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1 Neusa Maria Pereira Bojikian, Karina L. Pasquariello Mariano, Laís Forti Thomaz C a d e r n o C r H , S al va d or , v . 3 5, p . 1 -2 3, e 02 20 06 , 2 02 2 O ACORDO DE ALCÂNTARA E O DESENVOLVIMENTISMO OCULTO DOS ESTADOS UNIDOS1 Neusa Maria Pereira Bojikian* Karina L. Pasquariello Mariano** Laís Forti Thomaz*** * Universidade Estadual de Campinas. Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia para Estudos sobre os Estados Unidos, sediado no Instituto de Filosofia e Ciências Hu- manas (INCT-INEU-IFCH-Unicamp). Rua Cora Coralina, 100, Barão Geraldo. Cidade Universi- tária Zeferino Vaz. Cep: 13083-896. Campinas – São Paulo – Brasil. neusa.bojikian@gmail.com https://orcid.org/0000-0002-7691-7515 ** Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Fi- lho”. Faculdade de Ciências e Letras – Campus de Arara- quara (FCL-Unesp). Rodovia Araraquara-Jaú, km 1 – Machados. Cep: 14800-901. Araraquara – São Paulo – Brasil. karina.mariano@unesp.br https://orcid.org/0000-0002-4559-918X *** Universidade Federal de Goiás. Faculdade de Ciências Sociais – Campus Samambaia (FCS-UFG). Avenida Esperança, s/n. Chácaras de Recreio Samambaia. Cep: 74690-900. Goiânia – Goiás – Brasil. laisthomaz@ufg.br https://orcid.org/0000-0002-3488-1462 1 Este artigo é resultado de pesquisa financiada pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Distrito Federal (FAPDF), Processo 798/2019. Agradecemos à Fundação pelo apoio recebido. D O SS IÊ 1 http://dx.doi.org/10.9771/ccrh.v35i0.47382 A preocupação com o setor espacial brasileiro está inserida em um debate mais amplo sobre a promoção do desen- volvimento econômico, base para melhor inserção internacional do país. Utilizando revisão de literatura e estudo de caso, verificou-se que houve historicamente uma variação na disposição dos governos brasileiros em aderir à ideologia econômica defendida pelos EUA, sem levar em conta que este país apresenta elementos desenvolvi- mentistas, atuando como agente de transferência e difusão de novas tecnologias. O objetivo é demonstrar que o Acordo de Salvaguardas Tecnológicas (AST) é funcional à estratégia do governo norte-americano de promover o desenvolvimento com participação velada do Estado. Por sua vez, isso tende a representar importantes limitações à implementação da política espacial no Brasil. Infere-se que o AST é um instrumento por meio do qual o governo dos EUA procura mitigar os riscos regulatórios aos quais estão submetidas empresas do país e alavancar a compe- titividade de sua base industrial. Palavras-chave: Relações Brasil-Estados Unidos. Acordo de Salvaguardas Tecnológicas (AST). Neoliberalismo. Desenvolvimentismo. 1INTRODUÇÃO Após o impeachment da presidente Dil- ma Rousseff, em agosto de 2016, nota-se um redirecionamento da política externa brasi- leira em relação aos Estados Unidos (EUA). A reorientação tornou-se ainda mais acentuada com a eleição do presidente Jair Bolsonaro, em 2019, que assumiu uma postura de alinhamen- to incondicional ao governo de Donald Trump (2017-2021). Nesse contexto, foi selado e apro- 1 vado, entre Brasil e EUA, o Acordo de Salva- guardas Tecnológicas (AST), também conheci- do como Acordo de Alcântara. Por meio dele, o governo e as empresas privadas norte-ameri- canas adquiriram o direito de usar o Centro de Lançamento de Alcântara, ou Base de Alcânta- ra, para o lançamento de seus foguetes e satéli- tes. O Brasil, por sua vez, obterá compensação monetária por permitir o uso da base. Trata-se de um acordo polêmico que já havia sido concluído em 2000, durante o governo Fernando Henrique Cardoso (1995- 2002), alegadamente para “minorar as preo- cupações [dos Estados Unidos] concernentes à transferência de tecnologias para terceiras partes, particularmente a China” (Rollemberg, 2009, p. 55). Contudo, os congressistas brasi- leiros o rejeitaram porque concluíram que o acordo era incompatível com a soberania na- cional. Presentemente, a aprovação do acordo pelo Congresso brasileiro fundamentou-se na expectativa de um afluxo de investimentos externos – inclusive ao setor espacial (Brasil, 2019a, 2019b) –, embora o novo acordo apro- vado não tenha sanado os diversos problemas apontados sobre o acordo anterior. A preocu- 2 O ACORDO DE ALCÂNTARA E O DESENVOLVIMENTISMO ... C a d e r n o C r H , S al va d or , v . 3 5, p . 1 -2 3, e 02 20 06 , 2 02 2 pação com o setor espacial brasileiro faz parte de um debate mais amplo sobre a promoção do desenvolvimento, especialmente em setores que envolvem tecnologia de ponta, e a própria transformação da economia brasileira. Ao lon- go da história, diferentes estratégias governa- mentais foram implementadas para viabilizar esse objetivo, buscando sempre uma acomoda- ção entre o interesse nacional e as pressões do sistema internacional. Enquanto nas primeiras décadas do pós- -Segunda Guerra Mundial houve um período propício para maior experimentação de estra- tégias autonomistas e desenvolvimentistas, a partir do fim da Guerra Fria (1989), aumen- taram as pressões pela adoção das reformas orientadas ao mercado. Os EUA exerceram um papel central nessa nova ordem internacional em formação, reforçando a difusão da crença de que cabia ao Estado apenas equilibrar os orçamentos governamentais, reduzir impos- tos e cortar regulamentações para estimular o desenvolvimento econômico. Quaisquer polí- ticas públicas que atritassem com tal crença seriam supostamente incompatíveis com a natureza do capitalismo (Block, 2008). Essa inflexão trouxe importantes consequências aos países em desenvolvimento, inclusive ao Brasil, que acabaram promovendo políticas de ajuste e revisão de suas estratégias de desen- volvimento nacional. Considerando que o AST possa ser ava- liado como um instrumento de promoção do desenvolvimento na indústria espacial, a ques- tão central deste artigo é: Como as partes en- volvidas se beneficiariam desse acordo? Nosso objetivo é demonstrar que o AST é funcional à estratégia do governo norte-americano de pro- mover desenvolvimento com a participação velada do Estado, e que, para o Brasil, o acordo tende a representar significativos constrangi- mentos à implementação da política espacial. O argumento que defendemos é que o governo norte-americano tem desempenhado um papel de crescente relevância na subscri- ção e incentivo ao avanço de novas tecnologias na economia do país. Mas o fizeram de modo relativamente encoberto. Ao fazermos tal afir- mação, estamos nos apoiando no conceito de “Estado desenvolvimentista oculto” (Block, 2008; Block; Keller, 2016; Negoita, 2016), uma forma de atuação do Estado derivada do domí- nio das ideias neoliberais das últimas décadas. Para demonstrar nossa suposição, realizamos um estudo de caso sobre o AST, partindo de revisão bibliográfica que permitiu historicizar os contextos que condicionam as orientações da política externa brasileira sobre as relações com os EUA e compreender o funcionamen- to da economia da inovação norte-americana, especialmente sobre o envolvimento governa- mental em iniciativas da área espacial. A re- visão bibliográfica contempla a primeira parte do artigo, em que procuramos contextualizar a relação Brasil e EUA e mostrar o grau de dis- posição dos governos brasileiros de aderir às ideias econômicas defendidas pelos norte-a- mericanos. Também está presente na segunda parte, na qual analisamos a dimensão e a qua- lidade da dinâmica do Estado norte-americano desenvolvimentista, recorrendo à discussão teórica sobre neoliberalismo. Complementa- mos essa análise com o levantamento de dados sobre recursos investidos pelo governo norte- -americano no setor espacial e seu comporta- mento na regulamentação internacional desse setor. Finalmente, a partir de uma triangulação metodológica com os documentos, usamos o AST como objeto de estudo empírico sobre os conteúdos dos acordos de 2000 e de 2019 e os pareceres emitidos pelo Congresso Nacional em resposta ao Poder Executivo sobreambos. Esse conteúdo está na terceira parte, em que é demonstrado que o AST é um instrumento por meio do qual o governo dos EUA eleva a proteção aos itens classificados como tecno- logias sensíveis – que, na verdade, são aque- les que fornecem ao país largas vantagens no âmbito militar e de inteligência – quando eles estiverem fora de seu território. Além disso, demonstra-se que o acordo tende a aumentar a competitividade da base industrial norte-ame- 3 Neusa Maria Pereira Bojikian, Karina L. Pasquariello Mariano, Laís Forti Thomaz C a d e r n o C r H , S al va d or , v . 