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EBOOK - Análise do Discurso

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--- ser 
educacional 
gente criando o futuro 1elesap1ens 
.. \-' ' 1 1 l-'Í 1 1 ! ! t 1 1 ' 1 
Análise do Discurso 
© by Editora Telesapiens 
Todos os direitos reservados. Nenl1uma parte desta publicação poderá ser 
reproduzida 011 tra11smitida de qualquer modo 011 por q11alq11er outro 1neio, 
eletrônico ou n1ecânico, inclui11do fotocópia, gravação ou qualq11er outro 
tipo de sistema de armazenamento e trans1nissão de i11form.ação, sen1 prévia 
a11torização, por escrito, da Editora Telesapiens. 
Dados Internacionais de Catalogação na P11blicação (CIP) 
048a Oliveira, Adriana Ferreu·a Serafim de 
Análise do disct1rso [rec1u·so eletrônico]/ Adria.na Ferreira 
Serafim de Oliveira, Patrícia Valéria Vieira da Costa; coorde11ação de 
David Lira Stephen Barros; organização de Cristia11e Silveira Cesar de 
Oliveira - Recife: Telesapiens, 2021. 
l 72p.: il.; 23cn1 
ISBN 978-65-86073-84-3 
1. Análise do disc11rso. 2. Lmg11ística. I. Costa, Patrícia 
Valéria Vieira da. II. Barros, David Lira Stephen (coord.). 
III. Oliveira, Cristia11e Silveira Cesar de ( org.). IV. Título. 
CDD 401.41 (22.ed) 
CDU 800.85 
Bibliotecária: Maria Isabel Schiavon Kinasz, CRB9 / 626 
Análise do Discurso 
Créditos Institucionais 
Fundador e Presidente do Conselho de Administração: 
J anguê Diniz 
D ire to r-Presidente: 
Jânyo Diniz 
Diretor de Inovação e Serviços: 
Joaldo Diniz 
Diretoria Executiva de Ensino: 
Adriano Azevedo 
Diretoria de Ensino a Distância: 
Enzo Moreira 
© 2020 by Telesapie11s 
Todos os direitos reservados 
AS AUTORAS 
ADRIANA FERREIRA SERAFIM DE OLIVEIRA 
Olá. Meti nome é Adriana Ferreira Serafi1n de Oliveira. 
Sou Doutora em Educação pela UNESP - Rio Claro, com foco 
em inclusão social, direitos fundamentais e políticas públicas 
para as mulheres vítimas de violência de gênero. Estágio 
doutoral em Psicologia Social com bolsa PSDE - CAPES na 
''Universidad Complutense de Madrid - Facultad de Ciencias 
Políticas y Sociología'' co1n pesquisas desenvolvidas em 
Madrid e cercanias quanto aos serviços públicos de atendimento 
à mulher vítima de violência de gênero e quanto à legislação 
dessa temática a pesquisa foi desenvolvida com a orientação 
de professor da ''Facultad de Derecho de la Universidad 
Complutense de Madrid''. Tem experiê11cia em trabalha.r co111 
a metodologia qualitativa. Mestra em Direitos Fundamentais 
Difusos e Coletivos pela UNIMEP de Piracicaba, co1n foco 
em Direitos Humanos e Direito Internacional, com bolsa do 
programa PROSUP-CAPES. Pós-graduada em Política e 
Relações Internacionais pela Ft1ndação Escola de Sociologia 
e Política de São Paulo (FESP-SP). Bacl1arel e1n Direito pela 
Instituição Toledo de Ensino de Bauru (ITE). Pós-doutorado 
em curso pela FD-UPM. Revisora e parecerista de periódicos 
qualificados. Professora universitária. Advogada 
, , 
PATRICIA VALERIA VIEIRA DA COSTA 
Olá. Meu nome é Patrícia Valéria Vieira da Costa. S011 
formada e1n Letras com l1abilitação e1n Língua Portuguesa, 
pela Universidade Estadual da Paraíba, possuo Mestrado em 
Literatura e Interculturalidade e atualmente faço Doutorado em 
Literatura e Interculturalidade, ambos pela mesma instituição. 
Tenho experiência docente no ensino básico, por meio das 
disciplinas de Literatura e Produção de textos, passando 
por tunnas do ensino Fundamental II ao ensino Médio. S011 
apaixonada pelo que faço e adoro trans1nitir minha experiência 
de vida àqueles que estão i11iciando em suas profissões. Por isso 
fomos convidadas pela Editora Telesapiens a integrar set1 elenco 
de autores independentes. Estamos muito felizes em poder ajudar 
você nesta fase de muito estudo e trabalho. Conte conosco! 
--
1 C O N OG RA F I C OS 
Esses ícones que irão aparecer em sua trilha de aprendizagem 
significam: 
' ' , 
... , 
-
-
X 
OBJETIVO 
Breve descrição do objetivo 
de aprendizagem; 
CITAÇÃO 
Parte retirada de um texto; 
TESTANDO 
S11gestão de práticas 011 
exercícios para fixação do 
conteúdo; 
IMPORTANTE 
O contel.'.1do em destaque 
precisa ser priorizado; 
DICA 
Um atalho para resolver 
algo que foi ir1trodtLZido no 
conteúdo; 
EXPLICANDO 
DIFERENTE 
Um jeito diferente e mais 
silnples de explicar o que 
acaba de ser explicado; 
EXEMPLO 
Explicação do conteúdo ou 
conceito partindo de 11m 
, . 
caso pratico; 
PALAVRA DO AUTOR 
Uma opinião pessoal e 
pa1ticular do autor da obra; 
+ 
+ - --X ;,. 
OBSERVAÇÃO 
Uma nota explicativa 
sobre o que acaba de 
ser dito· 
' 
RESUMINDO 
Uma síntese das 
1'.1ltimas abordagens; 
DEFINIÇÃO 
Defi1úção de llID 
conceito; 
ACESSE 
Links úteis para 
fixação do conteúdo; 
SAIBA MAIS 
Informações adicionais 
sobre o conteúdo e 
temas afins; 
SOLUÇÃO 
Resolução passo a 
passo de um problema 
, . 
011 exerc1c10; 
CURIOSIDADE 
Indicação de cUiiosidades 
e fatos para reflexão sobre 
o te1na e111 estudo; 
REFLITA 
O texto destacado deve 
ser alvo de reflexão. 
_. 
ARIO 
UNIDADE 01 
A linguística imanente versus linguística do discurso ........ 14 
A linguística imanente ................................................ ............................................ 14 
Estn1turalismo .............. ' .................................................................................... . 
Gerativisn10 .......................................................................................................... 
15 
17 
A linguística do discurso ...................................................................................... 18 
Linguística Cognitiva .................................................................................. 19 
Sociolinguística Variacionista .............................................................. 21 
A língua enquanto objeto da linguística- consequências 
dessa perspectiva teórica ................................................................................. 24 
A subjetividade da Linguagem ....................................................................... 25 
A enunciação ........................... .. ......................................... .... ........................................ 28 
O discurso enquanto objeto de estudo da linguística (A 
análise do discurso) - consequências dessa perspectiva 
teórica 32 
A interpretação ........................................................................................................... ... 34 
Condições de produção e interdiscurso .................................................. 3 8 
Outros aspectos relevantes à análise do discurso ................ ... 41 
UNIDADE 02 
Enunciação, Pragmática, Argumentação, Discurso ........... .. 52 
Enunciação .......................... .. ........ ............. ............................. ...................................... ... 5 2 
A Semântica da En une i ação ..... ......... ............................................ ........ 5 3 
Prag111ática ........................................................................................................................ 5 7 
Argumentação ................................................................................................................ 6 O 
Discurso 62 .................................................................................. ' .......................................... . 
Perspectivas teóricas (Significado de Ideologia) segundo: 
Althusser Ricoeur Foucault Pêcbeux 65 ' ' ' ............................................ .. 
A ideologia segundo Althusser ....................................................................... 65 
A ideologia segundo Ricoetir ........................................................................... 68 
A Ideologia segundo F oucault ......................................................................... 70 
A Ideologia segundo Pêcheux .................................................... ....... ..... .... ..... 72 
Perspectivas da Análise do Discurso de linha americana 
(Givón); Análise do Discurso de Linha francesa (Foucault, 
Pêcbeux); Análise críticado Discurso ................................... ............ . 74 
Análise do Discurso de Linha americana (Givón) ........................ 74 
Análise do Discurso de Linha Francesa (Foucault, Pêcheux) ....... 76 
Authier-Revuz e a Análise Crítica do Discurso 82 
Authier- Revuz 82 ............... ... .......................... ................................. ................................. 
Análise Crítica do Discurso 85 
UNIDADE 03 
Sujeito do Discurso: Benveniste, Authier-Revuz, Bakhtin, 
Ducrot e Foucault 94 
As diversas formas de conceber o sujeito do Discurso ...... 94 
O Sujeito para Benveniste ....................................................................... 95 
O sujeito para Authier-Revuz ............................................................... 97 
O sujeito para Bakl1tin ................................................................................ 98 
O sujeito (Polifonia) em Ducrot ......................................................... 99 
O Sujei to para F oucaul t ......................... .. .. .. ............. ................ .. .. .. ........ 1 O O 
Formação Imaginária e Formação Discursiva ........... .... ...... .. 103 
F armação Itnaginária ........................................ .. .................................... ............. 103 
F armação discursiva ... .... .. .................... ................................... .... .. ....................... 107 
Ideologia e Suj eito ................................................................................................ 112 
A Forma-St1jeito ..... ............................. ... .......................................................... ........ 117 
O sujeito e sua forma histórica ............... .. ....................... ..................... .. 120 
Subj etividades ............................................................................................................ 125 
UNIDADE 04 
O intradiscurso, o interdiscurso e a memória discursiva ...... 130 
O intradiscurso 
Interdiscurso ................................................................................................................ 
131 
132 
F or1nações discursi vas ........................................................... .. ........................... 13 3 
A intertextualidade 139 
Intertex tualidade: uma questão discursiva ........................................ 14 5 
Dispositivo de Análise: O lugar da interpretação­
Interpretação versus compreensão; textualidade e 
discursividade 147 
Interpretação versus compreensão ........................... ................................ 14 7 
Textualidade e discursividade 151 .................................... .................................. 
Tipologias e relações entre discursos: Discurso autoritário; 
discurso polêmico; Discurso lúdico .................................................... 155 
Discurso autoritário; discurso polissêmico e discurso lúdico ..... 159 
Referências 163 ....... ...... .............................. ....................................................................... 
Análise do Disc11rso J ( ___ 1_1 ___ _ 
___ 12_) ( Análise do Discurso 
--
INTRODU AO 
Você sabia que a área da Linguística é u1na das mais 
importantes para o conl1ecime11to da Língua? Desde o início do 
Século XX que linguistas de variados países mergulham nessa 
á1·ea, com o intuito de desvendar os mistérios que circundam a 
linguagem. Nesta disciplina, você conhecerá o percurso teórico 
que se inicia com o famoso Sausslu·e, considerado o ''O pai da 
lingl1ística moderna'', até as concepções mais conte1nporâneas 
relativas aos estudos sobre a linguage1n. Nessa primeira unidade, 
apresentaremos a você u1n estudo convidativo a co11hecer a 
Linguística Imanente, bem co1no a Linguística do Discurso, 
chega11do ao interessante conteúdo que é objeto da nossa 
disciplina em questão: A Análise do discurso. Ao longo desta 
unidade letiva você vai mergulhar neste universo! 
