Prévia do material em texto
Um itinerário poético segundo os EX ERCÍCIOS ESPIRITUAIS No princípio era a JESUÍTAS BRASIL O R G A N I Z A D O R Igor Cristiano Oliveira Nascimento, SJ No princípio era a O R G A N I Z A D O R Igor Cristiano Oliveira Nascimento, SJ G R U P O D E T R A B A L H O : Miguel Martins, SJ Raquel Beatriz Junqueira Guimarães Paulo Moregola Davi Caixeta, SJ José Laércio de Lima, SJ JESUÍTAS BRASIL Copyright ©Jesuítas Brasil C O O R D E N A Ç Ã O E D I T O R I A L , P R O J E T O G R Á F I C O E D I A G R A M A Ç Ã O Comunicação da Província do Brasil I L U S T R A Ç Ã O D A C A PA Claudio Pastro P E S Q U I S A I C O N O G R Á F I C A Igor Cristiano Oliveira Nascimento, SJ (2022) Todos os direitos desta edição reservados à P R O V Í N C I A D O S J E S U Í TA S D O B R A S I L Rua Bambina, 115, Botafogo Rio de Janeiro, RJ - Brasil www.jesuitasbrasil.org.br Tel.: (21) 3622-0236 S u m á r i o PRÓLOGO 5 INTRODUÇÃO 9 INTRODUÇÃO AOS EXERCÍCIOS ESPIRITUAIS 20 POEMAS DO PEREGRINO 319 5 Pediram-me para apresentar este livro de jovens poetas. Tentarei escrever apoiando-me na experiência, não só na minha, embora eu não seja jovem, nem tenha pretendido escrever poesias que possam ser classificadas segundo modelos literários. Nos meus salmos há poesia, mas não há uma opção por um gênero determinado. O que me interessa é ser claro e, em alguns casos, me expressar de forma que possa chegar a outras pessoas. Alguns salmos são mais poéticos e outros mais mistagógicos. Minha inspiração é a forma da poesia bíblica, tão presente em alguns profetas e nos Livros Sapienciais. O povo entende a sua linguagem, identifica-se com ela e, em muitos casos, os salmos e as orações tornam- se a sua oração permanente, porque resumem, de forma muito afetiva, o momento da sua vida. Quando a linguagem do encontro com Deus, tanto da sua presença como do seu escondimento, que é outra forma de provocar o nosso vazio sem fim, se torna pequena e carcereira, todos procuramos instintivamente linguagens mais poéticas, mesmo que não pretendamos nos enquadrar em nenhum molde definido de poesia. p ró l o g o Benjamín González Buelta, SJ 6 A poesia nasce quando nos adentramos no mistério, e se esse mistério é o abismo inesgotável do Amor de Deus, abre-se para nós um encontro com Ele que não tem ponto final, nem no caminho percorrido dentro de sua intimidade, nem na iluminação da nossa. O encontro com Deus também não se esgota quando entramos em toda a extensão da história, na surpreendente beleza e sabedoria da criação, nas criações fascinantes dos povos e das culturas, ou nas relações com cada pessoa humana. Às vezes podemos sentir que a única forma de nos expressarmos é o silêncio surpreendido que continua a ressoar no coração e no corpo, e que de forma alguma queremos arranhar com a limitação de nossa palavra. Pode ser que esse silêncio mais tarde nos presenteie com alguma palavra ou imagem inesperada e fecunda. Às vezes ouvimos dizer que o nosso tempo não é propício a esse tipo de experiência, por causa da velocidade e da estridência que assaltam os nossos sentidos e marcam o ritmo dos nossos passos e das nossas decisões 7 mais ou menos colonizadas. Não conseguimos encontrar facilmente no nosso itinerário espaços privilegiados que nos levem à calma e, por vezes, só dedicamos tempo a um burburinho que se embaralha sozinho dentro de nós com uma lógica que nos escapa. Ao mesmo tempo, devemos reconhecer que hoje a comunicação do nosso universo interior pode ter outros códigos. Há alguns anos, prestei atenção em uma jovem que tinha uma tatuagem que percorria a parte interna de todo o seu antebraço. Eu perguntei a ela o que aquele desenho significava. Ela me disse: “É um nome que eu não quero esquecer nunca, que preciso ter sempre diante dos olhos, que seja tão duradouro quanto a minha vida. É o nome da minha avó. Senti nela um amor tão incondicional, que sempre continua a me inspirar em qualquer situação que eu viva”. A cultura de hoje, que valoriza tanto a sensibilidade, a afetividade e o corpo, e onde os sentidos são tão estudados e impactados, pode ser tão sensível quanto em outras épocas, para acolher a linguagem a que recorremos para expressar a profunda experiência de Deus, que é o Amor em todas as suas inúmeras expressões. Quando a experiência de Deus se aprofunda, sentimos em muitas ocasiões que a linguagem racional e lógica dos discursos sobre Deus não pode recolher e expressar nossa experiência. Procuramos, então, outras linguagens mais imaginativas e simbólicas que nos possam referir a essa experiência sem pretender capturá-la, sem guardá-la como uma carteira de identidade, mas como um passaporte que nos abre para o melhor de toda a realidade. Também sentimos que, quando lemos em outras pessoas intimidades expressas com palavras evocadoras, podem-se despertar nossas dimensões mais profundas, e sentimos que de alguma forma elas estão falando de nós. Os Exercícios Espirituais, que nos situam no centro do nosso ser e do nosso devir, nos “exercitam” durante a primeira semana, para alicerçar a nossa vida no amor de Deus, que nos ajuda a reconhecer e acolher o nosso pecado, para que ele não nos desintegre a partir das sombras onde se esconde, mas nos liberte e possamos ser recriados pela misericórdia de Deus na qual 8 sempre vivemos. Depois, o exercitante concentra-se em contemplar, com os sentidos da imaginação, o Filho encarnado que nos surpreende com a sua maneira de olhar o mundo. Com o seu olhar livre, o exercitante descobre por onde passa o reino de Deus, e fala e age de uma nova maneira. Essa contemplação de Jesus vai mudando a nossa sensibilidade para que também nós, com os nossos sentidos, possamos perceber o mundo com todo o seu realismo. Poderemos contemplar que a última verdade da realidade é a presença ativa de Deus. Os místicos não são os que têm visões, mas os que contemplam Deus como a última dimensão do real, com o seu dinamismo de reconciliação de tudo o que foi criado. Os Exercícios não nos ajudam apenas a ordenar nossa afetividade para ordenar nossa vida; eles também mudam nossa sensibilidade para “sentir e saborear” toda a nossa vida de outra maneira. A novidade inesgotável de Deus sobre a realidade nos surpreende e unimos nossa criatividade com a dele. Nesse momento, os olhares desencantados se encantam, e se descobre o futuro novo em pessoas e situações das quais ouvimos dizer que não pode sair nada de novo e bom. Nesse tão intenso processo de relacionamento com Deus e com a reali- dade, podem nascer palavras e ações novas, até mesmo tão transgressoras quanto as de Jesus. A linguagem poética pode oferecer palavras e imagens que permanecem em nossa intimidade como memória da graça de Deus e, às vezes, como ajuda para que outros também se aproximem de Deus e da realidade com um olhar que, com a mesma força com que sofrem a dureza do real, descubram mais profundamente a ação de Deus que a transforma. Ele nos convida a associarmo-nos à sua própria missão de encantamento, sem saber onde acaba a sua mão e começa a nossa. Hoje todos necessitamos de palavras, imagens, símbolos, que emanam do centro de toda a realidade e que não carregam entranhas de negócio, de apropriação ou de exclusão, mas se oferecem aos paladares que procuram saborear a vida em sua verdade mais profunda e mais bela. 9 POESIA COMO EXERCÍCIO ESPIRITUAL A relação entre Exercícios Espirituais e Poesia pode ser encontrada já nas Constituições da Companhia de Jesus, integrando aquilo que os jesuítas “han de studiar”, nomeadamente as “Letras de Humanidad” que compreendiam “retórica, poesía y historia”, tendo por referência o tratado sobre a Poética de Aristóteles, e a partir dele, o estudo dos clássicos. Dito de outro modo, para Inácio a formação literária de um jesuíta comporta obrigatoriamente o estudo da literatura como forma de acesso ao humanismo comum compartilhado entre os clássicosda Antiguidade e o cristianismo, (cf. Constituciones de la Compañia de Jesus, Capítulo 5 [“De lo que los Scolares de la Compañia han de studiar”], nn. [351-352]; ainda cf. Cuarta Parte, Capítulo 12 [“De las Faculdades que se han de enseñar en las Universidades de la Compañia”], n. 2 A [448]). Essa abertura aos clássicos, própria da herança cultural da Renascença, era em si, ainda para o século XVI, um lugar de fronteira, dado o empenho de algumas figuras eclesiais em superar o que era considerado um modismo perigoso por flertar com não cristãos. Essa preocupação com a poesia, na perspectiva inaciana, pode ser relacionada à consciência de que “o modo de falar ajude o modo de sentir” Alex Villas Boas i nt ro d u çã o 10 (cf. Examen, Capitulo 4 [“De algunas cosas que más conviene saber a los que entran, de lo que han de observar en la Compañia”], n. 7 C [62]). E nesse sentido a poesia é uma mediação, ou seja, fundamentalmente um meio de ajudar as pessoas em duas coisas: a “fazer uma reflexão sobre si” e a provocar “santos desejos” (cf. Cuarta Parte, Capítulo 8 [“Del instruir los scolares en los médios de ayudar a sus próximos”], 4 D [407]; cf. ainda n. 45 [102]). Tal relação entre o despertar de afetos e reflexão sobre si, mediada pela linguagem constitutiva de uma lógica poética, como diria Giambatistta Vico (1668 – 1744), perpassa toda a história do pensamento Ocidental e Oriental na medida em que é a lógica própria dos textos sagrados e dos mitos religiosos, entendidos aqui em seu melhor sentido, e a despeito de sua não incomum desvalorização, sobretudo ao concorrer com modelos mais abstratos e essencialistas no pensamento Ocidental. Essa tensão e disputa entre poetas e filósofos ocorre já na Grécia Clássica, e é possível encontrar o seu registro no livro X da República de Platão, herdeiro dessa divergência que o antecede, mas que com ele ganha nova gravidade, ao dissociar linguagem e pensamento. Entretanto, ao evocar os poetas, Platão também atribui aos mesmos o ofício da teologia como “discurso divino” (República 379a). Vale lembrar que a questão “do que é um deus” (tí theós) já havia sido feita, quase um século antes do filósofo das ideias, com Píndaro (522 a.C.-443 a.C., cf. Fragmento 140d). E, mesmo após Platão, várias correntes do estoicismo entendiam que a leitura da poesia era também 11 um dos exercícios espirituais importantes para o cuidado de si, ao lado da pesquisa e da reflexão filosófica, de modo que dos mitos se extraiam princípios racionais, como afirmava o estóico Lucius Annaeus Cornutus, que viveu em torno do ano 60 d.C., em sua obra que ficou conhecida como Compêndio de Teologia Grega, atribuída a autores pré-cristãos, já em um momento em que a presença do cristianismo se faz sentir muito visivelmente. Tal recuo histórico tem a intenção de dizer que o caminho metafísico platônico que resultou na desvalorização da poesia, na medida em que dissocia o ato de pensar do ato de linguagem, assim como secundariza dimensões de concretude da vida humana, foi fruto de escolhas não dissociadas de um contexto político, que se sobrepuseram a outras atitudes intelectuais que levaram muito tempo para vir à tona e ser reconhecidas como alternativas que permitem revisitar a tradição teológica. Nomes que ficaram à sombra de grandes vultos, obras consideradas de menor importância, entre autores helênicos e cristãos, ajudam a escavar as relações entre espiritualidade, teologia e poesia que ficaram soterradas face aos intermináveis debates dogmáticos. Enquanto a poesia visava enfrentar os limites da finitude para se encontrar com uma experiência iluminadora de Deus, a dogmática, sobretudo a partir do estatuto jurídico que o direito romano vai lhe imprimindo [regula fidei], vai se especializando no enfrentamento de heresias, resultando em sobrevalorização conceitual 12 que ofusca a dimensão estética do dogma, ou seja, a beleza de Deus. Se a dogmática vai reforçando uma dinâmica de identidade que exclui sua alteridade, especialmente em alguns grupos em que nomeadamente ao lado dos hereges também se condena tudo o que não foi cristianizado, sempre houve testemunhos de grande lucidez, como é o caso de São Basílio de Cesareia em sua Carta aos jovens sobre a utilidade da literatura pagã. Ali, o grande não somente em santidade, mas também em sabedoria, exorta os cristãos em processo formativo para assumirem o “ideal da filosofia” (a teologia era parte da filosofia) a lerem Homero, Hesíodo, Sólon, entre outros, por ser a poesia um “elogio à virtude”. Evoca ainda a metáfora das abelhas como postura a ser tomada diante da literatura clássica pagã, que um grupo de cristãos considerava ser desprezível, de modo que à “imagem das abelhas” (mellitton tem eikóna) que se aproximam de todas as flores, e delas se servem daquilo que auxilia seu trabalho, sem se importar com o resto, assim deve ser o cristão em relação a tudo que lê (IV, 9). E ainda, face àqueles que pretendiam controlar o que deveria ser lido, por medo de que os estudantes se desviassem do caminho da fé, diz o Santo sobre a liberdade intelectual: “é nobre quem discerne (sonoronta), por si mesmo (par eautou)” (I, 4). Para os capadócios, já nos primeiros séculos do cristianismo, a leitura da literatura grega era parte de sua askésis, ou como se convencionou traduzir no Ocidente, de seus exercícios espirituais. 13 Essa grande obra, escondida em um livrinho de Basílio, só foi traduzida no Ocidente latino em 1405, por Leonardo Bruni, e foi de fundamental importância para a consolidação de uma perspectiva de compatibilidade entre os clássicos e o cristianismo, na emergência da Renascença. A partir daí é que Bruni foi legitimado a prosseguir com as traduções latinas de Demóstenes, Plutarco, Xenofonte, Platão e Aristóteles, sendo ele ao mesmo tempo membro de um círculo de literatos que estudavam autores que inspiravam o renascentismo, como Boccaccio, e, como chanceler, fora secretário pontifício de quatro papados (Inocêncio III, Gregório XII, Alexandre V e João XXII). Há incontáveis autores, ou obras menos conhecidas de grandes autores, que prestaram esse serviço de ressignificar o papel da poesia no modo de pensar a teologia, como Santo Efrém da Síria, Romano, o Melodista, considerado o Píndaro cristão, Potâmio de Lisboa, entre outros, que a historiografia, tanto a social, mas especialmente a eclesial, não privilegiou, devido à ênfase no debate dogmático. Tais autores, cristão e “pagãos”, recuperam a ideia da poesia como askésis, um exercício espiritual, a pensam a partir de um imaginário que valoriza a concretude da vida, especificamente a concretude do Amor na vida. Dizia o grande Tomás de Aquino que à manifestação que desvela o Mistério de excesso de sentido na vida, e “a isso chamamos Deus” [hoc dicimus Deum] (Suma Teológica I, questão 2, artigo 3), também provoca uma conversão da imaginação (conversio intellectus ad phantasmata, Suma Teológica I, questão 84, artigo 7). 14 Essa reflexão da concretude da vida, em que emergem experiências doadoras de sentido, se fez presente na literatura de modo geral, e nos poetas de modo específico, como um pensamento marcado pelo ato de imaginar, incluindo nesse modo de pensar a representação de nossa ambiguidade, e em meio a elas a emergência da esperança e o ensaio de novas realidades a serem construídas, um antídoto à idealização da vida, que, como disse Hölderlin, “poeticamente habita o humano sobre esta terra”, sendo a poesia a testemunha por excelência da própria condição de possibilidade da vida humana. Seguindo essa trilha aberta por Heidegger, é que o grande teólogo jesuíta Karl Rahner lamentava o fato de que tão pouco se falou sobre “tema tão elevado” na teologia do século XX, em seu escrito A palavra poética e o Cristo (Das Wort der Dichtung und der Christ, p. 454). Rahner via na poesia uma “escola de escuta” do Evangelho adequada à sua concepção antropológica de serhumano como Ouvinte da Palavra. Essa palavra, envolta em uma dinâmica poética, nasce silenciosamente como vontade de sentido à espera da sua tradução em palavras que transubstanciem o desejo em decisão em direção ao amor. A poesia, portanto, está a meio caminho entre as potencialidades da vida [potentia] e suas concretizações [actus]. Por isso, para o jesuíta alemão, o poeta tinha algo de sacerdote, assim como o sacerdote deveria ter algo de poeta, sendo ambos mediadores do Mistério. A poesia é uma escuta para o Evangelho porque a Palavra de Deus opera como Palavra poética inspirada e que reinventa a vida. Se os Exercícios Espirituais são entendidos por Rahner como “lógica de conhecimento existencial”, é a lógica poética da contemplação das imagens igualmente poéticas do Evangelho que dinamiza os afetos a entrarem na estrutura cristológica de suas cenas, de onde emerge uma nova configuração da existência. Não é à toa que a recomendação de Inácio nas Constituições sempre gerou jesuítas que traduziram a mistagogia dos Exercícios Espirituais em formas poético-literárias de colocar a linguagem ao serviço de despertar o desejo por um Amor maior ou, como diria o próprio Inácio, santos desejos. Insere-se aqui a emergência do teatro jesuítico, por exemplo, como expressão da pedagogia humanista dos Colégios da Companhia de Jesus, com nomes como Luís da Cruz (1543-1604), Miguel Venegas (1531- 1567), Stefano Tucci (1540-1597), Pedro Pablo de Acevedo (1522 – 1573), 15 e que genialmente é adaptado e inaugurado no Brasil por São José de Anchieta (1534 – 1597) para uma cultura radicalmente diferente de sua origem europeia, e como instrumento de pacificação e de sensibilização ética. O mesmo se pode dizer de seu confrade, Antonio Vieira (1608 – 1697), chamado por Fernando Pessoa Imperador da Língua Portuguesa, em que os Sermões vieirinos são cenificações que alteram profundamente o modo de compreender a realidade. Tal ressignificação provocada pela cena se dá devido ao fato de ela ser construída pela leitura literária como um princípio de interiorização, um estilo que fora inaugurado por um brilhante aluno de um colégio jesuíta na Espanha, chamado Miguel de Cervantes (1547 – 1616), inspirado na antropologia literária da Autobiografia de Santo Inácio de Loyola. Tal qual Inácio, o itinerário transforma o cavaleiro Dom Quixote em peregrino, transmutando a visão de mundo a partir da configuração autodirigida de um “novo eu”, em que a imaginação funciona como uma visão interior de uma verdadeira ação teatral que mobiliza os afetos. Do mesmo modo é que Gerard Manley Hopkins (1844 – 1889), com seus Sonetos, cenifica as desolações da turbulenta modernidade no mais concreto do cotidiano para lapidar com sua poesia a beleza bruta do coração em que habita também a graça. 16 Essa relação entre mística e poesia é lapidar em Michel de Certeau, e é constitutiva da análise da presença da religião na Modernidade, sendo o labor poético um exercício de produção do paradoxo em que se possibilita o impossível na linguagem, um estilo mais compatível ao indivíduo contemporâneo indisposto aos discursos mais pornográficos do anúncio da fé, como dizia o crítico literário mexicano Juan García Ponce. O que pode ser entendido como pornografia verborrágica da pregação da fé, reside na compreensão de que a linguagem pornográfica não mostra demais, mas sim de menos, porque o explícito atinge apenas de modo epidérmico o desejo, tal qual uma pregação eivada de moralismos que visam coagir à conversão. Tal coerção pelo explícito é incapaz de expressar a secreta dinâmica erótica que vai seduzindo cada vez mais o desejo para o todo da existência, e ordenando-a para o que faz mais sentido. A poética que lapida a dimensão bruta da ambiguidade da vida e a transubstancia em representação paradoxal da presença do que chamamos Deus possui essa capacidade erótica de poeticamente possibilitar a compreensão do que se chama Palavra divina, viável, portanto, pela poética e pela mística, na condição de ser portadora de uma palavra inspirada, e demanda uma educação da escuta para captar tal inspiração na vida de 17 quem a recebe. Ademais, para evocar Michel de Certeau, a poesia como prática discursiva também está relacionada a uma prática social, que possui duas funções: ética e crítica. A ética representa como prática social aquilo que a poética representa como prática discursiva, a saber, a abertura de um espaço que não necessita ser autorizado por uma autoridade ou pela ordem estabelecida da realidade, uma semente de possibilidade nas fendas dos muros da impossibilidade, e que cria pontes para a esperança. Tal enunciado do aparentemente impossível se desdobra potencial e frutuosamente na cultura não como fruto de mera contestação, mas como emergência do impossível que habita o desejo, e inquietantemente brota como confissão do inevitável, modelo alternativo de inteligibilidade advinda da lógica poética dos místicos. Se a poética, portanto, tem outro registro de autorização que não se dá pela reprodução de enunciados teológicos autorizados, mas sem negá-los, traduz a beleza dos mesmos pelo exercício de engendrá-los poeticamente na linguagem comum, que se impõe por sua força estética. O mesmo vale para a emergência da sensibilidade ética que brota como Rosa no asfalto, para lembrar Carlos Drummond de Andrade. E é exatamente nessa condição de buscar exprimir o inefável do poético e do ético que ambas as linguagens são formas de resistência da dignidade humana, e de modo 18 muito peculiar, evocando Agamben, há na poética cristã um traço de antitragédia, de insistência em reverter o itinerário para a fatalidade em ocasião de mudança de mentalidade para reorientar a busca, de si, de uma comunidade, de um povo. E é nesse sentido que tanto a mística quanto a poesia, além de sacramentar, expressam esse chamado de tentar dizer o impossível de ser totalmente dito, sobretudo em épocas que vão sendo caracterizadas pelos muros, visíveis e invisíveis, de divisão, de proibição da transparência, de impedimento da palavra, de abismos para a ética. Não raro, é nesse momento de muralhamento ético que a poética vem em seu auxílio, como ponte que nos aproxima dos dias que ainda não se realizaram, mas que já estão presentes nos mais nobres sonhos de humanidade, fraternidade, justiça e de paz que habitam nossos desejos. Místicos e poetas habitam as fendas ainda não abertas na história, mas já domiciliadas no desejo. É assim que gostaria de tentar homenagear este precioso livro de exercício poético, que faz jus ao cristianismo moderno da tradição inaciana, e, junto com ele, alarga as fileiras daqueles que tentam recuperar o papel da poesia no pensamento filosófico e teológico a fim de oferecer um cenário em que o sujeito contemporâneo se identifique, e ali identifique o sentido de Deus na sua busca de sentido. 