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ÉTICA, RELIGIÃO E CULTURA NO ENSINO

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ÉTICA, RELIGIÃO E CULTURA NO ENSINO 
RELIGIOSO 
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SUMÁRIO 
 
1 - MORALIDADE, ÉTICA E RELIGIÃO ..................................................................... 3 
1.1- Que razões seriam estas? ........................................................................................... 4 
2 - RELIGIÃO E CULTURA ........................................................................................... 8 
REFERÊNCIAS ............................................................................................................. 15 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
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FACUMINAS 
 
A história do Instituto Facuminas, inicia com a realização do sonho de um 
grupo de empresários, em atender à crescente demanda de alunos para cursos 
de Graduação e Pós-Graduação. Com isso foi criado a Facuminas, como 
entidade oferecendo serviços educacionais em nível superior. 
A Facuminas tem por objetivo formar diplomados nas diferentes áreas de 
conhecimento, aptos para a inserção em setores profissionais e para a 
participação no desenvolvimento da sociedade brasileira, e colaborar na sua 
formação contínua. Além de promover a divulgação de conhecimentos culturais, 
científicos e técnicos que constituem patrimônio da humanidade e comunicar o 
saber através do ensino, de publicação ou outras normas de comunicação. 
A nossa missão é oferecer qualidade em conhecimento e cultura de forma 
confiável e eficiente para que o aluno tenha oportunidade de construir uma base 
profissional e ética. Dessa forma, conquistando o espaço de uma das instituições 
modelo no país na oferta de cursos, primando sempre pela inovação tecnológica, 
excelência no atendimento e valor do serviço oferecido. 
 
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– Revisão: 15/12/2017 
 
Caro aluno, nessa disciplina você irá estudar os fundamentos éticos e culturais das 
religiões. Vamos conhecer algumas das mais conhecidas religiões existentes na 
humanidade e para isso selecionamos um material especial com vídeos e textos para que 
você amplie seus conhecimentos sobre elas e instrumentalize sua prática em sala de aula. 
Boa leitura e bons estudos! 
 
1 - MORALIDADE, ÉTICA E RELIGIÃO 
Marcos de Almeida 
 
É possível que haja uma moralidade sem religião? É necessário existir um deus 
ou deuses de modo a que isso se torne indispensável para a moralidade? O fato de que 
algumas pessoas não são religiosas, as impedem de ser, automaticamente, morais? E se a 
resposta a estas questões exigirem a crença em uma divindade, qual das religiões é o real 
fundamento para a moralidade? A grande constatação é que ao olhar-se o quadro mundial 
dos dias de hoje, é possível afirmar que existem conflitos em número equivalente ao das 
religiões e pontos de vista religiosos. 
A religião é uma das mais antigas instituições humanas. Há, por exemplo, pouca 
evidência de que a linguagem tenha existido em tempos pré-históricos, mas temos 
evidências claras de que práticas religiosas já eram interligadas com expressões artísticas 
e de que leis ou tabus exortavam os seres humanos daquela época a comportarem-se de 
certas maneiras. Naqueles tempos primordiais a moralidade estava implantada nas 
tradições, hábitos, costumes e práticas religiosas de cada cultura. 
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Além disso, a religião servia (como o fez até bem recentemente) como a mais 
poderosa das sanções para manter as pessoas, moralmente bem comportadas e obedientes. 
As sanções de recompensa ou punição tribal eram desprezíveis ao lado da ideia de uma 
punição ou recompensa tão grande, que poderia ser mais terrivelmente destrutiva ou mais 
deliciosamente compensadora do que qualquer outra que os simples mortais pudessem 
oferecer. 
Entretanto, o fato de que a religião possa ter precedido qualquer código legal 
formal, ou sistema moral separado, na história da raça humana, ou por que possa ter 
fornecido sanções poderosas e efetivas, para um comportamento moral, não prova de 
modo algum, que a moralidade deva ter, necessariamente, uma base religiosa. Meu 
argumento é, precisamente, o de que, por múltiplas razões, a moralidade não necessita e, 
de fato, não deve ser baseada somente na religião, muito embora, como adverte Fabri dos 
Anjos, a religiosidade (e não uma religião em particular ) e a ideia daquilo que nos é 
transcendente (não necessariamente uma divindade, sejam antropologicamente inerentes 
ao nosso refletir bioético. 
