et al., 2012; Da Costa e Da Silva, 2014; Fabris et al., 2014). Visando avaliar a prevalência da paracoccidioidomicose infecção (subclínica), Magalhães et al. (2014) verificaram a taxa de positividade de testes intradérmicos em uma região rural de Alfenas-MG em 542 indivíduos sem manifestações clínicas, radiológicas ou sinais sorológicos de doença ativa. Foi avaliado que quase a metade (46,67%) das pessoas havia entrado em contato com o P. brasiliensis, um resultado semelhante ao encontrado em estudos parecidos feitos no estado do Paraná e em Ibiá-MG (Silva-Vergara e Martinez, 1998; Fornajeiro et al., 2005; Magalhães et al., 2014). No Brasil, segundo Prado et al. (2009), as micoses sistêmicas causaram 3583 mortes entre os anos de 1996 e 2006, com média anual de aproximadamente 325 óbitos. No estudo, a PCM foi considerada a mais fatal IFI e a décima infecção crônica mais letal, com uma média 26 anual correspondente a cerca de 50% das mortes (Prado et al., 2009). Coutinho (2002), após estudar 3181 mortes no Brasil durante 15 anos, classificou a PCM como a oitava mais comum causa de morte entre as doenças infecciosas e parasitárias predominantemente crônicas ou recorrentes. Um estudo feito entre 1998 e 2006 com dados de todo o Brasil mostrou que a PCM correspondeu a 50% das admissões em hospitais ocorridas por micose sistêmica. Revelou também que a doença é a micose sistêmica mais prevalente, tendo hospitalizações reportadas em todos os estados brasileiros durante o período de estudo (Coutinho et al., 2015). Estima-se que a incidência no Brasil seja de 7,99 casos para cada 100 mil habitantes por ano, embora estudos apontem que esse número seja de até 39,1 casos em regiões hiperendêmicas (Shikanai-Yasuda et al., 2006; Vieira et al., 2014; Giacomazzi et al., 2015; Martinez, 2015). Ainda que esses dados por si só já apresentem grande relevância, os números podem ser ainda mais significativos, levando em consideração a ocorrência de subnotificação no Brasil e principalmente em áreas rurais, onde as IFIs são mais frequentes (Prado et al., 2009; Coutinho et al., 2015). A doença possui notificação compulsória apenas em alguns estados brasileiros, a despeito da tentativa de alguns fóruns em reverter essa posição da vigilância epidemiológica brasileira. Por esse motivo, os dados epidemiológicos obtidos são baseados apenas em inquéritos e relatos clínicos (Brasil, 2009; Da Costa e Da Silva, 2014). 2.4 TRATAMENTO DA PCM De modo ideal, o tratamento para doenças que exigem antibioticoterapia deveria ser feito apenas após a identificação do agente patogênico. Na prática, essa análise prévia geralmente não é realizada e a terapêutica empírica é iniciada no momento em que há a suspeita da infecção. Além disso, em alguns casos a adoção de tratamento profilático é preferível, sobretudo em indivíduos com depressão do sistema imune, nos quais as infecções podem evoluir de forma muito rápida (Brasil, 2010). Os fármacos de primeira escolha contra IFIs como a aspergilose invasiva, candidíase disseminada, meningite criptococócica/criptococose e histoplasmose são a anfotericina B, fluconazol, itraconazol (Brasil, 2010). Para a PCM,o tratamento é feito de forma que sejam minimizados os sintomas de fase aguda (uso de drogas mais intensas) e, em seguida, o uso de medicamentos de uso prolongado até que a doença seja controlada (Shikanai-Yasuda, 2015). Ainda que haja a necessidade de avaliar a severidade da doença e dar suporte às complicações clínicas e às comorbidades existentes em alguns casos, os antifúngicos mais usados e aprovados para a terapêutica no Brasil são a anfotericina B, os derivados azólicos (fluconazol, 27 cetoconazol, itraconazol, posoconazol e voriconazol), terbinafina e sulfamídicos (sulfadiazina e associação de sulfametoxazol com trimetoprim). Nas manifestações clínicas leves a moderadas é usado o itraconazol por um período de até 18 meses, ou a associação de sulfametoxazol com trimetoprim (alternativa mais usada nos ambulatórios brasileiros), que pode ser usada por até 24 meses ou até a melhora clínica em casos de maior severidade. Nos casos considerados graves, a anfotericina B é bastante usada em regime hospitalar e o voriconazol tem sido a escolha principal para casos de neuroparacoccidioidomicose, já que apresenta maior facilidade de ultrapassar a barreira hematoencefálica (Lutsar et al., 2003; Shikanai-Yasuda et al., 2006; Brasil, 2009; 2010; Shikanai-Yasuda, 2015). Embora não sejam de indicação clínica pelo Ministério da Saúde ou Vigilância Epidemiológica no Brasil, outros antifúngicos podem ser usados na PCM e/ou outras IFIs, como as fluocitosinas, griseofulvina, posaconazol, sulfadoxina, sulfametoxipiridazina e cotrimazina (Shikanai-Yasuda et al., 2006; Brasil, 2009; 2010; Rang et al., 2012; Katzung et al., 2014). 