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1 MIGRAÇÕES EXTERNAS O Brasil foi um país de imigrantes. Primeiramente foi ocupado pelos portugueses, que, por sua vez, trouxeram para a colônia os africanos escravizados (imigração for- çada). Entre 1850 e 1934, ocorreu a maior entrada de imigrantes no país, os quais vieram espontaneamente da Europa, no auge da agricultura cafeeira no Brasil. Os principais grupos que entraram no Brasil, em toda a história da imigração espontânea, foram os portugueses, os italianos, os espanhóis, os alemães e os japoneses. Nesse período, o governo paulista chegou a estimular o processo imigratório, inclusive com ajuda financeira (subvenção). Observe o gráfico (figura 1). Fonte: IBGE. Brasil 500 anos. Disponível em: <http://brasil500anos.ibge.gov.br>. Acesso em: fev. 2016. figura 1. Brasil: imigração por nacionalidade – 1884-1933 1.200.000 0 600.000 300.000 Alemães Espanhóis Italianos Japoneses Portugueses Sírios e Turcos Outros Total 90 N œ m e ro d e p e s s o a s 0.000 1884-1893 1894-1903 1904-1913 1914-1923 1924-1933 Além dos imigrantes constituírem mão de obra para a lavoura cafeeira, após a proibição do tráfico de escravizados em 1850 (lei Eusébio de Queirós), vários gru- pos, principalmente alemães e italianos, foram utilizados para a colonização da atual Região Sul do país. Com a abolição da escravatura (1888), o número de imigrantes multiplicou-se e se manteve elevado até as primeiras décadas do século xx. A partir de 1934, foi estabelecida a Lei de Cotas, que restringia a entrada de estrangeiros, com exceção dos portugueses. O declínio da economia cafeeira, decor- rente da crise mundial de 1929, afetou o crescimento econômico do Brasil. A nova lei foi justificada como uma forma de evitar que o índice de desemprego aumentasse ainda mais, provocando instabilidade social. A lei de Cotas estabelecia que apenas 2% do total de imigrantes de cada nacionalidade, que haviam entrado nos cinquenta anos anteriores à promulgação da lei, podiam fixar residência no país. Embora numa proporção bem menor, o Brasil continuou recebendo imigrantes. A partir da década de 1940, a imigração para o país esteve muito ligada à conjun- tura da Segunda Guerra Mundial. Os principais grupos de imigrantes à época foram judeus, poloneses, japoneses e chineses, além de italianos, alemães e pessoas de outros países europeus. É importante comentar com os estu- dantes que este capítulo trata ape- nas da imigração espontânea. Sendo assim, não discute a imigração afri- cana, muito importante para o Brasil, desde o início da colonização. A ques- tão dos afrodescendentes no território brasileiro foi abordada no Cap’tulo 1 deste volume. Memorial do Imigrante www.memorialdoimigrante. org.br O site tem como objetivo preservar, documentar e divulgar a história da imigração e a memória dos imigrantes no estado de São Paulo. Há um acervo com fotografias de época, reprodução de jornais dos núcleos coloniais e listas que relacionam imigrantes que desembarcaram no Brasil. Você ainda pode navegar por exposições virtuais e ouvir a “Rádio imigrante”, que possui listas de músicas de diversos países. SITE Em 1924, os Estados Unidos já haviam estabelecido a sua Lei de Cotas, que era uma forma seletiva de controle dos imigrantes que ingressavam no país. Estimulavam os imigrantes do norte da Europa e discriminavam os da região mediterrânea e os asiáticos. Acredita- -se que essas medidas inspiraram o governo de Getúlio Vargas, que já havia implantado algumas medidas que difi- cultavam a situação dos imigrantes, como, por exemplo, a obrigatoriedade de a mão de obra das empresas insta- ladas no Brasil ser formada por pelo menos 2/3 de brasileiros. Durante a Segunda Guerra, proibiu, ainda, o ensino da língua estrangeira em escolas de comunidades imigrantes e exerceu forte controle sobre insti- tuições culturais alemãs e japonesas, entre outras medidas. B IS 201capítulo 9 – Migrações no Brasil TS_V3_U3_CAP09_200_219.indd 201 5/23/16 7:10 PM noVa onda MigRatÓRia: outRos contextos Na década de 1970, o Brasil recebeu muitos imigrantes de Angola e Moçambique. Tendo perdido privilégios com a descolonização desses países, vieram para o Brasil diversos descendentes de portugueses que lá viviam. A partir do final do século xx, sobretudo nos anos 1990, o país passou a receber maior quantidade de imigrantes peruanos, bolivianos (figura 2), paraguaios, argen- tinos, coreanos e chineses. Muitos desses imigrantes estão em situação ilegal. Com vistos vencidos e vivendo na clandestinidade, não podem trabalhar com carteira assinada, adquirir casa própria ou montar seu próprio negócio. Figura 2. Feira livre de produtos típicos bolivianos em São Paulo (SP), 2013. Na cidade de São Paulo e em outras cidades do interior paulista, por