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Moraes, R.; Gobbi, L.T.B. Controle visual da locomoção adaptativa e da mobilidade em indivíduos idosos. In: Umberto Cesar Corrêa (Org.). Pesquisa em comportamento motor: a intervenção profissional em perspectiva. São Paulo: EFP/EEFEUSP, 2008, p. 42-60. 1 Moraes, R.; Gobbi, L.T.B. Controle visual da locomoção adaptativa e da mobilidade em indivíduos idosos. In: Umberto Cesar Corrêa (Org.). Pesquisa em comportamento motor: a intervenção profissional em perspectiva. São Paulo: EFP/EEFEUSP, 2008, p. 42-60. Introdução Existe uma preocupação, cada vez mais acentuada, com o perigo que as quedas representam para as pessoas idosas, tanto dentro de casa quanto na comunidade. Essa preocupação é pertinente, haja vista o aumento da incidência de mortes decorrentes de quedas em pessoas idosas nos últimos anos1. Muito em função disso, pesquisas básicas vêm sendo desenvolvidas para aumentar o entendimento dos mecanismos envolvidos no controle postural e locomotor. Esses estudos têm subsidiado a intervenção por meio de programas de atividade física específicos para a prevenção de quedas em idosos procurando aumentar os níveis de capacidade funcional. Entretanto, a prevenção de quedas não deve ser o único aspecto a ser considerado. Além de reduzir o risco de incidência de quedas, tais programas deveriam focar também na preservação e, eventualmente, aumento da mobilidade dos idosos na comunidade em que vivem. A capacidade de deslocar-se de um ponto a outro de forma independente no ambiente define a mobilidade de um indivíduo (Patla & Shumway-Cook, 1999). Esse atributo é essencial para a qualidade de vida das pessoas, pois permite a manutenção de um estilo de vida independente. Um problema observado com a maior parte dos estudos envolvendo idosos, atividade física e mobilidade diz respeito ao fato de as avaliações da mobilidade serem feitas em ambientes estáveis e regulares (Patla & Shumway- Cook, 1999; Frank & Patla, 2003). Entretanto, a simples ida à farmácia, distante duas quadras da casa de uma pessoa, impõe a necessidade de adaptar o padrão básico de locomoção às demandas do ambiente e da tarefa. No percurso casa-farmácia-casa existe obstáculos (e.g., guia da sarjeta) que implicam em elevar mais o membro durante a fase de oscilação do andar para evitar um tropeço. Além disso, podem existir buracos no percurso que requerem alterações no posicionamento do pé durante a aterrissagem para evitá-los. Outras pessoas podem se locomover na sua direção, sendo necessário, entre outras alterações, mudar a direção da locomoção. Todas essas alterações requerem atenção e pressupõem o planejamento antecipatório dos ajustes locomotores para evitar a perda de equilíbrio. Se uma pessoa precisa ir para essa mesma farmácia logo após uma chuva intensa, existe um risco maior de escorregar. Nesse caso, o indivíduo deve reagir a perturbações inesperadas. Esse mecanismo de controle é chamado de controle reativo e pressupõe a ocorrência de um evento inesperado e a posterior informação sensorial indicando tal evento. Além desses dois mecanismos de 1 Centers for Disease Control and Prevention, National Center for Injury Prevention and Control, United States of America. Web-based Injury Statistics Query and Reporting System (WISQARS). Acessado em 20/09/2007. Disponível em: www.cdc.gov/ncipc/wisqars. Moraes, R.; Gobbi, L.T.B. Controle visual da locomoção adaptativa e da mobilidade em indivíduos idosos. In: Umberto Cesar Corrêa (Org.). Pesquisa em comportamento motor: a intervenção profissional em perspectiva. São Paulo: EFP/EEFEUSP, 2008, p. 42-60. 2 controle, existe um terceiro mecanismo chamado de controle preditivo. No caso da farmácia, após comprar alguns itens, o farmacêutico coloca-os todos em uma sacola. O carregamento da sacola leva a alterações nas cargas internas das articulações envolvidas com a sustentação da sacola. O sistema de controle é capaz de predizer e compensar tais alterações para prevenir desequilíbrios. Esse três mecanismos de controle requerem que a atenção seja dirigida às características do ambiente e às condições do organismo. A manutenção da mobilidade de uma pessoa pressupõe o bom funcionamento de todos esses mecanismos de controle. Claramente, essa perspectiva é muito diferente da perspectiva tradicional que enfoca simplesmente mover-se de um ponto a outro no menor tempo possível em um ambiente regular e estável. Dentro de uma visão mais holística, a mobilidade deve incluir a capacidade de modificar e adaptar o padrão de andar a perturbações esperadas e inesperadas e desafios impostos à locomoção (Patla, 1997; Patla & Shumway-Cook, 1999). Nessa visão, faz-se necessário desenvolver procedimentos para quantificar a mobilidade. Patla & Shumway- Cook (1999) propuseram oito dimensões para analisar o nível de mobilidade no ambiente: distância mínima andada, restrições de tempo, condições do ambiente, características do terreno, carregamento de carga externa, demandas atencionais, transição postural e nível de tráfico. Somente um bom desempenho em todas essas dimensões garante a possibilidade de exercer a mobilidade plena. Neste contexto, o