Análise do Disc11rso J ( ___ 1_3 ___ _ 
OBJETIVOS 
Olá. Seja muito bem-vindo a nossa Unidade 1. Nesta 
unidade, o nosso objetivo é auxiliá-lo 110 desenvolvimento das 
seguintes competências profissionais: 
Compreender as diferenças entre a Ling11ística 
Imanente e a Linguística do Discurso; 
E11tender como a Líng11a se toma objeto da 
enunciação para a Linguística 1nodema, e como a 
co111preensão da enunciação interfere positivamente 
na origem da A11álise do Discurso; 
Conceber a Análise do Discurso enquanto resultante 
dos estudos que a antecedem, além de assimilar 
con10 essa perspectiva amplia as compreensões 
linguísticas anteriores; 
Investigar como a Análise do Discurso se to1nou 
u1na perspectiva crítica, nos contextos históricos, 
soc1a1s, econômicos e etc., para o estudo da 
linguage1n. 
Então? Está prepa1·ado para uma viagem sem volta rumo ao 
conhecimento? Ao trabalho! 
___ I 4_) ( Análise do Discurso 
A linguística imanente versus linguística 
do discurso 
Caro aluno(a), ao término deste capítulo, você será capaz 
de entender co1110 funciona a Análise do Discurso. Isso será 
funda1nental para a co111preensão de uma das grandes co1Tentes 
de estudo do curso de Letras, responsável por grande parte das 
pesquisas na área, bem como contribuirá para exercício de sua 
docência em sala de aula. E então? Motivado para desenvolver 
essa competência? Va1nos lá. Avante! 
A linguística imanente 
Desde a antiguidade, o ho1nem passa por motivações 
práticas qt1e o leva a refletir sobre a estrutura das língt1as e set1s 
t1sos. Apesar de Pêcheux (1990, p.38) afirmar que a ''reflexão 
sobre a linguage1n não tem evidentemente, co1neço histórico 
assi1nilável'', desde o antigo Egito, passando por Fenícios e 
Hindus, além de out1·os povos, o registro escrito é problematizado 
pela tomada de consciência, geralmente empírica, da estrutura 
da língua para fins de comunicação. Essa realidade nos leva a 
compreensão da imanência da língua, ou, mais propriamente, 
sua realidade material. Formalmente, a linguística imanente 
está para a ''teoria da linguagem'', co1no coloca o dinamarquês 
Hjelmslev, em seu livro ''Prolégomenes à tine théorie dt1 langage'' 
(Prolegô1nenos a ut11a teoria da ling·uage111). 
Como, então, consideramos as Linguística Imanente nos 
dias de hoje? 
Análise do Disc11rso J (_1_5 __ _ 
Hojee1ndia,alinguísticalmanenteéumdosprincípiosdoque 
chaman1os 1nais comumente de Linguística fo1mal, que antecede 
e ilu111ina o posterior surgi111ento da Linguística do discurso. 
Em se tratando de Linguística formal, é necessário 
compreender que essa concebe a língua enquanto est1utu1·a. 
Sendo assim, ''A língua é entendida co1no um objeto at1tônomo 
independente das intenções de uso e da situação comunicativa 
(MALELOTTA, 2008, p.87). No contexto formalista, surgiram 
duas vertentes: O estruturalisn10, do suíço Ferdinand Saussure, 
que i11augura a Linguística moderna; e o Gerativis1no, do no1ie­
americano N oan Chomsky ( 19 5 7). 
Estruturalismo 
Preparado (a) para conhecer o famoso ''Pai da linguística 
moderna''? Vamos lá! 
A teoria Sausst1riana ganha espaço nos estudos linguísticos 
por 1neio da publicação póstuma do ''Curso de Linguística geral'' 
( 1916), um compilado de escritos de Saussure efetivado por seus 
alunos Charles Bally e Albert Sechehaye. Para Fiorin (2002), 
apesar de, 110 livro, não estar claramente exposto dessa fonna, 
os estudiosos costumam dividir a teoria saussuriana em quatro 
princípios ou dicotomias, são elas: 
Sincronia versus Diacronia 
Indo de contra ao estudo da evolt1ção histórica das línguas, 
a diacronia, (vigente até fins do século XIX), Saussure prioriza 
a descrição sincrônica, objetivando descrever a estrutut·a de 
uma determinada língua em seu recorte temporal, sem levar em 
consideração seu processo evolutivo. Sobre essa perspectiva, 
Fiorin (2002, p. 79) comenta que: 
Contraria1nente ao estudo da mudança linguística, 
o ponto de vista sincrônico vê a língua como u1n 
siste1na em que u111 elemento se defu1epelos den1ais 
elementos. No estudo sincrônico, um determinado 
___ I 6_) ( Análise do Disct1rso 
estado da língua é isolado de suas mudanças 
através do te1npo de e passa a ser estudado 
como um siste111a de elementos linguísticos. 
Esses elementos são estudados não mais em suas 
mudanças históricas, mas nas relações que eles 
contraem, ao mesmo tempo, uns co1n os outros. 
Língua versus fala 
Saussure elege a língua como seu objeto de estudo 11a 
linguística, já que a considera sistêmica e coletiva. Para ele, 
a língua define-se enquanto um siste1na composto por signos 
linguísticos, encadeados para formar um todo organizado em que 
cada signo é interdependente e definido por sua ordem e função. 
Significado versus significante 
Para o estudioso, essa é a dicoto111ia mais importante, posto 
que forma o signo linguístico acima mencionado. Para Saussure 
tudo é signo, já que tudo significa algo. Sendo assim, significante 
seria a image1n acústica, 1naterial, de algo, co1no por exe1nplo 
escrever a palavra ''computador''. Já o significado é o conceito 
imaterial disso, Oll seja, as interpretações que competem a esse 
signo: aparelho tecnológico; n1eio comt1nicacional, etc. 
Sintagma versus paradigma 
O Paradigma é o conjunto de con1ponentes do qual o 
sujeito pode se valer para co111por seu e11unciado; já Sintagma 
é a escolha. Por exemplo, um sujeito pode dizer ''A água está 
fria''. A palavra ''fria'' poderia facilmente ser substih1ída por 
''temperatura'', por exemplo. No entanto, a escoll1a feita foi 
''água'', o que caracteriza o eixo do sintagma. Já os outros 
tennos como ''temperatura'', etc., que poderiam ser escolhidos, 
constituem o pa1·adigma. 
Co1110 vin1os, o Estruturalismo Saussuriano pode ser 
pensado como o estudo da língua enquanto um sistema fechado 
em si mesmo, se1n interferência de fatores extralinguísticos 
como o contexto situacional, dent1·e outros. Críticas à parte, o 
Análise do Disc11rso J ( ___ 1_1 ___ _ 
Estruttrralismo i1úluenciou diversas vertentes da produção de 
conhecimento linguístico no decorrer do século XX. 
Gerativisnio 
A partir da segunda n1etade do século XX, surgiu uma 
11ova abordage111 linguística, o Gerativismo. Formulado pelo 
linguista Chomsky, manifestou-se como uma nova proposta de 
investigação da linguagem. Esse estudioso optou por uma posttu·a 
racionalista para formular sua teoria dos estudos lingt1ísticos. 
Para Chomsky (2005), a língua deve ser estudada de for1na lógica 
e abstrata. Nesse contexto, essa passa a constituir um siste1na de 
regras e princípios compostos na 1nente humana, considerando 
que qualquer sujeito exposto a u1n ambiente apropriado pode 
adquirir ( a gramática de) qualquer língua. 
Pragmático, Chomsky tem como base da gi·amática gerativa 
três questões básicas, a saber: ''a) O qt1e constitui o conhecimento 
da Língua? b) Como é adquirido o conheci1nento da Língua? 
c) Como é usado o conl1ecime11to da língua?'' (CHOMSKY, 
1994, p.23). A resposta a essas questões, para o pesquisador, 
está 11a mente hu1nana, que possui un1a gramática internalizada, 
explicada de duas maneiras: Gramática enquanto dicionário 
mental de f armas da língua; gramática enqt1anto sistema de 
regras e princípios que atuam sobre as formas. Nesse ínterim, 
a gi·a1nática une-se com os demais sistemas conceituais mentais 
para articular o som. No processo formal, as expressões p1imeiro 
passam pelas regras para só depois ganharem significação. 
Para o Gerativis1110, o ser humano nasce com u111 conjunto 
de princípios relacionados ao funciona1nento da língua, ou 
seja, a aquisição da linguagem toma-se u1na herança genética. 
Se genético, portanto, comum entre todas as línguas. Assim, a 
abordage1n gerativa busca as características gerais da linguagem, 
explicando e descrevendo propriedades que compõem o que o 
Chomsky chama de Gran1ática Universal (GU). 
___ 1 s_J ( Análise do Disct1rso 
Considerado u1n dos 1naiores teóricos conte1nporâneos, 
Chomsky contribuiu de diversas 1naneiras para os estudos 
linguísticos. Apesar de formalista tal co1110 Saussure, o estudioso 
não concorda com a concepção de que a língua é uma convenção 
social, mas sim um fenômeno biológico humano. Ambos, 
Sausstrre e Chomsky, aproximam-se q11ando considera1n a língt1a 
uma forma homogênea e idealizada. No entanto, diferem-se 
quando, por exe1nplo, para o p1imeiro, a língua é um conjunto de 
signos sociais; en.quanto que, para o segundo, ela é u1n conjunto 
de sentenças for111uladas com bases biológicas. 
A linguística do discurso 
A linguística do discurso ultrapassa os limites da linguagem 
enquanto um sistema formal, passando a valorizar os usos da 
líng11a em situações reais de com11nicação, além das relações 
entre função e forma. Ou seja, para a Linguística do discurso 
a língua é uma estrutura f onnal perpassada por realidades 
subjetivas tanto histó1icas quanto sociais, que influenciam e são 
influenciadas pelo siste1na. 
Essa nova perspectiva motivou o surgimento de diversas 
vertentes que, apesar de suas particularidades, de umamaneira geral: 
( ... ) considera a língua e1n uso, observando os 
fenômenos de variação e mudança linguísticas, 
as interpretações face a face ( e de outros tipos) 
entre falante e ouvinte, as influências sociais e 
psicossociais na estrutura da língua, a ideologia 
e a co11st17.1ção da subjetividade, os atos de fala 
no lugar de frases e sentenças verdadeiras e 
gramaticais, as implicaturas conversacionais entre 
outros fatores. (MARTELLOTA, 2008, p.88) 
Dentre muitas vertentes, ressaltare1nos duas das principais, 
a saber: a Linguística cognitiva e a Sociolinguística variacionista, 
refletindo proxi111idades e distancian1e11tos e111 relação ao 
paradig1na f onnalista. 