19 A imagética poética dos poemas escritos e visuais que aqui se encontram é fruto da grande obra escondida no livrinho dos Exercícios Espirituais de Santo Inácio de Loyola, que se não é ser lido, por outro lado é uma escola de poetas como atesta a história dos jesuítas. Tal qual o poeta, o exercitante dos Exercícios tem diante de si o desafio de inscrever na vida o efeito da inspiração advinda sobre a vida. Todos somos poetas, mas apenas alguns de nós escrevem. Todos somos chamados a poeticamente habitar nossa história e nela descobrir um sentido que oriente a construção de uma nova história. Alguns fazem poesia no modo como vivem, como trabalham, como educam os filhos, como ajudam os que mais sofrem e alguns outros também escrevem poemas, e na medida em que escrevem ajudam a grande poética da vida a apostar que a vida é capaz de sentido apesar de seu absurdo. Os poetas que escrevem prestam o nobre serviço de fomentar a fraternidade entre aqueles que vivem a poética de sua vida. E os Exercícios Espirituais têm a nobre missão de ajudar a perceberque a vida é capaz de poesia e, sendo, é capaz de beleza, de bondade, de empenho por nobres ideias, de resistência pelo que é justo, é capaz de Amor, a que os cristãos chamam Deus. A estes que escrevem, devemos nossa gratidão por proporcionar um sentir cum poetas, que é de algum modo uma janela às suas almas que foram atravessadas por um Mistério que o leitor aqui também persegue, e que deverá descobrir que antes é por Ele seduzido. Seus poemas são, como diriam os medievais, vestigia Dei, uma busca de transformar em sentido a presença evanescente significante de algo que se situou em um tempo, e que dela temos apenas seus ecos. É neste eco (oikos) que os autores convidam o leitor a enxergar para além do que está escrito, ler o poema como um exercício espiritual. “Não é o muito saber que sacia e satisfaz a alma, mas o sentir e saborear as coisas internamente.” (Anotação 2) 21 Senhor Jesus Cristo, tu nos dissestes: “Aquele que quiser salvar a sua vida, vai perdê-la, mas aquele que a gastar por mim e pelo evangelho irá salvá-la”. Porém, nos dá medo gastar a vida, entregá-la sem reservas. Um terrível instinto de conservação nos conduz ao egoísmo, e nos amedronta quando queremos gastar a vida. Procuramos segurança em toda parte, para evitar riscos. E sobretudo está presente a covardia. Senhor Jesus Cristo, nos dá medo gastar a vida. Mas a vida Tu no-la deste para ser gasta; não se pode guardá-la em um estéril egoísmo. Gastar a vida é trabalhar pelos outros, mesmo quando não pagam; fazer um favor a quem não vai devolver. Gastar a vida é lançar-se, mesmo no fracasso, sem falsas prudências; é “queimar os navios” pelo bem do próximo. Somos velas que somente temos sentido quando queimamos; somente então, seremos luz. Livra-nos da prudência covarde que nos faz evitar o sacrifício e buscar a segurança. Tira-nos Senhor, essas falsas prudências que pensam demasiado no “meu” amanhã. Temos que gastar-nos por Ti. Gastar a vida não se faz com gastos espantosos, ou falsa teatralidade. A vida se dá simplesmente, sem publicidade, como a água da fonte, como a mãe dá a mama ao bebê, como o suor humilde do semeador. Ensina-nos, Senhor, a lançar-nos ao impossível, porque detrás do impossível está a tua graça, tua presença, estás Tu, Jesus; não podemos cair no vazio. O Futuro é um enigma, nosso caminho se adentra na obscuridade; mas queremos continuar nos doando, porque Tu nos estás esperando na noite, com mil olhos humanos derramando lágrimas. Senhor Jesus, ensina-nos a gastar a vida, a entregá-la sempre mais, sem reservas, como Tu fizeste. GASTAR A VIDA Padre Luís Espinal, SJ 22 PRECE Jerfferson Amorim, SJ Dá-me a graça de caminhar lento quando o meu peito aberto for lugar de repouso para os peregrinos do mundo. Dá-me a graça de escutar sereno e com paciência não pretender dar respostas nem receitas. Dá-me a graça de viver na abertura, cultivando afetos e tecendo relações solidárias. Dá-me a graça de ser homem e menino sempre discípulo, aprendiz. 23 MEU CORAÇÃO TEM CASA André Araújo, SJ Meu coração tem casa tanta casa esse coração tanta casa coração tanto coração casa e ele sabe e bate asa sem medo da solidão e ele sobe e entra em casa no meio da escuridão. 24 “ÉL, GRAN MISTERIO” Germán Méndez, SJ ¡Qué gran misterio eres! Amor infinito que se mide en dos brazos extendidos. Abrazo eterno que despliega su poder en lo frágil. Fragilidad que todo lo puede porque todo lo ama. Amor que todo lo perdona porque todo lo ha creado. Creación que todo renueva porque todo lo habita. Presencia plena que a todos llama a la vida. Vida perene que no teme a la muerte. ¡Qué gran misterio eres! 25 OBRA: SILÊNCIO Alexandre Raimundo de Souza, SJ DESCRIÇÃO: Desenho a lápis grafite sobre papel. Arte sobre o curvar-se, abraçar, contorcer-se, sentir a própria dor. De que sou acusado? Seu olhar pode ser só de julgamento e você nunca ouviu minha narrativa. 26 O SILÊNCIO Igor Cristiano Oliveira, SJ O que há no silêncio? Murmúrio de Deus Sim, é Ele sussurrando em meus ouvidos, Entrando em meus sentidos, ou melhor, possuindo meus sentidos. O que há no silêncio? O encontro com o absoluto, A inquietude de uma alma sedenta, Provocador dos desejos irrequietos. Silêncio, construção de intimidade Busca pelo “Ser” Clarificação dos mistérios transcendentes Revelação, nudeza do inexprimível. O que há no silêncio? O inexprimível O poético O harmônico. O que há no silêncio? Liturgia, Deus se corporificando, Revelando, Dando-se a nós. 27 OBRA: SAIR DO QUADRO, ENTRAR NA VIDA Alexandre Raimundo de Souza, SJ 28 “ESTOY SEDIENTO” Germán Méndez, SJ (Província do México) Mi alma está sedienta. Estoy sediento del Dios que da la vida. Tengo sed, hijo mío. Estoy sediento de tu amor. Mi cuerpo está cansado, Padre. Con ansias en ti busco descanso. Mis brazos están fatigados, hijo. He muerto con ellos extendidos para que en ellos halles tu descanso. Mis pasos no me sostienen. De noche y día, Padre, te busco andando. Hijo, aquí están los míos clavados. Fijos para que sepas encontrarlos. Padre, mi rostro anhela tu rostro. Al horizonte apunta esperándote en la aurora. Hijo, mi rostro he dejado caer mirando abajo. Así hallarás mi mirada siempre posada en ti. Tengo miedo, Señor. Mi debilidad me asusta. Mi fuerza tierna brilla sobre el miedo. Mi amor en ti, hijo, fortalece tu fragilidad. Te veo mirarme, Padre. En tu mirada me rehaces. Me veo en ti, hijo mío, creación mía. Mi amor entero arde serenamente en ti. Amor mío, vida mía. Padre mío, amigo y refugio seguro. Sueño mío, anhelo mío. Locura mía, pasión mía, hijo siempre mío. 29 OBRA: SILÊNCIO Jobson Ramos, SJ 30 BUSCA Pe. Jackson A. Carvalho, SJ Para Te encontrar, basta o trabalho, uma disposição, um jeito de ser, um sorriso. Para Te encontrar basta estar na história na realidade na partilha um pedaço de pão. Senhor, encontro a ti no irmão. Reconhecendo-te no rosto do outro, no perdão, sacrifício, na reconciliação. Senhor, para te encontrar, abro o coração, na justiça cumprida, paz desmedida, na entrega de vida, Palavra de Amor. Onde estás? Ouvi tua voz por entre árvores que balançam, pássaros que cantam, no zumbido da abelha, dentro do coração atento, no assobiar do vento, nuvem em movimento. Ouvi tua voz No silêncio imposto, Em um guerrear sem sentido, Na ferida exposta, De um gesto te aproprias. Ouvi tua voz nas incelenças entoadas, nas novenas dos santos, no pedido de chuva, na maré transbordada. Ouvi tua voz na família ferida, a pobreza sentida, da comida garantida, tua voz se ouvia. 31 AL OCÉANO Tomás Browne Urzúa, SJ (Chile) Al océano se lo boga sin prisa paladeando su espesor No se avanza a borbotones con los pies desparramados ni golpeando con rabia el pelaje del mar Al agua se le soba como a un animal pequeño perdiéndose en el ritmo En cada brazada el rumbo un sonido y la cadencia de las olas También la sal que irá subiendo por tus manos astilla por astilla dejándote sin rostro dejándote solo Incluso la estela con su fidelidad blanca te habrá abandonado y tú no te agites Sigue bogando apaciguado siendo solo un movimiento Tú sigue sigue bogando hasta sentir la caricia de la quilla sobre la arena. 32 SILÊNCIO Jobson Ramos, SJ Silêncio Não queira me atrapalhar Estou sendo criado em algum lugar O corpo, a alma a cor O receptáculo da calma e da dor A sinceridade, a caridade, o pudor Nem tudo são flores Há espaço para o medo Parte importante do segredo Milagre Falta pouco para o meu despertar Silêncio Não queira me atrapalhar Você e eu Você sou eu Nós Somos um Estamos nus A sós Abra os olhos Veja a luz Seja luz. 33 OBRA: Alexandre Raimundo de Souza, SJ DESCRIÇÃO: Pintura acrílica sobre tela. A arte do relacionar-se, do cuidar-se, toda dignidade, toda ternura. Por vezes o pranto, o silêncio... 34 RETIRO Luis Espinal, SJ Esto es sólo un paréntesis. No podemos encerrarnosen nosotros mismos, Señor, para entregarnos a Ti. Apenas cerramos los ojos, hallamos solamente el desierto de nuestro «yo», la náusea de nuestra nada. Nos da miedo una perfección algebrizada, con sus mil senderitos y grados. Señor, con los ojos abiertos te quisiéramos hallar en los demás, porque nos sonríes desde todo rostro humano. Te quisiéramos seguir a pleno sol, con la naturalidad de tu Evangelio. Déjanos ser osados. Nos pareces demasiado adusto en tus santos; te preferimos a Ti, desnudo y alucinante. No hemos nacido para el silencio; porque Tú nos has cargado con tu Palabra. A Ti te hallamos mejor en el ruido, en los problemas de los hombres, en estas personas heridas que se nos acercan. Jesucristo, tal vez nos sobre petulancia, pero nos asquean ciertas palabras: perfección, virtudes, santidad… Palabras de autopsia, estructuras que ocultan la vida, tu Vida. Líbranos del riesgo de volverte a desencarnar. Tememos mediatizarte. Ojalá no te perdamos entre tanto andamio. 35 SILÊNCIO Cláudia Honorio (Leiga, colaboradora dos EE) Preciso do silêncio E se eu abrir a boca, minha alma vai rachar. Preciso do silêncio, Nele me encontro com o Cristo, com a vida plena. Preciso do silêncio cúmplice, No silêncio rezo, amo, choro, me alegro. Preciso do silêncio E quando meus lábios estão fechados, Deus reza em mim. Meu coração cresce de todo lado, nele tudo cabe. Preciso do silêncio O silêncio é tenso, Mas nele, a presença é plena, amor discreto, calmo e alegre. O silêncio é palavra de vida, o abraço, o riso sem razões. É ele! É o Senhor! O silêncio é palavra agradecida. 36 PRECE DO AMOR PEQUENO João Júnior Amo-te com meu pequeno coração, com os cacos de mim. Com aquilo só que, às vezes, resta da batalha perdida, os despojos do existir. Acolhe com carinho sem pena e corajosa esperança meu pequeno amor e o vaso frágil de minha ternura. E busca reconhecer na confusão desses pedaços a inteireza que nunca fui e o sonho do que eu seria se tocado por teu amor. 37 OBRA: MENDIGO NA ORAÇÃO José Paulino Martins, SJ 38 CAMINHADA Renata Sales (Leiga, colaboradora do OPA) Aquietar-se Olhar o céu e sorrir Sentir a brisa Esmorecer Erguer o corpo caído Sustentar o peito Sofrido Encontrar o consolo Deitar nos braços De então, Ouvir os conselhos Afinal, quem caminha Sozinho, solitário Não sabe onde anda Tropeça O caminho não é uma estrada reta É vendaval É dilúvio Esperança e Silêncio também É um encontro Esperado Sentado ao lado de alguém. 39 AMOR LONGE João Júnior O difícil de amar para além do alcance das mãos ou dos lábios, e de ter o coração assim derramado, é que sempre se estará um pouco só. E que ela, porém e inevitavelmente, estará sempre ao lado; ela, a saudade, lembrança terna da finitude. 40 SOLEDAD Luis Espinal, SJ Todo hombre está siempre solo: con su «yo» impenetrable, su responsabilidad, su misterio, su amor, su predestinación… Recordamos la soledad del huérfano y la soledad del anciano, hambrientos de personas queridas. La soledad del delito, la soledad del sufrimiento, y de la tumba. La soledad del altiplano, la soledad de la pampa, del corazón de la mina, y la soledad del mar… Señor Jesús, enséñanos a vivir nuestra soledad; todo hombre es un solitario. Nos pesa la vida, con esa gravitación constante hacia lo infinito, insatisfecha por ahora. Por esto te mendigamos misericordia para los suicidas y desesperados. Tú sabes, Señor, la fascinación que ejerce sobre nosotros el pecado. Equivocadamente buscamos en él el espejismo del absoluto: realizarnos, saciar nuestro amor en este abismo de noche. Te pedimos por la soledad de los encarcelados; por los pastores altiplánicos; por los vigilantes nocturnos. Jesús de Betania y de Caná, enséñanos a encontrar y vivir la amistad y el amor. Te pedimos por aquellos que aún no han descubierto estos tesoros. Que cuando nos sintamos solos, recordemos la soledad humana de tu Encarnación y tu agonía. Te ofrecemos nuestra soledad, para que sea redentora unida a la tuya, para que se complete lo que falta a tu Pasión. No permitas que nos cerremos en nuestra soledad; ábrenos para salir al encuentro de la soledad de los otros. Que no se nos eclipse la esperanza de la comunión eterna Contigo. Ven, Señor Jesús. 41 OBRA: TOQUE DIVINO Jobson Ramos, SJ DESCRIÇÃO: A mão esquerda, cansada e sem vida, espera ansiosa por um toque divino. A Mão direita, viva e forte, aguarda sem pressa a hora certa para se doar. No encontro, a vida, há vida, transfusão de amor e cuidado. Impressão de sabedoria e desejos. Toque que marca como tatuagem que jamais se apaga. Toque que imprime digitais. Toque Divino. Toque humano. 42 FOME DE MIM Igor Cristiano Oliveira Nascimento, SJ Silêncio, preciso ouvir o céu Quero escutar a imensidão da minha alma Quero encontrar-me comigo Quero mergulhar no meu sertão Silêncio, preciso ouvir o vento Quero ser inebriado pela harmonia Quero me ver e desnudar-me de mim mesmo Quero a fome do horizonte Silêncio, preciso contemplar as estrelas Quero uma vida metafórica Quero olhos sensíveis Quero sentidos abertos, atentos. Silêncio, preciso da minha solidão Quero possuir a mim mesmo Quero tempo para as minhas inquietudes Quero a liberdade de ser eu mesmo e me perdoar Silêncio, preciso sentir a vida pulsar Quero sentir fome da minha presença Quero uma vida reinventada... 43 PRINCÍPIO E FUNDAMENTO Maria Clara Lucchetti Bingemer Somos seres posteriores. Ou seja, chegamos depois. Depois do pai e da mãe, depois dos avós, depois do mundo, depois de séculos, milênios de história, de processos internos da terra que habitamos. Somos posteriores às coisas criadas que encontramos ao nascer. E nós e tudo o mais somos posteriores a Deus. Só Ele é nosso Princípio e Fundamento. Somos criados, criaturas. Somos fruto de um Amor infinito que nos desejou e nos pensou para viver no amor, na reverência e no serviço. E tudo o que nos circunda deve ajudar-nos a isso. Se não nos ajuda, deve ser descartado. Nossa vida não pode contentar-se com a banalidade ou a mediocridade. Se viemos de um Amor infinito, devemos viver para reproduzir com nossa vida a esse amor, refleti-lo amando, reverenciando, servindo e buscando somente aquilo que MAIS nos ajuda para essa plenitude de vida a nós doada com nossa criação. Viemos de Outro que nos desejou e criou a fim de que vivamos para os outros, para fora de nós, buscando sempre para além de nós mesmos, de nosso eu, buscando sempre e em qualquer situação, vida ou morte, alegria ou dor, aquilo que mais nos leva ao encontro d´Aquele que nos criou e é a rocha onde nossos pés repousam, nosso Princípio e Fundamento. Nossa identidade mais profunda é ser criados, redimidos e santificados. Somos feitos para louvar a Deus que nos faz incessantemente, abrindo suas mãos para que tenhamos vida. Feitos para reverenciar tudo o que é criado, desde a mais minúscula plantinha até a mais próxima, querida e majestosa das criaturas. Feitos para servir a tudo e a todos: à natureza que nos dá solo, alimento e vida. Aos outros, nossos semelhantes que tal como nós são criados pelo mesmo Criador que em sua benção amorosa original segue acreditando em sua criação e chamando-a sem cessar à plenitude da vida. 44 OBRA: EXERCÍCIOS ESPIRITUAIS José Maria Fernandes Machado, SJ DESCRIÇÃO: Princípio e Fundamento – Caos sendo ordenado (Rm 8,18-30). 45 “O ser humano é criado para louvar reverenciar e servir a Deus nosso Senhor e, assim, salvar-se.” (Anotação 23) O DIVINO FEZ-SE POESIA Igor Cristiano Oliveira Nascimento, SJ No princípio era a poesia, A poesia fez-se palavra, Fez-se verbo Fez-se humanidade redentora... No princípio era o verso, O verso fez-se melodia... Fez-se pretexto Fez-se corpo No princípio era a saudade, A saudade fez-se presença, Fez-se nostalgia... Fez-se fraqueza No princípio era o desejo O desejo fez-se cioforia Fez-se espera... Fez-se carne E armou sua poesia entre nós. 46 FOTOGRAFIA:Régis Sarto, SJ 47 A VIDA ACONTECENDO: EIS O SOBRESSALTO! André Araújo, SJ Além... Olhei pro alto e me surpreendi com o que via na parede. Sorri. Entrava sem que eu me desse conta. Existe uma vida potente que desponta, trabalha lá fora e aqui dentro da gente. Um balé nas coisas e nas criaturas, a carnalidade do mundo que me apavora e me entrega suas vísceras com uma força e um existir profundo, que atravessa e impressiona e mora e pulsa e faz feliz toda hora. Entrou como quis, porque o sol saiu e brilhou e insistiu. Assim, naturalmente, não pediu nada, mesmo estando a porta e a janela fechadas. 48 OBRA: Alexandre Raimundo de Souza, SJ DESCRIÇÃO: Pintura sobre madeira. Arte sobre a delicadeza, ser acolhido, ser presença. 49 “AQUEL DÍA” Germán Méndez, SJ (México) El día en que no trinen las aves, bajaré al lago a buscar la lágrima que les robaron; ahí donde enterré mi dolor por tanta muerte, ahí donde ahogaste la pena de tus pérdidas. El día en que no brille la luciérnaga, volaré a la luna a buscar su luz; ahí donde enviaba mis deseos, ahí donde guardaste tus promesas. El día en que no dé concierto el grillo, atravesaré el fuego en que ardió su cítara; ahí donde ardió mi corazón en esperanza, ahí donde hallaste tu perdón. El día en que ya no amemos, me hundiré en el barro de donde me formaron las entrañas; ahí donde me enseñaste a amar, ahí donde te enseñaron a amar. El día en que ya no amemos, mendigaré el canto al ave, rogaré a la luciérnaga su brillo, y su música al grillo. El día en que ya no amemos, el lago me devolverá el dolor, la luna mis deseos, y el fuego mi esperanza. El día en que ya no amemos, el lago te dará tus penas, la luna tus promesas, y el fuego tu perdón. El día en que ya no amemos, la tierra nos dirá al oído, que nos ama y nos anhela. Y en el amor de su barro, hallaré yo mi sostén, y por su amor, amaré. Y en el amor de su barro, hallarás tú tu sostén, y por su amor, amarás. El día en que no amemos, y la tierra nos consuma, emergeremos de su barro, amados por amor, amantes por amor. 50 NO CAMINHAR PELA VIDA Davi Caixeta, SJ No caminhar pela vida, uma visão, uma voz, um chamado: Tira as tuas sandálias! Pisa neste chão com teus pés, toca este barro que tu és, sente esta terra que eu criei. Como te revelas com tanta graça! Cubro meu rosto diante de ti, abro meus ouvidos para te escutar, acolher tua Palavra. Queres mesmo te fazer com esta lama? Por que insistes em soprar este pó? Ponho meus pés neste chão, Junto à lama que eu sou, eu serei. Fogo que ilumina sem se consumir, brasa que transforma corações de pedra, vem consumir a escravidão e libertar este teu barro. Eis aqui a tua terra! 51 ENTONCES, ¿QUÉ HACEMOS? Pe. José Maria Rodríguez Olaizola, SJ ¿Qué hacemos con los pies de barro, con los sueños rotos, con las noches de vigilia y las puertas cerradas? ¿Qué hacemos con la fe asediada, el amor negado, los golpes injustos, y el desaliento? ¿Qué hacemos con la pobreza, con el fracaso, con el hambre, con la guerra, con la tristeza que campa a sus anchas por tantas vidas? No rendir la esperanza ni blindarnos contra la tormenta, no renunciar a los sueños, seguir buscando la llave que abra la vida, que libere la alegría que desencadene la paz, la abundancia, la justicia. Y seguir confiando, que con nuestro barro haces tú milagros. 52 FOTOGRAFIA: José Paulino Martins, SJ 53 O HOMEM QUE SOU Francys Silvestriny, SJ O homem que sou vem de tantos outros... Tantos pequenos tesouros recebidos de presente achados com surpresa surrupiados em segredo Tantas fendas e brechas abertas pelo amor rasgadas pelas feridas rompidas pelos recomeços Como poderia eu devolver a fortuna de meus tantos pedaços sem ser despedaçado e destruído? Como poderia eu exigir outros tantos pedaços que dei, perdi ou me tomaram no caminho sem despedaçar e destruir os outros? Minha vida única esta dívida impagável tem sido inteiramente saldada pela compaixão de muitos corações generosos A você, meu irmão, que carrega em si pedaços de mim receba, feliz, a mesma anistia Pois você e eu só estamos aqui porque somos frutos de um mesmo Amor capaz de juntar os cacos e revelar Beleza. 54 OBRA: Alexandre Raimundo de Souza, SJ DESCRIÇÃO: Pintura a óleo sobre tela com gesso. Arte sobre os níveis do ser. Um sempre nascer, um parto, o ser humano nos seus diferentes níveis da possibilidade de relação. Este também extrapola os limites da tela, foge do espaço comum, tende a expandir. 55 TATUAGEM Jobson Ramos, SJ Da natureza um fato Da humanidade um ato No coração um salto que me leva pra longe Lá atrás, lembranças Fui criado Sentido Sonhado Agora, trago tatuado em minha pele Tudo e nada Fogo e água Eis aí a minha referência Uma resposta pra quem não me pergunta Uma revolta pra uma renúncia Resistência Sinceramente Eu me importo com o amanhã Mas o meu lugar é hoje Ninguém vai me roubar. 