2.5 DIFICULDADES TERAPÊUTICAS Levando em consideração que o tratamento da PCM é longo e que as próprias drogas contra o fungo podem, em certos aspectos, debilitar os pacientes, é importante salientar os problemas gerados pelas opções terapêuticas disponíveis atualmente (Shikanai-Yasuda et al., 2006; Brasil, 2010). Entre os maiores problemas do tratamento da PCM estão o abandono da terapêutica pelo paciente, os efeitos adversos das drogas disponíveis atualmente, e as sequelas causadas pela fibrose. Além disso, a resistência in vitro e in vivo aos antifúngicos vem sendo observada nos últimos tempos e ainda, há a disponibilidade de apenas cinco classes de antifúngicos contra micoses sistêmicas (Wills et al., 2000; Kontoyiannis e Lewis, 2002; Baddley e Moser, 2004; Da Matta et al., 2007; Amaral et al., 2009; Mikulska et al., 2011; Bocca et al., 2013). O uso de agentes antimicóticos para o tratamento da PCM é um fator capaz de intensificar a resposta inflamatória do hospedeiro. Isso pode levar à formação de fibrose, causando dano tecidual e disfunção do órgão afetado, podendo gerar sequelas graves ou até o óbito do paciente (Benard et al., 2012; Bocca et al., 2013). Por essa razão, em casos onde há PCM disseminada é necessária a utilização de corticosteróides e/ou antifibróticos em associação ao antifúngico (Shikanai-Yasuda et al., 2006; Brasil, 2009; Naranjo et al., 2011; Benard et al., 2012). 28 Os antibióticos derivados de sulfonamidas são análogos do ácido para-aminobenzóico e atuam na inibição competitiva de sintetase de dihidropteroato, necessária para a síntese de ácido fólico, essencial para a biossíntese de aminoácidos e ácidos nucleicos (Rang et al., 2012). Algumas das suas desvantagens são a resistência fúngica e a posologia (necessidade do uso de cerca de seis comprimidos ao dia por longos períodos), além de poder causar lesões no sistema nervoso central, causar hipersensibilidade, anemia e trombocitopenia. Embora sejam largamente utilizados no tratamento da PCM, podem falhar por conta de rápida acetilação da droga, não aderência ao tratamento e dosagem insuficiente (Shikanai-Yasuda, 2015). A anfotericina B é um antifúngico natural do grupo dos polienos descoberto em meados de 1950 e aprovado para uso em 1960. Ele possui amplo espectro e, por ser altamente anfotérico, pode ser encontrado na forma deoxicolato ou lipídica. Apresenta ação no ergosterol presente na membrana celular de fungos (Figura 2), alterando a realização de transporte, permeabilidade da célula e estresse oxidativo (Arnold et al., 2010; Kauffman et al., 2011; Vandeputte et al., 2012; Katzung et al., 2014). É o agente fungicida de escolha em casos de infecções fúngicas potencialmente fatais. No entanto, sobretudo na formulação deoxicolato, apresenta desvantagens importantes, como a nefrotoxicidade (observa-se redução da função renal em 80% dos pacientes), anemia, hepatotoxicidade, neurotoxicidade em caso de infecções intratecais e tromboflebite. Embora apresente menos reações adversas, o alto custo das apresentações lipossomais inviabiliza o seu uso em países menos desenvolvidos (Amaral et al., 2009; Brasil, 2010; Restrepo et al., 2012; Katzung et al., 2014). Relatos de desenvolvimento de resistência à anfotericina B não são frequentes. Ainda assim ela pode ocorrer em casos de modificação do ergosterol alvo na membrana celular fúngica (redução da afinidade do fármaco), por uma menor exposição da molécula relacionada à alteração na composição dos fosfolipídeos, ou por aumento das enzimas antioxidativas (Baddley e Moser, 2004; Kauffman et al., 2011; Cuenca-Estrella, 2014; Katzung et al., 2014). 