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COMUNICAÇÃO E POLITICA

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A CONSTRUÇÃO DO CONCEITO DE POLÍTICA
Figura 2. A Escola de Aristóteles, por Gustav Adolph Spangenberg
Durante a segunda metade do século XX, a democracia se tornou um regime político extremamente popular. Da mesma forma, as repúblicas passaram a ser uma das mais recorrentes imagens de bom governo ou governo equilibrado. A participação popular e as demandas do coletivo em função da política são outra característica. Essa construção é histórica, e a contemporaneidade política do conceito passa necessariamente por seus reconhecimentos. Sendo assim, passamos agora a buscar o entendimento da formação histórica da nossa ideia de política.
A maioria dos regimes se autoproclama democrático, e mesmo regimes ditatoriais se apropriaram de uma parte ou outra da linguagem democrática como forma de legitimar seu poder. Apesar da expansão sem precedentes na adoção do termo democracia para designar os regimes políticos, o termo passou a corresponder a uma ideia popular vaga. Assim, vale a pena começar este tema perguntando: o que significa politicamente a palavra democracia no mundo contemporâneo?
A noção contemporânea de democracia carrega os principais elementos da linguagem e da institucionalidade da política moderna. Para compreendermos o seu significado de modo mais profundo e amplo, é necessário entender que essa forma política é uma mistura de ideias, experiências, instituições e práticas que se formaram ao longo de mais de dois mil anos de história. Com o objetivo de tornar a compreensão dessa longa história mais acessível, podemos dizer que as democracias modernas têm quatro origens históricas, das quais passaremos a tratar.
A DEMOCRACIA DA GRÉCIA CLÁSSICA
Há cerca de dois mil e quinhentos anos (no século V a.C.) ocorreu uma grande transformação entre os gregos antigos na sua forma de se organizar. Muitos estudiosos marcaram esse importante momento, essa mudança profunda de mentalidade como a invenção da política. A História trata esse momento como uma transição importante de modelos palacianos – representados por lideranças familiares – para modelos políticos, adotados pela interação entre grupos aristocráticos diversos. A demokratia ateniense não foi a única, mas é a que foi recuperada mais recorrentemente, transformando-se em um ícone ocidental e fundamento desse modelo político.
Este ponto é muito importante: o passado não é uma reminiscência, algo que fica e nos marca por ser muito importante no passado, mas sim um discurso, uma constante reinvenção.
Portanto, o que foi vivido nas póleis da sociedade grega clássica é importante não pelo que aconteceu, mas por ter sido considerado um evento muito emblemático e repetido por muitas sociedades ao longo da história. Podemos afirmar que a ideia de Ocidente passa pela admiração e reinvenção daquilo que aconteceu na Grécia. Leve essa informação com você para fazer todo o trajeto histórico sobre política.
Figura 3. Heitor adverte Páris por sua suavidade e exorta-o a ir à guerra, por Johann Heinrich Wilhelm Tischbein
O que ocorreu nesse período foi a invenção de uma forma de governo que até então era incomum. Predominavam governos compostos por reis ou famílias, que muitas vezes se comparavam a deuses (como no caso do Egito Antigo) ou acreditavam ter origens divinas, ou por tiranos (indivíduos que governavam segundo sua vontade, sem nenhuma restrição) e aristocratas (conselheiros de chefes guerreiros).
No século V a.C., os gregos inventaram uma nova forma de organizar o poder: a maioria dos homens livres e adultos podia decidir os assuntos mais relevantes de sua comunidade e escolher aqueles que exerceriam cargos importantes na direção da cidade-estado. A essa forma de organização política deu-se o nome de “democracia”, que em grego significa “governo do povo” ou “governo popular”.
Figura 4. O Parthenon, na Acrópole de Atenas
A democracia era baseada em duas importantes ideias que possuem forte influência até os dias atuais: a isegoria (o direito igual de fala para todos os cidadãos nos debates sobre os assuntos políticos) e a isonomia (igualdade de todos os cidadãos perante a lei – ideal que ainda encontra eco nos Estados democráticos de direito modernos). É elemento importante o fato de que esse modo de governo não legitimava seu poder de forma mágico-religiosa (ou seja, a religião não exercia autoridade nem tornava o poder legítimo). Também não era comum a todos aqueles povos antigos que conhecemos por gregos, mas tornou-se o modo particular de governo de uma cidade independente chamada Atenas. Sobre a democracia ateniense, é importante sabermos que:
	O número de participantes era muito restrito: tratava-se de uma cidade muito menor do que as cidades modernas. Além disso, seus cidadãos (os homens adultos e livres) eram poucos com relação à população geral.