56 OBRA: LIBERDADE Jobson Ramos, SJ DESCRIÇÃO: “Tudo o que nos toca, nos transforma. Deixemo-nos afetar pelo que é belo.” 57 ESTAMOS EM TI Jackson Carvalho, SJ Ah, Senhor! Bem sei de tua bondade, carinho e amor criador! Não à toa, tu nos deste a vida! Do barro fizeste a nós, humanos, obra de tuas mãos, desejados por ti. Quando nos deste a vida, com olhar amoroso, Tu viste que tudo era muito bom! Para ti fizeste cada pessoa humana! Somos para ti! Permanecer em ti é graça! Se em ti estamos, contigo aprendemos; Se em ti estamos, iremos por onde queiras. Por isso podemos te louvar e te servir. Se assim nos encontramos, caminhamos por ti. Porque és trilha de vida, de salvação. Ah, Senhor! Além de nos saber tua imagem no mundo, Porque criaturas saídas de ti, Tu nos deste a nós o que criaste, Para cuidar, para nos manter, para crescer. Quanta bondade! Pensava no acaso... Sem ti, porém, nada teria sido criado, nada seria dado, nada de imagem tua. E tu, deste-nos tudo! Tu te deste a nós! Ah, meu Senhor! Meu Deus! Do coração aberto de teu Filho Jesus Vem a liberdade pela qual nós, tuas criaturas, ansiamos. Realizar o que queres é objetivo. Viver em ti, que nos movimenta, Realizando tua vontade, sem medida, desejamos. Por teu amor, vivemos, entregamo-nos a ti. 58 PROCURAVAS... ENCONTRASTE! Gleison Pereira, SJ Procuravas... Encontraste! Ó Amor, aqui estavas, E meu olhar não vias. Ó Amor, me procuravas, E de ti fugia. Sem ti caminhava, Mas de mim não esquecias. Abandonado sentia que estava, Mas discreto me protegias. Sozinho caminhava, Sozinho sofria, Sozinho chorava, Sozinho seguia. Ó Amor, encontrastes, E mirando avistastes, Os passos não faltastes, Tua face no caminho revelastes. Nunca sozinho caminhava, Nunca sozinho sofria, Nunca sozinho chorava, Nunca sozinho seguia. Ó Amor, de mim cuidavas, Junto a mim permanecias. Bem perto ficavas, Mesmo quando de Ti me esquecia. Minha vida aceitaste, Do barro me modelaste. Tua imagem manifestaste, Sem Ti não posso viver, pois me encontraste. 59 TODO INTEIRO A TI, SENHOR Guilherme Kaíque, SJ “Sai-te da tua terra, da tua parentela e da casa de teu pai, para a terra que eu te mostrarei.” (Gn 12, 1) Como a andorinha que voa livre suspensa no vento quero também eu poder me entregar, todo, inteiro a ti, Senhor... Que meu abandono seja tal que eu não confie em outro se não em ti e tua poderosa e protetora mão a me guiar... Sei que me mostras um novo país, uma nova terra. Não imagino ser fácil o caminho, mas se eu lhe entrego minha vida o caminho muda... Pedra de tropeço torna-se pedra para edificação. Edifica-me, Pai, faz-me homem novo, todo, inteiro a ti, Senhor... 60 FOTOGRAFIA: Régis Sarto, SJ 61 POETIZAR A VIDA Igor Cristiano Oliveira Nascimento, SJ Eu quero é poetizar a vida, Torná-la cheia de cores Mesmo que dentro de mim exista um sertão Quero poetizar a vida, Descobrir e beber das minhas próprias fontes. Eu quero é poetizar a vida, Amar a minha pobreza Tornar minha esperança ativa Quero poetizaresperançando, Quero que meu ser finito anuncie um prelúdio de uma poesia litúrgica transcendental. Eu quero é poetizar a minha existência, Dar sentido, encontrar razões. Quem sou eu? Quero descobrir poetizando. 62 OBRA: A VIDA SE TECE EM SONHOS José Paulino Martins, SJ 63 CYBER SALMO Alberto Luna, SJ (Paraguai) Señor, tu me escaneas y me conoces, sabes si estoy conectado o ausente, de lejos captas qué estoy pensando. Si chateo, caminando o acostado, tu accedes a todos mis mensajes. Aún no he posteado una palabra y ya, Señor, conoces la frase entera. Me rastreas por detrás y por delante, y deslizas tu dedo sobre mí. Tu saber desde la nube me supera, son resoluciones muy altas para mí. ¿A dónde huiré lejos de tu alcance? ¿a dónde escaparé de tus redes? Si escalo a un lugar sin señal o voy a los confines sin wifi, también allí estás conectado. Si me pongo alas, en modo avión, o voy sin batería al otro lado del mar, también allá me encontrarás sin gps y me localizarás sin satélites. Si digo entonces: Borraré mi historial de navegación, cancelaré los registros de acceso. Mas para ti no hay datos ocultos y las claves están todas abiertas. Pues mis archivos desde el principio están registrados en tu base de datos. Te doy gracias por tantas maravillas admirables son tus obras y mi alma bien lo sabe. Tu me tenías registrado en tu lista antes de que abriera ninguna cuenta. Todos mis contactos te son familiares. Incluiste mi perfil en tu lista de amigos y me has hecho miembro de tu grupo. Mis páginas favoritas están ante ti, y registras en tu portal mis accesos. Tienes guardadas todas mis visitas. Los datos de tu sistema son infinitos, superan los formatos de mi memoria. ¿Cómo podría yo almacenarlos? Aunque me pase la vida actualizando jamás alcanzaré a tener tu última versión. 64 OBRA: O MENINO Alexandre Raimundo de Souza, SJ DESCRIÇÃO: Xilogravura. Estudos sobre expressões narrativas. 65 CREADOR DISCRETO Benjamín González Buelta, SJ No hay que pensar el aire para que se filtre al último rincón de los pulmones, ni hay que imaginar la aurora para que decore el nuevo día jugando con los colores y las sombras. No hay que dar órdenes al corazón tan fiel, ni a las células sin nombre para que luchen por la vida hasta el último aliento. No hay que amenazar a los pájaros para que canten ni vigilar los trigales para que crezcan, ni espiar la semilla de arroz para que se transforme en el secreto de la tierra. En dosis exacta de luz y de color, de canto y de silencio, nos llega de la vida sin notarlo, don incesantemente tuyo, trabajador sin sábado, dios discreto. para que tu infinitud no nos espante, te regalas en el don en que te escondes. 66 OBRA: PRINCÍPIO E FUNDAMENTO Luís Renato Carvalho, SJ 67 REALIDAD Alberto Luna, SJ (Paraguai) De lejos me encantas, de cerca me decepcionas. Por vez primera me fascinas, cada día me desilusionas. Porque de cerca descolorea tu imagen pintada en mí, y cada día despiertan las fantasías que soñé de ti. Y al descorrer el velo ¿qué me queda de ti sino tu presencia desnuda? Esa que eres en verdad. Esa que quiero ocultar y me resisto a mirar. La única que puedo amar, la que se deja abrazar. 68 AMOR QUE SALVA Alan Cavalcante, SJ Todos os dias invade minha existência Transborda Minha consciência. Caminho pelas ruas E deixo-me tocar Pelo amor Que se oferece. Busca morada nos Seres que continuam A concretização da vida Em obras Em palavras. Oferece-se sempre Com a bela pretensão De salvar-nos dia a dia Da turva visão. 69 OBRA: Alexandre Raimundo de Souza, SJ DESCRIÇÃO: Pintura acrílica sobre papel cartão. Arte sobre o quadro janela. Eu, artista, não posso prender as imagens na tela, elas fogem da minha capacidade, são muitos sentidos e significados que não pintei. Quem olha vê o que muitas vezes está dentro. A psiquê de um ser humano, nas suas tantas janelas narrativas. Cada janela leva a uma outra janela. Podem ser infinitas. De novo, o espaço das possibilidades de encontros. 70 AMAR SEM (RE)TER Higor Lima, SJ Amar sem (re)ter Reter é o mesmo que não ter. Aquilo que é retido deixa de ser o que era. Aquele que retém não é o mesmo de antes. Ter não é o mesmo que ser. Aquilo que é tido, não é. Aquele que tem, jamais será. Sê livre. (cf. EE 23) 71 OBRA: ANDORINHAS NO FIO José Paulino Martins, SJ DESCRIÇÃO: Nanquim aguado sobre papel. 72 O QUE HAVIA ANTES DA PALAVRA? Igor Cristiano Oliveira Nascimento, SJ O que havia antes da palavra? O nada A nostalgia O Silêncio Deus dançando em seus desejos infinitos... 73 OBRA: SILÊNCIO Jobson Ramos, SJ 74 O ÍNTIMO MAIS ÍNTIMO Igor Cristiano Oliveira Nascimento, SJ Na escuridão da minha Alma Tu estás O mais íntimo da minha solidão Tu habitas, Move em meu corpo e em meus sentidos Tu possuis o que de mais íntimo em mim é desconhecido. Oh mistério, mais íntimo do que a mim mesmo Onde tu habitas? A sede dentro em minha alma é a descoberta de que és tu mesmo, possuindo-me; É aqui que tu moras, tu habitas a minha alma inquieta. Aqui dentro de minha alma, tu, mistério que me possui, constrange o meu Ser, Dessedenta, despe o Ser e, se faz Palavra em mim. 75 HUMANO Franklin Alves, SJ O ser humano? Um nó! Feito com as cordas do tempo e do espaço. Um nó tão angustiado… Mas que tem tanto medo de ser desatado! 76 OBRA: Alexandre Raimundo de Souza, SJ DESCRIÇÃO: Pintura acrílica sobre papel. 77 LÁGRIMAS Franklin, SJ Minhas rugas... dobras na pele, onde as minhas dores dormem despreocupadas quando, então, acordadas por minhas lágrimas, descem faceiras e de mãos dadas até os cantos da minha boca. Minhas lágrimas... meu melhor remédio. 78 AMAR José Fernandes, SJ Por que te calas, minh’alma? Que silente segredo Aninhas em teu ser? Acaso o amor te seduziu, Ou escondes o teu medo De amar Nas dobras do silêncio? Amar. Amar é extrair do fundo Da alma o romântico Rosto da vida. Amar é não ter medo Deus uma desilusão. É ser poeta Que faz das palavras Um acalanto ao amor, Amar. É quem permite Um lento enlouquecer-se Pelo ser amado. É libertar-se Como lua por entre nuvens Em suave deslizar. Amar é ser nuvem Suja de dourado Quando o sol posto Se vai adormecendo É rir como límpida água De riacho entre Redondas pedras Amar são tantas coisas Tantas palavras e sonhos Tantos cantos e silêncios Que se unem e se conjugam No verbo amar. 79 DEUS TERNURA Odair José Durau, SJ Quem é Este que ama, chama e cuida? Aprisionado na razão dura e crua, era incapaz de compreender, sentir e experimentar o amor presente no mundo. Um amor discreto, sutil, profundo, respeitoso e belo. Por que será? Talvez pela autossuficiência, quem sabe pela rudeza de um teimoso ou quiçá por algum motivo que, possivelmente, desconheço ou não quero nomear. De fato, ainda falta muito para caminhar, para me conhecer e mergulhar com confiança na imensidão do Amor. Bendita foi a dor da perda experimentada, a qual foi dolorida no momento, mas fundamental para abrir uma fresta no coração e, assim, deixar o caminho livre para o Amor. O Amor que até então era desconhecido foi ganhando identidade e um rosto de ternura e bondade. Já tinha ouvido algo neste sentido: “tarde te amei, ó beleza eterna”; mas hoje sou agradecido por ser amado desde a mais tenra idade. Imerso e maravilhado na ternura de Deus, percebi que nada é pequeno no Amor, nem mesmo eu que, incrivelmente, fui acolhido na companhia desse Amor. Ó feliz dor que me abriu os olhos para um horizonte maior. Hoje, sigo confiante o Caminho de luz, Como um peregrino que não sabe o que vai encontrar, afinal, nada mais me causa medo, A não ser, deixar escapar a graça de estar ao lado da Ternura. 80 MIRAR DE NUEVO Juan Gutiérrez, SJ (Perú) Mirar de nuevo, abrazando mi principio reencontrándo lo principal, dejando que me repares en lo que soy, suavemente, para caminar sin ataduras.Mirar de nuevo, sintiendo mi fundamento, mi cimiento esencial lo que acallo en mis calles, lo que por ventura irrumpe a pesar de mis resistencias. Mirar de nuevo aquello principal individualizante y aquel cimiento estructurante para ser libre de nuevo, para volver a Ti. 81 BARRO EN LAS MANOS Jaime Andrés, SJ (Equador) barro en las manos corazón palpitando humano roto. todo vibrando resonando el amor abrazo lento. 82 LIBÉRAME DE MÍ Benjamín González Buelta, SJ Aquí estoy, Señor, doblado con un signo de interrogación que espera la respuesta al ritmo urgente del deseo tan tirano. Aquí estoy, Señor, hueco como la palma de la mano, hecha un cuenco para recibir el agua sin demora. distiende mis dedos de mendigo ansioso en un ágil gesto de baile y alabanza. Aquí estoy, señor, curvado como un anzuelo que busca afilado con su seguridad de acero la presa tangible como pago justo a su esfuerzo tenso. ablanda mi rigidez en el suave mecerse del sedal sobre las olas. Aquí estoy, señor, acogiendo tu don, la alegría y la paz de tu misterio. 83 OBRA: VINDE A MIM VÓS QUE ESTAIS CANSADOS José Paulino Martins, SJ DESCRIÇÃO: Caneta esferográfica. 21x29cm – 1999. 84 INTIMIDAD Luis Espinal, SJ la intimidad, Nos sobrecoge un paisaje, nos alucina el misterio de la vida submarina; pero ver un alma… es cegador. La intimidad es la transparencia del amor. Tal vez, es el único lenguaje plenamente comunicativo. En la intimidad se roza lo absoluto. La intimidad permite el diálogo sin palabras. En ella, se rompe la barrera entre exterior e interior, entre tuyo y mío… Gracias, Señor, por este don tan frágil de la intimidad. La intimidad nos alcanza la comunicación plena, la comunión. Rompe un poco la epidermis del «yo», y podemos convivir. Bajo el resplandor del «tú» que se comunica, se desmorona el egoísmo; llega la trascendencia, y comenzamos a verte a Ti, Señor. Lo que sería trivial si fuese nuestro, se transfigura y se vuelve apertura cósmica, cuando Tú nos lo das en la intimidad humana. Señor, enséñanos a respetar este gran sacramento de tu presencia. Esta teofanía sencilla y afelpada, como un musgo, pero capaz de hacernos reverdecer el alma. Jesucristo, te agradecemos que nos hayas hecho hallar personas tan ricas de intimidad. Pero, líbranos de profanarlas lo más mínimo. La intimidad es el último reducto de la libertad, el núcleo central de la persona. Por eso, danos comprensión para intuir el misterio de cada persona. Para no intentar convertirla en una fórmula exacta. Enséñanos a no juzgar a nadie, al menos con este juicio radical e inapelable. Danos una postura delicada ante las personas queridas. Las aceptamos totalmente, como son, con sus virtudes, defectos y misterio. En ellas respetamos este inmenso. misterio de tu trascendencia. 85 PRIMEIRA SEMANA Maria Clara Lucchetti Bingemer Esta não é a semana do pecado, como às vezes costuma ser chamada. Mas é sim a semana antropológica, quando vamos aprender a nos olhar e ver como criados para amar, reverenciar e servir. Vamos ver-nos humanos, mortais, falhos e ao mesmo tempo grandes. E sobretudo vamos sentir-nos olhados e amados com o olhar infinitamente misericordioso de Deus. Esse amor está expresso de forma infinita e próxima no Cristo Crucificado, que nos amou e se entregou por nós. Diante do Crucificado, Inácio de Loyola, o peregrino ferido pelo amor de Deus, sentiu-se perdoado, resgatado, amado. E se perguntou: Que fiz por ti, Senhor? Que faço? Que farei? A misericórdia não nos deixa parados, simplesmente girando à volta de nossos sentimentos. Ela nos impele para a frente, acendendo em nós o desejo de fazer algo por esse que tudo fez por nós. Apesar de nossa finitude somos amados infinitamente. E podemos amar porque fomos amados primeiro. Esse amor nos envolveu, nos olhou nos olhos, nos chamou, nos levantou ao colo, nos acarinhou. E quer que busquemos sempre mais. Sempre o que mais nos conduz para o fim para o qual somos criados: louvar, reverenciar e servir. Em suma: amar do mesmo amor com que somos amados. Este é o conteúdo da primeira semana dos Exercícios. Ver como a graça de Deus é maior do que qualquer pecado, como qualquer infidelidade é superada pelo seu infinito amor, como esse amor nos constitui e nos faz ser quem somos: filhos queridos e perdoados desde sempre e para sempre. Somos filhos nascidos do desejo do Pai e renascidos do dom do Filho. Pelo Espírito, somos constantemente ensinados a buscar mais vida, inspirada e gerada do perdão e destinada à comunhão da Santíssima Trindade. 86 OBRA: EXERCÍCIOS ESPIRITUAIS José Maria Fernandes Machado, SJ DESCRIÇÃO: Caos – Consequência do pecado: O barco da Morte – CARONTE. Da Mitologia Grega inspirando o Pecado e a Graça. 87 “Pedir a graça a Deus nosso Senhor para que todas as minhas intenções, ações e operações sejam puramente ordenadas a serviço e louvor de sua divina Majestade.” (EE 46) NOVO SENTIDO Carlos César, SJ Quando pronuncias meu nome, é poesia e afeto, carícia e canção. Eu ouço, reconheço e te sigo. Quando me fitas o olhar, é amor e verdade, perdão e recomeço. Eu olho, entendo e te recebo. Quando tocas em mim, é ternura e dança, apoio e cura. Eu sinto, me levanto e te anuncio. Teus gestos, Senhor, me restituem e Teus sentidos, convertem os meus. 88 OBRA: JESUS – COLÔMBIA Luís Renato Carvalho, SJ 89 CUANDO VINO LA LUZ Pe. José Maria Rodríguez Olaizola, SJ Estábamos ciegos, sumidos en la oscuridad sin saberlo. Creíamos tener el control de vidas y haciendas, de leyes y ritos, de corazones y cuerpos. Confundíamos realidad con deseos, lamábamos verdad a lo que solo eran sueños. Hasta que se hizo la luz, y empezamos a vislumbrar grietas en las paredes, arrugas en el alma, lágrimas en el rostro, flaquezas en la entraña. Hubo quien, entonces, temió que el fulgor desvelase solo miserias, y optó por cerrar los ojos. Pero el que se atrevió a mirar descubrió, más allá de las heridas, una presencia distinta, un amor sin cadenas, a Dios… Dios es el que late en lo hondo y da sentido a las batallas cotidianas. 90 OBRA: Alexandre Raimundo de Souza, SJ DESCRIÇÃO: Lápis grafite sobre papel. Arte meu jeito de expressar. Sou negro, sou história. 91 FANTASMAS E DEMÔNIOS Franklin, SJ Espremido entre a embriaguez de Futuros e a tormenta de Passados Quero gritar até que se abra o espaço do Presente Onde eu possa dançar com os meus cem fantasmas Sem máscaras e ao som da poesia Embriagando-me de lágrimas! Dançar! Dançar e dançando espalhar as cinzas dos meus tormentos. Cantar! Cantar e cantando dominar os meus demônios Repetindo ao repique de longínquos sinos: Passa! Passa! Passa! Tudo passa... 92 DESCI AO INFERNO Thalisson Bomfim Um dia antes de ir, pela noite, já deitado na cama, aplico as adições que me ensinaram... Num breve instante preparo o outro dia. Desperto às 6h20 da manhã, como tinha proposto na adição do dia anterior. Após abrir os olhos, a primeira coisa em que penso é na atividade que me fez acordar mais cedo. Preparei-me antes e na hora para descer ao inferno. E o inferno existe? Existe e fui até ele! Resisti, relutei, neguei. Mas Ele me levou. Fui de mãos dadas com Ele, parecendo uma criança com medo e acuada. O inferno era um ambiente familiar, muito familiar. Era a sala de minha casa. Da casa em que morei até há pouco tempo. O ambiente estava todo escuro, sem os móveis. Ouvia vozes, uma em especial pedindo para parar... gritos, risadas, piadas. Via muitos rostos. Dedos apontando, pedras para serem arremessadas. Sentia raiva de cada pessoa presente. Senti o deboche, o escracho, a ira. Não falava nada, só olhava e experimentava o gosto do inferno. Saboreava cada olhar, gestos, toques, todos os movimentos e sentimentos. Nada passou despercebido. O inferno existe, ele é real! O inferno existe e pode ser aqui e agora! O inferno existe e ele é existencial! O mais bonito dessa experiência foi levantaras mãos e Ele me puxar, me chamar para viver no Céu. Se o inferno existe o Céu também pode existir ou ser construído. Voltei do inferno mais amado, perdoado, feliz e pronto para continuar a ser criado e recriado na dinâmica do amor e seguindo os passos d’Ele. O Céu existe, ele é real! O Céu existe e pode ser aqui e agora! O Céu existe ele é existencial e é 93 PRECE Rogério Barroso, SJ Esta voz, pela garganta abafada, não querendo, senão por Ti, calar, trépidos sons grita, angustiada, e o medo pede a tudo olvidar. 94 OBRA: AS MÃOS SOBRE O ROSTO Alexandre Raimundo de Souza, SJ DESCRIÇÃO: Desenho a caneta esferográfica sobre papel. Arte sobre os exercícios espirituais. 95 MASMORRA Ozires Vieira de Sousa, SJ Fiz-me de vítima, refém do abandono Calei-me por medo de demonstrar minhas fraquezas Gritei em silencio: socorro! Para não importunar os outros. Então, decidi viver no castelo da superficialidade Protegido pelos muros do medo, do silêncio e da aparente tranquilidade. Sem perceber, tornei-me prisioneiro da solidão. Cansado desta prisão, decidi me libertar. Fugi do castelo pelo subterrâneo, abrindo os calabouços, deixando livres Os sentimentos Os traumas E feridas Fui me aventurar em outros reinos, tendo como companheira a minha Consciência. 96 TEMPO DE PÁSCOA Lucas Pedro, SJ Deus, nos cativas com dom de sua alegria. A luz da ressurreição adentra as trevas E ilumina com o esplendor da bondade. As fraquezas se transformam em coragem O cheiro podre dá lugar a Aloés A vida se reveste de amor Os dias difíceis dão lugar A um silêncio misterioso Que toca! Acalenta!! Cuida!!! A divindade diviniza a a humanidade Se experimenta aqui Aquilo que depois se gozará para sempre Deus é assim Mistura de amor Banhado com excesso de alegria Pequenas e singelas gotas Que harmonizam Que pacificam Alma ansiosa na busca Do mistério Onde está Deus? Qual o caminho para encontrá-lo Apenas nas orações Sigo minha intuição Guiado por suas moções. 97 PERDONAR Juan Gutiérrez, SJ (Perú) Señor, cómo perdonar cuando la memoria me distancia, cuando no recuerdo haberlo hecho, cuando no olvido la ofensa, cuando no vuelvo al cotidiano que me recuerda como hermano. Cómo hacerlo cuando no entiendo la ofensa, cuando no sé perdonarme, cuando no lo pienso posible cuando no imagino abrazar sin vencerme a mí mismo. Cómo lograrlo cuando mi voluntad se instala, cuando me paraliza la herida, cuando hay palabras duras, cuando mi deseo de perdonar no llega a mis acciones. Señor, sí lo intento, pero desearlo no basta, pues no depende solo de mí que la memoria no me hiera, que entienda tu misericordia, y que mi voluntad se mueva. Señor hoy no puedo, pero deseo desear perdonar Tú nos inspiras y mueves y cuando pueda será Gracia Tuya. 98 A VIDA É MISTÉRIO DE TRANSCENDÊNCIA Igor Cristiano Oliveira Nascimento, SJ Eis que a prisão obscura onde me encontro me convida: A Amar A Esperançar A Sonhar Eis que meus olhos enxergam no cotidiano vácuo, A beleza de abrir a janela, e perceber que o cotidiano é transcendência de mistérios tangíveis... Eis que minha vida é mais do que aquilo que se vê, Minha vida é felicidade de desassossego. Eis que a vida é uma paz inquietante, uma hora ela afrouxa, uma hora solta... Quem me dera conhecer todos os mistérios que corroem dentro de mim. Eis que sou guiado por uma grande fome; bendita seja a fome dentro de Minh ‘alma. Não quero jamais que ela se acabe. Perderia o gosto de sonhar De esperançar De amar De buscar... Eis que o homem é um ser inquietante, Inquieta-se tanto que sua alma só vive na busca de algo fora da materialidade. Eis que o homem é uma realidade finita... Mas eis que é Deus o princípio e fim do homem É o absoluto de toda minha subjetividade... 