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CENTRO DE ENSINO SUPERIOR DO CEARÁ FACULDADE CEARENSE CURSO DE BACHARELADO EM SERVIÇO SOCIAL DÉBORAH HOLANDA DE SOUZA A IMPORTÂNCIA DO SERVIÇO SOCIAL NA EDUCAÇÃO NA PERCEPÇÃO DAS ASSISTENTES SOCIAIS DO INSTITUTO FEDERAL DO CEARÁ (IFCE) FORTALEZA 2013 DÉBORAH HOLANDA DE SOUZA A IMPORTÂNCIA DO SERVIÇO SOCIAL NA EDUCAÇÃO NA PERCEPÇÃO DAS ASSISTENTES SOCIAIS DO INSTITUTO FEDERAL DO CEARÁ (IFCE) Monografia apresentada ao curso de graduação em Serviço Social do Centro de Ensino Superior do Ceará, como requisito parcial para a obtenção do grau de Bacharel em Serviço Social. Orientadora: Profª. Geórgia Patrícia Guimarães dos Santos FORTALEZA 2013 Bibliotecário Marksuel Mariz de Lima CRB-3/1274 S719i Souza, Déborah Holanda de A importância do Serviço Social na educação na percepção das Assistentes Sociais do Instituto Federal do Ceará (IFCE) / Déborah Holanda de Souza. Fortaleza – 2013. 73f. Orientador: Prof.ª Dr.ª Geórgia Patrícia Guimarães dos Santos. Trabalho de Conclusão de curso (graduação) – Faculdade Cearense, Curso de Serviço Social, 2013. 1. Educação. 2. Serviço Social. 3. Prática profissional. I. Santos, Geórgia Patrícia Guimarães dos. II. Título CDU 36(813.1) DÉBORAH HOLANDA DE SOUZA A IMPORTÂNCIA DO SERVIÇO SOCIAL NA EDUCAÇÃO NA PERCEPÇÃO DAS ASSISTENTES SOCIAIS DO INSTITUTO FEDERAL DO CEARÁ (IFCE) Monografia apresentada como pré-requisito para obtenção do título de Bacharel em Serviço Social, outorgado pela Faculdade Cearense - FAC, tendo sido aprovada pela banca examinadora composta pelos professores. Data de aprovação: _____/_____/_____ BANCA EXAMINADORA _______________________________________________________ Orientadora Drª. Geórgia Patrícia Guimarães dos Santos _______________________________________________________ Professora Ms. Eliane Nunes de Carvalho _______________________________________________________ Professora Ms. Idenilse Maria Moreira À minha mãe que sempre incentivou e contribuiu no processo da minha formação. Ao meu amor, Fábio, pela compreensão, carinho e estímulo, que foram essenciais na construção desse trabalho. AGRADECIMENTOS Talvez eu não consiga, em palavras, agradecer a todos que contribuíram e que me apoiaram durante essa longa caminhada, mas tentarei expressar aqui o que sinto nesse momento. Primeiramente tenho que agradecer a Deus, pela sua presença em minha vida, que me fortaleceu e iluminou o meu caminho durante todo o trajeto percorrido para atingir o meu objetivo de concluir esse curso. Nos momentos de fraqueza foi ele a fonte que busquei coragem para continuar e superar os obstáculos, como também tenho que agradecer por todas as bênçãos alcançadas nesse ano de 2013. Sem esquecer de agradecer o principal presente que ele me concedeu: a minha família, pois sem ela eu nada seria. A todos os meus familiares que tanto torcem por mim, e por seus ensinamentos. Com eles aprendi a respeitar, a conviver e a valorizar a vida. Em especial, agradeço a minha mãe que sempre me incentivou; tenho admiração por sua simplicidade, garra e dedicação como mulher, mãe e trabalhadora; ao meu pai, pelo seu lado protetor e ao meu irmão que, apesar das diferenças de pensamento, com seu jeito desenrolado e brincalhão me mostrou que, às vezes, é necessário arriscar. Ao meu esposo, namorado, amigo e fiel companheiro, Fábio. A esse não sei nem por onde começar a agradecer, pois ele dedicou tempo, incentivou, participou, esperou (e como esperou!) durante esses quatro anos. Posso dizer que ele esteve presente em todos os momentos dessa jornada, pois sempre me conduziu no trajeto trabalho - faculdade – casa, e até os conteúdos “chatos” ele estudou comigo; sempre paciente, compreensivo, dedicado, cuidadoso, me tranquilizando quando achava que não iria conseguir. Sem ele, realmente, eu não teria conseguido. Te amo muito! A todos os professores do Curso de Serviço Social, que através do seu conhecimento buscaram transmitir os ensinamentos para uma boa formação profissional, sempre alertando que esse processo nunca se esgota, e que enquanto profissionais devemos estar em constante aprimoramento. A minha orientadora, Geórgia Patrícia, pela dedicação de seu tempo. Pelo pouco contato consegui perceber que é uma pessoa simpática e simples, sempre transmitindo tranquilidade em sua fala, passando-me confiança e estímulo. Ela, sem dúvida, contribuiu como professora e pesquisadora para os direcionamentos desse trabalho. As minhas colegas de faculdade, pois não somente dividimos o mesmo espaço durante esse período de convivência, mas compartilhamos saberes e inquietações necessárias para a formação profissional. Principalmente, as minhas amigas Ana Maria e Gessyca Correia, pela afinidade adquirida, pois durante esses quatro anos fizemos tantos trabalhos juntas, foram várias as noites acordadas em frente do computador, e essas companheiras de jornada dividiram todos os sentimentos vivenciado nessa fase: ansiedade, angústias, tristezas e alegrias. Elas passaram a ser muito mais do que colegas de faculdade: foram ouvintes e conselheiras; espero que sejamos amigas para sempre, se Deus quiser! A todas as minhas colegas que sempre disseram: “você vai conseguir!”, “vai dar certo!”, “você é batalhadora, vai ser recompensada!”, “tenha fé!”. Todas essas palavras me passaram confiança, coragem e força. As minhas supervisoras de campo e a todas as profissionais de Serviço Social que atuam no Hospital Nossa Senhora da Conceição (HNSC), pois esse espaço propiciou a prática de estágio, possibilitando a oportunidade de articular teoria e prática, de forma a perceber as dificuldades e demandas no cotidiano profissional. As profissionais que participaram desse estudo, pela dedicação do tempo e pela colaboração com seus depoimentos, pois sem elas essa pesquisa não se concretizaria. Enfim, a todas as pessoas que, de alguma maneira, contribuíram para a realização desse sonho, que não se finaliza nesse trabalho; pelo contrário, esse é apenas mais um passo na longa caminhada que ainda está por vir. “Que os vossos esforços desafiem as impossibilidades, lembrai-vos de que as grandes coisas do homem foram conquistadas do que parecia impossível”. Charles Chaplin RESUMO Este Trabalho de Conclusão de Curso apresenta as reflexões a respeito da prática do profissional de Serviço Social, obtidas na aproximação com os assistentes sociais de um dos campi do Instituto Federal do Ceará (IFCE), com o objetivo de conhecer a percepção desses profissionais sobre a educação, além de suas dificuldades, possibilidades e importância em atuar nesse espaço. Para isso, além do contato com os sujeitos, buscou-se uma apropriação de estudos e bibliografias que envolvessem essa temática. Com esta pesquisa, compreendeu-se que a atuação desse profissional na educação possibilita a orientação dos indivíduos sobre seus direitos, revelando a necessidade da diversidade de saberes que as assistentes sociais precisam ter para realizar suas ações com fundamentação teórica metodológica. Esta pesquisa também revelou a imensa demanda no espaçoeducacional, devido a crescente expressão da questão social, sendo, assim, necessária a inserção de mais profissionais, como também essencial avaliar os projetos e programas, para não ocorrer soluções apenas no nível paliativo, sem contemplar a totalidade. Enfim, constatou-se que a atuação desse profissional pode contribuir para a mobilização de uma sociedade democrática, mas que ele necessita de apoio na construção desse processo. Palavras-chaves: Educação. Serviço Social. Prática profissional. ABSTRACT This work presents the End of Course reflections on the practice of social work professional, obtained in approaching social workers of one of the campuses of the Federal Institute of Ceará ( IFCE ), aiming to understand the perception of these professionals about education in addition, their difficulties, possibilities and importance of acting in this space. For this, as well as contact with the subjects, we sought to appropriate studies and bibliographies involving this subject. With this research it was realized that the performance of this professional education enables guiding individuals on their rights, revealing the need for diversity of knowledge that social workers need to have to perform their actions with methodological theoretical foundation. This survey revealed the immense demand in the educational space due to increased expression of the social question, and the inclusion of more professionals are needed, it is also essential to evaluate projects and programs for non palliative solutions occur only in level, without taking the whole. Anyway, it was found that the performance of this professional can contribute to the mobilization of a democratic society, but he needs support in building this process. Keywords: Education, Social Work. Professional practice. LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS AS – Assistente Social IFCE – Instituto Federal do Ceará PROTEC – Programa de Expansão e Melhoria do Ensino Técnico LDB – Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional UNESCO – Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura CISS – Conferência Internacional de Serviço Social UCISS – União Católica Internacional de Serviço Social CFESS – Conselho Federal de Serviço Social CRESS – Conselho Regional de Serviço Social SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO ................................................................................................................. 