Análise do Disc11rso J ( ___ 1_9 ___ _ 
Linguística Cognitiva 
O q11e seria a Linguística cog11itiva? 
Surgiu no final da década de 1970, na Califó1nia, a 
Linguística Cognitiva, resultante de 1upturas teó1icas de 
alguns dos gerativistas. Nesse período, se destacaram nomes 
co1no George Lakoff e Charles Fillmone. Com o tempo, essa 
abordagem passot1 a ser cha1nada de Sociocognição, visando 
destacar o poder do contexto social para a linguage1n (já não 
1nais autônoma): C11ltura e sociedade como bases da cognição 
hmnana, da co1npreensão do m1111do. Portanto, essa vertente 
não separa conheci111ento linguístico do conhecllnento 11ão 
linguístico, assu1nindo uma postura que vai de contra a visão 
racionalista do gerativismo. 
Para a Sociocognição, os interlocutores são o centro da 
constn1ção de sentido, ou seja, a comunicação entre indivíduos 
em situações reais de interação discursiva é o ponto chave. 
A linguagem deixa de seru1n sistema que independe 
do falante ou um conjunto de regras finitas e ganha 
uma dimensão social e cognitiva cuja função é 
possibilitar a seus usuários meios para reportar 
o disct1rso alheio, inflt1enciar ot1tras pessoas, 
narrar acontecimentos, fazer avaliações, ser 
impreciso, falsear infor1nações, predizer o fut11ro, 
expressar sentimentos. (SALOMÃO, 199, p.65) 
Para Lakoff & Johnson (1999), a mente não é separada 
do COIJJO, assi111, muitos dos significados se dão por meio 
da estrutura corporal humana, chamados teoricamente de 
pensa1nentos corporificados. Aqt1i, consideramos a soma da 
inferência conceptual à inferência sensório-motora. 
Quando usa1nos expressões relativas ao espaço, sendo que 
esse significa tempo. Vejamos: 
Dias atrás estive em São Paulo 
___ 2_0 ___ ) ( Análise do Discurso 
Temos acima, originalmente, a palavra ''atrás'' co1110 um 
referente espacial (atrás de algum lugar, posicionan1ento). No 
entanto, 110 contexto dessa oração a palavra sublinhada refere-se 
a um tempo anterior, sensorial. 
Como vi111os, a mente humana desenvolve um processo 
de reelaboração de informações que surgem inicialmente de 
domínios cognitivos distintos. A esse processo da1nos o no1ne de 
''1nesclage1n'', em que relações sintáticas abrem 1narge111 para os 
aspectos semânticos, em busca de sentido (s).Observe a figura abaixo: 
Input 1 
figura 1: Modelo esque111ático do processo de mesclagenJ conceptual 
Baseado e111 Fouconnier e l'u.mer (2002) 
Espaço Genérico 
Fonte: O autor 
Input 2 
Segundo Fouconnier e Turner (2002), esse processo se dá 
por pelo menos a conexão de quatro domínios: dois inputs de 
entrada; um esque1na genérico (possibilidade de interação) e a 
mescla ( o novo sig11ificado). 
Análise do Disc11rso J ( ___ ~_1 ___ _ 
Podemos perceber, portanto, que a Sociocognição 
ultrapassa o Fonnalismo em diversos aspectos. Dentre eles, a 
crítica à limitação gerativa, posto que apesar de se aproximar das 
ciências cognitivas, o Gerativismo entende a linguagem como 
autônoma, priorizando a sintaxe, enquanto que a Sociocognição 
valoriza a semântica por 1neio da utilização dos sentidos para o 
processo de const1ução da linguagem. 
Por fim, enquanto que na linguística fo11nal o sujeito é 
irrelevante, na Sociocognição o sujeito é o centro na constrt1ção 
de sentido, ou seja, o ho1nem significa o inundo de acordo co111 
suas experiências pessoais, sociais, econômicas e culturais. 
Sociolinguística Variacionista 
As pesquisas em to1no da Variação linguística surgiram 
nos Estados Unidos na década de 60, pela iniciativa de Willian 
Labov. Para Labov (2008), um dos principais intt1itos dessa nova 
perspectiva é identificar, descrever e interpretar as variações 
da língua levando e1n consideração grupos étnicos, etários, 
regionais, de gênero, etc., que compõem a sociedade. 
Segundo Wem·eicl1, Labov & Herzog (2006), a 
sociolinguística enfoca a língua em seu contexto usual. Para 
tanto, toma-se relevante aspectos linguísticos formais, sociais e 
culturais quando da necessidade de investigação sobre variações 
e mudanças linguísticas, principalmente pela consciência de 
que a variação em seu uso não ocorre de 1naneira aleatória, mas 
sim condicionada por um arcabouço de regras organizadas pela 
divisão social em classes. 
, 
E possível identificar, primeiramente, dois grandes grupos: 
O da norma padrão, linguagem de prestígio social, regida, 
comumente, pelo domínio da gramática normativa, geralmente 
trabalhada de 1naneira intensiva nos ambientes escolares, 
principalmente por estar articulada, sobretudo, à ascensão social 
dos indivíduos; e a norma não padrão, geral1nente estigmatizada 
___ 2_2 ___ ) ( Análise do Discurso 
por 11ão oferecer os 111esmos acessos 
padrão disponibiliza aos sujeitos. 
. " . soc1oeconom1cos que a 
No combate a const111ção de estigmas linguísticos, a 
Sociolinguística elege a diversidade linguística, que considera 
não só as regras da língua como, sobretudo, as relações de poder. 
Essa consideração é rest1ltado da ciência da língt1a enq11anto 
instituição social locada historica1nente e que, por isso, fi1ncio11a 
e1n diversos contextos situacionais. 
Vejamos a tirinha abaixo: 
~--:io. 
Q41C01 
INDAOCM.~ 
P~ Q.I N.1111 FIZ A 
UCÃOPICMA.l40JII 
Fonte: Mauricio de Sousa Produções 
1 
661◄ 
Chico Bento é um personagem cujo modo de falar difere 
da nonna culta padrão, já que caracteriza, em sua fala, u1na 
variação regional. A tirinha, para registrar esse modo de fala, 
reproduz a linguagem proveniente do contexto social a que ele 
está inserido. No diálogo com a professora ( que domina a nor1na 
padrão, o que lhe garante status social para exercer o cargo que 
ocupa) percebe1nos que o ''st1sto'' dela se deve não aos supostos 
''erros'' linguísticos cometidos por Cl1ico, 1nas si1n, pela sua 
esperteza em se livrar da hipótese de um castigo, revelando a 
compreensão da professora não só do uso oral da língua, como 
também o do1nínio das Variações linguísticas. 
Análise do Disc11rso J ( ___ ~_3 ___ _ 
E111 relação ao Estruturalis1no, a Sociolinguística se 
aproxi1na dessa linha de pensa1ne11to ao, como Saussure, 
considerar a linguística co1110 u111 fe11ômeno social. Apesar 
disso, as diferenças são mais reconhecíveis. Dentre elas, o 
fato Sociolinguística Variacionista fazer llSO de uma reflexão 
diacrônica ( diferente1nente de Sal1Ssl1re) já que essa valoriza 
os processos sócio históricos influenciadores das mudanças 
da língua. Alé1n disso, diferentemente do Gerativismo, para a 
Sociolinguística é fundamental a coleta do maior nú111ero de 
dados de falantes possível em situações de fala reais, por meio 
de recUI·sos de áudio. 
Para aprofundar seus conhecimentos em torno da 
Sociolinguística, recomendamos os livros ''A língua de Eulália' ', 
bem co1no ''Preconceito linguístico'' , ambos de Marcos Bagno. 
___ 24_) ( Análise do Discurso 
A língua enquanto objeto da linguística­
consequências dessa perspectiva teórica 
Anteriormente vimos que Saussure, considerado ''pai'' da 
Linguística moderna, em suas dicotomias, privilegia a língua, 
já que essa ''é u1n siste1na supra individual utilizado como meio 
de comunicação entre me1nbros da sociedade'' (COSTA, 2008, 
p.116). Ela se faz, para o estudioso, enquanto parte essencial da 
linguagem, posto que, sem ela, é i111possível conceber o contato 
entre indivíduos de uma mesma sociedade, daí surge seu caráter 
social. A fala, nesse contexto, tem um papel secundário, já que é 
considerada específica de cada indivíduo. 
Aprendemos, no decorrer dos estudos enu·e Linguística 
imanente e Linguística do Discurso que a língua, bem como a 
fala, tomam maiores amplitudes conceituais que t1ltrapassaram 
as concepções estabelecidas por Saussure, co11forme os estudos 
linguísticos foram avança11do durante o século XX, o que 11ão 
tira de Saussure a iniciativa ter colocado a língua como u111 dos 
principais objetos da linguística moderna. 
A partir de Saussure, muitos estudiosos debruçaram­
se sobre o estudo da língua. Dentre eles temos o linguista 
' francês Emile Benveniste, e porque vamos enfocá-lo? A 
escolha por esse teórico justifica-se, pois, apesar de partir de 
Saussure, ele conseguiu ampliar a concepção de lí11gua por 
1neio da possibilidade de análise de sua particularidade à luz 
de outras grandes ciê11cias, co1no a Psicologia social, Filosofia, 
Pragmática e a Antropologia, por exemplo. Assim, Benveniste 
contribuiu de maneira significativa para o legado da língua e 
Análise do Disc11rso J ( ___ ~_s ___ _ 
para consequências pos1t1vas no sentido da a1npliação desse 
conceito no âmbito da linguística. 
Va1nos conhecê-lo? Vejamos o trecho a seguir: 
Não atingimos nunca o homem separado da 
linguagem e não o ve1nos nt1nca inventando-a 
, 
[ ... ]. E um l1ome111 falando q11e encontramos no 
mundo, um homem falando com outro ho1ne1n, e 
a linguagem ensina a própria defi11ição do homem 
(BENVENISTE, 2005, p. 285) 
Ou seja, para Benveniste a linguagem é natural, compõe 
a nah1reza humana, portanto, é nela que se faz o st1jeito, é por 
meio dela que se pode emergir um ''eu'', subjetivo, consciente de 
sua existência. A subjetividade é, para o linguista, norte para a 
co1npreensão da linguage1n e, por isso, daremos ênfase a ela agora. 
A subjetividade da Linguagem 
Para compreender a concepção do l101ne1n en.quanto 
sujeito, Benveniste elabora uma relação dialética em que o 
''eu'' cria uma interdependência com o ''tu'', chamada de ''eco''. 
