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--- ser educacional gente criando o futuro 1elesap1ens .. \-' ' 1 1 l-'Í 1 1 ! ! t 1 1 ' 1 Análise do Discurso © by Editora Telesapiens Todos os direitos reservados. Nenl1uma parte desta publicação poderá ser reproduzida 011 tra11smitida de qualquer modo 011 por q11alq11er outro 1neio, eletrônico ou n1ecânico, inclui11do fotocópia, gravação ou qualq11er outro tipo de sistema de armazenamento e trans1nissão de i11form.ação, sen1 prévia a11torização, por escrito, da Editora Telesapiens. Dados Internacionais de Catalogação na P11blicação (CIP) 048a Oliveira, Adriana Ferreu·a Serafim de Análise do disct1rso [rec1u·so eletrônico]/ Adria.na Ferreira Serafim de Oliveira, Patrícia Valéria Vieira da Costa; coorde11ação de David Lira Stephen Barros; organização de Cristia11e Silveira Cesar de Oliveira - Recife: Telesapiens, 2021. l 72p.: il.; 23cn1 ISBN 978-65-86073-84-3 1. Análise do disc11rso. 2. Lmg11ística. I. Costa, Patrícia Valéria Vieira da. II. Barros, David Lira Stephen (coord.). III. Oliveira, Cristia11e Silveira Cesar de ( org.). IV. Título. CDD 401.41 (22.ed) CDU 800.85 Bibliotecária: Maria Isabel Schiavon Kinasz, CRB9 / 626 Análise do Discurso Créditos Institucionais Fundador e Presidente do Conselho de Administração: J anguê Diniz D ire to r-Presidente: Jânyo Diniz Diretor de Inovação e Serviços: Joaldo Diniz Diretoria Executiva de Ensino: Adriano Azevedo Diretoria de Ensino a Distância: Enzo Moreira © 2020 by Telesapie11s Todos os direitos reservados AS AUTORAS ADRIANA FERREIRA SERAFIM DE OLIVEIRA Olá. Meti nome é Adriana Ferreira Serafi1n de Oliveira. Sou Doutora em Educação pela UNESP - Rio Claro, com foco em inclusão social, direitos fundamentais e políticas públicas para as mulheres vítimas de violência de gênero. Estágio doutoral em Psicologia Social com bolsa PSDE - CAPES na ''Universidad Complutense de Madrid - Facultad de Ciencias Políticas y Sociología'' co1n pesquisas desenvolvidas em Madrid e cercanias quanto aos serviços públicos de atendimento à mulher vítima de violência de gênero e quanto à legislação dessa temática a pesquisa foi desenvolvida com a orientação de professor da ''Facultad de Derecho de la Universidad Complutense de Madrid''. Tem experiê11cia em trabalha.r co111 a metodologia qualitativa. Mestra em Direitos Fundamentais Difusos e Coletivos pela UNIMEP de Piracicaba, co1n foco em Direitos Humanos e Direito Internacional, com bolsa do programa PROSUP-CAPES. Pós-graduada em Política e Relações Internacionais pela Ft1ndação Escola de Sociologia e Política de São Paulo (FESP-SP). Bacl1arel e1n Direito pela Instituição Toledo de Ensino de Bauru (ITE). Pós-doutorado em curso pela FD-UPM. Revisora e parecerista de periódicos qualificados. Professora universitária. Advogada , , PATRICIA VALERIA VIEIRA DA COSTA Olá. Meu nome é Patrícia Valéria Vieira da Costa. S011 formada e1n Letras com l1abilitação e1n Língua Portuguesa, pela Universidade Estadual da Paraíba, possuo Mestrado em Literatura e Interculturalidade e atualmente faço Doutorado em Literatura e Interculturalidade, ambos pela mesma instituição. Tenho experiência docente no ensino básico, por meio das disciplinas de Literatura e Produção de textos, passando por tunnas do ensino Fundamental II ao ensino Médio. S011 apaixonada pelo que faço e adoro trans1nitir minha experiência de vida àqueles que estão i11iciando em suas profissões. Por isso fomos convidadas pela Editora Telesapiens a integrar set1 elenco de autores independentes. Estamos muito felizes em poder ajudar você nesta fase de muito estudo e trabalho. Conte conosco! -- 1 C O N OG RA F I C OS Esses ícones que irão aparecer em sua trilha de aprendizagem significam: ' ' , ... , - - X OBJETIVO Breve descrição do objetivo de aprendizagem; CITAÇÃO Parte retirada de um texto; TESTANDO S11gestão de práticas 011 exercícios para fixação do conteúdo; IMPORTANTE O contel.'.1do em destaque precisa ser priorizado; DICA Um atalho para resolver algo que foi ir1trodtLZido no conteúdo; EXPLICANDO DIFERENTE Um jeito diferente e mais silnples de explicar o que acaba de ser explicado; EXEMPLO Explicação do conteúdo ou conceito partindo de 11m , . caso pratico; PALAVRA DO AUTOR Uma opinião pessoal e pa1ticular do autor da obra; + + - --X ;,. OBSERVAÇÃO Uma nota explicativa sobre o que acaba de ser dito· ' RESUMINDO Uma síntese das 1'.1ltimas abordagens; DEFINIÇÃO Defi1úção de llID conceito; ACESSE Links úteis para fixação do conteúdo; SAIBA MAIS Informações adicionais sobre o conteúdo e temas afins; SOLUÇÃO Resolução passo a passo de um problema , . 011 exerc1c10; CURIOSIDADE Indicação de cUiiosidades e fatos para reflexão sobre o te1na e111 estudo; REFLITA O texto destacado deve ser alvo de reflexão. _. ARIO UNIDADE 01 A linguística imanente versus linguística do discurso ........ 14 A linguística imanente ................................................ ............................................ 14 Estn1turalismo .............. ' .................................................................................... . Gerativisn10 .......................................................................................................... 15 17 A linguística do discurso ...................................................................................... 18 Linguística Cognitiva .................................................................................. 19 Sociolinguística Variacionista .............................................................. 21 A língua enquanto objeto da linguística- consequências dessa perspectiva teórica ................................................................................. 24 A subjetividade da Linguagem ....................................................................... 25 A enunciação ........................... .. ......................................... .... ........................................ 28 O discurso enquanto objeto de estudo da linguística (A análise do discurso) - consequências dessa perspectiva teórica 32 A interpretação ........................................................................................................... ... 34 Condições de produção e interdiscurso .................................................. 3 8 Outros aspectos relevantes à análise do discurso ................ ... 41 UNIDADE 02 Enunciação, Pragmática, Argumentação, Discurso ........... .. 52 Enunciação .......................... .. ........ ............. ............................. ...................................... ... 5 2 A Semântica da En une i ação ..... ......... ............................................ ........ 5 3 Prag111ática ........................................................................................................................ 5 7 Argumentação ................................................................................................................ 6 O Discurso 62 .................................................................................. ' .......................................... . Perspectivas teóricas (Significado de Ideologia) segundo: Althusser Ricoeur Foucault Pêcbeux 65 ' ' ' ............................................ .. A ideologia segundo Althusser ....................................................................... 65 A ideologia segundo Ricoetir ........................................................................... 68 A Ideologia segundo F oucault ......................................................................... 70 A Ideologia segundo Pêcheux .................................................... ....... ..... .... ..... 72 Perspectivas da Análise do Discurso de linha americana (Givón); Análise do Discurso de Linha francesa (Foucault, Pêcbeux); Análise críticado Discurso ................................... ............ . 74 Análise do Discurso de Linha americana (Givón) ........................ 74 Análise do Discurso de Linha Francesa (Foucault, Pêcheux) ....... 76 Authier-Revuz e a Análise Crítica do Discurso 82 Authier- Revuz 82 ............... ... .......................... ................................. ................................. Análise Crítica do Discurso 85 UNIDADE 03 Sujeito do Discurso: Benveniste, Authier-Revuz, Bakhtin, Ducrot e Foucault 94 As diversas formas de conceber o sujeito do Discurso ...... 94 O Sujeito para Benveniste ....................................................................... 95 O sujeito para Authier-Revuz ............................................................... 97 O sujeito para Bakl1tin ................................................................................ 98 O sujeito (Polifonia) em Ducrot ......................................................... 99 O Sujei to para F oucaul t ......................... .. .. .. ............. ................ .. .. .. ........ 1 O O Formação Imaginária e Formação Discursiva ........... .... ...... .. 103 F armação Itnaginária ........................................ .. .................................... ............. 103 F armação discursiva ... .... .. .................... ................................... .... .. ....................... 107 Ideologia e Suj eito ................................................................................................ 112 A Forma-St1jeito ..... ............................. ... .......................................................... ........ 117 O sujeito e sua forma histórica ............... .. ....................... ..................... .. 120 Subj etividades ............................................................................................................ 125 UNIDADE 04 O intradiscurso, o interdiscurso e a memória discursiva ...... 130 O intradiscurso Interdiscurso ................................................................................................................ 131 132 F or1nações discursi vas ........................................................... .. ........................... 13 3 A intertextualidade 139 Intertex tualidade: uma questão discursiva ........................................ 14 5 Dispositivo de Análise: O lugar da interpretação Interpretação versus compreensão; textualidade e discursividade 147 Interpretação versus compreensão ........................... ................................ 14 7 Textualidade e discursividade 151 .................................... .................................. Tipologias e relações entre discursos: Discurso autoritário; discurso polêmico; Discurso lúdico .................................................... 155 Discurso autoritário; discurso polissêmico e discurso lúdico ..... 159 Referências 163 ....... ...... .............................. ....................................................................... Análise do Disc11rso J ( ___ 1_1 ___ _ ___ 12_) ( Análise do Discurso -- INTRODU AO Você sabia que a área da Linguística é u1na das mais importantes para o conl1ecime11to da Língua? Desde o início do Século XX que linguistas de variados países mergulham nessa á1·ea, com o intuito de desvendar os mistérios que circundam a linguagem. Nesta disciplina, você conhecerá o percurso teórico que se inicia com o famoso Sausslu·e, considerado o ''O pai da lingl1ística moderna'', até as concepções mais conte1nporâneas relativas aos estudos sobre a linguage1n. Nessa primeira unidade, apresentaremos a você u1n estudo convidativo a co11hecer a Linguística Imanente, bem co1no a Linguística do Discurso, chega11do ao interessante conteúdo que é objeto da nossa disciplina em questão: A Análise do discurso. Ao longo desta unidade letiva você vai mergulhar neste universo! Análise do Disc11rso J ( ___ 1_3 ___ _ OBJETIVOS Olá. Seja muito bem-vindo a nossa Unidade 1. Nesta unidade, o nosso objetivo é auxiliá-lo 110 desenvolvimento das seguintes competências profissionais: Compreender as diferenças entre a Ling11ística Imanente e a Linguística do Discurso; E11tender como a Líng11a se toma objeto da enunciação para a Linguística 1nodema, e como a co111preensão da enunciação interfere positivamente na origem da A11álise do Discurso; Conceber a Análise do Discurso enquanto resultante dos estudos que a antecedem, além de assimilar con10 essa perspectiva amplia as compreensões linguísticas anteriores; Investigar como a Análise do Discurso se to1nou u1na perspectiva crítica, nos contextos históricos, soc1a1s, econômicos e etc., para o estudo da linguage1n. Então? Está prepa1·ado para uma viagem sem volta rumo ao conhecimento? Ao trabalho! ___ I 4_) ( Análise do Discurso A linguística imanente versus linguística do discurso Caro aluno(a), ao término deste capítulo, você será capaz de entender co1110 funciona a Análise do Discurso. Isso será funda1nental para a co111preensão de uma das grandes co1Tentes de estudo do curso de Letras, responsável por grande parte das pesquisas na área, bem como contribuirá para exercício de sua docência em sala de aula. E então? Motivado para desenvolver essa competência? Va1nos lá. Avante! A linguística imanente Desde a antiguidade, o ho1nem passa por motivações práticas qt1e o leva a refletir sobre a estrutura das língt1as e set1s t1sos. Apesar de Pêcheux (1990, p.38) afirmar que a ''reflexão sobre a linguage1n não tem evidentemente, co1neço histórico assi1nilável'', desde o antigo Egito, passando por Fenícios e Hindus, além de out1·os povos, o registro escrito é problematizado pela tomada de consciência, geralmente empírica, da estrutura da língua para fins de comunicação. Essa realidade nos leva a compreensão da imanência da língua, ou, mais propriamente, sua realidade material. Formalmente, a linguística imanente está para a ''teoria da linguagem'', co1no coloca o dinamarquês Hjelmslev, em seu livro ''Prolégomenes à tine théorie dt1 langage'' (Prolegô1nenos a ut11a teoria da ling·uage111). Como, então, consideramos as Linguística Imanente nos dias de hoje? Análise do Disc11rso J (_1_5 __ _ Hojee1ndia,alinguísticalmanenteéumdosprincípiosdoque chaman1os 1nais comumente de Linguística fo1mal, que antecede e ilu111ina o posterior surgi111ento da Linguística do discurso. Em se tratando de Linguística formal, é necessário compreender que essa concebe a língua enquanto est1utu1·a. Sendo assim, ''A língua é entendida co1no um objeto at1tônomo independente das intenções de uso e da situação comunicativa (MALELOTTA, 2008, p.87). No contexto formalista, surgiram duas vertentes: O estruturalisn10, do suíço Ferdinand Saussure, que i11augura a Linguística moderna; e o Gerativis1no, do no1ie americano N oan Chomsky ( 19 5 7). Estruturalismo Preparado (a) para conhecer o famoso ''Pai da linguística moderna''? Vamos lá! A teoria Sausst1riana ganha espaço nos estudos linguísticos por 1neio da publicação póstuma do ''Curso de Linguística geral'' ( 1916), um compilado de escritos de Saussure efetivado por seus alunos Charles Bally e Albert Sechehaye. Para Fiorin (2002), apesar de, 110 livro, não estar claramente exposto dessa fonna, os estudiosos costumam dividir a teoria saussuriana em quatro princípios ou dicotomias, são elas: Sincronia versus Diacronia Indo de contra ao estudo da evolt1ção histórica das línguas, a diacronia, (vigente até fins do século XIX), Saussure prioriza a descrição sincrônica, objetivando descrever a estrutut·a de uma determinada língua em seu recorte temporal, sem levar em consideração seu processo evolutivo. Sobre essa perspectiva, Fiorin (2002, p. 79) comenta que: Contraria1nente ao estudo da mudança linguística, o ponto de vista sincrônico vê a língua como u1n siste1na em que u111 elemento se defu1epelos den1ais elementos. No estudo sincrônico, um determinado ___ I 6_) ( Análise do Disct1rso estado da língua é isolado de suas mudanças através do te1npo de e passa a ser estudado como um siste111a de elementos linguísticos. Esses elementos são estudados não mais em suas mudanças históricas, mas nas relações que eles contraem, ao mesmo tempo, uns co1n os outros. Língua versus fala Saussure elege a língua como seu objeto de estudo 11a linguística, já que a considera sistêmica e coletiva. Para ele, a língua define-se enquanto um siste1na composto por signos linguísticos, encadeados para formar um todo organizado em que cada signo é interdependente e definido por sua ordem e função. Significado versus significante Para o estudioso, essa é a dicoto111ia mais importante, posto que forma o signo linguístico acima mencionado. Para Saussure tudo é signo, já que tudo significa algo. Sendo assim, significante seria a image1n acústica, 1naterial, de algo, co1no por exe1nplo escrever a palavra ''computador''. Já o significado é o conceito imaterial disso, Oll seja, as interpretações que competem a esse signo: aparelho tecnológico; n1eio comt1nicacional, etc. Sintagma versus paradigma O Paradigma é o conjunto de con1ponentes do qual o sujeito pode se valer para co111por seu e11unciado; já Sintagma é a escolha. Por exemplo, um sujeito pode dizer ''A água está fria''. A palavra ''fria'' poderia facilmente ser substih1ída por ''temperatura'', por exemplo. No entanto, a escoll1a feita foi ''água'', o que caracteriza o eixo do sintagma. Já os outros tennos como ''temperatura'', etc., que poderiam ser escolhidos, constituem o pa1·adigma. Co1110 vin1os, o Estruturalismo Saussuriano pode ser pensado como o estudo da língua enquanto um sistema fechado em si mesmo, se1n interferência de fatores extralinguísticos como o contexto situacional, dent1·e outros. Críticas à parte, o Análise do Disc11rso J ( ___ 1_1 ___ _ Estruttrralismo i1úluenciou diversas vertentes da produção de conhecimento linguístico no decorrer do século XX. Gerativisnio A partir da segunda n1etade do século XX, surgiu uma 11ova abordage111 linguística, o Gerativismo. Formulado pelo linguista Chomsky, manifestou-se como uma nova proposta de investigação da linguagem. Esse estudioso optou por uma posttu·a racionalista para formular sua teoria dos estudos lingt1ísticos. Para Chomsky (2005), a língua deve ser estudada de for1na lógica e abstrata. Nesse contexto, essa passa a constituir um siste1na de regras e princípios compostos na 1nente humana, considerando que qualquer sujeito exposto a u1n ambiente apropriado pode adquirir ( a gramática de) qualquer língua. Pragmático, Chomsky tem como base da gi·amática gerativa três questões básicas, a saber: ''a) O qt1e constitui o conhecimento da Língua? b) Como é adquirido o conheci1nento da Língua? c) Como é usado o conl1ecime11to da língua?'' (CHOMSKY, 1994, p.23). A resposta a essas questões, para o pesquisador, está 11a mente hu1nana, que possui un1a gramática internalizada, explicada de duas maneiras: Gramática enquanto dicionário mental de f armas da língua; gramática enqt1anto sistema de regras e princípios