12 2 PERCURSO METODOLÓGICO DA PESQUISA .......................................................... 14 2.1 Construção da pesquisa ..................................................................................................... 14 2.2 O Cenário da Pesquisa ....................................................................................................... 17 2.3 Perfil dos sujeitos pesquisados .......................................................................................... 22 3 SOCIEDADE E EDUCAÇÃO: ASPECTOS HISTÓRICOS E CONCEITOS TEÓRICOS. .............................................................................................................................. 24 3.1 Educação: diferentes concepções que marcam sua importância ....................................... 24 3.2 Breve histórico da educação brasileira .............................................................................. 31 3.3 A educação como uma questão de direito. ........................................................................ 37 3.4 A educação como instrumento de transformação. ............................................................. 40 4 A INSERÇÃO DO SERVIÇO SOCIAL NA EDUCAÇÃO: EXPERIÊNCIAS, DESAFIOS E POSSIBILIDADES ........................................................................................... 46 4.1 O Serviço Social no âmbito educacional ........................................................................... 46 4.2 A articulação e a luta pela inserção do Serviço Social nas instituições educacionais ....... 49 4.3 As ações, dificuldades e possibilidades do profissional de Serviço Social na educação .. 52 4.4 O Assistente Social como participante da transformação. ................................................ 59 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................................................ 64 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ..................................................................................... 67 APÊNDICES ............................................................................................................................ 70 12 INTRODUÇÃO O objetivo desta pesquisa é investigar a prática profissional do Serviço Social em uma instituição federal de ensino, a fim de compreender sua concepção de educação e as atribuições dentro dessa unidade, refletindo sobre as dificuldades encontradas em atuar nesse espaço e percebendo como o assistente social reconhece sua importância nas instituições educacionais. Compreende-se que o espaço educacional apresenta uma diversidade de questões sociais nas quais estão inseridas as relações de vários sujeitos como alunos, educadores, família e comunidade. Assim, busca-se conhecer como o profissional de serviço social atua nas relações desse espaço e como uma intervenção interdisciplinar pode possibilitar uma maior ampliação do conhecimento e uma reflexão da realidade. A educação é um fator de grande importância para o desenvolvimento do indivíduo na sociedade e preocupante na atualidade, pois sabe-se que ela enfrenta uma variedade de problemas como: a violência escolar, o uso indevido de drogas, as dificuldades de aprendizagem dos estudantes e o baixo rendimento escolar, entre muitas outras. Além disso, a educação é uma temática com forte significado para a sociedade, que, atualmente, sofre com a exigência do sistema econômico, o qual requer do homem qualidade em sua formação. A educação é, segundo o artigo 205 da Constituição Federal de 1998, “direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho” (BRASIL, 1988). Diante desse direito, compreende-se que a educação possui um papel essencial na vida de um sujeito, pois através dos conhecimentos adquiridos, esse sujeito pode ser capaz de transformar a realidade, buscar e lutar por outros direitos. Para a autora Queiroz (1999) o pesquisador jamais realiza a escolha dos problemas e dos instrumentos a serem utilizados na sua pesquisa de maneira causal; esse processo é realizado através de questões que exibem curiosidade e interesse ao estudioso, como também o período histórico em que está inserido o objeto a ser estudado. Assim, o motivo de estudar essa temática foi por possui curiosidade de conhecer a prática do Assistente Social no campo educacional, como também por pretender compreender a relação do Serviço Social com a Educação. 13 Dessa forma, pretende-se investigar as ações do citado profissional, buscando entender como ele percebe a educação, o processo de trabalho e a dinâmica da sua intervenção. No desenvolvimento deste estudo, realiza-se um processo de articulação e reflexão das falas dos sujeitos pesquisados com o referencial teórico abordado, para uma melhor percepção e assimilação do objeto estudado. Dessa forma, buscando facilitar a compreensão deste estudo, o presente trabalho constitui-se desta introdução, três capítulos e conclui-se apresentando algumasconsiderações. No primeiro capítulo, descreve-se a construção da pesquisa, com a intenção de apresentar o caminho percorrido pela pesquisadora, os instrumentos utilizados, além de contextualizar o cenário da mesma e caracterizar o perfil dos profissionais. No segundo capítulo, discute-se o tema educação dentro das concepções de importantes autores, com um breve histórico da educação brasileira, enfatizando o significado da educação. Também se aborda a educação como um direito e instrumento de transformação. No terceiro capítulo, destaca-se a profissão Serviço Social no âmbito educacional, realizando uma relação da necessidade de atuação desse profissional. Aborda-se como aconteceu a inserção nesse campo e segue-se mostrando as competências, dificuldades e possibilidades desse profissional nesse espaço. Por fim, as considerações finais, nas quais são apresentadas observações e reflexões da prática do Serviço Social na referida instituição de educação. 14 1 PERCURSO METODOLÓGICO DA PESQUISA A proposta deste capítulo é descrever a construção do objeto estudado, os instrumentos utilizados e apresentar o universo e os sujeitos pesquisados. Dessa maneira, o intuito é expor os caminhos percorridos para a elaboração desse trabalho. 1.1 Construção da pesquisa A pesquisa sobre uma determinada temática é a maneira que os pesquisadores encontram para dar respostas a alguns questionamentos. Esta pesquisa envolve a relação de dois assuntos, a educação e a prática do profissional de Serviço Social, a partir dos seguintes pontos: Qual a percepção desse profissional sobre a educação? Quais as atribuições e competências, dificuldades e possibilidades do assistente social dentro de uma unidade educacional? Como esse trabalhador pode colaborar e como ele reconhece a importância de sua atuação nesses espaços? Na perspectiva de refletir sobre esses questionamentos, inicia-se uma fase exploratória, na tentativa de conhecer o fenômeno estudado, buscam-se informações e teorias para compreender a realidade acerca da atuação do profissional de Serviço Social nas instituições educacionais. Para alcançar o objetivo desta pesquisa foi utilizada a pesquisa de campo como técnica para investigar e interpretar a dinâmica desse profissional, possibilitando, assim, uma maior aproximação com a realidade, uma interação com o movimento real, permitindo uma comunicação com as relações sociais. Segundo Setubal (2007, p. 65): Para se penetrar no mundo das coisas, para se entender, analisar e interpretar a realidade na riqueza complexa e na sua totalidade concreta tem que se desenvolver um esforço intelectivo capaz de aprender a essência delas na sua mediaticidade. O autor Pierre Bourdieu, no capítulo II de seu livro O poder simbólico (2001), apresenta uma introdução a sociologia reflexiva, realizando uma abordagem sobre o trabalho de pesquisar, apontando as dificuldades e as possibilidades de aprendizagem no processo de construção da pesquisa. Ele aponta a pesquisa como sendo uma atividade racional que envolve investimentos como a dedicação de tempo e riscos, como a exposição. Para o autor, a arte, em ciências sociais, é o espaço capaz de teorizar a respeito de objetos empíricos, no qual 15 ele crê que a importância social ou política do objeto é de grande relevância para o fundamento do discurso. Dessa forma, quanto pesquisadora, algumas dificuldades foram enfrentadas como a imensa dedicação de tempo, sendo necessário abdicar das atividades profissionais; se distanciar um pouco dos familiares e amigos, tudo isso com o objetivo de disponibilizar mais tempo para conhecer e se aproximar ao máximo do objeto estudado, concentrando os pensamentos nas reflexões necessárias para a análise dos dados. No processo de construção da pesquisa não se pode separar as opções técnicas das opções teóricas, pois a união desses dados pode funcionar com o rompimento do monoteísmo acadêmico. Em síntese, segundo Bordieu (2001), a pesquisa é um ato difícil que exige seriedade e extrema vigilância das técnicas utilizadas, para que não ocorra uma confusão entre rigidez e rigor. O autor aborda ainda que a construção do objeto: […] é um trabalho de grande fôlego, que se realiza pouco a pouco, por retoques sucessivos, por toda uma série de correções, de emendas, sugeridos por o que se chama o ofício, quer dizer, esse conjunto de princípios práticos que orientam as opções ao mesmo tempo minúsculas e decisivas. (BOURDIEU, 2001, p. 27) Boudieu (2001) aponta que a noção de campo é um modo que pode contribuir para a construção do objeto, como orientar as opções de práticas da pesquisa, além de ser um espaço com imensa diversidade de relações, no qual o pesquisador