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O Mistério em A Estranha Morte

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RAFAEL SANTANA | O mistério em A estranha morte do professor Antena ALEA | Rio de Janeiro | vol. 18/1 | p. 114-126 | jan-abr 2016114
o mistério Em a estranha morte 
do professor antena 
the mystery in a Estranha mortE do ProfEssor antEna
Rafael Santana
Universidade Federal do Rio de Janeiro 
Rio de Janeiro, RJ, Brasil
Resumo
O início do século XX manifesta-se como um tempo de contestação das formas tradicio-
nais de conhecimento, tais como a filosofia, a ciência e a própria escritura. Investindo nas 
instâncias do sonho e do mistério, a literatura de princípios de novecentos rejeita a lógica 
científico-positivista, clamando por novos valores. Este trabalho pretende ler o conto A 
estranha morte do professor Antena, de Mário de Sá-Carneiro, como uma narrativa que 
compreende a memória enquanto discurso onírico que se opõe à racionalidade científica.
Palavras-chave: Mário de Sá-Carneiro, A estranha morte do professor Antena, escritas 
da memória, narrativa policial.
Abstract
The beginning of the twentieth cen-
tury manifests itself as a time of dissent 
towards the traditional forms of knowl-
edge, such as philosophy, science and 
writing itself. Investing in the fields of 
dream and mystery, the literature of 
this epoch rejects the scientific, positiv-
ist logic, clamoring for new values. The 
aim of this paper is to read the short story 
A estranha morte do professor Antena, by 
Mário de Sá-Carneiro, as a narrative that 
understands memory as a dreamlike dis-
course opposed to scientific rationality.
Keywords: Mário de Sá-Carneiro; A est-
ranha morte do Professor Antena; writings 
of memory; crime fiction.
Resumen
El inicio del siglo XX se manifiesta como 
un tiempo de contestación de las formas 
tradicionales de conocimiento, tales como 
la filosofía, la ciencia y la propia escritura. 
Invirtiendo en las instancias del sueño y 
del misterio, la literatura de principios de 
novecientos rechaza la lógica científico-po-
sitivista, clamando por nuevos valores. Este 
trabajo pretende leer el cuento A estranha 
morte do professor Antena, de Mário de 
Sá-Carneiro, como una narrativa que com-
prende la memoria como discurso onírico 
que se opone a la racionalidad científica.
Palabras clave: Mário de Sá-Carneiro; A 
estranha morte do professor Antena, escri-
turas de la memoria; narrativa policial.
[...] sabemos tão pouco, tão infinitamente pouco, 
que nunca devemos, em verdade, garantir coisa alguma.
Sá-Carneiro – Céu em Fogo
Em A estranha morte do professor Antena (1914), estamos, tal como na 
narrativa A confissão de Lúcio (1913), diante de uma trama discursiva que 
http://dx.doi.org/10.1590/1517-106X/181-114
ALEA | Rio de Janeiro | vol. 18/1 | p. 114-126 | jan-abr. 2016 115RAFAEL SANTANA | O mistério em A estranha morte do professor Antena
envolve morte, investigação e mistério, o que poderia levar-nos a crer que se 
trata uma vez mais de uma narrativa de cunho científico-policial. Todavia, 
também neste conto pseudodocumental Mário de Sá-Carneiro parece investir 
na perpetuação do enigma e não na sua revelação, problematizando a lógica 
científica. A estranha morte do professor Antena tem suscitado por parte da 
crítica uma grande disparidade de leituras. Para alguns estudiosos, o conto 
resumiria a postura de um Sá-Carneiro que, deslumbrado com o mundo 
moderno, futurista e ultracivilizado, valorizaria um universo científico de 
possibilidades inesgotáveis através da figura de um pesquisador excêntrico; 
para outros contudo, a morte misteriosa do professor Antena exemplificaria 
o olhar negativo de um Sá-Carneiro decadentista para com uma ciência cer-
ceadora dos sonhos e dos livres projetos.
Na esteira das leituras sá-carneirianas de Fernando Pinto do Amaral 
(1990: 7), penso também que o Decadentismo é a estética que se manifesta 
mais vincadamente na escritura de Sá-Carneiro. Até porque, como lembram 
Mário Praz (1998), Matei Calinescu (1999), Antoine Compagnon (2010), 
Edmundo Bouças (1997: 219) e Latuf Isaias Mucci (1994), o Decadentismo 
não deve ser lido como um culto reacionário ao passado, mas como um movi-
mento que promove o trânsito para a modernidade estética. Contudo, o que 
parecia dificultar uma leitura de A estranha morte do professor Antena na clave 
do Decadentismo e das estéticas finisseculares era o fato de alguns estudos 
críticos apontarem – e com certa razão – para o diálogo de Sá-Carneiro com 
os escritos de Gaston de Pawlowski, sobre os quais o autor de Indícios de oiro 
comenta brevemente em algumas cartas a Fernando Pessoa.