que atuam sobre as formas. Nesse ínterim, a gi·a1nática une-se com os demais sistemas conceituais mentais para articular o som. No processo formal, as expressões p1imeiro passam pelas regras para só depois ganharem significação. Para o Gerativis1110, o ser humano nasce com u111 conjunto de princípios relacionados ao funciona1nento da língua, ou seja, a aquisição da linguagem toma-se u1na herança genética. Se genético, portanto, comum entre todas as línguas. Assim, a abordage1n gerativa busca as características gerais da linguagem, explicando e descrevendo propriedades que compõem o que o Chomsky chama de Gran1ática Universal (GU). ___ 1 s_J ( Análise do Disct1rso Considerado u1n dos 1naiores teóricos conte1nporâneos, Chomsky contribuiu de diversas 1naneiras para os estudos linguísticos. Apesar de formalista tal co1110 Saussure, o estudioso não concorda com a concepção de que a língua é uma convenção social, mas sim um fenômeno biológico humano. Ambos, Sausstrre e Chomsky, aproximam-se q11ando considera1n a língt1a uma forma homogênea e idealizada. No entanto, diferem-se quando, por exe1nplo, para o p1imeiro, a língua é um conjunto de signos sociais; en.quanto que, para o segundo, ela é u1n conjunto de sentenças for111uladas com bases biológicas. A linguística do discurso A linguística do discurso ultrapassa os limites da linguagem enquanto um sistema formal, passando a valorizar os usos da líng11a em situações reais de com11nicação, além das relações entre função e forma. Ou seja, para a Linguística do discurso a língua é uma estrutura f onnal perpassada por realidades subjetivas tanto histó1icas quanto sociais, que influenciam e são influenciadas pelo siste1na. Essa nova perspectiva motivou o surgimento de diversas vertentes que, apesar de suas particularidades, de umamaneira geral: ( ... ) considera a língua e1n uso, observando os fenômenos de variação e mudança linguísticas, as interpretações face a face ( e de outros tipos) entre falante e ouvinte, as influências sociais e psicossociais na estrutura da língua, a ideologia e a co11st17.1ção da subjetividade, os atos de fala no lugar de frases e sentenças verdadeiras e gramaticais, as implicaturas conversacionais entre outros fatores. (MARTELLOTA, 2008, p.88) Dentre muitas vertentes, ressaltare1nos duas das principais, a saber: a Linguística cognitiva e a Sociolinguística variacionista, refletindo proxi111idades e distancian1e11tos e111 relação ao paradig1na f onnalista. Análise do Disc11rso J ( ___ 1_9 ___ _ Linguística Cognitiva O q11e seria a Linguística cog11itiva? Surgiu no final da década de 1970, na Califó1nia, a Linguística Cognitiva, resultante de 1upturas teó1icas de alguns dos gerativistas. Nesse período, se destacaram nomes co1no George Lakoff e Charles Fillmone. Com o tempo, essa abordagem passot1 a ser cha1nada de Sociocognição, visando destacar o poder do contexto social para a linguage1n (já não 1nais autônoma): C11ltura e sociedade como bases da cognição hmnana, da co1npreensão do m1111do. Portanto, essa vertente não separa conheci111ento linguístico do conhecllnento 11ão linguístico, assu1nindo uma postura que vai de contra a visão racionalista do gerativismo. Para a Sociocognição, os interlocutores são o centro da constn1ção de sentido, ou seja, a comunicação entre indivíduos em situações reais de interação discursiva é o ponto chave. A linguagem deixa de seru1n sistema que independe do falante ou um conjunto de regras finitas e ganha uma dimensão social e cognitiva cuja função é possibilitar a seus usuários meios para reportar o disct1rso alheio, inflt1enciar ot1tras pessoas, narrar acontecimentos, fazer avaliações, ser impreciso, falsear infor1nações, predizer o fut11ro, expressar sentimentos. (SALOMÃO, 199, p.65) Para Lakoff & Johnson (1999), a mente não é separada do COIJJO, assi111, muitos dos significados se dão por meio da estrutura corporal humana, chamados teoricamente de pensa1nentos corporificados. Aqt1i, consideramos a soma da inferência conceptual à inferência sensório-motora. Quando usa1nos expressões relativas ao espaço, sendo que esse significa tempo. Vejamos: Dias atrás estive em São Paulo ___ 2_0 ___ ) ( Análise do Discurso Temos acima, originalmente, a palavra ''atrás'' co1110 um referente espacial (atrás de algum lugar, posicionan1ento). No entanto, 110 contexto dessa oração a palavra sublinhada refere-se a um tempo anterior, sensorial. Como vi111os, a mente humana desenvolve um processo de reelaboração de informações que surgem inicialmente de domínios cognitivos distintos. A esse processo da1nos o no1ne de ''1nesclage1n'', em que relações sintáticas abrem 1narge111 para os aspectos semânticos, em busca de sentido (s).Observe a figura abaixo: Input 1 figura 1: Modelo esque111ático do processo de mesclagenJ conceptual Baseado e111 Fouconnier e l'u.mer (2002) Espaço Genérico Fonte: O autor Input 2 Segundo Fouconnier e Turner (2002), esse processo se dá por pelo menos a conexão de quatro domínios: dois inputs de entrada; um esque1na genérico (possibilidade de interação) e a mescla ( o novo sig11ificado). Análise do Disc11rso J ( ___ ~_1 ___ _ Podemos perceber, portanto, que a Sociocognição ultrapassa o Fonnalismo em diversos aspectos. Dentre eles, a crítica à limitação gerativa, posto que apesar de se aproximar das ciências cognitivas, o Gerativismo entende a linguagem como autônoma, priorizando a sintaxe, enquanto que a Sociocognição valoriza a semântica por 1neio da utilização dos sentidos para o processo de const1ução da linguagem. Por fim, enquanto que na linguística fo11nal o sujeito é irrelevante, na Sociocognição o sujeito é o centro na constrt1ção de sentido, ou seja, o ho1nem significa o inundo de acordo co111 suas experiências pessoais, sociais, econômicas e culturais. Sociolinguística Variacionista As pesquisas em to1no da Variação linguística surgiram nos Estados Unidos na década de 60, pela iniciativa de Willian Labov. Para Labov (2008), um dos principais intt1itos dessa nova perspectiva é identificar, descrever e interpretar as variações da língua levando e1n consideração grupos étnicos, etários, regionais, de gênero, etc., que compõem a sociedade. Segundo Wem·eicl1, Labov & Herzog (2006), a sociolinguística enfoca a língua em seu contexto usual. Para tanto, toma-se relevante aspectos linguísticos formais, sociais e culturais quando da necessidade de investigação sobre variações e mudanças linguísticas, principalmente pela consciência de que a variação em seu uso não ocorre de 1naneira aleatória, mas sim condicionada por um arcabouço de regras organizadas pela divisão social em classes. , E possível identificar, primeiramente, dois grandes grupos: O da norma padrão, linguagem de prestígio social, regida, comumente, pelo domínio da gramática normativa, geralmente trabalhada de 1naneira intensiva nos ambientes escolares, principalmente por estar articulada, sobretudo, à ascensão social dos indivíduos; e a norma não padrão, geral1nente estigmatizada ___ 2_2 ___ ) ( Análise do Discurso por 11ão oferecer os 111esmos acessos padrão disponibiliza aos sujeitos. . " . soc1oeconom1cos que a No combate a const111ção de estigmas linguísticos, a Sociolinguística elege a diversidade linguística, que considera não só as regras da língua como, sobretudo, as relações de poder. Essa consideração é rest1ltado da ciência da língt1a enq11anto instituição social locada historica1nente e que, por isso, fi1ncio11a e1n diversos contextos situacionais. Vejamos a tirinha abaixo: ~--:io. Q41C01 INDAOCM.~ P~ Q.I N.1111 FIZ A UCÃOPICMA.l40JII Fonte: Mauricio de Sousa Produções 1 661◄ Chico Bento é um personagem cujo modo de falar difere da nonna culta padrão, já que caracteriza, em sua fala, u1na variação regional. A tirinha, para registrar esse modo de fala, reproduz a linguagem proveniente do contexto social a que ele está inserido. No diálogo com a professora ( que domina a nor1na padrão, o que lhe garante status social para exercer o cargo que ocupa) percebe1nos que o ''st1sto'' dela se deve não aos supostos ''erros'' linguísticos cometidos por Cl1ico, 1nas si1n, pela sua esperteza em se livrar da hipótese de um castigo, revelando a compreensão da professora não só do uso oral da língua, como também o do1nínio das Variações linguísticas. Análise do Disc11rso J ( ___ ~_3 ___ _ E111 relação ao Estruturalis1no, a Sociolinguística se aproxi1na dessa linha de pensa1ne11to ao, como Saussure, considerar a linguística co1110 u111 fe11ômeno social. Apesar disso, as diferenças são mais reconhecíveis. Dentre elas, o fato Sociolinguística Variacionista fazer llSO de uma reflexão diacrônica ( diferente1nente de Sal1Ssl1re) já que essa valoriza os processos sócio históricos influenciadores das mudanças da língua. Alé1n disso, diferentemente do Gerativismo, para a Sociolinguística é fundamental a coleta do maior nú111ero de dados de falantes possível em situações de fala reais, por meio de recUI·sos de áudio. Para aprofundar seus conhecimentos em torno da Sociolinguística, recomendamos os livros ''A língua de Eulália' ', bem co1no ''Preconceito linguístico'' , ambos de Marcos Bagno. ___ 24_) ( Análise do Discurso A língua enquanto objeto da linguística consequências dessa perspectiva teórica Anteriormente vimos que Saussure, considerado ''pai'' da Linguística moderna, em suas dicotomias, privilegia a língua, já que essa ''é u1n siste1na supra individual utilizado como meio de comunicação entre me1nbros da sociedade'' (COSTA, 2008, p.116). Ela se faz, para o estudioso, enquanto parte essencial da linguagem, posto que, sem ela, é i111possível conceber o contato entre indivíduos de uma mesma sociedade, daí surge seu caráter social. A fala, nesse contexto, tem um papel secundário, já que é considerada específica de cada indivíduo. Aprendemos, no decorrer dos estudos enu·e Linguística imanente e Linguística do Discurso que a língua, bem como a fala, tomam maiores amplitudes conceituais que t1ltrapassaram as concepções estabelecidas por Saussure, co11forme os estudos linguísticos foram avança11do durante o século XX, o que 11ão tira de Saussure a iniciativa ter colocado a língua como u111 dos principais objetos da linguística moderna. A partir de Saussure, muitos estudiosos debruçaram se sobre o estudo da língua. Dentre eles temos o linguista ' francês Emile Benveniste, e porque vamos enfocá-lo? A escolha por esse teórico justifica-se, pois, apesar de partir de Saussure, ele conseguiu ampliar a concepção de lí11gua por 1neio da possibilidade de análise de sua particularidade à luz de outras grandes ciê11cias, co1no a Psicologia social, Filosofia, Pragmática e a Antropologia, por exemplo. Assim, Benveniste contribuiu de maneira significativa para o legado da língua e Análise do Disc11rso J ( ___ ~_s ___ _ para consequências pos1t1vas no sentido da a1npliação desse conceito no âmbito da linguística. Va1nos conhecê-lo? Vejamos o trecho a seguir: Não atingimos nunca o homem separado da linguagem e não o ve1nos nt1nca inventando-a , [ ... ]. E um l1ome111 falando q11e encontramos no mundo, um homem falando com outro ho1ne1n, e a linguagem ensina a própria defi11ição do homem (BENVENISTE, 2005, p. 285) Ou seja, para Benveniste a linguagem é natural, compõe a nah1reza humana, portanto, é nela que se faz o st1jeito, é por meio dela que se pode emergir um ''eu'', subjetivo, consciente de sua existência. A subjetividade é, para o linguista, norte para a co1npreensão da linguage1n e, por isso, daremos ênfase a ela agora. A subjetividade da Linguagem Para compreender a concepção do l101ne1n en.quanto sujeito, Benveniste elabora uma relação dialética em que o ''eu'' cria uma interdependência com o ''tu'', chamada de ''eco''. Essa polaridade constituída toma-se a condição fundamental da linguagem, já que existe no homem para fazê-lo sujeito, na medida em que o ''eu'', marca absoluta de subjetividade, é transcendente ao ''tu'', ot1 seja, necessita de u111 h1 para estabelecer , sua existê11cia. E nesse ponto que Benveniste concebe a língua enq·uanto categoria de 1naior i1nportância enunciativa. Isso porque ''eu'' e ''tu'', pronomes pessoais existentes em todas as línguas, não existem por si mesmos, mas sim, pela atribuição de uma referência. Em outras palavras, Benveniste quis dizer que o ''eu'' não existe sozinho, há a necessidade de um outro, o ''tu'', para afirmar a existência do sujeito e vice-versa, po1ianto, é a língua, na enunciação, que concretiza a existência. Na subjetividade da linguagem os prono1nes ''eu'' e ''tu'' são essenciais. Veja1nos estacolocação de Juchem (2008, p.17): ___ 2_6 ___ ) ( Análise do Discurso Esses prono1nes, assi1n como outros indicadores autorreferenciais, diferen1 de todos outros signos linguísticos por terem con10 referência o sujeito que enuncia e a instância de discurso em que são enunciados. Eu e tu só têm referência na ''realidade do discurso'' , sendo o eu a pessoa que enuncia a instância de discurso que diz eu em referência a um tu, dada a situação de alocução. Eu e tu sofre1n u111 duplo processo: de eu referente enquanto enunciado e de eu referido enquanto tu enuncia, assim sucessivamente. Pode-se dizer que et1 e tu transitam entre os locutores nas instâncias de discurso porque se presst1põem. Po1ianto, ''eu'' e tu'', instituídos pela língua, constitue1n, por meio da ling·uage1n, o sujeito e seu interlocutor e vice-versa. Para Benveniste (2005), a subjetividade reside na ciência de que o ''eu'' só existe quando tem consciência de si por 111eio da enunciação, permitindo ao ''tu'' que esse tambétn seja ''eu'', como utn retorno. Para esclarecer essa concepção, vejamos a tirinha a segt1ir: As VEZES ME PERGUNTO l'On QtlE ESTOU AOOI. • • AsvfZES EU ME PERGUNTO A,.fESMA COIS4. ~ TN.ff!SW SE PERGUNTA POn QUE ESTÁAQUI? •--:it..:-:;;.,- --1 __._ _ _ _ • •• 1 __ ---.JJ Johnn}' TJ:ir A C Jor1u1/ clt4 Tur,le, 28 6 fl 991 Fonte: Johnn Ha.rt A. C. Jon1al da Tarde Repare que o ''eu'' e o ' 'tu'' trocam de posição durante o diálogo, e é exatamente a essa consciência subjetiva da existência de dois indivíduos por meio da língua, ou seja, eles existem por meio da linguagem. Análise do Disc11rso J ( ___ ~_7 ___ _ Além dos prono111es pessoais supraditos, Benveniste (2005) conclui que há, nas instâncias do discurso, enunciados que reme11tem ao que cha111a111os de situações objetivas, representadas pela te1·ceira pessoa, assim, ''o membro não marcado da con·elação de pessoa [ ... ] sendo o único modo de enunciação possível para as instâncias de discurso que não devam remeter a elas mesmas'' (ibid., p. 282). Exe1nplificando, existem quatro propriedades que diferenciam a terceira pessoa ''ele'', do ''eu'' e ''tu'': a) de co1nbinar com qualquer referência de objeto; b) de não refletir a instância de discurso; c) de ter u111a gra11de variação pronominal ou demonstrativa; d) de não se equiparar ao aqui-agora. Nesse contexto, o prono1ne ''ele'' ''não remete a nenhuma pessoa, porque se refere a tun objeto colocado fora da alocução. Ele só existe e se caracteriza po1· oposição a pessoa eu. (BENVEN1STE, 2005, p. 292). Até agora vimos que, para Benveniste, wna das formas de organização da língua se dá pelo par dialético eu/tu, que subjetivamente constitui sujeitos quando esses enunciam. Além do par opositivo eu/tu, Benveniste elege também, para a organização das línguas, a noção de tempo. Se é no exercício da língua qt1e encontramos sua subjetividade, logo, o tempo é presente a todo instante, posto q11e é ''O tempo e1n que se , fala''. E no presente e1n que se 1nanifesta o ''eu'' e tudo atribuído a ele. O te1npo, po1ianto, marca o aqui-agora da linguage1n. ___ 2s_) ( Análise do Disc11rso Eu Aqui/ Espaço Figura 2 - Os tempos Tu Quadro da Enunciação Fonte: Editorial Telesapiens Agora/ lempo Acima, te1nos o qt1adrinômio et1-tu-aqui-agora, representado pelo quadro da enunciação, perspectiva basilar dos estudos da língua propostos por Benveniste que veremos co1n mais profundidade a seguir. A enunciação Para Benveniste, a enunciação é definida con10 ''o colocar e111 funcionamento a língua por un1 ato individual de utilização'' (BENVENISTE, 2006, p. 82). Ou seja, enunciar é o ato de colocar a lingt1agem em funcionamento. Segt1ndo Juchem (2008, p.18), ela é vista por meio de três principais aspectos: a. o pri1neiro remete à realização vocal da língua, possível por um ato individual no interior da fala, sendo que, ne1n mesmo para o mes1110 sujeito essa realização é idêntica, ainda que sobre a mes111a experiência vivida; logo, a irrepetibilidade da enunciação ocorre até para o próprio loct1tor; b) dessa produção individual decorre o segundo aspecto, que supõe ''a conversão individual da língua em discurso'', processo definido como se1nantização da lí11gua, segundo Benve11iste Análise do Disc11rso J ( ___ ~_9 ___ _ (ibid., p. 83)11; c) a terceira abordagem pretende traçar um quadro formal da ent1nciação sob consideração do ato en1 si, as situações e os instrumentos de sua realização. Essencial para a existência da enunciação é o interlocutor: se1n ele só há ape11as uma possibilidade de língi1a, não o ato concreto. Entretanto, o interlocutor só existe se houver, da parte do locutor, uma apropriação da língua que estabelece u1n 111ovimento de referência e con·eferência, já que um pede o outro, um ''tu'', u111a via de mão dupla. E111 outras palavras, é na enunciação que o ''eu'' apropria-se da língua, concretizando-se no tempo, o presente. Para Benveniste (2006), passado e futuro não fazem parte da entmciação, pois o enunciado é sempre atualização. Assim, o tempo é sempre presente, contínuo e coextensivo, Uin aqui-agora que só existe pelo se1·. Dessa maneira, podemos entender a referência como i111portante para o ent1nciado, já que o ''eu'' se encontra no centro da língua, marcado pelo presente. Nesse âmbito, se toda língua perpassa o sujeito, toda ela tem referenciação, ou seja, todos os signos estão ligados ao ''eu'' e são, portanto, referenciais. A língua, na teo1ia da enunciação, é sempre referência, não diretamente ao mu11do, 1nas sim em relação ao sujeito com o inundo. Se a língua é referência, como, então, os signos são referenciados na enunciação? A resposta é simples. Para Benveniste há, na língua, um aparelho de ''funções'', que se adequa ao contexto comunicacional da entu1ciação. Essas ft1nções são a inti1nação, interrogação e asserção, e todas denota1n sentidos específicos de comu11icação. O quadro formal da enunciação, para Benveniste, é o eu tu-aqui-agora, considerando índices de pessoa, espaço/tempo, referindo-se, sempre, a enunciação. Flores e Teixeira (2005, p.36) esclarece que ''o aparelho formal da enunciação é uma espécie de dispositivo que as línguas têm para que possam ___ 3o_) ( Análise do Discurso ser enunciadas. Esse aparell10 nada mais é que a marcação da subjetividade na