3 5, p . 1 -2 3, e 02 20 06 , 2 02 2 ricana por meio de barreiras erguidas em ou- tros países, como no Brasil, contra seus com- petidores externos. RELAÇÃO BRASIL E ESTADOS UNIDOS: liberalização econômica e desenvolvimento A promoção do desenvolvimento econô- mico – baseado crescentemente na inovação, que, por sua vez, se estrutura no desenvolvi- mento técnico-científico – é um aspecto cen- tral do debate político brasileiro, pois é visto como pré-condição para propiciar a melhor inserção internacional do país. Nessa discus- são, encontramos duas divergências centrais: a primeira quanto à forma de promover esse de- senvolvimento; e a segunda sobre a influência da relação dos EUA nesse processo. Essas divergências estão relacionadas, pois pensar maneiras de promover o desenvol- vimento implica em estabelecer qual tipo de relação deve-se manter com o principal ator internacional. Consequentemente, estabele- ceu-se um intenso debate sobre autonomia brasileira no cenário internacional, que em- bora se refira ao sistema mundial, na prática está centrado na questão do grau de distancia- mento que o Brasil deve assumir em relação ao governo norte-americano. A promoção da autonomia significou a implantação de um projeto de modernização e desenvolvimento brasileiro, que teve como um de seus principais instrumentos a política ex- terna e a definição do grau de distanciamento em relação aos EUA, o que explica as variações no posicionamento autonomista na atuação internacional brasileira ao longo do tempo. A literatura sobre autonomia na política externa brasileira estabelece basicamente três momen- tos distintos: autonomia pela distância (1950- 1984),2 caracterizando-se pela Política Externa 2 Poderia-se classificar o governo Sarney (1985-1989) como integrante da fase da autonomia pelo distanciamen- to, mas, como o lançamento da estratégia integracionista e a criação do Mercosul ocorreram em seu governo, optamos Independente (Fonseca Jr., 1996; Vizentini, 2004); autonomia pela integração (1985-2002), cujo eixo central da política externa brasileira era o Cone Sul (Spektor, 2014; Vigevani; Oli- veira; Cintra, 2003); e autonomia pela diver- sificação (2003-2016), fase em que se buscou ampliar a cooperação com o Sul Global como forma de promover o projeto desenvolvimen- tista brasileiro (Vigevani; Cepaluni, 2016). Em cada uma dessas fases, encontramos distin- tos posicionamentos por parte dos EUA sobre a estratégia adotada pelo governo brasileiro. Durante a implantação da Política Externa In- dependente, o governo norte-americano estava preocupado em consolidar sua posição dentro de um cenário de Guerra Fria. Portanto, havia maior margem de manobra para países como o Brasil buscarem alternativas de promoção de desenvolvimento, desde que isso não represen- tasse uma aproximação ao bloco comunista. A redução das tensões militares com a ex-União Soviética propiciou um aumento na preocupação dos governos norte-americanos com o seu papel de liderança na regulamen- tação do sistema internacional, especialmente na determinação das regras multilaterais base- adas na defesa dos direitos humanos, da demo- cracia e dos valores liberais do livre mercado. A década de 1990 testemunhou a acla- mação dos liberais, que orientaram mudanças substanciais na economia mundial. Conforme destacou Ivo (2007, 2012), a década de 1990 é paradigmática, pois impuseram-se os com- promissos com a política fiscal, com o controle rígido da inflação, com as reformas adminis- trativas e com o ajuste institucional, a despeito dos trágicos efeitos sociais. Os EUA mantiveram tanto suas posições favoráveis ao neoliberalismo quanto ofensivas para assegurar o domínio tecnológico de sua indústria, conquistado à base do apoio do Esta- do e de suas políticas de desenvolvimento, ga- por inseri-lo na fase da autonomia pela integração. O mes- mo questionamento é feito em relação ao governo Collor (1990-1992), que teria abandonado a lógica autonomista (Mello, 2000). Contudo, dada a brevidade de seu governo, optamos por considerá-lo como irrelevante dentro do pro- cesso autonomista dessa fase. 4 O ACORDO DE ALCÂNTARA E O DESENVOLVIMENTISMO ... C a d e r n o C r H , S al va d or , v . 3 5, p . 1 -2 3, e 02 20 06 , 2 02 2 rantindo que as inovações se transformassem em produtos comercializáveis pelas suas em- presas (Bell, 1973; Block, 1990; Brick, 2006). Block e Somers (2014, p. 3, 200) apontam que essa atuação foi mascarada devido às pressões das organizações conservadoras norte-ameri- canas, que sustentam historicamente uma ide- ologia baseada na combinação da defesa dos valores tradicionais com o “fundamentalismo de mercado,” “uma crença quase religiosa na ausência de toda e qualquer regulamentação de mercado como fonte de liberdade pessoal”. O termo fundamentalismo de mercado trans- mitiria “a certeza quase religiosa expressa pe- los defensores contemporâneos da autorregu- lação do mercado”. Não consideramos haver um padrão neoliberal único, convergente. Ao contrário, tomamos como válidas afirmações que desta- cam a irregularidade, a incompletude, a diver- sidade e o desequilíbrio das formas de Estados neoliberais (Brenner, Peck, Theodore, 2010; Brennetot, 2015; Peck, 2008). O fato é que os efeitos negativos da implementação desse mo- delo neoliberal logo se fizeram presentes. A virada do século XX para o XXI foi marcada por profundas crises financeiras e econômicas em diversas partes do mundo, especialmente na América Latina, provocando fortes críticas aos programas neoliberais implementados pe- los governos que haviam abandonado a lógi- ca de impulsionar o desenvolvimento a partir do Estado. Ou seja, passou-se a questionar as regras impostas pelo Consenso de Washing- ton (Williamson, 1990)3 como único caminho para enfrentar os desafios econômicos. Com a ascensão, na América do Sul, de governos de centro-esquerda, durante a primeira década do século XXI, consolidou-se a discussão sobre 3 Segundo Williamson (1990, p. 8-17), o consenso de Wa- shington refere-se à proposta de dez reformas: 1) discipli- na fiscal para eliminar o déficit público; 2) novas priorida- des em relação às despesas públicas, com fim dos subsí- dios e aumento de gastos em saúde e educação; 3) reforma tributária; 4) taxas de juros determinadas pelo mercado e positivas; 5) taxa de câmbio determinada pelo mercado; 6) comércio liberalizado e orientado ao exterior; 7) investi- mentos diretos sem restrições; 8) privatização das empre- sas públicas; 9) desregulação das atividades econômicas; 10) maior segurança ao direito de propriedade. os limites e o caráter do modelo de liberaliza- ção econômica imposto aos países em desen- volvimento (Hurrell, 2006). Na percepção de tais governos, a conduta econômica neoliberal estaria acentuando o desequilíbrio na relação com os países centrais, com aprofundamento das relações de dependência e da vulnerabi- lidade econômica com o princípio da redução do Estado (Strauss, 2018). Com essa orientação, o governo Luiz Inácio Lula da Silva (2003-2010) tentou reco- locar o desenvolvimento econômico a partir do Estado na agenda política brasileira segundo a orientação denominada neodesenvolvimentis- ta (Boito Jr., 2012). A promoção de uma polí- tica externa autônoma voltou a ser o eixo da diplomacia brasileira, que, além dos interesseseconômicos, buscava acabar com a dependên- cia tecnológica para reduzir as vulnerabili- dades política e econômica nacional. Cano e Silva (2010, p. 6-7) observaram que a combi- nação discrepante entre a continuidade da po- lítica macroeconômica praticada pelo governo Fernando Henrique Cardoso (1995-2003) e o fim das amarras à política industrial criou um “grave paradoxo” no governo Lula. O fato de não poder alterar as políticas cambial e mone- tária, nem a administração fiscal, inviabilizou a flexibilização das restrições que freavam a política industrial. A área espacial não esca- pou das restrições orçamentárias. Assim, o or- çamento do Programa Nacional de Atividades Espaciais (PNAE), duramente afetado ao longo dos governos FHC, continuou prejudicado du- rante os governos petistas (Rollemberg, 2009). Por outro lado, o presidente Lula, evitou assinar o AST com os EUA, acreditando que ele comprometeria um programa estratégico efetivo na área espacial. Por sua vez, assinou e renovou acordos e memorandos com outros países de entendimento sobre cooperação na área espacial. Como dito acima, o AST estava em pauta desde 2000, entretanto, o Congresso brasileiro o rejeitou, porque, naquela ocasião, concluiu-se que seus termos e condições feriam a soberania nacional. O governo Dilma Rousseff 5 Neusa Maria Pereira Bojikian, Karina L. Pasquariello Mariano, Laís Forti Thomaz C a d e r n o C r H , S al va d or , v . 