Buscar

Direito Civil III - aula 2

Prévia do material em texto

DIREITO DAS OBRIGAÇÕES 
Patrícia Silva Cardoso
Aula 2 – 
Objeto da obrigação – a prestação 
 Na aula anterior, vimos que a estrutura da obrigação decompõe-se em três elementos: 
subjetivo ou pessoal: sujeito ativo (credor) e sujeito passivo (devedor); 
objetivo ou material: a prestação;
ideal, imaterial ou espiritual: o vínculo jurídico. 
 Agora, cuidaremos de analisar , com minúcias, o objeto imediato da obrigação — a prestação —, apontando as suas características fundamentais, e, principalmente, os seus requisitos de validade. 
 A prestação — entendida como a atividade do devedor direcionada à satisfação do crédito — poderá ser positiva (dar , fazer) ou negativa (não fazer). Por esta mesma razão, as obrigações também são subdivididas em positivas e negativas. 
Objeto da obrigação – a prestação 
 A patrimonialidade é indispensável à caracterização da prestação? 
 Segundo Orlando Gomes, “a patrimonialidade da prestação, objetivamente considerada, é imprescindível à sua caracterização, pois, do contrário, (...) não seria possível atuar a coação jurídica, predisposta na lei, para o caso de inadimplemento”. 
 Seguindo a mesma vertente, Maria Helena Diniz pontifica que a prestação deverá ser “patrimonial, pois é imprescindível que seja suscetível de estimação econômica, sob pena de não constituir uma obrigação jurídica, uma vez que, se for despida de valor pecuniário, inexiste possibilidade de avaliação dos danos”. 
Objeto da obrigação – a prestação 
 De fato, em regra, o direito obrigacional está calcado na ideia de patrimonialidade,. uma vez que os bens e direitos indisponíveis — a exemplo dos direitos da personalidade em geral (honra, imagem, segredo, vida privada, liberdade etc.) — escapam de seu âmbito de atuação normativa
 Exceção: em algumas situações, fora das hipóteses dos direitos da personalidade, a patrimonialidade pode não existir. Exemplo: alguém se obrigar , por meio de um contrato, a não ligar o seu aparelho de som, para não prejudicar o seu vizinho. A prestação, no caso, não é marcada pela economicidade, mas, nem por isso, se nega a existência de uma relação obrigacional. 
 Paulo Lôbo, invocando o pensamento de Pontes De Miranda, pontifica: “Pontes de Miranda entende que se a prestação é lícita, não se pode dizer que não há obrigação se não é suscetível de valorização econômica, como na hipótese de se enterrar o morto segundo o que ele, em vida, estabelecera, ou estipularam os descendentes ou amigos. Do mesmo modo, estabelece o art. 398 do Código Civil português que a prestação não necessita de ter valor pecuniário; mas deve corresponder a um interesse do credor, digno de proteção legal”. 
Características fundamentais da prestação 
 A prestação — objeto direto ou imediato da relação obrigacional — compreende o conjunto de ações, comissivas (positivas) ou omissivas (negativas), empreendidas pelo devedor para a satisfação do crédito.
 Assim, quando dá ao credor a quantia devida, ou realiza a obra prometida, o devedor está cumprindo a sua prestação, ou, em outras palavras, adimplindo a obrigação pactuada. 
 Nas prestações negativas, porém, o devedor obriga-se a não realizar determinada atividade, sob pena de se tornar inadimplente. Dessa forma, a sua prestação consiste em uma abstenção juridicamente relevante, um não fazer em benefício do credor. Exemplo: disposição contratual de não construir acima de determinada altura, impedindo a visão panorâmica de seu vizinho. O devedor descumpre a prestação ao realizar a atividade que se obrigara a não fazer. 
Características fundamentais da prestação 
 Importante  não confundir o objeto direto ou imediato da obrigação (a prestação), com o seu objeto indireto ou mediato. ANTUNES VARELA: “tendo principalmente em vista as obrigações com prestação de coisas, os autores costumam distinguir entre o objeto imediato e o objeto mediato da obrigação. O primeiro consiste na atividade devida (na entrega da coisa, na cedência dela, na sua restituição etc.); o segundo, na própria coisa, em si mesma considerada, ou seja, no objeto da prestação” 
 Exemplo: no caso da obrigação imposta ao mutuário (aquele que tomou um empréstimo), o seu objeto direto ou imediato é a prestação (a sua atividade de dar); ao passo que o objeto indireto ou mediato da obrigação pactuada é o próprio bem da vida que se pretende obter, a utilidade material que se vai transferir (o dinheiro). 