objetivo deste capítulo é discutir, inicialmente, aspectos cruciais do mecanismo de controle antecipatório na locomoção adaptativa e como ele interfere na mobilidade das pessoas. Locomoção Adaptativa A locomoção adaptativa consiste na capacidade de ajustar o padrão básico de locomoção às demandas do ambiente considerando as condições do indivíduo e a meta da tarefa, com o intuito de manter o equilíbrio dinâmico. Os mecanismos antecipatório, reativo e preditivo são empregados para garantir a estabilidade dinâmica durante a locomoção adaptativa (Patla, 2003). O mecanismo antecipatório é baseado na visão e guiado pela experiência para identificar potenciais perturbações no caminho da locomoção. Com base nessa informação, modificações são efetuadas no padrão de locomoção para adaptar-se proativamente às condições do ambiente. O mecanismo reativo baseia-se na detecção de perturbações inesperadas na locomoção com base na estimulação dos sistemas sensoriais, sendo considerada a última instância possível para recuperar o equilíbrio. No exemplo da farmácia, se a pessoa eleva o membro inferior insuficientemente quando transpondo a guia da sarjeta (i.e., controle antecipatório ineficiente) ela tropeçará e restará somente o controle reativo por meio, inicialmente, dos reflexos mono- e poli-sinápticos para tentar restabelecer e garantir o equilíbrio dinâmico. Por sua vez, o mecanismo preditivo permite ao indivíduo, por meio da experiência anterior, predizer as perturbações motoras esperadas geradas pela realização de movimentos voluntários isolados ou concorrentes. Por exemplo, o movimento de acenar ao amigo no caminho da farmácia resulta em Moraes, R.; Gobbi, L.T.B. Controle visual da locomoção adaptativa e da mobilidade em indivíduos idosos. In: Umberto Cesar Corrêa (Org.). Pesquisa em comportamento motor: a intervenção profissional em perspectiva. São Paulo: EFP/EEFEUSP, 2008, p. 42-60. 3 momentos de força desestabilizadores que devem ser compensados para garantir a estabilidade dinâmica. Por conta disso, idosos preferem elevar o braço na fase mais estável do andar (i.e., suporte duplo) (Patla et al., 1990), enquanto adultos jovens são capazes de elevar o braço independentemente da fase do andar (Patla, 1986). A magnitude da perturbação inesperada, que somente pode ser superada pelo mecanismo de controle reativo, muitas vezes não pode ser contrabalanceada e a queda torna-se inevitável. Idealmente, somente o controle antecipatório permite prever potenciais riscos ambientais à estabilidade e deve ser primariamente usado no controle da locomoção adaptativa. Por conta dessa vantagem, enfatizaremos o controle antecipatório nesse capítulo. Controle Visual da Locomoção Adaptativa As estratégiaslocomotoras adaptativas antecipatórias podem ser distribuídas em dois grupos: evitar e acomodar. As estratégias de evitar são empregadas para desviar ou transpor obstáculos presentes na superfície e acima do solo, para evitar colisão com pessoas andando em sua direção, para ultrapassar pessoas que estão andando lentamente à sua frente (i.e., mudança de direção), para evitar áreas indesejáveis no chão (e.g., buracos e poças de água) ou simplesmente para parar a locomoção. As estratégias de acomodar requerem que modificações no sistema efetor sejam realizadas de forma a ajustar às características da superfície, como densidade, inclinação, nível de atrito, entre outros. Para todas essas situações, a principal fonte de informação é a visão, pois ela permite a obtenção das características do ambiente de forma antecipada ou a uma determinada distância (Gibson, 1979; Patla, 1997; Mohagheghi et al., 2004). Nos parágrafos que se seguem discutiremos o papel da informação visual no controle antecipatório de evitar, já que o estudo do controle antecipatório de acomodar tem enfatizado, prioritariamente, os aspectos motores (Cham & Redfern, 2002; Leroux et al., 2002; Sun et al., 1996). O estudo da contribuição da informação visual para o controle antecipatório de acomodar carece de maior atenção por parte dos pesquisadores da área de controle da locomoção. Um primeiro ponto de interesse diz respeito à amostragem visual do ambiente. Será que para obter informação antecipada do ambiente através do sistema visual é necessário amostrar esse ambiente continuamente? Alguns estudos têm investigado essa questão, especialmente em adultos jovens, manipulando a disponibilidade de luz do ambiente (Thomson, 1980, 1983; Elliott, 1986; Menuchi, 2005) ou manipulando a disponibilidade de informação visual do ambiente através do uso de óculos de cristal líquido (Patla et al., 1996; Patla, 1997) que permite mudar o status das lentes de transparentes para opacas e vice-versa instantaneamente com o uso de um comando externo. Esses estudos, em geral, têm apontado que o ambiente não precisa ser amostrado continuamente, permitindo que a visão seja desviada para outros pontos no espaço como uma outra pessoa andando ou um objeto em uma vitrine no caminho para a farmácia, por exemplo. Moraes, R.; Gobbi, L.T.B. Controle visual da locomoção adaptativa e da mobilidade em indivíduos idosos. In: Umberto Cesar Corrêa (Org.). Pesquisa em comportamento motor: a intervenção profissional em perspectiva. São Paulo: EFP/EEFEUSP, 2008, p. 42-60. 