Essa polaridade constituída toma-se a condição fundamental 
da linguagem, já que existe no homem para fazê-lo sujeito, 
na medida em que o ''eu'', marca absoluta de subjetividade, é 
transcendente ao ''tu'', ot1 seja, necessita de u111 h1 para estabelecer 
, 
sua existê11cia. E nesse ponto que Benveniste concebe a língua 
enq·uanto categoria de 1naior i1nportância enunciativa. Isso 
porque ''eu'' e ''tu'', pronomes pessoais existentes em todas as 
línguas, não existem por si mesmos, mas sim, pela atribuição de 
uma referência. Em outras palavras, Benveniste quis dizer que 
o ''eu'' não existe sozinho, há a necessidade de um outro, o ''tu'', 
para afirmar a existência do sujeito e vice-versa, po1ianto, é a 
língua, na enunciação, que concretiza a existência. 
Na subjetividade da linguagem os prono1nes ''eu'' e ''tu'' 
são essenciais. Veja1nos estacolocação de Juchem (2008, p.17): 
___ 2_6 ___ ) ( Análise do Discurso 
Esses prono1nes, assi1n como outros indicadores 
autorreferenciais, diferen1 de todos outros signos 
linguísticos por terem con10 referência o sujeito 
que enuncia e a instância de discurso em que 
são enunciados. Eu e tu só têm referência na 
''realidade do discurso'' , sendo o eu a pessoa que 
enuncia a instância de discurso que diz eu em 
referência a um tu, dada a situação de alocução. 
Eu e tu sofre1n u111 duplo processo: de eu referente 
enquanto enunciado e de eu referido enquanto tu 
enuncia, assim sucessivamente. Pode-se dizer que 
et1 e tu transitam entre os locutores nas instâncias 
de discurso porque se presst1põem. 
Po1ianto, ''eu'' e tu'', instituídos pela língua, constitue1n, 
por meio da ling·uage1n, o sujeito e seu interlocutor e vice-versa. 
Para Benveniste (2005), a subjetividade reside na ciência de 
que o ''eu'' só existe quando tem consciência de si por 111eio 
da enunciação, permitindo ao ''tu'' que esse tambétn seja ''eu'', 
como utn retorno. 
Para esclarecer essa concepção, vejamos a tirinha a segt1ir: 
As VEZES ME PERGUNTO 
l'On QtlE ESTOU AOOI. 
• 
• 
AsvfZES 
EU ME 
PERGUNTO 
A,.fESMA 
COIS4. 
~ TN.ff!SW SE 
PERGUNTA POn QUE 
ESTÁAQUI? 
•--:it..:-:;;.,- --1 __._ _ _ _ • •• 
1 
__ ---.JJ 
Johnn}' TJ:ir A C Jor1u1/ clt4 Tur,le, 28 6 fl 991 
Fonte: Johnn Ha.rt A. C. Jon1al da Tarde 
Repare que o ''eu'' e o ' 'tu'' trocam de posição durante o 
diálogo, e é exatamente a essa consciência subjetiva da existência 
de dois indivíduos por meio da língua, ou seja, eles existem por 
meio da linguagem. 
Análise do Disc11rso J ( ___ ~_7 ___ _ 
Além dos prono111es pessoais supraditos, Benveniste 
(2005) conclui que há, nas instâncias do discurso, enunciados 
que reme11tem ao que cha111a111os de situações objetivas, 
representadas pela te1·ceira pessoa, assim, ''o membro não 
marcado da con·elação de pessoa [ ... ] sendo o único modo de 
enunciação possível para as instâncias de discurso que não devam 
remeter a elas mesmas'' (ibid., p. 282). Exe1nplificando, existem 
quatro propriedades que diferenciam a terceira pessoa ''ele'', do 
''eu'' e ''tu'': a) de co1nbinar com qualquer referência de objeto; 
b) de não refletir a instância de discurso; c) de ter u111a gra11de 
variação pronominal ou demonstrativa; d) de não se equiparar 
ao aqui-agora. Nesse contexto, o prono1ne ''ele'' ''não remete a 
nenhuma pessoa, porque se refere a tun objeto colocado fora da 
alocução. Ele só existe e se caracteriza po1· oposição a pessoa eu. 
(BENVEN1STE, 2005, p. 292). 
Até agora vimos que, para Benveniste, wna das formas de 
organização da língua se dá pelo par dialético eu/tu, que 
subjetivamente constitui sujeitos quando esses enunciam. 
Além do par opositivo eu/tu, Benveniste elege também, 
para a organização das línguas, a noção de tempo. Se é no 
exercício da língua qt1e encontramos sua subjetividade, logo, o 
tempo é presente a todo instante, posto q11e é ''O tempo e1n que se 
, 
fala''. E no presente e1n que se 1nanifesta o ''eu'' e tudo atribuído 
a ele. O te1npo, po1ianto, marca o aqui-agora da linguage1n. 
___ 2s_) ( Análise do Disc11rso 
Eu 
Aqui/ 
Espaço 
Figura 2 - Os tempos 
Tu 
Quadro da 
Enunciação 
Fonte: Editorial Telesapiens 
Agora/ 
lempo 
Acima, te1nos o qt1adrinômio et1-tu-aqui-agora, representado 
pelo quadro da enunciação, perspectiva basilar dos estudos 
da língua propostos por Benveniste que veremos co1n mais 
profundidade a seguir. 
A enunciação 
Para Benveniste, a enunciação é definida con10 ''o colocar 
e111 funcionamento a língua por un1 ato individual de utilização'' 
(BENVENISTE, 2006, p. 82). Ou seja, enunciar é o ato de colocar 
a lingt1agem em funcionamento. Segt1ndo Juchem (2008, p.18), 
ela é vista por meio de três principais aspectos: 
a. o pri1neiro remete à realização vocal da língua, 
possível por um ato individual no interior da fala, 
sendo que, ne1n mesmo para o mes1110 sujeito essa 
realização é idêntica, ainda que sobre a mes111a 
experiência vivida; logo, a irrepetibilidade da 
enunciação ocorre até para o próprio loct1tor; 
b) dessa produção individual decorre o segundo 
aspecto, que supõe ''a conversão individual da 
língua em discurso'', processo definido como 
se1nantização da lí11gua, segundo Benve11iste 
Análise do Disc11rso J ( ___ ~_9 ___ _ 
(ibid., p. 83)11; c) a terceira abordagem pretende 
traçar um quadro formal da ent1nciação sob 
consideração do ato en1 si, as situações e os 
instrumentos de sua realização. 
Essencial para a existência da enunciação é o interlocutor: 
se1n ele só há ape11as uma possibilidade de língi1a, não o ato 
concreto. Entretanto, o interlocutor só existe se houver, da 
parte do locutor, uma apropriação da língua que estabelece u1n 
111ovimento de referência e con·eferência, já que um pede o 
outro, um ''tu'', u111a via de mão dupla. E111 outras palavras, é na 
enunciação que o ''eu'' apropria-se da língua, concretizando-se 
no tempo, o presente. Para Benveniste (2006), passado e futuro 
não fazem parte da entmciação, pois o enunciado é sempre 
atualização. Assim, o tempo é sempre presente, contínuo e 
coextensivo, Uin aqui-agora que só existe pelo se1·. 
Dessa maneira, podemos entender a referência como 
i111portante para o ent1nciado, já que o ''eu'' se encontra no centro 
da língua, marcado pelo presente. Nesse âmbito, se toda língua 
perpassa o sujeito, toda ela tem referenciação, ou seja, todos os 
signos estão ligados ao ''eu'' e são, portanto, referenciais. A língua, 
na teo1ia da enunciação, é sempre referência, não diretamente 
ao mu11do, 1nas sim em relação ao sujeito com o inundo. 
Se a língua é referência, como, então, os signos são 
referenciados na enunciação? 
A resposta é simples. Para Benveniste há, na língua, um 
aparelho de ''funções'', que se adequa ao contexto comunicacional 
da entu1ciação. Essas ft1nções são a inti1nação, interrogação e 
asserção, e todas denota1n sentidos específicos de comu11icação. 
O quadro formal da enunciação, para Benveniste, é o eu­
tu-aqui-agora, considerando índices de pessoa, espaço/tempo, 
referindo-se, sempre, a enunciação. Flores e Teixeira (2005, 
p.36) esclarece que ''o aparelho formal da enunciação é uma 
espécie de dispositivo que as línguas têm para que possam 
___ 3o_) ( Análise do Discurso 
ser enunciadas. Esse aparell10 nada mais é que a marcação 
da subjetividade na estrutura da língua''. O aparelho pode ser 
se1npre universal, porém, seu uso é se111pre i11dividt1al, 111es1110 
que o propósito da teoria enunciativa não seja o sujeito em si, 
antes, as suas marcas no ato da enunciação. 
Te111 ctrriosidade e1n e11tender ai11da mais sobre o processo de 
enunciação de Benveniste? Acesse http://bit.ly/2SER7yl 
Colocadas as concepções de Benveniste sobre a língt1a, 
resta-nos a pergunta: Quais as consequências dessa perspectiva 
teórica? Podemos listar algu1nas, vejamos: 
! Diferentemente da linguística formal, Benveniste 
reconhece o sujeito como pertencente ao siste1na da língua; 
além disso, o linguista considera a natureza da subjetividade, 
marcando a necessidade de reconhecer a língua enquanto 
instância(s) do discurso, não apenas um repertório de signos 
como outrora colocado por Saussure; 
2. Be11veniste atribui à lli1gua o status de significação, que 
só se dá por vias do discurso, ou seja, na enunciação. Flores 
(2008, p. 12) exemplifica com clareza essa perspectiva quando , 
diz qt1e ''E no uso da língua que um signo tem existência; o qt1e 
não é usado não é signo; e fora do uso o signo não existe. Não l1á 
estágio intermediário; ou está na lí11gua, ou está fora da língua''; 
3 Para Benveniste o foco é o sujeito, é ele quem atualiza 
o sistema linguístico, articulando e significa11do. Desse modo: 
A língua - Subjetividade 
Sujeito - Intersubjetividade 
Análise do Disc11rso J ( ___ ~_1 ___ _ 
(Relembra111os aqui a relação interdependente entre os 
pronomes pessoais ''eu'' e ''tu'') 
4. Por fim, Benveniste inaugura umpensamento novo 
sobre a língua: A enunciação, que contribuirá, mais a frente, 
para os presst1postos da Análise do Discurso estudada na 
contemporaneidade e proposta por essa disciplina. 
___ 32_) ( Análise do Discurso 
O discurso enquanto objeto de estudo 
da linguística (A análise do discurso) -
consequências dessa perspectiva teórica 
Até então, os capítt1los anteriores propuseram tun percurso dos 
estudos linguísticos até que pudéssemos chegar, de maneira 
1nais clara, ao ponto central de nossa disciplina: A Análise do 
Discurso. Va111os conhecê-la? 
Como vi1nos anterio11ne11te, existem 1nuitas 1naneiras de 
estudar a linguagem: a língua enquanto sistema de signos; as 
diferentes normas de linguagem (lembremos da norma culta e da 
variação linguística); a enunciação, dentre outras. Essa variedade 
expõe muitas maneiras de significar, e foi a partir dessa ciência 
que surgiu a Análise do Discurso. 
O que seria então, caro aluno (a), a Análise do Discurso? 