1.1- Que razões seriam estas? 
Em primeiro lugar, de modo a provar que é obrigatório ser religioso para poder 
ser moral, teríamos que demonstrar conclusivamente que um mundo supranatural existe 
e que a moralidade existe lá tanto quanto no mundo natural. Mesmo que isso possa ser 
demonstrado, o que é altamente improvável, teríamos que mostrar que a moralidade lá 
existente tem alguma conexão com aquela presente em nosso mundo. Parece óbvio, no 
entanto, que ao lidar com as questões morais, a única base que temos, para exercitar nosso 
pensamento ético, é este mundo em que vivemos, as pessoas que nele existem, as ideias 
e valores que elas possuem e as ações que elas praticam. 
Um teste, para a veracidade dessa razão, seria tomar qualquer conjunto de 
preceitos religiosos e perguntar, francamente, quais deles seriam absolutamente 
indispensáveis para o estabelecimento de qualquer sociedade moral. Por exemplo, 
podemos usar os Dez Mandamentos sem validar os três primeiros. Os três primeiros 
podem ser um conjunto necessário para uma comunidade judaica ou cristã, mas se uma 
comunidade não religiosa seguir, rigorosamente, apenas os mandamentos de quatro a dez, 
de que modo, refletindo moral e honestamente, as duas comunidades diferem? Não estou 
querendo dizer que a moralidade não possa ser atrelada à religião; é um fato real que tem 
sido, é, provavelmente, será no futuro. O que estou querendo dizer é que a moralidade não 
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precisa ser fundada, de modo algum em uma religião. A religião, definitivamente, não é 
indispensável para a moralidade. E acrescentaria ainda, que existe um enorme risco real 
(demonstrado múltiplas vezes pela história), da restrição e da intolerância, caso uma 
religião passe a ser o referencial, o único fundamento da moralidade. 
Se pudermos, de modo sumário, caracterizar a moralidade desse mundo, como 
não ferir ou matar os outros e, de um modo geral, tentar tornar a vida e o mundo melhor 
para todos e tudo o que nele existe, e se muitos seres humanos não aceitarem a existência 
de um mundo supranatural e, ainda assim agirem tão moralmente quanto quaisquer outros 
que acreditam, então deve haver alguns outros atributos, diferentes das crenças religiosas, 
que são necessários para alguém ser moral. Embora seja óbvio que a maioria das religiões 
contenha sistemas éticos, isso não transforma em verdade a afirmação de que todos os 
sistemas éticos tenham uma base religiosa; por tanto não existe uma 
ligação obrigatória entre moralidade e religião. O simples fato de que pessoas 
completamente não religiosas (como, por exemplo, vários eticistas ateus humanistas), 
podem desenvolver sistemas éticos significativos e consistentes, é prova suficiente disso. 
Fornecer um fundamento racional para um sistema ético já é bastante difícil, sem 
ter de oferecer também um fundamento para a religião que propõe tal sistema ético. E a 
dificuldade de fundamentar racionalmente a maioria dos sistemas religiosos é 
inescapável. É impossível comprovar conclusivamente a existência de alguma 
supranatureza, pós-vida, deus ou deuses. Nem precisamos apelar para os argumentos 
modernos e tradicionais, sobre a existência ou inexistência de um deus ou deuses neste 
ponto, mas simplesmente verificar que não há evidência conclusiva de que tais seres 
existam ou não existam. 