Características fundamentais da prestação 
 A prestação para ser considerada válida, deverá ser lícita, possível, determinável. E são exatamente esses “caracteres”, que imprimem validade à prestação. 
 Licitude: A licitude da prestação implica o respeito aos limites impostos pelo direito e pela moral. Ninguém defenderá, por exemplo, a validade de uma prestação que imponha ao devedor cometer um crime (matar alguém, roubar). 
 Orlando Gomes, citando Trabucchi, visualizou diferença entre a prestação juridicamente impossível e a prestação ilícita, nos seguintes termos: a primeira é aquela simplesmente não admitida pela lei; a segunda, por sua vez, além de não ser admitida, constitui ato punível. E exemplifica: a alienação do Fórum romano — prestação juridicamente impossível, a venda de um pacote de notas falsas — prestação ilícita. 
 Possibilidade: A prestação, para que seja considerada viável, deverá ser física e juridicamente possível. A prestação é considerada fisicamente impossível quando é irrealizável, segundo as leis da natureza. Imagine a hipótese de o sujeito, por meio de um contrato, obrigar-se a pavimentar o solo da lua. 
 Se a impossibilidade for parcial, o credor poderá (a seu critério) aceitar o cumprimento parcial da obrigação, inclusive por terceiro (se não for personalíssima), às custas do devedor.
Características fundamentais da prestação 
 Finalmente, a impossibilidade, a depender do momento de sua ocorrência, poderá ser: a) originária; b) superveniente.
 A impossibilidade originária ocorre ao tempo da formação da própria relação jurídica obrigacional. Neste caso, como a nulidade macula a própria causa genética da obrigação (em regra, o negócio jurídico), a obrigação não prosperará, devendo ser invalidada.
 A impossibilidade superveniente, por sua vez, é posterior à formação da relação obrigacional. Nesta hipótese, tanto poderá haver o aproveitamento parcial da prestação (em sua parte não inutilizada) como a obrigação poderá ser integralmente extinta.
Características fundamentais da prestação 
 Determinabilidade: toda prestação, para valer e ser realizável, deverá conter elementos mínimos de identificação e individualização. 
 A prestação determinada é aquela já especificada, certa, individualizada. Exemplo: “obrigo-me a transferir a propriedade de uma casa, situada na Rua Oliveiras, s/n, cuja área total é de 100 metros quadrados...”. Note-se que, neste caso, houve inteira descrição da prestação que se pretende realizar. Cuida-se, consoante veremos adiante, de obrigação de dar coisa certa. 
 A prestação determinável, por sua vez, é aquela ainda não especificada, mas que contém elementos mínimos de individualização. Para que haja o seu cumprimento, no momento de realizá-la, o devedor ou o credor deverá especificar o objeto da obrigação, convertendo-a em prestação certa e determinada. 
 Assim, quando o sujeito se obriga a dar coisa incerta (obrigação genérica) — duas sacas de café, por exemplo, sem especificar a qualidade (tipo A ou B) —, no momento de cumprir a obrigação, o devedor ou o credor (a depender do contrato ou da própria lei) deverá especificar a prestação, individualizando-a. Esta operação de certificação da coisa, por meio da qual se especifica a prestação, convertendo a obrigação genérica em determinada, denomina-se “concentração do débito” ou “concentração da prestação devida”. 
Classificação básica das obrigações
 Como já vimos, as obrigações, apreciadas segundo a prestação que as integra, poderão ser: 
 Essa é a classificação básica das obrigações, que, inspirada no Direito Romano (dare, facere, non facere), foi adotada pela legislaçãobrasileira desde o esboço de Teixeira de Freitas. 
11
OBRIGAÇÕES DE DAR
 As obrigações de dar, que têm por objeto prestações de coisas, consistem na atividade de dar (transferindo-se a propriedade da coisa), entregar (transferindo-se a posse ou a detenção da coisa) ou restituir (quando o credor recupera a posse ou a detenção da coisa entregue ao devedor). 
 Subdividem-se em obrigações de dar coisa certa (arts. 233 a 242 do CC/02) e de dar coisa incerta (arts. 243 a 246 do CC/02).