99 OBRA: Alexandre Raimundo de Souza, SJ DESCRIÇÃO: Pintura acrílica sobre tela. Arte narrativa sobre as ataduras: não ser tolhido, não perder sua capacidade de expressar, numa busca de liberdade e compreensão do outro. Não somos monstros, somos seres que buscamos estabelecer relações. 100 SEM IGUAL Álvaro Negromonte, SJ Diante de ti, Senhor Estive todo, completo em mim A alegria me encheu o coração Por teu amor-miserere sem fim Sou teu copeiro, sei que sou Quero servir à mesa, cuidar Mesmo que tenha sido infiel em alguns momentos Teu toque de perdão vem me inundar Não há outro igual a ti, Senhor! Sem fim é o teu amor, o teu perdão Diante da minha pequenez Rasgo o peito de dor e gratidão. 101 CORAÇÃO EXPANDINDO Alan Cavalcante, SJ Ajuda-me, Senhor, A compreender Teu perdão. Aquela compreensão Simples, profunda Inesgotável Do coração. Diante de ti Minhas culpas Autojulgamentos, remorsos Já não encontram Lugar. Os lugares de minha Vida se abrem Para outra presença. A reconciliação O olhar amoroso O abraço acolhido. Da tua misericórdia Se expande meu coração Expande-se para que Mais possa amar. 102 OBRA: INÁCIO EM MANRESA José Paulino Martins, SJ DESCRIÇÃO: Acrílica sobre tecido. 1,20x2,50m – 2000. 103 MUITAS VEZES, SENHOR! Higor Lima, SJ Muitas vezes, Senhor! Quase sempre a mente está cansada. O coração está insensível. Os juízos são falsos, preconceituosos. Todos os dias Tu nos estendes a mão. Todos os dias nos dais a oportunidade de tomarmos parte contigo. Dividir o pão. Dilatar o coração. Sempre titubeamos. Perdão, Senhor! Por nossa falta de confiança, Por nosso amor vacilante. Ensina-nos o teu modo de amar, Para que assim o Teu coração ame em nós e por meio de nós. 104 MIRADA DE MISERICORDIA Juan Gutiérrez, SJ (Província do Perú) Miras el mundo herido y su dolor te rasga, cual amor no correspondido. Te duele nuestro pecado, pero te duele más no perdonarnos. Tu mirada se alegra, porque cuando nos nombras cada uno te vuelve su rostro. Tu mirada embellece, porque cuando nos perdonas cado uno es más hermoso. 105 OBRA: CRISTO José Paulino Martins, SJ DESCRIÇÃO: Técnica mista sobre página de revista – 20x20cm – 2006. 106 A VIDA EM MOVIMENTO Agnaldo Duarte, SJ Nestes dias de vento Sem destino e documento Precisamos do acalento Pra curar a dor só o tempo Neste momento, só o tempo Mas passa tão lento Precisamos do alento Como o pão precisa do fermento Nestes movimentos o fermento Não é apenas um alimento É preciso conhecer o sentimento Que atravanca o corpo por dentro Neste coração por dentro Palpita em contentamento A dor da gente é de sofrimento Que grita vida adentro Nestes mares adentro Além das bússolas me oriento Nas viagens sem mapas entro Levo a esperança em dia cinzento Neste dia tão cinzento Que o sol se esconde no firmamento Mudança de comportamento O amor vive sempre em movimento. 107 FOTOGRAFIA: Régis Sarto, SJ 108 PERDONAR Juan Gutiérrez, SJ (Província do Perú) Señor, cómo perdonar cuando la memoria me distancia, cuando no recuerdo haberlo hecho, cuando no olvido la ofensa, cuando no vuelvo al cotidiano que me recuerda como hermano. Cómo hacerlo cuando no entiendo la ofensa, cuando no sé perdonarme, cuando no lo pienso posible cuando no imagino abrazar sin vencerme a mí mismo. Cómo lograrlo cuando mi voluntad se instala, cuando me paraliza la herida, cuando hay palabras duras, cuando mi deseo de perdonar no llega a mis acciones. Señor, sí lo intento, pero desearlo no basta, pues no depende solo de mí que la memoria no me hiera, que entienda tu misericordia, y que mi voluntad se mueva. Señor hoy no puedo, pero deseo desear perdonar Tú nos inspiras y mueves y cuando pueda será Gracia Tuya. 109 OBRA: NOSSA SENHORA DA RUA José Paulino Martins, SJ 110 TIERRA QUEBRADA Jaime Andrés, SJ (Província do Equador) Tierra quebrada resuenan los tambores mirada pura Atardecer las palabras tejidas migas de pan. 111 CETICISMO MÍSTICO Rogério Barroso, SJ Ecos vagos delineiam formas Em abissos sonoros contidas Avistam o Mistério que entorna Além da sorte, o despertar da vida Nada e Tudo se confundemNa peleja vão luzes projetadas Inertes, descobrem e se fundem Imagens falsas por si criadas Decriptam da alma seus postos Decompostas presenças na dor do crível Retornam os seres análogos e opostos Religa-se o Necessário ao possível Da lida plena a sentença é ato Dela se diz oração, de fato? 112 OBRA: CRIAÇÃO – PRINCÍPIO E FUNDAMENTO Rogério Barroso, SJ DESCRIÇÃO: Compensado naval, verniz vitral, purpurina dourada, filó de algodão, barbante. 113 MIRO ADELANTE Benjamín González Buelta, SJ Miro hacia atrás, y veo mis dolores recientes e insepultos, y toda mi vida ambigua y generosa ya generosa ya bajo la tierra sepultada a paladas de días y de olvidos. Miro adelante y me veo en la vida que engendré ayer al sembrarme, creciendo hoy delante de mí mismo, en la risa sin trampa de los niños, en el ritmo de los jóvenes que estrenan horizontes, en las comunidades que se unen contra las fuerzas de la muerte. Mi vida ya va en todos ellos delante de mí más fuerte que yo, marcándome el camino tirando de mis pasos. Hoy, en este instante, escojo el futuro y resucito. 114 OBRA: Alexandre Raimundo, SJ 115 CABEÇA FORTE Isaías Gomes, SJ Levanto agradecendo a Deus por viver Caminho com generosidade, tenho como andar Me encontro, sei que posso presença-ser Cresço, é possível amar, ser junto e cuidar Caio, às vezes esqueço, o amor-cuidado pode perecer Volto, com gratidão sei, é possível ainda continuar Paro, converso, reflito, penso, é real crer, para tudo ver Entre começar, caminhar, encontrar, cair e voltar O quanto com Ele, elas e eles, me faço eu, forte para viver. 116 ABRO MEUS OLHOS Higor Lima, SJ Abro meus olhos. Me olho no espelho. Penso que vejo, mas não vejo. Nada vejo! Vejo sim. Olhos; Nariz; Boca; Pelos; Cabelos. Além dos poros, nada. Ou quase nada. Preciso de fôlego para mergulhar em mim. Mas não acaba assim, triste fim. É só o tempo da pupila se acostumar com a oscilação entre claridade e escuridão. E os pulmões se acostumarem com o ar às vezes abundante na alta pressão, às vezes rarefeito na baixa pressão atmosférica que existe dentro de mim. 117 PREGUNTAS DE DIOS Benjamín González Buelta, SJ Donde estás?, dice el Creador. ¿Dónde está tu hermano?, dice el Padre. ¿Quién te liberó?, dice el Señor. ¿Dónde están tus acusadores?, dice el Pastor. ¿Por qué me persigues?, dice el Hermano. ¿Por qué temes?, dice el Amigo. Preguntas de Dios en nuestra tierra, como la lluvia que baja del cielo y al cielo sube, preguntas eternas en la vida que nos traen, en la muerte que se llevan. Acogidas como la lluvia, ya nos van haciendo eternidad ahora. 118 SEGUNDA SEMANA Maria Clara Lucchetti Bingemer O perdão, que é amor sempre renovado, reiterado e revivido; dom que persiste e se dá novamente, nos diz que não podemos conformar-nos com nenhuma banalidade e qualquer mediocridade. Somos feitos para algo grande, a vida nos é dada para um projeto maior. Temos que construir um Reino, que não é nosso, mas do Rei Eterno e Senhor Universal. Ele nos chama, nos convida para estar perto dele, junto dele, caminhando e vivendo. O convite da segunda semana é apaixonar-se. Como diz o Pe. Arrupe: quando nos apaixonamos, tudo passa a ser diferente: os horários, os critérios, as atitudes, as prioridades. O amor rege nossa vida desde que acordamos até que dormimos, desde que nascemos até que morremos. E esse amor tem nome: Jesus. Nesta segunda semana somos chamados a ver, ouvir, tocar, contemplar, respirar Jesus Cristo. Sua encarnação no ventre de Maria, seu nascimento em meio a deslocamentos e dificuldades, sua infância de alegria e graça, de obediência, liberdade e descobertas, sua vida pública de paixão e entrega pelo projeto do Reino do Pai. A graça a pedir é, como os primeiros discípulos, poder ver, ouvir, tocar, apalpar o Verbo da Vida. A Vida se manifestou e a nós foi dada a graça de conhecê-la e saber seu nome. Jesus de Nazaré é nossa vida. Nosso caminho, verdade e vida. Segui-lo aonde ele for é o sentido maior da nossa vida. 119 OBRA: EXERCÍCIOS ESPIRITUAIS José Maria Fernandes Machado, SJ DESCRIÇÃO: A Igreja, a que caminha na LUZ ( Toda a epopeia de Moisés no livro do Êxodo). MARIA, a que alcança o Céu e acolhe a DEUS (A Encarnação). 120 “Conhecimento interno do Senhor que por mim se fez homem, para que mais o ame e o siga.” (EE 104) A PALAVRA SE FEZ CARNE Moisés Nonato , SJ No silêncio... coração a galope. Os olhos não veem, se inundam. Os ouvidos não escutam, sentem. O olfato não cheira, aspira. Os lábios não beijam, soluçam. O paladar... a salobro. O tato não toca, pulsa. Na carne, o latejo da vida. 121 OBRA: FUGA PARA O EGITO José Paulino Martins, SJ DESCRIÇÃO: Acrílica sobre parede. Itaici. SP – 2013. 122 RECOLHE NOS TEUS BRAÇOS Lucimara Trevizan (Leiga inaciana) Recolhe nos teus braços, Menino Deus, o meu amor. Veja nos meus olhos a imensa fragilidade que sinto e sou. Poderia enumerar tudo o que em mim é impossibilidade, fraqueza e solidão. Te dou minha enorme fome de amar. Te dou o oceano de amor, dor, silêncio e saudade que me habitam. Coloco aos teus pés minha vida. Te amo. Essa é uma verdade que me constitui. Te amo antes de tudo. Fica comigo nesse desassossego que não me deixa dormir. Fica comigo nesse vazio imenso e intenso que pulsa no silêncio dessa noite que invadiu o mundo. 123 OBRA: UM MENINO NOS NASCEU, UM FILHO NOS FOI DADO, (IS 9,5) Lúcio Américo 124 OS MAIORES DESEJOS Gabriel Araújo Pacheco Os maiores desejos E uma oferta... Coração ardente, Chamado, À misericórdia imensa se entrega: Eu me ofereço! Quem és? E por que tanto me chamas? Pela tua causa, luta, exemplo, E pela fé, Aqui estou! Confiança que se encarna em resposta! Eterno Rei e Senhor! 125 OBRA: INÁCIO EM MANRESA José Paulino Martins, SJ 126 O BOM PASTOR CUIDA E CHAMA-ME A CUIDAR DE SUAS OVELHAS Paulo Vinícius da Silva Abreu, SJ Tu és a porta, Tu és a voz, Tu és quem dá vida e em abundância. E eu, às vezes, por um motivo ou outro Afasto-me de Ti, do teu rebanho. Ouço outras vozes e as sigo em algum momento. Perco-me, me vejo só Sem a Tua presença. Mas Tu não desistes de mim E assim sais a minha procura E com a Voz suave e serena, sais a me chamar. Alegro-me com o Teu chamado, Com a Tua preocupação, Com o Teu cuidado para comigo. Ó Senhor, bom pastor, Tu que dás a vida por tuas ovelhas Ajuda-me a não me afastar de Ti E ensina-me a ter os teus gestos, Para que, ao contrário do mercenário Eu possa cuidar, abraçar, preocupar-me Levar a tua misericórdia E ensinar o teu mandamento, que é o amor, A todo um rebanho de ovelhas. Ajuda-me, Senhor, para que Esses gestos não fiquem só no coração, Mas que eu possa levá-los aqui e agora. 127 VOCACIÓN José María Rodríguez Olaizola, SJ A veces hay que ser árbol y dar sombra al caminante cansado. Hay que ser agua, que alivie la sed de respuestas, y fuego que arrase lo injusto, lo indigno, lo hueco. Hay que ser roca que abrace los cimientos de lo duradero, tierra que acoja las posibilidades de la semilla, y océano, donde podamos zambullirnos, para renacer llenos de libertad y de esperanza. Hay que ser canción que alivie los vacíos, y silencio habitado, que venza a la cháchara. Unas veces hay que ser hogar al que regresar, y otras veces, puerta que se abre a la tormenta. Dios es el árbol y el agua, la roca, la tierra y el mar. Dios es canto y silencio, hogar que acoge y puerta que nos conduce a nuevas historias. Pero hacen falta guías que consagren sus días a buscar ese tesoro. Hay quien se dedica a sembrar, encender, forjar, regar, compartir y acompañar. Hay trovadores que cantan con palabras prestadas, cauces de agua ajena que trae vida verdadera. Hay maestros con muchas preguntas y pocas respuestas, que ayudan a otros a descubrir el Misterio. Soñadores de un bien posible, que convierten su amor en puente, para acercar a hermano conhermano, para unir al ser humano con Dios. Apóstoles, con pies de barro y corazón de fuego. Que nunca nos falten. 128 POUCO OU NADA André Araújo, SJ Quis pegar a palavra no ar. Flecha disparada não tencionava ferir. Acreditava mais no homem que o homem em si. Tinha outras na aljava para momentos assim, de maior lucidez, quando a estupidez dá lugar à ação. Disparava e acertava nas verdades necessárias. Flecha como aquela não sangrava. Tanto melhor, não tinha mesmo inspiração para um Sebastião. Seria pior, fosse soldado ou rei, era café pequeno, desses que batem cabeça, pregam a Lei e ainda disputam um lugar no Reino. Um vai negar, o outro vai trair. De mim o que se dirá? Temo em perguntar pelo medo de não suportar ouvir. No entanto, em poucas linhas, o espanto: “Enche tuas talhas, a dimensão do teu voo é eterna, não meças com o pó da terra o que teu coração carrega, se te dispersares no pequeno, o que é grande escapará naturalmente aos teus olhos, não te impeça a curva de tuas asas o voo pleno por entre os mundos, deixa entre as nuvens o que segrega o teu existir profundo cair sobre os espaços da matéria. O resto, pouco ou nada... 129 QUANDO VACILO Jerfferson Amorim, SJ Quando vacilo, tu acolhes as minhas incertezas. Quando me escondo, tu continuas iluminando o caminho, para que eu não esqueça de onde vim. Quando procuro as sombras, tu brilhas como o sol, não por fora, mas desde dentro do meu interior, fazendo-me ver que tu me tens. E assim me sinto todo teu como centelha de vida que irradia a tua presença. Teu olhar me acolhe sem me incriminar. Acercas-te de mim e jamais me oprimes com a tua presença. Tu pavimentas as minhas conquistas. E fortaleces os meus passos. Quando te vejo, o coração palpita. Quando te sinto, confirmas a certeza de que vives em mim! Quando me convidas a dar-me todo, respeitas o meu passo que é resposta ainda medida e parcial, porque sou como Pedro na manhã da ressurreição: tu me amas? Tu sabes tudo, tu sabes que te quero, que gosto de ti, que sou teu amigo! 130 FALTA TÃO POUCO PARA QUE EU Francys Adão, SJ Falta tão pouco para que eu termine a travessia do deserto e entre na terra da Promessa E tantos cansaços já me paralisam tantas solidões me aprisionam tantas lamentações me atrofiam Mas Tu passas por mim e não és indiferente à minha miséria e dor Tu vês e me fazes ver a vida nova que posso ter o desejo escondido em mim a força para levantar e andar Se acolho Teu olhar escuto Tua Palavra e obedeço ao Teu convite já não há paralisia, mas movimento já não há pecado, mas perdão já não há ruptura, mas relação Pois o Amor sempre me resgata põe-me de pé devolve-me a mim mesmo e ao novo Caminho que me faz cada dia mais um filho querido do Alto um irmão entre tantos irmãos. 131 NO NOS LLAMES Benjamín González Buelta, SJ no nos llames para aclarar las sombras con velas frágiles protegido de los vientos con las palmas de la mano, no ser puros espejos que reflejan las luces ajenas, estrellas citadas dependiente de otros soles, que como amamos la noche hacer brillar las superficies con reflejos fugaces a tu gusto. nos ofreces sé luz desde dentro, cuerpos iluminados con tu fuego insaciable en la médula ósea arbustos en llamas en las soledades del desierto que buscan el futuro secuelas de casa que une a los amigos compartiendo pan y pescado o relámpago profético rasca la noche tan dueño de la muerte. nos ofreces sé la luz de la gente Hoguera de Pentecostés en combustión persistente de nuestros dias iluminado por tu espíritu, sé ligero en ti, que tu eres la luz, inseparablemente fusionado nuestro fuego con tu fuego. 132 PRECE À MÃE NEGRA Solange do Carmo e Eduardo Calil (Teóloga, ex aluna da Faje) Ó mãe preta, Preta igual aos negros da senzala, Igual à pele dos torturados, Roxeada pelos hematomas. Convosco podem se sentir Irmanados os sujos mendigos, Os pobres que se arrastam pela sarjeta E reviram os lixões, Os que não se sentem vistos. Olhai pra estes que são invisíveis, Perambulai com os pobres nos caminhos Da indiferença, Sede companheira dos mendigos. Sarai as feridas também dos torturados, E libertai os negros da senzala. Tocai conosco O tambor da libertação. E aos de pele clara, Que não têm olhos para a senzala — não é onde estamos todos? — Que deixem a ilusão de ser melhores, Mais puros... Ajudai-nos, mãe preta, a fazer a grande festa da comunhão. A do teu Filho, Onde somos todos irmãos. Já tocam os tambores da alegria, Entoam-se hinos de festa, Há pão! Pão à revelia. E o mendigo e o torturado curado Levam junto a mão ao mesmo pedaço. Há dança, há gozo, Os corpos se entrelaçam não na luta, Mas no abraço. Nesse banquete, Os saciados pedem perdão Para quem só restou migalhas. Os fortes se redimem com os enfraquecidos. Os violentos beijam os pés de suas vítimas. Só assim, Mãe Preta, Seremos seus devotos, Porque seguidores do teu Filho, pobre e torturado. 133 OBRA: Lúcio Américo DESCRIÇÃO: Que seu amor nos encontre, Mãe Aparecida, nos dias de sol e nas noites sem estrelas. Que seu acalanto ilumine nosso caminho e revele o rosto de Deus nesse chão tão seu. 134 DA PARTE DE DEUS Carlos César, SJ Há circunstâncias, surpresas e mudanças. Da minha parte, há recusa, aceite, idas e vindas. Mas a promessa de Deus não muda. Há constância. Se cumpre, permanece e eterniza. Da parte de Deus, Há sempre amor, paciência, presença e ternura. E isso basta! 135 OS LLAMO AMIGOS José Maria Rodríguez Olaizola, SJ No esperéis de mí mentiras o adulación. No escucharéis palabras fáciles, pero engañosas, ni os envolveré en silencios cómodos, pero cómplices. No os ofrezco todas las ventajas al menor de los costes, cómodos plazos para la justicia, o triunfo sin batalla. No tendréis, en mí, una caricatura del amor a medias. Os llamo amigos, y al hacerlo, os prometo hondura, pasión, y verdad. Os ofrezco mi cruz y mi cielo, mi amor y mi fuego, mi luz y mi tiempo. Os presento mi camino, mis pasos y mi evangelio. Cuando os sintáis preparados, os espero. 136 OBRA: INÁCIO EM PARIS José Paulino Martins, SJ 137 TUA CAUSA Eduardo Carvalho, SJ Jesus, como suportaste tanta perseguição E o abandono de teus amigos Quando mais precisou deles? Tudo por causa de um Sonho Sonho de um Reino Sem injustiças De paz e de amor Onde o pão alimenta a todos Onde a criança é criança Onde a mulher não é explorada Onde o idoso não jaz solitário Ensina-me, Senhor, A ter a Tua coragem Denunciar os grilhões que privam a muitos Da liberdade Da vida digna Faz-me sentir a dor dos que sofrem E dar voz a tantos outros excluídos Ajuda-me a ser coerente com o anel que carrego Mantendo minha fidelidade à Tua Causa Porque Tua Causa Vale a Vida. 138 VOZ DO PASTOR João Júnior Chama-me com tua voz de Pastor. Chama-me pelo nome e ajuda-me a crer que, para além desse mar de angústia e dessa solidão de indiferença, em que nem números somos mais, de tantos que já perdemos para a morte ou para a apatia, ao menos para ti, ainda somos um “tu” com nome e história, com lágrima e esperança. E leva-me para longe das paredes seguras às quais, um dia, penhorei a liberdade. E, atento à tua voz, Pastor, que me recorda o nome que me aviva, o meu, eu possa te seguir pelas travessias sempre escorregadias de ser eu mesmo. Lá onde não há “rebanho”, massa informe, mas sempre “tu” e sempre “eu”, naquilo único que faz viver: o amor que me faz ver-te, enamorado, e me faz ver-me, apaziguado. 139 OBRA: BOM PASTOR Luís Renato Carvalho, SJ 140 ¿A QUIÉN IREMOS? José María Rodríguez Olaizola, SJ Un día decidimos subir a tu barca, confiarte el timón. Desde entonces navegamos por la vida y escuchamos sonidos diversos, el ruido del trueno que anuncia la tormenta, los cantos de sirena que prometen paraísos imposibles, el bramido de un mar poderoso que nos recuerda nuestra fragilidad, las conversaciones al atardecer con distintos compañeros de viaje, los nombresde lugares que aún no hemos visitado, y los de aquellos sitios a los que no volveremos. A veces nos sentimos tentados de abandonar el barco, de cambiar de ruta, de refugiarnos en la seguridad de la tierra firme. Pero, Señor, ¿a quién iremos… si solo tú puedes ayudarnos a poner proa hacia la tierra del amor y la justicia? 141 APAIXONAR-SE PELAS COISAS NOVAS EM CRISTO Davidson Braga, SJ Apaixonei-me por Jesus Cristo. Não pela imagem dele que carrego comigo desde a infância. Mas pelas vezes em que ele se apresenta a mim como um jovem inquieto, questionando o fariseu que há em mim e meu apego às leis. Vejo-me apaixonado por ele quando, deitado em seu leito de morte, ele me olha com esperança. Com mais esperança do que costumo ter todos os dias, apesar de minha saúde e de todos os recursos a que tenho acesso. Estou perdidamente apaixonado por sua pobreza, seu despojamento, sua liberdade. Ele não me cobra nada. Apenas se dá por inteiro, sem reservas. Quando ele vem a mim menino, com sorriso e olhar curioso, com respostas surpreendentes e inusitadas. Quando ele me recebe em sua casa e me serve o melhor peixe, o melhor açaí, a farinha especial. Quando conta suas histórias, suas lutas, seus sonhos. Em todos esses momentos fico como bobo, admirando-o. Em tudo isso me vejo apaixonado por ele. Esta manhã outra vez ele veio a mim. Olhou-me com tanto amor e com esperança de me ver novamente em breve. Ah, esse Deus Encarnado, este eterno verbo amar. Deixou-me apaixonado quando decidiu atravessar este mar comigo, sem nem mesmo me conhecer. Confiou em mim e me perguntava se eu apreciava sua companhia. Deixou sua mãe, seu povo e veio caminhar comigo por estradas que não conhecíamos. Este mesmo Jesus que, companheiro de longa jornada, decide partir outra vez e trilhar novos caminhos. Desapegado. Ele me encanta todas as manhãs. Abre meus olhos. Cura minha cegueira. Destapa meus ouvidos e endireita minha coluna. 