3 5, p . 1 -2 3, e 02 20 06 , 2 02 2 (2010-2016) seguiu nessa linha, demonstran- do preocupação em preservar alguma margem de autonomia na estratégica área de produção de conhecimentos científicos e tecnológicos que pudesse reduzir a dependência externa. Tal orientação foi interrompida, em 2016, com o impeachment, o qual consideramos como o encerramento da fase da autonomia pela di- versificação. A partir de então, as mudanças governamentais ocorridas no Brasil passaram a questionar a tradição autonomista-desenvol- vimentista, o que representou também uma redefinição do relacionamento com o governo norte-americano. Podemos chamar a fase atual como a etapa da autonomia pela submissão, es- pecialmente durante o período compreendido pelo governo Bolsonaro. Ao usarmos tal termo, estamos empregando uma espécie de constru- ção conotativa para chamar atenção ao contras- senso presente na atual formulação da política externa: enquanto o governo apresenta um dis- curso em defesa do nacionalismo e de maior defesa de sua soberania, adota, na prática, uma postura subordinada. A nova orientação de po- lítica externa implementada por esses governos concebe a inserção do Brasil às cadeias interna- cionais de valor como a principal meta, enten- dendo que a melhor maneira de alcançá-la seria a plena adequação do país às disciplinas defen- didas pelos EUA nas negociações multilaterais sobre liberalização econômica e flexibilização regulatória. Portanto, abandonou-se a lógica de autonomia implementada historicamente pela política externa brasileira, que buscou aumen- tar a margem de manobra e independência do governo em relação às potências mundiais. Essa autonomia pela submissão iniciou- -se de forma mais velada no governo de Michel Temer (2016-2017), que buscou contrastar sua política externa em relação a de seus anteces- sores, definindo como eixo central a imple- mentação de negociações comerciais com as principais economias mundiais e ajustando-se aos parâmetros impostos. Questões conjuntu- rais, entretanto, impediram a reaproximação com os EUA, especialmente a campanha pre- sidencial norte-americana de 2016. O governo brasileiro manteve postura de neutralidade, embora tivesse preferência pela candidata de- mocrata Hillary Clinton, que presumivelmente representava um cenário de continuidade na política econômica. A eleição de Donald Trump como pre- sidente dos EUA frustrou a diplomacia de Te- mer, que esperava um ambiente mais favorável à negociação de um acordo comercial com o país. Ao mesmo tempo, trouxe alento à ideia de candidatura para presidente do então de- putado federal Jair Bolsonaro, que anunciou, durante a campanha, a escolha do economista Paulo Guedes para o cargo de ministro da Eco- nomia. Isso sinalizou que a política econômica brasileira estaria voltada à promoção de priva- tizações, flexibilização de regulamentações e mais liberalização comercial. A vitória de Biden, em 2020, pôs fim à ilusão do governo brasileiro de obter ganhos dos EUA por ter sido o mais submisso entre os aliados. Embora exista forte distanciamen- to nas agendas de ambos – especialmente no tocante à pandemia e ao meio ambiente –, pre- valece no governo norte-americano uma visão pragmática que interpreta a postura brasileira como vantajosa aos interesses norte-america- nos. De um lado, permanece o entusiasmo do governo brasileiro em iniciar negociações co- merciais com os EUA e, por outro, os ganhos obtidos durante a administração Trump conti- nuam frutificando. É o caso do AST. O governo Bolsonaro, aproveitando-se de amplo apoio no Congresso no início de seu mandato, reelaborou o acordo, tornando-o, na opinião dos congressistas, adequado aos interesses brasileiros e, com isso, o aprovan- do praticamente sem discussão (Bulla, 2019). Compreender as características e implicações desse acordo é fundamental para entender as consequências da atual política externa bra- sileira, a qual se baseia na busca da inserção internacional por meio da subordinação em detrimento do projeto de desenvolvimento e da autonomia do país. 6 O ACORDO DE ALCÂNTARA E O DESENVOLVIMENTISMO ... C a d e r n o C r H , S al va d or , v . 3 5, p . 1 -2 3, e 02 20 06 , 2 02 2 ESTADOS UNIDOS E O DESEN- VOLVIMENTISMO OCULTO Desde a década de 1930, o neolibera- lismo configura-se como uma tentativa de conceituar e construir uma ordem que coloca mercados autorregulados acima de tudo. Blo- ck (2001, p. xxii) observa que Karl Polanyi, na revisitação dos registros sobre a Revolução In- dustrial inglesa, mostrou como os pensadores ingleses responderam às rupturas da indus- trialização inicial, desenvolvendo princípios baseados na crença do domínio dos mercados autorregulados. Decorrente da liderança in- glesa como “fábrica do mundo”, essa crença tornou-se o princípio organizador da econo- mia mundial. Porém, destacando os aspectos experimental e reativo do liberalismo econô- mico com pretendida prevalência do mercado, Polanyi mostra que se produziu “uma resposta inevitável – esforços combinados para proteger a sociedade do mercado”. O neoliberalismo seria um genuíno “credo reacionário”. Primeiramente, suas fontes de sub- sistência e de energia procederiam da disputa ideológica. Depois, as crises lhe proporcionariam força e o levariam a tomar forma intencional – desse modo, ele seria dependente do contexto (não contingente). Por fim, ele seria reacionário por fundir “o inerentemente conservador com o insistentemente criativo” (Peck, 2008, p. 4-5). Para Peck (2008, p. 33), “o neoliberalis- mo alcançou uma forma hegemônica sem ser monolítica ou mesmo completamente unifi- cada”. Ele se configuraria como “um feixe po- limórfico de princípios e práticas, convicções e compromissos, centrado em um conjunto rela- tivamente duradouro de compromissos – com livre comércio, flexibilidade do mercado de trabalho, contenção do Estado social e assim por diante.” O neoliberalismo seria largamente dependente da trajetória, embora codificado em um conjunto comum, guardadas as diferen- ças, de coordenadas ideacionais. Posicionan- do-se de forma crítica no debate sobre a tra- jetória das transformações regulatórias pós-dé- cada de 1980, Brenner, Peck e Theodore (2010, p. 183-184) apontaram que a oposição entre as representações do neoliberalismo como “uma força hegemônica onipresente, por um lado, e sua descrição como uma presença instável, híbrida e contextualmente específica, por ou- tro”, impediria significativamente a investiga-ção dos padrões mercadológicos. Para resolver o impasse, os autores propuseram considerar o caráter “variegado” dos processos de neoli- beralização. O caráter variegado ou variado dos processos neoliberais envolveria uma sé- rie de mudanças constitutivamente desiguais, embora cumulativamente transformadoras, na forma qualitativa do próprio desenvolvimento regulatório desigual. Segundo Brenner, Peck e Theodore (2010, p. 214), nenhum dos projetos neoliberais da década de 1980 – nem mesmo os projetos emblemados pelo thatcherismo ou pela reaganomics – seria paradigmático. Cada um deles, entretanto, teria contribuído para o que se tornou, a partir da década de 1990, um programa “transnacional em evolução de transformação institucional criativamente des- trutiva”. Eles apontam que os processos de mudança regulatória impulsionados pelo mer- cado transformam os cenários institucionais e os sistemas interespaciais nos quais emergem os experimentos regulatórios subsequentes, havendo implicações para a evolução de mé- dio a longo prazo. Para eles, os diferentes im- pactos dos processos de neoliberalização são centrais à caracterização da natureza consti- tutiva e sistemicamente desigual dos proces- sos de reestruturação regulatória. Além disso, as consequências político-institucionais dos projetos de neoliberalização não poderiam ser verdadeiramente compreendidas em termos de seus efeitos polarizadores, deslocadores e disruptivos, pois eles seriam, muitas vezes, modificados e reinventados justamente para administrar e conter tais efeitos (Brenner, Peck e Theodore, 2010). Block (2008) tende a seguir nessa linha crítica. Para ele, as regras e insti- tuições específicas vigentes em determinado momento resultam de acordos políticos parti- 7 Neusa Maria Pereira Bojikian, Karina L. Pasquariello Mariano, Laís Forti Thomaz C a d e r n o C r H , S al va d or , v . 