Considerada enquanto u1na teoria política de Leitura, A 
análise do Discurso nasce na França na década de 1960, tendo 
como Fundador o estudioso Michel Pêcheux. Para Orlandi (2007 
p. 15) essa perspectiva, co1no seu próprio nome refere: 
Não tra1na a língua, não trata da gramática, embora 
todas essas coisas lhe interessem. Ela trata do 
discurso. E a palavra Discurso, etimologicamente, 
tem em si a ideia de curso, de percurso, de correr 
por, de movin1e11to. O discurso é assim palavra em 
movimento, prática de linguagem: com o estudo do 
discurso observa-se o homem falando. (Grifo nosso). 
Análise do Disc11rso J ( ___ ~_3 ___ _ 
Ou seja, a Análise do discurso, diferente de algu1nas das 
concepções anteriores, não trabalha com a língua na qualidade 
de u111 siste111a abstrato. Ela procura entender a língua enquanto 
sentido (s), como um trabalho simbólico, pa1ie constitutiva 
do homem e da história desse. Nesse âmbito, por meio dessa 
perspectiva surge a oportunidade de entender o qt1e faz o 
ho1ne1n ser o que é, compreender sua capacidade de significar 
e significar-se. Portanto, na Análise do Discurso a linguagem 
( o disct1rso) toma-se mediadora entre o ho1nem e sua realidade 
individual e social. 
O que interessa à Análise do Discurso é o movimento: 
as maneiras de significar; pessoas se comunicando e trocando 
experiências, compreendendo sentidos, compreendendo seu 
lugar na sociedade, po1· 1neio da interpretação. Se o meio e1n que 
o discurso é produzido é significativo, vale à Análise do Disc·urso 
a consideração da lingt1agem à sua exterioridade. Assim, ela 
se 111aterializa na ideologia, Otl seja, ela te111, em parte, un1a 
orde1n própria ( as regras de uso, as gramáticas); e1n outra, uma 
relativa auto11omia ( o campo da semântica, das possibilidades de 
interpretação). 
Para compreender melhor a questão ideológica, atentemos 
para a charge abaixo: 
1i~\\t\io Nf\ l"\f\A 
Fonte: Charge Tho1nate 
___ 34_) ( Análise do Discurso 
Se analisássemos a charge acima à luz de unica1nente de 
seu conteúdo, lerían1os de maneira literal, e set1 objetivo (a crítica 
à corrupção por 111eio da sátira), não seria atingido. AAnálise do 
Discurso propõe olhar o texto acima unindo sentidos e contexto 
situacional, considerando a compreensão da ideologia que ll1e 
cerca: a lingt1age1n pode st1gerir 1ní1ltiplos efeitos de sentido em 
um único texto. Assi1n, essa perspectiva sugere interpretar as 
linguage11s que produzimos e que lemos/ ouvi1nos/ vemos e etc. 
A interpretação, nessa conjuntura, é o primeiro destaque 
que dare111os 110 estudo da A11álise do Discurso. 
A interpretação 
Para Orlandi (2007, p. 25), 
A proposta intelectual em que se situa a Análise 
do Discurso é marcada pelo fato de que a noção 
de leitt1ra é posta em suspenso. Tendo co1no 
fundame11tal a questão do sentido, a Análise 
do Discurso se constitui no espaço e111 que a 
Linguística tem a ver con1 a Filosofia e com 
as Ciê11cias Sociais. Em outras palavras, na 
perspectiva discursiva, a linguagem é linguagem 
porque faz sentido. E a linguagem só faz sentido 
porque se inscreve na história. 
Ou seja, a perspectiva discursiva e11fatiza a questão do 
contexto (Social, histórico, político, econômico) enquanto peça 
chave para haver sentido e, assim, linguagem. Nesse sentido, a 
interpretação ganha espaço por permitir a leitura e compreensão 
desses variados contextos. 
A Análise do Discurso, por esse viés, acaba por teorizar 
a interpretação, colocando-a co1no t1ma proposta de análise 
que não se fecha e1n si, 1nas trabalha seus 1necanismos, li1nites, 
co1no pa11es do processo de construção de significação. Na 
interpretação proposta pela perspectiva discursiva não há um 
Análise do Disc11rso J ( ___ ~_s ___ _ 
sentido verdadeiro, único, revelado por u1n método. Há, si1n, 
uma construção de dispositivos teóricos capazes de dar conta 
das mais diversas produções emergidas da lingi1agem. 
Para compreender como funciona a perspectiva discursiva 
com mais clareza, vamos agora distinguir inteligibilidade, 
interpretação e compreensão, unido as explicações à exemplos. 
Inteligibilidade 
A inteligibilidade faz referência ao sentido da língua. 
Vejamos este exemplo: ''Ela pediu esse''. Essa frase é inteligível, 
basta dominarmos o português para ler esse enunciado. 
E11tretanto, ela não pode ser interpretada, pois não conseguimos 
chegar à conclusão de quem era ela e/011 o que ela pediu. 
Interpretação 
Pensemos na seguinte situação hipotética: 
Ma1ia vai ao restaurante co111 seu noivo, Carlos, e sua 
amiga, Júlia. Enquanto Júlia vai ao banheiro, Maria solicita 
ao garçom um dos pratos do Menu. Ao voltar à mesa, Júlia 
perg11nta a Carlos o que Maria pediu e ele prontamente responde, 
indicando co1n os dedos no Menu: ''Ela pediu esse''. 
Pelo exemplo acima podemos perceber que a interpretação 
necessita de um co-texto (as outras faces do texto) e o contexto 
em si. Interpretando, ela é Maria e esse é o prato solicitado. 
Compreensão 
Utilizando a mesma situação hipotética, nas palavras de 
Carlos poderíamos compreender que Júlia pediu dete1minado 
prato porque gosta mais, ot1 porque pode ter alguma restrição 
ali1nentícia, por exe1nplo. A co1npreensão, nesse se11tido, é 
entender co1no um objeto simbólico (texto, pintura, enunciado, 
, 
etc.), produz sentidos. E compreender como funcionam as 
interpretações. Quando interpretamos já estamos presos a um 
sentido. Assim, a compreensão procura explicitar os processos 
___ 36_) ( Análise do Disct1rso 
de significação presentes na situação co1nt1nicacional para que 
assi111 possam ser entendidos outros sentidos possíveis. 
Resumindo, a Análise do Discurso, para Orlandi (2007, 
p. 26): 
Visa a compreensão de como 11m objeto 
simbólico produz sentidos, como ele está 
investido de significância para e por sujeitos. 
Essa compreensão, por sua vez, implica explicitar 
como o texto organiza os gestos de interpretação 
que relacionam sujeito e sentido. Produzem-se 
assim novas práticas de leitura. 
Se a interpretação é um dispositivo teórico de análise da 
Análise do Discurso há, portanto, o analista e o 111étodo prod11zido 
no alcance teórico da perspectiva discursiva. Cada analista 
necessita fom1ular uma questão que desencadeie uma análise, e 
cada material de análise pede que seu analista eleja conceitos que 
outro analista não elegeria, criando assim conceitos diferentes 
de análises. Embora a teoria ilumine a análise, essa é escolhida 
dentre tantas pelo analista, em sua liberdade para a constn1ção 
de inte1-pretações. 
O Analista analisa e co1npreende o processo discursivo, 
pode11do, então, inte1-pretar seus resultados de acordo co1n os 
instrumentos teóricos escolhidos dos campos disciplinares dos 
quais ele optou. Dessa maneira, o analista do discurso desfaz 
a ilusão da transparência da linguagem, já que passou por um 
processo 1naterial de constituição e significação do (s) sujeito (s). 
É desse estt1do detalhado, 1netódico, teórico e 
principalmente interpretativo que deriva, Para Orlandi (2007,p. 
28), a riqueza da Análise do Discurso ''ao pe1111itir explorar de 
muitas maneiras essa relação trabalhada com o simbólico, sem 
apagar diferenças, significando-as teoricamente.'' 
Nesse contexto, o que se dizemos não são apenas 1nensagens 
a serem decodificadas, mas sim: 
Análise do Disc11rso J ( ___ ~_7 ___ _ 
Efeitos de sentidos que são produzidos em 
condições determinadas e q11e estão de algu111a 
forma presentes no 111odo como se diz, deixa11do 
vestígios que o analista de discurso tem de 
apreender. São pistas que ele aprende a seguir 
para compreender sentidos aí prod11zidos, pondo 
em relação o dizer com sua exterioridade, suas 
condições de produção. Esses sentidos têm a ver 
com o que é dito, e com o que poderia ser dito e 
não foi. Desse modo, as 111arfes do dizer, do texto, 
também fazem parte dele. (ORLANDI, 2007, p. 30) 
Para compreender melhor, vejamos o exemplo a seguir: 
__ , ___ ., __ 
1111s c1•0 N mls lnl S11 ISIISI nt •lrlà 
ls1a 6 .. •111!+111ra nct 11m lr • IIIISW11II 
Çale &N ~ ....... . ... .,. . ...... • , .-.vw....., .. ....... ...... _......,.__ ..... 
... ee.a • ..,. .. , ,, 1 , ilillll ,.. .. "'4M-.,. .... ...., , e ~ w wii__..,...,....,,., .,......,.,..,,._ . -- - - - -- --------
Fonte: O estadão 
(Texto verbal: ' 'Mais cedo ou 1nais tarde sua esposa vai 
dirigir. Este é uma das razões para você possuir um Volkswagen'') 
Enquanto analista do Discurso, quais vestígios precisamos 
apreender para interpretar o anúncio aci111a? 
Considerando o universo dos anúncios, propagandas, não 
basta apenas decodificar a linguagem verbal. Há de se levar em 
consideração o contexto situacional; as escolhas linguísticas; o 
texto 11ão verbal; dentre outros. 
___ 3s_) ( Análise do Disct1rso 
No exe111plo acima nos depara111os com u1n anúncio 
publicitário dos anos 60. Na época era comu111 e, inclusive, 
engraçado, sente11ças que 111aculasse111 a i111age111 da mulher. O 
texto verbal, portanto, pode ser inte1-pretado como uma ''piada'' 
em relação às capacidades limitadas da mulher ao fato de dirigir. 
A empresa, em contrapartida, oferece t11n produto que ''alivia'' a 
preocupação masculina, já que possuí peças baratas e fáceis de 
encontrar. Ou seja, o homem não precisai-ia se preocupar com 
n1ais esse ''proble1na'': a WV se preocupa por ele. 
Fica claro aqui co1110 a condição de produção de un1 discurso 
afeta a construção da linguagem. Se hoje, no século XXI, o 
mesmo anúncio publicitário fosse veiculado em jornais, revistas 
e internet, muito provavelmente seria tachado como machista 
e anacrônico, e a e1npresa sofrei-ia as represálias cabíveis. 
Po1ianto, as condições de produção e Interdisctrrso 
são de grande significado para o analista do discurso e, mais 
a1nplamente, para a A11álise do Discurso em geral. Assin1, cabe­
nos agora aprofundar essas perspectivas. 