142 OBRA: PANTOCRATOR Luís Renato Carvalho, SJ 143 NASCEU-NOS O ENCANTO Moisés Nonato, SJ Alegria por todo canto. Pranto em nenhum canto. Canto em cada canto. Nasceu-nos hoje o Encanto. Tão bom é o Encanto Que até o desencanto transforma, Em verbo: des-encantar. tirar dos cantos, Sair dos guetos, entrar no Canto. Como os pastores, outrora, Saídos dos seus cantos Ao som de todos os cantos De anjos e arcanjos, De querubins e serafins... Desencantando-se para se encantarem. Quem disse que nada há de bom no desencanto? Depende de como o enxergamos: Se substantivo, imutável, Se Verbo, transitivo. O primeiro, elege Herodes; O segundo, move pastores. 144 OBRA: NASCIMENTO DO MENINO JESUS José Paulino Martins, SJ 145 NO SILÊNCIO Moisés Nonato, SJ No silêncio... coração a galope. Os olhos não veem, se inundam. Os ouvidos não escutam, sentem. O olfato não cheira, aspira. Os lábios não beijam, soluçam. O paladar... salobro. O tato não toca, pulsa. Na carne, o latejo da vida. 146 SALTO PROFÉTICO Alberto Luna, SJ (Paraguai) “Cuando tu saludo llegó a mis oídos el niño saltó de alegría en mi seno” (Lucas 1,44). Visítanos, María, desde tus ojos radiantes corre hacia nosotros con los brazos abiertos. Abrázanos y despierta un salto de audacia, una palabra, un grito, una danza nueva desde el vientre de la tierra. Salúdanos, María, míranos niña indígena, joven campesina, adolescente negra, muchacha de barrio. Muéstranos tu rostro, las cicatrices de esperanza en tus manos de obrera, de tejedora silente, de lavandera de dolores, hechicera sanadora de hierbas medicinales. Tu rostro de luna nueva, huerto de flores tempranas donde brota chicha y maíz, caricia y canto de cuna en la choza de cartón. Inclínate a besarnos, María, madre a destiempo, embarazada de Dios. Abriga nuestro desconcierto abandonado a su suerte, huérfano de abrazos, sin lugar para hospedarse. Migrante indocumentada de mirada suplicante, desempleada en riesgo, maquiladora explotada. Ven hacia nosotros llena de gracia, déjanos oír tu voz, acércanos a tu pecho, hasta el ombligo de la tierra en su danza de parto. Canta conotros, agita nuestro aliento, y al ritmo del Espíritu despierten las palabras, salten los acordes vivos de una profecía nueva. 147 OBRA: NOSSA SENHORA Luís Renato Carvalho, SJ 148 TU DESEJAS QUE A TUA E A NOSSA VIDA Francys Adão, SJ Tu desejas que a Tua e a nossa vida levem a Lei e os Profetas a seu pleno cumprimento Para isso Tu nos fazes enxergar Teu jeito de ler as Escrituras Santas reconhecendo que o caminho para a Vida é feito de letras mas também de vírgulas é permeado de palavras mas também de respiros é repleto de ações mas também de repouso Nestes tempos atribulados por uma estranha enfermidade respiratória ajuda-nos a reconhecer nesta pausa em nossos ritmos acelerados uma nova oportunidade de mergulho no amor e no dom de si Pois verdade seja dita já havíamos esquecido que as vírgulas da vida abrem em nós espaços para Teu Respiro santo E sem essa Brisa suave nos afastamos do Teu Céu. 149 OBRA: Alexandre Raimundo de Souza, SJ DESCRIÇÃO: Desenho sobre papel. Gravura retrata as várias expressões dos jovens dentro da catequese narrativa. Um trabalho junto aos jovens das comunidades. Toda a beleza expressa no movimento do corpo. 150 LLAMA -REY ETERNAL Juan Gutiérrez, SJ (Província do Perú) Llamas a los que quieres. A quien ves desde las entrañas y elijes para anunciar tu Reino sin borrar sus fragilidades. Tú ¡llama! Somos tuyos. Susurras nuestros nombres. Nombres que sueñan e inquietas a cambiar por ellos y por el pueblo, sin desmerecer cualidades. Entonces, ¡llama! Aquí estamos. Llamas sin promesas. Nuestro seguro es desgastarnos más, porque no todos asumen tu llamado y nos quitan sus posibilidades. ¡Sigue llamando! podremos sumarnos. ¡Llama! susurra fuerte hasta que lleguemos a estar contigo, hasta gastarnos por Ti intensamente; porque sin Ti, todo esfuerzo es vacío. Por favor, ¡Llama! 151 OBRA: INÁCIO EM ROMA José Paulino Martins, SJ DESCRIÇÃO: Acrílica sobre tela. 152 O JOVEM POBRE (MT 19, 16-30) Álvaro Negromonte, SJ Sou o avesso, o contrário Não pergunto o que devo fazer de bom Porque a resposta é amar sem condições E ainda não aprendi a assim agir Para que meu coração se abra à luz Neste encontro de intimidade com Jesus Não parto triste, não tenho bens Sou deserdado deste mundo tão cruel Mas sinto o coração arder em brasa Quando mesmo tão fechado no meu eu Ainda escuto que irei herdar o céu Não vou embora, não pretendo ir sozinho Ficarei ao teu lado, ó do impossível Ter deixado casa, irmãos, pais, campos e filhos Não me faz melhor que outros, isto eu sei Que sou o homem pobre que chamaste Para seguir atrás de ti, meu Deus e amigo. 153 SEGUINDO A ESTRELA Odair José Durau, SJ Três homens sábios atraídos por uma estrela, deixaram a segurança e puseram-se a caminho. Guiados por esse astro encontraram um Menino. Como “secretário” anotava todos os detalhes desta grande epopeia. Após o encontro, chegou o momento de oferecer os presentes. Cada um ofertava o que possuía de melhor para aquela criança. Chegada a minha vez, ofereci o livro das anotações da viagem. Na verdade, era o meu livro, a minha história, a busca de um coração que tinha procurado e, enfim, agora encontrado. A peregrinação não pode parar. Assim como os magos seguiram outro caminho, continuarei seguindo os rabiscos daquela criança no meu livro. Agora já não quero mais guiar, mas ser guiado por este Menino. Quem sou eu para decidir o caminho? Desejo seguir a trilha totalmente aberta tendo o Menino como guia. Quero aventurar-me no desconhecido. Com o cajado preparado com as iniciais do nome do Menino, do meu e de meus companheiros, seguirei a estrela. Seguir a estrela é uma experiência de fé. Passo a passo acompanhava como Deus se revelava. Dava-me conta de que meu coração não era suficiente, o amor deum Deus apaixonado é uma escola de humanidade. 154 GASTA-TE James Castro, SJ Vem e gasta tua voz Levanta altivo o teu grito Em nome de um povo aflito E não bradaremos a sós. Vem e gasta-te de ouvir Clamores e o choro profundo Dos esquecidos do mundo Que aos céus não podem subir. Gasta-te por estares vendo Tamanha dor e injustiça Impostas por tanta cobiça Ao povo que vai padecendo Vem, sente o cheiro da morte A impregnar teu nariz Já tão comum ao infeliz Largado à sua própria sorte. Gasta teu toque e tua pele No pranto que encharca este chão, Nos calos que a enxada na mão Ao Cristo no outro revele. Gasta-te, assim, totalmente Por todos que gastos já estão. Gastando-se inteiro, e então Inteiro estarás novamente. 155 ESPERA Benjamín González Buelta, SJ Esperaré a que crezca El árbol, y me dé sombra. Pero abonaré la espera con mis hojas secas. Esperaré a que brote El manantial, y me dé agua. Pero despejaré mi cauce de memorias enlodadas. Esperaré a que apunte la aurora y me ilumine. Pero sacudiré mi noche de postraciones y sudarios. Esperaré a que llegue lo que llegue lo que no sé, y me sorprenda. Pero vaciaré mi casa de todo lo enquistado. Y al albonar el árbol, despejar el cauce, sacudir la noche y vaciar la casa, la tierra y el lamento se abrirán a la esperanza. 156 FOTOGRAFIA: Régis Sarto, SJ 157 ENCARNADO Juan Gutiérrez, SJ (Perú) Miras el mundo herido y el dolor llega a tu intimidad. Te duele nuestras infidelidades, pero te duele más no salvarnos. Y te haces como uno de nosotros. Irrumpes encarnado abrazando nuestra vulneravilidad, entre fríos y humedades, entre enos y chuvascos, entre carencia y asombros. Encarnado muestras tu modo. Involucrando a la humanidad, perdonando nuestras pasividades, caminando junto a nosotros, acariciando nuestros rostros. 158 OBRA: NOSSA SENHORA OCRE Luís Renato Carvalho, SJ 159 CAMINHAR CONTIGO Alan Cavalcante, SJ Tenho dúvidas se Alcancei teus passos. Ou se Tu, amavelmente, Te aproximaste dos meus. Os meus passos são vacilantes, têm receios das incertezas. Os teus me convidam a ver Onde e como tu vives. Tudo o que fazes é inesperado. Desconhecido. Me desconcerta. E pouco a pouco Tu te revelas Caminhando conosco Porque compartilhas De nossa Humanidade. E mesmo em silêncio Faz-me desejar Caminhar Contigo. 160 OBRA: OS DISCÍPULOS DE EMAÚS José Paulino Martins, SJ DESCRIÇÃO: Acrílica sobre Eucatex. 48x30cm – 2012. 161 OPRÓBIOS, HUMILHAÇÕES, AFRONTAS Higor Lima, SJ Opróbios, humilhações, afrontas, vexame, desonra, injúrias, ofensas. Promessa pesada. Desejo leve. Te peço, mas não quero. Me é concedido, mas não vivo, Blasfemo. O amor há de ser reconhecido. Quando diante das similaridades titubeio, Fracasso. O que pode sustentar tão grande desejo? (Anotações dos EE 146) 162 OBRA: Alexandre Raimundo de Souza, SJ DESCRIÇÃO: Desenho a caneta esferográfica sobre papel. Arte sobre os Exercícios Espirituais – Uma visão sobre Jerusalém... Uma janela, uma lágrima, uma mão estendida, por fim a cidade e os últimos acontecimentos. 163 O SENHOR DEUS Franklin Alves, SJ “O Senhor Deus chamou o ser humano: ‘Ondes estás?’, disse ele. ‘Ouvi teu passo no jardim’, respondeu o ser humano; ‘tive medo porque estou nu...’” Tive medo... Meus medos cabem todos na minha mão! Tenho pequenos cinco medos que se confundem com meus dedos. Tenho medo da morte! Parece ser o menor de todos os meus medos, por isso, ele se desdobra no dedo mínimo. Tenho medo da liberdade! Vizinho da morte, este medo se desdobra no dedo anelar. Tenho medo da solidão! Maior de todos os meus medos, ele se desdobra no dedo médio. Tenho medo da verdade! Apontar o dedo? Tenho medo! Por isso, ele se desdobra no dedo indica-dor. Por fim, tenho medo de ter medos! Talvez este seja o mais forte de todos os meus medos e por isso ele se desdobra no dedo polegar. Meus medos cabem todos na minha mão! “Ondes estás? Ouvi teu passo no jardim; tive medo...” Fechei minha mão, tentando conter meus medos! Dobrei meus dedos, dobrei meus medos ao fechar a minha mão formando um punho com o qual queria golpear a mim mesmo. Fechei meus olhos e entendi que errei porque apenas “ouvi o teu passo no jardim” e não a tua voz que gritava meu nome. Foi, então, que te vi, vindo com teus passos leves sobre as águas e escutei a tua voz que me dizia: “sou eu, não tenhais medo”. Nem mesmo o medo de ter medos! Abri meus olhos e fechei minhas mãos, dobrei meus medos, transformando meus dedos em arma letal! Punhos fechados para lutar e vencer! “O Senhor Deus chamou... Onde estás?” 164 EXPERIÊNCIA DE AMOR Renato Correia, SJ O Amor Quer ser amado. Amor que é encontro Quanto mais me deixo experimentar Maior será minha entrega Ao Amor obediente, Ser fiel ao correspondente deste amor Ao amor indiferente, Indiferença que me fala de liberdade, Que não quer nada do que sua vontade não me oferece. Só assim poderei experimentar o amor de verdade O amor que me identifica com o Amado. Amor que gera entrega, livre e gratuita Capaz de gastar a vida. O amor quer ser amado. 165 BAJO TU BANDERA Juan Gutiérrez, SJ (Perú) Verdadero y sumo capitán, desde un lugar humilde escoges a tus amigos para proclamar justicia. Conquistas bajo una bandera que promete solo pobreza oprovios y humillaciones, porque tu Reino es servicio. Deseas conquistar a todos: estados, condiciones y personas, porque amas tu creación y bajo tu bandera será cuidada. Estar bajo tu bandera es dejanos conquistar por Ti, es conquistar a muchos por una creación fraterna. 166 LIBERTAD CREADORA Benjamín González Buelta, SJ Cuando apresamos las cosas y a las personas, nos convertimos en carceleros, que también tienen que estar en la cárcel para que no se les escape ningún preso. Cuando dejamos volar al pájaro, rodar el oro y alejarse a los seres que más queremos, vivimos libres para ir a cualquier parte y estrenar el futuro donde aparezca el reino. 167 FOTOGRAFIA: MIGRANTE Dimas Oliveira, SJ 168 PAI-NOSSO DA TERRA Luan Amorim, SJ Pai dos marginalizados e dos vulneráveis, Abbá de todos e todas que estais na terra. Bendito seja vosso nome que pulsa no coração de todos homens e mulheres de boa-vontade. Que se realize no hoje de nossa história, o vosso projeto de vida plena. Seja feito o vosso sonho esperançoso, de uma humanidade de Justiça e reconciliação, em nossa casa comum. O Pão da mesa da Palavra, da Eucaristia e do Cotidiano seja para todos e todas! Perdoa as nossas ofensas contra os descartados e excluídos do nosso mundo, que gritam por dignidade. Assim como nos comprometemos em ser irmãos e irmãs, como fostes de cada um de nós no alto da cruz. E não nos deixeis cegar com o poder do antirreino, Mas livrai-nos da apatia que dilacera o nosso sim! Amém, Axé, Awere, Aleluia! 169 OBRA: SANTA CEIA José Paulino Martins, SJ DESCRIÇÃO: Acrílico sobre tela. 145x94 cm – 2013. 170 CONTRALUZ Alberto Luna, SJ (Contemplación del nacimiento / José como “esclavito indigno”) No, José. No han venido a verte a ti. Es a ella, la paloma, y en el nido, a su pichón, a quien todos quieren ver. Es la estrella de este niño parpadeando en su regazo como en un cielo de nubes, a quien cantan y celebran. No, José. Tu sigue juntando leña y busca un poco de agua. Ve si encuentras una manta, algo de pan con leche tibia. No dejes que en la noche fría se nos apague la estrella. 171 OBRA: FUGA PARA O EGITO José Paulino Martins, SJ DESCRIÇÃO: Acrílica sobre parede (detalhe). SP Itaici – 2013. 172 OS EMIGRANTES Ir. Francisco Fagundes, SJ Emigrantes, todos somos. Possuímos nossos sonhos, De chegarmos um dia, Na pátria prometida Para nós oferecida, Enchendo-nos de euforia! Existem emigrantes, Vítimas inocentes, Deixando seus lares, Buscando a proteção Tendo só uma intenção: Buscar a normalidade. 173 FOTOGRAFIA: MIGRAÇÃO Dimas Oliveira, SJ 174 QUEMSOU? Isaias Gomes, SJ Quem sou? Me afasto e me retiro, mas trago alguém comigo, não posso descer sozinho subo as montanhas, entre companhia, pedras, escuros e buscas, desço para mim estou só, mas estou acompanhado, porém, a partir daqui, desço sozinho, não sei por que, não queria. Por que eles vieram? Podem ver o que vejo? Sentir o que sinto? Talvez, não tanto quanto, mas podem ver algo, sem eles eu não veria. Vejo que outros vieram, estes bem mais velhos e de mais longe. O que querem? Me deixar sozinho também? Eles me disseram: há tempos que esperávamos por você. Agora me entendo, sinto-me acompanhado por estes mais distantes. Subo e vejo que os de agora, mesmo cansados, me esperam. 175 VAMOS FUGIR... Thalisson Bomfim Quem sou? Pensava que o Egito era negro. Que era filho da mãe África. Mas como uma família de brancos foge para o Egito, que é na África, sem ser reconhecida? Não sei! Só sei que me contaram assim! Vi aquela família fugindo no meio da madrugada. Fugindo por medo. Medo da morte e da ganância pelo poder. Para onde iriam? Para o Egito, mas qual lugar do Egito? Para casa de quem? Como seria o sustento daquela família? Tinham uma criança no colo. Como seria a vida desses três? Não sei! Vendo aquela família me lembrei de algumas outras famílias. Famílias que fogem de seu país por medo da guerra. Da fome. Da sua etnia. Da orientação sexual. Hoje chamamos essas pessoas de refugiados. Aqueles três que foram fugidos para o Egito não seriam refugiados? Pensei que Herodes tivesse morrido. Mas vejo-o na Venezuela, nos Estados Unidos na América, Coreia do Norte... O Herodes de ontem é o Herodes de hoje! Quantas famílias e vidas ainda serão ceifadas em nome do deus dinheiro, do deus poder? Outro mundo é possível! O que estamos esperando para fazê-lo acontecer? O Deus menino nos contou como fazer. Vem! Vamos derrubar os Herodes do poder! O Deus menino que fugiu para o Egito está conosco. Ele cresceu e nos chama a construir o novo mundo. Sejamos ousados! Não tenhamos medo! 176 OBRA: TEOTÓKOS José Paulino Martins, SJ 177 E O VERBO SE FEZ CARNE MENINO Renato Correia, SJ Deus, Trindade Deus Se encarna, Se faz um de nós. Para quem ele veio? Para quem ele vem? Se fez pequeno e frágil Na pureza de um menino. Risco tremendo Deus corre. Todo menino quer ser homem logo. Todo homem, na sua autossuficiência, Pensa que é Deus. Mas Deus... Deus quis ser menino! Maranathá! 178 JUNTOS VAMOS REMANDO Germán Méndez, SJ (México) Juntos vamos remando, en esta nuestra barca; donde me dejas elegir la dirección. Juntos vamos remando, hacia la voz del Padre; a donde me has invitado a remar. Y si, en pleno mar, temo a la tormenta; es porque me asusta llegar a verte dormido. Mas en medio de la duda, entre el llanto y la zozobra; soy yo quien duerme, y sueña verte dormido. Pero cuando despierto, sigues ahí en calma; volvemos a tomar los remos y juntos seguimos remando. 179 Engraçado... vão plantando a morte, vai brotando a Vida! ACAMPOU ENTRE NÓS... André Araújo, SJ O semeador saiu lançando grãos de manhã. Era um ato de coragem quase vã desafiar daquele jeito as erosões. Saía e, de mãos cheias, dispersava o que tivesse, toda hora do dia, sem que juízo houvesse de chão, de tempo bom ou ventania. Plantava sem escolher, porque outro regaria e nenhum faria crescer. Servo inútil, incansável, fazia o que devia fazer. E quando em Sião silenciaram-se as lágrimas, viu-se a abundância do trigo, do vinho novo e do azeite, viu-se encherem-se as torrentes e os cativos regressarem com os seus feixes. Nosso rosto iluminou-se de sorrisos, nossos lábios, de canções. A Alegria armou sua tenda em nossa casa e fez morada em nossos corações. Brotava a geração do Homem Novo, a voz do povo consolava multidões. Porque num dia, trivial como o de hoje, alguém saiu pra semear nas erosões. 180 OBRA: SAGRADA FAMÍLIA Luís Renato de Carvalho, SJ 181 MI OFRENDA Germán Méndez, SJ (México) Señor, quiero que cuando llegue a ti, Te entregue una ofrenda casi vacía, Que luzca incompleta y rota, Que se aprecie poco agradable y hasta inútil. Quiero que de ella no salga más; Ni para ornato ni aprecio sea servible, Quiero darte lo último que quede. ¿No sería esta ofrenda grata a ti? Sí, una patena ya vacía, De donde cuantos hermanos hayas querido Se hayan servido ya de mí. 182 É preciso amar muito para entender de dor. Para bom entendedor: “amar não acaba...” PARA BOM ENTENDEDOR... André Araújo, SJ “A vida não é para amadores!” Desculpem-me os entendedores. A vida é para amadores! Para entender de dores... Amar e amar bonito. Acolher do pobre o grito. Ouvir o irmão aflito. Aprender de infinito. Não passar indiferente. Enxergar o indigente. Amar o negligente. Saber mais da nossa gente que ensina compaixão, que foge da opressão, que não vive de ilusão. Amor assim não acaba, não! Isto eu quero, meu Senhor! Quero ser entendedor. Quero entender da dor. Quero ser um amador. Hoje eu quis até parar, quis desistir, quis chorar, mas também quis avançar: ver a vida começar! Me dá coragem e uns anos pra vencer medos e enganos, para reparar os danos, fazer amar os insanos. Teu povo vai resistir! Tua gente vai sorrir! Quem não ama vai cair... Amar: é questão de existir! 183 DEI-TE TUDO Claudia Honorio (Leiga inaciana) Dei-te meu coração Dei-te minhas histórias Dei-te minhas lágrimas Dei-te minhas alegrias Dei-te os restos de meus dias, o que quer que isso viesse a significar. Dei-te Tudo Não te dei coisas grandes e difíceis, Dei-te meu coração e o resto dos meus dias, o que quer que isso viesse a significar. Dei-te Tudo Dei-te a doçura e a beleza na amargura atravessada. Dei-te as lágrimas secas, mas o coração molhado. Dei-te Tudo O que quer que isso viesse a significar. 184 Desolado en Las Brisas… ERES Cristian Viñales SJ (Chile) ¿A qué te pareces? A un rey eterno han dicho, quizás un niño y gris llorar, ¿Quién digo hoy que eres? Horizonte, atardecer del mar, extensas y eternas avenidas en el oleaje plata, inmensidad. Eres, fugaces e inéditos colores, íntimo en mis ojos, rojo luminoso, eres sello y regalo personal. Eres, hambre de caminarte, esta nostalgia de futuro, el día que se va, y la belleza que insinúa el infinito, de seguro, si no eres allí estas. Eres, esta tarde impredecible, distinta en todo a las demás, las que también eres, quien te mire y en cualquier lugar. Eres tan tu que te imploro y en el aire cariñoso vas cargando, esta súplica de siempre, tan mía, tan poco original. Quisiera alcanzar a agradecerte, previo aquel instante ingrato, en que ya no serás quien eres y esta oscura angustia mía, fría vuelve desde el mar. ¿Ahora que pareces Atardecer? Eres, quien yo perdí de vista y mil dedos señalando desde el cielo, esto que yo parezco, sin sentido y soledad. 185 OBRA: É PRIMAVERA José Paulino Martins, SJ DESCRIÇÃO: Técnica mista. 64x47cm – 2007. 186 RE-MAR Marcos Sacramento, SJ Voltar ao mar Navegar. Ancorar. Descer da barca para consertar as redes e a vela costurar. Finda o dia e o coração unificado descansa sob o Teu olhar. No avançar da noite, uma voz que chama. Desperta! Arde a chama que aponta e guia para outro mar. Rema sem se adiantar ao Espírito. Rema confiando e esperando no Pai. Rema mar adentro com o Filho para servir e amar. 187 CHEIRO DE SAUDADE James Castro, SJ Pra minha história contar Não trago nada na mão. De caixa não vou tirar, De saco nem matulão. Hoje o que trago comigo E agora escancaro contigo É o fundo do meu coração Nasci no belo Sertão, Foi lá também que cresci. Ao ver seu rachado chão Da seca nunca esqueci. Seguindo a fé da família, Andando na mesma trilha A ter esperança aprendi. Tive uma infância feliz, Banho de chuva eu tomei. Um monte de amigos eu fiz, Com eles sorri e chorei. Queimado, bila e pião, Carrinho de rolimã, garrafão. De tudo isso eu brinquei. Depois o amor juvenil Me veio quando adolescente. Ainda assim me feriu Aquele namoro inocente.Aprendi, pois, pela dor Que aquele tal de amor Machuca e maltrata a gente. Chegou então o momento De noutro céu eu voar. Já feito o discernimento, Bem longe eu fui estudar. E mesmo de casa distante, Ainda simples estudante, O mundo eu queria mudar. A vida foi sendo tocada, Meus planos tornando reais. Mas quando olhava pra estrada Pensava: “falta algo mais”. Era de Deus o chamado, Mas eu, teimoso danado Olhava sempre pra trás. Meus planos estavam indo Mas tudo largar decidi. De Deus o apelo ouvindo Confesso não mais resisti. (continua) 188 Fazendo de mim peregrino, Com coração de menino, Seguir Jesus escolhi. Ao longo dessa vida minha Quantas pessoas passaram. Olhando quando se caminha Histórias que se cruzaram. Choros sorrisos e abraços, Na tranquilidade ou percalços A minha história marcaram. Diante de tantas janelas Minha vida fiz conhecer. Sem tranca, ferrolho ou tramela Bem verdadeiro vou ser. E agora encerramos assim: Com um pouco de você em mim E um pouco de mim em você! CHEIRO DE SAUDADE (continuação) 189 OBRA: José Maria Fernandes Machado, SJ 190 DA PARTE DE DEUS Carlos César, SJ Há circunstâncias, surpresas e mudanças. Da minha parte, há recusa, aceite, idas e vindas. Mas a promessa de Deus não muda. Há constância. Se cumpre, permanece e eterniza. Da parte de Deus, Há sempre amor, paciência, presença e ternura. E isso basta! 