OBRIGAÇÕES DE DAR coisa certa
 Nesta modalidade de obrigação, o devedor obriga-se a dar, entregar ou restituir coisa específica, certa, determinada. 
 “Um carro marca X, placa 5555, ano 1998, chassis n. ..., proprietário .....”, “um animal reprodutor bovino da raça nelore, com o peso de ..... arrobas, número de registro 88888, cujo proprietário é .....”. 
 O credor não está obrigado a receber outra coisa senão aquela descrita no título da obrigação (art. 313 do CC/02). 
OBRIGAÇÕES DE DAR coisa certa
 Princípio da gravitação jurídica  o acessório segue o principal (acessorium sequitur principale). Dessa forma, não resultando o contrário do título ou das circunstâncias do caso, o devedor não poderá se negar a dar ao credor aqueles bens que, sem integrar a coisa principal, a acompanham por acessoriedade (art. 233 do CC/2002). 
 Exemplo: obrigando-se a transferir a propriedade da casa (imóvel por acessão artificial), estarão incluídas as benfeitorias realizadas (acessórias da coisa principal), se o contrário não resultar do contrato ou das próprias circunstâncias. 
 Art. 233. A obrigação de dar coisa certa abrange os acessórios dela embora não mencionados, salvo se o contrário resultar do título ou das circunstâncias do caso.
OBRIGAÇÕES DE DAR coisa certa
 Art. 234. Se, no caso do artigo antecedente, a coisa se perder, sem culpa do devedor, antes da tradição, ou pendente a condição suspensiva, fica resolvida a obrigação para ambas as partes; se a perda resultar de culpa do devedor, responderá este pelo equivalente e mais perdas e danos.
Art. 235. Deteriorada a coisa, não sendo o devedor culpado, poderá o credor resolver a obrigação, ou aceitar a coisa, abatido de seu preço o valor que perdeu.
Art. 236. Sendo culpado o devedor, poderá o credor exigir o equivalente, ou aceitar a coisa no estado em que se acha, com direito a reclamar, em um ou em outro caso, indenização das perdas e danos.
OBRIGAÇÕES DE DAR coisa certa
 Quanto ao risco de perecimento ou deterioração do objeto, há que se invocar a milenar regra do res perit domino (a coisa perece para o dono). 
 Em caso de perda ou perecimento (prejuízo total), duas situações diversas podem ocorrer: 
se a coisa se perder, sem culpa do devedor, antes da tradição (da entrega da coisa), ou pendente condição suspensiva (o negócio encontra-se subordinado a um acontecimento futuro e incerto: o casamento do devedor, por exemplo), fica resolvida a obrigação para ambas as partes, suportando o prejuízo o proprietário da coisa que ainda não a havia alienado (art. 234, parte inicial, do CC/02); 
se a coisa se perder, por culpa do devedor, responderá este pelo equivalente (valor da coisa), mais perdas e danos (art. 234, parte final, do CC/02). Neste caso, suportará a perda o causador do dano, já que terá de indenizar a outra parte. 
 Culpa  lato sensu (dolo ou culpa). 
OBRIGAÇÕES DE DAR coisa certa
 Em caso de deterioração (prejuízo parcial), também duas hipóteses são previstas em lei: 
se a coisa se deteriora sem culpa do devedor, poderá o credor, a seu critério, resolver a obrigação, ou aceitar a coisa, abatido de seu preço o valor que perdeu (art. 235 do CC/02); 
se a coisa se deteriora por culpa do devedor, poderá o credor exigir o equivalente, ou aceitar a coisa no estado em que se acha, com direito a reclamar , em um ou em outro caso, a indenização pelas perdas e danos (art. 236 do CC/02)
OBRIGAÇÕES DE DAR coisa certa
 Art. 237. Até a tradição pertence ao devedor a coisa, com os seus melhoramentos e acrescidos, pelos quais poderá exigir aumento no preço; se o credor não anuir, poderá o devedor resolver a obrigação. 
 Estatui o princípio da equivalência: sendo o devedor o proprietário da coisa até a entrega, deverá suportar a sua perda. Ora, quem suporta os riscos também deve ser beneficiado pelos melhoramentos. Assim, por simetria, todas as benfeitorias e acessões efetivadas na coisa até a tradição serão incorporadas ao patrimônio do seu titular, que será legitimado, portanto, a postular a extinção da obrigação caso o credor se recuse a pagar o novo valor. 