4 Da mesma forma que os adultos jovens, indivíduos idosos não necessitam amostrar o ambiente continuamente (Patla, 1993). Entretanto, existem diferenças fundamentais entre esses dois grupos etários. Os idosos amostram o ambiente um número menor de vezes em relação aos jovens, porém a duração dessas amostragens é maior para os idosos do que para os jovens (Patla, 1993). Recentemente, Chapman e Hollands (2006, 2007) mostraram que indivíduos idosos com alto risco de quedas fixam o olhar por um período maior de tempo ao serem solicitados a aterrissar os pés sobre alvos colocados no chão durante a locomoção quando comparados a idosos com baixo risco de quedas e adultos jovens. Isso significa que os idosos precisam olhar por mais tempo o ambiente para planejar adequadamente suas ações locomotoras e a diminuição nesse tempo pode resultar em um planejamento incorreto que eventualmente leva a uma queda. A obtenção de informação do ambiente a uma distância tem uma implicação importante em relação ao controle do movimento, já que o controle antecipatório da locomoção permite a distribuição dos ajustes necessários no padrão de andar durante a fase de aproximação quando desviando de um obstáculo, pisando em um alvo ou evitando uma área indesejável. O estudo pioneiro de Lee et al. (1982) mostrou a importância da informação visual para regular o comprimento do passo durante a corrida de aproximação do salto em distância. A corrida de aproximação atende a dois requerimentos importantes: obtenção da máxima velocidade e posicionamento do pé de apoio próximo da margem anterior (ponto onde a medida da distância saltada é iniciada) da plataforma de decolagem. Lee et al. (1982) encontraram que a variabilidade da distância entre a posição do pé e a plataforma de decolagem aumentou continuamente durante a corrida de aproximação até atingir um pico alguns passos antes da plataforma de decolagem. Eles sugeriram que o aumento da variabilidade observado durante essa etapa da fase de aproximação resultou do desempenho de um padrão estereotipado da corrida com o objetivo único de ganhar velocidade, de tal forma que houve um acúmulo de erro ilustrado pelo aumento da variabilidade. Por outro lado, a redução da variabilidade observada nos passos próximos à plataforma de decolagem indica o uso da informação visual para regular o posicionamento adequado do pé. A distribuição desse ajuste nos passos próximos à plataforma de decolagem evita alterações drásticas na velocidade de corrida, garantindo uma boa velocidade e postura na decolagem. Esse mesmo comportamento da variabilidade foi observado para indivíduos inexperientes na tarefa de salto em distância (Hay, 1988), já que Lee et al. (1982) investigaram três saltadores experientes, sugerindo que essa estratégia é inerente ao sistema de controle e independe da prática. Mais recentemente, Montagne et al. (2000) mostraram que quanto maior o erro acumulado durante a fase de aproximação, mais cedo os ajustes necessários para pisar acuradamente no alvo são iniciados. Essa estratégia de controle é usada também durante a fase de aproximação na tarefa de transpor obstáculos (Mohagheghi et al., 2004; Patla & Greig, 2006). Por outro lado, a ausência de um alvo específico para pisar resulta, como esperado, em um contínuo aumento na variabilidade dos passos (Moraes et al., 2004). No exemplo da farmácia, quando atravessando a rua, o comprimento dos passos foi ajustado Moraes, R.; Gobbi, L.T.B. Controle visual da locomoção adaptativa e da mobilidade em indivíduos idosos. In: Umberto Cesar Corrêa (Org.). Pesquisa em comportamento motor: a intervenção profissional em perspectiva. São Paulo: EFP/EEFEUSP, 2008, p. 42-60. 5 para permitir que o pé de abordagem fosse posicionado próximo da margem da guia da calçada para iniciar o cruzamento da rua. Tanto a tarefa de pisar em um alvo quanto a tarefa de evitar pisar em uma área (e.g., um buraco no caminho para a farmácia) são implementadas através de ajustes no comprimento e largura do passo. Na tarefa de evitar pisar, a informação visual permite a detecção da área a ser evitada, bem como permite estimar, combinada com a informação proprioceptiva dos membros inferiores, onde o pé aterrissaria caso nenhuma mudança tivesse que ser realizada. Essa informação é importante, já que diferentes estudos têm apontado que a escolha do melhor ajuste está relacionada com a minimização do deslocamento do pé em relação à posição onde normalmente ocorreria a aterrissagem (Patla et al., 1999; Moraes & Patla, 2006; Moraes et al., 2004, 2007; Weerdesteyn et al., 2004, 2005). Idosos exibem um comportamento semelhante aos adultos jovens na tarefa de evitar pisar em áreas indesejáveis (Patla, 1993). Entretanto, nesse estudo, os idosos tiveram dois passos para identificar a área a ser evitada e fazer os ajustes necessários enquanto que os adultos jovens tiveram apenas um passo. Recentemente, Weerdesteyn et al. (2005) mostraram que, com o avanço da idade e a diminuição do tempo de resposta disponível, há diminuição considerável da taxa de sucesso para