estrutura da língua''. O aparelho pode ser se1npre universal, porém, seu uso é se111pre i11dividt1al, 111es1110 que o propósito da teoria enunciativa não seja o sujeito em si, antes, as suas marcas no ato da enunciação. Te111 ctrriosidade e1n e11tender ai11da mais sobre o processo de enunciação de Benveniste? Acesse http://bit.ly/2SER7yl Colocadas as concepções de Benveniste sobre a língt1a, resta-nos a pergunta: Quais as consequências dessa perspectiva teórica? Podemos listar algu1nas, vejamos: ! Diferentemente da linguística formal, Benveniste reconhece o sujeito como pertencente ao siste1na da língua; além disso, o linguista considera a natureza da subjetividade, marcando a necessidade de reconhecer a língua enquanto instância(s) do discurso, não apenas um repertório de signos como outrora colocado por Saussure; 2. Be11veniste atribui à lli1gua o status de significação, que só se dá por vias do discurso, ou seja, na enunciação. Flores (2008, p. 12) exemplifica com clareza essa perspectiva quando , diz qt1e ''E no uso da língua que um signo tem existência; o qt1e não é usado não é signo; e fora do uso o signo não existe. Não l1á estágio intermediário; ou está na lí11gua, ou está fora da língua''; 3 Para Benveniste o foco é o sujeito, é ele quem atualiza o sistema linguístico, articulando e significa11do. Desse modo: A língua - Subjetividade Sujeito - Intersubjetividade Análise do Disc11rso J ( ___ ~_1 ___ _ (Relembra111os aqui a relação interdependente entre os pronomes pessoais ''eu'' e ''tu'') 4. Por fim, Benveniste inaugura umpensamento novo sobre a língua: A enunciação, que contribuirá, mais a frente, para os presst1postos da Análise do Discurso estudada na contemporaneidade e proposta por essa disciplina. ___ 32_) ( Análise do Discurso O discurso enquanto objeto de estudo da linguística (A análise do discurso) - consequências dessa perspectiva teórica Até então, os capítt1los anteriores propuseram tun percurso dos estudos linguísticos até que pudéssemos chegar, de maneira 1nais clara, ao ponto central de nossa disciplina: A Análise do Discurso. Va111os conhecê-la? Como vi1nos anterio11ne11te, existem 1nuitas 1naneiras de estudar a linguagem: a língua enquanto sistema de signos; as diferentes normas de linguagem (lembremos da norma culta e da variação linguística); a enunciação, dentre outras. Essa variedade expõe muitas maneiras de significar, e foi a partir dessa ciência que surgiu a Análise do Discurso. O que seria então, caro aluno (a), a Análise do Discurso? Considerada enquanto u1na teoria política de Leitura, A análise do Discurso nasce na França na década de 1960, tendo como Fundador o estudioso Michel Pêcheux. Para Orlandi (2007 p. 15) essa perspectiva, co1no seu próprio nome refere: Não tra1na a língua, não trata da gramática, embora todas essas coisas lhe interessem. Ela trata do discurso. E a palavra Discurso, etimologicamente, tem em si a ideia de curso, de percurso, de correr por, de movin1e11to. O discurso é assim palavra em movimento, prática de linguagem: com o estudo do discurso observa-se o homem falando. (Grifo nosso). Análise do Disc11rso J ( ___ ~_3 ___ _ Ou seja, a Análise do discurso, diferente de algu1nas das concepções anteriores, não trabalha com a língua na qualidade de u111 siste111a abstrato. Ela procura entender a língua enquanto sentido (s), como um trabalho simbólico, pa1ie constitutiva do homem e da história desse. Nesse âmbito, por meio dessa perspectiva surge a oportunidade de entender o qt1e faz o ho1ne1n ser o que é, compreender sua capacidade de significar e significar-se. Portanto, na Análise do Discurso a linguagem ( o disct1rso) toma-se mediadora entre o ho1nem e sua realidade individual e social. O que interessa à Análise do Discurso é o movimento: as maneiras de significar; pessoas se comunicando e trocando experiências, compreendendo sentidos, compreendendo seu lugar na sociedade, po1· 1neio da interpretação. Se o meio e1n que o discurso é produzido é significativo, vale à Análise do Disc·urso a consideração da lingt1agem à sua exterioridade. Assim, ela se 111aterializa na ideologia, Otl seja, ela te111, em parte, un1a orde1n própria ( as regras de uso, as gramáticas); e1n outra, uma relativa auto11omia ( o campo da semântica, das possibilidades de interpretação). Para compreender melhor a questão ideológica, atentemos para a charge abaixo: 1i~\\t\io Nf\ l"\f\A Fonte: Charge Tho1nate ___ 34_) ( Análise do Discurso Se analisássemos a charge acima à luz de unica1nente de seu conteúdo, lerían1os de maneira literal, e set1 objetivo (a crítica à corrupção por 111eio da sátira), não seria atingido. AAnálise do Discurso propõe olhar o texto acima unindo sentidos e contexto situacional, considerando a compreensão da ideologia que ll1e cerca: a lingt1age1n pode st1gerir 1ní1ltiplos efeitos de sentido em um único texto. Assi1n, essa perspectiva sugere interpretar as linguage11s que produzimos e que lemos/ ouvi1nos/ vemos e etc. A interpretação, nessa conjuntura, é o primeiro destaque que dare111os 110 estudo da A11álise do Discurso. A interpretação Para Orlandi (2007, p. 25), A proposta intelectual em que se situa a Análise do Discurso é marcada pelo fato de que a noção de leitt1ra é posta em suspenso. Tendo co1no fundame11tal a questão do sentido, a Análise do Discurso se constitui no espaço e111 que a Linguística tem a ver con1 a Filosofia e com as Ciê11cias Sociais. Em outras palavras, na perspectiva discursiva, a linguagem é linguagem porque faz sentido. E a linguagem só faz sentido porque se inscreve na história. Ou seja, a perspectiva discursiva e11fatiza a questão do contexto (Social, histórico, político, econômico) enquanto peça chave para haver sentido e, assim, linguagem. Nesse sentido, a interpretação ganha espaço por permitir a leitura e compreensão desses variados contextos. A Análise do Discurso, por esse viés, acaba por teorizar a interpretação, colocando-a co1no t1ma proposta de análise que não se fecha e1n si, 1nas trabalha seus 1necanismos, li1nites, co1no pa11es do processo de construção de significação. Na interpretação proposta pela perspectiva discursiva não há um Análise do Disc11rso J ( ___ ~_s ___ _ sentido verdadeiro, único, revelado por u1n método. Há, si1n, uma construção de dispositivos teóricos capazes de dar conta das mais diversas produções emergidas da lingi1agem. Para compreender como funciona a perspectiva discursiva com mais clareza, vamos agora distinguir inteligibilidade, interpretação e compreensão, unido as explicações à exemplos. Inteligibilidade A inteligibilidade faz referência ao sentido da língua. Vejamos este exemplo: ''Ela pediu esse''. Essa frase é inteligível, basta dominarmos o português para ler esse enunciado. E11tretanto, ela não pode ser interpretada, pois não conseguimos chegar à conclusão de quem era ela e/011 o que ela pediu. Interpretação Pensemos na seguinte situação hipotética: Ma1ia vai ao restaurante co111 seu noivo, Carlos, e sua amiga, Júlia. Enquanto Júlia vai ao banheiro, Maria solicita ao garçom um dos pratos do Menu. Ao voltar à mesa, Júlia perg11nta a Carlos o que Maria pediu e ele prontamente responde, indicando co1n os dedos no Menu: ''Ela pediu esse''. Pelo exemplo acima podemos perceber que a interpretação necessita de um co-texto (as outras faces do texto) e o contexto em si. Interpretando, ela é Maria e esse é o prato solicitado. Compreensão Utilizando a mesma situação hipotética, nas palavras de Carlos poderíamos compreender que Júlia pediu dete1minado prato porque gosta mais, ot1 porque pode ter alguma restrição ali1nentícia, por exe1nplo. A co1npreensão, nesse se11tido, é entender co1no um objeto simbólico (texto, pintura, enunciado, , etc.), produz sentidos. E compreender como funcionam as interpretações. Quando interpretamos já estamos presos a um sentido. Assim, a compreensão procura explicitar os processos ___ 36_) ( Análise do Disct1rso de significação presentes na situação co1nt1nicacional para que assi111 possam ser entendidos outros sentidos possíveis. Resumindo, a Análise do Discurso, para Orlandi (2007, p. 26): Visa a compreensão de como 11m objeto simbólico produz sentidos, como ele está investido de significância para e por sujeitos. Essa compreensão, por sua vez, implica explicitar como o texto organiza os gestos de interpretação que relacionam sujeito e sentido. Produzem-se assim novas práticas de leitura. Se a interpretação é um dispositivo teórico de análise da Análise do Discurso há, portanto, o analista e o 111étodo prod11zido no alcance teórico da perspectiva discursiva. Cada analista necessita fom1ular uma questão que desencadeie uma análise, e cada material de análise pede que seu analista eleja conceitos que outro analista não elegeria, criando assim conceitos diferentes de análises. Embora a teoria ilumine a análise, essa é escolhida dentre tantas pelo analista, em sua liberdade para a constn1ção de inte1-pretações. O Analista analisa e co1npreende o processo discursivo, pode11do, então, inte1-pretar seus resultados de acordo co1n os instrumentos teóricos escolhidos dos campos disciplinares dos quais ele optou. Dessa maneira, o analista do discurso desfaz a ilusão da transparência da linguagem, já que passou por um processo 1naterial de constituição e significação do (s) sujeito (s). É desse estt1do detalhado, 1netódico, teórico e principalmente interpretativo que deriva, Para Orlandi (2007,p. 28), a riqueza da Análise do Discurso ''ao pe1111itir explorar de muitas maneiras essa relação trabalhada com o simbólico, sem apagar diferenças, significando-as teoricamente.'' Nesse contexto, o que se dizemos não são apenas 1nensagens a serem decodificadas, mas sim: Análise do Disc11rso J ( ___ ~_7 ___ _ Efeitos de sentidos que são produzidos em condições determinadas e q11e estão de algu111a forma presentes no 111odo como se diz, deixa11do vestígios que o analista de discurso tem de apreender. São pistas que ele aprende a seguir para compreender sentidos aí prod11zidos, pondo em relação o dizer com sua exterioridade, suas condições de produção. Esses sentidos têm a ver com o que é dito, e com o que poderia ser dito e não foi. Desse modo, as 111arfes do dizer, do texto, também fazem parte dele. (ORLANDI, 2007, p. 30) Para compreender melhor, vejamos o exemplo a seguir: __ , ___ ., __ 1111s c1•0 N mls lnl S11 ISIISI nt •lrlà ls1a 6 .. •111!+111ra nct 11m lr • IIIISW11II Çale &N ~ ....... . ... .,. . ...... • , .-.vw....., .. ....... ...... _......,.__ ..... ... ee.a • ..,. .. , ,, 1 , ilillll ,.. .. "'4M-.,. .... ...., , e ~ w wii__..,...,....,,., .,......,.,..,,._ . -- - - - -- -------- Fonte: O estadão (Texto verbal: ' 'Mais cedo ou 1nais tarde sua esposa vai dirigir. Este é uma das razões para você possuir um Volkswagen'') Enquanto analista do Discurso, quais vestígios precisamos apreender para interpretar o anúncio aci111a? Considerando o universo dos anúncios, propagandas, não basta apenas decodificar a linguagem verbal. Há de se levar em consideração o contexto situacional; as escolhas linguísticas; o texto 11ão verbal; dentre outros. ___ 3s_) ( Análise do Disct1rso No exe111plo acima nos depara111os com u1n anúncio publicitário dos anos 60. Na época era comu111 e, inclusive, engraçado, sente11ças que 111aculasse111 a i111age111 da mulher. O texto verbal, portanto, pode ser inte1-pretado como uma ''piada'' em relação às capacidades limitadas da mulher ao fato de dirigir. A empresa, em contrapartida, oferece t11n produto que ''alivia'' a preocupação masculina, já que possuí peças baratas e fáceis de encontrar. Ou seja, o homem não precisai-ia se preocupar com n1ais esse ''proble1na'': a WV se preocupa por ele. Fica claro aqui co1110 a condição de produção de un1 discurso afeta a construção da linguagem. Se hoje, no século XXI, o mesmo anúncio publicitário fosse veiculado em jornais, revistas e internet, muito provavelmente seria tachado como machista e anacrônico, e a e1npresa sofrei-ia as represálias cabíveis. Po1ianto, as condições de produção e Interdisctrrso são de grande significado para o analista do discurso e, mais a1nplamente, para a A11álise do Discurso em geral. Assin1, cabe nos agora aprofundar essas perspectivas. Condições de produção e interdiscurso Para Orlandi (2007), as condições de produção compreende1n sujeitos, situação e a memória. Essa í1ltima, inclusive, bastante significativa, como veremos mais à frente. As condições de produção, para a autora, consideram duas circunstâncias: o contexto imediato e o contexto sócio histórico, ideológico. No últi1no exen1plo que apresentamos ( o caso do fusca da Volkswagen), o contexto imediato é o ''simples'' anúncio de um carro e a sugestão de que esse é resistente e acessível e, por isso, deve ser comprado. Já o contexto amplo é o que revela efeitos de sentidos inerentes do funcionamento da nossa sociedade, co1no por exemplo o mercado automobilístico e a antiga cultura de que veículos eram desti11ados a ho1nens, já que à 111·ulher destinava-se o lar. Nas entrelinhas, observa1nos que a suposta aceitação de uma 1nulher dirigindo, reação lenta do Feminismo no decorrer do século XX, vem transvestida do Análise do Disc11rso J ( ___ ~_9 ___ _ 1nachismo que rei11ava co1n todas as forças naquele contexto e1n particular. O anúncio, assim, revela um posiciona1nento sócio histórico social comu1n à época e111 que fora publicado. , E aqui que o conceito de memória ganha forças quando pensada em relação ao discurso. No contexto teórico da Análise do Discurso, inclusive, podemos chamá-la de Interdiscurso: Definido co1no aqt1ilo que fala antes, em outro lugar, independente1nente. Ou seja, é o que cha1na1nos de memória disct1rsiva: o saber discursivo que torna possível todo dizer e que retorna sob a for1na do pré const1uído, o já-dito que está na base do dizível, sustentando cada palavra. (ORLANDI, 2007, p.31) Ora, só conseguimos, l1oje, interpretar de maneira significativa o anúncio produzido 110 século XX graças a 11ossa 1nemória discursiva: o discurso do 1nacllis1no não é novo, é U1n já-dito não só naquela época, co1110 se perpetua na nossa. Lá nos anos 60, o texto verbal anU11ciava uma forma de pensa111ento traduzida discursivamente que antecede sua produção. Assim, o texto a que tivemos contato caracteriza-se como um interdiscurso, um conj11nto de formulações já existentes sócio historicamente que se traduzem em um novo texto. Assi1n como a interdiscursividade, enq·uanto me1nória, nos faz considerar acontecimentos passados con10 matéria para os novos, també111 é esqueci111ento, outro aspecto importante da Análise do Discurso que conheceremos agora. Quer saber mais sobre a interdiscursividade na Análise do Discurso? Acesse ao vídeo ''Interdiscurso e memória discursiva'', disponível no Youtube por meio do Link: http://bit.ly/2HBguuK ___ 4o_) ( Análise do Discurso Para Pêcheux (1975) existem dois tipos de esqueci1nento no discurso, são eles: 1. O esquecimento número dois, da ordem da enunciação: Ao falannos se1npre opta1nos por uma forma e não outra. No entanto, o que dizemos se1npre poderia se dito de outra maneira, com outras escolhas linguísticas. Ao falarmos ''Feliz'', podería1nos ter optado por ''alegre'' ou ''co11tente'', por exemplo. Entretanto, nós ne1n sempre temos consciência disso. Este ''esquecimento'' é pai·cial, semiconsciente, que exemplifica que o modo de dizer tudo tem a ver com os sentidos. 2 O ideológico: . , . esqt1ec1mento numero um, ou esquecimento Instância do inconsciente, é resultante do modo como so1nos afetados ideologicamente. Por ele temos, quando elabora1nos um discurso, a ilusão de se1mos 01;ginais, os prin1eit·os a dizer/ escrever/falar, etc. No entanto, quando nasce1nos, os discursos já estão e1n processo, apenas entramos no movimento. Na verdade, a língua se materializa em nós e o esquecimento é, voluntariamente, uma necessidade para que a linguagem funcione na prod·ução de sentidos e st1jeitos: retomando palavras já existentes co1no se fosse1n deles e, assim, 1novimenta11do as possibilidades da linguagen1. Análise do Disc11rso J (_4_1 __ _ Outros aspectos relevantes à análise do discurso Ao té1111ino deste capítulo você será capaz de entender e aplicar as técnicas e métodos necessários para a implementação de projetos em HCD, ou seja, projetos de desenvolvi1nento de produtos centrados no humano. Além dos aspectos supraditos, outros se fazem importantes para uma compreensão mais completa em relação à análise do Discurso, são eles: Paráfrase e Polissemia; Formação Discursiva e Ideologia e sujeito. Ire1nos, agora, vê-los um por um, antes de concluinnos nosso estudo. ■ Paráfrase e Polisse111ia Quando pensamos a linguagem de maneira discursiva, é itnpossível dissociar essa compreensão da tensão entre processos parafrásticos e polissêmicos. Para Orlandi (2007, p.36): Os processos parafrásticos são aqueles pelos quais em todo dizer há se1npre algo que se manté1n, isto é, o dizível, a 1nemória. A paráfrase representa assi111 o retorno aos mesmos espaços do dizer. Produzem-se diferentes formulações do mesmo dizer sedimentado. A paráfrase está do lado da estabilização. Ao passo q11e, a polissemia, o q11e temos é deslocamento, ruptura com os processos de significação. Ela joga com o eq11ívoco. Ou seja, se1npre falamos algo dito,porém, pela polissemia, , esse algo dito se transfo1111a em outro. E assim que os sujeitos ___ 42_) ( Análise do Discurso (re) significa111 e (se) significa1n a todo instante. Dessa maneira, acaba1nos por concluir que a incompletude é condição para a linguage111: os discursos (sujeitos e sentidos) já estão prontos, contudo, eles estão sempre se refazendo, em um movimento constante da histó1ia e do simbólico. F armação Discursiva A noção de F armação Discursiva é basilar na Análise do Discurso, e o porquê é si1nples: é ela que permite entender o processo de produção de sentidos e sua relação com as questões ideológicas. A f armação disct1rsiva é definida por meio de t1ma formação ideológica dada, ou seja, a partir de um contexto sócio histórico dado, qt1e define o q11e pode e/ou deve ser dito. Para compree11de11nos 1nell1or como isso funciona, prestemos atenção nos dois pontos a seguir: a O discurso se constitui em seus sentidos: Isoladas, as palavras não possuem sentido nelas mesmas, é necessária uma conjuntl1ra na qt1al o sujeito se insere em t1ma dada formação discursiva e não em outra, para atingir t1m sentido ao invés de outro. Ou seja, as fo1mações ideológicas são representadas pelas f armações discursivas que as inscrevem. Daí ven1 o peso da ideologia. Para Orlandi (2007p. 43): Os sentidos se111pre são determinados ideologicamente. Não há sentido que não o seja. Tudo o que dizemos tem, pois, u1n traço ideológico em relação a outros traços ideológicos. E isto não está na essência das palavras 1nas na discursividade, isto é, na maneira como, no discurso, a ideologia produz efeitos, materializando-se 11ele. O estudo do discurso explicita a maneira como a linguagem e ideologia se articula1n, se afetam em sua relação , reciproca. Análise do Disc11rso J ( ___ 4_3 ___ _ Ou seja, todas as nossas escoll1as discursivas, tudo o que falamos ou escreve111os, a maneira con10 nos posicionamos, sempre estará co1Telacionada a uma dete11.11inada ideologia. As ideologias regem, portanto, nossas formações discursivas. b Os diferentes sentidos são assimilados pela referência a uma formação discursiva: As palavras, 1nes1no sendo iguais, podem significar coisas diferentes dependendo da formação disctrrsiva e1n que estão. Por exemplo, a palavra ''Floresta'' não significa a mesma coisa para um produtor rural, para um índio ou um cidadão. Além disso, alterada sua letra inicial entre maiúscula e minúscula, podemos obter novos sentidos. O analista do discurso, aqui, tem papel fu11da1nental para a co1npreensão: ele precisa observar as condições de produção do texto, verificando sempre o funciona111ento da me1nória; além disso, ele necessita verificar o porquê dessa formação discu1·siva (ao invés de outra), para assimilar os sentidos ali presentes. Para Orlandi (2007), o sentido que, na verdade, é efeito ideológico, não nos deixa perceber, e1n uma primeira análise, set1 fundo material, histórico. Porém, todo s11jeito, carregado de ideologia traz, obviamente, uma l1istoricidade e1n construção que aliinenta essa mesma ideologia. Assin1, Ideologia e sujeito caminham juntos e, por isso, a pa1iir de agora, caro aluno, iremos conhecer um pouco mais sobre esses dois princípios importantes à Análise do Discurso. ■ Ideologia e Sujeito , E interessante perceber como a Análise do Discurso ressignifica a noção de ideologia por meio dos estudos da linguagem. Dessa fonna, a ideologia passa a ser definida ideologicamente e é isso que veremos a seguir. Segundo Orlandi (2007, p.44), o fato de que não há sentido sem o 1novimento de interpretação evidencia a presença da ideologia. Sempre, e1n contato com um objeto simbólico, há no ___ 44_) ( Análise do Discurso home111 a 1notivação para se perguntar: ''o que isso quer dizer?''