 Caio Mário: a indenização requer que as benfeitorias sejam necessárias ou úteis e efetuadas de boa-fé. 
OBRIGAÇÕES DE DAR coisa certa
 Art. 237. Parágrafo único. Os frutos percebidos são do devedor, cabendo ao credor os pendentes. 
 Frutos podem ser definidos como utilidades que a coisa principal periodicamente produz, cuja percepção não diminui a sua substância (ex.: soja, bezerro, juros, aluguel). Se a percepção da utilidade causar a destruição total ou parcial da coisa principal, não há que se falar, tecnicamente, em frutos. 
 Frutos percebidos  são incrementos normais, previstos e separados do bem e pertencerão ao devedor até a data da tradição (art. 1.232 do CC). 
 No tocante aos frutos não colhidos, como parte integrante do bem, pertencerão ao credor a partir da tradição. 
 Exemplo: Carlos vendeu a Orlando um carro que está alugado a Giselda. Os aluguéis já recebidos (frutos percebidos) são de Carlos; os atrasados (frutos percipiendos) também são de Carlos; já os aluguéis ainda não vencidos (frutos pendentes) são de Orlando. 
OBRIGAÇÕES DE restituir
 As obrigações de restituir, por sua vez, desde o CC/16 mereceram tratamento específico. 
 Nesta modalidade de obrigação, a prestação consiste na devolução da coisa recebida pelo devedor, a exemplo daquela imposta ao depositário (devedor), que deve restituir ao depositante (credor) aquilo que recebeu para guardar e conservar. A coisa já pertencia, antes do nascimento da obrigação, ao próprio credor. 
 Exemplo: o locatário e o comodatário, que devem restituir ao locador e ao comodante, respectivamente, a coisa recebida. 
 Art. 238. Se a obrigação for de restituir coisa certa, e esta, sem culpa do devedor, se perder antes da tradição, sofrerá o credor a perda, e a obrigação se resolverá, ressalvados os seus direitos até o dia da perda. 
OBRIGAÇÕES DE restituir
 Regra: a coisa perece para o dono (credor), que suportará o prejuízo, sem direito a indenização, considerando-se a ausência de culpa do devedor. 
 Finalmente, devemos observar que o legislador , não obstante houvesse imposto as consequências do prejuízo ao credor , ressalvou os seus direitos até o dia da perda. Assim, se a coisa depositada gerou frutos até a sua perda, sem atuação ou despesa do depositário, que inclusive tinha ciência de que as utilidades pertenceriam ao credor, este terá direito sobre elas até o momento da destruição fortuita da coisa principal. 
 Art. 239. Se a coisa se perder por culpa do devedor, responderá este pelo equivalente, mais perdas e danos. (regra igual a obrigação de dar  valor do objeto + perdas e danos). 
OBRIGAÇÕES DE restituir
Art. 240. Se a coisa restituível se deteriorar sem culpa do devedor, recebê-la-á o credor, tal qual se ache, sem direito a indenização; se por culpa do devedor, observar-se-á o disposto no art. 239. (Em caso de simples deterioração, recebê-la-á o credor, tal qual se ache, sem direito a indenização, se não houver culpa; se há culpa, será o valor do objeto + perdas e danos) 
 Nada impede, todavia, a despeito de o Novo Código ser silente a respeito, que o credor de coisa restituível, deteriorada por culpa do devedor , opte por ficar com a coisa, no estado em que se encontra, com direito a reclamar a indenização pelas perdas e danos correspondentes à deterioração. Esta, aliás, era a solução do Código revogado (art. 871, c/c o art. 867). 
OBRIGAÇÕES DE restituir
 Melhoramentos, acréscimos e frutos experimentados pela coisa, nas obrigaçõesde restituir: 
 Art. 241. Se, no caso do art. 238, sobrevier melhoramento ou acréscimo à coisa, sem despesa ou trabalho do devedor, lucrará o credor, desobrigado de indenização. 
 Se os benefícios se agregam à coisa principal, sem a vontade ou despesa para o devedor, lucrará o credor, desobrigado de indenização. 