Condições de produção e interdiscurso 
Para Orlandi (2007), as condições de produção 
compreende1n sujeitos, situação e a memória. Essa í1ltima, 
inclusive, bastante significativa, como veremos mais à frente. 
As condições de produção, para a autora, consideram duas 
circunstâncias: o contexto imediato e o contexto sócio histórico, 
ideológico. No últi1no exen1plo que apresentamos ( o caso 
do fusca da Volkswagen), o contexto imediato é o ''simples'' 
anúncio de um carro e a sugestão de que esse é resistente e 
acessível e, por isso, deve ser comprado. Já o contexto amplo é 
o que revela efeitos de sentidos inerentes do funcionamento da 
nossa sociedade, co1no por exemplo o mercado automobilístico 
e a antiga cultura de que veículos eram desti11ados a ho1nens, já 
que à 111·ulher destinava-se o lar. Nas entrelinhas, observa1nos 
que a suposta aceitação de uma 1nulher dirigindo, reação lenta 
do Feminismo no decorrer do século XX, vem transvestida do 
Análise do Disc11rso J ( ___ ~_9 ___ _ 
1nachismo que rei11ava co1n todas as forças naquele contexto e1n 
particular. O anúncio, assim, revela um posiciona1nento sócio 
histórico social comu1n à época e111 que fora publicado. 
, 
E aqui que o conceito de memória ganha forças quando 
pensada em relação ao discurso. No contexto teórico da Análise 
do Discurso, inclusive, podemos chamá-la de Interdiscurso: 
Definido co1no aqt1ilo que fala antes, em outro lugar, 
independente1nente. Ou seja, é o que cha1na1nos de 
memória disct1rsiva: o saber discursivo que torna 
possível todo dizer e que retorna sob a for1na do pré­
const1uído, o já-dito que está na base do dizível, 
sustentando cada palavra. (ORLANDI, 2007, p.31) 
Ora, só conseguimos, l1oje, interpretar de maneira 
significativa o anúncio produzido 110 século XX graças a 11ossa 
1nemória discursiva: o discurso do 1nacllis1no não é novo, é U1n 
já-dito não só naquela época, co1110 se perpetua na nossa. Lá nos 
anos 60, o texto verbal anU11ciava uma forma de pensa111ento 
traduzida discursivamente que antecede sua produção. Assim, o 
texto a que tivemos contato caracteriza-se como um interdiscurso, 
um conj11nto de formulações já existentes sócio historicamente 
que se traduzem em um novo texto. 
Assi1n como a interdiscursividade, enq·uanto me1nória, 
nos faz considerar acontecimentos passados con10 matéria para 
os novos, també111 é esqueci111ento, outro aspecto importante da 
Análise do Discurso que conheceremos agora. 
Quer saber mais sobre a interdiscursividade na Análise do 
Discurso? Acesse ao vídeo ''Interdiscurso e memória discursiva'', 
disponível no Youtube por meio do Link: http://bit.ly/2HBguuK 
___ 4o_) ( Análise do Discurso 
Para Pêcheux (1975) existem dois tipos de esqueci1nento 
no discurso, são eles: 
1. O esquecimento número dois, da ordem da enunciação: 
Ao falannos se1npre opta1nos por uma forma e não outra. 
No entanto, o que dizemos se1npre poderia se dito de outra 
maneira, com outras escolhas linguísticas. Ao falarmos ''Feliz'', 
podería1nos ter optado por ''alegre'' ou ''co11tente'', por exemplo. 
Entretanto, nós ne1n sempre temos consciência disso. Este 
''esquecimento'' é pai·cial, semiconsciente, que exemplifica que 
o modo de dizer tudo tem a ver com os sentidos. 
2 O 
ideológico: 
. , . 
esqt1ec1mento numero um, ou esquecimento 
Instância do inconsciente, é resultante do modo como so1nos 
afetados ideologicamente. Por ele temos, quando elabora1nos 
um discurso, a ilusão de se1mos 01;ginais, os prin1eit·os a dizer/ 
escrever/falar, etc. No entanto, quando nasce1nos, os discursos 
já estão e1n processo, apenas entramos no movimento. Na 
verdade, a língua se materializa em nós e o esquecimento 
é, voluntariamente, uma necessidade para que a linguagem 
funcione na prod·ução de sentidos e st1jeitos: retomando palavras 
já existentes co1no se fosse1n deles e, assim, 1novimenta11do as 
possibilidades da linguagen1. 
Análise do Disc11rso J (_4_1 __ _ 
Outros aspectos relevantes à análise do 
discurso 
Ao té1111ino deste capítulo você será capaz de entender e aplicar 
as técnicas e métodos necessários para a implementação de 
projetos em HCD, ou seja, projetos de desenvolvi1nento de 
produtos centrados no humano. 
Além dos aspectos supraditos, outros se fazem importantes 
para uma compreensão mais completa em relação à análise do 
Discurso, são eles: Paráfrase e Polissemia; Formação Discursiva 
e Ideologia e sujeito. Ire1nos, agora, vê-los um por um, antes de 
concluinnos nosso estudo. 
■ Paráfrase e Polisse111ia 
Quando pensamos a linguagem de maneira discursiva, é 
itnpossível dissociar essa compreensão da tensão entre processos 
parafrásticos e polissêmicos. Para Orlandi (2007, p.36): 
Os processos parafrásticos são aqueles pelos quais 
em todo dizer há se1npre algo que se manté1n, isto 
é, o dizível, a 1nemória. A paráfrase representa 
assi111 o retorno aos mesmos espaços do dizer. 
Produzem-se diferentes formulações do mesmo 
dizer sedimentado. A paráfrase está do lado da 
estabilização. Ao passo q11e, a polissemia, o q11e 
temos é deslocamento, ruptura com os processos 
de significação. Ela joga com o eq11ívoco. 
Ou seja, se1npre falamos algo dito,porém, pela polissemia, 
, 
esse algo dito se transfo1111a em outro. E assim que os sujeitos 
___ 42_) ( Análise do Discurso 
(re) significa111 e (se) significa1n a todo instante. Dessa maneira, 
acaba1nos por concluir que a incompletude é condição para a 
linguage111: os discursos (sujeitos e sentidos) já estão prontos, 
contudo, eles estão sempre se refazendo, em um movimento 
constante da histó1ia e do simbólico. 
F armação Discursiva 
A noção de F armação Discursiva é basilar na Análise do 
Discurso, e o porquê é si1nples: é ela que permite entender o 
processo de produção de sentidos e sua relação com as questões 
ideológicas. 
A f armação disct1rsiva é definida por meio de t1ma 
formação ideológica dada, ou seja, a partir de um contexto sócio 
histórico dado, qt1e define o q11e pode e/ou deve ser dito. Para 
compree11de11nos 1nell1or como isso funciona, prestemos atenção 
nos dois pontos a seguir: 
a O discurso se constitui em seus sentidos: 
Isoladas, as palavras não possuem sentido nelas mesmas, 
é necessária uma conjuntl1ra na qt1al o sujeito se insere em 
t1ma dada formação discursiva e não em outra, para atingir t1m 
sentido ao invés de outro. Ou seja, as fo1mações ideológicas são 
representadas pelas f armações discursivas que as inscrevem. 
Daí ven1 o peso da ideologia. Para Orlandi (2007p. 43): 
Os sentidos se111pre são determinados 
ideologicamente. Não há sentido que não o seja. 
Tudo o que dizemos tem, pois, u1n traço ideológico 
em relação a outros traços ideológicos. E isto não 
está na essência das palavras 1nas na discursividade, 
isto é, na maneira como, no discurso, a ideologia 
produz efeitos, materializando-se 11ele. O estudo 
do discurso explicita a maneira como a linguagem 
e ideologia se articula1n, se afetam em sua relação 
, 
reciproca. 
Análise do Disc11rso J ( ___ 4_3 ___ _ 
Ou seja, todas as nossas escoll1as discursivas, tudo o que 
falamos ou escreve111os, a maneira con10 nos posicionamos, 
sempre estará co1Telacionada a uma dete11.11inada ideologia. As 
ideologias regem, portanto, nossas formações discursivas. 
b Os diferentes sentidos são assimilados pela referência a 
uma formação discursiva: 
As palavras, 1nes1no sendo iguais, podem significar coisas 
diferentes dependendo da formação disctrrsiva e1n que estão. Por 
exemplo, a palavra ''Floresta'' não significa a mesma coisa para 
um produtor rural, para um índio ou um cidadão. Além disso, 
alterada sua letra inicial entre maiúscula e minúscula, podemos 
obter novos sentidos. 
O analista do discurso, aqui, tem papel fu11da1nental para 
a co1npreensão: ele precisa observar as condições de produção 
do texto, verificando sempre o funciona111ento da me1nória; além 
disso, ele necessita verificar o porquê dessa formação discu1·siva 
(ao invés de outra), para assimilar os sentidos ali presentes. 
Para Orlandi (2007), o sentido que, na verdade, é efeito 
ideológico, não nos deixa perceber, e1n uma primeira análise, 
set1 fundo material, histórico. Porém, todo s11jeito, carregado de 
ideologia traz, obviamente, uma l1istoricidade e1n construção 
que aliinenta essa mesma ideologia. Assin1, Ideologia e sujeito 
caminham juntos e, por isso, a pa1iir de agora, caro aluno, iremos 
conhecer um pouco mais sobre esses dois princípios importantes 
à Análise do Discurso. 
■ Ideologia e Sujeito 
, 
E interessante perceber como a Análise do Discurso 
ressignifica a noção de ideologia por meio dos estudos da 
linguagem. Dessa fonna, a ideologia passa a ser definida 
ideologicamente e é isso que veremos a seguir. 
Segundo Orlandi (2007, p.44), o fato de que não há sentido 
sem o 1novimento de interpretação evidencia a presença da 
ideologia. Sempre, e1n contato com um objeto simbólico, há no 
___ 44_) ( Análise do Discurso 
home111 a 1notivação para se perguntar: ''o que isso quer dizer?''. 
Nesse contexto, no ato de interpretar o sentido surge con10 
evidê11cia, co1110 se ele sempre tivesse estado lá. O trabalho da 
ideologia, nesse contexto, é colocar o homem em uma relação 
imaginária com suas condições existenciais e materiais. 
A ideologia, portanto, passa a ser condição para a 
constituição de sujeitos e sentidos. Para Orlandi (2007, p.46): 
O indivíduo é interpelado em sujeito pela 
ideologia para que se produza o dizer. Partindo 
da afirmação de que a ideologia e o inconsciente 
são estruturas-funcionamentos, M Pêcheux diz 
que sua característica comum é a de assimilar 
sua existência no interior do seu próprio 
funcionamento, produzindo um tecido de 
evidências ''subjetivas'', entendendo ''subjetivas'' 
( ... ) co1110 ''nas quais se constitui o sujeito." 
Assim, a subjetividade, enquanto constituinte do sujeito, 
está para a ideologia do que ele pretende dizer. Entretanto, ao 
se colocar enquanto sujeito, muitas vezes o homem apaga o fato 
de que é interpelado pela ideologia. Esse apaga1nento já nos foi 
colocado aci1na: o l1omem acredita estar dizendo algo novo, 
nunca antes pronunciado. 