191 OBRA: FUGA PARA O EGITO José Paulino Martins, SJ DESCRIÇÃO: Acrílica sobre parede (detalhe). Itaici. SP – 2013. 192 SEDUÇÃO Eliomar Ribeiro, SJ Aproximou-se de mim Com palavras encantadoras Disse meu nome carinhosamente Olhou-me nos olhos com ternura Soprou segredos em meus ouvidos Tocou meus lábios com suavidade Fez meu corpo tremer de prazer Alegrou meu coração Amou-me apaixonadamente Abraçou meus medos Encheu de paz minha solidão Reacendeu desejos adormecidos Clareou a noite das minhas incertezas Fui seduzido! Já não tenho dúvidas: A verdadeira vida Nasce da entrega total Ao Deus da Vida! 193 HASTA ENCONTRARTE José Maria Rodríguez Olaizola, SJ (Espanha) Todo el mundo te busca, aunque a menudo ni lo sabe. Ese anhelo de plenitud, esa ansia de abrazo, la orfandad de a veces, la pasión, la furia, el baile con el tiempo que es la vida, la curiosidad, la imaginación, la voluntad inquebrantable de crear, todo eso es búsqueda. Tenemos sed de ti, una avidez insaciable si no nos zambullimos en tus aguas. Y hambre, de justicia y evangelio, de ternura y futuro, que engañamos al ocultarnos en refugios insuficientes. No queda otra que salir de nuevo a la intemperie a la tormenta a la verdad para seguir buscando. Hasta encontrarte. 194 OBRA: Alexandre Raimundo de Souza, SJ DESCRIÇÃO: Pintura acrílica sobre tela estucada. A arte da simplicidade, o narrar simplesmente. O anunciar, o encontrar, o jeito de ser... 195 BATISMO DE JESUS Eduardo Carvalho, SJ Aproxima-te da fila, Nazareno Vai com o povo Simples Pobre Pecador Espera a Tua vez com paciência Para que toda a justiça seja cumprida Tuas sandálias já gastas Tu mesmo as tiras E entra com reverência e expectativa Nas águas do Jordão E mergulha Sob o rio Tudo se cala Num instante De paz e quietude Ao sair Ao abrir os olhos Com a água fria Escorrendo pelo rosto Rompe-se o Céu Numa voz De amor “Este é meu Filho amado, em quem me pus o meu agrado!” Arde Teu coração Tu és o Filho de Deus O Amado do Pai Vem, Senhor! Espalha esse Amor Faz de nós Teus irmãos e irmãs E anuncia o reinado de Teu Pai 196 OBRA: Alexandre Raimundo de Souza, SJ DESCRIÇÃO: Desenho a caneta esferográfica sobre papel. Arte sobre os Exercícios Espirituais – o instante do batismo nas águas do rio Jordão. O desprender das vestes, a nudez, nas águas o nascimento, o feto conectado à Árvore da vida. A gota de sangue que cai da mão fendida. O Cristo nu pode ser um escândalo, mas é a força do amor que transparece, é vida. 197 VENID A MÍ José Maria Rodríguez Olaizola, SJ (Espanha) «Venid a mí», bramó la tormenta, invitándonos a adentrarnos en su intemperie llena de posibilidades. «Venid a mí», dijo la luz, alejando de nosotros el temor a la sombra. «Venid a mí», propuso la esperanza, convertida en caricia para quienes andaban cansados y afligidos. «Venid a mí», exclamó la pasión, prometiendo un nuevo fuego al rescoldo de corazones que en otro tiempo ardieron. «Venid a mí», exigió la justicia, herida – en las víctimas – por tanta mentira dicha en su nombre. «Venid a mí», susurró el silencio, mostrando, con los brazos abiertos, una forma distinta de cantar. «Venid a mí», gritó la soledad, cansada de deserciones y abandono. «Venid a mí», pidió el dolor, ofreciendo su rostro herido para que la compasión lo acunase. «Venid a mí», llamó el dios de los encuentros. Y fuimos. A veces vacilantes, con toda nuestra inseguridad a cuestas. Pero fuimos. 198 ANDAR NA PRAIA Jeferson Albuquerque, SJ Como é bom andar na praia Ali onde a areia se encontra com o mar Onde o som do mar, no ar me deixa levar Como é bom andar na praia Onde os pés se encontram com o mar E o mar se encontra com os pés. Pés que caminham Como é bom, Alguns passos só na areia Outros com o mar Assim é a experiência de Deus Como andar na praia Deus, como o mar, sempre está lá Ora, nós encontramos Deus E nesse encontro ele me refresca Ora, estou só na areia, mas o mar, tal como Deus, está logo ali. 199 CORAÇÃO DE PEREGRINO Carlos César, SJ Sigo em minha incessante busca, E meu coração de peregrino, tu, Senhor, o conheces. A cada passo dado, Um punhado de nomes De dores e risos acertos e erros. Contigo aprendi o sabor dos caminhos novos, Sem esquecer a beleza e a dureza dos caminhos antigos. A cada passo dado, Encontros e recomeços. Algumas memórias que evocam plenitude E outras que preferia esquecer. Como peregrino, Contigo e por ti, Aprendi a oferecer e pedir ajuda. Nos caminhos sem atalho Ao teu lado lutei. Aprendi a discernir batalhas E a caminhar com mãos calejadas e pés cansados. Te peço, Senhor, Que os meus pés ao andar Marquem teu passo. Que meu coração ao buscar, Encontre o seu. Tu és o Caminho. Meu ponto de chegada e de partida. 200 FOTOGRAFIA: José Paulino Martins, SJ 201 UM A UM Francys Adão, SJ Um a um meus sentidos são recriados em Tua Presença Porque para Ti tudo em minha humanidade é um portal que me conduz ao Reino que me abre aos outros que me eleva ao Céu Respeitando meus processos Tu me afastas dos ruídos da multidão Tu me aproximas de Teu Silêncio curativo Tu restauras minha humanidade enferma com o toque firme e suave de Tua humanidade santa Peço-Te, Senhor que diante de minha vida de homem aberto pela Graça portador de uma Palavra nascida da Escuta Teus filhos possam reconhecer o Dom que Tu és e o Bem que Tu fazes para cada pessoa que inteiramente agradecida escolhe amar-Te e seguir-Te. 202 OBRA: Alexandre Raimundo de Souza, SJ DESCRIÇÃO: Detalle del dibujo del Ciego de nacimiento. 203 É A TI QUE EU PROCURO, SENHOR! Paulo Vinícius da Silva Abreu, SJ (Noviço) É a ti que eu procuro, Senhor! Tu, que curas minhas cegueiras espirituais Para que eu enxergue o teu caminho e te siga. Tu, que desatrofias minha mão e todo o meu ser. Tu, que me vês em cima de uma árvore E pedes que eu desça, não só da árvore, Mas dos meus orgulhos e egos, para que contigo Espalhe a boa nova do Reino e construa um mundo de paz. É a ti que eu procuro, Senhor! Tu, que te disfarças de alguém, Me vês jogado pelo caminho, vens ao meu encontro, Me levantas, cuida de mim e diz: coragem! Tu, que passas do meu lado e me chamas a te seguir Para ser sinal de misericórdia por onde eu passar. Tu, que me chamas a andar sobre as águas, Apesar das minhas fraquezas e debilidades. Mesmo que deitado em uma maca, Com a ajuda de alguém, passo pela multidão, Desço pelo telhado e digo com confiança: “É a ti que eu procuro, Senhor!”, Que me chamas a mais amar e servir os meusirmãos, Os que estão à margem. 204 SOZINHO Francys Adão, SJ Sozinho vivo em lugares rasos Contigo vou às aguas profundas Sozinho conheço a frustração do nada Contigo espanto-me com a abundância Sozinho temo a ruptura de minhas redes Contigo descubro a salvação da partilha Sozinho olho para minha indignidade Contigo escuto Teu convite ao Novo Como poderia ser tão insensato a ponto de escolher a solidão ao invés de Tua companhia? Sim, eu Te seguirei até o fim de meus dias e descobrirei novas maneiras de criar contigo redes indestrutíveis de uma humanidade reconciliada pelo Teu Amor. 205 OBRA: EXERCÍCIOS ESPIRITUAIS José Maria Fernandes Machado, SJ DESCRIÇÃO: Quadro dos Exercícios Espirituais: “Do caos à Revelação “ – O Chamado dos Apóstolos. 206 TERCEIRA SEMANA Maria Clara Lucchetti Bingemer Como em toda vida verdadeiramente humana, a vida de Jesus também conheceu a dor e a morte. E nesta terceira semana somos convidados a contemplar a paixão e a morte de Jesus. Abrir-nos ao mistério de sua dor, da injustiça que o condena, da sua passagem por uma provação inexplicável. Somos aqui introduzidos no sofrimento injustificável de um inocente. Surpresos e perplexos, veremos o Verbo da vida reduzido ao silêncio, o Filho do Deus Altíssimo atado, supliciado, silenciado e condenado, submetido a torturas como em tantos porões de tantos cárceres, de tantos regimes de força, outros inocentes passam pelas mesmas dores. A divindade parece esconder-se e calar-se. A injustiça parece vencer e ter a última palavra. Na Cruz estão com ele dois ladrões, lado a lado. Ao pé da Cruz sua mãe e outras mulheres, e o discípulo amado. Seus discípulos o deixaram sozinho. O justo fica sozinho quando as forças do mal se desatam e querem sangue. Jesus está sozinho e sozinho exala seu último suspiro. E nós somos convidados a segui-lo aí, como o seguimos quando começou seu ministério na Galileia, quando fazia sinais, curas e prodígios poderosos, quando ressuscitava mortos, andava sobre as águas, multiplicava pães e encantava multidões. Agora há que acompanhá-lo em sua solidão e sua morte. Buscando aprender de sua paciência, de sua entrega fiel, de seu amor inesgotável, de seu perdão sem limites. Acompanhando Maria, fazemos silêncio, em comunhão com todas as mães que perderam seus filhos para a violência e a injustiça. Calamo-nos com seu silêncio. 207 OBRA: EXERCÍCIOS ESPIRITUAIS José Maria Fernandes Machado, SJ DESCRIÇÃO: Inserção plena no Mistério Pascal. 208 OLHANDO PRO CRUCIFICADO (EE 53) Creômenes Tenório Maciel, SJ Olhando pro Crucificado… A morte se anuncia. Loucura! Uns dizem. Escândalo! Outros gritam. (1Cor 1, 23) Olhando pro Crucificado... A dúvida assola. Por que o Criador se fez carne? Por que deixou a eternidade? Por que padecer neste vale de sombras da morte? (EE 53; Sal 22, 4) Olhando pro Crucificado... Aquele que se fez pecado, O louco amor de Deus se torna mais claro. Não poupou seu filho único, Pra um dia ver um mundo reconciliado. (2Cor 5,20; João 3, 16) Olhando pro Crucificado... Vejo em suas chagas meus pecados, Acordo minha voz com a voz do peregrino de Loyola e declaro: Por Cristo que fiz, que farei, que faço? (EE 53) Olhando pro Crucificado... Com Deus me sinto reconciliado N’Aquele que carregou nossos pecados. Vivo na justiça, declaro: “eis que venho... com prazer faço vossa vontade, Senhor” Eis minha oferta de amor. (1Pd 2, 24; Sal 39, 8-9; Heb 10, 7, 9). “Considerar o que Cristo nosso Senhor padece na humanidade.” (EE 195) 209 OBRA: VIA SACRA – MORRER José Maria Fernandes Machado, SJ 210 ARIDEZ Moisés Nonato, SJ Vendo a beleza das flores à minha volta, sonhei que o meu amor por Ti fosse: belo, esplendoroso, vicejante. Em meu chão, porém, aridez. Desnudaste-me como catingueira do sertão. Murcha a flor de meu deserto, que mais podia esperar? Feito cacto, enraizei-me. Sem muito me turbar, Centrado na água, que é vida em mim, cuidar. Verde esperança, beleza árida. Vigor, firmeza, constância. Assim o meu Amor, de flor, em cacto se converte. Firme, não fenece, amanhece. 211 OBRA: Alexandre Raimundo de Souza, SJ DESCRIÇÃO: Desenho lápis grafite sobre papel. Arte que expressa a oração de Jesus no horto das oliveiras. 212 PAIXÃO Renato Correia Santos, SJ Dor Sofrimento Humilhação Paixão E para quê? Para assumir a forma humana Na radicalidade da limitação: A morte! E morte violenta. Consequência de opções históricas De seu messianismo Morto e executado pelos deuses da morte. Por amor, Amor de entrega, Se converte em liberação Para toda a humanidade. Eu, Discípulo anônimo, Que um dia ouviu seu chamado, Agora contemplo seu martírio. Quanta tristeza invade meu coração! No silêncio Deixo-me impactar Pelo mistério da sua Paixão. Olhar fixo naquele homem Que um dia prometi seguir até a morte. A Paixão Dele É a paixão do mundo. 213 OBRA: VIA SACRA – DESPIR José Maria Fernandes Machado, SJ 214 MOSTRA-ME (EZ 16) Álvaro Negromonte, SJ Por ti, Senhor, Que devo fazer? Que fiz e que faço Desta vida que conservaste? Desci aos porões contigo Enfrentamos as minhas trevas, juntos Reconheço e me arrependo De não ter amado com todo o meu ser Doe-me a alma porque há muitos vendo Veem o íntimo das minhas entranhas Movidas pelos afetos e desejos baixos Se julgam vencedores de minha vida Por pensarem que em seus esquemas me encaixo Mas tu, Senhor, vens me salvar em teus braços, que me livras Soltando-me dos laços que meu coração criou. 215 OBRA: VIA SACRA – VERÔNICA José Maria Fernandes Machado, SJ 216 EXPIRAR LA VIDA – VIERNES SANTO – Juan Gutiérrez, SJ (Perú) ¿Expirar solo en la cruz? Parecía esconderse tu divinidad, pero sin darnos cuenta, tu cruz ilumina lo entregado, días tras día, persona a persona; apasionado en una dispocisión a darnos todo, sin reserva. Expiraste tu vida en cruz, pero ya nos la habías dado expirándola en lo cotidiano: no teniendo posada en Belén; naciendo en un pesebre; siendo familia migrante; perdido y cuestionando la indiferencia del Templo; convirtiendo agua en alegría; colocándote al final de la fila; liberando en sábados; bienaventurando excluidos; llamando a entusiastas; curando enfermos maldecidos; misericordiando, dignificando, y comprendiendo fragilidades. Toda una vida dada día tras día; pero, provocando envídias y rasgando falsas vestiduras en quienes idearon tu cruz, por no recordar el Padre Nuestro, que comparte nuestra humanidad para expirar la vida entre nosotros. 217 OBRA: Alexandre Raimundo de Souza, SJ DESCRIÇÃO: Desenho a lápis grafite sobre papel. Arte sobre Missão da Terra. Um peregrinar constante, um traçar caminhos pelas veredas do sertão. Mãos, braços, olhares, cruzes, são vida das tantas pessoas, são sentimentos que precisam ser narrados. São rostos, são rabiscos, são ternuras. 218 EU TENHO O CÁLCULO Francys Adão, SJ Eu tenho o cálculo ela, o excesso Eu tenho o protocolo ela, o transbordamento Eu tenho a razão ela, o amor Como posso entender-Te se não me deixo tocar pelo gesto dela? Como compreenderei Tua santa Unção se não consigo me inebriar com o perfume dela? Como acolherei Teu Dom radical se não me alegro com a qualidade da entrega dela? Que a generosidade desta mulher me provoque a amar mais sem medir sem temer sem deixar restos Só assim eu poderei ser Teu companheiro fiel diante do escândalo de Tua Cruz. 219 OBRA: VIA SACRA – MULHERES José Maria Fernandes Machado, SJ 220 VIENES Alberto Luna, SJ Con los estigmas de la vergüenza del condenado y del paria. Vienes de abajo de la tierra, del sepulcro ajeno sin nombre. Vienes con tu presencia negada y despreciada, sobreponiéndote. Vienes desde el fondo oscuro del fracaso y las decepciones. Desde los pedestales caídos y las ilusiones frustradas. Vienes subiendo tercamente desde los infiernos del asco, después de vomitar veneno y beber las heces del imperioen calabozos putrefactos. Vienes afirmando tu rostro como la memoria enterrada de una pesadilla subversiva. Con la cicatriz de la desgracia como un trofeo de guerra, del lado de los que pierden. Vienes entre los escombros demolidos de la esperanza. En el lugar de los ausentes. Vienes. 221 SABER PERMANECER Isaías Gomes, SJ Saber permanecer Se eu soubesse que ia ser tão assim, não teria seguido. Se eu soubesse que iria sofrer tanto no final, não teria me alegrado no início. Se eu soubesse que iria ficar tão difícil de suportar, não teria suportado antes. Se eu soubesse prever o futuro, o tempo, os sentimentos, as emoções e a angústia... não teria sentido primeiro. Se eu soubesse... se eu soubesse o que eu sei hoje, não sei o que faria... agora, apenas permaneço... 222 OBRA: CIRENEU José Maria Fernandes Machado, SJ 223 AQUELE QUE ME LAVA TAMBÉM ME POSSUI Igor Cristiano Oliveira Nascimento, SJ Lava-me, Senhor... Lava-me porque meu ser precisa ser despido Me espanta teu proceder Inquieta-me no mais profundo de minha alma Preciso ainda aprender o que é estar vazio, pobre Lava-me, Senhor... Transfigura-me na minha nudez Despe o meu ser cansado e une meu coração ao teu Desvela-me e torna-me teu amigo íntimo Lava-me, Senhor... Lava minha cabeça Lava minhas mãos Lava meus pés Possui a mim, meu corpo, todos os meus sentidos... Possui o mais íntimo de mim, o que é desconhecido, Minha parte oculta que só teu olhar é capaz de conhecer E faze-me transfigurar no amor; Pois a razão de tudo o que existe dentro das minhas entranhas é amar... Amar até chegar à plenitude do meu vazio, Da minha pobreza existencial que me torna mais íntimo de ti e dos outros. 224 ¿SERÉ YO? José María Rodríguez Olaizola, SJ ¿Seré yo, Maestro, quien afirme o quien niegue? ¿Seré quien te venda por treinta monedas o seguiré a tu lado con las manos vacías? ¿Pasaré alegremente del «hossannah» al «crucifícalo», o mi voz cantará tu evangelio? ¿Seré de los que tiran la piedra o de los que tocan la herida? ¿Seré levita, indiferente al herido del camino, o samaritano conmovido por su dolor? ¿Seré espectador o testigo? ¿Me lavaré las manos para no implicarme, o me las ensuciaré en el contacto con el mundo? ¿Seré quien se rasga las vestiduras y señala culpables, o un buscador humilde de la verdad? 225 ATÉ QUANDO, SENHOR? Guilherme Kaique, SJ “Pilatos, pois, tomou então a Jesus, e o açoitou.” (Jo 19, 1) Até quando, Senhor? Irmãos nossos vão sofrer a mesma morte que tu? Até quando, Senhor? Vamos olhar pro Gólgota e ver jovens sonhadores pendurados? Até quando, Senhor? Nós fugiremos de ti, porque não queremos olhar? Até quando nós não O deixarmos provocar mudanças em nós! Até quando o Senhor em nós continuar de mãos atadas! Até quando nós não nos dermos conta de que somos nós a força D’Ele para transformar... Até quando, Senhor? (...) 226 OBRA: ATÉ QUANDO SENHOR? Guilherme Kaique, SJ DESCRIÇÃO: Técnica mista: aquarela e nanquim, 297x210 mm – 2021. 227 O AMOR É A LEI Carlos César, SJ O veredito de Deus está dado: É amor até o fim E ponto! Nele não há meias verdades. É Aquele que É. É promessa, É vida doada, É ternura consumada em serviço. E por mais que tentem, Usurpem, Enganem, Ou distorçam, Nem mesmo a força das leis vigentes Pode ir contra a força Da Lei do Amor de Deus. 228 OBRA: Alexandre Raimundo de Souza, SJ DESCRIÇÃO: Desenho a caneta esferográfica sobre papel. Arte sobre os Exercícios Espirituais. A janela diante da mulher adúltera que seria apedrejada. Os braços presos, a mulher... os escritos no chão e as pedras que foram deixadas... na janela, uma pedra e algumas gotas de lágrima. Fora do muro, a árvore da vida desponta. Não tem como não me curvar diante deste encontro surpreendente. 229 O AMANTE Jackson A. Carvalho, SJ Fidelidade extremada De uma vida doada, amor E por isso ferida. Se perguntas: de sentido perdido! Teu corpo comunhão! Tua face ferida, macerada Da maior dor sentida, Da vida perdida. Teu andar cambaleante Pelas ruas, às costas carregas do que não fizeste, do vil de cada um de nós. Jesus, olhar para ti é causa de vergonha e graça! Por que sobre ti do vil de mim e de cada um carregaste. Portanto, nos assumiste. Mesmo assim, qual para a mulher aos teus pés que te suplicava, tu olhaste para nós com amor limpaste as nossas feridas com as tuas, salvaste-nos! Oh fidelidade bendita! Jesus. Deus te glorificou com a vida plena! Não te abandonou. E a nós deu tua vida O Amor se espalhou! 230 FOTOGRAFIA: IGREJA NOSSA SENHORA APARECIDA – BH Igor Cristiano Oliveira Nascimento, SJ 231 LA SUPLICA DE LA COPA Cristian Viñales SJ (Chile) Vacíame de mí, Señor de mi soberbia hazme libre, de mis ilusiones despiértame, que yo brille vacío de mí. Vacíame, del veneno que me tienta, del fantasma que me acecha susurrando lo que pudo ser cantando la gesta de la copa vacía de ti. Vacío, lluévete en mí, por esta grieta dolorosa, cuélate suave y lléname así vengan todos a embriagarse de ti: Quien quiera destrozarme, y quien me quiera compartir. Pero que beba el pobre, y con esta copa en su boca, mire atento el agua viva, y se refleje en ti. 232 OBRA: NOSSA SENHORA DA SOLIDÃO José Paulino Martins, SJ 233 “AMOR-SIN-LÍMITES” Germán Méndez, SJ (México) Me amaste, Y fui. Me amaste, Y existí. Miro al horizonte, Y mi mirada Encuentra un límite: Es tu amor. Miro a mi interior, Y en mi barro Encuentro mi límite: Ahí también está tu amor. Miro a mi interior, Y en mi barro está tu huella: soy fragilidad poderosa. Miro al horizonte, Y pasando mi mirada Estás tú, Amor-sin-límites: Poder tan frágil. En mi barro, tu amor No halla límites, En el horizonte, tu amor No cesa de llenarlo todo. Bendita mi fragilidad, Es huella de tu amor; Bendita tu fragilidad, Es huella de tu humanidad. Bendita mi fortaleza, Es fruto de tu amor; Bendito tu poder, Es llama eterna de vida. Bella oscuridad Donde luce el lucero, Bella penumbra Donde brilla la esperanza. Bello pesar Donde me siento sostenido, Bendita cruz, Benditos clavos. 234 OBRA: Adaptações de desenhos de Claúdio Pastro feitas por Rodrigo Souza Silva 235 HOJE TU ESTÁS CALADO Francys Adão, SJ Hoje Tu estás calado Tu, a Palavra disseste tudo o que tinhas a dizer Mas Teu Silêncio também fala Hoje é shabbat, dia do repouso Para a fé, o mundo existe porque Teu Pai quis criar, trabalhando Mas para que o Amor possa brotar livremente neste mundo criado Teu Pai quis gerar, parando O Amor verdadeiro nunca se impõe Ele crê e espera Ontem e hoje os poderes mundanos ignoram esta lógica e têm dificuldade de entendê-la Tu, o Filho amado sempre amaste, trabalhando mas também aprendeste do Pai o Mistério de amar, parando Quanto a mim serei eu capaz de parar e repousar, por amor? Em Teu Silêncio ajuda-me a crer, a esperar e pouco a pouco a aprender a amar Pois neste Sábado nas profundezas de nossos túmulos algo radicalmente novo é gerado em nossa humanidade cansada, amedrontada e ferida E quem sabe ao chegar o fim desta noite meu coração estará pronto para enxergar o brilho de Tua Luz que não se apaga. 236 OBRA: VIA SACRA – TÚMULO José Maria Fernandes Machado, SJ 237 MADRE DE LOS DÍAS INCIERTOS José Maria Rodríguez Olaizola, SJ Cuando muerda el frío, ateridos, inseguros, anhelando la hoguera y sintiendo temor, siéntate con nosotros, madre, en el hogar. Cuéntanos la historia, de una muchacha que no temió la llamada que cambiaba todo. Háblanos de aquel «Hágase» que abría la puerta sellada del perdón y la esperanza. Y de los días inciertos, de las miradas difíciles, de las dudas, tan humanas. Evoca, para nosotros, aquella intemperie que fue cuna de la Vida. Enséñanos tú, maestra del silencio, a guardar en el corazón las respuestas intuidas que germinan en fe inquebrantable. Hasta la cruz. Y más allá. Cuando muerda el frío, envuélvenos, señora, con tu manto. 