Gaston de Pawlowski, editor da Comœdia, publica em 1912 – justa-
mente o ano em que Sá-Carneiro parte para Paris – uma ficção científica inti-
tulada Voyage au pays de la quatrième dimension. Em estudo sobre A estranha 
morte do professor Antena, Yara Frateschi Vieira (1994: 49) sinaliza que os pes-
quisadores da quarta dimensão eram cientistas excêntricos que gostavam de 
promover experiências bizarras, ocultistas, desafiando a lógica aceite. Ora, o 
professor Antena é precisamente este tipo de cientista “louco”, que transita 
a um só tempo por vias científicas, ocultistas, místicas e delirantes. Todavia, 
a própria Yara Frateschi Vieira termina por assinalar que o conhecimento de 
Mário de Sá-Carneiro sobre as teorias da quarta dimensão, bem como a sua 
possível releitura dessas teorias em A estranha morte do professor Antena, não 
são o suficiente para nos levar a uma conclusão sobre o lugar ocupado pela 
ciência na sua obra, pois “o fim trágico do cientista acena também para a crí-
tica do progresso científico-tecnológico desenfreado” (VIEIRA, 1994: 55), ou 
– diria eu mais especificamente – da ciência pragmática que visa a eliminar 
o obscurantismo, ceifando a magia do mistério e do sonho.
RAFAEL SANTANA | O mistério em A estranha morte do professor Antena ALEA | Rio de Janeiro | vol. 18/1 | p. 114-126 | jan-abr 2016116
Lembro ainda que este conto, que pode parecer à primeira vista tão 
incoerente em relação ao conjunto da obra de Sá-Carneiro, aparentemente 
capaz de desestabilizar toda uma proposta de leitura do mistério, pode con-
tudo – e muito coerentemente – fazer sentido, permitindo-nos enxergar nele 
uma continuidade ética em relação ao que, em princípios da sua carreira lite-
rária, Sá-Carneiro já propunha em Páginas dum suicida (1909). Neste texto 
inicial, o Esfinge Gorda1 afirma, através da personagem de Lourenço Furtado, 
o herói do conto, que o mistério morreu no século XX, e que para isso muito 
contribuiu o avanço da ciência. Por outras palavras, diante do esgotamento 
dos grandes projetos, vale dizer, dos grandes sonhos, só restaria ao homem 
de espírito desbravador investigar as incógnitas zonas da morte, espécie de 
reduto último do mistério. Ora, é justamente a esse tipo de investigação que 
o professor Antena se dedica. Afinal, a pesquisa científica que o levou à morte 
buscava desvendar precisamente o mistério das vidas passadas que, segundo 
ele, existiriam sobrepostas à existência presente. Ao encerrar o conto, o narra-
dor sugere a possibilidade de o professor Antena, ao supostamente lograr ven-
cer o mistério, ter surgido “na outra vida entre uma Praça pejada de veículos, 
entre uma oficina titânica, no meio de maquinismos vertiginosos, alucinantes, 
que o tivessem esmagado” (CF: 529),2 o que justificaria a sua estranha morte.
Neste sentido, tal desfecho apontaria antes uma extrema ironia de 
Sá-Carneiro para com a ciência pragmática e não uma visão de cumplicidade 
acrítica ou de fascínio absoluto por ela. Observe-se que o narrador do conto 
se propõe, ao longo de todo o texto, a revelar a pura verdade dos acontecimentos 
que culminaram no epílogo fatal do seu Mestre, mas o que ele efetivamente 
faz não é nada mais do que levantar hipóteses estrambóticas sobre os eventos 
que decide relatar, o que me parece, uma vez mais, uma sarcástica investida 
de Sá-Carneiro contra a lógica científica estritamente racional.
Num longo posfácio de uma edição de A estranha morte do professor 
Antena para aeditora 7Letras, Maria João Simões afirma o seguinte a favor 
da Ciência nos escritos de Sá-Carneiro:
[...] Argumenta-se, assim, a favor da Ciência considerada em pé de igualdade 
com a arte – uma ideia plasmada neste conto sobretudo através desta figura do 
cientista, mas também através de diversas reflexões da mão do narrador que 
defende explicitamente esta ideia. Esta é uma posição marcadamente presente 
noutros textos do modernismo em Portugal – como é o caso da “Ode Triunfal”, 
ou do pequeno poema (de 1928) onde Álvaro de Campos afirma: “o Binómio 
1 Epíteto que Sá-Carneiro conferira a si próprio devido à aura de mistério que desejava conferir à 
sua figura de artista.
2 Utilizarei a abreviatura CF em citações do conto A estranha morte do professor Antena (1914), que 
é parte integrante do conjunto de textos que Sá-Carneiro reuniu e publicou sob o título de Céu 
em fogo (1915).
ALEA | Rio de Janeiro | vol. 18/1 | p. 114-126 | jan-abr. 2016 117RAFAEL SANTANA | O mistério em A estranha morte do professor Antena
de Newton é tão belo como a Vénus de Milo. / O que há é pouca gente para 
dar por isso”.