OBRIGAÇÕES DE restituir
 Art. 242. Se para o melhoramento, ou aumento, empregou o devedor trabalho ou dispêndio, o caso se regulará pelas normas deste Código atinentes às benfeitorias realizadas pelo possuidor de boa-fé ou de má-fé. 
 Se, porém, os melhoramentos ou acréscimos exigiram vontade ou despesa para o devedor, deveremos investigar a natureza das benfeitorias realizadas: 
 Benfeitorias necessárias (a reforma realizada para conservação do bem – ex.: reestruturação de uma viga) e úteis (acréscimo efetuado para facilitar a utilização do bem – ex.: a abertura de uma entrada maior)  o devedor de boa-fé terá direito de ser indenizado, podendo, inclusive, reter a coisa restituível, até que lhe seja pago o valor devido (direito de retenção). 
 Benfeitorias voluptuárias (acréscimos para simples embelezamento ou aformoseamento do bem – ex.: uma estátua no jardim)  poderá o devedor levantá-las (retirá-las), se não lhe for pago o valor devido, desde que não haja prejuízo para a coisa. 
 Atenção! Estando de má-fé, o devedor só terá direito a reclamar a indenização por benfeitorias necessárias, sem possiblidade de retenção da coisa. 
OBRIGAÇÕES DE restituir
 Art. 242. Parágrafo único. Quanto aos frutos percebidos, observar-se-á, do mesmo modo, o disposto neste Código, acerca do possuidor de boa-fé ou de má-fé. 
 Se a coisa restituível gerar frutos, deveremos perquirir o elemento anímico do devedor para extrair as consequências: 
 Quando o devedor estiver de boa-fé, tem direito aos frutos percebidos. Exemplo: o comodatário tem direito aos frutos das árvores que integram o imóvel, até o final do prazo contratual. Fará jus assim a todos os frutos colhidos, durante o tempo em que estiver licitamente no imóvel. 
 Os frutos pendentes (ainda não destacados da coisa principal), todavia, deverão ser restituídos, ao tempo que cessar a boa-fé, deduzidas as despesas de produção e custeio. 
OBRIGAÇÕES DE restituir
 Agora, se o devedor estiver de má-fé, deverá responder por todos os frutos colhidos e percebidos, bem como pelos que, por sua culpa, deixou de perceber, desde o momento em que se constituiu a má-fé, assistindo-lhe direito às despesas de produção e custeio. 
 Se não puder restituir ao credor esses frutos, deverá indenizar com o equivalente em dinheiro. 
 Se, notificado a restituir o imóvel, não o faz, estará de má-fé a partir do momento de ocorrência do prazo. 
OBRIGAÇÕES DE DAR coisa INCERTA
 São aquelas em que a prestação consiste na entrega de coisa especificada apenas pela espécie e quantidade. 
 Exemplo: quando o sujeito se obriga a dar duas sacas de café, sem determinar a qualidade (tipo A ou tipo B). 
 São também chamadas obrigações genéricas. 
 Art. 243. A coisa incerta será indicada, ao menos, pelo gênero e pela quantidade.
 A prestação genérica (“dar duas sacas de café”) deverá se converter em prestação determinada, quando o devedor ou o credor escolher o tipo de produto a ser entregue (“dar duas sacas de café tipo A”). 
 Caio Mário da Silva Pereira: “O estado de indeterminação é transitório, sob pena de faltar objeto à obrigação. Cessará, pois, com a escolha, a qual se verifica e se reputa consumada, tanto no momento em que o devedor efetiva a entrega real da coisa, como ainda quando diligencia praticar o necessário à prestação.”
OBRIGAÇÕES DE DAR coisa INCERTA
 Assim, se a qualidade do café é especificada e as sacas já foram individualizadas (já foram separadas do gênero e apresentadas ao credor), a obrigação se transforma em de dar coisa certa. 
 Pablo Stolze e Rodolfo Pamplona: Se, mesmo que se tenha estabelecido a qualidade do café, ainda não tiverem sido individualizadas as sacas, dentro do universo do estoque/produção, a obrigação ainda será de dar coisa incerta. 
 Essa operação, por meio da qual se especifica a prestação, convertendo o obrigação incerta em certa, denomina-se concentração do débito ou concentração da prestação devida.
 A quem cabe a escolha? 