. Nesse contexto, no ato de interpretar o sentido surge con10 evidê11cia, co1110 se ele sempre tivesse estado lá. O trabalho da ideologia, nesse contexto, é colocar o homem em uma relação imaginária com suas condições existenciais e materiais. A ideologia, portanto, passa a ser condição para a constituição de sujeitos e sentidos. Para Orlandi (2007, p.46): O indivíduo é interpelado em sujeito pela ideologia para que se produza o dizer. Partindo da afirmação de que a ideologia e o inconsciente são estruturas-funcionamentos, M Pêcheux diz que sua característica comum é a de assimilar sua existência no interior do seu próprio funcionamento, produzindo um tecido de evidências ''subjetivas'', entendendo ''subjetivas'' ( ... ) co1110 ''nas quais se constitui o sujeito." Assim, a subjetividade, enquanto constituinte do sujeito, está para a ideologia do que ele pretende dizer. Entretanto, ao se colocar enquanto sujeito, muitas vezes o homem apaga o fato de que é interpelado pela ideologia. Esse apaga1nento já nos foi colocado aci1na: o l1omem acredita estar dizendo algo novo, nunca antes pronunciado. Para o analista, nesse sentido, entender ideologia enquanto relação necessária entre mundo é linguagem é fundamental. E11quanto analistas, pode1nos nos perg11ntar: Como a ideologia atua na cl1arge abaixo? Análise do Disc11rso J ( ___ 4_5 ___ _ OI, MIGU&l.l'TOt COIS-' 80A NA TV ? __- AC'AIM;l OE l.l~AR MAS PAR6Ce Q\JE se vo~ PASSA 0Es::>DORANT6, DEPOIS COME SAI.SICHAS li AÍ COMPRA. UMA I.\A'QUINA pe I.AYAA ROUPAS, SÓ NJI::> f f'El.1% SE FOR MUITO IDIO'TA Fonte: Charge Mafalda Considerando o ''esqueci1nento'', para nós, enquanto sujeitos, a resposta de Miguelito poderia ser inocentemente a co1npreensão de u1n todo 01iginal, ''novo'' do que está passando na TV. Entretanto, a charge acima ultrapassa esses lilnites ao ii·o11izar a ideia de felicidade vendida nas propagandas e programas de TV. Nesse sentido, a formação discursiva, se analisada por esse viés, revela 11m sentido novo pertencente a 11ma ideologia do1ninante nos dias atuais que está aparente1nente velado na resposta do personagem: O consumo, incentivado co1no gerador de felicidade em nossa sociedade capitalista das mais diversas fonnas. Para Orlandi (2007, p.47) o sentido, , E assim uma relação determinada pelo sujeito-, afetado pela língua- com a história. E o gesto da interpretação que realiza essa relação do s11jeito com a língua, com a histó1·ia, com os sentidos. Esta ___ 46_) ( Análise do Disct1rso é a 1narca da subjetivação e, ao 1nes1no tempo, o traço de relação da líng11a co111 a exterioridade: não l1á discurso sem sujeito. E não há sujeito sen1 ideologia. Nós, enquanto sujeitos, somos fo1mados pela ideologia e história que nos cerca, e esses dois elementos são, mesmo que inconscientemente, norteadores do 11osso discurso. Muitas vezes é só pela interpretação, na busca pelo sentido do que dissemos, fala111os ou agimos, que compreenden1os a ( s) origen1 ( s) daquele discurso. Por fim, é importante esclarecer que o trabalho com a ideologia é um trabalho baseado na memória-esqueci111ento. , E j11sta1nente o esq11ecin1ento q11e inativa a il11minação de qualquer discurso proposto. No pensar, por exe1nplo: ''Por que ':ft1lano' se colocou dessa fo11na?''; ''Por que eu me posicionei dessa maneira''? temos o primeiro passo para a investigação da fo1111ação discursiva de dete11ninado contexto, cl1ega11do às conclusões ideológicas na consttução de sentidos. Após essa produtiva imersão teórica em relação à Análise do Discurso, nos perguntamos: Q11ais as consequências dessa perspectiva teórica? Ire1nos, agora, indicar algwnas: 1 AAnálise do discurso, ao unir campos de conhecimento, rompe suas fronteil·as e elege um novo recorte de disciplinas, constituindo um novo objeto de estudo: o discurso; 2. Para a Análise do Disctrrso, não há apenas trans1nissão de informação, muito menos linearidade nos ele1nentos comunicacionais. Para ela, a língua não é apenas 111n 1nero código, e1n que se separa e1nissor e receptor; em que u1n fala e outro, na sequência, decodifica. Não há transnússãode informação apenas, há um co1nplexo processo de formulação de sujeitos que produzem constantemente sentidos; 3. A líng11a, para a Análise do Discurso, tem s11a ordem própria, porém, é relativa1nente autônoma; Análise do Disc11rso J ( ___ 4_7 ___ _ 4. Na perspectiva discursiva, o sujeito da linguagem se constitui enquanto descentralizado, pois é afetado pelo real da língua, bem co1no o real da história, e o modo como essas o afetam não pode ser controlado por ele. Isso possibilita concluir que o sujeito discursivo age pela ideologia e inconsciente; 5. Por fim, pode1nos concll1ir ql1e na Análise do Discurso ''E1n seu quadro teórico, nem o discurso é visto como uma liberdade em ato, totalmente sem condiciona11tes linguísticos ( ... ) ne111 a língua co1no fechada em si n1es1na, sem falhas ou eqt1ívocos." (ORLANDI, 2007, 22). A língua, assi111, sempre será condição para a oportunidade do discurso. Análise do Disc11rso J ( ___ 4_9 ___ _ ___ so_J ( Análise do Discurso -- INTRODU AO Você sabia que a área da Linguística é u1na das mais importantes para o conl1ecime11to da Língua? Já tive111os um conhecimento introdutório desse conteí1do na unidade anterior. Nesta, daremos ênfase às grandes perspectivas e teorias que fundamentam a Análise do Discurso, tendo a opo1·tunidade, ao final do estudo, de compreender como essa perspectiva da Ling11ística funciona, e co1no ela é estudada por diversos filósofos/ pesquisadores. A segt1nda u11idade to1na-se um preparativo para os estudos aprofundados da Análise do Discurso que virão adiante, já que parte das noções de Enunciação, pragmática, argU1ne11tação e discurso, até chegar àAnálise crítica do Discurso. Ao longo desta unidade letiva você vai 1nergulhar nesse universo ! Análise do Disc11rso J ( ___ s_1 ___ _ OBJETIVOS Olá. Seja muito bem-vindo a nossa Unidade 2. Nesta unidade, o nosso objetivo é auxiliá-lo 110 desenvolvimento das seguintes competências profissionais: Compreender como fiincionam os critérios de Enunciação, pragmática, argumentação e discurso; Entender as perspectivas teóricas q11e penneiam o estudo da (s) ideologia (s) dentro do u11iverso da ciência da linguagem; Conceber as vertentes da Análise do Discm·so, a saber: a linha americana, bem como a linha francesa; Investigar como surgiu e Análise Critica do Discurso e co1no ela funciona e11quanto colaboradora para a visão critica dos discursos ideologicamente produzidos na sociedade, principalmente aqueles que oprimem sujeitos. E11tão? Está preparado para uma viagem sem volta rumo ao conhecimento? Ao t1·abalho! ___ s2_) ( Análise do Discurso Enunciação, Pragmática, Argumentação, Discurso Caro aluno (a), ao tén11ino deste capítulo você será capaz compreender as diversas vertentes que embasa1n a Análise do Discurso, além de entrar em contato com as linhas de Análise tanto americana, quanto francesa. Isso será ft.1ndamental para a compreensão de uma das grandes correntes de estudo do curso de Letras, responsável por grande parte das pesquisas na área, bem como contribuirá para exercício de sua docência e111 sala de at1la. E então? Motivado para desenvolver essa competência? Vamos lá. Avante! Enunciação Olá, alt1nos (as)! Ainda na unidade I tivemos a oporh1nidade de conhecer de 1naneira introdutória a teoria da Enunciação. Va1nos relembrá-la? A teoria da Enunciação, proposta por Benveniste, baseia se, resu1nidamente, nos quatro pontos abaixo colocados: 1 • Reconhece o sistema da língua enquanto uma instância do discurso. Nesse sistema, sujeito e subjetividade são significativos; 2. A significação da língua só se dá por meio do discurso, ou seja, por 1neio da enunciação desse; 3 O sujeito, na teoria da Enunciação, é o foco: Ele é quem atualiza o sistema linguístico, articulando e significando; Análise do Disc11rso J ( ___ s_3 ___ _ 4. O quadro formal da ent1nciação é o eu-tu-aqui-agora, considerando índices de pessoa, espaço/tempo, referindo-se, sempre, a ent1nciação. A subjetividade, enquanto aparelho formal da Enunciação, é semp1·e universal (todos nós temos), porém, set1 uso é sempre individual, mesmo que o propósito da . . . - . . . . teoria ent1nc1at1va nao seJa o st1Je1to em s1, antes, as suas marcas no ato da enunciação. Revisadas as características básicas da Enu11ciação, partiren1os agora para a compreensão de co1no ela funciona de11tro do universo da Análise do Discurso, 111ais especificamente em relação à argumentação, ou seja, à Semântica da Enunciação. Para a se111ântica fon11al, a verdade está fora da li11guage111, nesse sentido, a língua seria apenas um meio para alcançá-la. Esse conceito é fundamental para entender a Semântica da Enunciação, posto qt1e, para essa ''A linguagem constitui o mundo, por isso não é possível sair fora dela'' (OLIVEIRA, 2006, p .19). ■ Por que será, então, que a Semântica formal coloca os sentidos como sendo exteriores à língua? Geralmente, quando falamos ou escrevemos usamos te1n1os dêiticos, ou seja, que faze111 referência a algo externo ao discurso. Como por exemplo te1nos os pronomes isto, eu, você, etc. Esses geralmente passam a ilusão de que estamos nos referindo a algo externo à língua. ___ 54_) ( Análise do Discurso Quer saber mais sobre a dêixis linguística? Acesse o vídeo http://bit.ly/2vGcQNE. Disponível no Yot1tt1be. E11tretanto, se111pre estamos nela e por/para ela. Veja1nos como Oliveira (2002, p.20) esclarece essa perspectiva: A semântica Formal, diz Ducrot, cai na ilusão, criada pela própria linguagem, de que ela se refere a algo externo a ela mesma, de onde ela retira a sua st1stentação. A linguagem, afirma Ducrot, é t11n jogo de argumentação e11redado em si 111es1110; não fala1nos sobre o 1nu11do, falamos para construir um mundo e a partir dele tentar convencer nosso interlocutor da nossa verdade, verdade criada pelas e nas nossas interlocuções. A verdade deixa, pois, de ser t1m atributo do mundo e passa a ser relativa à comunidade que se forma na argumentação. Assim, a linguage1n é u1na dialogia, ou melhor, uma ''argumentalogia'', não fala111os para trocar informações sobre o 111undo, n1as para convencer o outro a entrar no 11osso jogo discursivo, para convencê-lo de nossa verdade. Ou seja, a linguagem é constitt1ída no diálogo, na busca, por meio da construção de argt1mentos, de inserir o outro, o interlocutor, 110 nosso inundo, 11a 11ossa verdade. Para as atuais concepções da Semântica da E11unciação, um enunciado é construído por diversos enunciadores que, concomitantemente, formam o espaço discursivo pelo qual o diálogo vai se desenvolver. Análise do Disc11rso J ( ___ s_s ___ _ Veja1nos o enunciado abaixo: (Considere os El, E2, e E3, enquanto ent1nciadores. O governador de São Paulo é Sociólogo E 1 : Há um e apenas uma pessoa. E2: Esta pessoa é um governador. E3: Esta pessoa é um sociólogo. No enunciado em negrito comprometemos nosso ot1vinte cotn o fato de que existe um único governador para São Paulo. Esse enunciado é polifônico (gera vários enunciadores) posto que encerra várias vozes. Acima temos um diálogo entre enunciadores, que pode gerar diálogos por n1eio, por exemplo, de negações polêtnicas ou metalinguísticas. Se negamos o El, estamos concretizando uma negação polêmica, mas ele pode negar o posto, portanto, dentro de 11m contexto pode fazer sentido; se negamos o E3, temos u1na negação metalinguística. Vejamos outro exemplo: Maria parou de fumar E 1: Maria fumava. E2: Maria não fuma mais. Essa seg11nda enunciação traz 11m enunciador que afirma que 1na1-ia fu1nava, tratando-se de um pressuposto, e outro que afirma que ela não fuma mais, concretizando o posto. Ao negar111os a fala do primeiro enunciador, faremos uma negação polêmica; se negamos o que está posto, faremos uma negação metalinguística. ___ 56_) ( Análise do Discurso Assi1n, para a Semâ11tica da Enu11ciação, as diferentes leituras explica111-sepela polissemia, ou seja, 11m 111esn10 enunciado que pode gerar 111últiplos sentidos, 111as que se correlacionam. Sobre os tipos de negação, vejamos esse outro enunciado: Imagine que alguém diz que sua bicicleta está estacionada em lugar errado, assim, você pode responder: Não, minha bicicleta não está estacionada em lugar errado (porque eu não tenho bicicleta). Nesse caso, você estaria fazendo uma negação polêmica, já que está negando o q11adro linguístico formado pelo se11 interlocutor, ou seja, nego o enunciador que acredita que a bicicleta seja sua. Imagine agora que dessa vez você tem bicicleta: Não, minha bicicleta não está estacionada em lugar errado (Porque está no lugar certo). Nessa situação temos uma negação metalinguística: o locutor retoma a fala do interlocutor, que coloca que a bicicleta está no lugar errado, para negá-la. Ducrot 1979, ainda evidencia um terceiro tipo de negação, a descritiva. Nesse tipo o locutor descreve u1n estado de ser negativamente, ou seja, na sua enunciação não há outro enunciador que o negue. Como exemplo, temos: Não há sol hoje. Podemos observar que não há reto1nada da fala do outro, 1nas a apresentação negativa de u1na descrição. Assim, a negação é, ''pois, um fenômeno de polisse1nia que, como dissemos, define se por ide11tificar usos distintos não relacionados'' (OLIVEIRA, 2006, p. 31 ). Já e1n relação a diferença de significados produzidos pelos variados tipos de enunciados te1npos, na lingt1ística, o q11e Análise do Disc11rso J ( ___ s_7 ___ _ chama1nos de Prag1nática, próxi1no ponto a ser estudado nessa unidade. Pragmática Caro aluno ( a), para esclarecer os diferentes significados que pode111 ser gerados pelos enunciados, o que co11cretiza o que chamamos de Pragmática, José Luiz Fiorin, em ''Pragmática'' (2007), utiliza um dos interessantes trechos de ''As aventuras de Alice'', de Lewis Carroll. Vejamos: -Veja, agora a senhora está bem nielhor! Mas, francamente, acho qite a senhora devia ter uma dama de companhia! -Aceito-a com todo pr·azer! - Disse a Rainha. - Dois pe,ice por semanas e doces todos os outros dias. Alice não pôde deixar de r·i1~ enquanto respondia: Não estou me candidata1ido.. . e não , gosto tanto assim de doces. - E doce de muito boa qitalidade- Afirmou a Rainha. -Bom, hoje, pelo menos, não estou querendo. -Hoje você não poderia ter, ne1n pelo nienos nem pelo mais- Disse a Rainha. - A regra é: doce amanhã e doce ontem - e nitnca doce hoje. - Algumas vezes tem de ser ''doce hoje''- Objetou Alice. - Não, não pode Disse a Rainha. Tem de ser senipre doce todos os outros dias; ora, o dia de hoje não é outro dia qualquer, como você sabe. Pa1·a Fiorin (2007), Alice e a Rainha discutem, nesse trecho, sobre o sentido de palavras como hoje e outro. Para elucidar a questão dos diferentes significados de um discurso, o at1tor elege a palavra hoje. Para a Rainha, o significado das palavras onte1n, hoje e amanhã são fixos. Nesse caso, se a reg1·a é doce onte1n e amanl1ã, Alice não poderá nunca comer doces, já que está sempre no hoje. Já Alice entende que o sentido das ___ ss_) ( Análise do Discurso palavras em 11egrito está relacio11ado ao ato de produção de um enunciado e, assi1n, por vezes há de ser ''ten1 de ser doce hoje'', já que l1oje é o dia em que o ent1nciado é pronunciado. Para Alice, segundo Fiorin (2007), o termo hoje se concretiza 11a , relação com a situação de comunicação. E por 1neio dela que o significado dessa palavra pode ser inteiramente comp1·eendido. Buscando uma análise pragmática eficiente, a consciência do enunciado ( estudado anteriormente) enqt1anto uma realização linguística concreta é fundamental. Se considerado a teoria do Enunciado, há de fazermos jus a ciência de que 11un1a situação de comunicação existe: eu/tu; espaço ( advérbios de lugar e prono1nes demonstrativos co1no aqui, este, lá, esse); marcadores de tempo, co1no exemplo os termos l1oje e ontem. Inclusive, tlm dêitico como esses só pode ser entendido dentro da situação de comt1nicação, assim, a pragmática parte do entmciado em direção ao lugar 110 qual esse foi ou está sendo produzido. Observe o enunciado: Anteontem andei muito por aqui. Só pelo enunciado não dá para saber o sentido, por exemplo, do anteontem, do eu e do aqui: é necessário conhecer a situação comunicacional para poder encontrar os sentidos dos enunciados, principalmente, os que fazem uso de tennos dêiticos, como o acima exemplificado. Surge, então, a pergunta: de maneira prática, con10 pode111os, enqua11to analistas do discurso, fazer uma análise pragmática? Análise do Disc11rso J ( ___ s_9 ___ _ Para Benveniste (1966), existem três categorias relacionadas ao Enunciado que são