29 Figura 2- Mecanismo de ação de drogas antifúngicas. Legenda: Seta com sinal negativo indica inibição do processo apontado pelas classes de antifúngicos mostradas. Fonte: Katzung et al. (2014). Os antimicóticos derivados triazólicos, são fungistáticos sintéticos de amplo espectro de ação. Tem como alguns integrantes da classe o itraconazol, posaconazol, ravuconazol, voriconazol e fluconazol, sendo que este último não é uma boa alternativa para o tratamento da PCM devido à necessidade de altas doses e tempo terapêutico. Embora cada fármaco possua suas próprias características farmacológicas, o grupo como um todo atua na enzima lanosterol demetilase do citocromo p450, inibindo a conversão de lanosterol a ergosterol (Figura 2), o que afeta a função de enzimas ligadas à membrana e interfere a replicação celular (Arnold et al., 2010; Kauffman et al., 2011; Kathiravan et al., 2012; Restrepo et al., 2012; Vandeputte et al., 2012; Katzung et al., 2014). Além da resistência intrínseca de certas espécies fúngicas, nos últimos anos tem sido observado o desenvolvimento de resistência adquirida aos azóis, o que pode se dever ao seu uso como tratamento profilático. Ela ocorre principalmente em Candida spp., e se dá através do aumento de efluxo da droga ou mutações que alteram a afinidade da molécula-alvo, por exemplo (Kontoyiannis e Lewis, 2002; Baddley e Moser, 2004; Kauffman et al., 2011; Cuenca-Estrella, 2014; Xie et al., 2014). Outras desvantagens dos triazóis são a sua ação teratogênica, alteração de enzimas hepáticas (hepatite em casos raros), grande espectro de interações medicamentosas e o fato de a apresentação oral (melhor 30 absorvida) não estar disponível no Brasil (Arnold et al., 2010; Kauffman et al., 2011; Kavanagh, 2011; Vandeputte et al., 2012; Katzung et al., 2014). As equinocandinas fazem parte do grupo de antifúngicos semissintéticos. A classe foi descoberta na década de 1970 e tem como fármacos integrantes a anidulafungina, caspofungina e micafungina. Ela atua na inibição não competitiva da síntese de 1,3-β-D- glucano sintetase, que compõe a parede celular dos fungos, levando a instabilidade osmótica e sua ruptura (Figura 2) (Sable et al., 2008; Kauffman et al., 2011; Kathiravan et al., 2012; Katzung et al., 2014). É a única classe de antimicóticos a atuar num alvo inexistente na célula de mamíferos, levando à redução dos efeitos colaterais. Pelo fato de terem mecanismo de ação diferenciado, não há resistência cruzada de polienos e azóis com as equinocandinas.Apesar disso, a resistência clínica à classe já foi relatada e, como possível mecanismo, está a mutação nos genes que codificam a enzima-alvo. Outro problema das equinocandinas se encontra no espectro de ação, atuando apenas em Candida spp., Aspergillus spp. e Penicilium spp. Apresenta baixa ação em Paracoccidiodes spp. devido à alteração da composição da parede fúngica de β-1,3-glucana para α-1,3-glucana na transição dimórfica de micélio para levedura (Kontoyiannis e Lewis, 2002; Baddley e Moser, 2004; Park et al., 2005; Singh et al., 2009; Kauffman et al., 2011; Pfaller et al., 2011; Kathiravan et al., 2012; Cuenca-Estrella, 2014; Xie et al., 2014). A fluocitosina, um antifúngico sintético descoberto na década de 1950, faz parte do grupo das fluoropirimidinas, que são análogos de pirimidina. Seu mecanismo de ação baseia- se na inibição da síntese de ácidos nucléicos (Figura 2). Ao entrar na célula, a fluocitosina é convertida a 5-fluorouracila que, por sua vez, é convertida a trifosfato de fluorouridina (integra-se ao RNA e interfere na tradução) ou a monofosfato de 5-fluorodeoxiuridina (inibe enzima envolvida na síntese do DNA) (Kauffman et al., 2011; Kathiravan et al., 2012; Katzung et al., 2014). Apesar de a enzima que permite a entrada do antimicótico na célula ser encontrada apenas em fungos, a microbiota intestinal humana é capaz de realizar a conversão a 5-fluorouracila, que possui a toxicidade à medula óssea como o efeito adverso de maior relevância desta classe. Apesar disso, possui limitado espectro de ação, e não é indicada para uso em monoterapia devido ao acelerado desenvolvimento de resistência (é usada combinada com azóis ou anfotericina B), e não há liberação para uso clínico no Brasil (Severo et al., 2009; Kavanagh, 2011; Kathiravan et al., 2012; Xie et al., 2014). 