deve estar alerta e absorver o essencial das suas particularidades. De acordo com Setubal (2007), o homem só consegue se aproximar da realidade superficialmente através do que os sentidos são capazes de captar. Para que esse homem avance nesse estágio sensível, torna-se necessário que ele saia da conduta contemplativa/reflexiva e busque movimenta-se para através de suas ações ocorra a aproximação e seja possível transformar. A autora afirma que: [...] acredita-se que a produção do conhecimento pela via da pesquisa é o caminho que possibilita o rompimento do Serviço Social com a pseudoconcreticidade, por provocar no profissional o desejo de se movimentar […]. (SETUBAL, 2007, p. 65) Diante do que foi exposto e com a finalidade de aproximar-se da realidade e do objeto estudado, optou-se pela pesquisa de abordagem qualitativa, pois segundo Goldenberg (2004, p.53): “Os dados qualitativos consistem em descrições detalhadas de situações com o objetivo de compreender os indivíduos em seus próprios termos”. Com essa abordagem, 16 busca-se um maior contato e visibilidade do objeto para alcançar as respostas das questões que não podem ser quantificadas. A fim de nortear o estudo, foram realizadas leituras que contribuíssem com a construção dos instrumentos que foram utilizados na pesquisa de campo, como a elaboração das perguntas utilizadas no roteiro de entrevistas. Para a aproximação com os entrevistados, foram realizados contatos telefônicos e via e-mail para expor o objetivo deste estudo, e, após análise do projeto pela atual coordenadora do setor, foi encaminhado um ofício de autorização emitido pela faculdade na qual a presente autora está inserida. Logo após iniciou-se o agendamento das entrevistas, e todos os profissionais optaram por realizar o diálogo no próprio local de trabalho, assim como escolheram os dias e horários das entrevistas. No intuito de atingir o objetivo desta pesquisa, realizou-se no mês de outubro de 2013 a pesquisa de campo com quatro assistentes sociais, utilizando-se os seguintes instrumentos: termo de consentimento (Apêndice 1), como orienta a conduta da pesquisa, expressando que todos os sujeitos autorizam a utilização das informações declaradas e estão cientes que, como sujeitos pesquisados, terão suas identidades preservadas; um formulário (Apêndice 2) preenchido pelo próprio sujeito da pesquisa, que resultou na obtenção de informações sobre o perfil dos indivíduos, e as entrevistas semiestruturadas (Apêndice 3). Desse modo, foi possível estabelecer um diálogo com perguntas e respostas, buscando atingir os objetivos da pesquisa e também uma maior aproximação com os entrevistados, propiciando uma interação entre pesquisador e pesquisados, pois, conforme Minayo (2000, p.114), “(...) a entrevista não é simplesmente um trabalho de coleta de dados, mas sempre uma situação de interação na qual as informações dadas pelos sujeitos podem ser profundamente afetadas pela natureza de suas relações com o entrevistador”. Durante as entrevistas, buscou-se ouvir e olhar de maneira disciplinada, tentando apurarao máximo as características e as informações que possibilitassem a compreensão do estudo, pois conforme Oliveira (2000, p.21), “evidentemente tanto o ouvir como o olhar não podem ser tomados como faculdades totalmente independentes no exercício da investigação. Ambas complementam-se e servem para o pesquisador como duas muletas”. No momento das entrevistas, com a permissão dos entrevistados, preferiu-se utilizar um gravador como utensílio facilitador, visando garantir uma maior fidedignidade e respeito aos relatos dos indivíduos no momento das transcrições. Também para preservar a privacidade desses sujeitos, utilizou-se nessa pesquisa, como forma de identificação, a sigla 17 AS, significando a palavra Assistente Social, junto com a numeração que representa a ordem em que foram executadas as entrevistas. Após a finalização da fase de coleta de dados, utilizou-se a análise de conteúdo, na qual se procurou identificar as questões que mais foram destacadas pelos entrevistados. A pesquisa bibliográfica também foi um procedimento essencial, e Minayo (1998) relata que para se conseguir o sucesso de uma pesquisa, deve-se ter um envolvimento com diversas obras e autores diferentes. Se quisermos, portanto, trilhar a carreira de pesquisador, temos de nos aprofundar nas obras dos diferentes autores que trabalham os temas que nos preocupam, inclusive dos que trazem proposições com as quais ideologicamente não concordamos. (MINAYO, 1998, p. 19). Assim, durante todo período desta pesquisa, foi realizado o estudo teórico com o maior número de pesquisadores que se envolveram em estudos sobre Serviço Social na Educação, como Eliana Bolorino, André Santos, Ney Almeida, entre outros que contribuíram para a construção desta pesquisa. 1.2 O Cenário da Pesquisa O cenário pesquisado foi o Instituto Federal do Ceará (IFCE), por possuir uma longa trajetória de ensino no Estado do Ceará e ter um número significativo de assistentes sociais na ativa, em vários campi descentralizados no interior do estado. Com 104 anos de existência, o IFCE possui como missão “produzir, disseminar e aplicar os conhecimentos científicos e tecnológicos na busca de participar integralmente da formação do cidadão, tornando-a mais completa, visando sua total inserção social, política, cultural e ética” (IFCE, 2013) 1 . Essa instituição possui suas raízes fincadas no começo do século XX, quando nesse período o Brasil estava sendo governado pelo presidente Nilo Peçanha, que buscou através do Decreto nº 7.566 de 23 de setembro de 1909, fornecer formação profissional aos filhos dos desfavorecidos, conforme se pode ver em um trecho desse decreto: “(...) que para isso se torna necessário, não só habilitar os filhos dos desfavorecidos da fortuna com o indispensável preparo técnico e intelectual, como fazê-los adquirir hábitos de trabalho profícuo, que os afastara da ociosidade ignorante, escola do vicio e do crime”. 1 Disponível em: <http://www.ifce.edu.br>. Acesso em: 01/11/2013. 18 Naquele momento, o país vivenciava o início do processo industrial, sendo necessário focar a educação como instrumento de desenvolvimento do país, e, para isso, foram criadas escolas que proporcionassem a qualificação do homem. Algumas décadas depois, essa instituição passou a atuar oferecendo cursos de formação profissional, com diferentes objetivos dos traçados pelo decreto de 1909, mas atendendo as demandas do processo industrial brasileiro, que necessitava de mão de obra técnica para trabalhar com o maquinário industrial. Assim, durante o decorrer do tempo, essa escola foi se desenvolvendo e adquirindo um maior espaço na rede de ensino, e, ainda com a meta de formar profissionais, passa a oferecer curso de graduação e pós-graduação. Atualmente, as atividades dessa instituição compreendem as estâncias do ensino, pesquisa e extensão, desempenhadas pelos 29 campi distribuídos pelo Estado do Ceará, sendo que a concentração desta pesquisa foi em uma das unidades institucionais, preferindo-se mantê-lo em sigilo, para preservar a identidade das profissionais entrevistadas, optou-se por esse campus devido a disponibilidade das entrevistadas, bem como pela maior quantidade de profissionais inseridas nesse espaço. O setor de Serviço Social, que é o interesse para esta pesquisa, iniciou nessa instituição no ano de 1998, com a criação da Coordenadoria de Serviço Social. Através do conhecimento e relatos de uma entrevistada, compreende-se que essa não foi uma inserção fácil, como se pode observar pelo depoimento a seguir: É o seguinte: historicamente, quando começou, pelo menos o que eu sei que outras funcionárias contaram, quando elas chegaram aqui não existia o Serviço Social, ninguém nem sabia o que era o assistente social. Não sabia o que o assistente social fazia na educação. Então, elas foram as desbravadoras daqui, elas chegaram e procuraram espaço, procuraram conhecer como era a realidade [...]. (AS2, 2013) Analisando as informações obtidas nas entrevistas, reconhece-se que esse serviço surgiu através da necessidade de atender as demandas sociais dos alunos, as quais foram identificadas através dos estudos socioeconômicos, como relata AS2 (2013): [...] o Serviço Social começou assim, com esse estudo socioeconômico, e começou- se a se identificar as demandas. Que os alunos não conseguiam vir para a aula, custear transporte, custear alimentação, custear fardamento, que na época era obrigatório, materiais de desenho, que o ensino técnico exige. Alunos que tinham dificuldades de acompanhar as aulas. por quanto da dificuldade de enxergar, de visão, não tinha condições de adquirir os óculos ou lentes. 