Portanto, se nenhuma evidência é conclusiva e nenhuma lógica dos argumentos é 
irrefutável, então a existência de um mundo supranatural, um pós-vida, um deus ou 
deuses,fica pelo menos colocada na categoria das coisas não provadas. Isso, 
naturalmente, não significa que grande número de pessoas não continuará a acreditar nas 
suas existências, baseando suas crenças na fé, no medo, na esperança ou na sua própria 
leitura das evidências. Todavia, como fundamentação lógica da moralidade, as religiões 
são, de fato, muito frágeis, exceto para aqueles que creem. Acreditar que Deus, ou um 
pós-vida exista, pode fazer as pessoas sentirem-se melhor agindo de determinadas 
maneiras. Pode igualmente fornecer poderosos reforços para alguém agir moralmente (ou, 
pelo menos, não agir imoralmente) . Só que isso não se configura como uma 
fundamentação racional válida para a moralidade, que nos forneça razões, sentimentos, 
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evidência ou lógica para agirmos de um modo e não de outro. A qualidade moral de um 
ato reside no fato dele ter sido escolhido livremente e não comandado. Como declarou 
Scriven: “A religião pode fornecer um fundamento psicológico, mas não lógico para a 
moralidade”. 
Ainda que as religiões pudessem ser racionalmente fundamentadas, qual religião 
deveria ser a escolhida como a base para a ética humana? Dentro de uma religião em 
particular, essa questão é facilmente respondida, mas, obviamente, não respondida de 
modo satisfatório para os membros de outras religiões conflitantes, ou para aqueles que 
não acreditam em qualquer religião. Mesmo se os pressupostos das religiões pudessem 
ser conclusivamente provados, qual religião deveríamos aceitar como a verdadeira e 
legítima geradora da moralidade? É claro que existem muitas religiões que têm muitas 
prescrições éticas em comum, como, por exemplo, não matar. Mas é também bastante 
evidente que existem numerosas prescrições não congruentes. 
Só para ficar no cristianismo, por exemplo, há muitas declarações éticas em 
desarmonia, relacionadas a sexo, guerra, casamento, divórcio, roubar e mentir. 
Em resumo, qual a conexão entre a religião e a moralidade? A resposta é que não 
há uma conexão necessária. Pode-se ter um sistema ético completo, sem mencionar outra 
vida, que não esta, deus ou deuses, nada supranatural, ou qualquer pós-vida. Quer dizer, 
então, que para sermos morais precisamos evitar a religião? De modo nenhum! Os seres 
humanos devem ser permitidos livremente a acreditar ou desacreditar, desde que exista 
alguma base moral que proteja todas as pessoas contra tratamento imoral tanto nas mãos 
de religiosos, como de não-religiosos. Uma religião que advogue o sacrifício humano de 
não-voluntários, não pode ser permitida existir dentro de um sistema moral amplo. Se, 
por outro lado, as religiões puderem aceitar alguns princípios morais abrangentes e seus 
membros puderem agir de acordo com tais princípios, então eles podem coexistir com 
pessoas não religiosas e, ao mesmo tempo, manterem seus próprios princípios de modo 
significativo, sem pretenderem impor suas crenças. 
Nos dias atuais é uma insanidade pretender que as pessoas cresçam ingênuas. Não 
podemos, e certamente não devemos, re-introduzir a famigerada era da credulidade. Está 
muito claro que o dogmatismo é um terrível obstáculo à educação e temos a convicção 
que representa um enorme perigo. Existe uma tendência, há muito perceptível nos Estados 
Unidos, e que vem aumentando também em outras partes do mundo, de tentar enveredar 
pelos caminhos do fundamentalismo religioso. A principal característica de qualquer 
religião fundamentalista seja cristã, judaica ou muçulmana, é que ela se baseia em um 
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texto que supostamente deve funcionar como fundamento para a educação e a verdade. O 
conhecimento é, assim, finito, e essencialmente a-histórico. Dessa maneira, o único 
conhecimento novo permitido deve ser uma nova interpretação de um certo texto que, por 
supostamente conter verdades que foram definitivamente reveladas, não é um objeto 
adequado para uma investigação crítica ou histórica. 