31 2.6 ALTERNATIVAS TERAPÊUTICAS Tendo em vista as dificuldades encontradas no tratamento das IFIs utilizando antifúngicos tradicionais, as limitadas opções terapêuticas e a diminuição de avanços substanciais nos últimos anos, nota-se a necessidade de criar alternativas terapêuticas viáveis para a prática clínica (Wills et al., 2000; Ostrosky-Zeichner et al., 2010; Kavanagh, 2011; Xie et al., 2014). Nesse sentido, podem ser destacadas a utilização de tecnologias in silico para identificação de alvos moleculares e desenvolvimento de novas drogas antifúngicas, as drogas nanoestruturadas e o desenvolvimento de imunoterapias profiláticas ou terapêuticas combinadas com agentes antimicóticos (Ostrosky-Zeichner et al., 2010; Kavanagh, 2011; Bocca et al., 2013; Xie et al., 2014). O uso de partículas nanoestruturadas desenvolvidas para a entrega de drogas é uma técnica bastante estudada nos últimos anos. Por realizar a liberação do fármaco de forma lenta e gradual, é capaz de minimizar a toxicidade, aumentar solubilidade, biodisponibilidade e diminuir a quantidade de aplicações. Exemplos de uso dessa técnica são o cetoconazol nanoestruturado, anfotericina B lipossomal, nanoestruturas de prata e ouro (Bocca et al., 2013; Tang et al., 2013; Jebali et al., 2014). A terapia imunomodulatória atua na tentativa de adequação da resposta imunológica do indivíduo após compreender a interação patógeno- hospedeiro. Com isso, é capaz de estimular uma resposta efetiva contra o agente infeccioso em si e/ou diminuir respostas inflamatórias que gerem consequências indesejáveis (como é o caso da fibrose na PCM). Como exemplo, pode-se citar o uso de pentoxifilina, interferon- gama e terapias gênicas (Dignani et al., 2005; Sable et al., 2008; Ribeiro et al., 2010; Safdar, 2010; Lopera et al., 2015). A pesquisa e o desenvolvimento de drogas são abrangentes, dispendiosos, consomem muito tempo e apresentam altos riscos. Estima-se que o tempo necessário para o desenvolvimento de uma nova droga desde as pesquisas laboratoriais até a sua chegada ao mercado seja de cerca de 15 anos. E ainda, que requer um investimento estimado de 800 milhões a 1,8 bilhões de dólares, dependendo do alvo terapêutico e levando em consideração a alta porcentagem de falha nos ensaios clínicos (Adams e Brantner, 2010; Paul et al., 2010; Csermely et al., 2013). No passado, várias drogas foram descobertas de forma acidental, por modificação de moléculas e estratégias in vivo. No entanto, métodos in silico surgiram com o avanço da tecnologia computacional e, juntamente com o progresso da biologia molecular, tornou-se possível o sequenciamento, construção e anotação de genomas (Lima, 2007). Esses avanços levaram à criação de banco de dados essenciais para a identificação de alvos 32 moleculares, triagem de bibliotecas de moléculas fármaco-similares (virtual screening), triagem biológica automatizada em larga escala (high throughput screening - HTS) ou ultra larga escala (UHTS), facilitando o desenvolvimento e aprimoramento de novas drogas de forma mais eficiente e vantajosa (Reddy et al., 2007; Saidani et al., 2009; Ferreira et al., 2011; Thiel et al., 2012; Wang et al., 2013). Uma estratégia bastante promissora para o descobrimento de alvos de drogas antifúngicas é a identificação de genes conservados essenciais para o crescimento do patógeno, avaliando a capacidade de genes e/ou seus produtos de serem alvos de drogas. É indiscutível que o papel dos bancos de dados alimentados com o genoma humano e de fungos patogênicos é essencial para essa avaliação (Hu et al., 2007; Birkholtz et al., 2008; Choi et al., 2013). Nesse sentido, Abadio et al. (2011) revisaram a literatura e encontraram 57 genes considerados essenciais ou importantes para a viabilidade de Aspergillus fumigatus, Candida albicans e/ou Paracoccidioides lutzii (Roemer et al., 2003; Felipe et al., 2005; Hu et al., 2007). Essa apreciação inicial serviu como ponto de partida para a análise desses genes através de genômica comparativa. Assim, Abadio et al. (2011) identificaram genes ortólogos ausentes no genoma humano e presentes em fungos patogênicos humanos de grande relevância (Aspergillus fumigatus, Blastomyces dermatitides, Candida albicans, Cryptococcus neoformans, Coccidioides immitis, Histoplasma capsulatum, Paracoccidioides lutzii e dois isolados de P. brasiliensis dos grupos S1 e PS2). Esta análise apontou dez genes não auxotróficos conservados nas espécies analisadas (Tabela 3). 