	Apenas homens adultos e livres eram considerados cidadãos, a democracia ateniense excluía mulheres, estrangeiros e escravos – que eram a maior parte da população. Além disso, apenas os filhos de cidadãos atenienses eram considerados cidadãos (filhos de mães atenienses com estrangeiros não contavam nessa categoria).
	A participação dos cidadãos nos assuntos públicos e nos cargos políticos existentes era toda decidida e exercida em reuniões públicas (assembleias). Isso reduzia o espaço dessa forma de organização a apenas uma pequena cidade, como era o caso de Atenas nos tempos da antiguidade clássica.
É importante destacarmos estas três características da democracia grega para compreendermos o quanto ela se distingue das atuais democracias:
	Era restritiva quanto ao direito de cidadania, que era concedido apenas a homens e excluía mulheres, estrangeiros e escravos.
	Era restrita ao pequeno território de uma cidade (ao contrário das democracias contemporâneas que cobrem populações de países inteiros).
	Era restrita a interesses homogêneos, os cidadãos tinham interesses, objetivos e mentalidades muito próximos (ao contrário das democracias contemporâneas, que tendem a ser mais conflituosas em função da sua heterogeneidade, ou seja, das diferenças de interesses, objetivos e mentalidades).
Podemos dizer que a democracia ateniense era uma democracia restritiva se comparada às democracias modernas. Essa característica foi responsável por sua breve existência: essa experiência durou menos de duzentos anos, e os atenienses foram dominados e absorvidos por povos que possuíam formas de organização política que agregavam populações maiores e governavam territórios mais amplos.
A TRADIÇÃO REPUBLICANA
De todas as fontes de origem dos ideais, valores, princípios e instituições que inspiram nossas democracias modernas, a mais longa, diversificada e rica é, sem dúvida, a tradição do pensamento republicano. Rica em experiências, formas institucionais e elaboração jurídico-filosófica, é uma tradição que surge no auge da antiguidade clássica e reaparece com força na Europa da Idade Moderna.
Figura 5. Alto-relevo de Políbio no Museu da Civilização Romana
Apesar de ter seus primeiros vestígios no seio da cultura grega clássica, podendo ser vinculada à crítica democrática, à teoria das formas de governo do filósofo grego Aristóteles (384-322 a.C.) e à ideia de governo misto do historiador grego Políbio (200-120 a.C.), a tradição republicana não deve suas origens à democracia grega. Filosoficamente, a concepção polibiana de governo misto ilustra bem as formas institucionais e as relações de governo da maior parte das experiências clássicas do republicanismo: a necessidade de representar todas as formas clássicas de governo em uma só para produzir um governo de grande estabilidade e ordem.
De maneira simplificada, é como se o governo misto juntasse a democracia (governo do povo), a aristocracia (governo dos melhores) e a monarquia (governo de um rei) numa mesma forma de governo. Em tese, isso eliminaria os defeitos e as instabilidades de cada uma das formas descritas, seus riscos de degeneração e desequilíbrio, produzindo uma forma de governo estável, equilibrada e ordenada.
Saiba mais
Para termos uma ideia clara do que
significa essa tradição, precisamos atentar que nos notórios movimentos intelectuais da modernidade – Renascimento e Iluminismo – as teorias filosóficas sobre a República – gregas e romanas – foram relidas e influenciaram toda a imensa corrente de filósofos políticos que enriqueceram a tradição republicana nos tempos modernos: Nicolau Maquiavel (1469-1527), John Locke (1632-1704), Jean-Jacques Rousseau (1712-1778), Montesquieu (1689-1755) e Immanuel Kant (1724-1804), por exemplo. Também inspiraram pensadores políticos e homens de Estado que tiveram fundamental importância na gestação dos republicanismos constitucionais inglês e americano entre os séculos XVII e XVIII, como o inglês John Harrington (1561-1612) e federalistas estadunidenses, como Alexander Hamilton (1755-1804), John Jay (1745-1829) e James Madison (1751-1836).
Figura 6. Origem da República Romana, por Casto Plasencia
Historicamente, a tradição republicana se “encarnou” na República Romana (entre os séculos VI e I a.C.), nas cidades-estados renascentistas de Veneza e Florença (entre os séculos X e XVIII) e na Inglaterra e nos Estados Unidos (séculos XVII e XVIII). Institucionalmente, sua grande inspiração foram as instituições da República romana clássica que ilustram também a ideia de governo misto: o poder popular tinha espaço através da magistratura dos tribunos da plebe, os aristocratas exerciam funções no Senado, a função monárquica do governo era exercida pelos cônsules.