3 5, p . 1 -2 3, e 02 20 06 , 2 02 2 culares, condicionados pelo poder relativo de diferentes nações e respectivos interesses. A respeito da crença sobre a capacidade de au- torregulação do mercado, a figura perturbado- ra continua sendo o Estado. Para Peck (2008, p. 25), a “maldição do neoliberalismo é que ele não pode viver nem com, nem sem o Estado”. No caso dos EUA, a confiança exagerada no mercado em resolver problemas econômicos e sociais teria influenciado as escolhas feitas pelos governos norte-americanos em termos de políticas de desenvolvimento de novas tec- nologias e capacidades do país (Block, 2008). Nosso argumento é que o ideário neoliberal foi contrabalançado por uma estratégia desenvol- vimentista oculta (Block, 2008; Block; Keller, 2016; Negoita, 2016), que buscou aproveitar os espaços nos quais se aceita a intervenção do Estado para essa atuação. Fazemos referência ao amplo guarda-chuva da segurança nacional, que seria um domínio legítimo da intervenção do Estado norte-americano, embora muitas es- tratégias de pesquisa e desenvolvimento, com ampla aplicação na área econômico-comercial, estão em desenvolvimento. Muitos registros mostram que agências estatais relacionadas à segurança nacional e a programas de tecnolo- gia tiveram papel essencial e determinante no modelo de desenvolvimento norte-americano, mesmo quando a esfera política estava visivel- mente dominada pela crença na supremacia do mercado (Fuchs, 2016; Keller, 2016) – inclu- sive no desenvolvimento de tecnologias consi- deradas “quintessencialmente internacionais e internacionalizantes, como a aviação e as te- lecomunicações” (Edgerton, 2007b, p. 14). Por certo, é histórica a dependência mantida pela indústria da aviação. As instalações de túneis de vento pertencentes ao governo foram críti- cas ao desenvolvimento de novas aeronaves (Crawford, 1986). Entretanto, isso tende a ser relevado. Conforme Edgerton (2007a, 2007b) notou, apesar de até hoje as compras milita- res dominarem as carteiras de vendas da in- dústria da aviação, as histórias da tecnologia tratam da aviação como meio de transporte, e o desenvolvimento tecnológico é visto como im- pulsionado pelas necessidades de transporte civil. Ainda segundo Edgerton (2007a, 2007b), as histórias da indústria enfatizam a importân- cia da produção de aeronaves civis. Porém, os registros revelam que, em tempos de paz, cerca de 75% de toda produção das principais indús- trias aeronáuticas do mundo destinava-se aos exércitos. O vínculo entre a Radio Corporation of America (RCA), atuante no setor de teleco- municações, e o Estado norte-americano, des- de a Primeira Guerra Mundial, também ilustra essa correspondência (Headrick, 1991). Block; Keller (2016, p. 6) dimensionam o papel do poder militar norte-americano no desenvolvimento industrial afirmando que “deixar as guerras e os armamentos fora da his- tória da indústria dos EUA é como a proverbial produção de Hamlet sem o príncipe”. Mas esse papel não se esgota no desenvolvimento e na manutenção dos fornecedores diretos para su- prir as necessidades do Estado belicista. Toda a infraestrutura necessária – estradas, canais, ferrovias, portos, treinamento da força de tra- balho e construção da capacidade tecnológica –, bem como a facilitação da difusão de ino- vações produtivas, também ficaram a cargo do Estado por meio de suas agências. O governo Reagan (1981-1989) foi notá- vel na implementação de políticas de desenvol- vimento, a despeito de seu discurso neoliberal. Nesse período, houve afrouxamento da política monetária e expressivo aumento dos gastos mi- litares, assim como continuidade de políticas de inovação implementadas pelos antecessores (Block, 2008; Slaughter; Rhoades, 2002). O setor espacial serve de exemplo. O go- verno Reagan, trabalhando com a Administra- ção Nacional de Aeronáutica e Espaço (NASA) adotou uma política envolvendo grandes gastos governamentais, como a construção da Estação Espacial Internacional, anunciada em 1984. Crawford (1986) criticou a política espa- cial do governo Reagan, destacando que o efei- to combinado dos esforços governamentais era “totalmente contrário a um mercado livre no 8 O ACORDO DE ALCÂNTARA E O DESENVOLVIMENTISMO ... C a d e r n o C r H , S al va d or , v . 3 5, p . 1 -2 3, e 02 20 06 , 2 02 2 espaço, uma vez que grande parte do programa consiste em aumentar os fundos para a NASA para que ela possa distribuir dinheiro para corporações selecionadas”. No julgamento do autor, seria descabida a ajuda fornecida pelo governo na forma de concessão sobre o uso do ônibus espacial, a custos “bem abaixo daque- les praticados no mercado”, para as empresas fazerem pesquisa e processarem materiais. De fato, o orçamento da NASA para promover a comercialização do espaço cobria muito mais do que pesquisas, que a indústria privada dizia não ter condições de realizar por conta própria. Referindo-se ao “lobby da comercialização do espaço”, Crawford (1986) dizia: “embora os proponentes pareçam convencidos de que os lucros do desenvolvimento industrial da Úl- tima Fronteira serão realmente enormes, eles mostram pouca inclinação a assumir os riscos para que esses lucros sejam realizados”. Assim, o capital inicial integralizado pela NASA foi fundamental para que grandes empre- sas privadas entrassem na comercialização do espaço. Conforme apontou Crawford (1986), na década de 1980, a maioria dessas empresas eram grandes empreiteiras militares, como McDonnell Douglas, RCA, Hughes Aircraft, Ford Aerospace, General Dynamics. As outras teriam concordado em participar somente depois de o governo fede- ral ter garantido importantes subsídios. Ao mes- mo tempo, percebe-se preocupação em garantir mercado às empresas financiadas. Os defensores da atuação do Estado apontaram a necessidade de se compensar a falta de mercados iniciais, que deveria ser suprida na forma de apoio financei- ro direto, ou com a NASA atuando como o “in- quilino âncora”, criando o mercado inicial por meio de compras antecipadas.4Em 1988, quan- do o governo Reagan permitiu que três satélites construídos por empresas norte-americanas fos- sem lançados em um foguete chinês, as empre- sas aeroespaciais do país vociferaram. Analistas diziam que a decisão aumentaria a probabilida- de de que pelo menos uma das três principais 4 Por inquilino âncora entende-se o papel do garantidor dos fluxos estáveis de caixa. empresas da época – General Dynamics, Martin Marietta e McDonnell Douglas –, com contratos para fornecer lançamentos às agências militares e civis estadunidenses, saísse forçadamente do mercado. Presumivelmente, a decisão de Reagan permitiria que fornecedores estrangeiros entras- sem no “mercado de incentivos”, o que forçaria as empresas do país a competir “com os preços baixos oferecidos por lançadores estrangeiros agressivos e subsidiados pelos respectivos Esta- dos” (Stevenson, 1988, p. 1). As três grandes empresas norte-ame- ricanas estavam preocupadas com os novos competidores asiáticos. O Japão estava desen- volvendo seu próprio sistema de lançamento – depois de trabalhar, sob licença, com os fo- guetes Delta da McDonnell Douglas. Mas era sobretudo a China o alvo do lobby contra a en- trada de concorrentes no setor de lançamento de satélites (Stevenson, 1988). Além disso, as empresas norte-america- nas sentiam-se ameaçadas com o consórcio eu- ropeu Arianespace, que detinha 75% do mer- cado mundial, e com os lançadores soviéticos, que, mesmo impedidos de lançar satélites com tecnologia norte-americana, poderiam futura- mente se beneficiar com a potencial evolução de satélites desenvolvidos com tecnologia de terceiros (Stevenson, 1988). O governo Bill Clinton (1993-2001) questionou a continuidade da Iniciativa de Exploração Espacial do governo George H. W. Bush (1989-1993). Inicialmente, a NASA foi instruída a reduzir o anunciado aumento de US$ 1 bilhão nos custos da Estação Espacial Internacional. Contudo, o programa básico da estação permaneceu inalterado e os aportes fi- nanceiros da agência a diferentes projetos civis superaram de longe os aportes das empresas privadas (Smith, 2001). Assim, apesar das crí- ticas do governo Clinton, decorrentes das pres- sões do Congresso (Smith, 2001), o programa espacial civil foi financiado em valor aproxi- mado de US$ 14 bilhões anuais (Pike, 1998).5 5 Tal valor corresponde apenas ao período pós-Guerra Fria e apenas às operações civis. 