33 Tabela 3- Genes selecionados como potenciais alvos de novas drogas antifúngicas. * Estrutura ausente no PDB (http://www.rcsb.org/pdb/home.do). Gene Processo biológico Citolocalização Molde PDB Organismo E- value Identidade de sequência (%) trr1 Homeostase redox celular Citoplasma 3ITJ Saccharomyces cerevisiae 3e-115 65 1VDC Arabidopsis thaliana 1e-94 57 aur1 Metabolismo celular Complexo de Golgi e membrana plasmática * * * * mak5 Biogênese do ribossomo Nucléolo 1HV8 Methanocaldococcus jannaschii 7e-42 30 chs1 Biogênese/degradação da parede celular Membrana plasmática * * * * tom40 Transporte de proteína Membrana mitocondrial 2QK9 Homo sapiens 0,8 34 kre6 Biogênese/degradação da parede celular Membrana do complexo de Golgi 2VY0 Pyrococcus furiosus 6e-4 32 fhs1 Organização/biogênese da parede celular Membrana plasmática 1R1M Neisseria meningitidis 0,3 32 kre2 Manosilação de proteínas Membrana do complexo de Golgi 1S4N Saccharomyces cerevisiae 6e-96 50 erg6 Biossíntese do ergosterol Membrana do retículo endoplasmático 3BUS Lechevalieria aerocolonigenes 5e-18 32 rim8 Regulador de resposta ao pH Citoplasma 3G3L Bacteroides fragilis 3,9 38 Fonte: Adaptado de Abadio et al. (2011). Para seleção dos melhores alvos desta lista, os seguintes critérios foram aplicados: ser essencial ou importante para a viabilidade da célula fúngica; não ser auxotrófico; codificar, preferencialmente, umaenzima; e possuir localização celular potencialmente acessível a drogas, tendo prioridade as proteínas com estrutura tridimensional conhecida. Assim, foram selecionados quatro candidatos a alvo molecular de drogas, são eles: trr1 (codifica enzima essencial), rim8 (codifica proteína não enzimática predita como essencial), kre2 e erg6 (codificam enzimas importantes para a viabilidade celular) (Roemer et al., 2003; Hu et al., 2007; Abadio et al., 2011). Estes genes alvos foram divididos entre os alunos componentes do projeto Pronex “Pós-genoma de fungos patogênicos humanos visando o desenvolvimento de novas drogas antifúngicas” e, portanto, estão sendo mais bem estudados de forma independente por cada membro do grupo. Esta dissertação trata especificamente sobre o gene rim8. De modo a demonstrar a presença de domínios conservados em todas as sequências fúngicas, as sequências polipeptídicas codificadas pelos alvos foram utilizadas para a 34 realização de alinhamento múltiplo (Abadio et al., 2011). O alinhamento das sequências de proteína Rim8/PalF (homólogas) é apresentado na Figura 3. Figura 3- Alinhamento múltiplo das sequências de aminoácidos de Rim8 de fungos patogênicos humanos. O resíduo de aminoácido Ser-86 de C. albicans na região N-terminal, responsável pela sinalização de pH através da interação entre PalF e Pal-H, foi alterado de forma semiconservativa por Cys-75 em B. dermatitidis, H. capsulatum e P. brasiliensis, por Cys-76 em C. immitis e por Cys-77 em A. fumigatus. O resíduo Ile-331 de C. albicans encontrado na região C-terminal, relacionada à interação entre PalF e PalH, estava conservado em todos os fungos analisados, embora localizado na posição 320 em P. brasiliensis. Legenda: Af: Aspergillus fumigatus, Bd: Blastomyces dermatitidis, Ca: Candida albicans, Ci: Coccidioides immitis, Cn: Cryptococcus neoformans, Hc: Histoplasma capsulatum, Pb01: Paracoccidioides brasiliensis isolado 01, Pb3: P. brasiliensis isolado 3, Pb18: P. brasiliensis isolado 18. Asteríscos (*) indicam posições de identidade; dois pontos (:) sugerem substituições conservadas; e pontos (.) identificam substituições semiconservadas. Fonte: Adaptado de Abadio et al. (2011). 