Desse modo, o povo e os aristocratas participavam do governo, e estavam amalgamadas as três formas clássicas de governo: a democracia (representada pelos tribunos da plebe), a aristocracia (representada pelo Senado) e a monarquia (representada pelos cônsules). Tanto a cidade renascentista de Florença como a cidade de Veneza (recordada por ter mantido um regime republicano que durou centenas de anos) tinham instituições semelhantes e foram referências de governos mistos para os pensadores republicanos modernos.
Essa breve exposição da tradição republicana e da noção de governos mistos pode lembrar bastante as democracias modernas – sobretudo aquelas que são repúblicas federativas presidencialistas – como é o caso do Brasil e dos Estados Unidos da América. Mas é importante notar três grandes diferenças entre a história e as ideias da tradição republicana e a vida política das democracias contemporâneas:
	As repúblicas de governos mistos tinham que lidar com dois grupos de interesse opostos, mas homogêneos: o povo e a aristocracia. O mundo contemporâneo possui uma multiplicidade de grupos de interesses muito mais complexa.
	Os governos mistos tinham cargos que eram populares e aristocráticos, ocupados, respectivamente, por aqueles que eram oriundos de cada um desses grupos: um plebeu nunca se tornava senador no mundo da República romana. O Senado era reservado somente aos aristocratas nascidos de famílias antigas e poderosas. Tal situação se repetiu em outras repúblicas históricas, como as de Florença, Veneza e Inglaterra dos séculos XVII e XVIII.
	A participação pública, por meio de cargos e magistraturas importantes, era limitada a uma cidade central: não existia uma cidadania nacional como a das democracias modernas. O cidadão da República romana era somente o romano nascido em Roma de famílias romanas, o mesmo ocorria em Florença, Veneza e Inglaterra dos séculos XVII e XVIII.
Podemos dizer que as democracias contemporâneas são mais democráticas que as repúblicas antigas e modernas. Além disso, elas possuem uma institucionalidade capaz de representar muito mais que apenas dois interesses opostos (povo versus aristocracia). Mas o que queremos dizer aqui com representação de interesses? Trataremos disso a seguir ao abordarmos a terceira fonte de origem das democracias contemporâneas.
O GOVERNO REPRESENTATIVO
No taxation without representation!
Essa sentença – traduzida para o português como: “Não pagaremos impostos se não tivermos representação!” – foi o slogan de uma das mais importantes revoluções dos tempos modernos: a Revolução Americana (1776-1783).
O que nos interessa aqui não são propriamente os acontecimentos, cenários e personagens dessa história, mas a invenção do governo representativo. Ao falarmos da democracia grega e da tradição republicana, observamos como suas origens e práticas históricas tiveram a limitação de serem localizadas em territórios muito pequenos: centralizados em apenas uma cidade (Atenas, a cidade de Roma, Florença, Veneza etc.).
Figura 7. Washington atravessando o Delaware, por Emanuel Leutze
Mesmo na Inglaterra, com a invenção de um Parlamento (dividido a princípio em Câmara dos Lordes – ocupada pelos aristocratas – e a Câmara dos Comuns – ocupada por aqueles que não tinham origem familiar na nobreza britânica), a participação era reduzida apenas aos habitantes da grande cidade que era Londres no século XVII. Desse modo, não eram todos aqueles que viviam sob o governo londrino – o governo inglês da época – que podiam participar das grandes decisões tomadas no Parlamento. Muitas dessas decisões eram relativas aos impostos cobrados, aos preços das mercadorias etc. E com o advento da Câmara dos Comuns, muitos negociadores, investidores e comerciantes (que não vinham de famílias nobres) passaram a tomar parte nessas decisões econômicas que os afetavam.
Figura 8. William Pitt discursando na Câmara dos Comuns sobre a eclosão da guerra com a Áustria, por Karl Anton Hicke
Antes da invenção da Câmara dos Comuns, era corriqueiro que a realeza e os nobres aumentassem os impostos sobre esses grupos mercantis e de negociadores para seus próprios fins. Ao tomarem parte nas decisões públicas, essa nova classe de comerciantes e negociantes prósperos passou a ter a capacidade de proteger seus próprios interesses. Mas isso se resumia apenas aos prósperos comerciantes e homens de negócio da grande cidade de Londres, não a todos aqueles que viviam sob o governo da recém-criada monarquia parlamentar inglesa.