O fundamentalismo é um convite, uma exortação, para se aceitar 
inquestionavelmente o que é tido como sendo os ensinamentos centrais da fé (e isto não 
apenas com relação a questões como a criação do mundo, mas em assuntos do século XX, 
como engenharia genética, clonagem terapêutica, células-tronco, etc.). Dessa forma 
negativa, o fundamentalismo atua como um empecilho à pesquisa científica e à busca de 
evidências históricas. O fundamentalista não acredita que seja desejável possuir 
conhecimento, seja para onde for que este o possa levar. O conhecimento não é 
considerado um objetivo em si. A mensagem é que nós deveríamos acreditar naquilo que 
nossos professores de religião nos ensinam e não nos intrometer em questões que seria 
melhor deixar ocultas. No entanto, o fato é que não podemos desaprender o que foi uma 
vez descoberto e demonstrado. Não devemos e não podemos desejar voltar ao período 
medieval, à era pré-Galileu ou pré-cartesiana. É impossível, ainda que tentássemos, 
acreditar que o que Aristóteles e Tomás de Aquino disseram, consistia na soma de todo o 
conhecimento possível. 
Dizer que a ética é independente da religião não é negar que teólogos ou outros 
crentes religiosos possam ter um importante papel a desempenhar em Bioética. Tradições 
religiosas frequentemente têm longas histórias no trato com dilemas éticos; e o acúmulo 
de sabedoria e experiência que representam, podem fornecer valiosos modos de enxergar 
determinados tipos de problema. Só que esses modos de enxergar devem estar submetidos 
à análise crítica, na mesma medida em que quaisquer outras propostas devam sê-lo. Se, 
no final, nós as aceitarmos, será porque as julgamos sólidas e racional e emocionalmente 
justificáveis, e não meramente porque sejam declarações de um papa, um bispo 
evangélico, um rabino, um monge budista, um mulá ou qualquer outra pessoa 
supostamente infalível ou sagrada. 
Toda decisão moral deve ser embasada, fundamentalmente, em três elementos: a 
maior quantidade de conhecimento que se possa adquirir sobre a questão, o tempero do 
sentimento e da emoção humanos e, sobretudo, o máximo de liberdade e isenção para 
fazer a escolha. Isso adiciona predicado humanitário à nossa estatura ética e 
confere responsabilidade real à escolha. Sem conhecimento, sem sentimento, sem 
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isenção e sem liberdade para decidir, não há ação moral possível. Há imposição. Mando 
e obediência. E toda imposição é moralmente injustificada, teologicamente herética, 
subversiva da dignidade humana e, pior do que tudo é obscurantista e espiritualmente 
opressiva. 
2 - RELIGIÃO E CULTURA 
 Marcia Avelino 
Segundo Abbagnano (2003), ética é a ciência da conduta, que pode ser vista de 
dois modos diferentes. A primeira concepção apresenta a ética como a ciência que aponta 
a finalidade da conduta do homem, mostrando então como se deve agir para atingir este 
objetivo. Já na segunda concepção a ética é vista como a ciência das possibilidades da 
conduta dos humanos, que pretende determinar os movimentos possíveis de uma forma 
que oriente sua ação. A primeira concepção de ética fala em termos ideais para o qual 
todo o humano se dirige por conta de sua natureza; algo universal. A segunda fala dos 
motivos da conduta humana, atendo-se ao conhecimento dos fatos. 
Alguns intelectuais fazem, então, uma distinção entre moral e ética. A moral seria 
esse conjunto de regras estabelecidas numa sociedade, que diz à pessoa de que modo ela 
deve se comportar, agir. Já a ética seria caracterizada pela reflexão que o humano faz 
dessas regras em relação à situação em que, normalmente, essas regras deveriam ser 
empregadas. Permeando esta distinção, está o ethos, uma espécie de casa íntima, 
subjetiva, constituída a partir das vivências sociais, na qual estão presentes, de algum 
modo, as normas culturais desses diversos âmbitos, e que são base para o agir pessoal e 
qualquer reflexão a respeito deste agir. O ethos é constituído, então, de forma singular, 
com as contribuiçõesda família, da escola, dos amigos, da religião, e da cultura de forma 
geral. Porém, por algum tempo fez parte da visão ocidental, achar que as contribuições 
morais tenham vindo exclusivamente da religião, até porque os demais âmbitos da 
sociedade eram norteados pela religião – cristianismo no caso. (Por isso, apesar dessa 
reflexão pretender se estender às religiões, ele apresenta o cristianismo como exemplo 
eleito dentre elas). 