fundamentais para uma análise prag1nática, são elas: A pessoa, O tempo e o Espaço. Vejamos cada uma, agora, de maneira detalhada: ■ Apessoa: Para Benveniste ( 1966) as três pessoas do disctrrso não possuem o 1nes1no estatuto. Há semelhanças e11tre o eu e o tu, já que são sempre os participantes da comunicação. Entretanto, o ele pode ser qualquer ser ou não designar nenhum. Além disso, enquanto que entre o eu e tu há reversibilidade ( quando você fala com alguém, ela é o tu, quando ele te responde, você passa a ser o tu e ela, o eu), para o ele isso é impossível. , E i1nportante entender que: ''é a situação de enunciação que especifica o que é pessoa e o que não é pessoa ( .. . ) Chamare1nos, então, de pessoa enu11ciativa aquelas que participam do ato de comunicação." (FIORIN, 2007, p. 164). ■ O tempo: O te1npo da língt1a é diferente do tempo cronológico e/ ou fisico: ele é ligado ao exercício da fala, ou seja, o agora é reinventado a cada enunciado, e cada ato de fala constitui um novo tempo. Dessa maneira, Fio1in (2007, p. 167) dete1mina a análise do tempo do enu11ciado considerando: ME- Mo1nento da enunciação; MR-Momento de referência (presente, passado, futuro); MA- Momento do acontecimento (Concomitante, anterior, posterior, etc., a cada momento de referência). O tempo é, ' 'pois, a categoria linguística que marca se um acontecimento é concomitante, anterior ou posterior a cada um dos momentos de referência (presente, passado e futuro), ___ 60_) ( Análise do Discurso estabelecidos e1n função do mo1nento da e11unciação''. (FIORIN, 2007, p. 167) O espaço Para Fiorin (2007), o espaço lingtiístico se ordena por meio do tempo (hic ), ou seja, o lugar do eu/tu (ego). Tudo é assim localizado, sem que haja necessariamente 11ma i1nportância para seu lugar fisico no inundo, isso, pois 1nais importante é aquele que os situa, já q·ue se toma centro da referência de localização. Pai·a observamos o espaço, precisamos atentar para os pronomes demonstrativos e alguns advérbios de lugar, considerando qtie esses, por vezes, são dêiticos. A atenção dada ao espaço, tempo e pessoa, unidas à consideração dos contextos do enunciado, ( entenda, po1· exemplo, a importância de compreender os dêiticos para significar o discurso, algo já discutido acima!) co11cretizam o que chamamos de Análise pragmática das categorias discursivas. Essas, por consequência, podem constituir a argumentação, algo que entenderemos com mais clareza a partir do próximo tópico. Argumentação A Argumentação para a linguística foi teorizada pelos franceses Jean-Claude Anscombre e Oswald Ducrot. Para esses, considerando ainda que a língua ft1nciona dentro dela 1nesma, sem a i11fluência de ele1nentos exteriores, todo o uso da linguage1n é argumentativo, ou seja, direciona e/ou projeta de maneira ideológica o seguimento do discurso. Pai·a compreender melhor a Teoria da Argumentação, vejamos como essa se deu por1neio de fases, qtie listare1nos abaixo: ■ 1 ª fase: Articulação de enunciados Nessa fase, os teóricos da Argumentação, segundo Grácio (2015), debruçaram-se sobre as chamadas ''palavras vazias'', as que utiliza111os para conectar enunciados, como por exe1nploAnálise do Disc11rso J ( ___ 6_1 ___ _ os conectores logo, mas, po1ianto, no entanto, etc. A eles foi atribuída uma valência argumentativa devido sua capacidade de linguistican1ente co11dicionar o discurso. Para entender melhor como funciona, observemos os enunciados abaixo: (1) Esse restaurante é bom, mas caro. (O operador argumentativo <mas> remete de maneil·a expectável a sequê11cia do discurso lógico <não vamos>. A argumentação, portanto, está na língua) ■ 2a fase: Uso das palavras como ''Topai'': Considerando ainda o exe1nplo acima citado, observemos o próprio t1so da palavra, no caso <caro>. A escolha dessa palavra, nessa segunda fase, é desde o p1mcípio argumentativa, já que classifica e, consequente1nente, significa, algo ou alguém. Ou seja, a interpretação parte não só da escolha dos conectores co1110 ta111bém da opção por esta ou aquela palavra que f armará o enunciado. ■ 3ª fase: Teoria dos blocos semânticos: Obse1-vemos o segt1inte enunciado: Você dirige depressa, corres o risco de sofrer um acidente Acima, podemos perceber que há um encadeamento discursivo: o primeiro enunciado <você dirige depressa> gera concomitante1nente t11na conclusão <corres do risco de sofrer um acidente>. A possibilidade de encadeamento parte da conexão entre preposições, que articulam blocos. ___ 62_) ( Análise do Discurso Discurso Uma questão importante que une as três teorias acima trabalhadas - a lembrar: O Enunciado, a pragmática e a Argumentação - é a questão da língua por ela mesma, ou seja, não há uma relação exterior, seus significados se encontram dentro dela. Figura 1 Fonte: Freepik ■ Por que lembrar dessa concepção em particular é importante? Porque, para ingressarmos de maneira completa na Análise do Disc11rso, percebere1nos que os estudos em tomo do discurso darão uma nova ênfase a essa anterior concepção: enunciados e interpretações ultrapassarão os limites do texto para ganhar possibilidades interpretativas na 111ate1ialidade histórica. Como colocado aciina, para a teoria do Discurso o sistema , linguístico por si só não ence1Ta significados da linguagem. E preciso, para além do sistema da língua, observar seu exterior, a história. Orlandi (1998), incl11sive, observa que uma das tarefas do analista do discurso é compree11der a relação proposta entre real da língua x real da história, ou seja, a produção de sentidos parte da relação entre história e sujeito. A Perspectiva discursiva, nesse sentido, para Orlandi (1998) considera a língua como uma estrutura que é regida por leis internas, que se soma aos acontecimentos circ·unscritos na Análise do Disc11rso J ( ___ 6_3 ___ _ história. Assim, o discurso materializa-se na língua. F oucault (2004) nessa conjuntura, amplia a teoria da Enunciação ao pensar que os enunciados são pronunciados e111 um determinado te111po histórico, considerando, aqui, a posição que o sujeito assumiu e o domínio de determinado conhecimento para produzir determinado en11nciado. Obse1-vemos abaixo o poema ''A rosa de Hirosl1ima'', do poeta e co1npositor Vinicius de Morais: Penseni nas crianças Mudas telepáticas Pensem nas meninas Cegas inexatas Pensem nas mulheres Rotas alteradas Pensem nas feridas Co,no rosas cálidas Mas oh não se esqueçam Da rosa da rosa Da rosa de Hiroshima A rosa hereditária A rosa radioativa Estúpida e inválida A rosa com ci,,.rose A antirrosa atômica Sem cor sem perfu,ne Sem rosa sem nada. Considerando a Teoria do Disc1rrso, o poe1na acima, para Foucault (2004) poderia ser concebido co1no um constructo de fatores sociais, históricos e institucionais. Para que esse discurso produzido por Vinícius pudesse ser enunciado, existiu uma força histórica agindo sobre ele. ___ 64_) ( Análise do Discurso Adaptemos a propositura Foucaultiana: Por que esse poe111a só surgit1 agora e por que não teria surgido outro em set1 lugar? Araújo (2008, p. 220) afirma que: ''[ ... ] para a história das ideias importa o que disse um sujeito, com suas intenções, ou mesmo com o jogo do inconsciente, de modo que é preciso resgatar st1a palavra, set1 texto, como interpretá-lo correta1nente." Assi1n, no poe1na em questão, Rosa de Hirosl1i1na só poderia ter surgido pela motivação histórica pela qual sofreu Vinícius de Morais, que estava inserido no mo111ento histórico do fim da Segunda Guerra Mt1ndial, e111 que o Estado Unido deu um ''Golpe de Misericórdia'' no Japão enviando duas bombas atômicas de proporções catastróficas (metaforizadas pela figura da ''rosa'', no poema). I11tencionalmente, o eu-lírico, para a Teoria do Discurso, utiliza do jogo dos enu11ciados unido à l1istória, assim: para o contexto do ano de 1945 o poe111a produzido por Vinícius é completo: Significa um ato de protesto às atrocidades da guen·a. Dessa maneira, faz sentido Foucault (2004) afirmar que criar enunciados em dado contexto é ver como as práticas discursivas agem para produzir dizeres; é entender como surgit1 a possibilidade de aparecerem detenninados dizeres em de1narcadas épocas. Até aqui vin1os que as teorias da Enunciação, Prag1nática e Argumentação são impo1iantes conceitos chave para embasar a teoria do Discurso, que amplia questões centrais a perspectiva da lingt1agem não só como elaborada e1n si mesma, 1nas também como u1n conjunto de fatores sociais, culturais e históricos, que permeia1n os ent1nciados prodt1zidos. Análise do Disc11rso J (_6_5 __ _ Perspectivas teóricas (Significado de Ideologia) segundo: Althusser, Ricoeur, Foucault, Pêcheux Esclarecidas as questões em relação ao foco da Teoria do discurso, 1nergulharemos agora, caro aluno (a), em um dos quesitos importantes na produção do discurso, que possui diversas perspectivas de abordagem pelos grandes estudiosos da linguagem: A ideologia. Esse conhecimento foi visto superficialmente na nossa Unidade I, agora teremos a oporh1nidade de conhecer de maneira aproft.1ndada como as ideologias funcionam. Me acompanham nessa empreitada? A ideologia segundo Althusser Para Sampedro (201 O), Althusser trabalhou o conceito de Ideologia com base em duas vertentes: a primeira, que trata da relação entre a ciência da história e ideologia, o que chamamos 1nais especificamente de Materialismo histórico; e t1ma segunda, mais prática, em que há uma nova filosofia de produção de conhecimento: o 1naterialismo dialético. Para Althusser, a ciência da história (pratica teórica) compo1ia sobretudo uma pa1·te pré-científica, ou seja, a Ideologia, o que faz com que con·entes científicas co1no o empirismo, a fenomenologia e a etnometodologia, por exemplo, são embasadas não só pelo 1nomento histórico que as cercam como, principal1nente, pela corrente de pensamento ideológica que as fez surgir. Para compreender como isso oco1Te, Althusser ( 1986) estabelece três mo1nentos de Generalidade, a saber: ___ 66_) ( Análise do Discurso Generalidade I: 1natéria pri1na ideológica Generalidade II: Conceitos já construídos Generalidade ill: O conceito científico que parte das duas outras generalidades. Segundo Altl1usser, a relação entre ciência e ideologia, 1nesmo que conflituosa, é interdependente, já que a ciência surge por meio de pré-noções científicas, ideológicas. Como coloca Sampedro (2010, p.33): Se toda ciê11cia 11asce e se desenvolve excluindo a ideologia, também é certo que as noções próprias da ideologia se descrevem co1no indicadores da ciência, no sentido de que a ciência produz o conheci1nento de um objeto cuja existência está indicada na região da ideologia. Isso implica que a ideologia seja sempre ideologia para uma ciência. Para Althusser, toda e qualquer ciência, principalmente, a da História, possui u1na pré-noção que a fomenta essa parte da ideologia pela qt1al os cientistas transitam, 1nesmo que conscientemente eles negue1n tal consideração, ou seja, politicamente inflexível. Assim, para esse teórico, mesmo que a ideologia nãoseja assumida pelas vertentes científicas (esteja vigente no presente histórico), ela pode, ao 111e11os, exprimir as atuais situações históricas, já que a ideologia é ao mesmo tempo fechada teorica1nente e politica1nente adaptável e maleável. Assi1n, ela é passível de mudança, como colocaAlthusser (1980, p. 87): ''A ideologia muda, pois, mas imperceptivelmente, conservando, a forma de ideologia; ela se move, mas com um movimento imóvel, que amantén1no 1nesmo lugar, em seu lugar e função de ideologia'' No sentido prático, a Ideologia para Altht1sser é: ■ Um modo de produção, assim como o político,jurídico, etc. ; Análise do Disc11rso J ( ___ 6_7 ___ _ Uma estrutura que surge do imaginário social; ■ Concomitantemente, as sociedades humanas não podem subsistir sem os sistemas de representações que, em outras palavras, constituem a ideologia; ■ As ideologias históricas mudam, mas estrutura ideológica não: ela permanece em quais quer tipos de sociedades; Dizer ''ciência'' não é o mesmo que dizer ''ideologia' ': essa segm1da dá-se 11a prática teó1ica, antecede e pe1n1eia a ciência elaborada. Desse modo, segundo Motta & Sen·a (2014, p. 13): A ideologia não é, po1ianto, uma aberração ou uma excrescência contingente da História: é uma estrutura essencial à vida histórica das sociedades. Tampouco pertence à região da consciência. Ela é profunda111ente inconsciente. A ideologia, para Altl1usser, é u111 sistema de representações, 111as essas representações na maior parte das vezes i1nagens, às vezes conceitos, 1nas é antes de h1do como estruturas que elas se impõem aos homens sem passar para a sua ''consciência'' . A ideologia refere-se, então, à relação ''vivida'' dos homens no seu mundo. ■ Dessa maneira, a Ideologia é, para Alhusser, a relação entre o homem e seu mundo. Resta-nos, então, uma pergunta: Como o sujeito, então, emerge enquanto parte da teoria da Ideologia para esse pensador? Althusser coloca que há uma relação entre sujeitos: Toda ideologia possui um centro e nele há um sujeito Absoluto, que ocupa m11 lugar único, interpelando os outros sujeitos a sua volta em dupla relação de sub111issão, ou seja, a troca de lugares entre sujeitos Absolutos e sujeitos que o cerca1n. Nesse sentido: ___ 6s_J ( Análise do Disct1rso a estrutura duplamente especular da ideologia garante si1nultaneamente: 1) a interpelação dos indivíduos co1110 sujeitos; 2) sua sub111issão ao Sujeito; 3) o reconhecimento mútuo entre os sujeitos e o Sujeito, e entre os próprios sujeitos, e o 1·econhecimento do sujeito por si mesmo; 4) a garantia absoluta de que tudo está bem assim, e sob a condição de que tudo está bem assim, e sob a condição de que se os sujeitos reconhecere1n o que são e se conduzire1n de acordo tudo irá bem: 'assi1n seja''' (Althusser 1976, pp. 118-119). A ideologia segundo Ricoeur Antes de mais nada, é imprescindível saber que a teoria da Ideologia, para Ricoeur, associa-se à Literatt1ra. Dessa maneira, esse pensador parte da Hennenêutica literária para compreender os mecanis1nos ideológicos. ParaRicoeur(1991,2008),aideologiaentraempautaquando o co1npreender-se diante de u111a obra literária se faz enquanto apropriação e desapropriação de sig1úficações ao 1nesmo te111po. Assim, para Pegino (2006), a apropriação simbólica de um inundo que existe e é significante passa a fazer parte da relação do ser com o mtmdo, e constitui-se e1n elemento central no processo de co1npreender-se diante da obra. Portanto, a apropriação dos significados de uma obra acontece por meio da compreensão de uma ideologia que pe1111eia o contato entre leitor-literatura. E11tretanto, para Ricoeur a Ideologia pode trazer consigo duas armadilhas: a prilneira refere-se à definição inicial de conceito, que poderia gerar t1m status de poder, algo que o teórico rebate ao colocando em xeqt1e a rejeição da ideologia em tennos de classe social ( Atente para o fato de que Ricoeur tenta afastar-se de uma análise marxista da Ideologia); a segunda trata do estatuto epistemológico da Ideologia. No caso dessa segunda an11adilha, para Pegi110 (2006, p.8): Análise do Disc11rso J ( ___ 6_9 ___ _ Ricoeur abdica da perspectiva positivista de ciência como o lugar por excelência da liberdade das a111arras da ideologia. Ainda mais quando esse lugar é utilizado como porto seguro daqueles que, advogando em prol de sua p1·ópria (pretensa) objetividade e neutralidade, denunciam a ideologia de outras formas de conhecimento filosófico. Com esforço, Ricoeur resvala na denúncia entre ciência e interesse levada a cabo pela Escola de Frankfurt. Assim co1no Altht1sser, Ricoeur acredita que toda ciência parte de u1na ideologia, 111es1110 que essas a:finnem que agem com neutralidade. Dessa maneira, para os dois pensadores, toda produção científica tem bases ideológicas. Partindo desses pressupostos, Ricoe1rr constrói o se11 próprio conceito de Ideologia que se baseia em três etapas, a saber: 1. A ideologia precisa ser apreendida por meio de sua dimensão integradora, originando o p1imeiro nível ideológico: ''A ideologia é a função de distância que separa a memória social de um acontecimento que, no entanto, trata-se de repetir'' (Ricoeur, 2008 p. 78). Por meio da integração a ideologia pode ser: ■ Ele1nento 1nobilizador; ■ Ele1nento justificador; Dinâmica: 111otiva, justifica e compro111ete; ■ Opinativa, não crítica: ''[ ... ] uma ideologia é operatória, e não temática. Ela opera atrás de nós, mais do que a posst1ímos co1no um te1na diante de , nossos olhos. E a partir dela que pensa1nos, mais do que pode1nos pensar sobre ela'' (Ricoeur, 2008, p. 80). 2. A Ideologia possui uma função de do111inação, visto que ela integra um sistema de autoridade ( de ve1iente Werberiana, não Marxista) que pede legitimação, e essa legitimação só pode ser dada pela crença dos indivíduos. ___ 10_) ( Análise do Discurso Para entender essa questão de do1ninação e como ela difere-se da vertente Marxista, Pegino (2006, p.10) coloca que: A dominação, em sua relação com as tipificações de autoridade weberiana, é um elemento por ce1·to desejado pelo grupo ( correspondendo à oferta de crença), pois também possui t1m elemento integrador e há u1na relação de pertença do nível integrador no nível da dominação, donde se apreende, na teoria ricoet1riana, que essa relação não é, e111 si, danosa, 111as se dá em te1n1os de equilíbrio e desiquilíbrio. Dessa maneira, a concepção de Ricoeur sobre dominação está baseada e1n tuna relação mútt1a entre dominador e dominado, na qual dominado sente-se co1no pertencente natural àquela ideologia. 1. A ideologia possui caráter deformativo. Aqui, Ricoeur faz uso do conceito Marxista da deformação do mundo, de um mundo invertido. Como exemplo, para Ricoeur, temos a religião, em que a imagem é o real e o que ela reflete é o original. Ou seja, a religião i1npõe uma ideologia, por 1neio de set1 conteí1do, que , . e inversa a outras tantas. Por fu11, vale deixar n1arcado para vocês, alunos (as), que o conceito de Ideologia Ricoeuriana é sempre correlacionado ao Marxismo, como viinos no decorrer desse estudo. A Ideologia segundo Foucault Caro aluno (a), pa1·a entender é ideologia segundo Foucault é preciso saber, antes de mais nada, que esse estudioso não a st1pervaloriza. Vamos descobru· o porquê? Para Benevides (2013), Foucat1lt elenca três razões pelas quais a Ideologia é ''Dificil1nente utilizável'' (FOUCAULT, 1998, p. 7) que serian1: Análise do Disc11rso J (_?