Para o analista, nesse sentido, entender ideologia enquanto 
relação necessária entre mundo é linguagem é fundamental. 
E11quanto analistas, pode1nos nos perg11ntar: Como a 
ideologia atua na cl1arge abaixo? 
Análise do Disc11rso J ( ___ 4_5 ___ _ 
OI, MIGU&l.l'TOt COIS-' 
80A NA TV ? __-
AC'AIM;l OE 
l.l~AR 
MAS PAR6Ce Q\JE se vo~ PASSA 0Es::>DORANT6, 
DEPOIS COME SAI.SICHAS li AÍ COMPRA. UMA I.\A'QUINA pe 
I.AYAA ROUPAS, SÓ NJI::> f f'El.1% SE FOR MUITO IDIO'TA 
Fonte: Charge Mafalda 
Considerando o ''esqueci1nento'', para nós, enquanto 
sujeitos, a resposta de Miguelito poderia ser inocentemente a 
co1npreensão de u1n todo 01iginal, ''novo'' do que está passando 
na TV. Entretanto, a charge acima ultrapassa esses lilnites 
ao ii·o11izar a ideia de felicidade vendida nas propagandas e 
programas de TV. 
Nesse sentido, a formação discursiva, se analisada por 
esse viés, revela 11m sentido novo pertencente a 11ma ideologia 
do1ninante nos dias atuais que está aparente1nente velado na 
resposta do personagem: O consumo, incentivado co1no gerador 
de felicidade em nossa sociedade capitalista das mais diversas 
fonnas. 
Para Orlandi (2007, p.47) o sentido, 
, 
E assim uma relação determinada pelo sujeito-, 
afetado pela língua- com a história. E o gesto da 
interpretação que realiza essa relação do s11jeito 
com a língua, com a histó1·ia, com os sentidos. Esta 
___ 46_) ( Análise do Disct1rso 
é a 1narca da subjetivação e, ao 1nes1no tempo, o 
traço de relação da líng11a co111 a exterioridade: 
não l1á discurso sem sujeito. E não há sujeito sen1 
ideologia. 
Nós, enquanto sujeitos, somos fo1mados pela ideologia e 
história que nos cerca, e esses dois elementos são, mesmo que 
inconscientemente, norteadores do 11osso discurso. Muitas vezes 
é só pela interpretação, na busca pelo sentido do que dissemos, 
fala111os ou agimos, que compreenden1os a ( s) origen1 ( s) daquele 
discurso. 
Por fim, é importante esclarecer que o trabalho com a 
ideologia é um trabalho baseado na memória-esqueci111ento. , 
E j11sta1nente o esq11ecin1ento q11e inativa a il11minação de 
qualquer discurso proposto. No pensar, por exe1nplo: ''Por que 
':ft1lano' se colocou dessa fo11na?''; ''Por que eu me posicionei 
dessa maneira''? temos o primeiro passo para a investigação 
da fo1111ação discursiva de dete11ninado contexto, cl1ega11do às 
conclusões ideológicas na consttução de sentidos. 
Após essa produtiva imersão teórica em relação à Análise 
do Discurso, nos perguntamos: Q11ais as consequências dessa 
perspectiva teórica? Ire1nos, agora, indicar algwnas: 
1 AAnálise do discurso, ao unir campos de conhecimento, 
rompe suas fronteil·as e elege um novo recorte de disciplinas, 
constituindo um novo objeto de estudo: o discurso; 
2. Para a Análise do Disctrrso, não há apenas trans1nissão 
de informação, muito menos linearidade nos ele1nentos 
comunicacionais. Para ela, a língua não é apenas 111n 1nero código, 
e1n que se separa e1nissor e receptor; em que u1n fala e outro, 
na sequência, decodifica. Não há transnússãode informação 
apenas, há um co1nplexo processo de formulação de sujeitos que 
produzem constantemente sentidos; 
3. A líng11a, para a Análise do Discurso, tem s11a ordem 
própria, porém, é relativa1nente autônoma; 
Análise do Disc11rso J ( ___ 4_7 ___ _ 
4. Na perspectiva discursiva, o sujeito da linguagem se 
constitui enquanto descentralizado, pois é afetado pelo real da 
língua, bem co1no o real da história, e o modo como essas o 
afetam não pode ser controlado por ele. Isso possibilita concluir 
que o sujeito discursivo age pela ideologia e inconsciente; 
5. Por fim, pode1nos concll1ir ql1e na Análise do Discurso 
''E1n seu quadro teórico, nem o discurso é visto como uma 
liberdade em ato, totalmente sem condiciona11tes linguísticos 
( ... ) ne111 a língua co1no fechada em si n1es1na, sem falhas ou 
eqt1ívocos." (ORLANDI, 2007, 22). A língua, assi111, sempre 
será condição para a oportunidade do discurso. 
Análise do Disc11rso J ( ___ 4_9 ___ _ 
___ so_J ( Análise do Discurso 
--
INTRODU AO 
Você sabia que a área da Linguística é u1na das mais 
importantes para o conl1ecime11to da Língua? Já tive111os um 
conhecimento introdutório desse conteí1do na unidade anterior. 
Nesta, daremos ênfase às grandes perspectivas e teorias que 
fundamentam a Análise do Discurso, tendo a opo1·tunidade, 
ao final do estudo, de compreender como essa perspectiva 
da Ling11ística funciona, e co1no ela é estudada por diversos 
filósofos/ pesquisadores. A segt1nda u11idade to1na-se um 
preparativo para os estudos aprofundados da Análise do Discurso 
que virão adiante, já que parte das noções de Enunciação, 
pragmática, argU1ne11tação e discurso, até chegar àAnálise crítica 
do Discurso. Ao longo desta unidade letiva você vai 1nergulhar 
nesse universo ! 
Análise do Disc11rso J ( ___ s_1 ___ _ 
OBJETIVOS 
Olá. Seja muito bem-vindo a nossa Unidade 2. Nesta 
unidade, o nosso objetivo é auxiliá-lo 110 desenvolvimento das 
seguintes competências profissionais: 
Compreender como fiincionam os critérios de 
Enunciação, pragmática, argumentação e discurso; 
Entender as perspectivas teóricas q11e penneiam o 
estudo da (s) ideologia (s) dentro do u11iverso da 
ciência da linguagem; 
Conceber as vertentes da Análise do Discm·so, 
a saber: a linha americana, bem como a linha 
francesa; 
Investigar como surgiu e Análise Critica do Discurso 
e co1no ela funciona e11quanto colaboradora para 
a visão critica dos discursos ideologicamente 
produzidos na sociedade, principalmente aqueles 
que oprimem sujeitos. 
E11tão? Está preparado para uma viagem sem volta rumo ao 
conhecimento? Ao t1·abalho! 
___ s2_) ( Análise do Discurso 
Enunciação, Pragmática, Argumentação, 
Discurso 
Caro aluno (a), ao tén11ino deste capítulo você será capaz 
compreender as diversas vertentes que embasa1n a Análise do 
Discurso, além de entrar em contato com as linhas de Análise 
tanto americana, quanto francesa. Isso será ft.1ndamental para a 
compreensão de uma das grandes correntes de estudo do curso 
de Letras, responsável por grande parte das pesquisas na área, 
bem como contribuirá para exercício de sua docência e111 sala 
de at1la. E então? Motivado para desenvolver essa competência? 
Vamos lá. Avante! 
Enunciação 
Olá, alt1nos (as)! Ainda na unidade I tivemos a oporh1nidade 
de conhecer de 1naneira introdutória a teoria da Enunciação. 
Va1nos relembrá-la? 
A teoria da Enunciação, proposta por Benveniste, baseia­
se, resu1nidamente, nos quatro pontos abaixo colocados: 
1 
• Reconhece o sistema da língua enquanto uma 
instância do discurso. Nesse sistema, sujeito e subjetividade são 
significativos; 
2. A significação da língua só se dá por meio do discurso, 
ou seja, por 1neio da enunciação desse; 
3 O sujeito, na teoria da Enunciação, é o foco: Ele é quem 
atualiza o sistema linguístico, articulando e significando; 
Análise do Disc11rso J ( ___ s_3 ___ _ 
4. O quadro formal da ent1nciação é o eu-tu-aqui-agora, 
considerando índices de pessoa, espaço/tempo, referindo-se, 
sempre, a ent1nciação. A subjetividade, enquanto aparelho 
formal da Enunciação, é semp1·e universal (todos nós temos), 
porém, set1 uso é sempre individual, mesmo que o propósito da 
. . . - . . . . 
teoria ent1nc1at1va nao seJa o st1Je1to em s1, antes, as suas marcas 
no ato da enunciação. 
Revisadas as características básicas da Enu11ciação, 
partiren1os agora para a compreensão de co1no ela funciona 
de11tro do universo da Análise do Discurso, 111ais especificamente 
em relação à argumentação, ou seja, à Semântica da Enunciação. 
Para a se111ântica fon11al, a verdade está fora da li11guage111, nesse 
sentido, a língua seria apenas um meio para alcançá-la. Esse 
conceito é fundamental para entender a Semântica da Enunciação, 
posto qt1e, para essa ''A linguagem constitui o mundo, por isso não 
é possível sair fora dela'' (OLIVEIRA, 2006, p .19). 
■ Por que será, então, que a Semântica formal coloca os 
sentidos como sendo exteriores à língua? 
Geralmente, quando falamos ou escrevemos usamos 
te1n1os dêiticos, ou seja, que faze111 referência a algo externo 
ao discurso. Como por exemplo te1nos os pronomes isto, eu, 
você, etc. Esses geralmente passam a ilusão de que estamos nos 
referindo a algo externo à língua. 
___ 54_) ( Análise do Discurso 
Quer saber mais sobre a dêixis linguística? Acesse o vídeo 
http://bit.ly/2vGcQNE. Disponível no Yot1tt1be. 
E11tretanto, se111pre estamos nela e por/para ela. Veja1nos 
como Oliveira (2002, p.20) esclarece essa perspectiva: 
A semântica Formal, diz Ducrot, cai na ilusão, 
criada pela própria linguagem, de que ela se 
refere a algo externo a ela mesma, de onde ela 
retira a sua st1stentação. A linguagem, afirma 
Ducrot, é t11n jogo de argumentação e11redado em 
si 111es1110; não fala1nos sobre o 1nu11do, falamos 
para construir um mundo e a partir dele tentar 
convencer nosso interlocutor da nossa verdade, 
verdade criada pelas e nas nossas interlocuções. A 
verdade deixa, pois, de ser t1m atributo do mundo 
e passa a ser relativa à comunidade que se forma 
na argumentação. Assim, a linguage1n é u1na 
dialogia, ou melhor, uma ''argumentalogia'', não 
fala111os para trocar informações sobre o 111undo, 
n1as para convencer o outro a entrar no 11osso jogo 
discursivo, para convencê-lo de nossa verdade. 
Ou seja, a linguagem é constitt1ída no diálogo, na busca, 
por meio da construção de argt1mentos, de inserir o outro, o 
interlocutor, 110 nosso inundo, 11a 11ossa verdade. 