exemplo, parte desses imigrantes trabalha em confecções que funcionam ilegalmente. Nelas, submetem-se a regimes de semiescravidão, com jornada diária de até 17 horas e rendimento inferior ao do salário mínimo estabelecido no país. Apesar dos abusos sofridos, esses imigrantes evitam denunciar a situação para as autoridades brasileiras por terem entrado clandestinamente no país, o que resultaria na deportação para seu país de origem. Em meados de 2009, o governo federal aprovou uma lei anistiando todos os imigrantes que entraram irregularmente no Brasil até 1o de fevereiro de 2009. Desse modo, aproximadamente 50 mil estrangeiros ilegais passaram a contar com a pos- sibilidade de regularizar sua permanência e obter vínculos empregatícios de acordo com a legislação trabalhista vigente ou ainda denunciar eventuais abusos cometidos por aliciadores e empregadores, sem correr o risco de ser deportado. No entanto, o Brasil tem uma legislação para estrangeiros defasada, estabelecida no contexto da ditadura militar, e apesar de terem ocorrido diversos complementos para adequá-la à realidade atual e a um contexto de sociedade democrática, se faz necessária a reformulação e a ampliação do conjunto de leis para imigrantes. Essa legislação está muito pautada na lei de segurança nacional, proibindo, por exemplo, os imigrantes de participarem de passeatas. A l F R IB E IR O /P U l S A R I M A G E N S Revista Com Ciência – Migrações www.comciencia.br/ reportagens/migracoes/ migr16.htm Artigos sobre as migrações internacionais e identidade no Brasil. SITE 202 unidade 3 | espaço, sociedade e economia TS_V3_U3_CAP09_200_219.indd 202 5/23/16 7:10 PM Existe um projeto de lei em trâmite no Congresso Nacional para adequar as leis de imigração pautada nos direitos humanos. Segundo dados da Polícia Federal, em 2015, havia cerca de 1.850.000 imigrantes no Brasil. Com os desdobramentos da crise de 2007/2008, que abalou profundamente a economia da Europa, também vieram para o Brasil imigrantes europeus, sobretudo portugueses e espanhóis, os quais exerciam atividades mais qualificadas, como engenheiros, advogados e arquitetos, ocupando postos gerenciais. Entretanto, com a última crise econômica de meados da década de 2010, esse fluxo cessou e muitos desses imigrantes retornaram aos seus países. O fato de o Brasil ter chefiado a missão de paz da ONU no Haiti após um período de insurgência causado pela instabilidade política com a deposição do presidente Jean-Bertrand Aristide (1953-), além do gravíssimo terremoto que atingiu o país em 2010, contribuiu para que milhares de haitianos viessem para o Brasil. Esses imigrantes viajavam primeiro para o Equador e para o Peru, e depois entravam no Brasil pelo Acre (figura 3). Figura 3. Alojamento improvisado de imigrantes haitianos e senegaleses em Caxias do Sul (RS), 2013. No final de 2015, o governo brasileiro havia concedido autorização de permanência para mais de 43 mil imigrantes haitianos que haviam ingressado entre janeiro de 2011 e julho de 2015 no Brasil (esses haitianos não entram na categoria de refugiados). Também nosegundo semestre de 2015, o Governo Federal havia reassumido o custeio no transporte de haitianos do Acre para São Paulo e estados do Sul do país. A imigração ilegal para o país não ocorre apenas na fronteira da região amazô- nica. No início desta década, estrangeiros sem documentos ingressaram no Brasil escondidos em táxis, carros particulares ou barcos, principalmente pelo município gaúcho de Uruguaiana, limítrofe com a Argentina e próxima do Uruguai. Um aspecto a ressaltar no caso da entrada de imigrantes no Brasil é o fato de a crise econômica global de 2007/2008 ter acarretado um aumento significativo da imigração de retorno, ou seja, brasileiros que saíram do Brasil, se estabeleceram em outros países, ficaram mais de um ano e, depois, retornaram. Nesse retorno, de acordo com o critério da Organização Internacional das Migrações, entram como imigrantes no Brasil. No final da década de 2000, cerca de 65% dos imigrantes que ingressavam no Brasil eram brasileiros que haviam retornado. Imigrantes fazem a diferença na saúde Com a implementação do Programa Mais Médicos, do governo federal brasileiro, em 2013, médicos cubanos come- çaram a chegar ao Brasil. Parte das vagas ofertadas a médicos nesse programa foram preenchi- das por profissionais de Cuba. O Mais Médicos é um programa do governo federal do Brasil que tem como objetivo ampliar o atendimento médico no ter- ritório brasileiro, em particular nas regiões menos favorecidas, tanto do espaço urbano quanto do rural. Compreende tam- bém ampliação da oferta de vagas nos cursos de Medicina no Brasil. V IN íC IU S C O S TA /F O lH A P R E S S 203Capítulo 9 – Migrações no Brasil TS_V3_U3_CAP09_200_219.indd 203 5/23/16 7:10 PM