Certos de que ética fosse, necessariamente, um conjunto de regras, muito tempo 
se acreditou que as leis oferecidas pela religião – sobretudo, as judaica e cristã – eram a 
mesma coisa que conduta ética, válidas para todos em qualquer situação. Isto quer dizer 
que seguir as normas de uma religião, ou dizer-se religioso, significava ser uma pessoa 
ética, confiável. E ainda hoje é assim para muitos. Porém, observando a multiplicação 
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dos modos como a religião acontece e é vivida hoje – além do conflito entre elas –, é 
natural questionar se há realmente essa equivalência entre ética, moral e religião. Se 
acreditarmos que religião é a instância social que nos oferece as regras de conduta moral, 
desprovida de reflexão, considerando a multiplicidade religiosa do final do último século, 
em qual das religiões, ou denominações, estaria esta regra de condutas para todos? O que 
dizer das ações dos orientais? Se considerarmos que, mesmo refletindo, é necessário uma 
série de regras de conduta oferecidas por uma divindade como base do agir ético, 
estaríamos dizendo que os ateus não podem ser éticos? Seriam delinqüentes em potencial? 
No caso do agnóstico, haveria uma moralidade sem religião? Por outro lado, será que por 
haver um deus e regras de conduta, não é possível haver reflexão ética nas religiões? 
É um fato histórico que práticas religiosas e tabus, bem como os costumes sociais 
são constituições humanas pré-históricas, anteriores, inclusive, à constituição da 
linguagem. Nestas culturas já havia a idéia de punição e recompensa de acordo com as 
ações do povo e de cada um. Contudo, o fato de surgirem praticamente juntas, religião e 
conduta social, não quer dizer que estejam necessariamente ligadas – embora também não 
seja possível comprovar que elas não estão ligadas, até porque para alguns estudiosos há 
uma relação de moral e religiosidade (no sentido de uma relação com aquilo que nos 
transcende) para além da religião. 
Assim, uma das propostas neste texto, é responder às questões levantadas de modo 
a discutir a possibilidade de haver moral, ética desvinculada da religião – pois temos 
algumas razões para desconfiar disso – e nela mesma (na religião) como isto se dá. 
 
Observamos que os motivos que temos para sermos éticos, são o modo como nós 
(humanos) vivemos, nossas ideias e valores que, diga-se de passagem, não são universais, 
pelo contrário, são típicos de cada cultura. Mandamentos vindos de um mundo 
sobrenatural, que se aplicasse ao nosso mundo, nos faria pensar que este outro mundo não 
é sobrenatural, mas, tal como o nosso, carente de regras de conduta – contraditório, 
portanto –; ou, no mínimo, que algum dos mandamentos lá desenvolvidos não serviria 
para nós, na medida em que não somos seres sobrenaturais capazes de vivências 
sobrenaturais. Lançando mão de exemplos teológico-cristãos, podemos dizer que o 
sacrifício do Cristo torna-se válido, por estar, ele mesmo, desprovido – ainda que 
parcialmente – de sua condição divina. Seu legado ganha dimensões magníficas 
justamente pelo fato de ter se tornado homem, recebido influências culturais (judaicas, 
no caso), e em meio às limitadas condições humanas poder provocar testemunhos de 
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como agir com justiça. Se fosse exclusivamente um deus entre humanos, seu modo de 
agir não se configuraria parâmetro para qualquer povo – contrário ao que pregam os 
cristãos. 
Se aplicássemos as regras divinas de uma religião para todas as pessoas, em 
qualquer cultura, o que aconteceria? Seria ainda ética? Sabemos que mesmo entre os 
cristãos há diferentes leituras das regras extraídas da Bíblia (seu manual de conduta). É o 
que acontece entre cristãos e católicos e, mais escancaradamente, o que acontece em meio 
aos protestantes. A falta de reflexão sobre essas leituras, por vezes, causa exatamente o 
oposto da intenção primeira destas regras: o respeito ao outro – ao próximo, se desejar. 
Infelizmente a guerra entre católicos e protestantes na Irlanda parece ser um “bom” 
exemplo disso. 