evitar pisar em áreas indesejáveis. Além disso, os indivíduos idosos exibiram maior latência para iniciar os ajustes necessários. Patla (1993) mostrou que a diminuição do tempo disponível para a resposta reduziu consideravelmente a porcentagem de sucesso dos idosos para regular o comprimento do passo. Em seu estudo,os participantes tiveram uma passada ou um passo para programar e realizar alterações no comprimento do passo (aumentar ou diminuir o comprimento do passo de acordo com um estímulo externo). Quando o estímulo externo (acendimento de uma luz indicando o local de aterrissagem do pé) era fornecido uma passada antes (i.e., contato do calcanhar ipsilateral), nenhuma diferença entre jovens e idosos foi observada. Entretanto, quando o estímulo foi apresentado um passo antes (i.e., contato do calcanhar contralateral), a taxa de sucesso dos idosos caiu drasticamente, chegando a 40% para o encurtamento do passo e 60% para o alongamento do passo, enquanto que os jovens mantiveram uma taxa de sucesso de 90% nas duas situações. Weerdesteyn et al. (2005) mostraram que os idosos diminuíram a porcentagem de encurtamento do passo para evitar pisar em áreas indesejáveis em relação aos adultos jovens. A menor taxa de sucesso na tarefa de encurtamento do passo deve-se a maior demanda sobre o sistema de controle postural (Moraes et al., 2007). Esses resultados estão de acordo com os dados que mostram a necessidade de maior duração das amostragens visuais pelos idosos. Evidências recentes ilustram de forma bastante elegante os riscos que indivíduos idosos correm por conta da necessidade de obter informação visual por um período mais longo de tempo. Chapman e Hollands (2006, 2007) mostraram que indivíduos idosos com maior risco de queda priorizam o planejamento dos passos futuros em detrimento da execução precisa e acurada do passo atual. Em todas as condições, indivíduos idosos com risco alto e baixo de cair e adultos jovens foram solicitados a andar e pisar em um alvo posicionado dois passos à frente em relação ao ponto de partida. Em uma Moraes, R.; Gobbi, L.T.B. Controle visual da locomoção adaptativa e da mobilidade em indivíduos idosos. In: Umberto Cesar Corrêa (Org.). Pesquisa em comportamento motor: a intervenção profissional em perspectiva. São Paulo: EFP/EEFEUSP, 2008, p. 42-60. 6 condição só havia esse alvo no chão, enquanto que em outra condição havia um segundo alvo posicionado dois passos à frente do primeiro alvo. Na condição com somente um alvo, os participantes dos três grupos mantiveram a fixação do olhar no alvo até pouco tempo depois do contato do calcanhar no alvo. Entretanto, o grupo de idosos com alto risco de queda exibiu duração inferior da fixação do olhar no alvo após o contato do calcanhar em comparação aos outros dois grupos. Na condição com dois alvos, tanto os adultos jovens quanto os idosos com baixo risco de queda continuaram fixando o olhar no primeiro alvo até 100 ms depois do contato do calcanhar no alvo e somente depois desse intervalo de tempo mudaram a fixação para o próximo alvo. Os idosos com alto risco de cair, por sua vez, fixaram no primeiro alvo até 100 ms antes do contato do calcanhar no alvo, ou seja, eles mudaram a fixação do olhar para o segundo alvo antes de completar a primeira tarefa. Além disso, os idosos com alto risco de queda exibiram menor acurácia e precisão no posicionamento do pé no alvo. O aumento da variabilidade médio-lateral do passo é um preditor do risco de quedas em idosos (Owings & Grabiner, 2004). É, portanto, interessante notar nos estudos de Chapman e Hollands (2006, 2007) que existe uma correlação negativa significativa entre o intervalo de tempo envolvido na transferência do olhar do alvo em relação ao contato do calcanhar no chão e a variabilidade médio-lateral do posicionamento do pé. Isso significa que quanto maior a variabilidade do posicionamento do pé, mais cedo o olhar é desviado do alvo. Cabe ainda destacar que o uso de óculos multifocais para corrigir comprometimentos da visão, comumente prescritos para idosos, piora a percepção de profundidade e a sensibilidade de contraste a margens (Lord et al., 2002) e aumenta a variabilidade da distância do pé em relação à margem de um degrau, aumentando o risco de um tropeço (Johnson et al., 2007). O uso de circuitos com vários obstáculos diferentes (i.e., forma, tamanho, cor, textura, posição, entre outros) é um procedimento experimental bastante útil para estudar o controle antecipatório da locomoção e, conseqüentemente, a mobilidade (Elliott et al., 1997; Gonçalves, 2001; Miyasike-da-Silva et al., 2003). Nessa situação, o padrão de andar deve ser continuamente modificado para evitar contatar os obstáculos presentes no caminho. Em um circuito de obstáculos com diferentes contrastes com o solo e sob condições de iluminação normal e reduzida, Reed et al. (2006) observaram que idosos acima de 85 anos de idade realizaram maior número de contatos com os objetos, especialmente aqueles pendurados, em ambas as condições de iluminação quando comparados com idosos mais jovens (entre 75 e 84 anos de idade). Entretanto, todos os participantes aumentaram o tempo gasto