Deixando de transparecer, de modo intencionalmente subtil ou abrupto, o 
reverso disfórico da modernidade, esta posição indica a uma valorização estética 
do próprio cunho científico e tecnológico entendido como caracterizador da época 
Moderna [...]. (SIMÕES, 2009: 61)
Para argumentar em sentido diverso, gostaria de lembrar que Fernando 
Pessoa considera o sonho o elemento caracterizador da estética moderna, e não 
a ciência, contra a qual investe declaradamente. Sobre isso, diz ele: “Quem qui-
sesse resumir numa palavra a característica principal da arte moderna encon-
trá-la-ia, perfeitamente, na palavra sonho. A arte moderna é arte de sonho” 
(PESSOA, 2005: 296). No que concerne contudo à Ode Triunfal de Álvaro 
de Campos, ou mesmo ao pequeno poema onde afirma que “o Binómio de 
Newton é tão belo como a Vénus de Milo”, cabe acentuar que os artistas de 
Orpheu consideravam a sua época uma espécie de mosaico fluido, no qual 
pululavam matrizes de todos os tempos e das mais diversas correntes. Assim, 
a pluralidade do presente nada mais seria do que um ponto de convergên-
cia entre os saberes antigos e os atuais – a filosofia, a mitologia, a História, a 
psicologia, a ciência etc., lidos todos eles na clave do mistério. Em relação ao 
mistério em Fernando Pessoa, por exemplo, diz José Gil:
O mistério em Pessoa representa o estádio último da riqueza emocional, a 
etapa última da expressão poética – que se pode traduzir em infinitas sensações 
libertadas, circulando sobre um plano de consistência; ou então, ficar como que 
suspensa à espessura da linguagem, desenrolando o seu jogo acima da distância, 
mistério da “profundidade” e do “abismo” [...]: da sensação mais minúscula e 
insignificante até “Hegel”, até ao binómio de Newton ou até “Deus”, de tudo 
fará um feixe de emoções, quer dizer, um mistério. (GIL, s/d: 116-117).
Noutras palavras, o ultramoderno não surgiu de forma aleatória e a sua 
existência seria o resultado da soma de todo um conhecimento anterior. Além 
disso, ressalte-se que o fascínio pela modernidade em Sá-Carneiro muito se 
assemelha ao culto que a ela promove Charles Baudelaire, poeta que manifesta 
um misto de atração e repulsa pelo mundo ultracivilizado e tecnológico, mas 
que não abre mão do lugar ocupado pelo sonho, o parâmetro menos cientí-
fico que se possa eleger.3 Ou seja, o mundo moderno inebria e fascina, sim, 
mas o seu excesso também cansa. A tecnologia avançada, cuja conquista se 
tornou possível por meio do progresso da ciência, provoca no homem um 
3 O poema La Voix parece dar conta deste fascínio crítico pela ciência: “Meu verso era vizinho à 
biblioteca apenas, / Babel sombrio em que o romance e a ciência, o espólio / Em que cinzas do 
Lácio e mais poeiras helenas / Se mesclavam. Era eu alto como um in-folio”. E ainda mais especi-
ficamente: “Mas me consola a voz: ‘Ah, conserva as ilusões! / Pois não sonham melhor os sábios do 
que os loucos!’” (BAUDELAIRE, 2004: 164-165).
RAFAEL SANTANA | O mistério em A estranha morte do professor Antena ALEA | Rio de Janeiro | vol. 18/1 | p. 114-126 | jan-abr 2016118
bem-estar demasiado passageiro, tão volátil quanto o fluxo da vida moderna 
e citadina, aumentando-lhe a sensação de impotência e de incompletude.
No que tange ao conto A estranha morte do professor Antena, o texto se 
abre com estas palavras que lhe ressaltam visivelmente a ambiguidade:
Mesmo entre o público normal causou grande sensação a morte do Prof. 
Domingos Antena. Não tanto – é claro – pela irremediável perda que nele 
sofreu a Ciência contemporânea, como pelo mistério policial em que a sua 
morte andou envolvida.
Esse automóvel-fantasma que, de súbito, surgira e logo, resvalando em vertigem, 
se evolara por mágica, a ponto de ser impossível achar dele um indício sequer, 
embora todas as diligências – e mesmo a prisão dalguns chauffeurs que puderam 
entretanto fornecer álibis irrefutáveis – volveu-se logicamente matéria-prima 
ótima, de mais a mais roçando o folhetim, para os diários, então, por coinci-
dência, privados de assunto emocional. (CF: 513)
Colocando-se como um ser superior, como alguém que se destaca do 
vulgo, o narrador homodiegético afirma que a morte do professor Antena 
foi de tal forma misteriosa que acabou por causar uma grande repercussão, 
mesmo entre o grande público, tornando-se quase numa estória de folhe-
tim, tamanha a estranheza da intriga que a envolve. Assim, a estranha morte 
do professor Domingos Antena não choca tanto pelo fato da perda de um 
grande cientista, senão – e sobretudo – pelo mistério policial que encerra. E 
para investigação policial encontramo-nos em mau caminho! Enigmática, a 
morte do Mestre Antena teria sido provocada por uma espécie de automó-
vel-fantasma, que surgira misteriosamente e se desvanecera como num passe 
de mágica, sem deixar qualquer vestígio.