Se voltarmos, então, àquelas duas concepções de ética, poderíamos dizer que na 
religião encontram-se somente as regras de conduta moral, mas da maneira como estão 
dispostas não favorecem a reflexão da pessoa frente à situação – postura que, parece, 
estaria mais próxima ao movimento filosófico, à reflexão. Isso traz algumas implicações 
por justificar atitudes como os preconceitos e a guerra, e, ainda, a falta de atitudes básicas 
como o respeito, compaixão. Entretanto, há que se dizer que esta postura, presente em 
grande parte das religiões, aponta, na verdade, o fundamentalismo como mediador da 
relação religiosa, com o qual as pessoas se deparam e abraçam na esperança de 
encontrarem segurança na resolução de suas questões, uma certeza para seu futuro. O 
fundamentalismo é uma forma de viver uma religiosidade desprovida das leituras 
hermenêutica e exegética, ou mesmo, cultural; uma forma desnecessária à vivência 
religiosa. 
Para discorrer a esse respeito vamos a outro exemplo cristão: ao narrar a parábola 
do bom samaritano (Lc 10.25-37), Jesus quer mostrar a seus discípulos e amigos que não 
se deve desconsiderar as leis, mas é necessário abstrair o motivo de sua pertinência ou se 
esvairá o real motivo de sua existência. 
Um perito da Lei se levantou e, querendo experimentar Jesus perguntou: “Mestre, 
que devo fazer para recebe a vida eterna em herança?” Jesus disse-lhe: “O que está escrito 
na Lei? Como lês?” Ele respondeu: “Amarás o Senhor, teu Deus, de todo o teu coração, 
e com toda a tua alma, com toda a tua força e com todo o teu entendimento: e o teu 
próximo como a ti mesmo!” Jesus lhe disse: “Respondeste corretamente. Faze isso e 
viverás”. Ele, porém, querendo justificar-se, disse a Jesus: “E quem é o meu próximo?” 
Jesus retomou: “Um certo homem descia de Jerusalém para Jericó e caiu nas mãos de 
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assaltantes. (...) o deixaram quase morto. Por acaso, um sacerdote estava passando por 
aquele caminho. Quando viu o homem, seguiu adiante, pelo outro lado. O mesmo 
aconteceu com o levita (...). Mas um samaritano, que estava viajando, chegou perto dele, 
viu e moveu-se de compaixão. Aproximou-se dele e tratou-lhe as feridas, derramando 
nelas óleo e vinho. (...) E Jesus perguntou: “Na tua opinião, qual dos três foi o próximo 
do homem que caiu nas mãos dos assaltantes? Ele respondeu: “Aquele que usou de 
misericórdia para com ele”. Então Jesus lhe disse: “Vai e faze tu a mesma coisa”. 
Talvez o homem pensasse que “amar o teu próximo como a ti mesmo” se referisse 
tão somente a um sentimento, pensamento que se deve ter em oposição ao ódio. Mas, com 
um exemplo prático, Jesus mostra ao fariseu a interpretação dessa lei. O que Jesus lhe 
propõe é mais que uma simples postura de ajudar o necessitado, mas diz a ele, judeu - e 
bom conhecedor da lei - que um samaritano (povo rejeitado pelos judeus; considerados 
inferiores) que a lei é universal na medida em que o próximo não é somente compatriota 
e que o samaritano, desconhecedor das leis, cumpri uma lei judia sem ter de recitá-la, pela 
capacidade de olhar a situação e compreender a necessidade do outro. Jesus aponta esta 
como a postura amorosa: observar a situação, refletir e agir em favor do bem do outro – 
que aliás, pode ser uma referência transcendente. Coloca em xeque a atitude: cumprir a 
lei em sua literalidade ou suprir a necessidade que se mostra na reflexão da situação que 
se mostra em relação ao ideal da lei? 