238 OBRA: Alexandre Raimundo deSouza, SJ DESCRIÇÃO: Desenho a lápis grafite sobre papel. Arte sobre Nossa Senhora Aparecida. Esta arte é a junção de outros desenhos. 300 anos de história desde as correntes abertas do negro escravizado. Mãe Negra, vestida com a coroa dos traçados destas terras, lembranças das mulheres com cestos na cabeça. Intercede por tantas situações. 239 O QUE VOCÊ PROCURA? Franklin, SJ Caminhava cabisbaixo e ligeiro... parecia procurar algo. — O que você procura, menino?! — Procuro uma razão pra não morrer, disse o cabisbaixo menino. — Mas... você caminha muito rápido! Difícil encontrar algo! — Por que você caminha ligeiro, menino inquieto?! — Caminho ligeiro porque já não me sinto parte de nenhum lugar. Carrego uma saudade profunda, mas não sei de quê... parece que perdi algo que não consigo encontrar... Caminhava saudoso o cabisbaixo ligeiro menino. — Ei, menino!! Procurar com a razão uma razão pra não morrer, não parece muito razoável. — A razão tornou-se uma ilusão, talvez, por isso não tenho mais razão pra viver, disse o ligeiro menino. — Ei, menino sem razão! Vai embora pra onde?! — Sinto-me fruto de um erro, talvez, por isso passei minha curta vida procurando acertar... eu, um erro! Disse o ligeiro, cabisbaixo, saudoso menino que procurava uma razão pra não se matar. O menino viu que as pessoas grandes que caminhavam a sua frente se desviavam de algo que havia no chão. O menino parou de ser ligeiro... viu que havia uma poça d`água no chão. Parou para olhar aquela poça d`água tranquila e escura que parecia profunda... refletia um pedaço do seu rosto, um pedaço do céu e um pedaço de um lampião apagado. Abaixou-se e escreveu com a ponta do dedo seu nome – menino – sobre a água que se transformou em pequenas confusas ondas que misturaram os pedaços do céu, do lampião e do seu rosto... — Agora, disse o menino, encontrei o que procurava! 240 TU MESA – JUEVES SANTO – Juan Gutiérrez, SJ (Perú) Nos dijiste que tu Reino era un gran banquete y esa tarde lo confirmó. Te sentaste con los tuyos que no eran pocos ni mucho menos iguales. En tu mesa caben todos. El que descansa en tu hombro y el que te traiciona; los de promesas impetuosas y los prudentes reflexivos; los jóvenes que renuevan y los mayores que sostienen; los que enferman, hieren, y se inclinan a curar; los que esperan acomodarse y los que ya se duermen por haber servido contigo; el que aporta sus bienes y el que no los tiene; los miedosos que te abandonan o las valientes invisibilizadas. Todos, hombres y mujeres, Juan que te conocen como amigo, hermano y salvador. En tu mesa nos heredas un ministerio que es servicio. Y siendo primero te haces último, te levantas dejando el confort, te despojas de tu imagen y te ciñes todo lo necesario. Te inclinas para contemplarnos en nuestros pies cansados, lavando falsas humildades y secando heridas con caricias. En tu mesa nos envías, Dispuestos a tener parte contigo en la pena y en la gloria, porque esos pies lavados han de caminar para lavar a otros; rehabilitando pasos esperanzados que no se vencen fácilmente; pasos que misericordian debilidades; y sirven al que no puede solo: pasos comprometidos con tu Reino. 241 OBRA: BODAS DE CANÁ José Paulino Martins, SJ 242 “SEDIENTO” Germán Augusto Méndez Ceval, SJ En tu último suspiro, Ahí en esa cruz clavado, Los pulmones soltando El último de tus alientos; Ahí te entregas llorando, vuelves la mirada abajo, y duele, te duele tanto. Ves a quienes amas, Te entregaste en vida, A quienes te entregan A la muerte en el madero; Y lloras tu dolor, Gimes a tu Padre, Y no dejas de mirarles. Tu boca está sedienta, La lengua pegada, Pero más sediento Está tu corazón; Ama sin ser amado, Mueres sediento, Sediento de amor. ¿De qué sirves, fiel sirviente, Invisible en el madero, Cuando todo muere Con tu aliento? ¿De qué sirves, hijo amado, Cuando el cielo calla Y la tierra escupe? Tu cuello se dobla, Pesa tanto la espina, Y en tus brazos Midiendo el amor todo; Clavado te entregas, Amándolo todo, Atrayéndolo todo. Y con tu muerte se rasga un velo, La luz que cegaba: ilumina, Volvemos todos a casa Con dolor golpeando el pecho; Si tanto nos ama tu Padre, Si nada tú te guardaste, ¿por qué nos cuesta tanto amarte? 243 OBRA: O NASCIMENTO DA IGREJA José Paulino Martins, SJ DESCRIÇÃO: Acrílica sobre papel. 42x29cm –1997. 244 GESTOS Claudia Honorio (Leiga inaciana) A vocação é o amor Fugir do quê? Fugir do que está no coração Esta vocação que é amor. Gestos de amor que irão longe Gestos para sair da opressão. Gestos para sair da angústia interior. Gestos de alegrias Gestos que fazem o coração crescer de todo lado. Fugir do quê? Deus é Amor. 245 OBRA: EM MEMÓRIA DE MIM Jobson Ramos, SJ 246 TRAS EL DISCURSO Tomás Browne Urzúa, SJ Tras el discurso los abrazos las promesas las sonrisas los aplausos Tras las firmas y diplomas las estatuas estandartes y canciones, asoma de reojo esa duda capaz de destruirlo todo. 247 QUARTA SEMANA Maria Clara Lucchetti Bingemer Tudo começou com um rumor. Ele está vivo. As mulheres viram. Ele não está no túmulo. Os discípulos não deram crédito. Afinal, mulher gosta de inventar história, fala demais... Mas os que foram ao túmulo... viram tudo como elas disseram. Será que tinham razão? O rumor cresceu e começou a transformar corações e vidas. Os medrosos se converteram em intrépidos. Os fugitivos voltaram ao seio da comunidade. Os desolados e desesperados sentiram seu coração quente. Os incrédulos confessaram e adoraram seu Senhor e seu Deus. Os escondidos saíram à praça pública e anunciaram que ele ressuscitara como disse e cantaram aleluias. A alegria passou a reinar em lugar da dor. E nós somos chamados a entrar nessa alegria, a alegrar-nos com a alegria do Mestre que cumpriu suas promessas, com a misericórdia do Deus que jamais nos abandonou. Entramos no rastro dessa alegria, procurando dar fruto, testemunhar, mostrar a todos seus verdadeiros e santíssimos efeitos. Alegrar-se com a alegria do Senhor Ressuscitado, isso precisamos aprender. Aprender que a alegria permanece mesmo quando há dor, mesmo quando a tribulação se aproxima, mesmo quando parece impossível sorrir. A quarta semana nos inicia nessa alegria sem fim, mostrando uma realidade toda ela transfigurada pelo amor do Deus que é vida em si mesmo e que com a Ressurreição de Seu Filho nos diz que sua última palavra não é a morte, mas a vida, não é o pranto, mas a alegria. 248 OBRA: EXERCÍCIOS ESPIRITUAIS José Maria Fernandes Machado, SJ DESCRIÇÃO: Ressuscitado – A Plena Revelação do sentido da Vida. 249 “Sentir intensa e profunda alegria por tanta glória e gozo de Cristo nosso Senhor.” (EE 221) “Vamos ressuscitando sem saber...” mas é preciso olhar para aprender a ver! OLHAI E VEDE! André Araújo, SJ Não pude conter o susto quando vi o pão partido muito antes da Ceia. O pão vivo descido, ali, pra quem quisesse ver. Como não tinha visto a mesa posta? Como não havia percebido que, ali, naquela hora mesma, o Menino envolto em faixas era comida e bebida no cocho dos animais? Sim! Manjedoura é palavra bonita demais, a gente até se esquece e só se lembra numas horas banais... Pois foi assim: tomaram-no, abençoaram-no, partiram-no e o banquete estava pronto. Enviaram-no! Difícil de entender?! Nova gramática para as palavras antigas, acostumadas às velhas relações sintáticas. Outro enunciado bem mais arrojado que essa pragmática. Com esse jeito novo de habitar o mundo: palavra-verbo-comida, as estruturas mudam no profundo. Muda o gesto a Palavra da Vida, a maneira de conjugar; (continua) 250 muda o modo de se alimentar, a forma de viver; muda o jeito de querer. Se não mudar, o risco de olhar e não ver é grande mesmo! Não vê o agricultor, não vê o trigo e a flor, não vê a uva pisada, não vê o cordeiro, não vê nada, nem o Pão, nem a Palavra e a porta se abrindo, autocomunicando-se e atraindo, chamando pra mais perto os sedentose os famintos, consolando e repartindo. Não vê quem chamou, nem quem preparou, não vê os comensais. Olha e não o reconhece urgente em tantas mesas, presente em tanta prece, pedindo que não nos faltem mais o Pão e a Palavra, maior riqueza, tamanha delicadeza! O risco é grande: entra e se senta, mas não se contenta, passa fome, não bebe nem come... “OLHAI E VEDE! (continuação) 251 OBRA: COLHEITA Jobson Ramos, SJ 252 PASCUA José Maria Rodríguez Olaizola, SJ La losa está apartada. La luz se desparrama por la tierra. Que no se rindan los buscadores de amaneceres. No hay noche eterna. No hay victoria para el mal. El sepulcro está vacío. La tristeza, bailando, se transforma en alegría. El muro sellado es ahora ventana. Al otro lado, muestra un paisaje desconocido. Dicen que el Amor pasea por la tierra nueva. Aparece a quien lo llama. Solo hay que pronunciar su nombre con fe. Su nombre sobre todo nombre. Aparecido. Cicatrizado. Resucitado. 253 ENTARDECER… AMANHECER! Gabriel Araújo Pacheco Entardecer... O medo, Desde as entranhas faz estremecer. Fechamento, isolamento, Do entardecer o medo ameaça. Logo, a mudança, Inesperada, inexplicável, indefinível. Presença rara, sopro, paz, Que do medo faz impulso, Impulso vital, ressuscitador. As dúvidas Daqueles (e também nós, que por memória e chamado somos neles) Dos incrédulos, Dúvidas encontram um convite: Que seja pessoa de fé! Um aventurar-se, de fato, Caminho de confiança. Do medo à alegria Do medo à saída. Arriscar-se! Risco de uma vida por paz (paz não tranquila, não fácil, mas instigante). Uma vida pela paz, Para consolar, liberar, Ressuscitar... Amanhecer! 254 FOTOGRAFIA: PÔR DO SOL Régis Sarto, SJ 255 RESSURREIÇÃO Igor Cristiano Oliveira Nascimento, SJ O silêncio... A solidão... A noite escura... Irrompida por uma grande novidade. Trago-te aromas, perfumes Quero embalsamar teu corpo e tocar tuas feridas O raiar do sol... A pedra... A surpresa... Venho a ti com pressa, como quem tem sede de Companhia Quero na liberdade da solidão ressurgir junto contigo, O túmulo... O vazio... O olhar... Busco-te no silêncio, no vazio cheio de petrificação interior Onde tu estás? No mais íntimo de mim, ordenando o ser e o viver. O abandono... O medo... A surpresa... És tu caminhando em meu jardim, Irrompendo as barreiras entre o tempo e a eternidade, nutrindo minha esperança; Ressurgindo minha vida de tua inexaurível presença Fazendo-me contemplar e comungar de tuas profundezas. 256 FOTOGRAFIA: PRIMAVERA Ir. Lucemberg Lima de Oliveira, SJ 257 MANHÃ DA RESSURREIÇÃO Luan Amorim, SJ Doce jardineiro sinto a necessidade de encontrar contigo. Quero como Maria de Magdala escutar o sussurro de tua voz, E perceber que depois de uma longa jornada, Possa ver teu rosto! E ao voltar meu coração a ti, Anseio ser criança aprendiz, que se encanta com cada saber novo. Quero simplesmente te dizer: Que sou terra árida e sedenta, que muitas vezes dá frutos insuficientes. Mas sei, que tu, divino cultivador Conheces com grande habilidade o laborioso cuidado da terra, Com tuas mãos silenciosas e ternas. Faz de mim aquele jardim daquela manhã, E permite que eu escute meu nome em teus lábios E como Maria possa dizer: É o Senhor! 258 OBRA: José Paulino Martins, SJ DESCRIÇÃO: Acrílica sobre tela. Nossa Senhora das Candeias, da luz, Luzia, luz guia – 2017. 259 ALÉGRATE Juan Gutiérrez, SJ (Província do Perú) Alégrate! Esa es la noche en que el silencio fúnebre fue salvíficamente quebrado. La muerte ya no es fin, solo paso; la soledad se hace abrazo; las lágrimas dibujan sonrisas; y el miedo se hace anuncio de un Reino siempre actual. Amanecimos ante lo imposible: su tumba quedó vacía, y sus lienzos gritan vivamente que Dios no habita la muerte, que Dios devuelve la esperanza, que Dios nunca abandona, que Dios no solo crea, sino que levanta de la nada. Alégrate! Ya no está entre piedras. Nos espera en nuestros caminos, entre los nuestros y necesitados, entre las dudas y las certezas. Resucitó para habitarnos de esperanza y buenos deseos, de misericordia, consuelo y deseos de servirle. Ya es Emanuel Resucitado, El Dios con nosotros, por siempre. 260 OBRA: Alexandre Raimundo de Souza, SJ DESCRIÇÃO: El Cristo Resucitado lleva las marcas de la cruz. Los colores fuertes expresan la fuerza del amor. 261 TUDO É DOM Jeferson Albuquerque, SJ Antes de eu começar Deus já sabia onde ia terminar Tudo é dom O que julgo ser meu, Na verdade apenas está comigo Todos os talentos eu apenas possuo, Na verdade, tudo é de Deus Tudo é dom. 262 CONSOLAÇÃO Eliomar Ribeiro, SJ Um cheiro de alecrim e cravo inebriou-me Devo ter sonhado com plantas, doces, celebrações São as primeiras horas da manhã de mais um dia Sol claro, de primavera, entrando pela janela Sem pedir licença e sem nenhuma modéstia Gosto bom salivando na boca da história A memória caminha a passos lentos O coração acelera porque vive de desejos Mais um dia de estudos, de saudades, de sonhos A imagem da pombinha bebendo água na fonte Desperta em mim uma sede insaciável de comunhão A melodia encantadora das entranhas amazônicas Toca o ouvido com toadas, rostos, flores, bichos e matas Carrego comigo um balaio lotado de encantos Às vezes penso que devia ter nascido mágico Para enxugar cada lágrima derramada sem razão Olho o mundo e vejo tanta falta de cuidado Sei que devo continuar utopicamente cantando Do chão regado em sangue a flor brota mais forte No encontro com o Amado a palavra certa e preciosa: “Maravilhas o Senhor fez por nós, encheu-nos de alegria!” 263 OBRA: NOSSA SENHORA COLIBRIS Luís Renato Carvalho, SJ 264 Dizem que estou ameaçado de morte. Um dia vou morrer. Mas ando flertando com a vida... AMEAÇA DE VIDA André Araújo, SJ Acostumara-se tanto ao sofrimento que ser feliz soava como uma afronta ou uma ofensa ao mundo. Era tão comum sentir-se ameaçado de morte que uma ameaça de vida constrangia. Ameaça devida: ver os sinais da Alegria na menor das vagas, ver no que está morto a vida que viria. Não é essa a confiança que depositamos na semente? Em vez de viver morrendo um pouco cada dia, seria diferente experimentar que ressuscitava toda hora. Esse era o maior desafio: descobrir que vivia e revivia sem saber, assim, ao menor sinal, como num atentado amoroso: o cego, o coxo, o surdo, o homem da mão seca, a menina que dorme e o filho da viúva, a pecadora, o amigo sepultado há quatro dias, os epiléticos e os atormentados, a imensa multidão dos famintos, uma mulher da Samaria, um publicano, um homem caído à beira do caminho, um fariseu na estrada para Damasco, a dívida paga, a casa pra morar, o novo emprego, o pão de cada dia, a mãe recuperada, o menino que nasceu sadio, a febre que cessou, a hemorragia que estancou, a aprovação no concurso, a cirurgia que correu bem, a escola pública e de qualidade, o sistema único de saúde garantido, o desenvolvimento sustentável, a economia criativa, os artistas e a cultura popular, a fraternidade e a dignidade humana, (continua) 265 o migrante, a viúva e o órfão socorridos, as religiões, a diversidade e as etnias respeitadas, a paz universal, a ecologia integral, a verdade da utopia, realizando-se no milagre, no esforço de cada dia, nas ações mínimas e na política responsável. Tudo o que existe canta e ameaça viver! Por desaforo, decidiu não morrer! Ainda que o que se ofereça seja forjado entre lágrimas. Vejo a morte carregar a vida! Luto sem substantivo, quero o Verbo renascendo todo dia na primeira pessoa que se une a outras tantas entre mim e você. Prepare-se! É uma ameaça com Vida! AMEAÇA DE VIDA (continuação) 266 CONTAGIAR ALEGRÍA Juan Gutiérrez, SJ (Província do Perú) Te veo pasar y no me abrasas con tu calor galopante, porque hay quién sufre y llora, porque hay enfermos, hambre, soledades y egoísmo. Con todo esto no puedo alegrarme, me sientotímido para abrazarte. Porque quien quiera abrazarte. querrá transformarlo todo, mirar con esperanza, percibir la bondad del otro, reconocerse con posibilidades, compartir oportunidades, reír con los amigos, reemprender el camino, y soñar una nueva ruta. Y cuando te abracemos en tu ruta, ayúdanos a contagiarte a otros, con mensajes que griten, con carcajadas transparentes, compartiendo pensamientos, trasmitiendo sentimientos y sumándome a proyectos que alegren a muchos. Debo dejar mi timidez, no dejarte pasar de largo; porque vale la pena sentirte, compartirte y alegrarme con otros, contigo. 267 DO PERFUME DA MORTE AO PERFUME DA VIDA Agnaldo Duarte, SJ Com a paixão sentimos o mau cheiro da morte Com a Páscoa sentimos o perfume da vida Para que tanto desperdício de perfume? Para que tanto mau cheiro no coração? O perfume que custou acima de 300 denários 300 denários custou o mau cheiro da traição Ela fez o que pôde: ungiu meu corpo com o perfume da sua consolação Ele foi aos chefes: traiu-me com o mau cheiro da sua acusação E assim... Espalhou-se o perfume da vida onde existia o mau cheiro da morte Alastrou-se o perfume da solidariedade onde existia o mau cheiro da fome Propagou-se o perfume do diálogo onde existia o mau cheiro da dureza Anunciou-se o perfume da reconciliação onde existia o mau cheiro da rispidez Promoveu-se o perfume da justiça onde existia o mau cheiro da impunidade Expandiu-se o perfume da esperança onde existia o mau cheiro do medo Difundiu-se o perfume da dignidade onde existia o mau cheiro da obscenidade Estendeu-se o perfume do acolhimento onde existia o mau cheiro do desafeto Distribuiu-se o perfume do alimento onde existia o mau cheiro da miséria Proclamou-se o perfume da Ressurreição onde existia o mau cheiro da violência Enfim... Espalhou-se a Palavra que é Vida, que gera vida e nos mantém vivos Que não nos permite viver com o mau cheiro do desânimo Absorvidos pelas desilusões Derrubados pela força da morte Com a Páscoa sentimos o perfume da vida Compreendemos que a esperança sempre floresce No instante que se experimenta o perfume do Eterno dentro do nosso ser. 268 OBRA: Alexandre Raimundo de Souza, SJ DESCRIÇÃO: Pintura acrílica sobre tela. Arte da vida! Ser cordeiro, ser passagem, ter coragem e ser simplesmente amor. Mistério que dá sentido. 269 ENCUÉNTRAME… Alberto Luna, SJ En la madrugada del desconcierto, después de la pesadilla nocturna, entre los escombros de mis sueños. Crúzate en mi camino desorientado, perdido de la pista de tus huellas, volviendo a mi rutina vacía y seca. Asoma por la ventana tu mirada, porque mi puerta está trancada bajo siete llaves de hielo amarillo. Acércame el costado atravesado y las manos heridas a los ojos engrillados por mis dudas ciegas. Porque estoy solo en el entierro de mis rosales marchitos, bajo esa piedra imposible. Empuña el cuchillo de fuego, hiere de muerte a la noche sepultada bajo mis párpados. Alcánzame, jardinero del paraíso, ese alto fruto, maduro y deseado, que no tengo altura para tomar. 270 MIRAR DE NUEVO Juan Gutiérrez, SJ (Província do Perú) Señor queremos mirar de nuevo. Toma nuestra libertad, para silenciar nuestras distracciones y reemprender tu servicio y misión. Señor toma nuestra memoria, para recordar cómo nos hablas en el silencio cotidiano. Señor toma nuestro entendimiento, para comprender los ruidos que no nos dejan escuchar tu voz. Señor toma nuestra voluntad, para parar y escuchar para mirar de nuevo. 271 TEMPO E PROFECIA Igor Cristiano Oliveira Nascimento, SJ Neste novo tempo nascerá uma haste, Surgirá também um rebento de uma flor Haveremos de nos encantar com a beleza Haveremos de nos espantar com tal mistério A profecia tornar-se-á habitação, morada da esperança. Os desanimados Os tristes Os humildes Viverão com os corações inclinados e sentirão fome do horizonte. Neste novo tempo uma flor irá desabrochar A esperança nos acompanhará O surgimento da vida anunciará Um rumor entre o tempo e a eternidade. 272 FOTOGRAFIA: Régis Sarto, SJ 273 CONTEMPLAÇÃO PARA ALCANÇAR O AMOR Ao final do itinerário dos Exercícios Espirituais, o exercitante é devolvido ao mundo criado, do qual na verdade nunca saiu. Está agora banhado da luz da revelação de Jesus Cristo, Rei Eterno e Senhor do Universo inteiro. Redescobre a criação e seu lugar nela banhado nesse mistério da Encarnação, vida, morte e ressurreição de seu Senhor. A contemplação do final dos Exercícios – dita “para alcançar o amor” – abre o panorama de toda a criação diante do olhar do exercitante banhado pela luz crística. A experiência de Inácio é, assim, marcada por uma teologia da “descida” e do aniquilamento divinos. Todos os bens “descem” do alto, a Majestade divina pode ser encontrada nas “coisas” mais pequenas e humildes. O lugar de Deus, tal como percebido por Inácio, não é, portanto, outro, senão “todas as coisas”, essas “coisas” onde a graça divina habita, resgatando e salvando. O Deus de toda glória e majestade “desce” e se faz menor, no interior de sua Criação pecadora, chamando o ser humano a entrar também nesse movimento de seguimento de Jesus Cristo e de serviço sem limites para ser introduzido no amor propício e glorioso do Pai. O Deus de Inácio de Loyola é, portanto, um Deus-amor, que se dá e se comunica de maneira real e operante ao homem, enquanto amor, que o “serve” pelas obras salvíficas que realiza no mundo. Lançando o olhar sobre toda a Criação, o convite é perceber Deus, enquanto princípio vital, enquanto sopro que anima e dá “ser”, “crescimento” e “sensação” a tudo que existe (EE 235). Olhando tudo que o circunda e em tudo encontrando a Deus como origem e interioridade mais profunda percebe-se, então, a natureza e história humanas como habitadas pelo próprio Deus. (continua) 274 Esta presença de Deus nos seres e nas coisas encontra seu ponto máximo no ser humano, de quem Deus faz “templo seu” (EE 235). Essa centralidade antropológica no meio do mundo ganha ainda maior peso, se vista do ponto de vista da Encarnação do Verbo de Deus. O significado e o valor das coisas tornam-se radicalmente alterados pela presença do Cristo nelas. Mesmo as mais radicais negatividades ontológicas ou religiosas são transvalorizadas, devido à presença de Deus nelas até a inabitação do Espírito que faz do ser humano seu templo. A Encarnação torna-se assim o mais alto instante de presença de Deus na sua criação e no homem, mas, de uma certa maneira, também não a esgota. O que Deus fez em Jesus Cristo é indicativo do que faz e continua fazendo pelo homem, em todas as coisas e em seus templos de carne, escrevendo a nova lei do amor em seus corações. CONTEMPLAÇÃO PARA ALCANÇAR O AMOR (continuação) 275 “O amor é comunicação de ambas as partes. Isto é, quem ama dá e comunica o que tem ou pode a quem ama. Por sua vez, quem é amado dá e comunica ao que ama.” (EE 231) AGORA Jobson Ramos, SJ Para o mundo que sofre uma dor que demora Um sonho perdido, a criança que chora Do fogo aquecido dos dias de outrora Só resta essa chama apagando lá fora A mão afagando o coração na aurora Aquele que já não sustenta a hora Na flor prevalece, porém, o amor Já não se adia a esperança, é agora Vem, Faz florescer Faz florear Um simples botão é capaz, sim, de mudar Um olhar Esperançar. 