19 Ainda ressalta que esse setor foi construindo sua identidade na instituição, devido a grande demanda dos alunos que necessitavam de apoio para continuar o processo de aprendizagem. Como a instituição é o ensino técnico, eletrotécnica tem cadeira de desenho, mecânica tem cadeira de desenho, edificações tem cadeira de desenho, então precisa de materiais, um kitizinho de materiais de desenho que os alunos precisam levar para aula. Então, todas essas demandas, familiares que procuravam o Serviço Social com problemas na família, problemas de saúde, então o Serviço Social foi chamado a intervir nisso. Então, foi dessa forma, baseados nessas demandas foi que se construiu a cara do Serviço Social na educação, aqui no IFCE, antiga escola técnica. (AS1, 2013) Em relação à estrutura física, foi possível observar que esse setor possui uma sala própria, com equipamentos de informática, documentos, instrumentos necessários para a execução do trabalho, como também possui uma sala interna proporcionando condições mínimas de trabalho e sigilo profissional, conforme estabelecido na Lei 8.662/93 de Regulamentação da Profissão, no capítulo V, artigo 16, que diz: “o sigilo protegerá o/a usuário/a em tudo aquilo que o/a assistente social tome conhecimento, como decorrência do exercício da atividade profissional”. A rotina de trabalho desse setor é desenvolvida por atendimentos aos usuários, a fim de conhecer a realidade dos alunos e familiares. Logo, esse setor possui como prioridade o atendimento ao aluno, como se pode ver nas falas dos profissionais: Prioridade é o bom atendimento ao aluno, sempre os alunos estão em primeiro lugar. A gente tenta trabalhar, a demanda é muito grande, o nosso universo é imenso, a quantidade de alunos, são sete mil alunos, então, a gente tentar priorizar o atendimento com excelência. (AS1, 2013) [...] o aumento do universo de estudantes e a quantidade de profissionais não acompanhou, então o Serviço Social acabou por ter como público prioritário o estudante […]. (AS2, 2013) É o aluno, é a permanência do aluno na instituição. É assim que ele tem umaformação de qualidade. (AS3, 2013) [...] o estudante, para nós, ele é prioridade nesse processo, e não só no recebimento do auxilio, porque, para nós, é muito pouco o Serviço Social ficar como mero concessor de auxílio e de benefícios (...) a nossa prioridade é essa: o estudante, garantir o direito do nosso usuário. (AS4, 2013) Assim, as ações desse setor estão concentradas em atender os estudantes buscando garantir a qualidade de ensino. Para isso, o setor possui como objetivos: prestar assistência social aos alunos e seus familiares; pesquisar as condições socioeconômicas e a realidade 20 estudantil; elaborar, desenvolver, implementar, executar e avaliar programas e projetos na área social.(IFCE)2 A partir disso, verifica-se que o Serviço Social dessa instituição tem os seus objetivos embasados no Código de Ética Profissional e realiza suas práticas de acordo com as competências e atribuições estabelecidas nesse código. Ainda em relação às atividades exercidas pelos profissionais do setor de Serviço Social, identifica-se que suas principais ações estão relacionadas com a concessão de auxílios e orientação para participação em programas, como se pode confirmar na fala dos profissionais: Bom, aqui nós trabalhamos com os atendimentos aos alunos de forma em geral, com os programas bolsa de trabalho, auxílio óculos, auxílio-alimentação e o auxílio- transporte. Em linhas gerais, é isso, mas qualquer tipo de atendimento ao aluno, algum problema com o professor, a gente tenta estar ciente e realizar os encaminhamentos dentro do possível. (AS1, 2013) Nos trabalhos na assistência estudantil, nossa demanda principal é o programa de bolsa de trabalho, que é um programa desenvolvido para potencializar que os meninos, o que os alunos aprendem no curso. Então, eles são alocados aqui dentro (...), nos setores que estejam diretamente ligados aos cursos deles e a parte dos auxílios. (AS3, 2013) A atuação do Assistente Social não fica restrita apenas a esses procedimentos, pois uma das entrevistadas exerce suas atividades em uma das pró-reitorias dessa instituição, conforme descrição abaixo: […] até meados de março/abril desse ano, a assistência estudantil era dentro da pró- reitoria de extensão. Existia uma coordenadora de assuntos estudantis, e eu era a assistente social que acompanhava os processos, junto com ela. Afinal de contas, em todos os campus é a assistente social quem desenvolve, então eu entendia que tinha que fica perto dela para monitorar e acompanhar esses processos. O que eu fazia nesse momento? Eu trabalhava com processos de informações, com as assistentes sociais para elaboração de revisões da assistência estudantil e do regulamento. (AS4, 2013) Esse relato revela que a atuação do profissional se destina a elaboração e desenvolvimento de projetos, exigindo, assim, uma visão ampla dos profissionais para acompanhar as demandas da sociedade. Ainda seguindo com os relatos da AS4 (2013), nota-se também que esse setor desenvolve trabalhos pensando no universo fora da instituição: 2 Informações disponíveis em:< http://www.fortaleza.ifce.edu.br/index.php/extensao35/servico-social> Acesso em: 01/11/2013. http://www.fortaleza.ifce.edu.br/index.php/extensao35/servico-social 21 [...] uma coisa que está em processo, que está sendo implementada, é a Coordenadoria de Inclusão Social da pró-reitoria, que é o acompanhamento dos projetos sociais nos campus, porque a gente aqui tem um termo de acordo e metas, aqui não, em todos os institutos do país tem um termo de acordo e metas (...), que diz que uma das missões dos institutos é desenvolver ações sociais, extramuros escolares, atividades acadêmicas e não acadêmicas. Inclusive, a gente tem uma disciplina aqui que é obrigatória para construção de projetos sociais, que não é dada pelo Serviço Social, mas desde esse momento que a gente passou fazer esse acompanhamento, que é uma ideia nossa repensar isso: quem são essas pessoas que estão dando essa disciplina, porque a gente acha que é uma coisa do Serviço Social [...]. (AS4, 2013) Assim, compreende-se que o desenvolvimento desses projetos contribui para a formação dos estudantes do instituto, pois envolve parcerias com outras instituições e tem a finalidade de desempenhar o sentimento de solidariedade e colaboração com a inclusão social. Na análise das entrevistas, outro fator destacado nesse setor é a interdisciplinaridade, conforme aborda a AS3 (2013): Nós trabalhamos interdisciplinar com as pedagogas e as psicólogas; nós temos essa rotina diária; nós temos outras atividades. Eu falei do Bolsa e dos auxílios, porque são os nossos carros chefes, mas nós atuamos também em outras demandas da instituição [...]. No entanto, a fala da AS2 (2013) revela que essa conduta ainda precisa ser melhorada: Na minha opinião, o trabalho interdisciplinar aqui está incipiente, mas não pode dizer que não há, porque há, né? Então, assim, nós temos aqui o serviço de saúde, que lá tem dentista, médico e enfermagem. E aqui, assim, vinculado ao Serviço Social, tem a psicologia. A psicologia escolar ela está vinculada ao Serviço Social, até o nome do setor é Serviço Social e Psicologia Escolar, então, primeiramente, entre nós Serviço Social e Psicologia o trabalho é bem integrado. Eles se integram nas nossas atividades, até porque se você vai fazer um atendimento ao estudante que está com problema, vou dar um exemplo, com esquizofrenia, é um problema que compete à psicológica, mas é um problema social também, porque tem toda uma questão social por trás também: de condições, de como vai ser o afeto dele, se vai ser só serviços, as políticas disponíveis. É o Serviço Social que vai fazer isso. Todos os sujeitos entrevistados relatam sobre o trabalho interdisciplinar, mostrando assim que acreditam na importância do trabalho em equipe. Desta forma, através dessa relação percebe-se que é possível desenvolver ações com qualidades para atender os usuários, e durante essa comunicação ocorre também o processo de conhecimento de outros saberes. 22 1.3 Perfil dos sujeitos pesquisados A instituição em estudo possui um total de 23 profissionais de Serviço Social, distribuídos por seus diversos campi. Destes, escolhemos as quatro profissionais, participantes da pesquisa, atuam nesse espaço no período compreendido entre 2006 e 2013. Realizando uma apresentação dos sujeitos que contribuíram com a pesquisa, destacam-se algumas características pessoais, que interagem na construção da identidade profissional. Os sujeitos encontram-se na faixa etária de 32 a 43 anos e todos os profissionais pesquisados são do sexo feminino. Na solicitação da indicação do estado civil, a representação ficou dividida com duas que possuem a condição de casadas e duas de solteiras; as casadas possuem filhos. Diante desses dados, percebe-se uma predominância feminina nesse instituto, mostrando, assim, a relevância de uma profissão historicamente reconhecida como feminina, como afirma Minayo (1998, p.64): “(...) atravessada por relação de gênero enquanto tem uma composição social predominantemente feminina, o que afeta sua imagem na sociedade e as expectativas sociais vigentes diante da mesma”. Em relação às atividades trabalhistas, segundo os dados coletados, todos os sujeitos apresentam vínculo estatutário, com carga horária de 30 horas semanais. A renda salarial desses sujeitos representa, aproximadamente, oito salários mínimos. Além desse vínculo, duas profissionais possuem vínculo com outra instituição na área da saúde. Considerando os dados acima, pode-se afirmar que esse instituto cumpre o estabelecido no artigo 1º da Lei nº 12.317/2010, que dispõe o acrescido no artigo 5º da Lei 8.662/1993, cuja “duração do trabalho do Assistente Socialé de 30 (trinta) horas semanais”. No aspecto formação, verifica-se que todos os sujeitos realizaram sua graduação no período compreendido entre 1992 e 2006, com formação em universidade pública, como também todos possuem pós-graduação em nível de especialização (lato sensu) e duas possuem a qualificação de mestrado em educação. Nota-se ainda, que esses profissionais buscam estar sempre em um constante aperfeiçoamento e aquisição de conhecimentos, conforme as descrições: [...] é importante, é importantíssimo conhecer, se apropriar da legislação educacional e conhecer a educação, como ela funciona. E conhecer, também, um