Falandoem cristianismo, quem poderia dizer melhor a forma de proceder do que 
o próprio “Cristo” (também um judeu)? Haveria uma contradição na própria religião, 
quanto ao que é ser ético? Porque parece que Jesus indica o caminho da reflexão como o 
melhor em lugar de mera contemplação da lei. Em outra de suas falas, ele mesmo 
demonstra uma postura de refletir sobre a situação, quando um contra argumento lhe faz 
reconsiderar uma decisão designada a priori: 
(...) A mulher não era judia, mas de origem siro-fenícia, e pedia que ele expulsasse 
o demônio de sua filha. Jesus lhe disse: “Deixa que os filhos se saciem primeiro; pois não 
fica bem tirar o pão dos filhos para jogá-lo ao cachorrinhos”. Ela respondeu: “Senhor, 
também os cachorrinhos, debaixo da mesa, comem as migalhas que os filho deixam cair”. 
Jesus, então, lhe disse: “Por causa do que acabas de dizer, podes voltar para casa. O 
demônio já saiu da tua filha”. (Mc, 7.24-30). 
Nesse caso, Jesus, que veio somente para os judeus, reconsidera o pedido de uma 
estrangeira e lhe concede o pedido. Por estes exemplos, dentre tantos outros, podemos 
dizer que se os cristãos preferem cumprir leis em detrimento da reflexão, é por opção ao 
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fundamentalismo, presente no cristianismo, distante da postura cristã, que, como vimos, 
supõe reflexão ética. 
Sabemos, então, que, a exemplo do cristianismo, em geral na postura religiosa – 
que na maioria das vezes é fundamentalista (pois é pressuposto do membro religioso 
acreditar que a verdade de sua religião é absoluta, por exemplo, para o cristão, só há 
salvação em Jesus Cristo e para aproximar-se dele deve-se seguir as orientações bíblicas 
literalmente) – realmente não há espaço para a reflexão sobre as regras de conduta moral. 
Mas sabemos, por outro lado, que a postura ética é possível. Se abstrairmos dos 
ensinamentos, exemplos de Jesus, assim como dos de Buda e Maomé, entre outros, a 
“moral” da história – como nossos pais costumam dizer –, veremos que são ensinamentos 
reflexivos, que foram cristalizados em algum momento. De algum modo são derivadas 
da lei universal de preservação da vida. Esse tipo de leitura tornaria qualquer livro sagrado 
bem-vindo em todas culturas. Não se trata de abandonar sua cultura, seus costumes, mas 
conhecer e até somar. Seria, para tanto, necessário uma compreensão de religião como 
modo cultural. 
Se pensarmos no que há em comum entre as diversas regras morais, presente em 
muitas culturas, inclusive nas orientais, como não matar, não ferir e tornar a vida e o 
mundo melhor para todos, os seres humanos que agirem moralmente mesmo não tendo 
religião, indicaria que não há a uma ligação obrigatória entre moralidade e religião. 
Conforme a observação logo no início desse texto, a respeito da constituição do ethos, a 
noção de moralidade é oferecida não apenas pela religião, mas pelos demais âmbitos do 
universo social. Por isso é natural que ateus e agnósticos tenham posturas morais e éticas 
tanto quanto os religiosos.. 
Existem muitos outros motivos e exemplos que nos mostrariam que a ética, 
reflexão sobre uma moral, é a concepção mais adequada; também muitos outros que nos 
mostrariam que a ligação entre religião e ética não é certeira. Há, porém outra provocação 
que salta aos olhos em decorrência dessa reflexão: havendo hoje “éticas” – como dizem 
– ou, modos de agir em cada âmbito da vida e do saber (ética médica, ética docente, ética 
empresarial, ética política, etc), porque não falar em “ética”, um modo de proceder dentro 
da religião? Por exemplo, é preciso ter respeito acima das leis, para com outras religiões, 
sua existência, o fim que elas indicam às pessoas com as regras que criam e como fazem 
isto – até porque, não respeitar o modo de alguém viver de acordo com sua religião é dito 
antiético. (Parece esquizofrênico!) Muitos brasileiros ainda se lembram do pastor 
evangélico que agrediu a santa padroeira do País, para os católicos. 