2.7 VIA RIM/PAL DE REGULAÇÃO DO PH As arrestinas são proteínas adaptadoras importantes para a regulação do transporte intracelular de receptores, canais e transportadores de membrana através da facilitação de endocitose (Lefkowitz e Shenoy, 2005; Moore et al., 2007; Alberts et al., 2010; Becuwe et al., 2012; Herrador et al., 2015). O tráfico endocítico, que ocorre da membrana plasmática para o endossomo, envolve a transdução de sinal dependente do pH (Peñalva e Arst, 2004; Herranz et al., 2005). Embora possuam algumas diferenças, esta via de sinalização é conservada entre os fungos deuteromicetos, ascomicetos e basidiomicetos. Ela já foi bem caracterizada em Aspergillus nidulans (Orejas et al., 1995; Andersen et al., 2009; Bignell, 35 2012), Saccharomyces cerevisiae (Denison et al., 1998; Lamb et al., 2001; Obara et al., 2012), Candida albicans (Porta et al., 1999; Davis et al., 2000; El Barkani et al., 2000; Davis, 2003; Li et al., 2007) e Yarrowia lipolytica (Lambert et al., 1997; Gonzalez-Lopez et al., 2006; Blanchin-Roland et al., 2008; Blanchin-Roland, 2011). A existência de um gradiente de pH na membrana plasmática é cessada quando o pH fora da célula se assemelha ao intracelular, podendo ocorrer deficiência na captação de íons e nutrientes e, por conseguinte, dificuldade na manutenção da parede e membrana celular (Lamb et al., 2001). A via RIM/PAL regula várias respostas ao ambiente alcalino, incluindo a ativação de genes de resposta alcalina, reprimindo os genes de resposta ao ambiente ácido. Os genes regulados pelo pH incluem os que codificam para enzimas secretadas, permeases, enzimas intracelulares que participam da síntese de produtos exportados, como toxinas e antibióticos. Além disso, estes genes possuem relação com biossíntese de parede/membrana, dimorfismo, esporulação, metabolismo de ferro, cobre, homeostase iônica, adesão, formação de biofilme, invasão de tecidos e formação da cápsula de C. neoformans (Davis et al., 2000; Davis, 2003; Bignell et al., 2005; Herranz et al., 2005; Peñalva et al., 2008; Davis, 2009; O'meara et al., 2010; Bertuzzi et al., 2014; Cornet e Gaillardin, 2014; Marques et al., 2015). Em leveduras, os genes que estão envolvidos na cascata, rim20, rim13, rim23, rim8, rim21, rim9 e rim101 são homólogos, respectivamente, a palA, palB, palC, palF, palH, palI, e pacC em A. nidulans (Peñalva e Arst, 2004; Peñalva et al., 2008; Bignell, 2012; Cornet e Gaillardin, 2014). Em C. albicans, dois homólogos da via RIM foram identificados, rim101 e rim8, também conhecidos como prr2 e prr1, respectivamente (Porta et al., 1999; El Barkani et al., 2000). PalF (para fungos filamentosos) ou sua ortóloga Rim8 (para leveduras), contém os domínios amino-terminal (N-terminal) e carboxi-terminal (C-terminal) similares à arrestina. A proteína, também chamada de ART9 (por ser um adaptador de tráfego relacionado à arrestina), liga-se fortemente a duas regiões diferentes no domínio C-terminal da cauda citoplasmática do receptor com sete domínios transmembrana (TMD) PalH/Rim21 (uma proteína de sensibilidade ao pH do ambiente) (Lin et al., 2008; Becuwe et al., 2012; Herrador et al., 2013; Herrador et al., 2015). Assim, ela funciona como um conector entre o receptor 7TMD Rim21 e a subunidade Vps23 do complexo endossomal de distribuição necessário para transporte (ESCRT, do inglês endosomal sorting complex required for transport). O recrutamento de ESCRT cria uma plataforma de sinalização para a ativação proteolítica do fator transcricional Rim101 na via de sinalização RIM/PAL de sensibilidade ao pH alcalino (Herrador et al., 2010; Hervas-Aguilar et al., 2010; Maeda, 2012). 36 De forma mais detalhada, já foi descrito que em Y. lipolytica e S. cerevisiae a via RIM (Figura 4) é ativada pela percepção de neutralização/alcalinização do pH pela maquinaria de sensibilidade ao pH. Essa maquinaria está presente na membrana plasmática, e dela fazem parte as proteínas 7TMD Rim21 (sensor putativo) com seu parálogo Dfg16, 3TMD Rim9, Rim23 e Rim8 (Calcagno-Pizarelli et al., 2007; Galindo et al., 2012; Obara et al., 2012; Smardon e Kane, 2014). Ao ocorrer, em pH neutro-alcalino, a ligação de Rim8 na região C- terminal da Rim21, ocorre a ubiquitinação de Rim8 pela E3 ubiquitina ligase Rsp5 (Herranz et al., 2005; Lefkowitz e Shenoy, 2005; Hervas-Aguilar et al., 2010; Herrador et al., 2015). O motivo SXP de Rim8 ubiquitinado medeia a ligação aos domínios Bro1 de Rim23 e ao domínio variante E2 de ubiquitina de Vps23 (componente do ESCRT-I). Essa interação é responsável por gerar a endocitose do complexo (embora estudos mais recentes apontem que toda a via ocorre em sítios pontuais da própria membrana plasmática) (Xu et al., 2004; Herrador et al., 2010; Galindo et al., 2012; Obara e Kihara, 2014; Lucena-Agell et al., 2015). As proteínas Vps dos