9 Neusa Maria Pereira Bojikian, Karina L. Pasquariello Mariano, Laís Forti Thomaz C a d e r n o C r H , S al va d or , v . 3 5, p . 1 -2 3, e 02 20 06 , 2 02 2 Nos anos 2000, a mão do Estado esten- deu-se novamente à indústria espacial. Em um estudo feito pela Space Angels, empre- sa de investimento, foi revelado que, entre 2000 e 2018, 67 empresas espaciais receberam US$ 7,2 bilhões em investimentos do governo. Observa-se que cerca de 93% deste investi- mento foi destinado a empresas do segmento de lançamento de foguetes. O relatório destaca a importância do investimento inicial do go- verno à SpaceX. Durante sua primeira década de operação, a SpaceX dispôs de US$ 1 bilhão. Metade desse montante veio de contratos go- vernamentais da NASA. Em 2012, Elon Musk reconheceu o apoio imprescindível da NASA, depois que a SpaceX lançou sua primeira cáp- sula de carga, a Dragon, para a Estação Espa- cial Internacional (Grush, 2019). Para impulsionar novos segmentos do mercado, o programa Serviços Comerciais de Carga Útil Lunar (CLPS, da sigla em inglês), anunciado pela NASA, em 2018, concedeu contratos a três empresas espaciais privadas fabricantes de espaçonaves robóticas que po- dem levar instrumentos à superfície da Lua. As empresas contempladas foram: Astrobo- tic: US$ 79,5 milhões; Intuitive Machines: US$ 77 milhões; OrbitBeyond: US$ 97 milhões (Brinkmann, 2019). Pela lógica da Space An- gels, a mão do Estado se estenderá até o mo- mento em que as empresas privadas possam assumir as operações comerciais (Grush, 2019). Sob o governo Biden (2021), a NASA anunciou a seleção de três empresas do país que receberão financiamento do Estado para desenvolver estações espaciais comerciais até 2025: Nanoracks LLC (US$ 160 milhões); Blue Origin (US$ 130 milhões); e Northrop Grumman (US$ 125,6 milhões). Da forma como foi apresentado, o Estado norte-americano, uma vez mais, será o verda- deiro mantenedor dos negócios das empresas e do desenvolvimento das estações espaciais comerciais do país. Uma vez prontas, a NASA certificará cada uma das estações construídas pelas três empresas referidas, contratará seus serviços em órbita e pagará pelo uso das es- tações. Como observamos com a indústria de aviação, o desenvolvimento tecnológico da in- dústria espacial continuará sendo impulsiona- do pela mão do Estado e não pelas necessida- des de transporte espacial comercial. O ACORDO DE SALVAGUARDAS TECNOLÓGICAS COMO INSTRU- MENTO DO DESENVOLVIMENTIS- MO OCULTO Como visto, na indústria espacial, a mão do Estado oferece apoio de diferentes formas: fomento à pesquisa e desenvolvimento; finan- ciamento aos investimentos; compras gover- namentais de produtos e serviços das empre- sas privadas norte-americanas; e por meio de diferentes iniciativas para mitigar os riscos. Como os projetos espaciais são arriscados, com altos custos, sempre houve temor entre os fornecedores de serviços de seguro. Conforme mostram os registros históricos, na década de 1980, os subscritores temiam não conseguir cobrir uma carga completa do ônibus espacial. Diante das perdas contabilizadas pelo setor, a Comissão de Comércio, Ciência e Transporte concluiu, em relatório de 1985, que o setor de seguros espaciais deveria ser estatizado. Entre o Estado subsidiar taxas de seguro ou ser o próprio provedor de seguros, a segunda opção seria mais adequada para lidar com as restrições de capacidade. O Estado forneceria seguro quando tal serviço não pudesse ser for- necido pelo setor privado e mediante razoáveis taxas (apud Crawford, 1986). Esse é apenas um exemplo, mas devemos destacar que os riscos avaliados pelos investi- dores vão além dos riscos técnicos, abrangendo riscos de mercado, financeiros, competitivos, políticos, execução e regulatórios. Não é o caso de se discutir cada um deles, apenas elencá-los basta para ilustrar a complexidade do setor es- pacial. O propósito aqui é discutir os riscos regulatórios sobre os quais o AST tem papel 10 O ACORDO DE ALCÂNTARA E O DESENVOLVIMENTISMO ... C a d e r n o C r H , S al va d or , v . 3 5, p . 1 -2 3, e 02 20 06 , 2 02 2 relevante. As regulamentações e exigências de conformidade presentes em leis e acordos in- ternacionais são vistas como riscos adicionais à atuação das empresas no setor espacial. O ris- co estaria não apenas no descumprimento, mas também no custo do devido cumprimento. Isso se deve ao fato de que os regimes regulatórios dos EUA de restrição e controle de exportação e importação de tecnologias de defesa às forças militares – em nome da segurança nacional e de outros objetivos da política externa do país – tendem a ser apontados como os riscos mais proeminentes do setor. Trata-se dos Regulamen- tos de Tráfico Internacional de Armas (ITAR), de 1999, administrados pelo Departamento de Estado com base em uma Lista de Munições dos EUA (USML). O problema é que muitas tec- nologias, componentes e sistemas associados a foguetes, satélites ou outros sistemas espaciais figuram na USML. O governo norte-americano se mantém rígido em relação à execução dos regulamentos que se aplicam às empresas norte-americanas e suas subsidiárias no exterior. As ações por violações do ITAR contra empresas e indiví- duos estão aumentando desde o começo dos anos 2000. A ITT e a Lockheed Martin figuram entre as empresas acusadas de violar os regu- lamentos de exportação de artigos de defesa, especificamente dados técnicos designados na USML, além de serviços de defesa relaciona- dos. Elas acabaram resolvendoas acusações via Acordos de Consentimento6 (U.S. Depart- ment of State, 2007, 2008). Na percepção das empresas, tais regu- lamentos as deixam em desvantagem no mer- cado internacional, “uma vez que os concor- rentes internacionais geralmente não possuem um [código] equivalente ao ITAR, ou possuem 6 Em casos considerados como graves violações, o infrator pode ser impedido de exportar por determinado período. O governo incentiva os exportadores do país a implemen- tarem programas internos de conformidade de exportação que devem ser disponibilizados às subsidiárias no exterior. Também pode exigir que os exportadores desenvolvam um Plano de Controle de Transferência de Tecnologia. (U.S. Department of Defense; U.S. Department of State, 2011). No AST, essa questão aparece entre as cláusulas que serão discutidas adiante. uma versão muito menos restritiva de contro- les de exportação”. A redução da participação dos EUA no mercado internacional de fabri- cantes de satélites e de provedores de serviços de lançamento tende a ser correlacionada a esses regulamentos (Near Earth, 2010, p. 55). De fato, os EUA são o único país que controla todos os satélites comerciais e itens relacionados, considerando-os como arma- mentos. Os Departamentos de Defesa e de Es- tado reconheceram que a aplicação de políti- cas e práticas de controle de exportação mais rigorosas, incluindo controles extraterritoriais impostos às subsidiárias estrangeiras das em- presas norte-americanas, colocaria a indústria de satélites do país em desvantagem competi- tiva (U.S. Department of Defense; U.S. Depart- ment of State, 2011). Assim, os compradores no mercado de satélites avançados prefeririam fornecedores com capacidade semelhante aos norte-americanos, mas