pouquinho da questão da psicologia, pelo menos um pouquinho, pelo menos uma base. A gente pega uma noção na faculdade, mas é bom conhecer um pouco mais, como é que se dá um pouco da aplicação da psicologia na sala de aula, como o aluno vai captar. Pelo menos o nível básico é importante, é muito importante. (AS2, 2013) 23 [...] saiu da faculdade e vai atuar na educação? Então, você tem que conhecer tudo que rege a educação, todo o arcabouço jurídico; as leis que regem a educação, o que está se passando nesse setor; fazer parte dos grupos de discussão no CRESS; tem o GT de Educação. Tem que estar dentro desses movimentos, e, principalmente, dos movimentos específicos do Serviço Social: dos congressos brasileiros, dos encontros de pesquisa. Tá formando opinião dentro desse setor, escrevendo artigos, fazendo diversos trabalhos sobre sua prática aliada a teoria. Dando visibilidade ao que é o profissional de Serviço Social dentro da educação. (AS3, 2013) Ressalta-se que o profissional de Serviço Social precisa ampliar o seu conhecimento, não somente para atuar na educação, mas em qualquer área. Confirma-se isso com a fala do AS3 (2013): [...] ter primeiro uma formação muita bem feita de Serviço Social. Não só para educação, mas para onde ele for atuar. Ele tem que saber quais são as legislações que ele atua, ele tem que estar sempre lendo, se atualizando. Ele tem que tá tendo a capacidade de fazer a leitura da realidade, não só da instituição que ele está [...]. Diante dessas informações, percebe-se que os sujeitos estão sempre buscando capacitação e aprimoramento dos seus conhecimentos, logo se tem, novamente, a educação como um fator importante e de ampliação na vida do homem. Realizando uma reflexão deste primeiro capítulo, além de conseguir compreender o trajeto percorrido, foi possível conhecer os sujeitos envolvidos nesta pesquisa e como surgiu a sua inserção e quais as atividades exercidas nesse espaço. Com essas informações será possível o desenvolvimento deste estudo, com um olhar mais próximo da realidade desses profissionais. 24 2 SOCIEDADE E EDUCAÇÃO: ASPECTOS HISTÓRICOS E CONCEITOS TEÓRICOS. A educação possui várias funções que são praticadas por diversas instituições como a escola, a universidade, a família, a comunidade, os meios de comunicação, as organizações religiosas e políticas. De acordo com Almeida (2007, p. 2): “a família, as instituições religiosas, os movimentos associativos entre outras, ao lado da escola contribuem para a constituição do amplo e diversificado campo educacional”. Na intenção de compreender e analisar a importância do profissional de Serviço Social no espaço educacional e de sua percepção sobre a educação busca-se, nesse primeiro momento, uma aproximação com os pensamentos de alguns autores a respeito da questão educacional, bem como se desenvolve um breve resgate histórico da educação no Brasil. Com isso, tem-se a finalidade de conhecer um pouco das dificuldades, lutas e conquistas vivenciadas pela sociedade brasileira na ação de educar. Seguindo este estudo, apresenta-se a educação como uma questão de direito, com o propósito de mostrar a importância de ser reconhecida pela sociedade como direito adquirido, e logo deve ser exigida, para que essa aconteça com qualidade. A seguir, abordar-se a educação como um instrumento de transformação, a fim de expor que a educação é a ferramenta capaz de proporcionar aos indivíduos inseridos na sociedade capitalista uma leitura diferenciada da realidade, como também possibilita nortear e mostrar a essa sociedade que, através de sua articulação e mobilidade social, é possível buscar e construir uma sociedade democrática. 2.1 Educação: diferentes concepções que marcam sua importância Desde a Antiguidade que o ato de educar está presente no seio da sociedade, porém, segundo Manacorda (2006), é difícil encontrar provas desses ensinamentos, pois apenas se possuem registros dos ensinos reservados a classe nobre, e nestes estão incluídos apenas a preparação para a vida política, como os ensinamentos morais e comportamentais, além da oratória, que é bem presente nesse momento. A ação de educar ocorre em meio a uma diversidade de relações econômicas, políticas, sociais e culturais. Assim, em cada localidade ela ocorre de maneira diferenciada, como: nas comunidades tribais, as crianças aprendem imitando os gestos dos adultos nas 25 atividades diárias, ou seja, elas aprendem „para a vida e por meio da vida‟; já o povo hebreu transmite seus ensinamentos com uma forte carga de religiosidade; no Egito, as escolas funcionam nos templos e em algumas casas; na Grécia, a educação acontece estimulando o uso da razão. Desse modo, percebe-se que a ação de educar é influenciada de acordo com o espaço e os interesses de cada sociedade (ARANHA, 1996). Essa mesma ação pode ser vista por diferentes concepções. Para Durkheim (1978), segundo um viés positivista, a educação é uma ação de inserção e de integração dos sujeitos à vida social, ou seja: A ação exercida pelas gerações adultas sobre as gerações que não se encontram ainda preparadas para a vida social tem como objeto suscitar e desenvolver na criança, certo número de estados físicos, intelectuais e morais, reclamados pela sociedade política em seu conjunto e pelo meio especial a que a criança particularmente se destine. (DURKHEIM, 1978, p.41) Dessa forma, conforme Durkheim (1978), a educação possui um aspecto conservador, em que sua função é apenas transmitir ao homem os valores, os costumes e as normas existentes na sociedade. Em Karl Marx, perspectiva teórica diversa da positivista. Não existe uma obra específica a respeito da educação, mas é possível verificar que esse autor retrata a questão realizando reflexões e relacionando-a com o sistema de produção e trabalho. Nos escritos de Marx, o ensino está vinculado ao ato do trabalho, pois para que o indivíduo realize alguma atividade trabalhista é necessário aprender para fazer. Lombardi (2011, p. 14) afirma que para Marx e Engels: O sistema de ensino é entendido, assim, como uma concreta qualificação da força de trabalho que alcançará seu aproveitamento máximo se conseguir também o ajuste e a integração dos indivíduos no sistema, única maneira de não desperdiçar sua força de trabalho, mas sim, aproveitá-la. Partindo disso, percebe-se que nos escritos de Marx a educação realiza uma combinação com o trabalho. Essa combinação é apresentada como algo vantajoso, como afirma Marx e Engels (IN: LOMBARDI, 2011, p.91): Os inspetores de fábrica logo descobriam, através dos depoimentos dos mestres- escolas, que as crianças empregadas nas fábricas, embora só tivessem meia frequência escolar, aprendiam tanto e muitas vezes mais que os alunos regulares que tinham a freqüência diária integral. 26 Dessa forma, é apresentada a relação do trabalho com a educação, mostrando que o indivíduo no exercício de suas atividades possui maior disposição e desejo de aprender. No entanto, essa mesma atividade que propicia a educação também pode contribuir para que o indivíduo se mantenha preso a uma determinada função, ficando, assim, impossibilitadode exercer outras atividades, pois não teve oportunidade de receber outros conhecimentos. Em “A Ideologia Alemã”, Marx e Engels (IN: LOMBARDI, 2011, p. 28) afirmam que: Com efeito, desde o momento em que o trabalho começa a ser repartido, cada indivíduo tem uma esfera de atividade exclusiva que lhe é imposta e da qual não pode sair; é caçador, pescador, pastor ou crítico e não pode deixar de o ser se não quiser perder os seus meios de subsistência. Além disso, a aquisição de conhecimento envolve também o fator valor, no qual Marx (IN: LOMBARDI, 2011, p.112) apresenta: [...] quanto menor for o tempo de formação profissional exigido por um trabalho, menos será o custo de produção do operário e mais baixo será o preço de seu trabalho, de seu salário. Nos ramos industriais onde não se exige quase nenhuma aprendizagem e onde a simples existência material do operário é o bastante, o custo da produção deste se limita quase que unicamente às mercadorias indispensáveis à manutenção de sua vida, à conservação de sua capacidade de trabalho. Eis a razão por que o preço de seu trabalho será determinado pelo preço dos meios de subsistência necessários. Assim, os escritos de Marx sinalizam que a educação é abordada como uma ferramenta na formação do operário. Logo, quanto mais conhecimento o indivíduo obtiver para exercer diversas atividades, maior será a garantia para aplicação de sua força de trabalho e, assim, a garantia para os meios de sua sobrevivência. O verdadeiro significado da educação, para os economistas filantropos, é a formação de cada operário no maior número possível de atividades industriais, de tal modo que, se é despedido de um trabalho pelo emprego de uma máquina nova, ou por uma mudança na divisão do trabalho, possa encontrar uma colocação o mais facilmente possível. (MARX IN: LOMBARDI, 2011, p. 114). Sobre esse ponto, compreende-se que os indivíduos utilizam sua força de trabalho para transformar e adquirir os meios para sua sobrevivência, como também nessa mesma ação o trabalho exerceria a função de prática educativa. Porém, essa prática não estaria sendo exercitada dentro de uma lógica de ampliação do conhecimento e desenvolvimento do homem, e sim sendo utilizada como forma de capacitar esse homem para desenvolver suas atividades trabalhistas, alimentando o sistema explorador. Logo, a educação pode ser 27 considerada uma mercadoria para o sistema econômico, que exige do homem apenas o conhecimento necessário