Já na abertura do conto, o narrador explicita que a ciência e a investi-
gação lógica não foram capazes de solucionar o insólito caso do falecimento 
do professor Antena, personalidade excêntrica certamente, mas dedicada à 
pesquisa, a quem descreve da seguinte forma:
Depois, a figura do Prof. Antena era entre nós popular. O seu rosto glabro, 
pálido e esguio, indefinidamente muito estranho; os olhos sempre ocultos por 
óculos azuis, quadrados, e sobretudo negro, eterno de Verão e de Inverno, na 
incoerência do feltro enorme de artista; os cabelos longos e a lavallière de seda, 
num laço exagerado – tudo isto grifara bem o seu perfil na retina paspalheira 
da multidão inferior das esquinas. Entanto jamais um dito grosseiro, dessa lusa 
grosseria, provinciana e suada, regionalista, que até nesta Lisboa – central, em 
vislumbres – campeia à rédea solta (e mesmo refina democraticamente), o atin-
giu nas ruas ou nas praças, pelas quais ele era silhueta quotidiana. Pois ao invés 
dos sábios convencionais e artistas castrados que fogem às multidões, à Europa, ao 
progresso, num receio gagá de ruído e agitação – o Prof. Antena era, pelo contrário, 
onde mais se aprazia, sobretudo nas horas maravilhosas da criação. Com efeito 
um grande sábio cria – imagina tanto ou mais do que o Artista. A Ciência é 
talvez a maior das artes – erguendo-se a mais sobrenatural, a mais irreal, a mais 
ALEA | Rio de Janeiro | vol. 18/1 | p. 114-126 | jan-abr. 2016 119RAFAEL SANTANA | O mistério em A estranha morte do professor Antena
longe em Além. O artista adivinha. Fazer arte é Prever. Eis pelo que Newton e 
Shakespeare, se se não excedem, se igualam. (CF: 513, grifos meus)
Marcado pela excentricidade no seu modo de portar-se e de vestir-se, o 
professor Antena destaca-se entre a chusma provinciana, plebe ignara de uma 
Lisboa regionalista, grosseira e suada, cidade onde lhe apraz transitar nas horas 
mais ruidosas, mais agitadas, que lhe propiciam uberemente a criação. No que 
respeita ao seu perfil físico, avulta a estranheza de um “rosto glabro,pálido e 
esguio”, de uns “olhos ocultos por uns óculos azuis”, de um “incoerente feltro 
enorme de artista”, de uns “cabelos longos” e de uma lavallière de seda num 
“laço muito exagerado”. Todos esses elementos conferem ao professor Antena 
um perfil excêntrico de dandy, que fascina a retina “paspalheira” da multidão 
inferior. Afinal, o Mestre Antena é um renomado cientista, e um cientista, como 
parece ironizar o narrador, é tão artista quanto os grandes artistas. Repare-se 
que o discípulo descreve o seu Mestre como um ser que gostava de imiscuir-se 
na “agitação”, nos “ruídos”, no “progresso”, imbuindo-se de “Europa”, isto é, 
do espírito cosmopolita. Contudo, se levarmos em conta a coerência interna 
dos escritos de Sá-Carneiro, lembraremos, por outro lado, que Lisboa sempre 
se afigurou aos seus olhos e aos olhos dos seus personagens como o avesso de 
tudo isso. Noutras palavras, a provinciana Lisboa sá-carneiriana jamais pode-
ria ser tomada como sinônimo de agitação e de progresso, a não ser pelo viés da 
ironia. A meu ver, a advertência de que a Ciência é talvez “a maior das artes” 
poderia ser lida como um grande sarcasmo do narrador-personagem, se pen-
sarmos que tanto Sá-Carneiro como Pessoa, antes mesmo do surgimento de 
Orpheu, já interpretavam o cientificismo desenfreado – entendido aqui pelo 
viés do racionalismo pragmático – como uma espécie de tesoura que corta as 
asas do sonho. Num contexto sociocultural onde tudo deveria ter “o como e o 
porquê científico e exato” (PESSOA, 2005: 297), burocrático em certa medida, 
ao voo livre não era dado vez nem lugar.
Se a tecnologia do mundo moderno fascinava os de Orpheu, que sobre 
ela compunham glosas que pareciam almejar o logro do espasmo sexual pela 
palavra; se Mário de Sá-Carneiro, Álvaro de Campos, Almada Negreiros, 
todos esses artistas fizeram do cosmopolita um objeto de contemplação e de 
gozo, é também certo que eles abdicavam do caráter pragmático e/ou posi-
tivista da Ciência em prol do que pode haver nela de sedução, isto é, de des-
vio funcional do elemento científico, lido agora no avesso do utilitarismo. 