276 OBRA: AGORA Jobson Ramos, SJ 277 SÓ MUDA DE LADO... Eduardo Henriques, SJ É pra passar a vida toda, Pois aí está tudo da vida! Colcha de retalhos infinita, Só quando completa, orna. Completa quando? No amanhã do hoje, No hoje amanhecido sempre. Seu nome é: Eternidade... 278 OBRA: INÁCIO EM PARIS José Paulino Martins, SJ 279 Que vida nova é essa que começamos agora?! Quem é esse Anônimo que me consola? “TEM DEUS!” André Araújo, SJ Quando Ele chegou, a mesa do café estava posta. Fumegava o bule esmaltado e o coração parecia sossegado. Veio perguntando por mim, Ela mostrava-se mais preocupadado que triste. “Desde então, ele está assim”. Falou com voz firme e apontou para mim. Eu dormia, e Ele foi me acordar, como sempre fazia. Tocou-me o rosto e me fez um carinho. Não acreditei no que via. Era Ele mesmo! Como podia?! Sentei-me depressa, deu-me um abraço forte, quis saber o que havia. Contei, chorei e me desculpei, disse que o decepcionaria. Ele sorriu, claro que já sabia e pôs a mão no meu peito; consertou alguma coisa, lá bem do seu jeito. Ela olhava de longe seus meninos crescidos. Sorria, senti sua ternura. Como podia?! Não tinha amargura, era toda alegria! Com Ela aprenderia o que importa até o final dos meus dias. Um seria para o outro verdadeira companhia. Algo acontecia num lugar que não se vê muito bem. Levantei, beijei-a na testa, tomei um banho, tomamos café. Era assim e não era estranho, era mais um carinho e um cafuné. (continua) 280 Pois é... Como não ter Deus?! Pegamos um livro, que Ele quis ler, e Ela, sorrindo, veio logo ver: “Com Deus existindo, tudo dá esperança: sempre um milagre é possível, o mundo se resolve. Mas, se não tem Deus [...] é o aberto perigo das grandes e pequenas horas, não se podendo facilitar”. E continuou devagar: “Tendo Deus, é menos grave se descuidar um pouquinho, pois, no fim dá certo. Mas, se não tem Deus, então, a gente não tem licença de coisa nenhuma! Porque existe dor.” Ela me olhou, aprendi com amor e ainda hoje Ela insiste, num modo de me alegrar: “Deus existe mesmo quando não há.” “TEM DEUS!” (continuação) 281 FOTOGRAFIA: Régis Sarto, SJ 282 ONDE ESTÁS Jackson A. Carvalho, SJ Ouvi tua voz por entre árvores que balançam, pássaros que cantam, no zumbido da abelha, dentro do coração atento, no assobiar do vento, nuvem em movimento. Ouvi tua voz No silêncio imposto, Em um guerrear sem sentido, Na ferida exposta, De um gesto te aproprias. Ouvi tua voz nas incelenças entoadas, nas novenas dos santos, no pedido de chuva, na maré transbordada. Ouvi tua voz na família ferida, a pobreza sentida, da comida garantida, tua voz se ouvia. 283 OBRA: Alexandre Raimundo de Souza, SJ DESCRIÇÃO: Rabisco – grafite sobre papel. Simplesmente simples, apenas um pouco de saudade. 284 QUIOSQUE! Heber Salvador de Lima, SJ Aqui está o novo Quiosque Pr’a nossa felicidade, quase no meio de um bosque, no coração da cidade. Será sempre um bom presente Ao surgir dor ou cansaço; quando mal-estar se sente o quiosque nos dá um abraço! Foi feito com muita arte num jardim e seu esplendor que o cerca de toda parte e até faz dele uma flor! Vamos usá-lo p’ra cantos, pr’a jogos e refeições, talvez p’ra momentos santos de piedosas orações. Obrigado, Senhor Deus, Pelo quiosque que nos deste! Para estes velhinhos teus É um gozo quase celeste! Aqui estará nossa idade em serena quietude pois paz e felicidade têm jeito de juventude! 285 O NOVO DAS MESMAS COISAS Carlos César, SJ Todo dia a mesma coisa: Nada mais parece surpreender. O mesmo trabalho, As mesmas pessoas. Os mesmos dilemas, Os velhos problemas disfarçados. Viver a rotina, Superar a mesmice, Amar de novo as mesmas pessoas, Reinventar o fazer, Insistir no crer, E não deixar que o desânimo ganhe a batalha. Na rotina que não muda, Eu mudo. Desde o meu interior, eu mudo. 286 FOTOGRAFIA: Régis Sarto, SJ 287 PERMANECER José Maria Rodríguez Olaizola, SJ Hoy todo fluye, todo cambia, todo trae fecha de caducidad. Maldito presente absoluto que se nos ha instalado dentro, como un intruso, ocupando las estancias de la memoria y la esperanza con su ahora cargado de exigencias. Y así, huérfanos de historias y vacíos de futuro, somos presa de los estados de ánimo, tan cambiantes. Nos devoran las crisis en tiempo menguante. Nada perdura. Ni el amor. Ni las promesas que hicimos y que recibimos. Ni la confianza en el para siempre. No sabemos conjugar el verbo permanecer, y exigimos que todo, hasta Dios, cambie a nuestra medida. Así no hay viña que crezca y dé fruto. Devuélvenos, Señor, la conciencia de tu tiempo y tu presencia. Enséñanos a ser sarmientos de la vid, que eres Tú. Devuélvenos la fe, Tú que calmas las tormentas. 288 FOTOGRAFIA: Régis Sarto, SJ 289 LIBERDADE Jobson Ramos, SJ Eis um sonho, um desejo Não meu, nem teu: nosso Ser leve, suave, singelo Voar sem destino certo Pousar quando quiser Parar. Contemplar Sentir Voar de novo e repetir o mesmo ciclo quantas vezes quiser Borboletear Metamorfosear Eis um sonho Um desejo. 290 OBRA: BORBOLETA Jobson Ramos, SJ DESCRIÇÃO: Tudo que nos toca nos afeta, nos transforma. Deixemo-nos afetar pelo que é belo. 291 EN TU NOMBRE Alberto Luna, SJ En el nombre del mar de las olas y la espuma. En el nombre del sol de la luna y las estrellas. Me crece en el pecho tu nombre. Padre, repite el raudal de mis venas. Padre creador, resuena, su eco me habita y llena. Padre protector de los pequeños, Padre que cuidas a los tuyos y encuentras tu alegría plena al verlos crecer en libertad, al reflejar en ellos tu bondad. En el nombre de la flor del fruto y la semilla, en el nombre de la casa de la mesa y el jardín. Se dilatan los ojos al verte, compañero, rostro de luz abierto y transparente, maestro de vida, pastor sincero, de todo poder en el servicio. Jesús, oigo tu nombre como lluvia que me empapa y fecunda de ternura. Brota tu verbo erguido en mi aliento y me lanzo al camino peregrino, amigo de sudores de los pobres, hasta llegar a Emaús contigo en la mesa ardiente de pan y vino, el corazón anclado para siempre en ti. En el nombre del fuego de las llamas y la chispa, en el nombre de la fiesta la música y la danza. Como el perfume de una sonrisa te deslizas en la neblina discreta, en las pupilas intuitivas, en la alegría de las cosas nuevas. Espíritu Santo, inteligencia amorosa, poeta que das nombre a la alegría. Infundes en todas mis fibras al cosmos en cada aliento. Me haces uno y solidario, comprometido con todos para que venga tu Reino. En el nombre de la tierra de los ríos y del bosque. En el nombre del encuentro del beso y el abrazo. Amén. 292 OBRA: CRISTO AMARELO José Paulino Martins, SJ 293 ALTAR E OFERENDA Álvoro Negromonte, SJ O que sou e o que tenho Que sentido tem, se não moenda? Se guardo sonhos, desejos e vontades E não coloco no altar a oferenda? Chegar ao lugar, autodeserto Construir e reconstruir como uma renda Perguntar se aqui devo ficar Sem medo de propor uma outra estrada Para a Maior Glória tão desejada Fazer de si altar e oferenda Ver o mundo com outro olhar menino Como cordeiro pronto para doar a vida Será a vontade que me acena? Mudar o rumo, vencer não e buscar sins Para desejar e ensinar ser altar e oferenda. 294 LO INDECIBLE Tomás Browne Urzúa, SJ (Chile) La vida no es otra cosa que el balbuceo de una guagua Y una madre que la mira sin entender lo entiende todo. 295 OBRA: NOSSA SENHORA DA PAZ José Paulino Martins, SJ 296 CÁLICE José Fernandes, SJ Venha, ó eterno amor, Falar das coisas do coração, Fazer germinar belezas, Da barriga da mãe terra. Venha, espírito de vida, Inundar rios em ondas De maré alta com Carícias de terno amor. Venha na mansidão do Amanhecer, Filtrando o sol, Nas frescas da mata escura. Venha, irmão das gentes, Filho bonito da senhora, Mãe da palavra paz, Tão cheia de luar Na noite da humanidade… Venha força da natureza, Encher as mãos Com os grãos da vida nova. Chuva mansa nos cabelos Lavando corações, Em miúdas e fecundas gotas. Varrendo medos acumulados Dos lixos nos beirais da vida. Venha, Venham! Beber com a gente, O cálice da alegria Do licoroso vinho-doce mel No oco do Jequitibá! 297 FOTOGRAFIA: Régis Sarto, SJ 298 COTIDIANO Renata Sales (Grupo OPA) Céu azul Aberto Ergo as mãos Ofereço Dobro os joelhos Rezo As palavras Silencio Recolho os braços Quieto Deito o olhar Contemplo Vejo escrita A Palavra Ouço a voz que me Consola. 299FOTOGRAFIA: Ir. Lucemberg Lima de Oliveira, SJ 300 DESEO Alberto Luna, SJ Sólo en mitad de la mañana el banco de la plaza calla, recostado, sin más afanes que perder la mirada, dilatar el pecho, aspirar el aroma inédito que pasa en los rostros de la calle. La quietud desata el silencio de las manos, apaga los ecos de las voces. Al vuelo de las palomas el corazón busca una nube que no se lleve el viento, un sendero en el horizonte para darle pies al deseo. 301 Eu sinto que Alguém trabalha... e minha vergonha é tanta que, agradecido, pego papel e caneta. Esse inventário não vai ter fim! INVENTÁRIO DE CONSTRANGIMENTOS André Araújo, SJ Como olhar e não ver o Amor?! Olho os porquinhos no chiqueiro, o quarador e o abacateiro, os pés-de-moleque e as cocadas, as comidas na casa da avó, os bloquetes da rua coloridos com cacos de tijolo de tudo que era cor, as flores apanhadas na beira do rio, a água da biquinha, o banho de mangueira, a água no telhado pra aguentar o calor, as brincadeiras na rua; nós rodando bombril, subindo nas árvores, apanhando frutas, comendo os doces e os biscoitos da avó; eu cuidando das galinhas, tratando da cachorrinha; nós brincando de gangorra, passeando no sítio, com o tio tirando leite, chupando cana, nadando na piscina; eu descobrindo os livros; com a tia moendo o milho, fazendo fubá, torrando café, comendo broa; eu levando almoço pra pai, dormindo de tarde, indo trabalhar, andando de ônibus, os amigos, os grupos de jovens, a crisma e a liturgia, a pastoral, a escola plural, a universidade, a literatura, a língua estrangeira, as viagens, a poesia, o terço, a solidariedade, a pesquisa, as aulas, a Companhia, os pobres, a Filosofia, as artes, a Teologia, uma nova gramática de relações, o sacerdócio, o Nordeste, o enunciado e as enunciações, o ser da linguagem, a ficção, o povo, a Missão, o acompanhamento, a Consolação. O dia em que vi minha tia (continua) 302 subindo as escadas lá de casa, com o pé quebrado e de bunda no chão, vencendo degrau por degrau, um a um, com todo sofrimento, porque queria me ver antes que eu fosse embora, senti o que era ser amado até o mais profundo constrangimento. Todo mundo quis ajudar, e ela não quis auxílio de ninguém. Por medo de se machucar, subiu devagar, descansou, me abraçou, lembro que a gente chorou. Muita história pra contar... Mas não dá pra esquecer: muita coisa misturada! Não fico parado no alto da escada, caminho, vou longe nesse sentimento, às vezes, sem prumo, desalinho, perco rumo e haja papel pra adiar o esquecimento; nada vai faltar no meu itinerário, tudo vai ficar forte, vivo e denso, registrado aqui nesse meu inventário... INVENTÁRIO DE CONSTRANGIMENTOS (continuação) 303 NO ALTO DA COLINA Igor Cristiano Oliveira, SJ Na casa do alto da colina O serenar desperta o amanhã, O fogão de lenha reúne os amigos, Memórias despertam sorrisos, pura nostalgia... É um aquecer a vida, esquentar nossas friezas. Na casa do alto da colina O entardecer anuncia aurora O pôr do sol provoca calmaria na alma Tudo lá se interliga num movimento singular. Na casa do alto da colina o anoitecer é uma liturgia, a estrelas, o luar, tudo revela o absoluto. No alto da colina nos permitimos ser encontrados pelo mistério. 304 FOTOGRAFIA: Régis Sarto, SJ 305 NO BAILAR DAS ONDAS Ozires Vieira de Sousa, SJ Contemplem o mar! O azul do céu A tonalidade da água, Às vezes azul, outras vezes verdes, Mas a espuma é sempre branca Fruto do vai e vem ritmado pelo vento. Há uma intensidade para além da força das ondas Há um mistério espiritual nesse ritmo É a natureza nos falando de seus segredos divinos Por que é tão difícil contemplá-la E escutá-la? 306 FOTOGRAFIA: Thiago Augusto Coelho 307 PRESENÇA José Fernandes, SJ Foi um instante… Passou como nuvem errante Fazendo sombra No ensolarado dia. Aquela constante presença Nos passos da vida Trazendo alento Na carcomida memória Perdida no tempo. Foi apenas um instante, Faísca de doces lembranças, O vulto no espelho Do eu que me habita. Onde foi aquele que fui, Esquecido de ser?! Uma presença de não sei, Embaraçada no tempo De antigas memórias, Como musgo aderido Nas pedras do caminho, Fazendo-se escorregadio. Voltar ao início, Refazer caminhos, Recolher o que se perdeu Nos vão das pedras, Limpar e polir As velhas lembranças, Revelando a presença Daquele que é e sempre foi Mas que se perdeu Na ironia do esquecimento meu Ressuscitar exalando vida Reviver o que se quer viver Sonhar a eterna presença De ser. 308 EPIFANIA Igor Cristiano Oliveira Nascimento, SJ Era uma segunda-feira, uma segunda-feira normal, Normal como os outros dias. Na segunda-feira em que a alma parece sentir falta de um gesto gratuito. Caminhava apressadamente, como alguém que sentia pressa de vencer o cansaço exaustivo do cotidiano; Estava vazio... corpo oco. Não sentia nada, absolutamente nada. Parecia não me pertencer, era como se meu corpo não estivesse unido à minha alma, Era como se minha alma não tivesse unido a minha poesia... Foi quando passei por uma árvore de ipê e contemplei um tapete belíssimo de flores, coisa que os olhos não se acostumam a ver, nem o corpo costuma sentir. Por um instante uma pétala de flor caiu em meus ombros e... eu achei Deus de uma grande fineza. Meu dia mudou com aquele instante, eu queria morar dentro daquele instante; aprendi que é preciso deixar-se ser tocado. 309 FOTOGRAFIA: IPÊ Igor Cristiano Oliveira Nascimento, SJ 310 ESPALDA DURA Jaime Andrés, SJ (Equador) Espalda dura caminando los andes corazón grande. 311 DEUS UNIFICADOR DE SENTIDOS Igor Cristiano Oliveira, SJ Toca em meus ouvidos, Senhor, Para que não seja surdo aos teus gritos. Toca em meus ouvidos, Senhor, Para que meu corpo se incline em profunda reverência. Toca em meus olhos, Senhor, Para que não seja insensível a tua beleza manifestada nas tuas criaturas. Toca em meus olhos, Senhor, Para perceber que tu brincas conosco em nosso ser criança. Toca, unifica meus sentidos aos teus, Senhor, E faze-me poetizar à Vida. 312 PAISAJE Alberto Luna, SJ El filo de luz rasga el horizonte y desviste el misterio de la noche, abre las compuertas de los ojos y derrama nombres en los labios. Entre la bruma recién nacida las gaviotas llaman a las olas. Se despereza en la cañada la verde quietud de los cipreses. La brisa fresca inunda la vista al soplo colorido de las flores. El sol preside el rito originario con su cortejo de nubes claras. Como un eco de los ladridos se oye al queltehue en el llano. El paisaje vuela hacia adentro y se posa en mi asombro niño, trae a la playa de mis manos guijarros pálidos, algas dormidas. Como en una caracola antigua resuena el mar en mis orillas, venda con su velo de espuma las heridas sufridas en la arena. 313 FOTOGRAFIA: Régis Sarto, SJ 314 NO UN DIOS SOLO Benjamín González Buelta, SJ Solo Dios basta pero un Dios al que no basta andar él solo por todo el universo. Dios se nos acerca en cada ser el cosmos, que es para nosotros hogar, alimento, tarea y horizonte. ¡comuníon cósmica que nos une a dios en la vida que nos llena a través de los sentidos, don y presencia suya en nosotros sin medida! dios nuestro, en la comunión que se gesta con todos sin sobrantes ni descanso, en el vientre maternal de la historia jadeante. Dios libre y único en el último rincón de callada intimida, donde cada persona se hace consistente. dios eclipsado, donde sólo nos quedan sus huella, tan leves como aliento de niño marginal, tan fuertes como un sismo que cuartea el alma y los imperios. dios del tú a tú en el instante transfigurado, donde todo los demás se ilumina desde dentro en su verdad, o se desvanece vacío en su apariencia. sólo dios basta pero un Dios al que no basta andar él solo por todo el universo. 315 BAUTIZA MIS SENTIDOS Benjamín González Buelta, SJ Bautiza mis sentidos No amanezcas, Señor, que aun mis ojos no aprendieron a verteen medio de la noche. No me hables, Señor que aun mis oidos no pueden escucharte en los ruidos de la vida. No me abraces, Señor que aun mi cuerpo no te fijes en tu piel en abrazos y en la brisa. No me endulces, Señor que aun mi garganta no saborea tu ternura, en medio de lo amargo. No me perfumes, Señor, que aun mi nariz no hueles tu presencia en medio de la miseria. bautiza mis sentidos con el curso lento de tu gracia encarnada, fluyendo a través de mi cuerpo. 316 FOTOGRAFIA: PRIMAVERA Igor Cristiano Oliveira Nascimento, SJ 317 O VIAJANTE PEDE O RUMO Paulo Veríssimo, SJ O viajante pede o rumo Ao prumo da história Para poder chegar Onde viver é amar O tempo revela o destino do homem Cuja força de andar faz seguir Feliz como quem já chegou Onde viver é não parar Viver é amar sem parar. 318 OBRA: Alexandre Raimundo de Souza, SJ DESCRIÇÃO: Tres milagros de Jesús, la Samaritana en el pozo, agua viva que mata la sed. Lázaro, Jesús le devolvió la vida. El ciego de nacimiento, Jesús ha hecho barro con la saliva y polvo de tierra y le abrió los ojos. (Narrativas segundo San Juan). 320 INACIAR Luiz Beltrão A decisiva aventura não é risco. É escultura. É terra seca tornar-se argila, pedra dura moldar-se bilha. Todo início é exercício. Maior batalha, ceder muralha. Pobre tíbia, mero símbolo, de fato címbalo que percutia: “Qual é teu rumo? Valeu a pena? E se morrer dessa gangrena, como será pós sepultura?” E no balanço do percorrido, muda o senhor, troca o sentido. Levanta. Manca. Tropeça. Avança. Luz e querer. Depõe sua capa. A forja é a lapa. Jerusalém é ir além. Pois Quem o chama merece e clama por nada aquém de todo o ser. Eis o inciso do Peregrino: remar preciso, leve e menino, mas sempre em busca de precisão. Processo eterno, inacabado, em quatro tempos, fio trançado. Contemplo o templo que pulsa dentro. A graça age na decisão. O resto é espera, é confiança. E qual criança fazer-me dom pelo chamado imerecido. No mar, a nau. Terceiro grau. Inaciar o Reino aqui, com fundamento, discernimento, justiça e paz, cada vez mais. Junto com outros, pobres e loucos, sob a bandeira do Cristo amigo. 321 A NATUREZA ME FEZ ASSIM Felipe de Assunção Soriano, SJ A natureza me fez assim... O senhor era outro, A cidade era outra, A senhora era outra, Outro era o Reino... Os companheiros eram outros, As armas eram outras, As terras eram outras, As glórias eram outras, Outros eram os meios... Se uma ferida foi o estopim, Se dessa dor uma eleição, Toda ferida esconde uma missão. 322 PEREGRINO, SÓ? Guilherme Augusto Siebeneichler Peregrino, só? Peregrino só, Que tanto busca? Pelo que tanto anseia? O que lhe dá forças? Faz a travessia de campos De florestas, de montes e montanhas Quilômetros seguidos de quilômetros Escorre o suor de seus passos já errantes Cansado, senta-se No coracão, nomes, rostos, cheiros e cores Sabe que não está solitário Brota um sorriso no rosto E no caminho Dá passos silenciosos dentro de si Não se trata da distância, Mas a chama que arde e faz caminhar E então, vem a noite Com ela, as estrelas e a lua Silenciosos cristais do mistério E o coração queima novamente com a beleza A cada passo, Pegadas no chão, na areia, na lama Marcas da continuidade do mistério E mais nomes, rostos, cheiros e cores Aqui, não é saber É saborear Não é antes, nem depois É agora. 323 AS FERIDAS Felipe de Lima França Cristo, nenhum osso te foi quebrado Inácio, uma bala quebrou tua perna Cristo ficou chagado Inácio ficou manco Do fracasso a vida um processo um apelo uma vocação uma missão a salvação E eu estou inteiro E o mundo está ferido No sofrimento do inocente O Senhor chama um nome De quem? 324 JERUSALÉM Luisinho Vieira e Roberto Mesquita Ribeiro (Grupo OPA) Vou para longe, vou. Vou onde Deus mandar. Seja o limite do mundo, ou para outro lugar. Quero poder partir, quero me encontrar. Sonho em correr todo o mundo, na mão de Deus caminhar. Jerusalém... A vida eu entrego a Deus. Jerusalém, meus sonhos são todos teus. Quando deixei meu lar, promessa recebi. Recebo mais que entrego, Deus mesmo vem se ofertar. Caminho pra servir, sirvo pra encontrar. Só me encontro no mundo, fazendo o mundo mudar. Jerusalém... A vida eu entrego a Deus. Jerusalém, meus sonhos são todos teus. Não sei se vou chegar. Acho que não tem fim. Que não tem fim minha sede: desejo de caminhar... Se acho que consegui, penso em me instalar. Deus me convida: em frente. É hora de enfrentar! Jerusalém... A vida eu entrego a Deus. Jerusalém, meus sonhos são todos teus. Em cada ir e vir, todo recomeçar. Encontro minha verdade: Jerusalém procurar. Jerusalém jardim, meta que Deus me deu. Estrela que eu contemplo, templo onde vou habitar. Jerusalém... A vida eu entrego a Deus. Jerusalém, meus sonhos são todos teus. Inácio Santo. 325 OBRA: Rogério Barroso, SJ