para sua reprodução, sem estimulá-lo a refletir sobre o meio no qual está inserido. Para outro clássico da sociologia, Max Weber (1977), alguns pontos dos seus pensamentos são diferentes de Karl Marx, e para analisar a questão educacional na sua percepção, torna-se necessário compreender que para Weber (1977) as pessoas atribuem às ações sociais uma direção para o comportamento na sociedade, ou seja, na concepção desse autor as escolhas e ações de um indivíduo são norteadas por valores tradicionais, afetivos e racionais. Weber (1977) aborda que, além das ações sociais, outros fatores são importantes para a compreensão da vida social, como a racionalidade e a burocracia. Para esse autor, a questão educacional possui um forte relacionamento com a burocracia, onde a formação possibilita a aquisição de diplomas e certificados, ou seja, registros que comprovem as competências ou habilidades de um indivíduo e, através destes, proporcionar ao homem a ocupação de cargos e funções no mercado profissional. Segundo o autor: A burocratização do capitalismo, com sua exigência de técnicos, funcionários preparados com especialização, etc., generalizou o exame por todo mundo. Acima de tudo, a evolução é muito estimulada pelo prestígio social dos títulos educacionais, adquiridos desses exames. É ainda mais o caso quando o título educacional é usado com vantagem econômica. Hoje, os diplomas são o que o teste dos ancestrais foi no passado, pelo menos onde a nobreza continuou poderosa: um pré-requisito para a igualdade de nascimento, uma qualificação para um canonicato e para o cargo estatal. (WEBER, 1977, p. 278). Diante da concepção de Weber (1977), identifica-se que a educação é movida pelo interesse de um indivíduo adquirir títulos para conquistar seus ideais profissionais e, assim, conseguir se manter com influência social na estrutura existente. Refletindo a questão educacional no contexto contemporâneo, percebe-se que com os avanços da tecnologia e as exigências do mercado de trabalho, esse entendimento de Weber (1977) sob a educação está bem presente nos dias de hoje, devido a organização do sistema capitalista que necessita de eficiência para se manter efetivo no poder. Desse modo, exige-se uma educação que proporcione o desenvolvimento de um homem qualificado com diversas competências e habilidades, para que esse possa acompanhar as constantes modificações sociais e os requisitos exigidos pelo mercado, como, por exemplo, alcançar o sucesso profissional. 28 Nessa perspectiva, refletindo os pensamentos de Marx (IN: LOMBARDI, 2011) e Weber (1977), com os dados colhidos no campo, verifica-se o poder da educação em favorecer a qualificação do homem para prática do trabalho, como se pode perceber nos relatos da AS1 (2013): A gente entende que a educação é capaz de promover uma mobilidade social. Disso aí não tenho dúvida. A gente sabe que nós estamos inseridos no sistema capitalista que, por si só, ele é altamente excludente. Não é só o aluno correr atrás que ele vai conseguir, mas ele vai melhorar muito as oportunidades, ele vai realmente ter condições de almejar algo melhor, conforme for o nível de qualificação, isso é inevitável. Não é só isso: a perseverança, a força de vontade e a educação, realmente oportuniza melhores condições de chegar ao mercado de trabalho, é a questão da qualificação mesmo, né? Na fala da AS1 (2013), identifica-se semelhança nos inscritos desses clássicos, pois a profissional ao falar sobre sua concepção de educação apresenta em seu discurso que através da educação o homem pode se promover através da qualificação. Mannheim (1978, p. 89) referia-se a educação como uma técnica, na qual “todos os métodos de influenciar o comportamento humano de maneira que este se enquadre nos padrões vigentes da interação e organizações sociais”. Logo, para ele, a educação pode ser utilizada como uma forte ferramenta para manutenção da ordem ou até mesmo para a transformação de uma sociedade, dependendo de quem possui o poder de decisão e dominação. Como afirma Mannheim (1978, p. 89): “a educação não molda o homem em abstrato, mas em uma dada sociedade e para ela”. Portanto, para Mannheim (1978), a educação pode ser utilizada conforme a sociedade desejar. Assim, é possível através da educação formar indivíduos democráticos, basta a sociedade tomar as decisões corretas e realizar um planejamento racional que utilize estratégias capazes de manter a ordem social, estabelecendo-se dentro dessas estratégias o caráter democrático. Para o grande estudioso sobre a temática educação, Pierre Bourdieu (1975), a educação está inserida no campo em que ele chama de “capital cultural”, e esse capital está ligado a outros tipos de capital, como o capital econômico. Bourdieu (1975) diz que não é fácil adquirir o capital cultural, é preciso tempo, investimento e inclui, também, diversos outros fatores como costumes, valores, condições econômicas e relações familiares e sociais. Para Bourdieu (1975), a escola é um agente da educação e dependente da classe dominante, assim contribuindo para a reprodução da estrutura de classes. 29 Se não é fácil perceber simultaneamente a autonomia relativa do sistema de ensino e sua dependência relativa à estrutura das relações de classe, é porque, entre outras razões, a percepção das funções de classe do sistema deensino está associada na tradição teórica a uma representação instrumentalista das relações entre a Escola e as classes dominantes, enquanto que a análise das características de estrutura e de funcionamento que o sistema de ensino deve à sua função própria tem quase sempre tido por contrapartida a cegueira face às relações entre a Escola e as classe sociais, como se a comprovação da autonomia supusesse a ilusão da neutralidade do sistema de ensino (BOURDIEU, 1975, p.204). Na percepção de Bourdieu (1975), mesmo que todos os indivíduos tenham oportunidades iguais de frequentar a escola, a sua carga cultural não seria igual, pois ele relata que as orientações recebidas pela família são grandes influenciadores para o desempenho do homem. Na verdade, a garantia do acesso à escola representa apenas uma demonstração de igualdade e oportunidade a todas as pessoas. Correlacionando esse pensamento com as falas das assistentes, constata-se semelhança em seus relatos quando elas dizem que: [...] não pode comparar com uma pessoa que já nasceu em berço de ouro, que nunca precisou parar para trabalhar, teve tempo e tudo, assim com uma pessoa que precisa ralar, trabalhar para comprar seu próprio material de estudo, para poder pagar um curso a noite, que trabalha durante o dia para pagar um curso a noite. Ainda não é a mesma oportunidade [...]. (AS1, 2013) Nem todos tem a mesma oportunidade de jeito nenhum. Porque isso vai variar de acordo com o meio que esse indivíduo vive. Nunca vai ser, se tentar, porque esta aí, amplamente divulgado, mas não tem porque cada história é uma história, cada família é uma família, porque muitos não podem se dar nem ao luxo de tentar porque tem que trabalhar. (AS2, 2013) Diante desses pensamentos, compreende-se que não basta o indivíduo possuir acesso à escola, é preciso uma interação com outros fatores para conseguir ter a mesma oportunidade que outros indivíduos. Então, a educação está atribuída com a maneira que os sujeitos se relacionam e atuam no mundo. A escola é considerada como a instituição que transfere o conhecimento. Diante disso, Bourdieu (1975) alerta que os sujeitos devem refletir e analisar os conhecimentos adquiridos, para que através dessas relações não ocorram apenas reproduções. Outro estudioso dessa temática, o autor Paulo Freire (2004), reconhecido internacionalmente, aborda a educação dentro de uma ação de libertação, e afirma que “(...) ninguém educa ninguém, como tampouco ninguém educa a si mesmo: os homens se educam em comunhão (...)” (FREIRE, 2004, p. 69). Para Freire (2004) a educação não é apenas transferir e depositar conhecimentos nos sujeitos, como ele chama de educação „bancária‟. Do seu ponto de vista, o importante é 30 uma educação libertadora, que os indivíduos possam pensar, discutir e refletir acerca dos seus pensamentos. Com isso, o autor apresenta que o diálogo entre os homens, proporciona uma educação capaz de libertar o pensamento e a conscientização dos indivíduos. Assim, através das reflexões dos escritos de Freire, constata-se por meio deste estudo que os profissionais pesquisados possuem uma concepção de educação muito próxima aos seus pensamentos, conforme os seguintes depoimentos: Eu acho, eu acho não, eu acredito que a educação é libertadora, né? A partir do momento que você sai da ignorância, você desvenda um universo. Não é preciso você saber tudo, mas saber de tudo um pouco, eu acredito nisso sim. (AS1, 2013) A função da educação, então, eu complemento também: ela transforma e essa transformação perpassa o nível pessoal e econômico. Transforma não só o individuo, mas a sua família, é a questão da ascensão social, ela também permite isso. (...) ela transforma, ela muda a pessoa, muda a sua família, faz a pessoa ascender socialmente, amplia horizontes e gera o senso crítico. (AS2, 2013) A minha concepção de educação, é a educação libertadora, que forme o ser humano completo. Não sou o aluno na educação bancária, o aluno na questão de passar por semestre, terminar o curso, mas aquele tem a visão de mundo, aquele que seja formado enquanto aluno. Lógico que ele tem que ter o saber técnico, mas ele tem que fazer as interelações desse saber técnico com toda uma sociedade que o rodeia; que ele possa ser fomentado na sua visão critica, de tudo que ele aprende, de tudo que ele absorve. Essa educação que eu aprendi que é a educação libertadora. (AS3, 2013). A concepção que eu tenho de educação é que ela tem que ser integral, integrada e humana. Que leve a formação de um indivíduo crítico, político e cidadão [...]