sem as imposições de regulamentos como o ITAR. Uma forma de resolver esse dilema se- ria fazer com que os demais países aceitassem cumprir regulamentos semelhantes para prote- ger as chamadas tecnologias sensíveis para os EUA, diminuindo com isso as alegadas desvan- tagens das empresas norte-americanas. O pro- pósito declarado dos Acordos de Salvaguardas Tecnológicas é fornecer garantia aos EUA de que medidas para proteger tecnologias tidas como sensíveis são tomadas nos países que os assinam. Ou seja, tais acordos estabelecem a outros países regras para lidar com a tecnolo- gia e com dados confidenciais relacionados às atividades espaciais norte-americanas. Em ge- ral, tais acordos seguem um padrão. As termi- nologias usadas normalmente têm significados semelhantes. O que muda são as autorizações que são ou não concedidas e sob quais condi- ções. Certamente há outros objetivos incluídos em tais acordos, como impedir que outros pa- íses alcancem autossuficiência tecnológica na indústria espacial, bem como vantagens eco- nômicas em territórios fora da jurisdição dos EUA sejam aproveitadas por concorrentes in- 11 Neusa Maria Pereira Bojikian, Karina L. Pasquariello Mariano, Laís Forti Thomaz C a d e r n o C r H , S al va d or , v . 3 5, p . 1 -2 3, e 02 20 06 , 2 02 2 desejados. No caso do AST com o Brasil, há o indiscutível interesse pela vantagem econômi- ca referente à localização da Base de Alcânta- ra, próximo à linha do Equador, o que faz com que haja economia de combustível nos lança- mentos. Isso interessa não só aos EUA, mas a outros países, como China, principal alvo das restrições norte-americanas. Diante disso, o AST assinado e ratifica- do pelo governo brasileiro pode ser interpreta- do como instrumento de duplo objetivo: a) au- mentar significativamente a proteção daqueles itens classificados como tecnologias sensíveis – justamente os que fornecem aos EUA vanta- gens relevantes no âmbito militar ou de inte- ligência – quando eles se encontrarem fora de seu território; b) aumentar a competitividade da base industrial dos EUA por meio de barrei- ras erguidas em outros países contra competi- dores externos. Em relação a esses objetivos, encontra- mos uma série de cláusulas no AST que ten- dem a assegurá-los e que foram fortemente criticadas, em 2001, no Congresso brasileiro. No Quadro 1 estão resumidas as principais cláusulas do acordo de 2000 que receberam avaliações negativas e a versão de 2019. (O quadro completo das cláusulas está disponível no Anexo). Na época em que a primeira versão foi apresentada, o relator do Acordo na Câmara dos Deputados, deputado Waldir Pires (PT-BA), sublinhou em seu parecer as assimetrias que apresentamos no quadro a seguir como impe- ditivas da aprovação (Brasil, 2001). Em 2019, o Senador Roberto Rocha (PSDB-MA) foi res- ponsável pelo novo relatório, bem mais breve que o anterior, no qual ressaltou seu apoio ao AST: “Lamento, tão só, que tratado semelhante celebrado em 2000, no governo do presidente Fernando Henrique Cardoso, não tenha prospe- rado na Câmara. Perdemos dezenove anos de experiência e de recursos” (Brasil, 2019b, p. 5). Considerando que as duas versões são muito semelhantes nos aspectos questiona- dos, a aprovação se justificaria pela mudança na percepção dos parlamentares sobre o con- teúdo. Cabe resgatar as críticas apresentadas em 2001. Começamos pelo artigo III, o qual faz com que o Brasil se comprometa a firmar acordos juridicamente vinculantes com outros países que tenham soberania sobre entidades envolvidas em atividades de lançamento. Pe- los termos do acordo, o Brasil também con- corda com o requisito de que os acordos que vierem a ser assinados com terceiros países sejam substancialmente similares ao próprio AST assinado pelo Brasil. O deputado Waldir Pires (Brasil, 2001, p. 14) considerou tal cláu- sula uma “aberração jurídica”, pois, no seu en- tendimento, “nações soberanas não podem ser coagidas a celebrar atos internacionais entre si em função de um acordo bilateral firmado por uma delas com outro país, e, muito menos, se- rem obrigadas a inscrever nesses atos o mesmo conteúdo do acordo”. A crítica do relator ao artigo III envolve também a parte que condiciona acordos com terceiros para o uso da Base de Alcântara ao fato de que eles não estejam sujeitos a sanções pelo Conselho de Segurança das Nações Uni- das ou por algum país membro dela sob a ale- gação de que esse governo colabore com o ter- rorismo. O relator questionou a validade dos critérios adotados pelos EUA ao classificarem os países como apoiadores de atos terroristas. Para o deputado Waldir Pires (Brasil, 2001, p. 14), trata-se de uma “salvaguarda política” e não tecnológica, o que poderia impor restri- ções de cooperação ao Brasil. Os artigos IV e VI também tende a cor- roborar nosso argumento. Em suas cláusulas, é cedido aos EUA o controle exclusivo das “Áreas Restritas” da Base de Alcântara, subordinando inclusive as autoridades brasileiras às autori- zações e procedimentos definidos pelos EUA. O governo brasileiro passa a ser o responsável por garantir que os veículos de lançamento e espaçonaves norte-americanas, além de outros equipamentos e dados técnicos presentes na base, não sejam acessados sem anuência dos EUA. Esse ponto havia sido questionado pelo 12 O ACORDO DE ALCÂNTARA E O DESENVOLVIMENTISMO ... C a d e r n o C r H , S al va d or , v . 3 5, p . 1 -2 3, e 02 20 06 , 2 02 2 Cláusula Acordo 2000 Acordo 2019 Artigo III, 1.A Não permite o uso Centro de Lançamento de Alcânta- ra (CLA) por países acusados de apoio ao terrorismo. Manteve-se a cláusula Artigo III, 1.B Não permite o ingresso de equipamentos, tecnologias, mão de obra ou recursos financeiros no CLA provenientes de países não-membros do Regime de Controle de Tecno- logia de Mísseis, exceto se acordado entre as partes. Manteve-se a cláusula Artigo III, 1.E Não utilizará recursos obtidos de Atividades de Lança- mento em programas de aquisição, desenvolvimento, produção, teste, liberação, ou uso de foguetes ou de sistemas de veículos aéreos não tripulados (quer na República Federativa do Brasil quer em outros países). Mudoupara artigo III, 2, e foi alterada a restri- ção do uso dos recursos à aquisição, desenvol- vimento, produção, teste, emprego ou utiliza- ção de sistemas da Categoria I do MTCR. Artigo III, 1.F Firmará acordos juridicamente mandatórios com ou- tros governos, com dispositivos equivalentes àqueles contidos no Acordo, os obrigando a exigir que seus licenciados cumpram os compromissos, em sua es- sência, equivalentes aos previstos nos Planos de Con- trole de Tecnologias dos EUA. Mudou para artigo III, 1.E, mas manteve-se o conteúdo. Artigo III, 3 O governo dos Estados Unidos teria autoridade para aprovar as licenças de exportação necessárias à exe- cução de atividades de lançamento. Mudou para artigo III, 4, incluindo a autoridade do governo brasileiro nessa aprovação, a condicio- nando à conformidade com os termos do acordo. Artigo IV, 3 Em toda atividade de lançamento, deve-se assegurar aos participantes norte-americanos o controle sobre os veículos de lançamento, espaçonaves, equipamen- tos afins e dados técnicos. Estabelece a criação das áreas restritas sob controle do governo norte-ameri- cano que definirá o acesso a essas áreas. Manteve-se a cláusula especificando que o go- verno brasileiro deverá disponibilizar ao par- ceiro norte-americano áreas restritas e áreas controladas, e que os limites deverão ser clara- mente definidos. Artigo VI, 2 As partes assegurarão que somente pessoas autoriza- das pelo governo norte-americano controlarão o aces- so às áreas restritas. Manteve-se essencialmente igual, especifican- do que o governo brasileiro fica responsável por garantir que somente tenham acesso às áreas restritas pessoas autorizadas pelo gover- no norte-americano. Artigo VI, 3 Servidores norte-americanos poderão realizar, a qualquer momento, inspeções nas áreas restritas do CLA e nas instalações exclusivamente reservadas aos trabalhos com veículos lançadores e espaçonaves, havendo um compromisso de notificar voluntaria- mente o governo brasileiro sobre tais inspeções. Manteve-se essencialmente igual, destacando que o governo brasileiro deve permitir essas inspeções e que o