Assim, eram poucos os que, sob o domínio do governo londrino, tinham meios de defender seus interesses: sendo que aqueles que viviam nas longínquas colônias do nordeste da América do Norte sequer tinham suas vozes ouvidas no recém-criado Parlamento de Londres.
O Parlamento inglês aberto aos “comuns” foi produto de um intenso conflito ocorrido na Inglaterra do século XVII, marcado por uma guerra civil – a Revolução Inglesa (1640-1651) –, uma ditadura – o período do Protetorado (1653-1659) – e uma ampla conciliação entre os grupos em conflito durante a Revolução Gloriosa (1688-1689). Esta última é chamada assim por ter transformado as instituições políticas sem guerra ou conflito sangrento: esse acordo entre as partes, que fez cessar o conflito, deu origem ao Parlamento e à Constituição moderna da Inglaterra.
Durante o período de 1640 a 1689, as longínquas colônias do nordeste da América do Norte se viram esquecidas por seus governantes, absorvidos nos conflitos mencionados. Elas edificaram uma vida bastante próspera e mais igualitária entre homens e mulheres brancos do que a realidade europeia do outro lado do Oceano Atlântico (não tão igualitária: lembremo-nos de que em alguns lugares dessas colônias, mas não em todos, existia a brutal escravidão negra – como houve no Brasil, na mesma época).
Não era um mundo perfeito, mas havia mais prosperidade – e menos luxo – do que na Europa da época, apesar das grandes desigualdades existentes. Durante essas décadas de abandono relativo dos assuntos coloniais por parte dos interesses britânicos, os colonos do norte da América puderam se autogovernar com um nível de autonomia muito grande para a época.
Com o fim dos conflitos ingleses, o governo britânico começou a reorganizar seus interesses nas suas colônias do outro lado do Atlântico mediante taxações e outras intervenções nos assuntos das colônias. Entretanto, seriam as taxações diretas sobre mercadorias como o chá (Lei do Chá, de 1773), o açúcar (Lei do Açúcar, de 1764) e sobre documentos impressos (Lei do Selo, de 1775), que taxava em moeda britânica
revistas, jornais, documentos oficiais e outros materiais impressos pelos colonos americanos, que inflamariam o ânimo dos colonos.
Figura 9. Festa do Chá de Boston, de autor desconhecido
Tais taxações – entre outras – eram consideradas abusivas para os colonos da América do Norte, que viam isso como uma situação injusta por não terem seus interesses representados no Parlamento britânico. Daí o slogan da Revolução Americana ter sido “No taxation without representation” – ou seja, tratava-se inicialmente de uma exigência por representação no Parlamento britânico em função das taxações serem vistas como ilegítimas na ausência de uma representação colonial.
Figura 10. Assinatura da Constituição dos Estados Unidos, por Howard Chandler Christy
O desenvolvimento desse conflito culminou com a Independência Americana. Contudo, a demanda por representação por parte dos colonos americanos foi uma experiência que os influenciou a produzir uma forma de governo que levasse em conta a representação como um fator de grande importância. Desde a convenção que deu origem à Constituição americana (1787) até o modo como foi configurado o governo pós-independência, a representação teve um papel central e extremamente inovador na história da política moderna. A prática moderna de populações elegerem representantes que agem como mediadores de seus interesses na condução dos assuntos públicos, em um país de grandes proporções (a princípio apenas nas treze colônias originais), foi uma contribuição legada ao mundo moderno pelos nascentes Estados Unidos da América.
Outro elemento importante oriundo da experiência política estadunidense desse período foi a subordinação do poder militar à autoridade presidencial eleita e de natureza civil, aspecto que ganharia bastante importância em todas as democracias constitucionais modernas. Porém, devemos lembrar que a representação por voto nos Estados Unidos era bastante limitada em suas origens.
Apesar da representação americana ter sido, historicamente, um elemento inovador nas práticas de governo e um diferencial com relação à tradição republicana europeia, ela padecia de grandes limitações quando comparada às nossas democracias modernas por três motivos centrais:
	Tratava-se de uma lógica de representação restritiva, pois apenas homens brancos livres, proprietários de terras e alfabetizados podiam eleger seus representantes. Essas características designam o que chamamos de voto censitário: por estipular critérios que restringem o nível de participação política das populações.