. (AS4, 2013) Nesses depoimentos, evidencia-se que esses profissionais percebem a educação de uma forma ampla, acreditando que ela pode fornecer uma visão da realidade, como também é responsável por transformar e libertar os indivíduos. Diante desses posicionamentos, a educação pode ser compreendida com diferentes missões: para alguns autores é vista como mecanismos para a reprodução do sistema capitalista, da cultura e das relações sociais; para outros, é um espaço capaz de proporcionar uma mediação entre a transmissão de conhecimento, de cultura e contribuir para a busca da modificação do ser e da sociedade. Após realizar essas reflexões sobre a concepção educacional na percepção de alguns autores e dos profissionais envolvidos na pesquisa, faz-se necessário percorrer um 31 pouco a história educacional no Brasil, pois segundo Dalarosa (2000, p.43), “precisamos estudar a história para, através do passado, entender o presente e preparar o futuro”. Assim, no próximo tópico, discute-se o processo histórico da educação brasileira, buscando compreender a realidade atual, através do estudo de como aconteceu essa trajetória e observando as transformações que ocorreram ao longo do tempo. 2.2 Breve histórico da educação brasileira A educação brasileira passou por várias lutas, conquistas e diversos problemas para chegar ao que se tem hoje, e, na perspectiva de conhecer as experiências e a trajetória da história da educação, utiliza-se como referência a autora Freitag (1980) que divide essa história em três períodos, explicitados a seguir. No período de 1500 a 1930, Freitag (1980) aponta que a educação inicia-se com os padres jesuítas que tinham as doutrinas da Igreja Católica e as vontades da Coroa Portuguesa como base nos ensinos. Nas colônias não existia nenhuma manifestação de organização educacional, visto que a intenção dos portugueses era somente explorar as riquezas da colônia. As instituições de ensino existentes, como os colégios e seminários, foram utilizadas para divulgação do cristianismo e da cultura europeia. Logo as escolas utilizadas pelos jesuítas tinham como finalidade domesticar a população indígena e estimular esses indivíduos a realizarem os desejos dos colonizadores. Após a chegada da família real, houve uma alteração na realidade educacional, sendo inauguradas instituições educacionais e culturais. Durante todo esse período, a educação teve uma grande evolução. Porém, o acesso ao serviço educacional estava disponível apenas para a classe nobre, e foi exclusivamente após a Independência do Brasil (1822) que se iniciou um distanciamento da influência da igreja na política educacional. O segundo período compreendido por 1930 a 1945, conforme Freitag (1980), foi bastante influenciado pela crise mundial de 1929 e a crise da superprodução do café, que estimulou modificações na estrutura econômica, na sociedade civil e na política. Nesse momento, os militares apoiam Getúlio Vargas para assumir o poder. O ano de 1930 foi marcado pela criação do Ministério da Educação pelo Governo Vargas, que tinha como objetivo fundamental orientar e coordenar as reformas educacionais. Nessas reformas ocorreram fatores importantes como a obrigatoriedade e gratuidade das escolas primárias e a32 elaboração do Estatuto da Universidade Brasileira. Nesse momento, acontece, também, uma grande introdução dos cursos profissionalizantes. De acordo com Freitag (1980, p. 52): A política educacional do Estado Novo não se limita à simples legislação e sua implantação. Essa política visa, acima de tudo, transformar o sistema educacional em um instrumento mais eficaz de manipulação das classes subalternas. Outrora totalmente excluídas do acesso ao sistema educacional, agora se lhes abre generosamente uma chance. São criadas as escolas técnicas profissionalizantes („para as classes menos favorecidas‟). A verdadeira razão dessa abertura se encontra, porém, nas mutações ocorridas na infra-estrutura econômica, com a diversificação da produção. Dessa forma, a mudança ocorrida no quadro educacional nesse período apresenta que os interesses estavam voltados para a questão econômica, pois esse setor necessitava de mão de obra diversificada e qualificada para atuar nas indústrias. Assim, visando alcançar os interesses, o governo assume a responsabilidade de treinar os indivíduos que essas empresas necessitavam. Com isso, mostrava para população uma oportunidade de crescimento que eles não tinham antes, e logo o Estado apresentava-se como um órgão que estava contribuindo para o desenvolvimento da nação. Mesmo com a construção de escolas profissionalizantes, essas instituições não atendiam o desejo educacional das classes burguesas, que não possuíam interesse pelo ensino técnico. Deste modo, essas escolas foram utilizadas pelos filhos dos operários, que: [...] são forçados a trabalhar para o próprio sustento e o da família, escolhem cursos de nível médio, chamados profissionalizantes. E isto não para aprenderem uma profissão, mas porque estes cursos apresentam duas vantagens: são na maioria ministrados à noite, o que permite conciliar trabalho e estudo, e são cursos que, apesar de formalmente equivalentes, não são tão exigentes quanto o ginásio e o colégio (FREITAG, 1980, p. 67). Após a Segunda Guerra Mundial, surge um Estado populista e desenvolvimentista, que contribui para o movimento que tocou o Congresso Nacional, favorecendo a luta pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Assim, tem-se a terceira fase da história da educação entre os anos de 1945-1964, iniciando-se com determinação dessa lei considerada de grande importância para a política educacional, pois determina que tanto o serviço público como serviço privado possa administrar o ensino no Brasil. Porém, somente depois de vários debates, em 1961 a lei foi sancionada. Com a demora na determinação, essa lei acaba por ficar desatualizada, como afirma Freitag (1980, p. 59): “essa lei, que procura estabelecer um compromisso entre os interesses de uma burguesia 33 nacional e os interesses das frações de classe mais tradicionais, ligadas ao capital internacional, em verdade já está ultrapassada, quando entra em vigor”. Desse modo, essa lei foi mais favorável aos interesses políticos do que a vontade da sociedade. O que ocorreu foi uma negação da gratuidade, pois ao permitir o ensino privado, o Estado está assumindo que não consegue resolver o problema educacional sozinho, como demonstra Freitag (1980, p. 113): “Como o governo não pode deixar de dar uma solução ao impasse por ser este potencialmente conflituoso, permitiu que o setor privado participasse de sua solução”. Esse período foi marcado por graves problemas econômicos, políticos e sociais, que se acentuavam naquela época devido ao aumento da inflação. Mas é nesse contexto complicado que ocorrem as mobilizações e os movimentos contra o analfabetismo. Com o início da ditadura militar, o governo Castello Branco pretendia estabelecer a ordem no quadro educacional e, assim, decreta a Constituição de 1967, que reforça a questão do ensino particular, estabelecido em 1961, e promove a gratuidade e obrigatoriedade do ensino primário de 4 para 8 anos. O Estado queria com isso mostrar uma política educacional igualitária, mas, na verdade, o que ocorreu novamente, segundo Freitag (1980), foi uma educação a serviço dos interesses econômicos, sendo os planos e projetos dos militares para manter a ordem e desenvolver o país. Nessa perspectiva de desenvolvimento, no ano de 1969 é criado pelo governo um programa de alfabetização. A Fundação Mobral pretendia alfabetizar jovens e adultos, não sendo, segundo Freitag (1980), a primeira tentativa alfabetizadora exercida. Mas é a primeira vez que a alfabetização é claramente vista como um investimento que interessa ao desenvolvimento do país. Seguindo com a apreciação do processo histórico da educação brasileira, desenvolveram-se algumas reflexões com os pensamentos do sociólogo e educador Cunha (2005). Ele aponta que a demanda da escolarização foi fraca devido ao rápido processo de industrialização que o Brasil passou desde a década de 60, como também explana que, nessa mesma década, os meios de comunicação ganharam grande espaço, além de mostrar que existe uma hipótese que explica o que contribuiu para essa fraca demanda. Outros problemas que o autor aborda, relacionam-se a questão da qualificação dos professores e o espaço onde as aulas aconteciam, onde eram colocados estudantes de várias séries na mesma sala, exigindo dos professores maior qualificação. Diante disso, entende-se que o quadro apresentado relaciona-se com as questões econômicas vivenciadas pelo país. Cunha (2005) relata que entre 1973 e 1985 não houve uma 34 modificação relevante no número de matriculas nas instituições de ensino público, e isso tem relação com o estímulo que o governo fornecia às escolas privadas. Conforme Cunha (2005, p. 37), [...] no 1º e no 2º graus, a cobertura insuficiente da rede de ensino público é uma justificativa para que bolsas de estudo sejam distribuídas aos alunos para freqüentarem escolas privadas. Assim, recursos que poderiam ser utilizados na ampliação da rede pública de ensino são transferidos para o setor privado, reforçando a carência que justificou a