para percorrer o circuito na condição de iluminação reduzida. Este mesmo resultado foi observado por Lowrey et al. (2007) em um circuito com três obstáculos em seqüência que exigiam contornar, passar por cima e passar por baixo. Além disso, Lowrey et al. (2007) encontraram maior rebaixamento da trajetória vertical do centro de massa do tronco antes de passar por cima do segundo obstáculo, de tal forma que a preparação para passar por baixo do terceiro obstáculo foi iniciada antes de completar a transposição do segundo obstáculo. Esses resultados evidenciam a importância da informação visual para planejar adequadamente os ajustes necessários no padrão de locomoção e garantir Moraes, R.; Gobbi, L.T.B. Controle visual da locomoção adaptativa e da mobilidade em indivíduos idosos. In: Umberto Cesar Corrêa (Org.). Pesquisa em comportamento motor: a intervenção profissional em perspectiva. São Paulo: EFP/EEFEUSP, 2008, p. 42-60. 7 uma mobilidade plena. A importância da visão no controle antecipatório da locomoção adaptativa pode ser ilustrada também pelo aumento do risco de quedas em idosos com comprometimento da visão (Buckley et al., 2005). A catarata, por exemplo, é uma patologia decorrente da opacidade parcial ou total do cristalino dos olhos, que leva à formação de uma imagem embaçada na retina. Heasley et al. (2004) simularam uma situação semelhante à catarata através do uso de lentes especiais e encontraram um aumento da distância do pé em relação à margem do degrau na tarefa de subir escada. Buckley et al. (2005) também encontraram uma estratégia mais cuidadosa e conservadora para descer um degrau quando simulando catarata. Na mesma linha, Elliott et al. (1997) mostraram que a cirurgia de reparação da catarata melhora a mobilidade. Através do uso de um circuito de obstáculos, indivíduos com catarata foram avaliados antes e depois da cirurgia em relação ao tempo gasto para percorrer o circuito e o número de contatos feitos com os objetos desse circuito. Após a cirurgia, houve diminuição do tempo gasto e do número de contatos com os objetos. Quando o envelhecimento está associado a doenças neurodegenerativas, como é o caso da doença de Parkinson, o paradigma de ultrapassagem de obstáculo tem sido empregado para aprofundar o entendimento do papel da visão no planejamento antecipatório de ações motoras. Patla et al. (1995) evidenciaram a deterioração e a adaptação no controle antecipatório para desviar obstáculos acima do solo em três grupos de participantes: adultos jovens, idosos sadios e idosos em estágio moderado da doença de Parkinson, testados em estado “off” do medicamento. As alturas dos obstáculos foram personalizadas no nível dos ombros, olhos e acima da cabeça e foram apresentados com 4 a 5 passos de antecedência. O abaixamento do quadril e a distância entre a cabeça e o obstáculo revelaram que os obstáculos na altura da cabeça geraram maiores modificações comportamentais. Mais interessante foi que o grupo de idosos com doença de Parkinson apresentou valores médios intermediários aos demais grupos, independenteda altura do obstáculo. Pieruccini-Faria et al. (2005; 2006), empregando obstáculos no solo, analisaram o efeito da reposição de dopamina no planejamento antecipatório de idosos com doença de Parkinson. As alturas dos obstáculos foram personalizadas e corresponderam à altura do tornozelo e à metade da altura do joelho. O efeito do medicamento foi manipulado pela avaliação do comportamento locomotor em jejum e novamente no pico da levodopa. Os resultados revelaram que o obstáculo alto exigiu mais dos pacientes. Houve aumento da velocidade da perna de abordagem e aumento da margem de segurança sobre o obstáculo quando sob efeito do medicamento. Estes resultados também evidenciaram deterioração do planejamento antecipatório da ação motora e não foram confirmados pelos resultados obtidos por Tunik et al. (2007) ao avaliarem a capacidade de pacientes em realizar rápidos ajustes motores. A ausência ou diminuição na disponibilidade de informação visual acarreta em estratégias de controle mais conservadoras. Christina e Cavanagh (2002) encontraram diminuição no pico inicial da força de reação do solo quando a iluminação da sala foi reduzida, sugerindo um cuidado maior para Moraes, R.; Gobbi, L.T.B. Controle visual da locomoção adaptativa e da mobilidade em indivíduos idosos. In: Umberto Cesar Corrêa (Org.). Pesquisa em comportamento motor: a intervenção profissional em perspectiva. São Paulo: EFP/EEFEUSP, 2008, p. 42-60. 