Por isso a Ciência – soberana, absoluta, dogmática, acadêmica, burocrática, 
comprobatória – perde em Orpheu o seu posto de liderança, cedendo espaço 
para uma paradoxal ciência do sonho, viabilizadora de inenarráveis sortilégios.
Além disso, cabe frisar que o narrador-personagem de A estranha morte 
do professor Antena é aquele que – herdeiro de um grande artista – se coloca 
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aristocraticamente como um ser superior – que despreza a esfera popular de 
tal modo que a ilação científica passa a ter um lugar nessa eleição que o dife-
rencia da massa. Não por acaso ele, antipragmático que é, assinala que o labo-
ratório do Mestre mais se assemelhava à gruta dum feiticeiro do que realmente 
ao atelier dum mero cientista:
De resto nada há que torne alguém mais lisonjeiro ao povo do que a lenda – e 
em volta do Prof. Antena nimbava-se um véu áureo de Mistério. A tradição 
sabia que esse homem excêntrico se debruçara mais duma vez sobre qualquer 
coisa enorme, alucinante – que o seu laboratório seria melhor, entre aparelhos 
bem certos, a gruta dum feiticeiro, do que o atelier dum mero cientista. Os 
periódicos heroificavam-no popularmente nas suas manchettes, dia a dia – e, 
por último, as curas extraordinárias, laivadas de milagre, que ele fizera pelos 
hospitais graças à sua perturbadora aplicação dos raios ultravioleta – tinham 
acabado de o sagrar aos inferiores em humanitarismo. (CF: 513-514)
Contemplando como escol a realidade vulgar, o narrador-personagem 
considera o povo a massa inferior, o que nos permite inferir, pela tonalidade 
elitista e desdenhosa do seu discurso, que a lenda humanitária em que a 
chusma acabou por envolver o professor Antena – essa apropriação popular 
– o irrita sobremaneira. De qualquer forma, o próprio narrador admite que 
o mistério nimbava a figura do Mestre, pela qual ele próprio se via seduzido. 
Em relação a esse aparente paradoxo, cabe acentuar que o povo envolvera o 
professor Antena numa dimensão lendária por conta dos “milagres” que ela 
fizera em seu benefício: por exemplo, através da aplicação dos raios ultravio-
leta; por outro lado, o narrador-personagem, que desdenhosamente se refere 
ao povo como a multidão inferior, valoriza o Mestre e a sua ciência pelo viés 
do antipragmático, do insondável. Por outras palavras, a sua admiração pelo 
professor Antena provinha não da sua engenhosa ciência, mas sobretudo do 
mistério artístico que o Mestre encerrava. Ou seja, a ciência comum, certa, 
objetiva, pragmática, explicativa, reveladora do mistério, não lhe interessa, 
pois é apenas a mera ciência. O que de fato chama a sua atenção é a ciência do 
inexplicável, do oculto, do delirante, do sonho, enfim. Por isso, passado quase 
um ano da estranha morte do Mestre, o narrador homodiegético decide, em 
teoria, revelar todo o mistério que envolvera esse acontecimento sui generis. 
Através do relato da memória – discurso da recriação –, o personagem-nar-
rador buscará muito ironicamente trilhar passo a passo, e com base científica 
segura, diz ele, os acontecimentos que culminaram na morte do professor 
Antena, utilizando-se para tanto de provas e de “documentos irrefutáveis”:
Pois bem, hoje, quase um ano decorrido sobre o desastre, eu venho falar enfim. 
E venho agora só, porque só agora possuo nas minhas mãos documentos que, 
irrefutavelmente, autenticam a minha narrativa – documentos que fornecem 
pelo menos uma hipótese admissível, uma forte hipótese, ao estranho desfecho 
ALEA | Rio de Janeiro | vol. 18/1 | p. 114-126 | jan-abr. 2016 121RAFAEL SANTANA | O mistério em A estranha morte do professor Antena
que se vai conhecer. No momento da tragédia ser-me-ia impossível contar a 
verdade – todos me farão, de resto, essa justiça após me haverem lido. Um 
louco, no meu caso, teria falado. Isso mesmo definiria a sua loucura. Homem 
sensato, calei-me. A prova maior da sensatez está em ocultarmos a realidade dos 
fatos inverossímeis. A verdade é só para ser dita ocorrendo nela circunstâncias 
muito especiais. Eis o axioma máximo. (CF: 514-515, grifos meus)
Os documentos que, de forma irrefutável, autenticam a sua narrativa, e que, 
após quase um ano da morte do professor, permitem que o narrador-persona-
gem se pronuncie sem que pareça um louco não passam muito ironicamente 
de hipóteses admissíveis sobre o estranho desfecho daquilo que propõe contar. 
