Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
e-Tec Brasil17 Aula 2 - Histórico da responsabilidade Em verdade, a origem da responsabilidade civil remonta aos tempos antigos e primitivos, e passou por diversas fases históricas. Porém, como ponto de partida para nosso estudo pode-se afirmar que é da essência do ser humano a reação imediata contra um mal que lhe é causado. O Código de Hamurabi era um bloco de pedra em que as regras e suas punições no caso de descumprimento estavam dispostas a toda a população, com o fim de trazer paz social. Essa exposição pública tinha o objetivo de evitar qualquer alegação de desconhecimento a respeito de suas disposições (apesar de que, naquela época, apenas uma pequena margem das pessoas sabia ler). Para se ter uma ideia, veja algumas de suas regras e punições: se alguém tirar um olho a outro, perderá o próprio olho (196); se alguém quebrar um osso a outrem, parta-se-lhe um osso também 2.1 Histórico Pois bem, em um primeiro momento histórico, independentemente da cul- pa, se o indivíduo causava um dano, havia uma brutal, desproporcional e violenta resposta a essa injusta agressão. Essa resposta poderia advir do próprio ofendido, de seus familiares e mesmo do grupo social ao qual pertencia. Essa era a época em que inexistiam países, governos e territórios como conhecemos hoje. Tal característica é mais marcante no Império Babilônico, com a Lei do Ta- lião (Lex Talionis) reproduzida no Código do Hamurabi (que se estima que seja datado de 1.700 a.C.), em que era autorizado aplicar um mal ao agente como retribuição pelo mal causado à vítima. Você sabia? Figura 2.1: Código de Hamurabi Fonte: http://www. panoramio.com (197); se alguém bate numa mulher livre e a fez abortar, deverá pagar dez siclos pelo feto (209); se essa mulher morre, então deverá matar o filho dele (210); se o mestre de obras construiu a casa e esta caindo mata o proprietário, o construtor será morto. E se for morto o filho do proprietário, será morto o filho do construtor (229 e 230). Esse Código foi descoberto em 1901, e hoje se encontra exposto à visitação publica no Museu do Louvre, em Paris. Responsabilidade Civil e Criminale-Tec Brasil 18 Em síntese, a Lei do Talião pregava o seguinte: se o agressor quebrasse o dente da vítima, teria seu dente quebrado, se danificasse o olho de outrem, teria o seu, na mesma medida, prejudicado. Sem dúvida podemos afirmar que era uma forma primitiva de, pela lei, evitar a prática da justiça com as próprias mãos. Essa regra da Lei do Talião nos remete à expressão bíblica “olho por olho, dente por dente”: Se alguns homens pelejarem, e ferirem uma mulher grávida, e forem causa de que aborte, porém se não houver morte, certamente aquele que feriu será multado conforme o que lhe impuser o marido da mulher e pagará diante dos juízes. Mas, se houver morte, então, darás vida por vida, olho por olho, dente por dente, mão por mão, pé por pé, queimadura por queimadura, ferida por ferida, golpe por golpe. (Êxodo 21: 22-25) Os teóricos caracterizam esse período como da vingança privada, confor- me descreve Duarte (1999): Na denominada fase da vingança privada, cometido um crime, ocorria a reação da vítima, dos parentes e até do grupo social (tribo), que agiam sem proporção a ofensa, atingindo não só o ofensor, como todo o seu grupo. A inexistência de um limite (falta de proporcionalidade) no re- vide à agressão, bem como a vingança de sangue foi um dos períodos em que a vingança privada constituiu-se a mais frequente forma de punição, adotada pelos povos primitivos. A vingança privado constituía uma reação natural e instintiva, por isso, foi apenas uma realidade so- ciológica, não uma instituição jurídica. Duas grandes regulamentações, com o evolver dos tempos, encontrou a vingança privada: o talião e a composição. Apesar de se dizer comumente pena de talião, não se tratava propriamente de uma pena, mas de um instrumento moderador da pena. Consistia em aplicar no delinquente ou ofensor o mal que ele causou ao ofendido, na mesma proporção. e-Tec Brasil19 Em um momento histórico posterior, a vingança era divina, como uma espécie de consequência - reação - pelo ato que era emanada das autorida- des divinas, dos deuses. Na verdade, essas autoridades eram as vítimas, e os sacerdotes (representantes na Terra) eram quem aplicavam as penas. Esse período foi muito importante porque os povos antigos eram muito atre- lados a esses deuses, sendo que a intimidação foi uma forma de evitar o ato danoso. Ademais, o castigo também era brutal e violento, visto que deveria ser na proporção da grandeza do deus ofendido. A esse respeito, Dias (2005) explica o seguinte: Com a queda do Império Romano, no século IV, e a conquista dos po- vos germânicos (bárbaros – estrangeiros) sobreveio o direito germânico, porém sob forte influência