8 contatar a superfície do degrau. Além disso, eles observaram que três dos idosos avaliados tropeçaram no degrau na condição de iluminação reduzida, apontando para a importância desta informação para planejar e monitorar a locomoção adaptativa. Em suma, a informação visual adquirida antecipadamente permite a realização de ajustes necessários no padrão de locomoção para garantir o deslocamento bem-sucedido nos mais variados terrenos. Vale destacar que tais ajustes são distribuídos, quando existe tempo disponível suficiente, ao longo da fase de aproximação do obstáculo. Além disso, uma amostragem suficiente do ambiente é condição fundamental para um planejamento adequado das alterações necessárias no padrão de locomoção. Ainda, restrições do indivíduo, como a presença de doenças neurodegenerativas, aliadas a modificação no ambiente, auxiliam também no entendimento do papel da visão no controle locomotor adaptativo. Aplicabilidade na Intervenção Profissional Com base nos estudos revisados sobre a locomoção visualmente guiada, algumas implicações práticas podem ser definidas para o uso em programas de intervenção em pessoas idosas. É sugerido que, no início, os idosos realizem tarefas mais lentas, permitindo a observação longa e dirigida das características do ambiente (preferencialmente situações ambientais menos complexas). Gradativamente, atividades que reduzem a disponibilidade de tempo e aumentam a complexidade dos estímulos visuais devem ser executadas. Simultaneamente, os idosos devem ser estimulados a manter o olhar na tarefa atual e desviá-lo somente após iniciar essa tarefa. Ainda, é importante trabalhar com variações nas características dos objetos e eventos (localização, dimensões, texturas, etc.) e trabalhar com demandas específicas de aterrissagem dos pés para enfatizar o mecanismo de redução da variabilidade próximo a obstáculos, degraus ou alvos isolados. O planejamento dessas atividades de intervenção para pessoas idosas deve focar em dois aspectos fundamentais para a aprendizagem ou re- aprendizagem das adaptações necessárias no padrão de locomoção: a necessidade de maior tempo de prática e a variação das tarefas propostas. Maior número de repetições da tarefa deve ser oferecido aos idosos para garantir a ocorrência e retenção da aprendizagem (Spirduso, 1995). Este aspecto está intimamente relacionado com a variação das tarefas; pois, além do aspecto motivacional, estratégias locomotoras adaptativas são construídas por meio da oferta de um conjunto de atividades que permitam ao idoso usá-las em situações cotidianas. Poucos estudos tratam da aprendizagem de tarefas locomotoras por indivíduos idosos. Van Hedel et al. (2006) analisaram a aprendizagem de uma tarefa locomotora que envolve alta precisão em idosos sadios e idosos com doença de Parkinson. Ao ultrapassar obstáculos durante o andar na esteira rolante foi observado que idosos com doença de Parkinson necessitaram de um número maior de tentativas para atingir um desempenho semelhante ao dos idosos sadios. Estes resultados permitiram aos autores concluir que o comportamento locomotor adaptativo pode ser melhorado com treinamento Moraes, R.; Gobbi, L.T.B. Controle visual da locomoção adaptativa e da mobilidade em indivíduos idosos. In: Umberto Cesar Corrêa (Org.). Pesquisa em comportamento motor: a intervenção profissional em perspectiva. São Paulo: EFP/EEFEUSP, 2008, p. 42-60. 9 adequado em pacientes com doença de Parkinson. No último bloco de tentativas, a supressão da informação visual exproprioceptiva acarretou aumento da distância entre o pé e o obstáculo de maneira similar entre os dois grupos. Como idosos e pacientes compensam as deficiências no feedback proprioceptivo confiando na informação visual, os participantes foram forçados a utilizar o sinal auditivo de alerta presente no meio do suporte indicando a aproximação do obstáculo. O direcionamento da atenção ao sinal sonoro caracterizou uma situação de tarefa dupla e, portanto, houve declínio no desempenho da tarefa locomotora. O sucesso de qualquer programa de prevenção/intervenção deveria focar na capacidade dos idosos em realizar suas atividades diárias na comunidade em que vivem (e.g., ir à farmácia) com o mínimo de dependência de outras pessoas (Frank & Patla, 2003). Assim, medidas tradicionais como o tempo para percorrer uma determinada distância em um ambiente estável e regular não seriam adequadas para avaliar a mobilidade de um indivíduo. Procedimentos próximos do ambiente real são mais apropriados para avaliar a mobilidade de uma pessoa. Relação entre Programas de Atividade Física e Mobilidade Sessões de treinamento específicas para controle postural e locomotor têm sido aplicadas em indivíduos idosos e os resultados têm se apresentado, a uma primeira vista, animadores. Aparentemente, para aumentar as habilidades de controle do equilíbrio durante o andar, exercícios que envolvem o caminhar em combinação com várias tarefas de equilíbrio devem ser incorporados dentro de um programa de treinamento (Gobbi et al., 2002). Ao avaliar a mobilidade de idosos descendo degraus de ônibus em ambiente real, Miyasike-da-Silva e Gobbi (2005) revelaram que, independente do nível de atividade física, a maioria dos idosos percebeu a tarefa como fácil. Entretanto, utilizaram uma forma conservadora de locomoção. Os idosos desceram com um dos pés liderando a descida sendo seguido pelo outro no mesmo degrau (passo unido); os pés foram posicionados lateralmente no degrau, caracterizando uma ação dos abdutores do quadril, culminando em uma posição tandem ou semi-tandem; e o uso dos corrimãos. Esta estratégia conservadora parece ter causa multifatorial, como deficiências perceptivas e fraqueza muscular, e resulta em redução da velocidade da ação, aumento da estabilidade e redução do risco de queda. Ao