governo norte-americano se esforçará em notificá-las previamente. Artigo VI, 5 Os representantes brasileiros deverão portar crachás de identificação emitidos pelo governo norte-ameri- cano enquanto estiverem cumprindo atribuições re- lacionadas às atividades de lançamento. Manteve-se a cláusula. Artigo VII, 1.B Equipamentos norte-americanos acondicionados em “containers” lacrados não serão inspecionados pelo governo brasileiro, que deverá apenas ser informado sobre o seu conteúdo. Manteve-se essencialmente igual, acrescentan- do que o governo brasileiro poderá solicitar a inspeção, que será realizada por representantes norte-americanos na presença de representan- tes brasileiros. Arti- go VIII, 3.B O governo brasileiro assegurará uma “área de recu- peração de escombros”, controlada pelos EUA, assim como a imediata restituição de todos os componentes e/ou escombros recuperados por representantes bra- sileiros, sem que se possa estudá-los ou fotografá-los de qualquer maneira. Manteve-se essencialmente igual, acrescen- tando que o governo brasileiro poderá realizar estudos e fotografar em caso de saúde e segu- rança pública, desde que com o monitoramento e aprovação do governo norte-americano, não estando autorizado a divulgar quaisquer infor- mações coletadas. Quadro 1 – Comparativo do conteúdo das versões de 2000 e 2019 dos ASTs entre o Brasil e os Estados Unidos ques- tionado no Congresso brasileiro Fonte: Elaboração própria a partir dos AST de 2000 e 2019 (Brasil 2000, 2019a). 13 Neusa Maria Pereira Bojikian, Karina L. Pasquariello Mariano, Laís Forti Thomaz C a d e r n o C r H , S al va d or , v . 3 5, p . 1 -2 3, e 02 20 06 , 2 02 2 deputado Waldir Pires (Brasil, 2001), não ha- vendo qualquer referência sobre isso no parecer elaborado pelo senador Roberto Rocha (Brasil, 2019b). Os diplomatas Candeas e Viana (2020, p. 20) afirmaram que a questão das áreas res- tritas e áreas controladas foi bastante discutida durante as negociações “com vistas a corrigir sensibilidades assinaladas na primeira versão do AST 2000”. Contudo, a alteração passou de “assegurar que os participantes norte-america- nos mantenham o controle”, para “assegurar que os participantes norte-americanos possam acessar e controlar o acesso”. Ou seja, os termos referentes às áreas restritas permaneceram no acordo, apesar da recomendação do deputado Waldir Pires (Brasil, 2001, p. 21), dizendo que “as ‘áreas restritas’ [deveriam ser] controladas por ambos os governos e as autoridades e técni- cos brasileiros devidamente credenciados pelo Brasil teriam inteira liberdade de nelas adentra- rem”. As exigências assimétricas questionadas também estão presentes no artigo VIII, o qual determina que mesmo no caso de destroços, qualquer estudo ou fotografia realizados por grupos de resgate brasileiros depende expressa- mente de autorização dos EUA, ainda que en- volva questões de saúde pública. O deputado Waldir Pires (Brasil, 2001) menciona que esse item fere o direito de custódia ao país no qual caiam escombros em seu território, advindo do Acordo sobre o Salvamento de Astronautas e Restituição de Astronautas e de Objetos Lança- dos ao Espaço Cósmico (1986). Essa questão de sigilo sobre os equi- pamentos norte-americanos aparece também no artigo VII. Na versão de 2000, supunha-se que o governo brasileiro não poderia fiscalizar containers lacrados contendo equipamentos, item questionado pelo relator que recomen- dou a possibilidade dessa fiscalização quando o governo brasileiro julgasse necessário (Brasil, 2001). Na versão do AST de 2019, há alteração sobre a questão, indicando que o governo bra- sileiro pode solicitar a autorização para realizar essa vistoria. Contudo, ela só poderá ocorrer na presença de autoridades norte-americanas. Além disso, no artigo VI de ambos os acordos, é previsto que os EUA podem fazer inspeções na Base de Alcântara sem aviso pré- vio. Ademais, reforça o compromisso do gover- no brasileiro em observar um “Plano de Con- trole de Transferência de Tecnologia que reflita e inclua os dispositivos relevantes deste Acor- do e sua(s) respectiva(s) licença(s) de exporta- ção e/ou importação” (Brasil, 2019a), garantin- do que todas as partes brasileiras envolvidas nas atividades de lançamento cumpram tal plano. O deputado Waldir Pires (Brasil, 2001) reiterou que o Brasil, signatário do Tratado do Espaço, já estaria de acordo com as regras de transferência de tecnologia espacial. Outra cláusula atinente à proteção das tecnologias exigida pelos EUA é o artigo V, que proíbe qualquer assistência a partes brasileiras no que se refere ao “projeto, desenvolvimen- to, produção, operação, manutenção, modifi- cação, aprimoramento, modernização ou re- paro de Veículos de Lançamento dos Estados Unidos da América, Espaçonaves dos Estados Unidos da América e/ou Equipamentos Afins”, sem a devida autorização do governo dos Esta- dos Unidos (Brasil, 2019a). A justificativa do governo brasileiro des- taca que 80% dos satélites e objetos espaciais do mundo têm tecnologia de propriedade dos EUA (Agência Espacial Brasileira, 2021, p. 9) e que, sem o AST, o Brasil não poderia fazer lan- çamentos desses equipamentos. Candeas e Via- na (2020, p. 9) afirmam ser o AST “pré-requi- sito para o pleno acesso do Brasil a esse setor”. Mas, o que todas essas cláusulas revelam é que as leis, os regulamentos e políticas domésticas norte-americanas estarão também asseguradas em território brasileiro e acima de qualquer interesse legítimo do Brasil em promover suas políticas de desenvolvimento e acessar efetiva- mente o setor espacial internacional. Já em relação ao segundo objetivo, que é aumentar a competitividade da base industrial norte-americana por meio de regras restritivas a outros países, o acordo restringe as possibi- lidadesde o Brasil estabelecer acordos de co- 14 O ACORDO DE ALCÂNTARA E O DESENVOLVIMENTISMO ... C a d e r n o C r H , S al va d or , v . 3 5, p . 1 -2 3, e 02 20 06 , 2 02 2 operação com terceiros. Entendemos que tais proibições, mais do que servir ao propósito de garantir a proteção das chamadas tecnologias sensíveis de acordo com os regulamentos in- ternos dos EUA, tendem a aumentar a compe- titividade da base industrial norte-americana. A um só tempo elas levantam barreiras contra a China e retiram as possibilidades de desen- volvimento tecnológico do Brasil. No artigo III ficou estabelecido que o Brasil “não pode permitir o ingresso signifi- cativo, quantitativa ou qualitativamente, de equipamentos, tecnologias, mão de obra ou recursos financeiros no Centro Espacial de Al- cântara” (grifo nosso), que sejam provenientes de países que não sejam membros do Missile Technology Regime Controle (MTCR). O de- putado Waldir Pires (Brasil, 2001, p. 20) reco- mendava que o Brasil deveria ter “respeitada a sua competência de poder negociar transferên- cia de tecnologia com terceiros países e coope- rar com nações que não fossem membros do MCTR”. Mesmo assim, a questão foi mantida e, mais uma vez, não houve nenhuma argu- mentação no relatório de 2019. À primeira vista, a cláusula que restringe a cooperação pode parecer legítima, uma vez que a proibição recai sobre países que não fa- zem parte do MTCR. Porém, esse critério é pas- sível de questionamento, visto que tal regime não é efetivamente multilateral (Knox, 2017), pois não basta um país manifestar seu desejo de associação e seguir de forma voluntária o estabelecido no regime, os membros precisam ser aceitos, sobretudo pelos EUA. Ainda que a cláusula do AST preveja que, se ambas as partes concordarem, isso pode ser revisto, tra- ta-se de uma questão complexa. A China, por exemplo, a despeito de seus compromissos em cumprir com o estabelecido no MTCR e de ter solicitado formalmente sua adesão, não conse- guiu se associar ao regime. Alega-se que seus padrões de controle de exportação são inade- quados perante as exigências impostas pelos membros. É conhecida, entretanto, as atuais tensões dos EUA com a China em razão de dis- putas comerciais ou de direitos humanos. A estratégia de excluir a China do regime retira dela, de forma unilateral, o direito de partici- par de projetos cooperativos com outros mem- bros que sejam de interesse do governo chinês e de indústrias importantes (Zaborsky, 