	Os votos eram por distritos e não por pessoa. A lógica de que cada pessoa corresponde a um voto não era aplicada.
	A lógica do voto censitário não permitia que negros e mulheres votassem. Eles eram, portanto, excluídos do “governo representativo” dos Estados Unidos.
Ao longo dos séculos, a representação e o direito ao voto nos EUA foram ampliados em um longo processo de conflitos e pressões por grupos diferentes da sociedade civil. Mas foi apenas em 1965 que o direito ao voto universal (aberto a todos e sem nenhuma restrição) foi adotado nos Estados Unidos.
Podemos dizer, como frisamos anteriormente, que as desigualdades existentes nos Estados Unidos na época da fundação de seu sistema de governo representativo restringiam bastante as suas inovadoras práticas de representação. A relação entre interesse e representação era demasiado restritiva. Essas restrições relativas à igualdade de todos os cidadãos no exercício da cidadania, do direito de voto e de, portanto, ter seus interesses representados na esfera dos assuntos políticos e no governo nos levam à quarta origem das democracias contemporâneas: a lógica da igualdade.
A LÓGICA DA IGUALDADE
Tal como as três origens distintas das democracias modernas que abordamos anteriormente, a lógica da igualdade tem sua própria história e não se vincula àquela da tradição democrática grega, nem da tradição republicana e nem da invenção da representação. Suas origens são modernas e podem ser reconduzidas ao humanismo e aos movimentos puritanos do século XVI que ressignificaram todo um conjunto de ideias religiosas.
O humanismo clássico teve o papel de trazer para a cultura europeia do século XVI o homem para o centro dos debates da época, relegando as discussões teológicas para um segundo plano, como afirma Skinner (1996). Foi do seio do humanismo clássico que surgiram as discussões filosóficas sobre tolerância religiosa e da dignidade humana como valor civilizacional de importância.
Figura 11. Retrato de Erasmus de Roterdã, o “príncipe dos humanistas”, por Quentin Matsys
Já o puritanismo teve um papel fundamental nos movimentos religiosos e políticos do século XVII ao trazer para a linguagem político-religiosa da época a ideia de igualdade dos homens perante Deus. As ideias religiosas de igualdade entre os homens pregadas pelos puritanos tiveram bastante impacto na Inglaterra e nos Estados Unidos e influenciaram muitos movimentos políticos entre os séculos XVII e XVIII.
Mas uma outra corrente filosófica teve uma influência mais radical nesse processo de defesa da igualdade entre os homens: o Iluminismo. Movimento intelectual de grande abrangência na Europa (Inglaterra, Países Baixos, Itália, Alemanha e, principalmente, França), o Iluminismo trazia em sua bagagem uma forte crítica ao Antigo Regime, ao clero e ao obscurantismo, forças que submetiam a maioria dos homens ao poder de poucos: os aristocratas e o clero.
Figura 12. Prisão do Palácio das Tulherias, por Jean Duplessis-Bertaux
Na França, as ideias dos filósofos iluministas (principalmente de Jean-Jacques Rousseau – crítico feroz das desigualdades, tal como podemos ver em sua obra Discurso sobre a desigualdade entre os homens) inspiraram os revolucionários de 1789 e, principalmente, a ala mais radical (os jacobinos) a derrubar o regime monárquico existente. O lema da Revolução Francesa (1789-1799), “Igualdade, Fraternidade e Liberdade”, tinha como inspiração o iluminismo francês.
A crença iluminista e religiosa da igualdade entre os homens foi uma ideia bastante radical na época, mas teve, num primeiro momento, sua realidade limitada aos homens proprietários frente aos aristocratas que perdiam seus direitos de nascença.
Apesar dos direitos políticos e da cidadania terem se expandido com as revoluções dos fins do século XVIII e início do século XIX, eles ainda excluíam os pobres, as mulheres e, nas Américas, outras etnias, como negros e indígenas.
Seriam os movimentos sufragistas do século XIX que expandiriam o voto e os direitos de cidadania às mulheres e, posteriormente, no século XX, sob a rubrica dos direitos humanos universais, a lógica da igualdade se expandiria a outros povos e etnias. Essas ideias de igualdade tiveram histórias e crenças com fontes distintas, com bases sociais e movimentos diferentes e ocorreram em cada país moderno em épocas diversas. Essa lógica da igualdade formou o que chamamos de sufrágio universal, que é a última característica das democracias modernas abordadas aqui.
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