simular em laboratório a tarefa de descer degraus de ônibus, Miyasike-da-Silva e Gobbi (2007) revelaram que os participantes com maiores níveis de atividade física realizaram a tarefa em menor tempo. Os resultados também revelaram que o processo de envelhecimento e os baixos níveis de atividade física têm o mesmo efeito direcional, refletindo níveis de mobilidade reduzidos. Ainda, quando a altura do último degrau foi manipulada, idosos foram mais afetados pelo aumento das demandas ambientais. Assim, a manutenção de níveis ótimos de atividade física pode minimizar os efeitos do envelhecimento em ambientes irregulares. A estimulação do sistemasensório-motor, por meio da atividade física, pode contribuir para minimizar os efeitos do envelhecimento e favorecer a Moraes, R.; Gobbi, L.T.B. Controle visual da locomoção adaptativa e da mobilidade em indivíduos idosos. In: Umberto Cesar Corrêa (Org.). Pesquisa em comportamento motor: a intervenção profissional em perspectiva. São Paulo: EFP/EEFEUSP, 2008, p. 42-60. 10 manutenção da independência do idoso por um período mais prolongado (Spirduso, 1995). Alguns estudos têm trabalhado com programas de caminhada para idosos (Buchner et al., 1997; Daley & Spinks, 2000). Tipicamente, essas caminhadas ocorrem em ambientes planos e estáveis. Será que a melhora evidenciada na locomoção nessas circunstâncias é transferida para ambientes imprevisíveis e irregulares? Nenhum estudo quantificou isso, mas é razoável supor que tal transferência seria muito baixa, já que estudos envolvendo transferência de aprendizagem mostram que a transferência, quando presente, é baixa (Schmidt & Lee, 2005). A manutenção das capacidades físicas, através da prática regular da atividade física, tem favorecido o comportamento locomotor adaptativo em idosos. Em um circuito de objetos simulando o ambiente doméstico e manipulando a disponibilidade de luz ambiente, Gonçalves (2001) observou que idosos com maiores níveis de atividade física percorreram o circuito em menor tempo e com maior número de contato com os objetos, tanto em condições de iluminação normal como em condições de iluminação reduzida, quando comparados com idosos sedentários. Em outro estudo, Miyasike-da- Silva et al. (2003) aplicaram um treinamento específico para mobilidade (20 sessões) em um grupo de idosos ativos e compararam o desempenho no circuito de ambiente doméstico com o de idosos ativos sem treinamento específico e com idosos sedentários. As diferenças entre os idosos ativos e sedentários, observadas por Gonçalves (2001), foram mantidas; entretanto, os idosos ativos treinados utilizaram tempo similar e realizaram maior número de contatos com os objetos em relação aos idosos ativos. Após o período de treinamento, os idosos ativos treinados mantiveram o número de contatos com os objetos sob condição de iluminação reduzida, enquanto que os idosos ativos aumentaram o número de contatos. Como houve correlação entre o número de contatos com os objetos e o tempo para percorrer o circuito, Miyasike-da-Silva et al. (2003) concluíram que o treinamento específico de duração média favoreceu a mobilidade, mesmo em iluminação reduzida. Um exemplo com uma população especial: o caso de pacientes com a doença de Parkinson O envolvimento na prática regular de atividade física tem um aspecto neuroprotetor e o exercício deve constituir parte da rotina diária dos pacientes com doença de Parkinson. Quando este não é o caso, programas de atividades físicas também têm sido dirigidos para estes pacientes. A atividade física melhora as funções cognitivas e a qualidade de vida (Oliveira-Ferreira et al., 2007b), a capacidade funcional (Hamanaka et al., 2007b), o equilíbrio (Hamanaka et al., 2007a), a mobilidade em ambientes previsíveis e regulares (Miyai et al., 2000; Scandalis et al., 2001; Teixeira-Arroyo et al., 2007) e a mobilidade funcional (Oliveira-Ferreira et al., 2007a). Os tipos de intervenção empregados em pacientes com doença de Parkinson variam de acordo com a ênfase pretendida. Quando o uso de dicas visuais é destacado, Sidaway et al. (2006) observaram que o treinamento promoveu aumento no comprimento do passo e na velocidade do andar. Após um mês, ao final da fase de retenção, estes benefícios foram ainda Moraes, R.; Gobbi, L.T.B. Controle visual da locomoção adaptativa e da mobilidade em indivíduos idosos. In: Umberto Cesar Corrêa (Org.). Pesquisa em comportamento motor: a intervenção profissional em perspectiva. São Paulo: EFP/EEFEUSP, 2008, p. 42-60. 