2004). Cabe lembrar que o Instituto Nacional de Pes- quisas Espaciais (INPE), firmou parceria com a China, especificamente com a Academia de Tecnologia Espacial do país, para o desenvol- vimento, fabricação e operação de satélites de sensoriamento remoto para usos estritamente pacíficos do espaço. No âmbito dessa parce- ria, envolvendo 70% de participação chinesa e 30% de participação brasileira, registrou-se, em 1999, o lançamento do satélite sino-brasi- leiro CBERS-1, depois, em 2003, o CBERS-2, e, em 2007, o CBERS-2B (Pereira, 2008). Outra cláusula restritiva está no artigo III, que impõe limitações ao Brasil no uso dos recursos ob- tidos do aluguel da base. No acordo anterior, impedia-se o uso de qualquer recurso e inves- timento no desenvolvimento espacial. No atu- al, ficou estabelecido que o governo brasileiro “não poderá usar tais recursos para a aquisi- ção, desenvolvimento, produção, teste, empre- go ou utilização de sistemas da Categoria I do MTCR”. Ou seja, o governo brasileiro não po- derá usar os recursos provenientes da locação da Base de Alcântara no desenvolvimento do setor espacial do país caso haja atividades rela- tivas à categoria I do MCTR – incluindo siste- mas com alcance além de 300 km e capacidade de carga acima de 500 kg. O problema é que na programação dos Projetos de Acesso ao Espaço (2012-2021), no âmbito da retomada do desen- volvimento de veículos lançadores, constava modelos de maior porte, como o VLS-Alfa (até 500 kg em órbita equatorial de 750 km) e o VL- S-Beta (até 800 kg em órbita equatorial de 800 km) (Agência Espacial Brasileira, 2012). Em 2010, no relatório publicado na Câmara dos Deputados sob a responsabilida- de do deputado Rodrigo Rollemberg (2009, p. 35), destacou-se a avaliação feita por uma consultoria especializada, apontando a perda 15 Neusa Maria Pereira Bojikian, Karina L. Pasquariello Mariano, Laís Forti Thomaz C a d e r n o C r H , S al va d or , v . 3 5, p . 1 -2 3, e 02 20 06 , 2 02 2 de competitividade espacial do Brasil e que a política espacial brasileira carecia de uma es- tratégia que lhe assegurasse as condições para a implementação. Entretanto, ao contrair, me- diante o acordo atual, a obrigação de assinar novos acordos de salvaguardas tecnológicas, espelhando o AST, com outros países, o desen- volvimento dos veículos lançadores de satéli- tes não dependerá somente de iniciativas bra- sileiras e de parceiros detentores de tecnologia sobre veículos lançadores de satélites, mas, imprescindivelmente, do aceite dos EUA. É interessante notar que o Brasil, em 1995, já havia contraído compromissos de ob- servar o regime MTCR, sinalizando aos EUA disposição em cooperar com as regras esta- belecidas por eles. E, diante da possibilidade de compra de tecnologia de mísseis da Ucrâ- nia – mísseis Cyclone – e da China, o Brasil assinou acordos de salvaguardas tecnológicas com esses dois países. Depois, em decorrência do acidente com o VLS-1, em 2003, e da ne- cessidade de o Brasil restabelecer sua parceria com a Rússia no intuito de apontar as causas do problema e propor modificações no projeto do VLS, o Brasil firmou, em 2009, um acordo de salvaguardas tecnológicas com o governo russo (Rollemberg, 2009). As assinaturas de acordos de restrição à aquisição de tecnologias sensíveis, entretanto, não evitaram embargos comerciais, bem como não cessaram apresentações de novas condi- cionalidades diante de quaisquer possibilida- des do Brasil adquirir tecnologias e produtos de lançamento de satélites, ainda que compro- vadamente para fins pacíficos. Conforme ob- servou Scalco (2019), o domínio sobre a tec- nologia de lançamento de satélites é decisivo para o Brasil maximizar suas vantagens decor- rentes da localização privilegiada da Base de Alcântara e explorar efetivamente o acordo de cooperação mantido com a China para o de- senvolvimento de satélites. CONSIDERAÇÕES FINAIS O artigo tratou das relações entre o Bra- sil e os EUA, observando, primeiramente, o grau de concordância dos governos brasilei- ros com as ideias econômicas defendidas nos EUA. Na sequência, analisou-se o modelo de atuação do Estado norte-americano no desen- volvimento tecnológico e de inovação e o pa- pel do AST, que vai além do objetivo de mitigar os custos regulatórios impostos às empresas norte-americanas. Conforme foi demonstrado, há diferenças historicamente importantes no alinhamento entre as respectivas orientações políticas. Essas diferenças se aprofundaram quando Bolsonaro assumiu a presidência, em 2019, optando por um alinhamento pela sub- missão aos EUA. Apostando em uma possível reeleição do presidente Trump, o governo Bolsonaro po- sicionou-se como um aliado devotado, fazen- do concessões unilaterais ao governo Trump. Entre outras concessões, aceitou os termos do Acordo de Alcântara, ignorando os argumentos dos congressistas que haviam reprovado, em 2001, um acordo análogo. Tal comportamen- to justifica as críticas sobre o descompasso da atuação internacional do Brasil sob o governo Bolsonaro, com a tradição diplomática e com os interesses nacionais. O redirecionamento da política externa brasileira buscou adequar- -se ao discurso do governo norte-americano em defesa primordialmente do mercado, acei- tando, sem reservas para o Brasil, os constran- gimentos impostos à atuação do Estado, seja nos esforços efetivos de superação da estag- nação, seja como indutor do desenvolvimento econômico. Noentanto, o posicionamento ide- ológico predominante nos EUA contrasta com a prática dos governos do país. Como apresen- tamos na segunda seção, pode-se observar no comportamento desses governos elementos que indicam a condução do Estado norte-ame- ricano no sentido da lógica desenvolvimen- tista velada, encoberta ou oculta, para usar o 16 O ACORDO DE ALCÂNTARA E O DESENVOLVIMENTISMO ... C a d e r n o C r H , S al va d or , v . 3 5, p . 1 -2 3, e 02 20 06 , 2 02 2 termo de Block (2008). Dentro dessa lógica, a intervenção não se restringe ao financiamento e a outros tipos de apoio material às empresas. Envolve também garantias de que os marcos regulatórios nacionais a elas impostos serão igualmente aplicados aos concorrentes estran- geiros por meio de acordos internacionais. In- fere-se que o AST é um instrumento por meio do qual os governos dos EUA procuram, pri- meiramente, mitigar os riscos relacionados aos requisitos regulatórios e aos custos nos quais estão submetidas as empresas do país. Uma tentativa de harmonização das regras a fim de nivelar o campo de atuação para as empresas norte-americanas no que diz respeito às res- trições de exportação e à efetiva transferência de tecnologias espaciais. Além disso, o AST tende a funcionar como um instrumento para alavancar a competitividade da base industrial norte-americana por meio de barreiras ergui- das em outros países contra os competidores externos. Podemos presumir que essa mesma orientação possa ser seguida em outros acor- dos assinados pelos EUA com outros países, mas a verificação dessa suposição exige uma nova agenda de pesquisa. O estudo detalhado aqui realizado sobre o Acordo de Alcântara permitiu demonstrar que o governo norte-americano conseguiu es- tabelecer barreiras ao Brasil no uso de seu ter- ritório e dos recursos à Categoria I do MCTR, assim como à constituição de acordos de par- cerias e de cooperação tecnológica com países que não fazem parte do regime MTCR, como é o caso da China. Com isso, os EUA restrin- gem o potencial de desenvolvimento do setor espacial brasileiro e, consequentemente, favo- recem sua própria indústria espacial. 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Pasquariello Mariano – Professora Associada da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (Unesp), na qual coordena o Grupo de Estudos Interdisciplinares em Cultura e Desenvolvimento (GEICD) e participa do Observatório de Regionalismo (ODR), que integram a Rede de Pesquisa em Política Externa e Regionalismo (REPRI). Bacharel em Ciências Sociais pela Universidade de São Paulo (USP); mestre em Ciência Política pela Universidade de São Paulo (USP); e doutora em Ciências Sociais pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). Atualmente coordena a rede Development,
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