Como Lúcio, o narrador de A estranha morte do professor Antena almeja relatar 
fatos inverossímeis, que desafiam a lógica do mundo, apostando contudo numa 
coerência que ambos não logram manter. Disposto a dizer a verdade, o discí-
pulo do Mestre Antena quer, apesar do caráter hipotético daquilo que narrará, 
provar “como logicamente, ainda que distantemente, se pode referir o Mistério 
à simples realidade científica” (CF: 519, grifos meus). Eis, em teoria, o seu único 
propósito. Extremo sarcasmo, é documentalmente, em forma de monografia 
científica, que o personagem-narrador resolve organizar os “fatos” que relatará:
Eu proponho-me fazer hoje a simples exposição verídica da morte do Mestre, 
e a seguir interpretá-la segundo os documentos que achei entre os seus papéis.
[...]
Para melhor exposição, arrumarei assim a minha narrativa: Restabelecerei pri-
meiro a verdade sobre o desastre. Depois, num apanhado, condensarei – tanto 
quanto possível ordenada e claramente – todos os apontamentos dispersos 
encontrados entre os papéis do Mestre, os quais, reconstituídos nas suas lacu-
nas, ajustados, refletidos em conjunto – além das coisas assombrosas que nos 
entremostram – nos fornecem, senão uma explicação definitiva, categórica, 
pelo menos, como já dissemos, uma forte hipótese sobre a estranha morte do 
Prof. Antena. (CF: 515)
Parecendo contrariar o pacto de leitura que estabelece com o destinatá-rio do seu texto, o narrador, como aquele que manipula a linguagem e com 
ela empreende voluntariamente o seu trabalho, sabe que os documentos – 
sejam quais forem – não são nunca capazes de autenticar integralmente a 
veracidade do que relatam. Por isso, diante dos tais documentos do Mestre, 
o que o personagem-narrador pode fazer é apenas estabelecer uma interpre-
tação possível para o estranho desenlace da sua morte, uma leitura interpre-
tativa e não assertiva, de acordo com a bagagem que tem em mão. Desde o 
princípio, sabe ele que não está diante de uma verdade científica definitiva e 
categórica, e, portanto, aquilo que propõe narrar não são os fatos em si, mas 
apenas uma hipótese que, ironicamente, diz ser muito forte. Neste sentido, 
tudo o que o narrador não faz é mostrar como o mistério se pode reduzir à sim-
RAFAEL SANTANA | O mistério em A estranha morte do professor Antena ALEA | Rio de Janeiro | vol. 18/1 | p. 114-126 | jan-abr 2016122
ples realidade científica, como afirma ser a sua proposta primeira. Enveredando 
por caminhos a um só tempo ocultistas e cientificistas, o discípulo do profes-
sor Antena chega ao fim da sua narrativa sem nada provar. Tal como Lúcio, 
o seu propósito parece ser o de investir no mistério e não na sua revelação.
Frente a um caso inexplicável e, portanto, sem solução, o personagem-narrador 
dispõe-se ironicamente a relatar o passo a passo da morte do professor Antena. 
Mas, se num romance policial, as pistas e os documentos fornecem uma prova 
daquilo que é narrado,4 os tais “documentos” resgatados pelo narrador do texto 
de Sá-Carneiro oferecem apenas uma hipótese possível para a esfera do narrado. 
Organizando cientificamente o “documento” que relata, o narrador de A estra-
nha morte do professor Antena, tal qual Lúcio, jura não estar a compor uma novela, 
de modo a atestar o caráter veridicamente comprobatório da sua escritura. Se, 
num primeiro momento, como já foi dito, ele começa por escrever uma intro-
dução na qual afirma poder restabelecer, por meio de documentos irrefutáveis, 
a completa verdade sobre a misteriosa morte do professor, numa segunda etapa, 
 põe-se a narrar o enredo do estranho falecimento do Mestre para, finalmente, 
num terceiro tempo – este, sim, mais largo –, discorrer sobre as suas hipóteses 
 pseudocientíficas que explicariam a morte do pesquisador, com base nos – na 
verdade – escassos e incompletos documentos que encontrara.
Ora, no enredo da morte do professor Antena, vale ressaltar que o 
narrador-personagem expressa surpresa ao receber um bilhete do Mestre, 
 pedindo-lhe que só o procurasse quando fosse devidamente avisado. Este 
recado inusitado rompe o convívio quotidiano entre o lente e o seu discípulo, 
que só o torna a ver duas semanas depois. Reencontrando o Mestre, o narra-
dor-personagem estranha a misteriosa fisionomia do seu rosto, que parecia 
haver-se deslocado. Envergando incoerentemente uma peliça num aprazível 
dia de maio, portando estranhos óculos que escondiam os seus olhos e alte-
ravam a sua fisionomia e utilizando ainda um misterioso relógio que mais 
se assemelhava a um esdrúxulo aparelho científico, é como se o professor 
Antena fosse a própria encarnação do mistério que estava disposto a revelar, 
e que não seria outro senão a sua própria morte que ele oferecia ao discípulo 
em espetáculo, e para a qual se encontrava já devidamente travestido, como 
se fora entrar numa grande representação:
Agora dobrávamos uma curva estreita da estrada. Em volta de nós, um grande 
silêncio... Até que, ao longe, as badaladas dum sino aldeão marcaram as dez 
horas... E de repente – ah!, o horrível o prodigioso instante! – eu vi o Mestre 
estacar... – Todo o seu corpo vibrou numa ondulação de quebranto... Ergueu 
o braço... Apontou qualquer coisa no ar... Um ricto de pavor lhe contraiu o 
4 Refiro-me à teoria de Tzvetan Todorov – As Estruturas Narrativas – sobre o romance de enigma 
(TODOROV, 2006).