_1 __ _ 1. ''Queira-se ou não, ela [ a noção de ideologia] está sempre en1 oposição virtual a alguma coisa que seria a verdade'' (FOUCAULT, 1988, p.7). Ot1 seja, Fot1cault separa Ideologia de verdade; 2. A ideologia sempre estará vinculada ao st1jeito, e esse, geralmente, possui u1na série de constrt1ctos qt1e baseiam sua escolha por algu1n tipo de Ideologia; 3. A terceira se refere ao caráter periférico, derivado, acessório,da noção de ideologia e1n relação com a realidade, o mundo mate1·ial. Assim, para Foucault, a Ideologia seria um teimo frágil para fundamentar as relações de poder. Isso acontece posto que, para Fot1cault, mais do que Ideologia, as relações sociais são regidas pelo que ele chama de ''Verdade e Poder'' Foucault (1988, p. 13). Esse estudioso evidencia que ''é preciso pensar os problemas políticos dos intelectuais não em te1mos de 'ciência/ideologia', mas em termos de ' verdade/poder '''. Dessa maneira, apesar de a Ideologia ser parte significativa das relações de poder, ela jamais será uma estrutura fundamental. Logo, diferentemente dos outros estudiosos acima referidos, a relação entre História e Ideologia para Foucault não é uma relação p1imá1;a para ente11der o movi111ento da sociedade. Como aponta Valeirão (2012, p. 9): Seria equivocado entender os eventos históricos so1nente sob o peso da ideologia já que esta, em última instância, diz respeito a uma idealização nobre e vaga que te11ta explicar o desenvolvi1nento da História como se os objetos determinasse1n as práticas e os discursos, e não o cont1·ário disso. Eis porque a 1netodologia de análise da História, para Foucault, prima pela problematização dos discursos e das práticas ao invés do desvelamento sob o peso das ideologias. ___ 12_) ( Análise do Discurso Desse 1nodo, para Foucault, a Ideologia não é a 1nola propulsara para entender a história, antes, parte secundária, um ten110 acessório, que contribui para con1preensão das relações de dominação sociais. A Ideologia segundo Pêcheux Para Pêcheux, a Ideologia tem ligação direta com os modos de produção. Considerando que, nos modos de produção, sempre a tun lado responsável pelas forças produtivas e outro, responsável pelas relações de produção, o estudioso divide sua inteil)retação de Ideologia em duas, acompanhando a essa divisão dos modos de produção. Seriam elas: ~. Ideologia do tipo ''A'': Análise dos produtos co1110 resultantes da prática técnica com base no empirismo (As forças produtivas). Aqui, a referida é um meio de recombinar discursos anteriores como meio de criar um novo ''discurso original''; 2. Ideologia do tipo ''B'': Condições para a prática política (As relações de produção). Nesse tipo, a Ideologia é um 1neio de prod11ção e 111anutenção de diferenças necessárias entre as classes sociais, com foco e111 uma especificamente: O trabalhador e o não trabalhador. Para Siqueira (2017), mais do que dividir a ideologia em dt1as partes ''puras'', há de se ter noção das condições de surgi1nento de cada ele1nento. Assi1n: En1 relação ao p1·ocesso de produção, a ideologia opera sob o que Pêcheux chama de ''realização técnica do real'', ''sob o controle de uma ideologia da forma técnica-empírica que assegura o sentido do objeto produzido''[3]. O efeito ideológico de tipo ''A'', assim, se refere à forma empirista da ideologia, que tem como objetivo ligar a significação à realidade, 111anter u1na correspondência ''correta'' entre a111bos. [ ... ]. Em relação às relações sociais de Análise do Disc11rso J ( ___ ?_3 ___ _ produção, a ideologia opera sob a forma especulativa fraseológica, já que te111 como função assegurar aos age11tes de produção sua posição destinada pela formação social. A ideologia de tipo ''B'' atua como condição indispensável das práticas políticas e essas, por sua vez, têm no discurso, a fo1ma de sua u·ansformação. (SIQUEIRA, 2017, p. 3). Para Pêcheux, a Ideologia está no ca1npo das relações sócio econômicas e, portanto, considerando as diversas divisões sociais, sua perspectiva ideológica tanto refere-se à questão de a ideologia permear os sentidos que se pretende formar com a realidade; bem como, numa perspectiva política, é força maior para a elaboração dos discursos qt1e demarcam as classes sociais. Nesse capítulo vimos quatro tipos de Ideologia, a saber: A teoria da Ideologia segundo Althusser, que gii·a em torno da consideração de que o st1jeito está em constante relação co1n o inundo e1n que está inserido; a perspectiva de Ricoeur, que evidencia a questão da dominação pela Ideologia; A Ideologia segu11do Foucault, que para ele é uma parte secundária, mn te11110 acessório, que contrib·ui para co1npreensão das relações de dominação sociais; e, por fim, a Ideologia para Pêcheux, em que essa se encontra no campo das relações sócio econômicas e, por isso, é a força maior para elaborar discursos que demarcam classes sociais. ___ 7_4 ____ J ( Análise do Disc11rso Perspectivas da Análise do Discurso de linha americana (Givón); Análise do Discurso de Linha francesa (Foucault, Pêcheux); Análise crítica do Discurso Prezado aluno (a), consideradas as diversas fo1mas do pensar ideológico, que subsidia, assim como outros critérios, a fo11nulação dos 1nais diversos discursos, partire1nos para as resultantes dessa produção científica pela qual passeamos até agora: As várias perspectivas da Análise do Discurso. De antemão, é importante salientar que os dois primeiros pontos tratarão da grande divisão da Análise do discurso: americana x francesa, e que, segundo Orlandi (2005, p. 78) essa divisão não é mera1nente geográfica: Do lado da a111ericana ( ... ) está a te11dência de u111a declinação linguístico-pragmática ( empirista) da análise de discurso com um suj eito intencional, e do lado europeu a tendência (materialista) que desterritorializa a noção de língua e de sujeito ( afetado pelo inconsciente e constituído pela ideologia). Análise do Discurso de Linha americana (Givón) Se a Análise do Discurso americana está para uma tendência empírica, ela se baseia, portanto, 110 funcionalismo da linguage1n. Dessa maneira, a Análise do Discurso de Givón tem Análise do Disc11rso J ( ___ ?_s ___ _ por alicerce a consideração de que a língua é um instru1nento social, meio pelo qual os indivíduos interage111, se comt1nicam. Com a publicação de From Discourse to Syntax ( 1979), Talmy Givón propõe que todo enunciado ( as chamadas sentenças sintáticas) pode ser analisadas por meio da investigação de suas 1notivações discursivas, ou seja, a estrutura do en1mciado é resultante direto dos componentes do discurso e, assim, insere se 110 universo maior da Análise do Discurso. Por conseguinte, segundo Martins (2009), o contexto do discurso ganha visibilidade enquanto motivador para a produção linguística: Só formamos enunciados partindo de objetivos que estão no plano do disc1rrso ( as intenções, as práticas, etc.) no uso da língua. Para Givón ( 1979), a pragmática do discurso te1n papel fundamental 11a explicação da sintaxe lingt1ística, assi1n, para o pensador, a si11taxe é depende11te, 1notivada fiu1cional1nente pelos processos de cognição e comunicação. Pa1·a esclarecer melhor essa perspectiva, Givón ( 1979) estabelece dois polos da modalidade comunicativa: O pragmático e o sintático, ambos visando a funcionalidade da linguagem. A gra1nática, posto isso, é constn1ída por 1neio do discurso, baseando-se set1 uso na concretização desse pelos fala11tes. Alii1guagem, nesse âmbito, torna-se u111 siste111a de interação social. Enquanto Analistas do Discurso, para as considerações de Givón, portanto, para além de observar os fenômenos estruturais do discurso, precisamos, fundamentalmente, considerar toda a situação comunicativa. Melhor dizendo, como coloca (NICHOLS, 1984, p.97), necessita1nos buscar ''O propósito do evento da fala, seus participantes e o contexto discursivo''. Desse 1nodo, a situação comunicativa inativa, explica e dete11nina a estrutura gramatical. ___ 76_) ( Análise do Disct1rso Análise do Discurso de Linha Francesa (Foucault, Pêcheux) Diferentemente da vertente americana, que unica111ente trata da questão do discurso nos contextos, a vertente francesa da Análise do Discurso amplia essa ideia ao colocar a noção de língua e sujeito como resultantes de ideologias e afetados pelo inconsciente (político).Vale então lembrar, caro aluno (a), dos conceitos de Ideologia trabalhados anteriormente para ajudar a esclarecer a Análise do discurso de linha européia. Pêcheux e Foucault A partir de 1977, o estudioso francês Michel Pêcheux se debruçou sobre os contextos epstemológicos das Ciências H11manas na França, inclusive o surgimento da Análise do Discurso. Dentre os principais aspectos elencados por Pêcheux, te111os: q11e a fonnação do discurso é ling11ística e histórica; que a forma discursiva produzida pelo sujeito é semp1·e ideológica, não empúica (não só como um ii1strumento de con1unicação baseado no contexto, diferindo-se da vertente americana). Nesse sentido, a linguagem é entendida como trabalho simbólico de ação e transfonnação, em q11e ''tomar a palavra é um ato social com todas as suas implicações, conflitos, reconhecimentos, relações de poder, constituição de identidade, etc." (ORLANDI, 1998, p.17). Para Pêcheux, o sujeito é perpassado tanto pelo i11co11sciente qua11to pela ideologia, o que faz dele um sujeito descentrado, ou seja, apesar de ter a ilusão de que é fonte primária do que diz, o homem é, para a Análise do Disc11rso, res11ltante de ideologias e políticas que o constit11em, e o que é enunciado por ele acompanha essa lógica. Desse modo, o s11jeito é un1 (re) produtor de discursos. Por essa ótica, o sujeito, para Pêcheux, não se faz enquanto fonte absoluta de sig11ificado, posto que ele se constitui pela fala de outros sujeitos, ele é o resultado da união de vá1ias vozes, em uma correlação sócio ideológica: o sujeito é heterogêneo. Análise do Disc11rso J ( ___ ?_7 ___ _ Seg11ndo o Pêcheux (1990), dessa 1naneira, o sujeito pode sofrer dois tipos de esquecimento: 1. Aquele em que o sujeito acredita ser a origem de tudo o que enuncia. Esse tipo de esquecimento é de vertente ideológica e inconsciente: esse procura apagar h1do o q11e não está dentro de sua formação discursiva, ilude-se em ser o criador de tudo; 2. Neste, o sujeito acredita q·ue o que diz tem um único significado e, dessa forma, espera que seu interlocutor apreenda o significado que ele quer transmitir. As ideias pioneiras de Pêche11x auxiliaram ot1tros estudiosos da Linguagem, como F oucat1lt. Dele, surge a questão da ciência histórica e suas descontinuidades, dispersão, que implica no abrangente conceito de fo11.11ação discursiva; na relação entre saber e micro poder; na atenção à leihlra, interp1·etação e memória discursiva. Já o trabalho de Fo11cault (1988), descentralizot1 a identidade do sujeito, isso graças ao que ele chamou de poder disciplinar (que nada tem a ver com opressão e/ou poder do estado): poder que conduz tanto compo1ia1nento l1u1nano quando a regulação do cot'])O e i11divíduo, o controle do que pensa e co1no se comportam as sociedades. Poder disciplinar, nesse sentido, constitui um poder localizado nas instituições modernas que ''policiam'' e disciplinam populações. Tal visão esclarece a heterogeneidade do sujeito, que é, mesmo que inconscientemente, atravessado por vozes ideológicas. Para Bonácio (2017. P.14): Na visão de Foucault (2004), falar é mais que produzir enunciados em uma dada situação, é ver como certas práticas discursivas agem na produção do dizer, é saber como houve a possibilidade de aparecer certos dizeres em determinadas épocas. ___ 7s_) ( Análise do Disct1rso Para F oucault, portanto, a Análise do discurso ta1nbém parte do ideológico: ''a verdade está circularmente ligada a sistemas de poder, que a produze1n e a apoia111 e a efeitos de poder que ela induz e a reproduzem'' (1980, p. 131). Assim, os estudos Foucaultianos inauguram na Análise do discurso a relação entre verdade e poder, sendo os discursos regimes de verdade e, cada regime de verdade, pe1iencente a uma sociedade em particular. A verdade, nesse contexto, é para Foucault (1980) convencio11ada e organizada pelas institt1ições e está estreita111ente relacionada a como os sujeitos se fo1mam, inclusive em relação a linguagem a qual se apropriam. Enquanto isso, o saber passa a ser um conjunto de práticas do disctrrso, embasadas pelos acontecimentos políticos, processos econômicos, bem co1no instituições. Verdade e saber torna111-se, portanto, poder, que é construído historican1ente, expandindo-se social111ente. Em suma, o poder, para Foucault (1988), penetra em instituições, toma-se técnica de dominação. Além da questão do Discurso, Foucault (2004) t1·az ta1nbém a q11estão do estabelecimento de enunciados com outros enunciados. Para um autor, um enunciado sempre trará, evidente ou não, as 111arcas de outros. Assi1n, para a A11álise do Discurso fouca11ltiana, é imprescindível entender a rede de relações que permite111 que os enunciados seja111 ditos e ente11didos, o que ele chama de ''domínio associado'': a presença de outros discursos por meio da memória disc11rsiva. Isso, pois os entmciados: a. são de natureza histórica, porque é nela q11e encontra sua existência; b) possuem u1na materialidade específica, são registrados de alguma forma; c) pe11nitem ligações, correlações com outros enunciados, co111 já ditos; d) não se referencia111 a um único objeto, estado de coisa, em uma realidade pronta e acabada. Sobre esse último item, Foucault (2004) revela que os objetos podem mudar de sentido por conta das formações discursivas (FD) em que se encontram dispersos. Um 1nes1no Análise do Disc11rso J ( ___ ?_9 ___ _ objeto pode ganl1ar sentidos diferentes de acordo com a FD a qual ele pertence. En1 vista disso, te111os que o discurso é constituído por enunciados os quais se dispõe111 seguindo un1a formação discursiva dada, na qual determinam seu agrupamento realizado por meio de relações. (BONÁCIO, 2017, p.18) Observe a cl1arge abaixo: Figura 2 Fonte: Pixabay Trazendo para a prática a questão de outros dizeres em um 111esmo enu11ciado, mesmo qt1e e111 linguagem 11ão verbal, necessitamos remeter a charge em questão a outros enunciados para compreendê-la, já que o discurso funciona em uma rede de relações, na qt1al o que já foi dito retoma para refo1mular um novo discurso. Como podemos observar, para fo1111ular o disctrrso do n1undo enqt1anto u1na ''bomba'' prestes a explodir, buscamos passar essa ideia por meio de uma rede de outros e11unciados construídos sócio historicamente: ''Um Deus que presenteia o ser humano''; ''Um bebê que recebe uma bola de presente''; ''A ideia de que nem Deus pode ctrrar os males do planeta''; e por aí vai. A união de discursos é múltipla e, claro, ideológica: Parte de um po11to de vista que o cartunista e1n questão quis tra11spassar. ___ so_J ( Análise do Disct1rso Esses novos discursos sobre o pla11eta colocados 11a história por meio das mídias (111aterialidade) podem ser analisadas sob o que F oucat1lt (2004) deno1ninou de ''aconteci1nento discursivo'' . Dele, outros textos surgem, sentidos são trazidos de volta; deslocados, interditados, fonnando, dessa maneira, um arquivo, qt1e imputa um dos sistemas de enunciabilidade do home1n moderno ( em sua subjetividade). Para Foucault (2004), cada enunciação é exclusiva, possui sua particularidade. Em contrapartida, u1n enunciado pode ser constitutivamente repetível, podendo ser repetido, atualizado, transf armado: Em geral, a descrição llistórica das coisas ditas é inteiramente atravessada pela oposição do interior e do exterior, e inteiramente comandada pela tarefa de voltar dessa exterioridade - que não passaria de contingência ou pura necessidade n1aterial, corpo visível ou tradução i11certa - em direção ao núcleo essencial da interioridade. Empreender a história do que foi dito é 1·efazer, em outro sentido, o trabalho da expressão : retomar ent1nciados conservados ao longo do te1npo e dispersos no espaço, em direção ao segredo interior que os procedeu, neles se depositou e aí se encontra ( em todos os sentidos do termo) traído (Foucault, 2004, p. 140). Para Foucault (1998), os enunciadosnão circulam como querem, livremente, eles são regidos pelos micropoderes: Esses penetra1n no cotidiano, pulverizados, disseminando atih1des, gestos, hábitos, discursos; e agindo no corpo dos sujeitos. Segundo (Foucault (1998), não existe poder e111 si, 1nas si1n, relações de poder. Nesse sentido, esses micropoderes são exercidos por 111eio de várias práticas discursivas, não sendo somente repressivo, mas também administrativo, já que pode controlar a vida das pessoas. Análise do Disc11rso J ( ___ s_1 ___ _ Ao passo que há 1nicropdoeres, há, para Foucault (1998), resistê11cias, já que esses discursos não chegan1 aos sujeitos de forma11eutra: existe111 os que resistem, não aceitam passivamente, pois têm consciência da historicidade dos mesmos. Para Araújo (2017, p. 22): O enunciado não é constituído por uma relação do significante com seu significado, ne1n do no1ne com seu designado, ou da frase com seu sentido, ou ainda, da proposição com seu referente, mas por configurar u111a situação da orde111 do discurso, características do saber de uma época. Assim, para a Análise do Discurso elegida por F oucault, Significantes e significados são de suma importância para determinada orde1n do discurso: para co1npreender, para além do literal, os pan.os de ftu1do históricos que rege1n os enu11ciados. Vi111os nesse capítulo que a corre11te americana da A11álise do Discurso privilegia o Funcionalis1no. Já dentro da Análise do Disct1rso de linha francesa, temos e1n Pêcheux a noção de que interpretação é u1n gesto, ou seja, um ato simbólico, assim, lingt1ístico e social fonnam ent1nciados que necessitam de interpretação para que haja construção de significados; Para Foucault, por fim, o discurso é resultante de uma construção de sujeitos heterogêneos, influenciados por ideologias que partem de verdades instituídas, bem como saberes institucionalizados. ___ s2_) ( Análise do Discurso Authier-Revuz e a Análise Crítica do Discurso Nesse último capítulo apresentare1nos a você, prezado alu11o(a), Autl1ier-Revuz, estudiosa que, por participar da terceira geração de analistas do Discurso, se aproxin1a das teo1ias elencadas no últi1no tópico dessa unidade: a Análise Crítica do Discurso. Authier- Revuz Authier- Revt1z faz parte da terceira geração de lingl1istas a estudar a A11álise do Discurso. Partindo da l1eterogeneidade do sujeito, algo inclusive proposto do Foucault, essa estudiosa elegerá o reconhecimento do jogo do ''não-um'' no discurso, 011 seja, todo discurso alé1n de partir do i11consciente ideológico, deixa marcas visíveis, considerando o contexto em que está sendo produzido. O ''outro'' (as vozes que constituem o discurso) pode to1nar-se visível, por exemplo, quando um enunciador passa a traduzir as palavras de outre1n, ou quando, de outra 1naneira, usa certas palavras e si1nultanea111e11te as explica, tor11ando-se um observador/utilizador de suas próprias palavras. Esse uso das palavras é chamado, por Authier-Revuz, de modalização autonômica. Três características que constituem, a saber: formas facilmente identificáveis nas cadeias de significantes; O comentário sobre o dizer que acabo11 de ser enunciado; e formas apacificastes de representação do que foi dito, que coloca111 e111 xeque as representações do dizer por 1neio da escolha das palavras que a ele relacionam-se. Análise do Disc11rso J ( ___ s_3 ___ _ Nesse ínterim, estamos evidenciando o q·ue Authier-Revuz (1982) chama de heterogeneidade 1nostrada e constitutiva. Veja111os: 1. Heterogeneidade mostrada: A hererogeneidade mostrada acontece quando ''No fio do discurso que, real e material1nente, um locutor único produz, t11n certo número de formas, linguísticamente detectáveis no nível da frase ou do discurso, inscrevem, e1n sua linearidade, o outro'' (AUTHIER-REVUZ, 2004, p.12). Esse conjunto de formas pode se inscrever no outro de maneira marcada e/ ou não marcada. A mais evidente da heterogeneidade mostrada é, pois, o discurso relatado: em outras palavras, o discurso direto e indireto. Na frase, esses tomam-se enunciação. No discurso indireto o locutora tra11sforma-se em um tradutor, ot1 seja, usa suas próprias palavras pa1·a remeter-se ao discurso de outro(s) como fonte de ''sentido''. Já no discurso direto, são literalmente as palavras de um outro que ocupam o espaço/tempo de 1naneira clara, evidente. Para Mesquita & Rosa (2010, p.5) as formas 1narcadas da heterogeneidade mostrada: São explícitas e podem ser recuperadas no nível enunciativo, a partir de n1arcas linguísticas, que mostram a presença de uma outra voz. Dentre as formas 1narcadas, encontram-se o discurso direto, o discurso indireto, a modalização autonímica, a autonímia, as aspas, a glosa, o itálico e a entonação. As for1nas não-marcadas, por sua vez, são mais complexas, pois não estão explícitas e a heterogeneidade deve ser reconstituída a partir de diferentes índices - discurso indireto livre, ironia, antífrase, alusão, pasticl1e, imitação, metáforas, jogos de palavras, reminiscência. No grupo das formas marcadas, há modos explícitos da ___ 84_) ( Análise do Discurso presença do disc·urso do outro por meio de 1narcas na língua. No grupo das formas não-n1arcadas, essas marcas 11ão são explícitas, não aparecem, cabendo, portanto, ao receptor o reconhecimento ou interpretação da presença de um outro discurso. Q11al seria, caro aluno (a) a importância dessa l1eteroge11eidade 1nostrada? , E por meio dela que pode l1aver a representação de diferentes relações entre o sujeito que fala e a possibilidade de construção de seu discurso. 