primeira rodada de subsídios. Com isso, o autor mostra que a privatização foi um fator marcante na administração da educação e apresenta o governo do presidente José Sarney como o primeiro presidente civil, após os anos da ditadura. Este buscou uma reforma, tentando eliminar o caráter autoritário, mas Cunha (2005) explica que houve apenas uma nova edição dos mesmos procedimentos adotados. Como na questão da valorização do ensino técnico profissional, visualizado como acelerador do desenvolvimento social, em que nesse governo foi realizado o projeto para a construção de duzentas escolas técnicas, com o Programa de Expansão e Melhoria do Ensino Técnico (PROTEC). No entanto, segundo Cunha (2005) a meta desse programa não foi considerada objetiva para a criação desse grande número de escolas, no qual apresenta que no final do governo Sarney, em 1989, apenas dezesseis novas escolas foram realmente construídas. Diante disso, verifica-se que os planos realizados pelos governantes não possuem um planejamento, como afirma Cunha (2005, p. 268): O planejamento educacional como processo não tem sido no Brasil uma forma de atuação do Estado, principalmente devido ao clientelismo, ao privatismo e à predominância de padrões autoritários, mesmo quando se buscou, de algum modo, a construção da democracia. Seguindo a trajetória pela história da educação, percebe-se uma grande influência no cenário educacional com a Constituição de 1988 e a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional de 1996, na qual o governo assume a política educacional como sua competência. Mas essa passou por vários governos, e com o presidente Collor de Mello (1990 a 1992), a política educacional é colocada em segundo plano. Depois, com o presidente Itamar Franco (1992 a 1995), tenta-se, novamente, definir apolítica da educação (PIANA, 2009). Abordando esse ponto em certo momento da entrevista, AS4 (2013) comenta sobre essa lei ao dizer que o sistema de ensino não é democrático, “porque a LDB é prova disso, a forma como ela foi imposta, colocada para sociedade, não é democrático”. 35 Após realizar um estudo sobre o processo histórico da educação, percebe-se que a deficiência na educação brasileira foi marcada desde o início de sua história, e que os avanços nessa área foram resultantes das lutas da população na tentativa de inserir a escola como um espaço para todos. Porém, essas conquistas somente foram mantidas para sustentar as classes dominantes e a estrutura existente, e, assim, o que prevalece não é uma educação de qualidade. Realizando um paralelo da história da educação com as informações obtidas na pesquisa de campo, verifica-se que apesar de todas as barreiras enfrentadas, atualmente a questão do ensino no Brasil avançou comparado aos anos atrás. Porém, ainda necessita de muitas melhoras, pois ao perguntar às entrevistadas o que elas pensam a respeito do modelo atual de ensino e se elas consideram o sistema educacional democrático, elas afirmam que: É a mesma oportunidade. Igual, igual, realmente a gente não pode dizer que sim, porque a gente vem de um sistema, nós somos fruto de um sistema que ele por si só, ele é altamente excludente, né, o sistema capitalista. Então, assim, ele deu muitas melhoras, sem dúvida, grandes avanços, mas, assim, se você realmente for fazer uma comparação com dez ou quinze anos atrás, está cem por cento melhor; muitas pessoas estão tendo mais acesso que não tinha, não se via há alguns anos atrás; Mas dizer ter a mesma oportunidade, a gente acredita que não [...] (AS1, 2013) Em parte sim. Em parte ele é democrático, porque hoje ele dá acesso, isso a gente não tem nem como negar. Se a gente comparar com anos anteriores, o acesso era bem mais difícil. Ele dá acesso, mas ele é democrático nesse sentido, porque ele dá acesso, mas no passo que ele dá acesso ele tem que melhorar a qualidade, ele não pode ficar só nesse sentido de cotas e tal. Ok! Mas cadê a política paralelo a isso, a longo prazo? As cotas, elas deveria ter um prazo de tantos anos, que é exatamente o tempo dos governos. Vamos investir nas escolas de bases e no ensino fundamental, para que não sejam mais necessárias as cotas. Ele não é democrático nesse sentido. É e não é, em parte. (AS2, 2013) Olha, o modelo de ensino no Brasil em si, eu acredito que ele tem que melhorar muito, muito, muito. Porque, assim, é contado as exceções que não visam a formação para o mercado, né? E que formação nós estamos dando? Então, nós temos que alinhar uma formação crítica, como eu disse. Lógico que o mercado é importante, mas que você tenha condições de fazer uma análise de conjuntura, você tenha uma visão plena do que lhe rodeia. Se nós partimos do pressuposto de democrático ser acesso, eu acredito que de uns anos para cá, o acesso ele se tornou mais democrático dentro das diversas camadas sociais. Eu acredito que nessa visão ele está se tornando cada dia mais democrático. (AS3, 2013) Com esses relatos, identifica-se que o que ocorreu foi apenas uma transformação das problemáticas de acordo com o tempo, pois ainda hoje continua a luta pela igualdade de uma educação de qualidade para todos. Mas, como se vive em uma sociedade capitalista, na qual o que prevalece são os interesses econômicos, a educação é um setor que vai ficando para trás, pois, de acordo com a 36 Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO, 2008) 3 , o Brasil está entre os 53 países que ainda não alcançaram e estão longe de alcançar os objetivos de uma educação para todos. Como o sistema educacional público brasileiro não oferece uma educação de qualidade, contribui e alimenta a lógica do capital, visto que se a população necessita de uma educação eficiente, ela precisa pagar para adquirir esse serviço. [...] as propostas neoliberais em matéria de política educacional se orientam pela lógica do mercado, pelas leis da oferta e da procura. A ação do Estado em matéria de educação se reduz a garantir uma educação básica geral, deixando os outros níveis de ensino sujeitos às leis do mercado. Ele se encarregará de premiar as escolas de melhor qualidade, punindo as ineficientes com a restrição da demanda (BONAMINO, 1993, p. 7). Para que as instituições educacionais ofereçam um ensino de qualidade, é necessário um investimento na política de educação, para que essa não desenvolva um trabalho somente de quantidade, mas sim de qualidade, envolvendo a educação dentro dos interesses do país. Conforme um ranking sobre a qualidade da educação 4 , no qual incluía 40 países e o Brasil ocupou o 39º lugar no ranking de educação, mostrando que o fator educação de qualidade não é um elemento preocupante para os nossos governantes, embora a educação seja um investimento necessário para o desenvolvimento do país, como bem lembra Antônio Filho (2008) 5 : Educação é um catalisador e, portanto, fator determinante no desenvolvimento de qualquer nação. A educação é a principal ferramenta para capacitar o capital humano qualificado, cada vez mais necessário, na era atual. Sem qualificação é, praticamente, impossível a uma nação se manter e competir na era do conhecimento. Diante disso, torna-se necessário que a questão do ensino de qualidade seja encarada pelos governantes com objetivo e foco, pois não existe solução para as problemáticas da educação, sem a vontade dos políticos que estão no poder para a representação do povo. Porém, não basta apenas construir projetos para a construção de escolas, mas sim alterar o sistema educacional, pois o que acontece é que os representantes 3 O relatório Monitoramento de Educação para todos Brasil 2008 - Educação para todos em 2015: alcançaremos a meta?, divulgado em 2008 pela UNESCO, utilizou dados referentes a 2005. Disponível em: <http://www.unesco.org/new/pt/brasilia/education/education-for-all/education-for-all-goals/>. Acesso em: 20/10/2013. 4 A pesquisa foi divulgada em 2012 e levou em consideração os dados coletados em 2006 e 2010. Disponível em: <http://www.cartacapital.com.br/educacao/ranking-de-educacao-com-40-paises-coloca-o-brasil-em-penultimo- lugar>. Acesso em: 14/11/2013. 5 Disponível em:< http://www.espacoacademico.com.br/084/84amsf.htm >. Acesso em: 14/11/2013. 37 preocupam-se apenas em realizar obras para continuar se mantendo no poder. Conforme afirma Tomazi (1997, p.71): No Brasil, há muito tempo, há mais interesse em se aplicarem recursos na construção de escolas, de modo a privilegiar os aspectos quantitativos da educação em detrimento dos aspectos qualitativos. Implementar recursos pedagógicos, qualificar o corpo docente ou até mesmo contratar mais professores, pagar melhores salários, enfim, adequar a escola a uma situação em que o professor possa ministrar um ensino de qualidade não é objetivo de nossos governantes, pois isso não lhes dá dividendos eleitorais, uma vez que a própria sociedade cobra pouco esse tipo de ação. Obras públicas, como asfalto, pontes e viadutos, parecem agradar mais aos eleitores, „perpetuando‟ a gestão dos governantes. Nessa perspectiva, percebe-se que a população brasileira em vez de se organizar para ir em busca de uma melhoria coletiva e exigir dos governantes escolas com ensino de qualidade, pelo contrário: paga para adquirir esses serviços e se contenta com o que seus olhos podem visualizar, como as grandes quantidades de obras intermináveis realizadas pelos governantes. 2.3 A educação como uma questão de direito. Diversas transformações ocorreram na sociedade, durante as quais vários direitos foram conquistados, tais como o da educação.
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