ALEA | Rio de Janeiro | vol. 18/1 | p. 114-126 | jan-abr. 2016 123RAFAEL SANTANA | O mistério em A estranha morte do professor Antena
rosto... As mãos enclavinharam-se-lhe... Ainda quis fugir... Estrebuchou... Mas 
foi-lhe impossível dar um passo... tombou no chão: o crânio esmigalhado, as 
pernas trituradas... o ventre aberto numa estranha ferida cônica...
Petrificado, eu assistira ao mistério assombroso – sem poder articular uma 
palavra, esboçar um gesto, fazer um movimento... Uma agonia estertor me 
ascendeu grifadamente... Julguei-me prestes a soçobrar também morto, esfa-
celado... Mas de súbito pude desvencilhar-me – e soltei então um grande grito: 
um uivo despedaçador, apavorante... (CF: 518)
O professor Antena morre, pois, estranhamente, e a polícia, diante de um 
caso inexplicável, aceita a hipótese algo verossímil mas absolutamente redutora 
– se levarmos em conta o relato do narrador – do seu atropelamento. Passado 
quase um ano do acontecido, o personagem-narrador decide revelar tudo o 
que sabe e começa por dizer que haveria uma ligação intrínseca entre o faleci-
mento do Mestre e uma pequena explosão ocorrida no seu laboratório, no exato 
momento em que o seu corpo soçobrara. Somando pistas estilhaçadas, docu-
mentos incompletos e teorias desconexas, o narrador-personagem reconstitui 
artisticamente, como fingimento de linguagem, a morte do professor-cientista, 
de acordo com a sua própria interpretação. Formulando uma hipótese sobre 
os fatos que propõe narrar, cria ele um discurso de fragmentos díspares, que 
abarca ironicamente a ciência e a religião, o discurso monográfico e o literário:
Aceite esta hipótese tão verossímil, imediatamente nos é lícito concluir que, 
antes da nossa vida atual, outra existimos. A fantasia cifrar-se-á nas lembranças 
vagas, longínquas, veladas, que dessa outra vida conservamos. E sendo assim, 
nada nos repugna também propor que a nossa vida de hoje não será mais do 
que a morte, do que o “outro mundo” da nossa existência da véspera.
– Mas como passaremos duma vida para a outra vida, atendendo que nunca 
conservamos longínquas reminiscências da anterior?
Segundo o Mestre, tudo residiria numa simples adaptação a diversos meios. 
Os órgãos da nossa vida A, em função do tempo – ou de qualquer outra gran-
deza –, ir-se-iam pouco a pouco atrofiando relativamente a essa vida; isto é: 
modificando. Até que a mudança seria completa. Então dar-se-ia a morte para 
essa vida A. Mas, ao mesmo tempo, esses órgãos haver-se-iam adaptado a outra 
existência, tornando-se sensíveis a ela. E quando assim acontecesse, nasceríamos 
para uma vida B. (CF: 521-522)
Mesclando num único discurso a Teoria das Ideias, o Espiritismo, o 
Magismo, o Positivismo, o Darwinismo e a Teoria da Relatividade de Einstein, 
o narrador-personagem parece rir-se da ingenuidade do seu leitor ao continuar 
afirmando, sem contudo operar nesse sentido, que pretende revelar a estra-
nha morte do seu Mestre por meio de documentos irrefutáveis. Chegando 
ao sarcasmo imenso de comparar os sonhos ao processo evolutivo dos batrá-
quios, anfíbios que num primeiro momento da vida são larvas adaptadas ao 
meio aquático e que num segundo momento se transformam em animais 
RAFAEL SANTANA | O mistério em A estranha morte do professor Antena ALEA | Rio de Janeiro | vol. 18/1 | p. 114-126 | jan-abr 2016124
terrestres, o narrador pseudocientista lança mão da teoria da reminiscência 
de Platão para explicar absurdamente a adaptação dos órgãos da vida preté-
rita à vida presente, ao juntar num só texto o Darwinismo e a filosofia antiga.