2. Heterogeneidade constitutiva: A heterogeneidade constitutiva nada mais é do que a presença do outro no discU1·so, mas não uma presença desvelada, mostrada: antes, ela é da ordem do inconsciente. Segundo Mesquita e Rosa (2007, p. 7) a heterogeneidade constitutiva: Está 110 exterior, ou seja, no outro, q11e são os discursos construídos sócio-historica1nente e que atravessam as enunciações do s11jeito. Dessa forma, ela transcende a possibilidade de identificação/ descrição dos ele1nentos linguísticos, como o faz a heterogeneidade mostrada. A heterogeneidade constitutiva é assim chamada porque não há discurso que não seja constituído por ela, ou seja, não existe discurso que não esteja perpassado por iní1meros 011tros discursos, ou já-ditos. Para embasar a possibilidade da Heterogeneidade constitutiva, Authier Revuz apoia-se em Bakthin e na Psicanálise, já que esses questionam o locutor ''livre'', que ac1·edita dominar por completo seu discurso, co11scientemente. Assim, há para Authier-Revuz sujeitos inscritos em discursos, atravessados constante1nente por outros discursos. Sendo assim portanto, o s11jeito não manda no seu dizei·, ele apenas escolhe as palavras. Assim, mes1no que tenhamos a ilusão de originalidade, somente Análise do Disc11rso J ( ___ s_s ___ _ algo que já foi enunciado pode ser expresso nova1nente. Desse 111odo, o st1jeito não é o dono de suas palavras, antes, ''repete'' a dos outros. Mesn10 assim, ele pensa ter controle sobre como os sentidos são nele constituídos. O sujeito, portanto, esquece o que o ''outro'' disse e toma para si a autoria. Por isso t1m dos pontos chaves da Análise do Discurso de Authier-Revuz é a heterogeneidade. Mes1no que o Sujeito esqueça o ''outro'', seu discurso setnpre será transpassado por esse. Para Mesquita e Rosa (2007, p.14) vale destacar Que a heterogeneidade é constitutiva tanto do discurso quanto do sujeito, uma vez que não há discurso homogêneo, já que ele é também do outro. Por isso, pensar a heterogeneidade constitutiva é pensar sobre a co11stitt1ição do tecido discursivo. Análise Crítica do Discurso AAnálise Crítica do Discurso (ACD) é um mecanis1no de a11álise/interpretação que buscou ·u1na base teórica rica, co1no por exemplo os três estudiosos aci1na elencados, para formular uma 11ova teoria: a de que o st1jeito temcapacidade de tra11sformar seu meio social a partir do discurso, em um movimento no qual a sociedade modela o discurso, bem como esse modela a sociedade. Dessa maneira, a ACD, segtmdo Pedro (1998, p. 15) é aquela que: Recusa a neutralidade da investigação e do investigador, que define os seus objetivos em termos políticos, sociais e culturais e que olha para a linguagem como prática social e ideológica e para a relação entre interlocutores como contextl1alizada por relações de poder, dominação e resistência institucionalmente constituídas. ___ 86_) ( Análise do Disct1rso Assi111, os analistas críticos do discurso se posiciona1n de n1aneira política em relação aos seus procedi1nentos de análise. Para isso, verifica111 como as práticas discursivas, sociais e linguísticas se correlacionam de maneira a alicerçar práticas ideológicas de dificil desarticulação, buscando, dessa forma, alcançar tuna neutralidade advinda de uma postura crítica. Por esse viés, a ACD pode intervir na sociedade e gerar mudanças, principalmente em favor dos menos desfavorecidos (sujeitos oprimidos sócio economican1ente). Con10 coloca Van Dijk (2008, p. 19): Se o discurso controla mentes, e mentes controlam ação, é crucial para aqueles que estão no podei· controlar o disct1rso e1n primeiro lt1gar. Como eles fazem isso? Se eventos comunicativos consistem não somente de escrita e fala ''verbais'', mas ta1nbém de um contexto que influencia o disct1rso, então o primeiro passo para o controle do discurso é controlar seus contextos. [ ... ] isso significa que precisamos examinar em detalhe a maneira como o acesso ao discurso está sendo regulado por aqueles que estão no poder. Compreendendo que o discurso é regulado por quem está no poder, a ACD se dispõe a elaborar u111a análise crítica de con10 o esse discurso interfere 11a vida dos sujeitos e con10 pode, dessa maneira, ser desarticulado. Para atingir seus objetivos, a ACD assume a concepção de que a ideologia é hege1nônica, pois estabelece e st1stenta relações de dominação, além de servir como beneficio àqueles que dominatn os blocos sociais, já que esses podetn, por meio do discurso, disseminar st1as ideias revestidas de ''senso co1num''. , E importante salientar, aqui, como a Análise do Discurso contribuiu para a existência da ACD: por meio dela passou-se a enfatizar, nos estudos da linguagem, a perspectiva social, dando Análise do Disc11rso J (_s_7 __ _ 1nargem para pe11sar criticamente a língua e as intencio11alidades de quem a usa. ■ Dispositivos teóricos da ACD A grande intencionalidade da ACD é construir um aparelho teórico integrado, que possibilite descrever, explicar e interpretar os discursos dominantes que infl11enciam os saberes, o conheci1nento e as atitudes ideológicas dos sujeitos. Dentre esses métodos tempos duas concepções: A opacidade da linguagem: A ACD pa1te da ciência de que muitas relações entre linguagem e estruturas sociais são opacas, ou seja, passam de maneira despercebida por entre os sujeitos. Por isso a itnportância dada pela a ACD aos contextos. Segundo Melo (2011, p.5) os contextos seriam: Os ele111entos externos à linguage111 que interferem na co1nposição e sentido da 111es111a, de11tre eles a cultura, a história e a ideologia. Para os analistas críticos, esses recursos são totalmente extrínsecos aos textos, porém fazem parte da constituição do discurso, só sendo possível reconhecê los nos textos se levarmos em consideração, como afi1ma Pedro (1997, p. 33) que, na sua função representativa, a forma linguística é sempre deformada pelos efeitos do poder [ ... ] [e] tem setnpre 111n efeito mediador que leva a processos de enviezamento a11iculados em modos específicos [ ... ] e na sua f11nção de construção, a ling11agem projeta, per1nanente1nente, relações e estruturas sociais, de acordo com os desejos dos participantes, em regra os do(s) participante(s) mais poderosos. ___ ss_) ( Análise do Discurso O·u seja, o objetivo metodológico do analista crítico do discurso é procurar essas pistas na intenção de visibilizar as relações entre linguagem e práticas sociais, que são geral111ente naturalizadas por grupos dominantes. Poder e ideologia no discurso Para a A CD, os textos são atravessados por relações tanto ideológicas qt1a11to de poder. Nesse sentido, t1ma das 1naiores preocupações da ACD é identificar como a língua é usada como mantenedora ou desafiadora de tais relações na contemporaneidade. Assi1n, a ideologia é vista pela ACD como for1nas de ver o inundo, contribuindo, mantendo ou mudando sistemas de dominação. Esses, organizados por instituições de modo l1ierárqt1ico. Já o poder é a possibilidade que indivíduos e instituições têm de fazer algo influenciar em algum contexto. Apesar das várias violências explícitas que temos hoje, o poder não tem sido usado por meio de imposição, mas sim, através de disct1rsos ideologica1nente institucionalizados. Além disso, segundo Melo (2011, p.13), aACD Pensa a linguagem como um espaço de luta irregular de poder, ressaltando o papel da cobiça constante por hegemonia, isto é, a ''liderança tanto quanto dominação nos domínios econômicos, político, cultural e ideológico de uma sociedade'' (FAIRCLOUGH, 2001, p. 122). Assim, na ACD, podemos falar em poder hegemônico quando o poder está a serviço da contint1idade da liderança e dominação de U11s sobre outros. Diante disso, os analistas c1iticos do discurso desenvolvem uma teo1ia/método para investigar como o exercício de poder hegemônico se mescla com práticas discursivas no mundo conte1nporâneo, ou seja, analisar e revelar o papel do discurso na (re )produção da do1ninação. Análise do Disc11rso J ( ___ s_9 ___ _ A dominação, nesse sentido, é entendida como exercício do poder pelas elites, grupos e instituições e o resultado não poderia ser outro: desigualdades sociais, políticas; discri111inação por classe, gênero, etnia e orientação sexual. De manei1·a específica, os analistas críticos do discurso b·uscam saber quais estratégias e/ou estn1tt1ras, do texto falado 011 escrito, motiva1n a repercussão de 1nodos de reprodução. Assi1n, a ACD acredita que o discurso possui um poder co11stitutivo, já que, por 1neio de seu uso, os sujeitos mantêm, constroen1, tra11sforma111 realidades sociais: n1a11tê111 01.1 111odificam suas realidades. Em síntese, por meio de Maurer, Melo (2011, p.16) indica três princípios que norteiam o conjunto teórico da ACD, a saber: 1. os indivíduos realizam ações por meio da linguagem, de acordo com o conceito de ato de fala elaborado nos estudos da Prag111ática por Austin (1962) e Searle (1969); 2. as formas discursivas e as estruturas sociais se influenciam mutuamente, princípio este, cunhado pelas Ciências Sociais , em especial por Antony Giddens (2003), de que há sempre u1na relação biunívoca entre os textos e a sociedade; 3. os recursos empregados pelos indivíduos para produzir e consu111ir textos não são apenas cog11itivos, 111as sociocognitivos atravessados por ideologias. Desta feita, compreendemos que a Análise Crítica do Disctrrso, para além da teoria, norteia os passos e pontos principais dos quais um analista do discurso deve ap1·eender para poder construir 11ma crítica constritiva e contributiva para o 111eio no qual vive e, em n1aior amplitude, para a sociedade como um todo. ___ 9o_J ( Análise do Disc11rso Nesse último capítulo mostra1nos co1no Pêcheux e Foucault, Authier - Revuz descentraliza o sujeito, 1nostrando que esse é heterogêneo, ou seja, impossibilitado de se desfazer das múltiplas vozes que o constitui. Ele é, portanto, um ''não-um''. Já em relação à A11álise Crítica do discurso, pudemos pe1·ceber que essa absorve a linguagem pela perspectiva social, advinda da Análise do Discurso, para poder analisar criticamente ( e assim contribuir socialmente) discursos de nascente ideológica usada por opressores para atingir as camadas mais frágeisda sociedade, os oprimidos. Após toda essa incursão teórica, chegamos ao fim de mais uma unidade. Que venha a próxima! Análise do Disc11rso J ( ___ ~_1 ___ _ ___ 92_) ( Análise do Discurso #1111# INTRODU AO Você sabia que a Análise do Discurso é tuna das mais importantes para o conl1ecime11to da Língua? Já tive111os um conhecimento introdutório desse conteúdo na unidade anterior. Neste daremos ênfase a como esse estudo vê as concepções de Sujeito de acordo com os maiores pensadores da Análise do Discu1·so, além de mostrar como :ft1ncionam perspectivas essenciais à essa ciência: A f armação Imaginária e a F armação Discursiva. Além disso, expore1nos como funcionam tanto a Ideologia como a História e1n relação aos sujeitos constituídos no discurso. Esse será um passeio 1naravilhoso no objeto foco de 11ossa discipli11a. Ao longo desta m1idade letiva você vai 1nergulhar nesse uni verso! Análise do Disc11rso J ( ___ ~_3 ___ _ OBJETIVOS Olá. Seja 111uito bem-vindo à Unidade 3. Nosso objetivo é auxiliar você no atingimento dos segui11tes objetivos de aprendizage1n até o término desta etapa de estudos: Compreender como funciona a questão do Sujeito Discursivo dos analistas do Discurso mais reconhecidos; Entender como funciona111, dentro do Universo da Análise do Discurso, a F armação In1agi11ária, bem co1no a Formação Discursiva; Identificar, na Análise do Discurso por 1neio de seus estudiosos, qual a relação entre Ideologia e sujeitos do disct1rso; Compreender co1no para a Análise do Discurso o Sujeito é entendido e1n sua for111a histó1ica. E11tão? Está preparado para uma viagem sem volta rumo ao conhecimento? Ao t1·abalho! ___ 94_) ( Análise do Discurso Sujeito do Discurso: Benveniste, Authier Revuz, Bakhtin, Ducrot e Foucault Ao término deste capítt1lo, você será capaz de entender como funcionam as perspectivas de sujeito do discurso para os principais analistas do Discurso. Para tanto, descrevere1nos cada perspectiva, bem como seus pontos fortes e fracos, que se to111aram n1arcos no estudo da liI1guística. Isso será fundamental para o exercício de sua profissão. E então? Motivado para desenvolver esta competência? Então vamos lá. Avante! As diversas formas de conceber o sujeito do Discurso No universo da Análise do Discurso, existe1n várias teorias em relação ao sujeito. Por exe111plo, existe aquela que considera o sujeito enquanto o ''eu'', dessa forma, ele seria o centro da comunicação. Outra teoria coloca um ''tu'' como o centro, já que ele tem total influência sobre o ''eu'', ou seja, é, portanto, fator principal. Há ainda a que defende o espaço entre o ''eu'' e o ''tu'' enquanto fator central. Dentre essas diversas perspectivas, Orla11di apud Brandão (2004, p.54, 55) enmnera, como for1na de sistematizar as teorias, as principais con·entes e1n relação à noção de sujeito. Vejamos: Primeira fase: em que as relações interlocutivas estão centradas na ideia da interação, harmonia conversacional, troca entre o eu e o tu. Nessa concepção idealista enquadra1n-se, por exemplo,anoçãodesujeitodeBenvenisteeaquelaregidapelasleis conversacio11ais e correntes do princípio de cooperação griceano; Análise do Disc11rso J ( ___ ~_s ___ _ Segunda fase: e1n que se passa para a ideia do conflito. Ce11tradas no outro, segundo essa concepção as relações intersubjetivas são governadas por un1a tensão básica en1 que o tu determina o que o eu diz, ocorrendo uma espécie de , tirania do primeiro sobre o segundo. E a concepção fortemente inflt1enciada pela retórica, presente nos mo1nentos inicias da AD, cujas análises focalizara1n, sobretudo os discursos políticos; Terceira fase: em que, reconhecendo, no binarismo da concepção anterior, t11na polarização que i1npedia apreender o sujeito na sua dispersão, diversidade, a AD procura ro111per con1 a circularidade dessa estrutura dual, ao reconhecer no sujeito um caráter contraditório que, marcado pela incompletude, anseia pela co1npletude, pela vontade de ''querer ser inteiro''. Assim, nu1na relação dinâmica entre identidade e alteridade, o sujeito é ele 1nais a comple1nentação do outro. O centro da relação não está, como nas concepções anteriores, ne111 no eu nem no tu, 1nas no espaço discursivo criado entre ambos. O sujeito só se co1npleta na interação com o outro. Caro aluno (a), perceberam como existem várias formas de conceber o sujeito? Va1nos agora conhecer quatro as 1nais i1nportantes perspectivas. Preparados? O Sujeito para Benveniste Só conseguiremos entender como Benveniste compreende o sujeito se, antes, entendermos de subjetividade. Isso, pois para a teoria desse estudioso, uma coisa não se dissocia da outra. Assin1, para Brandão (2004, p. 56), Be11veniste chama de subjetividade: A capacidade de o locutor se propor como sujeito do seu discurso e ela se funda no exercício da língua [ ... ] (ele) enuncia sua posição no disct1rso através de determinados índices formais dos quais os prono1nes pessoais constituem o pri1neiro ponto de apoio na revelação da subjetividade na linguagem. ___ 96_) ( Análise do Discurso Dessa forma, ve111os que o ''eu'' subjetivo to1na uma posição de vantagem sobre o ''tu'', que se toma apenas um receptor. Para Brandão (2004), Benveniste coloca ''eu'' e ''tu'', ou seja, considera a marca de pessoa. Porém, apesar de ambos serem protagonistas a enunciação, o ''eu'' e uma pessoa subjetiva, enquanto qt1e o ''tt1'' é não subjetiva. Na verdade, para Benveniste, a 11oção de sujeito é egocêntrica: o discurso depende unicamente do ''eu'', se111 qualquer influência do ''tu''. Como coloca Brandão (2004 ), Benveniste vê o ''ego'' como ce11tro da e11unciação, esse é o sujeito, já que está no ''eu'' a capacidade de auto afirmar-se subjetivamente. ' E dessa noção egocêntrica que as controvérsias em relação à concepção de sujeito em Benveniste s11rgem, pois o ''eu'' não constitui toda a lingt1age1n, se1npre existirá outro sujeito que co1nunicará algo. A subjetividade é inerente a toda linguagem e sua constituição se dá mesmo quando não se enuncia o eu. Os discursos que utilizam de formas indeterminadas, i111pessoais como o discurso científico, por exemplo, ot1 o discurso do esquizofrênico e1n qt1e o locutor utiliza o ele para se referir a si mes1no mostram t1ma enU11ciação q·ue mascara se1npre u1n sujeito. Isto é, nesses tipos de enunciação, o sujeito ent1ncia de outro luga1·, postando-se numa outra perspectiva, seja a da impessoalidade em busca de uma objetivação dos fatos ou de um apagamento da responsabilidade pela entmciação, seja a da incapacidade patológica de assunção de um eu. (BRANDÃO, 2004, p. 57 e 58). O sujeito, para Benveniste, portanto, não é uma teoria satisfatória, já que desconsidera o ''tu'' e, principalmente, a historicidade. Termos, caro aluno (a), que até então em nossos estudos identificamos como sendo importantes à Análise do Discurso. Análise do Disc11rso J ( ___ ?