11 observados. Quando a ênfase repousa nos parâmetros do andar, Miyai et al. (2000) empregaram um treinamento específico em esteira rolante e suporte parcial de peso por quatro semanas e observaram melhora na velocidade do andar e no número de passos para percorrer 10 m. Estes efeitos permaneceram por até quatro meses após o término da intervenção (Miyai et al., 2002). Aumentos no comprimento da passada e na velocidade de andar também foram observados após oito semanas de treinamento de resistência de força (Scandalis et al., 2001). Quando a mobilidade em ambientes naturais é enfatizada, Lökk (2000) observou melhoras na qualidade de vida dos pacientes ao final de um programa de caminhadas, mas estes benefícios não se mantiveram após quatro meses. Entretanto, estes estudos quando utilizam ambientes naturais não avaliam o padrão locomotor e quando o fazem, utilizam ambientes pobres em informação visual. Em uma recente revisão da literatura para fundamentar a intervenção específica para o andar em idosos com doença de Parkinson, Morris (2006) diferenciou as formas apropriadas de intervenção de acordo com a evolução da doença. Nos níveis iniciais e intermediários da doença, os pacientes devem ser encorajados a andar em diferentes superfícies direcionando a atenção para a ação motora e, se possível, realizando tarefas concomitantes. Este aconselhamento está fundamentado na observação de que quando os pacientes executaram tarefa verbal-cognitiva durante o andar, Bond & Morris (2000) evidenciaram lentidão ainda maior da marcha. Nos estágios mais avançados, devem-se evitar tarefas concomitantes, movimentos rápidos e, somente quando necessário, introduzir equipamentos assistivos. O uso de dicas visuais deve ser sempre encorajado. Estudos iniciais em nosso laboratório têm aplicado diferentes tipos de treinamento em pacientes nos estágios leve a moderado da doença de Parkinson. Quando a ênfase recaiu sobre os parâmetros do andar em terreno regular, Gobbi et al. (2006a), ao empregarem treinamento predominantemente aeróbio, evidenciaram que o comprimento da passada e a duração do duplo suporte são afetados pela capacidade funcional, principalmente aqueles relacionados com agilidade/equilíbrio dinâmico e resistência aeróbia. Teixeira- Arroyo et al. (2007) observaram que um programa de atividades físicas generalizadas promoveu aumento no comprimento e na velocidade da passada e na cadência. Quando a locomoção adaptativa foi enfatizada, Gobbi et al. (2006b) revelaram que, após um programa de treinamento específico para força, equilíbrio e locomoção em ambiente natural, os pacientes aumentaram o posicionamento dos pés antes e após a ultrapassagem e aumentaram a margem de segurança sobre o obstáculo. Estes estudos têm revelado respostas positivas ao treinamento; entretanto, ainda são necessários estudos que permitam determinar os efeitos do treinamento no andar e na locomoção adaptativa ao longo do tempo, ou seja, após o término do treinamento. Considerações Finais Tradicionalmente, a avaliação da mobilidade tem focado em tarefas simples como andar no plano sem obstruções no caminho. Entretanto, o ambiente do dia-a-dia não é tão estável assim. Rotineiramente nos deparamos Moraes, R.; Gobbi, L.T.B. Controle visual da locomoção adaptativa e da mobilidade em indivíduos idosos. In: Umberto Cesar Corrêa (Org.). Pesquisa em comportamento motor: a intervenção profissional em perspectiva. São Paulo: EFP/EEFEUSP, 2008, p. 42-60. 12 com obstáculos no caminho, buracos no chão, outras pessoas andando em nossa direção. Assim, temos que adaptar, antecipadamente, nosso padrão de locomoção para garantir a realização da tarefa. Esta capacidade de controle antecipatório tende a deteriorar com o avanço da idade e, conseqüentemente, a mobilidade pode ser comprometida, expondo o indivíduo a quedas. Patla e Shumway-Cook (1999) colocam que a definição sobre uma pessoa ser ou não móbil centrou-se inicialmente em variáveis quantitativas do tipo distância percorrida e o tempo gasto para percorrer tal distância.Paralelamente, outros pesquisadores ampliaram um pouco esta classificação e incluíram na definição de incapacidade de mobilidade o fato das pessoas usarem algum tipo de auxílio para locomover-se, apresentarem dificuldade ou não serem capazes de levantar e subir escadas sem auxílio. A inclusão destas tarefas pode ser visto como um avanço, mas ainda não dá conta de um aspecto muito importante não somente para o idoso, mas para as pessoas de forma geral: realizar diferentes tarefas em diferentes contextos. O idoso deve, além de realizar estas atividades, ser capaz de adaptar-se às demandas do ambiente. Como visto acima, a informação sensorial, a visão em particular, desempenha papel central nessa capacidade adaptativa. Nota-se ainda, entretanto, um longo caminho a ser percorrido em relação à incorporação do conhecimento sobre os mecanismos de controle antecipatório dentro dos programas de intervenção. Há carência de pessoal especializado para diagnosticar, programar, aplicar e avaliar programas de atividades físicas para idosos. Recomendações internacionais para a formação dos recursos humanos necessários para atuar nesses programas têm revelado preocupação com o ambiente em que as atividades são desenvolvidas (Gobbi et al., 2005), mas esta preocupação repousa apenas no aspecto segurança. Atividades em ambiente real, ou seja, contextualizadas e com significado, devem ser encorajadas, como o percurso casa-farmácia-casa. É importante também que a atividade tenha características desafiadoras. Neste caso, os sistemas perceptivo e motor devem ser requeridos com gradual complexidade, de forma que o idoso possa manter/aumentar suas possibilidades adaptativas. Referências Bibliográficas Bond, JM; Morris, M. 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