Para as atuais concepções da Semântica da E11unciação, 
um enunciado é construído por diversos enunciadores que, 
concomitantemente, formam o espaço discursivo pelo qual o 
diálogo vai se desenvolver. 
Análise do Disc11rso J ( ___ s_s ___ _ 
Veja1nos o enunciado abaixo: (Considere os El, E2, e E3, 
enquanto ent1nciadores. 
O governador de São Paulo é Sociólogo 
E 1 : Há um e apenas uma pessoa. 
E2: Esta pessoa é um governador. 
E3: Esta pessoa é um sociólogo. 
No enunciado em negrito comprometemos nosso ot1vinte 
cotn o fato de que existe um único governador para São Paulo. 
Esse enunciado é polifônico (gera vários enunciadores) posto 
que encerra várias vozes. Acima temos um diálogo entre 
enunciadores, que pode gerar diálogos por n1eio, por exemplo, 
de negações polêtnicas ou metalinguísticas. Se negamos o El, 
estamos concretizando uma negação polêmica, mas ele pode 
negar o posto, portanto, dentro de 11m contexto pode fazer 
sentido; se negamos o E3, temos u1na negação metalinguística. 
Vejamos outro exemplo: 
Maria parou de fumar 
E 1: Maria fumava. 
E2: Maria não fuma mais. 
Essa seg11nda enunciação traz 11m enunciador que afirma 
que 1na1-ia fu1nava, tratando-se de um pressuposto, e outro 
que afirma que ela não fuma mais, concretizando o posto. Ao 
negar111os a fala do primeiro enunciador, faremos uma negação 
polêmica; se negamos o que está posto, faremos uma negação 
metalinguística. 
___ 56_) ( Análise do Discurso 
Assi1n, para a Semâ11tica da Enu11ciação, as diferentes 
leituras explica111-sepela polissemia, ou seja, 11m 111esn10 
enunciado que pode gerar 111últiplos sentidos, 111as que se 
correlacionam. 
Sobre os tipos de negação, vejamos esse outro enunciado: 
Imagine que alguém diz que sua bicicleta está estacionada 
em lugar errado, assim, você pode responder: 
Não, minha bicicleta não está estacionada em lugar 
errado (porque eu não tenho bicicleta). 
Nesse caso, você estaria fazendo uma negação polêmica, 
já que está negando o q11adro linguístico formado pelo se11 
interlocutor, ou seja, nego o enunciador que acredita que a 
bicicleta seja sua. 
Imagine agora que dessa vez você tem bicicleta: 
Não, minha bicicleta não está estacionada em lugar 
errado (Porque está no lugar certo). 
Nessa situação temos uma negação metalinguística: o 
locutor retoma a fala do interlocutor, que coloca que a bicicleta 
está no lugar errado, para negá-la. 
Ducrot 1979, ainda evidencia um terceiro tipo de 
negação, a descritiva. Nesse tipo o locutor descreve u1n estado 
de ser negativamente, ou seja, na sua enunciação não há outro 
enunciador que o negue. Como exemplo, temos: 
Não há sol hoje. 
Podemos observar que não há reto1nada da fala do outro, 
1nas a apresentação negativa de u1na descrição. Assim, a negação 
é, ''pois, um fenômeno de polisse1nia que, como dissemos, define­
se por ide11tificar usos distintos não relacionados'' (OLIVEIRA, 
2006, p. 31 ). 
Já e1n relação a diferença de significados produzidos 
pelos variados tipos de enunciados te1npos, na lingt1ística, o q11e 
Análise do Disc11rso J ( ___ s_7 ___ _ 
chama1nos de Prag1nática, próxi1no ponto a ser estudado nessa 
unidade. 
Pragmática 
Caro aluno ( a), para esclarecer os diferentes significados 
que pode111 ser gerados pelos enunciados, o que co11cretiza o que 
chamamos de Pragmática, José Luiz Fiorin, em ''Pragmática'' 
(2007), utiliza um dos interessantes trechos de ''As aventuras de 
Alice'', de Lewis Carroll. Vejamos: 
-Veja, agora a senhora está bem nielhor! Mas, 
francamente, acho qite a senhora devia ter uma 
dama de companhia! 
-Aceito-a com todo pr·azer! - Disse a Rainha. -
Dois pe,ice por semanas e doces todos os outros 
dias. Alice não pôde deixar de r·i1~ enquanto 
respondia: Não estou me candidata1ido.. . e não 
, 
gosto tanto assim de doces. - E doce de muito 
boa qitalidade- Afirmou a Rainha. -Bom, hoje, 
pelo menos, não estou querendo. -Hoje você não 
poderia ter, ne1n pelo nienos nem pelo mais- Disse 
a Rainha. - A regra é: doce amanhã e doce ontem 
- e nitnca doce hoje. - Algumas vezes tem de ser 
''doce hoje''- Objetou Alice. - Não, não pode­
Disse a Rainha. Tem de ser senipre doce todos os 
outros dias; ora, o dia de hoje não é outro dia 
qualquer, como você sabe. 
Pa1·a Fiorin (2007), Alice e a Rainha discutem, nesse 
trecho, sobre o sentido de palavras como hoje e outro. Para 
elucidar a questão dos diferentes significados de um discurso, 
o at1tor elege a palavra hoje. Para a Rainha, o significado das 
palavras onte1n, hoje e amanhã são fixos. Nesse caso, se a reg1·a 
é doce onte1n e amanl1ã, Alice não poderá nunca comer doces, 
já que está sempre no hoje. Já Alice entende que o sentido das 
___ ss_) ( Análise do Discurso 
palavras em 11egrito está relacio11ado ao ato de produção de um 
enunciado e, assi1n, por vezes há de ser ''ten1 de ser doce hoje'', 
já que l1oje é o dia em que o ent1nciado é pronunciado. 
Para Alice, segundo Fiorin (2007), o termo hoje se concretiza 11a 
, 
relação com a situação de comunicação. E por 1neio dela que o 
significado dessa palavra pode ser inteiramente comp1·eendido. 
Buscando uma análise pragmática eficiente, a consciência 
do enunciado ( estudado anteriormente) enqt1anto uma realização 
linguística concreta é fundamental. Se considerado a teoria do 
Enunciado, há de fazermos jus a ciência de que 11un1a situação 
de comunicação existe: eu/tu; espaço ( advérbios de lugar e 
prono1nes demonstrativos co1no aqui, este, lá, esse); marcadores 
de tempo, co1no exemplo os termos l1oje e ontem. Inclusive, 
tlm dêitico como esses só pode ser entendido dentro da situação 
de comt1nicação, assim, a pragmática parte do entmciado em 
direção ao lugar 110 qual esse foi ou está sendo produzido. 
Observe o enunciado: 
Anteontem andei muito por aqui. 
Só pelo enunciado não dá para saber o sentido, por 
exemplo, do anteontem, do eu e do aqui: é necessário conhecer 
a situação comunicacional para poder encontrar os sentidos 
dos enunciados, principalmente, os que fazem uso de tennos 
dêiticos, como o acima exemplificado. 
Surge, então, a pergunta: de maneira prática, con10 
pode111os, enqua11to analistas do discurso, fazer uma análise 
pragmática? 
Análise do Disc11rso J ( ___ s_9 ___ _ 
Para Benveniste (1966), existem três categorias 
relacionadas ao Enunciado que são fundamentais para uma 
análise prag1nática, são elas: A pessoa, O tempo e o Espaço. 
Vejamos cada uma, agora, de maneira detalhada: 
■ Apessoa: 
Para Benveniste ( 1966) as três pessoas do disctrrso não 
possuem o 1nes1no estatuto. Há semelhanças e11tre o eu e o tu, já 
que são sempre os participantes da comunicação. Entretanto, o 
ele pode ser qualquer ser ou não designar nenhum. Além disso, 
enquanto que entre o eu e tu há reversibilidade ( quando você 
fala com alguém, ela é o tu, quando ele te responde, você passa 
a ser o tu e ela, o eu), para o ele isso é impossível. 
, 
E i1nportante entender que: ''é a situação de enunciação que 
especifica o que é pessoa e o que não é pessoa ( .. . ) Chamare1nos, 
então, de pessoa enu11ciativa aquelas que participam do ato de 
comunicação." (FIORIN, 2007, p. 164). 
■ O tempo: 
O te1npo da língt1a é diferente do tempo cronológico e/ 
ou fisico: ele é ligado ao exercício da fala, ou seja, o agora é 
reinventado a cada enunciado, e cada ato de fala constitui um 
novo tempo. Dessa maneira, Fio1in (2007, p. 167) dete1mina a 
análise do tempo do enu11ciado considerando: 
ME- Mo1nento da enunciação; 
MR-Momento de referência (presente, passado, 
futuro); 
MA- Momento do acontecimento (Concomitante, 
anterior, posterior, etc., a cada momento de 
referência). 
O tempo é, ' 'pois, a categoria linguística que marca se 
um acontecimento é concomitante, anterior ou posterior a cada 
um dos momentos de referência (presente, passado e futuro), 
___ 60_) ( Análise do Discurso 
estabelecidos e1n função do mo1nento da e11unciação''. (FIORIN, 
2007, p. 167) 
O espaço 
Para Fiorin (2007), o espaço lingtiístico se ordena por meio 
do tempo (hic ), ou seja, o lugar do eu/tu (ego). Tudo é assim 
localizado, sem que haja necessariamente 11ma i1nportância para 
seu lugar fisico no inundo, isso, pois 1nais importante é aquele 
que os situa, já q·ue se toma centro da referência de localização. 
Pai·a observamos o espaço, precisamos atentar para 
os pronomes demonstrativos e alguns advérbios de lugar, 
considerando qtie esses, por vezes, são dêiticos. 
A atenção dada ao espaço, tempo e pessoa, unidas 
à consideração dos contextos do enunciado, ( entenda, po1· 
exemplo, a importância de compreender os dêiticos para 
significar o discurso, algo já discutido acima!) co11cretizam o 
que chamamos de Análise pragmática das categorias discursivas. 
Essas, por consequência, podem constituir a argumentação, algo 
que entenderemos com mais clareza a partir do próximo tópico. 
Argumentação 
A Argumentação para a linguística foi teorizada pelos 
franceses Jean-Claude Anscombre e Oswald Ducrot. Para 
esses, considerando ainda que a língua ft1nciona dentro dela 
1nesma, sem a i11fluência de ele1nentos exteriores, todo o uso da 
linguage1n é argumentativo, ou seja, direciona e/ou projeta de 
maneira ideológica o seguimento do discurso. 
Pai·a compreender melhor a Teoria da Argumentação, 
vejamos como essa se deu por1neio de fases, qtie listare1nos abaixo: 
■ 1 ª fase: Articulação de enunciados 
Nessa fase, os teóricos da Argumentação, segundo Grácio 
(2015), debruçaram-se sobre as chamadas ''palavras vazias'', as 
que utiliza111os para conectar enunciados, como por exe1nplo

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