complexos ESCRT se relacionam para a formação do corpo multivesicular do endossomo. O sinal gerado pelas proteínas do ESCRT, juntamente com a cascata ativada pela alteração do pH, leva ao recrutamento das proteínas citosólicas Rim23, Rim20, Rim13 para o endossomo, onde se associam (Lefkowitz e Shenoy, 2005; Peñalva et al., 2008; Herrador et al., 2010; Blanchin-Roland, 2011; Galindo et al., 2012). Rim23 e Rim20 interagem com o subcomplexo Vps20/Vps32/Snf7, proteínas chave do ESCRT-III, enquanto Vps24 recruta e provavelmente, ativa a protease sinalizadora Rim13 (Herrador et al., 2010; Maeda, 2012; Cornet e Gaillardin, 2014; Obara e Kihara, 2014). Rim13, Rim20 e Rim23 formamo complexo de sinalização endossomal, realizando o recrutamento de Rim101. Rim20 medeia a interação entre Snf7, Rim13 e Rim101, o que gera a ativação do fator de transcrição Rim101 por proteólise citoplasmática. Ao ser ativado ele é translocado ao núcleo, onde reprime o gene nrg1 (Herranz et al., 2005; Peñalva et al., 2008; Cornet et al., 2009; Herrador et al., 2010; Subramanian et al., 2012; Ost et al., 2015). Como resultado da repressão do gene nrg1, um repressor de genes de resposta alcalina, ocorre a ativação destes genes (Lamb e Mitchell, 2003). É importante salientar que foi demonstrado que a porção N- terminal é essencial para ativação da cascata e interação entre Rim8 e Rim21 (Herranz et al., 2005). Além disso, por ser uma arrestina, Rim8 é regulada por ubiquitinação (recrutamento de ESCRT) e fosforilação (Becuwe et al., 2012). Em S. cerevisiae, foi proposto que o papel da fosforilação da proteína (por caseína quinase 1) é de evitar o acúmulo de Rim8 na membrana plasmática e inibir a via de sinalização RIM na ausência de estímulo por alcalinização extracelular (Herrador et al., 2015). 37 Figura 4- Modelo de recrutamento da maquinaria ESCRT mediada por Rim8 Em pH alcalino o receptor PalH/Rim21-Dfg16 é ativado, transmitindo um sinal para a fosforilação e ubiquitilação de Rim8/PalF pela ligação na região C-terminal de Rim21/PalH. Rim8/PalF ubiquitilada se liga a Vps23 e a Rim23/PalC, sendo todo este complexo endocitado (possivelmente) e recrutando toda a maquinaria ESCRT do corpo multivesicular endossomal, além das proteínas Rim13/PalB e Rim20/PalA. Rim23/PalC e Rim20/PalA se ligam a Vps32 e Vps20, enquanto Rim13/PalB se liga a Vps24, o que leva ao recrutamento de Rim101/PacC. Este fator de transcrição é ativado proteoliticamente por Rim13/PalB e é levada ao núcleo, onde atua sob genes de resposta ao pH (não mostrado na ilustração). Em A. nidulans toda a sinalização ocorre na membrana plasmática e o processo de proteólise consiste em duas etapas; em C. albicans Rim8 é hiperfosforilado e acredita-se que ele interaja com Rim21 e Rim101 de forma direta, não sendo conhecido o papel da Vps23. Legenda: Ub – ubiquitinação; P – fosforilação; interrogação (?) – processo ainda não confirmado. Fonte: Adaptado de Cornet e Gaillardin (2014). As diferenças dessa via em A. nidulans (no qual a via é chamada PAL – Figura 4) encontram-se no fato de a proteólise possuir uma segunda etapa de processamento; de os parálogos Rim21-Dfg existirem como apenas uma proteína (PalH); de alguns componentes da cascata possuírem função parecida, mas não idêntica à encontrada nas leveduras hemiascomicetas; e de o fator de transcrição PacC/Rim101 atuar diretamente em “genes ácidos e alcalinos” (Orejas et al., 1995; Galindo et al., 2007; Peñalva et al., 2008; Hervas- 38 Aguilar et al., 2010; Bignell, 2012; Galindo et al., 2012; Lucena-Agell et al., 2015). Em C. albicans (Figura 4), uma das maiores diferenças é que Rim8 é hiperfosforilada ao invés de ubiquitinada, sendo que os mesmos fatores requeridos para fosforilação de Rim8 são necessários para ativação de Rim101. Outra variação é que a importância de Vps23 para a via ainda não foi descoberta, sendo que a associação do complexo de sinalização é feita com a Vps32 (que também realiza o recrutamento de Rim20, Rim13 e Rim101). Além disso, foi demonstrado que Rim8 pode se associar com Rim21 e Rim101, sendo sugerido que Rim8 forma uma “ponte” entre o complexo de sinalização e a proteólise de Rim101 (Porta et al., 1999; Davis et al., 2000; Davis, 2003; Cornet et al., 2009; Gomez-Raja e Davis, 2012). Os estudos desta