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Seria conveniente que, nestas situações, a ética como reflexão sobre os próprios 
interesses ou modo de pensar fosse exercitada. Nos últimos dias temos visto já 
manifestações públicas que indicam a necessidade de se pensar nessa “categoria 
específica de ética”. No final de Junho de 2008 uma lei aprovada no senado aponta 
qualquer ofensa aos homossexuais como crime, a exemplo da lei contra a discriminação 
“racial”. Imediatamente surgiu um grupo de evangélicos em frente ao palácio do planalto 
reivindicando seu direito de dizer que homossexualismo é pecado sem, por isso, ser 
incriminado. E então, o que fazer? Abrir mão da convicção fundamentada pela Bíblia de 
que os homossexuais não entrarão no céu – e, consequentemente, desobedecer a 
ordenança de Deus de dizer isso a essas pessoas? Ou cumprir com a obrigação cristã de 
apontar o erro visando a cura e ser indiciado pela justiça do país? E agora? Cumpre-se as 
leis de Deus ou do país? 
É interessante notar que em nenhum momento a manifestação voltou-se aos 
beneficiados pela lei (ambos, religiosos e juristas não tiveram a preocupação de reunir 
outras opiniões a respeito – o que seria pertinente visto que cada um quer cumprir leis 
que, em suas leituras, são para o bem dessas pessoas, apesar da contradição entre elas), 
mas esteve, todo o tempo, voltada à preocupação de não se poder falar, ou não, que 
homossexualismo é pecado. Ora, isso tudo também indica que não há uma relação 
necessária entre agir ético e religião, sendo possível – talvez necessário – falar em ética 
na religião, para além das regras que ela mesma prega. 
Se entendermos que leis de preservação da vida são universais e que religião é 
uma necessidade cultural, social, na medida em que a sociedade muda suas convicções, 
seus valores, seu parâmetro de normalidade, deverá haver um movimento também na 
religião. Além de tudo, esses movimentos indicam que nossa cultura já não é tão cristã, 
pois, se fosse, não haveria tantas manifestações homossexuais – pelo menos públicas –; 
e perante esse tipo de lei não só evangélicos se manifestariam, mas muitos outros 
membros da sociedade. 
Da mesma forma, não podemos deixar de observar que, se pensássemos, enquanto 
sociedade, em promover a reflexão ética – ainda que em longo prazo – não precisaríamos 
criar tantas leis específicas, pois, no fim das contas, nordestinos e mulheres, dentre outros, 
são vítimas das mesmas intolerâncias. (Seria esta uma contribuição religiosa para o 
ocidente?). Outro exemplo é a bioética, a ética da vida, que trata principalmente de casos 
complexos, situações únicas, onde se deve analisar os contextos e as consequências da 
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ação no contexto, como pensar em cumprir regras estabelecidas a priori? Ou ainda, como 
aceitar que concepções morais religiosas sejam o pano de fundo da reflexão? 
Isso nos faz concluir que, em qualquer âmbito social, laico ou religioso, em que 
se pretenda um agir ético consciente, a reflexão, compreensão da lógica da moral e a 
interdisciplinaridade são pressupostos necessários. Do contrário, em algum momento 
haverá um conflito moral, que, por vezes, tem implicações terríveis. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
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REFERÊNCIAS 
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ALMEIDA, M. Moralidade, Ética e Religião, 2008. disponível em: ... 
BÍBLIA SAGRADA. Trad. João Ferreira de Almeida. (Lucas, Marcos). 
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R. Baehr; Gordon C. Wells (2002). 
WEBER, Max (1967). A ética protestante e o espírito do capitalismo (São Paulo: 
Pioneira). 
WEBER, Max (2004). A ética protestante e o “espírito” do capitalismo (São Paulo: 
Companhia das Letras (Tradução de José Marcos Mariani de Macedo)). 
PIERUCCI, Antonio Flávio (2004). O desencantamento do mundo Companhia das 
Letras [S.l.] 
SCHLUCHTER, Wolfgang (1981). The Rise of Western Rationalism: Max Webers 
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SELL, Carlos Eduardo (2013). A racionalização da vida (Petrópolis: Vozes). 
 «ISA - International Sociological Association: Books of the Century». International 
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