da Igreja e o seu direito canônico, pela qual a vingança divina era exercida a proporcionalidade do “pecado” cometi- do pelo acusado contra Deus. O fator que contribui para essa consolida- ção da influência da Igreja é o fortalecimento do poder centralizado do Direito germânico, que buscava adquirir com maior amplitude o caráter de poder público estatal, daí a adoção da concepção da Igreja de opo- sição à pratica individualista da vingança privada (vingança do sangue) utilizada no início do domínio dos povos germânico, embora essa inter- pretação das escrituras sagradas eram deturpadas e os métodos de veri- ficar a culpabilidade provinham de uma revelação divina inquestionável que impunha provações das mais variadas, a fim de corrigir o infrator. Porém, com o passar do tempo, os povos foram evoluindo. As sociedades passaram a se estruturar em torno de um governante, de um monarca, de um regente. Essa era a autoridade que decretava o castigo a ser aplicado, com base em normas jurídicas criadas. Para Canto (2005), “neste período o Estado tornou-se forte e chamou para si a aplicação da pena, que perde seu cunho religioso, assumindo uma finali- dade política. O objetivo era a segurança do príncipe ou soberano, por meio da pena, também cruel e severa”. Assevera ainda que “predominaram o arbítrio judicial, a desigualdade quan- to à punição das classes, a desumanidade das penas, o sigilo do processo, os meios inquisitórios, tudo aliado a leis imprecisas, lacunosas e imperfeitas, a favorecer o absolutismo monárquico e seus protegidos, postergando os direitos dos indivíduos”. Aula 2 - Histórico da responsabilidade Responsabilidade Civil e Criminale-Tec Brasil 20 Nesse período, como evolução da Lei do Talião, pode-se ter como referência a Lei Aquiliana (Lex Aquilia), que para Venosa (2009, p.17) “possibilitou atribuir a um titular de bens o direito de obter o pagamento de uma pena- lidade em dinheiro de quem tivesse destruído ou deteriorado seus bens”. Portanto, na fase da vingança pública, o interesse maior era de proteger o governante. Para tanto, a legislação existente era cheia de defeitos, favore- cendo a interpretação que essa autoridade desejasse. Contudo, a vingança pública foi superada por um período humanitário, em que se defendia a criação de normas mais simples, objetivas e de fácil interpretação. O objetivo disso era propiciar mais transparência e respeito ao ser humano. E finalmente, no final dessa evolução histórica encontramos o período cien- tífico, em que a análise do evento dano – crime – ganha traços acadêmicos. Surge a Antropologia Criminal, a Criminologia, e outras áreas de estudo correlatas. Na linha de acontecimentos, chegamos à Idade Contemporânea. Após a Revolução Francesa (1789), o Código Napoleônico trouxe grandes inovações no campo da responsabilidade civil, inclusive fazendo sua diferenciação com a responsabilidade penal. Você sabia? Figura 2.2: Napoleão Bonaparte Fonte: http://picasaweb.google. com A Revolução Francesa tornou-se o símbolo para a queda do absolutismo? Antes disso, a situação econômica e social daFrança era caótica, com grandes despesas decorrentes de derrotas em guerras (custeadas por 98% da população), indústrias pouco lucrativas e separação do povo em classes. Assim, com o Golpe dos “18 Brumário”, o jovem mili- tar Napoleão Bonaparte tornou-se Cônsul, depois Cônsul Vitalício (1802) e finalmente Imperador (1804), sendo suas principais reali- zações: promulgação do Código Civil, centra- lização administrativa, incentivo à educação e diversas reformas inspiradas na Revolução. e-Tec Brasil21 Conforme afirma Miguel (2006): O direito francês influenciou vários povos e, por consequência, a legis- lação de vários países, inclusive do Brasil. Assim, ainda que via reflexa, o atual Código Civil e especialmente o revogado Código Civil de 1916, cuja vigência se estendeu até 2002, tiveram aquele Codex como fonte inspiradora, o que levou a consagração da teoria da culpa como regra no campo da responsabilidade civil. Já imaginou viver naquele período primitivo, sem leis e regras? Por isso que a responsabilidade civil é muito importante por ser uma das razões que proporcionam a paz social. Afinal, quem descumpre as normas jurídicas certamente estará sujeito à reparação do dano que vier a causar, na forma que veremos adiante em nosso curso. Resumo Em conjunto com a primeira aula, hoje foi possível compreender os anteceden- tes históricos que darão embasamento para a continuidade de nossos estudos. Atividades de aprendizagem Em conjunto com um colega, imagine como seria viver em um mundo primiti- vo, sem leis e sem regras. Nesse contexto, descreva como seria a responsabiliza- ção de alguém que cometeu algum dano a outrem. Aula 2 - Histórico da responsabilidade Responsabilidade Civil e Criminale-Tec Brasil 22
Compartilhar