_7 ___ _ O sujeito para Authier-Revuz Agora que e11contramos a contradição na concepção de sujeito em Benveniste, conhecere1nos outras concepções que melhor buscarn e11tender o sujeito. De11tre elas ten1os, a de Authier-Revuz, que abandona o egocentrismo do ''eu'', pois considera o ''tu'' não só na pessoa como tambérn no tempo e no espaço em que está situado. Para Brandão (2004, p.59), a concepção de sujeito de Authier-Revuz: Não está mais centrada na transcendência do EGO, mas relativizada no par EU-TU, incorpora11do o outro con10 constitutivo do sujeito. Disso deco1Te uma concepção de linguagem também não mais assentada na noção de homogeneidade. A linguagem não é mais evidência, transparência de sentido produzida por um sujeito uno, homogêneo, ' todo-poderoso. E um sujeito que divide o espaço discursivo co1n o outro. Percebemos aqui que não há ainda uma concepção de homogeneidade da linguagem, mas sim, uma discussão em relação à heterogeneidade discursiva. Inclusive, Authier-Revuz( 1982) criou uma lista com as formas da hete1·ogeneidade, como vemos. Percebemos e11tão qt1e a homogeneidade também não é bem aceita, e ent1·are1nos nas discussões sob o ponto de vista da heterogeneidade discursiva. Authier-Revuz ( 1982) lista''[ ... ] fon11as de heterogeneidade que acusam a presença do outro'', vejamos quais são: ___ 9_s ___ J ( Análise do Discurso f igura 1 - Discurso relatado Conotação , . auton1m1ca Formas complexas •o discurso Indireto, no qual o "eu" coloca-se como um porta-voz do discurso de outrem; •espécie de discurso direto, no qual o locutor demarca claramente o discurso de outrem, seja por aspas, itálico, etc.; •a presença do outro não é explicitada- é um discurso seml velado, sugerido, não evidente. Fonte: Imagem elaborada pela autora Essas noções revelan1 um discurso heterogêneo que, inclusive, te1n bases na teoria do discurso bakhtiniana e, principalmente, na noção de sujeito que e1nerge dela, como • veremos a seg11rr. O sujeito para Bakhtin Para Bakhtin ( 197 8), a líng11a '' [ ... ] não e constituída por um sistema abstrato de formas linguísticas [ .. . ], mas pelo fenômeno social da interação verbal realizada através da enunciação e das enunciações''. Por meio disso, Bakhtin deixa claro que o ''eu'' nem é ne111 pode ser o ce11tro discursivo, posto que o sentido do discurso depende da interação entre um ''eu'' e um ''outro'', estabelecendo assim 11ma relação que o estt1dioso cl1ama de Dialogismo. Ao afirmar que, [ ... ] não tomo consciência de 1nim mesmo senão através dos outros, é deles que eu recebo as palav1·as, as formas , a to11alidade que forn1a a primeira i1nage1n de 111im n1es1no. Só 111e torno consciente de 1nim mesmo, revelando-me para o outro, através do outro e com a ajuda do 011tro (Bakhtin apud TODOROV, 1981, p. 148). Análise do Disc11rso J ( ___ ~_9 ___ _ Bak11tin (1978) evidencia a existência do ''tu'', que pode inclusive transfonnar e influenciar o sentido do discurso proposto pelo it1terlocutor. Isso, pois ao enunciar, o locutor estabelece um diálogo com o enunciado do receptor, em um jogo de contra disc11rso. Assim, temos em Bakhtin uma concepção de sujeito que se faz dialógica: ''O sujeito só constrói sua identidade na interação com o outro." (BRANDÃO, 2004, p. 76). O sujeito (Polifonia) em Ducrot , E em 1942 que Ducrot elabora, depois de várias tentativas, sua teoria da polifonia. Aqui, o estudioso revela a necessidade de se distinguir locutor de enunciador, seguindo novas diret1izes. Como ve111os: a) O locutor é apresentado como alguém a quem se deve imputar a responsabilidade pelo . , en11nc1ado. E a ele q11e referem o pronome eu e as demais marcas de primeira pessoa. b) O locutor, u1na ficção discursiva, é diferenciado do autor empírico, elemento da experiência (1987, p. 187). Aq1.1i Ducrot deixa claro sua recusa en1 admitir a ideia de u111 produtor de fala que se integra ao sentido descritivo do enunciado. Assim, esse pensador se distancia de outras teorias discursivas posto q11e o foco não está na polarização prono1ninal, mas sim no acontecimento estabelecido pelo surgi1nento do enunciado. Dessa maneira, o locutor recebe duas representações: O responsável pela enunciação [L]; o locutor como ser no mundo [Y]. Essas são subdivisões representam o mundo inte1no do enunciado, portanto, são seres do discurso. Assim: [L ]- Locutor constituído no nível do dizer, por meio do en11nciado: é ele que1n enuncia; [Y]- constitui-se no nível do dito, é o conteúdo do enunciado, o ser empírico referido pelo locutor [l]. ___ 1 o_o_J ( Análise do Disct1rso Segt1ndo Barbisam & Teixeira (2002, p. 168): A identificação de [Y] só é possível através de [L]. [L] qualifica o que [Y] faz, realizar um ato. Por exemplo, em Eu desejo, Eu remete a [Y], pois não é enquanto locutor que se experimenta o desejo, mas enq11anto ser do mt1ndo, e independentemente da asserção que se faz dele. Ou seja, para a teoria do sujeito de Ducrot, há um duplo de vozes, uma polifonia, que concretiza o discurso emitido em um enunciado. Por fim, caro aluno (a), veremos qual a concepção de sujeito para umjá conhecido nosso: Foucault. O Sujeito para Foucault Foucault, ao relacionar o sujeito com o poder, dá uma pers pectivaque se diferenciadas bases das perspectivas anteriores. Para esse estudioso, as relações de poder qt1e se liga ao st1jeito ah1am por completo em sua constituição. Como coloca Fernandes (2012, p. 7), essas relações ''são sutis, 1núltiplas, em diversos níveis''. Em ''O Sujeito e o poder'', Foucault (1995) explica que sua intenção 11U11ca foi analisar o poder em si, 111as sim, entender co1110 os seres humanos se tomam sujeitos. Para isso, o estudioso parte para a objetivação dos modos, e considera que um deles é a identificação e oposição do sujeito aos discursos do poder. Ao se opor, o st1jeito luta não só contra instâncias auto1itárias de poder, como tainbém contra o ''Gove1no da individualidade'', ou seja, contra o p1ivilégio do saber, bem con10 aos papéis mistificados in1postos às pessoas. Como coloca Silva & Machado (2016, p. 2003): Enfim, tais lutas giram em torno da busca de uma identidade, ''de quem somos nós'' e recusam os rótulos impostos pelas instâncias de poder que buscam determinar quem somos. Nessa luta, existe a formação de poder q·ue se aplicará à vida comum do indivíduo, na st1a identidade a ser reconhecida pelos outros. Análise do Disc11rso J ( ___ 1_0_1 __ _ Uma das questões centrais de Foucault é compreender co1110 surgen1 novos tipos de sujeitos. Diferentemente do 111arxisn10, que ente11de o sujeito e11quanto reflexo de suas condições econômicas, esse pensador entende o sujeito como algo que não é dado previamente. Assim: Para Fot1cat1lt, o fato de o sujeito ser um efeito das relações dos discursos const11.1ídos nas relações de poder, não significa que o mes1110 está submetido a um porvir inevitável. A proposta do pensador é apontar que não há u111 sujeito preestabelecido, do qual emanariam as relações de poder, pelo contrário, os sujeitos são construídos e/ou prodt1zidos a partir dessas relações, pois, para este, a própria noção de sujeito tal como é, resulta de u1na produção, visto que ''o que cha1na1nos sujeito é um enunciado social''. (SILVA & MACHADO, 2016, p.2003 ). Dessa maneira, os indivíduos podem ser chamados de nonnais, loucos, revolucionários, etc., sujeito daquele o desse discurso, daquela ou dessa ciência. A heterogeneidade volta, então, aos estudos do sujeito, quando Foucault entende que esse te111 sua identidade construída por um processo co11stante de produções e transfon11ações, já que é fruto de um an1biente heterogêneo e permeado por co11flitos sociais. Logo, a identidade de um sujeito é baseada na exterioridade social e constituída pela sua relação com o outro. Nesse contexto, o enunciado acaba por revelar a posição social do sujeito, localizando-o no emaranhado nó das relações de poder. Isso posto, O discurso como parte de um jogo de lt1tas de contradições e antagonismos referentes à vida dos sujeitos no meio social historicamente produzido, a resistência desses sujeitos também constitui uma forma de poder nas lutas, consistindo por ___ I 0_2_) ( Análise do Disct1rso esses inativos em u1na prática discursiva. (SILVA & MACHADO, 2016, p.2005). Em suma, para Foucault, do sujeito emana os discursos que revelam os jogos de poder sociais, historicamente localizados. Eles são, dessa maneira, produtores de práticas discursivas que revelam ideologias, aceitações e inquietações e1n relação aos diversos tipos de gove1nos l1istóricos. O sujeito, portanto, está no centro das relações de poder,já que é por meio dele que conflue1n as relações sociais, co1no a resistência às don1inações, por exemplo. Na Análise do Discurso, l1ouve dentre os analistas do discurso várias formas de conceber o sujeito, desde Benveniste, que enxerga enquantoo sujeito de maneira egocêntiica e, por isso, insuficiente à umaAnáiise do Disct1rso satisfatória; passando por Authier-Revt1z, que inclui na noção de sujeito a questão de heteroge11eidade; Bakhtin, que dá grande destaque a existê11cia do ''tu'', que pode inclusive transformar e influenciar o sentido do discurso proposto pelo interlocutor; Ducrot, que estabelece a noção de Polifonia para o Sujeito; e, por fim, Foucault, que coloca o Sujeito como o ser que emana discursos embasados em contextos sociais e históricos, reveladores de jogos de poder. Análise do Disc11rso J (_1_03 __ _ Formação Imaginária e Formação Discursiva Ao fim deste capítulo, esperamos que você co1npreenda como funcionam as F 011nações Imaginária e Discursiva, à luz dos estudos propostos por Pêcheux, be1n como, como essas inserem se no contexto 111aior da Análise do Discurso, ton1ando-se i1nportantes meios de análise e compreensão de textos. Formação Imaginária Partindo do conceito proposto por Lacan para o Imaginário, Michel Pêcheux elaborou o conceito de formações imaginárias para a Análise do Discurso francesa. Segundo Pêcheux (2001 ), acontece nos processos discursivos uma série de fo11nações i1naginárias ''que determinam o lugar dAe B se atribuem cada um a si e ao out1·0, a i1nage1n que eles se fazem de seu próprio lugar e do lugar do outro (PÊCHEUX, 2001 , p. 82). Nesse contexto, para o autor, existem f on11ações i1naginárias, designadas, para ele da seguinte maneira: ____ I 0_4 __ ) ( Análise do Disc11rso JA (IB)- lmagem1 ® luger de a pera o süJetbo ailocado em A: "'Quem1 ,6 eJe para q l!te e.u lhe fa le aslim2ª Figura 2 lA (A)· Imagem do lugar A 1Para o sujeito colocado em A,: "Quem :sou eu para e111 lhe falar as:sim?ff .[6(B)~ lm~Qé'fli d'õ lugi!l'r B [l'.li!'il",i!I õ sujéllõ éõlõêãdõ êffl 8; ""Q,111em $0\1 eu pã_i'ã1 ,qua @ll'é mi! f.ãlêi ãSsim?" [B (A)- Imagam do lugar de A para o stlljeuto ooloc.ado em118,: '\'Quem é ele paira ,que me falle ,assim?" Fonte: In1agen1 e laborada pela autora Para Orlandi (2003), as formações i111aginárias não fazem referência a sujeitos e/ou lugares empíricos, antes, às imagens que são resultados de suas projeções no discurso: ''São essas projeções que per1nitem passar de sitl1ações empíricas-os lugares dos sujeitos - para posições dos sujeitos no discurso. Essa é a distinção entre lugar e posição." (ORLANDI, 2003, p.40) . Análise do Disc11rso J ( ___ 1_os ___ _ Nas formações imaginárias aco11tece tun jogo de itnagens entre os sujeitos, e desses com os lugares que ocupam nos discursos e na sociedade (Discursos falados, possíveis, itnaginados). Nesse contexto, as formações imaginárias são rest1ltantes: elas surge1n de provessos discursivos ante1iores, mafinestando 110 discurso relações de força e sentido. Daí, caro aluno, vem a pergunta: O qt1e relação de forças? • seria essa A relação de força faz referência ao lugar onde o sujeito está ao emitir seu discurso. Para Orlandi (2001 ), as palavras não possuem significado sozinhas, há de existir um sujeito que as falam, em um determinado lugar ocupado, já que todo falante, bem como todo ouvinte, ocupa um determinado lugar na sociedade. Sendo assim, o sentido do que foi dito é resultado do qt1e A e B colocam em lugares determinados na organização social. Dessa for1na, o sujeito fala por 1neio do lugar de A, e suas palavras possuiria1n um significado diferente caso ele estivesse as pronunciando no lugar de B. Na relação de sentidos não existe discurso que não esteja relacionado com o outro. Os efeitos de sentido que surgem dessa relação ft1nciona da seguinte maneira: Um disct1rso apo11ta para 011tros, o sustentam, assi1n co1no para dizeres futuros. Todo discurso é visto como um estado de um processo discursivo mais amplo, contínuo . Não há, desse 1nodo, começo absoluto nem ponto final para o discu1·so (ORLANDI, 2003, p .39). ___ I 0_6_) ( Análise do Disct1rso Outrossiln, o discurso se relaciona não só co1n outros já ditos, mas também, co1n os ilnaginados, possíveis. Como dissemos, as formações imaginárias antecedem o discurso. Esse mecanismo de antecipação nada mais é do que a projeção do locutor considerando seu lugar, em relação ao lugar do seu interlocutor. Há, aqui, o estabelecimento de estratégias discursivas, que visam os efeitos que seus enunciados podem gerar sobre seu receptor, regt1lando a argu1nentação para pronunciar da n1aneira almejada. ''Co1110 se trata, por hipótese, de antecipações, deve-se observar que esses valores precede111 eve11tuais 'respostas' de B, vindo sancionar as decisões antecipadoras de A''. " (PECHEUX, 2001, p. 84). Assiln, os elementos estruturais das condições de prodt1ção disctrrsivas (Relação de sentido, força e antecipação) formam os processos de significação dos discursos. Já sabemos como os protago11istas intervé1n nas condições de produção dos discursos. Agora fica a dúvida: Co1110 o referente participa da situação? Para Pêcheux (2001), o referente é um objeto imaginário, ou seja, ele é o ponto de vista do sujeito, não a realidade fisica desse. Observemos como explicaPêcheux (2001, p. 84): '' IA(R) 'Ponto de vista' de A sobre R: 'De que ll1e falo assim?( ... ) IB(R) 'Ponto de vista' de B sobre R: 'De que ele 1ne fala assi1n' ''. Segundo Orlandi (2003), os mecanismos de u1n processo discursivo resultam do que é material, institucional do mecanismo do imaginário. Esse imaginário, nesse contexto, produz ilnagens de quem fala e do objeto de seu discurso dentro de um contexto sócio histórico. Po1ianto, te1nos a ilnagem do lugar de quem fala ( o locutor), do lugar de que1n escuta ( o interlocutor) e o referente ''é pois todo um jogo imaginário que preside a troca de palavras'' (ORLANDI, 2003, p.40). Assim, para Coelho & Pereira (2011, p. 7): Análise do Disc11rso J ( ___ 1_01 ___ _ Nesse jogo imaginário, a 1na11eira como dizer significa de um modo deter1ninado, não está relacionada com os sujeitos e111píricos que discursam, mas sim com o lugar que esses ocupam , no discurso. E dessa froma que as condições de prodt1ção se fazem presentes nos processos de identificação dos locutores, interlocutores e referente p1·esentes no discurso . Orlandi (2003) coloca que é pensando nas condições de produção de discursos, sob a perspectiva das fo1mações imaginárias, que poderemos ter várias possibilidades regidas pela forma como a fo1mação social se insere na histó1ia. Dito isso, podemos concluir qt1e a Análise do Dsict1rso desvenda a produção de sentidos e, també1n, o i1naginário que os condiciona, pois ''Os sentidos não estão nas palavras elas 1nes1nas. Estão àquem e alé111 delas." (ORLANDI, 2003, p. 42). ■ 'Caro aluno(a), acabamos de compreender como funcionam as fo11nações i1naginárias. Preparados para conl1ecer as formações discursivas? Vamos lá! Formação discursiva A primeira concepção de Fo1mação Discursiva foi elaborada por Micl1el Foucault, quando afirmou: Iluminado pela perspectiva Foucaultiana, Pêcheux desenvolveu sua própria perscpectiva, alinhada ao 1naterialismo dialético. Para esse pzensador, as formações discursivas são componentes correlacionados diretamente às fo1mações ideológicas. ___ 1 o_s_J ( Análise do Disct1rso o Formações ideológicas são um conjunto de atitudes e de representações que não se constitue1n nem ''individt1ais'', 1nt1ito menos ''universais''. Antes, se relacionam diretamente as posições de classes em disputa umas com as outras , em que a conjuntura ideológica as caracteriza enquanto u111a formação social e111 dado mo1nento. Para Pêcheux, cada formação ideológica traz uma ou mais fo1mações discursivas interligadas. Essas dete1minam O que pode e deve ser dito (articulado sob a for1na de u1na arenga, de um ser1não, de um panfleto, de u111a exposição, de u111 progran1a, etc.) a partir de t1ma posição dada numa conjuntura dada: o ponto essencial aqui é que não se trataapenas da natureza das palavras empregadas, mas também ( e sobretudo) de constrt1ções nas quais essas palavras se combina1n [ .. . ] as palavras ''mudam de sentido'' ao passar de uma fo1·mação discursiva a outra. (PÊCHEUX, 1995, p.196). Aci111a, te111os o pri111eiro co11ceito de F armação Discursiva elaborado por Pêcheux. Em um segundo momento, esse estudioso relaciona F armação Discursiva com o Interdiscurso, ou seja, liga o conceito a um outro capaz de iluminá-lo ainda 1nais, já que a interdiscursividade é a fo1mação dos interstícios: a F armação discursiva enquanto uma rede de co1nplexos discursos ideológicos que se tocan1, correlacionam-se: p1 p2 p3 p4 p5 p6 p7 p8 p9 p10 p11 p12 p13 p14 p15 p16 p17 p18 p19 p20 p21 p22 p23 p24 p25 p26 p27 p28 p29 p30 p31 p32 p33 p34 p35 p36 p37 p38 p39 p40 p41 p42 p43 p44 p45 p46 p47 p48 p49 p50 p51 p52 p53 p54 p55 p56 p57 p58 p59 p60 p61 p62 p63 p64 p65 p66 p67 p68 p69 p70 p71 p72 p73 p74 p75 p76 p77 p78 p79 p80 p81 p82 p83 p84 p85 p86 p87 p88 p89 p90 p91 p92 p93 p94 p95 p96 p97 p98 p99 p100 p101 p102 p103 p104 p105 p106 p107 p108 p109 p110 p111 p112 p113 p114 p115 p116 p117 p118 p119 p120 p121 p122 p123 p124 p125 p126 p127 p128 p129 p130 p131 p132 p133 p134 p135 p136 p137 p138 p139 p140 p141 p142 p143 p144 p145 p146 p147 p148 p149 p150 p151 p152 p153 p154 p155 p156 p157 p158 p159 p160 p161 p162 p163 p164 p165 p166 p167 p168 p169 p170 p171 p172 p173