 Art. 244. Nas coisas determinadas pelo gênero e pela quantidade, a escolha pertence ao devedor, se o contrário não resultar do título da obrigação; mas não poderá dar a coisa pior, nem será obrigado a prestar a melhor. 
Art. 245. Cientificado da escolha o credor, vigorará o disposto na Seção antecedente.	
OBRIGAÇÕES DE DAR coisa INCERTA
 Essa liberdade de escolha, porém, não é absoluta, uma vez que o devedor não poderá dar coisa pior, nem será obrigado a dar a melhor. 
 Exemplo: se o devedor se obriga a entregar duas cabeças de gado, deverá especificar a raça dos animais, no ato do cumprimento da obrigação (nelore, holandês); não estará obrigado a entregar os melhores reprodutores, nem poderá escolher os piores animais do rebanho. 	
 Tal regra é supletiva, sendo apenas aplicada se nada se estipulou no título da obrigação (contrato). 
 Art. 246. Antes da escolha, não poderá o devedor alegar perda ou deterioração da coisa, ainda que por força maior ou caso fortuito. 
 O gênero nunca perece (genus nunquam perit). 
 Atentar-se para a distinção em relação ao perecimento na obrigação de dar coisa incerta e na de dar coisa certa!!!
 Feita a escolha, as regras que passarão a ser aplicadas serão aquelas previstas para as obrigações de dar coisa certa. 
Manoel e Sebastião, agricultores e pecuaristas, comprometeram-se a entregar cinco touros para Artur em 25/05/2013, mediante pagamento à vista, em razão da proximidade de realização de um rodeio organizado por este, previsto para 01/06/2013, no qual os animais seriam utilizados. Ocorre que em 15/05/2013, sem que houvesse a concentração, todos os touros da fazenda de Manoel e Sebastião pereceram em razão de um desastre natural, do qual estes não tiveram culpa. Neste caso, é correto afirmar que (Ano: 2013 Banca: IDECAN Órgão: Prefeitura de Vilhena – RO Prova: Advogado) 
a) resolve-se a obrigação sem perdas e danos, por se tratar de obrigação de dar coisa certa, cujo objeto pereceu sem culpa de Manoel e Sebastião.
b) por se tratar de obrigação pendente de condição resolutiva, qual seja, o pagamento à vista, e não havendo culpa das partes, resolve-se a obrigação sem perdas e danos.
c) não subsiste a obrigação de Manoel e Sebastião, pois esta apenas existiria caso tivesse ocorrido a concentração, hipótese em que se trataria de obrigação de dar coisa certa.
d) subsiste a obrigação de Manoel e Sebastião, pois, tratando-se de obrigação de dar coisa certa, a coisa se perae para os donos, tendo em vista que não houve a tradição do objeto.
e) subsiste a obrigação de Manoel e Sebastião, pois, mesmo diante de caso fortuito ou força maior, por se tratar de obrigação de dar coisa incerta, não é possível, no caso, a alegação de perecimento do objeto.
Gabarito: E
Ana firmou com Pedro a obrigação de entregar três sacas de café Conilon que estavam armazenadas em seu galpão ao final do mês de abril. Para tanto, Pedro adiantou a quantia de R$10.000,00 (dez mil reais). Ocorre que antes do termo fixado, uma chuva torrencial destruiu o galpão com as sacas destinadas ao credor. Nesse caso, como Pedro poderá reaver o prejuízo sofrido?
Resposta: Trata-se de obrigação de dar coisa certa, com inadimplemento sem culpa do devedor. Nesse caso, aplica-se a regra do “res perit domino”. A dona das sacas de café, no caso, Ana, arcará com o prejuízo, devendo devolver a quantia adiantada por Pedro.
Fundamento legal: art. 234 do CC/02. 
João deve a Juca um caminhão da marca xxx, chassi yyy, placa www. Antes de entregar o bem, João, que estava na direção do veículo, ultrapassou outro carro em faixa contínua, vindo a causar um acidente de trânsito. O caminhão sofreu avarias, mas não se tornou inutilizável. Como Juca poderá reaver os prejuízos?
Resposta: Trata-se de obrigação de dar coisa certa,com inadimplemento culposo por parte do devedor. Nesse caso, poderá o credor: i) exigir o equivalente, com perdas e danos ou ii) aceitar o bem no estado em que se encontra, com perdas e danos.
Fundamento legal: art. 236 do CC/02.
image2.png

Continue navegando