Recuperando, “quase textualmente” (CF: 527), as ideias do professor 
Antena, o seu discípulo nos revela o seguinte teorema do Mestre: “a imagina-
ção não é ilimitada” (CF: 521, grifos do autor). Por outras palavras, a fantasia 
(o sonho) não seria nada mais do que uma soma finita – e portanto ponderá-
vel – de reminiscências. Ora, se o sonho, em Mário de Sá-Carneiro, sempre 
aparece como possível projeto de criação de mundos alternativos, de existên-
cias múltiplas a partir da palavraartística, ele pareceria surgir aqui (se acredi-
tássemos em todas as postulações do narrador) como uma manifestação não 
criativa, haja vista que ele afirma, “cientificamente”, que só sonhamos porque 
temos reminiscência de outras vidas. Portanto, o sonho já não seria mais uma 
potência criadora, uma reinvenção da vida, mas apenas uma lembrança esti-
lhaçada de uma outra existência, para a qual os órgãos da vida atual definha-
ram: a Teoria das Ideias de Platão e o Evolucionismo de Darwin aqui aparecem 
juntos, de modo a “comprovar” a limitação dos sonhos. Ora, estamos diante 
de uma imensa ironia, se levarmos em conta que essa hipótese – lida stricto 
sensu – não teria coerência alguma com o conjunto da obra sá-carneiriana, que 
valoriza o sonho, ou melhor, o voo livre como instância primeira e última.
Segundo o narrador-personagem, o professor Antena acreditava na 
existência de vidas sucessivas, que se manifestavam de forma sobreposta. O 
ser humano que conseguisse adaptar os órgãos mortos das vidas anteriores 
aos desta vida poderia transitar livremente pelas suas múltiplas existências, 
logrando ser uma espécie de Deus. É desta forma que o narrador pseudocien-
tista busca explicar documentalmente a estranha morte do seu Mestre que, 
vencendo o mistério, teria despertado noutra vida. Nessa dimensão outra, o 
seu corpo ter-se-ia imaterializado, deixando de ser poroso, o que explicaria 
teoricamente a quase desintegração do seu invólucro terrestre. Eis aí a hipó-
tese do narrador-personagem, hipótese que, enquanto discurso, é especula-
ção, é criação sobretudo:
Tal é a hipótese que pela minha parte proponho. Quem entender que formule 
outras – mesmo que retome as suas teorias e praticamente as busque verificar. 
Para isso as publiquei. Seria um crime ocultá-las. Elas rasgam sombra, fazem-nos 
oscilar de Mistério, como nenhumas outras. Incompletas, embaraçadas, são 
entretanto as mais assombrosas...
... E na memória do Prof. Domingos Antena, devemos sempre relembrar, atônitos, 
Aquele que, por momentos, foi talvez Deus – Deus, Ele-Próprio: que realizaria, 
um instante, o Deus que nós, os homens, criamos eternamente. (CF: 529)
ALEA | Rio de Janeiro | vol. 18/1 | p. 114-126 | jan-abr. 2016 125RAFAEL SANTANA | O mistério em A estranha morte do professor Antena
A mensagem está clara: o que o narrador-personagem acabou por for-
mular foi apenas uma hipótese, dentre tantas possíveis, para a estranha morte 
do seu Mestre, e quem quiser está livre para criar a sua própria proposição 
de leitura. E se o professor Antena logrou talvez ser Deus por um ínfimo 
momento, lembre-se que isto se deve tão somente às teorias que ele, enquanto 
homem, foi capaz de criar. A ciência do sonho, da criação artística, da lou-
cura, permitiram que o Mestre Antena quiçá tocasse momentaneamente o 
absoluto, quiçá adentrasse celeremente uma dimensão outra, onde, como 
deseja o protagonista do conto O Homem dos Sonhos, a alma, e não o corpo, é 
o invólucro visível. Eis talvez porque o seu corpo deixara de ser poroso, eis tal-
vez a sua conquista, eis talvez o seu triunfo. Como nos ensina o sujeito lírico 
do poema Partida, o logro da apoteose artística reside na subida, ainda que 
falhada, “[...] / além dos céus / Que as nossas almas só acumularam / E pros-
trados rezar, em sonho, ao Deus / Que as nossas mãos de auréola lá douraram” 
(SÁ-CARNEIRO, 1995: 9). Como criador, o artista é uma espécie de Deus, 
porque capaz de criar, com as suas próprias mãos, os seus mundos alternati-
vos, porque capaz de realizar, um instante, o Deus que nós, os homens, criamos 
eternamente. Ao fim e ao cabo, é sempre a criação artística que parece erigir-se 
como potência absoluta no universo literário de Mário de Sá-Carneiro.
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TODOROV, Tzvetan. As estruturas narrativas. Trad. Leyla Perrone-Moisés. São Paulo: 
Perspectiva, 2006.
Rafael Santana Gomes é professor adjunto de Literatura Portuguesa da UFRJ, dou-
tor em Literatura Portuguesa pela UFRJ, com tese sobre a prosa e a correspondên-
cia literária de Mário de Sá-Carneiro (Lições do Esfinge Gorda). Atua principalmente 
nos seguintes temas: Decadentismo, Modernismo e ecos do fim de século na litera-
tura contemporânea. Tem publicações no Brasil e no exterior. 
E-mail: emailrafaelsantana@gmail.com.
Recebido em: 29/09/2015 
Aprovado em: 4/11/2015

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