via ainda são incipientes no basidiomiceto C. neoformans, mas indicam que não possui homólogos para o complexo sensorial presente na membrana de ascomicetos; e que a proteólise ocorre em duas etapas, sendo dependente da via de adenosina monofosfato cíclico (AMPc) e proteína quinase A. Apesar de não terem sido encontradas sequências similares entre as proteínas de sinalização de C. neoformans e de ascomicetos, a estrutura preditiva demonstrou a presença de 7TMD, sugerindo similaridade a Rim21/PalH. Além disso, evidenciou-se que a via ocorre na membrana plasmática e que a mesma está relacionada com a regulação da cápsula (O'meara et al., 2010; Ost et al., 2015). Estudo realizado com mutantes de componentes da via RIM/PAL (Vps28 e Vps32) em C. albicans demonstrou hipersensibilidade das cepas a antifúngicos com ação na parede celular (como as equinocandinas). Também foi verificada a diminuição da resistência a triazóis em todos os mutantes, sendo que a mutação levou os compostos a possuírem ação fungicida ao invés de fungistática (Cornet et al., 2006). Em cepas de A. fumigatus mutantes da via Pal, foi demonstrada maior suscetibilidade a azóis e anfotericina B pela instabilidade de membrana gerada e perda da homeostase de cátions pela alteração em transportadores catiônicos (Haas, 2012). 2.8 PROTEÍNA RIM8 A proteína não enzimática Rim8, também conhecida como PalF, Prr1 ou Art9, é essencial na via de sinalização de pH. Estudos demonstram que mutações em Rim8 e Rim101 levam à redução da virulência, de lesão histológica e da capacidade danosa ao endotélio em C. albicans (Davis et al., 2000; Bignell et al., 2005). Estudos recentes apontam que Rim8 e Rsp5 também estão envolvidas na ubiquitinação de Pma1 (bomba de exportação de prótons) em leveduras deficientes da bomba H + -ATPase vacuolar (responsável pela acidificação de 39 organelas). A associação dessa deficiência a mutações em Rim8 levaram à geração de leveduras com crescimento bastante lento, sendo a proteína considerada um componente crítico desta via (Smardon e Kane, 2014; Kane, 2016). Essa cascata de sinalização é considerada importante alvos de novas drogas antifúngicas, visto que a mudança de pH é uma causa de estresse extracelular à qual o microrganismo deve se adaptar muito rapidamente para realizar a interação patógeno- hospedeiro, desenvolver doença e aumentar sua virulência (Davis et al., 2000; Bahn et al., 2007; Bastidas et al., 2008; Davis, 2009; Bertuzzi et al., 2014; Cornet e Gaillardin, 2014). A partir de buscas na base de dados de nucleotídeos GenBank ® do National Center for Biotechnology Information (NCBI) é possível identificar a sequência gênica de rim8 de Paracoccidioides lutzii (número de acesso XM_002791656.1) (Benson et al., 2009; Sayers et al., 2009; Desjardins et al., 2011). A região codificadora possui 2.343 pb e gera a proteína “pH-response regulator protein palF/RIM8” de 780 aminoácidos, que possui 86.316,8 Da de massa molecular e ponto isoelétrico de 6,57, de acordo com a ferramenta Protparam (ExPASy) (Gasteiger et al., 2005). Ao avaliar a predição de sítios conservados na Conserved Domains Database (NCBI) obtêm-se duas regiões arrestin-like nos domínios N-terminal e C-terminal (Marchler- Bauer et al., 2015), corroborando os dados obtidos por Abadio et al. (2011). Na base de dados do Universal Protein Resource Knowledgebase (UniProtKB) a proteína foi depositada com a entrada C1H6Q0, porém é relatado apenas o domínio arrestin-like N-terminal (Magrane e Consortium, 2011). Essa base de dados reúne informações de diversas outras e dentre elas, a STRING 10, que apresenta como possíveis parceiros funcionais as proteínas Rim21, Rim101, E3 ubiquitina-ligase Rsp5, Rim13, Vps-Bro1, Rim20 e Vps-Snf7 (Szklarczyk et al., 2015). É possível prever ortólogos e função gênica a partir do programa OrthoDB (Kriventseva et al., 2015), cujos dados são integrados aos de outras bases de dados, como o Uniprot. A proteína Rim8 de P. lutzii está contida no grupo EOG8ZCRKW (análise em todos os fungos) contendo 190 genes ortólogos em 161 espécies fúngicas, dos quais 163 possuem o domínio arrestin-like N-terminal, 127 possuem immunoglobulin E-set e 122 possuem arrestin-like C-terminal. Dentre os
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